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LITERATURA AFRICANA EM LÍNGUA

PORTUGUESA
LITERATURA
Estudo sobre as literaturas africanas em língua portuguesa e uma reflexão sobre a
importância da literatura para a sociedade africana
RESUMO
O presente artigo tem o objetivo explanar sobre as Literaturas Africanas em Língua
Portuguesa e realizar uma reflexão sobre a importância da literatura para a sociedade
africana. A língua portuguesa tornou-se o idioma oficial de alguns países e, hoje, são
consolidadas; e expressam as idéias dos autores e da população. A literatura é marcada pela
fragmentação e por uma forte tradição oral de construção e propagação da sabedoria. A
África é um continente formado por diversas culturas e muitas ainda são desconhecidas pela
sociedade moderna. Nesse sentido, busca-se apresentar algumas características marcantes
dos notáveis escritores africanos. Realizou-se, portanto, uma pesquisa bibliográfica obtendo
orientações de autores como LARANJEIRA (1992), BARBOSA (2008) e DAMATO
(1993). As literaturas de língua portuguesa do Brasil e dos países africanos são distintas,
mas existem laços de similaridade.

Palavras-chave: Literatura; Português; África.

ABSTRACT

This article aims to explain about African Literatures in Portuguese and reflect on the
importance of literature for African society. The Portuguese language became the official
language of some countries and, today, they are consolidated; and express the ideas of the
authors and the population. Literature is marked by fragmentation and a strong oral tradition
of construction and propagation of wisdom. Africa is a continent formed by diverse cultures
and many are still unknown by modern society. In this sense, it seeks to present some
outstanding characteristics of notable African writers. Therefore, a bibliographical research
was carried out, obtaining guidelines from authors such as LARANJEIRA (1992),
BARBOSA (2008) and DAMATO (1993). The Portuguese-language literatures from Brazil
and African countries are distinct, but there are similarity ties.

Keywords: Literature; Portuguese; Africa.

Introdução
Um belo continente que sempre atraiu o olhar do homem por causa de seus atributos,
segredos e belezas inconfundíveis. A África pode ser vista como um local cheio de belezas
naturais, que sempre oferece um enorme campo para a consumação de realizações incríveis.
Muitos idiomas são falados no Continente Africano, destacando-se: o francês, inglês e o
português.

As literaturas africanas em língua portuguesa podem ser consideradas recém-chegadas, pois


os países que foram colonizados por Portugal receberam sua independência no final do
século XX. No período de colonização, existiu a criação de textos literários nas colônias,
entretanto os textos eram conforme o ponto de vista do colonizador português.

Com o passar dos tempos, os escritores perceberam que deveriam escrever a partir das
perspectivas locais, com isso seus textos começaram a serem entendidos como os de Cabo-
Verde, Moçambique e Angola. A África é um país continental onde existem várias culturas
e, muitas destas culturas, são desconhecidas no Brasil, apesar de existir inúmeras
igualdades.

A leitura de grandes obras dos escritores africanos pode ser de grande valia para os alunos
brasileiros, visto que poderão aprender sobre este grande continente.    Um tema muito
discutido atualmente é a diversidade cultural na comunidade lusófona, e a inevitabilidade de
incluir temas ligados à comunidade africana nos processos de reconhecimento da
pluralidade da cultura brasileira.

Desenvolvimento
A literatura africana é o reflexo da vida social do povo, ela é ligada aos processos de
modernização e urbanização; e pode criar novas formas e estilos.  Por consequência do
processo de colonização, a literatura parece ter adquirido um posicionamento especial na
antropologia, criando etnografias[2] sobre como seria o continente e seus habitantes. Tal
processo é diretamente próximo à ocupação colonial.

Elísio Macamo elaborou uma classificação do conhecimento sobre a literatura africana que
são: conhecimento tradicional, africano e colonial (MACAMO, 2002). Nessa conformidade,
desprezando a ideia de cronologia pode-se pensar que a tradição oral seria uma forma de
literatura tradicional, e está presente em todas as culturas africanas, baseando-se nas
relações que são o repertorio histórico pertencente à comunidade, ao grupo e à sociedade.

