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3846 Diário da República, 1.ª série — N.

º 140 — 20 de julho de 2012

5.4 — O elevador de tesoura é um equipamento auxiliar as que tenham remunerações iguais ou superiores a
à realização do ensaio de verificação da geometria de ve- € 1500, como acontecia nas “reduções” previstas na
rificação da geometria do alinhamento e variação angular LOE 2011;
das rodas e do ensaio de verificação tridimensional de e) A cumulação das medidas da Lei do OE 2011,
cotas, em veículos ligeiros, que deve possuir as seguintes que são mantidas, com aquelas que são objeto das
características: normas a que se reporta o presente requerimento,
leva a que uma parte das pessoas atingidas possa
a) Sistema de elevação de dupla tesoura;
perder até cerca de 1/4 dos montantes anuais das
b) Capacidade de elevação: > 3500 kg;
suas retribuições e das pensões ou reformas, e isto
c) Plataformas com comprimento: > 4,5 m;
pelo menos em dois anos consecutivos, em contraste
d) Nas condições de realização do ensaio de verificação
com o máximo de 10 % que o Tribunal Constitu-
da geometria do alinhamento e variação angular das rodas,
cional estimou no Acórdão; em todos os casos, o
deve garantir um alinhamento:
valor total agora retirado a cada um dos atingidos
i) Transversal: no máximo de 1 mm; representa, no mínimo, um múltiplo do que acontecia
ii) Longitudinal: no máximo de 2 mm; no OE anterior;
iii) Diagonal: no máximo de 2 mm. f) As normas da LOE 2012 aqui impugnadas têm
o seu prazo de vigência referido ao que for o período
de vigência do Programa de Assistência Económica
e Financeira (PAEF), por sua natureza extensível,
TRIBUNAL CONSTITUCIONAL e na lei aqui em causa não foi assumido o pressu-
posto da vigência e renovação anual das medidas de
Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 353/2012 “redução” das remunerações previstas na Lei do OE
de 2011, pressuposto de que o TC assumidamente
Processo n.º 40/12 partiu.
Acordam em Plenário no Tribunal Constitucional:
II — Inconstitucionalidade das normas do artigo 21.º
Relatório São inconstitucionais as normas do artigo 21.º da
Um grupo de deputados à Assembleia da República LOE 2012, em primeira linha as que se extraem dos
veio requerer, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 n.os 1, 2 e, consequentemente, todas as demais daquele
e na alínea f) do n.º 2 do artigo 281.º da Constituição da preceito, n.º 3 a n.º 9, por violação dos princípios do
República Portuguesa e do n.º 1 dos artigos 51.º e 62.º da Estado de direito democrático (vertente da proteção da
Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, a declaração de incons- confiança), da proporcionalidade e da igualdade.
titucionalidade, com força obrigatória geral, das normas
A) Violação do subprincípio da proteção da confiança
constantes dos artigos 21.º e 25.º da Lei n.º 64-B/2011, de
30 de dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2012), 1 — As reduções da LO 2011 foram pelo Tribunal
com os seguintes fundamentos: Constitucional (TC ou Tribunal) consideradas “reduções
significativas” e geradoras de “frustração de expecta-
«I — Introdução tivas fundadas”, “capazes de criarem ou acentuarem
Tendo em conta as questões recentemente tratadas dificuldades de manutenção de práticas vivenciais e
pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 396/2011 de satisfação de compromissos assumidos pelos cida-
(Acórdão), que incidiu sobre várias normas da Lei dãos” (Acórdão), tendo o Tribunal referido expressa-
n.º 55-A/2010, de 15 de novembro (LOE 2011), vão mente “a intensidade do sacrifício causado às esferas
neste requerimento ser tomados em consideração, em particulares atingidas pela redução de vencimentos”.
especial, os seguintes aspetos novos, presentes na LOE Entendeu, no entanto, nesse caso, o TC que, apesar de
2012, ora em causa: tudo, se continham dentro de “limites do sacrifício”,
salvaguardados pelos montantes e pela transitoriedade
a) São adotadas medidas de “suspensão do paga- (“medidas de caráter orçamental, ou seja, anualmente
mento” de “subsídios de férias e de Natal” (não paga- caducando no termo do ano em curso”, como se assumiu
mento, à partida de âmbito plurianual, sem perspetiva no Acórdão).
de reposição), mantendo-se as medidas de “redução 2 — As “suspensões de pagamento” dos subsídios,
remuneratória” consagradas na LOE 2011, que o TC nas modalidades previstas, quer pelo forte agravamento,
considerou representarem “reduções significativas” acrescentado e global, dos montantes retirados, quer
(Acórdão); pelo alargamento do universo abrangido — que é esten-
b) O universo pessoal abrangido pelas medidas de dido até aos que auferem 600 euros de remuneração,
“suspensão” abrange agora, diferentemente do que acon- já não muito longe do salário mínimo nacional — quer
tecia com a “redução”, aposentados e reformados; ainda por expressamente se aplicarem, desde já, a todo
c) No âmbito dos reformados e aposentados agora o período (repete-se, extensível) por que vier a aplicar-
abrangidos, incluem-se também os do setor privado, -se o Programa de Assistência Económica e Financeira,
deixando de se estar, portanto, perante medidas ape- ultrapassam aqueles “limites de sacrifício” cuja admis-
nas direcionadas para pessoas ligadas ao setor público, são o TC considerou fazer sentido no nosso ordenamento
muito menos para “servidores públicos”; constitucional.
d) Passam a ser abrangidas pela “suspensão de paga- 3 — Se trabalhadores com vencimentos a partir de
mento” de subsídios a todas as pessoas com remunera- 600 ou 1100 euros, incluindo trabalhadores a termo
ções iguais ou superiores a € 600 mensais e não apenas e meros prestadores de serviços (artigo 21.º, n.º 3),
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expostos já plenamente às exigências, entretanto tam- remunerações mais baixas é diferente da situação das
bém agravadas, do sistema fiscal, não tivessem as pessoas que auferem remunerações mais altas. E é dife-
suas expectativas protegidas da imposição de exigên- rente muito em especial para efeitos de redução salarial.
cias e sacrifícios adicionais desta amplitude e com De facto, os efeitos negativos de uma redução salarial
este horizonte, a introdução do critério promissor dos sentem-se de forma mais intensa naqueles que auferem
“limites de sacrifício” não teria afinal desempenhado remunerações mais baixas do que naqueles que perce-
papel útil. bem remunerações mais elevadas”.
4 — Se mais não fora, por aplicação de tal critério 13 — Adicionalmente, não pode deixar também de
devem as normas agora em causa ser consideradas viola- se suscitar perante o Tribunal o tratamento diferente
doras do princípio constitucional da confiança (artigo 2.º de situações que são iguais, como é o caso de alguns
da CRP). trabalhadores de organismos públicos que, mercê do
seu estatuto de independência, ficarão, por opção do
B) A violação do princípio da igualdade OE 2012 imunes à “suspensão de pagamento”.
5 — As normas dos n.os 1 e 2 do artigo 21.º da Lei do C) A violação do princípio da proporcionalidade
OE 2012 violam o princípio da igualdade consagrado
no artigo 13.º da Constituição. 14 — As normas dos n.os 1 e 2 do artigo 21.º da LOE
6 — Esse princípio é violado na sua dimensão de 2012 violam o princípio da proporcionalidade — um
“igualdade perante a repartição de encargos públi- dos princípios que segundo a nossa Constituição devem
cos”. ser observados nas operações de ponderação de bens,
7 — Não pode admitir-se uma dualidade de trata- interesses e valores constitucionalmente tutelados
mento, agora nítida, entre cidadãos a quem os sacrifí- (v. artigos 2.º, 18.º, n.º 2, 19.º, n.os 4 e 8, 266.º, n.º 2,
cios são exigidos pelo Estado essencialmente através 272.º, n.º 2, da CRP).
dos impostos e outros cidadãos a quem os sacrifí- 15 — Há violação do princípio da proporcionalidade,
cios são exigidos não só por essa via, mas também, e na vertente da necessidade, uma vez que o legislador
cumulativamente, de forma continuada, em escalada dispunha de meios ou soluções alternativas globalmente
de montante e extensão temporal, através da ampu- menos drásticas.
tação definitiva de partes significativas e de direitos 16 — Através de uma simples opção de caráter quan-
relevantes que integram, como acontece com outros, titativo, podemos comparar entre a medida escolhida
a sua retribuição. que concentra um certo sacrifício num número restrito,
8 — Tal não pode em especial ser admitido quando com a consequência de algumas pessoas poderem sofrer
o diferencial de sacrifício entre ambas as categorias se um sacrifício dos seus rendimentos que pode atingir
amplia (quer no escalão que se inicia nos 600 euros uma percentagem próxima dos 25 %, e medidas alter-
quer no que se inicia nos 1100 euros), as medidas se nativas que poderiam alargar o universo abrangido,
desvinculam da anualidade orçamental e o universo em termos de destinatários, fontes de rendimentos, ou,
sujeito ao sacrifício adicional agora criado inclui toda a em particular, outras proveniências, com destaque para
gama de vínculos, até os meros prestadores de serviços as reduções de despesa a obter, em termos passíveis
(artigo 21.º, n. 4). de especificação quantificada no OE, por específicas
9 — Este âmbito pessoal, tão diversificado, faz com reformas nas estruturas do setor público e reengenharia
que nos situemos fora da esfera tida em vista, para efei- do procedimento público.
tos legitimadores, no anterior Acórdão (“Há um esforço 17 — Se fossem tidos em conta os valores da Cons-
adicional em benefício de todos, em prol da comu- tituição Portuguesa, não poderia ter-se optado por uma
nidade, que é pedido exclusivamente aos servidores medida que sacrifica intoleravelmente um número res-
públicos”). trito de pessoas, devendo procurar-se uma que atingisse
10 — Em qualquer caso, a aplicação da medida de menos intoleravelmente um número mais alargado ou,
“suspensão do pagamento” a quem aufira entre 600 e preferencialmente e com alívio destas, outras prove-
1100 mensais (n.º 2 do artigo 21.º), à luz da decisão niências e rubricas do lado da despesa, sobre as quais
anterior do TC, deve ser declarada inconstitucional, tanto tem incidido o discurso político e tão omisso, ou
porque a tão grande distância das referências quantita- inexpressivo, é a LOE 2012.
tivas julgadas cruciais pelo Tribunal, não se depara com
uma diferença de tratamento em linha com a enorme III — Da inconstitucionalidade das normas
do artigo 25.º
diferença na condição económica e social que nesse
caso se regista — diferenciação que é reclamada pelo 18 — Os argumentos que se desenvolveram nos pará-
princípio constitucional da igualdade. grafos anteriores em relação às normas do artigo 21.º
11 — De facto, se uma redução até 10 %, sempre valem mutatis mutandis para as normas do artigo 25.º
acima dos 1500 euros de vencimento, foi considerada da Lei do OE de 2012, particularmente as dos n.os 1,
pelo TC, em atenção a precisos parâmetros, ainda nos 2, 3 e 4 e, consequentemente, para as demais normas
“limites do sacrifício”, no segmento que vai dos 600 aos desse preceito, desde já se deixando invocada a violação
1100 o princípio da igualdade imporia uma diferença de dos princípios da igualdade e da proporcionalidade, em
tratamento que excluiria sempre o recurso ao não paga- termos análogos.
mento de um dos subsídios, sem perspetiva de retorno, No caso:
pelo menos por dois anos consecutivos. 19 — Acrescem, todavia, fundamentos próprios para
12 — Como disse o Tribunal, “o princípio da igual- a declaração de inconstitucionalidade das normas do
dade determina que se trate de forma igual o que é artigo 25.º, decorrentes da violação dos princípios do
igual e de forma diferente o que é diferente na medida Estado de Direito e da igualdade e do direito à segu-
da diferença. Ora a situação das pessoas que auferem rança social.
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A) A violação do princípio do Estado de direito democrático uma subida do IVA. Falando à entrada de uma cimeira
(artigo 2.º da CRP) do Partido Popular Europeu (PPE), Pedro Passos Coe-
20 — Conforme resume o Tribunal no Acórdão, “a lho, questionado sobre as notícias de que o PSD pensa
proteção da confiança traduz a incidência subjetiva da evitar cortes nas reformas através de uma subida do
tutela da segurança jurídica, representando ambas, em IVA, escusou-se a entrar em detalhes, alegando que a
conceção consolidadamente aceita, uma exigência inde- oposição desconhece a real situação financeira do País,
clinável (ainda que não expressamente formulada) de mas confirmou que, a ter de haver ajustamentos, será
realização do princípio do Estado de direito democrático nos impostos sobre o consumo. ‘Até haver um conhe-
(artigo 2.º da CRP).” cimento completo da situação financeira portuguesa,
21 — Para que uma situação de confiança seja mere- não é possível a nenhum responsável dizer que não será
cedora de tutela, à luz do subprincípio da proteção da necessário mexer nos impostos. Mas se ainda vier a ser
confiança, o Tribunal Constitucional, ao longo de um necessário algum ajustamento, a minha garantia é de
percurso de mais de 20 anos, consolidou um entendi- que seria canalizado para os impostos sobre o consumo,
mento sobre os requisitos cumulativos. e não para impostos sobre o rendimento das pessoas’,
22 — Diz o Tribunal Constitucional: “[Para que haja disse. O líder do PSD garantiu mesmo que, desde já,
lugar à tutela jurídico-constitucional da ‘confiança’ é ‘fica o compromisso expresso do PSD em como não
necessário: i) em primeiro lugar, que o Estado (mor- haverá recurso a medidas que afetem as pensões mais
mente o legislador) tenha encetado comportamentos degradadas ou as reformas, tal como estava previsto no
capazes de gerar nos privados ‘expectativas’ de continui- Programa de Estabilidade e Crescimento’. ‘Portanto, a
dade; ii) depois, devem tais expectativas ser legítimas, haver algum ajustamento que seja necessário fazer, será
justificadas e fundadas em boas razões; iii) em terceiro mais por via dos impostos sobre o consumo do que do
lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo rendimento das pessoas através dos impostos ou através
em conta a perspetiva de continuidade do ‘comporta- de cortes salariais ou das pensões’, reforçou.”
mento’ estadual; iv) por último, é ainda necessário que 29 — Este despacho da Lusa é descarregável em
não ocorram razões de interesse público que justifiquem, http://noticias. pt.msn.com/politica/article.aspx?cp-
em ponderação, a não continuidade do comportamento -documentid=156665761.
que gerou a situação de expectativa]” [aditámos os 30 — O mesmo se diga em relação a declarações no
números, para melhor identificação]. mesmo sentido, abundantemente passadas nos media,
23 — Embora isso não avulte na jurisprudência do em que se excluía o corte do 13.º mês e se considerava
Tribunal Constitucional português, não pode afastar- essa hipótese, em si, “um disparate”.
