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Beatriz Angélica Francisco Figaro

O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA

Centro Universitário Toledo


Araçatuba
2018
Beatriz Angélica Francisco Figaro

O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA

Monografia apresentada como requisito para


conclusão do curso de Direito do Centro
Universitário Toledo, sob orientação do Prof.
Ms. Paulo Roberto Cavasana Abdo.

Centro Universitário Toledo


Araçatuba
2018
Dedico este trabalho especialmente a meu pai
de coração, Sandro, que com todo amor e
carinho sempre se fez presente em minha vida
me apoiando em todos os momentos.
AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, por mais essa conquista em minha vida, por me dar
força durante toda a minha trajetória e por sempre estar ao meu lado para me ajudar a seguir
em frente nos momentos em que penso em desistir.
Agradeço a toda a minha família, principalmente minha mãe, Eliana, meu pai, Sandro
e meu namorado, Bruno, pelo apoio e toda a paciência nos momentos de tensão e estresse no
decorrer do presente trabalho e por sempre estarem ao meu lado me incentivando.
Agradeço a instituição Unitoledo, que dispõe dos melhores professores os quais
transmitem brilhantemente conhecimento, o meu orientador, Paulo Cavasana, por ter me
orientado com todo carinho e dedicação na elaboração do presente trabalho e meu
coordenador, Renato Freitas, por todo o empenho e esforço para tornar o curso de Direito do
Unitoledo um dos melhores e pela cordialidade, respeito e muito bom humor no tratamento
com os alunos.
E por fim, agradeço a todos os meus amigos que conquistei na faculdade e que sempre
estiveram comigo durante essa trajetória.
Meu muito obrigada a todos!
Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.

(Carlos Drummond de Andrade)


RESUMO

O presente trabalho visa estudar o instituto da paternidade socioafetiva e a sua importância na


manutenção das relações familiares, assim como se dá o seu reconhecimento e seus efeitos
quanto a prestação de alimentos e direitos sucessórios, consagrando o princípio da igualdade e
do melhor interesse da criança e do adolescente, além de demonstrar como a afetividade se
tornou importante no meio jurídico e foi fundamental para que o reconhecimento da
paternidade socioafetiva fosse amplamente aceito pela doutrina e jurisprudência. Para tanto,
será feita uma abordagem a respeito da origem da família brasileira e sobre os principais
princípios que a regem, utilizando-se de pesquisa doutrinária, análise da legislação e
jurisprudências no que diz respeito à paternidade socioafetiva para alcançar tais objetivos.

Palavras chaves: paternidade socioafetiva; afetividade; família.


ABSTRACT

The aim of this study is to study the socio-affective paternity institute and its importance in
the maintenance of family relations, as well as its recognition and effects on the provision of
food and inheritance rights, enshrining the principle of equality and the best interest of the
child and of the adolescent, besides showing how affectivity became important in the legal
environment and was fundamental so that the recognition of the socioafetiva paternidade was
widely accepted by the doctrine and jurisprudence. To do so, we will make an approach
regarding the origin of the Brazilian family and the main principles that govern it. Thus, in
order to achieve these objectives, we will use doctrinal research, legislation analysis and
jurisprudence regarding socio-affective paternity.

Keywords: socio-affective parenting; affectivity; family.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 9

I – A FAMÍLIA ....................................................................................................................... 10

1.1 Conceito e Origem .............................................................................................................. 10

1.2 Evolução Legislativa .......................................................................................................... 12

1.2.1 O Código Civil de 1916 ................................................................................................... 13

1.2.2 A Constituição Federal de 1988 e o Novo Código Civil de 2002 ................................... 15

1.3 Princípios do Direito de Família ......................................................................................... 17

1.3.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana ..................................................................... 18

1.3.2 Princípio da Igualdade ..................................................................................................... 19

1.3.3 Princípio da Liberdade Familiar ...................................................................................... 20

1.3.4 Princípio da Solidariedade Familiar ................................................................................ 21

1.3.5 Princípio da Afetividade .................................................................................................. 21

II – DA FILIAÇÃO ................................................................................................................ 24

2.1 Conceito .............................................................................................................................. 24

2.2 Igualdade de Filiação .......................................................................................................... 25

2.3 Prova de Filiação ................................................................................................................ 26

2.3.1 Posse de Estado de Filiação ............................................................................................. 27

2.4 Do Reconhecimento dos Filhos .......................................................................................... 29

2.4.1 Do Reconhecimento Voluntário ...................................................................................... 29

2.4.2 Do Reconhecimento Judicial ........................................................................................... 31

III – DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA ..................................................................... 33

3.1 Filiação Socioafetiva .......................................................................................................... 33

3.2 Paternidade Biológica e Paternidade Socioafetiva ............................................................. 36

3.2.1 Da Multiparentalidade ..................................................................................................... 40


3.3 Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente .............................................. 42

3.4 Da Adoção à Brasileira ....................................................................................................... 44

3.5 Do Reconhecimento da Paternidade Socioafetiva e sua Irrevogabilidade ......................... 45

3.6 Da Prestação de Alimentos e Direitos Sucessórios ............................................................ 47

3.7 Análise do Provimento nº 63 de 14 de novembro de 2017 do CNJ ................................... 52

CONCLUSÃO......................................................................................................................... 56

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 58
9

INTRODUÇÃO

A presença do afeto nas relações familiares foi o principal responsável pelas mudanças
acompanhadas na família brasileira. Diante de tal mudança e a forte presença da afetividade
nas relações familiares o Estado viu a necessidade de mudar também a legislação até então
vigente, com a finalidade de acompanhar tamanha evolução social e consagrar as relações de
afeto dando maior proteção e liberdade para a constituição de novas modalidades de família,
inclusive aquelas baseadas essencialmente por vínculos socioafetivos.
Desta forma, o marco histórico na legislação brasileira que inovou a família foi a
Constituição Federal de 1988, que consagra em seu texto vários princípios visando proteger a
família, tais como, a igualdade, a liberdade, afirmou o princípio da dignidade da pessoa
humana, entre outros. Logo após, veio o código Civil de 2002 que também proporcionou
mudanças importantes para a família brasileira estabelecendo em seu artigo 1.593 que “o
parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem” a
expressão “outra origem” deu margem para que vínculos socioafetivos também configure
parentesco civil e assim a paternidade socioafetiva ganhou espaço e maior visibilidade no
âmbito jurídico.
Tendo em vista tamanha proporção que o afeto ganhou nas relações familiares, a
paternidade socioafetiva, mesmo ausente de regulamentação específica, é amplamente aceita
pela doutrina e jurisprudência, que em respeito ao princípio da igualdade de filiação, confere
os mesmos efeitos da filiação biológica à filiação socioafetiva. Assim, a paternidade
socioafetiva gera inclusive o dever à prestação de alimentos à criança e também direitos
sucessórios. Além do respeito ao referido princípio, as decisões judiciais na qual se discutem
a paternidade, visam resguardar o melhor interesse da criança ou do adolescente, e assim, em
muitos casos a paternidade socioafetiva prevalece sobre a biológica quando presentes vínculos
afetivos entre a criança e o pai socioafetivo.
Assim, a afetividade é reconhecida pela maioria dos doutrinadores como um princípio
jurídico norteador do Direito de Família pois a paternidade socioafetiva baseada na verdade
sociológica e ligada por vínculos de afeto e amor exerce uma função social muito importante
na vida de uma criança, a função da verdadeira paternidade. Desta forma, por meio de estudo
doutrinário e análise jurisprudencial a paternidade socioafetiva será analisada no que diz
10

respeito a forma que se dá o seu reconhecimento e seus consequentes efeitos, como o da


prestação de alimentos e direitos sucessórios.
11

I - A FAMÍLIA

1.1 Conceito e Origem

O conceito de família sofreu diversas modificações seguindo a evolução da sociedade.


A Constituição Federal de 1988 foi o principal instrumento inovador do conceito de família,
trazendo em seu texto, especialmente em seu artigo 226, outras modalidades familiares, como
a união estável e a família monoparental, e não tão somente aquela reconhecida pelo vínculo
matrimonial, que por muitos anos perdurou como o único meio de constituição familiar. Neste
sentido, Rolf Madaleno (2017, p. 18) pontua:

Com a edição da Carta Política de 1988 abriu-se o leque de padrões distintos de


núcleos familiares, cujos exemplos não mais se restringiam ao casamento, surgindo
a união estável para definir e legalizar a convivência daqueles que viviam à margem
da lei e em concubinato, e a família monoparental. Auspiciado pela Constituição
Federal de 1988 o Direito de Família sofreu uma profunda reformulação e valores
constitucionais fincaram as bases de um direito de família constitucional,
sobrepondo direitos e princípios como verdadeiros vetores das relações familiares,
estruturadas na igualdade dos filhos e das pessoas e na pluralidade das famílias [...].

Importante destacar as mudanças no instituto da família trazidas pela Constituição


Federal de 1988, pois antes do século XX a família brasileira era um instituto patriarcal com a
prevalência do homem sobre a mulher, vinda essa cultura do direito grego e romano, no qual a
unidade familiar “era, então, simultaneamente, uma unidade econômica, religiosa, política e
jurisdicional” (GONÇALVES, 2018, p. 31).
“Tanto os gregos como os romanos tiveram, asicamente, duas concep es acerca da
família e do casamento: a do dever cívico e a da forma ão da prole” (LIS OA, 2013, p 25 ,
ou seja, o matrimônio e a família eram constituídos apenas em respeito a tais objetivos.
Assevera, Venosa (2018, p. 4):

Em Roma, o poder do pater exercido sobre a mulher, os filhos e os escravos é quase


absoluto. A família como grupo é essencial para a perpetuação do culto familiar. No
Direito Romano, assim como no grego, o afeto natural, embora pudesse existir, não
era o elo de ligação entre os membros da família. Nem o nascimento nem a afeição
foram fundamento da família romana.
12

Observa-se na família à época, a ausência do afeto para a sua manutenção, além disso
não estava presente a igualdade entre o homem a mulher e os filhos, o poder marital sempre
prevalecia.
O cristianismo também proporcionou muita influência para o instituto da família e o
casamento, entendendo esse ser um vínculo indissolúvel, a igreja não reconhecia a dissolução
do casamento.
Neste sentido, Lisboa (2013, p. 26):

[...] o cristianismo mostrou-se contr rio institucionali a ão do div rcio e


reali a ão de um segundo matrimônio, salvo no caso de morte de um dos cônjuges
ou da e ist ncia do adult rio E a toler ncia inicialmente conferida s uni es livres
foi su stituída pela san ão contra os concu inos Valori ou-se, desse modo, a
família constituída mediante casamento

Ou seja, o cristianismo regulava e legitimava a família por meio do casamento o qual


“esteve longe de qualquer conota ão afetiva A institui ão do casamento sagrado era um
dogma da religião dom stica” (VENOSA, 2018, p 5).
Diante das explanações acima, pode-se descrever a família antiga, ou seja, a família
que se formava antes do século XX, como “uma instituição social, composta por mais de uma
pessoa física, que se irmanam no propósito de desenvolver, entre si, a solidariedade nos
planos assistencial e da convivência ou simplesmente descendem uma da outra ou de um
tronco comum” (NADER, 2017, p 3).
No entanto, tal conceito não mais reflete as entidades familiares nos dias atuais, visto a
evolução social e consequentemente a evolução legislativa no que tange o Direito de Família
hoje se tem um novo conceito de família que resultou não só das mudanças sociais, mas
também da consagração de princípios que visam protege-la e o mais importante, se tem a
presença de laços afetivos que atualmente são indispensáveis e essenciais para a formação da
família moderna.
Desta forma:

A no ão de família foi ampliada, dei ando de ser considerada família tão somente
aquela esta elecida a partir do casamento civil A ado ão de outras entidades
familiares e dos princípios constitucionais da solidariedade social e familiar, da
igualdade entre o homem e a mulher e da isonomia entre os filhos via ili a o dever
de coopera ão m tua entre os parentes, cônjuges e conviventes, com maior alcance e
com um novo papel para cada integrante da família (LISBOA, 2013, p. 71).
No mesmo s

A entidade familiar deve ser entendida, hoje, como grupo social fundado,
essencialmente, em laços de afetividade, pois a outra conclusão não se pode chegar à
13

luz do Texto Constitucional, especialmente do artigo 1º, III, que preconiza a


dignidade da pessoa humana como princípio vetor da República Federativa do
Brasil.

Assim, a família contemporânea está ligada principalmente a vínculos afetivos, o que


consequentemente revolucionou o Direito de Família, pois o instituto sofreu diversas
alterações substanciais, inicialmente no cenário social e consequentemente no âmbito
legislativo que consagrou o afeto. Atualmente, a família é tutelada por princípios
constitucionais derivados principalmente do princípio da dignidade da pessoa humana.
Desta forma, mais adiante, serão analisados os principais princípios que regem o
Direito de Família e que são de suma importância para sua proteção e manutenção, pois para
maior compreensão de tais princípios e como foram incluídos em nosso ordenamento jurídico
é necessário fazer uma breve explanação a respeito da evolução legislativa do Direito de
Família.

1.2 Evolução Legislativa

Como já mencionado anteriormente, a família brasileira vem sofrendo diversas


alterações no âmbito social ao longo do tempo e como consequência houve muitas mudanças
na legislação do Direito de Família.
Observa-se as primeiras mudanças substanciais, aquelas provenientes da Constituição
Federal de 1988, que revogou em sua maioria o Código de 1916 no que diz respeito à família.

A onstitui ão de 1988 acolheu as transforma es sociais da família rasileira,


incluindo no seu te to tr s ei os modificativos de e trema relev ncia: a igualdade
em direitos e deveres do homem e da mulher na sociedade conjugal (art 226, 5o ,
reprodu indo o princípio da igualdade entre homens e mulheres (art 5o, I ;
igualdade a soluta dos filhos (art 227, 6o , sem importar a origem e vedando-se
qualquer forma de discrimina ão; c pluralidade dos modelos de família (art 226,
1º, 3º e 4º) [...]. (CARVALHO, 2017, p. 36-37).

“A onstitui ão rasileira inovou, reconhecendo não apenas a entidade matrimonial,


mas tam m outras duas e plicitamente (união est vel e entidade monoparental , al m de
permitir a inclusão das demais entidades implícitas” (L O, 2017, p 30).
14

Tais mudanças no cenário jurídico se fizeram necessárias para dar amparo as novas
modalidades de entidades familiares que se formavam, visto que, dispositivos anteriores
sequer previam tais modalidades, senão somente aquela derivada do matrimônio.
Conforme visto, “na evolu ão do direito de família verifica-se que, al m de ser havida
como c lula sica da sociedade, a família passou a ser tratada como centro de preserva ão do
ser humano, com a devida tutela dignidade nas rela es familiares” (MONTEIRO; SILVA,
2012, p. 25).
Além da previsão de novos modelos de entidade familiar, não se pode deixar de
destacar os princípios norteadores do Direito de Família que foram incluídos no ordenamento
jurídico, primeiramente, por meio da Constituição Federal e que também desencadearam
inovações e mudanças nas entidades familiares.
Sendo assim, com a promulgação da Constituição de 1988 que não recepcionou vários
artigos do Código Civil de 1916, a edição de um novo Código se fez necessária.

