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O filme Ilha do Medo (2010), produzido por Martin Scorsese, é uma ideia
consolidada de como um enredo misterioso e perturbador pode intrigar os telespectadores do
início ao fim, provocando diversas reflexões acerca do conflito psíquico, a moral, a
consciência e a loucura, reverberando a necessidade de uma análise psicológica dos
personagens nesse contexto, e nesse caso, fundamentada à luz dos estudos e teóricos da
fenomenologia. Nessa perspectiva, a trama se passa em um hospital psiquiátrico, onde Teddy
Daniels é um detetive investigativo e vai, em conjunto com o seu parceiro Chuck, investigar
o sumiço de uma das pacientes mais perigosas da ala ‘’C’’, presa e internada por ter matado
os seus três filhos afogados. Ao longo do filme, a narrativa do personagem investigativo vai
dando origem a uma série de fatos que revelam que, na verdade, Teddy Daniels era um
paciente daquele mesmo hospital e estava lá por ter assassinado a sua própria esposa,
chamado de Andrew Laeddis.
Segundo Moura [s.d], toda consciência é consciência de alguma coisa. Sendo assim,
só produzimos consciência daquilo que já temos conhecimento e, a partir disso, direcionamos
a consciência para produzir algum significado sobre alguma situação. No filme, Andrew está
disposto a viver uma ilusão para que não seja necessário não tomar consciência da realidade
que o assombra, deixando claro ao telespectador o motivo evidente o motivo pelo qual ele
estava sentindo e imaginando tudo aquilo. Durante o filme, há uma cena que revela isso:
O personagem Andrew é acusado de matar a sua esposa após saber que ela matou os
seus três filhos afogados no lago de sua casa. Durante o filme, pode-se perceber que a sua
esposa possui Transtorno Maníaco-Depressivo e Andrew se sente culpado por não ter
cuidado dela como deveria e ter-a deixado na responsabilidade de cuidar dos filhos enquanto
estava naquela situação. O personagem também apresenta traumas relacionados ao tempo que
foi soldado durante a Segunda Guerra Mundial, a qual contribui para o sofrimento psíquico
do personagem. Desse modo, o protagonista se depara em um estado de inconformidade e se
torna uma pessoa agressiva e com traços paranóides. Assim, o filme propõe que o
personagem se projete na situação real, vivendo um psicodrama e criando uma dramatização
de modo a resgatar a sua espontaneidade, bem como entrar em contato com os seus conflitos
internos (Gonçalves, 1988) que são veementemente negados pelo personagem. Desse modo,
os instrumentos utilizados em uma psicoterapia de psicodrama visam propiciar uma situação
para que o indivíduo encontre os papéis internalizados que ele vem evitando ou
desempenhando uma postura não espontânea espontaneidade.
Ainda assim, durante essa dramatização da realidade percebe-se que ele ainda não
conseguia lidar sozinho com a raiva que ele sentia da sua esposa (Dolores Chanal) por ter
assassinado seus próprios filhos, por mais que ele a amasse muito, foi necessário a criação e a
incorporação de Andrew no personagem Teddy (detetive), em busca de depositar a raiva que
ele sentia, no caso da Rachel Solano, mulher que estaria investigando o seu possível sumiço
da ala ‘’c’’. A Rachel Solano nada mais é do que uma representação da vida da sua esposa, a
qual ele matou. Nesse sentido, para o Existencialismo, a apropriação do real pelo personagem
foi tão doloroso que ele preferiu manter-se no imaginário. Ao retornar para o imaginário,
possivelmente ele teve de escolher uma determinada estrutura de escolha, o que gerou uma
insuportabilidade no personagem. Desse modo, foi necessária a criação de uma outra
realidade consolidada para ele aceitar os acontecimentos.
Ao final do filme, Andrew fala para Chuck a seguinte frase “O que é menos pior:
viver como um monstro ou morrer como um homem bom?’’, induzindo que ele compreende a
realidade, contudo, não consegue aceitar. De acordo com o pensar fenomenológico, a
consciência apenas é interrompida pela morte, devido a uma condição de relação com o
mundo. Assim, subentende-se que o personagem preferiu perder uma parte da consciência do
que viver a realidade. Para ele, morrer como um herói seria melhor do que viver com a culpa
de não ter cuidado dos filhos e ter o sentimento que causou a morte da sua família.
Referências bibliográficas
A Ilha do medo. (2010). Direção: Martin Scorsese. Produção: Martin Scorsese et al.
Estados Unidos: Paramount Pictures.
Gonçalves, C. S., Wolf, J. R. & Almeida, W. C. (1988). Lições de psicodrama:
introdução ao pensamento de JL Moreno. Editora Agora
Moura, C. A. R. Husserl: intencionalidade e fenomenologia. Mente,Cérebro &
Filosofia. ISBN 978-85-99535-28- 8, v.5, p.6-15.