-se a consideração de situações de tutela ou proteção 31 — Em relação ao requisito ou teste iii), para saber-
reforçada da confiança. mos se estamos perante um preenchimento qualificado,
24 — Isto é, situações em que por os requisitos i), há designadamente que fazer uma distinção entre estar
ii) e iii) — os requisitos relativos às expectativas dos ou não o destinatário da medida em condições de alte-
particulares — estarem preenchidos de forma qualifi- rar os seus “planos de vida” face a uma alteração do
cada, se exija também que as razões de interesse público comportamento do Estado (em particular quando esta
que justificam a não continuidade do comportamento é uma alteração-surpresa, assumida contra tão recente
do Estado sejam especialmente qualificadas, ou, por factum proprium).
outras palavras, excecionalíssimas, quer na substância, 32 — Esta distinção é de crucial importância uma vez
quer no caráter absolutamente inesperado. que não poderá deixar de se entender que deve haver
25 — Ora, no caso vertente dos subsídios de férias uma proteção reforçada da confiança para aqueles que
e de Natal ou quaisquer prestações idênticas pagos a pura e simplesmente já não têm possibilidade de adaptar
aposentados, reformados, pré-aposentados e outros equi- os seus planos de vida a um novo comportamento do
parados (artigo 25.º, n.º 1, da LOE 2012), os requisitos Estado e portanto só podem esperar do Estado — de
i), ii) e iii) mostram-se preenchidos de um modo espe- um Estado “de bem” — que este não altere o seu com-
cialmente qualificado. portamento.
26 — Tendo aliás em conta que estas decisões do 33 — Ora, essa é a situação dos aposentados e refor-
legislador não se limitam a atingir os futuros aposenta- mados, os quais, salvo exceções muito circunscritas,
dos, reformados, pré-aposentados e outros equiparados, não têm possibilidade de escolher, como é óbvio, quais
mas atingem de imediato os atuais aposentados, refor- são ou serão os seus planos de vida: não podem decidir
mados, pré-aposentados e outros equiparados. se adquirem mais ou menos qualificações, qual a pro-
27 — Primeiro, porque existiram recentemente — e fissão que exercem, se no setor público ou privado, se
já nas circunstâncias críticas que atravessamos — com- permanecem em Portugal ou emigram, se trabalham por
portamentos capazes de gerar nos privados renovadas conta de outrem ou própria, se enveredam pelo empre-
“expectativas” de continuidade, sendo tais expectativas, endedorismo, se vivem nesta ou naquela localidade, se
por conseguinte, não apenas legítimas e fundadas em adquirem ou não habitação própria, se fazem ou não
boas razões, mas legítimas e fundadas em qualificadas poupanças, se têm um modo de vida mais ou menos
e recentes razões. desafogado, se consomem mais isto ou aquilo, se gastam
28 — Entre várias, recordem-se as declarações do mais ou menos em medicamentos, etc.
atual Primeiro-Ministro, pouco antes das eleições legis- 34 — Para esses, os “planos de vida” estão em regra
lativas, em Bruxelas, em 24 de março de 2011. Noticiava inexoravelmente traçados. Resta-lhes simplesmente
então o despacho da Lusa: “O líder do PSD, Passos confiar que o Estado não os inviabilize, em termos que
Coelho, assumiu hoje em Bruxelas o ‘compromisso’ significarão, muitas vezes, uma inevitável condenação
de não proceder a cortes salariais ou das pensões se a uma vida de dificuldades que já não têm condições
tiver necessidade de ‘mexer nos impostos’, mas admitiu para enfrentar e vencer. Para esses não se trata ape-
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nas “de reduções significativas, capazes de gerarem prossecução do interesse público — nem abarcados, de
ou acentuarem dificuldades de manutenção de práticas qualquer modo, pelo conceito de “servidor público”.
vivenciais e de satisfação de compromissos assumidos” 44 — Olhando para o primeiro traço aglutinador,
(Acórdão); pode tratar-se disso e da completa, absoluta não parece possível sustentar que as retribuições das
e incontornável impossibilidade de adaptarem o seu pessoas que trabalham no setor público sejam iguais
plano de vida a um novo quadro. às pensões.
35 — A proteção reforçada de confiança em situa- 45 — Na verdade, as primeiras são cobertas pelos
ções de expectativas qualificadas tem uma repercus- impostos dos contribuintes e por outras receitas. Diversa-
são inevitável ao nível da operação de ponderação ou mente, as pensões, apesar de serem pagas por organismos
balanceamento que o teste ou requisito iv) exige, uma públicos e de as respetivas verbas estarem inscritas em
vez que implica que o interesse público que justifica a orçamentos públicos, resultam de contribuições de pessoas
não tutela da confiança seja incomensuravelmente mais que, por assim dizer, as colocam nas mãos daqueles orga-
pesado do que nos casos em que não tenha de haver uma nismos para serem geridas e depois devolvidas na forma
proteção reforçada da confiança. de pensões. Não estamos assim perante dinheiros públicos
36 — Pretende-se com isto argumentar que mesmo como os que resultam dos impostos e são empregues nas
que o Tribunal entendesse — o que não se espera — que remunerações de quem serve os organismos públicos.
as reduções de remunerações e as suspensões de subsí- 46 — Não se vislumbra, assim, qualquer critério
dios de férias e de Natal de pessoas no ativo, em valores material que justifique a sujeição destas categorias de
que podem atingir ¼ dos rendimentos anuais dessas pessoas a esta diminuição dos seus rendimentos e não
pessoas, não violam o princípio da confiança, por haver se regista também qualquer outra medida de caráter
interesses públicos que, transitoriamente, o justificam, equivalente que seja aplicada a outras pessoas, desig-
essa conclusão não pode ser aplicada da mesma forma nadamente as que estão no ativo.
em relação aos reformados e aposentados. 47 — A ausência de um critério material que justi-
37 — Como se disse acima, aqui o interesse público fique a diferenciação é especialmente visível quando
justificador da alteração do comportamento do Estado comparamos o tratamento dado aos trabalhadores do
tem de ser especialmente qualificado: para além de setor privado que já estão reformados ou aposentados
incontroverso, terá de ser excecionalíssimo, não ante- e o tratamento dado aos trabalhadores do setor privado
cipável, não resolúvel de outro modo. que ainda estão no ativo.
38 — Ora, como mostra o debate político, em que se 48 — O que distingue os reformados/pensionistas do
envolveram as mais altas figuras do Estado, incluindo setor privado dos trabalhadores ativos do setor privado
o próprio Presidente da República, esta medida está é que os primeiros já pagaram as suas contribuições,
muito longe de ser justificada ou justificável desse recebendo agora a respetiva pensão de acordo com o
modo. que contribuíram, enquanto os segundos estão a pagar
39 — Pelo que requerem a declaração da inconsti- para vir a receber a pensão correspondente.
tucionalidade das normas do artigo 25.º da Lei do OE 49 — Ora, daqui não parece decorrer nenhum critério
2012, n.os 1, 2 e seguintes, por violação do princípio do material constitucionalmente legítimo que justifique
Estado de direito democrático, na vertente da proteção o tratamento desigual dos primeiros em relação aos
da confiança. segundos, pelo que esse tratamento se deve ter por dis-
criminatório à luz do artigo 13.º da CRP.
B) A violação do princípio da igualdade
C) Violação do direito à segurança social
40 — Para além do acima aduzido a propósito do
artigo 21.º, sobre a violação do princípio da igualdade, 50 — As normas acima identificadas do artigo 25.º,
que se aplica também ao artigo 25.º, há razões adicionais n.os 1 e 2, restringem, sem qualquer credencial consti-
para a declaração da inconstitucionalidade das normas tucional e de forma desproporcionada, o direito à segu-
deste preceito por violação do princípio da igualdade. rança social (artigo 63.º da CRP) de alguns portugueses,
41 — Como já se recordou, o Tribunal indicou no sendo certo que, apesar de não estarmos perante um
Acórdão, como fio unificador das categorias sujeitas direito sistematicamente inserido no capítulo consti-
à redução de remunerações, dois traços aglutinadores: tucional dedicado aos direitos, liberdades e garantias,
i) auferirem aquelas categorias retribuições mensais qualquer restrição deve observar as várias dimensões em
pagas por dinheiros públicos; ii) estarem vinculadas à que se desdobra o princípio da proporcionalidade.
prossecução do interesse público. O TC falou mesmo
num “esforço adicional pedido exclusivamente aos ser- Pelo exposto, os Deputados abaixo identificados, nos
vidores públicos”. termos conjugados do artigo 281.º, n.º 2, alínea f), da
42 — Ora, estes dois critérios, que são o fundamento Constituição da República Portuguesa e dos artigos 51.º
por que o Tribunal entendeu que no caso não se veri- e 62, n.º 2, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (com
ficava violação do princípio da igualdade, falecem no as alterações introduzidas pela Lei n.º 143/85, de 26 de
caso dos subsídios de férias e de Natal de aposentados novembro, pela Lei n.º 85/89, de 7 de setembro, pela Lei
e reformados. n.º 88/95, de 1 de setembro, e pela Lei n.º 13-A/98, de 26
43 — Quando o artigo 25.º, n.os 1 e 2, determina a de fevereiro), vêm, por este meio, requerer ao Tribunal
aplicação da suspensão dos subsídios de férias e de Natal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade
a aposentados e reformados, do setor público e do setor com força obrigatória geral das normas dos n.os 1 e 2 do
privado (expressões que utilizamos por facilidade de artigo 21.º (e, consequentemente, dos restantes números
expressão), o segundo traço aglutinador cai por terra, do mesmo) e dos n.os 1 e 2 do artigo 25.º (e, consequen-
porque é óbvio que nem aposentados nem reforma- temente, dos restantes números do mesmo artigo) da Lei
dos podem ser identificados por um especial vínculo à n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro.»
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Notificada para se pronunciar, querendo, sobre o pedido 8 — O disposto no presente artigo aplica-se igual-
formulado, a Presidente da Assembleia da República veio mente ao pessoal na reserva ou equiparado, quer esteja
oferecer o merecimento dos autos. em efetividade de funções quer esteja fora de efetivi-
Discutido em Plenário o memorando apresentado pelo dade.
Presidente do Tribunal Constitucional, nos termos do 9 — O regime fixado no presente artigo tem natureza
artigo 63.º, n.º 1, da LTC, e fixada a orientação do Tribu- imperativa e excecional, prevalecendo sobre quaisquer
nal, cumpre agora decidir em harmonia com o que então outras normas, especiais ou excecionais, em contrário e
se estabeleceu. sobre instrumentos de regulamentação coletiva de tra-
balho e contratos de trabalho, não podendo ser afastado
Fundamentação ou modificado pelos mesmos.
1 — O teor das normas questionadas é o seguinte: Artigo 25.º
Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro Suspensão de subsídios de férias e de Natal
ou equivalentes de aposentados e reformados
(Orçamento do Estado para 2012) 1 — Durante a vigência do PAEF, como medida
excecional de estabilidade orçamental, é suspenso o
Artigo 21.º pagamento de subsídios de férias e de Natal ou quaisquer
Suspensão do pagamento de subsídios
prestações correspondentes aos 13.º e, ou, 14.º meses,
de férias e de Natal ou equivalentes pagos pela CGA, I. P., pelo Centro Nacional de Pensões
e, diretamente ou por intermédio de fundos de pensões
1 — Durante a vigência do Programa de Assistência detidos por quaisquer entidades públicas, independen-
Económica e Financeira (PAEF), como medida excecio- temente da respetiva natureza e grau de independência
nal de estabilidade orçamental é suspenso o pagamento ou autonomia, e empresas públicas, de âmbito nacional,
de subsídios de férias e de Natal ou quaisquer prestações regional ou municipal, aos aposentados, reformados,
correspondentes aos 13.º e, ou, 14.º meses, às pessoas a pré-aposentados ou equiparados cuja pensão mensal
que se refere o n.º 9 do artigo 19.º da Lei n.º 55-A/2010, seja superior a € 1100.
de 31 de dezembro, alterada pelas Leis n.os 48/2011, de 2 — Os aposentados cuja pensão mensal seja igual ou
26 de agosto, e 60-A/2011, de 30 de novembro, cuja superior a € 600 e não exceda o valor de € 1100 ficam
remuneração base mensal seja superior a € 1100. sujeitos a uma redução nos subsídios ou prestações
2 — As pessoas a que se refere o n.º 9 do artigo 19.º previstos no número anterior, auferindo o montante
da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, alterada pelas calculado nos seguintes termos: subsídios/prestações =
Leis n.os 48/2011, de 26 de agosto, e 60-A/2011, de 30 de = 1320 - 1,2 × × pensão mensal.
novembro, cuja remuneração base mensal seja igual ou 3 — Durante a vigência do PAEF, como medida exce-
superior a € 600 e não exceda o valor de € 1100, ficam cional de estabilidade orçamental, o valor mensal das
sujeitas a uma redução nos subsídios ou prestações subvenções mensais, depois de atualizado por indexação
previstos no número anterior, auferindo o montante às remunerações dos cargos políticos considerados no
calculado nos seguintes termos: subsídios/prestações = seu cálculo, é reduzido na percentagem que resultar da
= 1320 - 1,2 × remuneração base mensal. aplicação dos números anteriores às pensões de idêntico
3 — O disposto nos números anteriores abrange todas valor anual.
as prestações, independentemente da sua designação 4 — O disposto no presente artigo aplica-se sem
formal, que, direta ou indiretamente, se reconduzam prejuízo da contribuição extraordinária prevista no
ao pagamento dos subsídios a que se referem aqueles artigo 162.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezem-
números, designadamente a título de adicionais à remu- bro, alterada pelas Leis n.os 48/2011, de 26 de agosto, e
neração mensal. 60-A/2011, de 30 de novembro.
