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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA

FERNANDA SIEGLITZ PANATTA

A MULTIPARENTALIDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO E OS


SEUS EFEITOS SUCESSÓRIOS

Araranguá
2018
FERNANDA SIEGLITZ PANATTA

A MULTIPARENTALIDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO E OS


SEUS EFEITOS SUCESSÓRIOS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


ao Curso de Graduação em Direito da
Universidade do Sul de Santa Catarina, como
requisito parcial à obtenção do título de
Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Nádila da Silva Hassan, (Esp.)

Araranguá
2018
Dedico o presente trabalho as minhas filhas,
Maria Alice e Amanda, e meu noivo Adilson
Martins pelo esforço e apoio empregado em
me auxiliar durante a trajetória do curso e da
pesquisa, e por todas as orações em meu favor.
Dedico, também, a Érika Alves, quem me
inspirou com sua história pesquisar sobre o
tema e encontrar uma solução jurídica para seu
caso.
AGRADECIMENTOS

Agradeço primordialmente a Deus, que tem me sustentado por toda trajetória de


minha vida e principalmente nos momentos de dificuldades que passei durante a pesquisa. Foi
Ele quem me deu o dom da persistência e da vontade de vencer.
As minhas filhas Maria Alice e Amanda que me apoiaram no decorrer da
graduação e durante este trabalho. Devo a elas todo apoio e incentivo transmitidos todos os
dias para a construção do meu caráter e da minha responsabilidade. É por elas que me torno
todos os dias uma mulher melhor, que luto em busca de um futuro promissor onde eu sirva de
inspiração em atitudes e não só com palavras. Amo vocês mais que tudo na vida.
Ao meu noivo Adilson Martins (bebê), pela compreensão e disposição a meu
favor, bem como pelo companheirismo. As palavras de carinho e horas infindáveis de apoio
foram os principais motivadores dos meus sonhos. Ele é aquele com quem em todos os
momentos pude contar e que esteve sempre presente, sempre me incentivando a persistir e
jamais desistir daquilo que mais desejava.
A minha avó Olga Anália Sieglitz, e familiares que sempre expressaram palavras
de apoio em relação ao caminho que estou seguindo. Só posso dizer: amo vocês e agradeço
por fazerem parte da minha vida. Às minhas amigas, desde sempre, Mira, Elisangela, Arlete e
Priscila: vocês fazem parte da minha história e eu as amo demais.
À minha orientadora, Nádila Hassan, quem mais do que me auxiliar no
desenvolvimento do trabalho, ajudou-me durante a graduação, lecionando de uma forma tão
compreensível e didática que o tempo passava despercebido. O interesse nos estudos
despertava e a sede pelo conhecimento surgia por meio dela: uma grande mulher que se
tornou fonte de inspiração de vida. Obrigada pela dedicação e conhecimentos repassados.
A todos os professores que, com sabedoria, contribuíram na construção dos meus
conhecimentos, em especial, aos Mestres Fátima Caldeira Hassan, Rejane Johansson, Renan
Cioff, Fábio Mattos, Laércio Machado, Enoir Alexandrino, Jeã Pierre, Arnildo Steckert,
Guilherme Marcon, Marcos Monteiro e Karlo Von Muller.
A todos que de uma forma ou de outra colaboraram para mais essa conquista em
minha vida, fazendo parte da minha formação, a minha imensa gratidão.
O amor não é um produto acabado. O amor se cultiva, o amor se
lapida, o amor se estimula. O amor morre, mesmo sendo real. E ainda
renasce, mesmo estando morto. O amor não é genético, não se nasce
sabendo amar, você aprende a amar. (CURY, 2011).
O afeto merece ser visto como uma realidade digna de tutela. (DIAS,
2007).
RESUMO

O presente trabalho tem por escopo principal demonstrar os efeitos no direito sucessório que
surgem após o reconhecimento da multiparentalidade, entendida como a possibilidade de
coexistência de mais de um pai ou mãe no registro de nascimento, bem como os resultados
que podem de fato ocorrer e as jurisprudências correlatas. Para esta análise, realizou-se a
ponderação entre a evolução histórica do conceito de família e esta instituição no
ordenamento jurídico brasileiro, a análise do termo socioafetividade e seus princípios, da
multiparentalidade e seu reconhecimento, sendo isso tudo sob o prisma do direito sucessório.
As considerações iniciais serão sobre o conceito de família na atualidade e suas novas
composições, as formas de vínculo entre pais e filhos decorrentes do liame afetivo sob a égide
do princípio da dignidade da pessoa humana e afetividade. Desenvolve-se o tema na intenção
de esclarecer como o direito sucessório vem abarcando esta nova realidade jurídica brasileira.
Por fim, contemplar-se-á uma análise jurisprudencial do posicionamento dos tribunais quanto
à casos que envolvem estes institutos, bem como os efeitos de seu reconhecimento. A
metodologia que será utilizada no presente trabalho é a dedutiva, sendo utilizado o
procedimento monográfico, com natureza qualitativa e técnica de pesquisa bibliográfica.

Palavras-chave: Socioafetividade. Multiparentalidade. Direito de Família. Direito Sucessório.


ABSTRACT

The main purpose of this paper is demonstrate the effects on inheritance law that arise after
the recognition of multiparentality, understood as the possibility of coexistence of more than
one parent in the birth record, as well as the results that may actually occur and the related
jurisprudence. For this analysis, the historical evolution of the concept of family and this
institution in the Brazilian legal system was analyzed, the analysis of the term
socioafetividade and its principles, multiparentality and its recognition, all being under the
prism of succession law. The initial considerations will be on the concept of family in the
present and its new compositions, the forms of bond between parents and children resulting
from the affective bond under the aegis of the principle of the dignity of the human person
and affectivity. The theme is developed in order to clarify how inheritance law has been
encompassing this new Brazilian legal reality. Finally, a jurisprudential analysis of the
position of the courts regarding cases involving these institutes, as well as the effects of their
recognition, will be contemplated. The methodology that will be used in the present work is
the deductive one, being used the monographic procedure, with qualitative nature and
technique of bibliographic research

Keywords: Socio-activity. Multiparentality. Family Law. Succession Law.


LISTA DE SIGLAS

CADH – Convenção Americana dos Direitos Humanos


CC – Código Civil
CF – Constituição Federal
CJF – Conselho Federal de Justiça
CNJ – Conselho nacional de Justiça
CRFB – Constituição da República Federativa do Brasil
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família
LRP – Lei dos Registros Públicos
PL – Projeto de Lei
RE – Recurso Extraordinário
STF – Supremo Tribunal Federal
Unisul – Universidade do Sul de Santa Catarina
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 12
2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE FAMÍLIA..................................... 14
3 CONCEITO DE FAMÍLIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ..... 23
3.1 MODALIDADES DE FAMILIA NO ORDENAMENTO JURIDICO BRASILEIRO.. 24
3.1.1 Famílias consanguíneas ........................................................................................... 25
3.1.2 Família monoparental ............................................................................................. 26
3.1.3 Famílias nucleares e extensas ................................................................................. 26
3.1.4 Famílias reconstituídas, mosaicas ou pluriparentais ............................................. 27
3.1.5 Famílias homoafetivas............................................................................................. 27
3.1.6 Famílias poliafetivas................................................................................................ 29
3.1.7 Família substituta.................................................................................................... 30
3.1.8 Família anaparental ................................................................................................ 30
3.1.9 União estável ........................................................................................................... 31
3.1.10 Família matrimonial ............................................................................................... 31
3.1.11 Família sociafetiva................................................................................................... 32
3.1.11.1 Parentalidade socioafetiva ...................................................................................... 33
4 DA MULTIPARENTALIDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
E SEUS FEITOS NO DIREITO SUCESSÓRIO .............................................................. 35
4.1 BREVE EXPLANAÇÃO DOS PRINCÍPIOS QUE NORTEIAM O INSTITUTO DA
MULTIPARENTALIDADE ................................................................................................ 39
4.1.1 Da dignidade da pessoa humana ............................................................................ 39
4.1.2 Da afetividade.......................................................................................................... 40
4.2 MULTIPARENTALIDADE NO DIREITO DE FAMÍLIA .......................................... 41
4.3 EFEITOS DO RECONHECIMENTO DA MULTIPARENTALIDADE ...................... 43
4.3.1 Da extensão do parentesco ...................................................................................... 44
4.3.2 Do direito a mudança ao nome e inclusão dos pais e avós no registro civil .......... 45
4.3.3 Das obrigações de alimentar ................................................................................... 46
4.3.4 Da guarda de filho socioafetivo menor ................................................................... 47
4.3.5 Do direito de visitas a todos familiares ................................................................... 48
4.3.6 Dos direitos sucessórios ........................................................................................... 48
4.3.7 Conflito entre genitores........................................................................................... 48
4.3.8 Procedimento para o reconhecimento da multiparentalidade .............................. 49
4.3.8.1 Por ação declaratória .............................................................................................. 50
4.3.8.2 Por ação investigatória............................................................................................ 50
4.3.8.3 De forma incidental ................................................................................................ 51
4.3.8.4 Por reconhecimento das partes................................................................................ 51
4.3.8.5 Por reconhecimento em escritura pública ................................................................ 52
5 EFEITOS DA MULTIPARENTALIDADE NO DIREITO SUCESSÓRIO .............. 53
5.1 ASPECTOS GERAIS DO DIREITO SUCESSÓRIO NA MULTIPARENTALIDADE 53
6 CONCLUSÃO .............................................................................................................. 60
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 61
ANEXO A – Acórdão Tribunal de Justiça de Santa Catarina ......................................... 70
12

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho, condição parcial para conclusão do curso de direito da


Universidade do Sul de Santa Catarina- UNISUL, tem como finalidade averiguar as inovações
que o direito de família sofreu ao longo do tempo, bem como a possibilidade de ações para
concessão do reconhecimento da multiparentalidade perante os tribunais e os efeitos jurídicos
que atingem o direito sucessório, objetivo central da pesquisa.
É de se atentar que este é um instituto recente no ordenamento jurídico brasileiro,
entendido como a possibilidade de uma pessoa possuir em seu registro de nascimento mais de
um pai ou uma mãe, e quando houver esse reconhecimento, este terá de fato todos os direitos
sucessórios resguardados. Ainda que sem uma legislação própria ou sem inclusão em alguma
existente, este entendimento vem sendo adotado pelo sistema jurídico brasileiro.
Desta forma, o presente trabalho busca responder a seguinte questão: quais são os
efeitos do reconhecimento da multiparentalidade perante o direito sucessório? Frisa-se que a
resposta será resultado de uma pesquisa bibliográfica e jurisprudencial.
Assim, visando buscar o fim almejado, faz-se necessário destacar os objetivos do
presente trabalho, sendo que, inicialmente pretende-se abordar sobre a evolução histórica da
família nas sociedades e no ordenamento jurídico brasileiro, o reconhecimento do instituto e
os seus efeitos no direito das sucessões. Ao final, serão demonstrados os efeitos da
multiparentalidade neste prima sucessório e, por meio de julgados, a ocorrência e aceitação
desse instituto.
Ainda, para o desenvolvimento deste trabalho é utilizado o método de abordagem
de pensamento dedutivo, com base no método de abordagem de natureza qualitativa, com
técnica de pesquisa bibliográfica, baseada em doutrinas e documentos. Igualmente, esta
pesquisa fora baseada em legislações e jurisprudências acerca do tema, tendo como método de
procedimento monográfico.
Para a realização deste trabalho organizou-se a pesquisa em quatro capítulos,
sendo os assuntos distribuídos da seguinte maneira. Inicialmente, a presente introdução, que
se faz necessária a fim de contextualizar o tema objeto de análise, o objetivo, o método
utilizado e, por fim, a estruturação do trabalho.
No primeiro capítulo, inicia-se o desenvolvimento do tema com a explanação a
respeito do instituto familiar, abordando-se sua evolução histórica pelas sociedades, no Brasil
e globalmente.
13

No segundo capítulo, abordar-se-ão os tipos de famílias abrangidos no


ordenamento jurídico brasileiro atual e os princípios que regem essas novas relações
familiares.
No terceiro capítulo, a conceituação de multiparentalidade e suas formas de
reconhecimento construídas legais e jurisprudencialmente e, por fim, no quarto e último
capítulo discorre-se sobre os efeitos da multiparentalidade no direito sucessório, após seu
reconhecimento.
Finda-se o presente trabalho com as considerações finais, expostas por meio de
uma construção de opinião pessoal, baseada no estudo feito e nas vivências experimentadas
durante toda a pesquisa.
14

2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE FAMÍLIA

Em um primeiro momento, discorre-se sobre a esfera histórica da evolução do


conceito família, esclarecendo suas modificações ao longo do tempo, e demonstrando como,
na atualidade, essa concepção aceita diversos modelos de famílias no ordenamento jurídico
brasileiro.
Nesse sentido, aduz Araújo Junior (2008, p. 18) que “o estudo do direito de
família se apresenta no momento, especialmente difícil, em razão das grandes mudanças e
inovações que passa a sociedade moderna”.
A percepção sobre o conceito de família vem se transformando inteiramente no
transcurso do tempo. Na contemporaneidade tem sido visto como liame afetivo existente entre
seus membros, sobrepondo o modelo antepassado de poder patriarcal de família onde eram
consideradas apenas aquelas consanguíneas ou biológicas.
Hodiernamente, a afetividade trouxe uma igualdade nas relações familiares,
tornando-se um elo sem forma, pois “o direito, não sem uma longa e triste história de
exclusões, viu-se forçado a reconhecer o afeto como algo que merece proteção jurídica, sendo
o afeto o principal identificador do laço familiar” ( 2006, p. 2).
Para Dias (2016, p. 137) houve uma significativa mudança na visão hierarquizada
de família, para ela é “difícil encontrar uma definição de família de forma a dimensionar o
que, no contexto dos dias de hoje, se insere nesse conceito, fazendo assim a referência de que
não há mais como ter a visão de família patriarcal, tendo o homem como figura central”.
Por conseguinte, a evolução do conceito de família determina-se por uma
instituição em permanente mudança, e para uma melhor compreensão sobre a evolução do
conceito de família, precisam-se abordar alguns momentos dentro do instituto familiar no
decorrer da história da humanidade.
Sendo assim dividir-se-á por épocas, começando pela família primitiva e pela
família romana, passando pela estrutura familiar na idade média e na idade moderna e, por
fim, a família brasileira.
Para Venosa, na família primitiva:
As relações sexuais ocorriam entre todos os membros que integravam uma tribo
(endogamia). Disso decorria que sempre a mãe era reconhecida, mas se desconhecia
o pai, o que permite afirmar que a família teve de início um caráter matriarcal,
porque a criança sempre ficava junto à mãe, que a alimentava e educava. (2005, p.
19).

O entendimento de Barros (2018, p. 47) se assemelha ao anterior:


15

Na sua origem remota, surgiram naturalmente, pela necessidade histórica de manter


em mãos das tribos as terras em que elas se assentaram, evitando a mescla ou
domínio de outras gentes, o que as destruiria. É fato amplamente sabido que as
tribos, quando ainda nômades, desconheciam a agricultura e a pecuária extensivas,
não praticavam a propriedade da terra e dos frutos da terra. Mas já discerniam a
família. As relações sexuais se travavam de forma espontânea, motivadas pela
atração natural entre homens e mulheres, sem preconceitos que os inibissem. Os
agrupamentos familiares – formando a gens primitiva – eram reconhecidos pelo lado
da mãe, que sempre era certa, ao passo que o pai nem sempre o era.

Observa-se que a era primitiva cobria as relações familiares pelo manto da


promiscuidade e, ao longo do ciclo temporal, as entidades familiares vão ganhando novas
formas e estruturas.
Aduz Engels (1995, p. 31), em sua obra sobre a origem da família, que:
O estudo da era primitiva revela-nos, que os homens praticavam a poligamia e suas
mulheres poliandria, e que por consequência disso os filhos de uns e outros tinham
que ser considerados comuns. É nesse estado de coisas, por seu lado, que, passando
por transformações, resulta na monogamia. E essas modificações são de tal ordem
que o círculo compreendido na união conjugal comum, e que era muito amplo, se
estreita pouco a pouco até que, por fim, abrange exclusivamente o casal isolado, que
predomina hoje.

Em continuidade, na era romana “é de se entender que o poder do pater é quase


absoluto, exercido pela figura paterna sobre a esposa, filhos e seus escravos”, explica Venosa
(2005, p. 20).
Para Pontes Miranda (2000, p. 203 - 204), durante a era romana, a família era
compreendida pelo pater onde “os descendentes ou não, estavam submetidos ao pátrio poder,
e a mulher in manu, era considerada na mesma condição análoga à de uma filha: loco filiae”.
E nesse norte, compreendem-se nessa unidade familiar patriarcal, dado ao fato que
nesse tempo a formação das famílias seguia certas tradições e regras sociais da época,
conforme explana Aguiar (2018, p. 112).
A família na Roma Antiga era patriarcal, ou seja, toda a autoridade era delegada ao
homem, ao pai. A família romana era uma junção de tudo aquilo que estava sob o
poder do pater famílias. O patriarca era o primeiro do lar, sendo assim, ele
desempenhava todas as funções religiosas, econômicas e morais que fossem
necessárias, os bens materiais pertenciam somente a ele. A representação familiar
romana era simbolizada pelo pai e todo poder atribuído a ele terminava
somente com a sua morte. Sendo o homem o senhor do lar, a mulher romana não
tinha o papel de senhora do lar, pois ela era considerada parte integrante do homem.
(grifos próprios).

Esse é o entendimento doutrinário de Pereira (2009, p. 31), expõe,


O pater poder seria simultaneamente chefe político, sacerdote e juiz do lar,
comandando e oficiando o culto dos deuses doméstico e distribuindo justiça. Exercia
ainda o extremo direito de vida e morte dos filhos, podendo impor-lhes penas
corporais, vender-lhes e tirar-lhes a vida. Enquanto isso a mulher vivia totalmente
subordinada à vontade do varão e nunca adquiria autonomia, pois sua única
16

transição seria a de fila à esposa, sem alteração nenhuma do fato na sua capacidade,
não possuindo direitos próprios perpetuamente, por toda sua vida, podendo ser
repudiada por ato unilateral do marido.

Pode-se comprovar que a partir do texto supramencionado, resquícios da


civilização romana figura como influência direta no mundo ocidental, sendo à base da família
comumente conhecida até poucos anos atrás. Esta, por sua vez, era a família sob o poder do
“pater” considerado o chefe absoluto familiar e a mulher não possuía quaisquer direitos, era
submissa às vontades do marido.
Nesse sentido:
O parentesco romano, para efeitos civis, não se baseava em laços de sangue,
mas no poder (potestas). Seriam parentes pessoas que estivessem sob o poder do
mesmo pater, ligadas pelo parentesco masculino. Essas pessoas eram chamadas
de agnadas e o parentesco daí resultante denominava-se agnatio. O pater e seus
descendentes eram agnados entre si. Já o parentesco pelo sangue, com relação à
família materna ou paterna, chamava-se cognatio e não produzia efeitos civis. Era
um parentesco natural. Essa é a diferença entre o parentesco romano antigo e o
moderno (grifos próprios) (MEIRA, 1971, p. 106).

Pode-se analisar a família na era romana sob o prisma de que era exclusivamente
patriarcal, ou seja, toda autoridade era delegada ao homem, ao pai, ele como patriarca era o
centro do lar, desempenhando todas as funções e os bens matérias constituídos pela instituição
familiar pertencia a ele (AGUIAR, 2018).
Conforme explana Nascimento (2010, p. 256):
Na Antiguidade Romana - A cidade antiga - a família é tida como um grupo de
pessoas que a religião permitia invocar o mesmo deus manes. Tinha por obrigação
principal a celebração do culto aos mortos, oferecendo banquete fúnebre aos seus
antepassados. Uma família bastante patriarcalista, imperava a figura do marido, pois
este era encarregado de dar continuidade a sua família e do culto aos antepassados,
os seus deuses; ficando a mulher submissa e em situação inferiorizada, sem muitos
direitos. Tida assim, pois eles acreditavam que depois da morte haveria uma segunda
existência, além da nossa vida terrena, um local perto dos homens, era para eles a
própria casa, sendo necessário para dar continuidade à vida pós-morte, que os
parentes vivos, ficassem com a obrigação/dever de trazer a felicidade dos seus
deuses, uma sobrevivência feliz e para isso, a família devia sempre ser continuada.

