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horizontal.

Os degraus são visíveis apenas pela tonalidade azul-esverdeada


mais intensa a cada passo. O corpo gradualmente desce entre as monumen-
tais pedras até o fundo da piscina. A temperatura é amena, 32°C segundo
um discreto numeral de latão em uma das paredes internas. No centro, os
blocos monumentais de pedra me rodeiam e cortam as visuais externas, me
distanciando da realidade que parece distante como um murmúrio que foi
deixado para trás. As aberturas zenitais azuis direcionam o olhar e o corpo
resolve boiar e apreciar de frente a composição. As frestas de luz rodeiam
todo o perímetro da cobertura acima da piscina, soltando esse volume. E
assim como a massa do meu corpo boia sobre a água, aquela espessa e pe-
sada massa parece flutuar sobre minha cabeça, gerando uma certa estranhe-
za, mas também admiração. Apenas o som ou a agitação da água gerada por
F14. Quadro de sensação: outros visitantes me conecta novamente com a realidade.
Piscina interna
O som na terma é uma constante, o movimento da água e as conversas entre os
banhistas refletem entre as paredes e a falta do visual ludibria o ponto de origem. É
interessante que a grande parte do contato com as outras pessoas é apenas pelo som,
como um labirinto onde a visão é restrita e a audição e intuição seu melhor guia.

Ao sair da piscina central sinto um pouco de frio, e vou de encontro ao


“Fire Bath”, a única entrada que revela seu interior, sendo possível ver as
paredes de concreto vermelhas que envolvem o espaço. Ao descer o primei-
ro degrau meu corpo para, em choque com o calor de 42°C, mas continuo.
O formigamento gerado pelo calor vai subindo, beirando ao agradável,
porém após um tempo o corpo se acostuma e começa a relaxar. O piso e
o banco são uma mistura de pequenas pedras agregadas por um cimento
vermelho e polidas, criando uma sensação tátil diferente da pedra de Vals.
A parede abaixo da água é branca e uma luz artificial no lado oposto incide
perpendicularmente e acende o ambiente. Água como luminária. A cor
vermelha parece intensificar a temperatura do espaço e parte dela escorre
sobre a pintura branca, como se o cômodo estivesse derretendo junto con-
F15. Quadro de sensação: tigo. Ao sentar-se de frente para a entrada vejo a entrada para o “Ice Bath”,
Fire Bath para os aventureiros esse é seu próximo destino. Daqui posso avaliar se alguém en-
trou, visualmente ou pelos berros que alguns soltam ao entrar na água gelada. Apesar
de relaxante, o banho quente é pontual, o calor intenso começa a amolecer o corpo,
dando uma sensação de fraqueza se prolongar sua estadia em demasia.

A configuração do espaço já te induz a sair do “Fire Bath” e ir ao “Ice


Bath”, pois estão bem em frente um do outro. Em croquis anteriores havia
um único bloco que abrigava ambos, relacionando-se ao intuito dos banhos
antigos do choque térmico como ápice do prazer do banho. A entrada do
“Ice Bath” não revela seu interior, o corpo deve virar à direita e descobrir
um espaço pequeno, para apenas uma pessoa, todo em azul. Acima da linha
d’água o concreto possuiu um pigmento azul de tonalidade forte, abaixo
e no piso agregados com cimentado azulado são iluminados por uma luz
baixa. Jatos perturbam a água e criam reflexos dançantes na parede e o
material submerso parece cascalho no leito de um rio. Aqui deve-se entrar
de uma vez, pois os 14°C são eletrizantes, não é a toa que algumas pessoas
soltam berros ao experienciar esse banho. O material do piso é bem áspero
F16. Quadro de sensação: e parece acentuar esse choque e desconforto dos primeiros segundos. Aqui
Cold Bath não há banco, pois é um local de imersão e não estadia. Após esse choque os sen-

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F17. Experiência Banhos: à esquerda, entrada Fire Bath; interior Fire Bath; passagem Fire Bath; vista entrada
Cold Bath da saída do Fire Bath; entrada Colc Bath; passagem Cold Bath; entrada Flower Bath; chuveiro Flower
Bath; passagem Flower Bath. JC0220.