5 — No caso das pensões ou subvenções pagas, dire-
4 — O disposto nos n.os 1 e 2 abrange ainda os con-
tamente ou por intermédio de fundos de pensões detidos
tratos de prestação de serviços celebrados com pessoas
por quaisquer entidades públicas, independentemente da
singulares ou coletivas, na modalidade de avença, com respetiva natureza e grau de independência ou autono-
pagamentos mensais ao longo do ano, acrescidos de mia, e empresas públicas, de âmbito nacional, regional
uma ou duas prestações de igual montante. ou municipal, o montante relativo aos subsídios cujo
5 — O disposto no presente artigo aplica-se após pagamento é suspenso nos termos dos números anteriores
terem sido efetuadas as reduções remuneratórias pre- deve ser entregue por aquelas entidades na CGA, I. P., não
vistas no artigo 19.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de sendo objeto de qualquer desconto ou tributação.
dezembro, alterada pelas Leis n.os 48/2011, de 26 de 6 — O regime fixado no presente artigo tem natureza
agosto, e 60-A/2011, de 30 de novembro, bem como imperativa e excecional, prevalecendo sobre quaisquer
do artigo 23.º da mesma lei. outras normas, especiais ou excecionais, em contrário
6 — O disposto no presente artigo aplica-se aos e sobre instrumentos de regulamentação coletiva de
subsídios de férias que as pessoas abrangidas teriam trabalho e contratos de trabalho, não podendo ser afas-
direito a receber, quer respeitem a férias vencidas no tado ou modificado pelos mesmos, admitindo como
início do ano de 2012 quer respeitem a férias vencidas única exceção as prestações indemnizatórias correspon-
posteriormente, incluindo pagamentos de proporcio- dentes, atribuídas aos deficientes militares abrangidos,
nais por cessação ou suspensão da relação jurídica de respetivamente, pelos Decretos-Leis n.os 43/76, de 20
emprego. de janeiro, 314/90, de 13 de outubro, na redação dada
7 — O disposto no número anterior aplica-se, com pelo Decreto-Lei n.º 248/98, de 11 de agosto, e 250/99,
as devidas adaptações, ao subsídio de Natal. de 7 de julho.
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As pessoas referidas no n.º 9 do artigo 19.º da Lei jurídica de emprego público, nos termos do disposto nos
n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, alterada pelas Leis n.os 1 e 2 do artigo 2.º e nos n.os 1, 2 e 4 do artigo 3.º da
n.os 48/2011, de 26 de agosto, e 60-A/2011, de 30 de no- Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, alterada pelas Leis
vembro, que foram abrangidas pela medida de suspensão n.os 64-A/2008, de 31 de dezembro, e 3-B/2010, de 28 de
do pagamento de subsídios de férias e de Natal ou presta- abril, incluindo os trabalhadores em mobilidade especial
ções equivalentes, decretada pelo transcrito artigo 21.º da e em licença extraordinária;
Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, são as seguintes: s) Os trabalhadores dos institutos públicos de regime
a) O Presidente da República; especial e de pessoas coletivas de direito público dotadas
b) O Presidente da Assembleia da República; de independência decorrente da sua integração nas áreas
c) O Primeiro-Ministro; de regulação, supervisão ou controlo;
d) Os Deputados à Assembleia da República; t) Os trabalhadores das empresas públicas de capital
e) Os membros do Governo; exclusiva ou maioritariamente público, das entidades públi-
f) Os juízes do Tribunal Constitucional e juízes do Tri- cas empresariais e das entidades que integram o setor
bunal de Contas, o Procurador-Geral da República, bem empresarial regional e municipal, com as adaptações auto-
como os magistrados judiciais, magistrados do Ministério rizadas e justificadas pela sua natureza empresarial;
Público e juízes da jurisdição administrativa e fiscal e dos u) Os trabalhadores e dirigentes das fundações públi-
julgados de paz; cas e dos estabelecimentos públicos não abrangidos pelas
g) Os Representantes da República para as regiões alíneas anteriores;
autónomas; v) O pessoal nas situações de reserva, pré-aposentação e
h) Os deputados às Assembleias Legislativas das regiões disponibilidade, fora de efetividade de serviço, que bene-
autónomas; ficie de prestações pecuniárias indexadas aos vencimentos
i) Os membros dos governos regionais; do pessoal no ativo.
j) Os governadores e vice-governadores civis;
l) Os eleitos locais; 2 — Do conteúdo destes preceitos conclui-se que o
m) Os titulares dos demais órgãos constitucionais não Orçamento do Estado para 2012 veio suspender total ou
referidos nas alíneas anteriores, bem como os membros dos parcialmente o pagamento dos subsídios de férias e de
órgãos dirigentes de entidades administrativas independen- Natal, ou quaisquer prestações correspondentes aos 13.º
tes, nomeadamente as que funcionam junto da Assembleia e, ou, 14.º meses, quer para pessoas que auferem remune-
da República; rações salariais de entidades públicas, quer para pessoas
n) Os membros e os trabalhadores dos gabinetes, dos que auferem pensões de reforma ou aposentação através
órgãos de gestão e de gabinetes de apoio, dos titulares do sistema público de segurança social, estabelecendo que
dos cargos e órgãos das alíneas anteriores, do Presidente tal medida, qualificada como excecional, terá a duração
e Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura, do período de vigência do Programa de Assistência Eco-
do Presidente e Vice-Presidente do Conselho Superior nómica e Financeira (PAEF).
dos Tribunais Administrativos e Fiscais, do Presidente Este Programa implicou a satisfação de determinadas
do Supremo Tribunal de Justiça, do Presidente e juízes condições prévias por parte das autoridades portuguesas e
do Tribunal Constitucional, do Presidente do Supremo é constituído por um conjunto de instrumentos jurídicos,
Tribunal Administrativo, do Presidente do Tribunal de os quais foram aprovados, por um lado, pelo Governo
Contas, do Provedor de Justiça e do Procurador-Geral da Português e, por outro lado, pelo Conselho Executivo do
República; Fundo Monetário Internacional, bem como pelo Governo
o) Os militares das Forças Armadas e da Guarda Nacio- Português e pela Comissão Europeia (em nome da União
nal Republicana, incluindo os juízes militares e os militares Europeia) e pelo Banco Central Europeu. Assim, entre o
que integram a assessoria militar ao Ministério Público, Governo Português e o Fundo foram aprovados um memo-
bem como outras forças militarizadas; rando técnico de entendimento, assim como um memo-
p) O pessoal dirigente dos serviços da Presidência da rando de políticas económicas e financeiras, os quais
República e da Assembleia da República, e de outros servi- estabelecem as condições da ajuda financeira a Portugal por
ços de apoio a órgãos constitucionais, dos demais serviços parte do Fundo Monetário Internacional. Além disso, entre
e organismos da administração central, regional e local o Governo Português e a União Europeia foi assinado o
do Estado, bem como o pessoal em exercício de funções memorando de entendimento relativo às condicionalidades
equiparadas para efeitos remuneratórios; específicas de política económica, adotado com referência
q) Os gestores públicos, ou equiparados, os membros ao Regulamento do Conselho (UE) n.º 407/2010, de 11 de
dos órgãos executivos, deliberativos, consultivos, de fisca- maio de 2010, que estabelece o Mecanismo Europeu de
lização ou quaisquer outros órgãos estatutários dos institu- Estabilização Financeira, em especial o artigo 3.º, n.º 5,
tos públicos de regime geral e especial, de pessoas coletivas do mesmo, o qual descreve as condições gerais da política
de direito público dotadas de independência decorrente económica tal como contidas na Decisão de Execução do
da sua integração nas áreas de regulação, supervisão ou Conselho n.º 2011/344/UE, de 17 de maio de 2011, sobre
controlo, das empresas públicas de capital exclusiva ou a concessão de assistência financeira a Portugal.
maioritariamente público, das entidades públicas empre- Estes memorandos são vinculativos para o Estado Por-
sariais e das entidades que integram o setor empresarial tuguês, na medida em que se fundamentam em instru-
regional e municipal, das fundações públicas e de quaisquer mentos jurídicos — os Tratados institutivos das entidades
outras entidades públicas; internacionais que neles participaram, e de que Portugal
r) Os trabalhadores que exercem funções públicas na é parte — de Direito Internacional e de Direito da União
Presidência da República, na Assembleia da República, Europeia, os quais são reconhecidos pela Constituição,
em outros órgãos constitucionais, bem como os que exer- desde logo no artigo 8.º, n.º 2. Assim, o memorando técnico
cem funções públicas, em qualquer modalidade de relação de entendimento e o memorando de políticas económicas e
3852 Diário da República, 1.ª série — N.º 140 — 20 de julho de 2012

financeiras baseia-se no artigo V, Secção 3, do Acordo do no caso das remunerações iguais ou superiores a € 2000
Fundo Monetário Internacional, enquanto o memorando até € 4165;
de entendimento relativo às condicionalidades específicas c) 10 % sobre o valor total das remunerações superiores
de política económica se fundamenta, em última análise, a € 4165.
no artigo 122.º, n.º 2, do Tratado sobre o Funcionamento
da União Europeia. Tais documentos impõem a adoção E, relativamente às pessoas que auferem pensões, cujo
pelo Estado Português das medidas neles consignadas montante exceda 12 vezes o indexante dos apoios sociais
como condição do cumprimento faseado dos contratos de (IAS), a ablação dos subsídios de férias ou de prestações
financiamento celebrados entre as mesmas entidades. equivalentes acresce à contribuição extraordinária de soli-
Da leitura destes memorandos, assim como da Reso- dariedade imposta pelo artigo 162.º da Lei n.º 55-A/2010,
lução do Conselho de Ministros n.º 8/2011, de 5 de maio de 31 de dezembro, com as alterações introduzidas pelo
de 2011 (publicada no Diário da República, 2.ª série, de artigo 20.º, n.º 1, da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro,
17 de maio de 2011), resulta que, na sequência de tal Pro- com os seguintes valores:
grama, Portugal deve adotar um conjunto de medidas e de
iniciativas legislativas, inclusivamente de natureza estrutu- a) 25 % sobre o montante que exceda 12 vezes o valor
ral, relacionadas com as finanças públicas, a estabilidade do indexante dos apoios sociais (IAS), mas que não ultra-
financeira e a competitividade, as quais deverão ocorrer passe 18 vezes aquele valor;
durante um período de três anos. b) 50 % sobre o montante que ultrapasse 18 vezes o
Apesar de estes memorandos não preverem a suspensão IAS.
do pagamento dos subsídios de férias e de Natal ou de
quaisquer prestações equivalentes, como os artigos 21.º e Há ainda que tomar em consideração que foi adotada
25.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, remetem em 2010, 2011 e 2012 uma política de congelamento dos
para o período de vigência do PAEF a duração da suspensão salários do setor público, e nos dois últimos anos das pen-
de pagamentos neles decretada, tal medida não pode deixar sões, cuja manutenção nos anos seguintes se encontra
de ter, pelo menos, a duração de três anos, abrangendo os prevista nos memorandos que consubstanciam o PAEF, o
anos de 2012, 2013 e 2014. que, conjugado com o fenómeno da inflação, resulta numa
Esta suspensão do pagamento dos subsídios de férias de redução real desses salários e pensões equivalente às taxas
Natal vai afetar as pessoas acima elencadas que auferem de inflação verificadas nesse período.
remunerações salariais de entidades públicas ou pensões Já relativamente a medidas de natureza universal, ado-
de reforma ou aposentação através do sistema público de tadas no capítulo das receitas, que tenham uma ação direta
segurança social de valor superior a € 600. de diminuição dos rendimentos dos cidadãos, resultando
Para os rendimentos mensais ilíquidos entre € 600 e numa contribuição acrescida para o esforço de consolida-
€ 1100 o legislador introduziu duas fórmulas de igual ção orçamental, a Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro
conteúdo (subsídios/prestações = 1320 - 1,2 × remune- (Orçamento do Estado para 2012), além de diversas alte-
ração base mensal e subsídios/prestações = 1320 - 1,2 × rações no regime de cálculo do imposto sobre os rendi-
× pensão mensal) que implicam, na prática, a imposição mentos de pessoas singulares, designadamente no domínio
de uma redução progressiva do rendimento anual ilíquido dos benefícios fiscais e no valor de algumas taxas, como
até 14,3 %. medida excecional, apenas fez incidir sobre os sujeitos
A ablação da totalidade dos subsídios de férias e de passivos com rendimentos mais elevados pertencentes
Natal ou de quaisquer prestações correspondentes aos ao último escalão uma taxa adicional de 2,5 % sobre o
13.º e, ou, 14.º meses recai sobre as pessoas que aufiram respetivo rendimento coletável, a qual vigorará nos anos
remunerações ou pensões superiores a € 1100 mensais. O de 2012 e 2013 (artigo 68.º-A). Num sentido oposto, o
não pagamento, na totalidade, dos subsídios, que se aplica legislador, para os anos de 2012 a 2014, optou por não
às pessoas com rendimentos mensais superiores a € 1100, repetir a imposição de uma sobretaxa extraordinária de
corresponde percentualmente a uma redução de 14,3 % do 3,5 % sobre os rendimentos sujeitos a IRS, como havia
montante anual das remunerações salariais e das pensões feito no ano de 2011, através da Lei n.º 49/2011, de 7 de
de reforma ou aposentação. setembro, a qual teve uma previsão de acréscimo de receita
Esta ablação é cumulada com as prévias reduções já de €840 milhões, em 2011, e €185 milhões em 2012, nem
impostas no ano anterior pelos artigos 19.º, 23.º e 162.º criar um novo imposto específico extraordinário, como
da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, alterada pelas forma de cumprir os limites do défice público a que se
Leis n.os 48/2011, de 26 de agosto, e 60-A/2011, de 30 de vinculou nos memorandos de entendimento acordados com
novembro, que o artigo 20.º, n.º 1, da Lei n.º 64-B/2011, as entidades financiadoras, através do contributo de todos
de 30 de dezembro (Orçamento do Estado para 2012), os cidadãos de acordo com as suas capacidades. Preferiu
manteve em vigor no presente ano. atuar, sobretudo, pelo lado da despesa, suspendendo por um
Ou seja, no que respeita às pessoas que auferiam, no período de três anos o pagamento dos subsídios de férias
final de 2010, no quadro do setor público, remunerações e de Natal a quem os aufere por verbas públicas.
