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F17. Experiência Banhos: à esquerda, entrada Fire Bath; interior Fire Bath; passagem Fire Bath; vista entrada
Cold Bath da saída do Fire Bath; entrada Colc Bath; passagem Cold Bath; entrada Flower Bath; chuveiro Flower
Bath; passagem Flower Bath. JC0220.
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tidos parecem estar mais acordados. Muitos banhistas retornam ao “Fire Bath” e
ficam nesse vai e vem por algum tempo. Particularmente, prefiro terminar essa dupla
com um banho quente, pois me despeço com calor e não passo frio ao deambular
pelo espaço geral. Porém ao retornar aos 42°C a sensação é gritante, minha pele e o
cômodo parecem em chamas.
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F20. Experiência Banhos: entrada Shower Stone; interior escuro Shower Stone; uma das duchas no Shower
Stone; entrada Sound Bath, entre o bloco dos vestiários e entrada externa para o spa; entrada Sound Bath; pas-
sagem Sound Bath; paredes interior Sound Bath; vista interna da entrada do Sound Bath; vista ao voltar para o
salão central. JC0220.
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Voltando à rota original, o próximo bloco de banho é o “Flower Bath”,
com entrada mais prolongada, o corredor possui um espaço de ducha à
direita, para retirar as pétalas que permanecem após o banho. Ao final do
corredor o corpo vira a direita e desce os degraus. As paredes e teto são
de concreto preto, abaixo da linha d’água uma pintura branca e o piso um
cinza-claro polido. Jatos movimentam as pétalas de cravo amarelo que
ficam mais evidentes pela iluminação do fundo branco. Há um cheiro floral
agradável, mas que não é proveniente das pétalas: um funcionário aciona
uma máquina no piso inferior que pulveriza o aroma por uma discreta saída
embutida no concreto. É um espaço muito tranquilo, onde pessoas costu-
mam ficar mais tempo que nos outros banhos, pois a temperatura da água
é mais deleitável, 33°C, o cheiro é agradável e a sensação relaxante. A parte
F21. Quadro de sensação: superior escura estática e o branco cintilante da água em movimento cria
Flower Bath um contraste calmante, quase hipnotizador ao observar a dança das pétalas.
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F23. Experiência Drinking Stone e descanso: entrada Drinking Stone; passagem Drinking Stone; continuação da
descoberta; peça central na Drinking Stone; saída água Drinking Stone; vista da entrada no interior do Drinking
Stone; janela com espreguiçadeiras no salão central; vista para entrada de um dos Resting Space; interior
Resting Space. JC0220.
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luminosidade é branca amarelada com pigmentos alaranjados na borda que
oscilam com a perturbação da água, me lembram o sol. No entorno, um
guarda-corpo circular serve de apoio para canecas e correntes também em
latão. Os banhistas posicionam-se à sua volta, enchem a caneca com a água
que vem de cima e bebem. O gosto metálico da água é distinto, acentuado
pelo sabor do copo e pelos sons das correntes tangendo o guarda-corpo
e das pessoas brindando. O som protagonista é o encontro de águas, com
os barulhos metálicos como coadjuvantes. Embora o compartilhamento
de copos com desconhecidos ser inimaginável nas condições atuais, é uma
experiência única, envolta por uma aura de misticismo. A monumentalida-
de dos blocos de pedra projeta uma aura sacra para a veneração da água, a
disposição das pessoas em círculo me remete a um culto. A água iluminada
F24. Quadro de sensação: e borbulhante parece que está brotando das entranhas da terra. Apesar
Drinking Stone do caráter contemporâneo do espaço, há uma qualidade mais profunda, quase anciã,
imagino Druidas cultuando divindades aquáticas no interior de grutas.
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F26. Experiência piscina externa: acesso por porta; acesso pela água; vista entre os dois acessos; enquadra-
mento da paisagem; vista no topo do Rock terrace; vista para o vilarejo do Rock terrace; a terma e a montanha;
a terma e a montanha oposta; detalhe gárgulas de água e escada para o Rock terrace. JC0220.
