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CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BRASÍLIA

Faculdade de Ciências Jurídicas e Ciências Sociais - FAJS

ALESSANDRA LORIATO NAZARETH FRANCO

A OBRIGATORIEDADE NA REALIZAÇÃO DE EXAME EM


DNA NA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE

BRASÍLIA – DF
2011
ALESSANDRA LORIATO NAZARETH FRANCO

A OBRIGATORIEDADE NA REALIZAÇÃO DE EXAME EM


DNA NA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE

Monografia apresentada como requisito para


conclusão do curso de bacharelado em Direito
da Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais
do Centro Universitário de Brasília –
UniCEUB.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria Heloísa
Cavalcante Fernandes

BRASÍLIA – DF
2011
FRANCO, Alessandra Loriato Nazareth

A obrigatoriedade na realização de exame em DNA na ação de investigação de


paternidade/ Alessandra Loriato Nazareth Franco. Brasília: UniCEUB, 2011

50 fls.

Monografia apresentada como requisito para conclusão do curso de bacharelado


em Direito do Centro Universitário de Brasília – UniCEUB.

Orientadora: Maria Heloísa Cavalcante Fernandes


ALESSANDRA LORIATO NAZARETH FRANCO

A OBRIGATORIEDADE NA REALIZAÇÃO DE EXAME EM


DNA NA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE

Banca Examinadora

_________________________________________________
Prof. Dr. Nome completo

_________________________________________________
Prof. Dr. Nome completo

_________________________________________________
Prof. Dr. Nome completo

BRASÍLIA – DF
2011
Ao meu esposo Alexandre Coelho Franco, meu porto seguro, fonte de
paciência, equilíbrio, amor, motivação, incentivo, compreensão,
determinação e companheirismo. Você tem sido uma benção na minha
vida!
Às minhas filhas Hannah, Sarah e Rachel, que mesmo pequenas,
sempre me presentearam com grande amor carinho, paciência e
alegria infinitas. Vocês fazem parte da minha conquista por estarem
sempre presentes em minha vida.
Amo vocês!
AGRADECIMENTO

A Deus, por minha vida, família e oportunidade de crescer com mais


este curso, e a realização deste trabalho. Enfim, por estar comigo em
todos os momentos. Sem Ele não estaria aqui.
À minha família, especialmente meu esposo Alexandre Coelho
Franco, e às minhas filhas Hannah, Sarah e Rachel pelo carinho,
incentivo e paciência, por entender minha ausência durante estes cinco
anos em que não estive tão presente.
Aos meus pais, Adair e Leonídia, pelo amor, cuidado e dedicação
durante toda a minha vida.
À minha irmã, Patrícia, primeira incentivadora para voltar a estudar,
pelo apoio durante todo o curso.
Aos meus professores, por todo ensinamento, por meio do qual
buscaram incentivar uma mente reflexiva sobre o desafiador papel do
advogado diante da sociedade.
Principalmente à minha orientadora Drª. Maria Heloísa Cavalcante
Fernandes por sua paciência e orientações no decorrer destes dois
últimos semestres.
Aos meus colegas, por cada momento que passamos, que foram muito
enriquecedores, em especial à Gracineide, Laíse, Michelle, Ana, Éder,
Veroneze, Everton e Silvio, entre outros. Muito obrigada!
RESUMO

A Constituição Federal Brasileira de 1988 estabeleceu direitos iguais para todos, sem
distinção, inclusive os filhos, unificando a relação entre filhos naturais e adotivos que até
então, eram tratados de forma desigual. Na adoção, não importa a condição biológica do
adotante, mas sim da proteção integral da criança que se desdobra, entre outros, no melhor
interesse da criança. Para acompanhar o desenvolvimento da sociedade é necessário que o
sistema jurídico procure em outras fontes soluções para resolver os conflitos sociais, como na
jurisprudência, nos princípios e na analogia, haja vista o interesse de suprir o vazio legislativo
em relação aos direitos não positivados. A pesquisa foi estruturada em três capítulos: primeiro
traz uma noção geral da adoção no Brasil a partir da Constituição Federal de 1988. Esse
mesmo capítulo aborda os princípios da Dignidade da Pessoa Humana, da Igualdade e da
proteção integral da criança e do adolescente, como um subtítulo relevante para o
desenvolvimento desse estudo. O segundo capítulo primeiramente aborda algumas
modalidades de adoção dando ênfase na modalidade de adoção por casal homoafetivo uma
vez que essa será o tema em discussão. Por fim, o terceiro capítulo apresenta o
posicionamento do STJ; promove análise de casos concretos e ilustra opiniões diversas.

Palavras chaves: Paternidade. Verdade biológica. DNA. Princípios. Obrigatoriedade.

Desde a Constituição de 1988, onde foram estabelecidos direitos iguais sem distinção, os
filhos naturais e adotivos começaram a ser tratados igualmente, sem distinção biológica.
Os direitos e a proteção integral da criança passaram a ser o principal motivador para
adoções de novas práticas e inclusão da ciência como um dos pilares nas decisões sobre
paternidade. Para acompanhar o desenvolvimento da sociedade o sistema jurídico
procurou novas fontes de soluções. Neste contexto surgiu à obrigatoriedade do exame
DNA como prova contundente de paternidade e filiação. Este trabalho foi estruturado
em três capítulos: No primeiro, trata-se da evolução do conceito paternidade e filiação,
no segundo aborda as previsões constitucionais e no terceiro aborda-se a
obrigatoriedade na realização de exame médico para comprovação ou não da
paternidade, além de uma abordagem sobre a Súmula 301 do STJ.

Palavras chaves: Paternidade. Verdade biológica. DNA. Princípios. Obrigatoriedade.

ABSTRACT

Keywords: Paternity. Biological truth. DNA. Principles. Obligation.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................................1

1 PATERNIDADE...............................................................................................................1
1.1 Evolução do conceito de paternidade e filiação...............Erro! Indicador não definido.
1.2 O Exame em DNA...............................................................................................................1
1.3 Reflexos sociais e jurídicos da paternidade......................................................................1
1.3.1 Reflexos Sociais.................................................................................................................1
1.3.2 Reflexos Jurídicos..............................................................................................................1

2 REGULAMENTAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE NO


ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO........................................................1
2.1 Constituição Federal...........................................................................................................1
2.2 Código Civil Brasileiro de 2002 – CC/02..........................................................................1
2.3 Leis específicas – 8.560/92; 11.105/05 e 12.004/09............................................................1

3 A OBRIGATORIEDADE NA REALIZAÇÃO DE EXAME MÉDICO


NECESSÁRIO......................................................................................................................1
3.1 Direitos do investigante e direitos do investigado............................................................1
3.2 Recusa em submeter-se a exame necessário.....................................................................1
3.3 Súmula 301 do STJ.............................................................................................................1

CONCLUSÃO.......................................................................................................................1

REFERÊNCIAS...................................................................................................................1
INTRODUÇÃO
Contextualizar

Este trabalho tem como escopo tratar resumidamente sobre o assunto a


obrigatoriedade na realização de exame em DNA na ação de investigação de
paternidade, abordando os aspectos jurídicos, a evolução do conceito paternidade e
filiação, bem como os reflexos sociais, trazendo a tona aspectos relevantes e opiniões
de diversos juristas a fim de se trazer luz ao tema.

No caso do presente trabalho o que nos motivou foi a suposta eficácia do exame no
processo civil como prova inequívoca de paternidade e filiação. Desta indagação
verificamos que algumas questões sem respostas precisavam de maior
aprofundamento. Não queremos esgotar o assunto, mas temos como objetivo abordar
algumas questões que nos levam a refletir sobre a relevância do tema e seus impactos
na sociedade e nos indivíduos.

Neste propósito pergunta-se:

A prova de DNA é suficiente para se determinar a paternidade, com a formação de


filiação e família?

Todos os exames de DNA, realizados nos mais diversos laboratórios e com os diversos
profissionais, possuem a mesma confiabilidade ?

O exame de DNA é absoluto?

Diante destes questionamentos, até que ponto o exame de DNA deve ser obrigatório
nos casos de determinação da paternidade. Qual o seu verdadeiro valor e suas
fragilidades?

É valido buscarmos resposta na rigidez de nosso sistema de normas? Seria possível


adequar o exame de DNA aos aspectos afetivos e amorosos da família e da filiação?

Estas questões põem frente a frente à frieza da prova com os aspectos subjetivos
inerentes ao processo de filiação. Aspectos como afeição, amor, desejo também devem
pesar no processo de paternidade e filiação? Atualmente a defesa do réu é secundário,
sendo preponderante o exame de DNA.

No primeiro capítulo, busca-se, de maneira resumida discutir a evolução do conceito


de paternidade e filiação, refletir sobre o exame pericial, além dos reflexos sociais e
jurídicos decorrentes.

O segundo capítulo aborda as previsões constitucionais, do Código Civil de 2002,


além das leis específicas.

O terceiro capítulo trata da obrigatoriedade na realização de exame médico para


7

comprovação ou não da paternidade, os direitos do investigante e investigado, na


recusa em submeter-se ao exame, além de tratar da Súmula 301 do STJ.

Quanto à metodologia para desenvolver esse estudo, uma vez que já mencionado no
terceiro capítulo os casos e pesquisa é um trabalho fundamentado em análise e
conceitos doutrinários, jurisprudenciais como também em lei uma vez que esta
assegura a proteção integral da criança e a dignidade da pessoa humana. Para melhor
compreensão do tema a ser abordado serão ainda observados os casos e pesquisas

Ao final desta pesquisa, em anexos destacam-se projetos de Lei e Decretos-Lei que de


alguma forma sustentam que os direitos devem ser assegurados...

Neste sentido, a partir do momento em que a mulher detém o controle da concepção e


contracepção e opta por não decidir conjuntamente com seu par em ter ou não um
filho; como se justificaria a imposição da paternidade ao homem? Aqui a solução
encontrada, segundo Leite,1 se fundada exclusivamente no exame de DNA e graças aos
recursos tecnológicos e biomédicos, seria de restringir a figura paterna ao homem-
genitor.

