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(1) Eng. de Materiais. Doutorando PCC-EPUSP. Cx. Postal 61548. São Paulo-SP.CEP
05424-970. E-mail: fabio.alonso.cardoso@poli.usp.br
(2) Eng. de Materiais. Pesquisador Doutor Associado do Departamento de Engenharia de
Construção Civil, PCC-EPUSP. Cx. Postal 61548. São Paulo-SP.CEP 05424-970. E-
mail: rafael.pileggi@poli.usp.br
(3) Eng. Civil. Professor Doutor Associado do Departamento de Engenharia de Construção
Civil, PCC-EPUSP. Cx. Postal 61548. São Paulo-SP.CEP 05424-970. E-mail
vanderley.john@poli.usp.br
RESUMO
O comportamento reológico das argamassas é complexo, pois estas apresentam uma
natureza bifásica (agregados e pasta) e reativa, características variáveis dependendo da
finalidade (revestimento ou colante) e, ainda, são submetidas a diversas solicitações nas
etapas de mistura, aplicação e acabamento. A consistência é geralmente caracterizada
por ensaios de mesa de fluidez, de dropping-ball e também por penetrômetros. Estes são
ensaios de baixo custo e de fácil execução em obras, mas insuficientes para efetuar uma
avaliação mais completa desses materiais no estado fresco. O presente trabalho propõe a
utilização da técnica de squeeze-flow para avaliação reológica de argamassas e outros
materiais de construção. O método consiste em medir o esforço necessário para
comprimir o material entre duas placas paralelas gerando deformações por cisalhamento
e elongação no mesmo. São apresentadas diferentes configurações de ensaio
desenvolvidas para materiais com características de fluidez inicial distintas. Os efeitos
da consolidação pela ação do cimento, da variação do teor de água e da presença de
incorporador de ar em argamassas industrializadas são avaliados através do squeeze-
flow e comparados aos resultados obtidos por testes de mesa de consistência e dropping-
ball. É discutida a influência da taxa de deslocamento nos resultados obtidos por
squeeze-flow.
ABSTRACT
The consistency of fresh mortar is generally evaluated by slump and dropping-ball tests.
Although these are simple and cheap tests, they are not able to provide a more complete
rheological characterization of cement-based mortars. The rheological behavior of
mortars tend to be complex not only due to the biphasic characteristic and reactive
nature of the material, but also as a consequence of the diverse strain solicitations that
the material is submitted to during the mixture, application and finishing steps. This
paper presents an adaptation of the Squeeze-flow technique to the rheological
characterization of mortars and other building materials. The method measures the load
required to squeeze the material, accordingly to a pre-determined displacement
schedule, between two parallel plates resulting in shear and elongation strains. Diverse
test configurations developed for materials with different characteristics are shown. The
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effects of water content, surfactant additive and the set of cement in a commercial
mortar composition were determined through the squeeze-flow method as well as by
slump and dropping-ball tests. The influence of the displacement rate on the squeeze-
flow results is discussed.
1. INTRODUÇÃO
Os principais requisitos de desempenho dos revestimentos estão relacionados a
propriedades finais no estado endurecido, como a porosidade, a resistência de aderência,
a resistência à tração, o módulo elástico e a permeabilidade, parâmetros importantes
para promover uma durabilidade maior das edificações. As argamassas são aplicadas no
estado fluido e, apesar de ser uma etapa intermediária do processo, o comportamento
destas no estado fresco é de fundamental importância para possibilitar uma moldagem
fácil e isenta de defeitos, minimizando a ocorrência de patologia nos revestimentos após
endurecimento (fissuras, descolamento e manchas), as quais podem ser decorrentes de
um comportamento reológico inadequado para a aplicação.
- 122 -
Pseudoplástico - a viscosidade da suspensão diminui com o aumento da taxa (ou tensão)
de cisalhamento;
Dilatante - aumento da viscosidade do sistema com a taxa de cisalhamento. É um
comportamento típico de suspensões concentradas;
Adicionalmente, as suspensões podem apresentar uma tensão mínima necessária para
que se inicie o fluxo, ou seja, uma tensão de escoamento. Quando solicitados por
tensões abaixo da de escoamento, os materiais comportam-se como sólidos rígidos
[Glatthor e Schweizer, 1994; Oliveira et al., 2000; Pileggi, 2002]. Os materiais que
apresentam pseudoplasticidade ou dilatância com tensão de escoamento são
denominados fluidos de Bingham. Ainda, o comportamento dos materiais pode
depender da história ou tempo de cisalhamento, apresentando tixotropia (redução da
viscosidade aparente em função do tempo quando a suspensão está sob cisalhamento
constante) ou reopexia (aumento da viscosidade em função do tempo de cisalhamento).