ilíquidas mensais superiores a € 1500, o não pagamento 3 — No Relatório do Orçamento do Estado para 2012
do subsídio de férias e de Natal acresce a uma redução justificou-se a adoção da medida de suspensão do paga-
percentual da sua remuneração salarial mensal que varia mento dos subsídios de férias e de Natal ou de prestações
entre 3,5 % e 10 %, nos seguintes termos: equivalentes a quem recebe remunerações ou pensões pelo
Orçamento do Estado nos seguintes termos:
a) 3,5 % sobre o valor total das remunerações superiores
a € 1500 e inferiores a € 2000; «Tendo como base as perspetivas orçamentais para
b) 3,5 % sobre o valor de € 2000, acrescido de 16 % 2011 e o atual enquadramento macrofinanceiro, a pro-
sobre o valor da remuneração total que exceda os € 2000, posta do Orçamento do Estado para 2012 materializa
perfazendo uma taxa global que varia entre 3,5 % e 10 %, um conjunto de medidas de consolidação orçamental
Diário da República, 1.ª série — N.º 140 — 20 de julho de 2012 3853

com vista a garantir a sustentabilidade das contas pú- uma onerosidade social excessiva. Para os orçamentos
blicas num contexto de grande exigência, o controlo da familiares, alternativas de reduções remuneratórias que
despesa em todas as áreas da Administração Pública, implicassem uma diminuição dos montantes que a cada
a monitorização rigorosa dos riscos orçamentais e o mês fazem face às despesas dos agregados seriam certa-
cumprimento dos limites definidos no Programa de mente mais penalizadoras e de muito mais difícil gestão.
Assistência Económica e Financeira (PAEF). Por isso a suspensão dos subsídios de férias e de Natal
As medidas propostas e sumariadas na tabela abaixo é socialmente mais admissível e menos onerosa, não
incidem em grande parte sobre a despesa pública afastando a mais-valia que a estabilidade remuneratória
(mais de 2/3) tendo inerentes cortes transversais a toda mensal proporciona.
Administração Pública, incluindo institutos públicos, O facto de os portugueses nas últimas eleições legis-
Administração Local e Regional e Setor Empresarial lativas terem manifestado um apoio inequívoco ao cum-
do Estado. O cumprimento da meta para o défice em primento dos objetivos assumidos no contexto do PAEF,
2012 torna também necessário proceder a um ajus- através de uma votação global de 80 % nos partidos
tamento pela via fiscal, tal como aliás já previsto no subscritores do acordo com a UE e FMI, demonstra
próprio programa. estarem conscientes da situação do País e da necessidade
O PAEF impõe um limite para o défice orçamental incontornável de fortes ajustamentos ao nível geral.
das Administrações Públicas, numa ótica de contabili- Não ignora o Governo que se trata de um peso que
dade nacional, de 7645 milhões de euros em 2012 (equi- recai diretamente sobre as pessoas com uma relação de
valente a 4,5 % do PIB), cujo cumprimento é condição emprego público, não tendo uma natureza universal.
necessária para garantir os desembolsos associados ao Mas a verdade é que embora sendo múltiplas as
Programa e, portanto, para impedir a interrupção do medidas de contenção de despesa pública adotadas pelo
financiamento da economia portuguesa. Governo, ainda assim os desvios subsistem com uma
Para atingir tal objetivo, a proposta de orçamento magnitude que não podem senão ser corrigidos por uma
materializa um esforço de consolidação orçamental medida transversal sobre uma rubrica tão relevante para
com medidas que totalizam um impacto esperado na a consolidação orçamental como é a da despesa com
ordem dos 6 % do PIB quando comparado com um pessoal. As alternativas ou são social e economicamente
cenário das políticas invariantes, i. e., cerca de 2.4 p. p. piores ou simplesmente não são eficazes para garantir
acima do previsto no PAEF. A estratégia de consolidação as necessidades.
orçamental incorpora, assim, medidas de contenção da O esforço do lado da receita atingiu já os limites
despesa que vão além das incluídas no PAEF de forma do sustentável, e é da imperiosa combinação com um
a compensar, de forma permanente, o desvio de execu- acentuado esforço do lado da despesa nos seus seg-
ção orçamental verificado, essencialmente, no primeiro mentos de maior expressão que será possível corrigir
semestre de 2011. os desequilíbrios.
Parte deste desvio foi já explicado no Documento Acresce que não é de facto igual a situação de quem
de Estratégia Orçamental, designadamente no que diz tem uma relação de emprego público e os outros tra-
respeito às despesas com o pessoal, ao consumo inter- balhadores.
médio, à receita não fiscal, à inclusão de efeitos de Nem no plano qualitativo dos direitos e garantias, que
natureza temporária, como sejam a assunção da dívida são superiores, nem no plano quantitativo das remune-
de duas empresas da Região Autónoma da Madeira e a rações, subsistindo na sociedade portuguesa uma dife-
operação relacionada com a privatização do BPN, bem renciação média remuneratória, com alguma expressão,
como a medidas incluídas no Orçamento para 2011 cujo entre os setores públicos e o privado. Num contexto de
impacto estava sobrestimado ou cuja implementação se emergência nacional com elevado nível de desemprego,
veio a demonstrar impossível. a segurança no emprego constitui um valor inestimável
O trabalho técnico subjacente à preparação da pro- que, na ponderação dos bens tutelados, se sobrepõe às
posta de Orçamento do Estado para 2012 permitiu obter expectativas de intocabilidade do quantum remunera-
informação significativamente mais detalhada para 2011 tório, sobretudo atendendo a que os trabalhadores do
referente a todas as entidades incluídas no perímetro das setor público beneficiam em média, quando comparado
Administrações Públicas. No que se refere, em particu- com trabalhadores com qualificações idênticas no setor
lar, ao Setor Empresarial do Estado e à Administração privado, de retribuições superiores.
Local a referida informação revelou a existência de A presente proposta de orçamento tem também a
desvios no primeiro semestre superiores aos reportados preocupação de ser transversal, abrangendo todos, mas
no Documento de Estratégia Orçamental. garantindo simultaneamente a proteção dos mais vulne-
Os desvios encontrados e a meta estabelecida para ráveis. Numa situação de crise e emergência social não
2012 justificam, assim, o nível de ambição das medidas é possível excluir nenhuma corporação ou grupo social
propostas. de dar o seu contributo para o ajustamento. Daí a neces-
Com efeito, uma medida como a suspensão dos sub- sidade de medidas abrangentes que têm efeitos sobre
sídios de férias e de Natal aos servidores do Estado é salários, pensões e outras prestações sociais bem como
ditada pela urgente necessidade de corrigir os dese- de aumento de impostos com maior incidência sobre os
quilíbrios orçamentais e o profundo agravamento das rendimentos mais elevados e sobre o património».
finanças públicas, e só se justifica por ser absolutamente
necessária para assegurar as metas muito exigentes a que O mesmo Relatório indica, no quadro II.1.1., a previsão
Portugal se vinculou e para preservar a manutenção e dos montantes globais de redução da despesa com pessoal e
sustentabilidade do Estado Social e garantir o financia- prestações sociais que resultam desta medida: face a 2011,
mento da economia portuguesa. A adoção destas medi- os cortes salariais na Administração Pública permitirão re-
das foi ainda modulada pela preocupação de prevenir duzir a despesa em € 1800 milhões, e os cortes nas pensões
3854 Diário da República, 1.ª série — N.º 140 — 20 de julho de 2012

permitirão uma redução da despesa de € 1260,2 milhões. tuado «segundo um esquema de aumentos degressivos em
Esta previsão de resultados é ilíquida, não contemplando valor absoluto», bem como com a instituição, com caráter
a diminuição da receita do IRS e das contribuições para de obrigatoriedade legal, do 13.º mês (subsídio de Natal) e
a Segurança Social que tal suspensão de pagamentos au- com a criação do subsídio de férias (cujo valor era, então,
tomaticamente irá originar. O quadro II.3.1. do mesmo equivalente a metade da remuneração mensal).
Relatório, que já inclui as previsões dos resultados líquidos Atualmente, a ideia de que estes subsídios constituem
destas reduções, refere uma poupança líquida em 2012 de parte da «remuneração anual», resulta claramente do
€ 1065 milhões, em resultado das reduções salariais, e de artigo 70.º, n.º 3, da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro,
€ 951,5 milhões, em resultado do corte nas pensões. que estabelece os regimes de vinculação, de carreiras e
As razões apresentadas para se adotar a medida contida de remunerações dos trabalhadores que exercem funções
nas normas aqui sob fiscalização assentam, primordial- públicas, o qual dispõe que «A remuneração base anual
mente, na necessidade de cumprimento dos limites do é paga em 14 mensalidades, correspondendo uma delas
défice orçamental (4,5 % do PIB em 2012), imposto nos ao subsídio de Natal e outra ao subsídio de férias, nos
memorandos acima mencionados, os quais condicionam termos da lei».
a concretização dos empréstimos faseados acordados com Daí que a suspensão do pagamento do subsídio de férias
a União Europeia e com o Fundo Monetário Internacio- e de Natal se traduza numa redução percentual do rendi-
nal, garantindo assim o imprescindível financiamento do mento anual das pessoas afetadas, tal como sucede com
Estado português. Invocando-se os desvios verificados os cortes salariais determinados pelo artigo 19.º da Lei
na execução orçamental de 2011, optou-se por recorrer a n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro (Orçamento do Estado
medidas adicionais que, não estando previstas no PAEF para 2011), e que o artigo 20.º, n.º 1, da Lei n.º 64-B/2011,
consubstanciado naqueles memorandos, permitissem corri- de 30 de dezembro (Orçamento do Estado para 2012), man-
gir de forma permanente aqueles desvios. Nessas medidas, teve em vigor no presente ano, representando, da mesma
avulta a suspensão do pagamento dos subsídios de férias forma, uma diminuição dos seus meios de subsistência.
e de Natal ou de prestações equivalentes a quem recebe De forma idêntica devem ser encarados os subsídios de
remunerações ou pensões no quadro do setor público, férias e de Natal ou quaisquer prestações correspondentes
durante a vigência do PAEF. Apesar de se reconhecer que aos 13.º e, ou, 14.º meses, pagos por verbas públicas aos
tal opção redundava num significativo sacrifício apenas aposentados, reformados e pré-aposentados, os quais mais
para as pessoas com uma relação de emprego público, não não são do que prestações complementares, com a mesma
tendo, portanto, uma natureza universal, entendeu-se que a natureza das prestações mensais pagas a estas pessoas,
necessidade de atuar no lado da despesa, designadamente caracterizadas por uma periodicidade distinta, mas que se
na rubrica das despesas com pessoal, devido ao esforço do integram no cômputo global anual da pensão.
lado da receita já ter atingido os limites da sustentabilidade, A opção pela suspensão do pagamento destes subsí-
conjugada com a eficácia de tal medida na obtenção dos dios e não por uma parte das prestações pagas no final de
resultados pretendidos, exigia essa escolha. cada mês deveu-se apenas, nas palavras do Relatório do
Numa outra linha de fundamentação, invocou-se que não Orçamento do Estado para 2012, à preocupação em sal-
era igual a situação de quem tem uma relação de emprego vaguardar a mais-valia que a estabilidade remuneratória
público e os outros trabalhadores, uma vez que aqueles, mensal proporciona, dado que alternativas de reduções
em média, têm remunerações superiores e usufruem de remuneratórias que implicassem uma diminuição dos mon-
uma maior segurança no emprego, o que justificaria o tantes que a cada mês fazem face às despesas dos agregados
acréscimo de sacrifício exigido. seriam certamente mais penalizadoras e de muito mais
4 — Previamente à abordagem da questão de constitu- difícil gestão.
cionalidade suscitada pelos Requerentes, convém referir 5 — Os Requerentes, além de outros argumentos, invo-
que os subsídios de férias e de Natal ou quaisquer pres- cam que as normas questionadas violam o princípio da
tações correspondentes aos 13.º e, ou, 14.º meses, cujo igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição, na sua
pagamento foi objeto de suspensão pelo artigo 21.º da Lei dimensão de «igualdade perante a repartição de encargos
n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro (Orçamento do Estado públicos». Alegam que a medida imposta pelas normas
para 2012), não revestem, no essencial, natureza diversa impugnadas se traduz numa dualidade de tratamento, ao
das remunerações salariais que foram objeto da redução estabelecer uma distinção entre cidadãos a quem os sacri-
determinada pelo artigo 19.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 fícios são exigidos pelo Estado essencialmente através dos
de dezembro (Orçamento do Estado para 2011). impostos e outros cidadãos a quem os sacrifícios são exigi-
Com efeito, atualmente, tanto o subsídio de férias como dos não só por essa via, mas também, e cumulativamente,
o de Natal, quer no regime jurídico do direito privado, quer através da ablação de partes significativas dos seus direitos
no do direito público, têm a natureza de retribuição, isto à retribuição e à pensão de reforma e aposentação.