Partindo de uma visão histórica...

A relevância do tema perpassa pelo o direito de família, sendo reconhecido pelos


doutrinadores e legisladores, assim como o Poder Judiciário e o Estado como um todo,
tendo assim reflexos na sociedade e no meio jurídico.

1
LEITE, Eduardo de Oliveira. Exame de DNA, ou, o limite entre o genitor e o pai. In: LEITE, Eduardo de
Oliveira (Org.) Grandes temas da atualidade - DNA como meio de prova da filiação. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 78
8
1 PATERNIDADE

A relação entre pais e filhos, que decorre da maternidade ou paternidade, foi


prevista em vários ordenamentos jurídicos por todo o mundo 2. No Brasil, há normatização
específica para a filiação na Lei nº 10.406 de 10/01/2002 - Código Civil3, no Livro IV, Título
I, Subtítulo II, Capítulo II.

Este capítulo pretende discutir o a evolução do conceito de paternidade e


filiação, refletir sobre o mais recente exame pericial utilizado em sua verificação, qual seja o
exame em DNA, além dos reflexos sociais e jurídicos que deles decorrem, considerando sua
importância na avaliação da obrigatoriedade ou não em se submeter a exame médico
necessário em ação de investigação de paternidade.

1.1 Evolução do Conceito de Paternidade e Filiação

Vargas e Werlang apontam que “o caminho percorrido pela evolução dos


comportamentos e pensamentos, ou seja, do poder ilimitado do patria potestas à noção de
deveres e obrigações que, hoje, caracterizam a relação paterno-filial, foi longo e de forma
alguma sem percalços.” 4

No entendimento de Eduardo Leite5 o atual conceito de paternidade se


encontra distribuído nos critérios biológico, jurídico e sócioafetivo, sendo que a relação
paterno-filial é mais que hereditariedade sanguínea, prevalecendo a socioafetividade sobre os
demais critérios. Historicamente a paternidade tinha o foco apenas no pai e era definida no
denominado poder pátrio6 (patria potestas), refletido no poder absoluto que o pai tinha sobre
os filhos. 7
2
LEITE, Eduardo de Oliveira. Exame de DNA: Reflexões sobre a prova científica da filiação. In: WAMBIER,
Teresa Arruda Alvim; LEITE, Eduardo de Oliveira (coord.). Repertório de doutrina sobre Direito de Família:
Aspectos constitucionais, civis e processuais. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1999. p. 197-204.
3
BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406 de 10/01/2002. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm> Acesso em: 20 set. 2011.
4
VARGAS, Glaci de Oliveira Pinto, WERLANG, Maslova. Paternidade: Investigação Judicial e Coisa Julgada.
Florianópolis: OAB/SC Editora, 2004. p. 18.
5
LEITE, idem. Exame de DNA, ou, o limite entre o genitor e o pai. In: LEITE, Eduardo de Oliveira (Org.)
Grandes temas da atualidade - DNA como meio de prova da filiação. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 78
6
A expressão “Pátrio poder” foi substituída por ‘poder familiar’ devido à determinação contida no art.3º da Lei
nº 12.010, de 3 de agosto de 2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-
2010/2009/Lei/L12010.htm#art3> Acesso em 19 nov. 2011
7
LEITE, Eduardo de Oliveira. O exame de DNA: reflexões sobre a prova científica da filiação. In: WAMBIER,
10

A presunção de paternidade no casamento surgiu, num momento quando,


ainda não havia os meios tecnológicos atuais, presumia-se pai o marido da mãe: pater is est
quem nuptiae demonstrant. Hodiernamente, a antiga dúvida de que mater semper certa est
enquanto pater incertus foi invalidada, pois com os avanços da biomedicina, passou a ser
possível determinar o genitor de certa pessoa. 8

Assim, conforme Caio Mário, no antigo Direito romano, “a organização


religiosa da família sobrelevava a qualquer outro aspecto seu”, e nesse sentido o culto era
transmitido de pai para filho (varão a varão), o qual era apresentado diante do altar como o
continuador do culto. O filho que fosse fruto de relação extraconjugal, não era apresentado
conforme a religião, e consequentemente não recebia o nome do pai, nem herdava dele, em
suma, não era reconhecidamente filho. 9

A presunção pater is est, antes adotada pelos romanos na determinação da


paternidade, relembra Eduardo Leite, foi vencida na segunda metade do século XX “pela
confiabilidade do exame de DNA que não só revolucionou o mundo da biomedicina, mas, e
sobretudo, alterou o quadro estagnado que dominava no engessado ambiente jurídico
nacional”. 10

O enfoque de Leite é em outro tipo de pai, ou seja, aquele que busca


desenvolver um vínculo de amor profundo com o filho. Neste sentido em face do conceito de
paternidade tradicional romano da figura do mero genitor, Hurstel confirma esse diferencial
no conceito da paternidade, a saber, o pai é entendido não apenas como aquele que gerou, mas
também como aquele que educa e provê, além de ser aquele que transmite nomes e bens. 11

O Direito de família tem refletido em um conceito cada vez mais atual da


filiação e da paternidade, devido a sua importância. Sendo assim Lourival Serejo destaca os
direitos fundamentais à criança e ao adolescente garantido pelos princípios da proteção da

Teresa Arruda Alvim; LEITE, Eduardo de Oliveira (cood). Repertório de doutrina sobre Direito de Família:
Aspectos constitucionais, civis e processuais. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1999. p. 192
8
Idem. Exame de DNA, ou, o limite entre o genitor e o pai. In: LEITE, Eduardo de Oliveira (Org.) Grandes
temas da atualidade - DNA como meio de prova da filiação. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 78
9
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Reconhecimento de paternidade e seus efeitos. Rio de Janeiro: Forense,
1998. p. 8-9.
10
LEITE, op. cit., p. 63
11
HURSTEL, 1999 apud LEITE, Eduardo de Oliveira. Exame de DNA, ou, o limite entre o genitor e o pai. In:
LEITE, Eduardo de Oliveira (Org.) Grandes temas da atualidade - DNA como meio de prova da filiação. Rio
de Janeiro: Forense, 2002. p. 66-67.
11

família e da infância, e da paternidade responsável, princípios constitucionais, orientadores do


direito de família, formalizados na Constituição Federal12 de 1988 nos artigos 6º e 226, § 7º,
dentre outros, como aquele evidenciado na preocupação do legislador ao ratificar a obrigação
alimentar em relação aos filhos, com o consequente desestímulo da “desagregação familiar e a
disseminação de proles desamparadas.” 13

Para Caio Mário a filiação é “um fenômeno excepcionalmente complexo”,


perpassando pelos fatores biológico, fisiológico, histórico, sociológico e por fim se traduzindo
em vínculo jurídico. Ressalta ainda, que a sociologia tem buscado “suas origens num passado
sem fim, tão longo e tão distante que relembra os primórdios da vida humana”. 14

Maria Helena Diniz, numa concepção mais biológica, define a filiação como
“o vínculo existente entre pais e filhos, vem a ser a relação de parentesco consanguíneo em
linha reta de primeiro grau entre uma pessoa e aqueles que lhe deram vida”, ou seja, a relação
entre o filho e as pessoas que o conceberam. Da mesma forma, chama à atenção para o fato de
que nem sempre essa ligação decorre de união sexual, visto que também pode derivar de
inseminação artificial homóloga ou heteróloga; e de fertilização in vitro ou em proveta15.

Já Belmiro Welter, destaca que a família atual, e a relação de filiação, não se


origina apenas dos laços de sangue e do casamento, mas também pela união estável, família
monoparental, unilinear, nuclear, eudemonista ou socioafetiva, sendo seus membros o foco
principal, unidos pela “afetividade em busca da solidariedade, felicidade, afeto e da promoção
da dignidade da pessoa humana” 16.

Orlando Gomes17, numa perspectiva diferente, conceitua a filiação no fato


de possuir o estado de filho, chamado tendo o título correspondente, desfrutando suas
vantagens e suportando seus encargos, sendo assim socialmente tido como tal. “É passar a ser
tratado como filho.”
12
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 18 ago 2011.
13
SEREJO, Lourival. Direito Constitucional da Família. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 8-10.
14
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Reconhecimento de paternidade e seus efeitos. Rio de Janeiro: Forense,
1998. p.1.
15
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro v. 5: direito de família 19a ed. São Paulo: Saraiva,
2004. p.396
16
WELTER, Belmiro Pedro. Igualdade entre as filiações biológica e socioafetiva. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2003. p. 36
17
GOMES, Orlando. Direito de Família. Rio de Janeiro: Revista forense, 1998. p. 324
12

Neste mesmo sentido a posse do estado de filho, no entendimento de


Chamelete Neto18, tem fundamento em três fatores, quais sejam, o nome (uso do patronímico
do suposto pai), o tratamento dispensado pelo suposto pai ao filho, ou a forma daquele se
comportar perante este e o aspecto ostensivo e externo da posse de estado, ou seja, sua
reputação pública.

Sendo assim, a partir de uma visão histórica, fica evidente a crescente


evolução do conceito de paternidade e da filiação, extrapolando a esfera genética e
alcançando a afetividade como perspectiva de maior importância aos envolvidos.

1.2 O Exame em DNA

O termo DNA (ácido desoxirribonucléico), em inglês, é largamente utilizado


no Brasil, tanto informalmente, no uso cotidiano, quanto no meio jurídico, sendo um tipo de
molécula, presente em todas as células nucleadas, responsável pela transmissão do código
genético, que caracteriza todos os seres vivos19.

Conforme Fernando Simas Filho, a fórmula biológica do indivíduo,


determinada no exame em DNA, tem sido utilizada, em investigações tanto de contestação de
paternidade, quanto nas criminais, para alcançar seu propósito o DNA pode ser obtido de
diversas formas.