Água
reativos
Pasta
inertes
- 123 -
não somente devido à natureza multifásica e reativa, mas também devido às diversas
solicitações a que são submetidas nas etapas de preparo (mistura) e aplicação
(lançamento e acabamento).
A adequação das características reológicas do material à finalidade (revestimento,
colante ou assentamento), às condições ambientais (temperatura, umidade relativa,
exposição ao vento) e aos tipos de lançamento (manual ou mecânico) e acabamento
favorece o máximo aproveitamento do potencial das propriedades finais da argamassa, o
qual é determinado pelas características intrínsecas da formulação (químicas, físicas,
granulométricas, proporção dos constituintes, teor de água).
Idealmente uma argamassa deve apresentar um comportamento pseudoplástico para
facilitar espalhamento, nivelamento e acabamento, bem como uma considerável tensão
de escoamento para manter-se estável após as etapas citadas. Contudo, a generalização
do comportamento ideal para argamassas é limitada considerando que cada método de
aplicação e finalidade podem requerer características particulares do material.
- 124 -
• Dropping-ball
Este método de caracterização é baseado na queda livre de uma esfera (onde o tamanho
e peso da esfera e a altura da queda são padronizados) sobre uma argamassa moldada
em um cilindro metálico. Os resultados são expressos na forma de índice de penetração,
não utilizando unidades fundamentais. É um ensaio geralmente relacionado à tensão de
escoamento do material, mas deve-se levar em conta que existe a influência do impacto
da bola no material e que a densidade da argamassa ou concreto influi bastante na
medida (como no caso de materiais com ar incorporado). Norma relacionada: Inglaterra
– BS 4551 (1998).
- 125 -
• Reômetros
Os reômetros são equipamentos dedicados à avaliação de propriedades reológicas de
fluidos, suspensões, argamassas e concretos. Determinam parâmetros como viscosidade
e tensão de escoamento através de dois princípios básicos de funcionamento: (1)
aplicação de torque ao fluido ou suspensão e medida do cisalhamento resultante ou (2) o
cisalhamento aplicado é controlado sendo avaliado o torque necessário para tal [Pileggi,
2002].
Contudo, os reômetros de precisão atuam em faixas limitadas de torque, sendo
incapazes de medir os elevados esforços requeridos para o cisalhamento de materiais
como concretos e argamassas em taxas extremas.
A reometria rotacional foi pioneiramente aplicada em concretos na década de 60
[Powers, 1968], utilizando o conceito de cilindros concêntricos para aplicação de
cisalhamento ao material. A importância crescente da utilização da reometria rotacional
para caracterização de concretos em nível internacional é ilustrada por publicações do
NIST (National Institute of Standards and Technology) [Ferraris e Brower, 2001;
Ferraris, 1999], que propõe a utilização desta técnica para avaliação reológica de
concretos auto-adensáveis de alto desempenho.
Acrescenta-se que, os rêometros rotacionais para concretos e argamassas além de
determinar o comportamento reológico dos materiais, apresentam geometrias mais
adequadas para avaliar as formulações durante as etapas de mistura e transporte, por
simularem condições de escoamento turbulento.
Entretanto, as geometrias de ensaio usualmente empregadas neste tipo de reômetro
(cilindros concêntricos ou placa-placa) eventualmente podem não satisfazer um
requisito fundamental dos ensaios reológicos, que é o não deslizamento entre o fluido e
a superfície dos elementos de cisalhamento [Pileggi, 2002]. No caso da caracterização
de argamassas essa é uma questão bastante relevante, pois devido à sua natureza
plástica, podem ocorrer problemas de deslizamento e perda de contato entre a massa e a
ferramenta que aplica o cisalhamento, comprometendo a avaliação. Ainda, as
solicitações impostas por esse tipo de equipamento não são semelhantes às condições de
aplicação das argamassas (que consistem em cisalhamento em elevadas taxas
juntamente com elongação para espalhamento do material sobre o substrato).