1.2.1 O Código Civil de 1916

Decretado em 1º de janeiro de 1916, o Código Civil regulava a entidade familiar com


influência da família grega e romana além de sofrer também influência do Direito Canônico.
Sendo assim, em seu texto estavam presentes fortes traços de conservadorismo, patriarcalismo
e patrimonialismo. O patrimonialismo se mostrou presente visto que “dos 290 artigos da parte
destinada ao Direito de Família, 151 tratavam de rela es patrimoniais e 139, de rela es
pessoais” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2017, p. 69).
Afirma Carlos Roberto Gonçalves (2005 apud CARVALHO 2017, p. 36):

Que a família rasileira sofreu influ ncia da família romana, na qual predominaram
as preocupa es de ordem moral; da família canônica, que considera o casamento
um sacramento, não podendo os homens dissolverem a união reali ada por Deus –
quod Deus conjun it homo non separet –, materiali ada no direito especialmente
pelas Ordena es Filipinas, de forte predomin ncia do Direito anônico .

É visível a influência do Direito Canônico, visto que em seu texto eram apenas
regulamentadas as uniões derivadas do matrimônio e sendo essas uniões indissolúveis, assim
como para a igreja, pois para ela o casamento é considerado um sacramento e não pode ser
dissolvido.
15

Os filhos não concebidos na constância do casamento eram tidos como ilegítimos e


não tinham nenhum direito referente à filiação reconhecidos. Neste sentido:

om efeito, apenas as famílias formadas a partir do casamento eram reconhecidas O


matrimônio, influenciado pelo sistema do Direito anônico, era indissol vel
Vínculos havidos fora do modelo formal estatal eram relegados margem da
sociedade, sendo que os filhos eventualmente nascidos dessas rela es eram
considerados ilegítimos e todas as refer ncias legais, nesse sentido, visivelmente
discriminat rias, com a finalidade de não reconhecimento de direitos (GAGLIANO;
PAMPLONA FILHO, 2017, p. 68).

Além da discriminação entre os filhos de acordo com a origem de sua filiação, havia
também a discriminação em relação a mulher, visto que o homem exercia predominância
sobre a mesma. A igualdade entre os cônjuges e entre os filhos não estava presente no
dispositivo ora estudado.
Sendo assim, visto que:

O digo ivil de 1916, o ra memor vel no seu tempo, não acompanhou a r pida
evolu ão e modifica ão dos costumes, especialmente na estrutura da família
patriarcal do s culo passado, na qual prevalecia a autoridade do homem, enquanto
provedor, marido e pai. A vontade do pai e marido era fundamental e determinante,
sendo imposta aos dependentes como lei. (CARVALHO, 2017 p. 35-36).

Desta forma, durante sua vigência, o dispositivo legal sofreu várias alterações em seu
texto por meio de legislações extravagantes. Tais mudanças denominadas por Gagliano;
Pamplona Filho (2017, p. 69) como:

[...] o fenômeno da descodifica ão do Direito ivil, marcado pela prolifera ão


assustadora, velocidade da lu , de estatutos e leis especiais que disciplinariam não
somente as novas e ig ncias da sociedade industriali ada, mas tam m velhas
figuras que se alteraram com o decorrer dos anos, so o influ o de novas ideias
solidaristas e humanit rias, e que não poderiam ser plena e eficazmente reguladas
por um digo ultrapassado e conservador

“ omo o servamos, o Código Civil de 1916 há muito já não retratava o panorama


atual da família, derrogado em grande parte por inúmeras leis complementares, que
dificultavam sobremaneira o estudo sistemático da mat ria” (VENOSA, 2018, p 18 “As
mudan as na família e igiram a atuali a ão do digo ivil de 1916 e das leis especiais,
inclusive com edi ão de novas normas, resultando finalmente na aprova ão do digo ivil
de 2002” ( ARVALHO, 2017, p. 37).
Como visto, após a promulgação da nova Constituição em 1988, o antigo Código Civil
teve vários de seus dispositivos não recepcionados e diante da grande quantidade de leis
16

esparsas que o modificaram, pois o mesmo não mais atendia as necessidades da família
contemporânea, um novo Código Civil com o texto adequado ao texto constitucional foi
aprovado.
1.2.2 A Constituição Federal de 1988 e o Novo Código Civil de 2002

Tendo em vista a evolução da sociedade e um Código Civil ultrapassado, incapaz de


atender aos anseios das famílias e diante de um cenário jurídico totalmente desordenado, haja
a vista a tentativa frustrada da legislação acompanhar a evolução social, criando inúmeras leis
e estatutos com a finalidade de preencher as lacunas existentes no dispositivo legal
supracitado, o projeto de um novo Código Civil foi apresentado ao Congresso Nacional.
Inicialmente, o projeto foi apresentado em 1975, ou seja, antes da promulgação da
Constituição Federal de 1988, no entanto, o projeto inicial passou por inúmeras emendas
estendendo sua tramitação por anos e anos no Congresso Nacional, até que a nova
Constituição passou a viger e o novo Código Civil ainda não havia sido aprovado.
Com a vigência da nova Constituição, que trouxe várias mudanças, não só no Direito
de Família como também no âmbito civil em geral, além de vários princípios que até então
não existiam no ordenamento jurídico brasileiro, o projeto do novo Código Civil precisou ser
reformulado passando por novas emendas que visavam deixar seu texto em consonância com
o novo texto constitucional e agregar as legislações que até então haviam sido criadas.
Assim:

omo acima visto, a tramita ão do Projeto de digo ivil teve início anteriormente
onstitui ão Federal de 1988, que introdu iu os apontados princípios
reformuladores do direito de família No entanto, em ra ão das emendas reali adas,
especialmente na fase final dessa tramita ão, perante a mara dos Deputados, o
novo digo ivil foi adequado Lei aior ( ONTEIRO; SILVA, 2012, p. 36-
37).

Desta forma, após sua a adequação o novo Código Civil foi aprovado e sancionado em
10 de janeiro de 2002, com prazo de um ano de vacatio legis, entrando em vigor em 11 de
janeiro de 2003, nos termos da Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002.
Sem dúvidas, a promulgação da Constituição de 1988 foi fundamental para a
aprovação do novo Código Civil, tendo em vista as inúmeras novidades previstas em seu
texto. Neste sentido, assevera Carlos Roberto Gonçalves (2018, p. 33-34):
17

Todas as mudanças sociais havidas na segunda metade do século passado e o


advento da Constituição Federal de 1988, com as inovações mencionadas, levaram à
aprova ão do digo ivil de 2002, com a convoca ão dos pais a uma “paternidade
respons vel” e a assun ão de uma realidade familiar concreta, onde os vínculos de
afeto se sobrepõem à verdade biológica [...] Uma vez declarada a convivência
familiar e comunitária como direito fundamental, prioriza-se a família socioafetiva,
a não discriminação de filhos, a corresponsabilidade dos pais quanto ao exercício do
poder familiar, e se reconhece o núcleo monoparental como entidade familiar.

O Código Civil de 2002, em consonância com a Constituição Federal, reformulou o


Direito de Família em toda a sua essência. A família não é mais vista como apenas aquela
constituída pelo casamento, o novo Código reconhece não só os laços matrimoniais como
também os laços afetivos reconhecendo as relações socioafetivas como entidades familiares, a
exemplo da União Estável.
Reitera o princípio da igualdade já previsto na Constituição, entre os cônjuges,
acabando com a prevalência do homem sobre a mulher, e a igualdade entre os filhos, abolindo
as figuras de filhos legítimos e ilegítimos. Todos os filhos, independentemente da sua origem
tem direito ao reconhecimento e a todos os demais direitos derivados do mesmo.
Outra mudança importante a ser citada, foi a regulamentação do instituto do divórcio,
figura inexistente no texto original do Código Civil anterior, pois com a influência do
Cristianismo o casamento era considerado um vínculo indissolúvel.
E ainda, no mesmo sentido da Constituição Federal, estabelece outras modalidades de
família, além da união estável, reconhece a entidade monoparental e qualquer outra forma de
entidade familiar, ou seja, não há mais limites no conceito de família, pois é vedada qualquer
interferência Estatal ou de terceiros na criação ou extinção das relações familiares,
reafirmando o princípio da liberdade familiar já consagrado no texto constitucional.
Reafirmando as mudanças supracitadas, Gonçalves (2018, p. 34):

O Código de 2002 [...] desde logo enfatiza a igualdade dos cônjuges (art. 1.511),
materializando a paridade no exercício da sociedade conjugal, redundando no poder
familiar, e proíbe a interferência das pessoas jurídicas de direito público na
comunhão de vida instituída pelo casamento (art. 1.513) [...] O novo diploma
amplia, ainda, o conceito de família, com a regulamentação da união estável como
entidade familiar; [...] reafirma a igualdade entre os filhos em direitos e
qualificações, como consignado na Constituição Federal; [...] regula a dissolução da
sociedade conjugal.

No mesmo sentido:

Nas Disposi es Gerais so re casamento foram eliminadas todas as refer ncias


legitimidade e clusiva da família oriunda de casamento civil, em respeito
onstitui ão da Rep lica de 1988 Não h mais na família a qualifica ão de
legítima ou ilegítima A família tanto pode ser constituída pelo casamento como pela
18

união est vel ...] O princípio da plena igualdade entre os cônjuges foi plenamente
acolhido nos efeitos pessoais e patrimoniais do casamento, inclusive no que se refere
guarda de filhos e chefia conjunta da sociedade conjugal ocorreu a
elimina ão das discrimina es e istentes entre filhos. (MONTEIRO; SILVA, 2012,
p. 37).

Diante do exposto, são flagrantes as profundas mudanças trazidas pela Constituição


Federal e pelo Código Civil de 2002 no instituto da família. Tais dispositivos legais inovaram
e modernizaram a família brasileira, privilegiando a afetividade e buscando um maior amparo
e proteção às relações socioafetivas. E finalmente, regularam princípios aplicáveis
especialmente no âmbito familiar consagrando a importância da família para o Direito
brasileiro.

1.3 Princípios do Direito de Família

O Direito de Família é um dos ramos do direito com a mais ampla proteção do Estado.
A Constituição Federal traz vários princípios protecionistas da família com o intuito de
preservar tal instituto, pois o seio familiar é essencial para a formação dos cidadãos. Neste
sentindo é importante ressaltar o artigo 226 do referido dispositivo legal, pois é neste
dispositivo que se encontra a dimensão da importância que é dada a família. O artigo 226 da
Constituição Federal traz em seu texto:

A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado [...] § 5º Os direitos e


deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela
mulher [...] § 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da
paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal,
competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício
desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou
privadas. § 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos
que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas
relações.

Com base no artigo citado acima, pode-se extrair princípios constitucionais implícitos
e explícitos que norteiam a família e que são de suma importância para a sua manutenção que
os mesmos sejam aplicados e garantidos. Desta forma:

Um dos maiores avan os ocorridos no direito rasileiro, ap s a onstitui ão de


1988, foi a consagra ão normativa dos princípios constitucionais e plícitos e
implícitos, pois sua efic cia meramente sim lica frustrava as for as sociais que
19

clamavam por sua inser ão constitucional” (L O, 2002 apud MALUF A., 2010 p.
37).

Assim, diante da evolução social, eram necessários instrumentos normativos que


regulassem as novas mudanças havidas no instituto da família e a Constituição Federal de
1988, foi o marco legislativo inovador que buscou acompanhar tais mudanças, consagrando
princípios que que tutelam e protegem as entidades familiares e suas relações.
Sendo assim, serão analisados, sucintamente, os principais princípios norteadores da
família.

1.3.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

Esse princípio é, sem dúvidas, um dos princípios mais importantes em todo


ordenamento jurídico. Tem-se tal princípio como base para todos os demais, pois assegura a
todos os seres humanos que todas as garantias e direitos fundamentais sejam resguardados a
fim de garantir uma vida digna “ A dignidade da pessoa humana o n cleo e istencial
que essencialmente comum a todas as pessoas humanas, como mem ros iguais do g nero
humano, impondo-se um dever geral de respeito, prote ão e intoca ilidade” (L O, 2017, p
53-54).
Desta forma, ensina Adriana Maluf (2010, p. 40):

omo princípio fundamental, a dignidade da pessoa humana vem colocada no pice


do ordenamento jurídico e permeia intrinsecamente o direito de família, visando
reali a ão de seus mem ros Protege o Estado a família, independentemente da sua
esp cie, visto que v rias são as modalidades de família presentes na onstitui ão
Federal, apresentando esta uma norma de inclusão para outras modalidades ainda
não previstas e pressamente Dele decorre a e ist ncia dos demais princípios na
ordem atual.

No mesmo sentido, Carvalho (2017, p. 89):

Os homens são livres e iguais em dignidade e direitos Demonstra-se, dessa forma,


que o direito de família est intrinsecamente ligado aos direitos humanos e
dignidade, o que tem resultado no reconhecimento jurídico da igualdade do homem
e da mulher, de outros modelos de constitui ão de família, e na igualdade dos filhos,
independente da origem.
20

Diante do exposto, fica evidente a importância do princípio da dignidade da pessoa


humana, não apenas no Direito de Família, mas em todos os âmbitos da vida do ser humano.
Assim, prevê a Constituição Federal, a lei maior, que a família deve ser tratada sobre a égide
da dignidade da pessoa humana.
Neste sentido, afirma Barroso, (2017 apud CALDERÓN, 2017, p. 378).

A consagração da dignidade da pessoa humana como valor central do ordenamento


jurídico e como um dos fundamentos da República brasileira (art. 1º, III, CF/1988)
foi o vetor e o ponto de virada para essa gradativa ressignificação da família [...]
fazendo com que as normas civilistas passassem a ser lidas a partir da premissa de
que a pessoa humana é o centro das preocupações do Direito, que é dotada de
dignidade e que constitui um fim em si próprio. A família passou, então, a ser
compreendida [...] como um instrumento (provavelmente o principal) para o
desenvolvimento dos indivíduos e para a realização de seus projetos existenciais
[...].

O princípio da dignidade humana está presente em todo o ordenamento jurídico, pois


se trata de um princípio indissociável do ser humano, devendo o Estado sempre buscar
garantir a todos os indivíduos que seus direitos sejam tutelados de forma a preservar a sua
dignidade, dessa forma, a família entendida como base para o desenvolvimento dos seus
membros, deve sempre ser norteada a luz do princípio da dignidade da pessoa humana.