é, de contrapartida ligada ao trabalho prestado, integrando O princípio da igualdade na repartição dos encargos
a remuneração anual. públicos, enquanto manifestação específica do princípio
No que respeita aos trabalhadores que exercem funções da igualdade, constitui um necessário parâmetro de atu-
públicas, esta natureza foi reconhecida, desde logo, no ação do legislador. Este princípio deve ser considerado
Decreto-Lei n.º 372/74, de 20 de agosto, que instituiu, com quando o legislador decide reduzir o défice público para
caráter de obrigatoriedade, o subsídio de Natal, e criou o salvaguardar a solvabilidade do Estado. Tal como recai
subsídio de férias. Conforme resulta do preâmbulo desse sobre todos os cidadãos o dever de suportar os custos do
diploma, teve-se em vista, com o mesmo, aumentar «subs- Estado, segundo as suas capacidades, o recurso excecional
tancialmente os vencimentos do funcionalismo público a uma medida de redução dos rendimentos daqueles que
civil», cujo poder de compra havia sido fortemente abalado auferem por verbas públicas, para evitar uma situação de
pela evolução dos preços nos anos anteriores. Ainda de ameaça de incumprimento, também não poderá ignorar os
acordo com o referido preâmbulo, esse aumento foi efe- limites impostos pelo princípio da igualdade na repartição
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dos inerentes sacrifícios. Interessando a sustentabilidade efetivamente, permite uma redução segura e imediata
das contas públicas a todos, todos devem contribuir, na de despesas fixas com pensões e remunerações do setor
medida das suas capacidades, para suportar os reajusta- público que possibilitam uma poupança certa e garantida
mentos indispensáveis a esse fim. para os cofres do Estado, embora também não possa ser
É indiscutível que, com as medidas constantes das nor- ignorado que ela igualmente determina automaticamente
mas impugnadas, a repartição de sacrifícios, visando a uma diminuição da receita do IRS e das contribuições para
redução do défice público, não se faz de igual forma entre a Segurança Social e tem efeitos recessivos no consumo
todos os cidadãos, na proporção das suas capacidades interno, com a consequente diminuição generalizada das
financeiras, uma vez que elas não têm um cariz universal, receitas públicas.
recaindo exclusivamente sobre as pessoas que auferem O Relatório do Orçamento do Estado para 2012 acres-
remunerações e pensões por verbas públicas. Há, pois, um centa ainda que «não é [...] igual a situação de quem tem
esforço adicional, em prol da comunidade, que é pedido uma relação de emprego público e os outros trabalhadores»
exclusivamente a algumas categorias de cidadãos. e invoca essencialmente duas razões: os trabalhadores do
O Tribunal Constitucional pronunciou-se recentemente Estado e outras entidades públicas beneficiam em média
no Acórdão n.º 396/2011, proferido em 21 de setembro de retribuições superiores às do setor privado e têm uma
de 2011 (acessível em www.tribunalconstitucional.pt), maior garantia de subsistência do vínculo laboral.
sobre a constitucionalidade das reduções remuneratórias Deve, no entanto, afirmar-se que a diferença de níveis
constantes do artigo 19.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de de remuneração não pode ser avaliada apenas em ter-
dezembro (Orçamento do Estado para 2011), as quais se mos médios, pois os tipos de trabalho e de funções que
mantém no presente ano de 2012, como acima se referiu, são exercidos no setor público não são de modo nenhum
proferindo um juízo de não inconstitucionalidade. Nesse necessariamente iguais aos do setor privado. Assim, essa
aresto, o Tribunal não deixou de confrontar essas redu- diferença de remunerações médias teria de se demonstrar
ções salariais com o princípio da igualdade, na dimensão em face de cada tipo de atividade comparável, sendo certo
invocada pelos Requerentes, tendo concluído que «o não que há funções muito específicas, incluindo funções de
prescindir-se de uma redução de vencimentos, no quadro soberania, que só ao Estado e demais entidades públicas
de distintas medidas articuladas de consolidação orça- competem. Além disso, uma comparação tendo como crité-
mental, que incluem também aumentos fiscais e outros rio a simples média do valor dos rendimentos auferidos nos
cortes de despesas públicas, apoia-se numa racionalidade dois setores seria sempre insuficiente para justificar uma
coerente com uma estratégia de atuação cuja definição discriminação nos cortes dos rendimentos concretamente
cabe ainda dentro da margem de livre conformação política auferidos por cada um dos afetados.
do legislador. Intentando-se, até por força de compromis- No que respeita à alegação da maior garantia de subsis-
sos com instâncias europeias e internacionais, conseguir tência do vínculo laboral, apesar de ainda ser possível dizer-
resultados a curto prazo, foi entendido que, pelo lado da -se que, na generalidade, se verifica uma maior segurança
despesa, só a diminuição de vencimentos garantia eficá- no emprego público, esse dado não é idóneo para justifi-
cia certa e imediata, sendo, nessa medida, indispensável. car qualquer diferenciação na participação dos cidadãos,
Não havendo razões de evidência em sentido contrário, e através de uma ablação de parte dos seus rendimentos,
dentro de “limites do sacrifício”, que a transitoriedade e os nos encargos com a diminuição do défice público, como
montantes das reduções ainda salvaguardam, é de aceitar meio de garantir a sustentabilidade financeira do Estado,
que essa seja uma forma legítima e necessária, dentro do num período de emergência. Essa participação é exigí-
contexto vigente, de reduzir o peso da despesa do Estado, vel apenas àqueles que atualmente auferem rendimentos
com a finalidade de reequilíbrio orçamental. Em vista capazes de suportar tal contributo, sendo irrelevante para
deste fim, quem recebe por verbas públicas não está em a medida dessa capacidade um valor como o da segurança
posição de igualdade com os restantes cidadãos, pelo que no emprego.
o sacrifício adicional que é exigido a essa categoria de Em qualquer destes planos, o que releva considerar é que
pessoas — vinculada que ela está, é oportuno lembrá-lo, a suspensão dos subsídios de férias e de Natal afeta indivi-
à prossecução do interesse público — não consubstancia dualmente os trabalhadores do setor público em função do
um tratamento injustificadamente desigual». respetivo nível remuneratório, sendo indiferente, do ponto
Entendeu-se que o recurso a uma medida como a redu- de vista da onerosidade da medida, que as remunerações
ção dos rendimentos de quem aufere por verbas públicas globalmente consideradas na Administração Pública sejam
como meio de rapidamente diminuir o défice público, em superiores às que são auferidas pelos trabalhadores do setor
excecionais circunstâncias económico-financeiras, apesar privado ou que estes se encontrem em situação mais desfa-
de se traduzir num tratamento desigual, relativamente a vorável no que se refere à garantia de empregabilidade.
quem aufere rendimentos provenientes do setor privado da Por outro lado, a possível extensão da medida à genera-
economia, tinha justificações que a subtraíam à censura do lidade dos trabalhadores — que está subjacente à argumen-
princípio da igualdade na repartição dos encargos públicos, tação adotada no Relatório do Orçamento do Estado para
uma vez que essa redução ainda se continha dentro dos 2012 — só afetaria aqueles que se encontram em situação
«limites do sacrifício». de pleno emprego e na proporção dos rendimentos efetiva-
É inegável que no atual contexto uma medida deste tipo mente auferidos. O que significa que as ponderações feitas
tem, desde logo, uma razão justificativa que é a sua eficácia pelo legislador não evidenciam uma situação de desigual-
nos resultados a curto prazo, ao nível da redução do défice dade que pudesse justificar a implementação da medida
público, sendo certo que, de momento, na situação em somente em relação a uma categoria de trabalhadores, mas,
que o País se encontra e tendo em conta os compromissos quando muito, apenas poderiam determinar que o Estado
internacionais assumidos, essa redução do défice se apre- viesse a arrecadar uma maior receita no setor público rela-
senta como um objetivo prioritário de política económica tivamente ao mesmo universo de trabalhadores que fossem
e financeira. Ora, não oferece dúvidas que tal medida, correspondentemente abrangidos no setor privado.
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Subsiste, pois, como razão justificativa para o tratamento quer redução dos mesmos. Não se esqueça, no que toca
diferenciado dos que auferem remunerações e pensões do às pensões mais elevadas, que naquelas que excedem 12
Orçamento do Estado apenas a eficácia das medidas ado- vezes o valor do indexante dos apoios sociais, o montante
tadas na obtenção de um resultado de inegável e relevante excedente é reduzido em 25 %, e quando ultrapassam em
interesse público. 18 vezes aquele valor a redução é de 50 %.
Na verdade, é defensável que a opção tomada se revela E para os que auferem remunerações ilíquidas superiores
particularmente eficaz, pela sua certeza e rapidez na pro- a € 1500, a redução é também de 14,3 % do seu rendi-
dução de efeitos, numa perspetiva de redução do défice mento anual. Ora, se o Tribunal Constitucional, no referido
a curto prazo, pelo que ela se mostra coerente com uma Acórdão n.º 396/2011, neste mesmo universo, perante a
estratégia de atuação, cuja definição cabe dentro da mar- redução salarial ocorrida no ano de 2011, determinada
gem de livre conformação política do legislador. pelo artigo 19.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro,
Nestes termos, poderá concluir-se que é certamente que se situou entre 3,5 % e 10 % do rendimento anual,
admissível alguma diferenciação entre quem recebe por entendeu que a transitoriedade e os montantes das reduções
verbas públicas e quem atua no setor privado da economia, efetuadas nos rendimentos dos funcionários públicos se
não se podendo considerar, no atual contexto económico continham ainda dentro dos limites do sacrifício adicional
e financeiro, injustificadamente discriminatória qualquer exigível, o acréscimo de nova redução, agora de 14,3 %
medida de redução dos rendimentos dirigida apenas aos do rendimento anual, mais do que triplicando, em média,
primeiros. o valor das reduções iniciais, atinge um valor percentual
Mas, obviamente, a liberdade do legislador recorrer ao de tal modo elevado que o juízo sobre a ultrapassagem
corte das remunerações e pensões das pessoas que aufe- daquele limite se revela agora evidente.
rem por verbas públicas, na mira de alcançar um equilí- Estas medidas terão uma duração de três anos (2012 a
brio orçamental, mesmo num quadro de uma grave crise 2014), o que determinará a produção de efeitos cumulati-
económico-financeira, não pode ser ilimitada. A diferença vos e continuados dos sacrifícios ao longo deste período,
do grau de sacrifício para aqueles que são atingidos por a que acresce o congelamento dos salários e pensões do
esta medida e para os que não o são não pode deixar de setor público, verificado nos anos de 2010, 2011 e 2012,
ter limites. e cuja manutenção nos anos seguintes se encontra pre-
Na verdade, a igualdade jurídica é sempre uma igual- vista nos memorandos que consubstanciam o PAEF, o
dade proporcional, pelo que a desigualdade justificada pela que, conjugado com o fenómeno da inflação, resulta numa
diferença de situações não está imune a um juízo de pro- redução real desses salários e pensões equivalente às taxas
porcionalidade. A dimensão da desigualdade do tratamento de inflação verificadas em todos esses anos.
tem que ser proporcionada às razões que justificam esse Ora, nenhuma das imposições de sacrifícios descritas
tratamento desigual, não podendo revelar-se excessiva. tem equivalente para a generalidade dos outros cidadãos
Como se pode ler nos Acórdãos n.os 39/88 e 96/2005, que auferem rendimentos provenientes de outras fontes,
deste Tribunal (acessíveis em tribunalconstitucional.pt): A independentemente dos seus montantes.
igualdade não é porém igualitarismo. É antes igualdade A diferença de tratamento é de tal modo acentuada e
proporcional. Exige que se tratem por igual as situações significativa que as razões de eficácia da medida adotada na
substancialmente iguais e que a situações substancialmente prossecução do objetivo da redução do défice público para
desiguais se dê tratamento desigual, mas proporcionado. os valores apontados nos memorandos de entendimento
Isto significa que temos de verificar se os quantitativos não tem uma valia suficiente para justificar a dimensão
cujo pagamento é suspenso pelo disposto nos artigos 21.º e de tal diferença, tanto mais que poderia configurar-se o
25.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro (Orçamento recurso a soluções alternativas para a diminuição do défice,
do Estado para 2012), num «critério de evidência» no con- quer pelo lado da despesa (v. g., as medidas que constam
trolo da igualdade proporcional, não são excessivamente dos referidos memorandos de entendimento), quer pelo
diferenciadores, face às razões que se admitiram como jus- lado da receita (v. g. através de medidas de caráter mais
tificativas de uma redução de rendimentos apenas dirigida abrangente e efeito equivalente à redução de rendimentos).
aos cidadãos que os auferem por verbas públicas. As referidas soluções, podendo revelar-se suficientemente
Para este juízo é necessário relembrar e pesar os sacrifí- eficientes do ponto de vista da realização do interesse
cios impostos pelas normas sob fiscalização a quem aufere público, permitiriam um desagravamento da situação
remunerações ou pensões por verbas públicas. daqueles outros contribuintes que auferem remunerações
Do seu conteúdo resulta que os pensionistas e os tra- ou prestações sociais pagas por verbas públicas.
balhadores do setor público com rendimentos ilíquidos Daí que seja evidente que o diferente tratamento imposto
situados entre € 600 a € 1100 terão uma redução do seu a quem aufere remunerações e pensões por verbas públicas
rendimento anual que aumentará progressivamente até ultrapassa os limites da proibição do excesso em termos
14,3 %. Estamos num universo em que a exiguidade dos de igualdade proporcional.
