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Café Orgânico

Orgânico 7

Análise agroeconômica do café orgânico:


definições, análise de mercado
e viabilidade econômica1 Resumo - Adaptação do documento prepa-
rado pela Junta Executiva do Conselho da
Organização Internacional do Café, que trata
do tema café orgânico. Contém definições
desse tipo de café, análise de seu mercado e
sua viabilidade econômica, com informações
úteis sobre potencialidades econômicas, carac-
terísticas deste mercado, limitações e propos-
tas desse tipo de cafeicultura nos métodos
adotados pela agricultura orgânica.
Palavras-chave: Cafeicultura orgânica; Ma-
nejo orgânico; Comercialização; Certificação;
Mercado orgânico.

1
Adaptação de: ORGANICAZAÇÃO INTERNACIONAL DO CAFÉ. Análise agroeconômica do café cultivado organicamente ou café orgânico.
Londres, 1997. 19p.

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.7-13,


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DEFINIÇÃO DE requerem grandes quantidades de ferti- são restrita, que pode levar a erros de apre-
CAFÉ ORGÂNICO OU lizantes concentrados de alta solubilida- ciação por quem não esteja familiarizado
EM SISTEMA ORGÂNICO de. com a química, a física ou a agronomia. Pa-
DE CULTIVO Os agricultores, os mais importantes ra melhor compreender o que constitui a
personagens no aspecto em que essa defi- agricultura orgânica, propomos uma análise
Antes de caracterizar o café orgânico,
nição controversa caracteriza, absorveriam que inclui três níveis de definição: técnico-
é preciso definir o que se entende por agri-
os diversos discursos e adotariam e adapta- agronômico, econômico e científico-filo-
cultura orgânica.
riam métodos, técnicas e idéias prove- sófico.
nientes de outros, através de um processo No nível técnico-agronômico, descre-
Agricultura orgânica
de tentativa e erro. Isso nos leva a conside- vem-se os métodos utilizados na seleção
A definição de agricultura orgânica, co- rar o segundo fator que causa diferenças de sementes, germinação, preparo e manu-
mo se costuma denominar o processo de de opinião e ambigüidades, quando se tenção dos solos, plantio, proteção fitos-
cultivar organicamente, assim como sua procura definir agricultura orgânica. sanitária, fertilização e, no caso do café,
legitimidade, tem sido e continuará sendo Este segundo fator subjacente à dificul- processamento e armazenamento. A ênfase
objeto de grande polêmica. dade de definir agricultura orgânica através não é na produção e uso de novos fertili-
Isso se deve a vários fatores: o primeiro de critérios claros, específicos e imutáveis
e menos transcendental está ligado à varia- zantes, produtos fitossanitários ou outros
é a constatação de que cultivar é um pro- aditivos, mas no respeito a uma série de
da terminologia que se utiliza para expressar cesso ligado a uma dada área geoecológica
os conceitos pertinentes em diferentes princípios, que será enunciada ao des-
e, sendo um processo, está sujeito à evo-
idiomas, que introduz novas palavras e crever-se o terceiro nível.
lução. As técnicas agronômicas emprega-
significados no vocabulário existente. Vem No nível econômico, promovem-se
das vão mudando, à proporção que a difu-
daí a dificuldade em encontrar equivalência estratégias de produção e de comercializa-
são das informações e do conhecimento
e precisão nos termos utilizados para ção que se adaptam ao sistema capitalista
se amplia graças à transferência de tecno-
expressar os conceitos de orgânico, ecoló- ou dele divergem, segundo a região. Para
logia e sua adaptação através da transmis-
gico, biológico, convencional, tradicional os países da Europa Ocidental ou da Amé-
são do saber-tudo isso num contexto eco-
e, mais recentemente, um termo mais da rica do Norte, com sistemas de produção
nômico, social e político. O ritmo da adoção
moda, como sustentável ou durável. altamente mecanizados e pouca mão-de-
dos modelos de cultivo depende das con-
Os economistas rurais, que se interes- obra, a agricultura orgânica não propõe
dições geográficas, ecológicas e climáticas,
sam em observar os sistemas agrários por uma estrutura de organização diferente do
assim como das limitações econômicas dos
uma ótica microeconômica, prefeririam produtores. sistema produtivista desenvolvido desde
valer-se dos adjetivos tradicional e conven- Os métodos de agricultura orgânica não os anos 50. A diferença proposta pelos agri-
cional ou empregar termos como em escapam desta generalização e isso está cultores e consumidores de produtos orgâ-
pequena escala, familiar, de subsistência, claro para quem tenha tido o privilégio de nicos é que se procure reduzir o excesso
industrial ou tecnificado. Falariam de pa- explorar as raízes desses conhecimentos e de intermediários, para que haja uma rela-
drões da produção e distinguiriam uma a história da migração das idéias. ção direta, mais sociável e humana, entre
estrutura economicamente auto-suficiente Os países de tradição anglo-saxônica produtores e consumidores.
de uma estrutura econômica, em que os adotaram o termo orgânico, que reflete uma Nos países onde a estrutura de produção
meios de produção orientam-se para a me- visão holística, porém mecanicista do mun- assenta-se numa fartura de mão-de-obra
canização, a divisão do trabalho e a especi- do. A perspectiva mecanicista permite esta- familiar, é mais fácil vender diretamente a
alização da produção para gerar economias belecer uma relação de causa e efeito entre comerciantes que garantem um preço jus-
de escala. Também incluiriam em sua lingua- as partes do sistema agrícola, a partir da to aos produtores e incentiva-se a conser-
gem termos como: fatores de produção, qual é possível elaborar receitas e produtos vação de um sistema, na medida do possí-
aludindo ao solo, à mão-de-obra e ao capi- fitossanitários. vel, auto-suficiente ou autárquico. A auto-
tal. Em seu vocabulário, os aspectos eco- Os países de tradição e fala francesa suficiência só é conseguida quando os
nômicos da agricultura orgânica seriam preferem enfatizar o caráter vivo dos fenô- agricultores são capazes de produzir suas
considerados no contexto de medidas menos agronômicos observados e denomi- próprias sementes, selecionadas de acordo
destinadas a manter a fertilidade do fator nam o emprego desses métodos de agricul- com a localidade, seus próprios fertili-
de produção solo pelo uso de técnicas a- tura biológica. zantes, seus próprios recursos fitossani-
propriadas e a empregar intensivamente o Com efeito, a definição de agricultura tários e remédios para uso em seus ani-
fator de produção mão-de-obra, utilizando orgânica é complexa, não bastando descre- mais, só dependendo, em pequena escala,
o fator capital de forma menos intensiva vê-la como a ausência de emprego de subs- de distribuidores externos para a obtenção
que nas estruturas mais mecanizadas, que tâncias químicas, pois esta é uma expres- de alguns insumos. Em casos extremos,

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regressaríamos às estruturas de policultura o cafeeiro cresça, utilizam-se maiores quan- das recomendações específicas sobre a
familiares. tidades de fertilizantes minerais e irrigação. elaboração de composto à base de polpa
A base científica e filosófica da prática Essas técnicas aumentam substancialmen- de café. Como se sabe, na América Latina,
da agricultura orgânica foi implantada nos te os custos e só são viáveis em áreas de este procedimento está cada vez mais difun-
anos 30, em parte como conseqüência da produtividade e rendimento elevados. Por- dido.
difusão do conhecimento das ciências na- tanto, são propriedades mais vulneráveis Outra técnica importante para assegurar
turais e em parte como reação à tendência aos efeitos dos baixos preços do mercado a fertilidade é a da associação de culturas.
à mecanização e à especialização na orga- do que aquelas tradicionais, onde os pro- Da cuidadosa escolha das plantas ou árvo-
nização das empresas. Este terceiro nível dutores limitam-se a fazer a limpeza, a poda res para plantio com o cafeeiro dependerá
compreende os seguintes princípios: e a colheita. o êxito da devolução ao solo do nitrogê-
a) solo não é um substrato inerte, mas Assim, embora a maioria das técnicas nio e dos elementos essenciais para a nutri-
o habitat de múltiplos organismos propostas pela agricultura orgânica pos- ção do cafeeiro. Esta técnica pode ser com-
e microrganismos, que funcionam sa ser aplicada ao cultivo do cafeeiro, ao binada com outras de cultivo intercalar,
como agentes transformadores dos adaptar as mais pertinentes é preciso ter usadas para manter a fertilidade do solo.
nutrientes, tornando-os solúveis e em conta as características ecoclimáticas As plantas utilizadas para este fim, como
disponíveis às plantas; da região, as estruturas econômica e social as leguminosas, proporcionam benefícios
da localidade e, naturalmente, as condições econômicos e, ao mesmo tempo, fixam o ni-
b) desequilíbrio nutricional das plantas
do mercado (preços). trogênio. É o caso da Crotolaria ochroleuca,
ou do meio ambiente reduz a defesa
produzida na Tanzânia.
das plantas e propicia o aparecimen- Fertilização e Na Colômbia, estudaram-se outras vari-
to de pragas tornando-as mais vul- manutenção do solo na edades de leguminosas cultivadas de forma
neráveis às doenças; cafeicultura orgânica intercalar ao cafeeiro, para favorecer a fixa-
c) fertilizantes de origem mineral, por Os métodos propostos pela agricultura ção de nitrogênio e a conservação do solo,
sua natureza inerte, devem ser evita- orgânica dão grande ênfase à conserva- utilizando seis leguminosas, exclusiva-
dos, pois não têm os mesmos efeitos ção dos solos e às adubações, valendo-se mente ou em combinação com gramíneas.
que o adubo líquido ou o composto da fauna e da flora e recorrendo aos co- No estudo em questão, as plantas também
bem preparado; nhecimentos da ciência dos solos. foram inoculadas com estirpes de bactéria
d) as plantações devem formar um todo O argumento científico contra o uso de do gênero Rhizobium. No entanto, é impor-
orgânico, para alcançar a maior auto- fertilizantes de origem mineral baseia-se no tante a realização de uma pesquisa mais
suficiência possível. fato de que esses fertilizantes, sendo mais ampla sobre a fixação simbiótica de nitrogê-
solúveis, podem propiciar um desequilíbrio nio no cultivo de cafeeiro (estudos bem-
Métodos da nutricional nas plantas, quando o agricultor sucedidos já foram realizados sobre o uso
agricultura orgânica emprega fórmulas já preparadas sem levar de bactérias fixadoras de nitrogênio para
aplicados ao cultivo em conta as necessidades específicas do outras culturas, tais como o arroz e o milho).
e processamento de café local. Além disso, solubilizam-se rapida- São vários os métodos utilizados para
O cafeeiro Coffea é o principal gênero mente e, quando não são absorvidos pelas evitar a erosão, como a caixa de contenção
da família das Rubiáceas, que inclui mais plantas, desperdiçam-se e contribuem para para recebimento de águas pluviais, os
de 6 mil espécies. Hoje, só duas espécies acidificar os solos ou acumulam-se nos len- bons sistemas de drenagem, o plantio de
do gênero Coffea têm importância econômi- çóis freáticos, contaminando os recursos árvores para evitar o desgaste de origem
ca: Coffea arabica (70% da produção mun- hídricos. Trata-se de um sério problema que eólica em áreas demasiadamente expostas
dial) e Coffea canephora ou robusta (30% ameaça a saúde humana, e tem sido expos- ao vento etc. Técnicas de policultura, que
da produção mundial). Ambas são culturas to sobretudo na Europa e na América do combinam o plantio de diversas variedades
arbóreas, que começam a produzir três ou Norte. de arbustos de sombra entre as leiras de
quatro anos após o plantio e têm uma vida Técnicas de reciclagem de matéria orgâ- cafeeiros, também são utilizadas. As folhas
econômica de 20 a 30 anos. Embora só pros- nica vegetal ou animal (por exemplo o adubo e ramos mortos podem ser utilizados como
perem em zonas tropicais e subtropicais líquido ou o sangue), usadas como ferti- fertilizante e como cobertura morta que se
(temperaturas entre 18oC e 26oC), as duas lizantes, têm sido muito difundidas, não espalha ao redor dos cafeeiros para prote-
espécies exigem diferentes condições de só nas propriedades que afirmam estar gê-los contra as plantas espontâneas.
cultivo. O café não resiste a temperaturas produzindo café orgânico. Entre outras
abaixo de zero e requer uma precipitação substâncias vegetais, a polpa de café pode Medidas de controle fitossanitário
de mais de 1.500mm por ano. ser reciclada e utilizada como adubo. Na na cafeicultura
Nas modernas propriedades, para que literatura consultada, não foram encontra- Dos dois primeiros princípios enuncia-
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dos que orientam as práticas de controle Ainda são necessárias muitas pesqui- A certificação, porém, cria custos adi-
fitossanitário, o combate a pragas, doenças sas com vistas à ampliação dos conheci- cionais para os produtores, que têm de des-
e plantas espontâneas baseia-se sobretudo mentos agronômico e biológico existentes pender somas consideráveis para assegu-
nas seguintes medidas preventivas: e à difusão desses conhecimentos, para co- rar que, após dois ou três anos, suas proprie-
a) controle natural; locar ao alcance dos agricultores métodos dades sejam aprovadas como orgânicas.
econômicos de combate a doenças, pragas
b) controle biológico, que inclui o bio- e plantas invasoras. Agências e instituições
controle por meio de biotecnologias internacionais relacionadas
e da seleção de plantas naturalmente Estratégias de comercialização com a certificação
resistentes; no mercado de café da agricultura orgânica
c) uso de outras variedades de plantas O último princípio enunciado, segundo O primeiro organismo internacional de
naturalmente resistentes. No combate o qual as propriedades agrícolas devem apoio à harmonização das normas da pro-
às plantas espontâneas também utili- constituir um todo orgânico para alcançar dução, processamento e comercialização
zam-se medidas que incluem um sis- a maior auto-suficiência possível, tem influ- foi a International Federation of Organic
tema de rotação plurianual (quando enciado tanto as estratégias de comerciali- Agriculture Movements (Ifoam). Criada
possível), a limpeza mecânica ou tér- zação como a forma de organização das em 1972, a Ifoam hoje trabalha de forma
mica e o uso de coberturas vegetais. propriedades. muito dinâmica para, através de uma rede
Na comercialização, os produtores têm mundial, promover uma vasta gama de ati-
O controle natural consiste em preservar
os inimigos naturais das pragas para evitar de demonstrar aos consumidores que res- vidades que compreendem a promoção, a
peitaram os princípios e métodos já descri- coordenação de medidas destinadas a in-
o uso de inseticidas.
tos. Quando os consumidores vivem na fluenciar decisões parlamentares, a coope-
O controle biológico baseia-se no co-
nhecimento do ciclo de vida dos inimigos mesma localidade que os produtores, no ração, a educação e a divulgação.
caso de produtos como verduras, legumes, A Ifoam publica e revisa periodicamente
naturais das pragas do cafeeiro, bem como
frutas, laticínios ou carnes, isso requer menos uma série de Padrões Básicos da Agricultu-
sua etologia ou comportamento e ciclos re-
produtivos. Assim, introduzem-se inimigos esforço do que no caso de produtos como ra e Processamento Orgânicos. A revisão
o café, cujos consumidores, em sua maioria, de 1976 incluiu as diretrizes para a produ-
naturais, que podem ser predadores, com-
situados em lugares distantes, não fazem ção e o processamento do café, do cacau e
petidores ou patógenos da praga.
O biocontrole, um processo ligeiramen- idéia da complexidade dos processos que do chá. Convém observar porém, que essas
resultam numa xícara de café. diretrizes têm caráter bastante indicativo e
te mais sofisticado do que o combate bioló-
Quanto ao café orgânico, não só os pro-
gico, também se apóia nos avanços do que ainda se está trabalhando na harmoni-
conhecimento nas Ciências Biológicas. Um dutores, mas também os processadores, se-
zação de critérios mínimos.
jam eles torrefatores ou armazenadores e
dos exemplos mais populares é o emprego
do fungo Beauveria bassiana no controle
empacotadores, devem respeitar os princí- Associações européias
da broca-do-café. pios da agricultura orgânica. Isso nos leva As principais entidades encarregadas
ao exame da função da certificação e da de- de conceder certificação ao café orgânico
A seleção de variedades resistentes a
terminação dos padrões a respeitar, para na Europa são a Naturland Association,
agentes patogênicos ou insetos é viável
do ponto de vista da renovação dos cafe- que um produto produzido como orgânico o Institut für Marktökologie e, em alguns
não perca essa especificação. casos, a Demeter. Esta última, encarrega-
zais. No entanto, esta é uma técnica menos
eficaz no caso do cafeeiro do que no dos se sobretudo de certificar produtos biodi-
CERTIFICAÇÃO DOS nâmicos, cujos princípios seguem os ensi-
cultivos anuais, pois estes são plantados
PRODUTOS ORGÂNICOS, namentos de Rudolf Steiner, difundidos na
para durar muitos anos.
ENTRE ELES O CAFÉ Alemanha e na Suíça, a partir dos anos 30.
O uso de outras variedades de plantas
naturalmente resistentes é altamente reco- A certificação surgiu como resposta a A Naturland foi criada em 1982 por um
mendado entre os métodos técnico-agronô- uma necessidade de validar os esforços de grupo de cientistas ligados à agricultura e
micos que a agricultura orgânica preconiza. muitos e para garantir aos consumidores consumidores e, em 1989, começou a ofere-
Trata-se do emprego de inseticidas que já que o produto que eles tencionam consumir cer serviços de certificação no México. Ho-
existem na natureza. Substâncias como o foi produzido de acordo com normas de je, ela certifica mais de 20 cooperativas, que
piretróide ou a nicotina são inseticidas natu- qualidade precisas e definidas. Além disso, congregam mais de 15 mil pequenos produ-
rais. Já a mencionada Crotolaria ochroleuca, ela cumpre uma função de difusão de in- tores, e podem ser encontradas no México
da Tanzânia, é excelente fixadora de nitrogê- formações e de educação do público, ao (desde 1989), na Guatemala (1992), no Peru
nio e reduz a propagação de plantas prejudi- generalizar e divulgar os métodos utilizados (1993), na Costa Rica (1996), na Bolívia
ciais aos cafeeiros. e padrões observados. (1992) e em Camarões (1997).
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Associações nos Estados Unidos direitos ou custos de licença calculados Orgânicos - Organic Foods Production Act
Nos Estados Unidos, há 33 associações anualmente à base de porcentagem sobre (OFPA). Implementada em 1996, a OFPA
certificadoras de produtos orgânicos. Se- as vendas dos produtos comercializados contém uma série extremamente abrangente
gundo informações recebidas, as agências como orgânicos. de normas a cumprir, para que no rótulo de
mais importantes no que diz respeito ao café um produto possa mencionar que ele foi
Normas para a certificação produzido organicamente. Nota-se que a
são a Organic Crop Improvement Association
da agricultura orgânica lei oferece uma lista completa tanto de
International (Ocia) e a Organic Growers
and Buyers Association (OGBA). A Ocia Diversos países já adotaram ou estão- substâncias sintetizadas quimicamente, co-
reúne cerca de 40 mil membros produto- se preparando para adotar as bases da regu- mo de substâncias naturais, que são inacei-
res distribuídos em 35 países. Cerca de 40% lamentação da certificação e, portanto, da táveis na produção orgânica. Entre estas
desses membros estão nos chamados paí- produção, processamento, comercialização últimas, encontra-se a nicotina.
ses em desenvolvimento. e marketing (etiquetagem) dos produtos
obtidos pelos métodos de agricultura orgâ- SITUAÇÃO DO MERCADO
Agências certificadoras nacionais nica. DO CAFÉ ORGÂNICO
Além dessas entidades européias e
Legislação européia Uma análise detalhada e profunda do
norte-americanas reconhecidas, começam
a surgir instituições locais, como por exem- A legislação européia procura harmoni- mercado de café orgânico e de seu potencial
plo o Centro Nicaraguense para a Investi- zar as iniciativas de seus vários membros, para novos mercados exigiria um conhe-
gação e a Promoção da Agricultura Ecoló- em resposta a: cimento dos países produtores, dos países
gica (Cenipae). Trata-se de entidades que consumidores, dos canais de distribuição,
a) obter um incremento da demanda
certificam na região e que, em alguns casos, dos consumidores por produtos or- dos volumes das transações nos últimos
dependem das instituições internacionais ganicamente produzidos; anos e dos preços obtidos no mercado.
para garantir a viabilidade dos produtores Como as estatísticas acerca deste tó-
b) assegurar uma competição saudável pico são quase inexistentes ou esparsas,
nos mercados europeu e americano. entre os produtores e uma transpa-
os comentários que são feitos baseiam-se
rência no mercado, com relação à
Processos para obter em informações prestadas por especialis-
produção, ao processamento e à
a certificação de tas do comércio cafeeiro e associações cer-
transformação de produtos, que cus-
agricultura orgânica tificadoras. Uma pesquisa mais aprofun-
tam caro para os consumidores;
A certificação observa uma série de pro- dada seria necessária para completar essa
c) proteger os consumidores do ponto análise.
cedimentos rigorosos. A entidade certifi-
de vista da observância de normas e
cadora estipula normas relativas a cada as-
padrões mínimos nos métodos em- Países produtores
pecto da produção, controle fitossanitário,
pregados pela agricultura orgânica. e países consumidores
controle de pragas, embalagem, processa-
A Comunidade Européia (CE) emitiu
mento, armazenamento, transporte, comer- Os principais países produtores de ca-
uma série de normas, que apresen-
cialização e etiquetagem, empregando um fé orgânico são os latino-americanos: Cos-
tam a definição de exigências míni-
comitê independente para deferir ou inde- ta Rica, Peru, México, Guatemala, Nicará-
mas para os métodos de produção e
ferir os pedidos de certificação. Uma vez gua, El Salvador, Brasil e Colômbia. Em
etiquetagem dos produtos orgânicos
concedida a certificação, visitas anuais de na CE (utilizando também termos de outras partes do mundo, também produzem
controle são organizadas para assegurar seus outros idiomas, como ecológico café orgânico Papua-Nova Guiné, Indo-
uma estrita obediência às normas. em espanhol, ökologisch em alemão, nésia - na Sumatra, e em um projeto do
Da mesma forma como os produtores, biologique em francês, organic em Departamento de Agricultura dos Estados
os comerciantes e os processadores (torre- inglês e biológico em português) e Unidos (USDA), no Timor - Índia, Uganda,
fatores, empacotadores) estão obrigados estabelecem o sistema de inspeção Camarões e Tanzânia.
a requerer a certificação e a acolher as inspe- dos produtos importados. Os principais países consumidores de
ções e o sistema de monitoramento nos ter- café orgânico são os Estados Unidos, se-
mos dos contratos que eles celebram com Legislação norte-americana guidos pela Alemanha, Países Baixos,
a entidade certificadora. Além disso, o direi- Para proteger tanto os consumidores Suíça, França, Áustria e Japão. Embora não
to de utilizar a marca registrada da entida- quanto os produtores, processadores e co- se conheça a porcentagem do consumo que
de (por exemplo, Naturland, Ocia etc.) é merciantes certificados como orgânicos, em corresponde a cada país, sugere-se que os
conseguido mediante contratos, pelos quais 1990, o Congresso dos Estados Unidos principais compradores sejam os Estados
os requerentes comprometem-se a pagar aprovou a Lei da Produção dos Alimentos Unidos e a Alemanha.
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A comercialização do O café orgânico volumes vendidos por outros canais (a


café orgânico como parte de um Demeter, outras agências certificadoras) e,
Diz-se que o mercado do café orgâni- mercado segmentado portanto, não estamos em condições de citar
co é determinado pelos consumidores O café orgânico tem um potencial de neste trabalho o volume efetivo ou estima-
conscientes em questões ligadas à saúde vendas num pequeno nicho do mercado, do das vendas de café orgânico. A Wet Coffee
(health food market). A publicidade deste visto por alguns analistas como um seg- Processors Association (WCPA), da Ugan-
tipo de produto, porém, vem-se deslocando mento da qualidade gourmet. Para outros, da, tencionava colocar aproximadamen-
de um mercado onde os consumidores pre- o café orgânico não pode ser associado te 5 mil toneladas de café Arábica no mer-
ocupavam-se sobretudo com a saúde, para aos cafés especiais, pois dentro dessa cate- cado europeu.
um mercado onde eles têm em mente ques- goria encontram-se diferentes qualidades. No Timor, 7 mil agricultores produziram
tões de caráter ambiental e social. Este fenô- No mercado dos cafés especiais, afirma- 450 toneladas em 1996, e estimava-se que
meno vem ocorrendo principalmente na se que o café orgânico tem grande potencial 8.500 produtores estariam participando do
Europa, onde a imagem de um comércio éti- econômico. Sua inclusão na categoria não projeto do USDA e exportando de 600
co, solidário ou justo (fair trade) tem sido pode ser atribuída a uma melhora inevitável a 800 toneladas para o mercado norte-
ligada à imagem da agricultura sustentável de sabor resultante da utilização de méto- americano, em 1997.
e orgânica. dos da agricultura orgânica em sua produ- Observamos com grande atenção que, para
Como ocorre com outros produtos pos- ção, mas ao fato de que, sendo café Arábica, produtores em algumas regiões onde o cafeeiro
tos à venda como orgânicos, o café orgâni- é possível incluí-lo em mesclas que podem é cultivado sem fertilizantes ou pesticidas
co é vendido aos consumidores com a ga- ser vendidas como café gourmet sempre sintéticos e comercializados por grandes com-
rantia de que provém de fonte segura, con- que, após ter sido certificado como orgâni- panhias, se a demanda e os preços recebi-
fiável e direta, sem passar pelas mãos de co, ele satisfaça a preferência dos consumi- dos lhes oferecessem suficiente incentivo,
múltiplos comerciantes e distribuidores. Is- dores por um produto de qualidade superior. poderiam encontrar-se em posição bastante
so significa que uma grande proporção do O diretor da Associação dos Cafés Fi- vantajosa do ponto de vista competitivo,
prêmio que os consumidores estão dispos- nos dos EUA, Ted Lingle afirma que, se- caso pleiteassem a certificação de seu café
tos a pagar irá favorecer o meio ambiente e gundo estimativas, até 1999 o café cultiva- para comercializá-lo como orgânico.
chegar diretamente aos produtores, contri- do organicamente foi responsável por 5% A título indicativo, calcula-se que, apli-
buindo para uma maior eqüidade socioeco- das vendas de cafés finos no mercado norte- cando os mais estritos padrões de certifica-
nômica através da prática do comércio soli- americano, respondendo por um volume de, ção de produtos orgânicos, um volume de
dário (fair trade). aproximadamente, 80 mil a 100 mil sacas. 9.700 toneladas de café das denominações
Uma lista dos fornecedores de cafés fi- Djimma e Limu poderia ter recebido certifi-
nos nos EUA, publicada em novembro de Volume real cação imediata em 1995 só na Província
1994, mostra que apenas 25 firmas, dentre O consumo de café certificado como Etíope de Keffa. Além disso, nos últimos
as 400 citadas, ofereciam café orgânico. Este orgânico e que cumpria o Regulamento cinco anos a Província exportou 73% de
dado é coerente com a afirmação de que no 2.072/91 da Comunidade Européia (CE), seu café da qualidade seco a sol (35 mil to-
milhares de produtores podem ter conse- em 1991, respondia por apenas 0,12% do neladas) e cerca de 3 mil toneladas de Limu,
guido certificados da Ocia, mas só perto consumo total dos principais países consu- ou seja, 20% do total de suas exportações
de uma dúzia de firmas (torrefatoras princi- midores da CE, ou seja, por um volume de de café lavado.
palmente) e alguns comerciantes estão 2.240 toneladas ou 24 mil sacas. Esses dados provocam muitos questio-
recebendo certificação da entidade. Essas Em 1996, os membros da Naturland namentos sobre o futuro do café produzi-
firmas têm um papel decisivo na promoção venderam um total de 1.800 toneladas na do organicamente: O que se passaria com
do consumo do café certificado como orgâ- Alemanha, Países Baixos, Áustria e Suíça. o mercado? Países que seguirem as estritas
nico. O sistema repousa na confiança que os Segundo estatísticas da Organização Inter- normas impostas pelos mercados europeu
consumidores depositam nos comerciantes nacional do Café (OIC), o consumo nesses e norte-americano ver-se-iam ameaçados por
que adotam a estratégia de lidar diretamente países colocou-se na ordem de 1,14 milhão países competitivamente privilegiados co-
com cooperativas de pequenos produto- de toneladas. Isso significa que os mem- mo a Etiópia? Ou talvez, a confiança que se
res, para evitar problemas no trato com uma bros da Naturland venderam, aproximada- tem nos distribuidores tradicionais, cons-
regulamentação cada vez mais severa. mente, 0,16% do café consumido nos qua- truída graças ao trabalho árduo das agên-
Para atender às exigências administrati- tro países. cias certificadoras de maior renome, permita,
vas do monitoramento pelas organizações pelo menos durante certo tempo, proteger
certificadoras e para fortalecer seu poder de Volume potencial das quem tenha acatado todas essas normas,
negociação, os pequenos produtores tendem vendas de café orgânico especialmente os países latino-americanos.
a se associar em cooperativas. Não dispomos de cifras exatas sobre os A previsão da orientação desse mercado
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teria de basear-se num consenso a respeito nizem-se em sistemas de cooperativas CONSIDERAÇÕES FINAIS
de questões como as que constituem o cul- que lhes garantam acesso ao mercado.
Está longe de se ter um consenso em
tivo orgânico, as normas a respeitar, o papel Por estes parâmetros, grande parte do
torno da definição de café orgânico, devido
das entidades certificadoras e as garantias café que o mundo produz é orgânico à dificuldade em definir o que constitui agri-
aos consumidores. à revelia. Não se sabe quantos agricul- cultura orgânica. Levando-se em conta a
tores praticam esse tipo de agricultura evolução histórica do conceito, no presen-
Comparação do preço pago ou quais são as superfícies alocadas te documento propõe-se um esquema de
pelo café orgânico e pelo a esse tipo de produção, mas há infor- análise que compreenda um nível técnico-
não-orgânico mações de que eles não passam de agronômico, um nível econômico e uma
Em 1992, o café orgânico estava sendo alguns milhares. base filosófica para definir a aplicação do
vendido no atacado por US$ l.00 a US$1.50 A importância relativa dos métodos pre- conceito de orgânico à produção, proces-
acima do preço do café não-orgânico, ob- conizados pela prática da agricultura orgâ- samento e comercialização de café.
tendo-se um prêmio de US$1.50 a US$2.00 nica do ponto de vista de sua difusão será Os padrões de certificação não são pre-
no varejo. Acredita-se que os consumidores determinada em grande parte pelos seguin- cisos. Embora as organizações certificadoras
de países como a Alemanha, de modo ge- tes fatores: tenham publicado padrões muito detalha-
ral, estão dispostos a pagar um prêmio de dos quanto aos métodos a seguir na agri-
15% a 20% pelos produtos certificados co- a) capacidade que esses métodos pos-
sam ter em adaptar-se e aceitar a in- cultura orgânica, os padrões específicos
mo orgânicos. Esta margem pode variar, para a produção e o processamento do cha-
segundo a conjuntura econômica, diminu- clusão de novas tecnologias e bio-
controle entre seus princípios; mado café orgânico só foram determinados
indo em períodos de recessão e também em termos muito genéricos. Tem-se a infor-
segundo resultados de campanhas de sen- b) papel das campanhas de extensão mação de que o trabalho acerca dos pa-
sibilização e promoção. rural promovidas pelos governos; drões para o café ainda está em curso.
O diferencial de preços que os produ- Os países que desejam exportar seus
c) flexibilidade demonstrada pelas entida-
tores recebem depende em grande parte produtos para regiões onde as normas estão
des certificadoras e agências estatais,
da capacidade de negociação com os distri- sendo implementadas com rigor nesses últi-
esforçando-se para não se transfor-
buidores. Como na maioria dos casos os mos anos, vêem-se obrigados a respeitar
mar num peso e obstáculo à conver-
produtores de café orgânico são pequenos uma série de padrões que podem constituir
são e, ao mesmo tempo, o rigor em
produtores, que ainda não têm grande barreiras não-comerciais ao livre comércio.
celebrar os contratos de certificação
experiência, nem grande poder para ne- A viabilidade econômica do café orgâ-
e monitoramento, para preservar a
gociar preços mais remuneradores, quem nico ainda é difícil de avaliar. Os custos extras
confiança dos consumidores;
consegue os maiores benefícios, compa- acarretados pela necessária inspeção e con-
rativa e relativamente, são os distribuido- d) campanhas de educação e de sensibili-
trole da observância dos métodos da agri-
res. zação destinadas a promover os produ-
cultura orgânica, mais os custos dos direi-
tos orgânicos entre os consumidores;
tos de propriedade das marcas registradas
A importância do
e) preço relativo do café orgânico, que exigirão que os diversos agentes produtores,
café orgânico
teria de compensar os custos de pro- processadores, comerciantes, bem como
O que mostra a importância relativa do dução e as despesas adicionais da entidades certificadoras e governos estejam
café cultivado pelos métodos da agricultura certificação e do monitoramento ao de acordo, quanto às normas a seguir e aos
orgânica não é tanto o volume de café que longo da cadeia de produção, proces- custos administrativos acarretados tanto
se vende, mas o enorme esforço dos produ- samento, transporte e comercialização. para produtores como para consumidores.
tores no sentido de adquirir conhecimentos
sobre técnicas agrícolas que exigem baixos
níveis de inversão de capital e que, ao mes-
mo tempo, atendem aos dois principais obje-
tivos do desenvolvimento sustentável:
a) proporcionar alternativas menos noci-
vas para a manutenção da fertilidade
e da qualidade dos recursos naturais;
b) contribuir para que pequenos e médios
agricultores que operam com base no
uso intensivo de mão-de-obra orga-

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, 7-13, jan./abr. 2002


Café Orgânico 15

Cafeicultura orgânica:
conceitos e princípios
Ivan Franco Caixeta1
Sérgio Pedini2

Resumo - São apresentados os principais con-


ceitos e princípios que norteiam a produção de
café de forma sustentável e em equilíbrio com
o ambiente. Existem várias denominações para
um sistema de produção ecologicamente equi-
librado, adotando-se, aqui, a conceituação de
orgânico. Destacam-se ainda as diferentes
escolas, pontos a favor e os desafios existen-
tes no processo de comercialização do café
orgânico.

Palavras-chave: Agricultura orgânica; Agricul-


tura biológica; Café orgânico.

1
Engo Agro, M.Sc., Prof. Escola Superior de Agricultura e Ciências de Machado (ESACMA) / Presidente da Associação de Cafeicultura Orgânica
do Brasil (ACOB), Rua Major Feliciano, 1000, CEP 37750-000 Machado-MG. Correio eletrônico: caixeta@axnet.com.br
2
Engo Agro, M.Sc., Prof. Escola Superior de Agricultura e Ciências de Machado (ESACMA) / Secretário Executivo da Associação de Cafeicultura
Orgânica do Brasil (ACOB), Rua 7 de Setembro, 222, CEP 37750-000 Machado-MG. Correio eletrônico: spedini@axnet.com.br

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.15-20, jan./abr. 2002


16 Café Orgânico

INTRODUÇÃO que devem ser respeitados para que haja o cafeeira é nutrida, por sua vez, com a com-
equilíbrio (Fig. 1). postagem obtida a partir do esterco de gado
O modelo agroquímico de produção,
Percebe-se que, no organismo agrícola, misturado com a casca do café beneficiado
com base no uso intensivo de fertilizantes
a integração deve acontecer em todos os (Fig. 3). Externamente, pode-se estruturar
sintetizados e altamente solúveis, com a
níveis, criando-se relações de troca entre um sistema integrado, quando uma torre-
aplicação indiscriminada de defensivos
componentes internos e externos do sis- fação que recebe o café beneficiado produz
agrícolas e conseqüentes desequilíbrios
tema. A integração na propriedade pode um resíduo que pode ser utilizado na adu-
ambientais, sociais e sanitários, vem sen-
ocorrer, por exemplo, entre sistemas de pro- bação. O importante é perceber que a inte-
do alertado e discutido por vários autores,
dução vegetal como a aplicação de adubos gração dos sistemas é fundamental para a
dentre eles, Paschoal (1994), notadamente sustentabilidade da produção e que os
verdes no café (Fig. 2). A integração entre
a partir da década de 70, quando se inten- recursos naturais têm o mesmo peso dos
a produção animal e vegetal pode ser exem-
sificou a preconizada Revolução Ver- plificada, quando existe um confinamen- demais componentes, fazendo com que o
de. Ainda, segundo esse autor, exemplos to de gado e uma lavoura de café: o gado cafeicultor fundamente sua produção em
claros desse modelo estão por toda parte: recebe, como parte de sua alimentação, resí- princípios ecológicos de manejo.
áreas cultivadas com trigo e soja na Região duos do benefício da cafeicultura e a lavoura Para que se possa diferenciar uma la-
Sul do país perdem mais de 100 t/ha de so-
lo, em apenas um ano agrícola, dilapidan-
do um recurso que levou milhares de anos
para ser formado. Segundo a Organiza- Organismo agrícola
ção Mundial da Saúde (apud FAO, 1999), Produção
“o uso intensivo de pesticidas na agricul- vegetal
tura tem provocado envenenamentos da
ordem de 3 milhões de pessoas por ano”.
Um dos argumentos utilizados por
aqueles que preconizaram e defenderam a
Produção Recursos
Revolução Verde, e agora preconizam a animal naturais
manipulação genética, era a responsabi-
lidade em acabar com a fome no planeta.
Sabe-se ainda que estamos longe desse
ideal e que a fome não só continua assolan-
Indústria Homem Cidade
do o planeta, como caminha a passos lar-
gos, principalmente nos países pobres do
Hemisfério Sul. Figura 1 - Sistema articulado de um organismo agrícola
Todo esse processo degradante e des-
truidor acabou gerando reações contrárias
que se concretizaram através de movimen-
tos contestadores (PEDINI, 1993), grande
parte destes, originários de movimentos
ambientalistas e de contracultura dos anos
60 e 70. Neste artigo, pretende-se apresentar
as formas como esses movimentos alter-
nativos desencadearam-se no mundo e no
Brasil, com destaque para a cafeicultura
nacional.
Um cafeicultor é “orgânico” não só por-
que utiliza intensamente matéria orgânica,
Foto: Ivan Franco Caixeta

animal e vegetal, como comumente é apre-


sentado, mas principalmente porque sua
produção deve ser conduzida de modo
semelhante à vida de um organismo vivo
(um sistema articulado, inter-relacionado e
complexo) que tem ritmos e limites naturais, Figura 2 - Lavoura orgânica em área de Cerrado, com adubação verde

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.15-20, jan./abr. 2002


Café Orgânico 17

comerciais transparentes como base da


negociação dos produtos etc. O Quadro 1
apresenta uma sistematização dessas dife-
renças.

DIFERENTES ESCOLAS
Diversas são as denominações dos sis-
temas de produção agrícola que têm por
objetivo produzir alimentos, perturbando
o menos possível o equilíbrio do ambiente.
Para tal, todos incorporam como princípios
Foto: Ivan Franco Caixeta

básicos a não-utilização da maior parte dos


chamados produtos agroquímicos elabo-
rados industrialmente, sejam os fertilizan-
tes na forma solúvel, sejam os agrotóxicos
propriamente ditos, denominados eufemis-
Figura 3 - Lavoura orgânica de cafeeiros com composto ao fundo ticamente de defensivos agrícolas e a eco-
nomia de energia. Entretanto, diferem entre
voura orgânica de uma lavoura de café con- cular da maneira cartesiana como são trata- si em aspectos específicos de alguns itens
vencional, torna-se fundamental o apro- dos os problemas, comumente utilizada nos como a organização da produção e relações,
fundamento de conceitos que superam a modelos agroquímicos de produção. Mais solo, planta, animais, homem, filosofia.
noção de produto, para a conceituação de importante que controlar uma praga é sa- Ehlers (1996) diferenciou as principais esco-
sistema de produção, envolvendo compo- ber se o manejo nutricional adotado foi o las de pensamento, de acordo com suas
nentes ecológicos, sociais e até mesmo responsável por seu aparecimento; conhe- características peculiares, incluindo-as no
políticos. É necessário incorporar a noção cer as condições de trabalho dos funcio- que o autor denominou de movimentos
de processos produtivos para se desvin- nários da empresa; defender as relações rebeldes.

QUADRO 1 - Análise comparativa entre as formas convencional e orgânica de produção agrícola


Agricultura
Características
Convencional Orgânica
Objetivos gerais Atender, de maneira geral, a interesses econômicos Atender a interesses econômicos, sobretudo, a inte-
de curto prazo resses ecológicos e sociais auto-sustentados

Estrutura do sistema Monocultura Sistema diversificado

Maneira de encarar o solo Como um substrato físico, basicamente como supor- Como um ser vivo (um meio eminentemente bio-
te para a planta lógico)

Recursos genéticos Redução da variabilidade; maior suscetibilidade ao Adaptação ambiental; maior resistência ao meio
meio; utilização de organismos geneticamente mo-
dificados (transgênicos) etc.

Adubação Fertilizantes altamente solúveis; adubação às vezes Reciclagem de nutrientes; uso de rochas moídas e ma-
desiquilibrante téria orgânica

Como lidar com pragas e doenças Uso intensivo de defensivos agrícolas Nutrição equilibrada e adequada; diversificação e con-
sorciação; controles alternativos não-contaminantes

Entradas do sistema Alto capital e consumo de energia; pouco trabalho Pouco capital e baixo consumo de energia; mais traba-
lho

Saídas do sistema e conseqüências Alimentos desbalanceados e contaminados; baixa va- Alimentos de alto valor biológico; equilíbrio ecoló-
lorização do produto; agressão ambiental gico; alta valorização do produto; sustentabilidade do
sistema

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.15-20, jan./abr. 2002


18 Café Orgânico

Agricultura biodinâmica mento, de maio de 1999 (BRASIL, 1999), micas regionais. Bastante difundida na
É uma corrente de pensamento ligada à definiu: França, a agricultura biológica tomou impul-
antroposofia. A agricultura biodinâmica so a partir dos trabalhos de Claude Aubert
Considera-se sistema orgânico de
tem como base um ciclo de oito conferên- que publicou, em 1974, o livro A Agricultura
produção agropecuária e industrial,
cias proferidas pelo filósofo austríaco Rudolf Biológica, em que ressalta a importância
todo aquele em que se adotam tecno- da manutenção da saúde dos solos como
Steiner (1861-1925), na Fazenda Koberwitz,
logias que otimizem o uso de recursos
próxima a Breslau, na Polônia, em 1924. forma de propiciar a saúde das plantas.
naturais e socioeconômicos, respeitan-
Steiner salientou, nas palestras, a impor- Paralelamente a Aubert, o biólogo fran-
do a integridade cultural e tendo por cês Francis Chaboussou lançou as bases
tância da manutenção da qualidade dos
objetivo a auto-sustentação no tem-
solos para a sanidade das culturas vegetais da teoria da trofobiose3 (CHABOUSSOU,
po e no espaço, a maximização dos
e soluções práticas para seu tratamento, 1980), uma das mais relevantes contribui-
benefícios sociais, a minimização da ções científicas para o movimento orgânico
visando reestimular as forças naturais dos
dependência de energias não-reno-
solos. Esses aditivos ficaram conhecidos mundial.
váveis e a eliminação do emprego de
como preparados biodinâmicos. Além des- Para a cafeicultura orgânica, os princí-
agrotóxicos e outros insumos artificiais pios biológicos acabaram sendo funda-
ses preparados, os agricultores biodinâ-
tóxicos, organismos geneticamente
micos regem suas atividades, respeitando mentais em sistemas de produção de lar-
modificados - OGM transgênicos, ou
um calendário próprio e também a integra- ga escala, pois dependem de um leque de
radiações ionizantes em qualquer fase fontes alternativas de matéria orgânica,
ção das produções animal e vegetal.
do processo de produção, armazena-
Não existem registros, até o momento, incluindo os resíduos agroindustriais.
mento e de consumo, e entre os mes-
de lavouras biodinâmicas de café certifi-
mos, privilegiando a preservação da Agricultura natural
cadas, mas algumas lavouras orgânicas já
saúde ambiental e humana, assegu-
iniciaram seus projetos de conversão para Da mesma forma como o filósofo Rudolf
rando a transparência em todos os
o sistema biodinâmico de produção. Steiner propôs a corrente filosófica conhe-
estádios da produção e da transfor-
cida por antroposofia, que tem a agricultura
Agricultura orgânica mação.
biodinâmica como um dos componentes
A obra do pesquisador inglês Sir Albert A grande maioria das propriedades em fundamentais, a evolução do movimento re-
Howard foi o principal ponto de partida sistemas orgânicos de produção de café é belde japonês percorreu um caminho simi-
para uma das mais difundidas vertentes certificada de acordo com os princípios lar. Em 1935, o mestre Mokiti Okada criava
alternativas, ou seja, a agricultura orgânica. dessa Instrução Normativa e segue, portan- uma religião que tem como um dos seus
Entre os anos 1925 e 1930, Howard dirigiu, to, suas bases tecnológicas de produção. alicerces a chamada agricultura natural. O
em Indore, na Índia, uma instituição de pes- princípio fundamental dessa proposta é o
quisa de plantas, onde realizou vários estu- Agricultura biológica de que as atividades agrícolas devem res-
dos sobre a compostagem e a adubação É uma escola de pensamento que se ba- peitar as leis da natureza. Em 1938, pratica-
orgânica. Em suas obras, além de ressaltar seia nos conceitos do político suíço Hans mente na mesma época, Masanobu Fukuoka
a importância da utilização da matéria orgâ- Peter Müller e do médico alemão Hans Peter chegava a conclusões muito semelhantes
nica nos processos produtivos, Howard Rush, que ampliou os conceitos de Howard às de Okada, formulando os princípios da
mostrou que o solo não deve ser entendido no que concerne aos aspectos econômicos agricultura da natureza. Ambos defenderam
apenas como um conjunto de substâncias, e sócio-políticos, preocupando-se, por a idéia de que se deve aproveitar ao máximo
tendência proveniente da química analíti- exemplo, com a autonomia dos produto- os processos que já ocorrem espontanea-
ca, pois nele ocorre uma série de processos res e com os sistemas de comercialização mente na natureza, sem esforços desneces-
vivos e dinâmicos, essenciais à saúde das direta dos produtos. Müller e Rush não sários e desperdício de energia. Os adeptos
plantas. Nos anos 80, a noção de agricultu- consideravam essencial a associação da da agricultura natural limitam o uso de ester-
ra orgânica já apresentava um campo con- agricultura com a pecuária, como os bio- cos, por considerá-los impuros e adotam
ceitual e operacional mais preciso e, em 1984, dinâmicos, e sugeriram que a agricultura práticas, como a compostagem de vegetais
o Departamento de Agricultura dos Esta- deveria fazer uso de várias fontes de matéria e a utilização de microorganismos, que
dos Unidos (USDA) reconheceu sua impor- orgânica, sejam estas do campo ou das auxiliam os processos de decomposição e
tância para a agricultura americana. cidades, integrando-se as propriedades melhoram a qualidade dos compostos.
No Brasil, a Instrução Normativa no 7 agrícolas com as demais propriedades e Na cafeicultura, já existem experiências
do Ministério da Agricultura e Abasteci- com o conjunto de atividades socioeconô- expressivas que se consideram naturais e

3
Trofhe, do grego, exprime a idéia de nutrição. O termo trofobiose já havia sido empregado anteriormente por outros biólogos para designar a
relação entre dois seres na qual um deles protege e alimenta-se das excreções ou detritos de outros (EHLERS, 1996).

