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2
Adriana
Braitt
Lima1
e
Darci
de
Oliveira
Santa
Rosa
1
Departamento
de
Saúde
da
Universidade
Estadual
de
Feira
de
Santana
(UEFS),
Brasil.
abraitt@gmail.com;
2
Pós-‐Graduação
em
Enfermagem
da
Universidade
Federal
da
Bahia
(UFBA),
Brasil.
darcienf@ufba.br.
Resumo.
Revisão
de
literatura
acerca
da
Análise
Existencial
de
Viktor
Frankl
e
sua
relação
com
o
cuidar/cuidado
em
enfermagem.
O
referencial
teórico-‐filosófico
fundamentou-‐se
em
investigações
com
foco
no
legado
de
Viktor
Emil
Frankl.
O
objectivo
foi
compreender
a
Análise
Existencial
Frankliana
relacionando
com
o
cuidar
na
enfermagem.
O
cuidar/cuidado
ao
ser
humano
quando
compreendido
como
uma
soma
das
dimensões
biológica,
psicológica
e
espiritual
torna
visível
valores
que
manterão
os
canais
do
campo
psicofísico
do
indivíduo
abertos
para
a
expressão
da
pessoa
espiritual,
encontro
de
sentido
de
vida
mesmo
na
situação
concreta
da
doença.
Palavras-‐chave:
existencialismo,
cuidar,
enfermagem.
1 Introdução
O
processo
de
cuidar/cuidado
em
enfermagem
tem
o
seu
foco
pautado
na
inter-‐relação
entre
o
ser
cuidado
e
o
cuidador.
O
ser
cuidado
torna-‐se
uma
pessoa
vulnerável
devido
à
doença,
o
que
requer
do
cuidador
o
“saber
fazer”,
o
“saber
estar”
e,
também,
o
“saber
ser”
com
empatia,
atenção
humanizada
e
personalizada
(Zangão,
Mendes,
2014,
p.
183).
Para
Watson
(2002,
p.
65)
“o
cuidar,
na
enfermagem,
tem
sido
reconhecido
tanto
como
processo
como
intervenção:
com
efeito,
como
característica
com
um
imperativo
ético
moral,
como
uma
ontologia
e,
como
uma
base
filosófica
e
científica
para
a
enfermagem”.
Assim,
a
enfermagem
urge
por
referências
que
sigam
conhecimentos
em
ontologias,
epistemiologias,
valores
e
visões
de
mundo
que
fundamentem
de
modo
compreensivo
e
prático
a
relação
de
cuidado
entre
cuidador
e
ser
cuidado.
Foi
com
este
pensamento
que
a
teórica
de
enfermagem,
Joyce
Travelbee,
autora
do
“Modelo
de
Relação
Pessoa-‐a-‐Pessoa”,
inspirou-‐se
na
obra
de
Viktor
Frankl
para
criar
os
pressupostos
de
sua
teoria.
Entre
estes,
o
conceito
de
enfermagem:
“um
processo
interpessoal
através
do
qual
o
profissional
de
enfermagem
auxilia
o
indivíduo,
família
ou
comunidade
na
prevenção
e
a
lidar
com
a
experiência
da
doença
e
do
sofrimento
e,
se
necessário,
a
encontrar
sentido
nestas
experiências”
(Tomey,
2004,
p.
470).
O
cuidar/cuidado
com
alicerces
teóricos
e
filosóficos
da
Análise
Existencial
de
Viktor
Frankl
é
uma
possibilidade
de
se
trilhar
caminho
para
uma
vida
plena
de
sentido
na
relação
entre
o
cuidador
e
ser
cuidado.
1193
>>Atas
CIAIQ2016
>>Investigação
Qualitativa
em
Educação//Investigación
Cualitativa
en
Educación//Volume
1
Segundo
Lukas
(2012,
p.
8),
a
obra
de
Viktor
Frankl
representa
“um
acervo
de
sabedoria
humana”
e
promove
“as
relações
humanas
ao
destacar
a
convivência
e
a
solidariedade
no
amor”.
As
autoras
deste
estudo
motivaram-‐se
em
desenvolver
este
tema,
após
a
construção
da
dissertação
de
mestrado
intitulada:
“O
sentido
de
vida
do
familiar
do
paciente
crítico”.
Elas
perceberam
que
a
enfermeira
tem
a
possibilidade
de
prestar
cuidados
despertando
na
pessoa
conteúdos
de
sentido,
que
poderão
ser
um
bálsamo
de
ajuda
frente
às
situações
de
possibilidade
de
morte,
culpa,
dor
e
sofrimento
(Lima,
2005;
Lima,
Santa
Rosa,
2008).
Nessa
perspectiva,
elaborou-‐se
a
seguinte
interrogação
de
pesquisa:
Como
a
Análise
Existencial
de
Viktor
Frankl
se
relaciona
com
o
cuidar/cuidado
em
enfermagem?
E,
estabeleceu-‐se
o
seguinte
objectivo:
Compreender
a
Análise
Existencial
de
Viktor
Frankl
relacionando
com
o
cuidar/cuidado
em
enfermagem.