O DNA pode ser obtido para exames, em filtros de cigarro, selos, envelopes
(nos quais a pessoa tenha passado a língua impregnando-os de saliva,
contendo células da mucosa bucal); aba de chapéus (se a pessoa sempre
passava os dedos ali, pois existe muito DNA se desprendendo continuamente
nas extremidades dos dedos); roupas íntimas; máscaras de borracha
(principalmente se a pessoa transpirou); igualmente pode se obter DNA para
exames, em peças conservadas em formol! [...] 20

Tal sigla, diversamente do previsto no artigo 156 do Código de Processo


Civil, de onde se extrai que: “em todos os atos e termos do processo é obrigatório o uso do
vernáculo” 21, permanece utilizada em língua inglesa. No entanto, de acordo com o destacado

18
CHAMELETE NETO, Alberto. Investigação de paternidade & DNA. Curitiba: Juruá, 2002. p. 63.
19
SIMAS FILHO, Fernando. A prova da investigação de paternidade. 7ª Ed. Curitiba: Juruá, 2001. p. 256
20
SIMAS FILHO, Fernando. A prova da investigação de paternidade. 7ª ed. Curitiba: Juruá, 2001. p. 187
21
BRASIL, Código de Processo Civil. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5869.htm>
13

por Durvalina Araújo22, a forma ADN, aportuguesada, seria a forma mais adequada à Lei nº
11.105/05, sobre as “normas que regem o uso de técnicas de Engenharia Genética e liberação
no meio ambiente de organismos geneticamente modificados”.

Segundo o médico especialista em genética médica molecular Salmo


Raskin, os testes em DNA se constituem em verdadeira impressão digital genética, razão pela
qual a técnica em seus primórdios era chamada de DNA Fingerprints (impressão digital de
DNA), ficando assim evidenciado seu valor e potencial contribuição na busca jurídica pela
verdade biológica. 23

Conforme Raskin, o descobrimento dos diversos sistemas encontrados no


sangue (ABO, Rh, HLA e DNA) tem proporcionado valiosos elementos para o esclarecimento
à Medicina Legal e aos profissionais do Direito de questões fundamentais nas ações de
investigação de paternidade e maternidade24.

Ocorre que a verdade biológica, encontrada nos recursos biomédicos à


disposição da sociedade, como o exame na investigação de paternidade, cuidou de resolver os
conflitos de filiação, minimizando a necessidade de presunções nesta determinação. Por outro
lado, apesar de todo o avanço da ciência, relembra Eduardo Leite 25, cresceu muito nas últimas
décadas “o questionamento em torno da família e, especialmente, do que é a paternidade,
gerando um pai e uma família ‘incertos’”, cabendo ao Estado redefinir essas novas relações.

Segundo Fernando Simas Filho, dentre os exames científicos, os exames no


sangue são aqueles dignos de maior credibilidade, destacando o exame em DNA como o mais
especializado e aquele que determina a paternidade “sem margem de erro”, já que nesse
exame a frequência acima de 99% é mundialmente aceita como certeza científica. 26

Ao que Alberto Chamelete Neto corrobora afirmando que ao ser realizado


exame em DNA, não há dúvida nos casos de exclusão de paternidade. Admite da mesma
Acesso em 15 set. 2011.
22
ARAÚJO, Durvalina. Exame de DNA e a prova emprestada.Curitiba: Juruá, 2008. p. 28-29
23
RASKIN, Salmo. Manual prático do DNA para investigação de paternidade. Curitiba: Juruá, 1998. p. 22
24
Ibidem. p. 18
25
LEITE, Eduardo de Oliveira. Exame de DNA, ou, o limite entre o genitor e o pai. In: LEITE, Eduardo de
Oliveira (Org.) Grandes temas da atualidade - DNA como meio de prova da filiação. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 63.
26
SIMAS FILHO, Fernando. A prova na investigação de paternidade. Curitiba: Juruá, 2010. p. 137-186.
14

forma a certeza do resultado na inclusão da paternidade, pois ultrapassa o percentual de


99%.27

Em que pese o exame em DNA seja reconhecidamente “prova judicial de


alta qualidade”, é recomendação do Conselho Federal de Medicina que o mesmo deva ser
cercado de cautelas, devendo ser realizado em laboratório especializado, com profissionais
competentes, sob a direção de um médico geneticista, ou seja, com conhecimento técnico e
científico diferenciado28.

A credibilidade dos laboratórios que realizam esse exame pericial também


resta abalada visto que conforme reportagem da revista Veja, em razão da grande procura pelo
referido exame, e a relativa facilidade em se montar um laboratório (é necessário apenas a
aquisição do equipamento, e a contratação de um especialista na área de biologia molecular
para a interpretação dos resultados), além da falta de normatização rigorosa para o
funcionamento de tais estabelecimentos acaba por ser traduzida em redução dos custos e a
consequente queda na qualidade dos resultados, já que a recomendação da Sociedade
Brasileira de Medicina Legal é que o laudo seja assinado por um doutor em genética que
tenha no mínimo três anos de experiência na área não é obrigatória. 29

No entanto, em inúmeros casos a necessária atenção na realização de tal


procedimento não tem acontecido. Tais cuidados trariam maior credibilidade ao exame, pois o
mesmo não tem valor absoluto. Desta forma a prova pericial deverá ser sempre analisada em
conjunto com as demais provas30.

1.3 Reflexos sociais e jurídicos da paternidade

A paternidade, que decorre do vínculo de filiação é vinculo jurídico, que


conforme Farias e Simões, constitui uma relação de parentesco entre o ascendente e o
descendente em primeiro grau, é relação decorrente do fato da procriação. Igualmente se
encontra refletida a paternidade pelo reconhecimento social da família, e a importância da

27
CHAMELETE NETO, Alberto. Investigação de paternidade & DNA. Curitiba: Juruá, 2002. p. 77.
28
Ibidem. p. 85.
29
BARBOSA, Bia; COUTINHO, Leonardo. Quem é o pai?. VEJA. São Paulo, 1658 ed. 19/07/2000.
Disponível em:<http://veja.abril.com.br/190700/p_108.html>. Acesso em 16 set. 2011.
30
CHAMELETE NETO, Alberto. Investigação de paternidade & DNA. Curitiba: Juruá, 2002. p. 90.
15

relação familiar na constituição emocional do indivíduo.31

1.3.1 Reflexos Sociais

No dizer de Luiz Edson Fachin da construção da presunção pater is est, e da


discriminação que havia entre filhos, anteriormente classificados em legítimos e ilegítimos,
presumia-se pai aquele que é ou foi casado com a mãe do filho. 32 Neste entendimento, Fachin
aborda a presunção de paternidade na possibilidade de filiação adulterina a matre33, sendo que
a verdadeira paternidade não se limita à verdade genética ou à verdade biológica, para ele
deve ser priorizada a afetividade.

Cumpre salientar que a partir de uma visão mais ampla das verdades social e
a biológica na determinação da filiação constata-se que nenhuma delas é auto-suficiente.
Mesmo assim alerta, que essas verdades devem ser levadas em consideração, mas a verdade
jurídica deveria caminhar conjuntamente com a verdade sociológica34.

A importância em se buscar a verdadeira paternidade, buscando defini-la,


não apenas a partir do dado biológico e sim na construção cotidiana da paternidade afetiva,
fundada em uma relação significativa, tanto para o filho, quanto para o pai, terá um reflexo
positivo na relação familiar que a criança necessita para seu pleno desenvolvimento.35

Leciona Eduardo Leite, que no desenrolar histórico da paternidade humana,


em razão da evolução da ciência, a mulher se viu detentora dos meios de concepção e
contracepção, passando a ela a decisão em ter ou não um filho. Sendo assim, a mulher poderia
privar a um homem que desejasse ter um filho, e por outro lado tornar pai aquele que não o
quisesse.36

31
FARIAS, Cristiano Chaves de. Reconhecimento de Filhos e a Ação de Investigação de Paternidade. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 07.
32
FACHIN, Luiz Edson. Estabelecimento da filiação e paternidade presumida. Porto Alegre: Fabris, 1992. p.
29
33
Ibidem. p. 151
34
Ibidem. p. 150
35
FACHIN, Luiz Edson. Da paternidade: Relação Biológica e Afetiva, p. 21, 22 e 28
36
LEITE, Eduardo de Oliveira. Exame de DNA, ou, o limite entre o genitor e o pai. In: LEITE, Eduardo de
Oliveira (Org.) Grandes temas da atualidade - DNA como meio de prova da filiação. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 72
16

Neste sentido, a partir do momento em que a mulher possui esse controle e


opta por não decidir conjuntamente com seu par em ter ou não um filho; como se justificaria a
imposição da paternidade ao homem? Aqui, segundo Leite, a solução encontrada graças aos
recursos tecnológicos e biomédicos, seria restringir a figura paterna ao homem-genitor, se
exclusivamente fundada no exame de DNA. 37

O foco da crítica de Leite é que a vontade do homem em ser pai não mais é
considerada, exceto quando se trata de doação para fertilização artificial. Somente neste caso
o doador não será declarado pai pelo mero fato de transmitir sua informação genética ao filho
da mulher. Busca assim uma reflexão quanto à valorização não somente do componente
genético e sim das relações de afetividade.38

Seguindo este raciocínio, surge a dúvida sobre o que deve ser priorizado.
Assim como Leite, Fachin entende que o exame de DNA, como único fundamento do vínculo
da filiação, não seria suficiente para determinar a paternidade. O direito à filiação de que a
Constituição Federal assegura não é somente o direito ao nome e aos bens do genitor, mas
também, e com absoluta prioridade, diversos direitos descritos em seu artigo 227. Desta forma
a doutrina distingue pai de genitor e não necessariamente a origem genética acarretará
filiação39.