Considerando o cenário delineado, a avaliação do comportamento reológico das
argamassas faz-se necessária para o desenvolvimento de formulações que apresentem
características no estado fresco adequadas para aplicação e que não comprometam o
desempenho do material no estado endurecido. Para isso o presente trabalho consiste em
adaptação e desenvolvimento da técnica de squeeze-flow para a caracterização reológica
de argamassas e suas pastas.
2. SQUEEZE-FLOW
Técnica amplamente utilizada para a caracterização dos mais diversos tipos de pastas
incluindo alimentos, cosméticos, materiais cerâmicos e compósitos poliméricos [Öskan
et al., 1999]. Estudo pioneiro em materiais de construção foi publicado por Min et al.
[Min et al., 1994] utilizando squeeze-flow para a caracterização de uma pasta de
cimento, verificando as alterações reológicas decorrentes da consolidação do ligante.
Entretanto, a utilização do método para a caracterização de argamassas é inovadora.
Este baseia-se na medida do esforço necessário para a compressão uniaxial de uma
amostra cilíndrica do material entre duas placas paralelas, conforme a Figura 2, e pode
ser facilmente realizado em equipamentos do tipo máquina universal de ensaios. A
- 126 -
deformação efetiva do material ocorre por cisalhamento radial quando a razão entre o
diâmetro e a espessura da amostra for elevada (D/h>>5) [Meeten, 2000; Meeten, 2004;
Min et al., 1994; Öskan et al., 1999]. As condições de contorno nas interfaces do
material com as placas alteram o perfil de deformação no interior da amostra e a área de
contato entre placas e amostra. Solicitações do material predominantemente de
deformação elongacional ocorrem no caso do deslizamento (ou atrito nulo) e a
deformação por cisalhamento é mais acentuada quando o atrito entre as placas e a pasta
é elevado (escorregamento nulo), de acordo com a ilustração da Figura 3 [Meeten,
2000; Meeten, 2004; 1994; Öskan et al., 1999]. Na prática, geralmente, verifica-se nos
experimentos uma situação intermediária, com ambos os tipos de deformação presentes.
Compressão
punção
D = 50,8 mm
amostra h0 = 10 mm h < 10 mm
compressão
Figura 3 – Ilustração esquemática das linhas de fluxo geradas para as duas condições de
contorno básicas de ensaio de squeeze-flow - escorregamento nulo (atrito infinito) e
escorregamento livre (atrito nulo).
Existe outra configuração de ensaio também bastante utilizada, onde as duas placas
(punção e base) são de mesmo tamanho, fazendo com que a área de contato entre ambas
as placas e o material permaneça constante ao longo do ensaio. Desta maneira o
material deformado é descartado da área de atuação das placas. Esta é uma condição
ideal para a simulação, por exemplo, do comportamento de argamassas de assentamento
durante a aplicação.
Entretanto, como na maioria das aplicações o material deve ser espalhado sobre uma
superfície, foi escolhida para este estudo a configuração de ensaio ilustrada na Figura 2.
A área sob carregamento permanece constante, mas a área submetida aos fenômenos de
escorregamento e atrito entre a base e a amostra é variável. Esta é, portanto, uma
configuração versátil que permite avaliar o comportamento dos materiais frente a
diferentes solicitações.
- 127 -
O método permite a variação da taxa de cisalhamento e também da magnitude das
deformações. Compressão simples controlada por deslocamento, oscilação, compressão
por força controlada, aplicação de patamares de relaxação, são procedimentos de
squeeze-flow que podem ser utilizados para determinação de diversos parâmetros
reológicos e também para a simulação de situações práticas [Meeten, 2000; Meeten,
2004; Öskan et al., 1999]. No lançamento contra o substrato, por exemplo, a argamassa
é solicitada em altas taxas de cisalhamento e grandes deformações, enquanto as etapas
de desempeno e acabamento podem submetê-la a deformações e taxas de cisalhamento
bastante variáveis.
O perfil típico obtido de um ensaio de squeeze-flow com controle por deslocamento
expresso na forma de carga vs. deslocamento apresenta 3 regiões bem definidas [Min et
al. 1994], conforme demonstrado na Figura 4.