1.3.2 Princípio da Igualdade

O princípio da igualdade ou da isonomia, previsto primordialmente no artigo 5º, inciso


I da onstitui ão Federal, o qual prev que “ todos são iguais perante a lei, sem distin ão
de qualquer nature a”, esta eleceu mudan as su stanciais na família, visto que a família na
sua origem tinha como característica o patriarcalismo, ou seja, a prevalência do homem sobre
a mulher e os filhos, atualmente nosso ordenamento jurídico não mais aceita distinções entre
homem e mulher e distinções entre os filhos.
Desta forma:

Quanto ao princípio da igualdade, previsto no art 5 , I, da F, foi elevado ao status


de direito fundamental, e operou imensa transforma ão no direito de família,
mormente no que concerne igualdade entre o homem e a mulher, entre os filhos e
entre as entidades familiares, rompendo, assim, com os fundamentos jurídicos da
família tradicional, principalmente quando se trata da legitimidade familiar.
(MALUF A.; MALUF C., 2015, p. 68).
21

O princípio da igualdade resulta em uma grande mudan a na família, “ [...] a proi i ão


da discrimina ão, não e agero di er, revolucionou o Direito de Família” (S ALQUETTE,
2014, p. 6).
Não se restringindo apenas ao artigo 5º da Constituição Federal, o princípio da
igualdade também se faz presente em outros artigos do dispositivo legal supracitado, tais
como o artigo 226, §5 o qual estabelece a igualdade entre os cônjuges, ou seja, entre o homem
e a mulher. E também se encontra previsto no artigo 227, §6, o qual prevê a igualdade entre os
filhos independentemente da origem de sua filiação e também em dispositivos do Código
Civil.
Assim, o referido princípio é um dos mais importantes no Direito de Família pois é em
respeito a ele que as filiações socioafetivas se igualam em direitos e deveres à filiação
biológica, além de consagrar uma importante conquista da mulher no âmbito familiar ao ser
garantido a ela plena igualdade em relação ao homem.

1.3.3 Princípio da Liberdade Familiar

O próprio nome é autoexplicativo, tal princípio garante a todos a liberdade de escolha


quanto à constituição e manutenção da entidade familiar sem a interferência do Estado ou de
terceiros, ou seja, cabe ao indivíduo autonomia no que diz respeito ao planejamento familiar.
Desta forma, ensina Paulo Lôbo (2017, p. 64).

O princípio da li erdade di respeito ao livre poder de escolha ou autonomia de


constitui ão, reali a ão e e tin ão de entidade familiar, sem imposi ão ou restri es
e ternas de parentes, da sociedade ou do legislador; livre aquisi ão e
administra ão do patrimônio familiar; ao livre planejamento familiar; livre
defini ão dos modelos educacionais, dos valores culturais e religiosos; livre
forma ão dos filhos, desde que respeitadas suas dignidades como pessoas humanas;
li erdade de agir, assentada no respeito integridade física, mental e moral

No mesmo sentido:

O princípio da li erdade, com nfase no art 3 , I, da F, refere-se autonomia


individual para formar, manter ou e tinguir rela es familiares, em como
possi ilidade de al ar formas novas, sem interfer ncias e ternas, assim como
estende-se livre administra ão do patrimônio familiar, ao livre planejamento
familiar, li erdade de escolha em face das prefer ncias valorativas individuais,
o servadas as limita es de ordem moral, mental ou em face da integridade física,
22

opondo-se, dessa forma, ao rigorismo do sistema anterior, substituindo-o por um


modelo mais democr tico ( ALUF A ; MALUF C., 2015, p. 69).

Ou seja, a liberdade é inerente ao indivíduo e como membro familiar ele tem o direito
de escolher livremente a respeito da formação, manutenção, planejamento ou extinção da
entidade familiar, bem como a formação de outra família se assim desejar, vedando qualquer
interferência, seja ela estatal ou de terceiros.

1.3.4 Princípio da Solidariedade Familiar

Os princípios do Direito de Família não estão previstos apenas no texto constitucional,


outros dispositivos legais, como o Código Civil e o Estatuto da Criança e do Adolescente
também tem presentes em seus textos princípios que visam proteger a família, como é o caso
do princípio da Solidariedade Familiar previsto em vários dispositivos no Código Civil, que
também é chamado por alguns autores, como Carlos Roberto Gonçalves, de princípio da
comunhão plena da vida, pois assim previsto no artigo 1 511 do digo ivil que prev : “O
casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres
dos cônjuges ”
O princípio da solidariedade é um dos princípios basilares da família. Neste sentido,
MADALENO, (2017, p. 34) assevera que:

A solidariedade é princípio e oxigênio de todas as relações familiares e afetivas,


porque esses vínculos só podem se sustentar e se desenvolver em ambiente recíproco
de compreensão e cooperação, ajudando-se mutuamente sempre que se fizer
necessário.

Rodrigo da Cunha Pereira, conceitua em seu dicionário (2017, p. 585-586):

Solidariedade como princípio jurídico norteador do Direito de Família adv m da


ideia que tradu uma rela ão de corresponsa ilidade entre pessoas unidas, inclusive
por um sentimento moral e social de apoio ao outro. Mais que moral, a solidariedade
transforma-se em dever tico de rela es humani adoras

A prestação de alimentos prevista no artigo 1.694 do Código Civil de 2002, por se


tratar de natureza assistencial, tem como fundamento o princípio da Solidariedade Familiar.
Dessa forma, tem-se a solidariedade como a cooperação entre os cônjuges para assim se
23

estabelecer uma convivência familiar saudável entre os membros da entidade familiar, sempre
prestando assistência uns aos outros de acordo com as necessidades de cada um.

1.3.5 Princípio da Afetividade

Considerado um princípio implícito no Direito de Família, a afetividade sem dúvidas


inovou o cenário familiar, pois conforme o observado, na evolução histórica da família, o
afeto tinha pouca relevância nas relações familiares. Hoje, a afetividade é fundamental no
m ito familiar e como princípio “ [...] recebeu grande impulso dos valores consagrados na
Constituição de 1988 e resultou da evolu ão da família rasileira, nas ltimas d cadas do
s culo XX, refletindo-se na doutrina jurídica e na jurisprud ncia dos tri unais ” (L O,
2017, p. 68).
Desta forma:

[...] o princípio da afetividade permeia as rela es familiares, pois se encontra


diretamente jungido ao princípio da dignidade da pessoa humana o princípio que
fundamenta o direito de família na esta ilidade das rela es socioafetivas e na
comunhão de vida Evidencia-se este princípio, mesmo não inserto diretamente no
te to constitucional, tanto na forma de composi ão do n cleo familiar quanto na
preval ncia da paternidade socioafetiva, que, hoje, muito comum entre os
doutrinadores do Direito de Família (MALUF A., 2010, p. 43).

Corrobora no mesmo sentido, Carvalho (2017, p. 90):

Assim, a família s fa sentido se um veículo que promove a dignidade de seus


mem ros, numa estrutura vinculada e mantida majoritariamente por elos afetivos
onclui-se, portanto, que o afeto familiar est vel e ostensivo o elemento essencial
de todo e qualquer n cleo familiar, conjugal ou parental, a ser valorado pelo direito
quando tratar-se de uma família de fato.

Analisando a evolução histórica e social da família brasileira, fica evidente que a


presença do afeto nas relações familiares foi o principal responsável para a mudança no
Direito de Família, pois observa-se na legislação atual e principalmente na jurisprudência uma
preocupação em tutelar as relações afetivas. A legislação sobre a adoção é um exemplo claro
de como a afetividade se faz presente no ordenamento jurídico brasileiro.
Pode-se conceituar afeto conforme o conceito trazido no dicionário de Rodrigo da
Cunha Pereira (2015 apud CALDERÓN, 2017, p. 149):
24

Afeto – Do latim affectus. [...] Espinosa diz que somos construídos por nossos afetos
e pelos laços que nos unem a outros seres. (...) Desde que a família deixou de ser,
preponderantemente, um núcleo econômico e de reprodução, e as uniões conjugais
passaram a se constituir, principalmente, em razão do amor, a família tornou-se
menos hierarquizada e menos patrimonializada. O afeto, tornou-se, então, um valor
jurídico e passou a ser o grande vetor e catalisador de toda a organização jurídica da
família. [...] tornando-se o princípio da afetividade o balizador de todas as relações
jurídicas da família.

Como pode-se notar, a família moderna tem a afetividade como pressuposto


fundamental para a sua formação e manutenção. Muitas das novas modalidades de família,
hoje, devidamente reconhecidas pelo ordenamento jurídico baseiam-se exclusivamente nos
vínculos afetivos, como exemplo das famílias socioafetivas e o instituto da adoção, visto que
nesses casos estão ausentes os vínculos biológicos.
A jurisprudência foi essencial para que a afetividade fosse reconhecida pela maioria da
doutrina como um princípio jurídico do Direito de Família. As atuais decisões no que tange as
relações socioafetivas dão muita valoração para o afeto e assim a afetividade como princípio,
cada vez mais vem ganhando força e notoriedade no mundo jurídico pois o mesmo está ligado
ao princípio fundamental da dignidade da pessoa humana.
25

II – DA FILIAÇÃO

2.1 Conceito

Conceituava-se filiação como o parentesco derivado do vínculo consanguíneo entre


genitores e filhos, ou seja, da filiação que surge a maternidade e paternidade em relação aos
filhos. No entanto, este conceito não é o mais adequado com o advento da Constituição
Federal de 1988, o qual extinguiu a exclusividade do reconhecimento da filiação ou
paternidade derivadas apenas de fatores biológicos. Assim, “podemos entender a filia ão
como a rela ão e istente entre os genitores e sua prole, independente de haver vínculo
iol gico”. (MALUF A.; MALUF C., 2015, p. 465).
A filiação trata-se de um instituto de suma importância para o Direito de Família, visto
que:

O esta elecimento da filia ão apresenta grande relev ncia na atualidade, devido s


consequ ncias jurídicas que acarreta e dos m ltiplos direitos e deveres que decorrem
do parentesco, principalmente de primeiro grau, al m da necessidade que os seres
humanos t m, so retudo de nature a psicol gica e emocional, de conhecer a
identidade de seus pais. (MALUF, A.; MALUF C., 2015, p. 466).

Dessa forma, os novos dispositivos legislativos, buscam trazer a liberdade e a


diversidade no conceito de família, não mais ficando adstrito a filiação a fatores genéticos ou
biológicos.
Neste sentido, Rolf Madaleno (2017, p. 160) pontua:

[...] Acresce possuírem a paternidade e a maternidade um significado mais profundo


do que a verdade biológica, em que o zelo, o amor filial e a natural dedicação ao
filho revelam uma verdade afetiva, um vínculo de filiação construído pelo livre-
desejo de atuar em interação entre pai, mãe e filho do coração, formando verdadeiros
laços de afeto, nem sempre presentes na filiação biológica, até porque a filiação real
não é a biológica, e sim cultural, fruto dos vínculos e das relações de sentimento
cultivados durante a convivência com a criança e o adolescente.

Atualmente, o sistema jurídico faz prevalecer as relações de afetividade em detrimento


aos laços consanguíneos, visto que para a manutenção do seio familiar é indispensável a
demonstração de afeto entre os membros familiares, sendo o afeto, um dos pilares para a
formação familiar nos dias atuais. Sendo assim, todos os filhos são considerados iguais a luz
26

do ordenamento jurídico, sendo eles ligados por vínculos biológicos ou socioafetivos, dessa
forma, consagrando o princípio da igualdade de filiação, o qual passa a ser analisado.

2.2 Igualdade de Filiação

Conforme mencionado, a Constituição Federal de 1988 gerou grandes inovações no


Direito de Família e sem dúvida uma das mais importantes foi a vedação da diferenciação
entre os filhos. A Carta Magna traz em seu artigo 227, §6: “Os filhos, havidos ou não da
relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas
quaisquer designa es discriminat rias relativas filia ão”
Corrobora no mesmo sentido o artigo 1.596 do Código Civil de 2002, que copia em
seu texto, exatamente o previsto acima.
É importante ressaltar tais dispositivos que vedam a distinção entre filhos,
independentemente de sua origem, pois nem sempre foi assim, visto que, “[...] a desigualdade
entre os filhos fato na hist ria da humanidade Desde as civili a es antigas os filhos são
discriminados” ( ARVALHO, 2017, p 535
O antigo Código Civil de 1916, trazia as figuras dos filhos legítimos e ilegítimos,
podendo apenas serem reconhecidos os filhos havidos na constância do casamento, sendo
esses os considerados legítimos. Aqueles gerados antes do casamento, poderiam ser
legitimados caso ocorresse posteriormente o matrimônio. Por outro lado, ilegítimos eram
aqueles concebidos de relações extraconjugais e relações incestuosas, não podendo esses,
jamais, serem reconhecidos.
Para esclarecer melhor as figuras dos filhos legítimos e ilegítimos, Carlos Roberto
Gonçalves (2018, p. 314) pontua:

Filhos legítimos eram os que procediam de justas núpcias. Quando não houvesse
casamento entre os genitores, denominavam-se ilegítimos e se classificavam, por sua
vez, em naturais e espúrios. Naturais, quando entre os pais não havia impedimento
para o casamento. Espúrios, quando a lei proibia a união conjugal dos pais. Estes
podiam ser adulterinos, se o impedimento resultasse do fato de um deles ou de
ambos serem casados, e incestuosos, se decorresse do parentesco próximo, como
entre pai e filha ou entre irmão e irmã.

A igualdade da filiação foi devidamente regulamentada na esfera civil com a


promulgação do Código Civil de 2002. Assim ensina, Monteiro e Silva (2012, p. 478):
27

Somente com o digo ivil de 2002 foi devidamente acatado o princípio


constitucional da absoluta isonomia entre os filhos Nenhuma qualifica ão
discriminat ria utili ada no atual diploma civil Finalmente os filhos, oriundos ou
não de casamento, são tratados de maneira igual

Dessa forma, atualmente, independentemente da origem da filiação, todos os filhos


possuem os mesmos direitos e deveres.
Paulo Nader (2015, p. 314) afirma que:

A Constituição Republicana de 1988 é um grande marco na evolução do Direito de


Família, tanto na definição das entidades familiares quanto na fixação do princípio
da isonomia entre a prole. Anteriormente, os filhos havidos fora do casamento, além
de acoimados, pejorativamente, de ilegítimos, não possuíam iguais direitos aos
concebidos no casamento, então chamados legítimos. As discriminações existentes
foram eliminadas pelo texto constitucional, art. 227, § 6º, reproduzido ipsis
verbis no art. 1.596 da Lei Civil.

No mesmo sentido, Paulo Lôbo (2017, p. 212):

O enunciado do art 1 596 do digo ivil de que os filhos de origem iol gica e
não iol gica t m os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer
discrimina es, que reprodu norma equivalente da onstitui ão Federal, , ao lado
da igualdade de direitos e obrigações dos cônjuges, e da liberdade de constituição de
entidade familiar, uma das mais importantes e radicais modificações havidas no
direito de família brasileiro, após 1988.

Certamente, pode-se afirmar que foi com o advento da Constituição Federal de 1988
que a distinção entre os filhos foi totalmente abolida, consagrando a igualdade de filiação, no
entanto, tal instrumento precisava de respaldo no âmbito civil, visto que o antigo Código Civil
não mais estava adequado ao texto constitucional. Dessa forma, visto a importância do
princípio da igualdade de filiação, o mesmo está previsto não só na Constituição Federal,
como também no Código Civil de 2002 o que traz maior segurança jurídica para a sua
aplicação, assim, o princípio da isonomia deve sempre prevalecer em relação aos filhos,
independentemente da forma que se resultou a filiação.