Para Eduardo Leite, “a questão crucial, que atormentará constantemente os


estudiosos da matéria, continua sendo a de saber se a vontade de ter um filho é suficiente, ou
o único fundamento do vínculo da filiação”, pois se assim fosse estariam excluídos da filiação
muitos dos filhos biológicos, fundado apenas na falta do desejo. Desta forma o direito do
indivíduo relativo ao nome e à sucessão estaria prejudicado, além daqueles relativos à
afetividade e outros que necessita para sua formação como pessoa. 40

Nesse sentido, afirma Leite que o legislador constituinte percebeu esse


exagero na valorização do elemento biológico, na medida em que previu a noção de
paternidade responsável. Em uma tentativa de valorizar o requisito fundamental na construção

37
Ibidem. p. 78.
38
Ibidem. p. 80.
39
FACHIN, Luiz Edson. Da paternidade: Relação Biológica e Afetiva, p. 21, 22 e 28
40
LEITE, op. cit., p. 80.
17

de uma pessoa bem estruturada, que é a presença qualitativa da figura paterna. 41

Por outro lado alerta Leite a procriação ocorrida não como fruto do desejo
do casal, dos pais, ou como projeto parental, mas como desejo unilateral, é de um “tocante
reducionismo” fugindo, de certa forma, daquela paternidade responsável, desejada pelo
constituinte, pois viola a própria essência da paternidade, tendo como fundamento o desejo de
se responsabilizar financeiramente o genitor, lembrando que a paternidade não é mero ato de
vontade, pois o homem ainda se não a quiser, não poderá ser exonerado dos deveres a ela
inerentes. 42

O posicionamento de Eduardo Leite é que o suprimento material, financeiro,


pretende suprir apenas a necessidade física, não sendo suficiente para prover a real
necessidade da sua alma, que é de se relacionar afetivamente com seus pais. Assim sendo ao
se determinar judicialmente pai aquele que se recusa a submeter-se a exame médico
necessário por presunção, não se consegue alcançar aquela real necessidade outrora
mencionada, afinal esclarece: a paternidade em verdade surge da decisão livre e pessoal de ser
pai.43

Havendo excessiva priorização do fator biológico, e a partir de ação de


investigação de paternidade impô-la às pessoas envolvidas, na verdade não soluciona o
problema, mas apenas se mantém o status quo do filho que se mantém na condição de não ter
um pai.44

Enfim destaca Leite o entendimento de que em se mantendo essa linha de


raciocínio se perde a conquista relativa às crianças, que deixaram de ser objeto, e passando a
sujeitos de direito, hoje se encontram de certa forma a retornarem ao estado de crianças-
objeto45.

41
LEITE, Eduardo de Oliveira. Exame de DNA, ou, o limite entre o genitor e o pai. In: LEITE, Eduardo de
Oliveira (Org.) Grandes temas da atualidade: DNA como meio de prova da filiação. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 80
42
Ibidem. p. 81
43
Ibidem. p. 81
44
LEITE, Eduardo de Oliveira. Exame de DNA, ou, o limite entre o genitor e o pai. In: LEITE, Eduardo de
Oliveira (Org.) Grandes temas da atualidade: DNA como meio de prova da filiação. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 82
45
Ibidem. p. 84-85
18

1.3.2 Reflexos Jurídicos

Conforme entendimento de Caio Mário, as ações de estado, especialmente


as de investigação de paternidade, são ações declaratórias, pois buscam a declaração do juiz
quanto à existência ou a inexistência de uma relação ou situação jurídica 46. Desta forma
aquele que pretender tal declaração, senão voluntária, deverá buscar a esfera judicial a fim de
resolver a lide, e assim regularizar a relação jurídica da paternidade do filho, a qual terá efeito
erga omnes.

Independente da natureza (se voluntária ou compulsória) o reconhecimento


da paternidade é sempre um ato de vontade, diferentemente dos filhos havidos na constância
do casamento, pois são reconhecidos por presunção. Ao se rejeitar o estado de filiação relativo
a um suposto filho, tem-se a paternidade recusada. 47

A questão da paternidade em geral, tanto naquela presumida, reconhecida ou


recusada, gera reflexos jurídicos nas famílias e na sociedade como um todo. As ações de
investigação de paternidade, que correm em segredo de justiça, têm ocupado aqueles que
buscam construir e repensar o conhecimento a esse respeito.48

Giorgis, por exemplo, com foco no entendimento jurisprudencial lembra que


a recusa em fornecer material era vista pelos novos juízes como confissão ficta, sendo que
apesar da não obrigatoriedade do exame, o suposto pai deveria contribuir com a busca da
verdade, realizando o exame sob pena de, por presunção, ser declarado pai.

O impacto inicial do novo exame de DNA fez com que os juízes,


inicialmente, considerassem a recusa em fornecer o material como uma
confissão de paternidade, sob o argumento de que a parte que se opõe furta-
se a um resultado desfavorável, o que equivalia a confessar de modo
implícito49

É importante lembrar que muitas vezes o filho busca não somente o pai

46
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Reconhecimento de paternidade e seus efeitos. Rio de Janeiro: Forense,
1998. p. 50
47
Ibidem. p. 61
48
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Reconhecimento de paternidade e seus efeitos. Rio de Janeiro: Forense,
1998. p. 61
49
GIORGIS, José Carlos Teixeira. A paternidade fragmentada: família, sucessões e bioética. Porto Alegre:
Livraria do Advogado Editora, 2007. p. 68
19

biológico, mas aquele que ele tem ou terá relação afetiva, sendo assim a simples declaração,
embasada na confissão ficta do suposto pai, não traz a certeza desejada pelo filho, ficando a
eterna dúvida quanto à real filiação. Da mesma forma não traz um efetivo relacionamento,
visto que aquele declarado pelo juiz como pai, será o mantenedor do filho, e contrariamente
ao seu desejo de se manter afastado daquela família, não buscará suprir aquela real
necessidade.50

A recusa na realização do exame em DNA quanto ao fornecimento de


material e suas consequências no processo de investigação de paternidade também foram
prevista no Código Civil, em seus artigos 231e 232. No artigo 231 declara ser a parte
impedida de se aproveitar da recusa em submeter-se a exame médico necessário, no caso o
fornecimento de material genético para a realização de exame de investigação de paternidade
- DNA, no artigo 232 foi prevista a possibilidade de o juiz suprir a prova pretendida em face
de tal recusa. Temos assim uma diversidade de interesses, direitos e deveres que deverão ser
objeto da análise do juiz para decidir cada caso. 51

Giorgis ressalta que “uma das questões mais recorrentes nas demandas
investigatórias é a consequência processual oriunda do comportamento da parte que se recusa
a cumprir a prova pericial ordenada”. O desenvolvimento histórico da interpretação dos juízes
em relação à recusa perpassou vários entendimentos, desde a confissão à presunção de
paternidade. Atualmente sendo considerado como indício de paternidade.52

Ainda conforme Giorgis, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul,


entende que a referida recusa deve ser considerada como “mais um elemento de prova”, que
somado aos demais indícios deverão fundamentar a decisão do juiz pela declaração ou não da
paternidade, cuidando em identificar e punir possível litigância de ma-fé.. O resultado do
exame, neste caso, não deve ser o veredito por si só, e sim parte do julgamento, na formação
do convencimento do magistrado, que é subjetivo como são as relações humanas. 53

50
Ibidem.
51
BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406 de 10/01/2002. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm> Acesso em: 20 set. 2011.

52
GIORGIS, José Carlos Teixeira. A paternidade fragmentada: família, sucessões e bioética. Porto Alegre:
Livraria do Advogado Editora, 2007. p. 68
53
Ibidem.
20

Outro ponto abordado por Giorgis é relativo à avaliação da posição dos


tribunais em relação ao pagamento dos procedimentos clínicos do exame em DNA, já que em
geral o filho (juntamente com sua mãe) não tem condições de arcar com os custos, também o
suposto pai, ou não tem condições financeiras para assumir a despesa, ou simplesmente não
quer custeá-lo, entende assim que, em se tratando da assistência judiciária gratuita, e havendo
necessidade na realização dele, o Estado deverá custeá-lo, pois nem a falta de previsão
orçamentária estatal justifica a negativa de atendimento ao bem maior a ser tutelado, qual seja
o direito à filiação.54

Desta forma é preciso lembrar que a condução coercitiva para a realização


de exame necessário, configura prova ilícita, devendo o magistrado buscar outras formas para
solucionar a lide relativa à declaração de filiação, direito personalíssimo do filho55.

Afinal “a prova ilícita é a obtida com violação das garantias constitucionais


e do direito material; e prova ilegítima é a produzida com transgressão das regras
processuais”. Desta forma , a obtenção de material genético para a realização do exame de
DNA sem o consentimento do suposto pai, se configura em prova ilícita, que segundo a teoria
do fruto da árvore envenenada, não poderia sob hipótese alguma ser admitida. 56

A respeito da importância que o exame de DNA tem refletida na


jurisprudência, destaca-se a valoração, :

Investigação de paternidade. Prova. Exame pelo método DNA. Valoração.


