Você está na página 1de 181

Aspectos Culturais da

Língua Espanhola
Prof. Carlos Rodrigo de Oliveira

2018
Copyright © UNIASSELVI 2018

Elaboração:
Prof. Carlos Rodrigo de Oliveira

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

O48a
Oliveira, Carlos Rodrigo de
Aspectos culturais da língua espanhola / Carlos Rodrigo de
Oliveira. – Indaial: UNIASSELVI, 2018.

173 p.; il.


ISBN 978-85-515-0160-3

1.Língua espanhola – Brasil. I. Oliveira, Carlos Rodrigo de


II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.
CDD 468.2469

Impresso por:
Apresentação
Aprender uma nova língua também inclui conhecer uma série de
significados e códigos culturais que fazem parte da realidade social em que
essa língua se insere. Formar frases e pronunciá-las não basta para dominá-
la; é preciso saber analisar, refletir e contextualizar histórica e culturalmente
nossos enunciados, os quais são atravessados por singularidades e visões de
mundo diversas.

A disciplina de Aspectos Culturais da Língua Espanhola tem um


importante papel nesse sentido, pois através dela você poderá compreender
esse movimento social da língua, bem como relacioná-lo ao conceito de
cultura, aplicando ambos conceitos (língua e cultura) ao ensino de espanhol
à luz da contemporaneidade. Além disso, esta é uma disciplina reflexiva, com
temas pertinentes à realidade da diversidade escolar, linguística e cultural.
Os conteúdos apresentados nas unidades desenvolvem-se, principalmente,
em torno de teorias antropológicas e sociológicas, que têm sido aprofundadas
pela Linguística Aplicada dentro de seus propósitos interdisciplinares.

Este conteúdo está dividido em três unidades: a primeira trata de


conceitos como cultura e identidade e os discute historicamente e sob a
perspectiva da pós-modernidade; a segunda unidade abrange estudos
sobre interculturalidade, multiculturalismo e hibridação cultural, muito
pertinentes ao ensino de espanhol, uma língua caracterizada por sua
variedade linguística e cultural; e a terceira e última unidade aborda a língua
como prática social e sua relação com a cultura, seguido pelos estereótipos
e os estigmas, finalizando com uma contextualização do tema das unidades
com a prática pedagógica.

A cada tópico deste livro de estudos, você será desafiado a analisar


conceitos e dialogar sobre eles, para isso, use seus conhecimentos prévios
e percepções, contribuindo com perspectivas semelhantes ou diferentes às
apresentadas.

Esperamos que aproveite ao máximo esse momento de aprendizagem,


e que os conhecimentos trazidos ajudem na transformação de sua prática em
sala de aula.

Um abraço,
Professor Carlos.

III
NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto


para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!

UNI

Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos


materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais
os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais
que possuem o código QR Code, que é um código
que permite que você acesse um conteúdo interativo
relacionado ao tema que você está estudando. Para
utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos
e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar
mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!

IV
V
VI
Sumário
UNIDADE 1 – APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE.................. 1

TÓPICO 1 – O PERCURSO HISTÓRICO DO CONCEITO DE CULTURA................................. 3


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 3
2 CULTURA: UM CONCEITO HISTORICAMENTE EM TRANSFORMAÇÃO........................ 3
3 CULTURA HOJE.................................................................................................................................... 7
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 14
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 15

TÓPICO 2 – CULTURA E MODERNIDADE...................................................................................... 17


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 17
2 AS RAÍZES DO CULTO, POPULAR E MASSIVO......................................................................... 17
3 O NASCIMENTO DAS CULTURAS NACIONAIS....................................................................... 24
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 32
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 33

TÓPICO 3 – É POSSÍVEL DEFINIR CULTURA?............................................................................... 35


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 35
2 AS DEFINIÇÕES DE CULTURA NAS CIÊNCIAS SOCIAIS...................................................... 35
3 AS DEFINIÇÕES DE CULTURA NA LINGUÍSTICA APLICADA............................................. 39
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 42
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 43

TÓPICO 4 – O QUE É IDENTIDADE?................................................................................................. 45


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 45
2 A FORMAÇÃO DE NOSSAS IDENTIDADES............................................................................... 45
3 A EVOLUÇÃO NA CONCEPÇÃO DE IDENTIDADE.................................................................. 49
4 A IDENTIDADE NA PÓS-MODERNIDADE................................................................................. 51
5 A IDENTIDADE E A DIFERENÇA.................................................................................................... 53
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 59
RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 60
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 61

UNIDADE 2 – OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL........... 63

TÓPICO 1 – O MULTICULTURALISMO............................................................................................ 65
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 65
2 AS VERTENTES DO MULTICULTURALISMO............................................................................. 65
3 O MULTICULTURALISMO E A COEXISTÊNCIA ENTRE CULTURAS.................................. 69
4 O MULTICULTURALISMO CRÍTICO............................................................................................. 72
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 77
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 78

VII
TÓPICO 2 – O PROCESSO DE HIBRIDAÇÃO CULTURAL.......................................................... 81
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 81
2 O QUE É HIBRIDAÇÃO CULTURAL?............................................................................................. 81
3 A INDÚSTRIA CULTURAL................................................................................................................ 84
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 89
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 90

TÓPICO 3 – A INTERCULTURALIDADE.......................................................................................... 91
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 91
2 FACES SOCIAIS DA INTERCULTURALIDADE........................................................................... 91
3 A INTERCULTURALIDADE CRÍTICA............................................................................................ 96
4 A INTERCULTURALIDADE NO ENSINO DE LÍNGUAS.......................................................... 100
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 104
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 105

UNIDADE 3 – ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA................ 111

TÓPICO 1 – A RELAÇÃO ENTRE LÍNGUA E CULTURA.............................................................. 113


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 113
2 A LÍNGUA COMO PRÁTICA SOCIAL E CULTURAL................................................................. 113
3 LÍNGUAS EM CONTATO E CHOQUES CULTURAIS................................................................. 119
4 O RELATIVISMO CULTURAL........................................................................................................... 122
5 COMO ENSINAR A LÍNGUA NA RELAÇÃO COM A CULTURA?.......................................... 125
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 130
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 131

TÓPICO 2 – DA DIVERSIDADE À INTOLERÂNCIA..................................................................... 133


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 133
2 DIVERSIDADE OU DIFERENÇA?.................................................................................................... 133
3 O QUE SÃO ESTEREÓTIPOS?........................................................................................................... 135
4 O QUE SÃO ESTIGMAS?.................................................................................................................... 146
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 151
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 152

TÓPICO 3 – A PRÁTICA INTERCULTURAL DE ENSINO DE LE................................................ 155


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 155
2 A IMPORTÂNCIA DO ENSINO DE LÍNGUAS PARA SUPERAÇÃO DA
INTOLERÂNCIA .................................................................................................................................. 155
3 DA TEORIA À PRÁTICA: O DIÁLOGO SOBRE PRECONCEITOS NAS AULAS DE LE...... 158
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 166
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 167

REFERÊNCIAS.......................................................................................................................................... 169

VIII
UNIDADE 1

APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE
CULTURA E IDENTIDADE

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir dessa unidade, você será capaz de:

• discutir o percurso histórico do conceito de cultura;

• localizar historicamente o nascimento de noções de culto e cultura nacio-


nal;

• relacionar aspectos históricos, políticos e sociais às concepções hegemôni-


cas em torno do conceito de cultura;

• relacionar os estudos sobre culturas nas ciências sociais com a linguística


aplicada;

• perceber cultura como um conceito amplamente discutido e aberto;

• identificar a relação entre identidade e cultura.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – O PERCURSO HISTÓRICO DO CONCEITO DE CULTURA

TÓPICO 2 – CULTURA E MODERNIDADE

TÓPICO 3 – É POSSÍVEL DEFINIR CULTURA?

TÓPICO 4 – O QUE É IDENTIDADE?

1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1

O PERCURSO HISTÓRICO DO CONCEITO DE


CULTURA
1 INTRODUÇÃO
Este é o primeiro tópico do nosso livro de estudos da disciplina de Aspectos
Culturais da Língua Espanhola. Através dele você vai se aprofundar sobre o
conceito de cultura, um termo que você já leu ou estudou em outras disciplinas,
não é mesmo? Sobretudo em disciplinas de língua, costuma ser associado aos
aspectos, características individuais e coletivas de sujeitos hispano-falantes.

Em algum momento do curso, você se perguntou como e quando surgiu


essa associação? Além disso, o que mais a palavra cultura lembra? Sugiro que
pense a respeito. Em seguida, inicie a leitura do tópico, pois esta reflexão ajudará
a entender melhor as raízes do termo e a fazer correlações com o uso deste na
atualidade.

Então vamos lá! O tópico está dividido em quatro partes, a primeira


compreende o surgimento da noção de cultura e sua relação histórica com outros
conceitos, por exemplo, civilização; a segunda parte trata da cultura nos dias de hoje.

2 CULTURA: UM CONCEITO HISTORICAMENTE EM


TRANSFORMAÇÃO
Você consegue imaginar o que significava cultura em seus primórdios?
Para ajudá-lo a desvendar este mistério, trazemos a seguir três imagens. Apenas
uma delas remete ao significado da palavra cultura no século XIII. ¡A descubrirla!

FIGURA 1 – ARTESANATO

FONTE: Disponível em: <https://pixabay.com/pt/cestaria-vannier-


vime-artes%C3%A3o-m%C3%A3o-1958239/>. Acesso em:
28 out. 2017.
3
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

FIGURA 2 – CULTIVO AGRÍCOLA

FONTE: Disponível em: <https://pxhere.com/es/photo/1058995>. Acesso


em: 28 out. 2017.

FIGURA 3 – APRECIAÇÃO DA ARTE EM MUSEU

FONTE: Disponível em: <https://pixabay.com/pt/exposi%C3%A7%C3%A3o-


galeria-de-arte-galeria-362163/>. Acesso em: 28 out. 2017.

Agora, observando as três imagens, responda: qual delas remete à noção


de cultura no século XIII?

a) Saber produzir adereços, retratada na primeira imagem.


b) Saber cultivar a terra, conforme mostra na segunda imagem.
c) Saber o significado de uma obra artística e apreciá-la, conforme a terceira
imagem.

Se você respondeu saber cultivar a terra, opção b, ¡Enhorabuena! Você


acertou. Segundo Eagleton (2011, p. 10), este foi o primeiro significado de cultura,
o qual derivou do latim colere.

4
TÓPICO 1 | O PERCURSO HISTÓRICO DO CONCEITO DE CULTURA

Achou curioso esse significado? Se sim, talvez seja pelo mesmo motivo que
eu, ele nos mostra como o conceito de cultura evoluiu e se afastou do seu sentido
original, sendo usado nos dias de hoje para fazer referência a bens materiais e
intelectuais, que praticamente desconsideram o valor do trabalho e da vida no
campo, comenta Eagleton.

Dentre as transformações do termo cultura, esta parece ser a mais


interessante e, talvez, a mais radical.

E
IMPORTANT

Devemos nos lembrar que o sentido de cultura como cultivo ou cuidado


mantém-se nos dias de hoje, principalmente ligado a termos como agricultura, floricultura etc.

Segundo Eagleton (2011), é importante saber que historicamente,


adaptando-se às diferentes sociedades e suas realidades políticas, a palavra
foi ganhando associações com outros termos e, consequentemente, outras
conotações. Uma delas é a sua relação com a noção de colonialismo (colonus),
estando ligado a princípios de habitação/ocupação.

Você já ouvir falar, por exemplo, em aculturação? Este termo representa


a ligação de cultura com colonização, já que significa, segundo o Dicionário
Priberam (2008) de Língua portuguesa, “fenômeno pelo qual um indivíduo ou
um grupo humano de uma cultura definida entra em contato permanente com
uma cultura diferente e se adapta a ela ou dela retira elementos culturais”.

Assim, o termo cultura associado à ideia do estabelecimento de colônias


indica, mesmo que de forma impositiva, a relação entre culturas e a produção de
novas a partir dessa relação. Um exemplo, talvez um tanto traumático, desse tipo
de processo foi a colonização das Américas portuguesa e espanhola, em que os
europeus, de forma violenta, tentavam erradicar a cultura dos índios, tentando
libertá-los de suas origens e costumes para assumir outras, por exemplo, o
catolicismo enquanto religião.

Sobre o conceito de cultura, outra interferência conceitual importante de


ser mencionada é a que passou no século XVIII, época do Iluminismo, quando
cultura (termo alemão) era associado ao termo civilização (termo francês), e ambos
usados em função do progresso geral e intelectual das nações (EAGLETON,
2011). Para os iluministas, em oposição ao natural, cultura dizia respeito aos
conhecimentos adquiridos e transmitidos pelo ser humano durante sua vida,
sendo esses conhecimentos o seu diferencial em relação aos animais (CUCHE,
2002, p. 11).

5
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

Desse modo, o refinamento intelectual do indivíduo é que fazia dele um


sujeito “culto”, ou com cultura. Esse refinamento acontecia, por sua vez, através
do processo de instrução, o qual tinha a função de preparar esse sujeito para a
convivência e atuação em sociedade; caso este sujeito não possuísse esses saberes
essenciais, era reconhecido socialmente como uma pessoa irracional e sem cultura
(SOUZA, 2010).

FIGURA 4 – O PROCESSO DE INSTRUÇÃO TINHA O PAPEL DE ‘TORNAR CULTO’


DURANTE O ILUMINISMO

FONTE: Disponível em: <https://pixabay.com/photos/blackboard-school-frame-green-


2640979/>. Acesso em: 05 mai. 2020.

NOTA

Como você já deve saber, o Iluminismo foi o movimento de ideias ocorrido


nos dois últimos decênios do século XVII e no século XVIII, na Europa Ocidental. Também
conhecido como Filosofia das Luzes, esse movimento desafiava a tradição e a autoridade, e
tinha como principais características a crença na razão humana e no progresso (LEÃO, 2011,
p. 72).

6
TÓPICO 1 | O PERCURSO HISTÓRICO DO CONCEITO DE CULTURA

Em contrapartida, o conceito iluminista com relação à cultura ganha, ao


longo do tempo, uma face descritiva e passa a narrar a realidade da sociedade.
Sendo que nos dias de hoje o termo nos remete ao que está em nossa volta. No
entanto, o conceito não conseguiu livrar-se totalmente das conotações relativas
a normatizações e homogeneizações do passado, mantendo-se, nesse conflito de
ideais, entre os modelos de cultura uniformes e a realidade da diversidade.

Ressaltando a importância desse reconhecimento da diversidade, foi


cunhado na conferência mundial sobre políticas culturais, a Mondiacult, que
ocorreu no México em 1982, o conceito de cultura como:

Conjunto dos traços distintivos espirituais e materiais, intelectuais e


afetivos que caracterizam uma sociedade ou um grupo social e que
abrange, além das artes e das letras, os modos de vida, as maneiras
de viver juntos, os sistemas de valores, as tradições e as crenças
(UNESCO, 2002, s. p.).

Esta visão é próxima da compartilhada socialmente, não é mesmo? Sua


visão sobre cultura coincide com esta? Na modernidade, ainda resiste a noção de
culto relacionado às artes e letras. Esta definição faz questão de ressaltar que a
noção de cultura, da qual a expressão culto deriva, vai muito além desses aspectos,
e corresponde a tudo aquilo que é construído pelo ser humano e modifica a sua
realidade.

3 CULTURA HOJE
Considerando a multiplicidade de interferências que o conceito de cultura
sofreu, fica difícil chegar a uma conclusão sobre o que é cultura, não é mesmo? O
conceito da Unesco que você viu se aproxima do que entendemos por cultura, no
entanto ainda precisamos desmembrar esse conceito, afinal ele não é só formado
por coisas materiais, mas também comportamentais e espirituais.

Segundo Canedo (2009, p. 4), existem pelo menos “três concepções


fundamentais sobre cultura que ajudam a explicá-la na atualidade. A primeira
delas, Canedo chama de modos de vida que caracterizam uma coletividade,
que estão relacionados aos significados atribuídos dentro do grupo, ou seja,
aquilo que ao mesmo tempo une o grupo, o diferencia de outros. Você deve
estar se perguntando se isso é material, espiritual ou comportamental, acertei?
Essa divisão é muito mais complexa, porém, para simplificarmos, podemos falar
em significados, e aspectos espirituais e comportamentais. São construídos na
linguagem e funcionam como uma interpretação, ou seja, atribuímos juízo de
valor coletivamente aceito. Vejamos um exemplo:

7
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

FIGURA 5 – GESTO CULTURAL DE PONTUALIDADE

FONTE: Disponível em: <https://pixabay.com/pt/vectors/em


pres%C3%A1rio-tempo-de-rel%C3%B3gio-311337/>.
Acesso em: 05 mai. 2020.

Já sabe a qual situação do dia a dia a imagem acima se refere?

A figura inserida se refere a um aspecto muito importante para alguns


argentinos, segundo Romanzoti (2015). Você pode até não ligar muito para
essa questão, mas na Argentina, assim como em outras culturas que prezam a
pontualidade, o atraso pode significar desrespeito com o outro e gerar conflitos.
Significa que ao atribuir um horário, costuma ser comum não haver atrasos, é
uma ideia culturalmente aceita.

Se você não se considera uma pessoa pontual, quando viajar à Argentina,


faça um esforço de chegar uns minutos antes de seus companheiros, pois ajudará
você a conviver em harmonia com alguns dos nossos hermanos.

O que o gesto a seguir, ilustrado na imagem, significa para você?

8
TÓPICO 1 | O PERCURSO HISTÓRICO DO CONCEITO DE CULTURA

FIGURA 6 – GESTO CULTURAL DE INVEJA

FONTE: Disponível em: <https://www.tudointeressante.com.


br/2014/03/cuidado-com-as-maos-conheca-alguns-
gestos-simples-que-significam-coisas-bem-rudes-em-
outros-paises.html>. Acesso em: 28 out. 2017.

A imagem retrata um sujeito fazendo um gesto de dor de cotovelo, o que


no nosso dia a dia significa aquela invejinha básica, não é mesmo?

Em algumas regiões do México este gesto pode significar outras coisas. Se


você fizer esse gesto ou bater com o cotovelo à mesa, há grandes chances de você
ser mal interpretado, pois tradicionalmente, é como se você estivesse chamando
o indivíduo de mesquinho, conforme explica Hilton (2014). Curioso?

AUTOATIVIDADE

Você já foi ao México ou Chile? Descreva as curiosidades, costumes e


etnias encontradas nesses países.

NOTA

Se você gostou dos exemplos anteriores, pode encontrar outros. Acesse o


link a seguir, leia sobre o Turismo sem mico: veja 35 dicas para fugir de gafes em viagens
a 12 países.
Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/turismo/2015/07/1653142-turismo-sem-mico-
veja-35-dicas-para-fugir-de-gafes-em-viagens-a-12-paises.shtml>.

9
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

Essas são questões culturais que perpassam a linguagem dos sujeitos,


e estão relacionadas à maneira como nosso grupo cultural cria e compartilha
significados, interagindo entre si e com outras culturas, porém esses gestos não
são os únicos, tampouco são de uso unânime entre os sujeitos desses países,
pois toda nação é diversa, mas eles nos ajudam a entender como um gesto pode
variar de uma cultura para outra, e como essa diversidade é riquíssima. Segundo
Canedo (2009, s. p.), são “obras e práticas da arte, da atividade intelectual e do
entretenimento”. Observe agora as imagens a seguir:

FIGURA 7 – CAÑAR, LUGAR TURÍSTICO NO EQUADOR

FONTE: Disponível em: <http://www.viajeros.com/destinos/ingapirca/


fotos/1819712>. Acesso em: 28 out. 2017.

FIGURA 8 – TECNOLOGIAS

FONTE: Disponível em: <https://pixnio.com/it/oggetti/computer/


tecnologia-legno-lavoro-tazza-di-caffe-computer-scrivania-
elettronica>. Acesso em: 8 jan. 2018.

10
TÓPICO 1 | O PERCURSO HISTÓRICO DO CONCEITO DE CULTURA

FIGURA 9 – LIVRO DE DON QUIJOTE

FONTE: Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/


juantiagues/26614788755>. Acesso em: 18 fev. 2018.

Segundo Canedo (2009), a partir das figuras inseridas, a cultura nesta


segunda concepção está relacionada ao material, ou seja, aos bens e patrimônios
culturais produzidos pelos seres humanos. Na primeira imagem está um
patrimônio histórico, Cañar, que além de remeter à capital arqueológica e cultural
do Equador, é um lugar de apelo turístico. Na Figura 8 foram apresentadas as
tecnologias da comunicação e informação, que são retratos da evolução material
dos seres humanos. Na terceira concepção, no dizer de Canedo (2009), foram os
livros, sendo um deles reconhecido mundialmente, Don Quijote. Cultura nessas
imagens remete às atividades artísticas e intelectuais, que, além de servirem
como forma de expressão e representação, movimentam as sociedades modernas
e o mercado cultural.

TURO S
ESTUDOS FU

Nesta unidade, o subtópico intitulado As raízes do culto, popular e massivo,


abordaremos melhor as concepções elitistas, mercadológicas, e materiais de cultura; uma
discussão que será complementada no subtópico A Indústria Cultural da segunda unidade
deste livro de estudos.

A terceira e última concepção de cultura que vamos abordar está


relacionada ao fator de desenvolvimento humano, ou seja, a cultura em prol da
sociedade, em que as práticas culturais têm um papel de montar uma sociedade
melhor.

11
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

Sob esta ótica, as atividades culturais são realizadas com intuitos


socioeducativos diversos: para estimular atitudes críticas e o desejo
de atuar politicamente; no apoio ao desenvolvimento cognitivo de
portadores de necessidades especiais ou em atividades terapeutas
para pessoas com problemas de saúde; como ferramenta do sistema
educacional a fim de incitar o interesse dos alunos; no auxílio ao
enfrentamento de problemas sociais, como os altos índices de
violência, a depredação urbana, a ressocialização de presos ou de
jovens infratores (CANEDO, 2009, s.p.).

FIGURA 10 – A ESCOLA COMO ESPAÇO CULTURAL

FONTE: Disponível em: <https://pixabay.com/pt/sala-de-aula-escola-


educa%C3%A7%C3%A3o-2093744/>. Acesso em: 18 fev. 2018.

FIGURA 11 – IGREJAS E RELIGIÕES COMO TRANSMISSORAS DE VALORES MORAIS

FONTE: Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/soldon/6767196259/>.


Acesso em: 18 fev. 2018.

12
TÓPICO 1 | O PERCURSO HISTÓRICO DO CONCEITO DE CULTURA

FIGURA 12 – POLÍTICAS DE UNIÃO POR UM MUNDO MELHOR

FONTE: Disponível em: <https://catracalivre.com.br/geral/cidadania/


indicacao/8-atitudes-simples-por-um-mundo-melhor/>. Acesso em:
18 fev. 2018.

Nas imagens apresentadas, vemos suportes de acesso a esse tipo de


atividade cultural que teria o papel de nos apresentar o mundo e suas leis, fazer
superar práticas como a corrupção, o descaso com o meio ambiente etc. Dos três
apresentados, você acredita haver um mais efetivo? Qual?

Dando continuidade a nossos estudos, lembra quando mencionamos


anteriormente o conceito de culto? Canclini (2015) discute a fundo essa noção
de cultura associada a bens e patrimônios intelectuais. Dessa forma, no próximo
tópico entraremos em uma discussão sobre o conceito de cultura na modernidade,
mas antes vamos praticar um pouquinho o conhecimento adquirido.

13
RESUMO DO TÓPICO 1
Nesse tópico, você aprendeu que:

• A relação histórica do conceito de cultura com outros, por exemplo, culto e


civilização, tem influência ao longo do tempo.

• A importância da noção de cultura ao lado do termo civilização, no Iluminismo,


reforçando a hierarquia entre os sujeitos com e sem cultura, com base em
critérios como instrução e comportamento social.

14
AUTOATIVIDADE

1 Explique o contexto de surgimento dos significados do termo cultura.

Cuidado ou
Cultivo

Colonialismo

Sinônimo de
instrução

2 Leia os trechos a seguir, e relacione-os com as explicações listadas.

(1) “A Associação dos Produtores de Soja de Mato Grosso do Sul – Aprosoja/


MS é uma entidade representativa de classe sem fins lucrativos, constituída
por produtores rurais ligados às culturas de soja, milho e outros grãos de
Mato Grosso do Sul”.
FONTE: Disponível em: <http://aprosojams.org.br>. Acesso em: 28 out. 2017.

(2) “Colonização é o ato de colonizar, ou seja, quando pessoas de um


determinado país ou região vão para outra região (desabitada ou com
nativos) para habitar ou explorar. No processo de colonização, ocorre a
influência ou transferência cultural dos colonizadores para os colonizados
e vice-versa”.
FONTE: Disponível em: <http://aprosojams.org.br>. Acesso em: 29 out. 2017.

(3) “Culto é um conjunto de ritos que se prendem à adoração ou homenagem


a divindades em qualquer de suas formas e em qualquer religião, como
também a antepassados ou outros seres sobrenaturais”.
FONTE: Disponível em: <https://www.significados.com.br/culto/>. Acesso em: 29 out. 2017.

(4) “Culto é um adjetivo que qualifica aquela pessoa que tem cultura, que é
instruída, civilizada ou informada, que tem conhecimento sobre vários
assuntos”.
FONTE: Disponível em: <https://www.significados.com.br/culto/>. Acesso em: 29 out. 2017.

a) ( ) Cultura relacionada ao termo cultus, do latim.


b) ( ) Cultura do latim, colere.
c) ( ) Cultura relacionada ao termo colonus, do latim.
d) ( ) Cultura como instrução.

15
16
UNIDADE 1
TÓPICO 2

CULTURA E MODERNIDADE

1 INTRODUÇÃO
No tópico anterior vimos como a cultura evoluiu historicamente e possui
uma gama de definições que o tornaram um conceito relativo e aberto.

A partir deste tópico veremos uma perspectiva mais crítica sobre o


conceito, tendo em vista estudos recentes sobre a modernidade cultural, que
buscam problematizar culturas hegemônicas, rótulos e identidades nacionais.

Para desenvolvermos este tema, o tópico está dividido em duas partes.


No primeiro veremos as expressões relacionadas à cultura: culto e as relações
de superioridade sobre o popular e o massivo, no que se refere às manifestações
artísticas e literárias; a segunda parte esclarece a noção de culturas nacionais e as
estratégias políticas e sociais que a sustentam.

2 AS RAÍZES DO CULTO, POPULAR E MASSIVO


Quantas vezes sua maneira de falar já foi corrigida e reprimida por distanciar-se
da gramática normativa língua portuguesa? Ou, ainda, em quantas ocasiões você já foi
criticado por preferir a leitura de um livro de autoajuda, ou um best-seller, a um clássico
da literatura? E quanto ao seu estilo musical, já sofreu algum tipo de comparação com
outros de outras décadas considerados de maior ou menor qualidade?

Embora possam parecer ultrapassadas, distinções culturais associadas ao


intelecto, ao poder aquisitivo, a identidades e comportamentos sociais mantêm-
se presentes no interior de nossas relações sociais. Dentro das culturas dos países
hispano-falantes, essa constatação não é diferente. Situações de supervalorização
de alguns aspectos culturais em relação a outros podem ser observadas em distintos
contextos, e estas impactam negativamente na percepção de um indivíduo sobre
o outro, bem como na relação entre grupos. Vejamos como exemplo o reggaeton.

O reggaeton é um ritmo musical urbano que tem origem em Porto Rico e


que se espalhou pelo mundo, alcançando o topo das paradas musicais e milhares
de reproduções nas plataformas digitais. Contudo, uma parcela da sociedade,
tanto em seu país de origem, quanto em outras regiões da América Latina, resiste
em reconhecer a cultura por trás desse estilo musical em virtude de sua sonoridade
e apelo popular. De forma negativa, o gênero costuma ser associado à falta de
poder aquisitivo e ‘intelectual’, e também é visto como produto meramente
comercial, da grande massa, pela sua abrangência e preferência a nível mundial.
17
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

TURO S
ESTUDOS FU

Entenderemos adiante o argumento usado em críticas ao reggaeton e à cultura


da massa em geral, normalmente associadas a uma homogeneização cultural.

Sobre este tema, a Revista ISTOÉ publicou, em junho de 2017, uma


reportagem com o título “O triunfo do reggaeton: da marginalização ao
Despacito” dando ênfase ao sucesso do reggaeton para além do país de origem.
Nessa reportagem, a revista destaca a dimensão alcançada pela música Despacito,
que recebeu prêmios e bateu recordes, sendo a primeira música em espanhol a
dominar o mercado anglo-saxão desde “Macarena”. No entanto, a revista fez a
mesma ressalva: o ritmo é historicamente marginalizado e censurado, tanto por
sua relação com os porto-riquenhos de classes menos favorecidas, quanto por ser
constantemente associado a temas como as drogas, o crime e a sexualidade.