Para Dantas (1991, p. 19), no direito romano a base da família era patriarcal sendo
que o pai detinha o poder sobre os seus filhos, netos, sua esposa, a esposa de seus filhos e de
seus netos, sendo que quem detinha o pátrio poder também era o responsável pelas finanças,
pois não existia o patrimônio da família mas sim o patrimônio do “pater famílis”.
Numa família bastante patriarcal, imperava a figura do marido, pois este era
encarregado de dar continuidade a sua família e do culto aos antepassados, os seus deuses;
ficando a mulher submissa e em situação inferiorizada, sem muitos direitos.
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Era assim entendida, pois acreditavam que depois da morte haveria uma segunda
existência e, nesta vida pós-morte, os parentes vivos ficariam com a obrigação/dever de trazer
a felicidade dos seus deuses. Isso era encarado como uma sobrevivência feliz e para isso, a
família devia sempre ser continuada.
De modo geral, a família vista por eles tinha a finalidade de perpetuar o culto dos
seus antepassados, de forma universal e abrangente. O princípio de todo o direito civil dessa
época girava em torno de manter a família, e em consequência o culto doméstico. Logo, a
família da antiguidade era protegida pela religião, o que foi a mola impulsionadora para o
crescimento da sociedade e a formação dos preceitos atuais. Em que pese ainda se guarde
obediência ao chefe familiar, hoje a família concebe igualdade de decisão e a chefia do lar
entre homem e mulher (NASCIMENTO, 2010).
Por sua vez, durante a idade média, o conceito de família traz o ensinamento de
que o casamento era algo obrigatório, mas não tinha por fim o prazer. Seu objetivo religioso
seria o culto doméstico dos seres, fazendo com que procriassem:
Durante a idade média, nas classes nobres, o casamento esteve longe de qualquer
conotação afetiva. A instituição do casamento sagrado era um dogma da religião
doméstica. [...] Desaparecia a família pagã, a cristã guardou esse caráter de unidade
de culto, que na verdade nunca desapareceu por completo, apesar de o casamento ser
tratado na história mais recente apenas sob o prisma jurídico e não mais ligado á
religião oficial do Estado. A família sempre foi considerada como célula básica da
igreja. (VENOSA, 2015, p. 21).

Nota-se que a família nessa seara era um modelo ainda patriarcal, com predomínio
do homem, na supremacia da relação conjugal e os laços de sangue prevaleciam, mas o afeto
nos matrimônios não existia: esses relacionamentos não se embasavam no amor (RENON,
2009, p. 84).
Com a evolução do pensamento e construção social, “a família atual contudo
difere das formas antigas no que concernem suas finalidades, composição e papel dos pais e
mães. [...] o homem vai para a fábrica e a mulher lança-se no mercado de trabalho”
(VENOSA, 2005, p. 6),
Da mesma maneira, Brito (2009, p. 59) tem a opinião que,
A chamada família contemporânea nasceu de profundas mudanças da dilatada
lacuna entre a família clássica e a família moderna. Com as constantes
transformações da sociedade, a família moderna adquiriu um novo paradigma,
acolhido por sua nova identidade, cujos valores se modificaram. A realidade das
famílias modernas esboçou uma revolução em sua organização, enfraqueceu o
autoritarismo do pai ao tempo que a mãe deixou o fogão para concorrer com os
homens no mercado de trabalho. Destarte, a sociedade transformou-se novamente,
posto que a mulher com sua habilidade influenciou positivamente o mercado de
trabalho, a política, a educação e o próprio homem.
18

Percebe-se então, que “na medida em que se evoluem os tempos, o ser humano, de
forma geral, altera seus hábitos e se desapega de velhos conceitos e princípios herdados pelos
antepassados trazendo profundas modificações nos padrões clássicos das famílias” conforme
abona Rizzardo (2009, p. 1).
No Brasil, a “tradição brasileira se adequou ao sistema romano germânico do
direito legislado, também conhecido como sistema do civil law, que é calcado na positivação
do direito pela norma” (GAGLIANO, 2009, p. 26).
Desde os primórdios desta civilização, os brasileiros foram considerados uma
sociedade onde o homem era o detentor de todo poder, assim como já visto em outras
civilizações ao longo do estudado, na época do Brasil império (OLIVEIRA, 2012, p.15).
Para Carmona (2010), o modelo patriarcal poderia ser entendido como um grupo
composto por núcleo conjugal e sua prole legítima em que se incorporavam parentes,
escravas, afilhados, agregados, concubinas e bastardos. Todos abrigados sob o mesmo
domínio, na casa grande ou na senzala, sob a autoridade do patriarca, que era considerado
dono de tudo, inclusive do mando político.
Tal modelo familiar entrou em crise no século XX, após vastos anos de
colonização portuguesa (CASSETARI, 2017).
Conforme texto descrito por Bezerra (2017, p. 187),
Foi escolhida uma Assembleia legislativa que elaborou a nova Constituição em três
meses. Na verdade, grande parte da redação ficou a cargo dos juristas Rui Barbosa e
Prudente de Morais. [...] A Constituição de 1891 determinava: A criação de três
poderes Executivo, Legislativo e Judiciário ficando extinto o Poder Moderador; A
separação entre o Estado e a Igreja Católica. O Estado seria o responsável pela
emissão de certidões e certificados e o clero católico deixaria de receber subvenção
do Estado; A liberdade de culto para todas as religiões; A garantia do ensino
primário obrigatório, laico e gratuito; A proibição do uso de brasões ou títulos
nobiliárquicos; A instituição do voto universal para cidadãos alfabetizados; A
criação do Poder Legislativo bicameral. Os deputados tinham um mandado de três
anos e os senadores nove anos. Isto pôs fim ao Senado vitalício; O surgimento do
Poder Legislativo provincial. Assim, as províncias poderiam criar suas próprias leis
e impostos, tendo mais autonomia em relação ao poder central.

Entretanto, há de se deixar claro que, em toda sua estrutura, houve apenas um


artigo que mencionava a entidade familiar de maneira genérica - artigo 72, § 4º - onde consta
a seguinte menção: “a República só reconhece o casamento civil, cuja celebração será
gratuita” (BRASIL, CF, 1891).
Pensamento esse que perdurou por longos anos, onde a família só era reconhecida
através do registro de casamento civil, pois “é o reconhecimento apenas do casamento civil
19

que precedia as cerimonias de qualquer culto” evidenciando mesmo que de forma sucinta
como era visão social de família da época, conforme aduz Rizzardo (2009, p. 19).
Houve nesse período da história algumas revoluções, e anos mais tarde entra em
vigor a constituição de 1934 abordando temas sobre a regulamentação da família em título
próprio e capítulo específico que tratou de mencionar que o casamento era indissolúvel.
Ainda, esclareceu que a família só era constituída através dele, com proteção do estado, e
poderia ser reconhecido casamento religioso com habilitação dos nubentes e através da
confissão do ministro religioso, desde que não contrariasse a ordem pública e os bons
costumes (BRASIL, CF, 1934).
Já na constituição denominada de “Estado Novo” ou “Constituição Polaca” de
1937, que nasceu fruto de um golpe de Estado e era entendida como uma “carta de inspiração
fascista, de caráter marcantemente autoritário e com forte concentração de poderes nas mãos
da Presidência da epública” conforme explicam Paulo e lexandrino (2013 p. 28), o
conceito jurídico de família constituída pelo casamento indissolúvel estaria em sintonia com o
contexto histórico, social e político da época.
Em continuidade, a Constituição do Brasil (CF, 1946), ao contrário das outras
legislações constituintes não foi precedida por uma comissão especial para discuti-la. Há de
ser entender que, nesta época acompanhavam-se todos os temores do fim da Segunda Guerra
Mundial e início da Guerra Fria, portanto a constituição de 1946 teve como alicerce a
Constituição de 1934 (CASTRO, 2008, p. 504).
Na Constituição de 1967 (BRASIL, CF, 1967), considerava-se que a família só
ocorria através do casamento, conforme fica evidenciado no dispositivo legal, que em seu art.
167 versa que a família é constituída pelo casamento, tendo direito à proteção dos poderes
públicos. Versa, ainda, que o casamento será indissolúvel e que o casamento religioso será
reconhecido a requerimento dos nubentes perante autoridade competente.
A Emenda Constitucional de 1969 (BRASIL, CF, 1969), inovou o ordenamento
jurídico brasileiro ditando que a família, sendo constituída através do casamento poderia ser
desfeita, havendo a separação judicial desde que passados três anos de separação conjugal.
Para Lenza (2011, p. 119) “sem dúvida dado o seu caráter revolucionário
podemos considerar a EC n. 1/69 como a manifestação de um novo poder constituinte
originário, outorgando uma nova carta”.
Abordando mais sobre as mudanças que ocorreram a partir de 1969, deve-se
entender que o país estava sendo governado por militares, e isso acarretava em
20

descontentamento geral por parte da sociedade que exigia nas ruas, via protestos e passeatas,
eleições diretas.
Conforme descrito no artigo jurídico de Vieira e Brito (2014, p. 74):
Em 1978, através do pacote de junho, foi revogado o AI-5 e vários dispositivos que,
baseados nele, cassavam direitos políticos; a suspensão do Congresso Nacional
tornou-se impossibilitada e, dessa forma, foram limitados o poder do chefe do
executivo. Em 1979, vários presos políticos, perseguidos pelo regime, são
anistiados; é reestabelecido o pluripartidarismo. Em 1982, tem-se eleição direta para
Governadores de Estado. Em 1983, inicia-se o movimento Diretas Já, que vai
propor a volta das eleições diretas para Presidente da República. O fim desse
período se dá com a posse de um presidente civil, José Sarney, que cumprindo
mandamento da EC 26/85, instala a Assembleia Nacional Constituinte, em 1987. Os
trabalhos desta Assembleia ultimam com a promulgação da vigente Constituição de
1988.

Para abordar a Constituição Federal de 1988, é preciso compreender que o país sai
de uma época de ditadura militar e é tangente a necessidade da construção de uma nova
organização social.
O doutrinador Cassetari (2017, p. 30) leciona que:
Justamente com a Constituição Federal de 1988 denominada “Constituição Cidadã”
acabou dando lugar à família afetiva, já que esse novo paradigma é que servira de
base para a construção do atual conceito de família. Assim sendo, a família
moderna possui a proteção estatal, ou seja, um direto subjetivo público oponível
erga omnes, que é adotado na grande maioria dos países, independentemente de
questões políticas e ideológicas. Com isso, podemos afirmar que a família moderna
possui amparo no princípio da solidariedade, que fundamenta e existência da
afetividade em seu conceito e existência e dá a á família uma função social
importante, que é a de valorizar o ser humano.

Portanto, pode-se dizer que a Constituição de 1988, chamada de constituição


cidadã, alargou o conceito de família, trazendo certa inovação, pois é possível reconhecer nela
a instituição familiar com e sem matrimônio e formada exclusivamente por qualquer dos pais
e seus descendentes.
Nesse sentido, para Dias (2016, p. 40), “família é todo agrupamento aonde seus
membros se veem como uma família” aqui o que liga essa relação é a afetividade, além dos
laços parentais aqui o laço afetivo é o principal liame de família. Entende-se que ocorreu a
humanização do direito das famílias quando “o legislador constituinte o alargamento do
conceito de família ao emprestar juridicidade ao relacionamento fora do casamento. Afastou
da ideia de família o pressuposto do casamento, identificando como família a união estável
entre o homem e uma mulher”.
Essa é a compreensão de Costa (2018, p. 6), sobre a evolução do texto
constitucional, “assim chamada em razão da evolução que promoveu nos direitos da
21

personalidade e da família, [..] o reconhecimento de novas entidades familiares, a igualdade


dos cônjuges e dos filhos e a facilitação do divórcio”.
Aceitando novas formas de arranjos familiares, o texto constitucional assim
prediz:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração. [...]
§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o
homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento. (Regulamento)
§ 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por
qualquer dos pais e seus descendentes.
§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente
pelo homem e pela mulher.
§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. (Redação dada Pela
Emenda Constitucional nº 66, de 2010).
§ 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade
responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado
propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada
qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. (BRASIL,
CRFB, 2018).

Para Gonçalves (2012, p. 35), as alterações advindas do texto constitucional de


1988, demonstram e ressaltam a função social da família no direito brasileiro.
Pode-se ratificar essa transformação no texto por meio de Buchmann (2013, p.
189) que explana que a “família consiste na unidade basilar da sociedade tendo sido a
primeira manifestação de agrupamento social verificada na História. No Brasil, tal instituto
sempre possuiu forte carga moral, representando e refletindo os valores vigentes a cada
época”.
Nota-se assim, com tantas transformações na sociedade e na família, o estudo do
direito de família apresenta-se em um momento muito difícil e delicado, através do
relaxamento dos costumes, das modificações sociais, tornando as normas antigas e novas
inadequadas constantemente, fazendo com que os operadores jurídicos sejam desafiados no
dia a dia (ARAÚJO JÚNIOR, 2008, p. 18).
Para Oliveira (2012, p. 5), a família brasileira sofreu grandes mudanças aos longos
dos anos, “de família patriarcal onde o homem era o responsável pelo sustento da família e
todos deviam a obediência a ele, até a chegada da revolução feminina, sendo inserida no
mercado de trabalho conquistando direitos iguais ao dos homens”.
Para ela também “com o divórcio se tornando cada vez mais comum e as
mulheres se tornando a rimo de família, os padrões foram mudando, e a família se
transformando e sendo acompanhadas pelo ordenamento jurídico” ( 2012, p. 6).
22

Desta forma, se faz necessário o pensamento do Ministro do Supremo Tribunal


Federal, Luiz Edson Fachin (2002, p. 8), em seu texto sobre família cidadã:
Passados séculos da revolução que se armou em torno da liberdade, da igualdade e
da fraternidade, não é serôdia a constatação de que a família tradicional passou por
uma transição paradigmática, na qual uma pluralidade de novos e complexos
arranjos são claramente evidenciados. E a afetividade (legatária da fraternidade)
desponta, nesse contexto, como fundamento principal nas relações familiares.

Por conseguinte, indispensável à explanação do instituto familiar no ordenamento


jurídico brasileiro para uma melhor percepção da temática.
23

3 CONCEITO DE FAMÍLIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Inicialmente, deve-se compreender que o conceito de família não é algo definido,


ele pode deve ser analisado como algo amplo, que abrange várias linhas de estudos que nos
levam a um melhor entendimento. Assim exemplifica Venosa (2005, p. 18):
A conceituação de família oferece, de plano, um paradoxo para sua compreensão. O
código civil não a define. Por outro lado, não existe identidade de conceitos para o
direito, para a sociologia e para antropologia. [..] Nos diversos direitos positivos dos
povos e mesmo em diferentes ramos de direito de um mesmo ordenamento, podem
coexistir diverso significados de família. [..] Desde modo, importa considerar a
família em um conceito amplo, como parentesco, ou seja, o conjunto de pessoas
unidas por um vínculo jurídico de natureza familiar. Neste sentido, compreendem os
ascendentes, descendentes e colaterais de uma linhagem, incluindo-se os
ascendentes, descendentes e colaterais do cônjuge, que se denominam parentes por
afinidade ou afins.

Já na Convenção Americana de Direitos Humanos (BRASIL, CADH, 1969) se


regulamentou, em seu artigo 17, que “a família é o núcleo natural e fundamental da sociedade
e deve ser protegida por esta e pelo Estado”.
Sobre o tema, evidencia-se que no ordenamento jurídico brasileiro há vários
ramos do direito que apresentam a definição do que vem ser a família, e qual o tratamento
jurídico dispensável a esse núcleo.
Em seu dispositivo legal, a constituição brasileira, mais conhecida como Carta
Magna, traz a seguinte definição sobre família: a família como a base da sociedade tendo
proteção especial do estado, sendo guiada principalmente pelo princípio da dignidade da
pessoa humana, e alargando o entendimento sobre unidades familiares, passando a
compreender como entidade familiar algo formado não só como antes, agora família torna-se
mais amplo, conforme artigo 226 (BRASIL, CRFB, 2018).
Fica evidenciado que o rol previsto no texto Constitucional é considerado por
grande parte da doutrina e operadores do direito como sendo apenas como exemplificativo,
como se observa na tese de dissertação de Lima (2018, p. 73):
Como se vê, doutrina e jurisprudência, modernamente, entendem que o rol do art.
226, da CF/88, é meramente exemplificativo. Não se tem limitado a compreensão de
família às entidades expressamente previstas no texto constitucional, admitindo-se
novas modalidades, criadas pela dinâmica das relações sociais, às quais se têm
reconhecido direitos de variadas espécies, notadamente, no que tange a alimentos,
direito sucessório e proteção processual. A dinâmica dos tribunais, em especial do
STJ, tem sido de que os tipos de entidades familiares explicitamente constantes na
Carta Magna não são numerus clausus, sendo o rol do art. 226, da CF/88, meramente
exemplificativo.
24

Sobre as mudanças que ocorreram no conceito de família no ordenamento jurídico


em questão, após a promulgação da Constituição de 1988, o ministro Fachin (1999, p. 149)
explana que:
O Código Civil em vigor, antes da Constituição de 1988, assentava-se em modelo
jurídico da família baseada no matrimonio, na desigualdade entre os sexos, no pátrio
poder e na transpessoalidade da família. Esse modelo foi vencido pela legislação
especial e posterior, pela doutrina, pelo papel construtivo da jurisprudência e pela
força criadora dos fatos. Essas quatros características fundamentais da família deram
lugar a um concepção constitucional da família, baseada em uma dimensão
sociológica e plural.

Atualmente, o Código Civil em vigência desde 2002, vem regulamentando de


forma mais ampla, definindo que “o parentesco é natural ou civil conforme resulte de
consanguinidade ou outra origem” em seu artigo 1.593 (BRASIL, CC, 2018).
Para Maria Berenice Dias (2010, p. 288) a família é considerada a base da
sociedade e merecedora da especial proteção do estado, não havendo apenas um conceito
fechado, e sim algo muito mais amplo, que necessita de todo cuidado ao ser apreciado em
todas as esferas sociais:
A família é igual em qualquer lugar do mundo e em todos os tempos, e LAR,
deve significar Lugar de Afeto e Respeito, é importante saber como os mais
diversos sistemas jurídicos regulam as relações familiares. Precisamos ter
coragem para ousar na busca da justiça, decantar a primazia dos direitos humanos e
assegurar tais direitos também no âmbito das relações familiares. Afinal, vivemos o
império do respeito à dignidade humana. (grifos da autora).

Assim, onde houver uma união de pessoas ligadas por laços afetivos, sendo esta
sua finalidade fundamental, haverá família.

3.1 MODALIDADES DE FAMILIA NO ORDENAMENTO JURIDICO BRASILEIRO

Com as modificações sociais ao longo do tempo, principalmente nos últimos anos,


atualmente existem diferentes tipos de famílias, com diferentes formas. Pode-se evidenciar
que as estruturas familiares se modificaram no espaço e no tempo, conforme as necessidades e
as expectativas do homem e da sociedade de cada época.
Para Coelho (2013, p. 27), as famílias brasileiras podem ser classificas no
ordenamento como sendo duas espécies, as constitucionais (estão presentes no texto
Constitucional no artigo 226) e as não constitucionais que são aquelas amplas, não abarcadas
pela Carta Magna, mas existentes no cotidiano social, como por exemplo, as parcerias entre
pessoas de mesmo gênero sexual e as não monogâmicas.
25

As famílias atuais, para tanto, podem ser divididas por afetividade e pelo
pluralismo familiar. A necessariamente essa forma de divisão pelo fato de que essa entidade
familiar é constituída indubitavelmente pelas relações de afeto, carinho, respeito e
solidariedade entre seus membros.
Esses elementos valorativos são encontrados em todas as espécies de famílias
regradas pelo ordenamento jurídico, conforme aduz Vianna (2011, p. 512):
O afeto, enquanto característica inata dos seres humanos, é mais do que uma
garantia constitucional, é um direito natural do homem. [...] A família atual está
vinculada ao elemento que explica sua função, a afetividade. O princípio da
afetividade compreende, sobretudo, a evolução do direito tornando-o aplicável a
todas as formas de manifestação da família, tendo como premissa uma nova cultura
jurídica que possa permitir a proteção e o reconhecimento estatal de todas as
entidades familiares, centrando-se no afeto como sua maior preocupação.