Peso superior sobre prova indireta. Na investigação de paternidade, a prova
científica relativa à perícia médica feita pelo método DNA, direta que é, na
medida em que seus resultados se mostrem categoricamente afirmativos, ou
excludentes da paternidade, tem ela, peso incontestável, superior ao da prova
indireta na formação do livre convencimento do julgador, mormente quando
vem completar prova indiciária.57

54
Ibidem. p. 69
55
GIORGIS, José Carlos Teixeira. A paternidade fragmentada: família, sucessões e bioética. Porto Alegre:
Livraria do Advogado Editora, 2007. p. 72)
56
GIORGIS, José Carlos Teixeira – O Direito de família e as provas ilícitas. IN: WELTER, Belmiro Pedro e
MADALENO, Rolf Hanssen - Direitos Fundamentais do Direito de Família. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2004 p. 150
57
BRASIL. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. AC. Unânime da 2ª Câmara Cível do TJMG – AC 11.223/5 –
Rel. Des. Bernardino Godinho – j. em 25/05/1994 – ementa oficial. IOB 3/10510. Disponível em:
<http://www.genomic.com.br/siteartigo/jur>. Acesso em: 16/06/11.
21

Direito civil. Recurso especial. Ação de investigação de paternidade. Exame


pericial (teste de DNA) em confronto com as demais provas produzidas.
Conversão do julgamento em diligência. Diante do grau de precisão
alcançado pelos métodos científicos de investigação de paternidade com
fulcro na análise do DNA, a valoração da prova pericial com os demais
meios de prova admitidos em direito deve observar os seguintes critérios: (a)
se o exame de DNA contradiz as demais provas produzidas, não se deve
afastar a conclusão do laudo, mas converter o julgamento em diligência, a
fim de que novo teste de DNA seja produzido, em laboratório diverso, com o
fito de assim minimizar a possibilidade de erro resultante seja da técnica em
si, seja da falibilidade humana na coleta e manuseio do material necessário
ao exame; (b) se o segundo teste de DNA corroborar a conclusão do
primeiro, devem ser afastadas as demais provas produzidas, a fim de se
acolher a direção indicada nos laudos periciais; e (c) se o segundo teste de
DNA contradiz o primeiro laudo, deve o pedido ser apreciado em atenção às
demais provas produzidas. Recurso especial provido58.

Investigação de paternidade. Exame DNA. Valoração. O exame genético


pelo DNA tornou obsoletos os demais sistemas existentes. É o auxílio
científico para a solução de um dos mais graves e subjetivos dramas do
judiciário, a investigação de paternidade. Antes eram, a apreciação subjetiva
da prova testemunhal, os arcaicos exames de sangue; hoje a certeza objetiva
científica.

Em resumo, a determinação do perfil de DNA para estabelecer a paternidade,


embora merecedora de consideração, dista muito de ser o processo infalível
que seus proponentes defendem. Em primeiro lugar, há uma aplicação
inadequada de uma metodologia destinada a finalidades científicas (onde a
incerteza é admissível) para a área jurídica (onde a dúvida deve beneficiar o
réu). Em segundo lugar, a possibilidade de falhas técnicas está sempre
presente e deve ser avaliada em todos os casos que o tribunal for examinar.
Terceiro, as bases de dados em que se baseiam as afirmações estatísticas ou
não existem ou são pouco confiáveis, e deveriam ser analisadas sempre que
esta prova for apresentada ao juiz. E mesmo os dados baseados em tais
fontes podem variar de forma acentuada, conforme a técnica de cálculo
(Regra do Produto ou Regra da Contagem). Finalmente, as probabilidades
oferecidas pelo exame são, na realidade, artifícios matemáticos
desenvolvidos para facilitar conclusões científicas, não correspondendo ao
que é difundido como verdade absoluta (BOERIA, Alfredo Gilberto. O perfil
de DNA como prova judicial – uma revisão crítica, p. 7, publicado em
Revista dos Tribunais, v. 714, p. 296).59

A fim de exemplificar, Simas Filho, apesar de reconhecer ser um exame


definitivo, não deixando espaço para dúvidas fundamentando que “O estudo de diversas
regiões repetitivas de um indivíduo, fornece um padrão genético que o caracteriza única e
exclusivamente”, não descarta a falibilidade do exame de DNA, lembrando que gêmeos
58
(REsp 397.013/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/11/2003, DJ
09/12/2003, p. 279) acesso em 14/09/11 https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?
sSeq=441565&sReg=200101874989&sData=20031209&formato=PDF
59
http://www.conteudojuridico.com.br/informativo-tribunal,informativo-631-do-stf-2011,32549.html acesso em 14/09/11
22

univitelinos têm o mesmo DNA, e além desse, outra possibilidade também pode resultar em
falso resultado em exame de DNA, é o caso de pessoas que foram submetidas a transplante de
medula óssea60. Cita para tanto Jobim:

O transplante alogênico de medula óssea, permite a troca da identidade


biológica de um indivíduo ao nível sanguíneo. Caso o paciente participe
posteriormente como réu em perícia de investigação de paternidade, poderá
ser excluído falsamente! O indivíduo transplantado passa a produzir células
sanguíneas com as características do doador a partir dos primeiros dias do
transplante. (JOBIM, L. f. – O transplante de medula óssea &
Investigação de paternidade – DNA News – n. 2 – Porto Alegre – 1998).

Nos primórdios das pesquisas sobre o DNA, foi requerido o auxílio de


geneticistas no desvendamento de crimes e ficou comprovado quão acurado tal exame pode
ser e sua contribuição em tais investigações61. Porém ainda assim pode haver dúvidas acerca
da confiabilidade do exame de DNA em razão da forma como o exame é conduzido, a
manipulação do material, a credibilidade do exame como um todo, a finalidade do exame e
não a ciência propriamente dita, visto que é notória seu grau de confiabilidade 62, de quase cem
por cento de acerto.

60
SIMAS FILHO, Fernando. A prova da investigação de paternidade. 7ª Ed.Curitiba: Juruá, 2001. p. 183-184
61
ARAÚJO, Durvalina. Exame de DNA e a prova emprestada.Curitiba: Juruá, 2008. p. 30
62
ARAÚJO, Durvalina. Exame de DNA e a prova emprestada.Curitiba: Juruá, 2008. p. 35
2 REGULAMENTAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE NO
ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

A divisão do instituto da filiação para fins acadêmicos, em sistemas


biológico, adotivo e socioafetivos, de Farias e Simões63, aponta para as previsões no
ordenamento civil brasileiro na Constituição Federal, nos artigos 226 e 227, o Código Civil
(artigos 1593, 1596 e 1597, I e II) da filiação decorrente de presunção, baseada em laços
biológicos, os artigos 1618 ao 1629 e o artigo 1626, relacionado com a filiação adotiva.

Reconhecendo a fundamental importância da regulamentação legal da ação


de investigação de paternidade no Brasil nas questões relativas à investigação da paternidade,
o capítulo pretende, ainda que de forma resumida, abordar as previsões constitucionais, do
Código Civil de 2002, além das leis específicas.

2.1 Constituição Federal

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, conforme cita


Serejo, implantou um sistema de novos princípios para avaliar as relações familiares, estando
consagrado em seu primeiro artigo, inciso III, dentre os fundamentos do Estado Democrático
de Direito, o princípio da Dignidade da Pessoa Humana, que orienta a aplicação de todos os
institutos do Direito de Família64.

O princípio da Dignidade da Pessoa Humana é reafirmado no artigo 226,


§7º da Carta Magna, na busca pela valorização do ser humano como pessoa e indivíduo, para
que as pessoas sejam respeitadas e supridas em suas necessidades. Fica evidente que o direito
que todo filho tem à paternidade também perpassa por esse princípio.

Serejo destaca em sua obra65 o enfoque da família na Constituição Federal,


sendo que, embora a palavra família reste mencionada por diversas vezes ao longo do texto
constitucional, o núcleo da previsão se encontra nos artigos 226 e 227.

63
FARIAS, Cristiano Chaves de; SIMÕES, Thiago Felipe Vargas. Reconhecimento de Filhos e a Ação de
Investigação de Paternidade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p.12
64
SEREJO, Lourival. Direito Constitucional da Família. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p.7
65
SEREJO, Lourival. Direito Constitucional da Família. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p.24/25
24

A Constituição Federal de 198866 traz no artigo 226 a consagração da


família como base da sociedade, devendo o Estado protegê-la, sendo assim, o texto
constitucional esclarece estar igualmente incluído como entidade familiar, não somente a
união formada pelo casamento, mas também aquela na união estável e naquela formada por
qualquer dos pais e seus descendentes.

Da união entre homem e mulher, podem surgir filhos, o que gera efeitos na
esfera do direito. A Constituição, em seu artigo 227, declara ser dever da família, da sociedade
e do Estado, ou seja, de todos, assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, diversos
direitos, dentre eles à vida, à saúde, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar, devendo
ser os mesmos colocados a salvo de toda forma de negligência, discriminação exploração,
violência, crueldade e opressão. O dever de proteção à criança, adolescente e ao jovem
prevista neste artigo é com absoluta prioridade, estando reforçado no parágrafo 6º que não
pode haver discriminação entre os filhos, sejam eles biológicos, adotados ou aqueles
decorrentes da socioafetividade.

Da mesma forma o direito à filiação deverá ser provido, independentemente


se derivado de presunção ou do reconhecimento. Neste sentido Diniz 67 define que o
reconhecimento é o ato pelo qual se declara a filiação havida fora do casamento, ficando
estabelecida a relação de parentesco entre os pais e o filho. Assim como Diniz, Venosa leciona
que tal reconhecimento se dá de forma voluntária ou judicial, produzindo efeitos ex tunc, ou
seja, retroagindo à data de nascimento ou até mesmo da concepção do filho68.

O legislador constituinte também se preocupou em determinar no artigo


229, a obrigação dos pais em assistir, criar e educar os filhos menores, restando assim
amparado na Carta Magna tal dever. Não pode qualquer dos pais, mediante qualquer pretexto,
se esquivar dele. Destaca neste mesmo artigo, o dever que estes filhos terão ao se tornarem
maiores, em amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.

Preocupado com os avanços da ciência o legislador enfatizou no artigo 225,


66
Constituição Federal do Brasil. 1988. Capítulo VII – Da Família, da Criança, do adolescente, do jovem e do
idoso. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em
03/10/2011
67
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro v. 5: direito de família 19a ed. rev., aum. e atual. De
acordo com o novo código civil. São Paulo: Saraiva, 2004. p.416/441.
68
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2003. p. 311.
25

parágrafo 1º, inciso II, da Constituição Federal de 1988, a necessidade de regulação da


manipulação genética no sentido da fiscalização das entidades pesquisadoras que estudam e
manipulam material genético, sendo que a norma constitucional foi posteriormente
regulamentada pela Lei nº 11.105/0569, tendo sido revogada a lei nº 8.974/95.