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.15-20, jan./abr. 2002


Café Orgânico 19

baseiam seus sistemas nos princípios de dois aspectos, em pontos favoráveis e em e à exportação de café orgânico, pois
Fukuoka (1995) e no teste do “nada fazer”, desafios, conforme descrição a seguir: esse mercado representa um adicio-
preconizado pelo autor. Os produtores nal na entrada de recursos externos
a) pontos favoráveis:
naturais de café não adotam nenhum tipo no país. Outro estímulo, é a criação
- mercado altamente comprador: to- de linhas especiais de crédito como
de adubação, via solo ou foliar, e não con-
dos os dados estatísticos e mercado- o BB Agricultura Orgânica do Banco
trolam pragas e doenças; apenas manejam
lógicos continuam apontando para do Brasil;
as plantas espontâneas, quando necessário
um crescimento na demanda por pro-
(Fig. 4). - barreiras não-tarifárias: no mercado
dutos orgânicos em todo o mundo,
globalizado, onde começam a cair as
Sistemas organominerais principalmente na Europa, Estados
barreiras tarifárias (impostos e taxas
Unidos e Japão e, mais recentemente,
Um último sistema de produção que tem discriminatórias), surgem as barreiras
no Brasil;
crescido em volume de produção, princi- não-tarifárias. Uma delas é a barreira
palmente de café, mas que não é citado por - preço diferenciado: atualmente, o café ambiental, ou seja, logo surgirão res-
Ehlers (1996) é o denominado organomi- orgânico tem sido valorizado com prê- trições aos produtos agrícolas que
neral ou SAT (sem agrotóxicos). Trata-se mios ou ágios que variam de 30% a advenham de sistemas que agridam
de um manejo no qual o produtor elimina 100% acima do preço do café conven- o ambiente e o homem, criando, assim,
da propriedade toda e qualquer forma de cional, dependendo do mercado e da uma vantagem comparativa ao café
aplicação de agrotóxicos, mas continua uti- qualidade do produto; produzido organicamente;
lizando, por um período determinado, fertili- - commodity: o café, sendo uma - mercado justo (fair trade): uma mo-
zantes sintetizados quimicamente, proibi- commodity, tem facilitada sua co- dalidade de comercialização que já
dos pelas normas orgânicas. Apesar de se mercialização, fato que não ocorre, existia antes do mercado orgânico é
respaldar num embasamento teórico defi- por exemplo, com as hortaliças. Já a do mercado justo (fair trade) que
nido e ser adotado por empresas de asses- existem estruturas de despacho, privilegia a transparência nas nego-
soria, o café organomineral ou SAT não transporte e exportação aptas para ciações, a aproximação entre consu-
possui um mercado consumidor definido e atender à cadeia do café; midor e produtor e o relacionamen-
regulamentado. - estocagem: o café, por ser de fácil to justo entre produtor e empregado.
Essa modalidade de mercado acaba
estocagem, é pouco perecível e não
privilegiando o produto orgânico que
ASPECTOS DA sofre o ataque de pragas em grãos
já possui normalmente essas caracte-
COMERCIALIZAÇÃO DO armazenados, e acaba tendo vanta-
rísticas;
CAFÉ ORGÂNICO gens comparativas comerciais;
Atualmente, pode-se dividir o processo - incentivos governamentais: atual- b) desafios:
de comercialização do café orgânico em mente, existem incentivos à produção - mercado exigente: muitos cafeicul-
tores acreditam que pelo fato de seu
café ser orgânico, o desobriga de ser
de qualidade, o que não é verdade.
Tanto no mercado externo quanto no
interno, o café orgânico é voltado ao
consumidor de cafés especiais, o que
obriga o cafeicultor a adotar proce-
dimentos que tornem seu café um
produto de alta qualidade, muitas
vezes onerando seu custo;
- volume: somente grandes volumes
são aceitos no mercado internacional,
onde a medida adotada normalmente
Foto: Ivan Franco Caixeta

é o contêiner (200 a 250 sacas de 60kg),


o que pode dificultar principalmente
o pequeno produtor;
- concorrência: atualmente, existe uma
concorrência com países que culti-
Figura 4 - Lavoura de café “natural” vam café sombreado e faltam ainda,

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.15-20, jan./abr. 2002


20 Café Orgânico

no Brasil, tecnologias voltadas para de 1999. Dispõe sobre a produção de produtos gica. Folha de São Paulo, São Paulo, 13 abr.
a arborização das lavouras cafeei- orgânicos vegetais e animais. LEX – coletânea 1999.
ras; de Legislação e Jurisprudência: legislação
FUKUOKA, M. Agricultura natural: teoria e
federal e marginália, São Paulo, ano 63, t.5,
- custo da certificação: o custo impos- prática da filosofia verde. São Paulo: Nobel, 1995.
p.2465-2476, maio 1999.
to pelas certificadoras pode ser um 300p.
impeditivo, principalmente num ce- CHABOUSSOU, F. Plantas doentes pelo uso
PASCHOAL, A.D. Produção orgânica de ali-
nário futuro de redução do ágio sobre de agrotóxicos: a teoria da trofobiose. Porto
mentos: agricultura sustentável para os séculos
Alegre: L & PM, 1980. 253 p.
o produto convencional. XX e XXI. São Paulo, 1994. 191 p.
EHLERS, E. Agricultura sustentável: origens
PEDINI, S. Agricultura e pequena produção:
REFERÊNCIAS e perspectivas de um novo paradigma. São Paulo:
o caso do CAA de Montes Claros. 1993. 100f.
Livros da Terra, 1996. 178 p.
BRASIL. Ministério da Agricultura e do Abaste- Dissertação (Mestrado) – Escola Superior de
cimento. Instrução Normativa n0 7, de 17 de maio FAO aponta crescimento da agricultura ecoló- Agricultura de Lavras, Lavras.

Onde obter informações sobre café orgânico

• AAO – Associação de Agricultura Orgânica. Telefax: (11)


3673-8013. Correio eletrônico: organica@uol.com.br (Cer-
tificadora).

• ACOB – Associação de Cafeicultura Orgânica do Brasil. Tele-


fax: (35) 3295-2366. Correio eletrônico: acob@axnet.com.br
(Associação de cafeicultores orgânicos).

• Centro de Assessoria SAPUCAÍ. Telefax: (35) 3422-3782.


Correio eletrônico: sapucaiong@uol.com.br (Certificadora de
produtores orgânicos).

• ESACMA – Escola Superior de Agricultura e Ciências


de Machado. Telefax: (35) 3295-3578. Correio eletrônico:
esacma@fem.com.br. (Faculdade de agronomia que trabalha
com cafeicultura orgânica).

• EPAMIG-CTSM – Empresa de Pesquisa Agropecuária de


Minas Gerais - Centro Tecnológico do Sul de Minas -
Ecocentro. Telefax: (35) 3821-6244. Correio eletrônico:
ctsm@epamig.ufla.br

• EPAMIG-CTZM – Empresa de Pesquisa Agropecuária de Mi-


nas Gerais - Centro Tecnológico da Zona da Mata. Telefax:
(31) 3899-5224. Correio eletrônico: epamig@ufv.br

• FADEMA – Fundação de Apoio ao Desenvolvimento, Ensino


e Extensão de Machado. Telefax: (35) 3295-5011. Correio
eletrônico: fadema@axnet.com.br (Fundação que promove
cursos e eventos sobre cafeicultura orgânica no Sul de Mi-
nas Gerais).

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.15-20, jan./abr. 2002


Café Orgânico 21

Manejo ecológico Resumo - Apresentam-se os princípios gerais de ma-


nejo ecológico de uma propriedade, que se acredi-
tam aplicáveis à lavoura cafeeira, já que não existem
da propriedade trabalhos científicos específicos com enfoque na
cafeicultura. Os princípios básicos para obtenção do
cafeeira orgânica equilíbrio ecológico e, assim, da sustentabilidade
são: utilizar o solo de acordo com sua capacidade de
uso e implantar lavouras de acordo com a aptidão
Maria Inês Nogueira Alvarenga1 agrícola das terras. O manejo ecológico visa também
Márcia Martins2 a proteção ambiental, sendo este aspecto abordado
Miralda Bueno de Paula3 em relação aos recursos naturais mais afetados, direta
ou indiretamente, por atividades agrícolas, quais
sejam: solo, recursos hídricos, flora e fauna.

Palavras-chave: Manejo do solo; Sustentabilidade;


Agroecossistema; Cafeicultura orgânica.

1
Enga Agra, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: mines.alvarenga@epamig.ufla.br
2
Enga Agra, M.Sc., Doutoranda, UFLA - Depto Agricultura, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: marcialavras@bol.com.br
3
Enga Agra, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: bueno@.ufla.br

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, 214/215, p.21-31, jan./abr. 2002


22 Café Orgânico

INTRODUÇÃO Supõe-se que almejar a sustentabili- CONCEITOS


dade seria algo utópico. Entretanto, pen-
O paradigma da sustentabilidade limi- Manejo integrado
sando em modelos de agricultura que se
ta-se à compreensão do potencial de uso
aproximem da sustentabilidade, ou que A palavra integrado significa “cada
do ambiente, em face das interferências
tendam para tal, acredita-se que uma explo- uma das partes de um todo que se com-
antrópicas que visam o bem-estar da po-
ração agrícola integrada é a que estaria mais pletam ou complementam”. Dentro de um
pulação. Dentro desse contexto deve-se
próxima da sustentabilidade. Junte-se a es- agroecossistema, onde se busca o manejo
atentar para duas vertentes principais:
sa integração, o aspecto ecológico, ou seja, integrado, o produtor deve manipular os
atingir o bem-estar em um nível de consumo
agricultura visando o manejo da lavoura, recursos físicos e biológicos e, dependen-
que se pode considerar digno ou exces-
sem ou com mínima utilização de agro- do do grau de modificações da tecnologia,
sivo. Diga-se de passagem, que grande
tóxicos, mas trabalhando com o equilíbrio estas atividades afetam quatro processos
parte da população mundial, cerca de 2/5,
vive num patamar bem abaixo do digno, ecológico. Nessa linha de raciocínio, po- ecológicos principais que, segundo Altieri
isto é, o miserável; uma mesma fração num dem-se observar os indicadores de sus- (1989), são os energéticos, hídricos, bio-
patamar médio, aqui chamado digno; e, tentabilidade do solo e de manejo das cul- químicos e de equilíbrio biótico. O manejo
apenas 1/5, num patamar de consumo turas, segundo Lal (1999), apresentados na integrado, como o próprio nome sugere,
elevado. É evidente que esses últimos Figura 1. integra estes processos. Assim, nos pro-
querem manter seu padrão de consumo e,
portanto, são responsáveis pela condi-
ção de vida daqueles miseráveis, que, se
almejarem um padrão médio, digno de vida,
levarão o planeta ao caos, porque a Terra
não tem sustentabilidade para manter esse
padrão de consumo. Em outras palavras, é
interesse de alguns que muitos sobrevivam
em condições miseráveis, para que seus
padrões de consumo de luxo possam ser
mantidos.
Trazendo esse cenário para a agricul-
tura, observa-se que se pratica em larga
escala uma agricultura exploratória que,
dominada pelos donos do poder, tem re-
cursos e créditos facilitados, direcionados
a uma atividade que visa o lucro ganan-
cioso, ou seja, “quanto maior melhor”, sem
se preocupar com o ambiente explorado.
Inclui-se aqui o homem. Do outro lado,
encontra-se o produtor miserável que faz
uma agricultura exploratória sim, mas que
se preocupa em preservar o ambiente, por-
que sabe estar ali a sua fonte de sobrevi-
vência. Entre esses, alguns conseguem
fazer uma exploração mais integrada apro-
veitando sobras e restos de uma ativida-
de para sustentar a outra, estando numa
posição intermediária. Entretanto, na gran-
de maioria, em nenhuma das duas pontas
tem-se a sustentabilidade; pode-se conse-
guir numa vertente a lucratividade que
sustenta determinado sistema de produ-
ção e, na outra, consegue-se sustentar um
padrão de vida muito baixo, onde sobrevive
aquele que tem pouca ambição de melhora Figura 1 - Indicadores de sustentabilidade do solo e de manejo das culturas
de vida. FONTE: Dados básicos: Lal (1999).

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.21-31, jan./abr. 2002


Café Orgânico 23

cessos energéticos, a energia solar entra ao seu módulo ambiental dentro das leis Biodiversidade
em um agroecossistema como luz solar, naturais, de onde se infere que o manejo Número ou variedade de espécies em
passa por numerosas transformações, de ecológico da propriedade seria a utilização um local, comunidade, ecossistema ou
forma que a energia é transferida para as dos recursos naturais dentro das leis na- agroecossistema; grau de heterogeneidade
plantas pela fotossíntese (produção primá- turais e inter-relacionados em equilíbrio di- dos componentes bióticos de um ecossis-
ria) e de um organismo para outro através nâmico. tema ou agroecossistema (GLIESSMAN,
da cadeia alimentar. Nesta ressalta-se a im- 2001).
portância ecológica da fauna, que desloca Agricultura orgânica
a energia produzida pela fotossíntese por Na verdade não há um conceito mun- Agroecologia
todo o ecossistema. Em relação aos proces- dialmente aceito de agricultura orgânica. É a ciência da aplicação de conceitos e
sos hídricos, ressalta-se que a água é parte Ao contrário do que muitos pensam, a princípios ecológicos ao desenho e manejo
fundamental de qualquer sistema, inclusive maioria dos produtores orgânicos faz uso de agroecossistemas sustentáveis. A agro-
o agrícola, onde, além de seu papel fisioló- de equipamentos agrícolas modernos, va- ecologia proporciona o conhecimento e a
gico, entra no agroecossistema sob formas riedades melhoradas, sementes certifica- metodologia necessários para desenvol-
de precipitação, água escorrida e de irriga- das, manejo adequado de animais, práticas ver uma agricultura que é ambientalmente
ção, água perdida por evaporação, água de conservação de solo e água, manejo do consistente, altamente produtiva e econo-
lixiviada e de drenagem, quando ultrapassa lixo e de resíduos orgânicos. A agricultura micamente viável. Valoriza o conhecimento
a zona radicular efetiva das plantas. Entre orgâ-nica é um sistema de produção local e empírico dos agricultores, a socia-
os processos biogeoquímicos que devem agropecuá-rio que promove a interação lização desse conhecimento e sua aplicação
ser considerados no manejo integrado, entre biodi-versidade, ciclos biológicos das ao objetivo comum da sustentabilidade
destacam-se os nutrientes fornecidos pelo espécies vegetais e animais e atividade (GLIESSMAN, 2001).
solo, a fixação do nitrogênio atmosférico biológica do solo, sem o uso de produtos
pelas leguminosas, a fixação não-simbiótica químicos tóxi-cos ao meio ambiente para Agroecossistema
do nitrogênio, nutrientes carreados pela não proporcio-nar a contaminação de Segundo Gliessman (2001), compreende
chuva e pela água corrente, fertilizantes mananciais, solo e ar. Baseia-se no uso o ecossistema natural e ambientes modifi-
químicos e orgânicos. mínimo de produtos externos à propriedade cados pelo ser humano, em uma proprie-
Nos processos de equilíbrio biótico, o e no manejo de prá-ticas que restauram, dade rural, onde ocorrem complexas rela-
controle das sucessões (invasão de plantas mantêm e promovem a harmonia ecológica ções entre seres vivos, elementos naturais
e competição) e a proteção contra pragas e do sistema. A agricul-tura orgânica deve (rochas, solos, água, ar). Ou seja, é o lo-
doenças são os principais problemas em ser, também, ecologica-mente sustentável, cal de produção agrícola – uma proprieda-
manter a continuidade de produção nos economicamente viável, socialmente justa de agrícola, por exemplo – compreendido
agroecossistemas. Os produtores têm usa- e culturalmente aceitável (Fig. 2). como um ecossistema.
do várias técnicas, como variedades re-
sistentes, manipulação da época de plantio,
espaçamento, técnicas culturais, controles
alternativos etc. As estratégias ecológicas
do manejo de pragas geralmente empregam
uma combinação de ações, com o objetivo
de tornar o campo menos atrativo a pragas
e doenças, e o ambiente favorável aos ini-
migos naturais, interferindo, assim, na pro-
pagação das doenças de uma cultura a
outra ou atraindo as pragas para longe das
culturas (ALTIERI, 1989).
Foto: Maria Inês N. Alvarenga

Manejo ecológico
De acordo com Primavesi (1990b), eco-
logia é a ciência que estuda a inter-relação
dos equilíbrios dinâmicos dos diversos
lugares com sua vida, seu solo e seu con-
junto (o ambiente, como um todo). Eco- Figura 2 - Lavoura de café orgânico (Catuaí Vermelho), em propriedade de agricultura
lógico quer dizer perfeitamente adaptado familiar, no município de Poço Fundo-MG

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, 214/215, p.21-31, jan./abr. 2002


24 Café Orgânico

Os princípios básicos para um agro- e animal como forma de garantir o equilí- priedades interagem entre si e, para um bom
ecossistema sustentável, segundo Altieri brio biológico natural (LÓPEZ DE LEÓN; manejo do solo sob o cafeeiro, é conve-
(1989), são: a conservação de recursos re- MENDOZA DÍAZ, 1999). niente adotar algumas medidas (LÓPEZ DE
nováveis, adaptação da agricultura ao O desequilíbrio biológico natural e o LEÓN; MENDOZA DÍAZ, 1999), tais co-
ambiente e a manutenção de um nível alto, desequilíbrio nutricional da planta ocasio- mo:
porém sustentável de produtividade. nam um estresse no metabolismo vegetal a) cobertura do solo: árvores de sombra
que, por sua vez, resulta na produção exces- cumprem esse papel, protegem o so-
Ecossistema siva de aminoácidos livres na seiva e folhas, lo do impacto das gotas de chuva e
Sistema funcional de relações comple- sendo esses aminoácidos livres, fonte de ajudam na produção de matéria orgâ-
mentares entre organismos vivos e seu alimento para pragas e doenças. Essa teo- nica; cultivo de leguminosas como
ambiente, delimitado por fronteiras esco- ria contribuiu fortemente para o movimento cobertura viva em plantios novos
lhidas arbitrariamente, as quais, no espaço da agricultura orgânica no início da década e/ou onde há suficiente penetração
e no tempo, parecem manter um equilíbrio de 80 e foi chamada, por Francis (apud de luz para seu desenvolvimento;
dinâmico, porém estável. Assim, um ecos- GLEISSMAN, 2001), de teoria da trofobiose. uso de cobertura morta, como os re-
sistema tem partes físicas com suas relações Sendo o desequilíbrio nutricional um dos síduos de plantas daninhas ou de
particulares - a estrutura do sistema - que fatores principais no controle de pragas e restos de cultivo; aplicações de ma-
juntas participam de processos dinâmicos doenças, o manejo dos solos é de grande téria orgânica;
- a função do sistema. Os componentes importância para a cafeicultura orgânica,
b) estruturas de conservação: estruturas
estruturais mais básicos dos ecossistemas por ser o solo a base da nutrição vegetal. O
físicas que têm finalidade de mini-
são fatores bióticos, organismos vivos que manejo, a proteção e o melhoramento do
mizar a perda da fertilidade do solo
interagem no ambiente, e fatores abióticos, solo devem-se basear, primeiramente, no
por erosão, tais como: barreiras vi-
componentes químicos e físicos não vivos seu potencial de uso.
vas, barreiras mortas, terraços indivi-
do ambiente, como solo, luz, umidade e Para um manejo adequado do solo é
duais, terraços contínuos, faixas de
temperatura (GLIESSMAN, 2001). necessário considerar suas propriedades
infiltração etc.
físicas (aeração, retenção de água, compac-
Sustentabilidade tação, estruturação), químicas (acidez, A sombra é muito importante para o cul-
No sentido mais amplo, a sustentabi- disponibilidade de nutrientes, interações) tivo do café orgânico. O uso da terra, quan-
lidade é uma versão do conceito de produ- e biológicas (teor de matéria orgânica, res- do envolve manejo intencional de árvores
ção sustentável - a condição de ser capaz piração, biomassa de carbono, biomassa e arbustos, é designado como sistema
de perpetuamente colher biomassa de um do nitrogênio, taxa de colonização e tipo agroflorestal (Fig. 3). Através da introdu-
sistema, porque sua capacidade de renovar de microrganismos). Na prática, essas pro- ção e mistura de árvores ou arbustos nas
ou ser renovado não é comprometida, ou
seja, a sustentabilidade refere-se à habili-
dade de um agroecossistema manter a pro-
dução através do tempo, mediante distúr-
bios ecológicos e pressões econômicas de
longo prazo (GLIESSMAN, 2001, ALTIERI,
1989).

MANEJO DOS SOLOS


O propósito fundamental da produção
orgânica, assim como da cafeicultura orgâ-
nica, é proporcionar alternativas de pro-
dução próximas da sustentabilidade que
Foto: Maria Inês N. Alvarenga

minimizem o impacto ambiental, aprovei-


tando os conhecimentos, experiências e
recursos locais. Isto se baseia principal-
mente na reciclagem de matéria orgânica e
nas técnicas de produção compatíveis com
o meio ambiente, fazendo uso adequado
dos recursos naturais, entre eles: fertilidade Figura 3 - Sistema agroflorestal para cultivo de café orgânico em propriedade de agri-
do solo, o estímulo à biodiversidade vegetal cultura familiar, no município de Poço Fundo-MG

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Café Orgânico 25

áreas de cultivo agrícola ou pecuária po- preparo do solo para as zonas tropicais, pois picos e não conseguem produzir o suficien-
dem-se obter benefícios a partir das inte- ficou evidente que não é o clima quente que te para sobreviver e, sobretudo, pela má dis-
rações ecológicas e econômicas que acon- impede uma produção adequada da terra, tribuição dos alimentos produzidos.
tecem nesse processo e enquadram-se nos mas sim o manejo errado de seus solos. Se- Os fundamentos do modelo agrícola
princípios de manejo integrado. Há muitas gundo Primavesi (1990a), dos 40% do globo químico-mecanizado foram desenvolvi-
variações práticas nos sistemas agroflo- terrestre que constituem a zona tropical, dos para condições de clima temperado,
restais: na agrossilvicultura, combinam-se somente 10% são terra firme, que correspon- onde a diversidade ambiental é sensivel-
árvores com produção agrícola, nos sis- dem a 45 milhões de km2, ou seja, 30% do mente menor que a dos trópicos. Segundo
temas silvipastoris são combinadas com total de terra do planeta. Porém, somente Primavesi (1999a), tal modelo pressupõe o
produção animal e nos agrossilvipastoris 10% da população mundial vive nos tró- controle de limitações ambientais mediante
mesclam-se árvores, culturas agrícolas e
animais. Os sistemas agroflorestais são
utilizados por produtores para suprir suas
necessidades básicas de alimento, madeira,
forragem e conservação dos recursos natu-
rais (solo, água, biodiversidade da fauna e
flora). Através dos sistemas agroflorestais
pretendem-se otimizar os efeitos benéficos
das interações com as árvores, produção
agrícola e animais, obter maior diversida-
de de produtos, diminuir a necessidade de
insumos externos e reduzir os impactos
ambientais negativos da agricultura, além
de favorecer o equilíbrio biológico natural

Foto: Maria Inês N. Alvarenga


que é um dos fins do sistema de produção
ecológico.
Além do aporte de matéria orgânica,
gerada com o manejo das árvores de sombra,
ocorre melhora das características físicas,
químicas e biológicas do solo. Isso ocorre
graças à decomposição e incorporação de Figura 4 - Cultivo de café consorciado com mamona, no município de Poço Fundo-MG
matéria orgânica e penetração das raízes das
árvores e/ou arbustos no solo. Os diferentes
comprimentos de raízes presentes no solo
podem reduzir o potencial de erosão, me-
lhorar a estrutura e infiltração.
Dependendo das condições climáti-
cas da região e objetivos do produtor, me-
diante delineamentos adequados, é possí-
vel trabalhar cultivos em associação com
o cafeeiro, tais como cafeeiro-mamoneira
(Fig. 4), cafeeiro-bananeira (Fig. 5), cafeeiro-
abacateiro. Sugere-se que o nível de som-
bra não ultrapasse 40% (ALVARENGA;
GUIMARÃES, 1998).

Causas da degradação
Foto: Paulo César de Lima

A desequilibrada distribuição da popu-


lação na terra está relacionada com as suas
condições inadequadas de produção de ali-
mentos e, conseqüentemente, de sobre-
vivência. Com o crescente aumento popu-
lacional, buscam-se novos caminhos de Figura 5 - Cultivo de café arborizado com banana, no município de Heliodora-MG

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26 Café Orgânico

aportes externos, quanto mais homogêneo intensa e sua produtividade aumentou. A ou restaurada entendendo-se os ciclos dos
for o ambiente maior será a probabilidade adubação química permitiu o desenvolvi- nutrientes e processos ecológicos do so-
de sucesso na aplicação generalizada dos mento de variedades de alto potencial lo – especialmente a dinâmica da matéria
“pacotes tecnológicos”. Tal fato não é o produtivo e safras compensadoras e rendi- orgânica (GLIESSMAN, 2001).
caso dos ecossistemas tropicais, em que a mentos elevados. Hoje, as zonas tempe- Como alternativa para melhorar a qua-
diversidade, complexidade e fragilidade radas, apesar de sua população densa, são lidade e proteger o solo, maneja-se a matéria
ambiental dificultam muito essa genera- tidas como regiões de superprodução agrí- orgânica através do retorno dos resíduos
lização. Além de apresentarem maior diver- cola por terem encontrado as técnicas que culturais, que podem ser compostados pa-
sidade ambiental, os ecossistemas tropicais permitiram produzir bem em seus solos e ra evitar incidência de pragas e doenças.
diferem de forma significativa dos de clima seu clima (PRIMAVESI, 1990a). Outra forma são as culturas de cobertu-
temperado quanto aos solos, ao regime de Os países tropicais importaram essas ra, ou seja, cultivo de plantas para serem
chuvas, às temperaturas, à radiação solar, técnicas dos países temperados, certifica- incorporadas como adubo verde ao solo
à biodiversidade, entre outros fatores. Não ram-se de que aquecer e enxugar os solos (GLIESSMAN, 2001). Como adubação
são raros os casos em que a aplicação nos tropicais não melhorou a produção nos verde entendem-se cultivos de entressafra
trópicos de propostas tecnológicas desen- trópicos e, sim, favoreceu o surgimento de e entrelinhas que devem proteger o solo,
volvidas sob condições de clima tempera- desertos ou de solos improdutivos, como tanto nos campos, como nos pomares, cafe-
do tem provocado rápida degradação dos ocorreu na Índia, África e Brasil. Ainda zais, seringais e outros. A inclusão de mais
recursos naturais. O exemplo característico assim, culparam-se a má distribuição das uma cultura, que é a adubação verde, que-
é o da aração. Essa prática foi desenvolvi- chuvas, a pobreza dos solos e o calor do bra a monotonia das monoculturas, enri-
da com o propósito de revolver o solo após sol (PRIMAVESI, 1990a). quecendo o solo com materiais orgânicos
os rigorosos invernos típicos do clima A maior ocupação agropecuária das diferentes, contribuindo, assim, para a di-
temperado, a fim de expor suas camadas Regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, na versificação da vida do solo e melhoran-
mais profundas ao sol, proporcionando singularização apresentada por Quirino et do as condições para a cultura principal
rápida melhoria das condições físico- al. (1999), acabará comprometendo o solo (PRIMAVESI, 1990a).
químicas e biológicas. No Brasil, sobretu- e a qualidade do lençol freático, através da Observa-se, na prática, que o plantio
de crotalária, guandu, mamona e, em alguns
do em regiões de menor latitude, as arações lixiviação de produtos tóxicos, se nada for
casos, a mucuna anã como adubo verde
expõem o solo a altas temperaturas, com- feito para mudar a perspectiva. Tal fato
nas entrelinhas dos cafezais, enriquece o
prometendo suas qualidades biológicas e ocasiona a deterioração dos recursos em
solo com matéria orgânica, beneficia a mi-
físico-químicas. As chuvas torrenciais, razão do “inchaço” promovido pelo de-
crovida do solo, melhorando as condições
típicas dos trópicos, sobretudo no período senvolvimento econômico sem medidas.
de cultivo para os cafeeiros.
de preparo dos solos, ao se precipitarem Um dos exemplos citados é a produção de
na terra desnuda provocam sérios pro- soja e trigo no Rio Grande do Sul, que está
ASPECTOS EDAFOAMBIENTAIS
cessos erosivos (ALMEIDA et al., 2001). degradando o solo em razão de seus des-
DA CAFEICULTURA ORGÂNICA
Enquanto em clima temperado o solo matamentos. Como conseqüência, será
necessita ser exposto ao sol, em clima tro- necessário gastar grandes quantias na Independente se o sistema de explora-
pical, ele deve ser protegido dele, para evi- recuperação das condições naturais. ção da cafeicultura é orgânico ou conven-
tar um aquecimento exagerado. Assim, os cional, a observação dos aspectos edafo-
países de clima tropical desenvolveram o Melhoria da qualidade e ambientais é imprescindível ao sucesso da
preparo e o cultivo de seus solos, pois proteção do solo lavoura.
tinham recebido plantas e métodos de Muitos produtores acham que obter No que diz respeito aos aspectos ambien-
cultivo de zonas subtropicais, local aonde um alto rendimento da terra evidencia um tais, alguns cuidados devem ser conside-
o clima é mais ameno e o solo mais fértil. solo produtivo. Porém, se a perspectiva rados: insolação, altitude, ocorrência de
Dessa forma, os solos de zonas subtropi- for agroecológica e a meta for manter e geadas, precipitação e distribuição de chu-
cais, conseguem secar mais rápido da umi- promover todos os processos de formação vas, variedade adaptada etc.
dade do degelo e aquecer-se mais rapida- e proteção do solo relacionados com a ma- Quanto aos aspectos edáficos, é impor-
mente, favorecendo o plantio na época da téria orgânica, então um solo produtivo não tante considerar: granulometria, estrutura,
primavera. Foram desenvolvidas máquinas será, necessariamente, um solo fértil. Os densidade, teor de matéria orgânica, dre-
para executar essa função, e conseguiram processos no solo que nos habilitam a ter nagem, impedimentos à mecanização, pro-
aproveitar melhor o húmus que se decom- produção assumem maior importância na fundidade do solo etc.
punha mais rápido, devido ao arejamento e agricultura sustentável. Fertilizantes podem Para o desenvolvimento da lavoura ca-
à captação de calor. O solo foi mobilizado ser adicionados para elevá-la, mas a ferti- feeira, considera-se que a profundidade
de sua inércia fria, sua vida tornou-se mais lidade do solo somente pode ser mantida do solum (horizontes A+B) é de grande
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Café Orgânico 27

importância. Constitui-se na profundidade estimulando os cafeicultores a deslocarem- derada exemplar sob muitos aspectos, sua
do solo que vai ser explorada pelo sistema se para o interior do Estado em busca de aplicação está longe do adequado. Para
radicular, o que se traduz em volume de outras terras virgens. Por volta de 1854, a esses mesmos autores, é fundamental o
solo com água e/ou nutrientes que as raízes região dominada pela cultura já estava mais reconhecimento do valor dos ecossiste-
do cafeeiro terão disponíveis. Aliado à a Oeste. E, assim caminhando os cafeicul- mas da propriedade, de forma que explorem
profundidade, é importante que o sistema tores, acompanhados principalmente pe- áreas mais nobres para rotação de culturas,
radicular tenha condição de explorá-lo. Isto los plantadores de algodão e de cana-de- aquelas menos nobres para culturas pe-
significa que, se houver algum impedimento açúcar, foram derrubando as matas e insta- renes, as de valor histórico local com ativi-
físico ou químico, as raízes não conseguem lando suas culturas, seguidos pelas estra- dades de turismo rural e de valor natural
explorar satisfatoriamente o solo. Alguns das de ferro que permitiam o transporte de com ecoturismo. Reconhecer o valor da
impedimentos podem ser removidos atra- suas colheitas. Esse afã de derrubar e plan- fauna e da flora. Assim, a questão deve ser
vés do manejo, por exemplo, promover a tar chegou a criar a idéia de que o cafeeiro tratada de forma global, isto é, abrangendo
subsolagem quando o solo estiver compac- só produzia bem “sentindo o bafo da mata”. todas as áreas, deixando claro o conceito de
tado, calagem/gessagem no caso do exces- Depois de passar para os Estados vizinhos, áreas de preservação e recuperação/conser-
so de acidez, incorporação de leguminosas, sendo um dos principais fatores responsá- vação. Existem conflitos em relação ao
quando o teor de matéria orgânica estiver veis pelo desbravamento em Minas Gerais, significado da necessidade de preservar e
muito baixo etc. Norte do Paraná, Mato Grosso, Goiás e recuperar o ambiente.
Com ênfase no manejo ecológico, algu- Espírito Santo, transpôs as fronteiras, indo Nessa linha de raciocínio, haverá maior
mas medidas de condução da lavoura po- nossos agricultores instalarem-se no Para- equilíbrio na distribuição de capital, pois
dem ser adotadas, tais como de rochas na- guai. Qual a razão dessa corrida dos cafei- de acordo com estudos de Quirino et al.
turais moídas como calcário e o fosfato cultores em busca de terras novas? Por que (1999), as pesquisas prioritárias estarão
natural para melhorar a fertilidade. Plantio não foi possível permanecerem em suas condicionadas à melhoria da qualidade de
e incorporação de leguminosas, que aumen- propriedades, onde tantas instalações one- vida em todos os níveis, conservação e uso
tam o teor de matéria orgânica, melhorando rosas como casas de colonos, terreiros, sustentado dos recursos naturais, produ-
a estrutura do solo e também contribuindo tulhas, estradas vicinais foram construí- ção econômica com eficiência energética e
para o aumento de cargas dependentes de das? Por que suas terras tornaram-se can- uso crescente de tecnologias biológicas ao
pH. Cabe ressaltar que, como os solos cul- sadas e menos produtivas? A resposta está invés de químicas. No aspecto político, são
tivados com o cafeeiro são na maioria oxídi- no depauperamento das terras, causado esperados ainda o estabelecimento de polí-
cos e/ou cauliníticos, o aumento de cargas pelas culturas e pela erosão do horizonte ticas agrícolas e a mobilização de recursos
provenientes da incorporação de matéria superficial do solo, mais rico em nutrientes financeiros, que possam colocar em práti-
orgânica pode resultar em aumento nos e matéria orgânica. O roteiro da cafeicultura ca os métodos estudados cientificamen-
pontos de carga para retenção/troca de foi uma corrida dos agricultores em busca te, principalmente por meio de legislações
íons com o sistema radicular do cafeeiro. do húmus do solo. específicas coerentes que possam, de for-
A ausência de pontos de carga faz com Mesmo com a evolução do conheci- ma efetiva, ser colocadas em prática e, sobre-
que os nutrientes adicionados ao solo, pela mento, notadamente, os princípios de apti- tudo, respeitadas. Segundo Vivan (1998),
mineralização da matéria orgânica, sejam dão agrícola e capacidade de uso do solo, comparando áreas manejadas com áreas em
lixiviados a grandes profundidades, não não houve um redirecionamento das ativi- estado natural, devem-se analisar a veloci-
estando disponíveis ao cafeeiro. dades que utilizam os recursos naturais, dade de recuperação da biomassa e a com-
principalmente solo e água, em conseqüên- posição das espécies (fauna e flora). No
cia de falta de uma política agrícola ade- caso, uma regressão na sucessão de espé-
MANEJO DA LAVOURA VERSUS
quada. cies e uma queda de biodiversidade podem
AMBIENTE
O uso inapropriado do solo pode ser indicar erros de manejo e perdas energé-
Kiehl (1985) relata o roteiro da cafei- considerado como responsável por pre- ticas do sistema. Deve-se ter consciência
cultura no estado de São Paulo, com base visões restritivas ao uso de águas super- das alterações que ocorrem na estrutura e
em estudos do historiador Sérgio Miliett. ficiais e subterrâneas de algumas regiões funcionamento do ecossistema após uma
Segundo o autor, os agricultores paulistas brasileiras. Segundo Quirino et al. (1999), perturbação, como pode ser observado no
buscavam terras virgens, ricas em matéria essas restrições dizem respeito a conflitos Quadro 1.
orgânica para nelas cultivarem o cafeeiro. gerados por ocupação de áreas, ou, ainda, Criar condições usando o próprio fluxo
A cultura cafeeira, vinda do estado do Rio pela falta de fiscalização do uso. São fato- energético da natureza, constitui o refina-
de Janeiro, entrou no estado de São Paulo res tanto de ordem econômica e ecológica, mento tecnológico que separa a agricultura
pelo Vale do Paraíba. Em 1836, essa região quanto política e social, pois dizem respei- que nos levará para o futuro daquela que
estava tomada pela cultura e dominava a to à aplicação inadequada de legislações nos trouxe até aqui. Segundo Vivan (1998),
produção cafeeira no Estado mas, em pou- relativas ao aproveitamento dos recursos o clímax é o resultante do processo de evo-
cos anos, a terra já se mostrava cansada, naturais. Embora possua legislação, consi- lução conjunta da fauna, flora e ambiente.
Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, 214/215, p.21-31, jan./abr. 2002
28 Café Orgânico

QUADRO 1 - Mudanças que ocorrem na estrutura e funcionamento do ecossistema no decorrer da sucessão secundária, após uma perturbação intensa
(1)
Mudanças durante o processo de sucessão
Característica do ecossistema
Estádios iniciais Estádios intermediários Maturidade
Composição das espécies Rápida substituição das espécies Substituição mais lenta das espécies Pequena mudança

Diversidade das espécies Baixa, com rápido aumento Média, com rápido aumento Alta, com possibilidade de leve declínio

Biomassa total Baixa, com rápido aumento Média, com aumento moderado Alta, com lenta taxa de aumento

Massa de matéria orgânica não viva Baixa, com rápido aumento Média com aumento moderado Alta, com lenta taxa de aumento

Produtividade primária bruta Aumenta rapidamente Diminui levemente Diminui levemente

Produtividade primária líquida Aumenta rapidamente Diminui levemente Diminui levemente

Respiração do sistema Aumenta Aumenta Aumenta lentamente

Cadeias / teias alimentares Tornam-se cada vez mais complexas Tornam-se cada vez mais complexas Permanecem complexas

Interações entre espécies Tornam-se cada vez mais complexas Tornam-se cada vez mais complexas Permanecem complexas

Eficiência do uso geral de nutrientes Aumenta Aumenta Permanece eficiente


e energia

Ciclagem de nutrientes Fluxo através do sistema, Tende a Ciclagem interna; ciclos fechados
ciclos abertos

Retenção de nutrientes Baixa retenção, tempo curto Tende a Alta retenção, tempo longo para
para reposição reposição
(2) (3)
Forma de crescimento Espécies de estratégia r de Tende a Espécies de estratégia k, de
crescimento rápido vida longa

Amplitude do nicho Generalistas Tende a Especialistas

Ciclos de vida Anuais Tende a Perenes

Interferência Principalmente coletiva Tende a Mais mutualística


FONTE: Dados básicos: Odum (1993 apud GLIESSMAN, 2001).
NOTA: (1) Embora algumas mudanças sejam apresentadas na forma de degraus, todas ocorrem como transições graduais. (2) Mortalid ade determinada por
fatores ambientais limitantes. Tamanho da população determinado mais por fatores físicos que bióticos. (3) Vivem em ambientes estáveis ou
previsíveis, onde a seleção natural favorece genótipos com capacidade de evitar ou tolerar interferência. Tamanho da população limitado mais por
fatores bióticos do que por fatores físicos.

A vida modifica o ambiente físico e é por Proteção e manejo das forma inadequada, é conseqüência da falta
ele modificada. O dinamismo desse proces- águas de uma política que direcione a atividade
so dá-se pelos ciclos de vida e morte dos A fartura de água disponível, em con- agrícola de forma adequada às aptidões
componentes do ecossistema. A sucessão dições brasileiras, leva ao desperdício que naturais e não a interesses econômicos pro-
de espécies é o veículo de reorganização trará, como conseqüência, a sua carência. tecionistas, sem uma preocupação com o
da complexidade rumo ao clímax. Assim, o Cabe ressaltar que a crise energética na qual esgotamento dos recursos naturais e, con-
que conhecemos como clímax de um ecos- se encontra o país, é conseqüência da falta seqüentemente, com a degradação ambien-
sistema é o resultado da otimização de fa- de água. Isto não é somente porque faltou tal cada vez mais evidente.
tores da radiação, nutrientes e umidade chuva nos últimos três anos, mas também De acordo com Primavesi (1997), calcula-
pelas formas vivas. A faixa de clímax dinâ- a conseqüência de um consumo descon- se que o gasto de água em ambientes do-
mico é o espaço onde se dá essa reorgani- trolado desse recurso, principalmente, na mésticos não ultrapassa de 6% a 8% do
zação com o mínimo de perdas energéticas atividade agrícola, que, através de formas consumo total. As fábricas, que utilizam a
e, portanto, com a maior possibilidade de de irrigação inadequadas, favorece uma maior água para refrigeração e veiculação de seus
sustentar as formas vivas em quantidade e evaporação da água. Diga-se também que, dejetos, gastam 21% do total da água con-
diversidade. se o uso da irrigação vem sendo feito de sumida. A grande vilã é a agricultura, com
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Café Orgânico 29

seus confinamentos monstruosos de bois, lisar os níveis atuais e anteriores das cister- clima e tamanho da população que
porcos, frangos e a irrigação. Gasta de 71% nas que propiciam o abastecimento domés- traz consigo poluição e maior deman-
a 72% da água, esgotando rios, poços arte- tico de água. da. As regiões com maior ocupação
sianos e níveis dos lençóis freáticos. Um Segundo Almeida et al. (2001), inúmeras agrícola, Sul, Sudeste e Centro-Oeste,
pivô central desperdiça enormes quanti- experiências de manejo e gestão racional tenderão a comprometer a qualida-
dades de água, uma vez que boa parte do de recursos hídricos, visando à economia de do lençol freático, via lixiviação de
líquido evapora-se ainda no ar, nunca alcan- de uso e sua conservação nos agroecos- produtos tóxicos, sendo a restrição
çando o solo. sistemas, estão em curso. Para o alcance qualitativa e não quantitativa;
O Brasil detém a maior reserva de água da sustentabilidade dos agroecossistemas b) no Nordeste, a maior restrição está
potável do planeta e, segundo Quirino et al. uma série de demandas de água dos vários no clima seco e árido. Os recursos
(1999), no seu território ocorrem reservas subsistemas deve ser satisfeita. Por esse hídricos mais pobres estão na Região
aparentemente inesgotáveis de água super- motivo, as experiências agroecológicas de Nordeste. Nas outras regiões, se o
ficial, tais como a do pantanal e as dos rios manejo dos recursos hídricos caracterizam- manejo for consciente, não haverá
da Bacia do Prata, que lhes são associados se pela abordagem mais integradora e sistê- uma restrição muito forte;
a imensidade da Bacia Amazônica, além de mica da problemática. Os consumos hu-
c) nos locais onde a agropecuária é in-
insuficientemente conhecidas reservas sub- mano (beber, cozinhar, higiene), animal,
tensa, as águas superficiais sofrerão,
terrâneas como, por exemplo, o Aqüífero agroindustrial e agrícola devem ser aten-
conseqüentemente, uma conside-
Guarani, que se estende desde o estado de didos, cada qual com exigências próprias
rável diminuição. Vê-se, portanto, a
São Paulo, até o norte da Argentina e Para- de quantidade e qualidade, sazonalidade e
íntima relação entre demanda e po-
guai. Poderia ser uma garantia, porém não é distância das fontes de oferta.
luição, causadas, sobretudo, pela
inalterável, são passíveis de contaminação. A crescente escassez de água trará mui-
atuação desenfreada e despreocu-
A contaminação dos recursos hídricos está tas implicações sociais. Conforme obser-
pada dos agentes econômicos, tanto
ligada a um maior desenvolvimento da vações de Quirino et al. (1999), o monito-
sociedade industrial e/ou a fatores climáti- ramento e a regulamentação do uso dos consumidores como produtores, que
cos adversos. Nesse caso, os custos para recursos hídricos são fatores considerados se transformam em agentes do esgo-
despoluição das águas deverão aumentar e importantes para o não esgotamento das tamento dos recursos naturais;
com isto a restrição às atividades econômi- águas superficiais e subterrâneas. O inte- d) os recursos hídricos apresentam sua
cas (QUIRINO et al., 1999). resse e o conflito pela água irão aumentar; disponibilidade não somente rela-
Silva (1999) relata em seu trabalho a água com qualidade será mais restrita e os cionada com a agricultura. O pano-
escassez hídrica no Médio Vale do Riachão usos múltiplos da água não estão regula- rama previsto para um prazo de dez
(Norte de Minas Gerais), observada pela mentados. A disputa pelo uso da água na anos é pequeno para mudanças estru-
diminuição da vazão e seca dos córregos Região Sudeste (usos múltiplos), bem co- turais em diversos setores. Desse
da área do estudo, assim como de todo o mo a poluição, escassez em algumas re- modo, regiões com estresse hídrico,
Vale e certamente de todo o Norte de Minas. giões (Nordeste) e a crescente e genera- alta densidade de população ou alta
Não há significativas mudanças no regi- lizada demanda das atividades industriais, atividade econômica apresentam
me de precipitação da região. O que mudou devem provocar maior regulamentação das potencial restritivo semelhante. O mo-
foi o tipo e a intensidade do uso da terra. atividades. O processo de regulamentação nitoramento desses recursos deve ser
Aonde o modelo de desenvolvimento re- quanto à múltipla utilização dos recursos feito em parceria com outros setores.
gional tem, talvez, seu efeito mais desas- hídricos depende da atitude política dos No caso da agricultura, deve ser dada
troso. Pivôs centrais, perímetros irrigados, agentes produtores de cada região. Falta ênfase à lixiviação de agroquímicos e
maciços de eucalipto, desmatamento indis- fiscalização e não há conscientização. concentrados orgânicos;
criminado para produção de carvão, certa- No entanto, ainda segundo Quirino e) as águas superficiais e subterrâneas
mente foram fatores preponderantes no et al. (1999), cabem outras considerações têm sido também prejudicadas pe-
rompimento de equilíbrio hídrico regional. quanto à degradação dos recursos hídricos lo desenvolvimento agropecuário
A impressão da diminuição da chuva, re- provenientes do modelo atual de desen- e ainda por condições climáticas e
lativa aos dados que mostram uma certa volvimento econômico: despreparo dos agricultores, quanto
uniformidade, tanto dos montantes anuais, a) quanto à densidade da população, à utilização de técnicas dentro das
como de sua distribuição, certamente está diante do desenvolvimento indus- regiões brasileiras;
ligada à sensação de um ambiente seco con- trial e da agropecuária, a água será f) em algumas áreas pesquisadas nas
formado por uma menor cobertura vegetal, um bem cada vez mais escasso, prin- Regiões Sudeste e Centro-Oeste,
solos mais expostos e por córregos secos cipalmente onde é naturalmente rara onde ocorreu a agricultura irriga-
ou de vazão diminuta. O abaixamento do e a população intensa. A restrição é da de modo maciço, observa-se o
nível do lençol freático é nítido, basta ana- função de duas causas principais: secamento dos reservatórios em pe-
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30 Café Orgânico