2.3 Prova de Filiação

O principal instrumento de prova, ou seja, aquele que reconhece e atesta a existência


de filiação, se dá pela Certidão de Registro Civil de Nascimento, a qual é regulamentado pela
lei 6.015/73. Conforme o artigo 1 603 do digo ivil “a filia ão prova­se pela certidão do
28

termo de nascimento registrada no Registro ivil” Desta forma, tal registro, considera-se
prova quase que irrefutável de filiação, visto que só poderá ser invalidado no caso de erro ou
falsidade de registro, devendo esses serem provados, conforme o artigo 1.604 que prevê:
“Ningu m pode vindicar estado contr rio ao que resulta do registro de nascimento, salvo
provando-se erro ou falsidade do registro” Neste sentido, Paulo Lôbo (2017, p. 229):

O registro produz uma presunção de filiação quase absoluta, pois apenas pode ser
invalidado se se provar que houve erro ou falsidade A declara ão do nascimento do
filho, feita pelo pai, irrevog vel Ao pai ca e apenas o direito de contestar a
paternidade, se provar, conjuntamente, que esta não se constituiu por não ter sido o
genitor biológico e não ter havido estado de filiação estável.

Considerado como meio de ser comprovar a filiação e por se tratar de ato totalmente
voluntário baseado na vontade, após o Registro, a paternidade se torna inegável e seu
reconhecimento irretratável, podendo apenas ser discutida no âmbito judicial no caso de
provas contundentes de possível erro ou falsidade.

2.3.1 Posse de Estado de Filiação

Como dito acima, a Certidão de Registro de Nascimento é o principal instrumento de


prova de paternidade, no entanto, não é o único. O próprio Código Civil prevê outras formas
para se provar a filiação, como a posse de estado de Filiação.
Vejamos o artigo 1.605 do Código Civil:

Na falta, ou defeito, do termo de nascimento, poderá provar-se a filiação por


qualquer modo admissível em direito:
I - quando houver começo de prova por escrito, proveniente dos pais, conjunta ou
separadamente;
II - quando existirem veementes presunções resultantes de fatos já certos. (BRASIL,
2002).

Tal dispositivo traz em seu inciso II, a figura da posse de estado de filiação, o qual
pode-se conceituar como um conjunto de fatos já certos que corroboram para se provar a
filiação por meio de vínculo afetivo de parentesco entre duas pessoas. Importante ressaltar
que o Enunciado 256 do CJF, do artigo 1.593 do Código Civil esta elece que “a posse do
estado de filho (parentalidade socioafetiva constitui modalidade de parentesco civil” Ou
seja, tal instituto é de suma importância para o reconhecimento da paternidade socioafetiva.
29

Embora a doutrina majoritária traga o nome de “posse de estado de filho” Welter


(1998 apud PEREIRA C., 2017, p. 46) discorda e esclarece:

que não se trata de posse de estado de filho, mas sim de “estado de filho afetivo,
cujo vínculo entre pais e filho, com o advento da Constituição Federal de 1988, não
é de posse e domínio, e sim de amor, de ternura, na busca da felicidade mútua, em
cuja convivência não há mais nenhuma hierarquia”

Independentemente da nomenclatura dada ao instituto pela doutrina o importante é


como se dá a sua caracterização, ou seja, como se prova o estado de posse de filiação e para
dessa forma se comprovar a filiação socioafetiva. Assim, a doutrina estabelece três requisitos
para que reste configurado a posse de estado de filho, sendo eles, nomen, no que diz respeito
ao nome que o pai socioafetivo confere ao filho e o mesmo usa como se fosse seu, tractatus o
qual se refere ao tratamento de pai para com a criança e a fama que consiste no
reconhecimento social da relação paterno-filial existente.
Assevera Paulo Lôbo (2017, p. 232):

A posse de estado de filia ão refere situa ão f tica na qual uma pessoa desfruta do
status de filho em relação a outra pessoa, independentemente dessa situa ão
corresponder realidade legal uma com ina ão suficiente de fatos indicando um
vínculo de parentesco entre uma pessoa e sua família que ela diz pertencer [ ...].

Dessa forma, “a posse de estado consiste no desfrute p lico, por parte de algu m,
daquela situa ão peculiar ao filho, tal o uso do nome familiar, o fato de ser tratado como filho
pelos pretensos pais, aliado persuasão geral de ser a pessoa, efetivamente, filho”.
(RODRIGUES, 2004, p. 292).

A posse do estado de filho permite, portanto, o reconhecimento da paternidade


socioafetiva ou sociol gica e o registro da filia ão, independentemente da origem
iol gica A paternidade socioafetiva um ato de op ão fundado no afeto e no amor
de quem escolhe ser pai, materiali ando-se, em uma de suas formas, na posse do
estado de filho, que nada mais do que o tratamento recíproco paterno-filial,
reconhecidos como tais pu licamente, sendo o filho socioafetivo, denominado
popularmente em algumas regi es de filho de cria ão, criado e educado pelo pai
afetivo como pr prio ( ARVALHO, 2017, p 557 .

De modo independente da filiação biológica, na posse de estado de filiação, o


comportamento de pai ou mãe para com o filho na convivência familiar, sendo tais
comportamentos contínuos e notórios constituem o estado de filho perante a sociedade, sendo
o reconhecimento da sociedade fundamental para tal prova. Assim, os fatos e atos de afeto
que devem indicar o vínculo familiar, prevalecendo a relação socioafetiva, pois nestes casos
os fatores biológicos se tornam irrelevantes.
30

2.4 Do Reconhecimento dos Filhos

Com a vedação à distinção entre os filhos havidos ou não em constância do


casamento, resultante do texto constitucional que também fez tornar-se obsoleto os termos
filhos legítimos ou ilegítimos, o reconhecimento dos filhos concebidos fora do casamento não
mais encontra obstáculos para sua efetivação.
Assevera Paulo Nader (2017, p 334 que “de acordo com a sistem tica civil, o
reconhecimento pode ser feito, espontaneamente, por um dos modos previstos no art. 1.609
ou, consoante o art. 1.606, por sentença judicial prolatada em ação de investigação de
paternidade ou de maternidade”.
Visto que os filhos concebidos na constância do casamento têm a paternidade
presumida, não necessitando de reconhecimento, tal instituto se aplica aos filhos havidos fora
da relação matrimonial. O reconhecimento se trata de ato personalíssimo, voluntário ou
compulsório o qual se reconhece um filho como sendo seu e dando a ele todos os direitos e
obrigações inerentes à condição de filho.
Desta forma, serão analisadas as formas de reconhecimento de paternidade.

2.4.1 Do Reconhecimento Voluntário

O reconhecimento de filho tem como finalidade assegurar a todos independentemente


de sua origem, o direito de possuir o nome do pai em seu registro, ou seja, ter a sua filiação
assegurada com todos os direitos decorrentes da mesma. Tal possibilidade foi resultado do
avanço e das mudanças que acompanhamos no Direito de Família, tendo em vista que no
Código Civil anterior haviam ressalvas quanto ao reconhecimento dos filhos considerados
ilegítimos.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988 que consagrou o princípio da
Igualdade de Filiação, todos, sem exceções possui o direito ao reconhecimento da
paternidade, que poderá ser feito de forma voluntária ou compulsória por meio de decisão
judicial. O reconhecimento voluntário encontra-se disposto no artigo 1.609 do Código Civil, o
qual prevê em seu texto:
31

O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito:


I - no registro do nascimento;
II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório;
III - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado;
IV - por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento
não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.
Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser
posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes. (BRASIL, 2002).

Conforme o disposto acima, a primeira forma de reconhecimento voluntário se dá por


meio do Registro de Nascimento da criança. Após o filho ser registrado, geralmente pela mãe,
visto que a maternidade é automaticamente presumida, quando registrado apenas em seu
nome, ficando ausente o nome do pai, a este caberá o reconhecimento de sua paternidade.
Paulo Nader, esclarece (2017, p. 337):

Quando a mãe reconhece o filho e fornece o nome do pai ao oficial, a este caberá
comunicar o fato ao juiz, que determinará a manifestação do suposto pai. Se este,
voluntariamente, confirma a informação, dar-se-á o reconhecimento,
chamado oficioso pela doutrina. [...] A oficialização da paternidade se faz sem
qualquer ameaça de sanção, a qual inexiste. Se negativa a resposta, esta deverá ser
respeitada. Neste caso, o juiz encaminhará ao Ministério Público os elementos
disponíveis, a fim de examinar a possibilidade de ajuizamento de ação investigatória
de paternidade.

Dessa forma, se o suposto pai admite a paternidade, o mesmo, voluntariamente, se


dirige até o cartório no qual a criança foi registrada e procede com o reconhecimento. No
entanto, se não a admitir é necessário o ajuizamento de ação de investigação de paternidade
para se apurar a mesma. Vale ressaltar, que se comprovada a paternidade na referida ação, o
reconhecimento derivado da decisão da mesma não será considerado voluntário e sim judicial.
Há também a possibilidade de reconhecimento de paternidade por meio de escritura
pública, testamento ou ainda por manifestação expressa diante do juiz, podendo ainda ser
reconhecida após a morte do filho, caso haja descendentes. Essa ressalva se faz necessária
para evitar o reconhecimento motivado apenas por interesse patrimonial, visto que a
existência de descendentes afasta a sucessão aos ascendentes.
Neste sentido, conforme Rolf Madaleno (2017, p. 194), o reconhecimento da
paternidade:

pode ser feito a qualquer tempo, mesmo antes do seu nascimento, durante a vida
deste ou até depois de sua morte, com as ressalvas do parágrafo único do artigo
1.609 do Código Civil, para o qual há restrições para efeitos sucessórios, quando
este reconhecimento de filho já falecido só ocorre para fins claramente patrimoniais,
coibindo esse reconhecimento o parágrafo único do artigo 1.609, e o parágrafo único
do artigo 26 do Estatuto da Criança e do Adolescente, salvo que o perfilhado tenha
32

deixado descendentes, porque então serão estes os seus herdeiros, pela ordem de
vocação hereditária do artigo 1.829, inciso I, do Código Civil.

Vale ressaltar que o reconhecimento é irrevogável, salvo as exceções prevista no


artigo 1.604 do Código Civil, no caso de erro ou falsidade.
Pontua, Silvio Rodrigues (2004, p 321 “ que o reconhecimento irrevog vel,
impedindo o arrependimento. E até mesmo se revogado o testamento que o contém, na parte
relativa ao reconhecimento o ato se preserva integralmente valido para o efeito de estabelecer
a filiação".
Assim, mesmo diante da revogação do instrumento de última vontade, o ato de
reconhecimento é válido e possui os efeitos da filiação, tais como:

rela ão de parentesco entre quem reconhece e quem reconhecido; e no campo


material vai criar não s rela es sucess rias recíprocas entre aquelas partes, como
também obrigações alimentícias igualmente recíprocas. Com efeito, da mesma
forma que o filho se torna herdeiro do pai, este se torna herdeiro daquele; assim
como o pai fica sujeito a prestar alimentos ao filho, pode dele exigir alimentos, se o
necessitar. (RODRIGUES, 2004, p. 320).

Há várias formas de proceder com o reconhecimento da paternidade de forma


voluntária, como visto acima, seja ele por meio do registro de nascimento, escritura pública,
testamento, ou ainda por meio de decisão judicial o qual será analisado subsequentemente.
A partir do momento que há o reconhecimento voluntário da paternidade, esse
instituto gera direitos e obrigações reciprocas entre o pai e o filho reconhecido, não podendo
simplesmente esse vínculo ser extinto por mera vontade das partes.

2.4.2 Do Reconhecimento Judicial

Tal reconhecimento se dá após decisão prolatada pelo juiz em ação de investigação de


paternidade. Por se tratar de direito personalíssimo, quem figurará o polo ativo da referida
ação será o filho, que se tratando de menor de idade será representado. Figurará no polo
passivo o suposto pai.
Pontua Carlos Roberto Gonçalves (2018, p. 348), que “o filho não reconhecido
voluntariamente pode o ter o reconhecimento judicial, for ado ou coativo, por meio da a ão
33

de investiga ão de paternidade, que a ão de estado, de natureza declaratória e


imprescritível”
Pontua Paulo Lôbo (2017, p. 261):

A senten a judicial supre a falta do reconhecimento volunt rio e ser aver ada no
registro de nascimento do filho, do mesmo modo que o ato de reconhecimento
voluntário. A aver a ão gera a presun ão da paternidade (ou da maternidade , com
todo o comple o de direitos e deveres atri uídos rela ão entre pai ou mãe e filho .

Dessa forma, o reconhecimento de paternidade judicial, produz fielmente os mesmos


efeitos do reconhecimento voluntário, que retroagirão a data de nascimento da criança,
inclusive, segundo Paulo Lôbo (2017, p. 262), “ [...] outro efeito da senten a que reconhecer a
paternidade o da fi a ão de alimentos provisionais e definitivos do reconhecido que deles
necessite”
Assim, tendo em vista a recusa em proceder com o reconhecimento da paternidade de
forma voluntária, a mesma poderá ser feita de forma compulsória proveniente de uma
sentença judicial, resultante de uma ação de investigação de paternidade se ao final do
processo a mesma restar comprovada.
34

III – PATERNIDADE SOCIOAFETIVA

3.1 Filiação Socioafetiva

A filiação socioafetiva está prevista no artigo 1 593 do digo ivil o qual prev que
“o parentesco natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”, como
se pode perceber, não está prevista explicitamente a figura da filiação socioafetiva no
dispositivo supracitado, no entanto, é consolidado pela doutrina que tal figura é abrangida
pelo termo “outra origem”, que diante de sua generalidade pode abarcar várias formas de
parentesco, inclusive aquela baseada na afetividade.
Corrobora com o exposto acima, Adriana Maluf; Carlos Maluf (2015, p. 521-522):

No que tange paternidade e maternidade socioafetivas, disp e o art 1 593 do


que “o parentesco natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra
origem” Entende-se que a e pressão “outra origem” foi utili ada de maneira
inovadora e ampla pelo digo ivil vigente, de modo a a ranger outras esp cies de
parentesco, al m do consanguíneo e do civil ou por ado ão dada a pluralidade
de forma es familiares, esse conceito passou tam m a compreender a paternidade
e a maternidade socioafetivas, cujo vínculo não adv m de la o de sangue ou de
ado ão, mas, sim, de reconhecimento social e afetivo da parentalidade

No mesmo sentido e conceituando a filiação socioafetiva, preleciona Dimas Carvalho


(2017, p. 564):

A filia ão socioafetiva em sentido amplo, agasalhada pela e pressão outra origem, ,


portanto, a filia ão não iol gica, a filia ão acolhida na afetividade, os filhos do
cora ão, que pode ocorrer mediante ado ão, por reprodu ão medicamente assistida
heter loga, na chamada ado ão rasileira e pela socioafetiva em sentido estrito,
surgida em ra ão da conviv ncia familiar e cuidados paternos

Conforme discorrido nos capítulos anteriores, o instituto da família sofreu diversas


modificações ao longo do tempo, atualmente, a família tem como lastro basilar as relações de
afeto, dessa forma com a evolução social a família deixou de ser um instituto econômico e
patriarcal, dando espaço para que sua a formação e manutenção sejam baseadas
essencialmente em vínculos de afeto e amor.
Neste sentido, pontua Rodrigo da Cunha Pereira (2014, p. 69):
35

Desde que a família dei ou de ser, preponderantemente, um n cleo econômico e de


reprodu ão, e as uni es conjugais passaram a se constituir, principalmente, em ra ão
do amor, a família tornou-se menos hierarquizada e menos patrimoniali ada O afeto
tornou-se, então, um valor jurídico e passou a ser o grande vetor e catalisador de
toda a organi a ão jurídica da família

Desta forma:

A afetividade passou a prevalecer sobre os critérios econômicos, políticos,


relogiosos, sociais, de interesse do grupo familiar, enfim, preponderou sobre os
demais fatores que influenciavam os vínculos familiares até então. O critério afetivo
que figurava como coadjuvante no período da família clássica foi alçado à
protagonista na família contemporânea, tanto para as suas relações de conjugalidade,
como para as suas relações de parentalidade. (CALDERÓN, 2017, p.157).