No primeiro estágio, em pequenas deformações, o material comporta-se como um
sólido, apresentando deformação elástica linear. Uma argamassa que apresente
comportamento com uma parcela significativa nesse estágio, possivelmente apresentará
problemas de fissuração ainda no estado fresco devido à recuperação elástica após a
retirada do esforço (após a passagem da desempenadeira).
No estágio seguinte, em deslocamentos intermediários, a compressão resulta em
deformação radial elongacional e de cisalhamento superando as forças que mantinham o
material sob comportamento elástico, e assim, o mesmo flui por deformação plástica
e/ou viscosa dependendo das suas características. Nesta etapa o material é capaz de
sofrer grandes deformações sem aumento significativo da força necessária para o
deslocamento, o que aparenta ser um comportamento apropriado para aplicação e
espalhamento de argamassas.
Já no terceiro estágio, no qual o material é submetido a grandes deformações, pode
ocorrer um aumento expressivo (exponencial) da carga necessária para o deslocamento
do mesmo. A aproximação das partículas ou de outros constituintes de um sistema
(fibras por exemplo) submetido a grandes deformações gera forças restritivas ao fluxo
devido à maior interação (embricamento ou entrelaçamento) das unidades móveis.
Provavelmente, este é um estágio de comportamento em que procedimentos de
aplicação e acabamento do material devem ser dificultados, devido às altas cargas
(tensões) necessárias para deformá-lo, possivelmente levando a um acabamento
defeituoso.
- 128 -
Carga (N) I II III
Deformação (mm)
- 129 -
indústrias, visto que equipamentos do tipo máquina universal de ensaios são
tradicionalmente utilizados no cenário nacional.
3. MATERIAIS E MÉTODOS
Com o intuito de ilustrar a versatilidade da técnica de squeeze-flow, neste trabalho
foram avaliados 4 tipos de materiais de construção. Uma composição comercial de
revestimento à base de gesso com teor de água indicado pelo fabricante, uma pasta de
cal CH I com relação água/cal igual a 0,83, uma argamassa colante de mercado com
teor de água indicado pelo fabricante e uma composição comercial de argamassa de
revestimento. Esta última foi preparada com adição de 13 e 15% em massa de água e,
também, com a adição de 1% em massa de aditivo incorporador de ar numa das
formulações com 15% de água.
As composições testadas foram preparadas em agitador mecânico de bancada para o
gesso e a pasta de cal, e argamassadeira EMIC para as argamassas por cerca de 5
minutos para garantir homogeneização. Logo após a mistura, as composições foram
vertidas em moldes de PVC com diferentes geometrias (descritas na Figura 5)
escolhidas de acordo com as características de cada suspensão. Independentemente da
geometria utilizada, as amostras foram razadas para garantir um bom acabamento
superficial, condição importante para a realização do teste de squeeze-flow, pois a
superfície do punção deve tocar perfeitamente o material.
A preparação das suspensões e a realização dos ensaios ocorreram em temperatura
ambiente em torno de 23 oC e umidade relativa de, aproximadamente, 60%.
Os ensaios de squeeze-flow foram realizados em uma máquina universal de ensaios
INSTRON (modelo 5569) utilizando células de carga de 10N e 1000N. As ferramentas
utilizadas para o ensaio foram: uma base rígida de aço inox, punções de aço inox com
25,4 e 50,8mm de diâmetro, anéis de PVC com 50,8mm de diâmetro e 10mm de altura
ou com 76,2mm de diâmetro e 5mm de altura utilizados como moldes juntamente com
placas quadradas de PVC com 5mm de espessura (utilizadas como base). Os dados de
carga, deslocamento e tempo foram coletados e registrados pelo software do
equipamento numa taxa de 4 pontos por segundo, ou seja, com intervalos de 0,25s.
Todos os ensaios foram realizados segundo o conceito de compressão simples
controlada por deslocamento. Entretanto, para cada material foram utilizados programas
de deslocamento distintos, variando as taxas de deslocamento, as deformações finais e a
presença de patamares de relaxação.