As modalidades familiares, em seus núcleos e arredores, são as mais variadas


possíveis. Aceitas ou não pelo ordenamento, não deixam de existir em nenhuma hipótese no
campo fático. O pluralismo da forma familiar é abstrato somente para o legislador, pois para
os operados jurídicos é existente desde os primórdios.

3.1.1 Famílias consanguíneas

Observar-se-á que o entendimento sobre a tipificação de família consanguínea


tido por Érrico (2018, p. 254) se enquadra como o mais preciso:
A família consanguínea é um tipo de organização familiar considerada como uma
das primeiras etapas no que foi a história da família. As principais características
deste tipo de família estão relacionadas com os laços de sangue que unem aos seus
integrantes. A família consanguínea é a que está baseada numa relação biológica. É
um tipo de família formada por familiares de sangue que são a base principal do
parentesco. Agora detalhamos uma série de características importantes da família
consanguínea, considerada como a primeira fase da família na sua história: Os
grupos conjugais classificam-se por gerações nesta etapa da família É uma família
uni lineal, pois são considerados parentes só os descendentes dum antepassado
comum. Isto quer dizer que os parentes são os que têm o mesmo sangue. O total dos
avôs e as avós nos limites da família são maridos entre eles. Isto também acontece
com os filhos. Aliás, neste tipo de família, os descendentes e ascendentes, pais e
filhos são os únicos que depois de estar longe ficam excluídos dos deveres que
implica o matrimônio.

Observa-se, portanto, que é a família em que existe uma relação conjugal


consanguínea, independentemente da estrutura em que se mantenha. Ainda, esses tipos
familiares são constituídos por pessoas com os mesmos laços sanguíneos.
26

3.1.2 Família monoparental

Essa entidade familiar foi reconhecida pela Constituição Federal como sendo base
da sociedade e tendo proteção especial do estado: “ rt. 226. § 4º ntende-se, também, como
entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”
(BRASIL, CRFB, 2018).
É o instituto familiar onde apenas existe um dos genitores, responsável pela
criação e educação da criança. Tornou-se um dos arranjos familiares mais conhecidos na
sociedade atual.
Em consonância, como colaciona Dias (2015, p. 2), tais mudanças no
entendimento “começaram a alargar o conceito de família. As mudanças chegaram à
Constituição Federal que enlaçou no conceito de família, outorgando-lhes especial proteção,
outras estruturas de convívio. [...] a chamada família parental: um dos pais e seus filhos”.
São aquelas famílias compostas, por exemplo, uma mãe e um filho, um pai e seus
filhos:
A família monoparental ou unilinear desvincula-se da ideia de um casal relacionado
com seus filhos, pois estes vivem apenas com um dos seus genitores, em razão de
viuvez, separação judicial, divórcio, adoção unilateral, não reconhecimento de sua
filiação pelo outro genitor, produção independente, etc. (DINIZ, 2002, p. 11).

De outra feita, o entendimento de Leite (2003, p. 22) sobre a temática diz que
“uma família é monoparental quando a pessoa considerada (homem ou mulher) encontra-se
sem cônjuge ou companheiro e vive com uma ou várias crianças”.
Pode-se observar que esta é uma forma comum de modelo familiar nos dias
atuais, a sociedade aceita e o reconhece como instituição familiar.

3.1.3 Famílias nucleares e extensas

São as famílias que podem ser conhecidas como naturais, nucleares - que incluem
os pais e os filhos, e extensas - que são que as mais tradicionais do ordenamento jurídico,
estando diretamente ligada a ideia de família biológica.
Para confirmar, Estatuto da Criança e do Adolescente afirma que:
Art. 25. Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou
qualquer deles e seus descendentes.
Parágrafo único. Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende
para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes
próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de
afinidade e afetividade. (BRASIL, ECA, 2018).
27

Estranha e engessadamente “parece que ninguém percebe que este conceito dispõe
de um pressuposto que vai além do consanguíneo”. A lei exige que exista um vínculo de
convivência, afinidade e afetividade da criança com algum parente como família extensa
(DIAS, 2016, p. 146).

3.1.4 Famílias reconstituídas, mosaicas ou pluriparentais

Para doutrina e jurisprudência essas famílias recebem diversas nomenclaturas,


mas são as famílias compostas por pessoas que emanaram de outros relacionamentos, e após
esses relacionamentos desfeitos, decidem recomeçar de alguma forma.
Segundo Karolina (2014, p. 185), essas famílias são reconhecidas como:
As famílias reconstituídas receberam nomes diversos pela doutrina e jurisprudência,
como famílias mosaico, famílias recompostas e famílias ensambladas, mas trata-se
de pessoas que fizeram parte de um núcleo familiar que por algum motivo se desfez,
e por consequência das necessidades dos seres humanos, como a de se
reconstituírem, passaram a fazer parte de um novo núcleo, agora com alguns
membros do núcleo anterior e alguns novos, que por sua vez terão de aprender a
conviver juntos. A dificuldade mais comum é a de estabelecer uma boa relação entre
os filhos da união ou casamento anterior com o (a) novo (a) cônjuge, até porque
muitas vezes os filhos são levados a acreditar que se dar bem com seu padrasto ou
madrasta será uma espécie de traição para com seus pais ou mães. Na realidade, o
que tem acontecido, com a praticidade e proximidade, em alguns casos, da vida
moderna, é que a relação com os padrastos/madrastas se tornam cada vez mais
próximas da relação com pais e mães, motivo pelo qual surge o afeto,
consequentemente o parentesco por afinidade, e com este os direitos e deveres.

Este modelo familiar é comumente conhecido pela frase: os teus, os meus, os


nossos.

3.1.5 Famílias homoafetivas

Esta entidade familiar, cada dia mais comum na sociedade hodierna, é composta
por pessoas do mesmo sexo ou da mesma identidade de gênero, que se unem pelos laços
afetivos.
Para Dias (2018, p. 5), essa é uma realidade atualíssima e mesmo que não tenha
regulamentação própria, precisa da tutela jurisdicional:
As uniões entre pessoas do mesmo sexo, ainda que não previstas expressamente na
Constituição Federal e na legislação infraconstitucional, fazem jus à tutela jurídica.
A ausência de regulamentação impõe que as uniões homoafetivas sejam
identificadas como entidades familiares no âmbito do Direito das Famílias. A
natureza afetiva do vínculo em nada o diferencia das uniões heterossexuais,
merecendo ser identificado como união estável. Preconceitos de ordem moral não
28

podem levar à omissão do Estado. Nem a ausência de leis nem o conservadorismo


do Judiciário servem de justificativa para negar direitos aos relacionamentos afetivos
que não têm a diferença de sexo como pressuposto. É absolutamente discriminatório
afastar a possibilidade de reconhecimento das uniões estáveis homoafetivas.
Descabido estabelecer a distinção de sexos como pressuposto para a identificação da
união estável.

Por haver falta de previsão legal que regulamente a união homossexual no Brasil,
e ter uma demanda pungente sobre o assunto, para essa modalidade familiar, nos casos
recorrentes no judiciário, usa-se uma interpretação extensiva e analógica da legislação, bem
como os princípios constitucionais para embasar as decisões de reconhecimento dessas
famílias.
Colaciona-se a informação sobre o Projeto de Lei n 2285 DE 2007, que ainda está
em tramitação na Câmara de Deputados, que traz em seu artigo 68 o reconhecimento sobre a
União Homoafetiva, evidenciando-se assim um avanço para a sociedade,
Art. 68. É reconhecida como entidade familiar a união entre duas pessoas de mesmo
sexo, que mantenham convivência pública, contínua, duradoura, com objetivo de
constituição de família, aplicando-se, no que couberem, as regras concernentes à
união estável. Parágrafo único. Dentre os direitos assegurados, incluem se:
I – guarda e convivência com os filhos;
II – a adoção de filhos;
III – direito previdenciário;
IV – direito à herança. (BRASIL, PL nº 2285, 2007).

Afirma-se ainda que:


As famílias homoafeitivas são as formadas por pessoas do mesmo sexo. O
reconhecimento da homoafetividade como união estável foi levado a efeito pelo
Supremo Tribunal Federal, no ano de 2011, em decisão unânime e histórica. O tema
acabou regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça. Agora é proibido negar
acesso ao casamento e impedir o registro das uniões homoafetivas, estando
assegurada a possibilidade de estas se transformarem em casamento. Também se
deve à iniciativa do Poder Judiciário assegurar aos homossexuais, vivendo sozinhos
ou em família, o direito de adotarem crianças, bem como fazerem uso das técnicas
de reprodução assistida. Agora esta é a realidade. Homossexuais casam, têm filhos,
ou seja, são uma família! Ativismo judicial? Não, interpretação da Carta
Constitucional segundo um punhado de princípios fundamentais. É a justiça
cumprindo o seu papel de fazer justiça, mesmo diante da lacuna legal. (DIAS, 2015,
p. 2).

Nota-se nessas unidades familiares que estas são baseadas em afeto e carinho
entre seus integrantes, valores esses que também se encontram presentes em todas as espécies
de família disciplinadas pela legislação pátria. Ainda que o “afeto, enquanto característica
inata dos seres humanos, é mais do que uma garantia constitucional, é um direito natural do
homem” (VIANNA, 2011, p. 527).
Noutras palavras, onde existir uma união de pessoas ligadas por laços afetivos
haverá uma família.
29

3.1.6 Famílias poliafetivas

Para compreender essa unidade familiar, precisa-se entender que não se compõem
somente por dois indivíduos – um casal, mas sim por mais de duas pessoas dentro de uma
mesma relação afetiva. Assustadoramente imoral para alguns, comumente aceito por muitos,
incluindo operadores do mundo jurídico, ainda que sem base legal.
No entendimento de Dias (2016, p. 143), favorável a este instituto:
Os termos são muitos: poliamor, família poliafetiva ou poli amorosas. O formato de
tais arranjos familiares também. No entanto, todas as formas de amor que foge do
modelo convencional da heteronormatividade e da singularidade, são alvo da
danação religiosa e, via de consequência, da repulsa social e do silêncio do
legislador. Ou o silêncio ou a expressa exclusão de direitos. Nada mais do que uma
vã tentativa de condenar à invisibilidade formas de amor que se afaste do modelo
monogâmico. Já a união poliafetiva é quando forma-se uma única entidade familiar.
Todos moram sobre o mesmo teto. Tem-se um verdadeiro casamento, com uma
única diferença: o numero de integrantes. [...] Traição e infidelidade estão perdendo
espaço.

E no posicionamento que faz resistência a esse tipo de “união familiar” temos


Silva (2012, p. 487), enfatizando que:
[...] deve ser notada a sedução que reside na utilização de expressões como
"poliamor" ou "poliafeto". Não se nega o agradável sentimento que decorre da
expressão afeto. Contudo, a expressão poliafeto é um engodo, um estelionato
jurídico, na medida em que, por meio de sua utilização, procura-se validar
relacionamentos com formação poligâmica. Esse tipo de relação é palco propício a
deixar mazelas nas pessoas que, excepcionalmente, assim convivem. Com efeito,
não há como se admitir, observados os contornos sociais e jurídicos brasileiros, que
o casamento e a união estável deixaram de ser monogâmicos. Em países africanos,
como na Tanzânia e em Guiné, ou, ainda, em países de religião muçulmana, há a
aceitação da poligamia, mas seus costumes são muito diversos dos brasileiros.

Ora observa-se que, no texto constitucional, o posicionamento é claro quanto ao


modelo reconhecido como entidade familiar:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem
e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento. (BRASIL, CRFB, 2018).

Neste óbice, os tribunais superiores em vários julgados têm negado diversos


pedidos de reconhecimento de união nesta forma poliafetiva.
Vive-se em um modelo de sociedade que adotou a monogamia como seu alicerce.
E para tanto, o poder estatal, para proteger a afirmativa de que família é a base da sociedade e
merece proteção do Estado, por meio de seus tribunais vem negando os pedidos de
30

reconhecimentos desse tipo de família, existente mas não aceita no ordenamento jurídico
vigente.

3.1.7 Família substituta

Essa modalidade familiar tem uma definição bem simples: é a família que passa a
suprir a família biológica da criança e do adolescente. E isso ocorre de forma permanente com
a adoção ou de forma eventual, transitória, denominadas de guarda ou tutela.
Esta modalidade familiar tem regramento próprio e previsto no Estatuto da
Criança e Adolescente de 1990. O art. 28 versa sobre a colocação do menor no lar substituto,
mediante guarda, tutela ou adoção. E os seguintes incisos e artigos vem regulamentando a
forma que se deve proceder nestes casos, como ouvir o menor sempre que possível, manter
irmãos unidos no mesmo grupo familiar e/ou sempre se levara em conta o grau de parentesco
ou afinidade e afetividade dessa família (BRASIL, ECA, 2018).
A família substituta pode ser constituída por qualquer pessoa maior de 18 anos, de
qualquer estado civil, e não precisa obrigatoriamente ter parentesco com a criança. A família
adotiva e o instituto da adoção, para Venosa (2005, p. 295):
É modalidade artificial de filiação que busca imitar a filiação natural. Daí ser
também conhecida como filiação civil, pois não resulta de uma relação biológica,
mas de manifestação de vontade [...]. A filiação natural ou biológica repousa sobre o
vínculo de sangue, genético ou biológico; a adoção é uma filiação exclusivamente
jurídica, que se sustenta sobre a pressuposição de uma relação não biológica,
mas afetiva. A adoção moderna é, portanto, um ato ou negócio jurídico que cria
relações de paternidade e filiação entre duas pessoas. O ato da adoção faz com que
uma pessoa passe a gozar do estado de filho de outra pessoa, independentemente do
vínculo biológico (grifos do autor).

Nessa espécie de família, observa-se que os membros não são aliados por laços
sanguíneos, mas sim por afinidade, carinho, compaixão e amor, ou seja, os pais não são os
pais biológicos dos filhos, mas agem como assim o fossem.

3.1.8 Família anaparental

É conceituada sendo como aquela família unida por algum laço de parentesco,
mas sem a presença dos pais. Organizada pela convivência entre parentes dentro de um
mesmo lar, com objetivos comuns, sejam eles de afinidade ou até mesmo econômico. Como
exemplo, podem-se citar dois irmãos ou primos que convivem juntos, tios e sobrinhos.
31

Em resumo, Dias (2015, p. 2) afirma que “as famílias anaparentais são


constituídas somente pelos filhos, sem a presença dos pais”.

3.1.9 União estável

União estável é uma união não passageira existente entre pessoas dispostas a
conviver em um vínculo de afinidade e amor.
Foi reconhecida como entidade familiar e regulada na Constituição de 88:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
[...]
§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o
homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento. (BRASIL, CRFB, 2018).

E o Código Civil, em seu artigo 1.723, passou a regular a União Estável da


seguinte maneira: “é reconhecida como entidade familiar a união entre homem e mulher
configurada na convivência pública, continua e duradoura e estabelecida com o objetivo de
constituição de família” (BRASIL, CC, 2018).
Segundo Araújo Júnior (2008, p. 72), ao considerar os limites legais, entende-se
“união estável como a união fática de um homem e uma mulher, com propósito de estabelecer
comunhão plena de vida, assumindo publicamente e mutuamente os companheiros a
qualidade de consortes, com base na igualdade de direitos e deveres”.
É socialmente a forma mais comum de relacionamento conjugal nos dias atuais,
exigindo, para ser reconhecido, somente um relacionamento público e a união contínua e
duradoura com o objetivo de constituir uma família.

3.1.10 Família matrimonial

Era a única modalidade de família reconhecida até a promulgação da CF de 1988.


Aqui as pessoas ingressam por vontade própria no instituto do casamento.
Conforme reforça Dias (2016, p. 152):
O casamento gera o que se chama de estado matrimonial, no qual os nubentes
ingressam por vontade própria, por meio da chancela estatal. Historicamente a
família nasce quando da celebração do casamento, que assegura os direitos e
impõem deveres nos campos pessoal e patrimonial. As pessoas têm liberdade de
casar, mas uma vez que se decidam, a vontade delas se alheia e só a lei impera na
regulamentação de suas relações. (grifo próprio)
32

Nessa acepção, o Código Civil Brasileiro regra em seu artigo 1.514 que: “o
casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a
sua vontade de estabelecer vínculo conjugal e o juiz os declara casados” (B S CC,
2018).
Ainda, o mesmo dispositivo legal limita-se a descrever os direito e deveres de
ambos os cônjuges:
Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
I – fidelidade recíproca;
II – vida em comum, no domicílio conjugal;
III – mútua assistência;
IV – sustento, guarda e educação dos filhos;
V – respeito e consideração mútuos. (BRASIL, CC, 2018).

Segundo entendimento embasado em tese de dissertação de mestrado, por Maluf


(2010, p. 126) entende que família matrimonial é:
Um ato solene, com forma prevista em lei, que tem em vista a formação de um
grupo social, que visa o amparo mútuo dos seus partícipes em todas as esferas da
vida íntima, baseado em afeição genuína, com finalidade e crescimento interior,
desenvolvimento das intrínsecas potencialidades, visando o bem-estar, a felicidade,
a perpetuação do ser humano em observância da higidez da sociedade.

Como exposto alhures, este foi por longos anos considerados o modelo único de
família aceito no ordenamento jurídico, mas com as mudanças culturais, e com a evolução
social, fez-se necessário ampliar as novas formas familiares.

3.1.11 Família sociafetiva

Primordialmente, no que tange as famílias socioafetivas, não há vinculo


sanguíneo, o que permeia essa relação basicamente é o afeto: “a socioafetividade nada mais é
que o estabelecimento de uma relação de parentesco que se inicia a partir de um convívio
social e que, dentro desta convivência, surge o afeto em sua esfera positiva”. (COSTA, 2011,
p. 8).
Observa-se que o Código Civil implicitamente aceita este novo instituto ao
proferir, em seu artigo 1.593, que “o parentesco é natural ou civil conforme resulte de
consanguinidade ou de outra origem” (BRASIL, CC, 2018).
Objetivamente, esse modelo familiar é baseado não nos liames sanguíneos, mas na
convivência de seus membros que nutrem entre si carinho e afeto.
firma Gama (2008 p. 348) que “com base no melhor interesse da criança, tem se
considerado a prevalência do critério socioafetivo para segurar a primazia da tutela dos filhos,
33

nos resguardos dos seus direitos fundamentais, notadamente, o direito a convivência


familiar”.
Conforme entendimento unânime na jurisprudência e na doutrina, a família
socioafetiva pode ser reconhecida quando preenchidos alguns requisitos: vontade clara e
inequívoca do apontado mãe ou do pai socioafetivo ao despender expressões de afeto à
criança, de ser reconhecido, voluntária e juridicamente, e da configuração denominada posse
de estado de filho (PEREIRA, 2009, p. 377).
Encerrando a temática sobre os existentes modelos familiares na sociedade
hodierna, a ponderação agora incide sobre o instituto da parentalidade socioafetiva e os
princípios que norteiam essas novas modalidades de unidades familiares.
Por meio destes princípios demonstrar-se-á qual o caminho que os operadores
jurídicos percorrem na busca de compreender melhor os novos institutos familiares.

3.1.11.1 Parentalidade socioafetiva

A parentalidade socioafetiva não é originária da paternidade biológica. O sentido


jurídico quer expor a ligação construída entre pessoas, as quais são unidas por algum fato
jurídico. O primeiro requisito para existir esse instituto é o laço de afetividade, e o elemento
indispensável para tornar essa relação existente é o tempo de convivência que faz nascer o
carinho o afeto e a cumplicidade nas relações humanas (CASSETARI, 2017, p. 33).
O mesmo doutrinador define o instituto da parentalidade socioafetiva como o
“vínculo de parentesco civil entre pessoas que não possuem entre si um vínculo biológico,
mas que vivem como se parentes fossem, em decorrência do forte vínculo afetivo existente
entre elas” (C SS T 2017 p. 17).
Já Diniz (2011, p. 469) afirma que o parentesco socioafetivo está baseado em uma
relação de afeto gerada pela convivência.
Nesse contexto, explica Lemos (2010, p. 148) que “a visão moderna do Direito de
Família é da existência de um núcleo familiar unido por relações de afeto, solidariedade e
amor, que buscam a realização da dignidade as pessoas humanas, com outras formas de
família merecedora de proteção do stado”.
Neste sentido, Dias (2017, p. 1) aduz em seu texto que fala sobre amores,
parentesco e responsabilidades:
Todos podem amar muitos, mas precisam assumir os ônus decorrentes da confiança
que gerou no outro e respectivos filhos. Daí a imposição da paternidade responsável,
a primazia da filiação socioafetiva, o reconhecimento judicial da multiparentalidade.
34

Esta é a única limitação cabível ao amor: a responsabilidade pelos seus afetos em


suas múltiplas facetas.