A literatura colonial seria aquela elaborada por uma produção de textos de origem
etnográfica, biográfica escrita pelos missionários. Os missionários, também, seriam
reguladores de línguas nativas, agora domesticada em gramáticas, dicionários, etc.
(COUTO, 2009; MENDONÇA, 1999). Francisco Noa, em sua análise sobre literatura
colonial, relata que existe uma literatura produzida a respeito da África a partir de um
“olhar externo”, em constante renovação (NOA, 1999).

Conforme Deize Bebiano (2000), o conhecimento africano era passado por intermédio da
literatura oral. Essa forma sofria muito preconceito, contudo, no decorrer do tempo,
conseguiu ter reconhecimento nos veículos culturais. Até hoje, a oralidade e o som
influenciam a literatura africana conforme as palavras de Pires Laranjeira (1992):

[...] Faz-se por esquecer que a África é ainda um continente da oralidade e do som,
mas do que da escrita ou da imagem, e que privilegiar, portanto, a literatura escrita
é, no mínimo, postergar as outras formas de criação literária par terreno da
inferioridade discriminatória, da subserviência artesanal, o que permitiria avaliar
os discursos críticos, quer dos próprios países dessas criações, que dos exógenos,
como autênticos baluartes de metalinguagens demagógicas ou de imprecisas
hermenêuticas reducionistas [...], (LARANJEIRA, 1992, p.36).

As literaturas africanas escritas em língua portuguesa coincidem na flexibilidade das


narrativas, fazendo, assim, conviver o antigo com o novo; a escrita com a oralidade; em um
discurso mesclado. Também promove uma escrita dinâmica mestiça resultado dos diálogos
entre as formas de textualidade das línguas européias escritas e formas de textualidade das
línguas nativas. 

A literatura africana é uma literatura de luta e conflito, ela discute de forma ambígua com a
tradição, a literatura colonial e com seu tempo. Ela é uma literatura de características
modernas, no sentido de ser aquela que surge da possibilidade de um conjunto de
mudanças, que evidencia um número de conflitos e contradições (HAMILTON, 1999:
AUGEL, 2007).

Um estudo notável sobre literatura e nacionalidade na cultura moçambicana elaborado por


Patrick Chabal salienta quatro fases de incremento da literatura africana em língua
portuguesa.

 A primeira é a percepção de que os escritores transcreviam os modelos da escrita européia.


A segunda é a perseverança do autor em construir e defender uma cultura africana essencial.
A terceira fase é o período pós independência, o autor quer ter seu lugar na sociedade. A
quarta é a atualidade, o autor busca novos rumos para o futuro (CHABAL, 1994).
Na época antecedente a Independência, os escritores de Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo
Verde, São Tome e Príncipe e Angola escreviam seus textos com a influência trazida pelo
colonizador e, muitas vezes, entravam em conflito com a sua cultura nativa africana.

Após a ruptura com o colonialismo imperialista, surgiram movimentos literários


importantes e obras de grande proeminência para o desenvolvimento da literatura africana
em língua portuguesa. Evidenciando-se a publicação da revista Claridade (1936-1960) em
Cabo Verde; a publicação do livro de poemas Ilha de Nome Santo (1942) de Francisco José
Tenreiro, em São Tomé e Príncipe; a publicação da Revista Msaho (1952) em Moçambique;
e a publicação da Mantenhas Para Quem Luta! (1977) pelo Conselho Nacional de Cultura
em Guiné-Bissau.

Deize Bebiano enfatiza que em Angola, nas décadas de 50 e 60, tempo anterior a
independência, a procura pela identidade foi realizada através da poesia. Os temas mais
falados eram o que focavam em solidariedade aos ancestrais, a infância e etc. (BEBIANO,
2006).