O artigo 3º, inciso IV da Carta Magna, prevê que o objetivo fundamental da


República é a promoção do bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação, sendo assim a socioafetividade passou a ser
considerada na formação da família, na sua proteção, e na regulação da paternidade fundada
neste importante fator formador da efetiva paternidade responsável, pois fundados na
responsabilidade e função desses pais, o afeto, respeito, carinho, cuidado, é que são
importantes conforme destacado por Farias e Simões 70, e não somente os laços de sangue.

Por outro lado, além da vasta garantia constitucional aos filhos, há da


mesma forma previsão na Lei Maior, em seu artigo 5º, incisos II, que “ninguém será obrigado
a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Sendo assim, alerta Araújo 71,
como o exame de DNA não havia sido explicitamente regulamentado como prova pericial,
necessária foi a sua regulamentação, em razão de ser questão pública. Caberia então ao juiz
passar por uma análise mais abrangente, não exclusivamente do exame propriamente dito,
mas também do restante do conjunto probatório, a fim de formar sua convicção.

direitos constitucionalmente garantidos para as duas partes, como o direito


do suposto pai à intangibilidade do corpo, sua inviolabilidade, o direito de não produzir
provas contra si mesmo, entre outros. Por outro lado, não se pode deixar de tutelar o direito do
filho à filiação, à dignidade, entre outros.

Por sua vez, para que haja a realização do exame de investigação de


paternidade, com a recusa do suposto pai, a condução forçada à realização do referido exame
é incabível, visto ser entendida como atitude que fere o princípio da dignidade humana, não
deve, portanto, encontrar guarida nos procedimentos judiciais.
69
A Lei 11.105/05 estabeleceu normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam
organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, técnicas de engenharia genética, regulando os
procedimentos de laboratórios que manipulam material genético, qualquer que seja o tipo de DNA.
70
FARIAS, Cristiano Chaves de; SIMÕES, Thiago Felipe Vargas. Reconhecimento de Filhos e a Ação de
Investigação de Paternidade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 31
71
ARAÚJO, Durvalina. Exame de DNA e a prova emprestada. Curitiba: Juruá, 2008. p. 41
26

2.2 Código Civil Brasileiro de 2002 – CC/02

Coltro menciona em seu texto, Rainer Frank, que afirma haver


internacionalmente, de forma geral, prevalência da integridade corporal, sobre a verdade
biológica, no entanto, cita jurisprudência da Corte Constitucional Federal Alemã, onde há
orientação de “que a retirada de pequena quantidade de seu sangue não significa, de modo
nenhum, atentado ao direito fundamental da integridade corporal”.

No Brasil, Coltro relembra o conflito entre “o dever moral de colaborar com


a realização da justiça, bem como o próprio interesse social, além do postulado inerente à
dignidade da pessoa humana”, e as “normas constitucionais protetivas da intimidade e da
privacidade” quando da recusa em submeter-se a exame de DNA, em ação de investigação de
paternidade, até que o Código Civil trouxe o regramento específico sobre a questão, nos
artigos 231 e 232. . 72

O CC/02 trouxe em seu artigo 231, que não poderá aproveitar-se da recusa
aquele que se nega a submeter-se a exame médico necessário, e regulamenta no artigo 232,
sobre a possibilidade de ser suprida a prova que se pretendia obter quando da recusa à perícia
médica ordenada pelo juiz. Sendo assim o legislador preocupou-se em determinar que não é
possível obrigar a quem quer que seja a submeter-se a exame médico necessário e no artigo
seguinte, oportuniza ao juiz suprir tal falta, como consequência, pois não permite o tirar
proveito da recusa. Isto porque em razão tanto do princípio constitucional do devido processo
legal (art. 5º, inciso LIV, CF/88), quanto dos direitos e garantias individuais à integridade
física e intimidade, não se pode obrigar a realização de qualquer que seja o exame sob pena de
ser declarada a nulidade por se tratar de prova ilícita. 73

Sendo assim, é direito do suposto pai se recusar a submeter-se ao exame de


DNA

72
COLTRO, Antônio Carlos Mathias. A Investigação de Paternidade , a Recusa ao DNA e os Artigos 231 e 232
do Código Civil de 2002. Revista IOB de Direito de Família. Vol. 9, n. 52, São Paulo, fev./mar. 2009. p. 34
73
COLTRO, Antônio Carlos Mathias. A Investigação de Paternidade , a Recusa ao DNA e os Artigos 231 e 232
do Código Civil de 2002. Revista IOB de Direito de Família. Vol. 9, n. 52, São Paulo, fev./mar. 2009. p.37
27

Assim, fica evidente que no caso de investigação de paternidade, o


ordenamento prevê que, em havendo necessidade de realização de exame necessário,
requerido pelo juiz para formação do seu convencimento, o mesmo seja realizado, para
confirmação ou não das alegações da parte contrária, sob pena de presunção de veracidade da
alegação feita em detrimento daquele que se recusou.

A filiação biológica, pela qual há presunção pater is est,74 segundo a qual o


marido é presumidamente o pai dos filhos gerados por sua esposa é, no Brasil, ainda
reconhecida e invocada no meio jurídico, cuidando da proteção da instituição familiar e
negando ao pai o direito que lhe cabia anteriormente de não reconhecer o vínculo de filiação
outrora chamado de “legítima”. A crítica fica para os casos em que ainda que todos os fatos
apontem determinado homem como pai de alguém, haja impedimentos ou dificuldades no
estabelecimento do vínculo, a paternidade passa a ser presumida, talvez até mesmo não real,
comprometendo a verdade real em prol da “essencial paz familiar” 75.

O uso da expressão “poderá suprir” no artigo 232, CC/02, demonstra que a


recusa na realização de exame médico necessário, é apenas auxiliar no convencimento do juiz,
devendo o mesmo se valer do conjunto fático probatório para fundamentar sua decisão.
COLTRO afirma, respaldado pelo Professor Barbosa Moreira, Francisco Amaral e René Dotti,
que não há cabimento a pretensão de que “a negativa a submeter-se ao exame possa
caracterizar confissão ficta em desfavor daquele que tenha se negado a fornecer material para
exame, por tratar-se tão somente, na espécie, do exercício do direito à intimidade e que ‘não
se assemelha a uma confissão de culpa’”76

Conforme o REsp 317.809/MG, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO


MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/05/2002, DJ 05/08/2002, p. 329,
observa-se que o laudo pericial de exame de DNA, não exclui possibilidade de erro, devendo
o mesmo ser considerado no conjunto probatório.

Ação de investigação de paternidade. [...]

74
"pater is est quem nuptiae demonstrant" fórmula segundo a qual cabe ao pai o direito de reconhecer ou não o
filho havido fora do casamento, pois há presunção da paternidade na constância do casamento.
75
FACHIN, Luiz Edson. Estabelecimento da filiação e paternidade presumida. Porto Alegre: Fabris, 1992.
p. 29
76
COLTRO, Antônio Carlos Mathias. A Investigação de Paternidade , a Recusa ao DNA e os Artigos 231 e 232
do Código Civil de 2002. Revista IOB de Direito de Família. Vol. 9, n. 52, São Paulo, fev./mar. 2009. p.40
28

1. Sem dúvida, como já decidiu esta Terceira Turma, a "independência do


juiz e a liberdade de apreciação da prova exigem que os motivos que
apoiaram a decisão sejam compatíveis com a realidade dos autos, sendo
impossível desqualificar esta ou aquela prova sem o devido lastro para
tanto. Assim, se os motivos apresentados não estão compatíveis com a
realidade dos autos há violação ao art. 131 do Código de Processo Civil".
Exempli pare, em nossos dias, "a ciência tornou acessível meios próprios,
com elevado grau de confiabilidade, para a busca da verdade real, com o que
o art. 145 do Código de Processo Civil está violado quando tais meios são
desprezados com supedâneo em compreensão equivocada da prova
científica" (REsp nº 97.148/MG, de que fui Relator para o Acórdão, DJ de
08/09/97).
2. Se o Acórdão recorrido, contudo, examina todo o conjunto probatório,
relevando a prova testemunhal, outro laudo pericial hematológico pelo
método tradicional, a ausência da alegação da exceptio plurium
concubentium, o tempo de convivência e a existência da vida em comum no
período próprio para a paternidade, não se está discutindo tema de direito
probatório, mas, sim, de reexame das provas produzidas, o que não é
possível, a teor da Súmula nº 07 da Corte.
3. O afastamento fundamentado do exame hematológico pelo método do
DNA, privilegiando o conjunto probatório amplo, devidamente
especificado, não viola os artigos 125, 131, 145, 436 e 458, II, do Código
de Processo Civil. Ao juiz é dado apreciar livremente a prova produzida,
não sendo o laudo pericial o único elemento de convicção (REsp nº
197.906/SP, da minha relatoria, DJ de 06/09/99); por outro lado, o grau
de confiabilidade do DNA não exclui a possibilidade de erro, não pela
técnica em si mesma, mas, sim, pela própria realização, em função da
falibilidade humana, não se cuidando da realização de novo exame de
confirmação.
4. Recurso especial não conhecido.77 [grifo nosso]

Da mesma forma o Código Civil regulamenta em seu artigo 1597, relativo à


presunção de concepção durante o casamento, a necessidade de se identificar os indícios de
paternidade, presumindo-a a partir do período em que possivelmente ocorreu a concepção, por
delimitação do número de dias entre uma possível relação sexual e a data do nascimento do
suposto filho, sendo assim considerada a duração mínima e máxima da gestação humana.
Assim, ainda que mitigado o reconhecimento do filho como direito do pai, que segundo seu
desejo recebia ou não o filho de sua mulher como seu, a presunção passa a ser estendida além:
de todos os filhos havidos no casamento para também aqueles concebidos antes e nascidos
após o mesmo (artigos 1597 e 1598 do Código Civil).