DICAS

Para ler na íntegra a reportagem ”O triunfo do reggaeton: da marginalização


ao Despacito”, acesse o link a seguir: Disponível em: <https://istoe.com.br/o-triunfo-do-
reggaeton-da-marginalizacao-ao-despacito/>. Acesso em: 05 mai. 2020.

NOTA

Luis Fonsi é o cantor da Música Despacito, ao lado de Daddy Yankee. Além


deles, outros nomes do reggaeton são difundidos na América Latina, como Maluma e J.
Balvin.

18
TÓPICO 2 | CULTURA E MODERNIDADE

FIGURA 13 – LUIS FONSI, CANTOR PORTO-RIQUENHO

FONTE: Disponível em: <https://www.billboard.com/files/styles/article_ma


in_image/public/media/luis-fonsi-march-2017-live-billboard-1548.
jpg>. Acesso em: 27 nov. 2019.

FIGURA 14 – OUTROS CANTORES DE REGGAETON

FONTE: Disponível em: <https://e.an.amtv.pe/espectaculos-lista-verdaderos-


nombres-cantantes-reggaeton-n364287-624x352-561966.jpg>. Acesso
em: 27 nov. 2019.

Infelizmente, como nos mostra esse exemplo do reggaeton, ainda existe


no senso comum uma falsa ideia de que somente as culturas de elite são culturas
propriamente ditas. As demais são marginalizadas e colocadas de lado, quando
não são tachadas negativamente. Obviamente, estereótipos como estes, comuns
dentro e fora do ambiente de circulação do gênero, devem ser contestados e
superados no ensino de línguas estrangeiras e na sociedade de modo geral.

DICAS

Ainda sobre o tema do reggaeton, vale a leitura do artigo: ‘Cartografias do


reggaeton: Mainstream na América Latina, marginal no Brasil’. Disponível em: http://www.
intercom.org.br/papers/nacionais/2014/resumos/R9-2309-1.pdf

19
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

AUTOATIVIDADE

Com base nos estudos realizados até aqui, analise as imagens e faça
uma breve reflexão sobre o aspecto valorativo presente nelas.

FIGURA 15 – MEME SOBRE O REGGAETON

FONTE: Disponível em: <https://tvyfarandula.com/wp-content/uploads/


2018/07/chabvo.jpg>. Acesso em: 28 nov. 2019.

FIGURA 16 – MEME SOBRE REGGAETON COMO CULTURA

FONTE: Disponível em: <http://es.memegenerator.net/instance/37945107/


yo-dawg-que-el-reggaeton-es-cultura-jajajajajajaaajajajaja>
Acesso em: 28 nov. 2019.

20
TÓPICO 2 | CULTURA E MODERNIDADE

O objetivo da atividade é que você reflita sobre como o uso da linguagem


pode levar-nos a criar hierarquizações culturais. Nos discursos presentes nas
imagens que você refez, foram estabelecidas posições antagônicas de superioridade
e inferioridade, favorecendo um único modelo de manifestação cultural.

Canclini (2015, p. 20) explica que a modernidade foi responsável por


essa distinção e categorização das culturas, dando origem à classificação das
culturas de acordo com culto popular e massivo. Observando a imagem a
seguir, você conseguirá perceber claramente a partir de quais critérios essas
divisões são construídas.

FIGURA 17 – AS CATEGORIZAÇÕES CULTURAIS NA MODERNIDADE

FONTE: Disponível em: <https://www.augustonascimento.com.br/branding-tudo-


junto-e-misturado-bob-dylan-premio-nobel-literatura-e-editora-abril/>.
Acesso em: 28 out. 2017.

Segundo mostra a figura 17, a cultura de elite é composta pelo conhecimento


erudito, pela escolaridade formal e por uma noção de cultura ‘codificada’. Isto
é, na modernidade, quanto mais acesso e domínio o sujeito tiver dos códigos
culturais associados à escolarização e a obras artísticas e literárias canonizadas,
mais próximo ele estará do ideário de ‘sujeito culto’. É nessa perspectiva que
frases como “Joãozinho é culto porque lê obras clássicas” e “Mariazinha é culta
porque vai ao teatro e ao museu” se perpetuam, e com certeza, você já ouviu
alguma parecida com essa.

21
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

A escolha desses conhecimentos cultos, no entanto, não foi despretensiosa;


esteve ligada aos interesses da burguesia, que os usava para justificar seus
privilégios sociais como não sendo resultantes apenas do fator econômico, mas
também intelectual (CANCLINI, 2015). Reforçava-se dessa maneira a ideia de
meritocracia, embora os conhecimentos que davam crédito a esse mérito fossem
escolhidos tendenciosamente. Tanto é que, na América Latina, ser culto era
associado a ser letrado, e menos da metade da população tinha oportunidade e
acesso à escola em 1920 (CANCLINI, 2015, p. 69), “o que explica a cultura popular
ser relacionada com práticas orais”, como é mostrado na imagem.

DICAS

É importante que você saiba localizar a modernidade enquanto período


histórico. Inicia no final do século XV e, relativamente (uma vez que já se fala em pós-
modernidade), dura até os dias de hoje. Segundo Canclini (2015), foi o momento de
descobertas científicas, desenvolvimento industrial e ideais de expansão. Nesse momento, a
educação e a arte eram importantes para uma evolução racional e moral.

Agora você já sabe que em oposição aos saberes cultos, “constituía-se,


a partir de práticas e comunidades culturais minorizadas, a cultura popular,
respaldada pelos estudos da antropologia e do folclore” (CANCLINI, 2015, p.
21). Essas práticas eram consideradas menores por não terem o respaldo da
ciência e tampouco exigirem rebuscamentos que a cultura de elite fazia questão
de estabelecer. O apagamento e a extinção de línguas e culturas de populações
indígenas e africanas em grandes nações como o Brasil, por exemplo, em
detrimento à exaltação da língua e da cultura dos colonizadores, mostram como
a escolarização ajudou a determinar o que é superior e inferior na lógica cultural
europeia. A figura a seguir mostra algumas práticas culturais dentro do que se
considera esse universo popular.

22
TÓPICO 2 | CULTURA E MODERNIDADE

FIGURA 18 – AS CAVEIRAS COMO SIMBOLO CULTURAL DO DIA DOS MORTOS NO


MÉXICO: UM EXEMPLO DA DITA ‘CULTURA POPULAR’

FONTE: Disponível em: https://pxhere.com/pt/photo/858883


Acesso em: 14 set. 2021

Como as sociedades modernas, com seus ideais de expansão, dependiam


da venda e consumo de produtos, aos poucos, as indústrias geravam o que se
chamaria de cultura massiva (CANCLINI, 2015, p. 21). Assim, com o objetivo
de movimentar esse mercado e obter lucro, produtos culturais de apelo popular
eram criados e divulgados à grande massa. No entanto, essa vasta divulgação, o
acesso facilitado e o consumo crescente passaram a gerar sociedades homogêneas,
o que não interessava à elite, que usa até os dias de hoje a distinção do ‘culto’ a
fim de frear os efeitos dessa massificação (CANCLINI, 2015, p. 37).

Meios de comunicação são aliados da indústria por trás da cultura massiva.


A TV, por exemplo, é um dos meios de divulgação que alimenta o mercado, e pelo
fácil acesso à população e apelo visual de seus conteúdos, é associada à indústria
do entretenimento, o que faz com que esta seja estigmatizada, como podemos ver
a partir da representação do sujeito na imagem a seguir:

23
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

FIGURA 19 - A TELEVISÃO E A CULTURA MASSIVA

Disponível em; https://pixabay.com/es/illustrations/tv-serie-simplificaci%c3%b3n-


cr%c3%adtica-1945130/ Acesso em: 30 ago. 2021

E
IMPORTANT

O termo hegemonia (adjetivado como hegemônico) será usado ao longo deste


livro, é um termo de interesse aos estudos culturais. É definido pelo Dicionário Houaiss da
Língua Portuguesa como sendo o “poder dominador de uma cidade, país, povo sobre outros,
bem como refere-se à liderança, predominância” (2011, p. 493).

Dessa maneira, a concepção de cultura que mencionamos no início deste


texto está ligada à noção de culto na modernidade, a qual diferencia grupos
hegemônicos da sociedade. Um dos objetivos da perspectiva pós-moderna de
cultura é a superação dessas divisões.

AUTOATIVIDADE

A partir dessa discussão, você acha possível superarmos as divisões


históricas que separam as culturas entre superiores e inferiores? Como
professor, de que maneira você pode contribuir para que isso aconteça?

3 O NASCIMENTO DAS CULTURAS NACIONAIS


Todos nós, em maior ou menor intensidade, nos identificamos de alguma
forma com nossa nação de origem e sua cultura. Prova disso é que quando
nos perguntam nossa nacionalidade, não hesitamos em dizê-la. No entanto, o
24
TÓPICO 2 | CULTURA E MODERNIDADE

processo de construção dessa cultura única, dita ‘nacional’, sobretudo em países


da América Latina, envolveu momentos de conquista violenta e subalternização
de povos nativos (HALL, 2005). Esse percurso fez com que determinadas culturas
ocupassem o status de ‘nacionais’ deixando outras em posição menor ou de
apagamento, como é caso das culturas indígenas.

NOTA

Reflita. Você concorda que essa relação de poder relacionada à cultura não
é única, que boa parte das culturas nacionais também nasceu por meio de processos de
conquista violenta?

Para Stuart Hall, grande nome dos estudos culturais, uma cultura
nacional nunca se limitou ao espírito de lealdade e traços comuns dos sujeitos,
“ela é também uma estrutura de poder cultural” (2005, p. 59). Isto é, para o autor,
a unificação cultural de um país está relacionada ao poder exercido sobre ele,
uma vez que, mesmo sendo permeado por culturas diversas, uma única cultura,
por cima de todas as outras, será privilegiada. Por isso, defende que uma cultura
nacional, além de funcionar como um sistema de representação, pode produzir
significados culturais e servir como objeto de identificação (HALL, 2005).

DICAS

Stuart Hall foi um importante pensador crítico dos estudos culturais. Discursou
sobre temas como cultura, raça, gênero e identidade. Sua foto ilustrou a capa de um dos
livros com seus escritos, trata-se do livro Da diáspora: identidades e mediações culturais,
como você pode observar a seguir. Nasceu em fevereiro de 1932 na Jamaica, e vivia na
Inglaterra desde 1951. Faleceu em 2014, aos 82 anos de idade.

25
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

FIGURA 20 – FOTO DE STUART HALL, CAPA DO LIVRO DA


DIÁSPORA: IDENTIDADES E MEDIAÇÕES CULTURAIS

FONTE: Disponível em: <http://www.publicbooks.org/wp-content/


uploads/2017/01/Stuart-Hall-double.jpg>. Acesso em: 28
out. 2017.

DICAS

Sugerimos a leitura do livro sobre as ideias de Stuart Hall, “A identidade cultural


na pós-modernidade”, o qual temos por base nas discussões sobre identidade e cultura nas
unidades deste livro didático.

Essa identificação dos sujeitos com a sua cultura nacional nasce, segundo
Hall (2005), a partir de uma história que é contada, a qual é construída como se
fosse um ritual, conforme alguns elementos.

Uma cultura nacional, por essência:

• Explica a nossa missão nacional, por que existimos e por que, na


efemeridade da vida, estamos ligados a essa nação.
• Destaca historicamente as origens, e o perpetuamento das tradições,
que independentemente do tempo se mantêm vivas.
• Inventa tradições outras com base em normas e valores, de natureza
ritual ou simbólica, disseminando-as socialmente por meio da
reprodução pelos sujeitos.
• Estabelece um mito fundacional, ou seja, o momento em que nasce e
torna-se uma nação independente.
• Relaciona sua história com a de um povo, uma comunidade; a qual
não ocupa o lugar de poder nessa nação (HALL, 2005, p. 52-55).

26
TÓPICO 2 | CULTURA E MODERNIDADE

DICAS

Para reflexão: Com base nesses cinco elementos escolhidos por Hall, você
consegue estabelecer uma ponte entre a história do Brasil e a narrativa das culturas nacionais?
Você já pode ir pensando sobre sua resposta para esta questão, pois ao final deste tópico
você será convidado a expor suas ideias sobre o tema.

E
IMPORTANT

Em síntese, com base no que vimos até aqui, e nos preceitos de Hall (2005),
podemos considerar a cultura nacional como um discurso influenciador e construtor de
sentidos, já que este modifica nossa forma de ver a nação e a maneira como essa se organiza.

O terceiro elemento citado nos mostra como essa construção de uma


cultura nacional pode ter uma natureza simbólica, a qual nem sempre tem
ligação com a realidade. Se essa história que nos é contada sobre a nação é sempre
limitada, apenas um lado, uma parte, um princípio, precisamos descontruir ideias
generalizantes sobre nações de língua espanhola, principalmente da América
Latina, tais como México, o país da pimenta, Paraguai, o país do comércio e
venda etc. Não porque esses aspectos não fazem parte do cotidiano de sujeitos
desses países, mas porque a origem dessas associações pode estar em políticas
segregacionistas que desconsideram o valor das diferenças culturais. Afinal,
não existe uma essência que determine que, por ter nascido no México, todos os
mexicanos têm o paladar preparado para a pimenta, a destreza da preparação de
pratos tradicionais e a preferência por eles. Tudo isso são construções sociais e
políticas, que não refletem uma sociedade diversa (GRIMSON, 2000, p. 26).

No que se refere à construção da cultura nacional argentina, por exemplo,


Grimson confirma o seu caráter político ao afirmar que durante muito tempo
tentou-se nacionalizar o tango, e distinguir o espanhol falado na Argentina do
de outros países. No entanto, esses ideais esbarraram no fato de muitos outros
ritmos, como o rock, terem o mesmo apreço pelos argentinos, e na dificuldade de
diferenciar o espanhol argentino de países vizinhos que compartilham o mesmo
sotaque, principalmente em regiões fronteiriças. Desse modo, o autor ressalta
que essa universalização nunca houve na prática, e esses símbolos difundidos
são resultados de políticas oficiais e das ações do Estado, bem como de culturas
hegemônicas que tentavam se instaurar através da escola e dos meios de
comunicação. Isso não significa que os argentinos não tenham ritmos e sotaques
em comum, e sim que se trata de um país diverso e que não se restringe a apenas
uma cultura (OLIVEIRA, 2017).
27
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

Essa diversidade musical é retratada no mapa musical a seguir, com


alguns dos ritmos de acordo com regiões da Argentina. É importante ressaltar
que, embora usemos essa imagem como exemplo de diversidade, os limites
geográficos são imaginários e muitos outros ritmos para além desses, ou
mesclados com esses, podem existir.

FIGURA 21 – MAPA MUSICAL DA ARGENTINA DE ACORDO COM


ESTILOS MUSICAIS

FONTE: Disponível em: <https://girademiel.wordpress.com/el-taller-


musica-popular-argentina-para-ninos/>. Acesso em: 28 out.
2017.

28
TÓPICO 2 | CULTURA E MODERNIDADE

Observando este mapa, podemos constatar que o tango é um ritmo bastante


presente em Buenos Aires, o que confirma a afirmação de Grimson (2000) de que
a escolha do tango como um ritmo nacional tem a ver com a sua importância na
história desta cidade, e o lugar de destaque atribuído a ela pelas políticas oficiais
do país. Também confirmamos que diante do tango, todos estes, e possivelmente,
outros ritmos acabam sendo apagados, e pouco conhecidos mundo afora.

Além do fator histórico do tango, pesa o fator econômico, já que as


culturas nacionais, a partir da ampla divulgação, ajudam no mercado das nações
no sentido de alimentarem o turismo. Observe, por exemplo, como esse fôlder
turístico de La Rioja, na Espanha, vende lugares, patrimônios e atividades que
representam a cidade para os visitantes.

FIGURA 22 – FOLHETO TURÍSTICO DE LA RIOJA

FONTE: Disponível em: <https://www.pinterest.cl/pin/476326098058852058/>. Acesso em: 28


out. 2017.

Você deve estar pensando, esses lugares não existem? Essas práticas não
são culturais, e não devem ser valorizadas? Com certeza, devem. Desde que não
nos levem a uma impressão reducionista e estereotipada. A sua impressão sobre
o lugar e sobre as pessoas não deve se limitar apenas aspectos mercadológicos.

Desse modo, a partir de um critério de nacionalidade, a modernidade tem


sido responsável por separar em gavetas cada cultura existente. Na modernidade,

29
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

dentre as mais variadas identidades culturais dos sujeitos, a identidade nacional


é a que se sobressai (HALL, 2005). Byram e Fleming (2009, p. 15) reforçam essa
ideia, pois defendem que a identidade nacional, demarcada pelo idioma, tende a
ser a primeira identidade a ser reconhecida quando falamos com um estrangeiro.
Após verificar a identidade nacional desse sujeito, costumamos refletir sobre a
nossa própria identidade, e buscar similaridades e diferenças entre ambas. Você
concorda com esses dois autores?

DICAS

Você deve estar se perguntando, mas a que eles se referem com identidade
cultural? Discutiremos sobre a noção de identidade e sua relação com a cultura no tópico 4
desta unidade.

AUTOATIVIDADE

DESAFIO

1 A cultura nacional é formada por tradições ou patrimônios que representam


uma nação como um todo e a diferenciam de outras. Considere as
representações das culturas nacionais da Bolívia, Peru e México, a seguir.
A partir delas, pesquise pelo menos outros dois aspectos que demonstrem
a diversidade interna dessas nações. Em seguida, escreva um pouco sobre
eles.
a)

FONTE: Disponível em: <http://www.boliviacultural.com.br/ver_noticias.php?id=348>. Acesso


em: 2 jan. 2018.

30
TÓPICO 2 | CULTURA E MODERNIDADE

b)

FONTE: Disponível em: <http://historiadomundo.uol.com.br/inca/machu-picchu.htm>.


Acesso em: 2 jan. 2018.

c)

FONTE: Disponível em: <http://beta.visitmexico.com/pt/musica-e-exponentes-de-mariachi-


em-guadalajara>. Acesso em: 2 jan. 2018 e Disponível em: <http://livepuntamita.
com/mariachi-mexicos-musical-gift-to-the-world/>. Acesso: 26 out. 2017.

31
RESUMO DO TÓPICO 2
Nesse tópico, você aprendeu que:

• As concepções modernas de culto, referindo-se à arte e à literatura de elite, e


as relações de superioridade sobre o popular, cultura folclórica do povo, na
modernidade.

• O papel da noção de cultura nacional na modernidade e seu lado reducionista,


deixando de lado a diversidade que é inerente.

• As relações de poder que são próprias da cultura nacional.

32
AUTOATIVIDADE

1 A noção de cultura passou por transformações históricas que


a tornaram um conceito complexo, imerso em contradições e
relações de poder que perduram até os dias de hoje. Com base
nas relações de poder estudadas ao longo do tópico, assinale
com V para verdadeira e F para falsa.

a) ( ) A cultura popular é aquela minorizada pela elite, diferenciada pelas


suas práticas e tradições que fogem à racionalidade do ‘culto’ moderno.
b) ( ) O conceito de culto é sinônimo de cultura da massa, já que esta última
nada mais é do que tudo que é produzido pelo ser humano.
c) ( ) Cultura e civilização eram termos parecidos na época do Iluminismo,
cujos ideais valorizavam, sobretudo, o lado racional do ser humano e a
possibilidade de progresso social e individual.
d) ( ) Como forma de frear a massificação dos produtos culturais na
modernidade, a elite reforçava a diferenciação entre a sua e a cultura
do povo.
e) ( ) O conceito de culto nasceu na modernidade, remetendo ao sujeito
escolarizado e pertencente à cultura de elite, como uma forma de justificar
os privilegias que este setor tinha sobre o setor mais pobre.

2 Segundo Hall (2005, p. 49), “as pessoas não são apenas cidadãos/ãs legais
de uma nação; elas participam da ideia da nação tal como representada
em sua cultura nacional”.
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução de Tomaz Tadeu da
Silva e Guacira Lopes Louro. 10. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.

Com base nessa afirmação e nas informações apresentadas no tópico


estudado, explique por que podemos dizer que a representação de uma
cultura nacional não é fiel à realidade dos países.

3 Uma cultura nacional:

• Explica a nossa missão nacional, por que existimos e por que,


na efemeridade da vida, estamos ligados a essa nação.
• Destaca historicamente as origens, e o perpetuamento das
tradições, que independentemente do tempo se mantêm vivas.
• Inventa tradições outras com base em normas e valores, de
natureza ritual ou simbólica, disseminando-as socialmente por
meio da reprodução pelos sujeitos.
• Estabelece um mito fundacional, ou seja, o momento em que
nasce e torna-se uma nação independente.
• Relaciona sua história com a de um povo, uma comunidade; a qual
não ocupa o lugar de poder nessa nação (HALL, 2005, p. 52-55).

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução de Tomaz Tadeu da


Silva e Guacira Lopes Louro. 10. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.

33
Estes itens são importantes na construção de uma cultura unificada no
imaginário nacional, e foram apresentados anteriormente no texto sobre
Culturas Nacionais do Tópico 2. Escolha um país hispano-falante, pesquise
sobre ele. A partir dos itens mencionados pelo autor Hall (2005), e do conteúdo
do tópico, liste características que remetem à construção da cultura nacional
desse país. Você pode usar os tópicos a seguir, como referência para sua
resposta:

• Origem da nação.
• Tradições em comum entre os nativos.
• Mito fundacional.
• Povo ou comunidade simbólicos.

34
UNIDADE 1
TÓPICO 3

É POSSÍVEL DEFINIR CULTURA?

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico do nosso livro didático da disciplina de Aspectos Culturais
da Língua Espanhola, vamos estudar noções históricas sobre o termo cultura,
principalmente as construídas sob um viés científico. O termo está presente tanto
em Ciências Sociais, como Antropologia e Sociologia, quanto em ciências da
linguagem, como a Linguística Aplicada.

Você conseguiria definir cultura sem cair em reducionismos? Esse é um


dos desafios dos estudos na área nos dias de hoje, sobretudo na Linguística
Aplicada, já que esta tem o desafio de discutir o ensino e verificar possibilidades
de superação de noções pretensiosas que perpassam a linguagem.

Para organizar melhor esta discussão, este tópico está dividido em duas
partes: a primeira parte compreende a noção de Cultura nas Ciências Sociais; e a
segunda parte compreende a Linguística Aplicada. Como você definiria cultura?

2 AS DEFINIÇÕES DE CULTURA NAS CIÊNCIAS SOCIAIS

ATENCAO

Para que você entenda a proposta desse tópico, é necessário primeiramente


que você saiba que as noções do termo se dividem principalmente em dois momentos:
concepções da modernidade e da pós-modernidade. Como vimos até aqui, as concepções
modernas, que se estendem às ciências, estavam mais preocupadas com a verdade das coisas,
e a universalização dessa verdade. Na pós-modernidade essas verdades são questionadas, e
as barreiras entre as ciências se diluem.

É bem provável que ao se perguntar o que é cultura, muitas informações


venham à sua mente, desde as mais variadas manifestações artísticas até as
realidades sociais mais distantes da sua.

35
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

FIGURA 23 – MAS, AFINAL, O QUE É CULTURA?

FONTE: O autor

Se de fato isso ocorre, não se assuste. Você não é o único a não encontrar
uma resposta objetiva para esta pergunta, já que o conceito de cultura durante
anos foi reconhecido pelas ciências como um conceito amplo, cujo significado
abarca todas as nossas relações sociais, convicções, comportamentos e bens
patrimoniais.

Essa visão abrangente sobre cultura não é recente, mas, também, não é
o único olhar direcionado ao conceito ao longo de sua história. Como vimos no
tópico anterior, cultura esteve ligada a relações de poder, e tem como reflexo,
nos dias de hoje, usos indiscriminados do termo, referindo-se aos sujeitos mais e
menos escolarizados.

Embora o termo já figurasse pelas sociedades muito antes, a primeira


definição científica de cultura deu-se por Edward Tylor em 1871. Sua definição
partiu de dois termos já conhecidos por nós, cultura (do alemão kultur) e
civilização (do francês civilization). Segundo Laraia (1999, p. 25), Tylor assim
definiu, “tomado em seu amplo sentido etnográfico é este o todo complexo que
inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra
capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade”.

36
TÓPICO 3 | É POSSÍVEL DEFINIR CULTURA?

NOTA

Segundo Mendes, esse conceito de cultura é reconhecido como o primeiro


conceito antropológico de cultura, e Tylor como o fundador da antropologia britânica (2015,
p. 206).

Mendes, a partir da obra de Cuche, A noção da cultura nas Ciências


Sociais, explica que muito antes dessa definição antropológica, a Sociologia e a
Etnologia já haviam sido fundadas enquanto ciências, e buscavam de alguma
forma descrever as culturas. Além de tentar superar a dificuldade na precisão
do termo, a busca por uma definição de cultura tinha o intuito de fazê-lo ganhar
credibilidade como saber científico, e para isso, durante algum tempo, buscou-
se construir um conceito que desse conta de abarcar não só a diversidade das
sociedades, como também a unidade biológica do ser humano.

NOTA

Mendes explica que, para tentar entender as culturas nesse primeiro momento,
os pensadores se basearam em teorias em evidência no final do século XIX e início do século
XX: o determinismo biológico e o determinismo geográfico, “essas teorias defendiam a ideia
de que a diversidade cultural humana é condicionada por duas principais variáveis: o caráter
biológico e o espaço geográfico” (2015, p. 206).

Quanto ao conceito cunhado por Tylor mais tarde, embora sua aceitação
não tenha sido unânime devido à sua ideologia evolucionista implícita,
diferenciadora de culturas como primitivas e avançadas (MENDES, 2015), foi
considerado um passo importante em direção ao aprofundamento sobre o tema,
uma vez que depois de sua definição muitas outras surgiram, inclusive em
direções opostas a essa.

37
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

FIGURA 24 – O EVOLUCIONISMO SEGUNDO DARWIN

FONTE: Disponível em: <https://darwinismo.files.wordpress.com>. Acesso em: 28 out. 2017.

Com base de estudo que tivemos desde o primeiro tópico, sobre cultura,
podemos acompanhar a seguir a linha do tempo e sua evolução:

FIGURA 25 – O CONCEITO DE CULTURA NO TEMPO

FONTE: O autor

Você deve estar se perguntando o que são os Estudos Culturais no último


marco da linha do tempo. No século XX, autores com engajamento em temas de
justiça social dão origem aos Estudos Culturais, que segundo Moura (2005, p. 77),
trata-se de “uma escola de pensamento transdisciplinar nascida na Inglaterra,
nos anos setenta”. Transdisciplinar porque as teorias que predominam nessa
escola não se fecham a ciências específicas, pelo contrário, elas interagem entre

38
TÓPICO 3 | É POSSÍVEL DEFINIR CULTURA?

si. As discussões que realizamos sobre culturas nacionais, e conceitos de culto,


popular e massivo, no primeiro tópico, têm como base autores dessa escola, como
Hall (2005) e Canclini (2015), que são constantemente trazidos para discussões
no campo da Linguística Aplicada, uma vez que esta é considerada como uma
ciência transdisciplinar por Celani (1998, p. 117).

DICAS

Estudos futuros. Tema de interesse dos Estudos culturais é o tema da identidade.


Falaremos sobre ele no Tópico 3.

3 AS DEFINIÇÕES DE CULTURA NA LINGUÍSTICA APLICADA


Em algum momento do curso você se perguntou por que o conceito de
cultura é um conceito tão importante para a área de letras? Como você acha que
ele pode nos ajudar na nossa prática escolar enquanto professores de Espanhol?
Sugiro que ao longo deste tópico você reflita sobre estas questões, pois as respostas
para elas ajudarão a contextualizar melhor o conteúdo deste tópico.

No Brasil, a Linguística Aplicada (LA) tem atuado de maneira independente


em relação aos pressupostos da Linguística formal, caracterizando-se como um
campo de estudo mestiço e indisciplinar (MOITA, 2006; 2013), ou transdisciplinar,
como sugerimos antes. Isto é, a LA rompe fronteiras disciplinares e transita por
outros campos que ajudam a entender temas relacionados à linguagem em seu
uso social. Sua implicação na homogeneização do sujeito, no apagamento de sua
história, identidade, gênero, classe etc. (OLIVEIRA, 2017, p. 15). Embora não
atue só no ensino de línguas, é nessa área que a maioria de seus estudos está
concentrada, sendo o ensino de línguas estrangeiras (LE) um de seus focos.

Assim, dentro do ensino de LE muitos pesquisadores têm se debruçado


sobre o tema da cultura (ALMEIDA, 2011; MENDES, 2015), tentando compreender
a sua relação com a língua nesse contexto, o funcionamento social dos estereótipos
e das representações culturais do outro (OLIVEIRA, et al., 2015; OLIVEIRA, 2017).
Baseando-se, principalmente, em pressupostos de ciências como a Antropologia e
a Sociologia, que estudam o tema há mais tempo.