Em seu livro Paul Ricoeur (1994) reflete que:

A identidade não poderia ter outra forma do que a narrativa, pois definir-se é, em ultima
analise, narrar. Uma coletividade ou um individuo se definiria, portanto, através de histórias
que ele narra a si mesma sobre a si mesma e, destas narrativas, poder-se-ia extrair a própria
essência da definição implícita na qual a coletividade se encontra (RICOUER, 1994, p.
432).

A literatura africana sofre com preconceitos criados desde os tempos antigos, relatos
bíblicos, a elaboração de alguns mapas e outros trabalhos com outras fontes foram usados
para negativar o continente africano e sua população. Segundo Serrano e Waldman (2007):

“historicamente, o regime de estereotipias imposto a África foi reforçado pela distância e o


relativo isolamento do continente para com o mundo europeu. A África, e em particular a
África Negra ou Subsaariana, constituía um domínio sobre o qual as informações eram
fragmentarias e distorcidas, ocultando-se par completar, por trás de um deserto considerado
impenetrável, o Saara”, (SERRANO E WALDMAN, 2007, p.27).

A literatura escrita atualmente em Angola, Guiné-Bissau, Cabo-Verde, São Tomé e Príncipe


e Moçambique é produzida essencialmente em português, com pouca ocorrência em crioulo
saliente Pires Laranjeira. A criação em língua crioula acontece principalmente em Cabo
Verde, local onde existe uma tradição neste sentido. A língua crioula sofreu influência da
língua portuguesa trazida pelos colonizadores o que afetou a produção literária africana.

Barbosa (2008) debate sobre o eurocentrismo[3] e sua interferência negativa para história
africana. Ocorreram mudanças significativas na pesquisa da historiografia africana e do
continente baseada na Escola dos Annales[4]. Por conseguinte Barbosa (2008) cita:

“o eurocentrismo é pensado como ideologia e um paradigma, cujo cerne é formado por uma
estrutura mental de caráter provinciano fundada na crença da superioridade do modo de
vida e do desenvolvimento europeu-ocidental”, (BARBOSA, 2008, p. 87).

Assim sendo, ponderar sobre produções intelectuais e culturais africanas sempre foram
denegridos pelos estereótipos gerados com base no pensamento eurocêntrico. Todavia,
como já relatado, uma forma de abordar essa história pode ser via diálogos literários
especialmente o de matrizes africanas de língua portuguesa como enfatiza Amâncio (2008).

Continuando nos pensamentos de Amâncio (2008), as literaturas de matrizes africanas


surgem em um cenário político, bem como em um ambiente cercado de lutas e estratégias
desenvolvidas pelos autores nas ações efetivadas contra a dominação colonial posta na
África. Neste contexto Pesavento (2008) explana:

“Neste cruzamento que se estabelece entre história e literatura, o historiador se vale do texto
literário não mais como ilustração do contexto em estudo, como um dado a mais, para
compor uma paisagem dada. O texto literário lhe vale como porta de entrada às
sensibilidades de um outro tempo, justo como aquela fonte privilegiada que pode acessar
elementos do passado que outros documentos não proporcionam”, (PESAVENTO, 2008, p.
113).

Dessa forma, na instrução de História, as indagações relacionadas ao tempo, ou às formas


de se entender as diversas fases do tempo, poderão ser levadas para as salas de aulas da
Educação Básica pelo professor. Os textos literários, cheios de metáforas podem ser usados
perfeitamente, utilizando essa abordagem pedagógica de ensino. Nas palavras do autor
Laranjeira (2001):

A formação e o desenvolvimento das literaturas africanas de língua portuguesa, desde o


primeiro livro impresso em 1849, ate a atualidade, passaram pela construção do ideal
nacional no discurso. No discurso literário, o nacionalismo foi a antecipação da
nacionalidade, modo específico de a escrita se naturalizar como própria de uma Nação-
Estado em germinação. A consciência nacional, no discurso literário, atravessou, assim,
diversos estádios de evolução, desde meados do século XIX ate a atualidade.
(LARANJEIRA, 2001, p. 185).