ríodos críticos. Na Região Centro- cipal. O produto final é uma floresta pro- Portanto, há menos perigo de doenças fún-
Oeste, práticas de agricultura em dutiva e diversificada, compatível com as gicas.
cabeceiras de nascentes fazem secar qualidades do ecossistema local. Para a proteção da fauna do solo, devem-
os córregos; No caso específico da cafeicultura, a se evitar: umidade excessiva ou seca; tempe-
g) problemas com as águas superficiais adoção de sistemas agroflorestais apre- raturas do solo elevadas ou muito baixas,
aos poucos levam a problemas com senta-se como uma boa opção, tanto sob luz solar direta, distúrbios freqüentes como
as águas subterrâneas. os aspectos ambientais (diversidade bio- aração, capinas etc., queimadas, adubação
lógica, controlador de temperatura etc.), com sulfato de amônio. Este último tem seu
Considerando esses aspectos, as ativi-
como sob os aspectos econômicos (renda uso proibido na agricultura orgânica, porém
dades agrícolas que buscam uma sustenta-
adicional, fornecedor de biomassa, redução as demais recomendações são pertinentes
bilidade, no caso da cafeicultura orgânica,
de aplicação de adubos solúveis etc.). ao cultivo do cafeeiro orgânico e são mais
estarão mais propensas ao sucesso. Cabe,
eficientes em caso de sistemas diversifi-
porém, ressaltar que a atividade parece mais
Proteção e manejo da fauna cados, como no caso de cafeeiro em sis-
adaptável a condições de propriedades me-
A fauna é um importante componente temas agroflorestais.
nores e/ou de agricultura familiar.
do ecossistema, já que a energia acumu-
Proteção e manejo da flora lada pelas plantas (produtores primários), SUBPRODUTOS DA LAVOURA
transfere-se no ambiente pela atividade da Como subprodutos da cultura do ca-
Os sistemas de produção predominan-
fauna, além dos demais aspectos relativos feeiro, têm-se polpa, cascas e mucilagens,
tes, notadamente nas áreas de expansão
às questões de manejo integrado de uma além dos restos vegetais resultantes da po-
da fronteira agrícola, não se têm preocupa-
cultura, como: produção de esterco, inimi- da dos cafeeiros, da água utilizada no pro-
do com a proteção dos recursos naturais
go natural de pragas, tração animal, produ- cesso de preparo e embalagens de bioinsu-
existentes, principalmente com a flora que,
ção de biomassa, polinização, controle de mos agrícolas (aqueles permitidos pelas
devido à sua grande diversidade, pode ser
população através da competição, entre respectivas certificadoras).
considerada ainda desconhecida sob o
outros.
ponto de vista de potencial de utilização.
As galerias construídas pelos animais Destino e manejo ambiental
De acordo com Almeida et al. (2001), inde-
do solo, como larvas de insetos, insetos, Na verdade, os grãos do café serão co-
pendente das diferenças de escala e de
minhocas, besouros e outros servem à pe- mercializados, as cascas retornam (ou de-
enfoque existentes nas experiências em
netração das raízes, à infiltração da água e veriam retornar) para os cafezais como
curso, todas indicam que a elevação da bio-
à circulação do ar. De acordo com Primavesi adubo orgânico. Os restos vegetais das
diversidade agrícola é essencial para a
sustentabilidade dos agroecossistemas. (1990a), existe uma relação específica entre podas dos cafeeiros podem ser utilizados,
Indicam ainda que a conservação e utili- os animais de um certo solo e suas condi- se bem triturados, como cobertura morta
zação dos recursos genéticos envolvem ções pedológicas, de forma que à medida ou na fabricação de composto orgânico,
ações que vão desde o nível dos sistemas que o solo piora em suas condições físicas retornando biomassa ao sistema. As emba-
produtivos (as que abordam a variabilidade e químicas, diminui a relação entre ácaros e lagens dos bioinsumos agrícolas podem ser
interespecífica), até o nível das espécies colêmbolos. Como a mesofauna diversi- encaminhadas para reutilização (recarga
vegetais e animais em uso (as que abordam ficada depende de matéria orgânica no solo do mesmo produto) ou para reciclagem. A
a variabilidade intra-específica). e seu arejamento adequado, a decadência água utilizada no processo de preparo do
Almeida et al. (2001) citam ainda que, física contribui para o desaparecimento da café deve ser tratada antes de retornar à
na diversificação dos sistemas produtivos, maioria dos animais do solo, sobrando so- sua origem. As ações do homem sobre o
uma das propostas é a dos sistemas agro- mente algumas espécies que suportam as ambiente refletem-se freqüentemente nos
florestais, sendo o cultivo em aléias uma condições adversas. E estes têm a sua proli- sistemas aquáticos. O homem tem uma
das modalidades destes sistemas. Seu obje- feração garantida por falta de inimigos. Em relação estreita com a água por depender
tivo primordial é fornecer biomassa, por solos ricamente povoados pela mesofauna, dela para todas as suas atividades, inclu-
meio de podas constantes das árvores ou o húmus produzido sempre é de boa quali- sive para a disposição de seus resíduos
arbustos, visando incrementar os teores de dade, melhorando a capacidade de troca de (MESQUITA et al., 2000).
matéria orgânica e a integração de práticas cátions (CTC) do solo. Nunca se forma A poluição dos mananciais (rios, lagos,
de manejo e conservação do solo. Outra húmus ácido em solos com atividade animal águas subterrâneas) pode ser causada por
modalidade é o sistema agroflorestal aná- diversificada. Os animais digerem a matéria efluentes líquidos e resíduos sólidos que
logo e regenerativo, que se baseia no prin- orgânica, de modo que esta possa ser ataca- têm a sua origem em atividades agrícolas,
cípio da sucessão vegetal. Se no caso do da diretamente por bactérias. Onde existe na produção animal e, principalmente, nas
cultivo em aléias as espécies florestais cum- uma meso e macrofauna ativa, há menos fun- atividades agroindustriais. A natureza di-
prem apenas um papel coadjuvante, nesta gos no solo, por executarem a sua tarefa de versificada desses resíduos pode envolver
outra modalidade elas são o objetivo prin- romper a estrutura de lignina e de celulose. a presença de substâncias orgânicas (pro-
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Café Orgânico 31

teínas, carboidratos, moléculas orgânicas águas secundárias (PAULA JUNIOR, 1995). ALVARENGA, M.I.N.; GUIMARÃES, P.T.G.
sintética etc.), substâncias inorgânicas (nu- Além dos aspectos específicos rela- Arborização como componente da sustenta-
trientes, metais pesados etc.) e, eventual- cionados com o cultivo do cafeeiro, numa bilidade da lavoura cafeeira. Lavras: EPAMIG-
CTSM, 1998. 4p. (EPAMIG-CTSM. Circular
mente, até microrganismos patogênicos. As propriedade onde se pretende o manejo
Técnica, 80).
características dos resíduos podem ser ava- integrado, todos os demais resíduos devem
liadas através dos seguintes parâmetros: ser tratados de maneira semelhante para KIEHL, E.J. Fertilizantes orgânicos. São Paulo:
demanda bioquímica de oxigênio (DBO); reaproveitamento no processo produtivo. Agronômica Ceres, 1985. 492p.
demanda química de oxigênio (DQO); car- Os resíduos orgânicos devem ser reapro-
GLIESSMAN, S.R. Agroecologia: processos
bono orgânico total (COT), sólidos (totais, veitados na forma de composto, cobertura ecológicos em agricultura sustentável. 2. ed. Porto
suspensos e dissolvidos), pH, alcalinida- morta, substratos etc.; as embalagens dire- Alegre: UFRGS, 2001. 653p.
de, temperatura, cor, odor, turbidez e con- cionadas para locais adequados; efluentes
centrações de elementos químicos diversos líquidos convenientemente tratados. No LAL, R. Métodos para avaliação do uso sus-
tentável dos recursos solo e água nos tró-
(PAULA JUNIOR, 1995). caso de resíduos orgânicos contaminados,
picos. Jaguariúna: Embrapa Meio Ambiente,
Algumas tecnologias de controle para a promover sua incineração ou conduzi-los 1999. 97p. (Embrapa Meio Ambiente. Documen-
minimização dos impactos provocados pelos para aterro sanitário, previamente licen- tos, 3).
resíduos podem ser relacionadas, para as ciado por órgão ambiental competente.
águas residuárias agroindustriais: tratamen- LÓPEZ DE LEÓN, E.E.; MENDOZA DIÁZ, A.
Manual de caficultura orgánica. Guatemala,
to primário (separação física), tratamento CONSIDERAÇÕES FINAIS
Guatemala: Asociación Nacional del Café, 1999.
secundário (processos biológicos) e tra-
A cafeicultura orgânica é uma ativida- 159p.
tamento terciário (remoção de nutrientes,
de que vem-se desenvolvendo na medida
metais pesados, patógenos); para os resíduos MESQUITA, H.A.; PAULA, M.B. de; ALVA-
das necessidades de mercado. O aumento RENGA, M.I.N. Indicadores de impactos das
sólidos agroindustriais: aterros e deposição
no solo e, de forma geral, para o reaprovei- do consumo de produtos orgânicos vem atividades agropecuárias. Informe Agropecuá-
tamento de resíduos: recuperação de sub- acompanhado de uma maior conscientiza- rio, Belo Horizonte, v. 21, n.202, p.57-62,
ção da necessidade de diminuir a agressão 70-71, jan./fev. 2000.
produtos (reaproveitamento no processo
industrial), compostagem, fertilizantes, con- ao ambiente e, nesse contexto, insere-se o PAULA JUNIOR, D.R. de. Impacto ambiental da
dicionadores de solo, utilização de biogás, e homem, que, indiretamente, está sofrendo agroindústria: tecnologias para controle de resí-
aplicação de resíduos em solos agrícolas as agressões de um desenvolvimento de- duos. In: TAUK-TORNISIELO, S.M.; GOBBI, N.;
(PAULA JUNIOR, 1995). sequilibrado. Por outro lado, pelas caracte- FORESTI, C.; LIMA, S.T. Análise ambiental:
rísticas do processo produtivo, dentro dos estratégias e ações. 1995. cap. 6, p. 248-252.
Utilizam-se, para o tratamento de águas
residuárias, processos biológicos aeróbicos princípios de agricultura orgânica, conside- PRIMAVESI, A. A agricultura em regiões tro-
convencionais (lodos ativados, tanque de rando o crescimento da população mundial, picais: manejo ecológico do solo. São Paulo:
aeração, vala de oxidação e filtro biológico a tecnologia disponível para o desenvol- Nobel, 1990a. 549p.
aeróbio), e os processos anaeróbios não- vimento do sistema e o preço desses pro-
________. Agroecologia: ecosfera, tecnosfera
convencionais (filtro anaeróbio, reator de dutos, que são proibitivos para a popula-
e agricultura. São Paulo: Nobel, 1997. 199 p.
manta de lodo UASB e reator de leito fluidi- ção de baixa renda, dificultam atender à
ficado). São também usualmente empre- demanda da produção de alimentos. Assim, ________. Manejo ecológico de pragas e doen-
gados, para otimizar os sistemas, unidades acredita-se que haja necessidade de pro- ças: técnicas alternativas para a produção agro-
duzir alimentos tanto no sistema orgâni- pecuária e defesa do meio ambiente. São Paulo:
de pré-tratamento (peneiras, grades, de-
Nobel, 1990b. 137p.
sarenadores, decantadores e flotadores) e, co, como no convencional, pelo menos até
eventualmente, unidades de pós-tratamen- o momento em que a pesquisa proporcionar QUIRINO, T.R.; IRIAS, L.J.M.; WRIGHT, J.T.C.
to (lagoas de maturação, unidades de desin- soluções que permitam atingir a demanda Impacto agroambiental: perspectivas, proble-
fecção etc.). O lodo gerado, principalmente mundial. mas e prioridades. São Paulo: Edgard Blücher,
com o uso de processos aeróbios, demanda 1999. 184p.
também dispositivos específicos para a sua REFERÊNCIAS
SILVA, C.E.M. Cerrados e camponeses no
manipulação, tratamento e disposição ade- ALMEIDA, J.G.; PETERSEN, P.; CORDEIRO, norte de Minas: um estudo sobre a sustenta-
quados (digestor anaeróbio, centrifugador, A. Crise socioambiental e conversão ecoló- bilidade dos ecossistemas e das populações serta-
filtro prensa, incinerador, leitos de secagem). gica da agricultura brasileira: subsídios à for- nejas. Belo Horizonte, 1999. 251p. Dissertação
Em situações onde o custo e disponibilida- mulação de diretrizes ambientais para o desenvol- (Mestrado em Geografia e Organização Humana
de de grandes áreas não é fator limitante, as vimento agrícola. Rio de Janeiro: AS-PTA, 2001. do Espaço) - Universidade Federal de Minas Gerais,
122p. Belo Horizonte, 1999.
lagoas de estabilização (fotossintética, anae-
róbia, facultativa ou sistemas combinados) ALTIERI, M.A. Agroecologia: as bases cientí- VIVAN, J.L. Agricultura & florestas: princípios
constituem-se em solução econômica, po- ficas da agricultura alternativa. Rio de Janeiro: de uma interação vital. Rio de Janeiro: AS-PTA/
dendo promover um tratamento completo de AS-PTA / FASE, 1989. 240p. Guaíba: Agropecuária, 1998.

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, 214/215, p.21-31, jan./abr. 2002


Café Orgânico 33

Estabelecimento de Resumo - Experiências em cafeicultura orgânica são incipientes. Para


se trabalhar com esse sistema é necessário que os técnicos tenham
conhecimento das normas para a produção orgânica e façam um

cafezal orgânico esforço adicional para compatibilizar a filosofia do orgânico com o


conhecimento acadêmico, fundamentado em sistemas convencionais
de produção. Para os cafeicultores, esse sistema de produção é mais
compatível e viável aos agricultores familiares, devido à sua tradição
na prática de multiuso da terra. Baseia-se no conceito de que o termo
orgânico é utilizado para denominar sistemas agropecuários
Paulo César de Lima1
conduzidos, respeitando os limites da natureza e o potencial produtivo
Waldênia de Melo Moura2
da propriedade agrícola. Assim, procurou-se estabelecer um
Marta dos Santos Freire Ricci de Azevedo3
Anôr Fiorini de Carvalho4 embasamento teórico de integração entre produção vegetal, produção
animal, recursos naturais e o homem. A princípio, são estabelecidos
conceitos básicos para o desenvolvimento de sistemas orgânicos. Em
seguida, é apresentada uma análise do meio físico que permite a
estratificação de ambientes em propriedades agrícolas. Finalmente
são abordados pontos importantes para o planejamento e a condução
do sistema, tais como ciclagem, aquisição, produção e transporte de
nutrientes. A partir disso, são apresentadas medidas para compati-
bilizar sistemas produtivos e ambientes, considerando escolha de
áreas, cultivares e formação de mudas, e a metodologia de sistemas
orgânicos de produção de café que foram implantados em Unidades
Experimentais da EPAMIG. Trata-se, entretanto, de uma primeira
tentativa de recomendação para o estabelecimento de cafezais em
sistemas orgânicos de produção, sem, portanto, pretender esgotar o
assunto.

Palavras-chave: Cafeicultura orgânica; Esterco; Leguminosa; Implan-


tação de cultura; Sistema de produção.

1
Engo Agro, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTZM, Vila Gianetti, 46, Caixa Postal 216, CEP 36571-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: plima@ufv.br
2
Enga Agra, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTZM, Vila Gianetti, 46, Caixa Postal 216, CEP 36571-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: waldenia@ufv.br
3
Enga Agra, D.Sc., Pesq. Embrapa Agrobiologia, Caixa Postal 74505, CEP 23851-970 Seropédica-RJ. Correio eletrônico: marta@cnpab.embrapa.br
4
Engo Agro, M.Sc., Prof. UFV-Depto Solos, CEP 36571-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: cta@solos.ufv.br

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002


34 Café Orgânico

INTRODUÇÃO ração e preservação dos recursos naturais, CONCEITOS IMPORTANTES


atenderia uma demanda por cafés especiais PARA A IMPLANTAÇÃO DE
Nos últimos anos, têm sido verificadas
e aumentaria seus lucros pela agregação CAFEZAIS ORGÂNICOS
mudanças tanto na produção quanto na
de valor ao produto.
comercialização de café em todo o mundo, A primeira reação de muitos profissio-
Tendo em vista o mercado emergente e
com reflexos significativos na produção nais de ensino, pesquisa e extensão, ao se
as normas para a produção orgânica, os
brasileira. O mercado tem-se tornado mais depararem com o termo café orgânico, é
cafeicultores que têm afinidade com este
exigente em termos de qualidade do pro- de perplexidade - café orgânico?! Por que
sistema de produção, principalmente aque-
duto, com preferência por tipos especiais café orgânico? Será que o café que eu co-
les que não querem fazer uso de agrotóxicos,
de café. Os problemas ambientais causados nheço e bebo diariamente é inorgânico?
sentem-se estimulados a aderir à cafeicultura
pela agricultura também são cada vez mais Assim, torna-se importante estabelecer, ini-
orgânica. A procura por técnicos e pesqui-
evidenciados. O fato de apenas produzir e cialmente, alguns conceitos que poderão
sadores para saber como produzir e comer-
ter lucro, sem observar os efeitos dos insu- direcionar o raciocínio para a implantação
cializar o café orgânico é crescente (LIMA,
mos modernos utilizados na cafeicultu- de sistemas orgânicos.
2000). Existem poucas informações técnicas
ra sobre o ambiente, tem sido fortemente O termo orgânico é utilizado para deno-
sobre o assunto e a escassez de resultados
questionado sob o aspecto de sustenta- minar sistemas agropecuários conduzidos
de pesquisa tem sido uma grande respon-
bilidade. São imprescindíveis as práticas de modo semelhante à vida de um organis-
sável por isso.
de conservação do solo, manejo ecológico mo, respeitando os limites naturais e o po-
No entanto, deve-se partir de alguns
de pragas, de doenças e de plantas invaso- tencial produtivo da propriedade agrícola.
pressupostos:
ras e a destinação correta dos efluentes, Nesses sistemas (organismos agrícolas), a
resultado do despolpamento do café. Hoje, a) já existem normas que balizam a pro- produção vegetal e animal, os recursos na-
mais do que nunca, torna-se necessária a dução orgânica, como a Instrução turais e o homem não se desenvolvem iso-
recuperação e a preservação da biodiver- Normativa no 7 de 17/05/99 do Mi- ladamente, mas de forma integrada (Fig. 1)
sidade e da água, pois tem-se verificado, nistério da Agricultura e do Abaste- (LIMA, 2000).
cada vez mais, a escassez desses recursos cimento (BRASIL, 1999);
ao longo dos anos. b) algumas práticas já têm sido empre-
As práticas de recuperação e de pre- gadas no desenvolvimento da cafei-
recursos
servação ambiental são importantes para cultura orgânica. São práticas já usuais naturais
todas as regiões agrícolas, mas um enfoque do sistema convencional de pro-
especial deverá ser dado às regiões mon- dução, como por exemplo, o uso de
tanhosas. A cafeicultura de montanha é cultivares resistentes a pragas e doen-
insumos consumidor
caracterizada por cultivos nas zonas ser- ças e com maior eficiência nutricional.
Sabe-se também que os espaçamen- homem
ranas. As propriedades que produzem ca-
fé nessas regiões são formadas, em geral, tos mais adensados têm proporcio- produção produção
por pequenos produtores. Tais produtores, nado redução na erosão, aumentos vegetal animal
principalmente da Zona da Mata mineira, nos teores de matéria orgânica e de
nutrientes no solo (PAVAN, 1997); Figura 1 - Representação esquemática de
implantam e conduzem suas lavouras uti-
organismo agrícola
lizando a mão-de-obra de suas próprias fa- c) as recomendações técnicas têm ca-
mílias e de outras de trabalhadores rurais ráter dinâmico, sendo aperfeiçoadas
denominados parceiros, sem terra. ao longo do tempo, à medida que as A cafeicultura orgânica pode ser con-
A produção de café em sistema orgâ- pesquisas e as práticas apresentam ceituada como um sistema de produção que
nico seria uma alternativa aos cafeicultores seus resultados. se baseia no melhoramento e na conser-
de montanha, especialmente aos agricul- Nesse artigo, será apresentada uma pri- vação da fertilidade do solo, no uso apro-
tores familiares. Seus sistemas de produção meira tentativa de recomendação para a priado de energia e no estímulo à biodiver-
são diversificados e há a preocupação com implantação de cafezais em sistemas orgâ- sidade vegetal e animal, promovendo um
a integração deles, visando, principalmen- nicos. Será considerada a necessidade de manejo integrado mediante técnicas e insu-
te, à distribuição de trabalho no tempo e o técnico começar sua proposta por uma mos compatíveis com o ambiente e proi-
no espaço. Alguns custos poderiam ser compreensão melhor dos ambientes da bindo o uso de agroquímicos sintéticos
reduzidos pela produção de parte dos insu- propriedade e tentar, a partir disso, desen- (LÓPEZ DE LEÓN; MENDOZA DÍAZ,
mos na propriedade, como estercos, com- volver sistemas que deverão ser integra- 1999).
postos, adubos verdes, biofertilizantes, dos, com relação aos insumos, às lavouras, Esses conceitos evidenciam a relação
extratos vegetais etc. O agricultor familiar às criações, à biodiversidade, aos recursos entre produção e ambiente por meio da inte-
estaria também contribuindo para a recupe- naturais e ao homem. gração de sistemas. Em sistemas integra-

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002


Café Orgânico 35

dos de produção, produtos ou subpro- da Serra das Águas e do município de He- Clima da região e
dutos obtidos de um sistema contribuem liodora e, finalmente, os da Fazenda Serra altitude da propriedade
para a obtenção de outro produto de outro das Águas. Os dados obtidos nas duas O clima da região foi descrito como
sistema e permite, ainda, a distribuição de primeiras fases do processo foram divi- subtropical moderado úmido, com tempe-
trabalho ao longo do tempo em determi- didos da seguinte forma: ratura média anual variando de 18oC a 20oC,
nado espaço geográfico - propriedade, co- a) físicos: geologia, geomorfologia, re- temperatura média do mês mais frio, entre
munidade, município etc. levo, solos, altitude, latitude, vege- 13oC e 16oC, e, a do mês mais quente, entre
A integração de sistemas pode implicar tação e clima (precipitação, tempe- 21oC e 23oC, com pouca ocorrência de gea-
em redução de custos, quando um produto ratura, evapotranspiração, vento, das. As precipitações médias anuais variam
serve de insumo para a produção de outro. insolação). Estas informações po- segundo o local, de 1.400 mm a 1.700 mm, com
Por exemplo, o esterco de curral, os adubos
dem indicar o uso de determinadas regime de distribuição periódico predomi-
verdes e a casca de café são produtos do
espécies vegetais (anuais ou arbó- nando no semestre mais quente. No inver-
leite, de leguminosas e da cafeicultura res-
reas), o potencial de produção e o no, há dois a quatro meses de seca com dé-
pectivamente, que se tornam insumos para
uso de técnicas de controle de ero- ficit hídrico na ordem de 10 e 30 mm anuais,
a produção de café orgânico. Pela importân-
são, ou algum manejo específico; com evapotranspiração potencial anual que
cia desses insumos, a questão passa a ser
onde, quando, quanto e como produzi-los. b) socioeconômicos: estrutura fundiá- varia entre 800 e 850 mm (GOLFARI, 1975).
Isso implica em determinar, previamente, ria, mercados externo e local, princi- Sua classificação climática é Cwa - tempe-
onde, quando, quanto e como distribuí-los. pais culturas da região, disponibi- rado chuvoso (mesotérmico), com inverno
Qualquer que seja a abrangência geo- lidade de mão-de-obra etc. Estas seco e verão chuvoso, predominante nas
gráfica dos sistemas de produção, pode- informações direcionam também o regiões serranas do Centro-Sul de Minas
se inferir que as análises e as estratificações desenho, a escala e as espécies co- Gerais (ANTUNES, 1986).
dos ambientes (onde) devem preceder o merciais a serem utilizadas nos sis- A altitude na propriedade varia de 880 m,
planejamento das atividades (quando, temas a implantar; no sopé da Serra das Águas a 1.220 m, no
quanto e como). Para se realizar tal estudo, c) cobertura florestal: estado atual da divisor de águas (Fig. 2).
o ideal seria iniciar uma caracterização cobertura florestal, evolução e histó-
ambiental (estudar o meio físico) a partir da rico do desmatamento e fisionomia Geomorfologia e relevo
região, onde se poderia ter uma idéia mais (também dá idéia do clima). Estes A fazenda localiza-se na região do
abrangente sobre geologia, geomorfologia, dados são importantes, quando há Planalto do Alto Rio Grande, na unidade
relevo, solo, clima, vegetação nativa e ênfase em técnicas fundamentadas geomorfológica do Planalto de Andrelândia
socioeconomia. Posteriormente, na proprie- na sucessão, direcionando as espé- (BRASIL, 1983). A serra, onde se localiza,
dade onde os ambientes serão estratificados, cies e o manejo. possui padrão de dissecação representado
observando, detalhadamente, caracterís- A título de exemplo, serão apresentadas por topos convexos e ravinas anfiteátri-
ticas como limites, relevo, altitude, faces de
algumas informações obtidas na proprie- cas. As encostas também convexadas são
exposição solar (importante em topografias
dade. intercaladas por cristas e ravinas estreitas
mais acidentadas), uso da terra, solos, nas-
centes e cursos d’água.

ANÁLISE DO MEIO FÍSICO


Um trabalho com objetivo de caracteri-
zar o meio físico foi realizado para a Fazen-
da Serra das Águas do município de Helio-
dora-MG, localizada na região do Circuito
das Águas no Sul de Minas (LIMA et al.,
1999). O objetivo geral foi realizar um diag-
nóstico ambiental, para estabelecer um pla-
nejamento de uso sustentável da terra. Tal
planejamento resultou em proposta para
implantação de sistema integrado de pro-
dução, tendo a cultura do café sob cultivo
orgânico. Foram abordados, primeiramen-
te, os dados referentes à região Sul de Mi-
nas, em seguida os da região de entorno, Figura 2 - Ortofoto, divisa e cotas de altitude da Fazenda Serra das Águas

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002


36 Café Orgânico

e alongadas, perpendiculares à linha de senta-se, predominantemente, como forte gradação. Isso implica considerar que os
culmeada (Fig. 3). ondulado e ocupa 97,68 hectares (62,72% sistemas de plantio deverão ser iniciados
Os cursos d’água que drenam as ravi- da área da fazenda), seguido por ondula- por práticas de conservação do solo. As
nas dos topos convergem em padrão den- do, montanhoso, plano, suave ondulado e áreas de preservação permanente (escar-
trítico para um curso principal, localizado escarpado. pas) estão situadas nas bordas das ravinas
em ravina estreita e profunda da encosta, A predominância do relevo mais aciden- da encosta e sob uso de floresta secundária
conduzindo as águas até o sopé da serra tado (73% da fazenda acima de 20% de em estádio inicial de sucessão.
(Fig. 2). declividade) indica que o uso adequado As áreas com declividades inferiores
O relevo representado no mapa de de- do solo deve ser o mais conservacionista a 20% apresentam potencial de uso mais
clividade em percentagem (Fig. 4) apre- possível, de forma que previna a sua de- intensivo com culturas anuais, pastagens,
olericultura etc. Seu uso é também prece-
dido por práticas conservacionistas. Outras
áreas com relevos de menores declividades
estão situadas nos altos dos morros, nos
divisores de águas. A maioria está com uso
florestal e deve continuar assim, principal-
mente, devido às questões legais e conser-
vacionistas.
Além do critério declividade, deve-se
levar em conta outras restrições da legis-
lação como as áreas de Mata Ciliar, nas-
centes, altos de morro, linhas de cumeada
etc. O fato de a área estar situada no do-
mínio da Floresta Atlântica, o seu uso apre-
senta restrições, devido ao Decreto no 750
de 10 de fevereiro de 1993 (BRASIL, 1993),
que dispõe sobre o corte, exploração e su-
pressão de vegetação primária ou nos está-
dios avançado e médio de regeneração da
Figura 3 - Modelo digital da Fazenda Serra das Águas
Floresta Atlântica.

Faces de exposição ao sol


A conformação do terreno em relação
ao caminho aparente do sol, na latitude da
propriedade, apresenta maiores áreas de
exposição solar nos sentidos leste e sul,
com 62,68% e 25,58%, respectivamente,
seguida pela exposição plana (todos os
sentidos), norte e oeste com 11,75%; 4,10%
e 0,07%, respectivamente (Fig. 5).
Em terrenos com elevada declividade, a
exposição solar determina variações de
ambientes em termos microclimáticos. É
comum constatar, entre os agricultores em
regiões montanhosas, que as faces mais
ensolaradas têm o solo mais duro e resseca-
do. As faces voltadas para o norte recebem,
diariamente e no decorrer do ano, grande
quantidade de insolação direta, sendo,
portanto, mais quentes. São chamadas de
“soalheiras” pelos agricultores. Já a exposi-
ção sul é o inverso. Recebe menor quanti-
Figura 4 - Mapa de classes de declividade da Fazenda Serra das Águas dade de insolação direta, sendo, portanto,
Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002
Café Orgânico 37

com diferentes idades. Com o objetivo de


monitorar os plantios antigos e os novos,
foram mapeados e numerados todos os
talhões.
A área citada como sede, 8,79 hectares
(5,56%) refere-se a um terreno plano, de
terraço, onde estão localizadas as casas dos
trabalhadores, um alambique, uma estrutu-
ra de secagem beneficiamento de café e
piquetes para criação de frangos caipiras
para corte.

Estratificação ambiental e
pedologia
A propriedade foi dividida em três estra-
tos gerais:
Figura 5 - Faces de exposição ao sol da Fazenda Serra das Águas a) terras altas: com topografia ondula-
da a forte-ondulada, solos vermelho-
amarelados com horizonte A típico
mais fria e sombreada. É denominada pelos abandonados, o que possibilitou a regenera- dos solos húmicos de altitude;
agricultores de “face Noruega”. A exposi- ção da floresta nativa, apresentando, apro-
b) terras intermediárias: com topo-
ção leste recebe mais insolação pela manhã ximadamente, dez anos de idade. Existem
grafia forte-ondulada e montanhosa,
e a exposição oeste, à tarde, sendo o solo 55,94 hectares ocupados por pastagens
solos vermelho-amarelados com ho-
desta mais duro e ressecado que o da outra. abandonadas e em estado de regeneração
rizonte A estreito e solos com média
As áreas de pequena declividade e as pla- de vegetação nativa. Algumas dessas áreas
a pequena profundidade;
nas recebem insolação direta o dia todo, podem ser caracterizadas como pasto sujo
ou de acordo com a conformação do vale, e outras já apresentam indivíduos arbóreos c) terras baixas: com topografia plana
no caso de locais de baixada. de porte alto, caracterizando uma capoeira e solos desenvolvidos a partir dos
Em unidades experimentais instaladas em estádio inicial de sucessão (Fig. 6). sedimentos depositados em terra-
pela EPAMIG, em áreas montanhosas da Uma outra parte da cobertura vegetal ços do rio, com elevada influência
Zona da Mata e do Sul de Minas, têm sido da fazenda é composta por plantios de café do lençol freático.
testados:
a) sombreamento mais intensivo (arbo-
rização ou agrofloresta diversificada
e estratificada) nas exposições oeste
e norte;
b) arborização mais rala (face leste);
c) cobertura do solo apenas com plan-
tas rasteiras nas ruas do cafezal (face
sul).
O sombreamento será maior com a dis-
posição das árvores no sentido norte-sul,
permitindo reduzir a insolação, a tempera-
tura e as perdas d’água, durante o período
mais quente do ano (RESENDE et al., 1993).

Vegetação e uso da terra


A maior parte da fazenda é ocupada por
fragmentos de floresta nativa em diversos
estádios de sucessão. A maioria destas áreas
eram antigos plantios de café que foram Figura 6 - Mapa de uso do solo da Fazenda Serra das Águas

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002


38 Café Orgânico

Os principais tipos de solos da proprie- solar) são os melhores solos da propriedade to, dependendo das fontes de nutrientes,
dade, descritos a seguir, estão represen- para implantar a produção de café orgânico. das condições de acesso e da estratégia
tados na Figura 7. No entanto, exigem a adição de nutrientes, de transição, estão perfeitamente aptos
para justificar produções compensadoras para a produção de café orgânico. Sugere-
Latossolo Vermelho-Amarelo de café, e as quantidades de matéria orgâ- se a mesma estratégia proposta para os
com horizontes A moderado e nica, para suprir essas necessidades, de- solos das terras altas, ou seja, a implan-
A proeminente (LVA mod./proem.) mandam investimentos em transporte. Uma tação de talhões experimentais.
Estes solos compõem a quase totalidade vez que o acesso às áreas desses solos é
da área do estrato das terras altas. São difícil nas épocas chuvosas, a adminis- Cambissolos (Ca)
profundos, porosos e bem drenados. Apesar tração da fazenda deveria implantar talhões Esses solos ocupam as vertentes mais
de argilosos, possuem agregados estáveis experimentais nesses solos para avaliar a íngremes da propriedade, acompanhando
por ser muito envelhecidos. Isso resulta viabilidade e dar tempo para o processo e as encostas dos vales formados pelas li-
em alta porosidade total, favorecendo aperfeiçoamento da atividade nas terras nhas de drenagem. Ocorrem principalmente
sobremaneira a infiltração da água, o que altas. nas terras intermediárias. Sua formação é
indica tratar-se de solos mais resistentes proporcionada pelos movimentos de terra
à erosão, capazes de absorver elevadas Latossolo Vermelho-Amarelo
causados pelo entalhamento dos cursos
quantidades de água infiltrada, que impedem com horizontes A fraco
d’água que cortam os solos mais profundos
o escorrimento superficial erosivo. Seu e moderado (LVA fraco/mod.)
e atingem o embasamento rochoso. Consi-
manejo deve ser realizado, preocupando-se Estes solos ocupam as terras interme- derando a topografia muito inclinada e a
com a manutenção da porosidade das ca- diárias da fazenda. Todas as observações pequena profundidade, que dificulta o ple-
madas superficiais para o pleno benefício feitas para o LVA mod./proem. são apli- no desenvolvimento do sistema radicular
da infiltração. cáveis a esses solos, exceto os teores de do café, não são recomendados para a sua
Considerando os aspectos físicos matéria orgânica do horizonte A, que são produção.
(topografia, porosidade, profundidade e menores, ou seja, do ponto de vista físico, A proteção dessas áreas com a vegetação
resistência à erosão), fertilidade do solo de conservação e da nutrição da lavou- arbórea, como as já existentes, seria o mais
(matéria orgânica e capacidade de troca de ra do café, esses solos seriam a segunda indicado. Isso manteria uma série de van-
cátions) e climático (altitude e exposição opção para a produção orgânica. No entan- tagens na propriedade, como a proteção das
nascentes e da fauna em geral, o controle de
erosão, a manutenção e, possivelmente, o
aumento da biodiversidade.

Hidromórficos (H)
Esses solos ocupam as terras baixas, ao
longo do riacho e em torno da sede. A baixa
porosidade e a pequena profundidade efe-
tiva, para ocupação pelas raízes do café,
inviabilizam o uso desses solos para a sua
produção. Além disso, os riscos de geadas
são maiores nessas áreas.

Comentários gerais sobre


a fazenda
Sugeriu-se que uma estratégia geral da
fazenda seria a de conduzir a produção de
café como um processo de transição entre o
sistema atual conhecido e o sistema orgâ-
nico ainda desconhecido. Seriam implan-
tados talhões experimentais para indicar as
limitações e oportunidades que atendessem
às demandas técnicas, operacionais e admi-
nistrativas. A exigência de transporte de
fontes de nutrientes sugere estratégias dife-
Figura 7 - Mapa de solos da Fazenda Serra das Águas renciadas para alcançar a produção orgâ-
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Café Orgânico 39

nica. Ou seja, haverá mais de uma forma para radicular. E a menor taxa fotossintética em ordem decrescente, nas faces plana, nor-
alcançar o selo orgânico. resultará em menor produção de carbono, te, oeste, leste e sul.
A estratégia de transição também con- empregado para reações oxidativas como Pelo exposto, podem-se implantar vários
templaria uma questão importante para a da respiração. Uma menor taxa respiratória modelos de sistemas em diferentes locais,
administração da fazenda. Essa questão acarretará em menos energia disponível de acordo com o ambiente. Além da expo-
envolve o investimento em uma nova ati- para o processo ativo de absorção de nu- sição solar, os fatores solo, declividade,
vidade, que seria a produção de esterco de trientes pelas raízes. acesso à lavoura e econômico deverão ser
origem animal. A fazenda teria que aprender Uma alternativa é o emprego de legu- considerados para a tomada de decisão.
duas atividades novas ao mesmo tempo: minosas rasteiras não trepadeiras, como as Um aspecto que merece destaque na
produzir café orgânico e produzir esterco. A crotalárias, feijão-de-porco, estilosantes e implantação de sistemas orgânicos é como
decisão de transicionar daria tempo para que amendoim-forrageiro, manejadas com roça- fazer as adubações para obter produções que
a fazenda se preparasse para atingir a meta das nas entrelinhas, e o guandu, nos cor- garantam lucratividade e sustentabilidade,
da produção desse insumo em um prazo que dões de contorno e nas proximidades, se- obedecendo as normas das certificadoras.
amortece economicamente os impactos de riam boas opções. Este é, sem dúvida, um grande desafio pa-
uma atividade totalmente nova (produção Ao contrário das leguminosas, as quan- ra os técnicos e, mais ainda, para os pro-
de esterco) e a aprendizagem de um sistema tidades de N supridas por meio de estercos prietários. Tal aspecto é o principal fator que
e de compostos orgânicos seriam crescen- determina a necessidade de integrar os
mais complexo.
tes do plantio à fase de produção, tempo sistemas de produção e, talvez, por onde se
Atendendo essa estratégia de transição,
que daria maiores condições para o apren- deve iniciar o planejamento e o dimensio-
as fontes de matéria orgânica também serão
dizado e o desenvolvimento do sistema de namento de todos os sistemas de produção
objeto de avaliação para uso. A palha de
produção de estercos etc. da propriedade.
café, que demanda menos esforço para ser
Além do esterco, das leguminosas e da
obtida e transportada, pode ser uma opção
casca de café como fontes de matéria orgâ- CICLAGEM, AQUISIÇÃO,
para as terras altas nos estádios iniciais.
nica e de nutrientes, haveria a possibilidade PRODUÇÃO E TRANSPORTE
Certamente, deverá haver complementação
de adicionar a vinhaça (resíduo líquido da DE NUTRIENTES
de nutrientes para a plena produção de café.
produção de aguardente). Tanto a vinhaça
Nesse caso, a fase de transição para a pro- As principais entradas de nutrientes no
como a casca de café são ótimas fontes de
dução orgânica pode incluir fontes minerais potássio, além dos demais macro e micro- ecossistema ocorrem via intemperismo,
de nutrientes (THEODORO, 2002) que sejam nutrientes, em proporções variadas. precipitação, fixação assimbiótica e simbió-
transportadas mais facilmente e contribuam Uma das maiores críticas feitas à cultura tica de nitrogênio e adubação. As saídas
especificamente. do café, quando se pretende implantar o de nutrientes ocorrem via lixiviação, erosão,
Outra opção seria o plantio do café com sistema orgânico, é tratá-lo como mono- volatilização e remoção do material orgâ-
espaçamento que permita o crescimento de cultura (espaçamento adensado e entre- nico (exploração de diferentes partes da
leguminosas intercalares até uma idade linhas no limpo). O emprego de legumino- planta, retirada da manta florestal) (REIS;
mais avançada da lavoura. Um aspecto sas nas entrelinhas já muda esse aspecto. BARROS, 1990). Considerando que os so-
importante para o sucesso dessa proposta Contudo, a associação do café com outras los brasileiros são altamente intemperiza-
é a administração das práticas culturais, que espécies arbóreas, sejam elas culturas se- dos, com virtual ausência de minerais ricos
exigem acompanhamento constante para cundárias (arborização), sejam em cultivo em nutrientes, a contribuição do intempe-
evitar o crescimento excessivo e a compe- misto (sistema agroflorestal), proporciona rismo deve ser muito pequena. Conside-
tição com as plantas de café. vantagens adicionais, como uma maior rando, também, o desenvolvimento de sis-
A competição pode ser tanto por luz, possibilidade de controle natural de pra- temas de produção que permitam uma
se as plantas intercaladas forem arbustivas gas, ciclagem de nutrientes e conservação elevada conservação do solo e minimizem
e arbóreas, quanto por nutrientes e por dos solos (cobertura do solo, cobertura as perdas de nutrientes, ainda restará um
água. A competição por água e por nutrien- morta, acúmulo de matéria orgânica e re- balanço entre as entradas de nutrientes, a
tes será maior, quanto maior for a área foliar dução da erosão). demanda da planta - que varia ao longo do
do mato. Tanto a absorção de água quanto Os sistemas agroflorestais são alter- seu ciclo, e a saída de nutrientes - que varia
a fotossíntese dependem da área foliar do nativas interessantes, principalmente com com aquilo que é exportado do sistema. Para
indivíduo ou da comunidade de plantas relação ao aumento da biodiversidade. Con- que esse balanço se equilibre, os compo-
(mato). Com pequena área foliar, a transpi- forme discutido anteriormente, a exposição nentes ciclagem e adubação devem ser
ração de uma planta ou da comunidade será solar em áreas com declives acentuados, considerados como os mais importantes.
menor. A pequena taxa transpiratória pro- difere o ambiente com relação à incidência de Assim, para implantar um sistema orgâ-
porcionará o mínimo transporte de nutrien- radiação sobre o solo. Admite-se que um nico de produção de café, deve-se ter em
tes por fluxo em massa até a superfície maior sombreamento possa ser promovido, mente que os nutrientes que serão fornecidos

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002


40 Café Orgânico

à lavoura poderão ser reciclados das reser- roçada e a cobertura morta sob o pé de ca- oferecer-lhes condições necessárias para
vas minerais do solo e da matéria orgânica fé contribuem para a melhoria da fertilidade sua produção.
(estercos, compostos, adubação verde etc.); do solo e da retenção de água. A liberação de N das leguminosas, para
outros podem ser adquiridos de fontes de São muitas as espécies capazes de se as culturas por meio da adubação verde,
fora da propriedade (calcários, fosfatos de associarem ou formar simbioses com orga- depende da sua imobilização na biomassa
rocha e micronutrientes, que são permitidos, nismos fixadores de N2 atmosférico, com microbiana e posterior mineralização. A
e termofosfatos e sulfatos de potássio, que destaque para as leguminosas e mesmo imobilização e a mineralização são reguladas,
são tolerados); ou produzidos, considerando para certas gramíneas, entre elas culturas em grande parte, pela relação C:N da matéria
as leguminosas como fonte de N para o de importância econômica nos trópicos orgânica, quanto maior a relação, maior a
sistema (fixação biológica de N). Embora o (FRANCO; BALIEIRO, 1999). Existem vá- imobilização. As leguminosas apresentam
esterco e os compostos possam ser adqui- rias tabelas que mostram quantidades de relação C:N mais estreita que as gramíneas,
ridos de fora da propriedade, o fator trans- N2 fixadas por leguminosas, algumas es- variando entre 10:1 e 30:1, portanto, quando
porte poderá onerar significativamente os tão agrupadas no Quadro 1 (FRANCO; incorporadas ao solo, a liberação de N é mais
custos de produção. O ideal é que o esterco BALIEIRO, 1999, AUER; SILVA, 1992, rápida. Além disso, quanto mais jovens, mais
seja produzido na própria unidade e, por SIQUEIRA; FRANCO, 1988, TANAKA, tenras são as partes da planta e maior é a
exigência das certificadoras, produzido orga- 1981). velocidade de mineralização. Estima-se que,
nicamente. Notam-se, no Quadro 1, que as quan- em curto prazo, 50% do N proveniente do
O uso de leguminosas intercaladas no tidades fixadas de N2 variam entre as espé- adubo verde seja mineralizado, o restante,
entorno e em faixas nos cordões de contor- cies leguminosas e dentro de uma mesma mais lentamente (FRANCO; SOUTO, 1984),
no (menor custo de transporte) poderá espécie. Condições ambientais como clima, que precisa ser considerado na estimativa
contribuir como a principal fonte de N pa- solo (preparo, manejo e nutrientes) e gené- de área de plantio de leguminosas, para aten-
ra a lavoura de café. O cultivo intercalar de ticas (de ambas – planta e bactéria) deter- der a cada hectare de café e sua demanda
adubos verdes também protege o solo con- minam o potencial de fixação biológica de em função da fase da lavoura (plantio, for-
tra a erosão, reduz o crescimento de plantas nitrogênio. É preciso, portanto, verificar as mação e produção).
invasoras e possibilita a incorporação de espécies mais indicadas (adaptadas) ao O emprego das leguminosas, como
matéria orgânica ao sistema. A prática da ambiente, onde se pretende cultivá-las, e adubação verde, não contribui apenas com

QUADRO 1 - Estimativas de fixação de N em leguminosas


N2 fixado N2 fixado
Espécie leguminosa Espécie leguminosa
(kg.ha-1.ano-1 ou ciclo) (kg.ha-1.ano-1 ou ciclo)

Produtoras de grãos Forrageiras

Soja (Glycine max) 60-178 Mineirão (Stylosanthes guyanensis) 30-196


Feijão (Phaseolus vulgaris) 2,7-110 Amendoim-forrageiro (Arachis pintoi) 150-180
Caupi (Vigna unguiculata) 73-354 Alfafa (Medicago sativa) 100-300
Amendoim (Arachis hypogea) 72-124 Trevo-doce (Melilotus sp) 125
Guandu (Cajanus cajan) 168-280
Trevo (Trifolium sp) 100-150
Calopogônio (Calopogonium mucunoides) 370-450
Lablabe (Dolichos lablab) 180
Feijão-mungo (Vigna mungo) 63-42
Mucuna preta (Stylozobium aterrimum) 210-220
Grão-de-bico (Cicer arietinum) 50-103
Mucuna anã (Mucuna spp)
Ervilha (Pisum sativum) 52-77
Feijão-de-porco (Canavalia ensiformis) 49-190
Fava (Vicia faba) 240-325
Puerária (Pueraria phaseoloides) 130
Lentilha (Lens sp) 100
Soja perene (Glycine wightii) 180-200
Lupino (Lupinus sp) 150-200