Não
se
pretendeu
abordar
todos
os
pilares
da
Análise
Existencial
Frankliana,
mas,
apenas,
os
valores
existenciais
e
o
sentido
de
vida,
combinando-‐os
à
visão
de
cuidar/cuidado
das
autoras.
2 Metodologia
O
estudo
baseou-‐se
na
abordagem
qualitativa,
tipo
revisão
de
literatura
por
meio
de
referências
virtuais
e
físicas.
As
pesquisas
de
revisão
de
literatura
“consistem
em
organizar,
esclarecer
e
resumir
as
principais
obras
existentes,
bem
como
fornecer
citações
completas
abrangendo
o
espectro
de
literatura
relevante
em
uma
área”
(Vosgerau,
Romanowski,
2014,
p.
167).
Posto
isto,
a
construção
deste
estudo
foi
guiada
por
algumas
considerações
do
modelo
de
revisão
sistemática
proposto
por
Sampaio
e
Mancini
(2007),
a
saber:
a
definição
de
uma
questão
e
objectivo
de
pesquisa,
a
identificação
e
seleção
da
literatura;
e,
pela
análise
temática
e
categorial
de
Santa
Rosa
(1999)
quanto
à
construção
das
categorias.
2 Resultado e Discussão
Após
a
seleção
das
referências
(livros,
artigos
e
teses),
considerando
a
qualidade
do
conteúdo
sobre
a
temática,
fez-‐se
a
leitura
destas
para
seleção
e
identificação
das
frases
significantes
de
acordo
com
o
que
se
mostrava
mais
visível
ao
olhar
das
autoras
para
a
compreensão
da
Análise
Existencial
de
Viktor
Frankl
relacionando
com
o
cuidar/cuidado
em
enfermagem.
Assim,
emergiram
as
unidades
de
significado,
que
ao
serem
agrupadas,
formaram
duas
subcategorias:
Considerações
sobre
a
Análise
Existencial
de
Viktor
Frankl
e
Relação
da
Análise
Existencial
de
Viktor
Frankl
com
o
cuidar/cuidado
em
Enfermagem.
Estas,
unidas,
construiram
a
categoria
empírica:
A
Análise
Existencial
de
Viktor
Frankl
e
o
cuidar/cuidado
na
enfermagem,
titulação
deste
estudo.
A
Tabela
1
demonstra
as
etapas
desta
metodologia.
1194
>>Atas
CIAIQ2016
>>Investigação
Qualitativa
em
Educação//Investigación
Cualitativa
en
Educación//Volume
1
Tabela
1.
Passos
da
Metodologia:
construção
da
categoria
empírica:
A
Análise
Existencial
de
Viktor
Frankl
e
o
cuidar/cuidado
na
enfermagem
2.1 Categoria 1: Conceituando a Análise Exitencial de Viktor Emil Frankl
Viktor
Emil
Frankl
foi
um
médico
neurologista
e
psicoterapeuta,
nascido
na
cidade
de
Viena,
na
Áustria
em
1905
e
falecido
em
1997.
Assim
como,
Sigmund
Freud
foi
o
criador
da
“Primeira
Escola
Vienense
de
Psicoterapia”
e
Alfred
Adler
da
“Segunda
Escola
Vienense
de
Psicoterapia”,
Frankl
foi
o
fundador
da
“Terceira
Escola
Vienense
de
Psicoterapia”,
“A
Logoterapia”
ou
“Análise
Existencial”,
ou
seja,
a
terapia
através
do
sentido,
que
se
baseia
no
significado
da
existência
do
ser
humano
e
na
busca
por
um
sentido.
A
palavra
“Logoterapia”,
utilizada
para
nomear
a
teoria
de
Viktor
Frankl,
surgiu
da
palavra
grega
“logos”
que
significa
“sentido”
(Frankl,
2009;
Gomes,
1987,
p.
11).
Desde
jovem,
Frankl
interessava-‐se
pelo
estudo
da
natureza
existencial
do
homem.
Frankl
defendia
que
o
homem
é
livre,
responsável,
com
consciência
de
sua
responsabilidade
que
busca
um
sentido
para
sua
vida
e
possui
um
Deus
inconsciente
dentro
de
si.
Para
ele,
a
vida
tem
um
sentido
a
partir
do
momento
em
que
somos
atirados
neste
mundo,
faltando
a
cada
um
o
descobrir-‐se,
pois
esse
sentido
está
em
nosso
interior
(Gomes,
1987).
Frankl
inspirou-‐se,
sobre
o
sentido
de
vida
a
partir
de
sua
experiência
nos
campos
de
concentração
de
Turkhein,
Theresienstad,
Kaufering
e
Auschwitz
durante
a
Segunda
Grande
Guerra
Mundial,
onde
foi
o
prisioneiro
número
119.104,
por
dois
anos
(Frankl,
2009,
p.
18).
Nesse
período,
ele
estava
longe
dos
familiares,
amigos
e
convivia
com
a
possibilidade
de
morte
de
todos.