A afetividade que hoje se encontra nas relações familiares foi responsável por uma
grande modificação social no cenário das entidades familiares modernas e consequentemente
alteração no conceito de família. Sendo assim, com a predominância do afeto nas relações
familiares que foi dado espaço para a formação das famílias socioafetivas.
Assim:

A paternidade socioafetiva um ato de op ão fundado no afeto e no amor de quem


escolhe ser pai, materiali ando-se, em uma de suas formas, na posse do estado de
filho, que nada mais do que o tratamento recíproco paterno-filial, reconhecidos
como tais publicamente, sendo o filho socioafetivo, denominado popularmente em
algumas regi es de filho de cria ão, criado e educado pelo pai afetivo como pr prio
(CARVALHO, 2017, p. 557).

Importante ressaltar que é por meio do “estado de posse de filho”, que constitui como
o principal meio de prova para o estabelecimento da filiação socioafetiva, conforme já
estudado anteriormente.
Consagrando o princípio da afetividade, a consanguinidade não é mais fator exclusivo
para o estabelecimento da filiação, e em muitos casos, a filiação socioafetiva prevalece sobre
a filiação biológica, pois atualmente se busca uma verdade real em relação a paternidade, pois
é inequívoco que a paternidade é mais do que um vínculo de sangue, tendo em vista que a
criança ou adolescente necessita da figura de um pai presente que esteja disposto a prestar
cuidados, educá-lo e o mais importante, esteja disposto a ama-lo.
Neste sentido, Carvalho (2017, p. 566):

A filia ão real, ou verdadeira, dei a de ser iol gica e passa a ser cultural,
revelando-se numa verdade afetiva construída numa rela ão paterno filial
consolidada nos la os de afeto, que muitas das ve es não e iste na filia ão
iol gica Sustenta-se no desejo de ser pai ou de ser mãe, de conce er um filho no
cora ão, fruto dos sentimentos cultivados durante a conviv ncia e esta elecendo
espontaneamente os vínculos paterno-filial.
36

Desse modo, o afeto é indispensável quando o assunto é paternidade. Não se pode


considerar pai somente aquele que dispõe de seu material genético e consequentemente
contribui na geração de uma vida. A paternidade vai muito além disso, possuindo uma função
social muito importante e essencial na vida de um filho.
Afirma Rolf Madaleno (2017, p. 160):

A filiação consanguínea deve coexistir com o vínculo afetivo, pois com ele se
completa a relação parental. Não há como aceitar uma relação de filiação apenas
biológica sem ser afetiva, externada quando o filho é acolhido pelos pais que
assumem plenamente suas funções inerentes ao poder familiar.

Assim:

Fa er coincidir a filia ão necessariamente com a origem gen tica transformar


aquela, de fato cultural e social em determinismo iol gico, o que não contempla
suas dimens es e istenciais A origem iol gica era indispens vel família
patriarcal e exclusivamente matrimonial, para cumprir suas fun es tradicionais e
para separar os filhos legítimos dos filhos ilegítimos A família atual tecida na
comple idade das rela es afetivas, que o ser humano constr i entre a li erdade e a
responsabilidade. (LÔBO, 2017, p. 26).

Tendo em vista que é da natureza do ser humano a necessidade de relações afetivas e


quando se trata de uma criança ou adolescente essa necessidade se intensifica, visto sua
vulnerabilidade, a ausência do afeto materno ou paterno pode causar graves danos emocionais
a esta criança ou adolescente. Assim, em busca de resguardar seus interesses é essencial
considerar a verdadeira filiação com base nos laços de afeto que a criança já estabeleceu com
seu pai socioafetivo.
Neste sentido, a seguinte decisão:

Agravo inominado na apelação cível. Cancelamento de registro de


nascimento. Paternidade sócio-afetiva que se sobrepõe à biológica. Nova
exegese. Direito Civil Constitucional. [...] desconsiderar o vínculo sócio-
afetivo enraizado entre o pai que costa do registro e a adolescente em prol apenas de
uma mera vinculação genética, é ignorar a nova exegese do Direito de Família
brasileiro, que busca pautar-se, entre outros valores,
no princípio da paternidade responsável em prestígio ao valor absoluto da dignidade
da pessoa humana. Negado provimento ao recurso. (Apelação nº
01179871620048190001, Relator: Jose Carlos Paes. Rio de Janeiro/RJ Data de
Julgamento: 19/11/2008).

O trecho da referida decisão, traz à tona o verdadeiro significado da paternidade


socioafetiva e o tamanho de sua importância no âmbito familiar e na manutenção do interesse
da criança e do adolescente e consequente respeito ao princípio da dignidade humana. Quando
37

a verdade biológica conflita com a verdade socioafetiva, essa deve prevalecer, pois é na
vontade e no comportamento de ser pai, que a paternidade se erradia em sua verdadeira
essência e se demonstra nos atos de cuidado, afeto, carinho e atenção e não em fatores
genéticos.

3.2 Paternidade Biológica e Paternidade Socioafetiva

Devido à grande importância que vem sendo dada a afetividade nas relações
familiares, não é incomum casos em que quando há conflito entre a paternidade biológica e a
paternidade socioafetiva, e a última prevaleça em detrimento da primeira, como exemplo, em
casos que o pai registra a criança achando ser o pai biológico e durante a convivência familiar
criam fortes vínculos afetivos e logo depois é descoberto que o mesmo não é o verdadeiro pai
da criança. Se nessa situação restar comprovada a filiação socioafetiva, a mesma prevalece
sobre a verdade biológica não sendo possível a revogação da paternidade.
Diante de tudo já estudado no presente trabalho até o momento, tal prevalência parece
ser coerente, no entanto é importante destacar que a mesma não se trata de uma regra pois se
deve analisar o caso concreto e sempre buscar soluções que respeitam e preservam o melhor
interesse da criança ou adolescente e a dignidade da pessoa humana, assim, “não e iste
posicionamento uniforme na jurisprud ncia so re a paternidade socioafetiva, nem nos parece
que possa vir a existir, em face das variantes de cada situa ão concreta” (MONTEIRO;
SILVA, 2012, p. 465).
Sendo o afeto um pressuposto fundamental para um ambiente de convivência familiar
saudável, muitas vezes é necessário preservar a paternidade socioafetiva de quem cria um
filho sabendo não ser seu, mas como filho o tem, pois não são raras as situações em que
mesmo havendo ligação biológica entre o genitor e a criança, não há vontade de ser ter uma
ligação de afeto, pois o genitor não quer ter como função a paternidade.
Neste sentido, afirma Álvaro Azevedo (2013, p. 240-241):

[...] Alerta, ainda, que o equívoco, “a prop sito da investiga ão de paternidade, est ,
pois, em não se distinguir que posso o rigar algu m a responder patrimonialmente
pela sua conduta [...] –, mas não posso o rigar, quem quer que seja, a assumir uma
paternidade que não deseja Simplesmente porque impossível fa -lo, sem
violentar, não tanto a pessoa, mas a pr pria ideia de paternidade Tem tanto esta de
autodoa ão, de gratuidade, de engajamento íntimo, que não susceptível de
38

imposi ão coativa Pai e mãe, ou se por decisão pessoal e livre, ou simplesmente


não se .

O autor ora citado, critica o entendimento de que a ação de investigação de


paternidade possa impor a paternidade a alguém que a recusa veementemente e que não tem
intenção nem interesse ao reconhecimento da criança, ou seja, quem não quer ser pai e nem
cumprir essa função. Tal crítica tem como fundamento que não seria saudável para uma
criança ter um pai imposto por uma sentença judicial na qual obrigou o seu reconhecimento,
pois certamente este pai, diante de uma imposição, não cumprirá sua função como deveria.
Por certo que o ponto de vista do autor não está totalmente equivocado, pois realmente
há muitos e muitos casos em que a paternidade é reconhecida e a função de pai não é
cumprida, e dessa forma caracterizando o abandono afetivo, que ocorre quando o pai ou a mãe
deixa de prestar os devidos cuidados aos filhos, não prestando um amparo emocional que
qualquer pessoa espera das figuras pai e mãe.
No entanto, não se pode concordar com essa visão do autor, que de certa forma exime
a responsabilidade da paternidade daquele que não a quer. Entende-se que:

o cuidado fundamental para a forma ão do menor e do adolescente; ganha o


de ate contornos mais t cnicos, pois não se discute mais a mensura ão do intangível
– amor – mas, sim, a verifica ão do cumprimento, descumprimento, ou parcial
cumprimento, de uma o riga ão legal: cuidar Aqui não se fala ou se discute o amar
e, sim, a imposi ão iol gica e legal de cuidar, que dever jurídico, corol rio da
liberdade das pessoas de gerarem ou adotarem filhos. Em suma, amar faculdade,
cuidar dever (STJ, 3a Turma, REsp 1 159 242 SP, Rel in. Nancy Andrighi, j.
24-4-2012 apud CARVALHO, 2017, p. 561-562).

Certamente que a imposição da paternidade não fará daquele que não deseja, ser pai,
no entanto, quando a pessoa assume o risco de gerar um filho, independentemente de ser esta
a sua vontade, a partir daí, nasce o dever de cuidado para com a criança que foi gerada.
Querendo ou não, a função de pai deve ser cumprida, mesmo que ausente o afeto.
Mesmo com o reconhecimento da paternidade socioafetiva daquele que já possui em
seu registro o pai biológico, não afasta do último seus deveres e obrigações derivados da
paternidade. Assim, “a paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro p lico, não
impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica,
com todas as suas consequências patrimoniais e e trapatrimoniais” (FUX, 2016, p 5).
Para melhor entendimento, ao se tratar do conflito entre paternidade biológica e
paternidade socioafetiva, devemos separar tais conflitos em duas perspectivas. Sendo a
primeira quando há o conflito em relação a verdade biológica com a verdade sociológica,
39

neste caso o pai descobre não ter vínculo biológico com a criança, porém há o vínculo
socioafetivo e devendo esse prevalecer.
Neste sentido:

A necessidade de manter a esta ilidade da família, que cumpre a sua fun ão social,
fa com que se atri ua um papel secund rio verdade iol gica Revela a
const ncia social da rela ão entre pais e filhos, caracteri ando uma paternidade que
e iste não pelo simples fato iol gico ou por for a de presun ão legal, mas em
decorr ncia de uma conviv ncia afetiva . (DIAS, 2009 apud AZEVEDO, 2013, p.
242).

Dessa forma, ainda que não há a presença dos fatores biológicos, a socioafetividade
continua a produzir os efeitos da paternidade. E nesse caso, embora alegado vício de vontade
no momento em que registrou a criança pois acreditava que a criança era seu filho biológico e
assim tenha sido enganado pela mãe da criança, em busca de preservar o interesse do menor
que já criou vínculo afetivo com aquele que acreditava ser seu pai, não é possível a destituição
da paternidade por meio de ação negatória de paternidade nesse caso, pois a verdade
socioafetiva prevalece sobre a biológica.
Assim:

Não asta, portanto, na a ão negat ria de paternidade, diante do novo conceito de


filia ão p s- onstitui ão de 1988, comprovar apenas a aus ncia do vínculo
iol gico, restando necess ria a presen a de tr s requisitos:
1 – aus ncia de vínculo iol gico;
2 – que o pai foi indu ido em erro, pois se tinha ci ncia que o filho não era
iologicamente seu o reconhecimento irrevog vel;
3 – ine ist ncia de paternidade socioafetiva consolidada, pois esta prevalece sobre a
iol gica ( ARVALHO, 2017, p. 627).

Desse modo, além das exceções previstas no Código Civil o qual permite a revogação
da paternidade se comprovado erro ou fraude, há também a necessidade de se comprovar que
não há nenhum vínculo afetivo entre o pai e a criança. Assim, vejamos a seguinte decisão:

Direito Civil e Processual Civil. Ação negatória de paternidade. Anulação de


registro. DNA. Ausência de vínculo genético. Vício de consentimento não
configurado. Paternidade socioafetiva caracterizada. 1. Se o autor não comprova
a ocorrência de vício de consentimento, quando do registro de nascimento da Ré,
tampouco a ausência de vínculo afetivo entre as partes, os pedidos de negação de
paternidade e de anulação do registro civil do menor não devem ser acolhidos,
devendo ser preservado o estado de filiação, em razão dos princípios da dignidade
da pessoa humana e do melhor interesse da criança. 2. [...] Apelo não provido.
Sentença mantida. Unânime. (TJ-DF 20151010085510 - Segredo de Justiça
0008438-91.2015.8.07.0010, Relator: Romeu Gonzaga Neiva, julgamento em:
08/03/2017)
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Em busca de resguardar os interesses da criança ou do adolescente, se no decorrer da


ação negatória de paternidade restar comprovada a presença de laços afetivos entre o menor e
o autor da ação, a mesma não prosperará, tendo em vista que filiação foi configurada por meio
da posse de estado de filho e a verdade real da paternidade se comprova também por vínculos
socioafetivos e assim prevalecendo sobre a verdade biológica.
Importante ressaltar que o filho pode impugnar o reconhecimento da paternidade em
relação ao pai socioafetivo no prazo prescricional de quatro anos após completar 18 anos ou
ap s a sua emancipa ão, conforme previsto no artigo 1 614 do digo ivil, que prev : “o
filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento, e o menor pode impugnar o
reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação.
A segunda perspectiva em relação ao referido conflito se encontra quando não há
confusão em relação a verdade biológica e socioafetiva. O pai socioafetivo sabe da ausência
de vínculo biológico com o menor e mesmo assim o reconhece como filho. Desta forma, se a
criança já tem em seu registro de nascimento sua filiação socioafetiva e nesse caso, se
posteriormente houver a inclusão do pai biológico não há o que se falar em prevalência de
uma paternidade em relação a outra, visto que conforme entendimento recente do STF, fixado
no julgamento do RE 898.060/SC, já citado acima, prevê a possibilidade de concomitância da
filiação biológica e socioafetiva no registro da criança, nascendo assim o instituto da família
multiparental.
No referido julgamento, o ministro relator Luiz Fux, ao proferir seu voto assevera
brilhantemente:

Não cabe a lei agir como o Rei Salomão, na conhecida história em que propôs
dividir a criança ao meio pela impossibilidade de reconhecer a parentalidade entre
ela e duas pessoas ao mesmo tempo. Da mesma forma, em tempos atuais, descabe
pretender decidir entre a filiação afetiva e a biológica, quando o melhor interesse do
descendente é o reconhecimento, por exemplo, jurídico de ambos os vínculos. Do
contrário, estar-se-ia transformando o ser humano em mero instrumento dos
esquemas condenados pelos legisladores. É o direito que deve servir a pessoa, e não
a pessoa que deve servir o direito. (STF. RE 898.060/SC. Relator Ministro Luiz Fux.
Julgado em 22.09.2016.).

