Você está na página 1de 4

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE LETRAS E COMUNICAÇÃO


FACULDADE DE LETRAS - manhã
LITERATURA BRASILEIRA MODERNA
DOCENTE: Ana Maria F. Torres
DISCENTE: Ana Carolina T. F. Belém
MATRÍCULA: 201509140096

2ª avaliação

Realismo no Brasil teve início com a publicação da obra Memórias Póstumas de Brás Cubas,
de Machado de Assis. As outras duas obras Quincas Borba e Dom Casmurro também
entraram para lista de livros que representaram genuinamente o realismo no Brasil.
Citar Dom Casmurro, nos últimos anos, tem sido acompanhado quase instantaneamente da
pergunta “traiu ou não traiu?”. Esta obra de Machado de Assis atraiu grande atenção do
público brasileiro devido, principalmente, ao seu final aberto - que fomenta discussões entre
as mais variadas idades e graus de instrução a respeito da (in)fidelidade de Capitu. Também
conhecido como Otelo brasileiro, a obra Dom Casmurro contém uma das personagens
femininas mais bem desenvolvidas da literatura brasileira. Aborda temas universais, como
ciúmes, infidelidade, paixão, e críticas voltadas para sociedade; utilizando, para tal, seu humor
irônico.
O livro é narrado em primeira pessoa pelo personagem Bentinho durante sua velhice, que
revive suas memórias desde sua infância/adolescência até seu atual momento. O tempo, na
obra, é psicológico: as cenas vêm e vão conforme as memórias lhe aparecem e a obra se passa
no cenário urbano. Segundo Souza (2019, p.15) sendo o Rio de Janeiro um importante centro
comercial de exportações e importações na segunda metade do século XIX, durante a
mudança do ambiente rural para o urbano após a morte do marido D. Glória investiu em
comprar escravos de aluguel e/ou ganho, imóveis (uma dúzia de prédios) e apólices, o que
caracterizava bons investimentos e de baixo risco.
O narrador-personagem, logo no início, descobre-se apaixonado por sua vizinha Capitu, esta
demonstra corresponder os sentimentos do rapaz (antes mesmo que ele os tivesse percebido),
porém a mãe de Bento (D. Glória), após ter o primeiro filho nascido morto, havia prometido
que, se a próxima gestação vingasse e fosse menino, o entregaria para o sacerdócio. O
agregado da família, José Dias, preocupou-se que Bento e a menina se envolvessem num
namoro, pois seria mais difícil entregar o filho para o seminário. Descoberto isso, Capitu
organiza série de fatores que fazem Dona Glória pensar que o rapaz deseja mesmo ir para um
seminário (assim não haveria pressa de colocá-lo em um tão desesperadamente); também
passou a deixar evidente uma relação de irmãos entre ambos, com baixas chances de interesse
amoroso, a fim de atrasar a ida de Bentinho para o seminário, visto que sua mãe também
desejava aproveitar o filho perto de si mais vezes. As primeiras opiniões que nos foram
apresentadas a respeito de Capitu são as de José Dias, sendo a mais famosa: “olhos de cigana
oblíqua e dissimulada”. Percebe-se que a personagem feminina vai sendo construída com
atitudes dissimuladas – a fim de evitar a ida de Bento para o seminário – e com emissões de
opiniões que colocam em xeque seu caráter. Percebe-se, na trama, o evidente sentimento de
superioridade que José Dias nutre em relação a família de Capitu; é sutilmente exposto, no
entanto, a hipocrisia deste personagem, pois logo descobre-se que ele mentiu sobre ser médico
(famoso charlatanismo), porém foi perdoado pela matriarca da família e acabou por torna-se
“membro” dela.
As narrativas da juventude de Bentinho (antes, durante e até depois do seminário) revelam
uma Capitu apaixonada, bastante afetuosa e ávida por ter ao seu lado o namorado, inclusive
este objetivo de tê-lo perto é a causa das tramas para tirá-lo do seminário. Mesmo assim, em
certo episódio, Bentinho demonstra ciúme colérico e desejos violentos de vingança (quando a
viu olhar para um cavaleiro que passou na rua). Esta, mesmo ofendida por ter sua fidelidade
posta à prova, decide perdoá-lo com a promessa de que nunca mais duvidasse de sua
honestidade.
Posteriormente, conseguem retirar Bentinho do seminário. É Escobar quem dá a ideia que tira
de vez Bento do seminário: que a mãe pegue um órfão e financie seus estudos para ser padre,
pois ela prometeu um filho à Deus, mas nunca disse que este filho seria Bentinho. Ao sair do
seminário, vai estudar direito, torna-se advogado, enquanto Escobar torna-se comerciante.
Bentinho casa-se com Capitu e Escobar casa-se com a melhor amiga de Capitu, Sancha, e
juntos têm uma menina. Os quatro vivem felizes e encontram-se com bastante frequência.
Após dois anos de casamento, Bentinho e Capitu estão ávidos por um filho, põem-se a rezar
noites a fio, pedindo a Deus que os abençoe com uma criança. Finalmente, após tantas
orações, Capitu engravida e dá a luz a um menino. Como homenagem põem o nome do
menino de Ezequiel, primeiro nome de Escobar. O amigo era atlético, nadava todas as