Forrageiras Arbóreas

Leucena (Leucaena leucocephala) 500-600 Acácia (Acacia mearnsii) 200

Centrosema (Centrosema pubescens) 126-398 Ingá (Inga jinicuil) 35


Estilosantes (Stylosanthes spp.) 34-220 Gliricidia (Gliricidia sepium) 100

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002


Café Orgânico 41

fornecimento de N. A princípio, todos os sobre solos pobres, produza estercos com com as leguminosas e outros materiais
nutrientes essenciais são fornecidos por teores de nutrientes inferiores à outra vaca orgânicos, passam a ser insumos funda-
esta adubação, que também precisa ser alimentada em pastagem sobre solo fértil, mentais para a produção de café, de outras
considerada, visando o complemento com com suplementação mineral e legumino- lavouras e de criações.
outras fontes. sa fornecidas no cocho. A composição do Grande parte das propriedades agríco-
Algumas quantidades extraídas do solo esterco também é influenciada por fatores las, especialmente as pequenas, não pode-
pelas leguminosas foram obtidas por Tanaka como a espécie animal, a raça, a idade, o ria conduzir uma lavoura de café utilizando
(1981) e podem ser verificadas no Quadro 2. material utilizado como cama e o tratamento o esterco como a única fonte de matéria
É preciso estabelecer, entretanto, que a extra- dado à matéria-prima esterco (KIEHL, 1985). orgânica. Dificilmente produziria quanti-
ção de nutrientes depende da disponibi- As variações das composições de nu- dades suficientes para tanto. Assim, o
lidade destes no solo (com exceção do N), trientes em diferentes materiais orgânicos potencial de produção de cada propriedade
que, por sua vez, nem sempre poderá ser podem-se tornar um complicador, quando deverá ser explorado, considerando as
atendida pela fertilidade atual, necessitando é necessário definir quantidades a ser apli- normas estabelecidas pela certificadora
de adições de acordo com a análise de solo cadas ao solo ou misturadas em compos- para a produção orgânica. São necessários
e a exigência do adubo verde. tagens. Uma maneira de reduzir tal varia- o estabelecimento de locais (curral, áreas
Leguminosas, estercos ou qualquer outro bilidade é determinar, para cada material, de acumulação etc.), números de horas/dia
material orgânico, que esteja disponível na padrões de produção. Assim, o esterco pro- e época do ano (normalmente durante as
propriedade, possuem composições variá- duzido com valor nutricional semelhante, secas), para se estimar a quantidade de
veis. Isso pode ser verificado nas recomen- com raça, idade, material utilizado como ca- esterco que seria possível juntar por dia e
dações fornecidas por Ribeiro et al. (1999), ma e tratamentos dados às matérias-primas ao longo do ano na propriedade.
para adubação de plantio do café com adu- padronizados, permitiriam a produção com Em função da quantidade de esterco
bos orgânicos disponíveis na propriedade, composição de menor variação, facilitando produzido, da análise da composição de
considerando os nutrientes neles contidos as estimativas das quantidades a ser utili- nutrientes e da demanda da lavoura, deter-
(Quadro 3). zadas. mina-se a complementação com legumi-
Quanto à composição do esterco, esta Além dos aspectos qualidade e padrão, nosas, calcário, fosfato de rocha ou ter-
é bastante influenciada pela nutrição e o fator quantidade e um sistema eficiente
mofosfatos, sulfato de potássio e outras
estado sanitário do animal. Imagina-se que de coleta também são necessários na pro-
fontes de origem orgânica ou mineral per-
uma vaca alimentada apenas em pastagem, priedade, pois, os estercos, juntamente
mitidas ou toleradas pelas normas de pro-
dução orgânica. Todo esse conjunto de
QUADRO 2 - Produção de massa seca e nutrientes totais extraídos pelas leguminosas insumos precisa ser dimensionado e pro-
Nutrientes extraídos gramado antes de implantar um sistema
Leguminosas Produção (kg.ha-1) orgânico de produção de café. Ao contrá-
-1
(t.ha ) rio de que muitos imaginam, o fator precisão
N P2O 5 K2O
é fundamental para se planejar uma proprie-
Guandu 11,6 324 35 199 dade orgânica.
Mucuna preta 7,0 195 23 144 Conforme relatado por Chaves (2000),
Feijão-de-porco 8,0 279 30 202 a combinação de leguminosas e esterco, em
Crotalaria juncea 16,4 290 41 217 experimento conduzido por dez anos no
Soja otootan 4,2 79 9 62
município de Ibiporã-PR, em cafezal plan-
tado com espaçamento 4 m x 2 m e leucena
Cowpea brabant 4,6 120 12 113
cultivada com uma ou duas linhas por rua
Feijão-baiano 3,8 100 11 100
de café, melhorou a fertilidade do solo,
proporcionou melhor produtividade e
QUADRO 3 - Alguns adubos orgânicos e doses recomendadas para o plantio de café reduziu o gasto com capinas, constituindo-
Dose
se em importante prática para a exploração
Adubo orgânico econômica da cafeicultura, especialmente
kg/cova L/cova
nas pequenas e médias propriedades. O em-
Esterco de curral 3,0-5,0 7,0-15,0 prego da leguminosa isoladamente não
Esterco de galinha 1,0-2,0 1,5- 3,0 atingiu a produtividade semelhante aos
Torta de mamona 0,5-1,0 1,0- 2,0 tratamentos - adubação mineral e adubação
orgânica + leucena1, sendo a maior produ-
Palha de café 1,0-2,0 5,0-10,0
tividade alcançada por esse último. O teor
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42 Café Orgânico

foliar de N foi mais elevado no tratamen- calendário da lavoura, conforme anterior- cafezais em solos com mais de 15% de
to - adubação mineral, sem, entretanto, pro- mente mencionado (Quadro 4). fração grosseira, nem solos com menos
porcionar maiores produtividades. Como pode ser observado no Quadro 4, de 20% de argila, ou aqueles com mais de
Chaves (2000) mencionou que o ester- são situações que podem ocorrer tanto em 50% de argila sem uma estrutura e porosi-
co empregado foi dosado com base no teor municípios da Zona da Mata, como do Sul dade adequadas (KÜPPER, 1981 apud
de N, em equiparação ao adubo químico. de Minas, ou outras regiões, onde num GUIMARÃES; LOPES, 1986).
Essa prática poderia explicar os 52,9 mg de local ocorre um período chuvoso mais lon- Um solo ideal para a cultura do cafeeiro
P, por kg de solo, que foi registrado para o go (setembro a abril), com inverno mais deveria ter, em volume, aproximadamente
tratamento orgânico. rigoroso, que determina a colheita mais 50% de porosidade (1/3 do espaço poroso
O acúmulo de P no solo merece uma aten- tardia, que, por sua vez, determina as épo- na forma de macroporos e 2/3 com micro-
ção especial e tem sido objeto de discus- cas de formação de mudas, preparo do solo poros), 45% de fração mineral e 5% de
sões e pesquisas. Quando a quantidade e plantio do café mais tardio que o local matéria orgânica (KÜPPER, 1981 apud
com inverno menos rigoroso. Entretanto, GUIMARÃES; LOPES, 1986). Os Latos-
de esterco aplicada em um solo é defini-
nesse último, onde ocorre um período mais solos encontrados na Fazenda Serra das
da pela exigência de N da cultura, há um
curto de chuvas (outubro a março), o prazo Águas (estratificação ambiental e pedolo-
acúmulo sistemático de P nos solos (NOVAIS;
para o cultivo de leguminosas é mais curto gia), mostraram-se bastante favoráveis à
SMYTH, 1999). Como a demanda de N
e para produção de esterco (meses secos) cafeicultura.
repete-se, após cada cultivo, ao contrário
é mais longo. Fica evidente que deverá Solos rasos e os sujeitos à erosão inten-
de P que se acumula no solo, aumenta-se o
haver um balanço entre as produções de sa, como os Cambissolos também encon-
problema (P - ambiente), com os anos de
esterco e de leguminosas, visando atender trados na Fazenda, devem ser evitados.
utilização de esterco como fonte primária
à demanda da cultura ao longo do tempo. Solos com horizonte B textural ou com
de N, podendo tornar-se causa de eutrofi- camadas adensadas seriam uma opção se-
cação de águas. O P pode ser transportado cundária, sendo, em último caso, empre-
Escolha e caracterização
para ambientes aquáticos, quando dissol- gados com práticas de manejo bastante
das áreas
vido em solução, por escorrimento super- conservadoras e, essencialmente, com o
ficial, ou quando ligado às partículas orgâni- Conforme discutido anteriormente,
plantio em covas mais profundas (50-60 cm),
cas ou inorgânicas do solo, pelo processo dentre os elementos utilizados para a estra-
para permitir um aprofundamento razoável
de erosão. Pesquisas no sentido de definir tificação de ambientes, a exposição ao sol
do sistema radicular.
níveis críticos confiáveis para diferentes e o uso atual não determinam definitiva-
culturas e, idealmente, definir um valor aci- mente a escolha das áreas. Os elementos Escolha de cultivares
ma do qual os problemas ambientais come- topografia, solo, altitude e acesso condicio-
Como no cultivo orgânico não é permi-
nam os fatores limitantes e potenciais dos
çam a ocorrer (nível crítico ambiental) tido o uso de adubos de alta solubilidade e
estratos.
devem ser enfatizados. Práticas ambientais, de agrotóxicos, é fundamental que as
Para se fazer a seleção de glebas em
como o estabelecimento ou manutenção de cultivares de café para esse novo sistema
que serão formados os cafezais, é neces-
faixas de vegetação permanente próximas aos de produção possam produzir bem, absor-
sário verificar se elas são capazes de pro-
rios (Matas Ciliares), lagos e represas, têm- ver e utilizar os nutrientes de forma eficien-
duzir colheitas compensadoras e também
se mostrado eficientes para reter resíduos te e conviver em equilíbrio com os agentes
se apresentam características de estabili-
erodidos. Práticas conservacionistas de causadores de doenças e injúrias. Assim,
dade que assegurem explorações dura- na implantação de lavouras orgânicas, deve
cultivo, como o plantio em nível, manuten-
douras (GUIMARÃES; LOPES, 1986). existir a preocupação na escolha da culti-
ção do solo coberto por vegetação, cultivo
Declividades acima de 15-20% inviabi- var mais apropriada, preferencialmente, as
mínimo, que minimizem a erosão, igual-
lizam a mecanização por trator. Áreas com resistentes ou tolerantes a doenças e pra-
mente minimizam o transporte de P ligado
declives até 30-40% poderão ser utilizadas gas. As cultivares existentes no mercado
às partículas sólidas do solo.
com tração animal. A presença de pedras foram desenvolvidas em programas de
ou cascalhos nos 30-40 cm do solo pode melhoramento tradicionais, ou seja, em
IMPLANTAÇÃO DE
ser limitante para o uso de implementos condições ótimas de fertilidade e controle
SISTEMAS ORGÂNICOS DE
agrícolas. A profundidade efetiva do solo de doenças e pragas (exceto as destinadas
PRODUÇÃO DE CAFÉ
para o cafeeiro está em torno de 120 cm, a resistências), não se conhecendo ainda
A implantação do cafezal orgânico é desde que tenha textura média a argilo- o comportamento destas em sistemas orgâ-
iniciada pela determinação de recursos sa, não tenha mais de 15% de pedras e nicos. A seguir, serão apresentadas algu-
financeiros, áreas disponíveis, escolha das cascalhos e possua uma estrutura granular mas cultivares de café que podem ser
áreas com maior potencial de produção de com boa estabilidade de agregados em consideradas na escolha para o sistema
café e pode ser programada a partir de um água. Não se recomendaria a instalação de orgânico de produção.
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Café Orgânico 43

Cultivares com resistência a melhoramento genético, conduzidos no de Timor e posterior cruzamento na-
doenças, pragas e nematóides país, é possível, contar com cultivares resis- tural com a cultivar Catuaí Vermelho.
tentes a tal doença, as quais serão descritas Produção semelhante à da cultivar
A principal doença do cafeeiro é a ferru-
a seguir: Catuaí Vermelho, apresenta porte
gem, causada pelo fungo Hemileia vastatrix.
Encontra-se presente nas principais regiões a) Oeiras MG 6851: resultante do cru- baixo, é vigorosa, com internódios
produtoras de café do mundo, causando zamento entre a cultivar Caturra Ver- curtos, boa ramificação secundária,
elevados prejuízos. No Brasil, esta doença melho x Híbrido de Timor. Apresenta brotos novos de coloração verde,
pode causar perdas de até 30% na produ- porte baixo, copa de forma cônica, folhas largas, frutos grandes, verme-
ção, se nenhuma medida de controle for alto vigor vegetativo, boa produtivi- lhos e de maturação média a tardia,
adotada. Em decorrência da desfolha acen- dade, maturação intermediária entre peneira média 17. Indicada, preferen-
tuada, causada pela doença, afeta também Catuaí e Mundo Novo, frutos graú- cialmente, para plantios adensados
a qualidade do produto. Apesar dos gran- dos e vermelhos. Resistente e/ou e em renques. Exigente, quanto à fer-
des avanços no controle desta doença, o tolerante à ferrugem e indicada pa- tilidade do solo, e altamente resisten-
uso de resistência genética ao patógeno ra plantios adensados (PEREIRA; te à ferrugem, sendo imune a todas
ainda constitui-se na estratégia mais fácil SAKIYAMA, 1999); as raças prevalecentes (FAZUOLI
e econômica (PEREIRA; SAKIYAMA, b) Obatã IAC 1669-20: resultante do et al., 2000, THOMAZIELLO et al.,
1999). Como resultados dos programas de cruzamento de Villa Sarchi x Híbrido 2000);

QUADRO 4 - Calendário para sistemas orgânicos de produção de café para duas condições climáticas diferentes
Atividades/meses Jan. Fev. Mar. Abr. Maio Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.

Formação de mudas

Análise de solo(1) (plantio)

Limpeza da área (roçada)

Calagem para leguminosas

Marcação de curvas de nível

Sulcamento/coveamento

Calagem sulco/cova café

Adubação para leguminosas

Plantio de leguminosas

Adubação sulco/cova café

Transplantio de mudas café

Controle de invasoras

Adubação de cobertura

Pulverização com biofertilizantes

Aplicação de adubação verde

Produção de esterco

Colheita

Preparo do café

Comercialização

NOTA: Chuvas de setembro a abril, inverno mais rigoroso; Chuvas de outubro a março, inverno menos rigoroso.
(1) Inclui amostragem de solo.

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44 Café Orgânico

c) Tupi IAC 1669-33: derivada do cru- g) Icatu Vermelho e Amarelo: resultante produtividade (FAZUOLI et al., 2000,
zamento de Villa Sarchi x Híbrido de do cruzamento da cultivar robusta THOMAZIELLO et al., 2000).
Timor, apresenta boa produção, se- de Coffea canephora x Bourbom Com relação às pragas, destaca-se o
melhante à da Catuaí, porte baixo, Vermelho (Coffea arabica). Porte bicho-mineiro das folhas do cafeeiro, con-
internódios curtos, boa ramificação alto, vigorosa, frutos de coloração siderado a principal praga do cafeeiro no
secundária, brotos novos de colo- vermelha ou amarela, conforme a Brasil, em virtude de sua ocorrência ge-
ração bronze, frutos vermelhos e de progênie, e de maturação média a neralizada nos cafezais e também dos
maturação mais precoce que a Catuaí tardia; sementes com peneira média prejuízos causados por esse inseto na pro-
Vermelho e Obatã, peneira média 17, excelente capacidade de rebrota dução de café (SOUZA et al., 1998). O ata-
17, exigente quanto à fertilidade do quando submetida à poda. Reco- que do bicho-mineiro produz minas ou
solo. Indicada para plantios aden- mendada para plantios largos, 3,8- lesões nas folhas e ocasiona queda prema-
sados, superadensados ou em ren- 4,0 m x 0,7-1,0 m, podendo ser aden- tura destas, reduzindo de forma sensível a
que. Altamente resistente à ferrugem, sadas de forma menos intensa. O fotossíntese das plantas (SOUZA et al.,
sendo imune a todas as raças pre- espaçamento entrelinhas não deve 1998). Apesar dos grandes prejuízos cau-
valecentes (FAZUOLI et al., 2000, ser menor que 3 m e a distância entre sados por esta praga, ainda não existem
THOMAZIELLO et al., 2000); plantas de 0,7-1,0 m. Apresenta linha- cultivares resistentes lançadas no mercado,
d) Iapar 59: originou-se do cruzamento gens resistentes e moderada resis- embora haja programas de melhoramento
entre Villa Sarchi x Híbrido de Timor, tência à ferrugem (FAZUOLI et al., genético sendo desenvolvidos com este
apresenta boa produtividade, princi- 2000, THOMAZIELLO et al., 2000); objetivo. Todas as cultivares da espécie
palmente na Região Sul do país, onde h) Icatu Precoce IAC 3282: porte alto, C. arabica são susceptíveis ao bicho-
foi desenvolvida. Possui brotos de menos vigorosa que o Icatu Verme- mineiro, embora haja variabilidade na inten-
cor predominantemente bronze, bom lho, frutos amarelos, de maturação sidade de ataque. Por outro lado, nas espé-
vigor vegetativo, frutos vermelhos precoce, sementes com peneira mé- cies diplóides do gênero Coffea, têm-se
com maturação medianamente pre- dia 16, excelente qualidade de bebida constatado diferentes níveis de resistência.
coce, peneira média 16 e apresenta (café expresso). Moderada resistência No entanto, muitas dessas espécies apre-
maior precocidade de produção em sentam características agronômicas inde-
à ferrugem e indicada para regiões de
relação à Catuaí. Preferencialmente sejáveis e dificuldade de cruzamento com
elevada altitudes, mais frias (FAZUOLI
indicada para regiões mais frias e chu- C. arabica. Algumas cultivares da espécie
et al., 2000, THOMAZIELLO et al.,
vosas, por amadurecer precocemen- C. canephora têm apresentado tolerância
2000).
te, a colheita é antecipada, escapan- a esta praga, como Conillon (FERREIRA et
do dos danos de geadas precoces Apesar de ainda não haver cultivares
al., 1979) e Guarini (MATOS et al., 2000).
sobre os frutos verdes. É altamente de C. arabica resistentes a nematóides,
Entre as diversas espécies identificadas
resistente à ferrugem e ideal para alguns materiais em fase de seleção, oriun-
como resistentes, a espécie C. racemosa
plantios adensados e superadensa- dos da cultivar Icatu e de cruzamentos
destaca-se como a mais promissora, como
dos (SERA et al., 1996); de Icatu com Catuaí, têm mostrado ser
doadora da resistência para a espécie C.
e) Catucaí Vermelho e Amarelo: origi- promissores, como é o caso de progênies
arabica, pois, além da resistência ao inseto,
nou-se, provavelmente, do cruza- selecionadas no Paraná com resistência
apresenta também tolerância à seca, pre-
mento natural entre as cultivares Meloidoyne paranaense (MATA et al.,
cocidade de maturação dos frutos, intenso
Catuaí e Icatu. Apresenta porte bai- 2000) e algumas linhagens de Icatu e
florescimento e alto potencial produtivo.
xo, ótimo vigor, resistência à ferru- Catucaí 785 (BARROS et al., 1999), com
Populações avançadas já vêm sendo testa-
gem, frutos de coloração vermelha e resistência ao M. exígua. Uma utilização
das em ensaios de campo em estações expe-
amarela, conforme a progênie, com de resistência a curto prazo, consiste na
rimentais do IAC (GUERREIRO-FILHO,
boa fava e certas progênies com to- enxertia hipoticoledonar usando, como
1999). O híbrido Siriema (C. racemosa x C.
lerância ao nematóide Meloidoyne porta-enxerto, cultivar resistente ao nema-
arabica) x Catimor apresenta resistência à
exigua (MATIELLO; ALMEIDA, tóide. A cultivar Apoatã IAC 2258 lançada
ferrugem, ao bicho-mineiro e provável
1997); no mercado, pertencente à espécie Coffea
tolerância à seca (MATIELLO; ALMEIDA,
f) Catucaí – Açu: resultante da seleção canephora, resistente aos nematóides M.
exigua, M. incognita, é recomendada co- 1997).
feita dentro do material de Catucaí, a
partir de 1996. Além de alta produ- mo porta-enxerto para todas as cultivares
Cultivares com resistência
tividade, porte baixo e resistência à pertencentes à espécie C. arabica. As mu-
à seca
ferrugem, apresenta frutos e semen- das enxertadas também podem ser utili-
tes graúdas, peneira alta, acima de zadas para o cultivo em áreas sem nema- Uma alternativa de grande importância,
17 (MATIELLO et al., 1999); tóides, conferindo ganhos significativos de para regiões onde há escassez de água, são
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Café Orgânico 45

as cultivares resistentes à seca. Entretanto, eficiente que em espaçamentos largos. sição de sementes em lavouras que fazem
não há no mercado cultivares de C. arabica Algumas evidências têm mostrado a uso sistemático de agrotóxicos.
que apresentam essa resistência, apenas existência de uma provável relação entre o A terra destinada à preparação do subs-
de C. canephora. Como resultado do pro- teor de potássio nas folhas e a resistência trato, onde serão formadas as mudas, deve
grama de melhoramento genético do Insti- de cultivares de café às geadas, pelo fato ser de boa textura e estrutura (evitando-se
tuto Capixaba de Pesquisa, Assistência daquele elemento alterar o ponto de conge- solos de textura muito arenosa), coletadas
Técnica e Extensão Rural (Incaper), foi lan- lamento. A cultivar Icatu tem maior capa- nas camadas subsuperficiais do solo, evi-
çado no mercado a variedade clonal de café cidade de absorver e acumular potássio, tando-se, assim, problemas com infestação
Conillon, Emcapa 8141 - Robustão Capi- fazendo com que seja mais tolerante ao frio, de sementes e patógenos.
xaba, pertencente à espécie C. canephora quando comparadas com as cultivares Para a preparação de mil litros do subs-
(FERRÃO et al., 1999). Esta cultivar é for- Mundo Novo e Catuaí. No entanto, ainda trato, que será usado no enchimento dos
mada por dez clones, apresenta porte baixo, não há trabalhos de pesquisas compro- saquinhos das mudas, recomenda-se: 700 L
adequação para poda e adensamento, alto vando tal fato. de terra peneirada; 300 L de esterco de cur-
vigor vegetativo, alta produtividade, re- Outro aspecto a considerar é a arbo- ral curtido e peneirado; 6 kg de termofos-
sistência à seca e tolerância às principais rização das lavouras de café que visa mini- fato; e 0,6 kg de sulfato de potássio.
doenças de campo, como a ferrugem. Tam- mizar os efeitos de geadas de vento e de O esterco deve ser bem curtido e de pro-
bém a cultivar Conillon 3F é um novo clone, irradiação. Recomenda-se o plantio de 50 a cedência conhecida, evitando-se a conta-
pertencente à espécie C. canephora, em 70 árvores/ha, na implantação da lavoura minação com plantas invasoras de difícil
desenvolvimento para resistência à seca e de café, conduzindo-as com copas altas e controle, como a tiririca e a grama-seda.
à ferrugem (MATIELLO et al., 1997). menos ramificadas, visando sombra clara. Também não deve haver resíduos de herbi-
Este sistema é efetivo contra geadas a partir cidas. Não sendo possível a obtenção de
Estratégias de plantio do terceiro ano, sem reduzir a produtivi- esterco de curral, pode-se empregar o com-
de cultivares visando proteção dade. Nos dois primeiros anos, pode-se posto orgânico e o húmus de minhoca, na
às geadas fazer a proteção temporária com guandu, mesma dosagem. Outra possibilidade é
Atualmente, o controle de geada tem ou tremoço (SERA; CARAMORI, 1997). substituir parte do esterco por parte equi-
sido feito por meio de manejos e cultivares valente de casca de café (150 L de esterco
com características que possam amenizar Formação de mudas de curral + 150 L de casca de café). Ester-
os efeitos provocados pelas geadas. Se- O sistema de formação de mudas para co de galinha (80 L) e torta de mamona
gundo Sera e Caramori (1997), em regiões o café orgânico não é muito diferente do já (10-15 L) podem ser utilizados, quando o
sujeitas às geadas, no terço médio das existente para os sistemas convencionais. solo for de textura média, devendo a se-
encostas, deve-se dar preferência para as São necessárias algumas modificações em meadura, neste caso, ser feita 30 a 40 dias
cultivares de porte alto, que são 30% mais função das normas para a produção orgâ- após o preparo da mistura (RIBEIRO et al.,
resistentes às geadas de irradiação ou gea- nica. Uma descrição mais detalhada sobre 1999).
das brancas, devido ao efeito de auto- formação de mudas em sistemas conven- Para a desinfecção do substrato, uma
sombreamento. Já no terço superior, as cionais poderá ser verificada em Alvarenga alternativa é o emprego da solarização. A
cultivares de porte baixo são as mais indi- et al. (2000) e Silva et al. (2000). Conside- cobertura do substrato com um filme plás-
cadas. São 30% mais resistentes às geadas rando o sistema orgânico, serão apresen- tico transparente eleva sua temperatura
de vento ou geada negra. No espigão, tados alguns detalhes importantes a seguir. em níveis letais a patógenos, porém com
recomendam-se cultivares compactas e O viveiro deverá ser instalado em ter- menor dano aos organismos benéficos
mais precoces; os danos são cerca de 30% reno seco (com excelente drenagem), com (MIZUBUTI; MAFFIA, 2001). Isso pode
menores nas geadas de vento, além de pro- topografia ligeiramente inclinada, ensola- ser feito esparramando o substrato em
piciarem o escape dos danos de geadas rado, protegido de ventos, servido de água camada fina sobre um terreiro cimentado
nos frutos verdes. Cultivares de arquitetura de qualidade e em quantidade suficiente ou sobre lona plástica preta. Sobre o subs-
compacta, de ramos inferiores baixos, como para as regas, de fácil acesso, distante das trato, é aberta uma lona plástica transpa-
as cultivares Catuaí e Iapar 59, oferecem lavouras de café, não sujeito a geadas. De- rente, bem esticada e fixada. Deve-se mantê-
proteção mais precoce ao tronco dos cafeei- verá também possuir um sistema de prote- lo sob o sol por quatro a cinco dias.
ros nos dois primeiros anos contra a “gea- ção contra enxurradas, com valas ou cor- Não existem ainda trabalhos sobre o
da de canela”. Deve-se também considerar dões elevados ao seu redor. controle de pragas que possam ocorrer nos
o vigor das cultivares e o espaçamento As sementes devem ser colhidas, prefe- viveiros orgânicos de café, porém, em sis-
utilizado no plantio, para recuperação rápi- rencialmente, de lavouras orgânicas. Não temas convencionais, existem as mais
da das plantas pós-geadas. Observa-se que sendo possível, poderá ser empregada a freqüentes como o bicho-mineiro, cocho-
cultivares de porte baixo, em plantios semente convencional, desde que seja nilhas e alguns insetos mastigadores (la-
adensados, recuperam-se de forma mais informado à certificadora e evite-se aqui- gartas, besouros, grilos) e formigas. Atual-
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46 Café Orgânico

mente, podem ser encontrados no mercado produção dentro das normas exis- para o café, com as seguintes etapas: marca-
óleos minerais emulsionáveis mais indi- tentes; ção das fileiras e sulcos de plantio - partin-
cados para o controle de bicho-mineiro e do das niveladas ímpares; foram feitos os
b) avaliar e aprimorar o conhecimento
da cochonilha e existem relatos do emprego sulcos de acordo com o espaçamento com
atual sobre a cultura, solos e ambi-
do ácido pirolenhoso 0,3%-0,5%, quando 30-40 cm de profundidade, dependendo do
entes;
necessário, com bons resultados. equipamento e da tração disponível (sulca-
Quanto às doenças, o controle cultural c) comparar cultivares; dor para cana-de-açúcar ou arado de aiveca);
seria o mais indicado, como: instalação dos d) testar modelos, considerando as fa- acertou-se o fundo do sulco com enxadão
viveiros em locais secos e arejados; utiliza- ces de exposição ao sol: Sul (café ou subsolador, deixando o fundo chato com
ção de substratos ricos em nutrientes e pro- consorciado com leguminosas ras- 30-40 cm de base. Marcaram-se os sulcos
venientes de solo bem estruturado; contro- teiras), leste (café arborizado e con- para o plantio de guandu e outras árvores
le de irrigação, evitando o encharcamento; sorciado com leguminosas rasteiras), que poderiam competir com o café (nos cor-
e pulverizações foliares semanais com Su- oeste e norte (sistemas agroflores- dões de contorno).
permagro (CARVALHO et al., 2002) em tais) (Fig. 8 a 14). Posteriormente, iniciou-se o processo
diluição 5% (fonte de N e micronutrientes), de calagem, gessagem (importante quan-
que, a partir do primeiro par de folhas defi- O preparo dos terrenos foi iniciado pela do o teor de Al3+ no subsolo for elevado) e
nitivo, tem-se mostrado eficiente no con- limpeza das áreas por meio de roçadas. Em adubação, levando em conta as recomen-
trole de cercosporiose. seguida, foram traçadas as niveladas bá- dações de Ribeiro et al. (1999) e as normas
sicas, perpendiculares à declividade, e as para a produção orgânica. A dose de calcá-
Implantação de cafezal em distâncias que variaram com essa decli- rio foi calculada em função do volume do
sistema orgânico vidade. As niveladas foram numeradas de sulco de plantio do café, sendo o calcário
cima para baixo, utilizando-se as pares para distribuído ao longo da terra retirada desse
Dependendo de cada situação, as prá- locação de carreadores. Foram traçados os sulco, misturando-o bem com a terra (outu-
ticas de conservação dos solos que deve- carreadores pendentes, em posição oblíqua bro); o mesmo foi feito com a adubação
rão ser adotadas, são divididas em: aos carreadores em nível, sem continui- orgânica, calculada em litros/metro de sul-
a) edáficas: selecionar as glebas de acor- dade destes. Às áreas com grandes pen- co (nos exemplos foram empregadas, após
do com a capacidade de uso; não dentes, foram adicionadas bacias de con- análises dos materiais, as opções: esterco
utilizar queimadas para limpeza do tenção de água (1,2m x 1,2m x 1,2m), nos de curral - 20 L/m, ou esterco de galinha -
terreno; preparar o solo em curvas carreadores pendentes, a cada 20-30m. 2,5 L/m, ou cama de galinha - 4,0 L/m). Para
de nível; realizar a calagem e as adu- Considerando o plantio do café entre as doses adicionadas de adubos orgânicos,
bações permitidas e toleradas para os meses de novembro e dezembro, iniciou- foram considerados dois fatores:
o cultivo do café, suas entrelinhas se a cobertura do terreno com o plantio de
mucuna preta em área total (fora carrea- a) a demanda de 15g de N por planta
etc.;
dores). Esse plantio foi importante para a no plantio de café;
b) vegetativas: reflorestamento de to-
realização de adubação verde que comple- b) que apenas 50% do N total seria
pos e grotas; cobertura vegetal per-
mentou a adubação orgânica de plantio do disponibilizado mais rapidamente; o
manente em áreas altamente sujeitas
café. Para isso, verificou-se a necessida- restante seria fornecido pela aduba-
à erosão; proteção de mananciais;
de de calagem para a mucuna, realizada em ção verde com a mucuna preta já em
cordões de contorno e culturas em
área total (agosto-setembro), com espar- fase de crescimento vegetativo.
faixas;
ramação a lanço e gradagem leve a 5 cm de
c) mecânicas: distribuição racional de profundidade; adubação com termofosfa- Uma parte da demanda inicial de P foi
vias de tráfego, sulcos, terraceamen- to, também com esparramação a lanço e se- reservada para aplicação de termofosfa-
to e bacias de contenção de água. meio de mucuna preta (setembro), a lanço to – 200 g/planta, na coveta de plantio (adu-
80 kg/ha - cinco sementes/m2 (ou em sulcos bação de arranque). A diferença entre o re-
O exemplo a seguir baseia-se em Uni- servado para as covetas e a recomendação
em espaçamento 0,5 m x 0,2 m - nesse caso,
dades Experimentais da EPAMIG, insta- de Ribeiro et al. (1999), foi adicionada jun-
com aplicação do termofosfato feita no
ladas no Sul e na Zona da Mata de Minas to com o calcário e a adubação orgânica,
sulco); gradagem rasa para incorporar o
Gerais. Os desenhos foram propostos pa- usando como fonte o fosfato natural - cal-
adubo e a semente (caso do semeio a lan-
ra ser testados em solos Latossólicos em culados em g/m de sulco, em função da re-
ço); o terreno foi percorrido para pisotear
altitudes acima de 800 m, com os seguintes
as sementes não incorporadas. comendação e da fonte de P. O gesso, quan-
objetivos:
Após o plantio da mucuna, iniciou-se do necessário, foi misturado com a terra do
a) desenvolver sistemas orgânicos de o sulcamento, calagem e adubação de sulco fundo do sulco.

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002


Café Orgânico 47

Figura 8 - Desenho esquemático para cafeeiros consorciados com leguminosas


NOTA: ♠ - Cafeeiro – 2,8-3,0 x 0,5-0,8 m; ® - Leguminosas rasteiras; Ψ - Guandu – cordões de contornos.

Foto: Paulo César de Lima

Figura 9 - Cafeeiros consorciados com leguminosas rasteiras

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002


48 Café Orgânico

Figura 10 - Desenho esquemático para cafeeiros arborizados


NOTA: ♣ - Abacateiro - 12 x 15m; Ψ - Bananeira - 12m (na linha) – cortadas quando os abacateiros estiverem sombreando; ♠ - Cafeeiro – 2,8-3,0
x 0,5-0,8 m ; ® - Leguminosas rasteiras.

Foto: Paulo César de Lima

Figura 11 - Cafeeiros arborizados com bananeiras

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002


Café Orgânico 49

Figura 12 - Desenho esquemático para cafeeiros em sistema agroflorestal


NOTA: ♣ - Abacateiro - 12m (mesma linha); ♠ - Cafeeiro – 2,8-3,0 x 0,5-0,8 m; ψ - Guandu; ® - Leguminosas rasteiras; ϕ -
Macadâmia – 12m (mesma linha); ¢D - Ingá – 20m (mesma linha).

Foto: Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata

Figura 13 - Implantação de sistema agroflorestal em propriedade de agricultor familiar, Sítio Pedra Redonda, Araponga, MG.
NOTA: Área central, superior e inferior reservadas para o plantio de árvores e guandu.

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002


50 Café Orgânico

Figura 14 - Cafeeiros consorciados com leguminosas (frente) e arborizados com bananeiras (fundos), Unidade Experimental EPAMIG
na Fazenda Serra das Águas, município de Heliodora, MG

Os sulcos de plantio foram preenchidos lateral com as mãos e retiraram-se os saqui- próximo da muda, evitando, assim, arrancar
com toda a terra adubada, não deixando nhos plásticos; o plantio foi feito no centro a muda do café junto com a planta invasora.
terra solta na entrelinha. Em seguida, rea- da cova, ficando o nível do torrão exata- As roçadas das plantas nas ruas foram
lizou-se o pisoteio com roda de trator ou mente no nível do terreno; juntou-se toda feitas de modo a não permitir a produção
com animais. A marcação das covetas de a terra em volta; pisoteou em volta com os de sementeiras, evitando também o cresci-
plantio (10-20 dias antes do plantio, ou seja, pés. mento excessivo do mato nas ruas.
em novembro) foi realizada bem alinhada- Trinta dias após o plantio, iniciaram-se Considerando a importância da cober-
mente na distância do espaçamento pro- as adubações de cobertura do café, aplican- tura do solo (evitar o impacto das gotas de
posto. As covetas foram abertas com enxa- do o segundo terço da dose recomendada chuva e o ressecamento pela exposição à
dão (20 x 20 x 20 cm) e misturados, com toda de sulfato de potássio por planta. Colocou- radiação) e suas implicações com relação à
a terra de dentro da coveta, 200g de termo- se o adubo no entorno das mudas (5 cm). competição com a cultura, as roçadas foram
fosfato por cova e 1/3 da dose de sulfato Na mesma ocasião foi realizada a roçada da realizadas mantendo o solo todo coberto,
de potássio recomendada por cova. mucuna preta da entrelinha, fazendo cober- principalmente durante o período chuvo-
Para o semeio das sementes de guandu turas mortas junto às mudas a, aproxima- so, o suficiente apenas para reduzir, a um
(início do período chuvoso, nos cordões damente, 5cm de distância. Aos 45, 60 e 90 mínimo, a competição com a cultura. O ro-
de contorno), as doses de calcário, de fos- dias após o plantio, fizeram-se pulveriza- çado é colocado no entorno das mudas de
fato de rocha e de matéria orgânica foram ções foliares com Supermagro 10%, com café, para melhorar a retenção de água e
reduzidas à metade da empregada para o as plantas túrgidas; também aos 60 dias, reduzir o crescimento do mato.
café. Sendo semeadas em sulcos rasos com aplicou-se o terceiro terço da dose recomen- O manejo de primeiro ano pós-plantio
espaçamento 50 x 20 cm e sete sementes/m dada de sulfato de potássio por planta. fez-se com roçadas e coberturas mortas
de sulco. O controle de plantas invasoras foi sempre que necessário; mantendo limpa
O transplantio das mudas de café foi realizado com arranquios e capinas do mato a linha do cafeeiro; pulverizações com
realizado da seguinte forma: foram selecio- na linha de plantio do café e roçadas no Supermagro (10%), a cada 60 dias, desde
nadas plantas com no mínimo três pares de meio da rua. O arranquio de plantas invaso- que haja umidade no solo e turgidez nas
folhas definitivas; cortaram-se os fundos ras da linha de plantio, junto às mudas de plantas; realização de amostragens de solo
dos saquinhos (dois dedos); fez-se o corte café, foi realizado firmando bem o pé no final do inverno para análise e recomen-

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002


Café Orgânico 51

dação de adubação para o próximo período REFERÊNCIAS orgânica e verde sobre a fertilidade do solo,
chuvoso. No início desse período, prepa- ALVARENGA, A.P.; MOURA, W.M.; RIBEIRO,
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rou-se para o plantio de leguminosas nas M.F. Escolha de variedades e produção de
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2000, Poços de Caldas. Resumos expandi-
parte foi com espécies perenes (depen- Boletim de Extensão, 42).
dos... Brasília: Embrapa Café, 2000. v.2,
de de multiplicação), como o amendoim- p.1389-1392.
forrageiro ou estilosantes, o restante, maior ANTUNES, F.Z. Caracterização climática do es-
FAZUOLI, L.C.; MEDINA FILHO, H.P.; GUER-
parte inicialmente, com crotalária ou outra tado de Minas Gerais. Informe Agropecuário,
REIRO-FILHO, O.; GONÇALVES, W.; SILVA-
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AUER, C.G.; SILVA, R. da. Fixação de nitrogênio selecionadas pelo Instituto Agronômico de Campi-
dões de contorno) para adubação verde, é
em espécies arbóreas. In: CARDOSO, E.J.B.N.; nas. In: SIMPÓSIO DE PESQUISA DOS CAFÉS
realizada sempre que a parte aérea atinge
TSAI, S.M.; NEVES, M.C.P. (Coord.). Micro- DO BRASIL, 1., 2000, Poços de Caldas. Resu-
1m de altura, a 40cm do solo, usando o ma-
biologia do solo. Campinas: Sociedade Brasilei- mos expandidos... Brasília: Embrapa Café, 2000.
terial para adubação verde do café. Para os
ra de Ciência do Solo, 1992. p.157-172. v.1, p.488-493.
sistemas arborizados, deverão ser feitas as
podas dos ramos laterais para condução BARROS, U.V.; BARBOSA, C.M.; MATIELLO, FERRÃO, R.G.; FONSECA, A.F.A.; FERRÃO,
das árvores, mantendo o caule ereto com J.B.; ALMEIDA, S.R.; RIBEIRO, A. Competição M.A.G. Programa de melhoramento genético de
copa na ponta e utilizando o material cor- de híbridos resistentes a ferrugem do cafeeiro e/ou robusta no Brasil. In: SIMPÓSIO DE ATUALI-
tado como cobertura morta. ao nematóide M. exigua, na Zona da Mata-MG. ZAÇÃO EM GENÉTICA E MELHORAMEN-
In: CONGRESSO BRASILEIRO DE PESQUISAS TO DE PLANTAS, 3., 1999, Lavras. Anais...
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é necessário ter conhecimento das normas 1999. p.27-28.
FERREIRA, A.J.; MATIELLO, J.B.; NETTO,
para essa produção, compreender o concei-
BRASIL. Decreto no 750, de 10 de fevereiro de K.A. Comportamento de algumas progênies e
to do ponto de vista filosófico e relacionar
1993. Dispõe sobre o corte, a exploração e a su- linhagens de Coffea arabica em relação a infesta-
o saber atual com um sistema pouco conhe-
pressão de vegetação primária ou nos estágios ção de bicho mineiro – Perileucoptera coffeella
cido, divulgado e utilizado.
avançado e médio de regeneração da Mata Atlân- (Guer.-Men., 1842). In: CONGRESSO BRASILEI-
A estratégia de transição de sistemas
tica, e dá outras providências. LEX – coletânea RO DE PESQUISAS CAFEEIRAS, 7., 1979,
convencionais para orgânicos na proprie-
de Legislação e Jurisprudência: legislação Araxá. Resumos... Rio de Janeiro: IBC-GERCA,
dade, por meio da implantação de talhões
federal e marginália, São Paulo, ano 57, p.94-96, 1979. p.222-224.
experimentais, talvez seja a mais adequada.
jan./fev. 1993.
Isso contemplaria uma questão importan- FRANCO, A.A.; BALIEIRO, F.C. Fixação bioló-
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aprender a integrar, relacionando ambien- tecimento. Instrução Normativa n o 7, de 17 nitrogenados. In: SIQUEIRA, J.O.; MOREIRA,
te, uso e transporte, com as produções de de maio de 1999. Dispõe sobre a produção de F.M.S.; LOPES, A.S.; GUILHERME, I.R.G.;
estercos, compostos, biofertilizantes, legu- produtos orgânicos vegetais e animais. LEX – FAQUIM, V.; FURTINI NETO, A.E.; CARVA-
minosas, outros insumos e café em siste- coletânea de Legislação e Jurisprudência: LHO, J.G. Interrelação fertilidade, biologia
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lhões daria tempo para que a propriedade
_______. Ministério das Minas e Energia. Proje- _______; SOUTO, S.M. Contribuição da fixação
se preparasse para atingir a meta de produ-
ção de insumos em prazo que amortece to RADAMBRASIL. Folhas SF. 23/24: Rio de biológica de N2 na adubação verde. In: FUNDA-
economicamente os impactos de atividades Janeiro/Vitória. Rio de Janeiro, 1983. 775p. ÇÃO CARGILL. Adubação verde no Brasil.
totalmente novas e de aprendizagem de um (RADAMBRASIL. Levantamento de Recursos Campinas, 1984. p.199-215.
sistema mais complexo. Naturais, 32).
GOLFARI, L. Zoneamento ecológico do esta-
É preciso dimensionar e programar um CARVALHO, V.L. de; CUNHA, R.L. da; do de Minas Gerais para reflorestamento.
conjunto de insumos e atividades que serão CHALFOUN, S.M. Manejo ecológico das princi- Belo Horizonte: Centro de Pesquisa Florestal
necessários antes de implantar um sistema pais doenças do cafeeiro. Informe Agropecuá- da Região do Cerrado, 1975. 65p. (Série Técni-
orgânico de produção de café. Ao contrá- rio, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.101-114, ca, 3).
rio do que muitos imaginam, o fator precisão
jan./abr. 2002.
é fundamental para se planejar uma pro- GUERREIRO-FILHO, O. Melhoramento do ca-
priedade orgânica. CHAVES, J.C.D. Efeito de adubações mineral, feeiro visando resistência à pragas. In: SIMPÓSIO

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002


52 Café Orgânico

DE ATUALIZAÇÃO EM GENÉTICA E ME- CONGRESSO BRASILEIRO DE PESQUISAS CA- to: ambiente, homem e instituições. Brasília: Se-
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Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.33-52, jan./abr. 2002


Café Orgânico 53

Conversão de cafezais
convencionais em orgânicos
Marta dos Santos Freire Ricci de Azevedo1
Paulo César de Lima2
José Antonio Azevedo Espíndola3
Waldênia de Melo Moura4

Resumo - O café é um importante produto agrícola brasileiro de exportação, sendo o Brasil, o maior
exportador mundial de café. Cresce em todo o mundo a expectativa sobre o mercado de produtos
orgânicos, dentre eles o café orgânico. Esse nicho de mercado, embora ainda pequeno, cresce a
uma taxa aproximada de 10% ao ano. A crescente demanda por produtos livres de resíduos de
agrotóxicos, por parte de produtores e consumidores, reflete uma nova realidade e interesse
inegável por este tema. Os produtos orgânicos (frutas, verduras e legumes produzidos sem
agrotóxicos) deixaram as lojas de artigos alternativos e foram alojar-se em geladeiras industriais e
prateleiras dos grandes supermercados. O tempo que transcorre, desde o início da conversão de
uma área até o recebimento do selo de orgânico, é chamado de transição. É o período necessário
para a troca das práticas agrícolas e de readequação biológica do sistema agropecuário. O tempo
necessário dependerá do tamanho da propriedade, das condições ambientais, especialmente de
solos, e do nível tecnológico adotado pelo cafeicultor. Antes de decidir pela conversão, o cafeicultor
deve primeiramente conscientizar-se do conceito, dos princípios e normas da agricultura orgânica
e das implicações práticas que a conversão trará, em termos de manejo do agroecossistema,
incluindo as relações com seus empregados e a forma de comercialização do produto. Alguns
aspectos, que se baseiam nos princípios e normas da agricultura orgânica e na vivência de
extensionistas, pesquisadores e produtores, podem servir de orientação inicial para aqueles que
desejam fazer a conversão. Os aspectos mais importantes a ser considerados pelo cafeicultor, são:
o respeito à natureza, a integração lavoura-pecuária e a diversificação da propriedade.
Palavras-chave: Cafeicultura orgânica; Agricultura orgânica; Transição; Controle cultural;
Sombreamento.