rendimentos já impõe tais provações que a exigência de Apesar de se reconhecer que estamos numa gravíssima
um sacrifício adicional deste tipo, como seja a sua redução, situação económico-financeira, em que o cumprimento
numa percentagem que vai progressivamente aumentando, das metas do défice público estabelecidas nos referidos
até atingir 14,3 % do rendimento anual, tem um peso exces- memorandos de entendimento é importante para garantir
sivamente gravoso. a manutenção do financiamento do Estado, tais objetivos
Os demais pensionistas e os que auferem remunerações devem ser alcançados através de medidas de diminui-
ilíquidas entre € 1100 e € 1500 terão uma diminuição do ção de despesa e ou de aumento da receita que não se
seu rendimento anual em 14,3 %, a qual, neste universo, traduzam numa repartição de sacrifícios excessivamente
assume uma dimensão considerável quando se compara a diferenciada.
sua situação com a daqueles que, com o mesmo nível de Aliás, quanto maior é o grau de sacrifício imposto aos
rendimentos, ou até superior, não são afetados com qual- cidadãos para satisfação de interesses públicos maiores são
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as exigências de equidade e justiça na repartição desses ao final do ano, projetar e executar medidas alternativas
sacrifícios. que produzissem efeitos ainda em 2012, de modo a poder
A referida situação e as necessidades de eficácia das alcançar-se a meta orçamental fixada.
medidas adotadas para lhe fazer face não podem servir de Estamos, pois, perante uma situação em que um inte-
fundamento para dispensar o legislador da sujeição aos resse público de excecional relevo exige que o Tribunal
direitos fundamentais e aos princípios estruturantes do Constitucional restrinja os efeitos da declaração de incons-
Estado de Direito, nomeadamente a parâmetros como o titucionalidade, nos termos permitidos pelo artigo 282.º,
princípio da igualdade proporcional. A Constituição não n.º 4, da Constituição, não os aplicando à suspensão do
pode certamente ficar alheia à realidade económica e finan- pagamento dos subsídios de férias e de Natal, ou quaisquer
ceira e em especial à verificação de uma situação que se prestações correspondentes aos 13.º e, ou, 14.º meses,
possa considerar como sendo de grave dificuldade. Mas ela relativos ao ano de 2012.
possui uma específica autonomia normativa que impede
que os objetivos económicos ou financeiros prevaleçam, Decisão
sem quaisquer limites, sobre parâmetros como o da igual-
Pelos fundamentos expostos:
dade, que a Constituição defende e deve fazer cumprir.
Deste modo se conclui que as normas que preveem a) Declara-se a inconstitucionalidade, com força obri-
a medida de suspensão do pagamento dos subsídios de gatória geral, por violação do princípio da igualdade,
férias e de Natal ou quaisquer prestações correspondentes consagrado no artigo 13.º da Constituição da República
aos 13.º e, ou, 14.º meses, quer para pessoas que auferem Portuguesa, das normas constantes dos artigos 21.º e 25.º
remunerações salariais de entidades públicas, quer para da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro (Orçamento do
pessoas que auferem pensões de reforma ou aposentação Estado para 2012);
através do sistema público de segurança social, durante os b) Ao abrigo do disposto no artigo 282.º, n.º 4, da Cons-
anos de 2012 a 2014, violam o princípio da igualdade, na tituição da República Portuguesa, determina-se que os
dimensão da igualdade na repartição dos encargos públicos, efeitos desta declaração de inconstitucionalidade não se
consagrado no artigo 13.º da Constituição. apliquem à suspensão do pagamento dos subsídios de férias
Por esta razão devem ser declaradas inconstitucio- e de Natal, ou quaisquer prestações correspondentes aos
nais as normas constantes dos artigos 21.º e 25.º da Lei 13.º e, ou, 14.º meses, relativos ao ano de 2012.
n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro (Orçamento do Estado
Lisboa, 5 de julho de 2012. — João Cura Maria-
para 2012), tornando-se dispensável o seu confronto com
no — Ana Guerra Martins — Joaquim de Sousa Ribei-
outros parâmetros constitucionais invocados pelos Reque-
ro — Maria João Antunes — Carlos Fernandes Cadi-
rentes.
lha — Gil Galvão — Catarina Sarmento e Castro (com
Apesar de a situação específica dos reformados e apo-
declaração, quanto ao efeitos) — Carlos Pamplona de
sentados se diferenciar da dos trabalhadores da Administra-
Oliveira [vencido quanto à alínea b), nos termos da decla-
ção Pública no ativo, sendo possível quanto aos primeiros
ração junta] — J. Cunha Barbosa (com declaração de voto
convocar diferentes ordens de considerações no plano da
constitucionalidade, em face da suficiência do julgamento quanto aos efeitos) — Vítor Gomes [vencido, quanto à alí-
efetuado, tendo por parâmetro o princípio da igualdade, nea a) da decisão, nos termos da declaração anexa] — Ma-
tal tarefa mostra-se igualmente prejudicada. ria Lúcia Amaral [vencida, quanto à alínea a) da decisão,
6 — Estas medidas de suspensão do pagamento de nos termos da declaração anexa] — Rui Manuel Moura
remunerações e de pensões inserem-se, como ficou alu- Ramos [vencido, quanto à alínea a) da decisão, nos termos
dido, no quadro de uma política económico-financeira, da declaração anexa].
tendente à redução do défice público a curto prazo, de Declaração de voto
modo a dar cumprimento aos limites (4,5 % do PIB em
2012) impostos nos memorandos acima mencionados, 1 — Votei a inconstitucionalidade das normas constan-
os quais condicionam a concretização dos empréstimos tes dos artigos 21.º e 25.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de
faseados acordados com a União Europeia e com o Fundo dezembro (Orçamento do Estado para 2012), que suspen-
Monetário Internacional. deram, total ou parcialmente, o pagamento dos subsídios de
Sendo essencial para o Estado Português, no atual férias e de Natal, ou quaisquer prestações correspondentes
contexto de grave emergência, continuar a ter acesso a aos 13.º e, ou, 14.º meses, quer para pessoas que auferem
este financiamento externo, o cumprimento de tal valor remunerações salariais de entidades públicas, quer para
orçamental revela-se, por isso, um objetivo de excecional pessoas que auferem pensões de reforma ou de aposentação
interesse público. através do sistema público de segurança social.
Ora, encontrando-se a execução orçamental de 2012 Contudo, divergi quanto ao alcance da restrição dos
já em curso avançado, reconhece-se que as consequên- efeitos da declaração de inconstitucionalidade.
cias da declaração de inconstitucionalidade acima anun- 2 — Ao fundamentar tal opção, começo por colocar a
ciada, sem mais, poderiam determinar, inevitavelmente, questão dos efeitos de uma declaração de inconstitucionali-
esse incumprimento, pondo em perigo a manutenção do dade naquele que é, a meu ver, o seu devido lugar: recuso,
financiamento acordado e a consequente solvabilidade do terminantemente, que a qualquer decisão de inconstitucio-
Estado. Na verdade, o montante da poupança líquida da nalidade se possa assacar o incumprimento de objetivos
despesa pública que se obtém com a medida de suspen- que uma qualquer opção normativa inconstitucional visasse
são do pagamento dos subsídios de férias e de Natal ou atingir. Um incumprimento de tais propósitos, indepen-
prestações equivalentes a quem aufere por verbas públicas dentemente das circunstâncias, não é, nunca, resultado de
assume uma dimensão relevante nas contas públicas e uma decisão do Tribunal Constitucional. Qualquer frustra-
no esforço financeiro para se atingir a meta traçada, pelo ção de objetivos, a acontecer, derivaria, quando muito, da
que dificilmente seria possível, no período que resta até solução normativa (ab initio) inconstitucional, resultado
3858 Diário da República, 1.ª série — N.º 140 — 20 de julho de 2012

de opções feitas por outros órgãos constitucionais aos ver, tal implicaria aceitar-se, num juízo de ponderação,
quais deve caber a preocupação de, quando assumem um que uma solução legislativa que o Tribunal Constitucional
determinado caminho que será o seu, fazê-lo no respeito da considerou constitucionalmente gravosa não teria, afinal,
Constituição. Este Tribunal, no exercício das competências no ano que corre, suficiente peso para aqueles que a sofrem.
que a Constituição lhe defere, apenas aprecia e declara a Ora, não posso, de modo algum, subscrevê-lo. Por um lado,
inconstitucionalidade de normas que não cria, e sempre porque o que levou à decisão de inconstitucionalidade, que
quando acionado por quem tem legitimidade processual. votei favoravelmente, foi admitir-se que nem mesmo as
3 — Nos termos do artigo 282.º da Constituição, a decla- circunstâncias excecionais atualmente vividas permitem,
ração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, à luz da Constituição, justificar uma situação fortemente
produz, habitualmente, efeitos desde a entrada em vigor da inigualitária de ablação ou redução dos subsídios de férias
norma declarada inconstitucional. Significa que, no caso, e de Natal, imposta apenas aos que auferem remunerações
os efeitos regra da decisão não se limitariam a salvaguardar salariais de entidades públicas, ou recebem pensões de
o futuro pagamento dos subsídios (ou equivalente) de 2013 reforma ou aposentação através do sistema público de
e 2014, como acarretariam, ainda, o direito ao pagamento segurança social, obrigando-os a um desmesurado sacrifí-
(ainda que atrasado) dos subsídios de férias cujo pagamento cio, em prol da comunidade. Por outro lado, atendendo ao
fora já suspenso em 2012, e o pagamento do subsídio de variado leque de situações abrangidas pelas normas, é-me
Natal de 2012 (ou prestações equivalentes). difícil aceitar que se tolere, durante todo o ano de 2012, o
4 — De acordo com o juízo maioritário, decidiu-se res- que para alguns casos será, certamente, um pesadíssimo
tringir os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, sacrifício, sacrifício esse, não se esqueça, determinado por
limitando-os à suspensão do pagamento dos subsídios de uma medida agora reconhecidamente inconstitucional.
férias e de Natal de 2013 e de 2014. 6 — Por estas razões, a meu ver, admitir-se-ia, quando
Ora, afastei-me do âmbito delineado pela maioria para muito, que, como vinha acontecendo noutras situações,
a produção de efeitos da declaração de inconstitucionali- o Tribunal Constitucional pudesse restringir os efeitos
dade, por entender que estes só não deveriam aplicar-se aos da declaração de inconstitucionalidade de modo a evitar
subsídios que, devendo ter sido pagos, não o houvessem situações que implicassem o pagamento (retroativo) dos
sido no momento da decisão de inconstitucionalidade (o subsídios que tivessem já ficado por pagar (férias 2012
subsídio de férias de 2012, ou equivalente). No caso, não ou equivalente), fazendo coincidir o início da produção
se deveria permitir que a norma, agora declarada incons- de efeitos da declaração de inconstitucionalidade com o
titucional, ainda viesse a produzir efeitos para além do
momento da decisão. Tal solução sempre deixaria intocado
momento da decisão deste Tribunal. Na prática, a decisão
o subsídio de Natal de 2012, o que, na opção de restrição
maioritária, quanto à produção de efeitos, tolera também,
adotada pela maioria no Tribunal, não acontece.
por razões que explica, a suspensão do pagamento dos
subsídios de Natal de 2012 (ou equivalente), ainda que a I. e., admitindo-se que a fixação de eficácia retroativa
considere inconstitucional. da declaração de inconstitucionalidade (desde o momento
5 — É o n.º 4 do artigo 282.º da Constituição que con- da emissão da norma) pudesse, in casu, ter consequên-
fere ao Tribunal Constitucional a possibilidade de fixar cias consideravelmente pesadas para o Orçamento — ao
os efeitos da declaração de inconstitucionalidade com obrigar ao pagamento de subsídios em atraso — , deveria
um alcance mais restrito do que o resultante do n.º 1 do este Tribunal determinar a fixação de efeitos temporais
mesmo preceito, desde que tal seja justificado por razões meramente prospetivos (ex nunc). Em suma, a solução
relacionadas com a segurança jurídica, equidade ou inte- equilibrada seria, a meu ver, ressalvar, da declaração de
resse público de excecional relevo. inconstitucionalidade que agora se opera, somente os efei-
Ora, parece-me ilógico — não havendo o Acórdão aten- tos produzidos pelas normas até à publicação do presente
dido, a meu ver, bem, ao argumento do excecional interesse acórdão.
público da execução das medidas tendentes à redução do Lisboa, 5 de julho de 2012. — Catarina Sarmento e
défice, para justificar, sem outras considerações, a concreta Castro.
solução em análise — que deva esse argumento ser esgri-
mido para, afinal, branquear a sua ablação ou redução em Declaração de voto
todo o ano que ainda corre.
Na verdade, não tenho para mim como demonstrado 1 — Em meu entender, a Constituição protege espe-
que o facto de se encontrar a execução orçamental de cialmente o sistema de segurança social, no qual inclui
2012 já em curso — e tanto mais que está apenas no iní- o regime de pensões de proteção da velhice e invalidez,
cio o segundo semestre do ano — inviabilizasse a adoção «independentemente do setor de atividade em que tiver
atempada de outras medidas universais alternativas que sido prestado» — artigo 63.º, em especial o seu n.º 4. Isso
contribuíssem para o objetivo da garantia da solvabilidade significa que, em princípio, a redução do montante das
das contas públicas. Mesmo tendo como seguro que não é pensões já fixadas é proibida, por representar uma restrição
ao Tribunal Constitucional que cabe qualquer opção nesta a um direito constitucionalmente garantido. Ainda assim,
matéria, difícil será obnubilar que outras soluções legis- em caso de emergência nacional é possível suspender
lativas foram anteriormente operacionalizadas de modo a esse direito, embora por um período limitado, até «ao
contribuir com rapidez para a redução do défice, facto que, pronto restabelecimento da normalidade constitucional»
inevitavelmente, tem de ser ponderado em juízos de neces- (n.º 4 do artigo 19.º da Constituição). Ora a verificação de
sidade relativos a medidas posteriormente adotadas. uma situação de emergência nacional levaria a considerar
E ainda que, em contradição de argumentos, se reconhe- outros cortes na despesa do Estado, designadamente as
cesse que um interesse público de excecional relevo justi- decorrentes de cerimoniais e de despesas de representação
ficaria, para todo o ano de 2012, a não produção de efeitos protocolar, antes de reduzir o montante das pensões de
da decisão de inconstitucionalidade deste Tribunal, a meu proteção da velhice e invalidez.