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tidos parecem estar mais acordados. Muitos banhistas retornam ao “Fire Bath” e
ficam nesse vai e vem por algum tempo. Particularmente, prefiro terminar essa dupla
com um banho quente, pois me despeço com calor e não passo frio ao deambular
pelo espaço geral. Porém ao retornar aos 42°C a sensação é gritante, minha pele e o
cômodo parecem em chamas.

Em movimento horário o próximo bloco é o “Shower Stone”, a entrada


mostra uma parede grossa de separação entre as três duchas que aqui se en-
contram. Ao entrar o piso é áspero e de tonalidade cinza escuro, as paredes
pretas sobem e perdem-se de vista. A iluminação localiza-se em cima das
duchas, jogando uma luz cônica teatral sobre o corpo que está a banhar-se.
A água pode ser quente ou fria, em jato único e forte, ducha larga com
bastante pressão, ou controlada por uma mangueira. A envoltória preta
proporciona uma experiência individual e parece atenuar o sentido visual e
aguçar a sensação tátil da água que escorre, o piso áspero sob os pés descal-
ços parece me aterrar ao chão.

Ao sair do “Shower Stone” ao invés de continuar o caminho circular, a


entrada para o “Sound Bath” chama minha atenção. Sugestões desse espaço
F18. Quadro de sensação:
Shower Stone apareceram no primeiro vislumbre da terma no corredor dos vestiários. A
entrada fica logo à esquerda ao descer a escada de entrada, porém não é
evidente, ocultando a jóia que é essa experiência. A única indicação de sua
existência é o som gerado pelas pessoas mais entusiasmadas que estão a
testar suas qualidades sonoras. Porém, o som viaja pelo espaço interno da
terma de forma quase irrastreável, iniciando uma busca pela sua origem.
Adentrando a água a 35°C, viro a direta e deparo-me com um paredão de
pedra. O espaço estreito dá a impressão de uma altura mais imponente, uma
sensação de pequenez. Agora é possível ver um corredor baixo, estreito e
meio submerso que dá acesso à câmara de banho, a proximidade com os
materiais parece torná-los mais palpáveis e potentes. O movimento da água
e iluminação no piso geram reflexos que dançam freneticamente nos limites
dessa estreita passagem e na parede em frente. A sensação é de surpresa,
a envoltória de pedra lisa e maciez da água enquadra, sem nenhum aviso
F19. Quadro de sensação:
Sound Bath
prévio, uma textura áspera e irregular da mesma pedra de Vals. No limiar da câmara
o liso transforma-se em áspero, duas facetas da mesma pedra que geram sensações
completamente diferentes. A textura irregular intensifica a sensação de movimento
do espaço, o material acende e gera sombras que parecem dançar em conjunto com
a água. No interior, a movimentação da água é tão forte que a perturbação causada
pelo movimento dos corpos é imperceptível, e esse movimento massageia levemente
a pele. A proporção do espaço e a superfície irregular, que constrói diferentes ân-
gulos de reflexão sonora, intensificam e prolongam os sons, principalmente os mais
graves. Banhistas testam diferentes sons, divertem-se e surpreendem-se. A difusão do
som é tamanha, que se alguém está a fazer um barulho com a boca fechada é muito
difícil adivinhar sua origem. O percurso de entrada e as características do espaço
recordam a experiência de explorar e encontrar um nicho cavernoso incrível. Apesar
de milimetricamente projetado pelo homem, esse espaço parece me aproximar da na-
tureza, ou pelo menos ponderar sobre. O cheiro de cloro é perceptível, o tratamento
com ozônio utilizado em todo o restante teve que ser modificado pelo banho ser tão
escondido, pois um pequeno erro de cálculo na injeção do composto poderia deixar
um banhista inconsciente.

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F20. Experiência Banhos: entrada Shower Stone; interior escuro Shower Stone; uma das duchas no Shower
Stone; entrada Sound Bath, entre o bloco dos vestiários e entrada externa para o spa; entrada Sound Bath; pas-
sagem Sound Bath; paredes interior Sound Bath; vista interna da entrada do Sound Bath; vista ao voltar para o
salão central. JC0220.

