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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS


FACULDADE DE HISTÓRIA

STEFFANY DOS SANTOS FLORES

Resenha do Artigo: Mairi dos Tupinambá e Belém dos portugueses: encontro e


confronto de memórias

BELÉM
2022
FIGUEIREDO, Aldrin Moura de. Mairi dos Tupinambá e Belém dos portugueses:
encontro e confronto de memórias. In Um imenso Portugal: estudos luso-amazônicos.
Belém: EDUFPA, 2020.

O artigo do professor, doutor Aldrin Moura de Figueiredo aborda, de forma geral,


elementos que seriam fundamentais para a construção histórica da cidade de Belém como
símbolo da Amazônia, desde a cidade indígena que havia aqui até a chegada dos portugueses,
seguida pela belle époque. Se utilizando de uma análise literária e historiográfica, o autor
discorre em sua escrita as “origens” dos indígenas que aqui habitavam, as ideias de um
território mestiço, as configurações da estabilização portuguesa, além das reconstruções que
os mesmos empreenderam sobre as obras aqui já empregadas pelos nativos, e por último
analisa a perda da identidade de uma cidade cabana no universo urbano.
Subdividindo seus argumentos em 4 (quatro) tópicos, o autor, no primeiro deles,
intitulado Fluviocracias: Tejo e Amazonas trabalha como os rios da região norte são
importantes para pensarmos o porquê da cidade de Belém se transformar no centro de
convergência política e econômica de toda a região norte1, justamente por conta do ponto de
confluência entre esses rios ser em território belenense. Para além disso, de acordo com o
autor, a imagem desses rios constroem o que chama de “metonímia da origem da Amazônia”,
uma paisagem cultural onde as águas têm papel de destaque. Com a visibilidade que o
território amazônico passa a ter, de início em mapas cartográficos por conta da centralidade
do rio Amazonas, a ideia de espaço vivido começa a surgir.
No tópico Mairi: A Cidade Tupinambá Figueiredo discorre sobre os usos do termo
mairi e o significado atribuído ao mesmo por intelectuais, aspecto que se liga as análises dos
usos da língua indígena na formação dos nomes próprios de lugares, da sua origem e
evolução nos primeiros séculos da história paraense2. Ainda dentro dessa discussão o autor
traz ao debate a participação indigena na estabilização dos europeus em terras amazônicas,
mostrando como o trabalho e construções efetuados pelos mesmos se torna essencial para as
bases da cidade de Belém, e a partir daí cabe pensar-se sobre o inicio da escravidão indígena e
as rebeliões sociais que surgem nesse processo.
Adiante em Feliz Lusitânia a reflexão do autor é sobre as questões que desdobram-se
acerca das políticas públicas de turismo e patrimônio histórico que destacam a relevância das

1
Figueiredo, Aldrin Moura de. Mairi dos Tupinambá e Belém dos portugueses: encontro e confronto de
memórias. In Um imenso Portugal: estudos luso-amazônicos. Belém: EDUFPA, 2020, p. 19.
2
Idem, ibidem, p. 23.
construções lusitanas, no então conhecido bairro da Cidade Velha. Já exposto em outro
momento de seu texto, o autor retoma nesse tópico o cenário de expulsão dos indígenas dessa
área da cidade para a periferia, com o intuito de desenvolver os arruamentos empreendidos
pelos portugueses. O que acontece nesse momento é a separação de uma cidade indígena e
uma cidade lusitana, seria a Cidade Velha portuguesa e a Campina indígena, complementares
entre si. O fato é que os indígenas não ficam de fora desse meio social, com o estabelecimento
de quatro importantes ordens religiosas – Franciscanos, Carmelitas, Mercedários e Jesuítas –
para a catequização dos indígenas, as trocas culturais começam a se desenvolver. Certamente
essas trocas corroboraram para a formação da cidade, com o destaque para a contribuição
indígena pois como argumenta “O próprio ir e vir dependia do indígena.” (FIGUEIREDO,
2020, p. 27).
Sua última análise, no tópico Mestiços e Cabanos: Outras Memórias a argumentação
de Figueiredo se desenvolve acerca dos trabalhos produzidos em âmbito nacional sobre o
tema da mestiçagem e a perda que o movimento político da Cabanagem sofre nos usos dos
espaços da memória na paisagem urbana.3
Com a ocorrência do processo de mestiçagem em território nacional, diversos
intelectuais passam a dedicar-se à escrita sobre o tema. Na Amazônia, o nome de maior
destaque foi o de José Veríssimo, que inicia de acordo com o autor “[...] uma espécie de
inauguração dos estudos etnográficos sobre a Amazônia, em profundo diálogo com os debates
mais importantes que ocorriam no Brasil e no estrangeiro.” (FIGUEIREDO, 2020, p.28). O
fato é que o tema da mestiçagem, mais uma vez, assim como já citado anteriormente, a
questão dos rios, configuram uma espécie de biografia da Amazônia, utilizada posteriormente
em diversos trabalhos. Com isso, a cidade de Belém recebe o título de “cidade mestiça”,
decorrente dos diversos contatos e trocas culturais que aqui ocorreram.
No que se refere a questão da Cabanagem, o que o autor discorre é sobre como o
principal movimento político e de maior alcance da Amazônia perde seu espaço na memória
urbana da cidade. Incontestavelmente esse movimento nos deixa quase nenhum registro de
imagem, porém o autor nos chama a atenção para as histórias e narrativas visuais que ainda
podem se escrever4, isso significa estudar as imagens que retratavam o que o autor chama de
reafirmação da nacionalidade5. É com isso que se torna possível, em 1933 com a pintura

3
Figueiredo, Aldrin Moura de. Mairi dos Tupinambá e Belém dos portugueses: encontro e confronto de
memórias. In Um imenso Portugal: estudos luso-amazônicos. Belém: EDUFPA, 2020, p. 34.
4
Idem, ibidem, p. 35.
5
Idem, ibidem, p. 36.
Tubas dos Mundurucus de Gariasso pensar a figura do indígena associada ao cabano, além da
integração desses indivíduos à paisagem de Belém.
Portanto, conclui-se com os argumentos de Aldrin Figueiredo que pensar as
construções lusitanas na cidade de Belém é pensar inseparavelmente as contribuições
indígenas. Esses que estiveram de forma assídua tanto em obras de natureza material quanto
no que se refere a questão cultural. O fato é que, apesar do apagamento desses indivíduos do
centro urbano, o que hoje em dia conhecemos como centro histórico, ao conhecer a história do
espaço se faz indissociável a memória dos mortos e conflitos que ali ocorreram.

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