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2 — Nos termos dos n.os 1 e 4 do artigo 282.º da Cons- quanto ao decidido relativamente a essa parte da decisão,
tituição, o julgamento do Tribunal Constitucional que apenas a acompanhando, portanto, em parte, por entender
declara a inconstitucionalidade com força obrigatória que os efeitos normais de tal declaração, salvaguardando-se
geral, como é o caso presente, «produz efeitos desde a os já produzidos até então, deveriam verificar-se a partir
entrada em vigor da norma declarada inconstitucional», da data da publicação de tal declaração de inconstitucio-
a menos que fundamentadas razões de interesse público nalidade.
de excecional relevo exijam que o efeito da declaração de
J. Cunha Barbosa.
inconstitucionalidade tenha alcance mais restrito.
O Governo não estava impedido de apresentar ao Tri- Declaração de voto
bunal Constitucional as suas razões quanto à não incons-
titucionalidade das normas em causa. Divergi da decisão expressa na alínea a) da decisão do
Não o fez. presente Acórdão pelas seguintes razões essenciais:
Para além disso, precavendo a hipótese de julgamento 1 — As medidas em apreciação foram adotadas para
adverso, teria até o dever de invocar, se as houvesse, as vigorar durante a vigência do PAEF, com a natureza de
razões de excecional interesse público que, em seu enten- «medidas excecional de estabilidade orçamental». Não
der, imporiam uma restrição dos efeitos da declaração de pode, porém, ignorar-se que a questão do défice orça-
inconstitucionalidade. mental, com os seus problemas nacionais específicos, se
Também não o fez. coloca em contexto de crise económica-financeira de maior
Perante tais omissões, o Tribunal não pode afir- abrangência que atingiu a chamada «dívida soberana» no
mar — com a segurança e o rigor que lhe são exigi- âmbito da «zona Euro». Como se ponderou no Acórdão
dos — que há razões de excecional interesse público que n.º 396/2011: «É sabido que a atuação, em combate ao
impõem uma restrição dos efeitos do seu julgamento, pois défice, pelo lado da receita (privilegiadamente fiscal),
fá-lo com base na mera suposição do «perigo» de insolva- ou, antes, pelo lado da despesa (bem como a combinação
bilidade do Estado como decorrência da normal vigência adequada dos dois tipos de medidas e a seleção das que, de
dos efeitos do seu julgamento, circunstância que, como se entre eles, merecem primazia) foi (e continua a ser) objeto
viu, não foi sequer invocada pelo órgão a quem cabe, em de intenso debate político e económico. E a divergência
primeira linha, a defesa de um tal interesse. de orientações e de propostas tem como pano de fundo a
Não acompanhei, por isso, a restrição de efeitos decidida não coincidência dos efeitos produzidos por uma ou outra
pelo Tribunal. categoria de medidas. Ainda que um acréscimo de recei-
tas fiscais possa conduzir, no estrito plano contabilístico-
Carlos Pamplona de Oliveira. -financeiro, a ganhos pecuniários equivalentes aos resul-
tantes de um corte de despesas, do ponto de vista dos
Declaração de voto
concomitantes efeitos colaterais e das repercussões globais
Votei favoravelmente o acórdão, quanto à sua fundamen- no sistema económico-social, está longe de ser indiferente
tação e decisão, no que concerne à declaração de inconsti- seguir uma ou outra via. Não há, nesta matéria, variáveis
tucionalidade com força obrigatória geral relativamente às neutras e rigorosamente intermutáveis, pelo que as políticas
normas dos artigos 21.º e 25.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 a implementar pressupõem uma ponderação complexa, em
de dezembro (Orçamento do Estado para 2012). que se busca um máximo de eficácia, quanto ao objetivo
Porém, no que se refere à decisão de restrição dos efei- a atingir, e um mínimo de lesão, para outros interesses
tos da declaração de inconstitucionalidade, discordo par- relevantes.» Para essas opções, construídas em prognoses
cialmente da mesma, por entender que, de acordo com o de base instável e de difícil consenso, está constitucional-
disposto no artigo 282.º, n.º 4, da Constituição, tal restrição mente legitimado o legislador democrático, só podendo
não poderá ir para além da publicitação da declaração os órgãos de justiça constitucional, na falta de parâmetro
de inconstitucionalidade alcançada, posição esta que, já específico, censurar à luz dos princípios da igualdade ou da
adotada em anterior jurisprudência deste Tribunal, vem confiança o que seja manifestamente indefensável segundo
sendo afirmada pela maioria da doutrina [cf., por todos, as máximas da proporcionalidade.
J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição Ora, se é indiscutível que as medidas agora tomadas são
da República Portuguesa Anotada, vol. II, 4.ª ed., revista, muito mais gravosas do que aquelas que foram apreciadas
p. 979, n. VIII, que afirmam que «[a] restrição temporal no Acórdão 396/2011, também é certo que o legislador
dos efeitos da declaração tem necessariamente um limite orçamental foi chamado a responder imediatamente a uma
absoluto — que é o da publicitação oficia! da decisão —, situação de crise das finanças públicas que se agravara dras-
pois, se se compreende que sejam salvaguardados os efei- ticamente. No contexto de emergência financeira em que
tos produzidos enquanto não estava estabelecida publica- o Orçamento do Estado para 2012 teve de ser elaborado,
mente a inconstitucionalidade (ou ilegalidade) da norma, resultante da impossibilidade prática de financiamento do
é manifestamente incompatível com a própria ideia da Estado (lato sensu) mediante emissão de dívida e da con-
declaração de inconstitucionalidade (ou da ilegalidade) sequente necessidade de recorrer a mecanismos internacio-
que uma norma continue a produzir eleitos após a publi- nais de apoio em que a libertação de fundos é condicionada
cação oficial da decisão que a declare inconstitucional ou à verificação do cumprimento das metas estabelecidas, não
ilegal “com força obrigatória geral”»]. pode o Tribunal afirmar que o legislador dispusesse, no
Assim, mau grado compreender a argumentação sub- momento da elaboração e aprovação do Orçamento para
jacente ao decidido quanto a tal matéria, não acompanho 2012, de alternativas que tivessem, perante a necessidade
a decisão na sua totalidade, por entender, como se deixou urgente de redução do défice orçamental a curto prazo,
já afirmado supra, que a restrição temporal dos efeitos da efeitos económico-financeiros similares ou aproximados
declaração de inconstitucionalidade deveria verificar-se dos da suspensão de pagamento dos subsídios de férias
tão só até à sua publicitação, razão pela qual voto vencido e de Natal e prestações equivalentes. Seja a redução da
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despesa por via da diminuição de outros encargos diversos atual controlável. Se, por um lado, a Constituição não
das remunerações e pensões de reforma e aposentação, pode ser interpretada como indiferente ao que ameaça a
seja o aumento das receitas, que em termos realistas não sustentabilidade financeira do Estado para que medidas de
se vê que pudesse deixar de ser por via fiscal, não apresen- exceção restritivas de direitos e expectativas dos cidadãos
tam efeitos tão imediatos e seguros na redução do défice possam ser adotadas, tem de exigir-se ao legislador um
orçamental a curto prazo. A redução da despesa por via de ónus de fundamentação, nomeadamente em termos de
uma diminuição de outras despesas que não com remune- valores previsíveis para as diversas alternativas possíveis
rações e pensões de reforma e aposentação é possível, a de aumento de receita ou redução de despesa, que só poderá
prazo, mas dependerá de medidas estruturais de efeito não cumprir-se — e controlar-se, ainda que no limite da evi-
imediato ou de medidas de execução orçamental de efeito dência — perante específicas circunstâncias económicas e
não totalmente garantido. No que respeita ao aumento dos financeiras. As razões que se aceitou poderem justificar que
impostos, não pode desconhecer-se que estes já foram o legislador não tenha podido encontrar medidas alternati-
objeto de um aumento generalizado (em especial o IRS e vas no contexto de urgência de elaboração do Orçamento
o IVA) e que, devido a fatores vários de ordem económica, de Estado para 2012 deixam de estar presentes, ou não se
a um aumento de tributação nem sempre corresponde um apresentam do mesmo modo, ou com a mesma intensidade
aumento efetivo de receitas fiscais. Por isso, sendo inegável para os períodos orçamentais seguintes.
que as medidas em causa se apresentam como entorse ao Por outro lado, na perspetiva da onerosidade para os
princípio da igualdade de contribuição para os encargos destinatários, o juízo de proporcionalidade depende não só
públicos, me não parece que, relativamente ao Orçamento da intensidade imediata da afetação dos direitos dos desti-
de 2012, possa fazer-se um juízo positivo de «diferenciação natários das medidas, mas também do caráter cumulativo e
desproporcionada» relativamente às pessoas com idêntica continuado dos sacrifícios impostos ao longo do tempo. O
capacidade contributiva para os encargos públicos que decurso do tempo implica um acréscimo de exigência ao
retire legitimidade constitucional ao caráter não universal legislador no sentido de encontrar alternativas que evitem
das medidas em causa. que, com o prolongamento, o tratamento diferenciado se
Em última análise, as medidas em apreço, com a onero- torne claramente excessivo para quem o suporta.
sidade que comportam para os seus destinatários, ainda se Deste modo, na parte em que as medidas adotadas se
subtraem ao juízo de que são excessivas na perspetiva do destinam a vigorar para um período que ultrapassa o exer-
princípio da igualdade na repartição dos encargos públi- cício orçamental de 2012, não pode considerar-se que a
cos, tendo em consideração que se apresentaram como compressão do princípio da igualdade que as normas em
resposta urgente a uma situação de grave e extrema crise causa implicam se tenha restringido ao necessário para
das finanças públicas a que foi necessário fazer face em fazer face à situação de emergência que as ditou como
termos imediatos, reduzindo, logo no exercício orçamental medidas excecionais de estabilidade orçamental.
seguinte, o défice público, de acordo com os compromissos Em conclusão: as normas dos artigos 21.º e 25.º da Lei
assumidos no âmbito do PAEF e que, consideradas apenas n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, apenas deveriam ter
na sua vigência para esse ano, o seu montante ainda está sido declaradas inconstitucionais na parte em que a sus-
no limite do concretamente suportável. É pois tendo em pensão, nelas estabelecida, do pagamento dos subsídios de
consideração a necessidade urgente de fazer face a essa férias e de Natal ou quaisquer prestações correspondentes
situação-limite de cujo horizonte não estava excluído o ao 13.º e 14.º mês tem um âmbito de aplicação que excede
risco de cessação de pagamentos por parte do Estado, com o exercício orçamental de 2012.
todas as consequências negativas daí decorrentes para a
economia nacional e o cumprimento dos compromissos Vítor Gomes.
e tarefas do Estado social — inclusivamente quanto ao
Declaração de voto
universo dos afetados pelas medidas consideradas — que
não acompanho o juízo de inconstitucionalidade a que o 1 — A questão colocada ao Tribunal é uma questão difí-
Tribunal chegou no presente acórdão quanto à violação cil. A primeira exigência que ela coloca é metódica: para a
do princípio da igualdade do pagamento do subsídio de resolver, é preciso seguir um caminho argumentativo soli-
férias e de Natal no que ao período orçamental de 2012 damente ancorado em razões jurídico-constitucionais. Não
diz respeito. vi este caminho ser seguido pela fundamentação adotada,
2 — Diferente tem de ser o juízo a fazer na parte em e por isso me distanciei, desde logo, da posição sufragada
que as medidas em causa se destinam a vigorar para um pela maioria.
período que ultrapassa o ano de 2012. A meu ver, o Tribunal deveria ter esclarecido três pontos
Não se ignora que o programa de assistência finan- fundamentais: i) qual o estatuto constitucional das posições
ceira tem caráter plurianual e que a redução do défice é jurídico-subjetivas afetadas com a suspensão do pagamento
progressiva e resulta de compromissos internacionais. dos subsídios de férias e de Natal; ii) qual o conteúdo do
Mas, estando em causa medidas de caráter excecional princípio ou princípios constitucionais que poderão justi-
e com tal grau de onerosidade para os direitos dos seus ficar a compressão dessas posições subjetivas; iii) final-
destinatários e com tão nítida compressão do princípio mente, qual o alcance dos instrumentos de que dispõe o juiz
da igualdade de contribuição para os encargos públicos, constitucional para resolver a antinomia existente entre os
a sua justificação tem de ser apreciada segundo um rigo- direitos das pessoas, afetadas pelas medidas orçamentais,
roso princípio de atualidade, de acordo com a regra de e os princípios constitucionais com elas conflituantes.
vigência anual do orçamento (artigo 106.º, n.º 1, da CRP). 2 — A Constituição portuguesa protege especialmente o
Efetivamente, a ponderação da proporcionalidade envolve trabalho e os rendimentos que com ele se aufere. Os direitos
considerações que dependem do modo como a situação e liberdades fundamentais que consagra são direitos do
económico-financeira evoluir, o que impõe um período cidadão enquanto pessoa, enquanto membro da comu-
de vigência rigorosamente limitado e uma justificação nidade política e enquanto trabalhador. No entanto, não
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pode dizer-se que o direito à não diminuição do montante Tal como sucede com as outras constituições europeias,
da retribuição do trabalho que em cada momento se aufira escritas na segunda metade do século XX, também a Consti-
tenha o estatuto de direito fundamental, resistente à lei tuição portuguesa instaura uma ordem estadual que assume
porque atribuído às pessoas pela Constituição. A razão para a responsabilidade de garantir que aos seus membros sejam
tal não está no facto de esse direito não constar, expressa- dadas as condições materiais e espirituais que permitam
mente, do elenco da parte primeira da constituição. Pode a realização de projetos de vida dignos. As tarefas funda-
haver direitos fundamentais não escritos: nenhuma cons- mentais do Estado que, na Constituição portuguesa, vêm
tituição é um código fechado, ou uma regulamentação definidas no artigo 9.º são a expressão desse compromisso
exaustiva de todas as relações entre cidadãos e Estado; constitucional básico, segundo o qual o Estado é para as
não o é também, por isso, a CRP. O motivo está na impos- pessoas e não as pessoas para o Estado.