A repetibilidade do método foi verificada através de ensaios realizados com água como
material de teste, sendo que em 10 repetições não ocorreu variação nos resultados
obtidos (estudo ainda não publicado). Adicionalmente, é importante ressaltar que
possíveis variações nos valores obtidos por squeeze-flow são oriundos de variações no
material e na forma de preparação das amostras como demonstrado por Antunes et al.
[Antunes, 2005].
O endurecimento dos materiais em função do tempo foi avaliado através de ensaios
realizados em diferentes tempos após a mistura.
As argamassas de revestimento foram também submetidas aos ensaios de mesa de
consistência (de acordo com a norma NBR-13276) e de dropping-ball, este baseado na
norma britânica BS 4551, com o objetivo de comparar os resultados de squeeze-flow
com parâmetros obtidos segundo estes métodos tradicionais.
- 130 -
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
- 131 -
100
(i) 0 min B) Gesso
A) (ii) 10 min 0,3
80 (iii) 20 min
Punção
Deslocamento (mm)
Deslocamento
(25,4mm)
Carga (cN)
60
0,2
(iii)
5mm 40
(ii)
0,1
0 0,0
0 10 20 30 40 50 60
Tempo (s)
Deslocamento (mm)
(iii)
Carga (N)
100 1,5
Punção (50,8mm)
1,0
50
10mm
Amostra (50,8mm) (ii) 0,5
(i)
0 0,0
0 10 20 30 40 50 60
Tempo (s)
5
E) (i) 10 min
F) Argamassa Colante
5
4 (ii) 30 min
4
Deslocamento (mm)
Deslocamento
Carga (N)
3
3
Punção (50,8mm)
2
(ii) 2
10mm
1 1
(i)
Molde partido Amostra (50,8mm) 0 0
0 50 100 150 200
Tempo (s)
- 132 -
ponto de máximo deslocamento, observa-se um comportamento predominantemente
viscoso de relaxação da composição de gesso.
Já os materiais que apresentam tensão de escoamento suficiente para manter a forma
durante o manuseio e desmoldagem, podem ser ensaiados de acordo com uma das
configurações descritas na literatura, ilustrada na Figura 2. Ou seja, compressão entre
duas placas com dimensões diferentes onde o volume de material é mantido constante e
a amostra não está confinada, pois não há a necessidade de manter o molde durante o
ensaio. Materiais de revestimento à base de cimento ou gesso e polímeros, massas
corridas, composições de fibrocimento e argamassas em geral podem ser testados de
acordo com a configuração da Figura 5C. Na Figura 5D são apresentados os resultados
do squeeze-flow de uma pasta concentrada de cal hidratada em função do tempo após a
mistura, comprimida até 2,5mm em taxa de 0,1mm/s. Pode-se notar que, apesar da pasta
de cal hidratada não sofrer reações imediatas que resultem na formação de fases ligantes
(visto que o processo de carbonatação não ocorre no período de 90 minutos em
temperatura e atmosfera ambientes), os fenômenos de coagulação e secagem são os
prováveis responsáveis pelas alterações no comportamento reológico deste material.
Com o passar do tempo ocorre o aumento das cargas registradas, refletindo o aumento
de viscosidade e da tensão de escoamento.
Adicionalmente, este ensaio ainda proporciona uma avaliação qualitativa da tendência à
segregação de fases da composição. Quando submetida a grandes deformações,
dependendo da capacidade de retenção de água do material (cal hidratada neste caso);
eventualmente pode ocorrer uma tendência maior ou menor à exsudação de água,
facilmente visualizada pelo operador.
Vale ressaltar que esta configuração de ensaio pode ser utilizada com outras dimensões
para atender determinadas situações. Dependendo das dimensões das maiores unidades
constituintes, geralmente agregados, ou do comprimento de fibras é indicado o aumento
das dimensões tanto das ferramentas quanto das amostras (altura pelo menos cinco
vezes maior que o diâmetro), minimizando questões de efeitos geométricos de parede.
Além disso, utilizando-se deste artifício a representatividade do ensaio é elevada. Por
outro lado, a utilização desta configuração com dimensões menores pode ser necessária
para se obter níveis de cargas compatíveis com o equipamento disponível e com a faixa
de precisão ótima e, também, visando uma logística factível em relação à quantidade de
material utilizado e praticidade na preparação, mistura e moldagem das amostras.