Assim preceitua Maluf (2012 p. 18) quando explana que “afetividade como a
relação de carinho ou cuidado que se tem com alguém intimo ou querido, como um estado
psicológico que permite ao ser humano demonstrar seus sentimentos e emoções a outrem”.
Após comprovada essa relação de parentalidade socioafetiva, tem-se como
consequência a multiparentalidade, para que esses institutos existam necessitam estarem
diretamente atrelados aos princípios constitucionais, assim como já ensinava Lôbo (2003, p.
42). Esse instituto efetiva o princípio da dignidade da pessoa humana e da afetividade,
reconhecendo no campo jurídico a filiação – amor, afeto e atenção - que já existe no campo
fático.
Tem-se primordial discorrer o conceito de multiparentalidade e como se dá o seu
reconhecimento no direito familiar.
35

4 DA MULTIPARENTALIDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO


E SEUS FEITOS NO DIREITO SUCESSÓRIO

A multiparentalidade é um instituto novo no sistema jurídico, ainda sem


regulamentação própria, mas que já tem forma e aceitabilidade nos tribunais. Esse instituto
versa sobre a possibilidade real de uma pessoa, em seu registro de nascimento, ter mais de um
pai ou mãe.
Cassetari (2017, p. 172) leciona a multiparentalidade de forma simples e objetiva
como sendo, “a hipótese de a pessoa ter três ou mais pessoas como pais no registro de
nascimento”.
Para Costa (2015, p. 235) o instituto é um fato jurídico contemporâneo,
“facilmente perceptível no âmbito de muitas famílias reconstituídas nas quais tanto o pai e
mãe biológicos quanto o padrasto e a madrasta, que acabam por funcionar como pais
socioafetivos, não de modo excludente, mas inclusivo e até mesmo complementar”.
O instituto, de forma sucinta e objetiva, é o parentesco constituído por múltiplos
pais, quando uma criança estabelece uma relação maternal ou paternal com pessoas que não
tem os mesmos liames biológicos. A multiparentalidade pode ser atribuída como
consequência da parentalidade socioafetividade, porque a família, ao deixar de ser,
essencialmente, um núcleo econômico e de reprodução, perdeu sua rígida hierarquia patriarcal
e tornou-se muito mais um espaço do amor e do afeto. Ficando assim mais humanizada, e
desta forma o afeto passou a ter um valor jurídico (PEREIRA, 2017).
Os laços de sangue não são fortes o suficiente para sustentar e garantir paternidade
e a maternidade, nem mesmo o liame jurídico predeterminado. Por isso é que se pode dizer
que a verdadeira paternidade é adotiva, isto é, se não se adotar, de fato e verdadeiramente, o
filho mesmo biológico, não haverá o laço fundamental que estrutura a relação de paternidade
maternidade (CASSETARI, 2017, apud PEREIRA, p. 14).
Pode-se evidenciar esse instituto presente na passagem bíblica sobre o nascimento
de Jesus, podendo ser um dos primeiros relatos de relação parental baseada no afeto e amor,
pois biologicamente José não era pai de Jesus, mas o criou como seu verdadeiro filho. Assim,
este é um dos primeiros núcleos familiares a estabelecer o vínculo socioafetivo (MATEUS,
1:18/25).
Reitera ainda Cassetari (2017, p. 20) que “não podemos esquecer que é
plenamente possível à existência de essa parentalidade biológica sem afeto entre pais e filhos,
36

e não é por isso que uma irá prevalecer sobre a outra, pelo contrario elas devem coexistir em
razão de serem distintas”.
Após o avanço nas relações familiares, como já estudado anteriormente, a
sociedade progrediu muito e passou admitir o instituto da pluriparentalidade, mormente
conhecido como multiparentalidade, tornando-a uma realidade que a justiça começou a
acolher.
Dias e Oppermann (2018, p. 74) afirmam que:
O evoluir da sociedade levou a uma verdadeira transformação da família, que passou
a ser referida no plural: famílias. Um mosaico da diversidade, um ninho de
comunhão de vida, cuja vocação é a realização pessoal de cada um de seus
membros, o respeito ao outro e a proteção das individualidades no coletivo familiar.
Nesta mesma perspectiva também a filiação foi alvo de profunda mudança. O afeto,
elemento identificador das entidades familiares, passou a servir de parâmetro para a
definição dos vínculos parentais. De um lado existe a verdade biológica,
comprovável por meio de exame laboratorial, que permite afirmar, com certeza
praticamente absoluta, a existência de um liame genético entre duas pessoas. De
outro lado há uma verdade que não mais pode ser desprezada: a filiação
socioafetiva, que decorre da estabilidade dos laços familiares construídos ao longo
da história de cada indivíduo e que constitui o fundamento essencial da atribuição da
paternidade ou maternidade.

Observa-se, contudo, que com a valoração do princípio da dignidade humana no


ordenamento jurídico do direito familiar, a pessoa passou a ser priorizada nas relações em
detrimento das questões meramente patrimoniais (CARDOSO, 2013, p. 78). A partir dessa
constatação, o direito de família restou entendido sob a égide desse princípio e as próprias
famílias deixaram de estar fundadas apenas no patrimônio e passaram ser regradas também
pelo afeto.
Nessa toada, Coelho (2013, p. 26) afirma que o direito de família apresenta a
irrefreável tendência à despatrimonialização das relações familiares, entendendo que “o
conjunto de duas ou mais pessoas vinculadas por relações especificas, tais as de
conjugalidade, ascendência e descendência, e no passado, definia-se em função de fatores
biológicos que aos poucos foram substituídos por vínculos de afeição”.
Atualmente, ressalta-se que é dentro do seio familiar que a dignidade da pessoa
vai se fortalecer, especialmente, em cada um dos seus membros e independentemente do
liame biológico ou afetivo. Através dessa convivência diária que são possibilitados o
desenvolvimento do afeto, amor, carinho e reciprocidade da vida e da felicidade (DINIZ,
2013, p. 37).
Cabe ressaltar conforme explana Pessanha (2011, p. 87), que não só da dignidade
humana, mas também do princípio da afetividade o instituto recebe amparo no mundo
37

jurídico, transformando as relações familiares modernas diretamente ligadas ao afeto: “a


afetividade, deve ser considerada como princípio constitucional implícito, ao aproximar
pessoas, dando origem aos relacionamentos que geram relações jurídicas, formando o status
familiar que contribui para a felicidade individual e/ou coletiva”.
Hodiernamente, dentro desses novos núcleos familiares, os indivíduos são unidos
por possuírem propósitos em comum, afeto e comprometimento mútuo, e não mais só
reconhecidas como família pelo casamento.
Dias (2016, p. 392) expõe que:
O primeiro foi ter deixado à família de se identificar pelo casamento. No momento
em que se admitiram entidades familiares não constituídas pelo matrimonio,
passou-se a reconhecer a afetividade como elemento constitutivo da família.
Essa mudança de paradigma não se limitou ao âmbito das relações familiares.
Refletiu-se também nas relações de filiação. Com isso o estado de filiação desligou-
se da verdade genética, relativizando-se o papel fundador da origem biológica
(grifos próprios).

Para entender melhor esse instituto devem-se compreender alguns conceitos


preliminares dessa relação jurídica familiar, um deles o ser debatido é a posse do estado de
filho.
É da relação de afeto duradouro diante de outras pessoas que se identifica a
parentalidade (paternidade ou maternidade). Mesmo não havendo previsão no ordenamento
jurídico, pode-se trazer a proteção à socioafetividade, como evidenciado no Código Civil no
dispositivo:
Art. 1.605. Na falta, ou defeito, do termo de nascimento, poderá provar-se a filiação
por qualquer modo admissível em direito:
I - quando houver começo de prova por escrito, proveniente dos pais, conjunta ou
separadamente;
II - quando existirem veementes presunções resultantes de fatos já certos. (BRASIL,
CC, 2018).

Para Nogueira (2001, p. 113/114), deve ser compreendido o conceito de posse de


estado de filho em primeiro lugar, e somente através dessa noção pode-se alcançar a
verdadeira filiação:
“posse de estado de filho” constitui a base sociológica da filiação é esta noção
fundada nos laços de afeto, o sentido verdadeiro de paternidade. Portanto é essa
noção que deve prevalecer em casos de conflitos de paternidade, quando as
presunções jurídicas já não bastam e não convencem, ou quando os simples laços
biológicos não são suficientes para demonstrar a verdadeira relação entre pais e
filhos. Não são os laços de sangue nem as presunções jurídicas que estabelecem
um vínculo entre uma criança e seus pais, mas o tratamento diário de cuidados,
alimentação, educação, proteção e amor, que cresce e se fortifica com o passar
dos dias. (grifo próprio)
38

Cabe ressaltar, que para caracterizar a posse do estado de filho, faz-se necessário
entender quais elementos estão incutidos nesse novo instituto: “a atribuição de nome o
tratamento de filho e o reconhecimento no meio social dessa relação paterno-filial devem ser
públicos notórios estáveis e inequívocos” (N 2014 p. 2).
Complementa-se que a caracterização da filiação sociológica com base na posse
de estado de filho é consequentemente aferida de modo objetivo, mantendo-se, dessa forma, a
segurança jurídica das relações sociais.
E, por corolário lógico, a filiação socioafetiva, que tem como fundamento a posse
de estado de filho, é construída no dia-a-dia, lastreada no afeto, assim como descreve Tartuce
(2017, p. 56):
A filiação decorrente de vínculo exclusivamente socioafetivo é questão que encontra
amparo na Constituição Federal, no Código Civil e no Estatuto da Criança e do
Adolescente. A jurisprudência dos Tribunais estaduais e superiores já admitem
como uma realidade a possibilidade de registro da paternidade socioafetiva. [...]
A premissa afirmada é confirmação de um antigo dito popular, emanado da
expressão pai é quem cria (grifo próprio).

Para garantir a segurança jurídica na caracterização da posse de estado de filho, a


doutrina reforça que todos os elementos constitutivos deste estado devem estar presentes no
reconhecimento da filiação socioafetiva de forma pública, inegável e continuada (FACHIN,
2004, p. 109).
Para Gomes (1999, p. 394) faz-se necessário que esses elementos sejam
preenchidos pelos dos envolvidos na relação: sempre ter levado o nome dos presumidos
genitores, ter recebido continuamente o tratamento de filho, ter sido constantemente
reconhecido pelos presumidos pais e pela sociedade como filho legítimo.
Portanto, entende-se que a partir da posse de estado de filho (filho de criação)
reconhecida pela justiça que se tem o marco para o reconhecimento de multiparentalidade,
pois passa a existir no campo jurídico o que já ocorre no mundo dos fatos (SALOMÃO,
2017).
Reafirmando a existência do direito à convivência familiar a todos, exercida por
meio da paternidade biológica em conjunto com a paternidade socioafetiva, não há que se
falar da existência de uma em detrimento da outra, pois nesses casos elas coexistem. Esse é o
entendimento de Dias (2015, p. 406):
Para o reconhecimento da filiação pluriparental basta flagrar o estabelecimento do
vínculo de filiação com mais de duas pessoas. Coexistindo vínculos parentais e
biológicos, mais do que apenas um direito, é uma obrigação constitucional
reconhecê-los, na medida em que preserva direitos fundamentais de todos
envolvidos, sobretudo a dignidade e afetividade da pessoa humana. Já sinalizou o
STJ que não pode passar despercebida pelo direito a coexistências de relações filiais
39

ou a denominada multiplicidade parental, compreendida como expressão da


realidade social.

Acompanham o mesmo entendimento Rodrigues e Teixeira (2010, p. 89) quando


doutrinam que “a multiparentalidade inaugura um novo paradigma do Direito Parental no
ordenamento brasileiro. Para que ela se operacionalize, contudo, é necessária que seja
exteriorizada através de modificações no registro de nascimento”.
De forma singela, mas de maneira a se fazer entender, pode-se afirmar que a
multiparentalidade é a possibilidade jurídica de inserção de mais de um pai ou de uma mãe no
registro civil da pessoa. Já é realidade jurídica legal no Brasil, apesar da lentidão legislativa
no âmbito, conforme Santos (2014).
Este instituto só é solidificado na certidão de nascimento quando do registro civil
pois amplamente embasado e norteado pelo principio da dignidade humana e o da afetividade,
explanados a frente.

4.1 BREVE EXPLANAÇÃO DOS PRINCÍPIOS QUE NORTEIAM O INSTITUTO DA


MULTIPARENTALIDADE

Fala-se em embasamento por princípios, pois são estes que cimentam as


construções legislativas e suas consequentes alterações civis. Não há alteração legislativa e
permissão da modificação do registro civil sem que houvesse a somatização dos princípios
que nutriram a mudança social.
A dignidade humana, além da afetividade de um para com o outro, são as bases
para a construção social voltada para a pragmatização do sentimento humano no judiciário
brasileiro.

4.1.1 Da dignidade da pessoa humana

É o princípio que está diretamente ligado a pessoa, conforme explana Amorim


(2017, p. 21):
A família na contemporaneidade é formada como base nos laços de afeto, esta é a
mola propulsora das novas entidades familiares, de forma a buscar a plena realização
de integrante da entidade familiar e a concretização da tão sonhada felicidade. A
família deve antes de tudo possibilitar a felicidade de seus membros, fazer como que
cada um sinta-se satisfeito em compor o ciclo familiar. Portanto, o conceito atual de
família está ligado aos princípios da dignidade da pessoa humana e ao da
solidariedade, de forma a propiciar aos seus integrantes plena felicidade e
consequente realização pessoal. A família deve ser um ambiente de respeito, onde
40

seus membros ajudem uns aos outros, colaborem na formação um do outro, deve ser
um lugar de concretização de projetos de vida e realização interior.

Como expõe Costa (2011, p. 18), esse princípio “é a base de todo o ordenamento
jurídico brasileiro, sendo considerado o mais importante. É com base neste princípio que se
impõe um tratamento digno e isonômico a todas as pessoas, estendendo a qualquer tipo de
filiação ou família”.
Para Dias (2012, p. 62) esse princípio da dignidade humana é o mais universal de
todos os princípios. É um macroprincípio do qual se irradiam todos os demais: liberdade,
autonomia privada, cidadania, igualdade, uma coleção de princípios éticos.
Conforme leciona Pereira (2005, p.100), o princípio da dignidade da pessoa
humana “significa em primeira e última análise igual dignidade para todas as entidades
familiares”.
Não há como falar na instituição familiar sem que se fale na dignidade da pessoa
humana. Há vínculo entre ser individuo de uma família e ter o mínimo existencial para
sobreviver, pois, em sua gênese, família é a proteção do individuo e de sua existência.

4.1.2 Da afetividade

Primeiramente, frise-se que o princípio da afetividade não possui texto legal. Os


operadores jurídicos ao se depararem com a demanda em crescimento de novas formas de
estruturas familiares observaram a necessidade de nortear essas situações e a forma
encontrada foi usar esse princípio de forma análoga.
Dias (2018, p. 67) sintetiza de forma perfeita o afeto nas relações familiares
quando diz que “o afeto deve ser visto como uma realidade digna de tutela”.
Nesse sentido temos como base de referência, o parágrafo 6º do artigo 227 da
Carta Magna, que dispõe sobre a afetividade ao declarar que “os filhos, havidos ou não da
relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas
quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação” (B S CRFB, 2018).
O Código Civil, ao autorizar o parentesco por outra origem que não a
consanguinidade, desdobrou-se em novas lacunas para interpretação, ao abarcar as relações de
parentesco resultantes também de afeto e não só de laços sanguíneos, como estabelece o Art.
1.593: “o parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”
(BRASIL, CC, 2018).
41

Para Pereira (2012, p. 59), pode-se ter a compreensão que esse princípio não está
expressamente escrito em texto constitucional, mas veio de encontro com as necessidades
sociais familiares conforme fica evidenciado, pois:
em que pese não estar positivado no texto constitucional, pode ser considerado um
princípio jurídico, à medida que seu conceito é constituído por meio de uma
interpretação sistemática da Constituição Federal (art. 5, § 2º, CF), princípio é uma
das conquistas advindas da família contemporânea, receptáculo de reciprocidade de
sentimentos e responsabilidades. Pode-se destacar o anseio social a formação de
relações familiares afetuosas, em detrimento da preponderância dos laços
meramente sanguíneos e patrimoniais. Ao enfatizar afeto, a família passou a ser uma
entidade plural.

O instituto afetividade constitui um princípio jurídico aplicado na entidade


familiar, explicito e implícito no ordenamento jurídico brasileiro:
A afetividade é um dos princípios do direito de família brasileiro, implícito na
Constituição, explícito e implícito no Código Civil e nas diversas outras regras do
ordenamento. Oriundo da força construtiva dos fatos sociais, o princípio possui
densidade legislativa, doutrinária e jurisprudencial que permite a sua atual
sustentação de lege lata. (TARTUCE, 2017, p. 1.231).

Nesse sentido também liveira (2002 p. 242) reafirma que “a família só tem
sentido enquanto unida pelos laços de respeito, consideração amor e afetividade”. Devido à
importância, o princípio da afetividade é capaz de gerar vínculos jurídicos de filiação
socioafetiva, a partir da relação de afeto, carinho e cuidado.
Portanto, podemos afirmar que desses vínculos jurídicos gerados através do afeto,
carinho e cuidado, nascem os novos institutos familiares, como é o caso da multiparentalidade
estas inovações vem sendo amplamente abarcadas pela jurisprudência atual. São somatizações
advindas do sentimento que trazem consequências diretas no mundo jurídico (CASSETARI,
2017, p. 16).
Muito embora sabido de outros vários princípios que norteiam o direto de família,
indispensável à explanação destes acima, apenas, pois instransponíveis quando se fala do
pedido de reconhecimento da multiparentalidade, seja na via judicial ou outra possível.

4.2 MULTIPARENTALIDADE NO DIREITO DE FAMÍLIA

Inicialmente pode-se compreender que com a modificação do conceito de família


na evolução história da humanidade, o ponto de maior valor e elo familiar tende a ser a
realização pessoal de seus membros (DIAS, 2016 p. 26), o que inclui alterações civis.
42

Numa visão hermenêutica, o instituto apresenta a percepção de que os laços


afetivos são tão relevantes quanto os laços consanguíneos. Em algumas situações os laços
afetivos tornam-se superiores aos laços consanguíneos, pois são aqueles que efetivamente
concretizam os elos familiares: o amor mútuo, o respeito e a solidariedade (NOGUEIRA,
2014, p. 22).
Afirma Diniz (2011, p. 469) que “o parentesco socioafetivo está baseado numa
relação de afeto, gerada pela convivência”. Atualmente, a família é um organismo que se
estrutura mais sob o prisma das relações afetivas e solidárias, sendo descentralizada,
democrática e menos voltada ao patrimônio ou construção material (FARIAS;
ROSENVALDO, 2014, p. 28).
Não os laços sanguíneos, mas sim o afeto é fundamental para caracterizar uma
relação parental. Pretto (2013, p. 29) expõe que “mais que o sangue mais que a adoção de
uma criança, a socioafetividade é a criação e a alimentação diária da convivência e do respeito
que há entre pessoas que se enxergam e vivem como pais e filhos”.
Sobre filiação, leciona Lôbo (2011) que “a filiação não é um dado da natureza e
sim uma construção cultural, fortificada na convivência, no entrelaçamento dos afetos, pouco
importando sua origem”.
Os fundamentos que embasam a aceitação do reconhecimento da
multiparentalidade no Direito de Família estão espalhados pelo ordenamento, sejam
legislados, sejam construídos jurisprudencialmente.
Primeiramente, encontra-se fundamentação no Código Civil, em seu artigo 1.593,
já explanado anteriorente, que afirma o parentesco como natural ou civil e que tem íntima
relação com o artigo 227 parágrafo 6º da Constituição Federal que determina que “os filhos
havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e
qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”
(BRASIL, CRFB, 2018).
Já no enunciado nº 103 do Conselho de Justiça Federal:
O Código Civil reconhece, no art. 1.593, outras espécies de parentesco civil além
daquele decorrente da adoção, acolhendo, assim, a noção de que há também
parentesco civil no vínculo parental proveniente quer das técnicas de reprodução
assistida heteróloga relativamente ao pai (ou mãe) que não contribuiu com seu
material fecundante, quer da paternidade sócioafetiva, fundada na posse do estado de
filho (BRASIL, CFJ, 2018).