No que se refere às tentativas de definir cultura na Linguística Aplicada,


algumas no campo do ensino podem ser citadas, em Oliveira (2017). No entanto,
não podemos esquecer que os conceitos na LA costumam ser assumidos a partir
de um viés pós-moderno, ou seja, sob uma perspectiva que não considera teorias

39
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

científicas como verdades prontas e acabadas (LYOTARD, 1979). Com a noção


de cultura não é diferente; na vertente crítica da LA, as diferentes conceituações
produzidas concordam em pelo menos um aspecto, no sentido de reconhecer a
diversidade e a inexistência de essências culturais.

NOTA

Reforço que a Linguística Aplicada é uma realidade brasileira da área, como


destaca Moita (2013, p. 17). Existem, porém, em outros países, e até mesmo aqui, outras
vertentes da LA, que seguem pressupostos completamente diferentes. Visando diferenciar
essas outras visões de LA da concepção transdisciplinar, Pennycook (1998) usa a expressão
Linguística Aplicada Crítica.

Desse modo, Mendes (2015, p. 218) explica que antes de decidir por
apontar um conceito universal de cultura, acredita ser primordial reconhecer os
princípios que juntos remetem a esse termo. De modo a tornar esse tópico mais
didático, a seguir no Quadro 1, acompanhe as características da cultura:

QUADRO 1 – CARACTERÍSTICAS DA CULTURA

Cultura para Mendes Minha leitura


a) “engloba uma teia complexa de Cultura vai além, e os sujeitos não
significados que são interpretados só compartilham características e
pelos elementos que fazem parte de patrimônios culturais herdados, como
uma mesma realidade social, os quais também criam novas realidades e
a modificam e são modificados por ela. interagem com outros grupos.
Esse conjunto de significados inclui
as tradições, os valores, as crenças, as
atitudes e conceitos, assim como os
objetos e toda a vida material”;

b) “não existe sem uma realidade social As culturas não são estruturas prontas,
que lhe sirva de ambiente; ou seja, modelos a serem seguidos. Durante
é a vida em sociedade e as relações muitos anos tentam demonstrar alguns
dos indivíduos no seu interior que grupos através de categorizações como
vão moldar e definir os fenômenos culto e popular, e culturas nacionais.
culturais, e não o contrário”; As culturas são o que os sujeitos
fazem dela, pois deles depende a sua
existência.

40
TÓPICO 3 | É POSSÍVEL DEFINIR CULTURA?

c) “não é estática, um conjunto de Não representa todos os sujeitos da


traços que se transmite de maneira mesma forma, e em todos os momentos.
imutável através das gerações, mas um
produto histórico, inscrito na evolução
das relações sociais entre si, as quais
transformam-se num movimento
contínuo através do tempo e do
espaço”;

d) “não é inteiramente homogênea e A interação com outras culturas é que a


pura, mas constrói-se e renova-se de mantém viva.
maneira heterogênea através dos fluxos
internos de mudança e do contato com
outras culturas”;

e) “está presente em todos os produtos Pode ser tanto espiritual, quanto


da vivência, da ação e da interação comportamental e material.
dos indivíduos; portanto, tudo o que é
produzido, material e simbolicamente,
no âmbito de um grupo social, é
produto da cultura desse grupo”.

FONTE: Adaptado de Mendes (2015)

Amparados nesses princípios e nos de outros estudos, em Oliveira (2017,


p. 22) encontramos o conceito de cultura como um termo que:

Faz referência a um conjunto de significados compartilhados, que se


manifestam nos comportamentos, personalidades, materialidades,
crenças, valores, sentimentos, gestos e movimentos dos sujeitos
envolvidos, bem como em sua maneira de organizar, interpretar
e conduzir a realidade em sociedade. Significados construídos na
linguagem, e que estão sempre sujeitos à ressignificação.

Adiante tentaremos entender a relação entre cultura e identidade, mas


antes você deverá resolver alguns exercícios para sua prática.

41
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• O percurso histórico da noção de cultura dentro das Ciências Sociais, como


a definição de Edward Tylor, que abriu portas para o estudo da cultura na
Antropologia.

• Pressupostos dos Estudos Culturais, relacionados com as noções de cultura


nacional, entre outros conceitos.

• O que é Linguística Aplicada e como a noção de cultura, em diálogo com os


Estudos Culturais, contribui com os estudos na área.

42
AUTOATIVIDADE

1 Relacione os pressupostos dos Estudos Culturais com a Linguística, e


explique por que há diálogo entre as áreas.

2 Na sua opinião, qual a importância de entender cultura para atuação em sala


de aula? Responda considerando os pressupostos da Linguística Aplicada
discutidos anteriormente.

43
44
UNIDADE 1
TÓPICO 4

O QUE É IDENTIDADE?

1 INTRODUÇÃO
Hall afirma que na modernidade, dentre as mais variadas identidades
culturais dos sujeitos, a identidade nacional é a que se sobressai (2005), mas a que
ele se refere com identidade cultural? O que é identidade para você? Pense sobre
essa questão, e a discutiremos neste tópico.

Neste tópico serão apresentadas as diferentes concepções de identidade,


e historicamente como essas identidades eram constituídas; a identidade na pós-
modernidade, aquela que costuma ser a atual concepção de identidade para as
diversas ciências, e por último, trazemos a relação entre identidade e cultura.

2 A FORMAÇÃO DE NOSSAS IDENTIDADES

AUTOATIVIDADE

Para aquecermos nossa discussão, escreva a seguir o nome de três países


da América Latina que vêm à cabeça. Atenção! Não prossiga a leitura do texto
antes de escrevê-los.

Em Oliveira (2017), foi realizada uma pesquisa com integrantes de um


grupo de estudo, em um evento na Universidade Federal de Santa Catarina em
2016, com o objetivo de descobrir, informalmente, se os visitantes do evento
identificavam o Brasil como uma nação “latina”. Para isso, cada um escreveu o
nome de três países pertencentes à América Latina em um papel e colocou em um
recipiente. Ao final do evento, com a análise quantitativa desses dados, constatou-
se que aproximadamente 28% dos participantes não mencionaram o Brasil dentre
os três nomes. Embora esse resultado seja relativamente baixo e não represente

45
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

a maioria, entende-se que, na ocasião, reforçava a hipótese de uma tendência à


diferenciação entre as identidades latina e brasileira, uma vez que a dissociação é
mais recorrente em situações espontâneas.

Você já se perguntou por que os brasileiros tendem a referir-se aos sujeitos


hispanofalantes de países vizinhos como latinos? Os brasileiros também não são
latinos? O Brasil está entre os três nomes que você escreveu?

AUTOATIVIDADE

Agora que você já sabe do que se trata a pesquisa, antes de prosseguir a


leitura, conte-nos se você espontaneamente também utiliza o termo latino para
referir-se aos países vizinhos, e por que você acha que isso costuma acontecer.

Essa divisão entre latinos e brasileiros é claramente uma questão de


identidade. A não identificação com a América Latina, além de estar relacionada à
política nacional e à mídia, que fazem questão de apagar essa relação (OLIVEIRA
et al., 2015), tem a ver com a nossa memória histórica, que difere dos países
vizinhos por sua colonização espanhola (GRIMSON, 2000). Esses são alguns dos
fatores, dentre outros, que você pode ter citado na sua resposta, que fazem com
que nossas realidades se distanciem desses países, e identidades separadas sejam
formadas. Mas, afinal, o que é uma identidade? Como ela se forma?

Silva afirma que uma identidade nada mais é do que um conjunto de atos
linguísticos, construído sócio e culturalmente (SILVA, 2014, p. 76). Nessa mesma
perspectiva, Moura (2005, p. 80) define identidade como um texto, o qual pode
dizer respeito tanto ao perfil de um indivíduo, quanto aos objetivos e objetos de
um grupo.

NOTA

Ficou clara essa concepção de identidade? Um outro modo de entender a


identidade: é “um sentimento de pertencimento a um determinado grupo cultural; este
grupo, por sua vez, é representado e constituído por sentidos e símbolos que refletem na
caracterização dessa mesma identidade” (OLIVEIRA, 2017, p. 16).

46
TÓPICO 4 | O QUE É IDENTIDADE?

O fato é que a partir de nossas memórias construímos nossa versão de nós


mesmos, e estas nos garantem essas identificações (MOURA, 2005). Isto é, se eu
me considero feminista é porque, a partir de associações, histórias e lembranças,
eu construí essa identificação, mas construí como? Na linguagem, por meio de
frases como “sou feminista”, que repito e carrego comigo quando me perguntam
sobre ela.

AUTOATIVIDADE

Que tal tentar entender na prática a formação da sua identidade


nacional? Boa ideia, não é mesmo? Analise as imagens a seguir e, em seguida,
responda as questões sobre elas:

ATENCAO

Caso você não seja ou não se considere brasileiro, proponho que faça as
adaptações necessárias na atividade para que compreenda a formação da identidade
nacional à qual você se sente pertencido.

FIGURA 26 – BANDEIRA DO BRASIL

FONTE: Disponível em: <https://pixabay.com/pt/brasil-bandeira-


p%C3%A1tria-1581233/>. Acesso em: 18 fev. 2018.

47
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

FIGURA 27 – CARNAVAL DO RIO DE JANEIRO

FONTE: Disponível em: https://pixabay.com/es/photos/rio-de-janeiro-


carnaval-4965438/ Acesso em: 30 ago. 2021

FIGURA 28 – O FUTEBOL

Fonte: Disponível em: https://pxhere.com/pt/photo/1046804


Acesso em: 14 set. 2021.

Com certeza estas imagens são familiares para você, o que não significa que você se
sinta conectado 100% com elas, concorda? Dentre as imagens apresentadas, alguma
delas foi essencial para a formação da sua identidade brasileira? Além do espírito de união
e lealdade, o que te faz considerar-se como brasileiro?

• Verifique se ela é composta por lembranças, histórias, tradições.

É composta? Então, com certeza estas são as memórias que te fazem afirmar com
automaticidade que você é ‘brasileiro’, ou da nacionalidade com que você se identifica.

• Analise se sua resposta abrange questões biológicas.

Não abrange, certo? Isso quer dizer que, como toda identidade, a sua identidade nacional
não é inata, ela se constituiu histórica e socialmente.

• Ainda, se possível, compare a sua resposta com o colega.

48
TÓPICO 4 | O QUE É IDENTIDADE?

Comparou? Você deve ter observado que mesmo sendo a mesma


identidade, brasileiro, vocês enxergam e assumem essa identidade por distintas
razões. Hall (2005, p. 63) explica isso da seguinte maneira, as identidades nacionais
“são atravessadas por profundas divisões e diferenças internas, sendo "unificadas"
apenas através do exercício de diferentes formas de poder cultural”, ou seja, os
símbolos nacionais são meras representações, sendo as nações formadas por uma
ampla diversidade cultural, na qual vocês se encontram.

NOTA

É preciso lembrar que, assim como ressalta Moura (2005), o processo de


constituição de uma identidade pode ser visto de vários ângulos, isso implica que a visão
sobre uma determinada concepção de identidade será, de certa forma, relativa.

Os três tópicos que você usou para a análise de sua resposta podem
ser aplicados a qualquer outro tipo de identidade (de religião, gênero, raça,
sexualidade etc.), mesmo o último tópico, voltado principalmente às identidades
nacionais, já que durante muitos anos foi considerada a identidade-mãe e
unificadora dos sujeitos. Ao longo do tempo, essa concepção de identidade foi
mudando a ponto de hoje tornar-se um termo complexo e amplo, assim como a
cultura.

E
IMPORTANT

Não podemos reduzir as culturas e as identidades à nacionalidade. Como


veremos adiante, embora a identidade nacional seja aquela que ganha bastante atenção em
nossa área por estar ligada à língua e à cultura, existem muitas outras identidades (de gênero,
raça, credo etc.) que também estão imersas nas discussões sobre a homogeneização e a
heterogeneidade das identidades.

3 A EVOLUÇÃO NA CONCEPÇÃO DE IDENTIDADE


Você observou que no Tópico 1 o conceito de cultura foi discutido
principalmente a partir da oposição entre concepções abertas e fechadas? Agora
você constatará que com o conceito de identidade não foi muito diferente.
Identidade e cultura são termos que conversam histórica e politicamente, sendo
a junção identidades culturais muito presente na literatura sobre o tema, como no
próprio título do livro do Hall (2005) “A Identidade Cultural na Pós-Modernidade”.
49
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

DICAS

Sugestão de leitura o livro A indentidade cultural na Pós-Modernidade, autor


Hall (2005).

E
IMPORTANT

Essa concepção é discutida em Oliveira (2017). Identidades culturais referem-


se às representações dos sujeitos que nascem a partir de práticas e símbolos de um grupo.

Assim como o conceito de cultura passou por uma evolução desde


o Iluminismo, o de identidade também. Isso porque os ideais do Iluminismo,
ligados à razão, terminavam por estabelecer sujeitos uniformes. Na concepção de
Hall (2005), as identidades nunca foram uniformes. Entretanto, o que houve foi
uma transformação na concepção da identidade cultural do sujeito, a qual passou
por três etapas:

SU J EI T O D O ILUMIN ISMO  SUJE I T O S OC I OL ÓGI C O 


SUJEITO PÓS-MO DE RNO

O sujeito do Iluminismo tinha uma identidade unificada que nascia com


ele, se desenvolvia e nunca mudava, “era uma concepção muito individualista do
sujeito e de sua identidade” (HALL, 2005, p. 10).

O sujeito sociológico, por sua vez, tinha uma identidade negociada


socialmente, ou seja, identidade = eu + sociedade. Nesse caso, a identidade
estabilizava essa relação, funcionando como uma troca.

De acordo com essa visão, que se tornou a concepção sociológica


clássica da questão, a identidade é formada na interação entre o eu e a
sociedade. O sujeito ainda tem um núcleo ou essência interior que é o
eu real, mas este é formado e modificado num diálogo contínuo com
os mundos culturais exteriores e as identidades que esses mundos
oferecem (HALL, 2005, p. 11).

O sujeito pós-moderno rompe com as identidades pré-moldadas,


ocorrendo a fragmentação da identidade do sujeito. Identidades deslocadas pelo
processo de globalização. “O sujeito assume identidades diferentes em diferentes
momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um eu coerente.

50
TÓPICO 4 | O QUE É IDENTIDADE?

Dentro de nós há identidades contraditórias, empurrando em diferentes direções,


de tal modo que nossas identificações estão sendo continuamente deslocadas”
(HALL, 2005, p. 13).

Como expoentes desse processo de transformação, ele traz como exemplos


grandes nomes, passando por Freud, Saussure, Derrida, Foucault e o feminismo.

É problematizando esse exercício de poder que, segundo Moura (2005), a


visão estática sobre a identidade nacional, imposta em países colonizados, passa
a ganhar notoriedade. Até então as identidades eram baseadas em narrativas
prontas e fiéis que diferenciavam as nações umas das outras. Nesse momento, as
identidades do sujeito passam a ser desmembradas, e deixam de ser vistas como
uma coisa só, como permanentes.

DICAS

Não é novidade para você que Hall associa culturas e identidades nacionais a
relações de poder e as problematize, não é mesmo? Caso tenha dúvidas sobre esta questão,
retome o assunto sobre Culturas Nacionais.

4 A IDENTIDADE NA PÓS-MODERNIDADE
Esses conflitos entre concepções homogêneas e heterogêneas é que Hall
(2005) vai chamar de crise de identidade, que nada mais é do que o deslocamento,
desmembramento e diluição dessa identidade nacional sólida. Você deve estar
se questionando: como assim? Voltamos à ideia de uma identidade brasileira,
os símbolos que visualizamos nas imagens anteriores sobre a formação de
nossas identidades, na verdade, foram escolhidos para remeter à ideia de cultura
nacional, na qual todos os sujeitos das nações são representados. No entanto, o
Carnaval, tal como é posto na Figura 27, é uma cultura ligada ao Rio de Janeiro,
diferenciando-se do carnaval de outros estados brasileiros, bem como de estados
em que esse aspecto cultural não predomina.

Assim, esse deslocamento, desmembramento e diluição em relação a essa


identidade nacional refere-se que ser brasileiro é ir além desses símbolos nacionais,
isto é, eu posso não me identificar com o Carnaval, mas ao mesmo tempo me
sentir parte dessa comunidade. De outra forma, nascer no Brasil e possuir outras
identidades com as quais me identifico mais. O fato é que uma identidade não
é uma essência, eu posso ter várias identidades ou nenhuma ao mesmo tempo.
É nesse sentido que se fala em crise de identidade na pós-modernidade, pois

51
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

esse questionamento sobre as representações estáticas dos sujeitos só surgiu


recentemente, nos anos 70. Antes essa homogeneidade era assumida como um
padrão natural nas sociedades (MOURA, 2005).

Desse modo, a formação de nossas identidades não é inata, ela se constrói


ao longo de nossas relações sociais. Byram e Fleming explicam essa questão:

Cada persona posee varias identidades sociales, es decir, grupos


sociales a los que pertenecen, y culturas, prácticas culturales, creencias
y valores a los que se adhieren. Cual de estas identidades va a ser
dominante en cualquier interacción depende de varios factores
presentes en la situación: el idioma que se emplea, la relación con
la otra persona, cómo se identifican los participantes (BYRAM;
FLEMING, 2009, p. 15).

Byram e Fleming, confirmando o que já discutimos antes, não


compreendem a nossa identidade nacional como uma identidade única e estável.
Para eles, nós temos várias identidades que assumimos de acordo com a nossa
realidade coletiva e individual, e elas tornam-se mais evidentes conforme o nosso
contexto de interação. Assim, observe a imagem a seguir e reflita: Quais tipos de
identidades além da nacional podem ser identificados?

FIGURA 29 – O QUE DEFINE A NOSSA IDENTIDADE?

FONTE: Disponível em: <https://br.pinterest.com/


pin/194780752611080092/?lp=true>. Acesso em: 28 out. 2017.

52
TÓPICO 4 | O QUE É IDENTIDADE?

Nessa concepção pós-moderna de identidade, os sujeitos não possuem


apenas uma única identidade que os formam, eles passam a assumir, de acordo
com determinados contextos, uma identidade diferente. Dessa forma, todas
as opções da imagem remetem a identidades dos sujeitos, sejam coletivas ou
individuais.

Fica uma pergunta para reflexão sobre o que é fundamental para a


existência de cada uma dessas identidades que assumimos. Haveria necessidade
de termos identidades se não existissem outras diferentes delas?

5 A IDENTIDADE E A DIFERENÇA

Sobre a pergunta realizada anteriormente para reflexão, se haveria
necessidade de termos identidades se não existissem outras diferentes delas. Já
vimos aqui que geralmente as identidades são formadas, independente da esfera
humana a que se referem, por traços que conferem aos membros de um grupo o
mesmo sentimento de pertencimento a tal identidade. Desse modo, um sujeito só
define as suas identidades a partir do momento em que conhece a existência de
outras práticas e visões de mundo, identificando-se com uma ou outra com base
em seus costumes e valores, ou seja, a diferença só existe quando existe o outro,
do contrário viveríamos em uma sociedade homogênea.

Vejamos um exemplo envolvendo duas identidades diferentes:

ATENCAO

Se você está tentando identificar as culturas por trás dessa imagem (Figura 30),
tome muito cuidado para não recair no estereótipo e no preconceito sobre elas. Ainda que
predomine uma caracterização generalista dos sujeitos, a própria imagem também retrata
que nem todos os sujeitos são iguais, e a noção de cultura é relativa.

53
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

FIGURA 30 – IDENTIDADES DIFERENTES

FONTE: Disponível em: <https://desmotivaciones.es/>. Acesso em: 28 out. 2017.

AUTOATIVIDADE

Sem entrar em méritos e deméritos sobre cada uma das culturas


retratadas na Figura 30, você consegue identificar o que faz com que as
personagens afirmem, de maneira negativa, que as culturas de uma e de outra
foram dominadas pelo homem?

Antes de prosseguir com a leitura, analise a imagem, reflita, e responda


essa questão.

Agora que você refletiu, vou tentar explicar o propósito de escolher esta
imagem para discussão. Talvez você se identifique com uma das duas identidades
em questão e isso te faça tender para um dos lados, mas com certeza você concorda
que, independentemente da identidade de cada uma das mulheres, ambas
assumem as suas culturas como norma ao avaliar e opinar sobre a outra. Isso
porque tratam-se de duas identidades em que a vestimenta feminina é assumida
de maneiras distintas, para a mulher da esquerda, a vestimenta está associada
à liberdade de escolha, seja ela mais ou menos discreta; enquanto a mulher da
direita, a discrição é parte de uma tradição de resguardo da figura feminina. Com
isso, concluímos que não existiriam duas identidades diferentes nesse caso, se
não existissem práticas e costumes que as diferenciassem.

Ainda, nessa perspectiva, se associarmos essa discussão à temática das


culturas nacionais, podemos mencionar o processo de “estrangeirização” a que
remete a imagem em questão.

54
TÓPICO 4 | O QUE É IDENTIDADE?

Em território brasileiro, a chegada de cubanos, alguns anos atrás,


exemplifica da mesma forma como a nacionalidade influencia no imaginário das
pessoas sobre o outro. No período em que vigorou o programa Mais Médicos do
Governo Federal, que trouxe profissionais cubanos para atender determinadas
regiões sem acesso médico, estes eram frequentemente estereotipados ou
estigmatizados pela nacionalidade, a qual era reconhecida durante a comunicação
pelos traços orais da língua espanhola.

Outro exemplo que pode ser citado, com base no estudo de Guizardi (2013),
é a tendência de construção da imagem da mulher brasileira em países europeus,
como a Espanha. O estudo destaca que à época, as mulheres representavam um
maior número de imigrações brasileiras, e discute como a visão hipersexualizada
e estereotipada sobre as brasileiras influenciou no local que elas ocuparam no
mercado de trabalho nesse país. Sobre o tema, a autora ressalta, dentre outras
questões, que tal visão reducionista sobre brasileiras é construída não apenas a
partir da própria percepção dos espanhóis, mas amparada na própria forma como
o Brasil vendia (e arrisco dizer que ainda vende) sua identidade “tropicalista”
mundo afora, através de agências de turismo internacional.

FIGURA 31 – ILUSTRAÇÃO: MELINA GALLO

FONTE: Disponível em: https://www.rbsdirect.com.br/


imagesrc/24864753.jpg?w=700. Acesso em: 30 ago. 2021

En gran medida, el nicho laboral de las brasileñas en la prostitución está


mediado por un estereotipo de hipersexualidad fuertemente asociado
al imaginario de "tropicalismo" con el que los y las brasileñas definen
su identidad nacional en condición migratoria, y que viene acompañando
la migración brasileña en diferentes partes del globo. Esta construcción,
sin embargo, no se refiere únicamente a la manera como los migrantes
entienden y elaboran su identidad. Ella se respalda en condiciones
estructurales vinculadas a los imaginarios europeos y norte-americanos
acerca de Brasil y de las brasileñas, reafirmando estereotipos que
relacionan su identidad nacional al dominio de los bailes, músicas, y
performances varias asociadas a este "tropicalismo" y ayudando a
constituir un nicho económico al que Machado denominó el mercado de
la alegría. La forma como los europeos y estadounidenses identifican,
clasifican y se relacionan con los y las brasileñas está en gran medida
impactada por la permanencia de este imaginario colonial  acerca de
la gente en los trópicos,  que en el caso de las mujeres brasileñas es
sintetizado por la noción de exotismo, erotismo, exuberancia/salvajismo

55
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

sexual y de la supuesta legitimidad del ejercicio de poder del hombre


blanco (colonizador) sobre estas mujeres, como manera de controlar
y someter su salvajismo, manteniéndolas en un estado de docilidad
(GUIZARDI, 2013, s/n)

NOTA

Indicamos a leitura do texto completo de Menara Lube Guizardi. Consulte a


referência desse artigo logo abaixo.

GUIZARDI, M. L. Estereotipos, identidades, y nichos económicos de las migrantes brasileñas


en Madrid. Revista Estudos Feministas, v. 21, n. 1, Florianópolis: 2013. Disponível em: < https://
www.scielo.br/j/ref/a/x8LSXcMJcRJxHsHfhSjpskm/?lang=es#>. Acesso em: 27 ago. 2021

Como podemos ver, há muitas questões em jogo quando tratamos do tema da


identidade nacional, e que determinam o estabelecimento da diferença entre os sujeitos.

Os exemplos trazidos em relação aos estrangeiros e a forma como são tratados


em outros países, tem o propósito de mostrar que a identidade precisa da diferença
para existir (SILVA, 2014). Isto é, ao afirmar a minha identidade, eu automaticamente
renego outras, e ao renegar outras, eu reafirmo a minha. Por exemplo, se eu me vejo
como brasileiro, é porque eu sei que minhas práticas e costumes não coincidem com a
de um muçulmano, por exemplo, elas me fazem ser o que eu acredito que sou. O que
me assegura essa identidade é a minha identificação com o que a diferencia de outras.
Por essa razão, segundo Silva, as identidades são afirmações e negações ao mesmo
tempo, e a partir dessas identidades é que nasce a diferença (SILVA, 2014).

Essa ideia apresentada por Silva talvez seja familiar para você, afinal, o autor
também se apoia na teoria de Saussure sobre signos (significado e significante) a fim
de discutir como a diferença é formada. Você já aprendeu essa teoria? Se sim, você
lembra como ela funciona? A seguir, algumas informações essenciais sobre ela:

FIGURA 32 – IDENTIDADES DIFERENTES

FONTE: Disponível em: <https://pt.slideshare.net/guidagava/lingustica-i-saussure>.


Acesso em: 28 out. 2017.
56
TÓPICO 4 | O QUE É IDENTIDADE?

Em síntese, na visão de Saussure, a palavra é formada tanto pela sua


grafia (significante) quanto pelo significado atribuído a ela, certo? É nesse sentido
que Silva (2014) traz como exemplo a palavra vaca, que mesmo sabendo do que
se trata ao escutarmos esse nome, não há nada na grafia da palavra que a ligue
diretamente ao animal. Só sabemos o que é porque contrastamos essa palavra
com outra, ou seja, porque sabemos que não se trata de outro animal.

AUTOATIVIDADE

Não entendeu? Então vamos tentar entender de uma forma mais


divertida. Antes de prosseguir com seus estudos, escreva ao lado das palavras
a seguir uma ideia ou imagem que venha à sua mente ao lê-las:

hond
chien
sobaka

Se você sabe falar outras línguas, além do português e do espanhol,


possivelmente chegou a uma conclusão sobre os significados originais dos termos
acima. No entanto, se você não sabe, é provável que essas palavras não tenham
nenhum sentido para você, não é mesmo? Isso acontece porque o significado
desses termos possui outro significante na sua língua. Isto é, você pode até
não usar e não conhecer os termos mencionados, mas saberia o referente se a
palavra utilizada fosse cão ou perro. Todas essas palavras remetem a esse mesmo
significado, porém em línguas distintas.

FIGURA 33 – TEORIA DO SIGNO DE SAUSSURE APLICADA AO


CONCEITO DE CÃO

significado

perro cão
cane
hond skuli
dog chien
significante sobaka

FONTE: Disponível em: <http://littera.es/ferdinand-de-saussure-y-la-


escuela-de/>. Acesso em: 28 out. 2017.

57
UNIDADE 1 | APROFUNDANDO AS NOÇÕES DE CULTURA E IDENTIDADE

Essa teoria do signo de Saussure nos ajuda a entender como se forma a


diferença no interior da linguagem e, consequentemente, em nossas identidades,
não é mesmo? Além de Silva (2014), a questão da identidade e diferença é discutida
por outros autores dos Estudos Culturais na atualidade, como alguns dos nomes
que trazemos em Oliveira (2017).

O objetivo de tratar do tema nesta unidade nada mais é do que aproximar


da realidade das pesquisas em Linguística Aplicada sobre o ensino de língua
espanhola, como as de Paraquett (2010; 2011). Picanço (2012) defende, dentre
várias questões, a importância de se entender que as identidades se constroem
criando limites entre os sujeitos, limites que precisamos superar. Assim,
precisamos superar a intolerância e o desrespeito com esse outro que criamos.

Por isso, o tema da identidade parece-nos essencial de ser tratado à luz do


contexto de ensino da língua espanhola, já que diariamente o professor convive
com alunos de diversos lugares, cores, raças, gêneros etc. Ainda nesse sentido, é
importante que relevemos o fato de estarmos lidando com uma língua plural. A
língua espanhola não é a língua de um único país, ela também não é a língua de
20 países, ela ultrapassa essas fronteiras. Afinal, você está no Brasil e aprendendo
ela, não é mesmo?

ATENCAO

A própria diferenciação entre nativos e estrangeiros, no que se refere ao


aprendizado de uma língua estrangeira, em tempos de globalização, pode ser considerada
ultrapassada (OLIVEIRA, 2017). Discutiremos este tema em outra unidade, mas você já pode
ir se aprofundando sobre ele.

DICAS

Sugerimos como leitura para o tema da Cultura nas Ciências Sociais o artigo
de Ortiz (2002): As ciências sociais e a cultura.