1
Enga Agra, Ph.D., Pesq. Embrapa Agrobiologia, Caixa Postal 74505, CEP 23851-970 Seropédica-RJ. Correio eletrônico: marta@cnpab.embrapa.br
2
Engo Agro, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTZM, Vila Gianetti, 46, Caixa Postal 216, CEP 36571-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: plima@ufv.br
3
Engo Agro, Ph.D., Correio eletrônico:jaespindola@uol.com.br
4
Enga Agra,D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTZM, Vila Gianetti, 46, Caixa Postal 216, CEP 36571-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: waldenia@ufv.br

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.53-61, jan./abr. 2002


54 Café Orgânico

INTRODUÇÃO Respeito à natureza tante exigente em solos, sendo este um as-


Este é o primeiro princípio a ser conside- pecto limitante para a obtenção de bons
No Brasil, é crescente a expectativa so-
rado, em que o cafeicultor deve reconhecer rendimentos. Logo, o cafeicultor em um sis-
bre o mercado de café orgânico. Esse nicho
as limitações da natureza, tais como clima, tema orgânico deve tratar o solo como um
de mercado, embora ainda pequeno, cresce
recurso natural, que sofre desgaste quando
a uma taxa aproximada de 10% ao ano. Costa solos, topografia, entre outras. Na agricul-
é mal manejado. Toda ação no sentido de
Rica, Peru, México, Guatemala, Nicarágua, tura convencional combate-se o problema
conservar e aumentar os teores de matéria
El Salvador, Brasil e Colômbia são os princi- ou o efeito, sem se preocupar com a causa,
orgânica do solo deve ser estimulado. Os
pais produtores de café orgânico. Os maio- que muitas vezes está nas condições ambien-
estercos constituem uma importante fonte
res consumidores são os Estados Unidos, tais inadequadas. As deficiências nutricio-
de matéria orgânica do solo e podem ser u-
Alemanha, Países Baixos, Suíça, França, nais, por exemplo, são corrigidas por meio tilizados diretamente nele ou compor com
Áustria e Japão. O mercado de café or- de aplicações de fertilizantes químicos in- outros resíduos orgânicos (vegetais e ani-
gânico é predominantemente constituído dustrializados, de alta concentração e solubi- mais) um substrato para ser compostado
por consumidores conscientes das ques- lidade. Os problemas fitossanitários são ou vermicompostado. Estas práticas são
tões ligadas à saúde, mas vem ganhando combatidos com a aplicação de defensivos de grande importância no processo de reci-
força pela adesão de um público ligado a químicos. clagem de nutrientes e aumento da matéria
questões de caráter ambiental (não-utiliza- Na agricultura orgânica, o produtor orgânica dos solos cultivados, devendo ser
ção de agrotóxicos e busca do equilíbrio solo/ deve buscar equilibrar o ambiente, para que bem vistas e praticadas pelo cafeicultor or-
planta) e social (respeito e valorização do a planta possa manifestar, plenamente, seus gânico.
trabalhador rural), é o chamado comércio mecanismos naturais de defesa, considera-
ético (fair trade), cuja imagem vem sendo dos como constituintes de uma verdadeira Integração lavoura-pecuária
associada a uma agricultura sustentável, “resistência orgânica” (AKIBA et al., 1999). Uma decisão importante no processo
agroecológica e/ou orgânica. Seguindo esse raciocínio, por exemplo, uma de conversão é a integração da cafeicultura
Muitos cafeicultores motivados pela ex- planta que cresce num ambiente pouco à atividade animal, a fim de garantir a produ-
pansão deste mercado, vêm buscando a diversificado, com baixa presença de inimigos ção de esterco, reduzindo, dessa forma, os
conversão, isto é, a transformação de suas naturais, onde o solo é pobre e com baixo custos, além de evitar a utilização de ester-
propriedades convencionalmente maneja- teor de matéria orgânica, em condições de cos não permitidos pelas entidades certifica-
das, para orgânicas. estresse hídrico ou nutricional, estará sujei- doras. Nesse caso, a atividade animal deve
ta mais facilmente a ataque de pragas e do- ser realizada conforme as regras estabeleci-
ASPECTOS A enças. das pela agricultura orgânica, descritas na
SER CONSIDERADOS A matéria orgânica é considerada peça Instrução Normativa no 7, de 17 de maio de
NA CONVERSÃO fundamental para a manutenção das carac- 1999 (BRASIL, 1999).
terísticas físicas, químicas e biológicas do No caso de esterco obtido fora da propri-
Antes de decidir pela conversão, o ca-
solo, conseqüentemente, do equilíbrio solo- edade, o produtor deve ficar atento à origem
feicultor deve, primeiramente, conscien-
dele, especialmente quanto à presença de
tizar-se do conceito, dos princípios e nor- planta. A matéria orgânica melhora a estru-
aditivos químicos e/ou estimulantes, medi-
mas da agricultura (cafeicultura) orgânica tura do solo, reduz a plasticidade e a coesão,
camentos e alimentos não permitidos. Reco-
e das implicações práticas que a conversão aumenta a capacidade de retenção de água
menda-se, neste caso, que antes de utilizar
trará em termos de manejo da cultura, adap- e a aeração, o que permite maior penetração
o esterco, o produtor peça autorização à
tações necessárias na propriedade, relações e distribuição das raízes. É a principal fonte
certificadora, a fim de evitar problemas
com seus empregados e forma de comercia- de macro e micronutrientes essenciais às futuros.
lização do produto. Esclarecimentos sobre plantas, além de atuar indiretamente na dis-
o assunto podem evitar procedimentos ponibilidade destes, devido à elevação do Diversificação
incorretos que resultarão em insucesso no pH; aumenta a capacidade de retenção dos da propriedade
futuro. nutrientes, evitando perdas, diminui o efeito Outro princípio importante a ser assimi-
No Brasil, os resultados de pesquisa nocivo do alumínio trocável. Biologicamen- lado no cenário da cafeicultura orgânica é
sobre conversão de propriedades conven- te, a matéria orgânica aumenta a atividade o da diversificação de culturas na proprie-
cionais em orgânicas são praticamente ine- dos microrganismos do solo, por ser fonte dade. É cientificamente reconhecido que a
xistentes. Entretanto, alguns aspectos com de energia e de nutrientes (KIEHL, 1981, simplificação do agroecossistema, através
base nos princípios e normas da agricultura 1985), tornando-o um organismo vivo. Por da maximização de monocultivos, torna-
orgânica e na vivência de extensionistas, estas razões, um solo rico em matéria orgâ- o biologicamente instável, devido à bai-
pesquisadores e produtores podem servir nica com nutrientes e organismos pode ser xa diversidade desses sistemas agrícolas
de orientação inicial àqueles que desejam considerado um solo saudável. (ALTIERI, 1989). Isto explica a ocorrência
fazer a conversão. É sabido que a cultura do cafeeiro é bas- cada vez maior de pragas e agentes de doen-
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Café Orgânico 55

ças, atingindo níveis de danos econômicos, desse plano. Um contrato deve ser firmado sejam degradados no solo (LÓPEZ DE
bem como o surgimento de novas pragas entre o cafeicultor ou a organização produto- LEÓN; MENDOZA DÍAZ, 1999).
(USDA, 1984, MONTECINOS, 1996, PÉREZ; ra e o órgão certificador. A documentação A conversão deve ser feita por etapas,
POZO, 1996). da propriedade, contendo dados gerais, as- substituindo os fertilizantes químicos pelos
Nos sistemas em que a diversificação de sim como um mapa da propriedade e uma orgânicos. Aconselha-se dividir a proprie-
espécies é maior, verifica-se uma nítida re- lista das áreas de plantio registradas devem dade em áreas ou talhões uniformes quanto
dução da incidência de fitoparasitas, quan- ser colocados à disposição. Os livros da ao ambiente (condições de solos, topogra-
do comparados a sistemas monoculturais propriedade devem conter registros dos in- fia, exposição solar etc). A partir daí, o cafei-
(RISCH et al., 1983, LIEBMAN, 1996). A sumos, produtividade e fluxo dos produtos cultor deve fazer um planejamento para con-
hipótese é de que, em ambientes heterogê- no processamento, armazenamento, empa- verter, anualmente, 20% a 25% da área total.
neos (policultivos), existe maior abundância cotamento/embalagem e vendas. Uma lista No Quadro 1 pode ser visto um exemplo,
e diversidade de inimigos naturais. Os pre- detalhada de insumos agrícolas deve ser onde a propriedade foi dividida em cinco
dadores tendem a ser polífagos e beneficiam- posta à disposição da certificadora para talhões, cada qual correspondendo a cerca
se de diferentes habitats, onde podem en- aprovação. No início da conversão, parâme- de 20% da área total a ser convertida. Nor-
contrar um maior número de hospedeiros e tros sociais como moradia, condições de a- malmente, o cafeicultor faz três aplicações
presas alternativas. A diversificação espacial, limentação e higiene serão inventariados e de fertilizante em cobertura por ano, utilizan-
por sua vez, permite estabelecer barreiras um plano de melhoria será apresentado. Na do formulações NPK, tais como 20-05-20
físicas que dificultam a migração de insetos implementação desses parâmetros será ob- ou 20-00-20, que deverão ser substituídas
e alteram seus mecanismos de orientação, servado o cronograma de execução. Amos- gradualmente. No primeiro ano, o primeiro
como no caso de espécies vegetais aromáti- tras podem ser colhidas pelo órgão certifica- talhão receberá duas coberturas com a for-
cas e de porte elevado (VENEGAS, 1996). dor para análise de resíduos. mulação química e a terceira deve ser subs-
O aumento da biodiversidade como conse- tituída pelo adubo orgânico, em quantidade
qüência da diversificação é, por conseguin- Transição das lavouras correspondente à cobertura química que
te, um elemento-chave para a tão desejada O tempo que transcorre desde o início da seria utilizada. Os demais talhões deverão
sustentabilidade. conversão de uma área até o recebimento do continuar recebendo as coberturas com NPK.
A diversificação de culturas pode ser selo de orgânico é chamado transição. A du- No ano seguinte este procedimento deve
promovida por meio de plantio de faixas ou ração desse período pode variar de um a cin- ser repetido num segundo talhão e, assim,
“ilhas” de vegetação arbórea, consorciação co anos, dependendo das condições iniciais sucessivamente. No segundo ano de con-
de culturas e uso de adubos verdes, especi- do sistema (resíduos de pesticidas, perdas versão, o primeiro talhão receberá uma co-
almente de espécies leguminosas. de solo, carência de diversidade). Em geral, bertura com N e duas com adubo orgânico.
as certificadoras de produtos orgânicos pe- No terceiro ano, as três coberturas serão
CONVERSÃO DA PROPRIEDADE dem três anos como período mínimo de tem- orgânicas. Este talhão, no quinto ano, po-
po para certificar um produto ou uma proprie- derá receber o certificado de orgânico, caso
Há necessidade de o cafeicultor entender
dade como orgânica (VENEGAS, 1996). todos os outros critérios tenham sido aten-
a filosofia do movimento, respeitando os
De acordo com a Instrução Normativa didos.
princípios e normas estabelecidos. Um siste- no 7, de 17/05/1999 (BRASIL, 1999), o tempo Os defensivos químicos devem ser sus-
ma agrícola, em que houve tão-somente a mínimo necessário para produção vegetal pensos de imediato, substituindo-os por
substituição de insumos, pode não credenci- de culturas perenes para a unidade de pro- pulverizações foliares, de caráter preventivo,
ar o produtor como orgânico, visto que as dução em conversão deve ser de 18 meses utilizando-se caldas (bordalesa, sulfocál-
entidades certificadoras consideram im- no manejo orgânico, para que a colheita cica etc.) e biofertilizantes, respeitanto o li-
prescindível o respeito a todas as práticas subseqüente seja certificada, podendo es- mite de uso desses produtos (número e con-
que padronizam suas normas regulamentares. tender-se até 36 meses em sistemas degra- centração de aplicação) e observando os
De acordo com as normas da Internati- dados ou quando o uso de insumos e defen- cuidados na pulverização. O ideal é que o
onal Federation of Organic Agriculture sivos químicos for elevado. cafeicultor faça também um cronograma jun-
Movements (Ifoam) (ORGANIZAÇÃO..., Em propriedades onde as lavouras são to a um técnico.
1997), a conversão deve ser feita seguindo manejadas com o uso mínimo de insumos, A divisão em talhões facilita a reestru-
um planejamento anual. O interessado deve um período de 18 meses será suficiente para turação da propriedade e o planejamento
preparar um projeto de conversão, que será o cumprimento dos requisitos. Por outro das ações, especialmente quanto à necessi-
apresentado ao órgão certificador no mo- lado, propriedades onde o manejo das la- dade de mão-de-obra e de insumos orgâni-
mento em que for requerida a certificação, vouras é altamente tecnificado ou semitec- cos. Não é aconselhável fazer a conversão
ou ao inspetor por ocasião de sua primeira nificado, será necessário um período míni- completa no primeiro ano, isto é, substituir
visita. A caracterização da propriedade co- mo de três anos para a transição, tempo de uma só vez todo o fertilizante químico
mo orgânica dependerá do cumprimento previsto para que os resíduos de agrotóxicos pelo orgânico. Uma conversão imediata po-
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QUADRO 1 - Exemplo de um cronograma de transição de diferentes talhões em uma propriedade em conversão para orgânica, em termos de substituição
de fertilizantes

Talhão Ano Área


(n o ) convertida
1o 2o 3o 4o 5o 6o 7o 8o 9o (%)

1 2 coberturas 1 cobertura 3 coberturas 3 coberturas Certificado Certificado Certificado Certificado Certificado 20


químicas nitrogenada orgânicas orgânicas
+ 1 orgânica + 2 orgânicas

2 Convencional 2 coberturas 1 cobertura 3 coberturas 3 coberturas Certificado Certificado Certificado Certificado 40


químicas nitrogenada orgânicas orgânicas
+ 1 orgânica + 2 orgânicas

3 Convencional Convencional 2 coberturas 1 cobertura 3 coberturas 3 coberturas Certificado Certificado Certificado 60


químicas nitrogenada orgânicas orgânicas
+ 1 orgânica + 2 orgânicas

4 Convencional Convencional Convencional 2 coberturas 1 cobertura 3 coberturas 3 coberturas Certificado Certificado 80


químicas nitrogenada orgânicas orgânicas
+ 1 orgânica + 2 orgânicas

5 Convencional Convencional Convencional Convencional 2 coberturas 1 cobertura 3 coberturas 3 coberturas Certificado 100
químicas nitrogenada orgânicas orgânicas
+ 1 orgânica + 2 orgânicas

NOTA: Convencional - Adubação química convencional com três aplicações em coberturas da formulação química usual; Certificado - Certificado de orgânico.

de submeter a planta a um estresse nutricio- Recomendações para o Uso de Corretivos no fornecimento de nutrientes para o cafe-
nal, predispondo-a a um ataque severo de e Fertilizantes em Minas Gerais (RIBEIRO eiro está diretamente relacionada com a sua
pragas e doenças. Convém salientar que, a et al., 1999), e o teor de N contido em cada decomposição. Por sua vez, a decomposição
partir do início da conversão, no plantio de fonte (Quadro 3). é um processo biológico influenciado por
novas áreas, o produtor deverá escolher cul- Contudo, a eficiência desses adubos vários fatores (composição química dos
tivares resistentes à ferrugem, visto que
esta é a principal doença da cultura e, até o QUADRO 2 - Doses de N recomendadas em função da produtividade esperada e do teor foliar de N
momento, a única forma de escapar da do- Teor de N foliar
ença no sistema orgânico. (dag.kg-1)
Somente a substituição de insumos quí- Produtividade esperada
Baixo: < 2,5 Adequado: 2,6 - 3,0 Alto: 3,1 - 3,5
(sacas/ha)
micos por orgânicos não é suficiente para
a conversão, mas é o começo. Paralelo a kg N /ha/ano
esse trabalho, o cafeicultor deve buscar al- < 20 200 140 80
ternativas para melhorar a sua propriedade, 20-30 250 175 110
visualizando-a como um organismo vivo. 30-40 300 220 140
40-50 350 260 170
Disponibilidade
50-60 400 300 200
de nutrientes
> 60 450 340 230
Diversos materiais podem ser emprega-
NOTA: dag.kg-1, no Sistema Internacional de Unidades corresponde à %.
dos como adubos orgânicos em cafezais,
tais como esterco, composto, vermicompos- QUADRO 3 - Teores médios de N contido em diferentes fontes de adubo orgânico
to e adubos verdes. A quantidade de adubo
Esterco de galinha
orgânico a ser aplicado deve ser calculada Esterco de Esterco de Esterco de Composto
curral gado leiteiro Com Sem suínos orgânico
de acordo com a dose de N recomendada
maravalha maravalha
em função da produtividade esperada e do
teor deste nutriente no tecido foliar (Qua- 71 % 1,10% 2,74 % 3,35 % 2,32 % 1,13 %
dro 2), conforme a 5a Aproximação das FONTE: De-Polli (1988).

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adubos orgânicos; temperatura e umidade gânica podem ser evitados com a sincroni- o que pode ser explicado através das condi-
do solo; manejo do agroecossistema). Den- zação entre a liberação de nutrientes pelos ções adversas de temperatura e precipita-
tre esses fatores, merece destaque a com- adubos orgânicos e sua demanda pelo cafe- ção observadas nesse período.
posição química dos adubos orgânicos, eiro. Uma forma de obter essa sincroniza- Certas práticas de manejo do cafezal
que tem como principais indicadores a re- ção é através da mistura de materiais com também afetam a disponibilidade de nutri-
lação entre as quantidades de C e N (rela- diferentes relações C:N (MYERS et al., 1994), entes do solo. Dentre essas práticas, me-
ção C:N) e os teores de lignina e polifenóis. seja pela compostagem ou pela adubação rece destaque a formação de cobertura ve-
Tais características afetam principalmente verde com mais de uma espécie vegetal. O getal permanente do solo, que pode ser
a disponibilidade de N para as plantas. Quadro 4 mostra as relações C:N e os teores obtida pelo consórcio de café com espécies
Materiais orgânicos com baixa relação de lignina e polifenóis relatados para alguns arbóreas. Numa comparação entre os sis-
C:N (< 25) adicionados ao solo sofrem mine- adubos orgânicos. temas de cultivo convencional e arboriza-
ralização, fornecendo N para o cafeeiro. Se No caso dos adubos verdes, a época de do, Babbar e Zak (1994) constataram que
a mineralização for muito rápida, poderá ha- corte também influencia na decomposição o cafeeiro sombreado tem maior ciclagem
ver perdas desse nutriente através de pro- dos resíduos adicionados ao solo. A Região de N, reduzindo as perdas desse nutriente
cessos como a lixiviação. Por outro lado, Sudeste do Brasil apresenta duas estações nos agroecossistemas.
materiais orgânicos com alta relação C:N distintas: verão quente e chuvoso e inverno Pelo que foi discutido, a condução da
(> 25) causam imobilização do N do solo seco com temperaturas amenas. Em condições fertilidade do solo em cafezais orgânicos
por um período, reduzindo os teores dispo- climáticas semelhantes, Thomas e Asakawa deve levar em consideração aspectos liga-
níveis (HAYNES, 1986). Recentemente, es- (1993) avaliaram o tempo de meia-vida de dos à composição química dos adubos or-
tudos têm demonstrado que a adição de leguminosas (período necessário para que gânicos, sua época de aplicação e práticas
resíduos vegetais com altos teores de ligni- metade do material orgânico adicionado ao de manejo. Tais aspectos devem ser combi-
na e polifenóis ao solo também promove solo sofra decomposição) cortadas em dife- nados de forma que criem condições favo-
imobilização do N (PALM; SANCHEZ, 1991, rentes épocas do ano. Os resultados encon- ráveis ao fornecimento de nutrientes para
MATTA-MACHADO et al., 1994). Os pro- trados nesse estudo revelam aumentos de os cafeeiros.
blemas associados à perda ou imobilização até três vezes no tempo de meia-vida dos
de nutrientes causados pela adubação or- resíduos durante a estação seca (Quadro 5), Controle de invasoras
As plantas que ocorrem espontanea-
QUADRO 4 - Relação C:N, teores de lignina e polifenóis de alguns adubos orgânicos mente na área são chamadas invasoras ou
Adubos Relação Lignina Polifenóis daninhas, por ser consideradas mais causa-
orgânicos C:N (g.kg -1) (g.kg -1) doras de danos do que de benefícios às
Estercos plantas cultivadas (SANTOS et al., 2000).
Aves 11 - - Todavia, para a agricultura orgânica, nem
Bovinos 32 - - toda planta invasora é considerada dani-
Suínos 16 - - nha. Tal idéia é defendida, considerando-se
Composto 10 - - os seguintes fatos:
Adubos verdes a) essas plantas são capazes de reciclar
Amendoim-forrageiro (Arachis pintoi) 18 116 24
nutrientes das camadas mais profun-
Cudzu tropical (Pueraria phaseoloides) 20 105 19
das do solo para a superfície, disponi-
Desmódio (Desmodium ovalifolium) 17 91 36
bilizando-os novamente ao cafeeiro;
Guandu (Cajanus cajan) 11 102 33
Siratro (Macroptilium atropurpureum) 21 110 20 b) promovem a descompactação do solo;
FONTE: Dados básicos: Kiehl (1985), Palm e Sanchez (1991), Espíndola (2001). c) protegem o solo da erosão e da inso-
lação;
QUADRO 5 - Tempo de meia-vida da matéria seca de leguminosas cortadas durante as estações seca
e chuvosa d) aumentam a aeração e a retenção de
Tempo de meia-vida
água dos solos;
Leguminosas
Estação seca Estação chuvosa e) aumentam a diversidade de espécies
(dias) (dias) ocorrentes na área que podem auxi-
Amendoim-forrageiro 150 50 liar no controle biológico de pragas;
Cudzu tropical 218 111 f) podem ser utilizadas na preparação
Desmódio 251 136 de compostos orgânicos e de biofer-
FONTE: Dados básicos: Thomas e Asakawa (1993). tilizantes foliares, quando cortadas.
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58 Café Orgânico

A partir da conversão, o cafeicultor de- rado, presta-se bem para áreas pequenas nica que apresenta bom rendimento, não
ve assimilar duas novas realidades: herbici- ou declivosas. necessita de mão-de-obra especializada, uti-
das não mais poderão ser utilizados e o O método mecânico consiste na utiliza- liza equipamentos relativamente baratos e
cafezal não deve ser deixado completamen- ção de implementos tracionados por tratores presta-se muito bem para áreas declivosas
te no limpo. O procedimento correto é efetu- ou animais (enxadas, cultivadores, roçadei- e/ou onde o espaçamento é pequeno entre
ar a capina manual completa na linha, abran- ras etc.). Na medida do possível, deve-se as linhas. As principais desvantagens ofere-
gendo uma faixa ligeiramente mais larga que minimizar a utilização de certos implemen- cidas por este método são: exposição do
a projeção da copa do cafeeiro, deixando-a tos, como a enxada rotativa, que, com o uso terreno à erosão mais do que o método ma-
contínuo, pode causar a desagregação da nual, eficiência somente onde o mato está
livre de invasoras, evitando a competição
estrutura do solo, expondo-o à erosão e a baixo, além da necessidade de um animal
destas por água e nutrientes. Nas ruas ou
altas temperaturas. Em áreas declivosas, o treinado.
entrelinhas as invasoras não devem ser er-
controle mecânico deve ser excluído. O controle das invasoras deve ser feito
radicadas totalmente, mas sim manejadas
O controle físico consiste no impedi- sempre que estas atingirem grande desen-
ou controladas por meio de roçadas com
mento da germinação de invasoras pela uti- volvimento e antes do florescimento delas.
foice, roçadeira tratorizada ou tipo costal. A melhor maneira de controlar o mato no
Em áreas menores, a roçada pode ser substi- lização de barreiras físicas, tais como cober-
sistema orgânico, durante qualquer época
tuída pela capina seletiva nas ruas ou entre- tura morta ou viva (adubos verdes ou con-
do ano, é proceder à capina manual comple-
linhas, mantendo-se a capina manual com- sorciação de culturas), cobertura inerte que
ta na linha, deixando o cafeeiro inteiramente
pleta na linha. A capina seletiva é realizada, não cause contaminação e poluição (a cri-
livre da competição por água. Nas entre-
visando eliminar apenas as espécies mais tério da certificadora), uso de filmes de poli-
linhas, o mato deve ser apenas roçado.
etileno (solarização), o que é inviável para
agressivas. Devido a não-utilização de her-
a cafeicultura, dado o custo do material e Arborização de cafezais
bicidas, os gastos com mão-de-obra no
mão-de-obra para a sua colocação. A co-
controle de invasoras no sistema orgânico O cafeeiro é originário de florestas ca-
bertura morta pode representar alto custo
podem ser superiores aos do sistema con- ducifólias da Etiópia, onde as árvores dos
com transporte do material para o cafezal,
vencional, dependendo das condições como extratos mais altos perdem as folhas entre
além de mão-de-obra para espalhá-lo. A co-
idade da lavoura, espaçamento, fertilidade os meses de julho a setembro, quando o
bertura viva, com espécies leguminosas ou
do solo, clima etc. A aquisição de roça- cafeeiro mais necessita de luz para a flora-
não, constitui excelente alternativa para o
deiras costais pode auxiliar sobremaneira o ção (CEPA, 1971). É, portanto, uma espécie
controle de invasoras, do ponto de vista e-
cafeicultor no processo de conversão, re- adaptada à sombra, embora, no Brasil, a
cológico. Tais culturas aumentam a bio- maioria das lavouras seja conduzida a pleno
duzindo bastante os custos com mão-de-
massa do solo, estimulam a atividade micro- sol.
obra.
biológica por serem fonte de carbono, adici- Arborização é o termo usado para o som-
Dentre os métodos de controle de inva-
onam nitrogênio ao sistema via fixação bio- breamento ralo dos cafezais. Trata-se de
soras, excetuando o uso de herbicidas (mé-
lógica, no caso de espécies leguminosas, um recurso utilizado para diversificar os mo-
todo químico), todos os outros são permiti-
aumentam a biodiversidade dos sistemas, nocultivos de cafeeiro, sendo comum em
dos (manual e físico) ou tolerados (mecânico)
além de constituírem um retorno extra ao países produtores da América Latina, tais
na cafeicultura orgânica.
cafeicultor. Entretanto, apesar desses bene- como Colômbia, Venezuela, Costa Rica,
O método preventivo é o mais ecológico
fícios, a cobertura viva requer do produtor Panamá, México. As espécies mais comuns
e barato. Consiste em impedir a entrada de
um certo conhecimento e um manejo cuida- utilizadas são: leguminosas ingazeiro (Inga
sementes ou propágulos de plantas da- doso, a fim de que não haja competição sp.) e Erythrina poeppigiana, fruteiras,
ninhas, por meio de implementos, rodas de por água e nutrientes com o cafeeiro, além como a bananeira (Musa spp.), e citros
trator, água de irrigação, sacarias e, princi- de ser possível somente em lavouras jovens (Citrus spp.) e espécies madeireiras, tais
palmente, esterco de gado, responsável por ou menos adensadas. como o freijó-louro (Cordia alliodora) e o
uma significativa introdução de espécies O controle biológico também é reco- cedro (Cedrela odorata) (BEER, 1997).
invasoras. Por esta razão, é de grande im- mendado, embora exija maior conhecimento A arborização, entretanto, deve ser uma
portância compostar o esterco antes de uti- por parte de técnicos e produtores. Para o prática adotada somente em áreas onde não
lizá-lo, porque a elevação da temperatura controle correto de invasoras, o produtor ocorre déficit hídrico, em áreas sujeitas a
durante a fermentação reduz consideravel- deve fazer uma associação de métodos. Du- geadas, ou com elevada insolação.
mente a germinação de sementes e propá- rante o ano, ou de um ano para o outro, Em países produtores de café das Amé-
gulos de invasoras. devem-se variar os métodos de controle, ricas do Sul e Central, o sombreamento é
O controle manual pode ser feito com ou buscando maior eficiência, economia e pre- uma condição necessária para a conversão
sem uso de enxada, na faixa de projeção da servação ambiental. em orgânico. No Brasil, entretanto, o som-
copa. Este método, apesar de caro e demo- A tração animal é o tipo de capina mecâ- breamento vem sendo estimulado pelas
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Café Orgânico 59

certificadoras e técnicos da área, porém não rios, quando comparada ao cultivo a pleno sam este sombreamento e mantêm o cres-
constitui uma condição limitante. sol. Os principais efeitos esperados são: cimento normal. Atualmente, as cultiva-
Nas Regiões Sudeste e Sul do Brasil, a produção de internódios mais longos; re- res comerciais de café são mais adaptadas
maioria das lavouras cafeeiras é constituída dução do número de folhas, porém de maior a pleno sol, porém, apresentam bienali-
por monocultivos de café Arábica. No Norte tamanho; produção de frutos maiores, mais dade de produção e menor longevidade
e no Nordeste, regiões de clima quente, on- moles e açucarados; melhoria do aspecto (CAFÉ ..., 2000).
de predomina o cultivo do café Conillon, a vegetativo do cafeeiro; aumento do número Um aspecto importante a ser considera-
arborização é uma prática tradicional que de ramos primários e secundários; aumen- do, é que o sombreamento uniformiza a matu-
favorece o aspecto vegetativo e a produti- to da capacidade produtiva do cafeeiro; ração do fruto, facilita a catação manual
vidade a longo prazo, quando comparada obtenção de cafés com bebida mais suave; dos grãos cereja, contribui para a qualida-
à cultura a pleno sol. redução na bienalidade de produção; me- de do produto (MATIELLO; COELHO,
No Espírito Santo, maior produtor naci- nor incidência da seca dos ponteiros e de 1999).
onal de Conillon, foi iniciado em 1986, no cercosporiose. Outro fato a ser considerado, é que la-
Norte do Estado, um trabalho de implanta- Em regiões quentes e com menor altitu- vouras arborizadas ou em consórcios agro-
ção de árvores e arbustos em lavouras de de, a arborização é recomendada com base florestais, fazem com que o produtor obtenha
cafeeiro Conillon, utilizando-se espécies ar- na fisiologia das plantas, para reduzir os maior retorno econômico (frutas, madeiras
bóreas pioneiras, frutíferas, primárias e in- picos de temperatura e elevar as mínimas, etc.), fator importante em pequenas proprie-
termediárias, formando Sistemas Agroflo- criar condições para conservar a umidade dades (BEER, 1997), ou nos períodos em que
restais. do solo e do ar, reduzir a evapotranspira- o preço do café está em baixa.
Em Rondônia, segundo maior produtor ção e a ação dos ventos, principal causa Existem dois tipos de sombreamento, o
brasileiro de café Conillon, nos anos 70, temporário ou provisório e o permanente.
de ressecamento.
produtores iniciaram consórcios de cafeeiro O primeiro serve de proteção ao cafeeiro,
Do ponto de vista de solos, a arborização
com a seringueira (Hevea brasiliensis), na fase inicial da lavoura, devendo ser elimi-
proporciona a adição de matéria orgâni-
cedro (Cedrela odorata), freijó-louro (Cordia nado quando o sombreamento definitivo
ca, devido à queda de folhas e à redução
alliodora), bandarra (Schizolobium
da decomposição destas pela diminuição estiver estabelecido. Para este tipo de som-
amazonicum), teca (Tectona grandis) e
da temperatura do solo, assim como redu- breamento, são utilizadas espécies anuais
algumas espécies regionais, tais como o
ção das perdas de N, que contribuem pa- ou perenes, de pequeno porte, sendo a ba-
cupuaçu (Theobroma grandiflorum), gua-
ra a melhoria da fertilidade (MUÑOZ; nana, a espécie mais utilizada no Brasil e paí-
raná (Paullinia cupana), pimenta-do-reino
ALVARADO, 1997). Destaca-se pelo seu ses latinos.
(Piper nigrum), entre outras.
efeito sobre a conservação da umidade do Na seleção de espécies para o sombrea-
No Ceará, na Serra do Baturité, o cultivo
solo, que, associada à maior presença de mento definitivo, os seguintes requisitos
do cafeeiro Arábica sombreado com inga-
matéria orgânica, favorece a biologia e a devem ser observados:
zeiro (Inga ingoides) e bananeira iniciou-
se no século passado, sendo uma opção microbiologia do solo. A presença de árvo- a) ser adaptada às condições ambien-
para aumentar o rendimento econômico das res diminui o impacto das chuvas sobre o tais da região;
lavouras. solo, aumenta a capacidade de absorção e
infiltração de água, reduzindo o risco de b) ser preferencialmente da família das
Os poucos estudos existentes sobre ar-
erosão, aspecto importante para a conser- leguminosas, para fixar nitrogênio;
borização de lavouras de café, demonstram
que a sombra reduz a produção, tanto do vação dos solos, especialmente em áreas c) ter crescimento rápido e vida lon-
Arábica, como do Conillon (GONZÁLEZ onde o declive é acentuado. Quando as ga;
GONZÁLEZ, 1980, DETLEFSEN R., 1988, espécies utilizadas são leguminosas, ocor-
re uma adição de N no sistema via fixação d) ter sistema radicular profundo, a fim
HERNÁNDEZ et al., 1997). Tais estudos,
biológica e, conseqüentemente, a disponi- de não concorrer por água e nutrien-
entretanto, foram realizados com sombrea-
bilidade deste nutriente no solo. Agroecos- tes com as raízes do cafeeiro;
mento denso, sendo os resultados, pouco
estimuladores. Por outro lado, o cultivo a sistemas diversificados podem funcionar e) não possuir espinhos e ser resisten-
pleno sol tem apresentado problemas de como banco de estoque de carbono do solo te a ventos;
superprodução e conseqüente esgotamen- e da vegetação, recuperando parte do CO2
f) ter copa rala ou então perder as fo-
to das plantas, durante os primeiros anos, perdido.
lhas no período de julho a setembro,
até que o auto-sombreamento diminua esse Em áreas de baixa altitude e alta tempera-
meses em que o cafeeiro necessita
efeito (SOUZA et al., 2000). tura, o sombreamento parcial pode ser
de mais luz para o florescimento;
Segundo Fernandes (1986), a arboriza- necessário para aumentar a sustentabilidade
ção, com espécies e espaçamentos adequa- da cultura. Mesmo submetidas a um som- g) ter boa capacidade de rebrota e pro-
dos, pode apresentar resultados satisfató- breamento de até 50%, as plantas compen- porcionar bom aporte de nutrientes;

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60 Café Orgânico

h) proporcionar retorno adicional, tais possa manifestar plenamente seus meca- herbáceas perenes usadas como cobertura
como lenha ou alimentos; nismos de produção, de uma forma saudá- viva do solo e sua influência sobre a produ-
vel, respeitando e valorizando o produtor ção da bananeira (Musa spp.). 2001. 144p.
i) não exigir podas freqüentes;
rural. Tese (Doutorado) – Universidade Federal Rural
j) não ser susceptível a pragas e doen- do Rio de Janeiro, Seropédica.
ças que possam prejudicar o cafeei- REFERÊNCIAS FERNANDES, D.R. Manejo do cafezal. In:
ro;
AKIBA, F.; CARMO, M.G.F. do; RIBEIRO, R.L.D. RENA, A.B.; MALAVOLTA, E.; ROCHA, M.;
k) manter as folhas nos períodos de As doenças infecciosas das lavouras dentro de uma YAMADA, T. (Ed.). Cultura do cafeeiro: fa-
geadas e ventos frios. visão agroecológica. Ação Ambiental, Viçosa, tores que afetam a produtividade. Piracicaba:

No que diz respeito à percentagem de MG, v.2, n.5, p.30-33, abr./maio 1999. POTAFOS, 1986. p.275-301.

sombra, recomendam-se 30% a 40%, depen- ALTIERI, M.A. Agroecologia: as bases cientí- GONZÁLEZ GONZÁLEZ, L.E. Efecto de la
dendo das condições de clima e da fertilida- ficas da agricultura alternativa. Rio de Janeiro: asociación de laurel (Cordia alliodora (Ruiz
de do solo. Há duas maneiras de obter a taxa ASPTA/FASE, 1989. 240p. y Pav.) Oken) sobre producción de café
de sombreamento desejada. A primeira, é (Coffea arabica L.) com y sin sombra de poró
por meio do espaçamento adotado, poden- BABBAR, L.I.; ZAK, D.R. Nitrogem cycling in (Erythrina poeppigiana (Walpers) O.F. Cook).
do ser mais ou menos adensado de acordo coffee agroecosystems: net mineralization and 1980. 110p. Tesis (Mag Sc) – Centro Agronó-
com o porte de cada espécie. Para espécies nitrification in the presence and absence of shade mico Tropical de Investigación y Enseñanza,
de pequeno porte, deve-se optar por espa- trees. Agriculture, Ecosystems and Environ- Universidad de Costa Rica, Turrialba.
çamentos que variam de 6 m x 6 m até ment, Amsterdan, v.48, p.107-113, 1994.
HAYNES, R.J. The decomposition process: mine-
10 m x 10 m. Para espécies de maior porte, BEER, J. Café bajo sombra en América Central: ralization, immobilization, humus formation and
utilizar espaçamentos de 10 m x 10 m, até hace falta más investigación sobre este sistema degradation. In: HAYNES, R.J. (Ed.). Mineral
15 m x 15 m. Entretanto, como estas espécies agroflorestal exitoso? Agroforestería en las nitrogen in the plant-soil system. Orlando:
têm um crescimento lento, o produtor pode Américas, Cali, v.4, p.4-5, 1997. Academic Press, 1986. p.52-176.
optar por um plantio mais adensado e, à
medida que forem crescendo, eliminam-se BRASIL. Ministério da Agricultura e do Abasteci- HERNÁNDEZ, G.; BEER, J.; PLATEN, H.von.
alguns indivíduos. A segunda maneira de mento. Instrução Normativa no 7, de 17 de maio Rendimento de café (Coffea arabica) cv caturra),
dosar a sombra é por meio de podas, sendo de 1999. Dispõe sobre a produção de produtos produción de madera (Cordia alliodora) y análi-
esta prática a mais utilizada no sombrea- orgânicos vegetais e animais. LEX - coletânea ses financiero de plantaciones com diferentes
mento provisório, por se tratar de espécies de Legislação e Jurisprudência: legislação densidades de sombra en Costa Rica. Agrofores-
de menor porte. federal e marginália, São Paulo, ano 63, t.5, tería en las américas, Cali, v.4, n.13, p.8-13,
Quanto à localização das árvores, estas p.2465-2476, maio 1999. 1997.
devem ser plantadas obedecendo o de-
CAFÉ orgânico: em busca de um sistema de pro- KIEHL, J.E. Fertilizantes orgânicos. São Pau-
senho do cafezal, em curvas de nível e na
dução mais sustentável. Agroecologia Hoje, lo: Agronômica Ceres, 1985. 492p.
mesma linha dos cafeeiros, deixando livre
Botucatu, v.1, p.16-22, 2000.
as ruas do cafezal para a passagem de má- _______. Preparo do composto na fazenda. Ca-
quinas. CEPA. Café - análise da produção e consu- sa da Agricultura, v.3, n.3, p.6-9, maio/jun.
mo: subsídios à implantação de um programa de 1981.
CONSIDERAÇÕES FINAIS incentivo à cafeicultura no Estado do Ceará. For-
taleza, 1971. 112p. LIEBMAN, M. Sistemas de policultivos. In: CEN-
Embora no Brasil a pesquisa sobre a TRO DE EDUCACION Y TECNOLOGIA. Cur-
conversão de propriedades convencionais DE-POLLI, H. (Coord.). Manual de adubação so de autoformación a distância: módulo II -
ao sistema orgânico de produção esteja ain- para o Rio de Janeiro. Itaguaí, RJ: UFRRJ, 1988. desarrollo rural humano y agroecologico. Chile,
da em fase inicial, algumas considerações 179p. (UFRRJ. Ciências Agrárias, 2). 1996. p.125-133.
práticas, normas e discussão de princípios
DETLEFSEN R., G. Evaluación del rendi- LÓPEZ DE LEÓN, E.E.; MENDOZA DÍAZ, A.
que norteiam este método, na visão de pes-
miento de Coffea arabica cv “Caturra” bajo Manual de caficultura orgânica. Guatemala,
quisadores, técnicos, e mesmo a partir da
diferentes densidades de Cordia alliodora y Guatemala: Asociación Nacional del Café, 1999.
experiência de produtores, apresentadas
Erythrina poeppigiana plantados en un diseño 159p.
neste artigo, poderão servir de orientação
sistemático de espaciamientos. 1988. 121p.
inicial para aqueles que desejam fazer a con- MATIELLO, J.B.; COELHO, C. Observações
Tesis (Mag Sc) – Universidad de Costa Rica, San
versão para este sistema de produção. Fo- fenológicas em cafeeiros Conilon cultivados com
José.
ram abordados alguns aspectos que bus- e sem arborização. In: CONGRESSO BRASILEI-
cam equilibrar o ambiente para que a planta ESPÍNDOLA, J.A.A. Avaliação de leguminosas RO DE PESQUISAS CAFEEIRAS, 25., 1999,

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.53-61, jan./abr. 2002


Café Orgânico 61

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Janeiro: MAA-PROCAFÉ, 1999. p.19-20. Análise agroeconômica do café cultivado ALCÂNTARA, E.N. de. Manejo de plantas
organicamente ou café “orgânico”. Londres, daninhas no cafezal. Belo Horizonte: EPAMIG,
MATTA-MACHADO, R.P.; NEELY, C.
1997. 19p. 2000. 24p. (EPAMIG. Boletim Técnico, 61).
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tion and nitrogen dynamics in an alley cropping PALM, C.A.; SANCHEZ, P.A. Nitrogen release SOUZA, N.L. de; OLIVEIRA, L.E.M. de.; GUER-
and an annual legume-based cropping system. from the leaves of some tropical legumes as RA NETO, E.G. Influência do sombreamento no
Communications in Soil Science and Plant affected by their lignin and polyphenolic contents. crescimento e desenvolvimento de diferentes cul-
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análisis de su evolución. In: CENTRO DE EDU- PÉREZ, N.C.; POZO, E.N. El problema de las
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rural humano y agroecologico. Chile, 1996. p.11- distância: módulo II: desarrollo rural humano y position of leaf litter from tropical forage grasses
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aproximação. Viçosa, MG: Comissão de Fertilida- cultura orgânica. Brasília: CNPq, 1984. 128p.
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Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.53-61, jan./abr. 2002


Café Orgânico 63

Adubação e nutrição do cafeeiro


em sistema orgânico de produção
Paulo Tácito Gontijo Guimarães 1
Francisco Dias Nogueira2
Paulo César de Lima3
Maria Juliana C. L. Guimarães4
Adélia Aziz Alexandre Pozza5

Resumo - A nutrição e a adubação do cafeeiro sob o paradigma


orgânico pressupõem que a fertilidade do solo deve ser mantida
e melhorada através da utilização de recursos naturais. Na
medida do possível, devem-se utilizar recursos locais, bem
como subprodutos orgânicos que proporcionem o forne-
cimento dos nutrientes aos cafeeiros, de forma ampla e
diversificada, através de produtos de baixa solubilidade e
concentração, quelatizados ou não etc. Trata-se de
uma área do conhecimento em que o envolvi-
mento da pesquisa faz-se necessário, para
se ter uma avaliação científica de tais
práticas, de seus benefícios quanto à
produtivi-dade, à estabilidade da
produção, ao seu custo/benefício e ao
desenvolvimento da tecnologia.

Palavras-chave: Cafeicultura
orgânica; Adubação
orgânica; Ma-téria
orgânica; Adu-
bação verde;
Agri-cultura
orgânica.

1
Engo Agro, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: paulotgg@ufla.br
2
Engo Agro, D.Sc., Bolsista CBP&D-Café/EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000, Lavras-MG. Correio eletrônico: paulotgg@ufla.br
3
Engo Agro, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTZM, Caixa Postal 216, CEP 36571-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: plima@ufv.br
4
Enga Agra, Bolsista CBP&D-Café/EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: paulotgg@ufla.br
5
Enga Agra, M.Sc., Bolsista CBP&D-Café/EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: adelia@ufla.br

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.63-81, jan./abr. 2002


64 Café Orgânico

INTRODUÇÃO ESCOLHA E PREPARO animal, então, áreas com declividade de


DA ÁREA PARA O PLANTIO até 30% a 40% poderão ser utilizadas com
A adubação e a nutrição do cafeeiro
NO SISTEMA ORGÂNICO cafeeiros. Mas se o proprietário tiver con-
num sistema orgânico de produção adotam
dições para o cultivo, usando totalmente o
todos os princípios de uma cafeicultura Para que o cultivo do cafeeiro tenha
manejo manual, uma declividade de 60% a
racional, respeitando-se, porém, alguns alta produtividade, é necessário que seja
70% não seria limitante para o plantio do
princípios e normas que caracterizam e são conduzido utilizando-se o máximo de co-
cafeeiro. A presença de pedras ou casca-
inerentes ao sistema orgânico. nhecimento dos fatores que contribuem
lhos nos primeiros 30 a 40cm do solo pode
Neste sistema, em qualquer fase do pro- para o melhor crescimento e para a maior
ser um fator limitante para o uso de imple-
cesso de produção, um maior enfoque é produção da planta.
mentos agrícolas, pois isso diminui o volume
dado à proteção ambiental, à conservação Na escolha do local para um plantio na
do solo e, conseqüentemente, sua capaci-
e à melhoria das condições físicas, quí- forma tradicional, na maioria das vezes,
dade de armazenar água. A profundidade
micas e biológicas do solo, à promoção da planta-se o cafeeiro em solos de média a
efetiva do solo tem importância na classifi-
sustentabilidade e ao incremento da ma- baixa fertilidade, reservando os melhores
cação de sua capacidade de uso, na avalia-
téria orgânica do solo. Portanto, evitam- solos para culturas alimentares de maior
ção do armazenamento de água e de nutri-
se, neste sistema, fertilizantes processados valor econômico. Neste tipo de cultivo, em
entes, bem como na seleção e quantificação
industrialmente, altamente concentrados e solos de baixa fertilidade, utilizam-se fer-
de práticas culturais. Para o cafeeiro, a pro-
tilizantes concentrados e de alta solubi-
solúveis rapidamente em água e outros fundidade efetiva do solo é de aproximada-
lidade em que os nutrientes estarão pron-
insumos, ou seja, principalmente aqueles mente 120cm, desde que tenha textura va-
tamente disponíveis aos cafeeiros.
que incluem elementos tóxicos ou resíduos riando entre média a argilosa e não tenha mais
No caso do sistema orgânico de cultivo
contaminantes, procurando sempre a auto- de 15% de pedras e cascalhos. Como não
em que se empregam fontes de nutrientes
sustentação do sistema, a maximização dos se pode mudar economicamente a profun-
de baixa solubilidade que necessitam de
benefícios socioeconômicos para quem o didade do solo, deve-se plantar o cafeeiro
transformações químicas ou de reações do
explora, a auto-suficiência da proprieda- somente em solos com suficiente profun-
solo para os nutrientes tornarem-se dis- didade, e com capacidade de armazenar a
de, a minimização da dependência das ener-
poníveis às plantas ou, no caso de fontes quantidade ideal de água disponível para
gias não-renováveis, privilegiando sem-
orgânicas, que, primeiramente, necessitam a cultura. Quanto à textura do solo, não é
pre a qualidade ambiental e a saúde huma-
da ação dos microrganismos para minera- recomendada a instalação de cafezais em
na.
lizá-las e da ação enzimática para dispo- solos com menos de 20% de argila, nem
Os métodos propostos pela cafeicultu- nibilizar os nutrientes, sempre em um ritmo
ra orgânica dão grande ênfase à conserva- com mais de 50% de argila, ou seja, solos
mais lento, a escolha do local para a insta- que não tenham uma estrutura e proprie-
ção dos solos e às adubações, valendo-se lação da lavoura orgânica deve priorizar
da fauna e da flora e sempre recorrendo dades adequadas. Os solos que não se en-
solos de média à alta fertilidade. Dessa quadram nestas características requerem
aos conhecimentos da ciência dos solos. forma, procuram-se minimizar os riscos com um manejo especial para minimizar estas
Neste sistema, o solo é visto não como um a cultura e garantir uma maior e contínua limitações, o que nem sempre é possível
substrato inerte, mas um meio com uma disponibilidade de nutrientes, evitando-se em uma empresa familiar. Para manter ou
multiplicidade de organismos vivos que os momentos de carência nutricional que desenvolver uma boa estrutura do solo su-
funcionam como transformadores das poderiam coincidir com os períodos de perficial, deve-se evitar a erosão, o excesso
fontes de nutrientes, tanto orgânicas como maior exigência da planta. de calor na superfície e o excesso de traba-
minerais, tornando-as disponíveis para as Além da fertilidade do solo, outros fa- lho mecânico. A porosidade e o espaço
plantas. tores devem ser levados em conta na esco- poroso de um solo são a porção ocupada
Os adubos e os compostos orgânicos lha do local de plantio como a declividade, pelo ar e pela água, e o grau de porosidade
produzidos na propriedade, quando bem a exposição em relação aos pontos car- é utilizado na avaliação da drenagem e per-
preparados, são preferidos aos fertilizan- deais, a presença de pedras etc. Tais fato- meabilidade. Um solo ideal deve ter 50%
tes de origem mineral, que por sua natureza res podem diminuir a possibilidade de se de porosidade, 45% de substância mineral
inerte, não apresentariam os mesmos efei- obter uma produção econômica de café e 5% de matéria orgânica. O espaço poroso
tos dos primeiros. A associação de cul- (KÜPPER,1981). Assim, áreas com menos abrange os macro e microporos. Os macro-
turas, o cultivo intercalar com plantas de de 5% de declividade podem ter problemas poros são poros de aeração e drenagem do
interesse econômico ou com leguminosas, de drenagem da água ou do ar frio, sendo solo e os microporos retêm a água dispo-
além das técnicas com policulturas, são mais sujeitas à ação dos ventos; áreas com nível às plantas que somente se desloca
meios utilizados que proporcionam bene- 15% a 20% já limitariam a possibilidade de por capilaridade. Um solo bem drenado e
fícios econômicos e que mantêm a ferti- mecanização. Se a propriedade puder ser com boa permeabilidade tem aproxima-
lidade do solo. estruturada para tratos culturais com tração damente 1/3 do espaço poroso na forma de
Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.63-81, jan./abr. 2002
Café Orgânico 65

macroporos e 2/3 como microporos. Solos limitação pode ser reduzida pelo sulcamen- A técnica de arborização, que é diferente
compactados que apresentam dificuldade to mais profundo aliado a uma subsolagem do sombreamento pleno, tem como fina-
para a penetração da água e não têm areja- no fundo do sulco no período seco e em lidade:
mento suficiente, possuem menos de 35% casos extremos, dessa forma, a área não a) a reciclagem de nutrientes das ca-
de espaço poroso total, sendo quase todo deve ser utilizada pela cultura. Estes prin- madas mais profundas;
ele composto de microporos. Um solo exces- cípios observados por Küpper (1981) são
b) a proteção contra o vento excessivo
sivamente drenado, que se resseca rapida- fatores que contribuem para a escolha da
que desidrata as folhas tornando a
mente, possui um espaço poroso total que área a ser implantada com o cafeeiro tanto
planta mais vulnerável;
ocupa mais de 60% do volume do solo, com no sistema convencional quanto orgânico.
o predomínio de macroporos. O arejamen- De modo geral, na escolha da área da c) uma menor incidência de pragas e
to do solo é indispensável à raiz do cafeei- lavoura, recomenda-se que esta seja fei- doenças;
ro que somente se desenvolve bem em ta segundo as classes de capacidade de d) uma maturação mais uniforme de
ambiente oxidante. O arejamento depende uso e que se priorize o estabelecimento das frutos ou uma maior proporção de
da textura, da estrutura e da quantidade, e práticas convencionais de conservação do cerejas para serem descascadas;
da relação macro/microporos. O cafeeiro se solo.
e) a uniformização da florada;
desenvolve melhor em solos bem drena- A limpeza do terreno deve ser feita se-
dos, tolera solos excessivamente e modera- letivamente para não afetar o ambiente, f) uma maior atividade de inimigos na-
damente drenados e não produz satisfato- aumentando a sua biodiversidade, que é turais, além de facilitar a observação
riamente em solos imperfeitamente ou mal importante para o controle biológico de de que os cafeeiros que estão logo
drenados. Para manter uma porosidade pragas e doenças. O plantio deve ser feito abaixo das respectivas árvores apre-
adequada do solo, deve-se procurar incor- em nível, em curvas e terraços, deixando- sentam crescimento e frutificação nor-
porar matéria orgânica produzida através se recuperar a vegetação de cobertura nos mais.
de práticas vegetativas ou com dejetos ani- espaços vazios e nas entrelinhas de plantio, A mobilização intensiva do solo deve
mais. A aplicação ou manutenção de ra- além do uso de palhas e restos de cultura ser tanto quanto possível evitada, dando-
zoáveis quantidades de matéria orgânica para impedir a erosão. A limpeza do terre- se preferência aos equipamentos escarifi-
no solo, por exemplo, faz aumentar o volu- no deve ser feita apenas nas linhas de cadores. As técnicas de cultivo mínimo são
me de espaço poroso e, conseqüentemente, plantio deixando os outros espaços e as mais indicadas, não havendo restrições ao
o armazenamento de água. Também, a esca- entrelinhas vegetadas. Portanto, deve-se plantio direto, desde que se prescinda do
rificação da superfície do solo e o uso de promover a conservação de áreas com re- uso de herbicidas.
cobertura morta são as práticas mais sim- manescências da vegetação natural e de No caso dos solos tropicais, como os
ples e eficientes para aumentar a infiltração reflorestamento, visando à manutenção do de baixa fertilidade ou aqueles originalmen-
de água no solo e ao mesmo tempo evitar equilíbrio biológico do agroecossistema; te sob cerrados que em geral são áreas me-
as perdas por evaporação. Outro fator a prever a construção de barreiras de reten- canizáveis, para o sucesso da implantação
ser considerado na escolha do local para ção dos sedimentos nos escoadouros; de lavouras tanto pelo sistema convencio-
a formação de uma lavoura de café seria o construir caixas de contenção para recebi- nal quanto orgânico, tem-se a necessidade
problema do adensamento sub-superficial mento dos excessos de águas pluviais; de incorporação do calcário em maiores
do solo. Pelo grau de adensamento, pode- promover a arborização da área, ou seja, quantidades e profundidades. Nestas con-
se inferir sobre a dificuldade ou facilidade após a marcação da lavoura, marcar também dições, no sistema orgânico, isto é feito
que a raiz vai encontrar para aprofundar-se as covas de plantio de árvores em áreas previamente no ano anterior, seguido do
e, também sobre sua capacidade de emitir demasiadamente expostas aos ventos ou plantio e da incorporação de uma legumi-
radicelas e pêlos absorventes. Esta menor em regiões demasiadamente quentes. nosa, para que no próximo ano agrícola os
intensidade e densidade do sistema radi- O plantio de árvores em barreiras como cafeeiros sejam implantados pelo siste-
cular fino resulta em uma menor resistên- quebra-vento também é feito nesta fase de ma orgânico. No ano do preparo inicial da
cia à seca e aos veranicos. O adensamento preparo da área (OPÇÃO..., 2000). Técnicas área, faz-se ainda a marcação da lavoura e
subsuperficial pode ser sentido ou detec- de policultura combinando a arborização, o plantio das árvores que constituirão os
tado pelo uso do trado ou de um penetrô- o plantio de diversas frutíferas ou árvores quebra-ventos ou aquelas para a arboriza-
metro e medido pela determinação da densi- de sombra devem ser realizadas ao longo ção. Dessa forma, procura-se primeiramente
dade ou massa específica aparente. Uma das linhas dos cafeeiros. Dessa forma, as construir a fertilidade do solo, minimizando
alternativa para lavouras de espaçamentos folhas e os ramos secos fornecidos consti- os riscos de um sistema orgânico em um
mais abertos seria o cultivo de plantas com tuem uma cobertura morta espalhada sob solo de baixa fertilidade para então, man-
sistema radicular mais agressivo para rom- os cafeeiros, que, pelo avanço da degra- ter a lavoura com pequenas aplicações de
per o adensamento como é o caso da mamo- dação, se transforma em fertilizante orgâ- calcário e com as adubações subseqüentes
neira (Ricinus comunnis L.). Em geral, esta nico, protegendo-os das plantas invasoras. necessárias.