Nesse sentido, colaciona-se a Lei 11.924/2009 que alterou e incluiu mais um


inciso no texto legal de 6.015/73. Passa a ser possível e legal a possibilidade de o enteado ou
43

enteada adotar o patronímico da família do padrasto ou da madrasta. Conforme artigo 57, e


inciso § 8o: “havendo motivo ponderável e na forma dos §§ 2 o e 7o deste artigo, poderá
requerer ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o nome de família
do cônjuge dos pais, desde que haja expressado concordância destes, sem prejuízo de seus
apelidos de família” (BRASIL, LEI Nº 6.015/73, 2018).
Kirch e Copatti (2013, p. 45) explanam sobre essa legitimação do padrasto e
madrasta em reconhecer como seu filho, sem que se considere uma adoção unilateral o
reconhecimento do vinculo afetivo, pois os padrastos ou madrastas que amam e cuidam não
desconsideram o cuidado e criação dos pais biológicos. A inclusão de um e alteração do
registro civil não ocorre com a saída do outro, necessariamente.
Nesse sentido a Corte Suprema decidiu em caráter de repercussão geral
priorizando e pacificando o afeto, entendendo que “a paternidade socioafetiva, declarada ou
não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante,
baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios”. (B S RE nº 898.060,
2016).
Desta feita, além de solucionar controvérsias ainda existentes em relação à
parentalidade socioafetiva, este entendimento abriu as portas do sistema jurídico brasileiro
para o fenômeno da multiparentalidade, também chamado de pluriparentalidade. A decisão é
fruto de longa transformação operada no direito de família vivenciada pelas necessidades
sociais: uma sociedade com relações baseadas puramente em afeto (AMORIM, 2017, p. 15).
Conforme Abreu (2014, p. 98) “a multiparentalidade é uma forma alternativa de
efetivar o princípio da dignidade humana e da afetividade, possibilitando o reconhecimento de
elementos subjetivos como amor, afeto, cuidado”.
Essa afirmativa cimenta o entendido na Constituição Federal de 1988 sobre o
afeto, tendo assim tanta relevância jurídica quanto à comprovação de liame biológico, não
havendo qualquer tipo de sobreposição entre um e outro (DIAS, 2015, p. 407).
A partir do reconhecimento desse liame afetivo, surgem algumas consequências e
efeitos pragmáticos.

4.3 EFEITOS DO RECONHECIMENTO DA MULTIPARENTALIDADE

Quais os efeitos decorrentes do afeto após o reconhecimento do instituto? Como


bem enumerado por Leite (2004, p. 193), do reconhecimento da multiparentalidade surgem o
44

“direito ao parentesco, direito ao nome, direito à convivência e guarda direito a alimentos, e


direito à herança”.
O avanço no direito de família respeita, principalmente e além da legislação, as
mudanças sociais e as interações humanas. Kirch e Copatti (2013, p. 74) são incisivos ao
afirmar que “o que identifica a família na atualidade é a presença do afeto unindo as pessoas.
A multiparentalidade se propõe então a legitimar a maternidade ou paternidade daquele que
ama, educa e cria como se pai fosse, sem desconsiderar a mãe ou pai biológico”.
Portanto é manifesto que, nos dias atuais, nas relações familiares está presente a
afetividade como norteamento primordial, e os indivíduos são tratados com igualdade,
gerando assim todos os efeitos existentes em uma relação filial.
Corroborando esta afirmativa, os enunciados do Instituto Brasileiro de Direito de
Família assim afirmam:
Enunciado 06 - Do reconhecimento jurídico da filiação socioafetiva decorrem todos
os direitos e deveres inerentes à autoridade parental.
Enunciado 07 - A posse de estado de filho pode constituir paternidade e maternidade
[...].
Enunciado 09 - A multiparentalidade gera efeitos jurídicos (IBDFAM, 2018).

Essa declaração judicial tem efeito ex tunc, ou seja, retroage ao momento em que
iniciou a vinculação, abarcando todos os atos praticados antes da prolação da sentença
(PRETTO, 2013, p. 31).
Portanto, dessa sentença judicial ou reconhecimento voluntário em cartório,
criam-se efeitos no mundo jurídico quais sejam: “Direito ao Parentesco, Direito ao Nome,
Direito à Convivência e Guarda, Direito a Alimentos, Direito à Herança entre outros”
(LOUZADA, 2015, p. 34)

4.3.1 Da extensão do parentesco

Pode-se denominar que o primeiro efeito do reconhecimento do fenômeno da


multiparentalidade se dá na própria relação de parentesco/filiação. É previsível esse efeito,
pois ao estabelecer o vínculo de parentesco entre o filho socioafetivo e entre todos os parentes
de ambos os pais ou mães, todas as linhas de parentesco produzirão seus efeitos, incluindo as
sucessórias.
Sobre a temática Cassetari (2017, p. 121) afirma que,
A extensão da parentalidade que se forma entre pais e filhos socioafetivos, pois irá
alterar a arvore genealógica e dará ao filho novos ascendentes e colaterais. Se o filho
socioafetivo já se tornou um pai, seu rebento irá, também, ganhar novos ascendentes
45

e colaterais. Assim, teríamos também a figura de irmão socioafetivo, no primeiro


caso; e de avô e tio socioafetivos, no segundo.

As relações de parentesco estão reguladas no Código Civil, no artigo 1.591 e


seguintes que dividem as relações parentais em linhas retas e colaterais. Estão abrangidos em
linha reta os parentes ascendentes e descendentes, e os de linhas colaterais os compreendidos
como as pessoas que provem de um tronco só, ate o quarto grau (BRASIL, CC, 2018).
Assim, o filho teria parentesco em linhas retas e colaterais (enfatizando que
apenas até o quarto grau) com a família do pai/mãe afetivo e pai/mãe biológicos, fazendo
valer todas as disposições expressas em lei quanto ao direito de família incluindo, por
exemplo, impedimentos matrimoniais e sucessórios (CASSETARI, 2017, p. 122).
Acerca do tema, Barbosa (2009, p. 33- 34) explana que:
O parentesco socioafetivo produz todos e os mesmos efeitos do parentesco natural.
São efeitos pessoais: (a) a criação de vínculo de parentesco na linha reta e na
colateral (até o 4º grau), permitindo a adoção do nome da família e gerando
impedimentos na órbita civil, como os impedimentos para casamento, e pública,
como os impedimentos para assunção de determinados cargos públicos; (b) a criação
do vínculo de afinidade. Sob o aspecto patrimonial são gerados direitos (deveres) a
alimentos e direitos sucessórios. O reconhecimento do parentesco com base na
socioafetividade deve ser criterioso, uma vez que como demonstrado, envolve
terceiros, aos necessariamente envolvidos na relação socioafetiva, mas que
certamente serão alcançados pelo dever de solidariedade que é inerente às
relações de parentesco. (grifo próprio)

Portanto, pode-se salientar, ainda, que, embora exista constante referência


somente à “paternidade” ou “maternidade” socioafetiva a criação do vínculo por óbvio se
estende aos demais graus e linhas de parentesco, passando a produzir todos os efeitos
patrimoniais e jurídicos pertinentes, englobando todos os membros pertencentes à entidade
familiar.

4.3.2 Do direito a mudança ao nome e inclusão dos pais e avós no registro civil

Quanto ao registro civil, conforme trata a Constituição Federal em seu artigo 1º,
inciso III, onde versa como direito fundamental da dignidade pessoa humana, o direito do uso
do nome do pai pelo seu filho é entendimento uniforme entre a doutrina e jurisprudência, não
podendo ser vedado a quem lhe deseja fazer uso e tem direito (BRASIL, CRFB, 2018).
Ainda sobre a temática do nome, convém trazer os ensinamentos de Venosa
(2015, p. 26):
O nome é, portanto, uma forma de individualização do ser humano na sociedade,
mesmo após a morte. Sua utilidade é tão notória que há exigência para que sejam
46

atribuídos nomes a firmas, navios, aeronaves, ruas, praças, acidentes geográficos,


cidades etc. O nome, afinal, é o substantivo que distingue as coisas que nos cercam,
e o nome da pessoa a distingue das demais, juntamente com os outros atributos da
personalidade, dentro da sociedade. É pelo nome que a pessoa fica conhecida no seio
da família e da comunidade em que vive. Trata-se da manifestação mais expressiva
da personalidade.

Conforme o artigo 54, da Lei de Registros Públicos, não há nenhum impedimento


para alteração do nome da pessoa advindo da relação parental socioafetiva (BRASIL, LRP,
2018). Cabe ressaltar que, depois de reconhecida a multiparentalidade, o nome do filho, sem
qualquer impedimento legal, poderia ser composto pelo prenome e o apelido de família de
todos os genitores (ABREU, 2014).

4.3.3 Das obrigações de alimentar

A obrigação alimentar gerada pelo reconhecimento da parentalidade socioafetiva,


poderá se estender a todos os envolvidos nessa relação familiar, podendo recair sobre os
ascendentes, descendentes e colaterais (CASSETARI, 2017, p. 124).
Conforme disposto no artigo 1.696, do Código Civil, “o direito à prestação de
alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a
obrigação nos mais próximos em grau uns em falta de outros”. (BRASIL, CC, 2018).
Compreende-se, então, que a obrigação de alimentar será reciproca entre os
parentes biológicos e afetivos, portanto todos seriam credores e devedores de alimentos em
relação ao filho, respeitando, obrigatoriamente, o binômio possibilidade/necessidade
conforme o dispositivo legal supracitado e em seu parágrafo primeiro (BRASIL, CC, 2018).
Cassetari (2017, p. 133) complementa ainda que “a parentalidade socioafetiva
gera outro efeito, além do alimentar: a necessidade de anotação no registro de nascimento,
para evitar demandas meramente patrimoniais”.
Portanto, desde que calcada a relação socioafetiva nos requisitos antes expostos,
cabe a obrigação alimentar do pai para com o filho, conforme IV Jornada de Direito Civil,
realizada no Conselho de Justiça Federal: Enunciado n 341, Artigo. 1.696. Para os fins do art.
1.696, a relação socioafetiva pode ser elemento gerador de obrigação alimentar (BRASIL,
CJF, 2018).
Por fim, é importante ressaltar que a legislação vigente assegura que a prestação
de alimentos é recíproca entre pai e filho. Portanto, todos os pais poderão prestar alimentos ao
filho, bem como estes poderão prestar alimentos a todos os pais.
47

4.3.4 Da guarda de filho socioafetivo menor

Juridicamente, não há dificuldades em resolver o problema da guarda de filhos,


ainda que seja reconhecida e aceita a multiparentalidade.
Diante do princípio do melhor interesse da criança e do adolescente que está
previsto na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227, caput, e no Estatuto da Criança e
do Adolescente em seus artigos 4º, caput, e 5º, é primordial o direito a convivência da criança
com seus pais biológicos e socioafetivos (BRASIL, ECA, 2018).
O Código Civil regra as formas de guardas existentes, visando a proteção do
individuo enquanto filho, trazendo duas hipóteses: guarda unilateral ou compartilhada
(BRASIL, CC, 2018).
Sobre guarda unilateral, o dispositivo trata como sendo aquela atribuída a um só
dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5 o) e, por guarda compartilhada a
responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam
sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns (BRASIL, CC, 2018).
Ainda na guarda compartilhada do mesmo artigo, § 2º, o tempo de convívio com
os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em
vista as condições fáticas e os interesses destes (BRASIL, CC, 2018).
Atente-se para o fato de que a ordem de prioridade de interesses foi invertida,
posto que, antigamente, se houvesse algum conflito decorrente da posse do estado de filho,
entre a filiação biológica e a filiação socioafetiva, os interesses dos pais biológicos se
sobrepunham aos interesses do filho. Isso porque se primava pelos vínculos sanguíneos e
biológicos, ou seja, a hegemonia da consanguinidade (ABREU, 2014).
Cassetari (2017, p. 135) leciona que atualmente essa realidade é tratada de forma
diferente por nossos tribunais “tanto o pai ou mãe socioafetivos terão direito a guarda pois
não há preferência para o exercício da guarda, o que deve ser atendido é o melhor interesse da
criança”.
Observa-se, portanto, que o critério mais adequado a ser ponderado nesses casos é
o que equilibre de fato os princípios constitucionais que resguardam o melhor interesse da
criança, o da afetividade, o da solidariedade familiar, o da dignidade da pessoa humana, tudo
em busca de preservar as relações familiares.
48

4.3.5 Do direito de visitas a todos familiares

O direito de visitas foi ampliado quando houve a promulgação da Lei nº


12.398/2011. O que até então era permitido apenas aos genitores, fora estendido aos avós.
Esta lei veio acrescentar um parágrafo único ao artigo 1.589 do Código Civil que consta
seguinte teor:
Art. 1.589. O pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá visitá-los e
tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado
pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação. Parágrafo único. O
direito de visita estende-se a qualquer dos avós, a critério do juiz, observados os
interesses da criança ou do adolescente (BRASIL, CC, 2018).

Portanto, após definida a guarda, o direito de acompanhar a evolução da pessoa


caberá a todos os envolvidos na relação, podendo todos estes reivindicar o direito de visitas
regulado de forma igualitária a fim de estreitar os vínculos afetivos (CASSETARI, 2017, p.
136).

4.3.6 Dos direitos sucessórios

A partir do momento em que se reconhece a multiparentalidade socioafetiva, a


pessoa que obteve esse reconhecimento passa a ter todos os direitos advindos da relação filial,
garantindo-se inclusive o direito a herança (VIEIRA, 2015, p. 95).
Ademais os direitos de suceder, nos casos de multiparentalidade, são reconhecidos
entre pais e filhos, e seus parentes, observada a ordem de preferência e vocação hereditária
disposta nos artigos 1.829 a 1.847, do Código Civil (BRASIL, CC, 2018).
Segundo Nader (2009, p. 261):
O avanço que se constata com a desbiologização do parentesco em prol de vínculos
socioafetivos não se deve situar exclusivamente no plano teórico, afirmação de
princípios, mas produzir efeitos práticos no ordenamento jurídico como um todo,
repercutindo, inclusive, no âmbito das sucessões.

Assim, reitera-se que ao reconhecimento da multiparentalidade são inerentes


todos os direitos de família ou sucessórios, conforme enunciado nº 9 do Instituto Brasileiro de
Direito de Família.

4.3.7 Conflito entre genitores


49

Cabe ressaltar, neste momento, que “as decisões mais importantes da vida da
criança (formação escolar, educação religiosa, atividades extracurriculares), e as decisões da
vida cotidiana cabem à pessoa com quem a criança reside” (SEVERINO, 2011, p. 63).
Se as tomadas de decisões, fiscalização e supervisão do desenvolvimento do
menor ou do indivíduo enquanto filho entrarem em conflito entre os pais biológicos e afetivos
estará o judiciário apto a julgar essa lide. Assim estabelece a lei civil em seus dispositivos,
artigo 1.517 e 1.567 do Código Civil (BRASIL, CC, 2018).
O reconhecimento do vinculo plural socioafetivo, tornando o registro civil
multiparental, detém titulares e procedimentos específicos de concessão. Em que pese
advindo de uma construção social, a legitimação é criteriosa.

4.3.8 Procedimento para o reconhecimento da multiparentalidade

Nas demandas envolvendo famílias multiparentais, deve-se sempre interpretá-las a


luz de todos os princípios e preceitos constitucionais do ordenamento jurídico, os quais
reconheceram a pluralidade de configurações da entidade familiar, expressa ou tacitamente,
rejeitando a ideia simplória da organização apenas formada por um pai, uma mãe e filhos,
estes ligados àqueles apenas biologicamente.
Nas palavras de Dias (2013, p. 385), a multiparentalidade, ou pluriparentalidade,
se configura com a possibilidade de uma criança ter dois pais ou duas mães, ou seja, o
reconhecimento da existência de múltiplos vínculos de filiação, com requerimento específico
destes vinculados.
O Superior Tribunal de Justiça explica em seus julgados que a ação de
reconhecimento pode ter como titular qualquer das partes interessadas. Inclusive, para o
referido tribunal, cabe esse pedido até se o interessado for um terceiro, exemplo tido como
neto.
Para consubstanciar a afirmativa supramencionada, colaciona-se o Enunciado 521
do Conselho de Justiça Federal, em que se afirma:
Enunciado n 521 CJF - artigo 1.606 - qualquer descendente possui legitimidade, por
direito próprio, para reconhecer o vínculo de parentesco em face dos avos ou de
qualquer ascendente de grau superior, ainda que o pai não tenha iniciado a ação de
filiação em vida.
50

Na concepção de Cassetari (2017, p. 61-73) essas ações caberiam a todos que


tivessem interesses reais na demanda. Aceita, ainda, a possibilidade de renúncia desse
reconhecimento pelo filho, desde que fosse por motivo justo e plausível.
Constata-se, ainda, que há formas específicas para que seja feito esse
reconhecimento.

4.3.8.1 Por ação declaratória

O verbete constante no artigo 1.605, inciso II do Código Civil, não exclui da


formação do liame de filiação os laços socioafetivos, pois afirma que “na falta, ou defeito, do
termo de nascimento, poderá provar-se a filiação por qualquer modo admissível em direito:
(...) quando existirem veementes presunções resultantes de fatos já certos” (BRASIL, CC,
2018).
Segundo Almeida (2014, p. 94) a ação declaratória “busca a eliminação da
incerteza acerca da existência ou inexistência de uma relação jurídica, ou ainda, da falsidade
ou autenticidade de um documento, de sorte a se alcançar o valor da segurança da coisa
julgada”.
Portanto, podemos observar que através dessa ação pode-se fazer o pedido de
reconhecimento de multiparentalidade. O processo de conhecimento culminará na
judicialização dos fatos.

4.3.8.2 Por ação investigatória

Já a ação investigatória cabe em casos em que o filho queira fazer o


reconhecimento parental do vínculo socioafetivo.
Conforme explica Oliveira e Lira (2012, p. 57), sobre ação de investigação:
Ação de investigação de paternidade, que é ação de estado, de natureza declaratória
e imprescritível, desse modo, o filho cujo registro de nascimento não conste o nome
de um ou de ambos os genitores, dispõe da ação investigatória de paternidade ou
maternidade, a fim de obter, oficialmente, a definição de seus nomes e a
regularização de seu registro de nascimento. Por ser uma ação de estado torna-se
indispensável à participação do Ministério Público, o rito da ação é ordinário,
podendo ser ajuizada a qualquer tempo, pois não se sujeita a prazo decadencial.
Atualmente o conceito de paternidade encontra-se vinculado ao conceito biológico e
socioafetivo, ou seja, a filiação é determinada não apenas em face do vínculo
biológico, mas também em face do vínculo socioafetivo, pois o que se busca é o
melhor interesse da criança, assim, forma-se a filiação e, esta filiação socioafetiva
não poderá ser contestada, prevalecendo sobre as outras formas de filiação, ainda
que sobre a biológica. Dessa forma, o vínculo de filiação quando formado, não pode
51

mais ser contestado, impondo direitos e obrigações relativos à filiação (grifos da


autora).
Os julgados analisados sobre o tema trazem esta possibilidade para os casos em
que o filho ajuizará a ação investigatória de paternidade para ver seu pai verdadeiro
(biológico) reconhecido, mas não precisará revogar a paternidade socioafetiva.
É o descobrimento genético, sem que se perca a construção afetiva.

4.3.8.3 De forma incidental

É quando o reconhecimento da relação pluriparental ou socioafetiva se dá em


incidente apartado ou em peça processual como instrumentalização de outro pedido. É
incidental, pois o reconhecimento é pressuposto para a exigência de outro direito. Conforme
sabido, os efeitos do reconhecimento são vários e nutrem outras tantas obrigações.
Não há legislação procedimental neste sentido, mas se prevê, pelas pesquisas
doutrinárias e jurisprudenciais, o acionamento do judiciário nestes casos. Para corroborar,
Cassetari (2017, p 84) traz como exemplo um caso ocorrido no Tribunal de Justiça de Santa
Catarina em que o padrasto fora condenado a pagar pensão alimentícia para sua enteada.
Resta claro que não só de forma autônoma ocorrerá o reconhecimento do vínculo
socioafetivo, sendo possível, igualmente, na forma incidental.