Que tal ler um pouquinho mais sobre cultura e identidade, e de quebra


entender a relação de ambos conceitos de língua? De modo geral, esses conceitos
são apresentados por Pereira Coelho e Pereira Coelho De Mesquita (2014) em seu
artigo, Língua, cultura e identidade: conceitos intrínsecos e interdependentes.

58
TÓPICO 4 | O QUE É IDENTIDADE?

LEITURA COMPLEMENTAR

LÍNGUA, CULTURA E IDENTIDADE: CONCEITOS INTRÍNSECOS


E INTERDEPENDENTES

Lidiane Pereira Coelho


Diana Pereira Coelho de Mesquita

Resumo

O presente artigo destina-se à discussão sobre a interdependência entre


os conceitos de língua, cultura e identidade, ressaltando que tais conceitos estão
intrinsecamente ligados, haja vista que a cultura se constitui e se difunde por
meio da língua e que é também por meio dela que ocorrem os processos de
identificação do sujeito. Nesse sentido, a língua perpassa tanto a cultura quanto
a identidade e é também por elas perpassada, o que faz com que a relação entre
estes três conceitos seja imanente, uma vez que não há cultura sem língua e que a
identidade se constrói por meio da língua e da cultura.

FONTE: Disponível em: <https://sistemas.uft.edu.br/periodicos/index.php/entreletras/article/


view/975>.

59
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico, você aprendeu que:

• O que é identidade, e como este conceito está relacionado ao uso da língua.

• Como se formam as identidades (no plural, porque não possuímos apenas


uma), sobretudo as nacionais e seus símbolos culturais.

• A constituição da diferença a partir da delimitação do que somos.

• Como evoluiu a concepção de identidade, desde os primórdios do Iluminismo


estava associada a um sujeito que não muda.

60
AUTOATIVIDADE

1 Uma identidade, além de servir como uma representação, ou rótulo,


contempla sentimentos de pertencimento que constroem diferenças entre
eu e o outro. A partir dessa afirmação, analise os quadrinhos a seguir, e
escreva a ideia apresentada ao conceito de identidade cultural.

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/cy737N>. Acesso em: 18


jan. 2018.

2 Hall (2005) defende que em nenhum momento da história as


identidades foram homogêneas, mas sim, estiveram ligadas a
uma concepção de sujeito que as assumia como tais. Essa con-
cepção se transformou ao longo do tempo, passando por três
etapas na visão do autor.

(a) Sujeito do iluminismo.


(b) Sujeito sociológico.
(c) Sujeito pós-moderno.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução de Tomaz Tadeu da Silva


e Guacira Lopes Louro. 10. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.

Tendo em vista estas três concepções de sujeito, associe cada uma delas às
concepções de identidade a seguir:

( ) Concepção múltipla de identidade – o sujeito assume diferente identidades


conforme o contexto.
( ) Concepção negociada de identidade – o sujeito adapta o seu interior ao seu entorno.
( ) Concepção única de identidade – nasce com o indivíduo e nunca muda.
61
3 Segundo a visão Pós-Moderna, nossas identidades não são
inatas, elas são construídas histórica e socialmente. Baseando-
se nessa perspectiva, analise as sentenças a seguir:

I– Nossas memórias e conhecimentos sobre nós e os outros nos ajudam a


determinar nossas diversas identidades.
II– A identidade é uma representação única do sujeito que se dá pela sua
nacionalidade, a qual o diferencia dos outros.
III– Uma identidade é uma representação real e imutável do que somos, por
esse motivo, as identidades são passadas de geração em geração.

Com base nas sentenças, assinale a alternativa correta.


a) ( ) Apenas I.
b) ( ) Apenas II.
c) ( ) Apenas I e II.
d) ( ) Apenas III.
e) ( ) Todas estão corretas.

4 Observe o diálogo a seguir:

Hola Olá. Você é


argentino ?

FONTE: Imagem original disponível em: <https://pixabay.com/pt/


cabe%C3%A7a-ponto-de-interroga%C3%A7%C3%A3o-674129/>.
Acesso em: 18 jan. 2018.

Considerando que algumas identidades se sobressaem mais que outras no


diálogo com um estrangeiro, analise e explique o que pode ter determinado a
conclusão do brasileiro sobre o outro.

62
UNIDADE 2

OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A


DIVERSIDADE CULTURAL

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir desta unidade, você será capaz de:

• reconhecer a multiplicidade cultural como parte das sociedades;

• identificar preceitos educacionais e sociais do multiculturalismo e da in-


terculturalidade;

• reconhecer aspectos políticos e sociais que tendem à homogeneização cul-


tural;

• avaliar situações de intolerância aplicando olhares críticos multi e inter-


culturais;

• relacionar e distinguir o multiculturalismo da interculturalidade;

• explicar o que é e como ocorre o processo de hibridação cultural.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você en-
contrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – O MULTICULTURALISMO

TÓPICO 2 – O PROCESSO DE HIBRIDAÇÃO CULTURAL

TÓPICO 3 – A INTERCULTURALIDADE

63
64
UNIDADE 2
TÓPICO 1

O MULTICULTURALISMO

1 INTRODUÇÃO
Seja muito bem-vindo à segunda unidade do nosso livro de estudos!
Na primeira unidade, como você deve lembrar, discutimos conceitos muito
interessantes, por exemplo, identidade e cultura. Vimos como esses conceitos
se relacionam socialmente. Nesta unidade, dando continuidade ao estudo dos
aspectos culturais, organizamos conteúdos e atividades desafiadoras que o
ajudarão a entender melhor os diferentes olhares sobre a diversidade cultural.
Preparado para esta nova etapa?

Vamos aos questionamentos iniciais: Para você, o que é diversidade


cultural? Você já ouviu falar de multiculturalismo? A que ele se refere?

Para debatermos sobre o termo, o tópico está dividido em três partes, a


primeira parte fala do significado do termo multiculturalismo e de suas vertentes;
a segunda parte aprofunda a sua vertente folclórica; e a terceira, por fim, é então
direcionada à sua abordagem crítica.

2 AS VERTENTES DO MULTICULTURALISMO
Multiculturalismo parece um termo simples de entender, não é mesmo?
Seguindo a lógica da estrutura da palavra, poderíamos logo relacioná-lo ao
conceito de diversidade cultural, pois seu prefixo junto ao termo cultura remete
a uma vaga ideia de muitas culturas. Você sabe o que é prefixo? E sufixo, você
sabe?

NOTA

Vamos lembrar um pouquinho das aulas de Morfologia: radical é aquela


estrutura básica da palavra que detém sentido. Prefixo e sufixo são morfemas que, adicionados
às palavras, formam novas palavras. Assim, o prefixo é aquela partezinha que adicionamos
antes do radical, e sufixo é a que colocamos depois dele.

65
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

Assim, ao falar em prefixo do termo multiculturalismo, quis me referir à


primeira parte da palavra, ou seja, “multi”, que é usada para remeter à quantidade
do termo que o sucede. Nesse caso, a sua forma fixa, “cultural”.

O sufixo “ismo”, você sabe para que ele serve? O que ele modifica nesse
termo? Para adivinhar, observe palavras que selecionei em que o sufixo ismo
também aparece, e tente descobrir o que elas têm em comum, em seu significado,
com o conceito de multiculturalismo.

FEMINISMO
MORALISMO
ILUMINISMO

Para facilitar a sua reflexão, faça a leitura das definições de cada uma delas,
retiradas do Dicionário Priberam da Língua Portuguesa (DPLP), disponível on-
line, e expostas a seguir:

FIGURA 34 – SIGNIFICADO DE FEMINISMO

FONTE: Disponível em: <http://www.priberam.pt/dlpo/chave>. Acesso em: 2 dez. 2017.

FIGURA 35 – SIGNIFICADO DE MORALISMO

FONTE: Disponível em: <http://www.priberam.pt/dlpo/chave>. Acesso em: 2 dez. 2017.

66
TÓPICO 1 | O MULTICULTURALISMO

FIGURA 36 – SIGNIFICADO DE ILUMINISMO

FONTE: Disponível em: <http://www.priberam.pt/dlpo/chave>. Acesso em: 2 dez. 2017.

AUTOATIVIDADE

1 Descreva suas observações sobre os conceitos apresentados.

Se você chegou à conclusão de que as três palavras envolvem um conjunto


de princípios ou ideias, fez uma boa associação. Palavras com o sufixo ismo, de
origem grega, podem referir-se tanto a um movimento ideológico, um conjunto
de ideias, quanto a um movimento político. De fato, os termos feminismo,
moralismo e iluminismo, bem como multiculturalismo, estão relacionados a
esses dois tipos de movimentos. Mas atenção! Os significados do sufixo ismo não
são somente esses. Se você fizer uma rápida busca na internet, encontrará uma
vasta lista com variados termos e contextos em que este é empregado, assim como
as conotações diversas que agrega às palavras.

Na medicina, a título de exemplo, o sufixo ismo serve para designar


patologias baseadas em comportamentos, um uso polêmico desse sufixo,
relacionado à área médica, é o do termo homossexualismo, que deixou de ser
usado nos anos 90 quando a pesquisa nessa área evoluiu, e passou-se a adotar
o termo homossexualidade, entendendo-o como uma condição, uma orientação
sexual.

Retornando ao conceito que nos interessa, em síntese, o que


procuro destacar com essa discussão morfológica é que o sufixo da palavra
multiculturalismo permite ser vista tanto como um objeto ideológico quanto
político, sendo formada da seguinte maneira:

67
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

FIGURA 37 – MULTICULTURALISMO

A seguir, veremos que o termo em questão está aberto a inúmeras


interpretações e usos, e com isso, pode até mesmo possuir significados opostos,
se analisarmos de perto os contextos em que é usado. Para ilustrar essa possível
oposição, observe a imagem que apresentamos:

FIGURA 38 – PROPOSTA DE RETRATO DA CULTURA LATINO-AMERICANA

FONTE: Disponível em: <https://alexmarques.deviantart.com/art/Cultura-


Latina-completo-287636522>. Acesso em: 2 dez. 2017.

AUTOATIVIDADE

Na sua opinião, há multiculturalismo na Figura 5 ? Por quê?

68
TÓPICO 1 | O MULTICULTURALISMO

A sua resposta, sendo positiva ou negativa, tenderá a uma das vertentes


do conceito de multiculturalismo. De um lado, perspectivas que assumem a
diversidade das culturas a partir de representações; e do outro, as que questionam
e desconsideram essas representações em virtude das fronteiras diluídas entre
uma cultura e outra. Desse modo, se você analisou a imagem pelo viés de que
o mariachi representa o México, e o tucano representa o Brasil, hipoteticamente,
poderia afirmar que existe multiculturalismo por haver mais de uma cultura
sendo apresentada, mas se levou em conta a imensidão cultural que faz parte do
Brasil e do México, deve ter se perguntado sobre essas representações fixas: e as
demais culturas desses países e da América Latina? A cultura desses povos é da
forma como está representada?

NOTA

Lembre que na Unidade 1 falamos sobre os mariachis em uma das atividades?


Se ainda tem curiosidade sobre suas apresentações, sugiro que assista ao vídeo no YouTube
titulado “Guantanamera - Mariachi Acapulco” Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=t0CZH1mfBLM>. Acesso em: 9 dez. 2017.

Conseguiu entender o dilema multiculturalista? O multiculturalismo é


um conceito muito presente em estudos sobre diversidade, língua e cultura, e
essencial para nós, professores de Espanhol. Você está se perguntando: por quê?
Espero poder ajudá-lo a chegar em uma resposta para essa pergunta com as
leituras deste tópico, afinal, continuaremos refletindo e dialogando sobre essa
questão. Nesse momento, o que você acha de conhecermos um pouquinho mais
sobre estas visões opostas de multiculturalismo?

3 O MULTICULTURALISMO E A COEXISTÊNCIA ENTRE


CULTURAS
Para começar, faço um convite para refletirmos um pouco sobre nossa
realidade em sociedade, nosso entorno, pois é a partir dessas reflexões que
nascem perspectivas como o multiculturalismo, por vezes complexas.

69
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

AUTOATIVIDADE

Na sua cidade ou bairro existem muitas diferenças étnicas? Quais são


mais reconhecidas pelo governo, moradores e turistas? Como você descreveria
a sua cidade, ou bairro, a partir do que você vê? Há uma grande diferença de
classes sociais e realidades?

Se você respondeu que existem muitas etnias, bem-vindo à realidade do


que chamamos de diversidade! A seguir, o significado da palavra diversidade
conforme o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa:

FIGURA 39 – SIGNIFICADO DE DIVERSIDADE

FONTE: Disponível em: <http://www.priberam.pt/dlpo/diversidade>. Acesso em: 2 dez. 2017.

Sendo a diversidade a qualidade do que é diverso, não raro, o termo


multiculturalismo é assumido como seu sinônimo, já que etimologicamente, como
vimos, multicultural pode ser usado como adjetivo pluralizador. A essa vertente
de multiculturalismo, que assume a coexistência de diversas culturas, Canen
(2007) chamará de “folclórica” ou “liberal”, uma vez que representa apenas o
reconhecimento e a valorização da pluralidade a partir de traços que diferenciam
culturas umas das outras, como as festas tradicionais, comidas típicas etc. Assim,
para a perspectiva folclórica, é suficiente reconhecer a América Latina como um
continente multicultural, desde que se respeite as diferenças existentes.

De modo a ilustrar essa perspectiva, a seguir, na figura, observe que o


mapa é formado por bandeiras, que separam e unificam culturalmente os países,
tanto pelo seu território, quanto pela sua história, uma vez que as bandeiras
funcionam como símbolo de sua trajetória.

70
TÓPICO 1 | O MULTICULTURALISMO

FIGURA 40 – MAPA MÚNDI COM BANDEIRAS

FONTE: Disponível em: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/c/


c0/Flags_map_post_war_1989.PNG/1280px-Flags_map_post_war_1989.PNG>.
Acesso em: 2 dez. 2017.

Esse mapa traduz a América Latina, por exemplo, como um todo


multicultural, formado por nações diversas. Olhando essas separações por países
e bandeiras, você deve estar se lembrando da nossa discussão sobre culturas
nacionais na Unidade 1, e como essas barreiras territoriais são ilusórias. Se isso
aconteceu, ótimo! Agora você está cruzando as informações e entendendo por
que a vertente folclórica do multiculturalismo é tão questionada na literatura
sobre o tema (CANEN, 2007; SILVA, 2010). Respeitar o outro, independentemente
de sua cultura, é o básico para uma boa convivência em sociedade, e por isso o
multiculturalismo crítico defende que devemos ir além do reconhecimento das
diferenças.

Complementando essa crítica ao multiculturalismo folclórico, vamos


retornar a outra das perguntas que foram lançadas sobre sua cidade/bairro. Em
sua cidade/bairro há uma grande diferença de classes sociais e realidades? Se, ao
mesmo tempo, na sua resposta você diz existir uma variedade de etnias e existem
desigualdades, possivelmente o tratamento dessas diversas etnias ou grupos não
deve ser o mesmo na sua cidade. Esse é outro ponto de discussão que faz com que
muitos pensadores critiquem essa perspectiva multiculturalista folclórica, já que
historicamente, como já discutimos, até formar nossa sociedade atual, algumas
culturas e etnias, como a dos índios e dos povos africanos, foram injustiçadas
e tratadas com desigualdade e segregação. Respeitar o outro parece muito
pouco diante deste cenário, o multiculturalismo crítico espera problematizações,
questionamentos sobre como essas diferenças surgiram.

É por isso que autores como Canen (2007) e Silva (2010) questionam os
objetivos de uma perspectiva educativa que se limite ao respeito e à tolerância
com a diversidade, como a do multiculturalismo folclórico. Silva (2010, p. 100)

71
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

espera que a educação possibilite ao aluno sair do senso comum, do seu conforto,
e passe a explorar nas identidades ‘possibilidades de perturbação, transgressão e
subversão’, e a confrontar hegemonias e homogeneizações.

Antes de seguir para a discussão sobre o multiculturalismo crítico, solicito


que analise o modelo de atividade proposto na Unidade 1, Tópico 1, reproduzido
logo em seguida, apontando de que maneira ele ajuda a superar certas limitações
do multiculturalismo folclórico. Faça sugestões de adequações que achar
pertinentes para essa atividade.

AUTOATIVIDADE

FIGURA 41 – TEXTO INFORMATIVO

FONTE: Disponível em: <http://www.boliviacultural.com.br/ver_noticias.php?id=348> e


Disponível em: <https://alchetron.com/Carnaval-de-Oruro-2086716-W>. Acesso:
26 out. 2017.

4 O MULTICULTURALISMO CRÍTICO
O marco do multiculturalismo se mistura com alguns momentos
importantes. Paraquett (2010, p. 141), com base em estudos de Hall, ressalta
que os deslocamentos que originaram sociedades multiculturais acentuaram-se
com o fim da II Guerra Mundial, em meados do século XX, quando intensificou-
se o fenômeno pós-colonial. Embora esses deslocamentos já existissem, o que

72
TÓPICO 1 | O MULTICULTURALISMO

contribuiu para sua intensificação foi “o fim do sistema imperial europeu e das
lutas pela descolonização e independência nacional, o fim da Guerra Fria e a
globalização” (PARAQUETT, 2010, p. 141).

Um padrão de relações herdado da colonização europeia pelas Américas


passa a se constituir como modelo de poder moderno e inabalável. Dentro desse
sistema, sobrevivem a segregação pela raça, exemplo do período de escravidão;
a adaptação dos povos à língua e à cultura do colonizador; o consequente
apagamento de línguas e culturas indígenas, com base em hegemonias culturais
históricas; dentre outros resquícios sociais.

Em virtude dessa realidade pós-colonial, que se estende até os dias de


hoje, nascem teorias pós-coloniais, que investigam e questionam o fato de os
sujeitos terem suas identidades particulares renegadas e discriminadas, por não se
adequarem a uma cultura ou identidade hegemônica. Nessas teorias está incluído
o multiculturalismo crítico, que, embora não rejeite os ideais da perspectiva
folclórica, defende um ponto de vista mais radical. Sobre a perspectiva crítica do
multiculturalismo, Canen (2007, p. 93) afirma que:

Ela busca articular as visões folclóricas, discussões sobre as relações


desiguais de poder entre as culturas diversas, questionando a
construção histórica dos preconceitos, das discriminações, da
hierarquização cultural.

Segundo a autora, os discursos que circulam em sociedade são foco da


vertente crítica, uma vez que é neles que nascem as diferenças. As diferenças
são impregnadas e naturalizadas na linguagem de modo que ninguém questiona
as suas origens, ninguém se detém ao modo como são construídas. Quer um
exemplo? A tecnologia é para nós, nos dias de hoje, uma das maiores descobertas,
não é mesmo? Então, como você definiria, por exemplo, os povos indígenas cuja
cultura não dependia dessa tecnologia? Ao impô-la a esses povos, o discurso do
colonizador é o de progresso. Você concorda? Trata-se de progresso, mas por que
precisou ser imposto? O direito à própria cultura, quando terminou?

A seguir, duas charges que complementam esses questionamentos.

73
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

FIGURA 42 – O PROCESSO DE COLONIZAÇÃO E


ACULTURAÇÃO

FONTE: Disponível em: <https://br.pinterest.com/


pin/452471093806021749/>. Acesso em: 2 dez. 2017.

FIGURA 43 – REPRESENTAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS HOJE

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/3ePKfv>.Acesso em: 2 dez.


2017.

74
TÓPICO 1 | O MULTICULTURALISMO

UNI

Para aprofundamentos sobre o tema do multiculturalismo, sugiro a leitura do


seguinte artigo. O multiculturalismo e seus dilemas: implicações na educação, de Ana
Canen, disponível nas referências.

Conseguiu observar como o discurso do colonizador está presente na


primeira charge? E na segunda, você observou como a cultura indígena foi
ficando para trás nesse contexto de globalização? São essas situações que o
pensamento crítico sobre o multiculturalismo espera ganharem foco, de modo
que nos percebamos diferentes, sim, mas também deixemos de lado as hierarquias
resultantes dessa diferença.

TURO S
ESTUDOS FU

Você verá no último tópico uma discussão complementar a esta, porém no


âmbito da interculturalidade, uma vez que, como afirma Canen (2007), o multiculturalismo
crítico tem princípios similares aos assumidos pela interculturalidade crítica. Passaremos,
agora, aos exercícios.

Responda às questões assinalando com um X, em seguida peça ao seu


professor o gabarito e a pontuação para que possa ver o seu resultado.

PONTUAÇÃO
PARA O
ACERTO

1. Possui ideais mais radicais que acompanham movimentos


sociais de luta pela igualdade:
( ) Multiculturalismo Crítico ( ) Multiculturalismo Folclórico
2. Vertente do multiculturalismo tratada como sinônimo de
diversidade:
( ) Multiculturalismo Crítico ( ) Multiculturalismo Folclórico
3. Aspectos culturais, como música e comidas típicas, fazem parte
do chamado:
( ) Multiculturalismo Crítico ( ) Multiculturalismo Folclórico

75
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

4. Questiona o sistema europeu e luta por uma nova sociedade:


( ) Multiculturalismo Crítico ( ) Multiculturalismo Folclórico
5. A valorização da diversidade guia o:
( ) Multiculturalismo Crítico ( ) Multiculturalismo Folclórico
6. Assemelha-se à interculturalidade crítica:
( ) Multiculturalismo Crítico ( ) Multiculturalismo Folclórico
7. A Figura 10 serve para refletirmos sobre o:
( ) Multiculturalismo Crítico ( ) Multiculturalismo Folclórico
8. A Figura 7 diz respeito à perspectiva do:
( ) Multiculturalismo Crítico ( ) Multiculturalismo Folclórico
9. A Figura 5 diz respeito à perspectiva do:
( ) Multiculturalismo Crítico ( ) Multiculturalismo Folclórico
10. A perspectiva que possui ideais pós-coloniais:
( ) Multiculturalismo Crítico ( ) Multiculturalismo Folclórico

UNI

Se você fez acima de 80 pontos, “¡eres un experto em multiculturalismo!” Se sua


pontuação foi de 50 pontos ou menos, sugiro que revise as partes da unidade que trabalham
os temas das questões em que apresentou maior dificuldade.

DICAS

Como forma de complementar seus estudos sobre o tema do multiculturalismo,


ou de aprofundá-lo, sugiro que visite os slides do professor Leonardo S. L. de Barros, da
UNIRIO, que tratam de modo objetivo e didático o contexto geral do tema. Disponível em:
<https://pt.slideshare.net/leotrigo/multiculturalismo-e-a-sociologia>.

76
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• O significado etimológico do termo Multiculturalismo.

• As diferentes vertentes do multiculturalismo.

• O multiculturalismo folclórico e suas fragilidades no que se refere ao


reconhecimento da multiplicidade cultural.

• A importância de reconhecer aspectos críticos relacionados às representações


culturais.

• O multiculturalismo crítico e suas características.

77
AUTOATIVIDADE

1 O multiculturalismo, além de ser denominado de diferentes formas em


distintos países, segundo Canen (2007), é assumido a partir de diferentes
perspectivas pelos estudiosos da área, as quais se diferenciam em três
aspectos: “a) à forma como a identidade e a diferença são concebidas; b)
à relação entre universalismo e relativismo na abordagem dada ao real; c)
à compreensão do multiculturalismo como campo de estudos de caráter
híbrido” (CANEN, 2007, p. 94).

Considerando esses três itens, e com base no conteúdo do Tópico 1, diferencie


o multiculturalismo crítico e o multiculturalismo folclórico.

2 Que pontos positivos e negativos você enxerga nas duas perspectivas,


multiculturalismo crítico e folclórico? Justifique.

3 Analise os enunciados, A, B e C, expostos a seguir. Considerando


a abordagem crítica do multiculturalismo, explique por
que esses enunciados parecem ser inadequados para essa
abordagem, e, em seguida, faça sugestões de adaptações.

a) Pesquise sobre a cultura da Espanha.


b) Qual das imagens representa a cultura da Argentina?

FIGURA 44 – ROCK

FONTE: Disponível em: <https://pxhere.com/pt/photo/1096281>.


Acesso em: 12 fev. 2018.

78
FIGURA 45 – TANGO

FONTE: Disponível em: <https://pxhere.com/es/photo/997840>.


Acesso em: 12 fev. 2018.

FIGURA 46 – SAMBA

FONTE: Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/


foradoeixo/7723102410>. Acesso em: 2 fev. 2018.

c) Faça uma lista das diferenças entre a cultura da Espanha e do Brasil.

4 O ensino da História da África e Cultura Afro-brasileira e Indígena passou


a ser obrigatório em disciplinas como História e Literatura, conforme a Lei
n. 10.639/03 e a Lei n. 11.645/08. Considerando essa obrigatoriedade, uma
maneira de trabalhar a temática dentro da abordagem do multiculturalismo
crítico é:

a) ( ) Produzindo apresentações de danças indígenas com os alunos para


comemoração do Dia do Índio, e promovendo um diálogo sobre suas
tradições.
b) ( ) Decorando as escolas em datas comemorativas, com desenhos e
ilustrações que ressaltem os traços mais marcantes dos afro-brasileiros,
e falando sobre sua importância na nossa história.
c) ( ) Promovendo ações de combate à exclusão na escola, e atividades que
estimulem a consciência sobre a igualdade étnico-racial.
d) ( ) Conversando sobre por que devemos respeitar os índios, e para que
essas leis servem.
e) ( ) Promovendo um duelo de apresentações entre grupos de capoeira.

79
80
UNIDADE 2 TÓPICO 2
O PROCESSO DE HIBRIDAÇÃO CULTURAL

1 INTRODUÇÃO
Olá, acadêmico! Chegamos ao Tópico 2 desta unidade. Neste tópico,
especificamente, vamos nos debruçar sobre o tema hibridação cultural, e
principalmente compreender o que há por trás do mercado cultural que impede
essa hibridação de ser reconhecida como a alma de nossa sociedade.

Como preparação para o que vem pela frente, solicito que você pense
um pouco sobre suas origens, seus ancestrais, bem como as origens de pessoas
próximas a você e comunidades de que participa. A ideia é que você foque nas
misturas que geraram o que você é hoje, e aquilo que determina a constituição
das suas identidades.

Este tópico está dividido em duas partes: a primeira parte trata do termo
hibridação e termos próximos (o que eles significam?); e a segunda e última parte
discute aspectos sociais relacionados à hibridação cultural.

2 O QUE É HIBRIDAÇÃO CULTURAL?


Pelo viés científico, a pergunta do título parece fácil de responder.
Canclini (2015), um dos nomes mais importantes relacionados ao tema, aponta a
hibridação como sendo aquele processo em que dois elementos se unem e geram
um terceiro. Em outras palavras, lembra da discussão que iniciei no Tópico 1
acerca dos termos sufixo e prefixo? A hibridação cultural funciona mais ou menos
como essas estruturas, que agregadas a diferentes radicais adquirem sentidos
diferentes e modificam o todo da palavra. Veja o exemplo:

ALCOOLISMO - relacionado a patologia.


ILUMINISMO - ideologia, movimento de ideias.

As construções linguísticas apresentadas anteriormente, formadas pelo


radical + sufixo ismo, possuem dois significados diferentes, uma vez que o sufixo
ismo mistura-se com dois radicais diferentes: junto ao radical álcool – conota
um desvio de comportamento; conectado ao ilumin diz respeito a um conjunto
de princípios filosóficos e políticos. Com isso, conclui-se que este sufixo possui
infinitas possibilidades de formar palavras, que não são ele próprio, e muito

81
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

menos os seus radicais. Assim funciona a lógica da hibridação. Quando uma raça,
religião, cultura, ou identidade, encontra-se com outra diferente dela, e interage,
conhecem-se mutuamente, inspiram-se, fazem trocas etc., aos poucos vão se
modificando e formando novas entidades.

Caro acadêmico, esse mesmo processo não pode ser chamado de


miscigenação, mestiçagem ou sincretismo? Canclini (2015) distingue essas três
denominações em relação à hibridação em apenas um aspecto, como veremos
adiante. Mas que tal entendermos o significado de cada um desses termos?
Para isso, vamos mais uma vez usar o dicionário. A seguir, o significado de
miscigenação, ressaltando que tanto este quanto o termo mestiçagem estão
relacionados à mistura de raças e etnias.

FIGURA 47 – SIGNIFICADO DE MISCIGENAÇÃO

FONTE: Disponível em: <http://www.priberam.pt/dlpo/chave>. Acesso em: 2 dez. 2017.

Agora é a sua vez, que tal procurar o significado de sincretismo no


dicionário?

FIGURA 48 – SIGNIFICADO DE SINCRETISMO

FONTE: Disponível em: <http://www.priberam.pt/dlpo/chave>. Acesso em: 2 dez. 2017.

82
TÓPICO 2 | O PROCESSO DE HIBRIDAÇÃO CULTURAL

Como você pode ver, tanto miscigenação, quanto sincretismo são termos
que se referem às combinações, misturas, diferenciando-se do termo hibridação
por serem mais específicos (mistura de quê?). Hibridação é aquele famoso termo
guarda-chuva, em que cabem todas as trocas culturais possíveis, por isso, o
favorito de pensadores como Canclini (2015).

