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A INTENCIONALIDADE COMUNICATIVA DA TRANSIÇÃO DO NOME

MIKHÁYHU (‫ )מיכיהו‬PARA MIKHÁH (‫ )מיכה‬EM JUÍZES 17-18

‫ִמיָכה‬ Ü ‫ִמיָכ ְיהוּ‬


MIKHÁH Ü MIKHÁYHU

QUEM É COMO YAHVÉH? Þ QUEM É COMO YA(H)?

Prof. Pr. Fabiano Ferreira


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MIKHÁYHU (‫ )מיכיהו‬PARA MIKHÁH (‫ )מיכה‬EM JUÍZES 17-18

Buscar a intencionalidade comunicativa do texto, que é a um tempo a intenção


comunicativa de seu autor, é uma das tarefas essenciais na interpretação textual.
A percepção da forma nos leva a ficar atentos em relação à tessitura textual para
entendermos por que o autor disse o que disse da forma que disse. Sendo assim,
o modo de textualização sempre pode reservar pistas importantes que só serão
percebidas pelo leitor atento e que sempre mantém o texto original aberto à sua
frente, em se tratando de interpretação bíblica ou de outro texto qualquer que tenha
sido traduzido de uma língua original (LO) para uma língua receptora (LR) da
tradução.

É exatamente este o caso de Juízes 17 quando o leitor atento percebe várias pistas
linguísticas importantes. Dentre estas, destaca-se a utilização de uma variação
proposital no nome da personagem principal, Mica. Dependendo da versão
utilizada, tal diferença sequer será notada pelos leitores. Apenas quem acessa o
texto hebraico original perceberá esta diferença significativa. Deste modo,
entramos na fase que diversos autores consideram como da análise do texto na
língua fonte para encontrar o sentido, da percepção e da análise do significado,

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da exegese do sentido atrelada ao significado original, da deverbalização, enfim


a fase da compreensão, que se constitui na fase da busca da intenção
comunicativa do autor do texto original refletida inteiramente no texto que foi
traduzido.

Nos versículos de 1 a 4, o autor utiliza uma forma do nome-sentença, Mikháyhu


(‫)ִמיָכ ְיהוּ‬, que significa Quem é como Javé (Yahveh) (‫)מיכיהו‬, onde temos o
Tetragrama (‫ )יהוה‬com uma apócope da última consoante ‫ה‬. A partir do versículo
5, esse personagem só é referido como Mikháh (‫ )מיכה‬que significa Quem é como
Yah, ainda que só apareça o ‫ ה‬da primeira sílaba ‫ יה‬do Tetragrama em seu nome a
partir de Jz 17.5 a 18.31, ocorrendo 19 vezes de Jz 17.5 a Jz 18.31. O nome de
Deus forma final a partir de Jz 17.5, Mikháh (‫)מיכה‬, aparece propositalmente de
modo mais suprimido do que em Mikháyhu (‫)מיכיהו‬, onde temos uma aférese da
1

apócope ‫ יה‬do Tetragrama (‫)יהוה‬, sobrando apenas ‫ה‬. Este fenômeno justifica a
1 Processos fonológicos de supressão
§ Aférese: supressão no início da palavra
§ avantagem » vantagem
§ Síncope: supressão no meio da palavra
§ vinrá » virá
§ Apócope: supressão no fim da palavra
§ mundanal » mundano

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intencionalidade comunicativa do autor de que o nome de Mica (Mikháh [‫)]מיכה‬


reflita parcamente os resquícios do que poderia ser realmente o culto original
ensinado por Javé (‫ )יהוה‬em sua Torá, no Pentateuco, na Lei de Deus.

Concordo com Paulus Cassel, no Comentário de Lange, que o narrador tenciona


a chamar a atenção para o pecado de Mica e de sua mãe, por meio de alguns toques
delicados. Até então, este homem sempre se chamara na narrativa de Mikháyhu,
com o nome de Javé distintamente aparente em forma apocopada ‫יהו‬. Mas, a partir
do v. 5 , onde ele estabelece seu santuário, ele é mencionado apenas como Mikháh
[‫]מיכה‬. Isto é um indicativo de que o nome de Deus não devia ser profanado nele,
cujo nome tem de ser mudado por não refletir a realidade do seu caráter e de suas
práticas sincréticas abomináveis. Portar o santo nome de Deus com suas práticas
idolátricas e a aberração de contratar um sacerdote levita de Javé para ministrar
seu culto idolátrico é uma das piores profanações a que se poderia submeter
alguém que originalmente possuía em seu nome parte do santíssimo nome de Javé.
E embora Mica fale de “Javé” ( 5.13 ), sua casa é chamada apenas de Beth Elohim
(‫ — )ֵבּית ֱא~ִהים‬um nome também dado aos templos de divindades pagãs — não

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Beth Javé (‫)ֵבּית יהוה‬, casa de Javé. Portanto, Beth Elohim (Casa de Deus) deve ser
traduzido aqui como beth elohim (casa de deuses).

Em síntese, a intenção comunicativa do autor ao promover uma corruptela no


nome original de Makháyhu (‫ )מיכיהו‬para Mikháh (‫ )מיכה‬tem por objetivo destacar
sutilmente que esse sincretismo promovido por Mica e sua mãe foram criados ao
arrepio de tudo quanto positivamente ensina a Torá, a Lei de Deus. O Deus
verdadeiro nada tinha a ver com isso a não ser deixar cair sobre esses idólatras
sincretistas a maldição outrora pronunciada, para não ser exaustivo, em Êx 20.3-
7 e Dt 27.15.

“3Não terás outros deuses diante de mim.


4
Não farás para ti imagem de escultura, nem semelhança alguma do que há em
cima nos céus, nem embaixo na terra, nem nas águas debaixo da terra.
5
Não as adorarás, nem lhes darás culto; porque eu sou o Senhor, teu Deus, Deus
zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos até à terceira e quarta geração
daqueles que me aborrecem

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MIKHÁYHU (‫ )מיכיהו‬PARA MIKHÁH (‫ )מיכה‬EM JUÍZES 17-18

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e faço misericórdia até mil gerações daqueles que me amam e guardam os meus
mandamentos.” (Êx 20.3-6)

“7Não tomarás o nome do Senhor, teu Deus, em vão, porque o Senhor não terá
por inocente o que tomar o seu nome em vão. (Êx 20.7)

“15Maldito o homem que fizer imagem de escultura ou de fundição,


\
abominável ao Senhor, obra de artífice, e a puser em lugar oculto. E todo o povo
responderá: Amém! (Dt 27.15)

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