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Voltando à rota original, o próximo bloco de banho é o “Flower Bath”,
com entrada mais prolongada, o corredor possui um espaço de ducha à
direita, para retirar as pétalas que permanecem após o banho. Ao final do
corredor o corpo vira a direita e desce os degraus. As paredes e teto são
de concreto preto, abaixo da linha d’água uma pintura branca e o piso um
cinza-claro polido. Jatos movimentam as pétalas de cravo amarelo que
ficam mais evidentes pela iluminação do fundo branco. Há um cheiro floral
agradável, mas que não é proveniente das pétalas: um funcionário aciona
uma máquina no piso inferior que pulveriza o aroma por uma discreta saída
embutida no concreto. É um espaço muito tranquilo, onde pessoas costu-
mam ficar mais tempo que nos outros banhos, pois a temperatura da água
é mais deleitável, 33°C, o cheiro é agradável e a sensação relaxante. A parte
F21. Quadro de sensação: superior escura estática e o branco cintilante da água em movimento cria
Flower Bath um contraste calmante, quase hipnotizador ao observar a dança das pétalas.

Virando novamente a esquina, chega-se ao “Sounding Stone”. Pela abertu-


ra apenas o preto da separação entre dois pequenos espaços que abrigam
um colchão revestido em couro preto para que se possa deitar. O piso é de
ripas de madeira, a mesma utilizada nos vestiários e nas espreguiçadeiras.
Ao atravessar a entrada, o som externo é imediatamente abafado, devido
ao revestimento em tecido preto que envolve todo o espaço. Sento-me no
colchão e olho pela porta, sinto uma sensação de estranhamento. O restan-
te está tão próximo visualmente, apenas dois passos, porém tão longínquo
sonoramente, como um ruído de fundo depois de um longo corredor.
Deito-me com a cabeça voltada para a porta, vejo apenas um minúsculo
bulbo de lâmpada muito fraco, com o filamento alaranjado flutuando num
breu. O espaço é aconchegante, quente e apaziguante, o couro logo esquen-
F22. Quadro de sensação: ta e parede derreter com o calor da pele. A instalação sonora Wanderungen
Sounding Stone [Andanças] é do compositor Fritz Hauser, criada em 1996 e tocada com pedras so-
noras feitas pelo escultor Arthur Schneiter. Fecho os olhos e apenas escuto, é tudo o
que o espaço permite. Apesar dos sons serem produzidos por instrumentos de pedra,
meu ouvido leigo apontava algo parecido com sons metálicos, como sinos de vento
que me levam à uma paisagem montanhosa de veraneio ao ar livre. A melodia apa-
rentemente metálica me faz pensar no latão e na pedra de Vals, como os dois soariam
em conjunto. Gongos e tambores também entram no meu imaginário que vai longe
no tempo e espaço. Os diferentes tipos de sons e arranjos deixam-me compenetrada
e passo muitos imperceptíveis minutos aqui dentro. Ao levantar creio que saí de uma
massagem, a sonância relaxante que parece ter massageado por dentro.

Próxima experiência é a “Drinking Stone”. Atravesso a portada e viro logo à direita,


um corredor com degraus alongados, como a escada de entrada, leva a um espa-
ço pequeno e alongado revestido com a mesma pedra, porém com uma sensação
totalmente diferente. A já familiar pedra de Vals em placas estreitas e suave ao toque
encerra ao final do corredor, sofre um corte e é substituída por blocos robustos de
pedra, polidos finamente apenas na face voltada ao interior, dando um leve brilho
e reflexo. Os maciços de pedra são empilhados com espaçadores metálicos e me
remetem a construções de templos antigos, até milenares como Stonehenge, porém
com a finesse do acabamento moderno. O pé descalço sente os veios da peça única
de pedra mais in natura. No centro, um fio de água provém de um cano que surge
entre o espaçamento de dois blocos próximo ao teto. A água derrama sobre um
fosso circular iluminado por baixo no centro da sala, sendo a única fonte de luz. A

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F23. Experiência Drinking Stone e descanso: entrada Drinking Stone; passagem Drinking Stone; continuação da
descoberta; peça central na Drinking Stone; saída água Drinking Stone; vista da entrada no interior do Drinking
Stone; janela com espreguiçadeiras no salão central; vista para entrada de um dos Resting Space; interior
Resting Space. JC0220.