Neste sentido, ensina Carlos Ro erto Gon alves, “que a paternidade socioafetiva,
mantida como pai registral, não afasta os direitos decorrentes da paternidade biológica, sob
pena de violar o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana” (2017, p 521
Ou seja, ainda que o primeiro registro tenha sido feito pelo pai socioafetivo, o
biológico não tem o seu direito de reconhecimento da paternidade afastado e assim poderá
constar seu nome no registro do filho juntamente com o nome do pai socioafetivo, pois neste
41

caso não há o que se falar em prevalência, para assim, atender o melhor interesse da criança
ou adolescente.

3.2.1 Da Multiparentalidade

Entende-se como multiparentalidade a possibilidade de alguém ter em seu registro de


nascimento a presença de duas ou mais mães ou dois ou mais pais no campo reservado para a
filia ão Segundo arlos Ro erto Gon alves (2018, p 305 “a multiparentalidade, pois,
consiste no fato de o filho possuir dois pais ou mães reconhecidos pelo direito, o biológico e o
socioafetivo, em função da valori a ão da filia ão socioafetiva”
Visto a ausência de legislação que regulamentasse a multiparentalidade no âmbito
civil, vários casos chegaram ao poder judiciário em busca de soluções e respostas quanto a
essa possibilidade. Tendo em vista as relações baseadas em vínculos afetivos com quem já
possui vínculo biológico com outra pessoa, restava a dúvida sobre a possibilidade de
reconhecer a paternidade socioafetiva e depois o reconhecimento da paternidade biológica ou
vice e versa e se uma excluiria a outra.
Desta forma, o STF admitiu a possibilidade da multiparentalidade no julgamento do
RE 898.060/SC, derivado de um processo em que se discutia o reconhecimento da
paternidade biológica de uma moça, com 18 na época, que descobriu que seu pai registral, o
qual matinha relação paterno-filial não era seu pai biológico, assim a mesma decidiu
promover uma ação de reconhecimento de paternidade em face de seu pai biológico. Mesmo
atestado o vínculo genético por meio de exame de DNA, o pai biológico, em sua defesa,
contestou a possibilidade do reconhecimento de paternidade tendo em vista que a moça já
possuía um pai socioafetivo o qual sempre a teve como filha e ela o teve como figura paterna.
Em sede de Recurso Extraordinário, tendo em vista que a autora da ação ganhou nas
instâncias inferiores e teve o direito ao reconhecimento da paternidade biológica e todos os
seus efeitos reconhecidos, o recorrente alegou que não poderia ser desconstituída a
paternidade socioafetiva para proceder com o reconhecimento da paternidade biológica, efeito
da decisão anterior. O STF negou provimento ao recurso.
Assim, o Ministro e relator Luiz Fux (2016, p. 19) votou da seguinte maneira:
42

Ex positis, nego provimento ao Recurso Extraordinário e proponho a fixação da


seguinte tese para aplica ão a casos semelhantes: “A paternidade socioafetiva,
declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de
filiação concomitante baseado na origem biológica, com todas as suas
consequ ncias patrimoniais e e trapatrimoniais”

Fixando-se a seguinte tese ao final do julgamento:


Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, fixou tese nos
seguintes termos: "A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público,
não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na
origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios", vencidos, em parte, os
Ministros Dias Toffoli e Marco Aurélio. Ausente, justificadamente, o Ministro
Roberto Barroso, participando do encontro de juízes de Supremas Cortes,
denominado Global Constitutionalism Seminar, na Universidade de Yale, nos
Estados Unidos. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. (Recurso
Extraordinário 898.060/SC, Plenário, Relator: Min. Luiz Fux. Julgamento em:
22/09/2016).

Foi nesse julgamento supracitado que restou consolidada a multiparentalidade no qual


reconheceu a paternidade biológica e todos os seus efeitos e permitiu a concomitância com a
paternidade socioafetiva, e assim, o reconhecimento da paternidade biológica não afasta a
socioafetiva. Nesse sentido, afirma Calderón (2017, p. 224):

[...] aspecto que merece destaque se refere ao reconhecimento da presença, no


cenário brasileiro, de ambas as paternidades, socioafetiva e biológica, em condições
de igualdade jurídica. Ou seja, ambas as modalidades de vínculo parental foram
reconhecidas com o mesmo status, sem qualquer hierarquia apriorística (em
abstrato). Essa equiparação é importante e se constitui em um grande avanço para o
Direito de Família. A partir disso, não resta possível afirmar, aprioristicamente, que
uma modalidade prevalece sobre a outra, de modo que apenas o caso concreto
apontará a melhor solução para a situação fática em análise.

Dessa forma, essa decisão do STF prevê a igualdade entre a paternidade socioafetiva e
biológica, deixando de existir qualquer hierarquia entre ambas, e possivelmente trará
uniformização de futuras decisões em relação a esse assunto que por muito tempo foi questão
de debate e decisões divergentes.
Embora considerada para alguns autores um avanço no Direito de Família, como para
Ricardo Calderón, a multiparentalidade ainda causa debate na doutrina e há aqueles autores
que defendem que a multiparentalidade só deve ser aplicada em casos excepcionais, pois a
mesma pode gerar questões futuras a serem resolvidas.
Neste Sentido, Gonçalves (2018, p. 306) afirma que:

[...] vários são os problemas que podem ocorrer com a multiparentalidade, tais
como: quem irá autorizar a emancipação e o casamento de filhos menores; quem
aprovará o pacto antenupcial do menor; quem representará os absolutamente
incapazes e quem assistirá os relativamente; quem irá exercer o usufruto dos pais
com relação aos bens dos filhos enquanto menores; quando os filhos menores serão
43

postos em tutela; como será dividida a pensão alimentícia entre os vários pais e se o
filho é obrigado a pagar a todos eles; como será feita a suspensão do poder familiar;
quem dos vários pais será, também, responsável pela reparação civil prevista no art.
932 do Código Civil; como será contada a prescrição entre pais e filhos e seus
ascendentes; e a quem será atribuída a curadoria do ausente.

Também em tom de crítica quanto a multiparentalidade, Madaleno (2018, p. 500):

Em realidade, a multiparentalidade quando refoge de suas clássicas hipóteses, não


amplia o conceito de família, mas amplia a margem dos conflitos que se criam
quando casos reais entram em rota de colisão, existindo limites éticos que não
autorizam a reconhecer a sua aplicação ao onerar e sobrecarregar os vínculos
familiares preexistentes na vida estática e na vida dinâmica da cada filho.

Assim, deve-se concordar que a decisão do STF em reconhecer a multiparentalidade e


autorizar a possibilidade da coexistência entre a filiação socioafetiva e a biológica, solucionou
apenas uma das inúmeras questões quanto a paternidade socioafetiva. A ausência de
legislação que a regulamente sempre trará à tona questões a serem solucionadas pela via
judicial e tendo em vista a discricionariedade do magistrado ao decidir o caso concreto
estaremos sempre diante de uma instabilidade jurídica visto a ocorrência de inúmeras decisões
conflitantes no mesmo sentido.

3.3 Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente

Tendo em vista a fragilidade de uma crian a, “o princípio parte da concep ão de ser a


crian a e o adolescente como sujeitos de direitos, como pessoas em condi ão peculiar de
desenvolvimento” (L O, 2017, p. 73), sendo assim, diante da situação de vulnerabilidade
em que uma criança se encontra é necessário a garantia de ampla proteção do Estado, da
família e da sociedade em geral, a fim de garantir todos os direitos fundamentais a essa
criança para que a mesma possa se desenvolver em um ambiente saudável, tendo seus
interesses resguardados.
Visto a importância em tutelar, da melhor maneira possível, os interesses do menor,
nossa legislação possui vários dispositivos que visam garantir seus direitos e interesses.
A Constituição Federal em seu artigo 227, caput, garante a criança, adolescente ou
jovem, direito à vida, à cultura, à dignidade, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, devendo
tais direitos serem resguardados pela sociedade, família e Estado com prioridade absoluta,
44

além de cuidar para que os mesmos não sofram nenhuma forma de discriminação,
negligência, exploração, violência, crueldade e opressão.
Importante ressaltar, o Estatuto da Criança e do Adolescente, que em seu artigo 3º
dispõe que todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana devem ser garantidos a
criança e ao adolescente a fim de lhes assegurar seu “desenvolvimento físico, mental, moral,
espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade”.
Diante da tamanha importância da proteção que o Estado garante ao menor, nos
processos judiciais em que está sendo discutido o interesse de uma criança, esse sempre deve
prevalecer ao interesse dos demais. Tal previsão se encontra no Decreto nª 99.710/ 90 (o qual
aprovou a Convenção sobre os direitos da criança), em seu artigo 3º, inciso I, prevê que
“todas as a es relativas s crian as, levadas a efeito por institui ões públicas ou privadas de
bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem
considerar, primordialmente, o interesse maior da crian a”

Dessa forma seria inconcebível admitir que pudesse qualquer decisão envolvendo os
interesses de crianças e adolescentes fazer tábula rasa do princípio dos seus
melhores interesses, reputando-se inconstitucional a aplicação circunstancial de
qualquer norma ou decisão judicial que desrespeite os interesses prevalentes da
criança e do adolescente recepcionados pela Carta Federal. (MADALENO, 2018, p.
99).

Sendo assim, qualquer ação relativa à uma criança seu interesse prevalecerá, inclusive
nas ações de reconhecimento da paternidade socioafetiva.
Dessa forma:

O princípio do melhor interesse ilumina a investiga ão das paternidades e filia es


socioafetivas A crian a o protagonista principal, na atualidade No passado
recente, em havendo conflito, a aplica ão do direito era mo ili ada para os
interesses dos pais, sendo a crian a mero o jeto da decisão O jui deve sempre, na
colisão da verdade iol gica com a verdade socioafetiva, apurar qual delas
contempla o melhor interesse dos filhos, em cada caso, tendo em conta a pessoa em
forma ão (L O, 2017, p 73 .

Sobre o reconhecimento da paternidade socioafetiva em respeito e proteção à


dignidade da criança, afirma Dimas Carvalho (2017, p. 104):

A prote ão dignidade da crian a e do adolescente e a li erdade de e pressar sua


vontade permitem a constru ão pela conviv ncia de rela ão afetiva do menor com
aqueles que considera como pais, mesmo não e istindo consanguinidade,
autorizando o reconhecimento jurídico da paternidade socioafetiva.
45

É em respeito ao princípio do melhor interesse da criança que a verdade socioafetiva


prevalece sobre a verdade biológica, pois não seria saudável para o seu desenvolvimento, ter
uma decisão judicial em desfavor aos seus interesses.
Desta forma, o princípio do melhor interesse da criança deve ser respeitado em todo o
âmbito judicial, devendo o juiz em análise ao caso concreto decidir de forma que melhor
atenda a criança. Mesmo havendo conflito entre o interesse de um adulto e o interesse de um
menor, o último deve sempre prevalecer, pois a criança e o adolescente possuem um amplo
rol de direitos e garantias fundamentais, estabelecido tanto na Constituição Federal como no
Estatuto da Criança e do adolescente, devendo tais direitos e garantias serem respeitados e
assegurados não só pelo Estado como pela sociedade em geral.

3.4 Adoção à Brasileira

Tal instituto se caracteriza quando alguém registra, de forma voluntária, filho de


outrem como se fosse seu, assumindo a paternidade desta criança sem o devido processo
legal. Temos nesse instituto como essência o afeto e consequentemente a paternidade
socioafetiva.
Quando alguém registra um filho sabendo não possuir vínculo biológico, o mesmo
está demonstrando a vontade de ser pai e assumir a função da paternidade na vida daquela
criança. Dessa forma, com a convivência familiar cria-se uma relação de pai e filho ligados
por vínculos afetivos.
Vale ressaltar que tal conduta é tipificada como crime pelo código penal, tanto em seu
artigo 299 em relação a falsidade ideológica, e em seu artigo 242 quanto ao crime contra o
estado de filiação. No entanto, visto que tais condutas ilícitas são praticadas por motivações
afetivas, no parágrafo único do artigo 242 do referido código, aduz que o juiz poderá deixar
de aplicar a pena se o crime é praticado por motivo de reconhecida nobreza.
Assim, afirma Rolf Madaleno (2018, p. 686) que as adoções à brasileira:

São, em verdade, registros de falsidade ideológica, de acordo com o artigo 299 do


Código Penal, cuja prática tipificada, em tese, como crime no ordenamento jurídico
brasileiro, mais precisamente como crime contra o estado de filiação, consoante
artigo 242 do Código Penal, mas cujo mote de dar afeto e ascendência à prole
rejeitada constrói a paternidade ou maternidade socioafetiva e retira por sua intenção
altruísta a conotação pejorativa e ilícita, porque trata dos pais do coração.
46

No aspecto material, a adoção a brasileira em nada se diferencia da adoção judicial,


visto que as mesmas possuem a finalidade que é de ter para si como filho uma criança sem
qualquer vínculo sanguíneo, assumindo deveres e obrigações para com aquela criança. O
desejo de ser pai deriva do afeto, da vontade de amar e cuidar, assim, fatores biológicos se
tornam irrelevantes pois, acima da verdade biológica, existe a verdade socioafetiva.
Neste sentido, Rolf Madaleno (2018, p. 687) pontua:

Não há, realmente, como distinguir um ato de adoção jurídica da


denominada adoção à brasileira, consistente no registro direto da pessoa, como se
fosse filho biológico, posto que uma e outra refletem um desejo de aproximação
afetiva entre duas pessoas, e neste posicionamento o filho adotivo (de fato ou de
direito) em nada diverge da filiação natural.

Dessa forma:

Revela o pai que ao filho empresta o nome, e que mais do que isso o trata
publicamente nessa qualidade, sendo reconhecido como tal no ambiente social; o pai
que ao dar de comer expõe o foro íntimo da paternidade, proclamada visceralmente
em todos os momentos, inclusive naqueles em que toma conta do boletim e da lição
de casa. É o pai de emoções e sentimentos, e é o filho do olhar embevecido que
reflete aqueles sentimentos. (FACHIN, 1996 apud CASSETTARI, 2017, p. 13).