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.63-81, jan./abr. 2002


66 Café Orgânico

Em áreas de média a alta fertilidade, em para o consumidor final, embora os argu- para os microrganismos do solo, aumentan-
áreas já cultivadas anteriormente ou em mentos científicos deste conceito apresen- do, portanto, a atividade da microbiota e,
áreas amorradas não-mecanizáveis, onde tem fragilidades. conseqüentemente, a degradação e a mi-
não se faz a incorporação do calcário, pode- Por outro lado, existe a matéria orgânica neralização da matéria orgânica (fonte 1).
se, no ano do plantio, abrir os sulcos, apli- (fonte 2) extraída da mesma matéria-prima A produção de fitomassa (raízes e parte
car o calcário na cova e na superfície confor- (fonte 1) que exclui a lentidão do aconteci- aérea) maximiza-se, quando os mecanismos
me a análise do solo, sabendo-se que serão mento natural, dentro das normas ecológi- disponibilizadores de nutrientes atuam fa-
necessárias menores quantidades de calcá- cas, quando se utiliza do processamento voravelmente.
industrial para transformá-la em compostos Um macronutriente que não está pre-
rio; em seguida faz-se o plantio das legu-
orgânicos de cadeias de carbono com ra- sente nas moléculas orgânicas, mas que
minosas e dos cafeeiros. Dessa forma, o
dicais funcionais definidos, e que mantém bioquimicamente é muito importante na
calcário é aplicado superficialmente sem
as mesmas propriedades químicas daque- degradação enzimática da matéria orgânica
incorporação, à semelhança das lavouras
les compostos orgânicos surgidos no des- (fonte 1), é o potássio, pela sua função ati-
em produção, podendo-se ainda usar equi-
dobramento natural que ocorre na decom- vadora de mais de 50 enzimas. Cerca de
pamentos escarificadores. 40% do fósforo presente no solo está na
posição da matéria orgânica de origem
vegetal e/ou animal. forma orgânica e este, para ser absorvido e
ADUBAÇÃO ORGÂNICA
Se os resíduos industriais podem ser assimilado pelas plantas, é indispensável
NO CAFEEIRO a ação enzimática principalmente da fitase
seletivamente transformados em fertili-
A preservação da fertilidade natural do zantes orgânicos, através de tratamentos, e da fosfatase (NOVAIS; SMYTH, 1999).
solo depende de inúmeros fatores: ação O manejo dos resíduos vegetais (adubo
processamentos que implicam no uso de
antrópica, composição mineral, estádio de verde, ramos, folhas etc.) é, sem dúvida, a
outros recursos industriais permanecendo,
intemperização das rochas e minerais pri- fonte mais acessível e econômica de matéria
porém, um material ou insumo agrícola com
mários, da reposição de nutrientes nas for- orgânica, devido à possibilidade de retor-
características, propriedades químicas e
mas orgânicas e minerais, da atividade da nar ao solo uma grande quantidade de
bioquímicas desejáveis, então a análise de
carbono orgânico, além de reduzir as perdas
microbiota do solo, também da sua estru- vantagem do diferencial entre os dois pro-
por processos erosivos. A matéria orgâ-
tura e arejamento. dutos (fontes 1 e 2) deve ser orientada pela
nica do solo é muito dinâmica, podendo
A tecnologia do uso de matéria orgânica escala de produção e pela velocidade de
ser mineralizada e/ou acumulada, depen-
é, até hoje, limitada quantitativa e qualita- sua obtenção, diante de uma demanda cada
dendo da atividade da microbiota, das prá-
tivamente, pouco compreendida e ainda vez maior de fertilizantes orgânicos ou de
ticas agronômicas e das condições ambien-
confundida; existem muitas matérias orgâ- compostos orgânicos com funções espe-
tais. Ela aumenta a capacidade produtiva
nicas de natureza, composição e estabilida- ciais de solubilizar compostos minerais e
do solo através da melhoria de suas proprie-
de diferentes, das quais consideraremos: disponibilizar nutrientes para as plantas.
dades físicas, químicas e biológicas. Pode-
No reino vegetal, as próprias plantas se atribuir à matéria orgânica o segredo dos
a) fonte 1: aquela fonte não manipula-
exsudam em sua rizosfera compostos orgâ- sistemas conservacionistas do solo. A per-
da pelo homem, incluindo lixos, resí-
nicos em volumes de microlitros, mas seu da dos nutrientes do ciclo biológico é sem
duos de esgoto e industriais; efeito pode superar um volume de matéria dúvida a maior contribuição à acidificação
b) fonte 2: outra propositalmente trans- orgânica (fonte 1) acima de 20 litros, superfi- dos solos agrícolas e, conseqüentemente,
formada, usando-se a primeira fonte cialmente depositada, quando se avalia a a aceleração da degradação da sua fertili-
como matéria-prima. capacidade solubilizadora de nutrientes do dade. Assim, devem-se concentrar todos
complexo cristalino autóctones do solo, resi- os esforços técnicos para maximizar a per-
A primeira fonte é uma matéria orgânica
duais de adubações pretéritas e ainda da- manência dos nutrientes no ciclo biológico,
de composição complexa, de origem vege-
queles presentes nas adubações anuais de ou seja, mantê-los no sistema solo-planta-
tal ou animal, quimicamente pouco defi-
manutenção das lavouras. A massa mole- solo. As perdas dos nutrientes para a atmos-
nida, que é degradada pelas ações bioló- cular e a estabilidade dos compostos orgâ- fera, através da volatilização; na água, atra-
gicas, enzimáticas, sempre na presença de nicos oriundos da fonte 2 são variáveis, sen- vés da erosão, lixiviação; e fixação em formas
água, até porque a matéria orgânica é consi- do produtos puros com moléculas e funções não disponíveis, têm que ser minimizadas
derada uma esponja armazenadora de água. definidas, específicas para cada situação. se a manutenção da produção agrícola é a
A disponibilidade deste tipo de matéria Certos compostos orgânicos (fonte 2), meta desejada. Neste aspecto, a matéria
orgânica é, sem dúvida, de muita importân- obtidos industrialmente, de menor peso orgânica é a primeira fonte a ser conside-
cia para a agricultura familiar e minifun- molecular, são biodegradáveis, não causam rada e mantida no ciclo biológico (PAVAN;
diária, havendo quem defenda a idéia de impactos nocivos e irreversíveis no solo. CHAVES, 1998).
que seu uso vem agregar aos produtos da Por serem biodegradáveis, facilmente, cons- A matéria orgânica adicionada ao solo
terra, atributos ecológicos mais saudáveis tituem ainda fonte energética de carbono melhora sua estrutura, reduz sua plastici-
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Café Orgânico 67

dade e coesão, aumenta a retenção de umi- Nos Quadros 2 e 3, são apresentadas a Algumas espécies concorrem com o ca-
dade, mantém temperaturas mais uniformes composição mineral de plantas utilizadas feeiro como o feijão-de-porco (C. ensiformes),
e, sobre o ponto de vista químico, aumen- como adubo verde e a produção e quanti- conforme foi observado por Melles et al.
ta a capacidade de troca de cátions (CTC) dade de N por elas incorporado ao solo, (1978, 1980 apud GUIMARÃES; LOPES,
do solo e o seu poder tampão, forma que- por hectare. 1986), ao semearem anualmente, a partir do
lados e sobretudo, é fonte de nutrientes, ano de plantio do cafeeiro, 6, 4, 2 e 0 linhas
principalmente de N, S, B entre outros QUADRO 1 - Matéria seca produzida nas entreli- de 0,50m entre si, com esta leguminosa, nas
(GUIMARÃES; LOPES, 1986). nhas de cafeeiros e em área total entrelinhas de uma lavoura espaçada de
pelos principais adubos verdes uti- 4,0m x 1,0m. As produções de café na pri-
Adubação verde lizados no Paraná
meira colheita foram, respectivamente, de
na cafeicultura orgânica Matéria seca
Adubo verde 5,48; 16,08; 18,26 e 29,03 sacas de café
(kg.ha-1)
Uma das fases mais propícias para se beneficiado por ha. É importante salientar
fazer uma adubação verde é antes do plan- Aveia preta 6.863 que foram realizadas adubações para os
tio do cafeeiro. Nas primeiras chuvas, em Ervilhaca comum 8.516 cafeeiros e para o feijão-de-porco, assim,
meados de setembro, após a incorporação Ervilhaca-peluda 6.921 acredita-se que possa haver algum efeito
do calcário, planta-se uma leguminosa pro- alelopático do feijão-de-porco sobre o ca-
Serradela 7.233
dutora de maior massa verde ou espécies feeiro. Dessa forma, o feijão-de-porco como
de outras famílias, como, por exemplo, gra- Azevém 11.766 adubo verde é recomendado apenas para
míneas; no caso de áreas anteriormente com Chícharo londrina 17.003 ser plantado antes da implantação da la-
lavouras de café, planta-se uma leguminosa Tremoço-azul-amargo 4.115 voura cafeeira.
que evite a multiplicação ou reduza a popula- (1) Quando se fala em adubação verde,
Mucuna cinzenta 4.000
ção de nematóides, como, por exemplo, a pensa-se logo no plantio de leguminosas.
(1)
Crotalaria spectabilis, que é roçada por Mucuna anã 2.925 Além desta idéia, oriunda de experiências
ocasião do florescimento. A seguir, o cafeei- (1)
Caupi 2.850 mais testadas no passado, a forma mais sim-
ro é plantado em fins de dezembro e início Crotalaria mucronata (1)
6.662 ples de se fazer uma adubação verde é atra-
de janeiro, em pleno período chuvoso, época vés da vegetação espontânea da lavoura
em que as mudas estarão prontas para ser FONTE: Calegari (1990) e Chaves (1990 apud por meio do manejo do mato, não devendo
PAVAN; CHAVES, 1998).
levadas ao campo. A adubação verde poderá este ser visto como uma planta daninha,
(1) Calculada em 1 ha de cafeeiro com espaça-
também ser feita durante as fases de for- mento de 4,0m entrelinhas. mas uma planta útil que vai ser manejada e
mação e produção do cafeeiro.
Muitas espécies de adubos verdes fo-
ram avaliadas quanto ao seu potencial de
produção de matéria seca, uma caracterís-
tica relacionada com a fertilidade do solo.
A leguminosa não deve concorrer com o
cafeeiro, aquelas que concorrem devem ser
usadas apenas antes do plantio, na implan-
tação da lavoura; não utilizar leguminosa
de crescimento indeterminado ou cresci-
mento volúvel que se enrosca nos cafeeiros
etc. No Quadro 1 é apresentada a produção
de matéria seca (kg/ha) de adubos verdes
(PAVAN; CHAVES, 1998).
Além dessas espécies, plantam-se tam-
bém nas entrelinhas dos cafeeiros o Arachis
pintoi que é perene e cobre bem o solo, a
leucena (Leucaena leucocephalla) e a
Cassia mangeum plantadas em aléias entre
as linhas da lavoura, das quais são corta-
dos seus galhos e colocados sob os cafeei- Figura 1 - Aléias de Cassia mangeum
ros (Fig. 1), a mucuna preta (Stylozabium NOTA: Plantadas entre os cafeeiros, das quais a parte aérea é periodicamente cortada e
aterrimum), a Crotalaria grantiana, o lab- deixada sob as plantas, na Fazenda Experimental de São Sebastião do Paraí-
labe (Dolichos lablab) etc. so - EPAMIG, MG.

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68 Café Orgânico

QUADRO 2 - Teores de nutrientes na matéria seca de algumas leguminosas e gramíneas b) altura de corte: deve-se deixar um
Leguminosa/gramínea
N P K Ca Mg mínimo de folhas verdes, para permi-
(dag.kg-1) (dag.kg-1) (dag.kg-1) (dag.kg-1) (dag.kg-1) tir uma vigorosa rebrota a partir da
Crotalaria juncea 2,01 0,36 2,43 1,43 0,44 área foliar residual;
Feijão-de-porco 2,73 0,57 2,11 2,58 0,40 c) freqüência de corte: deve-se permi-
tir que o mato complete sua fase de
Mucuna preta 2,83 0,61 2,05 1,28 0,31
crescimento rápido, a fim de explorar
Gramínea 1,12 0,17 1,36 0,48 - todo o seu potencial. Não se deve
NOTA: dag.kg-1, no Sistema Internacional de Unidades, corresponde à %. cortar tarde demais, ou seja, após
esta fase de crescimento rápido ou
do florescimento.
QUADRO 3 - Produção de matéria verde, matéria seca e a incorporação de N por algumas leguminosas
em área total, em kg.ha-1
Na adubação verde, deve-se ainda levar
em conta, para o seu maior sucesso, sua
Matéria Matéria N
Leguminosa
verde seca incorporado atividade na mineralogia do solo com po-
tencial de suprimento de nutrientes. O que
Crotalaria juncea 18 a 30 6 a 10 100 a 300
se busca com a adubação verde? Uma pro-
Canavalia ensiformes (feijão-de-porco) 50 10 a 15 100 a 300 dução de biomassa rica em nutrientes. Mas
Dolichos lablab 10 a 30 - 60 a 220 se mineralogicamente o solo é pobre, esta
biomassa vai contribuir pouco, sem que a
Mucuna aterrimum 10 a 40 - 60 a 300
fertilidade do solo tenha sido previamente
Canavalia brasiliensis (feijão-bravo) 10 a 40 - 300 reconstituída pela adição de corretivos e
Cajanus cajan (guandu) 15 a 25 5 150
fertilizantes (build up). Se o solo é mineralo-
gicamente rico em nutrientes, ou se o seu
status de fertilidade foi trabalhado para atin-
gir um nível desejado, há ainda dois fatores
incorporada na lavoura cafeeira. O uso de não prejudica o cafeeiro quando a faixa da a pensar:
roçadeiras descentralizadas proporciona linha, a região do sistema radicular e das
que o mato ceifado seja lançado pela late- adubações, é mantida sempre trilhada ou a) se a planta de valor econômico que
ral em duas passadas nas “ruas”, com as carpida. As plantas invasoras nas entre- vai ser cultivada tem habilidade, atra-
linhas de cafeeiros recebendo a massa ver- linhas do cafezal são capazes de reciclar vés de seus recursos fisiológicos e
de em ambos os lados. Com esta prática nutrientes das camadas mais profundas do bioquímicos, para absorver os nutri-
deve-se adubar não somente os cafeeiros, solo, tornando-os disponíveis aos cafeei- entes, extraindo-os do complexo cris-
mas também a área correspondente às entre- ros que possuem um sistema radicular bem talino do solo;
linhas, no intuito de produzir-se uma grande superficial. b) numa outra hipótese, seria a capaci-
massa de mato para ser manejada. Resíduos Alcântara (1997), em experimento de lon- dade para absorver nutrientes que
de calcário, todo o cisco e a terra adubada, go prazo, em que submeteu cafeeiros du- estejam em forma de precipitados
que estavam sob as plantas na arruação, rante 18 anos a diversos tratamentos de ma- químicos e que devam ser disponi-
são deslocados para as entrelinhas, e pro- nejo de mato entre eles, deixando o mato em bilizados previamente. Se a planta a
piciariam o desenvolvimento desta vege- livre crescimento ou sempre roçado nas en- ser cultivada não possui um sistema
tação espontânea que é composta basi- trelinhas, mas sempre mantendo-o carpido radicular, cuja rizosfera é dinâmica
camente de capim-marmelada (Brachiaria nas linhas, observou que estes tratamentos em exsudação em todas as estações
plantaginea), caruru (Amaranthus spp.), não afetaram a produção do cafeeiro, além do ano, a adubação verde intercalar
beldroega (Portulaca oleracea L.), picão- de observar melhorias nas condições físi- deve ser praticada com outras espé-
preto (Bidens pilosa L.) e também do cas e químicas do solo das entrelinhas, em cies de plantas que até possam ser
capim-braquiária (Brachiaria decumbens), relação ao tratamento da parcela experi- consideradas plantas daninhas, se o
predominante em algumas regiões ou ta- mental, onde se manteve sempre livre do seu manejo não for adequado. Em mui-
lhões, podendo esta, pela sua adaptação mato. tas famílias botânicas, Marantácea
plena superior a várias plantas utilizadas Para se fazer o manejo do mato, através (caruru), Crucíferas (nabo-forragei-
como adubos verdes, beneficiar o cafezal do uso de roçadeiras, devem-se observar: ro), Gramíneas (braquiária, sorgo,
através de sua enorme quantidade de mas- a) freqüência de roçadas: no verão, em Melinis minutiflora) etc., encontram-
sa e exsudatos radiculares que é capaz de torno de 45 dias, e no inverno, uma se estas qualidades.
produzir. O mato que cresce nas entrelinhas freqüência mais espaçada; Gallo et al. (1958) avaliaram a extração

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Café Orgânico 69

de nutrientes pelas plantas invasoras dos pilosa) uma planta bem eficiente na exsu- cionou produção maior que nas demais
cafezais. Segundo eles, estas plantas va- dação destes ácidos, tornando disponí- concentrações. Na condição sem Zn, a pro-
riam quanto às suas capacidades em absor- vel para si próprio e aos cafeeiros, o P, Zn e dução cresceu acompanhando o aumento
ver os diferentes nutrientes e quanto à pro- outros nutrientes. das concentrações de ácido cítrico adicio-
dução de massa verde. A concentração de A liberação de ácidos orgânicos pelas nadas. O ácido cítrico mostrou-se eficaz no
nutrientes na matéria seca das invasoras, raízes das plantas (ácido cítrico, oxálico, aumento da disponibilidade de Zn e outros
em geral, é mais elevada que os teores nor- málico, butírico, acético etc.), em condições nutrientes para o cafeeiro. Estudos reali-
mais do cafeeiro. Os resultados indicaram de estresse, por exemplo, nos solos de ele- zados na Índia mostraram que a disponi-
que as invasoras são eficientes na extração vada acidez ou de baixa disponibilidade de bilidade de P, K e micronutrientes, especial-
dos nutrientes do solo e são dotadas de nutrientes, é de grande importância. Estes mente o Zn aumentaram acentuadamente
certa capacidade seletiva de absorção, va- exsudados radiculares estão relacionados com a aplicação de 1kg de ácido cítrico/ha,
riável com a espécie. Entre as espécies estu- com o efeito que eles podem ter, aumen- misturado com o NPK na fórmula normal-
dadas, destacam-se os teores particular- tando a concentração de P na solução do mente utilizada para a fertilização do solo
mente altos de K e Mg na beldroega (P. solo, a partir do P nativo ou ligado a Fe, Al (JAYARAMA et al., 1998).
oleracea L.), de Mg no caruru (Amaranthus e Mn, na redução de MnO4, na liberação Existe ainda a matéria orgânica produ-
sp.) e N no amendoim-bravo (Eufhorbia de K e Zn etc. A quantificação destes áci- zida pelo próprio cafeeiro. É grande a quan-
sp.). O caruru foi a planta que mobilizou a dos pode ser usada também no melhora- tidade de folhas que se renovam anualmen-
maior quantidade de nutrientes. O K e o N mento do cafeeiro para selecionar plantas te, com quedas naturais ou devido a pragas
foram os nutrientes extraídos em maiores mais adaptadas às condições de baixa fer- e doenças, ou ainda, folhas retiradas na
quantidades pelas invasoras. Quanto aos tilidade do solo. A aplicação do ácido cítri- colheita etc. Estas acumulam-se principal-
micronutrientes Zn e Fe são também bas- co, diretamente ao solo com cafeeiros, tem mente nos plantios adensados. Os efeitos
tante mobilizados pelas plantas invasoras sido bastante promissora, com reflexos na desta matéria orgânica produzida pelos
e em menor escala o Mn, Cu e B. produção. É um produto natural, aplicado cafeeiros na melhoria das características do
Pereira e Jones (l954) verificaram que em baixíssimas quantidades, que não altera solo foram estudados por Pavan e Chaves
na comunidade infestante, composta prin- o pH do solo, não apresentando qualquer (1996). Além desta matéria orgânica produ-
cipalmente de picão-preto (B. pilosa L.) e efeito adverso às plantas ou às proprieda- zida naturalmente pelo cafeeiro, tem-se
de rabo-de-rojão (Tajetes minuta), remo- des do solo, com grande potencial para ser também aquela produzida através das po-
veu-se do solo cerca de 40 vezes mais P utilizado na cafeicultura orgânica. O cafeei- das. Os teores de macro e micronutrientes
que o cafeeiro. Miguel et al. (1980) quan- ro é uma planta eficiente em exsudar estes contidos na fitomassa resultante da poda
tificaram a absorção e mobilização de N, P, ácidos, assim como as invasoras dos cafe- do cafeeiro foram avaliados por Garcia et
K, Ca e Mg pelas invasoras mais comuns na zais e a adição do ácido cítrico, irá aumentar al. (1986). Segundo eles, esta fitomassa
cultura do cafeeiro. Ao comparar os teores a disponibilidade de nutrientes tanto para constituída principalmente de troncos e
dos nutrientes nas folhas das invasoras, elas quanto para os cafeeiros. Silva et al. ramos resultante das podas era retirada
verificaram teores mais elevados de N em (2000) avaliaram a produção de exsudatos da lavoura, por dificultar os demais tratos
Euphorbia primofolia, Amaranthus spp. em três cultivares de cafeeiros. O ácido oxá- culturais e/ou ser utilizada como combus-
e B. pilosa; de P em Digitaria sanguinalis lico foi produzido em maiores quantidades, tível principalmente nas fornalhas dos seca-
e Amaranthus spp.; de K em Amaranthus seguido pelo ácido cítrico que é mais efi- dores. Essa retirada arrasta consigo macro
spp. e Brachiaria plantagínea e de ciente quimicamente nos processos de libe- e micronutrientes e quanto mais drástica a
Mg em Amaranthus spp., B. pilosa e ração de P, Zn e na neutralização do Al. A poda, maior é a exportação de nutrientes,
D. sanguinalis. De maneira geral, o N foi o 'Icatu amarelo' e a 'Catuaí vermelho' produ- necessitando uma reposição futura. Eles
nutriente mais mobilizado pelas invasoras ziram quantidades semelhantes de ácido submeteram uma lavoura de sete anos da
seguido pelo K, Ca, Mg e P. A capacida- cítrico (1,66 a e 1,51 ab, respectivamente) cultivar Mundo Novo, com três a quatro
de de extração de nutrientes variou entre seguido da 'Mundo Novo' (0,17 c, mg.kg-1). hastes por cova, de 3,5m de altura e espaça-
as espécies sendo o Amaranthus spp., B. Nogueira et al. (2001) avaliaram em um da de 3,5m x 1,5m; perfazendo um total de
pilosa e B. plantagínea, as espécies com ensaio de campo a produção de cafeeiros 1.904 plantas/ha. As podas estudadas fo-
maior capacidade de extração. quando submetidos a adubação com e sem ram: (1) a recepa a 40cm; (2, 3 e 4) os decotes
Silva et al. (2001) avaliaram a exsudação Zn e diferentes concentrações de ácido cítri- a 1,00; 1,50 e 2,00m, respectivamente e (5) o
de ácidos orgânicos de baixo peso molecular co, via solo (0; 10-5; 10-4; 10-3 e 10-2 M). Os decote a 1,50m com esqueletamento. No
por plantas invasoras dos cafezais, respon- resultados demonstraram que as maiores Quadro 4, é apresentada a estimativa da
sáveis pela disponibilização de nutrientes produções foram obtidas quando o Zn foi extração de macro e micronutrientes das
em formas mais acessíveis a elas e aos ca- utilizado na adubação. O uso do ácido cí- partes podadas. Garcia et al. (1986) concluí-
feeiros. Observaram ser o picão-preto (B. trico + Zn na concentração 10-5 M propor- ram que a incorporação do material podado
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QUADRO 4 - Estimativa da extração de nutrientes nas partes podadas numa população de 1.904 covas/ha

Tratamentos Partes N P K Ca Mg S B Ca Fe Mn Zn
(kg.ha-1) (kg.ha-1) (kg.ha-1) (kg.ha-1) (kg.ha-1) (kg.ha-1) (g.ha-1) (g.ha-1) (g.ha-1) (g.ha-1 (g.ha-1)
Recepa a 0,40m (1) Folhas 92 3,8 76 27 9,3 3,5 96 29 767 157 28
Ramos 125 8,3 109 61 12,9 4,7 135 119 999 167 92
Tronco 105 6,2 99 60 8,0 1,8 120 84 1039 114 54
Total 320 18,3 286 149 30,2 10,0 306 229 2783 437 174

Decote a 1,00m (2) Folhas 93 3,8 73 26 10,0 3,2 93 27 675 219 26


Ramos 130 7,0 122 77 15,8 4,7 156 135 996 378 106
Tronco 71 4,2 70 36 6,8 0,8 89 57 707 181 19
Total 294 15,0 266 139 32,7 6,8 339 219 2328 779 152

Decote a 1,50m (3) Folhas 47 2,2 42 14 5,1 2,2 47 17 335 88 13


Ramos 74 5,7 92 36 8,0 2,8 82 79 562 131 50
Tronco 40 2,3 34 13 2,6 0,7 33 28 471 45 11
Total 162 10,1 168 63 15,7 5,7 163 121 1367 264 74

Decote a 2,00m (4) Folhas 26 1,1 20 6,9 2,4 0,9 25 10 156 43 7


Ramos 39 2,5 45 20,7 4,3 1,6 45 31 315 83 17
Tronco 15 0,8 13 5,7 1,0 0,3 13 10 72 16 4
Total 80 4,4 78 33,3 7,7 2,9 83 51 544 142 28

Decote a 1,50m (5) Folhas 98 4,4 84 28 10,2 4,5 78 35 671 176 27


e esqueletamento Ramos 124 9,6 155 60 13,5 4,7 138 130 946 220 83
Tronco 40 2,3 34 13 2,6 0,7 33 27 471 45 11
Total 261 16,2 273 101 26,2 10,0 268 191 2088 412 121
FONTE: Garcia et al. (1986).

poderá contribuir para reduzir ou até mesmo idade das plantas ou da umidade do so- 6 t.ha-1 de raízes, que terão ainda um papel
eliminar por um determinado tempo as lo); com o manejo da cultura etc. Materiais importante no sistema.
adubações. Hoje, já existem equipamentos orgânicos com relação C:N inferior a 25 so- Pavan e Chaves (1998) fizeram comen-
que trituram o material podado deixado no frem mineralização fornecendo N ao cafeei- tários sobre o uso de adubação verde. Afir-
meio das ruas de cafeeiros. Também no caso ro e, se esta for muito rápida, pode propor- maram que, geralmente, são recomendadas
de eliminação de uma rua de cafeeiros ou cionar perdas deste nutriente. Materiais para a adubação verde, plantas que tem
mesmo da eliminação de todo o talhão, na orgânicos com relação C:N superior a 25 grande velocidade de crescimento para a
renovação da lavoura, estas trituradeiras apresentam imobilização temporária do N cobertura do solo, boa adaptabilidade e ca-
ou “trinchas”, após triturarem, fazem uma do solo, reduzindo os teores disponíveis pacidade de produzir massa seca, em solos
incorporação superficial de todo o material para as plantas. Quando a relação C:N é 12 de baixa fertilidade, fixar N atmosférico,
podado, inclusive dos troncos. indica que a matéria orgânica está humi- contribuindo para melhorar a capacidade
A eficiência de decomposição dos adu- ficada. produtiva do solo. Com a adubação verde
bos verdes e orgânicos e a disponibilização Planta-se ainda como adubo verde a ma- reduz-se também a infestação de plantas
dos nutrientes presentes em sua constitui- moneira, principalmente por ter um sistema daninhas e evita-se a multiplicação de ne-
ção varia com a composição química destes radicular grosso e profundo, além de pro- matóides fitoparasitas, como as mucunas
adubos, como por exemplo, com a sua rela- duzir um bom volume de massa verde. Ao e crotalárias, reduzindo a população destes.
ção C:N e com os teores de lignina e poli- ser roçada, suas raízes grossas apodrecem O caupi (Vigna unguiculata) e o lablabe
fenóis que lhes garante resistência e prote- deixando canais profundos onde a água (Dolichos Lablab) são plantas hospedei-
ção de suas paredes celulares, promovendo infiltra. Russel (1973) afirma que deter- ras não devendo ser utilizadas em áreas
a imobilização do N; varia ainda com a tem- minadas gramíneas na Inglaterra, quando com suspeitas da infestação de nematói-
peratura e a umidade do solo; com a idade ceifadas, mesmo que a parte aérea seja re- des. As leguminosas utilizadas como adubo
das plantas (época do corte em função da movida, deixam ainda no solo pelo menos verde, geralmente, apresentam boa capaci-
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Café Orgânico 71

dade de fixação do N atmosférico ao solo


a) dissolução do calcário
e contribuem para diminuir a lixiviação de
- -
NO3-, um dos problemas mais importantes CaCO3 + H2O → Ca+2 + HCO3 + OH
na perda de N do ciclo biológico e de acidi- b) neutralização da acidez superficial
ficação do solo. O N inorgânico do fertili- -
zante é completamente solúvel e, portanto, OH + H+ H2O
vulnerável à lixiviação, e o N orgânico fixado - +
3 OH + AL AL(OH)3
pelo adubo verde é mineralizado lentamente -
HCO3 + H+ CO2 + H2O
no solo amenizando as perdas por lixivia-
ção. As práticas de manejo, que proporcio- c) mineralização da matéria orgânica
nam o acúmulo de matéria orgânica no solo, mineralização -
MO Lo
proporcionam uma menor temperatura deste,
devido ao efeito de isolante térmico. Com d) pareamento iônico organometálico
relação à umidade do solo, o cafeeiro planta- - -
Lo + ½ Ca+2 Lo . ½ Ca+2 (par iônico organometálico que se movimenta
do no sistema adensado, com alta popula- para a subsuperfície)
ção de plantas, proporciona um aumento
na proteção do solo pela maior cobertura e) neutralização do H+ e do Al+3 sub-superficial
-
vegetal e uma melhoria na reciclagem dos Lo . ½ Ca+2 + H+ Lo- . H+ + ½ Ca+2
resíduos, formando uma camada densa de - -
Lo . ½ Ca+2 + 1/3 Al+3 Lo . 1/3 Al+3 + ½ Ca+2
folhas na superfície do solo. Nessas condi-
ções, aumenta-se a quantidade de água
armazenada no solo, favorecendo a absor-
ção de íons e uma maior eficiência no uso Ainda, Pavan e Chaves (1998) afirmam agricultura como fonte de nutrientes para
dos nutrientes. A taxa de infiltração nos que, no sistema fisico-biológico, a mobilida- as plantas. Suas composições são muito va-
solos cobertos com restos vegetais é maior de do calcário aplicado na superfície de um riáveis, pois dependem muito dos materiais
que em um solo sem cobertura. A agrega-
solo não disturbado pode ocorrer através que lhes deram origem. Ambos são forne-
ção do solo, ou seja, a união de partículas
→ de canais, formados por raízes mortas, plan- cedores de nutrientes, tendo quase todo o
(argila-íon-matéria orgânica-areia-silte) em
tadas como adubo verde, ou por plantas da- K e o P praticamente disponíveis, ou tanto
unidades secundárias, controla os movi-
ninhas. disponíveis quanto os adubos minerais. O
mentos internos da água, ar e calor e a proli-
Esses autores ainda relatam efeitos da teor disponível de N está na dependência
feração de raízes. As lavouras adensadas,
matéria orgânica. Chaves (1992 apud PAVAN; da facilidade de degradação dos compostos
o mulch, os compostos orgânicos e a ro-
CHAVES, 1998) obteve em três colheitas de nitrogenados presentes.
çada das plantas invasoras aumentam a
café, com o uso exclusivo da adubação ver-
agregação das partículas do solo, contri- Resíduos animais
de, uma produção equivalente a 75% do tra-
buindo para melhorar as condições físicas
tamento em que se usou adubação mineral. A composição dos estercos varia com
dos solos cafeeiros degradados. A aduba-
Chaves (1991 apud PAVAN; CHAVES, 1998) a espécie animal, tipo de cama utilizado,
ção verde tem função importante na movi-
constatou, em lavouras não adubadas, uma cuidados em sua manipulação antes da
mentação do calcário para as camadas infe-
incidência de ramos mortos de 24% e teores aplicação, idade do animal, alimento consu-
riores em solos não disturbados, como são
foliares de N de 2,09%. A utilização de leu- mido etc., e pode ser aplicado puro, com
as lavouras já formadas, onde a ação deste
cena como adubo verde elevou os teores grande quantidade de cama e com partes
dá-se apenas nas camadas de 10cm, uma
vez que ele é aplicado na superfície do solo de N para 2,65% e proporcionou uma re- líquidas e sólidas.
e não incorporado. Esta movimentação dução de ramos mortos para 7%. Os dese- Uma das principais preocupações quan-
pode-se dar num sistema químico-orgânico quilíbrios nutricionais ou do meio ambiente to ao uso de resíduos animais é que estes
ou num sistema físico-biológico. No primei- reduzem as defesas das plantas, tornando- sejam produzidos na propriedade ou, se
ro em um solo não disturbado, com suficien- as mais vulneráveis às doenças, pragas etc., trazidos de fora, tenha-se o conhecimento
tes resíduos vegetais, há formação de pares reduzindo a sua produção. de sua origem e qualidade. Os estercos
iônicos organometálicos com o cálcio que bovinos podem ter resíduos de herbicidas
Adubação do cafeeiro com utilizados na erradicação de plantas inva-
vai movimentar-se até a subsuperfície do
resíduos agrícolas ou com soras das pastagens, e os estercos avíco-
solo proporcionando uma elevação do pH,
a complexação do alumínio e um aumento subprodutos agroindustriais las contêm antibióticos usados de forma
do cálcio nas camadas inferiores do solo. e urbanos preventiva nas rações disponíveis no merca-
Estas reações ocorrem no solo da seguinte Por vários séculos, os estercos e os com- do, em sua totalidade, que interferem, em
forma: postos orgânicos vêm sendo usados na alguns casos, no processo de humificação
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72 Café Orgânico

destes estercos e possivelmente na bioce- É recomendável que os estercos, sempre para serem usados devem preferencialmente
nose do solo, onde o esterco é aplicado que possível, não fiquem expostos ao sol e à ser compostados. Nos Quadros 5 e 6, é apre-
(COSTA; CAMPANHOLA, 1997). chuva, evitando-se perdas de nutrientes e, sentada a composição de vários estercos.

QUADRO 5 - Umidade e teores de macronutrientes (N, P2O5 e K2O) em diversos adubos orgânicos

Umidade N P 2O 5 K2O

Tipo Amplitude Média Amplitude Média Amplitude Média Amplitude Média

% dag.kg-1
Esterco bovinos 22,0-85,0 65,3 1,8-3,7 3,1 0,9-2,3 1,8 0,7-3,0 2,1
Esterco eqüinos 69,0-75,8 70,5 1,7-1,8 1,8 0,6-3,3 1,0 0,7-1,8 1,4
Esterco ovinos 65,0-65,7 65,4 1,6-4,0 2,8 1,3-2,1 1,7 0,5-3,4 2,0
Esterco suínos 75,0-81,0 78,0 2,0-4,5 3,2 0,9-3,6 2,4 1,9-4,2 2,7
Esterco de galinha 32,0-72,0 55,3 2,5-5,4 4,0 3,0-8,1 4,7 1,8-2,2 2,0
Efluente de biodigestor (bovinos) _ _ _ 2,3 _ 1,2 _ 2,2
Bagaço de cana-de-açúcar _ _ _ 1,1 _ 0,2 _ 0,9
Torta de mamona _ _ _ 5,4 _ 1,9 _ 1,5
Torta de filtro (cana) _ 72,0 _ 1,2 _ 2,2 _ 0,5
Turfa _ _ 0,5-5,7 3,1 0,1-0,2 0,2 0,2-0,5 0,4
Composto de esterco + restos vegetais _ _ 0,4-1,0 0,8 0,2-0,6 0,2 0,2-0,9 0,4
Composto de lixo urbano _ _ _ 3,4 _ 1,2 _ 0,3
-3
kg.m
(1)
Vinhaça de mosto de melaço _ _ _ 0,8 _ 0,2 _ 6,0
(1)
Vinhaça de mosto misto _ _ _ 0,5 _ 0,2 _ 3,1
(1)
Vinhaça de mosto de caldo _ _ _ 0,3 _ 0,2 _ 1,5
(1)
Chorume _ _ 2,0-6,0 4,0 2,0-6,0 4,0 2,0-3,0 2,5
FONTE: Ribeiro et al. (1999).
NOTA: dag.kg-1, no Sistema Internacional de Unidades, corresponde à %.
(1) À exceção de vinhaça e de chorume, os teores nos demais adubos orgânicos são apresentados com base na matéria seca. Como, na maioria das vezes, o
agricultor utiliza o adubo orgânico com certo teor de umidade, este aspecto deve ser levado em consideração.