manhãs. Numa manhã um escravo chegou desesperado; Escobar havia se atrevido a nadar
mais longe que o usual e acabou por afogar-se.
Durante o enterro, bentinho viu Capitu olhar para o caixão de forma intensa e viu algumas
lágrimas saltarem a furto e serem enxugadas sutilmente. Deste momento em diante, Bentinho
teve a desconfiança do caso de Capitu com Escobar e a cada momento que passava, mais esta
certeza crescia dentro dele. Mais ainda: estava convencido de que o menino era filho de
Escobar, não de Bentinho. Quando afastado da criança e da esposa, Bentinho novamente tinha
desejos violentos de vingança e morte para a criança e para a esposa, porém quando via a
alegria do menino ao vê-lo sentia-se desarmado e adiava a vingança. Por fim, acabou por
comprar um veneno. Planejou suicídio, teve impulso de o menino beber o café envenenado,
mas desistiu no último segundo. Quando o menino, chamou “papai” acabou por revelar “não
sou teu pai”.
Capitu pediu ao marido se explicasse. Revelou à mulher a suspeita do adultério e ela
queixou-se do ciúme doentio de Bentinho, demonstrando estar ofendida com as acusações
recebidas. Separaram-se e Bento Santiago enviou Capitu e o filho para suíça, com a desculpa
de ter ido estudar no país.
Ocasionalmente, Santiago viajava para Europa, a fim de fingir estar indo visitar a família.
Nota-se o investimento feito e o zelo para manter as aparências frente a sociedade. Mãe e
filho viveram até a morte de Capitu, que foi enterrada no país mesmo. Após anos, Ezequiel
retornou ao Brasil para encontrar o pai. Bentinho, ao vê-lo, notou a forma idêntica à de
Escobar, apenas um pouco mais magro, menor e com sotaque afrancesado. Mesmo sem a
convivência, Ezequiel apresentava a mesma voz, a mesma risada e os mesmos trejeitos que
Escobar. Moraram juntos e bentinho o tratou como filho, ao cabo de seis meses Ezequiel disse
precisar fazer uma viagem científica a Grécia, Egito e a palestina. Santiago forneceu-lhe os
recursos. Onze meses depois Ezequiel morreu de febre tifo durante a viagem e foi enterrado
nas imediações de Jerusalém. Na sepultura, os amigos da universidade que haviam
acompanhado o jovem mandaram escrever “tu eras perfeito nos teus caminhos”, citação do
profeta Ezequiel. Para verificar, Bentinho pegou sua própria bíblia e viu a citação completa
“tu eras perfeito nos teus caminhos desde do dia da tua criação”. Pôs-se a pensar “quando
teria sido o dia da criação de Ezequiel?”. Deixou a dúvida no ar, jantou e foi ao teatro.
Em resumo, devido a trama completa ser narrada em primeira pessoa, por um personagem
passional, não se pode confiar que a narrativa é feita apenas de “fatos”, pois tudo está sendo
descrito a partir da visão subjetiva do narrador – que está muito envolvido emocionalmente
com os episódios. Uma das críticas que o realismo faz é a respeito do casamento como
instituição burguesa; o autor já utilizou, em outras obras, a infidelidade feminina como forma
de ataque a esta instituição, por isto muitos tiram conclusões a respeito da personagem
feminina supondo que esta é mais uma ferramenta de ataque social; no entanto o esforço
constante que o protagonista faz para que a sociedade acredite que ainda tem um casamento
firme, para afastar seu filho dos olhos de quem possa desconfiar da “infidelidade” e para
encobrir qualquer imperfeição na “família” de Bentinho, já é uma forte crítica as famílias que
viviam de aparências, aquelas que se esforçavam para atender as expectativas da sociedade,
desfazendo assim a imagem de família burguesa harmônica. É importante lembrar que, em
determinado momento há um rumor a respeito de uma possível infidelidade de Escobar, mas é
pouco explorado e citado de forma quase irrelevante. No entanto, quando há uma possível
infidelidade de Capitu, a personagem é punida com o exílio na Suíça. Esta contraposição sutil
não deixa de ser uma forma de denúncia, não apenas da falência da instituição casamento,
mas também da injustiça sofrida pela mulher. Portanto, a obra Dom Casmurro, de Machado
de Assis utiliza a escrita sugerindo um romance ao leitor, mas elenca todas as características
do movimento literário Realismo ao longo da narrativa.

Referências Bibliográficas

SOUZA, Iara Moura Stefani. Rio de Janeiro, Segunda Metade do Século XIX: O Mundo
de Dom Casmurro. Monografia, Departamento de História do Instituto de Filosofia e
Ciências Humanas da Universidade Federal do Rio Grande do sul. Porto Alegre, 2019.
FONSECA, Daniel Gomes da. Em Torno da Ironia: Análise de Dom Casmurro, de
Machado de Assis. Dissertação, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo. São Paulo, 2014.
ROSENFIELD, Kathrin Holzermayr. A Ironia de Machado em Dom Casmurro: Reflexão
Sobre a Cordialidade Anti-Trágica. Programa de Pós Graduação em Letras da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2007.

Você também pode gostar