Como já citado, Rolf Madaleno (2018) afirma que não há como aceitar a paternidade
biológica que não exista o afeto, ou seja, o afeto é essencial, ainda que haja o vínculo
biológico este deve coexistir com o vínculo socioafetivo para que a paternidade cumpra com a
sua verdadeira função.
As citações acima trazem o verdadeiro significado de pai, independentemente da
origem da filiação, seja ela biológica ou socioafetiva, pai é aquele que cuida, que ama, que
demonstra todo seu afeto e ternura. Ou seja, a adoção à brasileira traz a essência da filiação
socioafetiva, pois como j di a e pressão popular, “pai quem cria”

3.5 O Reconhecimento da Paternidade Socioafetiva e sua Irrevogabilidade.

Inicialmente, o reconhecimento da paternidade socioafetiva só poderia ser feito pela


via judicial, por meio de Ação Judicial com a finalidade de reconhecer o vínculo socioafetivo
47

utilizando como principal meio de prova o Estado de Posse de Filiação e consequentemente o


reconhecimento da paternidade socioafetiva.
Afirma Calderón (2017, p. 361) que:

A presença do vínculo socioafetivo basta para consubstanciar uma relação de


parentesco (como a paterno ou a materno filial), disso não há dúvidas [...]
Entretanto, até recentemente, tais vínculos socioafetivos exigiam uma ação judicial
para ser consolidadas e averbadas registralmente. A via exclusiva para
reconhecimento e registro da relação socioafetiva era, necessariamente, pelo Poder
Judiciário (ante a inexistência de regramento legal sobre a matéria).

Por ausência de regulamentação específica a respeito do reconhecimento da


paternidade socioafetiva, havia muito debate doutrinário e decisões conflitantes a seu respeito.
No entanto aos poucos a jurisprudência vem se consolidando em relação a paternidade
socioafetiva e seus consequentes efeitos. Assim, em respeito aos princípios da afetividade,
dignidade da pessoa humana e principalmente o melhor interesse da criança e do adolescente
o reconhecimento da paternidade socioafetiva vem tomando espaço no âmbito jurídico e
administrativo que buscam as melhores soluções para sua efetivação e facilitação.
Como dito inicialmente, o reconhecimento da paternidade socioafetiva só poderia ser
feito exclusivamente por via judicial, no entanto, recentemente alguns Estados mudaram esse
cenário e passaram a permitir o reconhecimento da paternidade socioafetiva por meio
extrajudicial, o qual poderia ser feito diretamente no Cartório de Registro Civil de Pessoas
Naturais, perante o cartorário.
O primeiro Estado a permitir o reconhecimento extrajudicial foi Pernambuco no ano
de 2013, por meio do provimento n. 9 de 2013 do Tribunal de Justiça de Pernambuco, e a
partir de então outros Estados passaram a permitir o reconhecimento extrajudicial. Conforme
afirma Calderón (2017, p. 363):

O Estado pioneiro a permitir esse reconhecimento extrajudicial foi Pernambuco que,


por intermédio da Corregedoria de Justiça do Tribunal de Justiça estadual,
regulamentou a questão administrativamente, orientando como os cartórios de
registro de pessoas naturais poderiam registrar tais vínculos socioafetivos
diretamente, sem a necessidade de determinação jurisdicional (um caso de registro
extrajudicial de parentalidade socioafetiva) [...]Essa prática pulverizou a
possibilidade de registro extrajudicial da paternidade socioafetiva, medida que a
partir de 2013 se disseminou por várias localidades.

Assim, vários Estados criaram seus próprios provimentos com a finalidade de


reconhecer a paternidade socioafetiva perante os Cartórios, mas cada qual com as suas
especificações. Diante deste cenário, o CNJ por meio do provimento nº 63 de 14 de novembro
48

de 2017, instituiu a uniformização da certidão de nascimento em âmbito nacional e dispôs


sobre o reconhecimento voluntário e a averbação da paternidade e maternidade socioafetivas
dentre outras providências.
om uma se ão denominada “Da Paternidade Socioafetiva”, o provimento nº 63, de
14 de novembro de 2017 do CNJ, tra em seu artigo 10: “O reconhecimento volunt rio da
paternidade ou da maternidade socioafetiva de pessoa de qualquer idade será autorizado
perante os oficiais de registro civil das pessoas naturais”. E confirma a irrevogabilidade do
reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetivas, salvo nas hipóteses de vício de
vontade, fraude ou simulação, por meio de ação judicial.
Conforme já estudado anteriormente, por força do artigo 1.609 do Código Civil, o
reconhecimento voluntário é ato irrevogável, salvo se comprovado erro ou falsidade. No
reconhecimento da paternidade socioafetiva não é diferente e antes mesmo da edição do
provimento supracitado, sua irrevogabilidade já era amplamente difundida pela maioria da
doutrina, visto a voluntariedade em registrar um filho que sabia não ser seu e
consequentemente assumir todos os deveres e obrigações da paternidade.
Assim leciona Dimas Carvalho (2017, p. 586):

O reconhecimento da filia ão socioafetiva irrevog vel, como ocorre na filia ão


iol gica e na ado ão, admitindo-se, todavia, a retifica ão do reconhecimento
volunt rio, em a ão anulat ria do registro de nascimento, se for efetuado por erro ou
falsidade (art. 1.604 do CC).

Corrobora no mesmo sentido, Lisboa (2013, p. 280):

O reconhecimento volunt rio irrevog vel, considerando-se inefica es o termo e a


condi ão nele porventura apostos A e plica ão simples: o ato em pauta não se
sujeita a qualquer modalidade do ato jurídico (condi ão, termo, encargo ou
pressuposi ão asta que o declarante reconhe a a paternidade de forma livre, s ria
e sem qualquer vício de manifesta ão da vontade.

Desta forma, pela via extrajudicial o reconhecimento da paternidade socioafetiva se


tornou muito mais fácil e menos burocrática a sua efetivação. Desse modo, atualmente, o
reconhecimento da paternidade socioafetiva pode ser feita diretamente em cartório e em
qualquer Estado brasileiro. O provimento do CNJ inovou quanto ao reconhecimento da
paternidade socioafetiva, trazendo regras e ressalvas para o efetivo reconhecimento as quais
serão abordadas mais adiante.
49

3.6 Da Prestação de Alimentos e Direitos Sucessórios

Como já estudado anteriormente, a paternidade socioafetiva quando constituída, gera


os mesmos efeitos jurídicos da paternidade biológica e esse entendimento é amplamente
aceito pela doutrina e jurisprudência, pois somente dessa forma que há o devido respeito a
princípios constitucionais que tutelam a família e os indivíduos, tais como, o da isonomia,
solidariedade e a dignidade humana.
Neste sentido, afirma Carvalho (2017, p. 559):
A pessoa possui plena li erdade individual de afei oar-se a outro ou não, mas
afei oando e e teriori ando o afeto, criando rela es familiares, gera
responsa ilidade, como ocorre na união est vel, com e pressa previsão legal, e
o riga em ra ão do princípio da solidariedade, do compromisso com a dignidade da
pessoa humana Não h como dissociar a li erdade individual em desenvolver uma
rela ão afetiva, que se constr i culturalmente na conviv ncia familiar, com a
responsabilidade de seus efeitos.

Assim, quando alguém decide criar uma relação de paternidade baseada


exclusivamente em vínculos afetivos, precisa estar ciente que tal escolha traz consequências
para ambas as partes, pai e filho, envolvidos na relação socioafetiva existente.
Há ainda a questão quanto a extensão do parentesco socioafetivo aos demais familiares
do pai socioafetivo. Neste sentido, afirma Cassettari (2017, p. 120):

Assim, temos que, quando um pai ou mãe reconhece uma paternidade ou


maternidade socioafetiva, esse filho passará a ter vínculo de parentesco com seus
outros parentes. Com isso surgirão os conceitos: avós, bisavós, triavós, tataravós,
irmãos, tios, primos, tios-avós socioafetivos, que irão acarretar todos os direitos
decorrentes dessa parentalidade. Por exemplo, se o pai ou mãe socioafetivos não
tiver condição de pagar pensão alimentícia ao filho, poderão ser chamados os avós.

Ou seja, para que o princípio da igualdade seja aplicado em sua totalidade, seria
necessário a extensão da parentalidade com todos os demais parentes do pai socioafetivo,
gerando inclusive obrigações quanto a prestação de alimentos e direitos sucessórios entre
esses parentes e o filho reconhecido. No entanto, tal hipótese precisa ser analisada com
cautela, tendo em vista que os outros parentes podem não ter vínculo afetivo nenhum com a
criança reconhecida.
Ademais, será abordado dois efeitos jurídicos consequentes da paternidade
socioafetiva, como, a obrigação em prestar alimentos e como se dá o direito à sucessão nas
relações socioafetivas. Iniciando-se pela prestação de alimentos.
50

Consagrando o princípio da igualdade, o qual veda qualquer distinção entre os filhos,


independentemente de sua origem de filiação, conforme o artigo 227 §6, da Constituição
Federal, nada mais razoável do que um filho, cujo sua filiação se deu por vínculo
socioafetivo, tenha direitos ao recebimento de prestação alimentar, assim como os filhos
provenientes de vínculo biológico.
Considerando a relevância da afetividade nas relações familiares é “inequívoco que o
afeto em uma rela ão paterno filial não iol gica, criando uma filia ão paternidade
socioafetiva, gera responsa ilidades, direitos e o riga es O riga e vincula os indivíduos na
rela ão” ( ARVALHO, 2017, p 560 Ou seja, a presta ão de alimentos uma o riga ão que
também deriva da paternidade socioafetiva, e também um direito do pai socioafetivo, caso
necessite em sua velhice.
Neste sentido, Cassettari (2017, p. 125) traz a seguinte ementa:

Apelação. Ação de alimentos. Parentalidade socioafetiva. Legitimidade para a


causa. Ocorrência. O fundamento do presente pedido alimentar é a existência, entre
apelante e apelada, da parentalidade socioafetiva. Essa relação é até incontroversa. A
relação socioafetiva configura parentesco para todos os efeitos, inclusive para a
fixação de obrigação alimentícia. Juridicamente possível o pedido de fixação de
alimentos, o que denota estar presente a legitimidade para a causa, seja a ativa ou a
passiva. Deram provimento (TJRS; Ap. Cível 70011471190; 8ª Câmara Cível; Des.
Rel. Rui Portanova; j. 21.7.2005).

Conforme a ementa citada, a paternidade socioafetiva configura parentesco civil para


todos os efeitos, até mesmo na prestação de alimentos, criando obrigações recíprocas entre o
pai e o filho socioafetivo. Inclusive, essa possibilidade está expressa no Enunciado 341 do
CJF – art. 1.696, o qual prevê: “Para os fins do art. 1.696, a relação socioafetiva pode ser
elemento gerador de obrigação alimentar”.
Importante ressaltar que com a tese de multiparentalidade, já aceita e consolidada pelo
STF, há a possibilidade de prestação de alimentos ser paga tanto pelo pai socioafetivo, como
pelo pai biológico ou então pelos dois.
Neste sentido, afirma Paulo Lôbo (2017, p. 379):

Em ra ão da decisão do STF no RE 898 060, que fi ou tese de repercussão geral


(Tema 622 reconhecendo a coe ist ncia ou concomit ncia de direitos entre o pai
socioafetivo, oriundo da posse de estado de filia ão, registrada ou não, e o pai
iol gico, reconhecido posteriormente, am os são devedores de alimentos do filho
comum, repartindo-se o quantum devido de acordo com as possibilidades
econômicas de cada um
51

Ou seja, a prestação de alimentos a ser paga pelo pai socioafetivo não afasta o dever
do pai biológico em cumprir com sua obrigação na prestação alimentar de seu filho. Dessa
forma, não restam dúvidas quanto a possibilidade de prestação de alimentos derivada das
relações socioafetivas, pois nossa Constituição Federal e o atual Código Civil, iguala todos os
filhos em direitos e obrigações, independentemente da origem de sua filiação.
Em relação aos direitos sucessórios, se tem também como principal fundamento o
princípio da igualdade de filiação, ou seja, os filhos oriundos de relação socioafetiva possui
direitos sucessórios em relação a seu pai socioafetivo, assim como um filho biológico, pois
como já visto anteriormente, a paternidade socioafetiva gera direitos e obrigações, dessa
forma “[...] no que tange à aplicação dos direitos fundamentais nas relações privadas, conclui-
se que serão aplicadas todas as regras sucessórias na parentalidade socioafetiva, devendo os
parentes socioafetivos ser equiparados aos biológicos no que concerne a tal direito.”
(CASSETTARI, 2014, p. 134). Sendo assim, o direito a sucessão outro efeito consequente da
paternidade socioafetiva.
Afirma Dimas Carvalho (2017, p. 588):

Outro importante efeito conferir direitos sucess rios recíprocos entre o filho
reconhecido e todos os parentes socioafetivos na linha reta e na colateral at o quarto
grau, o edecendo ordem de voca ão heredit ria A o edi ncia ordem de voca ão
heredit ria resguarda todos os seus direitos sucess rios na qualidade de filho, como
o direito peti ão de heran a, cola ão dos ens doados pelos pais aos outros filhos,
nulidade da partilha, e clusão dos herdeiros ascendentes e colaterais na sucessão
legítima, veda ão aos ascendentes, mediante testamento, de impor, sem causas
justificadas, clausulas restritivas na legítima

Ou seja, todos os efeitos sucessórios gerados da filiação biológica, também é


concedido, por direito, à filiação socioafetiva. E concorda o autor quanto a extensão da
parentalidade socioafetiva aos parentes em linha reta e colaterais até quarto grau, no que diz
respeito a sucessão hereditária.
No que tange ao direito sucessório derivado da paternidade socioafetiva, outro aspecto
a ser considerado, é a possibilidade de reconhecimento de filiação post mortem, ou seja, após
a morte do autor da herança, com o intuito de gerar direitos sucessórios. Essa possibilidade
gera grande debate na doutrina quando vista exclusivamente com viés econômico.
Nesse sentido, Calderón (2017, p. 385):

Por outro lado, há também outra situação que merece atenção no campo sucessório,
vinculada à temática da afetividade. São os casos de reconhecimento de filiações
socioafetivas post-mortem, ou seja, após o falecimento do autor da herança. Nessas
situações, um filho com vínculo somente socioafetivo pode vir a demandar em juízo
para ver essa filiação declarada, com o seu reconhecimento judicial e, em
52

consequência, com todos os seus direitos sucessórios reconhecidos. Nesse caso, não
parece haver controvérsia quanto ao seu consequente direito sucessório. Ainda
assim, é uma possibilidade que merece atenção no momento da sucessão partilha e,
principalmente, em negócios jurídicos de cessão de direitos hereditários.

Há grande discussão na doutrina e jurisprudência quanto ao reconhecimento de


paternidade, seja biológica ou socioafetiva, após a morte do autor da herança, conhecido
como reconhecimento post mortem. Tal discussão se enlaça a questão puramente econômica
que possivelmente se busca com o referido reconhecimento de paternidade. Nesse sentido,
Rolf Madaleno (2018, p. 512):

Não pode ser perdido de vista que, se a lei considera imoral o reconhecimento de
filho falecido que não deixou descendentes (CC, art. 1.609, parágrafo único; ECA,
art. 26, parágrafo único), porque essa ação só teria propósitos sucessórios, por
analogia do artigo 4° da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro também
deve ser considerado imoral que um filho que estreitou laços socioafetivos com seu
pai registral possa pretender investigar uma ascendência biológica para postular
depois da morte do ascendente genético os efeitos materiais da sua condição de filho
natural do sucedido.