4.3.8.4 Por reconhecimento das partes

O reconhecimento voluntário dos filhos como forma de constituição da


parentalidade socioafetiva “apenas poderá ser perante o Oficio de Registro Civil de pessoas
Naturais no qual o filho está registrado” (CASSETARI, 2017, p. 90).
Para Almeida (2010, p. 530) esse reconhecimento:
Tanto na maternidade como na paternidade pode dar-se voluntariamente, através de
declaração no termo de nascimento, de escritura pública, de escrito particular, de
testamento, ou por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que seu
reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que contem art.
1.609 do Código Civil (grifos do autor).

Ainda explica referido doutrinador que:


Efetuado o reconhecimento de filho socioafetivo, o Oficial da serventia em que se
encontra lavrado o assento de nascimento procederá à averbação da paternidade,
independentemente de manifestação do Ministério Público ou de decisão judicial.
O reconhecimento espontâneo da paternidade socioafetiva, nos termos do
provimento, não obstaculiza a discussão judicial sobre a verdade biológica
(ALMEIDA, 2010, p. 531).
52

Para sedimentar a compreensão, Póvoas (2012, p. 89) aduz brilhantemente que “o


reconhecimento só judicial da multiparentalidade, sem a inclusão de todos no registro de
nascimento da criança cria mais um problema do que uma solução”.
Assim sendo, não bastará a existência de sentença concedendo o reconhecimento.
É preciso efetivá-lo na esfera administrativa, por meio de uma escritura pública.

4.3.8.5 Por reconhecimento em escritura pública

De toda feita, há de se compreender que atualmente não só por meio de ação


judicial pode-se requerer o reconhecimento do vínculo socioafetivo.
Como nota-se no provimento 63/2017, o Conselho Nacional de Justiça
disciplinou, dentre outros temas, o procedimento de reconhecimento de filiação socioafetiva,
perante os Ofícios do Registro Civil das Pessoas Naturais (BRASIL, CNJ, 2018).
Alguns requisitos que precisam ser preenchidos ao reconhecimento extrajudicial
da filiação socioafetiva, Provimento do Conselho Nacional de Justiça 63-2011:
Com efeito, de acordo com o referido provimento, os requisitos para que o
reconhecimento da filiação socioafetiva seja deferido extrajudicialmente são os
seguintes:
I - Requerimento firmado pelo ascendente socioafetivo (nos termos do Anexo VI),
testamento ou codicilo.
II - Documento de identificação com foto do requerente – original e cópia simples
ou autenticada (artigo 11 do Provimento 63/2017 do CNJ);
III - Certidão de nascimento atualizada do filho – original e cópia simples ou
autenticada (artigo 11 do Provimento 63/2017 do CNJ);
IV – Anuência pessoalmente dos pais biológicos, na hipótese do filho ser menor de
18 anos de idade (artigo 11, parágrafos 3º e 5º, do Provimento 63/2017 do CNJ);
V – Anuência pessoalmente do filho maior de 12 anos de idade (artigo 11,
parágrafos 4º e 5º, do Provimento 63/2017 do CNJ);
VI - Não poderão ter a filiação socioafetiva reconhecida os irmãos entre si nem os
ascendentes (artigo 10, parágrafo 3º, do Provimento 63/2017 do CNJ);
VII - Entre o requerente e o filho deve haver uma diferença de pelo menos 16 anos
de idade (artigo 10, parágrafo 3º, do Provimento 63/2017 do CNJ);
VIII - artigo 12 do Provimento 63/2017 do CNJ). (CNJ, 2017).

Por meio deste provimento, reconhece-se de forma ampla e mais célere a


possibilidade da multiparentalidade no registro civil, desde que respeitados e preenchidos aos
requisitos supracitados, comprovando desta forma que a relação socioafetiva tem tanta
relevância jurídica quanto qualquer outra, não havendo qualquer tipo de sobreposição entre os
modelos atuais de família.
53

5 EFEITOS DA MULTIPARENTALIDADE NO DIREITO SUCESSÓRIO

A partir desde ponto, os efeitos que surgem após o reconhecimento da


multiparentalidade no direito sucessório serão abordados. Para Dias (2011, p. 51), ao discutir
o direito sucessório, “essa possibilidade – de reconhecimento da multiparentalidade, inclusive,
há que se refletir nos temas sucessórios. O filho concorrerá na herança de todos os pais que
tiver”.
Ressalta-se que o filho tem direito a herança, independentemente do tipo de sua
filiação (socioafetiva, biológica ou adotiva), pois:
a Carta Magna traz com toda clareza que não pode haver discriminação sobre os
tipos de filiações, ou seja, não importa como se deu essa filiação, será igualitária
como se fosse um filho legítimo [sic], conforme o art. 227, parágrafo 6º, do diploma
legal referido. Dessa forma, caso haja o reconhecimento de uma filiação
socioafetiva, este terá os mesmos direitos das demais filiações. [...] Uma vez que se
tem a posse de estado de filho consolidado, logo este seria um herdeiro legítimo
necessário como as filiações biológicas (GOULART, 2013, p. 17).

Desta feita, em consonância com a Constituição Federal artigo 227, § 6º, e o


Código Civil artigo 1.593, o reconhecimento da filiação segue requisitos básicos. Assim, os
filhos são considerados iguais, estando protegidos pelo ordenamento legal (BRASIL, CRFB,
2018).
Importante se faz saber que o filho socioafetivo tem o direito de pleitear o
reconhecimento judicial de tal filiação, e dos seus consequentes efeitos sucessórios a qualquer
tempo, seja o pai vivo ou já falecido (PRETTO, 2013, p. 56).
Nessa toada, Goulart (2013, p. 17) explica que o reconhecimento após a morte
ainda encontra resistência nos tribunais, pois se houvesse de fato vontade do pai ou mãe o
teriam feito por meio de testamento. Para rejeitar o reconhecimento, utilizam-se do argumento
de que esse reconhecimento sem manifestação de vontade anterior seria apenas de cunho
meramente patrimonial, em busca apenas da quota parte na herança.

5.1 ASPECTOS GERAIS DO DIREITO SUCESSÓRIO NA MULTIPARENTALIDADE

Na doutrina civil, a palavra sucessão é amplamente utilizada e entendida como a


substituição de uma pessoa por outra na titularidade de um determinado bem. E para maioria
dos doutrinadores que leccionam sobre o tema, o direito de sucessório é entendido como um
conjunto de normas disciplinadoras da transferência do patrimônio de uma pessoa depois de
54

sua morte aos seus herdeiros, em razão de aplicação da lei ou do testamento (PEREIRA,
2017).
De maneira clara e objetiva, o direito das sucessões é o ramo do “direito civil
cujas normas regulam a transferência do patrimônio do morto ao herdeiro, em virtude de lei
ou de testamento. A palavra sucessão significa substituir uma pessoa por outra, que vai
assumir suas obrigações e adquirir seus direitos” (MENEZES, 2018, p. 75).
Esse direito a herança esta garantido na Carta Magna em seu Art. 5º, incisos XXX
e XXXI em que “é garantido o direito de herança; a sucessão de bens de estrangeiros situados
no País será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros,
sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus” (BRASIL, CRFB, 2018).
O Código Civil também regulamenta esse instituto, em seu artigo 1.784,
determinando que a herança transmite-se aos herdeiros legítimos e testamentários a partir do
momento da abertura da sucessão, ou seja, a partir da morte do indivíduo (BRASIL, CC,
2018).
Segundo Silva (2017, p. 48) é da transmissão de patrimônio que versa o direito
das sucessões. Quando o titular dos direitos e obrigações falecer, esses bens incorporam e
passam a se chamar espólio. Portanto sucessão é “a transferência do patrimônio do morto aos
herdeiros, em virtude de testamento ou de lei. A palavra sucessão significa substituir uma
pessoa por outra, que vai assumir suas obrigações e adquirir seus direitos quando a causa da
extinção da pessoa é a morte”.
Ainda, explica Santos (2014, p. 51) que são duas as “fontes de que nascem o
direito sucessório: a) A lei: a lei transmite o direito; b) Vontade da pessoa: a pessoa que
morreu teve a vontade de criar o direito”.
O artigo 1.829 do Código Civil Brasileiro estipula a ordem de sucessão legítima
nos seguintes termos:
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado
este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação
obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão
parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - ao cônjuge sobrevivente;
IV - aos colaterais (BRASIL, CC, 2018).

Em comento aos incisos do referido artigo, entende-se que o inciso I trata afirma
que, na falta de disposição de última vontade do indivíduo, deverão receber a herança os
55

descendentes, que em sua maioria se caracterizam na figura dos filhos e netos, juntamente
com o cônjuge sobrevivente.
O inciso II traz expressamente que, na falta de descendentes, terão direito a
suceder os ascendentes, e conjuntamente com o cônjuge sobrevivente. Já o terceiro inciso
versa sobre a presunção de não haverem descendentes ou ascendentes do falecido, caso em
que o único herdeiro legítimo será o cônjuge sobrevivente.
No inciso IV do referido artigo, depreende-se que os parentes colaterais são os
últimos a terem preferência na linha sucessória. Estes são aqueles parentes que não possuem
qualquer relação de ascendência ou descendência, mas possuem um ancestral em comum com
o falecido (BRASIL, CC, 2018).
Tartuce e Simão (2013, p. 207) ensinam que “a ordem do chamamento dos
parentes, cônjuge ou companheiro do falecido decorre da presunção legal de afetividade que
estes possuíam com o falecido, ou seja, os parentes a quem o de cujus oferecia mais
proximidade e afeto têm preferência à linha sucessória”.
Portanto, se ocorrer a primeira regra, existindo por tanto uma classe de herdeiros,
a próxima classe será excluída, e assim por diante. Noutras palavras, os de grau mais próximo
excluem da sucessão os de grau mais remoto.
Em continuidade os mesmos autores Tartuce e Simão (2013, p. 209) afirmam que
dessa regra poderá surgir exceção, conforme exposto a seguir:
Como primeira exceção, haverá concorrência sucessória entre o cônjuge
sobrevivente e os descendentes do falecido em certas situações, dependendo do
regime de bens do casamento (art. 1.829, I, do CC/2002). Ato contínuo, haverá
concorrência sucessória entre o cônjuge sobrevivente e os ascendentes do falecido
qualquer que seja o regime de bens (art. 1.829, II, do CC/2002). Também haverá
concorrência sucessória entre o companheiro sobrevivente e os descendentes do
falecido sobre os bens adquiridos onerosamente na constância da união estável (art.
1.790, I e II, do CC/2002). Não obstante tudo isso, haverá concorrência sucessória
entre o companheiro sobrevivente e ascendentes ou colaterais do falecido sobre os
bens adquiridos onerosamente na constância da união estável (art. 1.790, I e II, do
CC/2002). Por fim, haverá o direito real de habitação ao cônjuge,
independentemente do regime de bens e de sua participação na herança (art. 1.831
do CC/2002).

Pode-se entender implicitamente que a figura do afeto foi levada em conta pelo
legislador, uma vez que os parentes que são mais próximos do indivíduo terão preferência na
linha sucessória (SILVA; LATINI; PELLIZZONE, 2015).
O Código Civil até permite que o indivíduo deixe um ato de última vontade, como
por exemplo, o testamento, mas essa permissão não pode ser total. O próprio regramento legal
garante aos herdeiros necessários, em seu artigo 1.846, a metade dos bens da herança, o que
56

se chama de legítima: “pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens
da herança, constituindo a legítima” (BRASIL, CC, 2018).
Sendo assim, o testador poderá dispor apenas de metade de seus bens, obrigando-
se a deixar outra metade para seus herdeiros necessários, conforme disposto no artigo 1.845,
sendo que, entendidos por estes estão “os descendentes, os ascendentes e o cônjuge”
(BRASIL, CC, 2018). Noutros termos, os pais, os filhos, os avos, os netos ou o cônjuge.
Sobre a reserva da legítima, Silva, Latini e Pellizzone (2015, p. 169) aduzem que
se não houver nenhum herdeiro necessário, o testador terá liberdade na totalidade de seus
bens e “todos os demais parentes serão considerados herdeiros facultativos, que serão os
parentes colaterais até o quarto grau e o eventual companheiro do falecido”.
Ainda, cumpre esclarecer que há divergência nas doutrinas quando se fala de
companheiro no que prisma das sucessões. A doutrina majoritária defende a ideia que o
companheiro efetivamente pertence à classe dos herdeiros facultativos. Todavia, apesar de
minoritária, existe uma corrente que alega que o companheiro deve pertencer à classe dos
herdeiros necessários, comparando-se à figura do cônjuge do falecido.
Pode-se dizer que a diferença dos efeitos sucessórios entre as duas classes de
herdeiros é que o herdeiro necessário possui pleno direito à metade dos bens do falecido,
apenas sendo excluído da sucessão em um dos casos listados no artigo 1.814 do Código Civil:
Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:
I - que houverem sido autores, coautores ou partícipes de homicídio doloso, ou
tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro,
ascendente ou descendente;
II - que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou
incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;
III - que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da
herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.

Todavia, Cassetari (2017, p. 275) afirma que aqueles parentes com uma relação
afetiva mais próxima do falecido têm grande preferência na linha sucessória. O afeto irá muito
além da preferência no direito sucessório a ponto de diferenciar, dentro dos sucessores
legítimos, aqueles mais próximos do de cujus, tornando-os herdeiros necessários e
concedendo-lhes, automaticamente, direito à metade dos bens da herança.
Após superarem-se de maneira sucinta os aspectos gerais do direito sucessório,
discorrer-se-á sobre isonomia entre os herdeiros descendentes do falecido, mais
especificamente dos eventuais filhos que este possa ter.
57

Em consonância, a Constituição Federal, em seu o artigo 227, §6º, garante a


isonomia filial, sejam estes filhos provenientes ou não do casamento, garantindo a igualdade
da filiação (BRASIL, CRFB, 2018).
Essa igualdade supracitada no artigo da Carta Magna deve ser interpretada de
forma extensa. Não devem os filhos apenas ter tratamento igual enquanto o pai ou a mãe
estiverem vivos. Tal isonomia deverá continuar mesmo após o falecimento destes, sendo seus
quinhões dividido igualmente para cada filho, ressalvados eventuais adiantamentos da herança
(SILVEIRA, 2016).
Sobre a temática Farias e Rosenvald (2011, p. 566) "o tratamento jurídico dos
filhos emprestado pelo Pacto Social de 1988 corresponde ao término de um longo processo de
discriminações que, historicamente, marcou a legislação brasileira" no processo de busca pela
isonomia dos filhos.
De mesmo norte, leciona Cahali (2012, p.176) que basta ter “o status de filho para
a igualdade de tratamento, pouco importando se o fruto ou não do casamento de seus pais, e
independentemente do estado civil dos progenitores”.
De tal modo, a Constituição Federal garantiu o direito à herança a todos os filhos,
herdeiros, ascendentes e descendentes. Pode-se evidenciar então que a partir do
reconhecimento do filho, ele passara a ter todos os direitos na sucessão, independentemente
do tempo entre o reconhecimento e a morte do indivíduo (CASSETARI, 2017, p. 74).
O regramento civil reitera e garante essa igualdade em seu artigo 1.835, ao versar
que “na linha descendente, os filhos sucedem por cabeça, e os outros descendentes, por
cabeça ou por estirpe, conforme se achem ou não no mesmo grau” (BRASIL, CC, 2018).
Seguindo esses entendimentos legais em conjunto com os princípios
constitucionais, compreende-se que a igualdade entre os filhos deve existir em todo e
qualquer caso, sendo proibida qualquer discriminação quanto à natureza dessa filiação, ainda
que esta não tenha decorrido do vínculo biológico ou de um processo de adoção, como no
caso da filiação socioafetiva (CAMPELO, 2016).
Neste prisma, está-se diante da desbiologização do parentesco em prol de vínculos
socioafetivos, pois estes não devem situar-se exclusivamente no plano teórico. Manter
embasado em princípios e no campo abstrato não produzem efeitos práticos que somente
serão possíveis com a mudança do ordenamento jurídico, repercutindo, inclusive, no âmbito
das sucessões (NADER, 2009, p. 261).
De mesmo modo, afirma Araújo (2017, p. 201) que é importante salientar que a
filiação multiparental traz consigo integralmente os direitos que abrangem os filhos,
58

“inclusive os sucessórios e todos seus efeitos dentro da sucessão, tanto na paternidade


biológica quanto na socioafetiva, de maneira igual para todos os filhos, não havendo
prioridade para nenhum deles”.
Para internalizar o entendimento sobre o tema, indispensável trazer à luz uma
jurisprudência atual e relacionada do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. SUCESSÕES E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO
DE RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE POST MORTEM C/C PETIÇÃO
DE HERANÇA. - LIMINAR DEFERIDA NA ORIGEM. RECURSO DA MÃE
BIOLÓGICA. VÍNCULO SOCIOAFETIVO. POSSIBILIDADE.
MULTIPARENTALIDADE. PRECEDENTE DO STF. TUTELA DE URGÊNCIA.
REQUISITOS. PREENCHIMENTO. RESERVA DE QUINHÃO. CABIMENTO.
- "Havendo fortes indícios da paternidade, impõe-se o deferimento de tutela de
urgência para assegurar ao autor a reserva de parte dos bens deixados por seu
indigitado genitor, na proporção do quinhão a que eventualmente terá direito".
(TJSC, AI n. 0154004-30.2015.8.24.0000, rel. Des. Newton Trisotto, j. em 12-05-
2016). DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de
Instrumento n. 4016491-15.2016.8.24.0000, de Joinville, rel. Des. Henry Petry
Junior, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 30-05-2017).

Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto por D. P. contra a decisão


prolatada pelo Magistrado Fernando Speck de Souza, em 18/11/2016, que, nos autos da "ação
de reconhecimento de paternidade e maternidade socioafetiva post mortem c/c petição de
herança", proposta por J. I. P. e N. P. P. contra a ora agravante, perante a 3ª Vara da Família
da comarca de Joinville, deferiu o pedido de antecipação de tutela para determinar a reserva
de quinhão em 50% (cinquenta por cento) do patrimônio do de cujus E. P., cuja paternidade
socioafetiva se discutiu nos autos.
O Egrégio Tribunal decidiu manter a decisão que já havia sido proferida pelo
magistrado de primeira instância que reconheceu o direito do filho socioafetivo em ter seu
quinhão preservado na herança. Deixando assim decido no voto que “havendo fortes indícios
da paternidade, impõe-se o deferimento de tutela de urgência para assegurar ao autor a reserva
de parte dos bens deixados por seu indigitado genitor, na proporção do quinhão a que
eventualmente terá direito” (TJSC, AI n. 0154004-30.2015.8.24.0000, rel. Des. Newton
Trisotto, j. em 12-05-2016).
Observa-se que o referido tribunal passou a acompanhar as transições sociais e
pragmáticas de forma mais célere que o legislativo, passando a preencher uma lacuna no
ordenamento quanto à proteção dos efeitos jurídicos produzidos através da
multiparentalidade. A decisão supracitada esta em conformidade com o parecer da Corte
Suprema que pacificou o entendimento que reconhecido o vínculo afetivo tem-se que
preservar todos os direitos inerentes dessa efetivação, inclusive os direitos sucessórios.
59

Assim, pacificado o entendimento do Supremo Tribunal Federal quando julgou


precedente o RE nº 898.060, tem-se como possível e deve ser mantida a coexistência das
relações de paternidade afetiva e biológica, assegurando a proteção no direito sucessório tanto
nos seus efeitos patrimoniais como extrapatrimoniais.
Não é admissível, portanto, que uma sobreponha-se à outra. Devem coexistir tanto
no mundo fático quanto no positivo, não sendo óbice a falta de registro, bastando para tanto a
comprovação do vínculo afetivo e o intuito de haver a filiação (BRASIL. STF. RE nº 898.060.
Relator Min. Luiz Fux).
Assim, compreende-se que seria inútil o reconhecimento judicial da
multiparentalidade sem que a mesma não produzisse todos os efeitos jurídicos pertinentes
dessa filiação socioafetiva.
60

6 CONCLUSÃO

Pode-se observar, no decorrer da pesquisa, que a multiparentalidade efetiva o


princípio da dignidade da pessoa humana e da afetividade, reconhecendo no campo jurídico a
filiação regrada através do amor, do afeto e atenção, que já existe há muito no campo fático.
Compreendeu-se, ao estudar os dois primeiros capítulos, que na atual sociedade o
modelo contemporâneo de família é aquele onde há o afeto, o carinho, a convivência, sendo
muito mais um aspecto social do que biológico.
Está-se diante da somatização dos valores morais já incutidos desde os primórdios
em detrimento do abstrato, entendido como a legislação que, não se olvida, tem caminhado a
passos largos para grandes evoluções, passando a aceitar institutos jurídicos inovadores. A
partir do reconhecimento da multiparentalidade, constituída como a possibilidade de ter em
seu Registro de Nascimento a figura de dois pais ou mães, afetivos e biológicos coexistindo, a
sinergia jurídica e social alargou os efeitos benéficos àqueles que os desejavam.
Juntamente com essas evoluções, restou claro que a relação sanguínea, por
algumas vezes, fica em segundo plano se comparada com os laços afetivos criados pelos
indivíduos. E, nesta inversão de pensamento, o poder judiciário é acionado para dar uma
resposta à sociedade, não deixando de efetivar os princípios que norteiam e embasam essas
relações. Quando nasce essa aceitação do reconhecimento, vem a possibilidade jurídica do
filho socioafetivo estar presente na ordem sucessória.
É de suma importância entender que a partir do precedente aberto pelo Supremo
Tribunal Federal, passa-se a ter a garantia de segurança jurídica no aspecto sucessório perante
esse instituto inovador, compreendendo que, os legitimados que buscam, terão os seus direitos
patrimoniais e extrapatrimoniais resguardados juridicamente.
Com base no reconhecimento do modelo familiar antes não englobado no prisma
do judiciário, passou a existir a garantia de que não haverá distinção entre as filiações,
prevalecendo à coexistência de ambas. Destarte, não é possível, dentro da multiparentalidade,
opor-se ao direito do filho, que possui vínculos com dois pais ou duas mães, o direito às
heranças que lhe pertencem.
Em suma, conclui-se que o reconhecimento da multiparentalidade gera todos os
direitos inerentes a filiação, como parentesco, nome, convivência, guarda alimentos e,
inclusive, o direito à herança. E mais: além dos direitos sucessórios, o que aqui se discutiu é a
concessão de direitos fundamentais, devidamente positivados na Constituição Federal.
61

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70

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ANEXO A – Acórdão Tribunal de Justiça de Santa Catarina

Processo: 4016491-15.2016.8.24.0000 (Acórdão)


Relator: Henry Petry Junior
Origem: Joinville
Orgão Julgador: Quinta Câmara de Direito Civil
Julgado em: 30/05/2017
Classe: Agravo de Instrumento

AGRAVO DE INSTRUMENTO. SUCESSÕES E PROCESSUAL


CIVIL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE
PATERNIDADE POST MORTEM C/C PETIÇÃO DE HERANÇA. -
LIMINAR DEFERIDA NA ORIGEM. RECURSO DA MÃE
BIOLÓGICA. VÍNCULO SOCIOAFETIVO.
POSSIBILIDADE. MULTIPARENTALIDADE. PRECEDENTE
DO STF. TUTELA DE URGÊNCIA. REQUISITOS.
PREENCHIMENTO. RESERVA DE QUINHÃO. CABIMENTO.
"Havendo fortes indícios da paternidade, impõe-se o deferimento de
tutela de urgência para assegurar ao autor a reserva de parte dos
bens deixados por seu indigitado genitor, na proporção do quinhão a
que eventualmente terá direito". (TJSC, AI n. 0154004-
30.2015.8.24.0000, rel. Des. Newton Trisotto, j. em 12-05-2016).
DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 4016491-


15.2016.8.24.0000, da comarca de Joinville (3ª Vara da Família), em que é Agravante D. P. e
são Agravados J. I. P. e outro:
A Quinta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer e negar
provimento ao recurso. Custas legais.
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor
Desembargador Luiz Cézar Medeiros, e dele participou o Excelentíssimo Senhor
Desembargador Jairo Fernandes Gonçalves e a Excelentíssima Senhora Desembargadora
Cláudia Lambert de Faria.

Florianópolis, 30 de maio de 2017.


Henry Petry Junior
RELATOR

RELATÓRIO

1 A decisão agravada e as razões de recurso


71

Cuida-se de recurso de agravo de instrumento (fls. 01/27) interposto por D. P.


contra a decisão (fls. 39/42) prolatada pelo Magistrado Fernando Speck de Souza, em
18/11/2016, que, nos autos da "ação de reconhecimento de paternidade e maternidade
socioafetiva post mortem c/c petição de herança" (autos n. 0320815-26.2016.8.24.0038) (fls.
01/37 dos autos de origem) proposta por J. I. P. e N. P. P. contra a ora agravante, perante a 3ª
Vara da Família da comarca de Joinville, deferiu o pedido de antecipação de tutela para
determinar a reserva de quinhão em 50% (cinquenta por cento) do patrimônio do de cujus E.
P., cuja paternidade socioafetiva se discute nos autos.
Sustenta, em síntese, que inexiste relação maternal e paternal entre os autores e
seu filho biológico, falecido.
Requer, por fim, seja: [a] preliminarmente, concedido efeito suspensivo à decisão
agravada; e, [b] no mérito, o interlocutório reformado a fim de suspender a reserva de quinhão
concedida na liminar.
Instrui a peça inicial com os documentos às fls. 28/209.
Intimados, os agravados apresentaram contrarrazões às fls. 220/250, as quais
foram instruídas pelos documentos de fls. 251/281.
Em decisão às fls. 296/288, a Desª. Cláudia Lambert de Faria: [a] admitiu o
processamento do agravo na forma de instrumento; mas [b] indeferiu o efeito suspensivo
almejado.
Ao fim, a Procuradoria-Geral de Justiça, por parecer da lavra do Procurador de
Justiça Mário Luiz de Melo, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls.
296/303).
Intimados para se manifestarem acerca dos documentos colaionados por ocasião
das contrarrazões (fl. 306), os agravantes apresentaram suas considerações às fls. 308/313).
É o relatório possível e necessário.

VOTO

2 A admissibilidade do recurso
2.1 Um esclarecimento necessário

A segurança jurídica é preceito assegurado em algumas passagens da


Constituição da República Federativa do Brasil, como no caput do art. 5º, e, ainda, no inc.
XXXVI do mesmo dispositivo, o qual dispõe que "a lei não prejudicará o direito adquirido, o
ato jurídico perfeito e a coisa julgada", previsão repisada no caput do art. 6º da Lei de
Introdução às Normas do Direito Brasileiro, cujos §§ 1º a 3º conceituam os institutos.
Sob esse prisma, o Código de Processo Civil de 2015, em termos de direito
intertemporal processual, regulando a sucessão de leis processuais no tempo e a sua aplicação
aos processos pendentes, adotou a regra tempus regit actum, nos termos de seu art. 1.046,
impondo a aplicação imediata da lei processual a partir de sua entrada em vigor, em 18.3.2016
(art. 1.045 do Código de Processo Civil de 2015), mas, à luz do princípio da segurança
jurídica, apenas aos atos pendentes, salvaguardando, portanto, o ato processual perfeito, o
72

direito processual adquirido e a coisa julgada, conforme melhor leitura do art. 14 do Código
de Processo Civil de 2015.
A temática, para ser melhor compreendida, comporta exegese da teoria do
isolamento dos atos processuais, pela qual, muito embora se reconheça o processo como um
instrumento complexo formado por uma sucessão de atos inter-relacionados, advindo nova lei
processual e se deparando esta com um processo em desenvolvimento, para fins de definir sua
específica incidência ou não sobre cada ato, necessário se faz verificar se possível tomá-los
individualmente.
Dessa forma, constata-se se os elementos do ato a ser praticado são efetivamente
pendentes e independentes dos atos anteriores - aplicando-se, portanto, a lei nova - ou se
possuem nexo imediato e inafastável com um ato praticado sob a vigência da lei anterior,
passando a ser tomados, enquanto dependentes, como efeitos materiais dele - aplicando-se,
assim, a lei antiga -, vez que imodificável a lei incidente sobre os atos anteriores, seja porque
atos processuais perfeitos (uma vez consumados ao tempo da lei antiga), seja porque existente
sobre eles um direito processual adquirido (uma vez passíveis de exercício ao tempo da lei
antiga, com termo pré-fixo de início de exercício ou condição preestabelecida inalterável para
o exercício).
Outro não é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ, REsp n.
1.404.796/SP, rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. em 26.3.2014), firmado, aliás, em sede
de Recurso Especial Repetitivo (arts. 543-C do Código de Processo Civil de 1973; e 1.036 a
1.041 do Código de Processo Civil de 2015).
Dessa forma, tendo o interlocutório guerreado sido publicado em 18/11/2016 (fl.
46), isto é, quando já em vigência do Código de Processo Civil de 2015, o caso será analisado
sob o regramento do novo Diploma.

2.2 A admissibilidade do recurso

O procedimento recursal, em seu juízo de admissibilidade, comporta uma série de


pressupostos, doutrinariamente divididos em: [a] intrínsecos, os quais se compõem
por: [a.1] cabimento; [a.2] interesse recursal; [a.3] legitimidade recursal; e [a.4] inexistência
de fato extintivo do direito de recorrer; e [b] extrínsecos, que se subdividem
em: [b.1] regularidade formal; [b.2] tempestividade; [b.3] preparo; e [b.4] inexistência de fato
impeditivo do direito de recorrer ou do seguimento do recurso.
Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do recurso.

2.3 A filiação

Nada obstante a filiação consista em um conceito atemporal a acompanhar o


desenvolvimento da humanidade desde o seu primórdio, é dotada, simultaneamente, de
dinamismo, na medida em que se amolda aos valores vigentes em cada época.
Historicamente, o ordenamento jurídico discriminava os filhos entre legítimos
(nascidos da relação casamentária) e ilegítimos (havidos fora do matrimônio), dedicando
atenção e amparo à primeira categoria em detrimento da segunda. A este respeito, Renata
Nepomuceno Cysne leciona:
73

Na perspectiva histórica das relações familiares, a família matrimonializada e os


filhos advindos dessa relação recebiam todo o amparo social, religioso e jurídico, enquanto os
filhos tidos como "ilegítimos" foram alvo de profundos preconceitos, pelos "pecados"
cometidos por seus pais. A igreja proibia e alei dificultava o reconhecimento de filhos
ilegítimos, tudo em razão da manutenção da paz da família matrimonial. (CYSNE, Renata
Nepomuceno. Os laços afetivos como valor jurídico: na questão da paternidade socioafetiva.
In: Família e Jurisdição II. BASTOS, Eliane Pereira; LUZ, Antônio Fernandes da. (coords).
Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p.190)
Com o advento da Constituição de 1988, aboliu-se qualquer possibilidade de
diferenciação entre filhos, passando a destinar-se igual tratamento a filhos concebidos dentro
ou fora da relação matrimonial, bem como aos de origem biológica ou socioafetiva.
O artigo 227, § 6º, da Carta Magna é o dispositivo que traduz e normatiza este
avanço jurídico ao dispor que:
§ 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por
adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer
designações discriminatórias relativas à filiação.

Farias e Rosenvald enfatizam a importância da Constituição no processo de busca


pela isonomia ao sintetizarem que "O tratamento jurídico dos filhos emprestado pelo Pacto
Social de 1988 corresponde ao término de um longo processo de discriminações que,
historicamente, marcou a legislação brasileira" (FARIAS, Cristiano Chaves de;
ROSENVALD, Nelson. Direito das Famílias. 3. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lúmen
Juris, 2011, p. 566).
Sob o prisma constitucional, não há dúvidas de que a filiação consubstancia um
direito indisponível. Na lição de Belmiro Pedro Welter, "a perfilhação é direito natural e
constitucional de personalidade, sendo indisponível, inegociável, imprescritível,
impenhorável, personalíssimo, indeclinável, absoluto, vitalício, indispensável, oponível
contra todos, intransmissível, constituído de manifesto interesse público e essencial ao ser
humano" (WELTER, Pedro Belmiro. Coisa julgada na investigação de paternidade. Revista
Jurídica. N. 256. Ano 46, fevereiro de 1999, p. 19).
Segundo Mauro Nicolau Júnior, o registro de nascimento - apesar de alguns
posicionamentos em sentido contrário - não exprime, propriamente, a paternidade. O que ele
reflete é um acontecimento jurídico. Ao registro não interessa a história natural das pessoas,
senão apenas um evento jurídico.
Assim, quando o estabelecimento da paternidade decorrer de derivação biológica
do DNA, o que o oficial de registro consigna em seus assentos não é o laudo pericial, mas a
sentença do juiz. Ao contrário, se a sentença for lavrada manifestamente contrária à prova
genética, ainda assim é ela e não o laudo a que o oficial deve obediência. (In: Investigação de
Paternidade Procedente - coisa julgada material - prazo para ação rescisória expirado. Ação
negatória de paternidade. Qual prevalece- Revista da AJURIS. N. 85. Tomo I. Rio Grande do
Sul: AJURIS, março/2002, p. 286).
De outro lado, é relevante notar que o registro civil - por alguns chamada de
paternidade registral - não se configura, de regra, em fonte primária da paternidade. Ao revés,
o assentamento revela, exterioriza e dá publicidade a um evento anterior, qual seja, a relação
74

biológica ou socioafetiva. O registro não nasce per se, mas sim é conseqüente a algo que lhe é
anterior. Não é causa, mas conseqüência. Não é originário, sim sequencial.
Maria Berenice Dias analisa as diferenciações entre os vínculos parentais
biológicos e socioafetivos:
Dois fenômenos marcaram de forma significativa tudo que a lei diz, a doutrina
sempre sustentou e a jurisprudência vinha decidindo sobre os vínculos de parentalidade. Até
hoje, quando se fala em filiação e em reconhecimento de filho, sempre se esteve a falar em
filiação biológica. Em juízo sempre foi buscada a chamada verdade real, sendo assim
considerada a relação de filiação decorrente do vínculo de consanguinidade.
O primeiro grande marco que introduziu profunda revolução no direito das
famílias foi a quebra do princípio de que a família se identificada com o casamento.
No momento em que se admitiram como entidades familiares estruturas não
constituídas pelo matrimônio, passou-se a reconhecer a afetividade como elemento
constitutivo da família. Essa mudança de paradigmas não se limitou ao âmbito das relações
familiares. Refletiu-se também nas relações de filiação. O prestígio que se emprestou à
afetividade, como elemento identificador da família, passou a ser também o elemento
identificador dos elos de filiação.
Outro acontecimento veio trazer reflexos significativos no que diz com os
vínculos parentais. Os avanços científicos, que culminaram com a descoberta dos marcadores
genéticos e permitem a identificação da filiação biológica por meio de singelo exame não
invasivo, desencadearam verdadeira corrida ao Judiciário, na busca da "verdade real".
(Manual de Direito das Famílias. 5ª ed., rev., atual. e ampliada. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2009, p. 331).
Após a consagração desses dois institutos - paternidade biológica e paternidade
socioafetiva - , intensos debates passaram a ser travados na doutrina e na jurisprudência, com
o fito de consagrar qual modalidade de vínculo deveria prevalecer em caso de colisão, isto é,
quando as paternidades biológica e socioafetiva não coincidissem em um único sujeito.
Acerca da temática, Fátima Nany Andrigui e Cátia Denise Gress Krueguer
preconizam que: "Não há, na Constituição Federal, referência de primazia entre afetividade e
consanguinidade. Existem, assim, duas verdades reais: a biológica e a socioafetiva".
(ANDRIGHI, Fátima Nancy; KRUGER, Cátia Denise Gress. Coexistência entre a
socioafetividade e a identidade biológica - uma reflexão. In: Família e Jurisdição II.
BASTOS, Eliane Pereira; LUZ, Antônio Fernandes da. (coords). Belo Horizonte: Del Rey,
2008 , p. 84)
Neste mesmo vértice:
Destarte, de se reconhecer que tanto a filiação biológica como a
socioafetiva encontram guarida na Constituição Federal de 1988.
Na maior parte dos casos, a biológica também envolverá o afeto -
que estará presente desde o surgimento do vínculo. Na socioafetiva,
por sua vez, o sentimento de afeto é construído ao longo da vida,
porque se quis e desejou. Há um projeto comum, que permite a
integração e pleno desenvolvimento pessoal e social de cada partícipe
da entidade familiar. (SANTOS, Marlouve Moreno Sampaio. Reflexões
sobre a paternidade nas relações familiares sob a ótica do direito e da
psicanálise. In: Família e Jurisdição III. BASTOS, Eliane Pereira;
75

ASSIS, Arnaldo Camanho de; SANTOS, Marlouve Moreno Sampaio.


(coords). Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 343 - grifo nosso)

Dentre o embate firmado entre a prevalência de uma modalidade parental ou de


outra, exsurgiu o advento da multiparentalidade enquanto opção a propiciar maior eficácia
na contemplação dos interesses de todos os envolvidos, na medida em que, através de sua
adoção, nenhuma das paternidades precisa ser excluída.
Além de albergar os interesses de ambos os pais, o instituto prima essencialmente
pelo melhor interesse da criança, o qual, com efeito, tem de prevalecer frente ao dos demais
envolvidos, em decorrência da especial proteção concedida pela Constituição Federal ao seres
humanos em incipiente estágio de desenvolvimento.
Maria Berenice Dias sintetiza que "Nada justifica, portanto, não admitir a
presença de mais de um pai ou de mais de uma mãe. Restringir tal possibilidade só vem em
prejuízo de quem, de fato, tem mais de um pai e mais de uma mãe". Mais adiante, a autora
enfatiza a constitucionalidade do instituto ao preconizar: "Caso esta seja a realidade, ou seja,
se de fato o filho tem mais de dois pais ou mais de duas mães, a constituição do vínculo
jurídico com todos atende ao preceito constitucional da proteção integral". (DIAS, Maria
Berenice. Manual das Sucessões. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p.51)
No mesmo sentido, Flávio Tartuce afirma que a multiparentalidade é um
caminho sem volta na modernização do direito de família, e que representa uma consolidação
da afetividade como princípio jurídico em nosso sistema. Em suas palavras:
O que se tem visto na jurisprudência até aqui é uma escolha de
Sofia, entre o vínculo biológico e o socioafetivo, o que não pode
prosperar em muitas situações fáticas. Como interroga a doutrina
consultada, por que não seria possível ter a pessoa dois pais ou duas
mães no registro civil, para todos os fins jurídicos, inclusive familiares
e sucessórios? (TARTUCE, Flávio. O princípio da afetividade no
direito de família.