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Café Orgânico 73

Compostos orgânicos água. Os volumosos são capins, bagaços, veitando-se seus nutrientes e material orgâ-
Os compostos são resultantes da fer- adubos verdes, restos de cultura, casca de nico, vem sendo feita em muitas regiões do
mentação de diferentes resíduos e, por isso, eucalipto, palhadas etc. mundo. Trata-se de uma oportunidade para
têm composição também bastante variável. Os compostos podem ser enriquecidos as zonas urbanas devolverem, na forma de
Na sua produção, a aeração é essencial por com calcário, fosfato natural, farinha de resíduos orgânicos (lixo orgânico e lodo
promover a proliferação microbiana espe- ossos, cinzas etc. Um composto deve ter de esgoto), os alimentos enviados pela
cífica de bactérias, actinomicetos e fungos um mínimo de 40% de matéria orgânica zona rural, promovendo a integração dos
que favorecem uma rápida decomposição total; um mínimo de 0,1% de N total; um sistemas urbano e rural.
com o mínimo de odores inconvenientes. máximo de 40% de umidade; máximo de
18/1 de relação C:N e pH mínimo de 6,0 Vinhaça ou vinhoto
O processo de cura (fermentação) visa obter
matéria orgânica homogênea, bem estrutu- (RIBEIRO et al., 1999). É um subproduto orgânico utilizado,
rada, livre de cheiro desagradável, sem Nem sempre a adubação orgânica apre- proveniente da fabricação do álcool e de
sementes nem pragas ou agentes causa- senta resultados satisfatórios sobre a pro- aguardente e que é produzido na proporção
dores de doenças, com relação C:N ideal dução de café. O emprego de material de 12 a 15 litros de vinhaça para cada litro
e com boa mineralização dos compostos orgânico pobre em N, conseqüentemente de álcool. Devido à elevada demanda bio-
orgânicos e liberação de nutrientes. Sob com alta relação C:N, como é o caso da ser- lógica de oxigênio (DBO) da vinhaça, deve-
condições controladas de umidecimento e ragem de madeira, bagaço de cana e palha se impedir que ela seja lançada diretamente
aeração, o processo se completa entre 60 e de arroz, poderá induzir forte deficiên- nos cursos d’água, podendo ser aprovei-
90 dias. Em ambiente fechado, sem revolvi- cia de N nos cafeeiros, se não for feita uma tada na cultura do cafeeiro. Sua composi-
mento, o período de cura é no mínimo de outra suplementação deste nutriente por ção é variável dependendo da composição
120 dias (RIBEIRO et al., 1999). outra fonte, prejudicando a sua produção da matéria-prima originária e do processo
É preciso conhecer o teor de C e de N (MORAES, 1981). A solução seria o uso pré- industrial de destilação. Contém cerca de
de cada um dos resíduos vegetais e do vio destas fontes na compostagem para se- 95% de água e o restante de material sólido
esterco para favorecer a decomposição rem usadas na lavoura. que é composto de material orgânico (70%)
pelos microorganismos. Devem-se combi- Além dessas fontes de origem animal e e mineral. Neste último, há predominância
nar materiais com relação C:N alta (palhas vegetal, existem também os resíduos urba- de K contendo ainda N, Ca, Mg e P. Uma
e restos vegetais) com materiais com re- nos e os agroindustriais. vez que na fração sólida predominam a
lação C:N baixa (estercos). A relação óti- matéria orgânica e K, a vinhaça pode ser
ma de proporção C:N em uma pilha de com- Resíduos urbanos e vista como um fertilizante orgânico rico em
posto é de 30/1 (Quadro 6), assim cada agroindustriais K. A quantidade a ser aplicada deve ser
um dos materiais devem ser balanceados. Existe hoje a preocupação de que as com base na quantidade de K necessária
Coloca-se em torno de 60% a 80% de volu- cidades e as indústrias estão cada vez mais para a cultura. No Quadro 7 é apresentada
mosos, 20% a 40% de resíduos orgânicos encontrando dificuldades para dispor de a composição de vinhaça. As formas líqui-
ou nutrientes (esterco de galinha 20%, ou seus resíduos. A colocação ordenada na das (vinhaça, chorume etc.) devem ser apli-
cama de frango 30%, ou de curral 40%) mais agricultura destes resíduos no solo, apro- cadas de preferência no período seco, de-
vido à grande quantidade de água que se
leva para o solo. Quando o solo está muito
QUADRO 6 - Relação C:N e teores de N, P e K de alguns materiais utilizados no preparo de compostos úmido, se a aplicação não for bem contro-
lada, poderá ocorrer perdas por escorri-
N P2O 5 K 2O
Fonte C:N mento. As formas líquidas são úteis tam-
(dag.kg-1) (dag.kg-1) (dag.kg-1)
bém para regar as composteiras e capi-
Esterco de curral 18/1 1,92 1,01 1,62
neiras.
Esterco de galinha 10/1 3,04 4,70 1,89
Lodo de esgoto ou biossólido
Esterco de porco 10/1 2,54 4,93 2,35
Palha de milho 112/1 0,48 0,38 1,64
É um resíduo urbano removido das águas
residuárias provenientes das residências e
Palha de aveia 72/1 0,66 0,33 1,91
estabelecimentos comerciais e industriais,
Crotalaria juncea 26/1 1,95 0,40 1,81 nas estações de tratamento de esgoto. Estes
Guandu 29/1 1,81 0,59 1,14 têm, no uso agrícola, a melhor alternativa
Mucuna 22/1 2,24 0,58 2,97 para a sua reciclagem, e a cultura do cafeeiro
Serragem de madeira 865/1 0,06 0,01 0,01 revela-se promissora para seu uso devido à
FONTE: Kiehl (1985). sua alta exigência em nutrientes, o espaça-
NOTA: dag.kg-1, no Sistema Internacional de Unidades, corresponde à 1%. mento utilizado nas entrelinhas facilita sua
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QUADRO 7 - Composição química de vinhaças de diferentes mostos

Vinhaça MO N P2O 5 K 2O CaO MgO S Fe Cu Zn


(kg.m-3) (kg.m-3) (kg.m-3) (kg.m-3) (kg.m-3) (kg.m-3) (kg.m-3) (mg.dm-3) (mg.dm-3) (mg.dm-3)
Mosto de melaço 52,04 0,77 0,19 6,00 2,45 1,04 1,24 80 5 3

Mosto misto 32,63 0,46 0,24 3,06 1,18 0,53 0,89 78 21 19

Mosto de caldo 23,44 0,28 0,20 1,47 0,46 0,29 0,44 69 7 2

Mosto de mandioca 20,40 0,50 0,10 4,70 1,30 0,70 1,07 _ _ _

NOTA: mg.dm-3, no Sistema Internacional de Unidades, corresponde à ppm.

aplicação mecanizada além de que, a par- Como fonte de N, os biossólidos apre- mo o cafeeiro. O curado já sofreu o proces-
te colhida, ou seja, os frutos recebem uma sentam 50% de N orgânico e 50% de N so completo de fermentação. É o mais rico
translocação menor de metais pesados em inorgânico. As formas inorgânicas (N-NH4+ em nutrientes e os sais passaram da forma
comparação com as folhas. e N-NO3-) estarão disponíveis às plantas orgânica para a mineral, assimiláveis pelas
No estado de São Paulo, estima-se para poucos dias após a aplicação e as orgâni- plantas.
o ano 2005 que a produção diária de bios- cas, lentamente disponíveis, alguns meses Para uso na cafeicultura orgânica, os
sólido seja de 615 t (com base no material após a aplicação. resíduos urbanos devem ser de origem
seco), sendo que 93,4% dessa produção A análise de uma amostra não definida doméstica, provenientes de municípios que
se concentrará na região metropolitana da de lodo de esgoto feita pela seção de Pedolo- fazem a coleta seletiva do lixo, em sistema de
cidade. Dessa forma, o uso do biossólido gia do Instituto Agronômico de Campinas coleta fechado e monitorado, sendo com-
na agricultura consiste numa das alter- (IAC) apresentou a seguinte composição: postado ou fermentado anaerobicamente, e
nativas para garantir uma reciclagem de C (15,7 dag.kg-1); C:N (11); N (1,38 dag.kg-1); rejeitando-se teores de metais pesados aci-
nutrientes que serão limitantes no futuro P2O5 (1,83 dag.kg-1); K2O (0,27 dag.kg-1); ma das exigências, os lixos hospitalares etc.
(BATAGLIA et al., 1983). Penteado (2000) Ca (1,57 dag.kg-1); Mg (0,62 dag.kg-1); As concentrações máximas de metais no lixo
e Brasil (1999) afirmam que o lodo de esgoto Cu (22 mg.dm-3); Fe (36700 mg.dm-3); Mn domiciliar são: Cd (0,7); Cu (70); Ni (25);
poderá ser utilizado apenas quando com- (268 mg.dm-3); Na (920 mg.dm-3) e Zn Cb (45); Zn (200); Hg (0,4); cromo total (70);
postado na propriedade de produção e não (4110 mg.dm-3). cromo IV (0 mg/kg). A necessidade de uso
empregado no cultivo de olerícolas. Dessa É uma fonte de composição variável que do lixo urbano deve ser comunicada à Certi-
forma, deverá ser originário de áreas urba- faz com que a utilização de determinados ficadora. Nos Quadros 5 e 8 são apresen-
nas e não industriais, com a certificação de lodos seja limitada pela presença de metais tadas as composições de compostos a
que apresentem baixos teores de metais pesados como Cu, Ni, Fe, Zn, Mn, Co, Hg, partir de lixos domiciliares.
pesados e que serão usados apenas em Cd, Pb e Cr.
culturas perenes após sua compostagem Dejeto de suínos ou
na propriedade, comunicando-se em segui- Lixo domiciliar chorume
da à sua Certificadora. Cabe, portanto, às É outra fonte de matéria orgânica a ser Possui conhecido efeito fertilizante.
Certificadoras contrárias ao uso do lodo aproveitada após a separação da fração Compõe-se de fezes, urina, da água de
urbano provar os efeitos deletérios desta inerte, constituída de metais, plásticos, vi- higienização, restos de rações e pêlos. Pos-
fonte, mesmo quando aplicado com os dros etc., da fração orgânica, que deverá sui uma composição variável em função da
cuidados necessários. ser compostada, ou seja, sofrer uma série idade dos animais, da alimentação destes,
Além de conter alto teor de matéria orgâ- de fases de decomposição e terminar trans- do tipo das instalações, do manejo etc. Pode
nica que pode melhorar as propriedades formada em húmus. O lixo urbano, confor- ser usado na produção de composto, quan-
físicas, químicas e biológicas do solo, o lodo me o grau de decomposição, pode ser clas- do mais sólido, ou para regar as compos-
de esgoto possui quantidades apreciáveis sificado em cru, semicurado e curado. O teiras, sendo aplicado diretamente na la-
de nutrientes principalmente de N e P, composto cru é aquele em que o adubo voura ou curtido por 30 dias produzindo
podendo ser usado como fonte desses para está na fase inicial de decomposição, sen- um biofertilizante de boa qualidade (quími-
fornecimento às plantas. As concentrações do obtido após a peneiragem, podendo ser ca e sanitária). Ainda pode ser usado na
de N, P e K no lodo dependem das contribui- utilizado para o cafeeiro após curtido na produção de biogás aproveitando-se os
ções recebidas pelas águas residuárias, do propriedade por ainda 15 a 30 dias. O semi- seus resíduos como biofertilizantes. Dessa
tipo de tratamento submetido e do manejo curado, que na usina de compostagem pas- forma, evita-se tornar um poluente ao ser
do lodo entre sua produção e sua aplicação sa por no mínimo 30 dias de decomposição, lançado em riachos e córregos. Apresenta
no solo. pode ser usado diretamente em plantas co- altos teores de N, P, Ca e, entre outros,

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Café Orgânico 75

QUADRO 8 - Composição de dois compostos domiciliares plantio ou em sulcos na lavoura adul-


Características Unidade Composto cru Composto curado ta dada a dificuldade de decompo-
sição. É aplicada na superfície ou
pH _ 5,80 8,30
usada previamente na compostagem
Cinza dag.kg-1 27,60 45,70
(Quadro 13);
Matéria orgânica dag.kg-1 72,40 53,10
b) polpa do café: é um subproduto pro-
C dag.kg-1 26,70 22,50
duzido através do preparo “via úmi-
Relação C:N _ 28,00 16,00
da” do café colhido. É diferente da
N total dag.kg-1 1,34 1,77 palha do café que é um material seco
-1
P2O 5 dag.kg 0,40 0,54 e que apresenta em sua constituição
K2O dag.kg-1 0,93 1,07 o pergaminho. A polpa pode ser uti-
-1
CaO dag.kg 2,26 2,96 lizada úmida diretamente na lavoura,
MgO dag.kg-1 0,36 0,48 também parcialmente decomposta,
S dag.kg -1
0,22 0,33 ou, ainda, após a compostagem, em
mistura com outros resíduos orgâni-
FONTE: São Paulo (198?).
cos, onde se consegue melhorar a
NOTA: dag.kg-1, no Sistema Internacional de Unidades, correspondente à %.
relação C:N, assim como a proporção
dos nutrientes (Quadro 13);
elevados teores de Na que, quando apli- Outras fontes c) vermicomposto ou húmus de mi-
cado em grande quantidade, pode-se tornar de matéria orgânica nhoca: adubo orgânico produzido
um dispersante das argilas do solo, promo- Outras fontes orgânicas disponíveis na a partir de fontes em sua forma sim-
vendo sua desagregação e tornando-o mais propriedade podem ser utilizadas na la- ples ou em mistura de fontes como
erodível. O chorume deve ser aplicado de voura como a palha e a polpa do café, o os esterco de bovinos e aves, a palha
e a polpa do café, resíduos vegetais
45 a 90 m3/ha/ano corrigindo-se os teores vermicomposto, a turfa etc.:
ou de culturas, os quais são transfor-
de K que são baixos e observando seus a) palha do café: é uma fonte bastante mados pelas minhocas, devendo ser
teores elevados de P. Nos Quadros 9 a 12, rica em K, resultante do benefício do pré-fermentados por 15 dias para
são apresentados os teores de nutrientes fruto seco, mas que não deve ser evitar as altas temperaturas iniciais.
existentes por m3 de chorume. enterrada diretamente na cova de A partir de 2 a 3 meses, as minhocas
terão transformado toda a matéria
orgânica em adubo quando torna-
QUADRO 9 - Composição média de nutrientes encontrada em 1m3 de chorume de três origens e em
se a adicionar às minhocas um novo
1m3 de esterco com 6,5% de matéria seca
substrato (Quadro 13);
Origem
Nutrientes Unidade Esterco d) turfa: material orgânico encontrado
1 2 3 com abundância nas baixadas úmi-
pH _ 8,20 _ _ 7,70
das e veredas e que foi acumulado
-3
e conservado ao longo dos anos
N total kg.m 3,59 4,70 4,91 4,80
devido às condições anaeróbicas
-3
NH4 kg.m _ 1,40 1,60 2,60 desses locais. Este material é colhido
P2O 5 kg.m-3 4,97 5,95 5,95 5,90 úmido e levado a secar em terrei-
K2O kg.m-3 1,38 1,58 1,57 1,56 ros, sendo a seguir destorroado, por
Ca kg.m -3
2,90 3,60 4,90 4,20 exemplo, pelas rodas de trator. Como
-3 em condições brasileiras, é um ma-
Mg kg.m 1,17 1,80 1,60 1,70
terial ácido e pobre, e deve ser corri-
S g.m-3 550,00 600,00 600,00 600,00
gido (2kg de calcário/t de turfa) e enri-
Fe g.m-3 440,00 213,33 255,55 234,00 quecido com fosfato natural, cinzas,
-3
Mn g.m 50,00 24,44 37,77 31,00 farinha de ossos etc. Tem a proprie-
Zn g.m -3
93,00 100,00 118,00 109,00 dade de reter água em quantidades
Cu g.m-3 72,00 67,00 88,90 79,00 superiores ao seu peso. Pode ser uti-
-3 lizada na cova de plantio, produção
B g.m 35,40 _ _ _
-3
de mudas etc. No Quadro 13 são apre-
Na g.m _ 322,20 342,20 332,00
sentados os teores de nutrientes des-
FONTE: Dados básicos: Konzen (1983). ta fonte orgânica.
Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.63-81, jan./abr. 2002
76 Café Orgânico

QUADRO 10 - Quantidade de matéria orgânica e biogás produzido por bovinos de corte e leite estabulados Cuidados a ser
e suínos em ciclo completo
tomados com o uso de
Bovinos de corte Bovinos de leite Suínos matéria orgânica ou com
Animais
Matéria Matéria Matéria
o seu uso contínuo
(n o ) Biogás Biogás Biogás
orgânica
(m3.dia-1)
orgânica
(m3.dia-1)
orgânica
(m3.dia-1) Com relação à adubação verde há alguns
(t.ano-1 ) (t.ano -1) (t.ano-1 ) fatores de risco:
50 55 43 93 73 136 107
a) se ocorre sazonalmente déficit hí-
100 112 88 100 150 278 222 drico no solo, plantas de sistema
150 168 132 288 230 400 312 radicular profundo, mais agressivo,
200 227 182 380 300 565 434 podem competir desfavoravelmente
250 286 223 475 375 706 543 com a cultura principal;
FONTE: Lely do Brasil (198?). b) adubo verde com grande capacidade
de produzir biomassa mais fibrosa
pode alterar desfavoravelmente a
QUADRO 11 - Produção média diária de esterco relação C:N e, também, competir na
Peso médio do animal Fezes + urina utilização dos nutrientes do solo e
Tipo de animal
(kg) (litros) da água.
Suíno 70 06 Plantas como nabo forrageiro, caruru
etc., embora não produzam grande volu-
Bovino 450 26
me de biomassa, têm algo mais importante:
FONTE: Lely do Brasil (198?). grande exsudação de ácidos orgânicos
solubilizadores de fontes de nutrientes con-
QUADRO 12 - Produção dejetos de suínos produzida por categoria siderados como indisponíveis. Entretanto,
Esterco Esterco + urina Dejetos líquidos são adubos verdes de fácil propagação
Categoria animal
(kg.dia-1) (kg.dia-1) (L.dia -1) natural (por sementes ou estolões) e se não
5 a 100 kg 2,30 4,90 7,00
forem bem manejados, passam a ser consi-
derados como planta daninha infestando a
Porca reposição _ _ _
lavoura.
Cobrição/gestante 3,60 11,00 16,00 As adubações orgânicas residuais, isto
Porca com leitões 6,40 18,00 27,00 é, aplicadas em períodos anteriores, embora
Macho 3,00 6,00 9,00 sejam naturais de origem animal e vegetal,
Leitão creche 0,35 0,95 1,40 também não estão isentas de alguns riscos,
ou seja, podem provocar alterações desfa-
FONTE: Konzen (1983).
voráveis na relação C:N. O adubo orgânico

QUADRO 13 - Teores médios de nutrientes em diversas fontes orgânicas


N P2O 5 K2O Ca Mg S B Cu Fe Mn Mo Zn
Fonte
(dag.kg-1) (dag.kg-1) (dag.kg-1) (dag.kg-1) (dag.kg-1) (dag.kg-1) (mg.kg-1) (mg.kg-1) (mg.kg-1) (mg.kg-1) (mg.kg-1) (mg.kg-1)
Palha do café 1,78 0,14 3,75 0,41 0,13 0,15 34 18 150 29 0,07 70
Polpa do café 2,50 0,15 3,00 0,40 0,17 _ _ _ _ _ _ _
Vermicomposto 0,76 1,24 1,80 1,18 0,40 _ 3 12 210 77 _ _
Turfa 0,42 0,42 0,40 _ _ _ _ _ _ _ _ _
Torta de mamona 5,50 1,99 1,44 5,37 0,59 _ _ 23 938 23 _ 298
-1 -1
NOTA: dag.kg , no Sistema Internacional de Unidades, correspondente à %; mg.kg , no Sistema Internacional de Unidades, correspondente à ppm.

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Café Orgânico 77

residual natural sempre tem uma compo- anos de utilização de esterco como A fertilidade do solo deve ser aumen-
sição variada de nutrientes, mas desba- fonte primária de N, podendo tornar- tada e mantida através da utilização dos
lanceada, o que implica na necessidade de se causa da eutrofização das águas. recursos naturais, na medida do possível
serem enriquecidos com fertilizantes mi- O P, neste caso, pode ser transporta- com recursos produzidos na propriedade,
nerais (PAVAN, 1993). Em um experimento do para ambientes aquáticos quan- bem como através de subprodutos orgâ-
de longa duração, com a cultura do cafeeiro, do dissolvido em solução por escor- nicos. Diversas providências devem ser
Pavan e Androcioli Filho (1995) avaliaram rimento superficial ou quando ligado tomadas para manter ou incrementar a fer-
o manejo da adubação orgânica no sistema a partículas orgânicas ou inorgâni- tilidade do solo, além de que todo o material
de fracionamento de fósforo, e as diferen- cas, pelo processo de erosão (NOVAIS; orgânico deve ser reciclado.
ças nas frações foram maiores devido às SMYTH, 1999). Os fertilizantes concentrados de alta
mudanças químicas, principalmente pH, solubilidade são considerados prejudiciais
Dada a grande variabilidade da compo-
induzidas por composto orgânico e mulch para a vida do solo e para o desenvolvimento
sição dos fertilizantes orgânicos simples,
do que pelo efeito biológico. adequado das culturas, devido ao aumento
são apresentadas no Quadro 14 especifi-
O uso contínuo de matéria orgânica le- nas concentrações dos nutrientes, ocasio-
cações destes fertilizantes, conforme legis-
va ainda o cafeicultor a estar atento a deter- nando uma absorção mais intensa pelas
lação do Ministério da Agricultura (apud
minados cuidados quanto à fonte desta, à plantas. Além disso, por solubilizarem-se
RIBEIRO et al., 1999).
sua origem, à qualidade e à quantidade rapidamente e, se não forem absorvidos pe-
usada, como por exemplo: las plantas, desperdiçam-se, contribuindo
MANEJO DA
a) matéria orgânica pode disseminar para acidificar os solos, com efeito nega-
ADUBAÇÃO DO CAFEEIRO
plantas invasoras, cujas sementes tivo sobre alguns nutrientes do solo e com
EM UM SISTEMA ORGÂNICO
atravessam inalteradas o trato diges- possível incremento de problemas fitos-
DE PRODUÇÃO
tivo dos animais; sanitários. Podem também ser acumulados
b) através da matéria orgânica pode Os fertilizantes de origem mineral, com nos lençóis freáticos ou contaminarem os
ocorrer a disseminação de agentes alta concentração e solubilidade, devem ser recursos hídricos. Os adubos nitrogenados
patogênicos; rejeitados no sistema orgânico de produção muito contribuem para a contaminação com
c) pode promover efeito salino e mes- do cafeeiro. As lavouras de café devem for- nitrato dos mananciais hídricos e de conta-
mo de toxidez de amônio; mar um todo orgânico procurando alcançar minação dos aqüíferos subterrâneos.
a maior auto-suficiência possível. Ao evitar o emprego de fertilizantes mi-
d) excesso de N pode comprometer a
qualidade bromatológica de frutos
ou da vegetação de determinadas QUADRO 14 - Especificações dos fertilizantes orgânicos simples - extrato da legislação vigente(A)
espécies vegetais; Matéria
Orgânicos simples Umidade Relação N P2O 5
orgânica pH
e) uso elevado de fonte desbalanceada processados máxima C:N mínimo mínimo
mínima mínimo
(%) máxima (dag.kg-1) (dag.kg-1)
pode causar deficiência de Ca e/ou (dag.kg-1)
Mg, como por exemplo, excesso de Esterco de bovino 25 36 6 20/1 1,0 _
palha de café. O uso excessivo de Esterco de galinha 25 50 6 20/1 1,5 _
esterco de galinha de gaiola que
Bagaço de cana 25 36 6 20/1 1,0 _
apresenta teor elevado de Ca pode
Palha de arroz 25 36 6 20/1 1,0 _
promover deficiência de Mg e/ou K;
Palha de café 25 46 6 20/1 1,3 _
f) acúmulo de K e Na pode comprome-
ter a estrutura do solo, afetando suas Borra de café 25 60 6 20/1 1,8 _
propriedades físicas; Torta de algodão 15 70 _ _ 5,0 _

g) presença de resíduo de herbicidas Torta de amendoim 15 70 _ _ 5,0 _


nos estercos de bovinos causa pre- Torta de mamona 15 70 _ _ 5,0 _
juízos para a cultura adubada; Torta de soja 15 70 _ _ 5,0 _
h) muitos resíduos agroindustriais e Farinha de ossos 15 6 _ _ 1,5 (B)
20 (total)
urbanos em quantidades excessivas Farinha de peixe 15 50 _ _ 4,0 6 (total)
podem acumular metais pesados;
Farinha de sangue 10 70 _ _ 10,0 _
i) quando a quantidade de esterco é defi- Turfa e linhita 25 30 6 18/1 1,0 _
nida pela quantidade de N, poderá ha- FONTE: (A) Ministério da Agricultura e Reforma Agrária (apud RIBEIRO, 1999); (B) Total, dos quais
ver acúmulo de P no solo. Aumenta- 80% solúvel em ácido cítrico 20 g/L (Dados básicos: RIBEIRO et al., 1999).
se o problema (P-ambiente) com os NOTA: dag.kg-1, no Sistema Internacional de Unidades, corresponde à %.

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78 Café Orgânico

nerais de elevada solubilização, os agri- Deve-se ter ciência de que os nutrientes mento de material como pelo processo de
cultores que adotam o sistema orgânico de orgânicos aplicados nem sempre estarão fermentação, que envolve desprendimento
cultivo limitam sua capacidade de adubar totalmente disponíveis aos cafeeiros no de amônia.
às necessidades básicas de um cultivo, ou mesmo ano da aplicação, e que deverão Tanto as taxas de conversão dos nutri-
seja, apenas as quantidades necessárias às ser aplicados todos os anos para que os entes ao longo dos anos quanto as perdas
plantas ou o necessário conseguido atra- nutrientes de forma contínua estejam dis- de nutrientes das diferentes fontes podem
vés da mineralização da matéria orgânica ou poníveis às plantas. Dessa forma, a conver- fazer com que as quantidades de adubo
de fontes de baixa solubilidade etc. são dos nutrientes da forma orgânica, em orgânico previstas para ser adicionadas na
Dessa forma, na adubação e nutrição função do tempo para a mineral, ou seja, na lavoura não sejam disponíveis às plantas,
dos cafeeiros no sistema orgânico de pro- forma que são absorvidos, é apresentada fazendo com que estas fiquem deficientes.
dução pressupõe-se a adição de uma gama (para macronutrientes) no Quadro 15. As Além destes dois fatores citados, é ne-
de nutrientes, em doses reduzidas, de forma percentagens de conversão apresentadas cessário também conhecer as exigências
ampla e diversificada, através de produtos indicam uma aproximação da taxa de con- das plantas, os períodos de maior deman-
de baixa solubilidade e concentração, que- versão dos nutrientes da forma orgânica da de cada nutriente e os períodos em que
latizados ou não, em soluções de biomassa para a forma mineral. Estes dados ajudam eles estão menos disponíveis no solo (pe-
fermentada, em processos aeróbios e/ou a estimar a liberação de N, P2O5 e K2O de- ríodo seco).
anaeróbios. A seguir comentam-se os resultados de
corrente do uso dos adubos orgânicos,
No sistema convencional de adubação um experimento conduzido do plantio até a
desde que as condições sejam ideais para
intensiva, usam-se formulações concen- segunda produção, em um Latossolo va-
o processo de mineralização (RIBEIRO et
tradas de alta solubilidade, nas quais os riação Una, distrófico, textura muito argi-
al., 1999).
nutrientes no geral estão prontamente dis- losa, fase cerrado, na região de Rio Paranaí-
poníveis aos cafeeiros para que possam ba, MG, por Furtini Neto et al. (1995). Neste
expressar seus potenciais produtivos. No experimento foram testadas seis fontes
QUADRO 15 - Percentagens de conversão dos
sistema orgânico de produção, devem-se de matéria orgânica aplicadas na cova por
nutrientes aplicados, via adubos
também proporcionar aos cafeeiros todas orgânicos, para a forma mineral ocasião do plantio, mais um tratamento
as condições nutricionais para que possam
Tempo de conversão onde se plantou anualmente mucuna preta
expressar seus potenciais de produção, po-
nas entrelinhas com incorporação no flo-
rém, através do fornecimento de fontes de Nutriente Após o
1o ano 2o ano rescimento. Esses tratamentos foram repe-
baixa solubilidade que necessitam de trans- 2o ano
(%) (%) tidos também na presença de adubo quími-
(%)
formações químicas ou de reações do solo,
N 50 20 30 co, de acordo com o recomendado para a
para que os nutrientes se tornem disponí-
cultura (sistema convencional). As fontes
veis às plantas. No caso de fontes orgânicas, P2O 5 60 20 20
orgânicas na cova de plantio foram o ester-
estas necessitarão primeiramente de passar K2O 100 0 0 co de curral (8kg/cova); esterco de galinha
pela ação dos microrganismos para mine-
FONTE: Ribeiro et al. (1999). (2kg/cova); palha de café (8kg/cova); Hu-
ralizá-las ou da ação enzimática para dispo-
musite 310 (250g/cova); torta de mamona
nibilizar os nutrientes, tudo isto ocorrendo
(1kg/cova); turfa (15kg/cova). Nos dados
de uma forma lenta para serem absorvidos
Acredita-se que as percentagens de observados aos 12 e 24 meses, os trata-
pelas plantas.
conversão devam ser consideradas prin- mentos com adubação apenas orgânica na
Têm-se observado com freqüência ca-
cipalmente no primeiro ano de adubação cova de plantio não se diferiram daqueles
fezais conduzidos no sistema orgânico, mal
orgânica, ocorrendo, nos anos seguintes, tratamentos convencionais, em que se uti-
nutridos, apresentando deficiências nutri-
efeitos residuais da aplicação anterior. lizou adubo orgânico na cova mais a aduba-
cionais e com baixas produções. Indepen-
dente do sistema utilizado, convencional É necessário fornecer os adubos orgâ- ção química anual de cobertura, indicando
ou orgânico, os mesmos critérios, de cons- nicos todos os anos para que se possa ter que as fontes aplicadas na cova de plan-
trução e manejo da fertilidade do solo, de nutrientes disponíveis nas quantidades ne- tio (sem adubação química) já possuíam
adição dos nutrientes nas quantidades re- cessárias aos cafeeiros, em forma contínua, nutrientes suficientes para nutrir bem os
comendadas etc., têm que ser atingidos ou à medida que vão sendo mineralizados, cafeeiros. Os melhores tratamentos foram
perseguidos para se obter produções com- aproveitando-se sempre das mineralizações o esterco de curral e a turfa corrigida e o me-
pensadoras. As lavouras têm que, periodi- residuais referentes às adubações anterio- nos favorável foi a adubação verde, talvez
camente, ser avaliadas em função da pro- res. porque tenha sido cortada e incorporada
dução pendente e pela análise do solo ou Além do efeito da taxa de conversão, apenas nas entrelinhas, longe do acesso
do tecido foliar para se identificar o seu os nutrientes poderão também sofrer per- das raízes. A partir da primeira produção,
potencial e os fatores limitantes a ser corri- das. Os dejetos dos suínos podem sofrer dada a grande demanda de nutrientes para
gidos. perdas de 30% a 60%, tanto pelo arrasta- os frutos, os tratamentos, adubação orgâ-
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Café Orgânico 79

nica de cova de plantio mais adubação as condições químicas e biológicas do so- cies perenes, rotacionadas e/ou consor-
química anual de cobertura, mostraram-se lo, necessitando-se de pesquisas para se ciadas com os cafeeiros.
superiores. Dessa forma, fontes orgânicas, certificar esta afirmativa. Consideramos Não é permitido o uso de adubos nitro-
quando aplicadas em doses adequadas impossível a aplicação de calcário nesta genados como a uréia, sulfato de amônio,
apenas no plantio, foram capazes de suprir quantidade, tendo em vista que nos solos nitrato de amônio, nitrocálcio e de formu-
bem os cafeeiros até os 24 meses no cam- tropicais, nunca trabalhados, as necessida- lações convencionais. As fontes amonia-
po, necessitando de novas aplicações nos des sempre serão superiores a estes valo- cais acidificam o solo, uma vez que no
demais anos pós-plantio, semelhante ao res principalmente se considerarmos uma processo de absorção do NH+4 pelas raí-
critério utilizado para os sistemas conven- incorporação superior a 20cm. Além do zes ocorre a liberação de H+ para a solução
cionais. mais, no caso de plantas perenes é a única do solo. As formas nítricas (NO3-), como
oportunidade de incorporar calcário em os nitratos de sódio, de cálcio e de potás-
Correção da acidez do solo profundidade. Pode acontecer pela análi- sio, por serem altamente solúveis, não são
Na implantação da lavoura faz-se pre- se do solo, que a quantidade a aplicar de aceitas pela agricultura orgânica.
viamente uma amostragem de solo de 0 a até 2,0 t nesta fase seja uma subcalagem e, O P é um nutriente bastante deficiente
20cm e de 20 a 40cm para se avaliar carac- conseqüentemente, teremos sub-respostas nos solos brasileiros. No sistema orgânico
terísticas do solo relativas à acidez. As que das plantas. Como as aplicações na fase de de produção do cafeeiro não é permitido o
se apresentarem na camada de 20 a 40cm produção são superficiais sem incorpora- uso de adubos processados de alta solubi-
com valores como Ca+2 (< 0,4 cmolc/dm3); ção, acreditamos que as quantidades de lidade, mas num contínuo manejo orgânico
Al+3 (> 0,5 cmol/dm3) ou m (> 30%), reco- calcário nas lavouras já implantadas sejam do solo é elevada a disponibilidade deste
menda-se no preparo do solo, antes da im- provavelmente menor que as 2,0 t/ha limi- nutriente em suas formas solúveis, neces-
plantação do sistema orgânico, uma incor- tes. Nesta fase, levar-se-á em consideração sitando-se apenas de um aporte inicial, atra-
poração profunda do calcário ou o uso do a profundidade de incorporação a 7cm e vés de fontes de média a baixa solubilidade,
gesso agrícola no sulco ou cova de plantio será provavelmente feita uma aplicação em para dar início ao processo produtivo. Na
(300g/m de sulco ou 200g/cova), para favo- faixa, apenas na área das raízes ou na região adubação fosfatada, são indicados a fari-
recer as raízes e estas atingirem maiores das adubações, sendo uma calagem mais nha de ossos, os termofosfatos e os fosfatos
profundidades. Na lavoura já implantada de manutenção ou de adubação com cálcio. de rocha in natura ou semi-solúveis, de bai-
ou em produção, fazer amostragem de solo xa reatividade como os fosfatos brasileiros
a 0 a 20cm a cada dois a três anos, na área Adubações do cafeeiro (Araxá, Patos, Catalão, Abaeté etc.) ou fos-
adubada ou na região de concentração das Estas devem levar em consideração as fatos naturais reativos de origem sedimentar
raízes (sob a planta) e também nas entre- análises do solo e dos tecidos foliares e as (Gafsa, Arad, Daouy, Carolina do Norte,
linhas dos cafeeiros, na mesma profun- quantidades recomendadas para ser apli- Atifós etc.).
didade, ambas perfazendo duas amostras cadas, em função da idade da lavoura ou da No caso destes produtos, não tem sido
compostas distintas. Como o calcário será carga pendente, as fontes a ser usadas e os considerada a eventual presença de metais
aplicado na superfície do solo, levar em respectivos teores dos nutrientes nelas pesados. O uso de escórias também é acei-
consideração no cálculo a quantidade a ser contidos, as percentagens de conversão da to, desde que comprovadamente isentas
aplicada em uma possível profundidade de fonte orgânica para a forma mineral no ano de metais pesados e/ou elementos tóxicos
incorporação de 7cm. da aplicação e o residual do ano anterior, além aos vegetais. Não é permitido o uso de adu-
As quantidades de calcário e gesso a das perdas dos nutrientes em cada fonte. bos fosfatados de alta solubilidade como
ser aplicadas devem seguir as recomenda- As quantidades a ser aplicadas baseiam- o superfosfato triplo, o fosfato monoamô-
ções de Ribeiro et al. (1999), para o cafeeiro, se nas sugestões de adubação de Guimarães nio (MAP), fosfato diamônio (DAP) e de
quando ainda na fase de construção da fer- et al. (1999), para as diferentes fases da cul- formulações convencionais.
tilidade do solo, nos solos tropicais nunca tura. Também, deve-se estar atento de que
trabalhados, antes ainda de se implantar o Nestas aplicações, deve-se observar no uso de fosfatos naturais, o extrator uti-
sistema orgânico. Nesta situação, é a única que o N é o nutriente de maior requerimen- lizado para P na análise de solo (Mehlich 1)
oportunidade de se incorporar calcário a to pelas plantas e, no sistema orgânico de extrai quantidades maiores, superestiman-
maiores profundidades em culturas perenes. produção, é o nutriente mais limitante e que do o resultado, não representando o que a
Penteado (2000) e Costa e Campanhola deverá ser mais bem monitorado. Como planta absorve. Neste caso, ao se utilizar
(1997) afirmam que, implantado o cafeeiro fontes de N, preconiza-se o uso das tortas, fosfato natural, solicitar ao laboratório a
no sistema orgânico de produção, a quan- de resíduos animais, biofertilizantes, vi- utilização de outros métodos de extração.
tidade a aplicar não deve ultrapassar a 2,0 nhaça, húmus de minhocas, restos vegetais O cafeeiro é uma planta que utiliza bem
t/ha. Não conhecemos os critérios para se compostados e, principalmente, a fixação o P fornecido por fontes naturais, talvez
adotar este número. Sabe-se que qualquer biológica pelas leguminosas que são usa- por exigir menores quantidades de P que
quantidade, por menor que seja, já alteram das como adubos verdes e/ou como espé- são liberadas lentamente por estas fontes
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80 Café Orgânico

ou por exsudar ácidos orgânicos em quan- brasileiras, os mais importantes são o Zn, B eles estarão menos disponíveis no solo ou
tidade, disponibilizando o P às plantas. A e o Cu. Como fonte dos micronutrientes dos períodos em que os nutrientes referen-
seguir apresentam-se os resultados de um estão as algas, o basalto e os sais (sulfato tes às fontes aplicadas estarão disponíveis
experimento de Garcia e Ferreira (1997) que de cobre, sulfato de zinco, ácido bórico etc.). às plantas nas fases de sua maior exigência.
testaram três doses de P2O5 (0g ou teste- É bastante comum o emprego de produtos Com o uso de fontes que tragam o menor
munha, 30g e 60g/cova), três fontes de P, ricos em micronutrientes, complexados com efeito depressivo à planta e à natureza, nas
uma solúvel (superfosfato triplo); um fos- a matéria orgânica, como os biofertilizantes, quantidades e épocas adequadas, tem-se a
fato natural reativo (Atifós) e um fosfato supermagro etc. Esses adubos orgânicos, certeza do sucesso do empreendimento com
natural de baixa reatividade (fosfato de Ara- contendo micronutrientes e elevado teor de produtividade e retorno econômico.
xá); estes tratamentos foram testados na pre- aminoácidos e outros nutrientes naturais,
sença e ausência de calcário aplicado na quando adequadamente aplicados, podem REFERÊNCIAS
cova de plantio (200g/cova). Concluíram que favorecer a resistência e o vigor das plantas. ALCÂNTARA, E. N. de. Efeito de diferentes
as fontes e doses de fósforo utilizadas não No artigo “Certificação de Café Orgâ- métodos de controle de plantas daninhas na
apresentaram nenhuma resposta na ausên- nico” (THEODORO, 2002) é apresentado cultura do cafeeiro (Coffea arabica L.) sobre
cia do calcário. Na presença, as três fontes no Anexo II “Adubos e condicionadores a qualidade de um Latossolo Roxo distrófico.
tiveram comportamento semelhantes para permitidos” da Instrução Normativa no 007, 1997. 133f. Tese (Doutorado em Agronomia) -
a dose maior de P2O5 (60g/cova). Na dose do Ministério da Agricultura em 17/05/99, Universidade Federal de Lavras, Lavras.
menor o fosfato de Araxá foi inferior, se- publicada no Diário Oficial no 94-19/05/99 BATAGLIA, O.C.; BERTON, R.S.; CAMARGO,
guido do superfosfato triplo (Quadro 16). que normatiza a agricultura orgânica. O.A.; VALADARES, J.M.A.S. Resíduos orgânicos
Depois do N, o K é o nutriente reque- como fontes de nitrogênio para capim-braquiária.
rido em maior quantidade pelas plantas e CONSIDERAÇÕES FINAIS Revista Brasileira de Ciência do Solo, Cam-
no caso do cafeeiro, se considerarmos a Para que se tenham lavouras bem nu- pinas, v.7, n.3, p.277-284, set./dez. 1983.
produção, é o nutriente de maior impor- tridas e produtivas, sob o sistema orgânico BRASIL. Ministério da Agricultura e do Abasteci-
tância. É um nutriente de atividade fun- de produção de café, torna-se necessário mento. Instrução Normativa no 7, de 17 de maio
damental nos processos de frutificação e um perfeito monitoramento de seu estado de 1999. Dispõe sobre a produção de produtos
de defesa natural das plantas. Como fontes nutricional através da análise do solo, aná- orgânicos vegetais e animais. Lex - coletânea
de K, utilizam-se as cinzas vegetais, a casca lise foliar e da análise da produção a ser de Legislação e Jurisprudência: legislação
de café, a vinhaça, o sulfato de potássio obtida. Conhecida as quantidades de nutri- federal e marginália, São Paulo, ano 63, t.5,
em substituição à fonte clorada, o sulfato entes a ser fornecidas, deve-se ter em mente p.2465-2476, maio 1999.
duplo de K e Mg etc. as quantidades a ser fornecidas pelas fon- COSTA, M.B.B. da; CAMPANHOLA, C. A agri-
Os micronutrientes também são consi- tes a ser aplicadas, ter conhecimento das cultura alternativa no estado de São Paulo.
derados de grande importância na agricultu- taxas de conversão dos adubos orgânicos Jaguariúna: EMBRAPA-CNPMA, 1997. 63p.
ra orgânica, não somente por seu papel na para a forma mineral, de suas perdas, ter o (EMBRAPA-CNPMA. Documentos, 7).
nutrição, como na defesa e resistência das conhecimento dos períodos de maior de-
FURTINI NETO, A.E.; CURI, N.; GUIMARÃES,
plantas. Para os cafeeiros, em condições manda de cada nutriente, dos períodos que
P.T.G. Fontes de matéria orgânica e fertilização
química na formação e produção de cafeeiro
QUADRO 16 - Tratamentos utilizados e produções obtidas em sacas beneficiadas de café por ha (Coffea arábica L.) em latossolo da região dos
Cerrados. Ciência e Prática, Lavras, v.19, n.3,
Sacas beneficiadas/ha
p.265-271, jul./set. 1995.
Fontes e doses de P
Sem calcário Com calcário GALLO, J.R.; MORAES, F.R.P. de; LOTT, W.V.;
Testemunha 2,31 a 7,39 c INFORZATO, R. Absorção de nutrientes pe-
las ervas daninhas e sua competição com o
30g P2O5 Superfosfato triplo 2,31 a 19,41 ab
cafeeiro. Campinas: IAC, 1958. 13p. (IAC.
60g P2O5 Superfosfato triplo 2,68 a 23,11 a Boletim, 104).
30g P2O5 Atifós 2,77 a 24,03 a GARCIA, A.W.R.; CORREA, J.B.; GONÇALVES,
60g P2O5 Atifós 3,23 a 25,88 a S.; FREIRE, G.B.; SANTANA, J.; ROMERO, J.B.;
MALAVOLTA, M.L.; MALAVOLTA, E.;
30g P2O5 Fosfato de Araxá 2,40 a 16,64 b
CARVALHO, J.G. Fitomassa e conteúdo de macro
60g P2O5 Fosfato de Araxá 2,96 a 23,11 a e micronutrientes no material podado do cafeeiro.
In: CONGRESSO BRASILEIRO DE PESQUISAS
Média 2,67 b 19,94 a
CAFEEIRAS, 13., 1986, São Lourenço. Traba-
FONTE: Garcia e Ferreira (1997). lhos apresentados... Rio de Janeiro: IBC, 1986.
NOTA: Médias seguidas da mesma letra, não diferem entre si pelo teste de Tukey a 5%. p.158-164.

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Café Orgânico 81

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Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.63-81, jan./abr. 2002


Café Orgânico 83

Manejo ecológico
das principais Resumo - São discutidas as pragas-chave do cafeeiro aplicando-
se princípios e práticas de controle orientados ecologicamente
ou, ainda, recomendando-se uma série de táticas com base na

pragas do cafeeiro ecologia para reduzir o impacto de problemas causados pelas


pragas. Propõem-se a utilização ao máximo da ação benéfi-
ca dos agentes de controle biológico, pois o próprio agro-
Paulo Rebelles Reis 1 ecossistema possui um complexo de inimigos naturais capaz
Júlio César de Souza2 de controlar as pragas, e a utilização de conhecimentos
Madelaine Venzon3 ecológicos que permitam a tomada de decisão para reduzir
perdas, sem causar maiores riscos à saúde humana e ao
ambiente, que constituem o manejo ecológico. Mostra-se que

existe tolerância das plantas ao ataque de pragas e aos danos


que provocam, enquanto estes não representam prejuízo
econômico. Para isso, é fornecida a orientação ao agricultor
para esperar que a população do inseto atinja nível de dano
econômico para ser considerada como praga. Portanto, essa
tolerância deve ser observada, visando preservar a ação do
ambiente, principalmente dos inimigos naturais, cujo
crescimento populacional natural será favorecido, permitindo
que se tornem mais eficientes.

Palavras-chave: Cafeicultura orgânica; Café; Bicho-mineiro;


Broca-do-café; Cigarras-do-cafeeiro; Controle biológico;
Manejo de pragas.

1
Engo Agro, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM-EcoCentro, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: rebelles@ufla.br
2
Engo Agro, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM-EcoCentro, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: juliocs@ufla.br
3
Enga Agra, Ph.D., Pesq. EPAMIG-CTZM, Caixa Postal 216, CEP 36571-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: venzon@mail.ufv.br

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.83-99, jan./abr. 2002


84 Café Orgânico

INTRODUÇÃO Das espécies de Quesada, a Q. gigas é pertencem ao gênero Carineta. Segundo


a mais comumente encontrada (Fig.1). As Martinelli e Zucchi (1986), ocorrem em
O cafeeiro hospeda inúmeras espécies
ninfas móveis desta espécie medem de cafeeiros as espécies C. matura (Distant,
de insetos e ácaros (REIS; SOUZA, 1978,
20mm a 30mm de comprimento e atacam a 1892) e C. spoliata (Walker, 1858). Marti-
REIS et al., 1984), algumas das quais são
raiz principal e as mais grossas do restante nelli e Zucchi (1987) acrescentam a estas
pragas de importância econômica e fre-
do sistema radicular do cafeeiro. Os adultos espécies C. fasciculata (Germar, 1821). As
qüentemente causam prejuízos, enquanto
emergem no período compreendido entre ninfas móveis destas espécies medem cer-
que outras não chegam a causar nenhum
o final de agosto e outubro. ca de 10 mm a 15 mm de comprimento e di-
dano. As principais pragas da cultura,
O segundo gênero em importância é o ferem das do gênero Fidicina por terem o
embora possam haver diferenças entre as
Fidicina (Fig.1), e a espécie mais comu- corpo mais fino e formato quase retangular,
regiões cafeeiras, de modo geral são: o
mente encontrada em cafeeiros é F. pronoe, enquanto que aquelas têm o corpo mais
bicho-mineiro, Leucoptera coffeella
conforme Martinelli e Zucchi (1989a). As volumoso (Fig.1).
(Guérin-Mèneville, 1842) (Lepidoptera: Lyo-
ninfas móveis desta espécie são menores Conforme Martinelli e Zucchi (1984), a
netiidae); a broca-do-café, Hypothenemus
que as da espécie anterior, medem de 8mm espécie Dorisiana drewseni (Stal, 1854)
hampei (Ferrari, 1867) (Coleoptera: Scolyti-
a 15mm de comprimento e sugam a seiva tem sido erroneamente citada no Brasil co-
dae) e as cigarras-do-cafeeiro, principal-
nas extremidades das raízes, tendo sido mo Fidicina drewseni. Tendo em conta tal
mente a espécie Quesada gigas (Olivier,
encontradas até a uma distância de 1,20m fato, pode ser considerada como uma
1790) (Hemiptera; Homoptera: Cicadidae).
da raiz principal. Adultos deste gênero quarta espécie em importância ao cafeeiro.
O bicho-mineiro é praga de ocorrência
surgem nos meses de fevereiro e março. A A D. drewseni é muito comum nos cafe-
generalizada; a broca-do-café tem ocorrido
Q. gigas e F. pronoe apresentam gerações zais de Minas Gerais, São Paulo e Paraná
principalmente na Zona da Mata de Mi-
superpostas, e a composição percentual (MARTINELLI; ZUCCHI, 1989b), e o
nas Gerais, estados do Espírito Santo e de
das espécies, por cova de cafeeiro infesta- período de ocorrência de adultos é também
Rondônia e em cafezais próximos a grandes
do, geralmente é de 87% do gênero Quesada fevereiro e março.
represas, enquanto que as cigarras têm
e 13% de outros gêneros (SOUZA et al.,
atacado cafezais no noroeste da região Sul
1983, REIS et al., 1984, REIS; SOUZA, Dano
de Minas e parte do Alto Paranaíba, estado
1986b). Um cafezal infestado por cigarras da
de Minas Gerais, e Mogiana, no estado de
As cigarras que ocupam o terceiro lugar espécie Q. gigas apresenta em média 200 a
São Paulo, principalmente.
em importância como pragas de cafeeiros 400 ninfas móveis por cova, população que
É sobre essas três pragas que devem
ser concentrados os esforços de controle, causa severo dano às plantas. A sucção
sempre com base na preservação dos contínua da seiva causa o depauperamen-
inimigos naturais, pondo assim em prática to das plantas, que se manifesta na parte
o manejo ecológico. aérea delas pelo definhamento, clorose e
Outras pragas, por exemplo ácaros, queda precoce das folhas apicais dos
lagartas e cochonilhas, devem ter também ramos. Os sintomas são sempre mais
como base os mesmos princípios de ma- acentuados nas épocas de déficit hídrico,
nejo. com a ocorrência de floradas insignifi-
cantes. As conseqüências finais do ataque
resultam em quebra da produção e mesmo
CIGARRAS-DO-CAFEEIRO
perda total da lavoura, se a praga não for
As principais espécies de cigarras re- controlada a tempo (SOUZA et al., 1984).
gistradas atacando raízes de cafeeiro são: Estes autores relatam também que o cafeei-
Quesada gigas (Olivier, 1790), Fidicina ro suporta uma infestação de, aproxima-
pronoe (Walker, 1850), Carineta sp. e damente, 35 ninfas de Q. gigas por cova.
Foto: Paulo Rebelles Reis

Dorisiana spp. (Hemiptera; Homoptera: Considerando que o volume corpóreo da


Cicadidae). F. pronoe é dez vezes menor que o da Q.
gigas, pode-se supor que o cafeeiro venha
Considerações gerais a suportar uma infestação dez vezes maior
As cigarras que atacam raízes do ca- dessa espécie de cigarra.
feeiro pertencem principalmente a três Figura 1 - Tamanhos e formas de adultos
gêneros: Quesada, Fidicina e Carineta, Controle
da cigarra-do-cafeeiro Quesada
podendo um quarto gênero, Dorisiana, ser gigas, Fidicina pronoe, Carineta Serão discutidas apenas as formas de
também considerado. sp. e respectivas exúvias controle natural, que podem auxiliar na

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Café Orgânico 85

redução da praga, porém nem sempre com da Zona da Mata, em Minas Gerais, estados Dano
eficiência que permita reduzir danos. do Espírito Santo e de Rondônia, e lavouras O ataque da broca-do-café causa a re-
muito próximas às grandes represas em dução do peso dos grãos, queda de frutos
Controle biológico qualquer região, devido às condições de (prejuízo quantitativo) e redução da quali-
Até o momento somente foi relatada a alta umidade e temperatura nesses locais. dade do café através da alteração no tipo
ocorrência do fungo entomopatogênico A partir da constatação da ferrugem-do- e, às vezes, na bebida (prejuízo qualitativo).
Metarhizium anisopliae (Metsch., 1879), que cafeeiro, Hemileia vastatrix Berk. e Br., e Os danos são causados pelas larvas que
causa mortalidade da cigarra-do-cafeeiro, da necessidade de novo sistema de plan- vivem no interior do fruto de café e atacam
Q. gigas. A primeira constatação do fungo, tio, mais aberto e arejado, para propiciar o uma ou as duas sementes para sua alimen-
no estado de Minas Gerais, em julho de controle da doença, ocorreram condições tação, podendo a destruição do fruto ser
1980, foi relatada por Souza et al. (1983). desfavoráveis à sobrevivência da broca, parcial ou total (Fig. 3).
Segundo Reis et al. (1984) e Reis e Souza fato que pode ser revertido com a crescente
(1986b), somente 0,7% das ninfas móveis adoção de cafeeiros adensados ou muito
das cigarras observadas estavam infecta- sombreados.
das pelo fungo, e este índice aumentou O inseto adulto é um pequeno besouro
para 5,1%, quando foi aplicado inseticida de cor preta, luzidio, medindo a fêmea cerca
sistêmico granulado para o controle delas. de 1,7mm de comprimento, por 0,7mm de
Tal fato talvez se explique pela maior facili- largura. O macho é menor e apresenta cerca
dade de penetração do fungo em ninfas de 1,2mm de comprimento, por 0,5mm de
debilitadas pelo inseticida.