Dada a extensa gama de materiais utilizados na construção civil, existem alguns que
apresentam tensão de escoamento suficiente para o manuseio e desmoldagem, mas que
são altamente aderentes à superfície dos moldes, impedindo a desmoldagem adequada
das amostras para realização do ensaio de acordo com a configuração descrita na Figura
5C. Entretanto, os materiais com essas características, como é o caso das argamassas
colantes, podem ser ensaiados de acordo com a configuração ilustrada na Figura 5E, que
é uma adaptação da configuração representada na Figura 5C. Um molde de PVC rígido
partido em 4 pedaços é utilizado para a moldagem, mas a compressão do material
ocorre com a presença do mesmo. Como o anel de PVC é partido, seus pedaços
escorregam radialmente de acordo com o fluxo do material em resposta à compressão
exercida pelo punção metálico. Apesar do pouco peso e do fácil escorregamento dos
pedaços do molde sobre a base, certamente a sua presença em contato com o material
durante o teste aumenta a carga necessária para a deformação do material. Mas, este
efeito pode ser desconsiderado na prática visto que os ensaios são comparativos, sendo a
influência do molde igual em todos os ensaios.
- 133 -
Na Figura 5F são apresentados os resultados de squeeze-flow de uma argamassa colante
ensaiada de acordo com a configuração citada. Destaca-se que o programa utilizado
inclui diversos patamares de relaxação em diferentes níveis de deslocamento.
- 134 -
700
A) 13% água
(i) 15 min
600 (ii) 30 min
(iii) 45 min
500 (iv) 60 min
(i)
300
(iii)
200
100 (iv)
0
700
B) 15% água
(i) 15 min
600 (ii) 30 min
(iii) 45 min
500 (iv) 60 min
Carga (N)
400
300
(iv)
200 (iii)
(ii)
100
(i)
0
0 0,5 1 1,5
Deslocamento (mm)
- 135 -
e tensão de escoamento) devido à ação do cimento, conforme ilustrado na Figura 6B.
Em pequenas deformações as diferenças nas cargas medidas pelo equipamento não
foram muito significativas entre as amostras ensaiadas com até 1 hora, em intervalos de
15 minutos (curvas i, ii, iii e iv, respectivamente). Em deformações intermediárias e,
principalmente grandes, as diferenças tornam-se mais marcantes. Com o passar do
tempo o material tornou-se mais coeso, resultado das alterações sofridas pela pasta.
Em situações práticas, os comportamentos observados das formulações com teores
distintos de água causam diferenças extremas na facilidade e qualidade da aplicação. A
argamassa com 13% de água provavelmente apresentaria dificuldades na aderência e no
espalhamento após lançamento, pois apresenta estágio II (deformação plástica/fluxo
viscoso) quase inexistente e enrijecimento por deformação (estágio III) bastante intenso.
Essas características fazem que a composição com esse teor de água seja propícia à
fissuração e falhas de aderência, causando um desempenho do revestimento em uso
insuficiente. Por outro lado, a argamassa com 15% de água apresenta um
comportamento bastante plástico (estágio II extenso) e com enrijecimento pouco
intenso, sendo muito provavelmente mais adequada à aplicação, resultando em
revestimento com poucos defeitos e boa aderência.
- 136 -
100
90 (i) 15 min_SI
(ii) 60 min_SI
80
(iii) 15 min_CI
70 (iv) 60 min_CI (ii)
Carga (N)
60
50
40
30 (i)
20
(iv)
10
(iii)
0
0 0,5 1 1,5
Deslocamento (mm)
Figura 7 – Curvas de carga vs. deslocamento obtidas por squeeze-flow das argamassas
com 15% de água, sem e com a adição de 1% de incorporador de ar. As amostras com
15 e 60 minutos após mistura foram submetidas à deformação de 1,5mm em taxa de
0,01mm/s.
Influência da taxa de deslocamento
Além dos fatores intrínsecos já discutidos como o teor de água, tempo de consolidação e
teor de ar incorporado, também foi avaliada a influência de um fator extrínseco, a taxa
de deslocamento. A Figura 8 mostra o efeito da variação da taxa de deslocamento em
0,01, 0,1 e 1 mm/s nas argamassas com 13% e 15% de água sem aditivo incorporador
de ar. As amostras foram ensaiadas 60 minutos após a mistura. Observa-se que a
tendência das curvas de carga vs. deslocamento com a utilização de diferentes taxas é
oposta nas argamassas com teores de água distintos. Enquanto na composição com 13%
de água as cargas necessárias para efetuar a deformação do material aumentam com a
taxa utilizada, na argamassa com teor de água de 15% ocorre o inverso, ou seja, as
cargas diminuem com o aumento da taxa.