Um lugar em que as hibridações acontecem a todo momento é nas


fronteiras, já que o trânsito entre sujeitos é mais facilitado. Um artigo, apresentado
por Agenot e Costa Lima (2014), traz como exemplo um contexto de hibridismo
entre nações. Tratam-se das cidades de Guajará-Mirim, no Estado de Rondônia,
e Guayaramerín, no Departamento do Beni, na Bolívia. Os autores destacam
que, apesar da divisão natural entre essas cidades propiciada pelo rio Madeira-
Mamoré, ocorre uma socialização natural entre elas, com trocas culturais diversas.
Dentre essas trocas, os autores destacam a linguagem como um dos fenômenos
mais evidentes, já que se tratam de línguas diferentes, português e espanhol,
cruzando-se o tempo todo, o que leva a um léxico dentro do “portunhol”, como
estratégia de comunicação.

FIGURA 49 – GUAJARÁ-MIRIM (RO), A MAIS ANTIGA CIDADE DO INTERIOR DE RO

FONTE: Disponível em: <http://www.achetudoeregiao.com.br/ro/guajara_


mirim.htm>. Acesso em: 18 fev. 2018.

NOTA

Leia mais sobre o tema. Disponível em: <http://africanidadesamazonicas.


webnode.com/news/o-cenario-linguistico-cultural-no-espa%C3%A7o-de-fronteira-de-
guajara-mirim-rondonia-brasil-e-guayaramerin-beni-bolivia/>.

83
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

Entendido o que é hibridação cultural? Agora atente-se ao esquema a


seguir:

AZUL + AMARELO = VERDE

Ao misturamos azul com amarelo, forma a cor verde, certo? Mas, espera
um pouco, azul e amarelo não são cores suficientes? Por que precisamos do verde?

Será abordada essa analogia às cores para fazer um adendo ao tema.


Recentemente, a hibridação cultural tem ganhado atenção na literatura como
forma de alertar para aqueles fatos que já conhecemos e estudamos em outra
ocasião: a homogeneização e as hegemonias culturais como produtos da
globalização e do conservadorismo que aumentam a cada dia. Estamos vivendo
um momento em que ser diferente é ruim, e misturar as diferenças mais ainda.

Destaco nesse sentido o nosso papel enquanto educadores, não só de


promover o respeito quanto de levar os nossos alunos a pensar. A mistura e
o trânsito entre culturas ocorrem desde que nos conhecemos por gente, não é
mesmo? E qual o problema disso? Qual o problema em ser diferente?

Na seção a seguir, discutiremos alguns outros aspectos sociais da cultura.

3 A INDÚSTRIA CULTURAL
Tendo em vista o processo de hibridação cultural, se originados a partir de
uma mistura de povos e realidades culturais, por que ainda hoje há quem afirme
uma identidade única? Qual o propósito de continuar a demarcar diferenças a
partir de identidades nacionais estáticas?

Se você respondeu que isso está ligado à constituição dessas identidades


e suas relações de poder, você entendeu muito bem a discussão da Unidade 1.
Parabéns! Porém, além desse fator identitário, existem efeitos da globalização que
têm potencializado essa resistência à multiplicidade cultural, e levado aqueles
que acreditam em um espírito nacional a defender seus princípios sobre os da
realidade híbrida. Estou falando da massificação cultural ocasionada por uma
indústria cultural que, acompanhando o fenômeno da industrialização e do
capitalismo, impulsionou a venda e o consumo (COELHO, 1993).

84
TÓPICO 2 | O PROCESSO DE HIBRIDAÇÃO CULTURAL

Nesse contexto capitalista, a cultura, “[...] feita em série, industrialmente,


para o grande número — passa a ser vista não como instrumento de livre
expressão, crítica e conhecimento, mas como produto trocável por dinheiro e que
deve ser consumido como se consome qualquer outra coisa” (COELHO, 1993,
s.p.).

E
IMPORTANT

Em outras palavras, toda e qualquer produção cultural, desde as artes mais


abstratas até o teatro ou cinema, passa então a ter um propósito financeiro que o desvia da
arte pela arte, ou da vida pela própria vida.

NOTA

Para o situar historicamente, vale dizer que a indústria cultural, embora


dependa da Revolução Industrial do século XVIII para existir, só nasce na segunda metade do
século XIX, quando é efetivamente verificada uma economia baseada no consumo de bens
(COELHO, 1993).

A cultura, enquanto produto, deixa de ter valor por si própria para ganhar
um preço no mercado que, como qualquer outra mercadoria ou prestação de
serviço, visa o maior alcance da mídia e da compra. Como você já deve ter lido
em Hall (2005, p. 75), esse fenômeno é chamado de homogeneização cultural, e
para o autor:

No interior do discurso do consumismo global, as diferenças e as


distinções culturais, que até então definiam a identidade, ficam
reduzidas a uma espécie de língua franca internacional ou de moeda
global, em termos das quais todas as tradições específicas e todas
as diferentes identidades podem ser traduzidas. Este fenômeno é
conhecido como "homogeneização cultural".

Isto é, nessa perspectiva, somos guiados pela lógica da troca de dinheiro


por mão de obra, e em meio a essa condição, há quem reclame a perda de tradições
e valores do passado que demarcavam as diferentes identidades.

De que modo essa homogeneização interfere em nossas aulas de Espanhol?


Qual o efeito dessa mercantilização da cultura sobre os conhecimentos de sala de
aula? Você já pensou sobre isso?

85
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

Na própria escolha de materiais didáticos ocorre essa interferência, pois


estes também têm um preço e são atravessados pela lógica capitalista. Picanço
(2012, p. 121) menciona, por exemplo, a força das políticas de expansão econômica
da Espanha em países emergentes como Brasil, que incidem nos materiais
didáticos aqui usados. Vistos como inadequados para a realidade brasileira pela
autora, normalmente estes deixam o espanhol na América Latina em segundo
plano, e seguem com a “orientação metodológica hegemônica no mundo
ocidental, fundamentada no Marco Comum Europeu criado na década de 1970 e
constantemente reelaborado por um grupo de especialistas” (ibid). Desse modo,
a cultura a que temos acesso nesses materiais nem sempre nos permite conhecer
a realidade múltipla da língua espanhola.

Outra maneira com que a realidade mercadológica emerge em nossas aulas


de Espanhol é por meio da exposição de culturas de senso comum, frequentes
na mídia. Nesse sentido, os países hispanofalantes são definidos e apresentados
aos estudantes conforme a imagem mercadológica que possuem. Um exemplo
atual é a massificação do reggaeton, que longe de ser algo negativo, vem abrindo
espaço mundialmente à música latina. No entanto, devemos nos perguntar como
professores: Até que ponto nos restringirmos a esses aspectos difundidos pelo
mercado e pela grande massa pode ajudar nossos alunos a emergir nas infinitas
realidades que há por trás dessa língua? Não deveríamos ir além e ampliar seus
horizontes?

Enquanto professores é importante que saibamos, então, que as percepções


que nossos alunos terão sobre a cultura dos sujeitos hispanofalantes interferem
diretamente no processo de aprendizagem dessa língua estrangeira, como explica
Santos (2002). Se levarmos a eles a realidade do espanhol a partir dos estereótipos,
é essa imagem congelada que eles construirão, e quando confrontados com uma
realidade múltipla, não se abrirão a ela. Assim, em sala de aula, importa sabermos
do nosso aluno “[...] o valor que se dá à cultura ou ao grupo a que se pertence e se
as características atribuídas ao outro grupo são valorizadas ou não, se é um grupo
ao qual se deseja pertencer”.

TURO S
ESTUDOS FU

Você verá na unidade seguinte os pontos negativos dessas percepções


imediatas que nos levam, muitas vezes, a criar sentimento de rejeição que nos impede de
interagir e descobrir o outro.

86
TÓPICO 2 | O PROCESSO DE HIBRIDAÇÃO CULTURAL

Então, sabe aquelas fotos de lugares históricos ou paradisíacos que você


vê em livros didáticos e morre de vontade de conhecer, mas não pode? Além delas
serem símbolos nacionais, esses lugares também estão ligados ao mercado desses
países. Quanto mais atrativas as capitais, mais turismo, quanto mais turismo,
melhor a economia e o status.

FIGURA 50 – ACAPULCO

FONTE: Disponível em: <https://pixabay.com/pt/acapulco-para%C3%ADso-


m%C3%A9xico-ensolarado-420189/>. Acesso em: 2 dez. 2017.

FIGURA 51 – CHILE

FONTE: Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/


patrickcoe/862384305>. Acesso em: 2 dez. 2017.

Já se imaginou futuramente em alguns desses lugares das imagens, só pela


beleza da foto ou pela sua história? Pois bem, é assim que funciona o mercado
cultural. Certos aspectos culturais são cristalizados com o objetivo de vender,
massificar e movimentar o mercado com o apoio da mídia. Como professores,
devemos ter o cuidado para não os levar como em uma vitrine para a sala de
aula, mesmo tratando-se de patrimônios culturais. Nosso objetivo não é somente
o de apresentar atrativos de países hispanofalantes, mas propiciar aos estudantes
possibilidades de conhecer novos mundos, que não se reduzem a um universo
perfeito imaginário.
87
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

DICAS

Caso você ainda não tenha entendido a lógica da indústria cultural, sugiro
que observe atentamente o esquema na Figura 19. Também sugiro que assista ao vídeo no
YouTube para que complemente seus estudos sobre o tema. Disponível em: <https://www.
youtube.com/watch?v=g8rjzDsnpqk>.

FIGURA 52 – ESQUEMA DE FUNCIONAMENTO DA INDÚSTRIA CULTURAL

FONTE: Disponível em: <http://cultura.culturamix.com/curiosidades/o-conceito-da-industria-


cultural>. Acesso em: 2 dez. 2017.

88
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• Que hibridação é um termo que descreve um processo de troca cultural que


resulta em novas culturas.

• A diferenciar hibridação com miscigenação, sincretismo e mestiçagem.

• A hibridação cultural, ocasionada pelas sociedades em movimento, é renegada


e escondida por aqueles que acreditam num certo e errado, no fixo.

• A relação da homogeneização cultural com o mercado e a indústria cultural.

89
AUTOATIVIDADE

1 Pesquise no caça-palavras termos que completam as afirmações a seguir:

• Palavras sinônimas para referir-se ao cruzamento de raças e etnias.


• Mistura entre culturas de modo a formar novas.
• Combinação de diferentes credos/doutrinas.
• Turismo e economia são impulsionados pelo.

S T W R H Y I U O O N M I S R V
N I M T O H I B R I D A Ç Ã O L
A U N U R I T E M O L S I E M C
D O K N V B S I B J N M H I S Y
U I Ã Ç E R T E Ç A B E Ó L I A
G F U Ç Ã O L U M I H N Z U T T
M A T T A D O L E T U R R A E Z
V M I O A N P N H I G J B T R M
X T N D F W E Q X R E T B N C L
M E S T I Ç A G E M A A U A N I
T R I O D A C S I A A T Y U I A
Ç Q W E S T A B E C A S N I S A
P I S S L H U D O I S R T N E K
W M E R C A D O R H S I Ç É R L
M C U L T U R A L T G K M E I U
R R Z U H I B R Ç T H N L L O I

2 Que tal pesquisar um pouco sobre suas origens? Quem foram seus ancestrais?
Quem foram seus avós/bisavós e tataravós? Que hibridação houve em sua
família?

90
UNIDADE 2 TÓPICO 3

A INTERCULTURALIDADE

1 INTRODUÇÃO
Chegamos ao último tópico desta unidade! Você será guiado neste
momento da disciplina pelas diferentes perspectivas da interculturalidade.

Para debatermos sobre o termo, o tópico está dividido em três partes: a


primeira parte apresenta as perspectivas da interculturalidade panoramicamente;
a segunda parte se debruça sobre a interculturalidade crítica; e a terceira e última
vai tratar do ensino de línguas numa perspectiva intercultural.


2 FACES SOCIAIS DA INTERCULTURALIDADE
Depois de nos debruçarmos sobre tantas terminologias relacionadas
à cultura, tais como culto, multiculturalismo, hibridação cultural etc., o termo
interculturalidade não deve parecer tão estranho, ou parece? Qual é a diferença
dele para o termo multiculturalismo? O que você acha que ele significa?

Se estiver mais uma vez considerando a etimologia da palavra, deduzirá


de imediato que o prefixo inter denota relação (OLIVEIRA, 2017), e chegará à
conclusão de que sua definição é relação entre culturas. Como aprendemos
sobre o multiculturalismo no primeiro tópico, nem sempre a interculturalidade é
assumida a partir de sua etimologia. Seu significado depende do contexto e dos
agentes envolvidos, como perspectiva, mais do que designar uma relação entre
culturas, ela pode ser assumida também como abordagem educativa, ideologia
social, e como princípios científicos ou políticos.

Assim, essas perspectivas da interculturalidade e algumas do


multiculturalismo apresentam ideais relacionados à superação da intolerância,
bem como ideais de decolonização, colocando fim aos sistemas de poder
resultantes de outras décadas.

NOTA

Decolonização está relacionado ao “denunciar a colonização”, ou seja, trazer à


tona processos relacionados a esse período de modo a repensá-los.

91
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

Podemos, desse modo, dividir as perspectivas da interculturalidade como


em uma balança, algumas com seus ideais mais leves, que não desconstroem os
valores existentes na sociedade, apenas agregam novas formas de vê-la; e outras
que são mais rígidas e objetivas, propondo mudanças que criem uma nova
estrutura social.

FIGURA 53 – PERSPECTIVAS INTERCULTURAIS COLOCADAS NA BALANÇA

Ideais mais comuns:

Incentivar o respeito e
combater a intolerância. Ideais mais radicais:

Decolonizar e pôr
fim aos privilégios e
desigualdades.

FONTE: Adaptada em: <http://globoesporte.globo.com/platb/files/162/2013/12/


balan%C3%A7a-e1386946728643.jpg>. Acesso em: 2 dez. 2017.

Dentro dessas perspectivas de diferentes pesos, encontramos, conforme


Walsh (2012, p. 3), três usos do termo interculturalidade, a saber:

• Relacional: neste a interculturalidade serve para designar o contato, a


convivência entre sujeitos e culturas, não importando o contexto em que
acontece. Tem proximidade com o sentido do termo hibridação, embora não
haja efetivamente a afirmação de um produto resultante dessa troca, apenas a
relação em si.

FIGURA 54 – INTERCULTURALIDADE RELACIONAL

FONTE: Disponível em: <https://br.freepik.com/fotos-gratis/tres-amigos-


conversando-e-bebendo-cerveja-no-pub_1148200.htm>. Acesso
em: 2 dez. 2017.
92
TÓPICO 3 | A INTERCULTURALIDADE

• Funcional: a interculturalidade, neste caso, está a favor de um sistema


dominante, ou seja, quem está no poder exala o discurso de respeito ao próximo,
às diferenças, mas sem propor efetivas mudanças na estrutura social em vigor,
apenas a inclusão das minorias. Tal discurso tem o propósito de colocar ordem e
diminuir conflitos étnicos. Para essa ideia de interculturalidade, frases prontas
como na figura que segue são simbólicas.

FIGURA 55 – ENUNCIADO ILUSTRATIVO - INTERCULTURALIDADE


FUNCIONAL

FONTE: Disponível em: <https://www.pinterest.es>. Acesso em: 2 de


dezembro de 2017.

• Crítica: enquanto os outros dois usos do termo interculturalidade são mais


motivacionais, este está relacionado a projetos maiores e mais radicais. Propõe-
se, sob essa perspectiva, a problematização do modelo colonial da sociedade
que sobrevive, já que este é o responsável pelas desigualdades e privilégios,
padrões e diferenças. Não defende tão somente o respeito à diversidade, mas
busca uma outra ordem social. Você pode ver na primeira imagem, na qual se
questiona o respeito por si mesmo.

93
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

FIGURA 56 – DESIGUALDADE RACIAL – INTERCULTURALIDADE CRÍTICA

FONTE: Disponível em: <https://www.pinterest.es/


pin/550846598155398219/>. Acesso em: 2 dez. 2017.

Concluindo, o termo interculturalidade possui diversas faces, mas esta


última é a mais radical delas, também a mais adequada em se tratando de América
Latina, conforme aponta a literatura na área. Isso porque o termo, aqui, surgiu
como alicerce de reivindicações de direitos e lutas pela igualdade, acompanhando,
como afirma Walsh (2012, p. 2), desenhos globais do poder, capital e mercado.

DICAS

Sugiro a leitura integral do artigo Interculturalidad crítica y educación


intercultural, de Catherine Walsh, disponível como audiolivro no Youtube: Disponível:
<https://www.youtube.com/watch?v=ykQTtz9i7wA>.

Ainda sobre a interculturalidade crítica, vamos mais a fundo na seção


seguinte, mas antes veremos o que você conseguiu entender dessas definições.
Responda as questões, assinalando um X, em seguida peça ao seu tutor o gabarito
e a pontuação para que possa ver o seu resultado.

94
TÓPICO 3 | A INTERCULTURALIDADE

PONTUAÇÃO
PARA O
ACERTO

1. Possui ideais mais radicais que acompanham movimentos


sociais de luta pela igualdade:
( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade
relacional funcional crítica
2. Uma conversa com um estrangeiro sobre um tema qualquer
pode ser considerada:
( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade
relacional funcional crítica
3. Ações, sem fins políticos, contra o preconceito racial, linguístico
e de gênero são parte de uma:
( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade
relacional funcional crítica
4. Viver em um ambiente multicultural te coloca dentro da
realidade da:
( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade
relacional funcional crítica
5. A tendência de quem detém o poder é defender uma:
( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade
relacional funcional crítica
6. Assemelha-se ao processo de hibridação cultural no quesito
interação:
( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade
relacional funcional crítica
7. A Figura 23 diz respeito à perspectiva da:
( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade
relacional funcional crítica
8. A Figura 21 diz respeito à perspectiva da:
( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade
relacional funcional crítica
9. A Figura 22 diz respeito à perspectiva da:
( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade
relacional funcional crítica
10. A perspectiva que apresenta ideais mais leves segundo a
balança:
( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade ( ) Interculturalidade
relacional funcional crítica

95
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

UNI

Se você fez acima de 80 pontos, “!eres todo un experto em interculturalidad!”.


Se sua pontuação foi de 50 pontos ou menos, sugiro que revise as partes da unidade que
trabalham os temas das questões em que apresentou maior dificuldade.

3 A INTERCULTURALIDADE CRÍTICA
Voltando aos nossos estudos, a interculturalidade crítica, da maneira
como é apresentada por Walsh (2012), ainda é um projeto em construção, que
possui três pontos a serem enfrentados: (I) a matriz colonial do poder; (II) as
classificações raciais; (III) e o desenvolvimento do capitalismo mundial (moderno,
colonial eurocêntrico) (WALSH, 2012, p. 8).

DICAS

Um trabalho que discute a interculturalidade crítica é o de Reinaldo Fleuri. Se


você ainda não o leu, está em tempo de conhecer um pouco mais sobre o que há por trás
dessa perspectiva teórica na América Latina. Disponível em: <http://www.serie-estudos.ucdb.
br/index.php/serie-estudos/article/view/771>. Acesso em: 30 jan. 2018.

Veremos agora uma questão muito polêmica e amplamente discutida


pelo viés da interculturalidade crítica. Essa questão é a do monolinguismo, que
acompanha a constituição das nações modernas e a matriz do poder. A seguir, o
exemplo das línguas indígenas no México:

96
TÓPICO 3 | A INTERCULTURALIDADE

FIGURA 57 – O DESAPARECIMENTO DE LÍNGUAS INDÍGENAS

FONTE: Disponível em: <http://aprendeespanol.net/diversidad-linguistica-riqueza-cultural-en-


peligro-actividad-de-comprension-de-lectura-b1b2/>. Acesso em: 2 dez. 2017.

Uma das causas, como podemos ver, é o número de falantes, que se reduz
a cada dia em virtude da discriminação linguística, proibição de falar em espaços
públicos, e da pouca acessibilidade. Situações essas que levam pais que falam
essas línguas a deixarem de ensiná-las aos seus filhos por proteção, adaptando-
os ao idioma hegemônico (nesse caso, o espanhol). Esse pode ser um sinal claro
do seu iminente desaparecimento, já que, independentemente da pluralidade
linguística, apenas uma língua é valorizada socialmente. Além disso, o fator da
migração – em adaptação forçada às grandes cidades, uma vez que os territórios
indígenas vão diminuindo aos poucos –, bem como a hibridação das línguas,
ajudam nesse desaparecimento.

97
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

DICAS

Quer saber um pouquinho mais sobre o assunto? Sugiro que veja o seguinte
vídeo sobre o desaparecimento de línguas na América Latina: Disponível em: <https://www.
youtube.com/watch?v=_Fz6Pd64fok>. Acesso em: 30 jan. 2018.

Você deve estar se perguntando, e a interculturalidade crítica? O papel


dessa abordagem é justamente problematizar a desigualdade no tratamento
dessa cultura, de forma que leve a ações nesse sentido. Você já se imaginou
incomunicável? Sem que ninguém o entenda? Uma língua é mais do que palavras,
é toda uma vida.

Caso você queira levar essa problematização aos seus futuros alunos de
Espanhol, sugiro o poema Cuando muere una lengua”, de Miguel León-Portilla,
que passa essa sensibilidade através das palavras.

Cuando muere una lengua


Miguel León-Portilla

En homenaje a Carlos Montemayor

Cuando muere una lengua Cuando muere una lengua,


las cosas divinas, sus palabras de amor,
estrellas, sol y luna; entonación de dolor y querencia,
las cosas humanas, tal vez viejos cantos,
pensar y sentir, relatos, discursos, plegarias,
no se reflejan ya nadie, cual fueron,
en ese espejo. alcanzará a repetir.

Cuando muere una lengua Cuando muere una lengua,


todo lo que hay en el mundo, ya muchas han muerto
mares y ríos, y muchas pueden morir.
animales y plantas, Espejos para siempre quebrados,
ni se piensan, ni pronuncian sombra de voces
con atisbos y sonidos para siempre acalladas:
que no existen ya. la humanidad se empobrece.

98
TÓPICO 3 | A INTERCULTURALIDADE

Cuando muere una lengua Ihcuac thalhtolli ye miqui


entonces se cierra
a todos los pueblos del mundo Ihcuac tlahtolli ye miqui
una ventana, una puerta, mochi in teoyotl,
un asomarse cicitlaltin, tonatiuh ihuan metztli;
de modo distinto mochi in tlacayotl,
a cuanto es ser y vida en la tierra. neyolnonotzaliztli ihuan huelicamatiliztli,
ayocmo neci
inon tezcapan.
Ihcuac tlahtolli ye miqui,
Ihcuac tlahtolli ye miqui, itlazohticatlahtol,
mochi tlamantli in cemanahuac, imehualizeltemiliztli ihuan tetlazotlaliztli,
teoatl, atoyatl, ahzo huehueh cuicatl,
yolcame, cuauhtin ihuan xihuitl ahnozo tlahtolli, tlatlauhtiliztli,
ayocmo nemililoh, ayocmo tenehualoh, amaca, in yuh ocatcah,
tlachializtica ihuan caquiliztica hueliz occepa quintenquixtiz.
ayocmo nemih.
Ihcuac tlahtolli ye miqui,
Inhuac tlahtolli ye miqui, occequintin ye omiqueh
cemihcac motzacuah ihuan miec huel miquizqueh.
nohuian altepepan Tezcatl maniz puztecqui,
in tlanexillotl, in quixohuayan. netzatzililiztli icehuallo
In ye tlamahuizolo cemihcac necahualoh:
occetica totlacayo motolinia.
in mochi mani ihuan yoli in tlalticpac.

FONTE: Disponível em: <http://servindi.org/actualidad/132261#more-132261>. Acesso em: 15


dez. 2017.

DICAS

Para ver este poema em forma de animação, produzido por Gabriela Badillo e
Cocolvú, acesse o site. Disponível em: <https://vimeo.com/80222661>. Acesso em: 30 dez.
2018.

Leia com atenção a reportagem do site ProgDoc. Disponível em: <http://progdoc.


museudoindio.gov.br/noticias/retorno-de-midia/114-projeto-faz-registro-de-linguas-
ameacadas-de-extincao-no-brasil>. Acesso em: 30 jan. 2018.

99
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

AUTOATIVIDADE

Considerando a reportagem lida, na sua opinião, que outras medidas


poderiam ser tomadas para que não houvesse o desaparecimento dessas
línguas? Justifique.

4 A INTERCULTURALIDADE NO ENSINO DE LÍNGUAS


Sin comprensión no existe expresión, sin expresión ni comprensión
no existe comunicación: la competencia linguística es el primer paso,
necesario para ir avanzando hacia una interculturalidad integral e
integradora” (DÍE et al., 2012, p. 149).

Na sala de aula, sob o viés da interculturalidade, o professor tem o


papel de oferecer oportunidades de imersão na língua e cultura em estudo aos
aprendizes, de maneira que estes possam enxergar realidades fora das suas, e ao
mesmo tempo reconhecer-se como sujeitos únicos e livres (OLIVEIRA, 2017).

Isso significa, em termos práticos, possibilitar acesso a aspectos como:

• a variação linguística: mostrar possiblidades de uso da língua ao aluno, não


apenas a variedade formal, já que a língua é viva e se modifica todo o tempo;

FIGURA 58 – EXEMPLOS DE VARIEDADE LINGUÍSTICA

FONTE: Disponível em: <https://br.pinterest.com/pin/510454938995843274/>.


Acesso em: 2 dez. 2017.

100
TÓPICO 3 | A INTERCULTURALIDADE

• a paralinguagem: mostrar aos alunos os contextos em que expressões são


usadas e sua relação com outros comportamentos, como o tom de voz, os
gestos com as mãos etc.;

FIGURA 59 – A LINGUAGEM DAS EXPRESSÕES FACIAIS

FONTE: Disponível em: <https://pxhere.com/pt/photo/572775>. Acesso em:


2 dez. 2017.

• discursos que circulam nas diferentes sociedades, sendo problematizados


e debatidos em sala de aula, com o objetivo de superar preconceitos e
discriminações presentes nos enunciados;

FIGURA 60 – DISCURSO COM TOM RACIAL

FONTE: Disponível em: <https://ahbrancodaumtempo.tumblr.com/>. Acesso


em: 2 de março de 2018.

Dentro dessas possibilidades, o professor não deve limitar-se a informações


presentes no senso comum, uma vez que nosso objetivo será sempre confrontá-
los com o diferente, com o novo, preparando-os para lidar, sem choques, com o

101
UNIDADE 2 | OS DIFERENTES ENFOQUES SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL

que lhes é desconhecido. Por esse motivo, é essencial prepararmos nossas aulas
interculturais, quando já tivermos consciência dos conhecimentos prévios dos
nossos alunos, daquilo que eles mais precisam aprender sobre esse outro.

DICAS

Você sabe o que é paralinguagem? Sabemos que a língua compreende o


universo das palavras, não é mesmo? A paralinguagem seria, então, tudo aquilo que vai além
do linguístico, como os gestos, comportamentos, reações etc.

Segundo Oliveira (2017), existem hoje barreiras sociais que perpassam o


uso da língua e que estão atreladas à cultura, como a intolerância e o preconceito
entre sujeitos singulares. Essas barreiras acabam sendo ignoradas por escolhas
pedagógicas tradicionalistas, que se limitam apenas à abordagem da língua
como conjunto de regras, e da cultura como representações estereotipadas dos
falantes nativos. Sem questionarmos essas barreiras, perdemos a oportunidade
de levar os alunos a refletirem sobre os aspectos históricos que envolvem culturas
pautadas na homogeneidade, e a beleza da diversidade linguística e cultural que
escondem.

E
IMPORTANT

Para a interculturalidade, o objetivo do ensino de línguas deixa de ser o alcance


de um falante nativo. O artigo de Kramsch (2009), por exemplo, traz exatamente essa
discussão, problematizando o conflito de identidades que leva alguém a querer ser o outro,
bem como quem é esse outro com língua pura e natural que queremos alcançar. Ótima
sugestão para leitura! Dados sobre o texto estão nas referências.

ATENCAO

A interculturalidade é tema recorrente em pesquisas sobre a formação em


Letras, principalmente em licenciatura em línguas estrangeiras, como o espanhol. Para
conhecer um pouco a discussão na área de LA, sugiro a leitura do texto de Picanço (2012),
que problematiza a formação intercultural dos professores de Espanhol. Disponível em:
<https://periodicos.ufpe.br/revistas/EUTOMIA/article/view/813/600>.

102
TÓPICO 3 | A INTERCULTURALIDADE

DICAS

O artigo de OLIVEIRA et al. (2014) traz um exemplo de atividade intercultural


numa aula de EaD, mas que pode ser adaptado ao contexto de sala de aula, quando o tema
for ritmos musicais de países hispanofalantes. Texto disponível nas referências.

103
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• A interculturalidade é como um projeto político, científico e social.

• As diferentes perspectivas da interculturalidade e em que diferem: relacional,


funcional e crítica.