sibilidade de atribuir a tal direito o estatuto substancial de Simplesmente, nem a Constituição portuguesa nem as
fundamentalidade. Precisamente por nenhuma constituição outras constituições europeias consagraram (porque não
poder ser entendida como um código exaustivo das rela- estava nas suas mãos fazê-lo) as condições fácticas que
ções entre cidadãos e Estado, nenhuma, nem tão pouco permitiriam financiar a realização das tarefas fundamentais
a CRP, pode garantir que o quantum da remuneração do do Estado. Assim, o primeiro motivo de interesse público
trabalho exista sempre em crescendum e nunca diminua, que justifica esta medida legislativa é o da preservação
ao mesmo título a que garante os direitos e liberdades destas condições, em ordem ao cumprimento de um dos
fundamentais. Aquilo que é fundamental prima sobre a lei princípios que estruturam a ordem constitucional portu-
porque resiste a ela, e à variabilidade das circunstâncias guesa. Nesta perspetiva, trata-se de um princípio de salus
históricas em que ela é feita. O quantum da remuneração publica, constitucionalmente entendido.
que, num dado momento histórico, se aufere pelo trabalho O segundo princípio estruturante que é convocado pelo
que se presta ou prestou não está incluído no núcleo das contexto histórico que rodeia esta medida legislativa é
posições jurídico-subjetivas caracterizadas por este ele- o da justiça intergeracional. Pode discutir-se (coisa que
mento substancial de invariabilidade ao tempo histórico agora não farei) qual o exato alcance prescritivo que este
da lei e às suas circunstâncias. princípio pode ter, e qual a sua rigorosa sede, no texto da
3 — Não obstante, e porque a Constituição portuguesa Constituição; mas o que não pode a meu ver ser posto em
protege especialmente o trabalho e os rendimentos que com causa é o postulado básico em que o mesmo assenta, e que
ele se aufere, a posição jurídico-subjetiva das pessoas a resumo do seguinte modo: embora se não estabeleçam na
não verem diminuídos esses mesmos rendimentos (através Constituição limites quantitativos ao endividamento do
da ablação, pelo Estado, de uma percentagem significativa Estado, dela decorrem implicitamente limites qualitativos,
do seu montante) tem a forte proteção constitucional que que coincidem com os limites do ónus que as gerações
decorre, i. a, dos artigos 58.º e 63.º (e também 62.º) da presentes podem impor às gerações futuras sem condi-
CRP. O facto de o direito à não diminuição do montante cionar gravemente a sua autonomia. Em uma República
que se recebe pela remuneração do trabalho não ser, em baseada na ideia de dignidade da pessoa (artigo 1.º), esta
si mesmo, um direito oponível à lei (porque fundamental) atenção para o justo limite de encargos a deixar para o
não significa que quanto a esse direito a lei tudo possa. futuro — justo limite que se ultrapassa quando se oneram
Há limites constitucionais que aqui inevitavelmente se as gerações seguintes de tal forma que é a sua própria
impõem. esfera de decisão que é esvaziada — não pode deixar de
Esses limites exigem, desde logo, que a ablação de ser também, ela própria, um dos princípios estruturantes
parte significativa dos rendimentos que as pessoas auferem da Constituição. A solidariedade (artigo 1.º) entre os que
tenha sido imposta pelo legislador por claros e percetíveis estão vivos não pode ser vivida de forma a excluir a soli-
motivos de interesse público. Se esses motivos justificam dariedade para com o futuro.
a restrição de direitos que são fundamentais (artigo 18.º, Por último, a medida legislativa em apreciação justifica-
n.º 2, da CRP), por maioria de razão justificarão a afetação -se ainda no quadro do mandato constitucional para com
de um direito [à não diminuição da remuneração] que não a integração europeia (artigo 7.º, n.os 5 e 6, da CRP). Da
tem, em si mesmo, o estatuto de fundamentalidade. mesma maneira que é a responsabilidade para com a
As razões de interesse público invocadas pela lei do integração europeia que valida o financiamento de certos
orçamento para justificar as medidas de suspensão de Estados membros em dificuldades financeiras por parte
pagamento (aos trabalhadores do setor público, aos pen- de outros Estados membros, o que implica a assunção por
sionistas e reformados) dos subsídios de férias e de Natal estes últimos de riscos, também é essa mesma responsa-
inserem-se num contexto histórico complexo, com reflexos bilidade, constitucionalmente estabelecida, que justifica
e consequências em princípios estruturantes da ordem a adoção de uma medida que se insere no quadro de um
constitucional portuguesa. esforço conjunto, europeu, de cooperação entre os vários
Esse contexto histórico, na sua dimensão temporal mais Estados da União, maxime entre os vários Estados da «Zona
próxima, é marcado pelo processo negocial entabulado Euro», em ordem à estabilização financeira e económica
entre a República, por um lado, e as instituições da União dessa mesma «Zona Euro».
Europeia e os seus membros, por outro, para resolver o 4 — Para resolver o conflito existente entre os direitos
problema de emergência financeira em que se encontrava das pessoas a não verem reduzidas as remunerações aufe-
Portugal no âmbito da crise sistémica das dívidas soberanas ridas pelo trabalho que se presta ou se prestou, e os prin-
nos países da chamada «Zona Euro». cípios constitucionais que acabei de mencionar, a justiça
A meu ver, um contexto como este convoca três prin- constitucional dispõe dos instrumentos metódicos que os
cípios constitucionais, cujo cumprimento se impõe ao princípios da igualdade, da proporcionalidade e da prote-
legislador. ção da confiança lhe conferem. Estes três princípios, que
Em primeiro lugar, o princípio decorrente do artigo 9.º da integram o núcleo da ideia de Estado de direito, material-
Constituição, relativos às tarefas fundamentais do Estado. mente entendida, são na realidade os meios idóneos para a
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resolução de antinomias entre bens jurídicos individuais e Acompanhamos estas considerações, divergindo porém
bens comunitários (no caso da proporcionalidade), entre o na aplicação que o acórdão delas faz à situação concreta.
grau de justiça alcançado por soluções legislativas de apli- Para tanto, o acórdão interroga-se sobre se os quantitativos
cação universal e o grau de justiça alcançado por medidas cujo pagamento é suspenso pelas disposições sindica-
legislativas de aplicação pessoal sectorial (como é o caso das num «critério de evidência» no controlo da igualdade
da igualdade), ou entre a vocação da ordem jurídica para proporcional «não são excessivamente diferenciadores,
a duração estável e a necessidade, sentida pelo legislador face às razões que se admitiram como justificativas de
ordinário, de romper essa estabilidade de forma a melhor uma redução de rendimentos apenas dirigida aos cida-
servir o interesse público (como é o caso do princípio da dãos que os auferem por verbas públicas». E afirma que
proteção da confiança). os sacrifícios atingem em certos casos um «universo em
No entanto, para que se possa invalidar certas soluções que a exiguidade dos rendimentos já impõe tais prova-
legislativas com fundamento na aplicação destes instru- ções que a exigência de qualquer sacrifício adicional [...]
mentos metódicos, é necessário que em qualquer caso se tem um peso excessivamente gravoso» e que, noutros, o
saiba que tais soluções legislativas podiam e deviam ter acréscimo de nova redução atinge um valor percentual
sido outras, que, com idêntico grau de eficácia, servissem de tal modo elevado que «o juízo sobre a ultrapassagem
os mesmos fins de interesse público (ou realizassem os daquele limite [do sacrifício adicional exigível] se revela
princípios constitucionais que esse interesse convoca) de agora evidente».
modo mais igual para todos, mais benigno para cada um, Para assim concluir, revela-se decisiva a consideração de
e mais conforme com as expectativas de alguns. que «a diferença de tratamento é de tal modo acentuada e
Não me parece que, no caso colocado à apreciação do significativa que as razões de eficácia da medida adotada na
Tribunal, estivesse este em condições de saber da exis- prossecução do objetivo da redução do défice público para
tência efetiva destas medidas legislativas alternativas que os valores apontados nos memorandos de entendimento
fossem igualmente eficazes para a realização dos fins de não tem uma valia suficiente para justificar a dimensão
interesse público que, constitucionalmente, o legislador de tal diferença», tornando «evidente que o diferente tra-
estava obrigado a prosseguir e, ao mesmo tempo, menos tamento imposto a quem aufere remunerações e pensões
lesivas dos direitos das pessoas que, em última análise, se por verbas públicas ultrapassa os limites da proibição do
devem salvaguardar. excesso em termos de igualdade proporcional».
A maioria entendeu que, por razões de evidência, era Diferentemente, entendemos que a grave diferencia-
certa a existência dessas medidas alternativas quando ção que operam as normas impugnadas (ao imporem a
analisado o problema sob o ponto de vista do princípio determinadas categorias de cidadãos custos especialmente
da igualdade de todos perante os encargos públicos. A gravosos a que a generalidade dos outros cidadãos, com
medida ablatória de parte dos rendimentos dos trabalha- iguais rendimentos, não estão sujeitos) poderá não se con-
dores do setor público e dos pensionistas e reformados foi siderar concretamente excessiva, pelo menos no que se
julgada inconstitucional por violação deste princípio, por se refere ao exercício orçamental em curso, tanto mais que
entender que a intensidade do sacrifício, que por via dessa nada garante que o legislador não altere, em futuros exer-
medida, por razões de interesse público, se impunha apenas cícios orçamentais, o sentido de tais medidas optando por
a alguns, era tal que exigia a sua universal repartição por alternativas que, estando de forma mais direta ou indireta
todos. Discordei, por estar convicta de que não dispunha ao seu dispor, se apresentam menos diferenciadoras. E
aqui o Tribunal de nenhuma evidência que lhe permitisse isto porque o legislador não está dispensado da obrigação
comparar o grau de sacrifício exigido aos afetados por estas de, dentro da sua margem de livre conformação, procurar
medidas e o grau de sacrifício efetivamente sofrido por alternativas de modo a evitar que a medida de suspensão do
outros (nomeadamente os trabalhadores do setor privado) pagamento dos subsídios de férias e de Natal veja agravado,
com a conjuntura económica existente. Assim sendo, foi com o mero decurso do tempo ou a sua continuada repeti-
também minha convicção que não estava a justiça consti- ção anual, o seu caráter diferenciador, podendo vir assim,
tucional epistemicamente apetrechada para invalidar, neste com o efeito cumulativo gerado, a ultrapassar o limite
caso, a decisão tomada pelo legislador. Foi por isso que me do excesso. Temos para nós que a medida de suspensão
pronunciei pelo juízo da não inconstitucionalidade. do pagamento dos subsídios de férias e de Natal, com a
onerosidade específica que implica em termos de proteção
Maria Lúcia Amaral de expectativas legítimas e de igualdade na repartição
dos encargos públicos, apenas se poderá subtrair ao juízo
Declaração de voto
de que seria excessiva tendo em consideração que ela se
1 — Não tendo acompanhado a declaração de inconsti- apresentou como resposta urgente a uma situação de grave
tucionalidade das regras impugnadas cumpre agora expli- e extrema emergência financeira a que foi necessário fazer
citar brevemente as razões da nossa divergência. face em termos imediatos, reduzindo, logo no exercício
2 — O acórdão considera «que é certamente admis- orçamental seguinte, o défice público, de acordo com os
sível alguma diferenciação entre quem recebe por ver- compromissos internacionalmente assumidos. É pois tendo
bas públicas e quem atua no setor privado da economia», em consideração a necessidade urgente de fazer face a uma
acrescentando que «a liberdade do legislador recorrer ao situação-limite de necessidade grave e extrema envolvendo
corte das remunerações e pensões das pessoas que aufe- inclusivamente o risco de cessação de pagamentos por
rem por verbas públicas, na mira de alcançar um equilí- parte do Estado português, com todas as consequências
brio orçamental, mesmo num quadro de uma grave crise negativas que tal teria a nível da economia nacional e do
económico-financeira, não pode ser ilimitada», e que «a financiamento do Estado social, que se pode considerar a
diferença do grau de sacrifício para aqueles que são atin- medida como não sendo concretamente excessiva. Acresce,
gidos por esta medida e para os que não o são não pode também, o facto de não se terem verificado ainda efei-
deixar de ter limites». tos cumulativos ao longo do tempo a repetição anual da
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medida de suspensão do pagamento do subsídio de férias perante específicas circunstâncias económicas e financei-
e de Natal. Atendendo a estas considerações, julgamos não ras, forçosamente evolutivas, terá de estar dependente da
inconstitucional a medida de suspensão do pagamento do consideração da intensidade relativa em termos de justiça
subsídio de férias e de Natal agora impugnada. distributiva e dos efeitos cumulativos e continuados dos
3 — Tal juízo de não inconstitucionalidade não valerá, sacrifícios ao longo do tempo. Isto implica certamente
porém, necessariamente para futuros exercícios orçamen- o cumprimento por parte do legislador de um especí-
tais, sendo aliás a pretensão de ultra-atividade (para além fico dever de criação das condições de possibilidade de
do presente exercício orçamental) das normas sindicadas alternativas que evitem que, com o decurso do tempo, as
já de si de duvidosa legitimidade constitucional. Diga-se medidas tomadas se tornem excessivas, tendo em conta a
ainda que um futuro juízo de proporcionalidade, que não intensidade relativa dos sacrifícios impostos em termos de
poderá ignorar que para medidas de exceção restritivas igualdade na repartição dos encargos públicos.
de direitos e expectativas dos cidadãos existe um ónus de
fundamentação do legislador que só poderá ser cumprido Rui Manuel Moura Ramos.

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