- 137 -
700
A) 13% água
(i) 0,01 mm/s
600 (ii) 0,1 mm/s
(iii) 1 mm/s
500
(iii)
Carga (N) 400
(ii)
300
200
100
(i)
0
700
B) 15% água
(i) 0,01 mm/s
600
(ii) 0,1 mm/s
500 (iii) 1 mm/s
Carga (N)
400
300
(i)
200
(ii)
100
(iii)
0
0 0,5 1 1,5
Deslocamento (mm)
- 138 -
Independentemente da ressalva apontada, a diferença de comportamento das
argamassas, observada na simulação com condições distintas de aplicação pela variação
da taxa de deslocamento, indica que diferentes métodos de instalação (manual ou
projeção) necessitam de materiais com comportamento reológico especificamente
adequados para as características de aplicação. Problemas como fissuração, desperdício
de material por rebote e baixo rendimento da mão-de-obra durante aplicação podem ser
minimizados ou evitados através da determinação precisa do comportamento das
argamassas frente à variação na velocidade de solicitação.
- 139 -
20
13%_SI A) Dropping - Ball
15%_SI
13%_CI
15 15%_CI
0
80
B) Mesa de Consistência
Índice de Consistência (mm)
60
13%_SI
15%_SI
13%_CI
15%_CI
40
20
0
0 15 30 45 60
Tempo (min)
- 140 -
minutos respectivamente. Paralelamente, no mesmo período de tempo, os resultados
obtidos pela mesa de consistência para a mesma argamassa foram todos zero
(espalhamento nulo), resultando em uma variação percentual nula conforme observado
na Tabela 2.
Tabela 2 – Variação percentual dos parâmetros medidos por squeeze-flow (carga) e pela
mesa de consistência (espalhamento) em função do tempo após a mistura em relação
aos valores obtidos para as amostras com 15 minutos.
As diferenças na variação percentual dos valores medidos por cada técnica ficam ainda
mais expressivas quando se analisa a argamassa com 15% de água sem incorporador de
ar. O ensaio de squeeze-flow da amostra com 15 minutos resultou em carga máxima de
49,6N. Com o decorrer do tempo os valores medidos aumentaram de 167,3% após 30
minutos, chegando até 645,4% depois de uma hora. A avaliação da mesma argamassa
realizada através da mesa de consistência indica, para o mesmo período de tempo, uma
variação de apenas 14,9% no índice de consistência.
Esses resultados comprovam a superior sensibilidade do squeeze-flow em relação aos
ensaios tradicionais e, ainda, corroboram a observação feita por Nakakura [Nakakura,
2003]. Este autor sugere o abandono da determinação do teor de água de amassamento
com base no índice de consistência pela mesa de espalhamento, em virtude da falta de
capacidade da técnica em diferenciar argamassas com características bastante distintas.
5. CONCLUSÃO
A técnica de squeeze-flow para a avaliação reológica de argamassas e outros materiais
de construção mostrou-se bastante sensível e versátil, possibilitando a adequação da
geometria de ensaio para materiais com características de consistência inicial e de
aderência distintas. O teste é capaz de detectar pequenas alterações nas características
reológicas dos materiais e, ao contrário dos ensaios tradicionais, fornece não apenas um
valor medido, mas um perfil de comportamento de acordo com as solicitações impostas.
Além da versatilidade em relação à geometria de ensaio, o squeeze-flow possibilita a
aplicação de níveis de deformação distintos em taxas também variáveis, fornecendo
condições para que a simulação de diversas situações reais de aplicação dos materiais
seja realizada. Portanto, o método proposto exibe grande potencial para a pesquisa e
desenvolvimento em argamassas e, também, como ferramenta para o controle de
qualidade.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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STEFFE, J.F.; Rheological Methods in Food Process Engineering. 2nd Ed., Freeman
Press, EUA, 1996.
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