• Os princípios gerais da interculturalidade crítica.

• As características pedagógicas de uma abordagem intercultural com um olhar


para o espanhol.

104
AUTOATIVIDADE

1 A letra da música do Maná problematiza a discriminação de latinos, comum


principalmente em países europeus e nos Estados Unidos. Identifique as
seguintes passagens da música, e comente-as:

a) O orgulho em ser latino.


b) Superação da submissão ao colonizador.
c) A união, independente das diferenças.
d) O respeito às tradições.

Se for de seu interesse, também pode ouvi-la no YouTube: Disponível em:


<https://www.youtube.com/watch?v=X7aQi5kXC5k>. Acesso em: 15 dez. 2017.
Latinoamérica
(Maná)

Alerta esto es un llamado Hay que luchar Latinoamérica


Es valiosa su atención
Estan discriminando latinos Y si nos quieren marginar
No me parece que tienen razón Nunca nos vamos a dejar
Sólo existe una América
Somos gente que nunca se raja

Hay que soñar, Latinoamérica

Ante cualquier situación Si no aprendemos de nuestra história


No habrá forma de progresar
Cometeremos los mismos errores
Vamos a mostrar quienes somos con Atrasados nos vamos a quedar
coraje y valor Ahora es nuestro momento
De brillar como el Sol
No vamos, no vamos Tenemos todo para hacerlo
A quejarnos jamás Con cojones, dignidad y valor

Latino tu, latino yo No vamos, no vamos


La misma sangre y corazón A quejarnos jamás
Esto es mi Latinoamérica
Hay que luchar Latinoamérica Latino tu, latino yo
La misma sangre y corazón
Y si nos quieren marginar Esto es mi Latinoamérica
Nunca nos vamos a dejar
Sólo existe una América Hay que luchar Latinoamérica
Hay que soñar, Latinoamérica

105
Jamás se te olviden tus raíces Y si nos quieren marginar
Jamás se te olviden tus raíces Nunca nos vamos a dejar
Jamás se te olviden tus raíces Sólo existe una América
Jamás se te olviden tus raíces Hay que soñar, Latinoamérica

Latino tu, latino yo Jamás se te olviden tus raíces


La misma sangre y corazón Jamás jamás nunca mas
Esto es mi Latinoamérica Jamás se te olviden tus raíces
Jamás se te olviden tus raíces
Jamás se te olviden tus raíces
Jamás se te olviden tus raíces

2 Observe os rostos a seguir, e escreva possibilidades de frases que melhor


se encaixem nas reações deles. Depois compare com os colegas para ver se
suas percepções sobre o paralinguístico diferem.

FIGURA 61 – REAÇÕES FACIAIS

FONTE: Disponível em: <https://k12.thoughtfullearning.com/sites/k12/files/


minilesson/images/ML_reading_faces2.jpg>. Acesso em: 2 dez. 2017.

3 Sabemos que a Interculturalidade tem sido uma abordagem


muito discutida nos últimos anos, inclusive para a formação
de professores, sendo mencionada como prioridade pelas
Diretrizes Curriculares dos Cursos de Letras. Considerando
uma prática intercultural no ensino de línguas, analise as assertivas:

106
I– A partir da variação linguística é possível trabalhar o léxico dos diferentes
dialetos e problematizar hegemonias linguísticas e culturais.
II– A partir da paralinguagem pode-se evidenciar ao aluno que a comunicação
vai além da fala e compreende diversos outros aspectos culturais como os
gestos, movimentos etc.
III– A partir da análise de textos podem ser discutidos discursos preconceituosos
e intolerantes que os permeiam, podendo desconstruí-los.

Assinale a alternativa correta:


( ) Todas as assertivas estão corretas.
( ) Apenas as assertivas I e II estão corretas.
( ) Apenas a assertiva III está correta.
( ) Apenas as assertivas II e III estão corretas.

4 Analise as imagens e indique a que concepções de interculturalidade se


referem:

FIGURA 62 – UMA CONVERSA EM UMA FEIRA

FONTE: Disponível em: <https://pixabay.com/photos/food-fair-sweets-


nuts-yummy-stall-1229846/>. Acesso em: 05 mai. 2020.

a) ( ) INTERCULTURALIDADE RELACIONAL.
b) ( ) INTERCULTURALIDADE CRÍTICA.
c) ( ) INTERCULTURALIDADE FUNCIONAL.

FIGURA 63 –PROTESTO CONTRA RACISMO

FONTE: Disponível em: <https://pixabay.com/photos/sign-society-racism-


patriotism-3422241/>. Acesso em: 05 mai. 2020.

107
a) ( ) INTERCULTURALIDADE RELACIONAL.
b) ( ) INTERCULTURALIDADE CRÍTICA.
c) ( ) INTERCULTURALIDADE FUNCIONAL.

FIGURA 64 – CARTAZ DO GOVERNO DO PARÁ SOBRE RESPEITO E


DIVERSIDADE

FONTE: Disponível em: <http://www.pa.gov.br/diversidade/arquivos/


Cartaz%20Final%20Diversidade.jpg>. Acesso em: 2 dez. 2017.

a) ( ) INTERCULTURALIDADE RELACIONAL.
b) ( ) INTERCULTURALIDADE CRÍTICA.
c) ( ) INTERCULTURALIDADE FUNCIONAL.

108
FIGURA 65 – CARTAZ DE UM FÓRUM

FONTE: Disponível em: <https://www.animar-dl.pt/images/com_


droppics/331/Cartaz-final.jpg?1505628366>. Acesso em: 2 dez. 2017.

a) ( ) INTERCULTURALIDADE RELACIONAL.
b) ( ) INTERCULTURALIDADE CRÍTICA.
c) ( ) INTERCULTURALIDADE FUNCIONAL.

FIGURA 66 – ESTRANGEIROS PEDINDO INFORMAÇÃO

FONTE: Disponível em: <https://pixabay.com/photos/friends-lost-people-


talking-1255442/>. Acesso em: 05 mai. 2020.

109
a) ( ) INTERCULTURALIDADE RELACIONAL.
b) ( ) INTERCULTURALIDADE CRÍTICA.
c) ( ) INTERCULTURALIDADE FUNCIONAL.

5 A Interculturalidade Crítica problematiza situações de poder


e subalternização que ocorrem, principalmente, em virtude
de fatores históricos, políticos e sociais. A respeito de sua
relevância no tema ensino de línguas estrangeiras, assinale a
alternativa correta.

a) ( ) Demonstra a importância de uma língua padrão em sala de aula, já que


está elimina hierarquias e iguala a todos.
b) ( ) Ajuda a problematizar o monolinguismo e o apagamento cultural, pois
ocorre que muitos dialetos da língua estrangeira são esquecidos nesse
contexto.
c) ( ) Destaca a importância do monolinguismo diante do contexto de
homogeneização cultural, como forma de comunicação global.
d) ( ) Valoriza o falante nativo, principalmente o que vem de um país
colonizador.

110
UNIDADE 3

ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA


LÍNGUA ESPANHOLA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir desta unidade, você será capaz de:

• relacionar os conceitos de língua e cultura;

• identificar como a linguagem e a cultura se constroem mutuamente;

• discutir aspectos histórico-culturais da língua espanhola;

• definir os conceitos de estereótipo e estigma;

• entender a importância de aulas de língua espanhola que não se limitem


ao senso comum, no que se refere às culturas hispanofalantes.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você en-
contrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – A RELAÇÃO ENTRE LÍNGUA E CULTURA

TÓPICO 2 – DA DIVERSIDADE À INTOLERÂNCIA

TÓPICO 3 – A PRÁTICA INTERCULTURAL DE ENSINO DE LE

111
112
UNIDADE 3
TÓPICO 1

A RELAÇÃO ENTRE LÍNGUA E CULTURA

1 INTRODUÇÃO
Bem-vindo à última unidade do nosso livro de estudos! Você lembra
quando discutimos na unidade anterior que a interação depende não só da língua
como dos aspectos paralinguísticos? Pois este processo conjunto tem tudo a ver
com a relação entre língua e cultura que estudaremos neste tópico. Você sabe por
quê? A língua, em conjunto com a cultura, cria modos de viver e interpretar a
vida, e essa interação com o mundo acontece tanto por meio da fala e da escrita,
quanto através de expressões, como os gestos, os movimentos faciais etc.

O processo de comunicação, interligado pelo linguístico e o paralinguístico


(GRIMSON, 2000), concretiza-se aliado a sentidos culturais construídos
socialmente (MENDES, 2015). Esta será a premissa que trabalharemos ao longo
deste tópico. Nele também recuperaremos alguns conceitos trabalhados em
outras unidades, como os de cultura e interculturalidade, porém, agora voltados
ao ensino de espanhol como língua estrangeira. Será de interesse também a
discussão sobre hegemonias culturais, que será útil para a contextualização em
relação à prática docente em língua espanhola.

O tópico está dividido em quatro partes: na primeira tratamos de esclarecer


a relação entre língua e cultura; na segunda, apresentamos alguns exemplos de
como a língua e a cultura se relacionam; na terceira, entenderemos o relativismo
cultural; e por último, na quarta parte, visualizamos a prática em sala de aula com
base em exemplos e referenciais teóricos.

2 A LÍNGUA COMO PRÁTICA SOCIAL E CULTURAL


Como adiantei a você na introdução, estudaremos neste tópico a interação
entre língua e cultura, e uma boa maneira de exemplificar esta relação é usando
o léxico em língua espanhola. Que tal começarmos com mais um desafio? Você
conhece a palavra em destaque a seguir?

• Charro

Se você nunca leu ou ouviu a palavra charro, sugiro que faça uma
rápida busca na internet para descobrir a tradução dela para o português.
Entre os resultados de sua busca, com certeza você se deparará com um ou

113
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

mais significados possíveis. Veja na Figura 67, por exemplo, algumas definições
presentes no Dicionário on-line de língua espanhola da RAE – Real Academia
Espanhola.

FIGURA 67– DEFINIÇÕES DE CHARRO PELA RAE

FONTE: Disponível em: <http://dle.rae.es/?id=8dufCkw>. Acesso em: 2 jan. 2018.

Observe que a RAE nos oferece pelo menos sete opções de definições.
Quanto às traduções, alguma delas já era conhecida por você? As definições de
charro pela RAE coincidem com as traduções para o português que você encontrou
na internet? Lanço essas questões visando a sua reflexão, pois o significado
encontrado por você pode ser apenas um, dentre tantos outros existentes. Afinal,
sempre que você for traduzir uma palavra do português para o espanhol, terá
de escolher entre possibilidades de tradução, e adaptar a palavra a um outro
contexto: o de texto traduzido. Não fui claro? Então vou usar as palavras de
Karnal (2017, s. p.), a tradução é sempre uma adaptação, afinal toda língua é viva
e inalcançável como um todo, desse modo, a tradução sempre será condicionada
às escolhas lexicais do tradutor.

NOTA

Leandro Karnal é professor da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP),


desde 1996. Seus estudos, assim como sua formação, são voltados à História Cultural,
Antropologia e Filosofia.

114
TÓPICO 1 | A RELAÇÃO ENTRE LÍNGUA E CULTURA

Na Figura 67, podemos observar que a RAE nos oferece uma variedade
de significados, inclusive saindo do universo dos significados peninsulares que
a caracterizam. Dentre os sete usos da palavra apresentados, o México aparece
em dois deles, ambos relacionados a uma figura tradicional mexicana, que se
denomina charro, com indumentária típica, ilustrada na Figura 68.

FIGURA 68 – VESTIMENTA DE UM CHARRO NO MÉXICO

FONTE: Disponível em: <https://i.pinimg.com/736x/69/41/0d/69410d9868173c76877935


5cf15e7b27--charro-mexicano-infographic.jpg>. Acesso em: 2 jan. 2018.

Você já conhecia esta figura típica mexicana? Como você pode ver na
imagem, o traje tem origem no campo e está relacionado historicamente ao
trabalho ali realizado. Culturalmente, representa a nação mexicana ao lado dos

115
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

mariachis, mas não são a mesma coisa. Como vimos em unidades anteriores, os
mariachis, diferentemente dos charros que têm relação com o trabalho no campo,
são caracterizados pela sua música.

NOTA

A diferença entre um e outro é historicamente demarcada. Entendidos como


a mesma coisa, principalmente por estrangeiros, este blog explica a diferença entre eles.
Disponível em: <https://charrosmx.wordpress.com/2017/01/30/charros-vs-mariachi/>.
Apesar da semelhança da vestimenta, este vídeo do YouTube mostra os detalhes que os
peculiarizam. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=LSGvaBIcYuI>.

Voltando ao significado de charro. Esses são os únicos possíveis


significados para essa palavra? Será que em outros países da América Latina
charro significa a mesma coisa que no México? Se seguirmos a lógica da variação
linguística, a resposta para essa pergunta é negativa. Embora a RAE tenha feito
um esforço positivo em se aproximar das demais variantes do espanhol, a todo
momento a linguagem é moldada pelos sujeitos com base em seu contexto de
vivências, interações etc., (SOUZA, 2010), e essas constantes renovações e as
múltiplas variações ainda não são contempladas por dicionários.

Dentro de uma mesma língua há diferentes maneiras de dizer coisas


similares, bem como uma mesma maneira de dizer diferentes coisas, e charro é
um exemplo disso. Ilustrando essa afirmação, veremos alguns significados que
a RAE não apresentou em sua definição de charro, mas antes você deve tentar
descobri-los.

AUTOATIVIDADE

Analise as expressões faciais dos sujeitos nas imagens a seguir, e, a


partir delas, faça deduções de possíveis significados para charro nos países
elencados.

116
TÓPICO 1 | A RELAÇÃO ENTRE LÍNGUA E CULTURA

FIGURA 69 – REAÇÃO A UM CHARRO EM PORTO RICO E


GUATEMALA – CHARRO EM PORTO RICO E
GUATEMALA

FONTE: Disponível em: <https://pxhere.com/pt/


photo/621450>. Acesso em: 2 mar. 2018.

a) Charro na Colômbia

FIGURA 70 – REAÇÃO A UM CHARRO NA COLÔMBIA

FONTE: Disponível em: <https://pixabay.com/pt/risadinha-


meninas-escola-rir-608824/>. Acesso em: 2 mar. 2018.

b) Charro na Argentina

FIGURA 71– CHARRO NA ARGENTINA

FONTE: Disponível em: <https://upload.wikimedia.org/


wikipedia/commons/8/84/Cigarrillo_de_mariguana.
jpg>. Acesso em: 2 jan. 2018.

117
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

Toda essa contextualização usando a palavra charro nos mostra que


uma mesma palavra em diferentes culturas e diferentes contextos pode adquirir
sentidos diferentes e até mesmo opostos, ou seja, uma língua sempre estará
interligada a uma ou mais culturas, e uma cultura sempre estará interligada a uma
ou mais línguas. Nesse sentido, Karnal (2017, s. p.) afirma que “a língua pertence
ao universo da cultura, e a cultura é, por natureza, mutante [...], se transforma
permanentemente”. Desse modo, seja na interação ou durante a aprendizagem,
ao colocar em contato duas línguas, a materna e a estrangeira, por exemplo,
automaticamente colocamos em contato duas culturas (ibid).

Como já estudamos aqui, com base em Oliveira (2017), o conceito de


cultura inclui tudo aquilo que necessitamos para dar sentido ao mundo e fazer
parte dele, desde a língua até os gestos e movimentos corporais. Mas, e o conceito
de língua? É importante que você saiba que este conceito pode ser assumido
de várias perspectivas, seja como sistema, estrutura, prática social ou discurso.
Dentro dos estudos em Linguística aplicada, os quais, como você sabe, voltam-
se em grande parte ao ensino de língua materna e estrangeira, prepondera uma
concepção pós-moderna de língua. Numa visão pós-moderna, os discursos que
formam a língua, além de meras representações, constituem e modificam a nossa
realidade (CANEN, 2007, p. 92). Desse modo, a língua não é assumida a partir
de normas, mas sim conforme o seu contexto de uso social: os sujeitos, sócio-
historicamente situados, determinam os discursos e seus sentidos. Uma maneira
de definir língua, nessa perspectiva, é como “prática social, um meio pelo qual
representamos e damos sentido ao mundo, e, portanto, atua em conjunto com a
cultura, modificando e sendo modificada por ela” (OLIVEIRA C. R., 2017, p. 45).

E
IMPORTANT

Sendo a língua uma prática social, a exemplo da palavra charro, o vocabulário


representa uma das formas de ver e representar o mundo que se conecta à cultura.
Então, vale a pergunta: por que a palavra charro é usada de maneira diferente em países
hispanofalantes? Porque cada grupo cultural adéqua a língua à sua realidade em comunidade,
e também a modifica conforme suas experiências e interações com outros grupos. Assim,
manifestando-se na língua e em outras práticas, “a mudança cultural é algo que faz parte da
própria constituição essencial da cultura” (PINEZI, 2010, s. p.).

118
TÓPICO 1 | A RELAÇÃO ENTRE LÍNGUA E CULTURA

NOTA

Além da expressão charro, existem muitas outras que diferem de acordo com
o país hispanofalante. Sugiro que você acesse o site a seguir, para conhecer algumas delas.
Disponível em: <https://culturacolectiva.com/letras/de-norte-a-sur-palabras-latinas-con-
distintos-significados/>.

Em síntese, a discussão sobre a relação entre língua e cultura coloca em


xeque, além de nossas concepções reducionistas, as hegemonias linguísticas
presentes em dicionários e manuais gramaticais que não acompanham as
mudanças significativas de ambas. Um congelamento que posiciona os sujeitos
como simples reprodutores de normas e códigos.

3 LÍNGUAS EM CONTATO E CHOQUES CULTURAIS


Você já viajou a algum lugar em que o modo de falar era diferente do
que você imaginava? Desse lugar, alguma expressão em especial chamou sua
atenção? Alguma palavra com sentido diferente do que você conhecia?

Como você já deve saber, esses fenômenos linguísticos são normais e


ocorrem porque a língua é um organismo vivo. No entanto, a compreensão entre
os sujeitos depende do grau de conhecimento dos interlocutores sobre a língua
e a cultura do outro (KARNAL, 2017). Por esse motivo, como afirma Karnal, a
cultura sempre será uma barreira para alcançarmos a língua-alvo. Claro que o
termo barreira nesse caso não é pejorativo, mas sim faz referência a um grau
de conhecimento inalcançável, já que como o próprio autor afirma, a cultura é
mutável, e sempre teremos um acesso limitado a essa realidade.

Nas palavras de Karnal (2017), quando dois sistemas distintos de


significados culturais entram em conflito, resultando em um choque cultural,
chamamos este fenômeno de entropia. Isso acontece entre línguas diferentes,
porque, segundo o autor, nunca haverá na outra língua um referente com
significado idêntico e que diga exatamente o que você quer dizer. A transposição
de uma língua a outra não existe. Por essa razão, quanto melhor eu souber sobre
outras línguas e culturas, menos entropia acontece.

Karnal (2017) conta uma história muito interessante que exemplifica


muito bem esses choques culturais advindos da incompreensão linguística.
Trata-se da história dos primeiros náufragos espanhóis a conhecerem a costa da
península mexicana de Yucatán, mais precisamente a ilha de Cozumel. Quando
chegaram nessa ilha, a primeira coisa que procuraram saber era o nome do lugar,
e dirigiram esta pergunta, em espanhol, aos maias que ali habitavam. Como os

119
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

maias pouco entendiam dessa língua, responderam à pergunta dos espanhóis com
um Ma’anaatik ka t’ann, que significa na língua maia algo como “eu não entendi”.
Os espanhóis, ao ouvirem essa resposta, entenderam, na pronúncia maia, Yucatán,
e deduziram que este era o nome do lugar, batizando-o dessa maneira.

Obviamente, os espanhóis também não dominavam a língua maia, então


a comunicação aconteceu cada um na sua língua. Nesse caso, o conhecimento
limitado impossibilitou uma comunicação efetiva entre ambos, ocorrendo uma
entropia.

FIGURA 72 – POSSIBILIDADES DE ORIGEM DO NOME YUCATÁN

FONTE: Disponível em: <https://www.pinterest.cl/


pin/314477986463064163/>. Acesso em: 2 jan. 2018.

Assim como ilustra a história dos náufragos espanhóis, “a comunicação


humana é falha e limitada [...]”. Nem sempre o que queremos dizer é entendido
da mesma maneira pelo outro (KARNAL, 2017, s. p.).

120
TÓPICO 1 | A RELAÇÃO ENTRE LÍNGUA E CULTURA

FIGURA 73 – CHOQUE CULTURAL E INCOMPREENSÃO

FONTE: Disponível em: <https://pixabay.com/pt/mal-


entendido-black-homens-2421389/>. Acesso em: 2
mar. 2018.

Você lembra quando na Alemanha, em setembro de 2015, a chanceler


federal alemã abriu as fronteiras do país, acolhendo centenas de milhares de
refugiados que vinham da Síria e do Afeganistão, os quais fugiam de conflitos
civis e da extrema pobreza? Uma maneira encontrada de recebê-los e de ampliar
os seus conhecimentos sobre a cultura alemã foi a divulgação de folhetos e
cartilhas distribuídas aos refugiados no país no ano de 2015. Materiais polêmicos
que traziam exemplos de comportamentos comuns entre os alemães, de modo a
evitar choques culturais e entropia.

DICAS

A reportagem completa pode ser vista no link disponível em: <http://www.


larepublica.ec/blog/internacional/2016/01/30/temiendo-choque-cultural-alemanes-
ensenan-costumbres-refugiados/#prettyPhoto>.

A Figura 74 é um exemplo das dicas disponibilizadas on-line pela televisão


alemã, e mostra como cumprimentar as pessoas desse país usando as mãos. Parece
algo básico para nós, não é mesmo? Mas, para os refugiados muçulmanos, dentro
de sua cultura, isso era algo novo, uma vez que para eles essa corporalidade não
é comum entre pessoas desconhecidas.

121
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

FIGURA 74 – COMO SAUDAR NA ALEMANHA

FONTE: Disponível em: <https://www.larepublica.ec/blog/internacional/2016/


01/30/temiendo-choque-cultural-alemanes-ensenan-costumbres-
refugiados/#prettyPhoto>. Acesso em: 2 jan. 2018.

Vale lembrar que esta ação gerou controvérsias, pois as pessoas se


perguntavam se o reverso também aconteceria, ou seja, alemães conhecendo
a cultura desses refugiados. Conhecer a cultura do outro de forma mútua é
importante, sempre que não haja imposição de uma sobre a outra. Encarar a
possibilidade de uma hibridação cultural que os leve a uma interculturalidade,
em que os encontros e diálogos entre os sujeitos deixem de ser segmentados.

4 O RELATIVISMO CULTURAL
Sob o viés do relativismo cultural, é importante salientar que o diálogo
entre culturas diferentes é válido quando não há a sobreposição de uma cultura a
outra. Você sabe o que é relativismo cultural? O que significa exatamente?

Essa tem sido uma expressão bastante usada nos últimos anos,
principalmente associada a situações de intolerância e apropriação cultural.
Segundo Pinezi (2010, s. p.), “o relativismo cultural é uma teoria que implica a ideia
de que é preciso compreender a diversidade cultural e respeitá-la, reconhecendo
que todo sistema cultural tem uma coerência interna própria”. Isto é, trata-se de
um olhar para as culturas na sua singularidade, sem comparações e hierarquias,
tratando cada cultura como única e insubstituível. Enquanto concepção
metodológica de pesquisa, esse relativismo implica que um pesquisador, tanto na
Antropologia quanto em outras ciências que dialogam com esta prática, emerjam
em uma cultura sempre com o pé no chão, e cientes de que todas as práticas ali
têm um significado e fazem parte de um sistema cultural (ibid).

122
TÓPICO 1 | A RELAÇÃO ENTRE LÍNGUA E CULTURA

Dentro dessa concepção de relativismo cultural, posicionamentos mais


radicais também existem, como é caso daqueles que não aceitam a hibridação
resultante do contato entre culturas. Ilustrando esse posicionamento, apresento a
tirinha de Mafalda, logo a seguir:

FIGURA 75 –TIRINHA DE MAFALDA

FONTE: Disponível em: <https://facebook.com/TiriinhasDaMafalda>. Acesso em: 2 jan. 2018.

Como podemos ver, existe uma diferença entre a visão de mundo de


Mafalda e Manelinho, que diz respeito ao entorno cultural de cada um. No
entanto, não há entre eles um diálogo que os permita chegar a um consenso, ou,
no mínimo, ao respeito. Nesse sentido, o relativismo radical atuou de maneira
que o valor cultural posto sobre uma pedra fosse mais forte que a vontade de
conhecer o que há por trás da visão do outro, e interagir sobre ela. Pinezi afirma
sobre essa questão que:

O diálogo entre culturas distintas sobre um determinado valor ou


prática pressupõe o contato entre elas e não que fiquem e permaneçam
estanques como postula o relativismo cultural radical. Por isso, é
preciso relativizar o relativismo cultural, no sentido de vê-lo não como
um princípio absoluto, mas como um instrumento que possibilite o
encontro de forma respeitável (2010, s. p.).

Com posturas radicais, e com o desconhecimento sobre o outro, nascem os


choques culturais. Como é de senso comum, o conhecimento cultural e o contexto
nos farão interpretar objetos de várias maneiras, como agir sobre eles. O poema
“Pedra”, de Antonio Pereira, publicado no livro Essência em 1999, caracteriza
bem esta afirmação.

123
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

A PEDRA
Autor: Antonio Pereira (Apon)

O distraído, nela tropeçou,


o bruto a usou como projétil,
o empreendedor, usando-a construiu,
o campônio, cansado da lida,
dela fez assento.
Para os meninos foi brinquedo,
Drummond a poetizou,
Davi matou Golias...
Por fim;
o artista concebeu a mais bela escultura.
Em todos os casos,
a diferença não era a pedra.

FONTE: Disponível em: <https://www.aponarte.com.br/2007/08/


pedra.html>. Acesso em: 4 mar. 2018.

Finalizando essa discussão, como afirma Pinezi (2010, s. p.), uma maneira
de resolver essa polarização é “por meio da ideia de que é importante valorizar
uma relação dialógica entre diferentes culturas, que possibilite a superação de
conflitos e o estabelecimento de um acordo entre elas”.

124
TÓPICO 1 | A RELAÇÃO ENTRE LÍNGUA E CULTURA

5 COMO ENSINAR A LÍNGUA NA RELAÇÃO COM A


CULTURA?
Já vimos na prática como a língua e a cultura se relacionam. Agora chegou
o momento de reunirmos os conhecimentos adquiridos desde a primeira unidade
do livro e contextualizarmos aspectos relacionados ao ensino e aprendizagem de
espanhol como língua estrangeira. Preparado?

Sobre esta discussão é essencial que você saiba que nossas escolhas
metodológicas em sala de aula sempre estarão ligadas a uma determinada
abordagem ou princípio teórico. De acordo com Almeida Filho (2011, p. 159), mais
do que a escolha metodológica, a abordagem é que faz a diferença na didática de
uma língua-cultura, pois é a concepção que o profissional tem sobre esses termos
que vai guiar o seu planejamento e objetivos de ensino.

No quesito abordagem, podemos distinguir pelo menos dois entendimentos


de língua e cultura, conforme apresenta Gil (2014), a visão estruturalista e a pós-
estruturalista.

Como você já deve ter estudado, uma visão estruturalista de língua nasce
em meados do século XX, marcada pelas ideias de Ferdinand de Saussure –
linguista que levou a Linguística a legitimar-se enquanto ciência. Jordão (2006,
p. 2) explica que dentro do estruturalismo, priorizava-se a ideia de língua como
sistema (langue, como diria Saussure), deixando de lado o seu uso social (parole).
Estudada como um sistema abstrato, a língua é analisada como independente
do sujeito e este não atua sobre ela, apenas a usa para ter acesso ao mundo e à
verdade.

FIGURA 76 – VISÃO ESTRUTURALISTA DE LÍNGUA E CULTURA

• Visão Estruturalista tanto da língua quanto da


cultura e das relações entre as duas.

LINGUA = sistema SEPARADAS CULTURA = sistema

PRODUTO
CÓDIGO
CULTURA ALTA

CULTURA BAIXA

FONTE: Disponível em: <https://pt.slideshare.net/gloriagil1/a-relao-entre-lngua-


e-cultura-no-ensino-e-aprendizagem-de-lnguas-adicionais>. Acesso
em: 2 jan. 2018.

125
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

Nessa perspectiva estruturalista, como podemos ver no esquema de Gil


(2014), tanto a língua quanto a cultura são assumidas como sistemas fechados e
separados. Enquanto a língua é tratada como um código, a cultura é materializada
como produto e aspecto diferenciador da elite. Na realidade de sala de aula, seria
então aquela perspectiva guiada pela gramática, com jeito certo (de acordo com a
norma) e o errado (fora da norma) de falar e escrever.