A literatura pode fornecer outras formas de interpretação, criar novas sensibilidades aos
leitores e alunos no ensino de História nas escolas de Educação Básica e, assim, realizar a
implementação da Lei 10639/2003[5], e disponibilizar um ensino questionador e cauteloso.
Para Pesavento (2008), o uso de textos literários no ensinamento de História poderá levar a
compressão, esclarecimento e discussão a um melhor entendimento do “real e de verdade,
que uma narrativa histórica pode produzir, tomando o lugar do que teria acontecido um
dia”, (PESAVENTO, 2008, p. 84).

A conexão entre literatura e historia revela um campo de investigação em que as duas se


concluem, e são meios que o homem utiliza para pensar no mundo real. A literatura pode
ser considerada um processo inconsciente que concede uma entrada privilegiada a uma
temporalidade transcorrida. Como relata Sevcenko (1989):

“a produção literária revela todo o seu potencial como documento, como uma instancia
complexa, repleta das mais variadas significações que incorpora a historia em todos os seus
aspectos”. (SEVCENKO, 1989, p.246).

Vale salientar que os países africanos de idioma português têm sua própria história e
experiências, cada um tem suas típicas composições étnicas distintas, os trajetos políticos
culturais são diferentes, mas sofreram e lutaram de maneiras diferentes contra a violência
do colonizador. A luta contra a escravidão foi um laço forte entre estes países, que os
uniram. Conforme Hernandez (2005):

A aproximação entre os países africanos, mais do que por motivo de ordem estrutural, é
possibilitada pelos efeitos do colonialismo, com o agravamento da crise econômica e o
endividamento externo, alem das serias conseqüências da repressão. A união se impõe, a
despeito da diversidade de matrizes ideológicos e políticos dos movimentos nacionalistas
dos diferentes países africanos. (HERNANDEZ, 2005, p.162).

Novas diretrizes foram inseridas no estudo da história e cultura afro-brasileira e africana, os


professores têm que ensinar aos alunos a cultura afro-brasileira como componente e
criadora da sociedade brasileira. Os negros são classificados como sujeitos históricos e
devem ser valorizados.
Os pensamentos e as ideias de pessoas marcantes na história negra brasileira devem ser
ensinados, assim como a cultura, culinária, música, dança e as religiões de matrizes
africanas.

A promulgação da Lei 10639/03 foi em homenagem a morte de Zumbi dos Palmares. Neste
dia, também, se comemora o dia da consciência negra. A data é marcada pela luta contra o
preconceito racial. A referida Lei torna-se obrigatório o ensino da história e cultura afro-
brasileira em todas as escolas públicas e particulares, e vai do ensino fundamental ao médio.

A África e sua História de Colonização


A narrativa do português, na África, está diretamente associada com a sequência de
colonização portuguesa no continente, a ocupação dos portugueses no continente aconteceu
em Ceuta por volta do ano de 1415. Com dimensões enormes e riquezas incalculáveis, o
explorador preferiu a exploração do tráfico negreiro, e esta atividade rendeu muitos lucros
para a Coroa.

No período da segunda metade do século XV, os portugueses criaram feitorias nos portos
do litoral oeste africano. As feitorias foram importantes para o abastecimento das caravelas
que navegavam em direção as Índias e, depois, para o embarque das pessoas que foram
escravizadas e seriam enviadas para a América. A mão de obra barata e escrava eram
designadas para os engenhos de açúcar instalados na América Portuguesa, Ilha da Madeira
em São Tomé.

O português efetivou-se, fortemente, como língua falada em Moçambique e Angola, nos


outros países africanos, o português é usado no dia a dia juntamente com as outras línguas
nacionais ou crioulos de origem portuguesa. O português falado nestes países africanos foi
ficando distante daquele falado na Europa, por causa da influência das línguas locais.

A língua portuguesa é o idioma oficial de cinco países africanos são eles: Angola, Guiné-
Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Moçambique, Guiné Equatorial (adotou o
idioma português recentemente). O português tornou-se o idioma utilizado no ensino, na
imprensa, na administração e nas relações internacionais destes países.