Dedicava-‐se
à
terapia
com
os
prisioneiros,
impedindo
que
se
suicidassem
nas
cercas
elétricas
e
com
a
esperança
de,
um
dia,
reencontrar
seus
pais,
irmãos
e
esposa,
com
a
qual
tinha
convivido
apenas
poucos
meses.
Dessa
experiência,
surgiu
a
motivação
para
escrever
o
livro
“Um
Psicólogo
no
Campo
de
Concentração”,
com
as
bases
existenciais
das
suas
concepções
na
busca
do
sentido
de
vida,
o
que
explicitarei
a
seguir
(Frankl,
2009;
Xausa,
1988,
p.
31).
Para
Frankl,
o
sentido
de
vida
é
específico
na
vida
de
uma
determinada
pessoa
e
em
um
dado
momento.
Ele
entende
que
cada
ser
humano
tem
sua
missão
singular
na
vida
ou
vocação
própria,
uma
tarefa
concreta
que
exige
realização.
Assim,
cada
pessoa
não
pode
ser
trocada,
nem
sua
vida
pode
ser
copiada,
a
tarefa
é
tão
específica
quanto
à
oportunidade
única
de
levá-‐la
com
sentido
(Frankl,
Lapide,
2013).
A
Análise
Existencial
define
o
ser
humano
como
ser
tridimensional
constituído
do
corpo
(físico):
estrutura
orgânica
e
processos
fisiológicos;
da
alma
(psíquico):
impulsos,
emoções,
instintos,
sensações,
padrões
comportamentais
e
costumes
sociais
e
do
espiritual:
personalidade,
instância
1195
>>Atas
CIAIQ2016
>>Investigação
Qualitativa
em
Educação//Investigación
Cualitativa
en
Educación//Volume
1
Tabela 2. Valores e conceitos na visão da Análise Existencial de Viktor Frankl
-‐Valores
de
atitude
“[...]
jogar
o
espiritual
intacto
no
ser
humano
A
esperança
de
cura,
o
pensamento
contra
um
psicofísico
predisposto
às
doenças.
Se
positivo,
a
transcendência
com
a
fé
nos
der
certo,
podem
às
vezes
ocorrer
‘milagres’,
que
símbolos:
imagens
de
santos,
orações,
no
sentido
estritamente
científico,
significam
o
rosário
entre
outros
(Lima,
2005).
improvável
diante
de
um
prognóstico”
(LUKAS,
1990,
p.
160).
1196
>>Atas
CIAIQ2016
>>Investigação
Qualitativa
em
Educação//Investigación
Cualitativa
en
Educación//Volume
1
O
apoio
para
o
doente
não
consiste
numa
ajuda
para
simplesmente
agradá-‐los,
mas,
sim,
para
que
eles
possam
vivenciar
e
superar
as
dificuldades
da
situação
concreta.
Para
isso,
é
necessário
que
se
busque
despertar
a
consciência
quanto
aos
valores
de
suas
atitudes
positivas
frente
ao
sofrimento.
Os
resultados
positivos
da
atenção
de
enfermagem
podem
emergir
das
forças
espirituais
(Lima,
Santa
Rosa,
2008).
Nesse
sentido,
observa-‐se
que
a
utilização
de
procedimentos
não
materiais,
como
estímulo
à
profissão
de
fé,
evidencia
a
eficácia
dos
tratamentos
empregados.
Alguns
doentes
usam
meios
para
essas
forças
por
meio
de
promessas,
orações,
amuletos,
terços,
santos,
medalhas,
água
benta,
enfim,
elementos
e
forças
que
fazem
parte
de
sua
crença
e
fé
na
vida.
O
significado
desses
símbolos
é
de
fundamento
e
responsabilidade
espiritual,
pois
podem
significar
vitórias
diante
do
medo
do
destino
inevitável.
Eles
podem
transmitir
força
à
pessoa
que
se
encontra
apreensiva
e
fragilizada.
Nessa
perspectiva,
o
enfermeiro,
pode
prestar
apoio
à
pessoa,
por
meio
do
diálogo,
entendendo
a
origem
do
medo
da
morte,
da
dor
e
do
sofrimento
e
encontrando
e
apreciando
valores,
potencialidades
de
sentido.
5 Conclusão
Compreender
a
Análise
Existencial
de
Viktor
Frankl
possibilitou
a
percepção
da
vivência
do
indivíduo
que
cuidamos
como
ser
tridimensional.
Assim,
o
enfermeiro
tem
possibilidades
de
manter
e/ou
abrir
os
canais
do
campo
psicofísico
para
a
expressão
da
dimensão
espiritual
do
indivíduo,
podendo
levá-‐
lo
ao
encontro
de
sentido
de
vida
mesmo
na
situação
concreta
da
sua
doença.
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face
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Mondrian
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1197
>>Atas
CIAIQ2016
>>Investigação
Qualitativa
em
Educação//Investigación
Cualitativa
en
Educación//Volume
1
Lima,
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Técnicas
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Científicas.
Watson,
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Enfermagem
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novo
paradigma
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Loures:
Lusociência
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Edições
Técnicas
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Zangão,
O.,
Mendes,
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sobre
a
preservação
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intimidade
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1198