A autora vai além e problematiza que esta perspectiva ainda está muito
presente nas salas de aula:
Quando olhamos para o que acontece na sala de aula de uma língua
adicional no Brasil, por exemplo, de língua inglesa ou espanhola, a
relação entre língua e cultura aparece fragmentada e as duas separadas:
a língua é entendida como código e a cultura como produtos culturais
associados a algumas nações onde essas línguas são usadas (GIL,
2014).

FIGURA 77 – VISÃO PÓS-ESTRUTURALISTA DE LÍNGUA E CULTURA

• Visão pós-estruturalista: a relação dialética


entre as duas: a língua determina e é
determinada pela cultura

LÍNGUA

CULTURA

FONTE: Disponível em: <https://pt.slideshare.net/gloriagil1/a-relao-entre-


lngua-e-cultura-no-ensino-e-aprendizagem-de-lnguas-adicionais>.
Acesso em: 2 jan. 2018.

Por sua vez, segundo Jordão, “as principais preocupações do pós-


estruturalismo envolvem questões fundamentais sobre quem somos, de onde
viemos e para onde vamos. A relação entre sujeito e realidade, construção e
distribuição de conhecimento está no âmago das conjecturas pós-estruturalistas”
(JORDÃO, 2006, p. 4). Assim, o pós-estruturalismo é guiado por uma visão de
mundo reflexiva, em que as interpretações não são neutras, e a realidade não
pode ser separada de quem a observa, já que, ao mesmo tempo que se constrói
socialmente, é subjetiva. “Nossos entendimentos desta dita realidade se fazem
na linguagem, que é sempre ideológica, ou seja, localizada (isto é, determinada
pela perspectiva de quem a constrói e a utiliza) e com sua existência baseada em
relações estabelecidas culturalmente” (ibid).

No pós-estruturalismo, como mostra a Figura 78, a língua e a cultura se


constroem mutuamente. A língua em uso nasce a partir da interação, seja como
discurso e/ou prática social, e é carregada de ideologias (GIL, 2014).

126
TÓPICO 1 | A RELAÇÃO ENTRE LÍNGUA E CULTURA

Entendeu a diferença entre essas duas perspectivas? Não? A figura a


seguir sintetiza as duas perspectivas.

FIGURA 78 – SÍNTESE – ESTRUTURALISMO E PÓS-ESTRUTURALISMO

FONTE: Disponível em: <https://pt.slideshare.net/aparecidamallagoli/estruturalismo-xps-


estruturalismo>. Acesso em: 2 jan. 2018.

NOTA

Um aprofundamento sobre a diferença entre o estruturalismo e o pós-


estruturalismo pode ser consultado em Jordão (2006). Disponível em: <https://docs.ufpr.
br/~marizalmeida/interculturalidade/o_ensino_de_lem.pdf>.

A pergunta do título? Considerando essas duas perspectivas, qual devo


usar em sala de aula?

Dados os avanços na Linguística Aplicada, em direção a uma concepção


de língua que considere os interlocutores e o processo de interlocução, hoje são
muitos os autores que entendem que a língua deva ser abordada em seu contexto
de uso social (MENDES, 2004, 2015; OLIVEIRA L. C.; OLIVEIRA C. R., 2017;

127
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

PARAQUETT, 2010, 2011; ALMEIDA FILHO, 2010 etc.), perspectiva não muito
distante da dos Parâmetros Curriculares Nacionais. Defende-se, nesse sentido,
que memorizar regras e normas não ajuda o aprendiz a explorar novas realidades
e visões de mundo a partir da língua.

O ensino de línguas deve ser um meio de o aluno transitar pela língua/


cultura do outro, e dialogar a partir de sua própria língua/cultura (OLIVEIRA C.
R., 2017). Para que isso aconteça, a cultura do estudante deve ser sempre o passo
inicial, já que o objetivo não é que ele deixe de ser quem é, mas que pluralize
suas vivências e experiências (PARAQUETT, 2010, p. 143). Então, ao trazer
textos diversos de língua espanhola, o professor pode incluir na metodologia
questionamentos que levem o aluno a refletir sobre sua realidade e a da língua-
cultura-alvo.

FIGURA 79 – CONHECER O OUTRO PARA ME CONHECER

Descubrimiento del otro

permite genera

diversidad toma de
humana conciencia

para

conocimiento
de uno
mismo

FONTE: Disponível em: <http://cmapspublic2.ihmc.us/


rid=1KK7NQZR2-8LMBCF-1826/comprensi%C3%B3n%20
del%20otro.cmap>. Acesso em: 2 jan. 2018.

Além disso, mais do que analisar a língua como um sistema de regras


prontas e soltas, como ilustra a Figura 79, o aluno deve reconhecer-se como
produtor e usuário dessa língua. Que ele enxergue que cada enunciado emitido
o constrói e singulariza como ser social, uma vez que seus discursos estão
carregados de subjetividades e entrelaçamentos. Isso é possível a partir da
análise de discursos sociais carregados de ideologias (como textos jornalísticos,
de opinião, etc.), que levem a uma reflexão metalinguística.

Além disso, espera-se que o aluno compreenda que a língua não é estática,
ela é dinâmica; e que promova a diversidade linguística e cultural, reconhecendo
que somos todos diferentes e únicos.

128
TÓPICO 1 | A RELAÇÃO ENTRE LÍNGUA E CULTURA

FIGURA 80 – VALORIZAÇÃO DA DIVERSIDADE

FONTE: Disponível em: <http://tuvoz.com.ar/dia-del-respeto-por-la-diversidad-


cultural-por-ivana-comparin/>. Acesso em: 2 jan. 2018.

Nessa perspectiva, ensinar uma língua-cultura ultrapassa a simples ideia


do ensinar conhecimentos linguísticos e culturais preexistentes. Para Mendes
(2004, p. 13), vai mais além, no sentido de criar um diálogo entre as línguas-
culturas envolvidas no contexto de sala de aula.

O nosso objetivo fundamental, portanto, é fazer da sala de aula de


LE/L2 um ambiente no qual professores e alunos possam ensinar e
aprender a partir das suas experiências na/com a língua-cultura-
alvo, lugar no qual eles possam ser eles mesmos, com suas diferentes
culturas e identidades.

129
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• Os sujeitos atuam sobre a cultura e a linguagem, por isso os discursos são social
e historicamente situados.

• A língua e a cultura são interligadas e mutáveis, renovam-se a todo momento.

• O relativismo cultural como perspectiva que busca valorizar as singularidades


e o respeito aos diferentes sistemas culturais.

• A ampliação dos conhecimentos sobre o outro como maneiras de diminuir os


choques culturais e a entropia.

• Diferença entre uma abordagem estruturalista e pós-estruturalista no ensino


de línguas.

130
AUTOATIVIDADE

1 “A linguagem, o uso da língua, quando dissociado da cultura,


desloca o sentido de língua como fenômeno fundamental
da comunicação e vivência humanas, para um sistema de
elementos regido por regras, cuja estrutura pode ser analisada
independente de tempo, espaço ou contexto no qual está em funcionamento.
No entanto, quando se ensina ou se aprende uma língua estrangeira ou
segunda língua, não se pretende formar 'analistas da língua', mas indivíduos
capazes de usar todos os recursos que a língua oferece para compreender
e se fazer compreendido, para inserir-se no mundo como sujeito, com sua
cultura, seus modos de identificação, sua visão de mundo etc.” (2004, p.12).
MENDES, Edleise. Abordagem Comunicativa Intercultural (ACIN): uma proposta para ensinar
e aprender língua no diálogo de culturas. 2004. Tese de Doutorado. Programa de Pós-
graduação em Linguística Aplicada. Universidade Estadual de Campinas, Campinas. 2004.

Para ensinar a língua espanhola a partir de uma perspectiva social, e


indissociável da cultura, como sugere Mendes, o professor precisa:

a) ( ) Inserir o aluno no contexto do falante nativo, tendo este último como


exemplo comunicativo e cultural a ser alcançado.
b) ( ) Aplicar atividades de tradução literal, de maneira que o aluno construa
em sua língua significados precisos para a língua-alvo.
c) ( ) Mostrar como os sentidos são construídos social e culturalmente,
tomando como ponto de partida a língua e a cultura do estudante para a
aprendizagem da LE.
d) ( ) Levar aos alunos expressões idiomáticas prontas para que apliquem em
frases e contextos diversos de interação.
e) ( ) Eliminar a gramática das aulas de LE e priorizar a interação,
independentemente do grau de formalidade do contexto comunicativo.

2 As Orientações Curriculares de Espanhol para o Ensino Médio


(2005, p. 136) dizem que o fato “de o professor empregar uma
variedade qualquer não o exime do dever de mostrar aos alunos
que existem outras, tão ricas e válidas quanto a usada por ele, e,
dentro do possível, criar oportunidades de aproximação a elas, derrubando
estereótipos e preconceitos”.

Ainda nessa linha de pensamento, os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua


Estrangeira (1999, p. 47) defendem que “a questão da variação linguística em Língua
Estrangeira pode ajudar não só a compreensão do fenômeno linguístico da variação
na própria língua materna, como também do fato de que a língua estrangeira não
existe só na variedade padrão, conforme a escola normalmente apresenta”.

BRASIL, Ministério da Educação. Orientações Curriculares para o Ensino Médio. Linguagens,


códigos e suas tecnologias. Brasília: Secretaria de Educação Média e Tecnológica, 2005.

131
_________ Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares para o Ensino Médio.
Linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília: Secretaria de Educação Média e
Tecnológica, 1999.

Com base nas afirmações desses dois documentos, aplicados à realidade do


ensino de espanhol como LE na Educação Básica do Brasil, é correto afirmar
que:

a) ( ) A única variante a ser tratada com prestígio em sala de aula é a


empregada pelo professor.
b) ( ) As variantes mais distantes do contexto social do aluno devem ceder
espaço àquelas mais necessárias em contexto de relações comerciais.
c) ( ) O uso de um espanhol neutro é o mais adequado para que o aluno
posteriormente escolha qual espanhol seguir.
d) ( ) A existência de um ‘espanhol padrão’ é mito, existem diversas variantes
do idioma e estas devem ocupar o mesmo espaço na sala de aula.
e) ( ) Todas as variantes são importantes, porém o aluno deve aprender o
espanhol correto assim como o português, sua língua materna.

3 Nas aulas de LE, segundo Travaglia:

“Pode-se fazer com que o aluno, observando os fatos,


perceba que nem mesmo as normas sociais para o uso da língua
(gramática normativa) são uma lei imutável, já que a língua é essencialmente
dinâmica e está mudando constantemente por razões diversas, inclusive
para atender novas e/ou maiores necessidades comunicacionais da sociedade
e cultura a que a língua serve. Ele perceberá que, na verdade, as normas
sociais de uso da língua são escolhas da sociedade baseadas [...] muito menos
em razões linguísticas e mais em razões de prestígio social, de tradição, de
preservação da cultura e da identidade nacional, de estética, de lógica, de
maior ou menor eficiência comunicacional, entre outras” (TRAVAGLIA, 2004,
p. 105).
TRAVAGLIA, Luiz C. Para que ensinar teoria gramatical. In: Gramática ensino plural. São
Paulo: Cortez, 2004.

As concepções de língua como lei imutável (1) e essencialmente dinâmica (2)


dizem respeito:
a) ( ) Perspectivas estruturalista (1) e pós-estruturalista (2) respectivamente.
b) ( ) Perspectiva pós-estruturalista (1 e 2).
c) ( ) Perspectiva estruturalista (1 e 2).
d) ( ) Perspectiva pós-estruturalista (1) e estruturalista (2) respectivamente.

132
UNIDADE 3
TÓPICO 2

DA DIVERSIDADE À INTOLERÂNCIA

1 INTRODUÇÃO
Ao mesmo tempo em que presenciamos a internet viabilizando – em
conjunto com outras tecnologias – avanços educacionais, assistimos esse mesmo
elemento (a internet) tornar cada vez mais recorrente o contato entre pessoas
de cidades, estados, e até mesmo países diferentes, por meio de redes sociais
e afins. Porém, esse contato, presencial ou à distância, nem sempre é de mútuo
acolhimento. Nesse sentido, Lima (2014, p. 18) afirma que:

[...] a globalização, apesar de ter diminuído relativamente as distâncias


e tornado as fronteiras cada vez mais tênues, ela não fez desaparecer
os preconceitos e a intolerância. Portanto, é preciso repensar a
importância do diálogo e da valorização da diversidade cultural que é
inerente à condição humana.

Dentro dessa realidade de preconceitos e intolerância, neste tópico


abordaremos dois assuntos muito importantes que deveriam ser trabalhados em
sala de aula: o estereótipo e o estigma.

O tópico está dividido em três partes: na primeira, tratamos de esclarecer


os conceitos de diversidade e diferença; em seguida, trazemos o conceito de
estereótipo à luz da sala de aula; na terceira parte, focaremos brevemente o que
são os estigmas e suas classificações.

2 DIVERSIDADE OU DIFERENÇA?
Nas últimas duas décadas, os conceitos de diversidade e diferença
têm gerado amplos debates em pesquisas na área da educação, bem como em
políticas públicas nacionais e internacionais (RODRIGUES; ABRAMOWICZ,
2013). Considerando que estes também fazem parte das nossas discussões sobre
a prática de ensino de língua espanhola, você saberia distingui-los? Com base em
seu conhecimento de mundo, o que é diferença? Diversidade?

133
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

E
IMPORTANT

Nenhum desses conceitos possui resposta pronta, muito pelo contrário. Até
mesmo dentro das ciências, os sentidos divergem e são debatidos. Sua resposta é importante
para que reflita e a aprofunde a partir do conhecimento científico.

Desde crianças presenciamos o uso destes conceitos indiscriminadamente


no senso comum, principalmente em frases como “somos diferentes”, “respeite
as diferenças”, “sou a favor da diversidade”, que os fazem parecer faces de uma
mesma moeda. Rodrigues e Abramowicz, (2013) destacam que a aplicação de
conceitos-chave para retratar a pluralidade cultural pode nos levar a armadilhas,
como a dos elogios rasos às diferenças (retratados nas frases anteriores) e a
proliferação da desigualdade herdada sócio-historicamente.

As autoras não negam que somos, de fato, diferentes. Essas diferenças,


biológicas ou sociais, são naturais dos seres humanos. Basta olharmos ao nosso
redor que veremos pessoas de variadas etnias, raças, credos etc., constituindo o que
chamamos de diversidade, porém os conceitos de diferença e diversidade passam
a ser problemáticos quando usados não somente para retratar a multiplicidade
cultural, mas também para ocultar relações de força, conflito e superioridade.

Nesse sentido, você deve lembrar-se da nossa discussão na primeira


unidade sobre identidade e diferença, esta primeira se constitui a partir desta
segunda, isto é, uma identidade só existe porque há outra a ser contrastada
com ela. Quando espíritos nacionalistas predominam, por exemplo, a diferença
estabelece os que pertencem à nação e os que formam o grupo dos outros. A noção
de diferença, sob esse olhar, passa a ser um olhar de desigualdade e exclusão.

A tira de Mafalda retrata esse espírito identitário de superioridade sobre


o outro, mesmo quando há desigualdades implícitas no discurso.

FIGURA 81 – DISCURSO HISTÓRICO DE SUPERIORIDADE

FONTE: Disponível em: <https://clubedamafalda.files.wordpress.com/2011/05/hq-3.jpg>. Acesso


em: 2 jan. 2018.

134
TÓPICO 2 | DA DIVERSIDADE À INTOLERÂNCIA

Desse ponto de vista, o princípio do respeito às diferenças ganha outro


contorno, manter, em harmonia, os lugares desiguais entre negros e brancos,
homens e mulheres etc., que acompanham as sociedades. Respeito às hierarquias
e posições antagônicas, as quais nos impedem de olhar para essa diferença
levando em conta as condições sociais e históricas, os espaços e as oportunidades
diferenciadas (OLIVEIRA. C. R, 2017).

É necessário certo cuidado, portanto, para não olharmos a diferença pela


diferença, sem considerar o surgimento desta. O termo diversidade tampouco
foge à regra, já que como questionam Rodrigues; Abramowicz (2013), as políticas
públicas continuam a usá-lo como chave para apaziguar lutas pela igualdade de
condições e o fim das hegemonias.

DICAS

Reconhecer as diferenças é necessariamente elogiar as desigualdades? Sobre


este tema, recomendo um vídeo complementar: Fragmento da palestra Amor, Leitura e
Diferenças, do professor e filósofo Mario Sergio Cortella. Disponível em: <https://www.
youtube.com/watch?v=OjcZka0GLx0>. Acesso em: 12 fev. 2018.

Relacionados aos preconceitos, e até mesmo às desigualdades,


abordaremos, nas seções seguintes, a construção dos estereótipos e dos estigmas.

3 O QUE SÃO ESTEREÓTIPOS?

AUTOATIVIDADE

Você conhece um pouquinho sobre os países que falam espanhol, não


é mesmo? Vamos testar os seus conhecimentos sobre todos eles. Observe os
países de língua espanhola no mapa. Em seguida, escreva seguindo a tabela,
três palavras que venham à cabeça ao ler o nome de cada um dos países
elencados, mas atenção! Evite pesquisas. Os países que, porventura, você não
tenha nenhuma referência, pode deixar em branco.

135
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

FIGURA 82– O ESPANHOL NO MUNDO

FONTE: Disponível em: <http://elrincondegundisalvus.blogspot.com.br/2017/02/las-lenguas-


estan-para-entendernos.html>. Acesso em: 2 jan. 2018.

TABELA 1 – TRÊS REFERÊNCIAS PRÉVIAS SOBRE CADA PAÍS HISPANOFALANTE


Argentina 1.
2.
3.
Bolívia 1.
2.
3.
Chile 1.
2.
3.
Colômbia 1.
2.
3.
Costa Rica 1.
2.
3.
Cuba 1.
2.
3.
Equador 1.
2.
3.
El Salvador 1.
2.
3.

136
TÓPICO 2 | DA DIVERSIDADE À INTOLERÂNCIA

Guatemala 1.
2.
3.
Honduras 1.
2.
3.
México 1.
2.
3.
Nicarágua 1.
2.
3.
Panamá 1.
2.
3.
Paraguai 1.
2.
3.
Peru 1.
2.
3.
Porto Rico 1.
2.
3.
República Dominicana 1.
2.
3.
Uruguai 1.
2.
3.
Venezuela 1.
2.
3.
Espanha 1.
2.
3.
FONTE: O autor

Antes de explicar o porquê desta atividade, você sabe o que são


estereótipos? Bhabha, um importante nome da Antropologia, o define como:

[...] de forma bem preliminar, o estereótipo é um modo de representação


complexo, ambivalente e contraditório, ansioso na mesma proporção
em que é afirmativo, exigindo não apenas que ampliemos nossos
objetivos críticos e políticos, mas que mudemos o próprio objeto da
análise (BHABHA, 2003, p. 110).

137
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

Isto é, o estereótipo funciona como uma imagem construída a partir de


primeiras impressões sobre grupos e sujeitos. OLIVEIRA. C. R (2017, p. 40) o
define assim:

[...] o estereótipo representa um grupo ou sujeito de maneira estática, e


é codificado na medida em que é repetido, ofuscando, na relação entre
sujeitos, identidades reais em virtude da que já está preestabelecida
e internalizada. Em outros termos, representa o apagamento da
diversidade e da multiplicidade, a partir da perspectiva da unicidade.

O estereótipo então se mantém vivo por meio da repetição. Ele, por


natureza, impede-nos de enxergar a realidade por trás dessa representação,
pois, quando internalizado, tende a generalizar situações, e ser assumido como
verdade absoluta. Essa verdade absoluta, no entanto, é imaginária, já que uma
das características das culturas e identidades é a mutabilidade, são carregadas de
diferenças internas que impossibilitam generalizações.

Esta atividade inicial sobre os países tem o propósito justamente de coletar


conhecimentos prévios (estereotipados) a respeito dos países hispanofalantes,
e pode ser aplicada em sala de aula, de modo a verificar os estereótipos dos
estudantes e trabalhá-los a partir de aulas reflexivas. A atividade é uma adaptação
de uma pesquisa que realizei junto a um grupo de estudos durante a 15ª SEPEX
– Semana de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFSC, em 2016. Trata-se de um
levantamento de estereótipos culturais entre os visitantes do estande do projeto
CEEMO – Corpus do espanhol escrito com marcas de oralidade. A dinâmica
funcionava mais ou menos como esta da atividade inicial: os participantes
deviam escrever três propriedades que lhes vinham à mente ao sortear um país
hispanofalante. Cada propriedade elencada pelos participantes era afixada ao
mapa, como mostra a Figura 83. Assim, formávamos um mapa com estereótipos,
renovado e registrado a cada preenchimento.

138
TÓPICO 2 | DA DIVERSIDADE À INTOLERÂNCIA

FIGURA 83 – ALGUMAS DAS PROPRIEDADES ATRIBUÍDAS AOS PAÍSES HISPANOFALANTES

FONTE: OLIVEIRA, Carlos R. O ensino de espanhol em um curso de letras EAD: uma análise a
partir da perspectiva da interculturalidade. 2017. Dissertação de Mestrado. Programa
de Pós-graduação em Linguística. Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.
2017.

Em Oliveira C. R. (2017, p. 40), esta pesquisa nos evidenciou a presença de


estereótipos presentes no senso comum, e muitas vezes “propagados no próprio
ensino do espanhol – como o México, tratado na maioria das vezes a partir do
exotismo culinário, e Cuba reduzida musicalmente à salsa”. Entre os estereótipos
mais recorrentes estavam o México relacionado à pimenta, e as touradas à
Espanha. República Dominicana, Panamá eram aqueles que os participantes
pouco sabiam e redigiram um ponto de interrogação.

O objetivo dessa pesquisa era problematizar que “tópicos estereotipados


como esses fazem referência a uma vida superficial dos sujeitos que vivem nesse
território, e são observados com frequência nas salas de aula e nos materiais
didáticos” (OLIVEIRA, C. R. 2017, p. 40).

139
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

FIGURA 84 – A AMÉRICA LATINA PELOS LATINO-AMERICANOS – ESTEREÓTIPOS

FONTE: Disponível em: <http://elrincondegundisalvus.blogspot.com.br/2017/02/las-


lenguas-estan-para-entendernos.html>. Acesso em: 2 jan. 2018.

DICAS

Interessante esse tema dos estereótipos, não é mesmo? Quer verificar e


aprimorar ainda mais seus conhecimentos culturais sobre diversos países? Recomendo o
seguinte Quizz. Disponível em: <https://www.nexojornal.com.br/interativo/2016/10/18/Que-
pa%C3%ADs-%C3%A9-este-Um-quiz-para-al%C3%A9m-dos-estere%C3%B3tipos>. Adiante,
inspirado neste, faremos um com os países de língua espanhola.

140
TÓPICO 2 | DA DIVERSIDADE À INTOLERÂNCIA

FIGURA 85 – IMAGEM DO SITE

FONTE: Disponível em: <https://www.nexojornal.com.br/interativo/2016/10/18/Que-


pa%C3%ADs-%C3%A9-este-Um-quiz-para-al%C3%A9m-dos-estere%C3%B3tipos>.
Acesso em: 4 jan. 2018.

DICAS

Ainda não entendeu bem as discussões didáticas em torno dos estereótipos?


Para aprofundamentos teóricos sobre os estereótipos da América Latina, ler “O local da
Cultura”.
BHABHA, Homi K. O local da cultura. Belo Horizonte: UFMG, 2003.

Além disso, cabe, dentro de nossa discussão, reforçar que quando os


estereótipos são carregados de negatividade, influenciam na vida social e na
organização em sociedade, como é o caso da imagem construída dos latinos nos
Estados Unidos.

141
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

FIGURA 86 – ESTEREÓTIPOS DOS LATINOS NOS EUA

142
TÓPICO 2 | DA DIVERSIDADE À INTOLERÂNCIA

FONTE: Disponível em: <http://www.oyejuanjo.com/2015/06/infografia-estereotipos-latinos-


medios-extranjeros.html>. Acesso em: 2 jan. 2018.

143
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

Quando o estereótipo deixa de ser uma representação e adquire conotações


negativas, podemos considerá-lo um estigma. Veremos na seção seguinte o
porquê. Antes vamos praticar um pouco do conhecimento adquirido, que tal?

AUTOATIVIDADE

1 Que tal medirmos ainda mais o seu nível de estereótipos quanto aos
países hispanofalantes? Observe as imagens a seguir, e selecione o país
que elas representam. Informações no site. Disponível: <http://www.
gororobacomcardamomo.com>.

“Casabindo – o povoado com 200


habitantes que recebe em 15 de agosto
o Toreo de la Vincha – fica localizado na”:
a) ( ) México.
b) ( ) Espanha.
c) ( ) Argentina.
d) ( ) República Dominicana.

FONTE: Disponível em: <https://www.essemundoenosso.com.br>. Acesso em: 2 jan. 2018.

“Arroz, tortilha, saladinha de repolho


com molho de tomate, pimentão
recheado, frijoles refritos com tortilhas
fritas, bananas fritas e um queijinho
branco delicioso é um prato típico em”:

144
TÓPICO 2 | DA DIVERSIDADE À INTOLERÂNCIA

“Arroz, tortilha, saladinha de


repolho com molho de tomate,
pimentão recheado, frijoles refritos
com tortilhas fritas, bananas fritas e
um queijinho branco delicioso é um
prato típico em”:

a) ( ) Argentina.
b) ( ) México.
c) ( ) Guatemala.
d) ( ) Nicarágua.

FONTE: Disponível em: <http://www.gororobacomcardamomo.com/2012/02/05/o-que-


comemos-na-guatemala/>. Acesso em: 2 jan. 2018.

“O tango mais famoso do mundo, La


Cumparsita, foi criado e escrito pelo
músico Gerardo Matos Rodríguez,
entre 1915 e 1916, para uma comparsa
de carnaval da Federação de Estudantes
do(a)”:

a) ( ) Espanha.
b) ( ) Uruguai.
c) ( ) Argentina.
d) ( ) Chile.

FONTE: Disponível em: <http://alextangofuego.blogspot.com.br/2010/04/story-behind-la-


cumparsita.html>. Acesso em: 2 jan. 2018.

2 Analise a imagem e responda as questões.

145
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

FIGURA 87 – ESTEREÓTIPOS

FONTE: Disponível em: <https://br.pinterest.com/


pin/790663278302940836/>. Acesso em: 2 jan. 2018.

a) Identifique o movimento social representado pelas imagens.


b) Discuta e aponte os avanços sociais desse grupo.
c) Identifique como podemos ajudar a diminuir preconceitos e estereótipos
desses tipos em sala de aula.

4 O QUE SÃO ESTIGMAS?



Sabe quando aquela pessoa tem uma imagem negativa que a acompanha
em todo lugar? Conhece alguém assim? Talvez essa pessoa seja uma pessoa
estigmatizada.

Segundo Goffman (1988, p. 5), “os gregos usavam a palavra estigma para
referir-se aos sujeitos demarcados com sinais corporais, de corte ou queimadura,
que deveriam ser evitados, tais como escravos, criminosos, etc.”.

Associada a essa ideia, a palavra estigma refere-se à rejeição de alguém


por algum juízo de valor, ou seja, “nossas pré-concepções nos levam a criar
expectativas sobre o outro que se transformam em exigências rígidas, que se o
outro não possuir, passa a ser um sujeito estigmatizado” (GOFFMAN, 1988, p. 5).

Em síntese, estigma é quando o sujeito “possui um traço que pode impor


atenção e afastar aqueles que encontra, destruindo a possibilidade de atenção para
outros atributos seus” (GOFFMAN, 1988, p. 7). Há nesse sentido uma distância
entre sua identidade real (o que ele é) e a identidade virtual (o que socialmente
esperam que seja).

Goffmann (1988) classifica os estigmas em três tipos: corporais; de caráter;


e tribais (de raça, nação e religião).

146
TÓPICO 2 | DA DIVERSIDADE À INTOLERÂNCIA

Os estigmas corporais compreendem deficiências motoras, auditivas,


visuais, desfigurações de corpo, rosto etc. Sobre estes estigmas, Melo (2000, p.
20) explica que quanto mais acentuada e perceptível a diferença em relação ao
padrão, mais estigmatizado o sujeito tende a ser socialmente. Isto é, a título de
exemplo, alguém com apenas uma tatuagem tende a ser menos marginalizado do
que aquele que tem o corpo totalmente tatuado.

AUTOATIVIDADE

Observe a imagem a seguir:


FIGURA 88 – ESTIGMA CORPORAL – A TATUAGEM

FONTE: Disponível em: <https://br.pinterest.com/


pin/790663278302940829/>. Acesso em: 2 jan.
2018.

A partir da teoria de Goffman (1988), proponho fazermos uma análise


da figura do sujeito da imagem. Você o rotularia negativamente com base no
que vê? Qual deve ser a profissão do rapaz? Está distante da identidade virtual
que a sociedade espera? Qual poderia ser a identidade real desse sujeito?

A partir de sua resposta, ressalto que nos cabe, enquanto professores, levar
esse tipo de atividade como reflexão para nossos alunos, para mostrarmos que esse
tipo de estigma está normalmente associado à discriminação e à marginalização
do sujeito tatuado. Para sala de aula, o anúncio da Figura 89, ajuda no debate
sobre essa concepção negativa.