Os PALOP (Países Africanos de Língua Portuguesa) se uniram e firmaram vários


protocolos de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento em áreas como educação,
economia, cultura, preservação da língua portuguesa e diplomacia. Por causa das guerras
civis em Angola e Moçambique refugiados migraram para países vizinhos momo África do
Sul, Zâmbia, República Democrática do Congo e Namíbia.
Literatura de Autoafirmação, Resistência e Consolidação da
Identidade Negra
A idealização de diversos movimentos de resistência contra a ocupação da África pelos
europeus, bem como a luta pelos direitos negros contra o racismo fora e dentro da África,
em que inspirou o desenvolvimento de uma literatura comprometida e militante na primeira
metade do século XX.

Nos Estados Unidos e no Haiti, surgiu um movimento chamado Pan-Africanismo de grupos


afrodescendentes que lutavam em prol da criação e afirmação de um passado para a etnia
negra. Os integrantes do movimento buscavam valorização na sociedade e opunham-se às
práticas de interiorização dos africanos e das pessoas afrodescendentes que moravam no
Ocidente. (SANTOS, 2010, p.1).

A alocução Pan-Africanista era valorizar o passado comum de todos os africanos e


afrodescendentes e, também, enaltecer um futuro de grandes vitórias a partir da união
africana. No continente africano, o pan-africanismo começou a ser reconhecido após o fim
da Segunda Guerra Mundial, no momento em que o monopólio europeu sobre a civilização
passou a ser criticado dentro e fora da Europa.

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Alguns estudiosos africanos criticavam o movimento Pan-Africanismo, por achar que ao
sugerir uma África unificada não levava em conta as diversidades e contradições internas de
cada país. Por vezes, os estudiosos relatavam que as lutas fragmentadas eram motivadas por
ideais nacionalistas, e estes ideais eram oriundos da cultura política do colonizador.

Outro movimento de grande repercussão foi à negritude, a qual teve grande amplitude e que
era presente na Europa, África e América. Nas palavras de Diva Damato, a mobilização
teve o foco centralizado na busca da positivação do sentido de “negro” fundamentado na
percepção de orgulho racial, que permitiu vincular à tradição pan-africanista de Du Bois.
(DAMATO, 1983, p.34).

A negritude foi apontada como um dos mais importantes movimentos poético-cultural e


político-social de desaprovação do colonialismo e do racismo. Também, foi um dos
principais recursos ideológicos na luta de libertação africana em busca pela independência.

Um dos objetivos do movimento negritude era a criação de uma consciência negra limpa
sem marcas do passado opressor, a luta pelos direitos civis e conseguir reverter o sentido
depreciativo de elementos que eram ligados ao mundo negro. Com isso, buscava a criação
de uma nova identidade e a nova identidade seria ostentada com orgulho e vibração do povo
negro.

Os escritores queriam mostrar em suas obras uma mensagem de luta anti-colonial e de que
tinham fé nas mudanças e na construção de uma nova consciência racial que superasse as
diferenças de classe e étnicas sua mensagem era um grito de denúncia contra a opressão.
Nas palavras de Laranjeira (2001):

O discurso da Negritude constitui, portanto, a emergência estética da ampla doutrina da


africanidade e da ideologia pan-africanista, contributo inestimável para o fazer literário
segundo uma concepção autonomista que, embora aceitado naturalmente os contributos
culturais variados (políticos, ideológicos, científicos, étnicos, populares, eruditos, etc.)
incluindo os europeus, se atém a princípios autonomistas, africanos, anti-colonialistas,
recusando a submissão aos padrões impostos pelas potencias dominantes. (LARANJEIRA,
2001, p. 53).

O tempo passou e o movimento passou a lutar pela liberdade das colônias africanas das
mãos do europeu. A crítica poética prosseguiu com um caráter mais político. Na década de
50, o grupo negritude movimentou-se para organizar políticas africanas em desfavor da
colonização européia no continente.

Escritores Africanos e Suas Obras Literárias


Ao mesmo tempo em que lutavam por liberdade, os autores de obras literárias começam a
aparecer e a espalhar seus ideais através de seus livros e tentar mudar os pensamentos de
seu povo através da literatura e da cultura. Os autores buscam suas inspirações literárias na
terra, nos conflitos regionais e nas belezas naturais da região.