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des janelas do chão ao teto trazem luz natural entre os blocos, estes não são
alinhados, o que reforça mais ainda a definição de volumes separados e não
um plano com aberturas. É o ponto de maior alcance visual, de um lado
uma janela esbelta abre-se para o hotel, do outro a área da piscina externa
com o vale de Vals em continuidade. A piscina externa é separada por uma
parede de vidro e uma porta inteiramente revestida de latão, refletindo um
brilho dourado tímido. Abro a porta e reparo na espessura e peso, impo-
tente. Lá fora é inverno, o vento gelado é cortante e corro para dentro da
piscina. O pavimento está revestido com um piso elevado de plástico vaza-
do duro, provavelmente por causa da neve, o que torna o percurso dolorido
e desagradável. Porém, ao entrar na piscina quente a sensação é soberba, a
água parece te abraçar e proteger do frio externo e o vapor da água encorpa
a atmosfera. Para mim é o ápice da relação interior e exterior, uma pelícu-
F27. Quadro de sensação:
Piscina Externa la de água separa o submerso como extensão do interior da terma e o exterior em
contato direto com a pele exposta. Apesar de externa a piscina é envolta por todos os
lados. Ao fundo o bloco das saunas cria um paredão de pedra, à esquerda o interior
da terma é revelado pelas janelas, à direita um bloco elevado serve de descanso no
verão, a frente dois blocos e suas respectivas lajes emolduram a montanha ao fundo.
Percebo a espessura da laje e a proposta estrutural das “mesas de pedra”. Fica claro
que a laje em balanço ligada a um bloco que vai transmitir seus esforços ao chão. O
piso de pedra parece mais áspero, me aproximando mais da natureza do que uma
piscina de ladrilho. Há três fontes em cano de latão que nascem da água e curvam-se
de volta à mesma, jatos fortes de água massageiam as costas de banhistas. O desenho
da piscina proporciona recantos muito bem apreciados pelos banhistas, alguns acham
conforto nos degraus, outros encostam nas paredes e volumes, a parte central da
piscina é mais para passagem. No paredão há um volume alto a poucos centímetros
abaixo d’água. No verão é um lugar perfeito para ficar deitado ao sol e apreciando o
molhado, porém no inverno serve de apoio aos cotovelos. Alguns acham os jatos de
saída de água e ali ficam por horas. Do outro lado um volume 30cm mais alto que a
água constrói um espaço que no verão é revestido por toalhas para tomar sol. Meu
local preferido é o espaço entre o bloco da “Drinking Stone” e do “Fire Bath”. Os
degraus me permitem sentar e o resguardo me protege do vento e chuva e enqua-
dra meu olhar que desliza pela água, esbarra na horizontalidade do bloco ao fundo
e transborda para a paisagem. O som é completamente diferente do interior, três
fontes produzem um barulho intenso e constante, ouço pássaros, o vento, chuva,
dependendo da hora o sino da Igreja, e as pessoas conversam mais desinibidas, pois
o som não reverbera como no interior. O exterior é o local mais social dessa terma,
diferente das romanas. À noite experiencio o local sem ninguém, os pássaros já não
cantam, o único som é das fontes e do vento intenso esporádico. Não há nenhuma
luz visível no exterior. A paisagem branca transformou-se num quadro de camadas
negras e o vapor da água cria um certo misticismo. Olho fixamente para a escuridão
por muitos minutos, como se algo estivesse à beira de se mexer, aquilo me aterroriza
e me instiga. A adrenalina parece aguçar meus sentidos e tudo fica mais desperto.
De profundidade incompreensível o breu ganha volume e imaginário, como se Mark
Rothko tivesse o pintado. Coincidentemente há um quadro do artista, Untitled (Black
on Grey), que agora me trás essa memória muito vividamente.
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cor fria, pois as piscinas iluminadas agora atuam como a maior fonte de luz. A ilumi-
nação pelas frestas do teto já não existe mais e o espaço perde muito de seu encanto
por isso. Enquanto me troco escuto um barulho não familiar. Abro a cortina e ouço
um dos funcionários cantarolando enquanto limpa a piscina e um som forte de água
dentro drenada. Acendem a luz dos fortes refletores, estranheza impera, o edifício
está desprovido de sua qualidade fundamental, a luz natural.
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Desenredar
Atmosferas
IV.