Em igual orientação, ainda, é o posicionamento de Rolf Madaleno para quem: "A


filiação consanguínea deve coexistir com o vínculo afetivo, pois com ele se completa a
relação parental". (MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. Rio de Janeiro: 2011,
p.472)
Jurisprudencialmente, a controvérsia restou equacionada com o julgamento do
Recurso Extraordinário n. 898.060/SP, o qual reconheceu a viabilidade da concomitância de
paternidades distintas em apreço ao melhor interesse da criança e do adolescente, firmando a
tese em regime de repercussão geral (Tema 622):
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL
RECONHECIDA. DIREITO CIVIL E
CONSTITUCIONAL.CONFLITO ENTRE PATERNIDADES
SOCIOAFETIVA E BIOLÓGICA. PARADIGMA DO
CASAMENTO. SUPERAÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO DE 1988.
EIXO CENTRAL DO DIREITO DE FAMÍLIA: DESLOCAMENTO
PARA O PLANO CONSTITUCIONAL. SOBREPRINCÍPIO DA
DIGNIDADE HUMANA (ART. 1º, III, DA CRFB). SUPERAÇÃO
DE ÓBICES LEGAIS AO PLENO DESENVOLVIMENTO DAS
76

FAMÍLIAS. DIREITO À BUSCA DA FELICIDADE. PRINCÍPIO


CONSTITUCIONAL IMPLÍCITO. INDIVÍDUO COMO CENTRO
DO ORDENAMENTO JURÍDICOPOLÍTICO. IMPOSSIBILIDADE
DE REDUÇÃO DAS REALIDADES FAMILIARES A MODELOS
PRÉ-CONCEBIDOS. ATIPICIDADE CONSTITUCIONAL DO
CONCEITO DE ENTIDADES FAMILIARES. UNIÃO ESTÁVEL
(ART. 226, § 3º, CRFB) E FAMÍLIA MONOPARENTAL (ART.
226, § 4º, CRFB). VEDAÇÃO À DISCRIMINAÇÃO E
HIERARQUIZAÇÃO ENTRE ESPÉCIES DE FILIAÇÃO (ART.
227, § 6º, CRFB). PARENTALIDADE PRESUNTIVA,
BIOLÓGICA OU AFETIVA. NECESSIDADE DE TUTELA
JURÍDICA AMPLA. MULTIPLICIDADE DE VÍNCULOS
PARENTAIS. RECONHECIMENTO CONCOMITANTE.
POSSIBILIDADE. PLURIPARENTALIDADE. PRINCÍPIO DA
PATERNIDADE RESPONSÁVEL (ART. 226, § 7º, CRFB).
RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. FIXAÇÃO DE
TESE PARA APLICAÇÃO A CASOS SEMELHANTES.
1. O prequestionamento revela-se autorizado quando as instâncias
inferiores abordam a matéria jurídica invocada no Recurso
Extraordinário na fundamentação do julgado recorrido, tanto mais que
a Súmula n. 279 desta Egrégia Corte indica que o apelo extremo deve
ser apreciado à luz das assertivas fáticas estabelecidas na origem.
2. A família, à luz dos preceitos constitucionais introduzidos pela
Carta de 1988, apartou-se definitivamente da vetusta distinção entre
filhos legítimos, legitimados e ilegítimos que informava o sistema do
Código Civil de 1916, cujo paradigma em matéria de filiação, por
adotar presunção baseada na centralidade do casamento,
desconsiderava tanto o critério biológico quanto o afetivo.
3. A família, objeto do deslocamento do eixo central de seu
regramento normativo para o plano constitucional, reclama a
reformulação do tratamento jurídico dos vínculos parentais à luz do
sobreprincípio da dignidade humana (art. 1º, III, da CRFB) e da busca
da felicidade.
4. A dignidade humana compreende o ser humano como um ser
intelectual e moral, capaz de determinar-se e desenvolver-se em
liberdade, de modo que a eleição individual dos próprios objetivos de
vida tem preferência absoluta em relação a eventuais formulações
legais definidoras de modelos preconcebidos, destinados a resultados
eleitos a priori pelo legislador. Jurisprudência do Tribunal
Constitucional alemão (BVerfGE 45, 187).
5. A superação de óbices legais ao pleno desenvolvimento das
famílias construídas pelas relações afetivas interpessoais dos próprios
indivíduos é corolário do sobreprincípio da dignidade humana.
6. O direito à busca da felicidade, implícito ao art. 1º, III, da
Constituição, ao tempo que eleva o indivíduo à centralidade do
ordenamento jurídico-político, reconhece as suas capacidades de
autodeterminação, autossuficiência e liberdade de escolha dos
próprios objetivos, proibindo que o governo se imiscua nos meios
eleitos pelos cidadãos para a persecução das vontades particulares.
Precedentes da Suprema Corte dos Estados Unidos da América e deste
77

Egrégio Supremo Tribunal Federal: RE 477.554- AgR, Rel. Min.


Celso de Mello, DJe de 26/08/2011; ADPF 132, Rel. Min. Ayres
Britto, DJe de 14/10/2011.
7. O indivíduo jamais pode ser reduzido a mero instrumento de
consecução das vontades dos governantes, por isso que o direito à
busca da felicidade protege o ser humano em face de tentativas do
Estado de enquadrar a sua realidade familiar em modelos pré-
concebidos pela lei.
8. A Constituição de 1988, em caráter meramente exemplificativo,
reconhece como legítimos modelos de família independentes do
casamento, como a união estável (art. 226, § 3º) e a comunidade
formada por qualquer dos pais e seus descendentes, cognominada
família monoparental_ (art. 226, § 4º), além de enfatizar que espécies
de filiação dissociadas do matrimônio entre os pais merecem
equivalente tutela diante da lei, sendo vedada discriminação e,
portanto, qualquer tipo de hierarquia entre elas (art. 227, § 6º).
9. As uniões estáveis homoafetivas, consideradas pela
jurisprudência desta Corte como entidade familiar, conduziram à
imperiosidade da interpretação não reducionista do conceito de família
como instituição que também se forma por vias distintas do casamento
civil (ADI nº. 4277, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Tribunal
Pleno, julgado em 05/05/2011).
10. A compreensão jurídica cosmopolita das famílias exige a
ampliação da tutela normativa a todas as formas pelas quais a
parentalidade pode se manifestar, a saber: (i) pela presunção
decorrente do casamento ou outras hipóteses legais, (ii) pela
descendência biológica ou (iii) pela afetividade.
11. A evolução científica responsável pela popularização do exame
de DNA conduziu ao reforço de importância do critério biológico,
tanto para fins de filiação quanto para concretizar o direito
fundamental à busca da identidade genética, como natural emanação
do direito de personalidade de um ser.
12. A afetividade enquanto critério, por sua vez, gozava de
aplicação por doutrina e jurisprudência desde o Código Civil de 1916
para evitar situações de extrema injustiça, reconhecendo-se a posse do
estado de filho, e consequentemente o vínculo parental, em favor
daquele utilizasse o nome da família (nominatio), fosse tratado como
filho pelo pai (tractatio) e gozasse do reconhecimento da sua condição
de descendente pela comunidade (reputatio).
13. A paternidade responsável, enunciada expressamente no
art. 226, § 7º, da Constituição, na perspectiva da dignidade
humana e da busca pela felicidade, impõe o acolhimento, no
espectro legal, tanto dos vínculos de filiação construídos pela
relação afetiva entre os envolvidos, quanto daqueles originados da
ascendência biológica, sem que seja necessário decidir entre um
ou outro vínculo quando o melhor interesse do descendente for o
reconhecimento jurídico de ambos.
14. A pluriparentalidade, no Direito Comparado, pode ser
exemplificada pelo conceito de _ dupla paternidade_ (dual
paternity), construído pela Suprema Corte do Estado da
78

Louisiana, EUÁ, desde a década de 1980 para atender, ao mesmo


tempo, ao melhor interesse da criança e ao direito do genitor à
declaração da paternidade. Doutrina.
15. Os arranjos familiares alheios à regulação estatal, por
omissão, não podem restar ao desabrigo da proteção a situações
de pluriparentalidade, por isso que merecem tutela jurídica
concomitante, para todos os fins de direito, os vínculos parentais
de origem afetiva e biológica, a fim de prover a mais completa e
adequada tutela aos sujeitos envolvidos, ante os princípios
constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e da
paternidade responsável (art. 226, § 7º).
16. Recurso Extraordinário a que se nega provimento, fixando-
se a seguinte tese jurídica para aplicação a casos semelhantes: _ A
paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público,
não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante
baseado na origem biológica, com todas as suas consequências
patrimoniais e extrapatrimoniais. (STF, RE n. 898.060/SP. rel.
Min. Luiz Fux. j. em 21/09/2016, grifos acrescidos).

Assim sendo, diante da vinculação estabelecida pelo precedente


supracolacionado, maiores digressões acerca da temática tornam-se dispensáveis.
Delimitados os preceitos norteadores do caso em apreço, passa-se à análise dos
requisitos para a concessão da tutela de urgência.

2.4. A tutela de urgência

Consoante se sabe, a tutela provisória tem por fito dar eficácia imediata à tutela
definitiva, possibilitando sua pronta fruição. Sendo provisória, há de ser necessariamente
substituída por uma definitiva, a qual poderá confirmá-la, revogá-la ou, ainda, modificá-la.
Caracteriza-se por ser obtida em cognição sumária, sobretudo em um juízo de probabilidade,
bem como por sua precariedade, eis que passível de revogação ou modificação a qualquer
tempo, desde que, por certo, alteradas as condições ensejadoras de sua concessão. Não se
predispõe, por sua natureza, à produção de resultados imutáveis, sendo inapta à cristalização
com a coisa julgada material, à luz da necessidade de obediência ao devido processo legal.
Diz-se tutela provisória de urgência "aquela concedida quando houver elementos
que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do
processo" (art. 300 do Código de Processo Civil de 2015). Ela poderá ser cautelar (dotada de
cunho assecuratório) ou antecipada (caráter satisfativo), tem como pressupostos gerais: [a]
probabilidade do direito (fumus boni iuris), sendo este o juízo de verossimilhança que
possibilita contemplar uma verdade provável dos fatos aduzidos e de sua subsunção à norma
invocada, com aptidão prefacial a gerar os efeitos objetivados; e [b] perigo de dano ou risco
ao resultado útil do processo (periculum in mora), presente quando demonstrado um risco de
dano concreto (e não hipotético ou eventual), atual (na iminência de ocorrer) e grave (com
aptidão para prejudicar ou impedir o pleno exercício do direito). Há, ainda, como pressuposto
específico, a reversibilidade dos efeitos da decisão, que consiste na possibilidade de retorno
ao statu quo ante, caso alterada ou revogada a medida, elemento inerente à provisoriedade da
79

tutela e que possui como objetivo coibir abusos na utilização da providência processual,
preservando o adverso contra possíveis excessos no seu emprego.
Versando o caso sobre tutela provisória de urgência, aplicam-se as disposições
contidas no artigo 300 e seguintes do Código de Processo Civil de 2015, os quais preceituam:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver
elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de
dano ou o risco ao resultado útil do processo.
§ 1o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o
caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos
que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada
se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
§ 2o A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após
justificação prévia.
§ 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida
quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada
mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto
contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para
asseguração do direito.
Art. 302. Independentemente da reparação por dano processual, a
parte responde pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência
causar à parte adversa, se:
I - a sentença lhe for desfavorável;
II - obtida liminarmente a tutela em caráter antecedente, não fornecer
os meios necessários para a citação do requerido no prazo de 5 (cinco)
dias;
III - ocorrer a cessação da eficácia da medida em qualquer hipótese
legal;
IV - o juiz acolher a alegação de decadência ou prescrição da
pretensão do autor.
Parágrafo único. A indenização será liquidada nos autos em que a
medida tiver sido concedida, sempre que possível.

Assentadas essas conjecturas, passa-se à verificação do preenchimento dos seus


requisitos no caso concreto.

2.4.1 A espécie

Na espécie vertente, restam configurados os requisitos aptos à concessão da


liminar presentemente vergastada.
O fumus boni iuris reside nos fortes laços afetivos demonstrados por meio dos
elementos colacionados ao encarte probatório, tais quais declarações firmadas por pessoas de
seu convívio, caracterizando a relação travada entre os autores e o falecido como sendo de
pais e filho. Nesse sentido, sustentam: [a] vizinhos (fls. 66/67 e 90 dos autos de origem); [b]
catequista (fls. 68/69 dos autos de origem); [c] secretária e diretor das escolas frequentadas
pelo de cujus (fls. 86 e 88 dos autos de origem); [d] prefeito da cidade de Antônio Carlos (fl.
80

87 dos autos de origem); [e] profissional de saúde (fl. 89 dos autos de origem); [f] amigos (fls.
91 e 96/97 dos autos de origem); e [g] ex-namorada (fl. 95 dos autos de origem).
Acrescente-se a isso que, quando do preenchimento do prontuário de saúde do
falecido, a lacuna "mãe" foi preenchida com o nome da agravada (fl. 73 dos autos de origem).
Em entrevista pessoal fornecida pelo de cujus, esse expressamente referenciou seus tios como
sendo seus pais, afirmando ter sido por eles adotados, sendo válido consignar que o
documento foi colacionado pela própria agravante (fl. 132 dos autos do agravo).
Não fossem suficientes os documentos supra indicados, ainda há nos autos
inúmeras fotos indicando o intenso convívio do de cujus com a família dos agravados (fls.
103/162 dos autos de origem), bem como prints screens de conversas usuais que esse
mantinha com os integrantes da família dos recorridos por meio digital (fls. 91/129 dos autos
do agravo de instrumento).
De se consignar, ainda, que a agravante assinou contrato de prestação de serviços
advocatícios em que concordava em doar 50% (cinquenta por cento) dos bens deixados por
ele para os agravados (fls. 98/99 do autos originais). Igualmente, assinou acordo de partilha
extrajudicial, no qual os bens integrantes do espólio do falecido restavam divididos entre ela e
os dois recorridos, indicados enquanto pais de criação (fls. 100/102 dos autos de origem).
A questão deverá ser melhor equacionada mediante instrução probatória, visto que
a agravante afirma ter assinado tais documentos desconhecendo seu teor, dado que é
analfabeta.
Nada obstante, ainda que se desconsidere esses dois documentos, os autos se
encontram fartamente instruídos, demonstrando a verossimilhança da alegação.
No que concerne ao periculum in mora, esse se evidencia em razão da
possibilidade de dissipação do quinhão hereditário pertencente aos agravados na
eventualidade de sua demanda vir a ser julgada procedente.
Consoante salientado no parecer ministerial:
Aqui o perigo na demora é inverso: se revogarmos a tutela provisória
concedida em primeiro grau, a agravante poderá eventualmente
dilapidar o quinhão que no futuro pode ser reconhecido aos agravados,
ao passo que a manutenção da medida não afetará, ao menos de
maneira severa, qualquer das partes, já que está o patrimônio
momentaneamente indisponível aos envolvidos. (fl. 302 dos autos do
agravo).

Ademais, bem apontou a relatora Cláudia Lambert de Faria quando do julgamento


pela Câmara Especial:
Importante salientar, ainda, que não há provas de que o registro
deprotesto contra a alienação das quotas sociais das empresas do
falecido, a restrição judicial sobre a metade das parcelas pagas pelo de
cujus na aquisição do veículo Mercedes Benz Coupé e o depósito, em
subconta vinculada ao processo, de 50% dos ativos financeiros
descritos na escritura pública de inventário (medidas estas
determinadas para assegurar um possível quinhão dos agravados)
causarão prejuízos à agravante, à administração do patrimônio ou a
terceiros, até porque o magistrado singular autorizou a comprovação
81

de que parte dos valores foram empregados, por exemplo, na quitação


de dívidas (fl. 287 dos autos do agravo de instrumento).

Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência desta Corte:


DIREITO DA FAMÍLIA. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE
PATERNIDADE C/C PEDIDO DE PENSÃO POR MORTE E DE
RESERVA DE QUINHÃO HEREDITÁRIO. AGRAVO DE
INSTRUMENTO INTERPOSTO DE DECISÃO QUE DENEGOU
PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DA TUTELA PARA RESERVA DE
PARTE DO CRÉDITO DECORRENTE DE RECLAMATÓRIA
TRABALHISTA. EXISTÊNCIA DE FORTES INDÍCIOS DA
PATERNIDADE. RECURSO PROVIDO. 01. Se presentes os
pressupostos legais, tem a parte direito subjetivo à tutela
provisória apta a impedir que "a inevitável demora da prestação
jurisdicional seja capaz simplesmente de inviabilizar, pelo menos
do ponto de vista prático, a proteção do direito postulado"
(Barbosa Moreira). Cumpre ao juiz perquirir a "probabilidade do
direito" e o "perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo"
(CPC, art. 300) e ponderar: a) que se reveste de fumus boni juris
pretensão respaldada pela doutrina ou pela jurisprudência; b) que o
"perigo de dano" (periculum in mora) justificador da concessão da
tutela de urgência é aquele que resulta de um "risco concreto (e não o
hipotético ou eventual), atual (ou seja, o que se apresenta iminente no
curso do processo) e grave (vale dizer, o potencialmente apto a fazer
perecer ou a prejudicar o direito afirmado pela parte). Se o risco,
mesmo grave, não é iminente, não se justifica a antecipação da tutela.
É consequência lógica do princípio da necessidade" (Teori Albino
Zavascki); c) o princípio da proporcionalidade, pois "as realidades
angustiosas que o processo revela impõem que esse dano assim
temido não se limite aos casos em que o direito possa perder a
possibilidade de realizar-se, pois os riscos dessa ordem são
satisfatoriamente neutralizados pelas medidas cautelares. É preciso
levar em conta as necessidades do litigante, privado do bem a que
provavelmente tem direito e sendo impedido de obtê-lo desde logo.
[...] No juízo equilibrado a ser feito para evitar a transferência para o
réu dos problemas do autor, o juiz levará em conta o modo como a
medida poderá atingir a esfera de direitos daquele, porque não lhe é
lícito despir um santo para vestir outro. O grau de probabilidade de
existência do direito do autor há de influir nesse juízo, certamente"
(Cândido Rangel Dinamarco); d) que, quanto mais denso o fumus boni
juris, com menos rigor deverá avaliar os pressupostos concernentes
ao periculum in mora; quanto maior o risco de perecimento do direito
vindicado ou de dano de difícil reparação, com maior flexibilidade
deverá sopesar aqueles relativos ao fumus boni juris, podendo,
conforme as peculiaridades do caso, exigir que seja prestada caução
(CPC, art. 300, § 1º). 02. Havendo fortes indícios da paternidade,
impõe-se o deferimento de tutela de urgência para assegurar ao
autor a reserva de parte dos bens deixados por seu indigitado
genitor, na proporção do quinhão a que eventualmente terá
82

direito. (AI n. 0154004-30.2015.8.24.0000, rel. Des. Newton Trisotto,


j. em 12-05-2016, grifos acrescidos).

Assim sendo, ante ao preenchimento dos requisitos ensejadores da tutela de


urgência, ao menos em sede de cognição sumária, impera desprover o recurso.

2.5 Uma derradeira observação

Com efeito, uma vez presentes os requisitos essenciais, é ofício indeclinável do


julgador apreciar as pretensões trazidas à baila pela parte, justificando tanto seu acolhimento
quanto seu desacolhimento, sob pena de negar, de certa forma, a tutela jurisdicional,
porquanto lhe tolhe o direito constitucionalmente assegurado de ver seus argumentos
apreciados pela jurisdição estatal (arts. 3º, caput, do Código de Processo Civil de 2015; e 5º,
inc. XXXV, da Constituição da República Federativa do Brasil).
Nada obstante, não se trata de dimensão absoluta, vez que pode a decisão se
balizar em apenas alguns dos argumentos expostos, deixando-se de se manifestar sobre
outros, desde que suficientes aqueles ao desvelo da controvérsia e a justificar as razões do
convencimento do juízo, à luz dos arts. 458, inc. II, do Código de Processo Civil de 1973,
11, caput, e 489, inc. II, do Código de Processo Civil de 2015 e 93, inc. IX, da Constituição
da República Federativa do Brasil.
Outrossim, tal compreensão não ofende o § 1º do art. 489 do Código de Processo
Civil de 2015, em especial seu inc. IV, segundo o qual "não se considera fundamentada
qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que" "não enfrentar
todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão
adotada pelo julgador". Isso porque se a decisão se encontrar escorada em argumentos
suficientemente aptos a chancelar sua higidez, não sendo a conclusão fático-jurídica
formulada passível de infirmação por quaisquer outras alegações, a ausência de exame
específico das demais teses versadas estará albergada pela exceção legal.
Nesse sentido, assim já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART.


1.022 DO CPC. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE,
ERRO MATERIAL. AUSÊNCIA.
1. Os embargos de declaração, conforme dispõe o art. 1.022 do CPC,
destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade, eliminar
contradição ou corrigir erro material existente no julgado, o que não
ocorre na hipótese em apreço.
2. Argumenta-se que as questões levantadas no agravo denegado,
capazes, em tese, de infirmar a conclusão adotada monocraticamente,
não foram analisadas pelo acórdão embargado (art. 489 do
CPC/2015). Entende-se, ainda, que o art. 1.021, § 3º, do CPC/2015
veda ao relator limitar-se à reprodução dos fundamentos da decisão
agravada para julgar improcedente o agravo interno.
3. O julgador não está obrigado a responder a todas as questões
suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo
suficiente para proferir a decisão. A prescrição trazida pelo
83

art. 489 do CPC/2015 veio confirmar a jurisprudência já


sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, sendo
dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de
infirmar a conclusão adotada na decisão recorrida.
4.Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no AgRg nos EREsp
1483155/BA, rel. Min. OG Fernandes, j. em 15/06/2016, grifo
acrescido).

Delineados esses aspectos processuais, passo à conclusão.

3 A conclusão

Assim, quer pelo expressamente consignado neste voto, quer pelo que do seu teor
decorre, suplantadas direta ou indiretamente todas as questões ventiladas, deve o recurso ser
conhecido e desprovido, tudo nos termos supra.
É o voto.

Gabinete

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