Como o continente africano é de dimensões continentais e não seria possível relatar neste
artigo todos os autores e suas obras, mas será mostrado alguns de maior repercussão.

 Wole Soyinka: nascido na Nigéria escreveu obras como: O Leão e a Joia; A Quality
of Violence; The Swamp Dewllers; A Dance in the Forests; The Road; King Baabu.
 Antônio Agostinho Neto: nascido na Angola, escreveu obras como: Quatro Poemas
de Agostinho Neto; Póvoa do Varzim; Casa dos Estudantes do Império; Sagrada
Esperança; Sá da Costa; A Renúncia Impossível; Luanda.
 Nadine Gordimer: nascida na África do Sul escreveu obras como: A Arma da Casa;
The Lying Days; A World of Strangers; Face to Face; A Soldier´s Embrace; Loot.
 Naguib Mahfuz: nascido no Egito escreveu, obras como: Miramar; Trilogia do Cairo;
A Taberna do Gato Preto; Os filhos do Nosso Bairro; Noites das Mil e Uma Noites.
 Mia Couto: nascida em Moçambique, escreveu obras como: Antes de Nascer o
Mundo; Vozes Anoitecidas; Estórias Abensonhadas; O Fio das Missangas; Terra
Sonambula; O Gato e o Escuro; A Confissão da Leoa.
 José Eduardo Agualusa: nascido em Angola, escreveu obras como: A Conjura; A
Feira dos Assombrados; Estação das Chuvas; Nação Crioula; Um Estranho em Goa;
O vendedor de Passados; Teoria Geral do Esquecimento.
 José Luandino Vieira:  nascido em Angola, escreveu obras como: A Cidade e a
Infância; Luanda; A vida Verdadeira de Domingos Xavier; Nosso Musseque; O Livro
dos Rios;
 Paulina Chiziane: nascida em Moçambique, escreveu obras como: Niketche; Uma
História de Poligamia; Balada de Amor ao Vento; O Alegre Canto de Perdiz; Na Mao
de Deus;
 Artur Carlos Mauricio Pestana dos Santos (Pepetela) nascido em Angola, escreveu
obras como: O Planalto e a Estepe; As Aventuras de Ngunga; O Cão e os Caluandas;
Geração de Utopias; Mayombe;
Caminhos Históricos
A ligação entre portugueses e africanos foi pactuada no século XV, as relações eram pelas
feitorias de captura de escravos que eram destinados às economias de plantations na
América em principal o Brasil. Com o término do tráfico e a independência brasileira, os
colonizadores começam a pensar na necessidade de criar um novo império.

Conforme Valentin (2000), os portugueses criaram a ideia de que a África não poderia viver
sem o império devido ao fato de a Espanha estar olhando para o continente africano, para
isso, deveriam construir um novo Brasil.

 “A ideia vai marcar todo o pensamento nacionalista português dos séculos XIX e XX, que
vê na construção de um novo sistema colonial a preservação da herança histórica e a
garantia da existência na nação”. (VALENTIN, 2000, p. 181).

A grande arma do imperialismo é o poder que tem em nomear e rotular. Os pensamentos


dos dominantes são preconceituosos e proporcionou reflexões confusas sobre a África.  As
opiniões racistas e preconceituosas foram legitimadas e inseridas na comunidade cientifica,
o que gerou um pensamento político para reafirmar a superioridade ocidental e amparar à
invasão europeia a África.

A dialética colonialista introduziu o discurso da inferioridade para defender seus métodos e


ações na continente africano, o prestígio europeu seria uma benesse para aquele povo
atrasado. O estilo de vida europeu serviria de espelho para aquele povo modelar seus modos
e caminhar para e evolução humana. Segundo Fanon (2005).
[...] o colonialismo não se contenta em impor a sua lei ao presente e ao futuro do dominado.
O colonialismo não se contenta com encerrar o povo nas suas redes, com esvaziar a cabeça
do colonizado de qualquer forma e de qualquer conteúdo. Por uma espécie de perversão da
lógica, orienta-se para o passado do povo oprimido, distorce-o, desfigura-o e aniquila-o.
(FANON, 2005, p. 244).