No Capítulo VII da Constituição Federal, que trata da família, criança, do


adolescente e do idoso, em seu art. 226 declara ser a família, a base da sociedade, tendo
77
. Acesso em 17/08/11
https://ww2.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/IMGD?seq=11474&nreg=200100431984&dt=20020805&formato=PDF
29

especial proteção do Estado, reconhece-se no § 3º, a união estável entre o homem e a mulher
como entidade familiar, para efeito da proteção do Estado devendo a lei facilitar sua
conversão em casamento; no § 4º como entidade familiar a comunidade formada por qualquer
dos pais e seus descendentes. Já no § 7º regula que, fundado nos princípios da dignidade da
pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal.

Já no art. 227. declara ser dever da família, da sociedade e do Estado


assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de
toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Conforme § 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os
mesmos direitos e qualificações, ou seja, os direitos são dos filhos, independente da relação
entre os pais. Por fim no art. 229 declara o dever dos pais em assistir, criar e educar os filhos
menores.

Consequentemente, em havendo conflitos de interesse entre os pais, ou


supostos pais da criança o juiz não deve se olvidar da absoluta prioridade conferida à criança
e adolescente, deixá-los em situação de descaso por parte daquele, ainda que suposto, pai é
afronta à Carta Magna. O fato de não constar o nome do pai em registro civil de nascimento,
pode ser fato gerador de negligencia e discriminação. Desta forma, o juiz deve levar em
consideração, não só as provas técnicas produzidas em processos judiciais, mas também a
verdade fática, sabendo que tais provas podem ser questionadas.

O princípio da igualdade entre os filhos garante a qualquer deles o direito à


filiação, sem discriminações. A diferenciação se dá na forma de reconhecimento desta
paternidade: de forma voluntária, por sentença judicial ou ainda pela presunção pater is est,
nos casos de filhos havidos na constância do casamento78.

O Código Civil Brasileiro buscou proteger as famílias em detrimento da


paternidade “real”, biológica, cabendo exclusivamente ao pai a contestação da paternidade
dos filhos de sua esposa. Nesse caso cabe ao pai, que alega, provar que não é o pai, provando

78
FACHIN, Luiz Edson. Estabelecimento da filiação e paternidade presumida. Porto Alegre: Fabris, 1992.
p. 28
30

que a presunção pater is est ainda fundamenta a paternidade. Somente sendo impossível a
concepção, como por exemplo no caso da infertilidade do homem, é que estaria mitigada a
presunção.

Fachin esclarece que a mudança no conceito de família e o crescente


interesse em se estabelecer paternidades verdadeiras, têm alterado o entendimento das
presunções aqui refletidas.

O domínio materno sobre a concepção e a contracepção, leva o homem a


muitas vezes se ver forçado a reconhecer uma pessoa como filho, sem tê-la desejado como tal.

A lei atual garante às mães o direito de apontar o pai de seu filho, no


momento de registrá-lo, devendo o poder público proceder à investigação da filiação. A
simples recusa em se submeter ao exame de DNA gera confissão ficta e presume-se pai a este
homem. No entanto, o fator biológico não deveria ser tão preponderante, pois é o vínculo
afetivo que é fundamental na determinação da paternidade, não se soluciona, assim, o
problema da paternidade, na medida que ainda cabe, em geral, às mães o poder familiar nestas
situações, nas quais se evidencia mais um desejo em ver questões financeiras solucionadas do
que realmente o interesse maior do filho, que é a de ter um pai, não somente aquele que
apenas consta em uma certidão de nascimento ou que futuramente lhe transmitirá bens por via
sucessória, mas aquele que estará com ela nas mais variadas situações de sua vida, com
efetiva afetividade.

2.3 Leis específicas – 8.560/92; 11.105/05 e 12.004/09

Legislacao referente:
 CF/88 / CPC / CC / 8560 de 29/12/92 Regula a investigação de paternidade dos filhos
havidos fora do casamento e dá outras providências.

Sendo a ação de reconhecimento de paternidade (ou de maternidade),


conforme Cruz79 uma ação de estado na qual seu legitimado buscará o reconhecimento do seu
estado de filiação, em razão de ser um direito personalíssimo, indisponível e imprescritível,
somente poderá figurar no pólo ativo o filho investigante, que se menor deverá ser

79
CRUZ, José Aparecido da. Averiguação e investigação de paternidade no direito brasileiro: teoria,
legislação, jurisprudência. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2001. p. 96/97.
31

representado por sua genitora, tutor ou outro representante legal (agindo sempre em nome do
investigante), sendo legítimo aqui o Ministério Público. No pólo passivo figura o réu, suposto
pai, podendo tal direito, conforme art. 27 da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do
adolescente),80 ser exercido contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição,
observado o segredo de Justiça. É no reconhecimento judicial que é possível ao filho obter a
declaração de seu status familiae81quando não ocorrer à presunção ou o reconhecimento
voluntário.

A importância da Lei nº 11.105/05 sobre a regulamentação da manipulação


genética está relacionada aos possíveis prejuízos advindos da má manipulação do material
genético, podendo liberar resultados equivocados, que trariam danos aos interessados.

Sendo assim, Araújo82 aponta que a Lei nº 11.105/95 e o Decreto nº 1752/95,


buscam assegurar a credibilidade e segurança dos resultados obtidos com a utilização da
Engenharia Genética, inclusive com a criação do Código de Ética de Manipulação Genética.

O entendimento sobre a Presunção de Paternidade vem se consolidando


anteriormente a 1998. O STJ diante da decisão em 1994 onde foi reconhecida a
impossibilidade de condução de réu ‘debaixo de vara’ ao laboratório, tomou a decisão de
punir o investigado interpretando a recusa como presunção de paternidade. Este entendimento
resultou na Súmula n° 301 do STJ - 18/10/2004 - DJ 22/11/2004, de onde se lê: “em
investigação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz
presunção juris tantum de paternidade”.

Em 29/07/2009 foi promulgada a Lei nº 12.004, alterando a Lei nº 8.560 de


29/12/1992, que regulava a investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento.
Esta nova Lei acresceu o artigo 2º-A estabelecendo a presunção de paternidade no caso de
recusa do suposto pai em submeter-se a exames laboratoriais de DNA, esclarecendo que todos
os meios legais serão aptos a provar a alegada verdade:

Art. 2o-A. Na ação de investigação de paternidade, todos os meios legais,


bem como os moralmente legítimos, serão hábeis para provar a verdade dos
80
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm. Acesso em 30/10/2011.
81
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro v. 5: direito de família 19a ed. rev., aum. e atual. De
acordo com o novo código civil. São Paulo: Saraiva, 2004. p.426
82
ARAÚJO, Durvalina. Exame de DNA e a prova emprestada. Curitiba: Juruá, 2008. p. 33
32

fatos.

Parágrafo único. A recusa do réu em se submeter ao exame de código


genético - DNA gerará a presunção da paternidade, a ser apreciada em
conjunto com o contexto probatório.

Contudo ainda não resolve de maneira satisfatória a questão do


reconhecimento da paternidade, já que, como dito anteriormente, não há certeza na
identificação daquele que foi declarado pai. O objetivo maior do filho, tanto em ver protegido
seu direito à dignidade, e ao nome, ficam resumidos ao registro daquele presumidamente pai
na documentação do filho, mas não resolve a lacuna da afetividade e relação paterno-filial.

Sendo assim, fica um grande questionamento quanto ao artigo 226 da


Constituição Federal, relativo à real proteção da família pelo Estado, visto que somente o
registro ou os alimentos que serão prestados enquanto o filho for incapaz, não são suficientes
para solucionar o verdadeiro problema da falta de afetividade no relacionamento familiar.

Os conflitos entre direitos de filiação e intimidade, ambos protegidos pela


Constituição Federal, tem acirrado discussões acerca da investigação de paternidade, não se
encerrando, de forma alguma, com a publicação da Lei 12.004, em razão das incertezas
oriundas desta presunção.

Ver 8069/90 – ECA artigo 27, direito personalíssimo da criança e


adolescente o direito . Maria Christina de Almeida em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_44/Artigos/Art_Maria.htm acesso em 13/09/11

Por outro lado, o avanço foi jurídico na proteção inconteste da filiação. O art. 227 da Constituição
Federal ) anunciou uma nova fase para o direito da criança e do adolescente, seguido pela Lei 7.841/89, que revogou,
(5

expressamente, o art. 358 do Código Civil o qual, por força constitucional, já se achava tacitamente revogado, pela Lei
8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), que em seus arts. 3º, 4º, 17, 20, 26 e, mais notadamente, no art. 27,
patenteou o reconhecimento do estado de filiação como direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, e ainda, a Lei
8.560/92, que concede legitimidade ao Ministério Público para averiguar a paternidade (averiguação oficiosa).
3 A OBRIGATORIEDADE NA REALIZAÇÃO DE EXAME MÉDICO
NECESSÁRIO

Fazer o bem a outros seres humanos na medida de nossa capacidade é um


dever, quer os amemos ou não, e mesmo se alguém tivesse que observar
tristemente que nossa espécie, num relacionamento mais estreito, não é
particularmente amável, isto não diminuiria a força deste dever (Immanuel
Kant)

3.1 Direitos do investigante e direitos do investigado

3.2 Recusa em submeter-se a exame necessário

3.3 Súmula 301 do STJ

Afastada a dúvida concernente à confiabilidade do exame de DNA em razão


das possíveis falhas nos procedimentos desde a coleta e armazenamento do material, diante da
possibilidade de ver esclarecida a filiação genética, mediante efetivação do exame de DNA, as
partes poderão acordar sobre a realização da mesma, também o juiz pode determinar a
produção de tal prova pericial.