O autor ora citado, faz dura crítica à busca de reconhecimento da paternidade


biológica, após a morte do pai biológico, visto que, mesmo possuindo em seu registro um pai
socioafetivo, é direito da pessoa buscar por sua ascendência genética e assim requerer o seu
reconhecimento, e com a atual tese da Multiparentalidade reconhecida pelo STF, o filho
poderá ter em seu registro a figura do pai socioafetivo e posteriormente buscar o
reconhecimento de sua filiação genética, criando direitos e obrigações recíprocas com ambos
os pais.
Madaleno (2018), faz analogia ao artigo 1.609 do Código Civil que veda o
reconhecimento de filho que não possui descendentes por entender que tal reconhecimento se
baseia puramente em questões patrimoniais, entendendo como imoral a busca pelo
reconhecimento da paternidade biológica, quando presente a figura do pai socioafetivo. No
entanto, não podemos concordar com essa posi ão, pois “não se pode negar a condi ão de
herdeiro ao filho iol gico que foi criado e constituiu rela ão socioafetiva com outra pessoa,
so pena de premiar o pai que a andona sorte o filho que conce eu” (MONTEIRO; SILVA,
2012, p. 470).
O presente tópico visa demonstrar que reconhecimento da paternidade não é
pressuposto para gerar os efeitos consequentes da filiação, mas sim o mero vínculo biológico
ou afetivo é o suficiente para criar direitos e obrigações para com o filho. Ou seja,
comprovado o vínculo sanguíneo, não importando que o filho nunca tenha buscado pelo seu
53

reconhecimento, o seu direito como herdeiro deve ser reconhecido mesmo que seja após a
morte do pai biológico.
Da mesma forma com o reconhecimento da paternidade socioafetiva post mortem, se
comprovado que em vida se configurou a posse de estado de filho, havendo vínculo afetivo
entre o autor da herança e o filho socioafetivo, o mesmo já conquistou seu direito como
herdeiro.
Corrobora neste sentido, Carvalho (2017, p. 560-561):

Evidentemente que ningu m o rigado a afei oar, a ter amor por outra pessoa,
tratando-se de questão inapreensível pelo direito, por sua su jetividade, e li erdade
individual [...] Entretanto, afei oando e fa endo surgir uma rela ão afetiva,
externada por elementos o jetivos apreensíveis pelo direito, por comportamentos
que envolvem rela es familiares comprovadas pela conviv ncia e formando um
n cleo familiar, a afetividade assume valor jurídico regulado pelo Direito. A
espontaneidade, apresentada voluntariamente, ao evoluir em uma rela ão entre as
pessoas, assume car ter de responsa ilidade, surgindo o vínculo socioafetivo,
obrigando e vinculando.
Assim, entende-se que o reconhecimento da paternidade biológica ou socioafetiva é
mera consequência da existência de vínculos biológicos ou afetivos, respectivamente, e dessa
forma, os vínculos que são responsáveis pelos os efeitos da paternidade não necessariamente
o seu reconhecimento.
Como se pode ver, é inegável a concessão de direitos sucessórios às relações
socioafetivas, assim como o dever a prestação de alimentos, pois como já visto,
exaustivamente, se assim não o fosse, estaria sendo contrariado o princípio de igualdade de
filiação previsto na Constituição Federal que veda qualquer distinção entre os filhos, sejam
eles biológicos ou não.

3.7 Análise do provimento 63 de 14 de novembro de 2017 do CNJ

Conforme estudado anteriormente, com o provimento nº 63 do CNJ o reconhecimento


da paternidade socioafetiva pode ser realizado de forma extrajudicial em todo o território
nacional, ou seja, diretamente em cartório, não sendo mais necessário provocação do
judiciário para o reconhecimento e a inclusão do nome do pai ou mãe socioafetivos no
Registro de Nascimento da criança reconhecida.
O referido provimento, traz inicialmente em seu texto os aspectos que foram levados
em consideração para que o mesmo fosse editado e publicado. Desta forma, serão abordadas
54

as principais considerações referentes a paternidade socioafetiva trazidas em seu texto e


consequentemente uma análise com o que já foi debatido no presente trabalho até o momento.
Inicialmente, as seguintes considerações:

CONSIDERANDO a existência de regulamentação pelas corregedorias-gerais de


justiça dos Estados do reconhecimento voluntário de paternidade e maternidade
socioafetiva perante os oficiais de registro civil das pessoas naturais;
CONSIDERANDO a conveniência de ediçãode normas básicas e uniformes para a
realização do registro ou averbação, visando conferir segurança jurídica à
paternidade ou à maternidade socioafetiva estabelecida, inclusive no que diz respeito
a aspectos sucessórios e patrimoniais. Provimento n º 63 de 14/11/2017 do CNJ.
(BRASIL, 2017).

Assim, o provimento 63 do CNJ foi editado com a finalidade de uniformizar os


modelos de certidão de nascimento, de casamento e de óbito. Tendo em vista que vários
Estados já regulamentavam por meio de suas corregedorias gerais o reconhecimento da
paternidade socioafetiva diretamente em cartórios de registro civil, em busca de segurança
jurídica em relação ao reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetivas e seus
efeitos patrimoniais e sucessórios, o referido provimento estabeleceu modelos únicos dos
documentos supracitados.
Tendo em vista o reconhecimento das relações afetivas e consequente aprovação pela
doutrina e jurisprudência:

CONSIDERANDO a ampla aceitação doutrinária e jurisprudencial da paternidade e


maternidade socioafetiva, contemplando os princípios da afetividade e da dignidade
da pessoa humana como fundamento da filiação civil; CONSIDERANDO a
possibilidade de o parentesco resultar de outra origem que não a consanguinidade e
o reconhecimento dos mesmos direitos e qualificações aos filhos, havidos ou não da
relação de casamento ou por adoção, proibida toda designação discriminatória
relativa à filiação (arts. 1.539 e 1.596 do Código Civil). Provimento n º 63 de
14/11/2017 do CNJ. (BRASIL, 2017).

Outro aspecto importante considerado pelo referido provimento, foi a aceitação


majoritária da doutrina e jurisprudência em relação a paternidade socioafetiva e a
possibilidade do seu reconhecimento, consagrando e dando a devida importância a princípios
como o da afetividade, dignidade da pessoa humana e o princípio da igualdade de filiação.
E por fim, a tese fixada pelo STF, no julgamento do Recurso extraordinário nº
898.060/SP, que diz respeito ao reconhecimento da paternidade biológica em concomitância
com a paternidade socioafetiva, podendo constar as duas filiações no registro e fazendo valer
todos os efeitos derivados de ambas as paternidades.
Considerou ainda, o reconhecimento da paternidade socioafetiva irrevogável assim
como o reconhecimento voluntário previsto no artigo 1.609 do Código Civil.
55

Assim:

CONSIDERANDO o fato de que a paternidade socioafetiva, declarada ou não em


registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante
baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios (Supremo Tribunal
Federal – RE n. 898.060/SC); CONSIDERANDO o previsto no art. 227, § 6º, da
Constituição Federal e no art. 1.609 do Código Civil [...] Provimento n º 63 de
14/11/2017 do CNJ. (BRASIL, 2017).

Dessa forma, pode-se perceber que o CNJ considerou os principais pontos debatidos
na doutrina e jurisprudência ao editar o referido provimento. No entanto, muitas questões
ainda geram dúvidas em relação a paternidade socioafetiva. Tendo em vista que o
reconhecimento da paternidade socioafetiva é um ato irrevogável, é necessária muita cautela
para evitar problemas futuros, principalmente nos aspectos patrimoniais e sucessórios.
Como visto anteriormente, o provimento nº 63 do CNJ, dedica uma seção especial
para o reconhecimento da paternidade socioafetiva, intitulado “Da Paternidade Socioafeitiva”,
nessa seção estão previstas regras e ressalvas para a efetivação do reconhecimento
diretamente em cartório.
Assim, o reconhecimento da paternidade socioafetiva é vedada aos irmãos entre si ou
ascendente. Não há nenhum impedimento para o reconhecimento de maiores de 18 anos, no
entanto se tratando de adolescente maior de 12 anos, seu consentimento é indispensável e
ainda deverá ser respeitada a diferença mínima de 16 anos de idade entre o pai ou mãe e o
filho a ser reconhecido.
As regras citadas acima, são as mesmas previstas para a adoção no Estatuto da Criança
e do Adolescente.
Importante ressaltar que o reconhecimento de paternidade socioafetiva extrajudicial
não deixa de considerar como requisito o Estado de posse do filho, mesmo não estando
expressamente previsto como pressuposto para o reconhecimento, o artigo 12 do provimento
63 do CNJ, prevê: “suspeitando de fraude, falsidade, má-fé, vício de vontade, simulação ou
dúvida sobre a configuração do estado de posse de filho, o registrador fundamentará a recusa,
não praticará o ato e encaminhará o pedido ao juiz competente nos termos da legislação
local”. Assim, fica subentendido que o estado de posse de filiação deve ser comprovado para
o efetivo reconhecimento da paternidade socioafetiva, no entanto, o provimento não trouxe as
formas como tal fato será comprovado.
Essa previsão acima, deixa claro como o reconhecimento extrajudicial pode trazer
problemas futuros, tendo em vista que em cartórios não é possível fazer uma análise completa
56

de provas que comprovem o estado de posse de filho, diferentemente do processo judicial que
possui amplo campo probatório e a participação do Ministério Público. E tendo em vista que
muitas vezes é o interesse de um menor que está em pugna, é imprescindível a comprovação
real da existência de vínculo afetivo duradouro para evitar danos futuros a essa criança ou
adolescente.
O reconhecimento socioafetivo poderá ser feito mediante documento público ou
particular de disposição de última vontade, assim como o reconhecimento voluntário previsto
no artigo 1.609 do Código Civil.
E por fim, estabelece em seu artigo 14: “O reconhecimento da paternidade ou
maternidade socioafetiva somente poderá ser realizado de forma unilateral e não implicará o
registro de mais de dois pais e de duas mães no campo FILIAÇÃO no assento de
nascimento”. Ou seja, o reconhecimento da paternidade socioafetiva só poderá ser feito ou
pelo pai ou pela mãe socioafetivos, nunca de forma bilateral, com o reconhecimento dos dois
(pai e mãe) como figuras socioafetivas, limitando-se a no máximo a presença do nome de dois
pais ou duas mães no campo da filiação. Ressalva essa, importante, pois não coloca em
descrédito o reconhecimento da paternidade socioafetiva, o que aconteceria caso fosse
permitido a inserção indiscriminada de vários pais ou mães no registro da criança e assim
gerando conflitos em relação aos efeitos da paternidade/maternidade conferidos a todos eles.
Embora a possibilidade do reconhecimento da paternidade socioafetiva de forma
extrajudicial seja considerado um avanço para o instituto, não se pode esquecer que em torno
da paternidade há muitas questões a serem debatidas.
Dessa forma, o presente tópico visa mostrar que a edição do referido provimento não é
capaz de solucionar todas as questões que surgem a partir do reconhecimento da paternidade
socioafetiva, sendo necessário que o instituto seja devidamente regulamentado por meio de
Lei Federal, para que haja uma verdadeira uniformização sobre os seus efeitos e que assim os
interesses da criança ou adolescente sejam devidamente resguardados, pois o reconhecimento
da paternidade socioafetiva gera muitos efeitos em relação ao estado de pessoa e no aspecto
patrimonial, podendo desencadear inúmeros conflitos.
Assim, a fim de evitar demandas futuras no judiciário em relação a seus efeitos é
essencial que a paternidade socioafetiva seja regulamentada, e também por considerar-se que
a paternidade socioafetiva possui uma função social muito importante no campo da
afetividade e não restarem dúvidas de como as relações afetivas são fundamentais para uma
saudável manutenção do ambiente familiar o instituto necessita urgentemente de
regulamentação no âmbito civil.
57
58

CONCLUSÃO

Ao longo dos anos o cenário da família brasileira vem sofrendo diversas modificações
resultantes de uma histórica evolução social. Os modelos atuais de família em nada se
assemelham às entidades familiares antigas, que eram tidas como entidades econômicas e
patriarcais. Conforme analisado no presente trabalho a presença da afetividade nas relações
familiares observadas a partir do século XX mudou esse cenário e foi essencial para que as
relações socioafetivas fossem reconhecidas e tuteladas pelo Direito de Família.
Assim, a paternidade socioafetiva é amplamente aceita pela doutrina e jurisprudência,
pois entende-se que respeitar e tutelar as relações afetivas nas entidades familiares é
fundamental para a garantia da dignidade da pessoa humana, pois o afeto, atualmente,
considera-se indispensável para a formação e manutenção familiar.
A Constituição Federal de 1988 foi o principal instrumento normativo a dar amparo as
relações familiares, consagrando princípios e dando espaço para outros modelos de família,
no mesmo sentido, o Código Civil de 2002. Dessa forma, a paternidade socioafetiva e outras
relações baseadas no afeto, como a adoção e união estável ganharam maior visibilidade no
mundo jurídico.
Ao analisar jurisprudências, percebe-se nas decisões relativas a paternidade
socioafetiva como principal fundamento o melhor interesse da criança ou adolescente,
devendo esse sempre prevalecer em relação ao interesse das outras partes do processo. Para
que assim seja, é necessário a preservação dos laços afetivos e da verdade socioafetiva que
uma criança estabelece com seu pai socioafetivo, pois como visto, a paternidade possui uma
função social muito importante e não é estabelecida apenas por vínculos biológicos.
Desta forma, foi abordado no presente trabalho como se dá o reconhecimento da
paternidade socioafetiva e alguns dos seus principais efeitos, como a prestação de alimentos e
direitos sucessórios em respeito ao princípio da igualdade de filiação. Foi visto a possibilidade
da multiparentalidade, ou seja, a coexistência da paternidade socioafetiva com a biológica e a
produção de efeitos de ambas as paternidades.
E por fim, foi visto também, que a paternidade socioafetiva se comprova por meio da
posse de estado de filho e que atualmente seu reconhecimento pode ser feito
extrajudicialmente, possibilidade essa trazida pelo provimento nº 63 do CNJ, o qual fizemos
uma breve análise a respeito das suas considerações e regras para proceder com o
59

reconhecimento. Além de uma análise às lacunas ainda existentes em torno da paternidade


socioafetiva.
Desta forma, o presente trabalho demonstrou exaustivamente a importância que vem
sendo dada à paternidade socioafetiva, e que não poderia ser diferente, pois estamos diante de
um instituto baseado em nobreza e sentimentos mais puros, como o amor e o afeto. Quando
dizem que pai é quem cria, não está errado, pois a paternidade não se baseia em fator
genético. Sua essência está em sentimentos. Assim, o reconhecimento da paternidade
socioafetiva necessita de regulamentação específica para que seja devidamente efetivado de
maneira uniforme, para que dessa forma, consiga efetivamente resguardar os interesses da
criança e do adolescente e para que os vínculos afetivos continuem sempre a prevalecer nas
relações familiares.
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