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luminosidade é branca amarelada com pigmentos alaranjados na borda que
oscilam com a perturbação da água, me lembram o sol. No entorno, um
guarda-corpo circular serve de apoio para canecas e correntes também em
latão. Os banhistas posicionam-se à sua volta, enchem a caneca com a água
que vem de cima e bebem. O gosto metálico da água é distinto, acentuado
pelo sabor do copo e pelos sons das correntes tangendo o guarda-corpo
e das pessoas brindando. O som protagonista é o encontro de águas, com
os barulhos metálicos como coadjuvantes. Embora o compartilhamento
de copos com desconhecidos ser inimaginável nas condições atuais, é uma
experiência única, envolta por uma aura de misticismo. A monumentalida-
de dos blocos de pedra projeta uma aura sacra para a veneração da água, a
disposição das pessoas em círculo me remete a um culto. A água iluminada
F24. Quadro de sensação: e borbulhante parece que está brotando das entranhas da terra. Apesar
Drinking Stone do caráter contemporâneo do espaço, há uma qualidade mais profunda, quase anciã,
imagino Druidas cultuando divindades aquáticas no interior de grutas.

Os “Resting Space” ficam nos blocos mais externos do edifício e, diferente


dos espaços de banho que submergem, são elevados. O mais à direita (vide
planta) a altura é ainda maior, apenas ao deitar na espreguiçadeira percebo
o porquê. É aquela alongada e bonita entrada que me chamou a atenção
naquele primeiro enquadramento do interior da terma. Subo oito degraus
e logo em seguida viro à esquerda. Encontro uma cortina de couro preto
de separação, como a dos vestiários. Dentro, todas as faces são escuras,
concreto com pigmento preto para paredes e teto, piso tipo epóxi preto. Pe-
quenas janelas quadradas a aproximadamente 60cm do chão são dispostas
sequencialmente. Para cada janela, uma espreguiçadeira, feita com ripas da
madeira avermelhada e um pequeno travesseiro de couro preto, são esbeltas
e belas. Para cada espreguiçadeira, uma luminária pendente ilumina cabe-
F25. Quadro de sensação: ça e tronco, ideal para ler um livro. Ao deitar-me, o enfoque é a paisagem
Resting Space enquadrada pela janela, todo o resto é suavizado. O barulho característico do espaço
principal fica para trás, abafado pela virada e cortina grossa da entrada. Pela configu-
ração do espaço ser claramente individual, os banhistas tendem a não conversar e o
silêncio reina. O ambiente escuro com mínima textura e sem ornamentação priva de
distrações. A temperatura ambiente é agradável, um pouco mais quente que o espaço
central. A madeira da cadeira possui uma temperatura suave que logo esquenta, sua
estrutura proporciona uma leve massagem, apenas me deixando a par do contato
do corpo com o objeto. A ergonomia é fantástica e perfeita para admirar de frente
a janela. Essa é a mais minimalista possível, uma chapa metálica envolve a cavidade
e o vidro está na extremidade exterior da fachada, sem ser possível identificar um
caixilho. Esse arranjo expõe a espessura completa da parede, como a sensação das
pequenas aberturas nas grossas paredes de castelos atestam sua massa monumental.
Essa robustez enquadra os galhos, no momento sem folhas, das árvores em frente.
Em último plano, a paisagem montanhosa nevada com algumas cabanas de madeira
e pedra. Não se vê o céu. No outro “Resting Space”, a janela está posicionada mais
alta e inclinada para cima, a desviar do edifício do hotel que está em frente. Deitado,
o olhar é direcionado para cima, de encontro a montanha ao fundo. Esta, apesar de
longe, parece ter uma relação mais próxima e mais íntima através desse pequeno re-
corte. A atmosfera é incrivelmente relaxante, estou sozinha com meus pensamentos,
a paisagem é a única lembrança de uma realidade externa.

Um tipo de corredor é formado entre os blocos de banho e os mais externos. Gran-

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F26. Experiência piscina externa: acesso por porta; acesso pela água; vista entre os dois acessos; enquadra-
mento da paisagem; vista no topo do Rock terrace; vista para o vilarejo do Rock terrace; a terma e a montanha;
a terma e a montanha oposta; detalhe gárgulas de água e escada para o Rock terrace. JC0220.