Somando-se a toda esta história, as literaturas africanas despertam com a ideia de recusa do
pensamento colonial, transforma-se em um espaço de protesto, contestação e rejeição. O
propósito é reescrever sua história e não aceitar ser um pelego da historiografia ocidental. A
inserção de elementos da oralidade, a desestruturação gramatical da língua oficial, o
comprometimento político e a utilização de expressões nativas, são a vontade dos escritores
em se distanciar da visão colonial.

Contar história vem da base da conjuntura humana e está alusivo com a obrigação de
resgatar a experiência da perpetuidade e da fragilidade da vida. A presença da oralidade na
África está diretamente ligada à magnitude da memória e do testemunho. O discernimento
sobre a África será possível por meio desta herança de conhecimento que pacientemente é
transmitido de boca ao ouvido.

A oralidade é um dos elementos que representam a cultura africana e invadem a escrita


formal da língua portuguesa, admitindo um novo papel e, assim, concedendo outro tom as
narrativas. A comunicação oral é um dos fundamentais temas das literaturas, muitas das
vezes por ser uma marca das ideologias nacionalistas.

A integração de elementos da oralidade, a desestruturação gramatical da língua oficial, a


denúncia, o comprometimento político, a utilização de dialetos e expressões nativas,
caracterizam a angustia dos escritores em se distanciar do colonialismo e constituir algo que
fosse visto como genuinamente africano, criar um contra discurso colonialista.

Nesse sentido, a oralidade foi utilizada como estratégia para desfazer a imagem construída
pelo ocidente em relação à África.  A admissão dessa nova forma de narrativa nas obras
literárias foi à forma que os autores acharam para evidenciar as características marcantes
das culturas locais que foram menosprezadas pelo colonizador. Dessa forma, valorizando a
oralidade é possível exaltar a sabedoria milenar do povo e o seu passado que foi guardado
na memória, e contado verbalmente ao longo do tempo para as gerações futuras. Segundo
Hernandez (2005).

A predominância da oralidade na África é resultante de condições históricas (...). Apesar


disso, muitos críticos partem do princípio de que há algo de ontologicamente oral em
África, e que a escrita é um acontecimento disjuntivo e alienígeno. (HERNANDEZ, 2005,
p.169).

As literaturas escritas em língua portuguesa coincidem na flexibilidade das narrativas,


juntando o novo com o antigo, a escrita com a oralidade, num discurso heterogêneo. Resulta
em uma escrita mestiça, resultado dos diálogos entre as formas de escrita européias e as
nativas, as palavras falam entre o que poderá ser e o que já se foi, procuram uma identidade
ao exercício incessante da sobrevivência nas diferenças.

A literatura africana em língua portuguesa nasceu através de vozes que se uniram pelo
mesmo ideal, elas transmitiram as atrocidades sofridas pelo seu povo, o seu sonho de
liberdade e de luta pela independência. Suas belezas e riquezas foram descritos em prosas e
versos que ultrapassaram as fronteiras do continente e ajudou a escrever toda a sua história.

No endossamento de Rita Chaves e Tânia Macedo (2007), em réplica à indagação sobre


qual lugar ocupa a literatura em um local destroçado pela miséria, analfabetismo,
confrontos armados e a péssima qualidade de vida.

Se nos deixarmos levar pela lógica das estatísticas, temos de assinalar que, de fato, a
atividade literária da África não supera a marca do traço. Porem, segundo Mia Couto, um de
seus maiores prestigiados escritores, essa duríssima realidade não pode ser vista como um
impedimento para o lugar de sonho que a literatura também pode abrigar (CHAVES;
MACEDO, 2007, p. 44).