No entanto pode ocorrer de uma das partes se recusar a fornecer o material


necessário que for solicitado, podendo até mesmo, não comparecer ao local no dia marcado,
impossibilitando à outra parte de ver solucionada a questão.
34

Poderia ser a parte que se recusa coagida a realizá-lo?

Conforme vimos o artigo 231 do CC/02 declara que aquele que se negar a
submeter-se a exame médico necessário não poderá aproveitar-se de sua recusa. Desta forma,
por exemplo, a parte não poderia alegar a insuficiência de provas para desconstituir as
alegações da outra parte. Segundo a súmula n° 301 do STJ - 18/10/2004 - DJ 22/11/2004, que
determina que: “em investigação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao
exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade”.

Antes da Súmula STF houve condução coercitiva de investigado em exame


em DNA83, contudo o Supremo Tribunal Federal sumulou...

Ainda assim, a parte pode se recusar a realizar o exame. Não fosse assim,
não haveria previsão da recusa no ordenamento, podendo ser até mesmo suprida, conforme
artigo 232 do CC/02.

A Carta Magna Brasileira prevê em seu artigo 5º, inciso II, que “ninguém
será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Desta forma
obrigar alguém a realizar prova, qualquer que seja, é produzir prova ilegal, não admitida no
ordenamento brasileiro.

A recusa à realização de exame de DNA não pode ser fundamento para a


condução coercitiva na realização daquele, conforme julgado do STF no HC nº 71.373-4/RS,
no voto do Ministro Marco Aurélio84:

[...] Ninguém está compelido, pela ordem jurídica, a adentrar a Justiça para
questionar a respectiva paternidade, da mesma forma que há conseqüências
para o fato de vir aquele que é apontado como pai a recusar-se ao exame que
objetive o esclarecimento da situação. É certo que compete aos cidadãos

83
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Ap. cível nº 594101032. 8Ccv. 27.10.94. Relator: Antônio
Carlos Stangler Pereira. Disponível em: http://www1.tjrs.jus.br/busca/index.jsp?
q=+594101032&tb=jurisnova&pesq=ementario&partialfields=tribunal%3ATribunal%2520de%2520Justi
%25C3%25A7a%2520do%2520RS.%28TipoDecisao%3Aac%25C3%25B3rd%25C3%25A3o|TipoDecisao
%3Amonocr%25C3%25A1tica%29.Secao%3Acivel&requiredfields=&as_q= Acesso em 28/09/2011.
84
Disponível em <http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/dh/volume%20ii/
habeas713734.htm>, acesso em 15/06/2011
35

em geral colaborar com o Judiciário, ao menos na busca da prevalência


dos respectivos interesses e que o sacrifício – na espécie, uma simples
espetadela – não é tão grande assim. Todavia, princípios constitucionais
obstaculizam a solução dada à recusa. Refiro-me, em primeiro lugar, ao da
legalidade, no que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma
coisa senão em virtude de lei. Inexiste lei reveladora de amparo à ordem
judicial atacada neste habeas corpus – no sentido de o Paciente, Réu na ação
de investigação de paternidade, ser conduzido ao laboratório para a colheita
do material indispensável ao exame. Ainda que houvesse, estaria maculada,
considerados os interesses em questão – eminentemente pessoais e a
inegável carga patrimonial – pela inconstitucionalidade. Digo isto porquanto
a Carta Política da República – que o Doutor Ulisses Guimarães, em perfeita
síntese, apontou como a "Carta Cidadã" – consigna que são invioláveis a
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas – inciso X do
rol das garantias constitucionais (art. 5º). Onde ficam a intangibilidade do
corpo humano, a dignidade da pessoa, uma vez agasalhada a esdrúxula
forma de proporcionar a uma das partes, em demanda civil, a feitura de
uma certa prova? O quadro é extravagante e em boa hora deu-se a
impetração deste habeas corpus. É irrecusável o direito do Paciente de
não ser conduzido, mediante coerção física, ao laboratório. É irrecusável
o direito do Paciente de não permitir que se lhe retire, das próprias veias,
porção de sangue, por menor que seja, para a realização do exame. A recusa
do Paciente há de ser resolvida não no campo da violência física, da
ofensa à dignidade humana, mas no plano instrumental, reservado ao
Juízo competente – ou seja, o da investigação de paternidade – a análise
cabível e a definição, sopesadas a prova coligida e a recusa do réu. Assim o é
porque a hipótese não é daquelas em que o interesse público sobrepõe-se ao
individual, como a das vacinações obrigatórias em época de epidemias, ou
mesmo o da busca da preservação da vida humana, naqueles conhecidos
casos em que convicções religiosas arraigadas acabam por conduzir à perda
da racionalidade.[...] Grifo nosso.

No mesmo sentido o Superior Tribunal de Justiça em decisão85 afirma que:

É que a diretriz jurisprudencial prevalente no Supremo Tribunal Federal (HC


71.373-RS, Plenário, DJU 22.11.96) e seguida também pelo Superior
Tribunal de Justiça é no sentido de que ninguém poderá ser constrangido a
fornecer material genético para efeito de exame do DNA, mesmo em sede de
ação de investigação de paternidade, como no caso dos autos, dependendo a
sua realização do consentimento do investigado (MC nº 4.164/SP, Rel. Min.
Ari Pargendler, DJ 13.09.2001).
Vale lembrar, no entanto, quanto à relação entre o ônus da prova e os efeitos
da recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA, que, no sistema
brasileiro, essa situação induz presunção júris tantum de paternidade, matéria
que já está sumulada nessa Corte Superior (Súmula 301).

Conforme Pereira, a ação de investigação de paternidade visa “acertar a


relação jurídica de paternidade do filho, afirmar a existência de uma condição ou estado, sem
85
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CR 000789. Relator Ministro Edson Vidigal Data da Publicação
02/03/2006 Disponível em http://www.stj.jus.br/SCON/decisoes/doc.jsp?livre=s
%FAmula+adj+301+e+coercitiva&&b=DTXT&p=true&t=&l=10&i=3. Acesso em 29/09/2011
36

constituir para o autor nenhum direito novo, nem condenar o réu a uma prestação” 86. Razão
pela qual tal ação por vezes é cominada à ação de alimentos.

Cita Pereira que a ação de investigação de paternidade

Neste sentido, em decisão do STF87, resta confirmada a não obrigatoriedade


em realizar exame em DNA, já sumulada naquela casa:

– O entendimento do Supremo Tribunal Federal é no sentido de ser ilegítimo


o uso de coação como instrumento capaz de tornar efetiva a inspetio
corporis. A resistência, no entanto, para a doutrina e jurisprudência
dominante, induz à presunção, ainda que não absoluta, de paternidade, a teor
do disposto nos artigos 231 e 232 do Código Civil, e da Súmula 301 do
Superior Tribunal de Justiça, quando a isso são somados os demais indícios
apurados.

Afirma Oliveira Filho88 que em caso de a prova pericial converter-se em


juízo único da filiação, então os métodos utilizados nos laboratórios deverão ser detidamente
avaliados, inclusive com a intervenção de assistente técnico, devendo inclusive fiscalizar o
procedimento de coleta, identificação e manuseio do material a ser utilizado. Sendo assim
como a confiabilidade do exame está diretamente ligada à qualificação da equipe do
laboratório, da metodologia empregada e do seu conceito técnico, se recomenda que o
processo seja acompanhado por assistente.

Contudo Oliveira Filho observa que nada justifica que haja impedimento na
produção de outras provas fundado na sua inutilidade frente ao exame de DNA, pois inexiste
no sistema processual brasileiro a hierarquia das provas.89

86
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Reconhecimento de paternidade e seus efeitos. Rio de Janeiro: Forense,
1998. p. 52-53.
87
AI 682172 / GO - GOIÁS
AGRAVO DE INSTRUMENTO
Relator(a):  Min. LUIZ FUX
Julgamento: 01/06/2011
Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28s
%FAmula+adj+301%29+NAO+S%2EPRES%2E&base=baseMonocraticas acesso em 05/10/2011
88
OLIVEIRA FILHO, Bertoldo Mateus de. Alimentos e investigação de paternidade. 3 ed.rev. e ampl. Belo
Horizonte: Del Rey, 1998. p. 190/191
89
OLIVEIRA FILHO, Bertoldo Mateus de. Alimentos e investigação de paternidade. 3 ed.rev. e ampl. Belo
Horizonte: Del Rey, 1998. p. 192
37
CONCLUSÃO

Após a Constituição de 1988 pudemos constatar uma revolução do direito


da família, principalmente no que concerne a proteção dos filhos no seu direito irrenunciável e
inalienável de filiação. A ciência também tem seu papel acrescido em importância na
definição biológica da paternidade. Cabe salientar que apesar da eficiente comprovação de
parentesco através de exame DNA, a de se considerar os problemas e falhas ocasionados por
laboratórios mal aparelhados e profissionais descompromissados. Para assegurar o melhor
interesse e proteção dos filhos, se faz necessário maior aprofundamento das relações sócio
afetiva da família, não se considerando apenas o exame frio realizado em um laboratório. A
obrigatoriedade na realização do exame é positiva, uma vez que a simples condição
obrigatória já denota para aqueles que se negam a realizar a condição de suposta paternidade.
A ação de investigação como ação do estado deve procurar a verdade com todas as provas
possíveis e admitidas no ordenamento legal. Também se faz necessário uma melhor
normalização do exame DNA e credenciamento de laboratórios como forma de se minimizar
possíveis falhas e resultados equivocados.
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tb : 347.94 A779p A PROVA JUDICIAL DE ADN ARRUDA, JOSE ACACIO (pg. 80 do livro anterior do Welter, sobre defesa dos direitos.)
Reler o livro da Maria Helena Diniz: Curso de Dir. Civil Brasileiro a partir da pagina 435 ate
439 PARA A APRESENTAÇÃO!!!!!!!!!!
41

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