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des janelas do chão ao teto trazem luz natural entre os blocos, estes não são
alinhados, o que reforça mais ainda a definição de volumes separados e não
um plano com aberturas. É o ponto de maior alcance visual, de um lado
uma janela esbelta abre-se para o hotel, do outro a área da piscina externa
com o vale de Vals em continuidade. A piscina externa é separada por uma
parede de vidro e uma porta inteiramente revestida de latão, refletindo um
brilho dourado tímido. Abro a porta e reparo na espessura e peso, impo-
tente. Lá fora é inverno, o vento gelado é cortante e corro para dentro da
piscina. O pavimento está revestido com um piso elevado de plástico vaza-
do duro, provavelmente por causa da neve, o que torna o percurso dolorido
e desagradável. Porém, ao entrar na piscina quente a sensação é soberba, a
água parece te abraçar e proteger do frio externo e o vapor da água encorpa
a atmosfera. Para mim é o ápice da relação interior e exterior, uma pelícu-
F27. Quadro de sensação:
Piscina Externa la de água separa o submerso como extensão do interior da terma e o exterior em
contato direto com a pele exposta. Apesar de externa a piscina é envolta por todos os
lados. Ao fundo o bloco das saunas cria um paredão de pedra, à esquerda o interior
da terma é revelado pelas janelas, à direita um bloco elevado serve de descanso no
verão, a frente dois blocos e suas respectivas lajes emolduram a montanha ao fundo.
Percebo a espessura da laje e a proposta estrutural das “mesas de pedra”. Fica claro
que a laje em balanço ligada a um bloco que vai transmitir seus esforços ao chão. O
piso de pedra parece mais áspero, me aproximando mais da natureza do que uma
piscina de ladrilho. Há três fontes em cano de latão que nascem da água e curvam-se
de volta à mesma, jatos fortes de água massageiam as costas de banhistas. O desenho
da piscina proporciona recantos muito bem apreciados pelos banhistas, alguns acham
conforto nos degraus, outros encostam nas paredes e volumes, a parte central da
piscina é mais para passagem. No paredão há um volume alto a poucos centímetros
abaixo d’água. No verão é um lugar perfeito para ficar deitado ao sol e apreciando o
molhado, porém no inverno serve de apoio aos cotovelos. Alguns acham os jatos de
saída de água e ali ficam por horas. Do outro lado um volume 30cm mais alto que a
água constrói um espaço que no verão é revestido por toalhas para tomar sol. Meu
local preferido é o espaço entre o bloco da “Drinking Stone” e do “Fire Bath”. Os
degraus me permitem sentar e o resguardo me protege do vento e chuva e enqua-
dra meu olhar que desliza pela água, esbarra na horizontalidade do bloco ao fundo
e transborda para a paisagem. O som é completamente diferente do interior, três
fontes produzem um barulho intenso e constante, ouço pássaros, o vento, chuva,
dependendo da hora o sino da Igreja, e as pessoas conversam mais desinibidas, pois
o som não reverbera como no interior. O exterior é o local mais social dessa terma,
diferente das romanas. À noite experiencio o local sem ninguém, os pássaros já não
cantam, o único som é das fontes e do vento intenso esporádico. Não há nenhuma
luz visível no exterior. A paisagem branca transformou-se num quadro de camadas
negras e o vapor da água cria um certo misticismo. Olho fixamente para a escuridão
por muitos minutos, como se algo estivesse à beira de se mexer, aquilo me aterroriza
e me instiga. A adrenalina parece aguçar meus sentidos e tudo fica mais desperto.
De profundidade incompreensível o breu ganha volume e imaginário, como se Mark
Rothko tivesse o pintado. Coincidentemente há um quadro do artista, Untitled (Black
on Grey), que agora me trás essa memória muito vividamente.

Passa do horário de fechar, o encerramento é pontuado pelo som de um gongo. Di-


rijo-me para a outra travessia da piscina externa, sem sair da água atravesso a cortina
de plástico e me deparo com o final da escada de acesso. Saio da piscina, recolho
minha toalha e me dirijo para o vestiário. A terma agora possui uma temperatura de

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cor fria, pois as piscinas iluminadas agora atuam como a maior fonte de luz. A ilumi-
nação pelas frestas do teto já não existe mais e o espaço perde muito de seu encanto
por isso. Enquanto me troco escuto um barulho não familiar. Abro a cortina e ouço
um dos funcionários cantarolando enquanto limpa a piscina e um som forte de água
dentro drenada. Acendem a luz dos fortes refletores, estranheza impera, o edifício
está desprovido de sua qualidade fundamental, a luz natural.

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Desenredar
Atmosferas
IV.

DESENHO, ESBOÇOS DE ESTUDO

F01. Desenho de observação e colagem.


Desenho da autora.

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