As literaturas foram e são locais de protestos, representação de sentimentos e ideias,


permanecem empenhada e vigilante no seu dever de pensar em uma África melhor. Sua
missão é desmontar as estranhezas e idéias de uma cultura genuinamente africana, seu
estudo deve presumir o homem mestiço, a cultura hibrida e a experiência colonial. 

Ocorreu a criação de novos produtos culturais que foram marcados por histórias de
mudanças desde período pós-colonial, gerando, portanto, o sujeito híbrido culturalmente
que nasceu na poesia Identidade de Mia Couto que começa com a significadora frase:
“Preciso ser um outro para ser eu mesmo (...)”.

Considerações Finais
A literatura africana em língua portuguesa teve uma importância muito grande na
construção cultural e histórica das ex-colônias portuguesas na África. Utilizando a
linguagem dos colonizadores, os escritores de maneira criativa e inovadora, construíram nas
últimas décadas uma tradição literária que se evidencia de forma própria em cada nação.
Os autores africanos conseguiram passar em suas obras a forma de pensar de seu povo, sua
cultura, sua terra e, principalmente, expressar de forma clara seus sentimentos e emoções.
Os escritores procuraram afastar os horrores vividos pelo povo no período colonial e,
também, na época das guerras.

Uma das maiores lições que os autores deixaram em seus livros, foi o pensamento de que a
África negra não pode, nem deve ser considerado um estorvo para o mundo, deve-se pensar
nela como um pequeno desafio não somente na parte literária, mas, em toda forma de
expressão humana, busca-se contribuir com a África de forma honesta e levar esperança ao
seu povo.

Com o poder da educação e argumentação pode-se lutar por mudanças e conseguir ter um
mundo melhor. No momento atual, percebe-se que a literatura africana encantou o mundo,
com seus grandes autores expressando de maneira natural seus sonhos e anseios para com
sua terra.

A literatura africana em língua portuguesa passou por diversas etapas para construir sua
identidade cultural. As manifestações artísticas e culturais que antes eram oprimidas pelos
governos tiranos, hoje são mostradas ao mundo e tornaram-se muito interessantes.

Ainda há muito que aprender sobre as literaturas africanas em língua portuguesa no Brasil,
por isso existe a Lei 10639 em que tornou obrigatório o ensino da Literatura, História,
Cultura Africana e Afro-brasileira nas escolas, fazendo com que aumente a curiosidade das
pessoas sobre as literaturas africanas.

A literatura pode ser entendida como um condutor que contorna os obstáculos sofridos pelo
povo africano, e tornou-se um instrumento de criação da realidade social.

REFERÊNCIAS
AMÂNCIO, I.M. da C. 2008a. Lei 10.639/03, Cotidiano Escolar e Literaturas de Matrizes
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GOMES; M.L. dos S. JORGE, Literaturas africanas e afro-brasileiras na prática
pedagógica. Belo Horizonte, Autêntica, p. 31-46.

AUGEL, M. (2007). O Desafio do Escombro: Nação, identidades e pós-colonialismo na


literatura da Guiné-Bissau. Rio de Janeiro: Garamond.

BARBOSA, M.S. 2008. Eurocentrismo, história e história da África. Revista de História da


África e de Estudos da Diáspora Africana, 1:1-17.
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[1] Graduado em Gestão Pública, Filosofia e Licenciado em Letras - Língua Portuguesa; e-mail:


wendelf.lima@yahoo.com.br

[2] É o estudo descritivo da cultura dos povos, língua, raça, religião, hábitos etc., como também as
manifestações materiais de suas atividades. É a ciência das etnias. Do grego ethos (cultura) + graphe (escrita).

[3] Modo de julgar o mundo a partir de um ponto de vista europeu. Característica da pessoa eurocêntrica, que
busca compreender o mundo tendo em conta somente valores europeus.

[4] Movimento historiográfico surgido na França, durante a primeira metade do século XX. O novo movimento
colocou em questionamento a história tradicional e apresentava novos elementos para o conhecimento da
sociedade.

[5] Lei que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir na Rede de Ensino a
obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-brasileira.

Publicado por: WENDEL FERREIRA LIMA

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