147
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

FIGURA 89 – ESTIGMA CORPORAL: A TATUAGEM/COMPLETO

FONTE: Disponível em: <https://br.pinterest.com/


pin/790663278302940829/>. Acesso em: 2 jan. 2018.

Além disso, é importante tratarmos com nossos alunos, dentro do tema


dos estigmas corporais, a questão sobre a subjetividade da beleza, uma vez que
estes normalmente seguem padrões de beleza inalcançáveis. Os rótulos são
construções culturais, e mudam de acordo com a comunidade.

Associado ainda a este padrão estético, podemos mencionar os estigmas


de caráter, que apesar de contemplarem os comportamentos (vícios, atitudes
etc.), também podem ser associados ao visual, por exemplo, uma menina por
usar roupas curtas tem seu caráter deturpado.

148
TÓPICO 2 | DA DIVERSIDADE À INTOLERÂNCIA

FIGURA 90 – ESTIGMA DE CARÁTER

FONTE: Disponível em: <https://br.pinterest.com/


pin/353884483209867872/>. Acesso em: 2 jan. 2018.

Por último, temos os estigmas tribais, que podem ser de raça, nação e
religião, representados nas imagens a seguir:

FIGURA 91 – ESTIGMA DE RAÇA

FONTE: Disponível em: <https://br.pinterest.com/


pin/466333736387778516/>. Acesso em: 9 abr. 2018.

149
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

FIGURA 92 – ESTIGMA DE RELIGIÃO

FONTE: Disponível em: <https://br.pinterest.com/


pin/70228075414241449/>. Acesso em: 2 jan. 2018.

FIGURA 93 – ESTIGMA CORPORAL

FONTE: Disponível em: <https://br.pinterest.com/>. Acesso em: 2


jan. 2018.

DICAS

Você pode se aprofundar no tema dos estigmas a partir dessa apostila


disponível on-line. Disponível em: <https://pt.slideshare.net/JosDantas4/estigma-o-que>.

150
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• O que são os estereótipos, e como eles são construídos.

• Quais os principais estereótipos de países de língua espanhola, e por quê


superá-los.

• O que são estigmas.

• Os tipos, e como são construídos.

151
AUTOATIVIDADE

1 “O estigma é um atributo que produz um descrédito amplo na vida do


sujeito; em situações extremas, é nomeado como marca ou desvantagem em
relação ao outro; isso constitui uma discrepância entre a identidade social,
demarcada por um modelo social e a identidade real”.

MELO, Zélia Maria de. Estigmas: Espaço para exclusão social. Revista Symposium, v. 4, n.
especial, dez. 2000. Disponível em: <https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/2457/2457.PDF>.
Acesso em: 12 fev. 2018.

Considerando a definição acima, assinale o tipo de estigma correspondente a


cada imagem a seguir, e escreva a que identidade virtual (ou social) cada uma
se refere.

a) estigmas de caráter
b) estigmas tribais
c) estigmas corporais

( )

FONTE: Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=WqTKEQxYJcU>. Acesso em: 4


jan. 2018.

( )

FONTE: Disponível em: <http://etnicomhum.blogspot.com.br/2013/03/dia-internacional-


contra-discriminacao.html>. Acesso em: 4 jan. 2018.

152
( )

FONTE: Disponível em: <http://patiohype.com.br/wp-content/uploads/2017/05/Dia-


Internacional-contra-a-Homofobia.jpg>. Acesso em: 4 jan. 2018.

153
154
UNIDADE 3
TÓPICO 3

A PRÁTICA INTERCULTURAL DE ENSINO DE LE

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, fechando nossos estudos sobre os aspectos culturais da língua
espanhola, veremos possibilidades de atividades que ajudam na desconstrução
de estereótipos, estigmas e preconceitos.

Para isso, o tópico está dividido em duas seções: a primeira fala sobre
a importância de um debate em direção à tolerância nas escolas e no ensino de
LE, e a segunda é uma proposição de sequência didática sob uma perspectiva
intercultural.

2 A IMPORTÂNCIA DO ENSINO DE LÍNGUAS PARA


SUPERAÇÃO DA INTOLERÂNCIA
Muito se tem falado nos últimos anos sobre diminuir a intolerância, mas
você sabe o que é intolerância? Que tipo de atitudes devemos ter para que isso
aconteça? Primeiro de tudo, tolerância advém do latim tolerare, que significa algo
como "suportar" ou "aceitar". Para o senso comum, tolerância seria então o oposto
de intransigência, seria uma atitude de respeito e/ou aceitação diante daquilo que
está fora do seu controle ou do seu alcance, ou que não te diz respeito.

A Figura 94 complementa essa definição com os limites do que é ser


tolerante.

155
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

FIGURA 94 – O QUE É SER TOLERANTE

FONTE: Disponível em: <http://pictoline.com/>. Acesso em: 2 jan. 2018.

Embora o termo seja muito comum nos dias de hoje, o trabalho com a
tolerância no ensino de LE reside em discussões que vão para além do respeito
à diversidade. Dentre outros objetivos, espera-se que a aula de língua provoque
o enfrentamento de percepções de si e do outro que levam à intolerância. Nesse
sentido, no contexto do nosso país, em que a ideia de pertencimento à América
Latina é rejeitada por grande parte dos brasileiros (GRIMSON, 2000), uma aula
de língua espanhola ganha um outro tom. Afinal, sem a desconstrução dessa
visão depreciativa sobre os países hispanofalantes, aprender essa língua-cultura
não faria sentido, só causaria mais intolerância e choques culturais.

156
TÓPICO 3 | A PRÁTICA INTERCULTURAL DE ENSINO DE LE

FIGURA 95 – CELEBRAÇÃO DA DIVERSIDADE

157
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

FONTE: Disponível em: <aprendoenlaweb.blogspot.com/>. Acesso em: 2 jan. 2018.

Na seção seguinte apresento um exemplo de atividade que trabalha em


direção à intolerância em sala de aula.

3 DA TEORIA À PRÁTICA: O DIÁLOGO SOBRE


PRECONCEITOS NAS AULAS DE LE
Colocar em prática a teoria é sempre um desafio para os docentes. Essa
tarefa fica ainda mais árdua quando precisamos escolher materiais que nos
permitam proporcionar espaço para reflexões sobre preconceitos e estereótipos
sem recair neles. Por esse motivo, elaborei uma sequência didática para este
momento final de nossos estudos, contemplando aspectos interculturais variados
em sala de aula.

Você já consegue imaginar o conteúdo por trás dessa sequência didática?

NOTA

Talvez a expressão sequência didática ainda seja nova para você. Ela é muito
comum no espaço escolar, pois refere-se justamente ao conjunto de atividades planejadas
em torno de um conteúdo. Uma sequência didática requer que essas atividades não sejam
soltas, estejam ligadas aos objetivos e organizadas conforme as etapas dos processos de
ensino e aprendizagem.

158
TÓPICO 3 | A PRÁTICA INTERCULTURAL DE ENSINO DE LE

AUTOATIVIDADE

Conteúdo: verbos SER e ESTAR.

Público-alvo: turmas iniciantes de espanhol (Ensino Médio).

Objetivos: estimular o diálogo e a empatia entre os estudantes; instigar a


reflexão sobre estereótipos, preconceitos e estigmas; analisar e discutir a
aplicação do verbo ser e estar dentro do contexto dos discursos identitários.

Parte 1: apresentação do professor

Para iniciar, você, professor, deve apresentar-se aos alunos na terceira pessoa,
sem mencionar seu nome e usando informações particulares, porém menos
visíveis e mais generalistas (como descrições psicológicas, históricas etc.).
Evite informações que, porventura, os alunos já tenham e que usou em
sua apresentação no primeiro dia de aula. Torne natural esse processo de
apresentação usando uma história fictícia, como na imagem.

Reflexão: este momento é importante para que os alunos percebam que além
do papel de professor, você possui identidades e vivências que vão além da
sala de aula. Leve os alunos a perceberem isso antes de revelar que se trata de
uma descrição sua.

Parte 2: alunos fazem autorreflexão

• Após a sua apresentação, entregue a cada um dos alunos uma tirinha de


papel como o exemplo a seguir:

1. ¿Quién soy? ¿Cómo soy? Yo soy...


2. ¿Por qué estoy
Yo estoy aprendiendo porque...
aprendiendo español?

Peça aos alunos que reflitam sobre as perguntas e que respondam na


segunda coluna do papel sem escrever seu nome ou informações que facilitem
sua identificação. A descrição pode ser em português, tendo em vista que se
trata de uma aula inicial.

Deixe-os livres para responder à pergunta sobre o espanhol. Isso o


ajudará a descobrir estereótipos e crenças novas a serem superadas nas aulas
de língua.

Peça que preencham os papéis e entreguem a você... coloque-os em


uma caixa e misture-os.

159
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

Reflexão: ao escrever sobre si, o aluno reconhece suas identidades e reflete


sobre elas.

Parte 3: dinâmica de troca de identidades

Distribua os papéis aleatoriamente aos alunos, de modo que alguns alunos


peguem e outros não as suas próprias definições.

Cada aluno deve ler a descrição no papel e os demais tentarão adivinhar de


quem se trata: o próprio aluno ou outro colega qualquer. O aluno que está lendo
deve assumir esse papel, respondendo às perguntas que os colegas lançarem
como se fossem sobre ele (mesmo sem saber de quem se trata). A turma deve
chegar a um consenso de resposta a partir da análise das informações dadas.

Finalize a atividade perguntando aos alunos o que eles concluíram sobre cada
fase dela.

Reflexão: esta é uma parte muito importante, pois o aluno que está lendo se
coloca no lugar do outro, seja ele de outro gênero, classe social, raça, sexualidade,
etc. Os demais que estão ouvindo terão a função de descobrir mais sobre esse
colega, e com isso espera-se que percebam que julgamentos e preconceitos são
resultantes da pouca informação que têm.

Parte 4: superando os preconceitos e estereótipos

• Apresente aos alunos as figuras a seguir, uma a uma, lançando a eles a


seguinte questão: “¿Quién es?” Não esqueça de apresentar as alternativas
disponíveis nas imagens, e solicitar que os alunos cheguem a um consenso
de resposta. Anote no quadro cada resposta dada.

FONTE: Disponível em: <http://www.un.org/en/letsfightracism/>.


Acesso em: 4 jan. 2018.

160
TÓPICO 3 | A PRÁTICA INTERCULTURAL DE ENSINO DE LE

FONTE: Disponível em: <http://www.un.org/en/letsfightracism/>.


Acesso em: 4 jan. 2018.

FONTE: Disponível em: <http://www.un.org/en/


letsfightracism/>. Acesso em: 4 jan. 2018.

FONTE: Disponível em: <http://www.un.org/en/letsfightracism/>.


Acesso em: 4 jan. 2018.

161
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

FONTE: Disponível em: <http://www.un.org/en/letsfightracism/>.


Acesso em: 4 jan. 2018.

FONTE: Disponível em: <http://www.un.org/en/letsfightracism/>.


Acesso em: 4 jan. 2018.

• Ao final, questione-os se perceberam que uma resposta automática lhes


veio à mente em cada questão, e dê início a um debate sobre as alternativas
marcadas. Após o debate, explique sobre como nascem os estereótipos
e estigmas, apontando a importância desse tipo de debate envolvendo os
preconceitos raciais.

• Explique também que as imagens são parte de uma campanha criada pelas
Nações Unidas, visando divulgar o Dia internacional da Discriminação
Racial, em 21 de março.

162
TÓPICO 3 | A PRÁTICA INTERCULTURAL DE ENSINO DE LE

DICAS

Para aprofundamentos sobre esta campanha e discussão com os alunos,


visite o site.
Disponível em: <https://www.imf-formacion.com/blog/desarrollo-sostenible/desarrollo-
sostenible/naciones-unidas-campana-lucha-racismo/>. Acesso em: 15 jan. 2018.

Reflexão: a questão histórica por trás dessa atividade é muito importante, pois
é ali que está a raiz do preconceito. Se necessário, leve textos complementares
sobre o tema do racismo. Enfatize que todos podemos errar ao rotular alguém,
mas mascarar esses rótulos não resolve o problema, é preciso entendê-los,
discuti-los e problematizá-los.

DICAS

Para aprofundamentos sobre esta campanha e discussão com os alunos,


visite o site.
Disponível em: <https://www.imf-formacion.com/blog/desarrollo-sostenible/desarrollo-
sostenible/naciones-unidas-campana-lucha-racismo/>.

Parte 5: análise dos verbos SER e ESTAR

Desde a primeira atividade os alunos estão em contato com os verbos SER


e ESTAR, no entanto, ainda não fizeram esta reflexão sobre eles. Inicie com
perguntas prévias que os levem a refletir sobre isso, como estas: ¿Hay diferencia
entre SER LO QUE SOMOS, y ser LO QUE DICEN QUE SOMOS? ¿Rotular a
alguien es decir que una persona ES o ESTÁ de determinada manera? ¿Por qué el
verbo SER es tan presente en estas calificaciones? ¿De qué manera el verbo SER puede
ayudarnos a ser mejores personas, que se aceptan y aceptan a los demás?

Apresente aos alunos a música a seguir, versão em espanhol do tema do filme


“O Rei do Show”, e peça a eles que completem as lacunas.

163
UNIDADE 3 | ASPECTOS CULTURAIS NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA

Así Soy – Maite Perroni

No _____ ajena a la oscuridad Con palabras duras me quieren herir


Escóndete me dicen Las voy a inundar y las voy a hundir
No te queremos como _____ Fuerte _____ con dolor
Porque _____ quien debo ser
Ya aprendí mis cicatrices pena dan Así _____
Escapate me dicen
Porque así nadie te amará Paren porque aquí voy
Si marchando voy a mi propio sol
Que me eliminen, no los dejaré Sin temor véanme no me voy a
Tenemos un lugar, yo sé disculpar
_____ gloriosos Así _____

Oh oh oh Oh oh oh

Una ruta más de balas viene a mí Oh oh oh


Disparen más, porque ya
Más penas no voy a permitir Así soy
Barricadas vamos a destruir Yo sé que merezco tu amor
Hasta llegar al sol En nada equivocada _____
Si _____lo que _____hoy
Con palabras duras me quieren herir
Que me eliminen, no los dejaré Las voy a inundar y las voy a hundir
Tenemos un lugar, yo sé Así _____, hay dolor
_____gloriosos Porque _____ quien debo ser
Así _____
Con palabras duras me quieren herir
Las voy a inundar y las voy a hundir Paren porque aquí voy
Fuerte _____con dolor Si marchando voy a mi propio sol
Porque _____quien debo ser Sin temor véanme no me voy a
Así _____ disculpar
Así _____
Paren porque aquí voy
Si marchando voy a mi propio sol Oh oh oh
Sin temor véanme no me voy a disculpar Así _____
Así _____ Oh oh oh

Oh oh oh Así _____, hay dolor, porque _____


quien debo ser
Así _____

164
TÓPICO 3 | A PRÁTICA INTERCULTURAL DE ENSINO DE LE

O áudio oficial da música está disponível em: <https://www.youtube.com/


watch?v=b8LZos8QJdk>.

• Repita a música quantas vezes for necessário para que os alunos possam
preencher as lacunas. Em seguida, pergunte a eles:

a) Sobre o que a música está falando?


b) Em que contexto o verbo SER aparece na letra? E o ESTAR?
c) De que modo podemos relacionar a letra da música à discussão anterior
sobre preconceitos, estereótipos e estigmas?

• Corrija as lacunas oralmente, e, aos poucos, explique a conjugação do verbo


ser e estar a partir da música.

Reflexão: é importante que o aluno perceba que o verbo SER em nossos


discursos tem poder de definir nossas identidades e as identidades do
outro (erroneamente, muitas vezes). A partir dele podemos evitar conflitos
identitários e melhorar nossas relações sociais.

165
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• A importância do ensino de LE na superação da intolerância.

• Atividades de reflexão sobre preconceitos.

166
AUTOATIVIDADE

1 Sabemos que a discussão sobre preconceitos e estereótipos tem sido de


extrema importância no âmbito do ensino de línguas. Nesse sentido, a
sequência didática apresentada no Tópico 3 propõe um trabalho voltado
ao verbo SER e ESTAR, sem priorizar regras gramaticais, e sim os discursos
sociais em que costumam aparecer esses verbos. Considerando seus três
objetivos – os quais você pode rever logo a seguir. Analise cada parte
dessa sequência didática, e discuta brevemente sobre como esses objetivos
poderiam ser alcançados em sala de aula por meio dessas atividades.

Objetivos:

1. Estimular o diálogo e a empatia entre os estudantes.


2. Instigar a reflexão sobre estereótipos, preconceitos e estigmas.
3. Analisar e discutir a aplicação do verbo ser e estar dentro do contexto dos
discursos identitários.

PARTE 1:

PARTE 2:

PARTE 3:

PARTE 4:

PARTE 5:

167
168
REFERÊNCIAS
ALMEIDA FILHO, J. C. P. Língua cultura na sala e na história. In: MENDES,
Edleise. Diálogos interculturais – ensino e formação em português língua
estrangeira. Campinas: Pontes, 2011.

BHABHA, Homi K. O local da cultura. Belo Horizonte: UFMG, 2003.

BRASIL, Ministério da Educação. Orientações curriculares para o Ensino


Médio. Linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília: Secretaria de Educação
Média e Tecnológica, 2005.

_________ Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares para o Ensino


Médio. Linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília: Secretaria de Educação
Média e Tecnológica, 1999.

BYRAM, M.; FLEMING, M. Perspectivas interculturales en el aprendizaje de


idiomas: enfoques a través del teatro y la etnografia. Madrid: Edinumen, 2009.

CANCLINI, N. G. Culturas híbridas: Estratégias para entrar e sair da


modernidade. Tradução por Heloísa P. C.; Ana R. L. Tradução da introdução
por Gêneses Edusp. 4. ed. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2015.

CANEN, Ana. O multiculturalismo e seus dilemas: implicações na educação.


Revista Comunicação & política, v. 25, nº. 2, p. 091-107, 2007. Disponível em:
<http://pt.slideshare.net/driadomaitis/omulticulturalismo-e-seus-dilemas-ana-
canen>. Acesso em: mar. 2016.

CANEDO, D. Cultura é o quê? Reflexões sobre o conceito de cultura e a atuação


dos poderes públicos. Anais do V ENECULT. Salvador: 2009.

CELANI, M. A. A. Transdisciplinaridade na linguística aplicada no Brasil. In:


SIGNORI, Ines; C. M. (orgs.) Linguística aplicada e transdisciplinaridade:
Questões e perspectivas. Campinas: Mercado de Letras, 1998.

COELHO, Teixeira. O que é indústria cultural. 35. ed. Brasiliense, 1993.

CUCHE, D. A noção de cultura nas ciências sociais. 2. ed. Bauru: EDUSC, 2002.

DÍE, Luis; MELERO, Luisa; BUADES, Josep. Diversidad o diversidades? Las


desigualdades no resueltas. In: DÍE, Luis (coord.) Aprendiendo a ser iguales:
manual de educación intercultural. Valencia: CeiMigra, 2012.

169
EAGLETON, T. A ideia de cultura. Tradução por Sandra C. B. Revisão técnica
por Cezar M. 2. ed. São Paulo: Unesp, 2011.

GIL, Glória. A relação entre língua e cultura no ensino e aprendizagem de


línguas adicionais. 2014. (Apresentação de Trabalho/Conferência ou palestra). III
Seminário Integrado de Letras Espanhol - SILE. 2014.

GOFFMAN, Erving. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade


deteriorada. Tradução por Mathias Lambert. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 1988.

GRIMSON, A. Interculturalidad y comunicación. Colômbia: Grupo Editorial


Norma, 2000.

GUIZARDI, M. L. Estereotipos, identidades, y nichos económicos de


las migrantes brasileñas en Madrid. Revista Estudos Feministas, v. 21,
n. 1, Florianópolis: 2013. Disponível em: < https://www.scielo.br/j/ref/a/
x8LSXcMJcRJxHsHfhSjpskm/?lang=es#>. Acesso em: 27 ago. 2021

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução de Tomaz


Tadeu da Silva e Guacira Lopes Louro. 10. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.

HILTON, Luciano. 8 Gestos simples que significam coisas bem rudes em


outros países, 2014. Disponível em: <https://www.tudointeressante.com.
br/2014/03/cuidado-com-as-maos-conheca-alguns-gestos-simples-que-
significam-coisas-bem-rudes-em-outros-paises.html>. Acesso em: 19 fev. 2018.

JORDÃO, Clarissa. M. (2006). O Ensino de línguas estrangeiras: de


código a discurso. Disponível em: <https://docs.ufpr.br/~marizalmeida/
interculturalidade/o_ensino_de_lem.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2017.

KARNAL, Leandro. Língua é cultura. Palestra de abertura do VIII Congresso da


Abrates. São Paulo. 2017.

KRAMSCH, Claire. El privilegio del hablante intercultural. In: BYRAM,


Michael; FLEMING, Michael. Perspectivas interculturales en el aprendizaje de
idiomas: enfoques a través del teatro y la etnografía. Madrid: Edinumen, 2009.

LARAIA, R. B. Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,


1999.

LEÃO, Andreza M. C. A influência do Iluminismo nas políticas


educacionais atuais: em pauta a cidadania. Diversa, n. 2, p. 69-84,
jul. 2008. Disponível em: <https://repositorio.unesp.br/bitstream/
handle/11449/101587/000603793_20151220.pdf?sequence=1>. Acesso em: 20 out.
2017.

170
LIMA, Tânia de S. A competência intercultural na formação de professores
de espanhol: estabelecendo diálogos em um curso de letras. Brasília. 2014.
Dissertação de mestrado. Programa de pós-graduação em Linguística Aplicada.
Universidade de Brasília, Brasília, 2014.

LYOTARD, J. F. A condição pós-moderna. Tradução: Ricardo C. B.; Posfácio:


Silviano S. 12. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2009.

MELO, Zélia Maria de. Estigmas: Espaço para exclusão social. Revista
Symposium, v. 4, n. especial, dez. 2000. Disponível em: <https://www.maxwell.
vrac.puc-rio.br/2457/2457.PDF>. Acesso em: 12 fev. 2018.

MENDES, Edleise. Abordagem comunicativa intercultural (ACIN): uma


proposta para ensinar e aprender língua no diálogo de culturas. 2004. Tese de
Doutorado. Programa de Pós-graduação em Linguística Aplicada. Universidade
Estadual de Campinas, Campinas. 2004.

MENDES, Edleise. A ideia de cultura e sua atualidade para o ensino-


aprendizagem de LE/L2. Revista Entre Línguas, v. 1, n. 2, p. 203-221, 2015.
Disponível em: <http://seer.fclar.unesp.br/entrelinguas/article/view/8060>
Acesso em: 5 fev. 2018.

MOITA, L. L. P. (org.). Por uma linguística aplicada indisciplinar. São Paulo:


Parábola, 2006.

________. (org.). Linguística aplicada na modernidade recente. 1. ed. São Paulo:


Parábola, 2013.

MOURA, M. Identidades. In: Cultura e Atualidade. Antonio Rubim (org.)


Salvador: UFBA, 2005.

OLIVEIRA, Carlos R. O ensino de espanhol em um curso de letras EAD:


uma análise a partir da perspectiva da interculturalidade. 2017. Dissertação de
Mestrado. Programa de Pós-graduação em Linguística. Universidade Federal de
Santa Catarina, Florianópolis. 2017.

OLIVEIRA, Leandra C. et al. A língua espanhola na modalidade de ensino a


distância: uma proposta didática intercultural. In: AQUINO, V.; VERA. R. et al.
(orgs.) Múltiplos olhares sobre a educação a distância: letras espanhol EAD/
UFSC. Florianópolis: LLE/CCE/UFSC, 2015.

OLIVEIRA, Leandra C.; OLIVEIRA, Carlos R. Representações culturais de


países hispanofalantes: um olhar para recursos visuais em disciplina do
curso de Letras Espanhol a distância. Fórum Linguístico. v. 14, n. 3, 2017.
Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/forum/article/view/1984-
8412.2017v14n3p2334/35141>. Acesso em: 10 out. 2017.

171
PRIBERAM DA LÍNGUA PORTUGUESA. Aculturação.  [On-line], 2008-2013.
Disponível em: <https://www.priberam.pt/dlpo/acultura%C3%A7%C3%A3o>.
Acesso em: 19 fev. 2018.

PRIBERAM DA LÍNGUA PORTUGUESA. Diversidade. [On-line], 2008-2013.


Disponível em: <https://www.priberam.pt/dlpo/diversidade>. Acesso em: 19 fev.
2018.

______. Feminismo. [On-line], 2008-2013. Disponível em: <https://www.


priberam.pt/dlpo/feminismo>. Acesso em: 2 dez. 2017.

______. Iluminismo. [On-line]. 2008-2013. Disponível em: <https://www.


priberam.pt/dlpo/iluminismo>. Acesso em: 2 dez. 2017.

PARAQUETT, M. Multiculturalismo, interculturalismo e ensino-aprendizagem


de espanhol para brasileiros. In: BARROS, Cristiano S. de; COSTA, Elzimar
G. de M. (coord.) Espanhol: ensino médio. Brasília: Ministério da Educação,
Secretaria de Educação Básica, 2010.

________. O diálogo intercultural entre o português e o espanhol na América


Latina. In: MENDES, E. Diálogos interculturais: ensino e formação em
português língua estrangeira. Campinas: Pontes, 2011.

PENNYCOOK, A. A linguística aplicada dos anos 90: em defesa de uma


abordagem crítica. In: SIGNORI, I.; CAVALCANTI, M. (org.). Linguística
aplicada e transdisciplinaridade – questões e perspectivas. Campinas:
Mercado de Letras, 1998.

PICANÇO, D. C. L. Aspectos políticos, discursivos e subjetivos da


interculturalidade na formação do professor de espanhol como LE. Revista
Eutomia, v. 1, n. 10, p. 111-132, dez. 2012. Disponível em: <https://periodicos.
ufpe.br/revistas/EUTOMIA/article/view/813/600>. Acesso em: 10 dez. 2018.

PINEZI, Ana Keila Mosca. Infanticídio indígena, relativismo cultural e direitos


humanos: elementos para reflexão. Revista Aurora, n. 8, 2010. Disponível em:
<www.pucsp.br/revistaaurora>. Acesso em: 20 dez. 2017.

RODRIGUES, Tatiane C.; ABRAMOWICZ, Anete. O debate contemporâneo


sobre a diversidade e a diferença nas políticas e pesquisas em educação In:
Educ. Pesquisa. v. 39. nº. 1. São Paulo: Jan./Mar. 2013. Disponível em: <http://
www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97022013000100002>.
Acesso em: 9 abr. 2018.

REAL ACADEMIA ESPAÑOLA. (2001). Diccionario de la lengua española (22.


ed.). Disponível em: <http://www.rae.es/rae.html>. Acesso em: 20 dez. 2017.

172
RIVERA. Petra. O triunfo do reggaeton: da marginalização ao ‘Despacito’,
ISTOÉ. 2017. Disponível em: <https://istoe.com.br/o-triunfo-do-reggaeton-da-
marginalizacao-ao-despacito/>. Acesso em: 19 fev. 2018.

ROMANZOTI, Natascha. 15 gestos inocentes no Brasil, mas terríveis em


outros países. 2015. Disponível em: <https://hypescience.com/wp-content/
uploads/2015/07/gestos-rudes-em-outros-paises-8.jpg>. Acesso em: 19 fev. 2018.

SANTOS, Hélade S. O papel de estereótipos e preconceitos na


aprendizagem de línguas estrangeiras. Anais... 2. Congresso. Bras.
Hispanistas. 2002. Disponível em: <http://www.proceedings.scielo.br/scielo.
php?pid=MSC0000000012002000100029&script=sci_arttext>. Acesso em: 20 jan.
2018.

SILVA, T. T. A produção social da identidade e da diferença. In: SILVA, Tomaz.


T. Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis:
Vozes, 2014.

SOUZA, L. M. T. M. Cultura, língua e emergência dialógica. Revista Letras e


Letras, v. 26, n. 2, p. 289-306, jul. 2010. Disponível em: <http://www.seer.ufu.br/
index.php/letraseletras/article/view/25626>. Acesso em: 5 set. 2017.

UNESCO. Declaração universal sobre a diversidade cultural. 2002. Disponível


em: <http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001271/127160por.pdf>. Acesso em:
8 fev. 2017.

VILLAR, S. M.; HOUAISS, A. Dicionário Houaiss conciso. São Paulo: Moderna,


2011.

WALSH, Catherine. Interculturalidad y (de)colonialidad: Perspectivas


críticas y políticas. Revista Visão Global, v. 15, n. 1-2, p. 61-74, jan./dez 2012.
Disponível em: <http://editora.unoesc.edu.br/index.php/visaoglobal/article/
viewFile/3412/1511>. Acesso em: 20 jun. 2016.

173

Você também pode gostar