Foto: Paulo Rebelles Reis


largura. Os machos não voam e permane-
cem constantemente dentro dos frutos,
Controle cultural
onde se realiza a cópula e fecundação das
Consiste na eliminação de cafezais in- fêmeas. Estas perfuram os frutos, desde
festados e plantio de novos, no mesmo verdes (chumbão) até maduros (cerejas)
local, somente após dois a três anos. Os ou secos, geralmente na região da coroa Figura 3 - Corte de um fruto de café mos-
cafeeiros em formação não são atacados (Fig. 2), cavando uma galeria com cerca de trando uma das sementes dani-
pelas cigarras. 1mm de diâmetro até atingir a semente. ficadas pela broca
Ao arborizar ou implantar quebra-
ventos, evitar o uso de espécies vegetais
hospedeiras das cigarras Q. gigas. Embora Inicialmente, os prejuízos são ocasio-
haja dificuldades para obter informações nados pela queda de frutos. Para o cafeeiro
quanto às hospedeiras de Q. gigas, sabe- Arábica (Coffea arabica L.) foi constatado
se que a grevílea é hospedeira da praga que a broca aumenta a porcentagem de
e, portanto, deve ser evitado seu uso nas queda natural de frutos da ordem de 8% a
áreas reconhecidamente infestadas por 13% (NAKANO et al., 1976, YOKOYAMA
essas cigarras. et al., 1978), para Canéfora (Coffea canephora
Pierre & Froenher), a broca pode ser res-
Foto: Paulo Rebelles Reis

BROCA-DO-CAFÉ ponsável por um aumento da queda de fru-


tos da ordem de 46% (PAULINI; PAULINO,
A broca-do-café, Hypothenemus 1979).
hampei (Ferrari, 1867) (Coleoptera: Os frutos broqueados que permanecem
Scolytidae), é considerada, atualmente, a nas plantas sofrem redução de peso, tendo
segunda praga em importância depois do Figura 2 - Fêmea adulta da broca-do-café
em fruto de café no estádio de
Souza e Reis (1980), Reis et al. (1984) e Reis
bicho-mineiro, para a maioria das regiões e Souza (1986b) demonstrado experimental-
"chumbão" e orifício por ela pro-
cafeeiras do Brasil. mente, em Minas Gerais, que essas perdas
duzido no centro da coroa
podem chegar a 21% ou 12,6kg, por saca
Considerações gerais de 60kg de café beneficiado. Esses mesmos
Conhecida no Brasil desde 1922, e con- Informações mais detalhadas sobre a autores constataram que a qualidade do
siderada até 1970 a principal praga do broca-do-café, como histórico, reconheci- café ficou alterada com o ataque da broca,
cafeeiro, passou a ser a segunda ou até mento, biologia, prejuízos, monitoramento passando do tipo 2 ao tipo 7 com o aumento
terceira praga em importância na maioria e controle, podem ser obtidas em Souza e da infestação. Segundo Lucas et al. (1989),
das regiões cafeeiras do país, com exceção Reis (1997). cerca de 20% a 22% de perdas ocorrem na

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86 Café Orgânico

operação de beneficiamento, devido à fra- e penetração de luz, a fim de propiciar baixa Carneiro Filho (1984) relatou a aclimatação
gilidade que o grão atacado passa a apre- umidade do ar em seu interior, condições dessa espécie, apesar das geadas e do uso
sentar. que são desfavoráveis à praga. de inseticidas. Benassi (2000a) relatou uma
A qualidade da bebida do café parece A colheita do café deve ser muito bem- infestação natural da vespa-de-uganda da
não ser diretamente influenciada pelo ata- feita, evitando-se que fiquem frutos nas ordem de 2,3% nos frutos remanescentes,
que da broca, mas sim indiretamente pe- plantas e no chão, nos quais a broca poderá após cinco meses da colheita.
la facilidade que os danos proporcionam sobreviver na entressafra. Após a colhei- A partir de 1994, vem sendo estudada a efi-
à penetração de microrganismos, como fun- ta, caso tenham ficado muitos grãos nas ciência de outra vespa introduzida também
gos do gênero Fusarium (CHALFOUN et plantas e no chão, é recomendável fazer o da África, a Cephalonomia stephanoderis
al., 1984) e do gênero Penicillium (CALA- “repasse” ou catação dos frutos remanes- Betrem, 1961 (Hymenoptera: Bethylidae),
FIORI et al., 1978), que estão relacionados centes da colheita. conhecida como vespa-da-costa-do-marfim
com a alteração da qualidade da bebida do Benassi (2000a), em estudo realizado (BENASSI, 1996). Acredita-se ser esta espé-
café. com cafeeiro da espécie C. canephora cv. cie mais agressiva que a vespa-de-uganda.
Os danos provocados pela broca co- Conillon, no Espírito Santo, encontrou cin- Espera-se que a liberação de parasitói-
meçam quando a infestação, nos frutos da co meses após a colheita cerca de 71,7% des, criados em laboratório (BENASSI,
primeira florada, atinge 3% a 5% (REIS et dos frutos remanescentes atacados pela 2000b), no período da entressafra, reduza a
al., 1984). No estado de Minas Gerais este broca, o que evidencia a importância da população da broca para a safra seguinte
índice geralmente ocorre a partir de novem- colheita bem-feita e do repasse. Em 2000, de café. Uma forma de liberação é com o
bro na Zona da Mata e janeiro no Sul de no estado de Rondônia, a infestação média uso de sacolas de filó, dependuradas nos
Minas (REIS et al., 1980), ocasião em que de frutos na entressafra, caídos no solo, cafeeiros, com grãos de café broqueados e
os frutos, ainda muito aquosos, já se apre- foi de até 76,3% (COSTA et al., 2001). as vespinhas. As larvas da vespa são para-
sentam desenvolvidos e aptos a serem A colheita deve ser sempre iniciada nos sitóides das fases imaturas da broca, e os
perfurados pelos adultos da broca. No Sul talhões que apresentem cafeeiros mais adultos são considerados predadores de
de Minas, próximo à represa de Furnas, esse infestados, a fim de que sejam evitados ovos, larvas pequenas e adultos da broca-
nível de infestação pode ocorrer a partir de maiores prejuízos, pois a broca apresenta do-café (BENASSI, 1996).
novembro, devido às condições mais pro- grande capacidade de reprodução e, em Também está sendo estudada a possi-
pícias à praga. anos de alta infestação, os últimos talhões bilidade de utilização de outro parasitóide,
a serem colhidos apresentarão, sem dúvida, o chamado endoparasitóide de adultos da
Controle grande população de broca e, conseqüen- broca-do-café ou vespa-do-togo, o micro-
Serão discutidas algumas formas de temente, maiores prejuízos. himenóptero Physmatichus coffea La Salle
controle natural ou aplicado, que podem (Hymenoptera: Eulophidae) (GUTIERREZ
auxiliar na redução da praga, porém nem Controle biológico et al., 1998). Segundo esses autores, traba-
sempre com eficiência que permita reduzir Numa tentativa de controlar biologica- lho de simulação sugere que dos três para-
danos. mente a broca-do-café, foi introduzido, em sitóides, somente P. coffea exibe caracte-
1929, no estado de São Paulo, proveniente rísticas demográficas para potencialmente
Controle físico de Uganda, África, o microhimenóptero controlar populações de broca.
Adultos da broca (fêmeas) são atraídos Prorops nasuta Waterston, 1923 (Hyme- Um predador ocasional encontrado no Bra-
pelo álcool etílico (etanol) e por esse moti- noptera: Bethylidae), que recebeu o nome sil é a formiga Crematogaster curvispinosus
vo armadilhas, chamadas de armadilhas de de vespa-de-uganda, que parasita larvas Mayr, 1862 (Hymenoptera: Formicidae), que
etanol, podem ser utilizadas para monito- e pupas da broca. Liberada em grandes destrói, nos frutos, grande número de for-
ramento da broca (BENASSI, 1990), e mes- quantidades, não só em São Paulo, mas mas imaturas da broca (LE PELLEY, 1968).
mo controle, pois capturam fêmeas adultas também no Sul de Minas, teve a princí- Outro agente de controle biológico da bro-
responsáveis pela disseminação e procria- pio boa performance no controle da broca, ca, já constatado no Brasil, é o fungo ento-
ção da praga. A adição de óleo de café pode porém não conseguiu estabelecer-se em mopatogênico Beauveria bassiana (Bals.)
melhorar a eficiência de atratividade das condições naturais, a não ser em algumas Vuil. (VILLACORTA, 1984, BENASSI, 1987),
armadilhas (VILLACORTA et al., 2001). regiões cafeeiras montanhosas, onde até cuja multiplicação massal vem sendo desen-
hoje pode ser encontrada. O mesmo insu- volvida por alguns pesquisadores (ANTÍA-
Controle cultural cesso aconteceu com a introdução dessa LONDOÑO et al., 1992, VILLACORTA et
Constitui-se talvez no mais eficiente vespa na Indonésia e Ceilão, conforme Le al., 2000), porém ainda sem uma perspectiva
método de controle da broca-do-café. Os Pelley (1973). de uso eficiente. Segundo Ticheler (1963),
cafezais devem ser plantados em espaça- Após 40 anos da introdução da vespa as condições que favorecem a infestação
mentos que permitam um maior arejamento em uma fazenda no estado do Paraná, de B. bassiana são o tempo nublado e a

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Café Orgânico 87

alta umidade relativa (cerca de 80%) (Fig. 4). BICHO-MINEIRO franjadas. Quando em repouso, as asas
Essas condições ideais para o fungo nem anteriores cobrem as posteriores. As lagar-
O bicho-mineiro, Leucoptera coffeella
sempre são encontradas em cafezais com tinhas vivem dentro de lesões ou minas
(Guérin-Mèneville, 1842) (Lepidoptera:
espaçamento convencional, o que, prova- foliares por elas construídas, e quando com-
Lyonetiidae) é talvez a principal praga do
velmente, torna os cafeeiros adensados, pletamente desenvolvidas medem cerca de
cafeeiro na atualidade, principalmente nas
sombreados ou arborizados, como promis- 3,5mm de comprimento (Fig. 5). As lesões
regiões de temperaturas mais elevadas e
sores ao controle da broca com o uso de são inconfundíveis, apresentando o centro
de maior déficit hídrico (REIS; SOUZA,
fungos entomopatogênicos. mais escuro, como resultado do acúmulo
1986a).
de excreções. O contorno, em geral, tende
Considerações gerais para o formato arredondado. A epiderme
superior da folha, no local da lesão, destaca-
O bicho-mineiro das folhas do cafeeiro
se com facilidade. De modo geral e, princi-
é uma praga exótica, que tem como região
palmente, nas épocas de grande infestação,
de origem o continente africano. Foi cons-
o maior número de lesões é encontrado nas
tatado no Brasil a partir de 1851, vindo pro-
folhas do topo das plantas (terço superior)
vavelmente em mudas atacadas prove-
(REIS et al., 1975).
nientes das Antilhas e da Ilha de Bourbon.
A ocorrência do bicho-mineiro está
Foto: Paulo Rebelles Reis

É considerada uma praga monófaga, ata-


condicionada a diversos fatores:
cando somente cafeeiros.
À semelhança do que ocorreu com a a) climáticos: temperatura e chuva prin-
broca-do-café, o surgimento da ferrugem cipalmente;
no início da década de 70 é também um b) condições da lavoura: lavouras mais
Figura 4 - Fruto de café broqueado e adulto marco para o bicho-mineiro. Cafeeiros plan- arejadas têm maior probabilidade de
da broca, na entrada da galeria, tados em espaçamentos adequados para ser atacadas;
já morto pelo fungo Beauveria alta tecnologia propiciam melhores con-
bassiana, exibindo micélio do dições para o ataque do bicho-mineiro, ao c) presença ou ausência de inimigos
fungo contrário da broca-do-café que se desen- naturais: parasitóides, predadores e
volve bem em condições de maior inso- entomopatógenos.
lação e baixa umidade do ar. As épocas em que são constatadas as
O fungo Metarhizium anisopliae
O adulto do bicho-mineiro é um micro- maiores populações da praga são os perío-
(Metsch.) Sorokin (Deuteromycotina:
lepidóptero cujas mariposinhas medem dos secos do ano, com início em junho a
Hyphomycetes, Moniliaceae) é um agente
6,5mm de envergadura, têm coloração branco- agosto e acme em outubro, sendo menor
de controle biológico também promissor
prateada e asas anteriores e posteriores antes e após esses meses. Há casos em
no controle da broca e, segundo Lecuona
et al. (1986), causou mais de 60% de morta-
lidade após três dias da aplicação, numa
concentração de 1,5 x 108 conídios/mL, apli-
cados diretamente sobre os insetos ou indi-
retamente nos grãos e folhas.

Controle com extratos vegetais


Embora ainda no início, pesquisas com
extratos de plantas mostram um resulta-
do promissor no controle da broca-do-café.
Galvan et al. (2000b) demonstraram em
laboratório o efeito do extrato hexânico (uti-
Foto: Paulo Rebelles Reis

lizando hexano como solvente) de folhas


de chagas, Tropaeolium majus (Trapeola-
ceae), também conhecida como sete-chagas
ou capuchinha, e Dionízio et al. (2000a) o
efeito de extrato de mentrasto (Ageratum
conyzoides L.) (Compositae, Asteraceae) Figura 5 - Lagartas do bicho-mineiro sobre uma lesão na folha do cafeeiro, da qual foi
no controle de adultos da broca. retirada a epiderme superior

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.83-99, jan./abr. 2002


88 Café Orgânico

que a população aumenta em março-abril população do bicho-mineiro (PAULINI et intenso, ocorre a desfolha da planta, de cima
em decorrência de veranico no mês de al., 1976, MARCONATO et al., 1976), porém para baixo, devido à distribuição da praga.
janeiro e/ou fevereiro, como ocorreu em as causas não foram determinadas. Em geral, as plantas que sofrem intenso
1990 em Minas Gerais (Gráfico 1). Segundo Mais informações sobre biologia, dano ataque do bicho-mineiro apresentam, prin-
Reis e Souza (1986a), as condições do tem- e manejo integrado do bicho-mineiro po- cipalmente, o topo completamente desfo-
po que influenciam negativamente a popu- dem ser obtidas em Souza et al.(1998). lhado, podendo, no entanto, sofrer desfo-
lação da praga são a precipitação e a umida- lha total. Em conseqüência da desfolha, há
de relativa, ao contrário da temperatura que Dano redução da produção e da longevidade dos
exerce influência positiva. As lesões, causadas pelas lagartas do cafeeiros. Lavouras intensamente desfo-
As pulverizações de oxicloreto de co- bicho-mineiro nas folhas, reduzem a ca- lhadas pela praga podem levar até dois
bre, para o controle da ferrugem, já foram pacidade de fotossíntese em função da anos para se recuperar.
também correlacionadas com o aumento da redução da área foliar e, se o ataque for Reis et al. (1976) constataram no Sul de
Minas uma redução na produção de café
da ordem de 52%, devido a uma desfolha de
Porcentagem
67% no mês de outubro, em conseqüência
120 do ataque do bicho-mineiro, ocasião em
Folhas minadas Minas predadas que ocorreu a maior florada daquele ano.
Posteriormente, Reis e Souza (1996) também
constataram altos prejuízos, relatando uma
redução na produção entre 34,3% e 41,5%.
100
Maior prejuízo, de aproximadamente 72%
de redução na produção, foi observado na
cafeicultura do Cerrado mineiro em 1978,
região quente e favorável à praga.
80
Controle
Serão discutidas algumas formas de
controle natural ou aplicado, que podem
auxiliar na redução da praga, porém nem
60
sempre com eficiência que permita reduzir
significativamente os danos.

Controle cultural
40 A utilização de quebra-ventos ou arbo-
rização, com plantas apropriadas para tal
fim e devidamente planejadas, auxilia na
redução do ataque da praga, que tem prefe-
rência por locais mais secos e arejados. São
20
indicadas a seringueira, macadâmia, aba-
cateiro, cajueiro, ingazeiro, grevília robus-
ta, bananeira entre outras.
A arborização pode ser um componente
0 importante no equilíbrio ecológico do cafe-
zal, também devido ao abrigo que oferece aos
fev.

dez./jan.
1989

dez./jan.

1990

dez./jan.

1991

dez./jan.

1992

dez./jan.

1993

inimigos naturais de pragas. Faixas de vege-


tação, denominadas “corredores biológi-
cos”, entre talhões, que têm sido eficientes
Mês/Ano
no controle natural de formigas e cigarras
Gráfico 1 - Flutuação da população de bicho-mineiro em folhas de cafeeiro e das ves- em plantações de eucaliptos, certamente
pas predadoras serão também em cafezais (ALVARENGA;
FONTE: Reis e Souza (1996). GUIMARÃES, 1998).
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Café Orgânico 89

Resistência genética a) controle biológico por predadores: em de regra são destruídos pelos traba-
Embora haja espécies de cafeeiro que Minas Gerais, o predatismo das lagar- lhadores rurais, pois as vespas são
apresentam resistência genética ao bicho- tas do bicho-mineiro feito principal- agressivas e podem causar acidentes.
mineiro, como Coffea stenophylla G. Don. mente pelas vespas Protonectarina Portanto, restam a preservação de
e Coffea racemosa Lour., entre outras, sylverae, Brachygastra lecheguana, matas remanescentes e o plantio de
(GUERREIRO FILHO et al., 1999), as fontes Synoeca surinama cyanea, Polybia novas matas com espécies nativas da
de resistência ainda não estão presentes scutellaris e Eumenes sp. (Hymenop- região, o que contribuirá para a pre-
nas cultivares comerciais, assim como já tera: Vespidae), está em torno de 70% servação e aumento das vespas pre-
existem aquelas resistentes à ferrugem- de eficiência (SOUZA et al.,1980) dadoras que nelas se abrigam (Qua-
do-cafeeiro. Talvez esta seja a forma ideal (Fig. 6). Os vespeiros formados nos dro 1). Em condições de laboratório,
de resolver o problema da praga, com me- cafeeiros, apesar de poucos, por via Silva et al. (2001) verificaram que lar-
nor custo de produção e nenhum impacto
ambiental.

Controle por comportamento


Já é conhecido o feromônio sexual do
bicho-mineiro. Este pode ser utilizado para Figura 6 - Lesão
monitoramento da praga e mesmo na captu- causada pelo bicho-
mineiro, vista da
ra de machos adultos, com armadilhas de
página inferior,
feromônio e cola, o que reduz a possibi-
mostrando
Foto: Paulo Rebelles Reis

lidade de acasalamento e, conseqüente- rasgaduras


mente, a população da praga. produzidas por
vespas predadoras
Controle com extratos vegetais para retirada das
Uma das espécies vegetais cujo extrato lagartas
mais tem sido pesquisado é a Azadirachta
indica A. Juss. (Meliaceae), conhecida co-
QUADRO 1 - Relação de predadores do bicho-mineiro relatados no Brasil, pertencentes à ordem
mo “nim”. A azadirachtina, encontrada Hymenoptera e família Vespidae
principalmente nas sementes e, em menor
Superfície da
quantidade, na casca e nas folhas do nim, Espécies Fonte
folha dilacerada
é o principal composto responsável pelos
Apoica pallens Fabricius _ Gontijo et al. (2000)
efeitos tóxicos aos insetos (MORDUE;
Brachygastra augusti St. Hil. Inferior Nogueira Neto (1951)
NISBET, 2000). Resultados promissores
foram obtidos na redução da postura e da Brachygastra lecheguana (Latreille, 1824) Inferior Gonçalves et al. (1975)
Parra et al. (1977)
sobrevivência de ovos do bicho-mineiro com
D’Antonio et al. (1978)
a utilização de extrato de nim (MARTINEZ
Souza et al. (1980)
et al. 2001).
Fragoso et al. (2001)
Outros extratos de plantas têm mos-
Eumenes sp. Superior Souza et al. (1980)
trado também resultados promissores no
controle do bicho-mineiro. Assim, Galvan Polistes versicolor (Olivier, 1791) _ Semeão et al. (2000)

et al. (2000c) demonstraram o efeito de Polybia paulista Ihering _ Fragoso et al. (2001)
extrato hexânico de folhas de chagas (T. Polybia scutellaris (White, 1841) Inferior Gonçalves et al. (1975)
majus) e Dionízio et al. (2000b) a atividade Parra et al. (1977)
inseticida do mentrasto (A. conyzoides), em Souza et al. (1980)
laboratório, na mortalidade de lagartas do Protonectarina sylverae Saussure, 1854 Superior Nogueira Neto (1951)
bicho-mineiro. Parra et al. (1977)
D’Antonio et al. (1978)
Controle biológico Souza et al. (1980)
Protopolybia exigua Saussure _ Fragoso et al. (2001)
O controle biológico do bicho-mineiro
Galvan et al. (2000a)
é feito por predadores, parasitóides e ento-
Synoeca surinama cyanea (Fabricius, 1775) Inferior Souza et al. (1980)
mopatógenos:

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90 Café Orgânico

vas do predador Chrysoperla externa QUADRO 2 - Relação de parasitóides (Hymenoptera) do bicho-mineiro encontrados no Brasil
(Hagen, 1861) (Neuroptera: Chryso- Espécies Famílias Fonte
pidae) conseguem predar as fases de Centistidea striata (Rohwer, 1914) Braconidae Ecole et al. (2001)
pré-pupa e pupa do bicho-mineiro, Moraes et al. (2001a)
mas não conseguem predar as fases Cirrospilus sp. Eulophidae Villacorta (1975)
de ovo e lagarta, por estarem estas Parra et al. (1977)
Souza et al. (1980)
protegidas dentro das lesões, consti- Parra et al. (2001)
tuindo-se, assim, em mais um agente Closterocerus coffeelae Ihering, 1913 Eulophidae Ihering (1914)
de controle biológico da praga; Mendes (1940)
Mendes (1959)
b) controle biológico por parasitóides: Villacorta (1975)
o parasitismo natural das lagartas de Parra et al. (1977)
bicho-mineiro apresenta cerca de 18% Souza et al. (1980)
de eficiência (REIS et al., 1975), feito Colastes letifer (Mann, 1872) Braconidae Mann (1872)
Mendes (1940)
principalmente pelos microhimenóp- Villacorta (1975)
teros Colastes letifer, Mirax sp. (Hyme- Parra et al. (1977)
noptera: Braconidae), Closterocerus Gonçalves et al. (1978)
Souza et al. (1980)
coffeella, Horismenus sp. (Hymenop-
Eubadizon punctatus Redolfi Braconidae Parra et al. (1977)
tera: Eulophidae) e Proacrias sp. (Hyme- Gonçalves et al. (1978)
noptera: Entedontidae) (SOUZA et Eulophus cemiostomastis Mann, 1872 Eulophidae Mann (1872)
al., 1980). Outras espécies também Mendes (1940)
já foram constatadas parasitando Eulophus sp. Eulophidae Ihering (1914)
lagartas de bicho-mineiro no Brasil Mendes (1940)
(Quadro 2); Horismenus aenicollis Ashmead, 1904 Eulophidae Mendes (1940)
Mendes (1959)
c) controle biológico por entomopa- Villacorta (1975)
tógenos: dos agentes de controle bio- Parra et al. (1977)
lógico do bicho-mineiro, os patóge- Horismenus sp. Eulophidae Parra et al. (1977)
nos ou microorganismos entomopa- Gonçalves et al. (1978)
Souza et al. (1980)
togênicos são os menos conhecidos, Parra et al. (2001)
passando até mesmo despercebidos, Ecole et al. (2001)
embora possam causar epizootias, Moraes et al. (2001a)
quando as condições lhes são favo- Mirax sp. Braconidae Villacorta (1975)
Parra et al. (1977)
ráveis. Sabe-se, entretanto, de suas Gonçalves et al. (1978)
existências e do potencial que possuem Souza et al. (1980)
para o controle da praga. Robbs et al. Neochrysocaris coffeae (Ihering, 1913) Eulophidae Villacorta (1975)
(1976) e Robbs (1977) relataram a (=Proacrias coffeae) Parra et al. (1977)
presença de bactérias e fungos em Orgillus niger (Haliday, 1833) Braconidae Ecole et al. (2001)
lagartas agonizantes ou mortas (Qua- Moraes et al. (2001a)
Moraes et al. (2001b)
dro 3). Segundo esses mesmos auto-
Orgilus sp. Braconidae Mendes (1940)
res, as bactérias Erwinia herbicola
Mendes (1959)
(Enterobacteriaceae) e Pseudomonas Parra et al. (2001)
aeruginosa (Schroeter) Migula (Pseu- Proacrias coffeae Ihering, 1913 Eulophidae Ihering (1914)
domonadaceae) são apontadas como Mendes (1940)
os microorganismos mais eficientes Gonçalves et al. (1978)
Parra et al. (2001)
até agora conhecidos em epizootias
Proacrias sp. Eulophidae Souza et al. (1980)
de lagartas de bicho-mineiro, com
Stiropius reticulatus (Cameron, 1911) Braconidae Ecole et al. (2001)
ocorrência de 65% e 90%, respectiva- Moraes et al. (2001a)
mente (ROBBS et al., 1976). Moraes et al. (2001b)
Stiropius sp. Braconidae Parra et al. (2001)
Controle por biofertilizantes e
Tetrastichus sp. Eulophidae Mendes (1940)
caldas fitoprotetoras Mendes (1959)
O uso de biofertilizantes e de caldas Parra et al. (1977)
Gonçalves et al. (1978)
fitoprotetoras tem-se difundido, principal-
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Café Orgânico 91

QUADRO 3 - Relação de microorganismos entomopatogênicos encontrados que causam mortalida- LAGARTA-DOS-CAFEZAIS


de em bicho-mineiro no Brasil
A lagarta da espécie de mariposa Eacles
Microorganismos imperialis magnifica Walker, 1856 (Lepi-
Fonte
Espécies Grupos doptera: Saturniidae), denominada lagarta-
dos-cafezais, é a mais conhecida entre as
Cladosporium sp. Fungo Robbs et al. (1976) espécies de lagartas que podem ocorrer em
Erwinia herbicola Bactéria Robbs et al. (1976) cafezais.
Robbs (1977)
Considerações gerais
Pseudomonas aeruginosa Bactéria Robbs et al. (1976)
Robbs (1977) Apesar de muito comum em cafeeiros
de todas as regiões do Brasil, na maioria
Pseudomonas sp. Bactéria Robbs et al. (1976)
das vezes, não se constitui em praga, a não
ser em casos de desequilíbrio biológico
provocado pelo uso indiscriminado de
mente, em sistemas agrícolas familiares. Apesar da difusão desses compostos produtos fitossanitários ou devido às con-
O Supermagro, um biofertilizante fermen- como um método alternativo ao tratamento dições climáticas. É considerada praga
tado e enriquecido, empregado em pulve- fitossanitário convencional, pouco se sabe cíclica, porém seu ataque aos cafezais vem-
rização como adubação complementar no a respeito de suas eficiências como inse- se acentuando nos últimos anos. Atual-
cafeeiro, tem sido utilizado por agricultores ticidas/acaricidas. Além disso, em alguns mente, essa espécie de lagarta vem causan-
com o objetivo de controlar o bicho-mineiro casos podem haver problemas de fitotoxi- do danos aos cafezais da cultivar Conillon
e o ácaro-vermelho do cafeeiro (SILVA; cidade, como é o caso da calda sulfocálcica (C. canephora), no município de Cacoal,
CARVALHO, 2000). Semelhantemente, o em algumas culturas, dependendo da do- estado de Rondônia.
uso de caldas fitoprotetoras, como a calda sagem. É necessário, portanto, mais pesqui- Além do cafeeiro, pode atacar também
viçosa e a calda sulfocálcica, tem sido pro- sas no assunto que comprovem ou não a abacateiro, goiabeira, plátano, amendoeira-
pagado como eficiente para o controle do ação inseticida/acaricida desses compos- da-praia, amoreira, araçazeiro, aroeira,
bicho-mineiro. tos. cajueiro, cedro, jaqueira, macieira, mamo-

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neira, milho, pau-ferro, pereira, roseira, sa- to no estado adulto é uma mariposa também ríodo de incubação é de cinco a sete dias,
randi, tamarindeiro etc., entretanto, nesses considerada grande, de coloração amare- podendo-se estender até 12 dias em meno-
outros hospedeiros, o ataque não é muito la e pontos escuros nas asas, mais nu- res temperaturas, quando eclodem as lagar-
comum. merosos nos machos. Além das pontua- tinhas. Após a eclosão, as lagartas passam
As lagartas dessa espécie são grandes, ções, apresentam também nas asas, ante- os próximos 30 a 37 dias se alimentando de
medem cerca de 10 a 12cm de comprimento riores e posteriores, uma faixa de coloração folhas do cafeeiro, até atingirem cerca de
por até 2cm de diâmetro e apresentam colo- violáceo-escura. As fêmeas são maiores, 12cm de comprimento e 15g de peso. No
ração variável entre o verde, o alaranjado e menos manchadas que os machos, e podem final da fase de lagarta, descem ao solo,
o marrom. Ao longo de todo o corpo, apre- apresentar até 13,5cm de envergadura (me- onde empupam a 2cm de profundidade. A
sentam pubescência e fios brancos, e no dida tomada da ponta de uma asa à outra, fase de pupa ou crisálida dura em média 30
dorso do segundo e terceiro segmentos quando abertas) (Fig. 8). Os machos possuem a 40 dias, podendo ser mais longo em
torácicos apresentam tubérculos e um pro- cerca de 10cm de envergadura (Fig. 9). O condições menos favoráveis, após o que
cesso dorsal no décimo segundo segmen- acasalamento ocorre nas primeiras 12 a 24 emergem os insetos adultos (mariposas).
to do corpo (Fig. 7). Não são urticantes, ao horas de vida dos machos, que morrem O ciclo evolutivo de ovo a adulto é em média
contrário de outras lagartas que também após esse período. A mariposa fêmea, após 65 a 85 dias.
atacam cafeeiros, porém, devido ao seu acasalamento, coloca à noite cerca de 300 Em geral, ocorre somente uma geração
grande tamanho e instinto de levantar a ovos de coloração amarelada durante os por ano, ficando as crisálidas enterradas
parte anterior do corpo, impõem medo aos sete dias em que vive, em grupos e de pre- no solo até o ano seguinte, porém, em locais
trabalhadores nas lavouras de café. O inse- ferência na página superior das folhas. O pe- de temperaturas mais elevadas, sem inverno
frio, pode ocorrer mais de uma geração ao
ano, como é o caso do ataque dessa lagarta
em cafeeiros no município de Cacoal, e de
outros, em Rondônia.

Dano
As lagartas alimentam-se de folhas e
de brotos terminais, são vorazes e, em gran-
des quantidades, podem ser prejudiciais ao
cafeeiro, principalmente aos mais novos e
com menor número de folhas.
Pesquisas realizadas mostraram que são
necessárias 166 lagartas para destruir todas
Foto: Paulo Rebelles Reis

as folhas de um cafeeiro adulto, cultivar


Mundo Novo, pois apenas uma lagarta
consome 0,60% da planta ou 0,30m2 de
folha de café (Quadro 4). Em função da
redução da área foliar, ocorre a quebra da
Figura 7 - Lagarta-dos-cafezais, Eacles imperialis magnifica
Foto: Paulo Rebelles Reis

Foto: Paulo Rebelles Reis

Figura 8 - Mariposa fêmea de Eacles imperialis magnifica Figura 9 - Mariposa macho de Eacles imperialis magnifica

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Café Orgânico 93

produção de grãos de café. Além dos pre- as espécies Belvosia bicincta Robineau- afeta o controle biológico natural realizado
juízos citados, pode ocorrer a não aceitação Desvoidy, 1830, Belvosia potens (Wideman, pelas moscas e microhimenópteros. Esse
das lavouras infestadas pela lagarta, por 1830) e Pararrhinactia parva Town, bem produto age por ingestão, principalmente
parte dos colhedores de café, devido ao como larvas de microhimenópteros (Hyme- quando as lagartas ainda são novas, e não
aspecto repugnante que as lagartas apre- noptera) (pequenas vespinhas) do gênero as matam imediatamente como os inseti-
sentam. Ainda, a intensa desfolha causada Apanteles, podendo ser encontradas cerca cidas convencionais, porém ao ingerirem
pelas lagartas resulta em ramos desnudos, de 150 delas por lagarta de Eacles imperialis os bacilos param de se alimentar não cau-
com posterior secamento, inclusive dos parasitada (REIS et al., 1984) (Fig. 10); sando mais danos. Em altas infestações
frutos neles presentes, como resultado da Glypta sp. (Ichneumonidae); Macrocentrus aplicar a maior dosagem recomendada do
incidência direta do sol e de temperaturas ancylivorus Rohwer, 1923, Meteorus sp., B. thuringiensis.
altas. Meteorus eaclidis Muesebeck, 1958 (Bra-
conidae); Horismenus cockerelli Blanchard OUTRAS LAGARTAS
Controle (Eulophidae); Spilochalcis sp. (Chalcidi- DO CAFEEIRO
Em condições normais, lagartas de qual- dae) etc.
Além da lagarta-dos-cafezais Eacles
quer espécie, incluindo a Eacles imperialis Caso seja necessária a intervenção do
imperialis magnifica, outras lagartas não
ou lagarta-dos-cafezais, não se constituem homem para o controle da lagarta, é reco-
menos importantes também podem atacar e
em pragas do cafeeiro, devido ao grau de mendável a utilização de pulverizações do
consumir folhas de cafeeiros, e entre elas des-
parasitismo natural que apresentam. Já inseticida biológico à base de uma bactéria,
tacam-se as que causam dermatite urticante
foram encontradas, parasitando lagartas, o Bacillus thuringiensis Berliner, na dosa-
como as taturanas: Automeris complicata
larvas de moscas da família Tachinidae, com gem de 250 a 500g/ha, produto que não
(Walker, 1855), Automeris coresus (Bois-
duval, 1859), Automeris illustris (Walker,
QUADRO 4 - Redução na produção de cafeeiros ‘Mundo Novo’, em conseqüência da diminuição da
1855) (Saturniidae); a lonomia, Lonomia
área foliar, na fase construtiva, por lagartas Eacles imperialis magnifica circunstans (Walker, 1855) (Saturniidae);
Número de lagartas Redução da área foliar Redução na produção a lagarta-cabeluda, Megalopyge lanata
por planta (%) (%) (Stoll & Cramer, 1780) (Megalopygidae) e a
taturana-do-cafeeiro, Podalia sp. (Mega-
42 25 39,2
lopygidae). Entre as não urticantes, como
83 50 42,9 a Eacles imperialis, destacam-se as lagar-
tas-mede-palmo Glena sp. e Oxydia sp.
125 75 46,3 (Geometridae) (REIS et al., 1984). Haven-
FONTE: Crocomo (1977). do contato do homem com as urticantes,
há necessidade de tratamento específi-
co (SOUZA; REIS, 1999). O controle para
estas lagartas é o mesmo recomendado
para a lagarta-dos-cafezais.

ÁCAROS DO CAFEEIRO
Em cafeeiros, geralmente podem ocorrer
três espécies de ácaros-praga: o ácaro-ver-
melho Oligonychus ilicis (McGregor, 1917)
(Acari: Tetranychidae), o ácaro-da-mancha-
anular Brevipalpus phoenicis (Geijskes,
1939) (Acari: Tenuipalpidae) e o ácaro-
branco Polyphagotarsonemus latus (Banks,
Foto: Paulo Rebelles Reis

1904) (Acari: Tarsonemidae).

Considerações gerais
São apresentadas as considerações
gerais para as espécies de ácaro-vermelho
Figura 10 - Lagarta-dos-cafezais parasita e casulos do parasitóide Apanteles sp. pen- e ácaro-da-mancha-anular. O ácaro-branco,
durados por fios de seda que ocorre em locais mais úmidos, como

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94 Café Orgânico

viveiros e cafezais implantados em locais com estiagem prolongada, são condições da por um vírus do grupo dos Rhabdovirus
de alta umidade ou muito irrigados, não será propícias à proliferação do ácaro, podendo (CHAGAS, 1988), o Coffee Ringspot Virus
apresentado com detalhes neste artigo. causar desfolha das plantas e, nas lavouras - CoRSV.
novas, em formação, desenvolvimento Até 1988, a doença, mancha-anular do
Ácaro-vermelho retardado (REIS; SOUZA, 1986b). cafeeiro, não tinha ainda representado pro-
No Brasil, a primeira referência ao O. O uso em excesso de fungicidas cúpri- blema econômico, embora em 1986 tenha
ilicis atacando cafeeiro, C. arabica, foi no cos, para o controle da ferrugem-do-cafeei- sido associada a uma intensa desfolha,
estado de São Paulo, em 1950, embora ro, pode causar um desequilíbrio que trará devido a um inverno com baixa precipi-
sendo referido como outra espécie, com como conseqüência aumento do número tação, condição muito favorável ao ácaro
B. phoenicis (AMARAL, 1951, INFES- de ácaros, como mostrado por Reis et al. (CHAGAS, 1988).
TAÇÃO..., 1951). (1974) em experimentos com doses cres- Desde 1990, com destaque para 1995,
Já foi referido como a segunda praga centes de oxicloreto de cobre 50%. as infestações de B. phoenicis e da mancha-
em importância para o cafeeiro Conillon, C. Mais informações sobre a biologia do anular têm sido relatadas em Minas Gerais,
canephora, no estado do Espírito Santo ácaro-vermelho do cafeeiro podem ser obti- causando intensa desfolha em cafeeiros,
(INSTITUTO..., 1985). O cafeeiro Conillon das em Reis et al. (1997). principalmente na região do Alto Paranaíba
tem-se mostrado mais sensível ao ácaro do (FIGUEIRA et al., 1996). Foi também consta-
que o Arábica (C. arabica), à semelhança Ácaro-da-mancha-anular tada a presença do ácaro nas demais regiões
do que ocorre com a broca-do-café. O ácaro B. phoenicis foi observado pela cafeeiras do Brasil, tanto em cafeeiro Ará-
Vive na face superior das folhas, que, primeira vez na Holanda, em 1939, atacando bica (C. arabica), quanto em Canéfora (C.
quando atacadas, apresentam-se recober- Phoenix sp. em casa de vegetação. Hoje, canephora) (MATIELLO, 1987).
tas por uma delicada teia, tecida pelo pró- sabe-se que tem distribuição cosmopolita Os sintomas da doença aparecem nas
prio ácaro, onde aderem detritos e poeira, e um amplo número de hospedeiros, incluin- folhas e nos frutos do cafeeiro, e caracte-
dando às folhas um aspecto de sujeira, e do cafeeiros e citros (REIS, 1978, CHIAVE- rizam-se por manchas cloróticas, de con-
pode ser visto facilmente com o auxílio de GATO, 1991, TRINDADE; CHIAVEGATO, torno quase sempre bem delimitado, às
uma lente de aumento. 1994). Tem sido encontrado vivendo em vezes com um ponto necrótico central. Nas
Para se alimentar, na página superior cafeeiros (Coffea sp.) no Brasil, pelo me- folhas, as manchas tomam constantemente
das folhas, perfuram as células e absorvem nos desde 1950 (INFESTAÇÃO..., 1951, forma de anel, podendo coalescer, abran-
parte do conteúdo celular. Em conse- AMARAL, 1951), quando foi relatado no gendo grande parte do limbo ou acompa-
qüência, as folhas perdem o brilho natural, estado de São Paulo como Tenuipalpus nhando as nervuras (Fig. 11). Nos frutos,
tornam-se bronzeadas, dando um péssimo phoenicis, junto aos surtos do ácaro-ver- os sintomas também aparecem na forma de
aspecto às plantas. O ataque ocorre geral- melho, O. ilicis, este relatado na época como anéis (Fig. 12).
mente em reboleiras e, se as condições Paratetranychus ununguis Jacob, 1905. Matiello et al. (1995) mencionaram que
forem favoráveis ao ácaro e o controle não Posteriormente, o ácaro B. phoenicis foi as plantas atacadas pelo ácaro, e com sin-
for feito no início da infestação, poderá correlacionado com a doença mancha- tomas da doença ficam bastante desfolha-
atingir toda a lavoura. Períodos de seca, anular do cafeeiro (CHAGAS, 1973), causa- das, de dentro para fora, o que as denomi-
Foto: Paulo Rebelles Reis

Foto: Paulo Rebelles Reis

Figura 11 - Folha de cafeeiro com sintoma da mancha-anular Figura 12 - Frutos de café com sintoma da mancha-anular

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nam “planta oca”. Os frutos apresentam com sintomas da mancha-anular (REIS; compositus Denmark & Muma, 1973 com
lesões com coloração de ferrugem (marrom- CHAGAS, 2001). 6,9% e Iphiseiodes zuluagai Denmark &
clara), evoluindo depois para uma cor negra. Os resultados obtidos por Reis e Chagas Muma, 1972 com 1,5% do total de ácaros
Alguns frutos ficam recobertos por fungos (2001) mostram menores valores da ativi- predadores encontrados dessa família.
oportunistas (tipo Colletotrichum), apare- dade da polifenol oxidase e maior porcen- Considerando somente as duas espécies
cendo um pó branco sobre as lesões. Esses tagem de fenólicos totais nos grãos de café mais encontradas, a proporção de ocor-
autores constataram também lesões em provenientes de frutos que exibiam sintoma rência foi de 63% para E. alatus e de 37%
ramos e, em menor escala, morte de gemas da mancha-anular. Comparando-se os resul- para A. herbicolus. A primeira espécie, de
apicais nos ramos de dentro das plantas. tados da atividade da polifenol oxidase maneira geral, ocorreu em maior quantida-
Em cafeeiro, o ácaro apresenta flutuação obtidos por esses autores com os apresen- de nos períodos mais úmidos do ano e a
populacional semelhante à encontrada em tados por Carvalho et al. (1994), pode-se segunda nos mais secos. Reis et al. (2000c)
citros, isto é, foi constatado por Reis et al. inferir que o café sofreu alteração na quali- demonstraram o potencial de predação que
(2000a), que na região Sul de Minas, o ácaro- dade de bebida, passando de bebida mole esses ácaros possuem, principalmente as
da-mancha-anular ocorre durante o ano para dura, o que demonstra ser o ataque fêmeas adultas e ninfas. Embora faltem
todo, porém em menor quantidade no pe- do ácaro e, conseqüentemente, da mancha- estudos, provavelmente essas mesmas es-
ríodo compreendido entre outubro-novem- anular um fator que prejudica a qualidade pécies de ácaros predadores estejam asso-
bro e fevereiro-março, coincidindo com a de bebida do café.
ciadas também ao ácaro-vermelho.
época das chuvas e temperaturas mais ele- Foram também constatados por Reis e
A preservação e o aumento dessas
vadas na região. A maior população foi Chagas (2001) maiores teores de açúca-
espécies de ácaros são importantes para a
encontrada no período mais seco do ano e res totais na amostra de café com ácaro,
manutenção do controle biológico dos áca-
com temperaturas amenas, que vai de feve- teores que podem ter favorecido a infecção
ros, e se for necessário aplicar produtos
reiro-março a outubro-novembro, quando por microrganismos nas lesões causadas
fitossanitários para o controle, devem ser
a atenção ao seu controle deve ser acen- pelo ataque do ácaro. Conforme Carvalho
utilizados produtos à base de enxofre,
tuada. (1997), estes microrganismos em seu de-
porém são considerados moderadamente
O primeiro dano relatado ao cafeeiro em senvolvimento produzem suas próprias
nocivos aos ácaros predadores (REIS et
função do ataque do ácaro-plano ou da enzimas que agem sobre os compostos
al., 1998, 1999).
mancha-anular foi a desfolha sofrida pelas químicos da mucilagem, principalmente
plantas, principalmente nas épocas mais sobre os açúcares produzindo álcool, que
se desdobra em ácido acético, láctico, butí- CONSIDERAÇÕES FINAIS
secas do ano. Além da queda de folhas,
ocorre também uma redução na qualidade rico e outros ácidos carboxílicos superiores. Em condições normais de tempo, e
do café, provavelmente em função da Ao iniciar a produção de ácido butírico, plantio em áreas de aptidão da cultura ca-
posterior ocorrência de fungos associados começa a haver prejuízo na qualidade do feeira, as pragas terão suas populações em
às infestações do ácaro, que ocasionam café. equilíbrio com os inimigos naturais. Caso
fermentações indesejáveis durante a seca- Pelo exposto, conclui-se que o ataque isto não ocorra, recomenda-se a adoção de
gem dos grãos de café. Após o ataque do do ácaro B. phoenicis e da mancha-anular medidas biológicas de controle, ou seleti-
ácaro, os frutos ficam predispostos à pene- em frutos de café é um fator que altera para vas aos inimigos naturais, muitas já men-
tração de microrganismos, como é o caso pior a qualidade da bebida (REIS; CHAGAS, cionadas neste texto, e outras ainda em
do fungo Colletotrichum gloeosporioides 2001). estudo e que brevemente estarão dispo-
Penz, que é comum ser encontrado em con- níveis para uso. O desequilíbrio biológico
dições saprofíticas em cafeeiro (REIS et al., Controle
é a maior causa de danos pelas pragas.
2000b), e por fungos de outros gêneros co- Estudando a flutuação populacional do
mo Fusarium, Penicillium, Cladosporium ácaro-da-mancha-anular do cafeeiro duran- REFERÊNCIAS
e Aspergillus também correlacionados com te três anos, Reis et al. (2000a) constataram
ALVARENGA, M.I.N.; GUIMARÃES, P.T.G.
a qualidade de bebida de café. também a ocorrência de inimigos naturais,
Arborização como componente da sustentabi-
No Brasil, a qualidade do café é avaliada como ácaros predadores pertencentes às
lidade da lavoura cafeeira. Lavras: EPAMIG-
pelas características físicas (aspecto e pu- famílias Phytoseiidae, Stigmaeidae e Bdelli- CTSM, 1998. 4p. (EPAMIG-CTSM. Circular Téc-
reza) e pelo aroma da bebida (CARVALHO dae. Entre os fitoseídeos, mais conheci- nica, 80).
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café com ataque do ácaro B. phoenicis e Chant, 1959 com 33,6%, Amblyseius ANTÍA-LONDOÑO, O.P.; POSADA-FLOREZ,

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Café Orgânico 99

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Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.83-99, jan./abr. 2002


Café Orgânico 101

Manejo ecológico das principais


doenças do cafeeiro
Vicente Luiz de Carvalho1
Rodrigo Luz da Cunha2
Sara Maria Chalfoun3
Resumo - A utilização de insumos em larga escala
na cafeicultura, especialmente os agroquímicos, e
a fertilização química, na maioria das vezes, não
levam em consideração os cuidados necessários
com o ambiente. Alternativas para uma cafei-
cultura sustentável demonstram ser um conjunto
de técnicas que minimizam os impactos ambien-
tais. São apresentadas as principais doenças
relacionadas com a cultura do cafeeiro, os fatores
que as favorecem e as medidas, principalmente as
preventivas, que buscam recompor e preservar o
equilíbrio biológico dos agroecossistemas, ofere-
cendo alguns subsídios básicos para os produtores
e técnicos em extensão rural em relação à cafei-
cultura orgânica. Muitos resultados práticos obtidos
por técnicos e produtores que utilizam o sistema
de cultivo orgânico, orientados por princípios
agroecológicos, necessitam ainda de pesquisas e
estudos de validação científica que expliquem, com-
provem e quantifiquem a sua eficácia, na conser-
vação dos recursos naturais a médio e a longo
prazos. As principais medidas de controle vão
desde a nutrição adequada das plantas, podas e
desbrotas, espaçamentos, até o controle genético
de doenças, através de variedades resistentes ou
tolerantes etc. É importante também a participação
de órgãos certificadores no processo produtivo,
para auxiliar e prestar esclarecimentos quanto às
questões fitossanitárias que, uma vez controladas,
através de medidas ecologicamente corretas e
inócuas para a saúde dos trabalhadores e consu-
midores, agregam valor ao produto final obtido,
atestando a importância do sistema orgânico de
cultivo.

Palavras-chave: Café; Cafeicultura orgânica; Culti-


vo orgânico; Controle cultural.

1
Engo Agro, M.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras, MG. Correio eletrônico: vicentelc@epamig.ufla.br
2
Engo Agro, M.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras, MG. Correio eletrônico: rlc@ufla.br
3
Enga Agra, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras, MG. Correio eletrônico: chalfoun@epamig.ufla.br

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102 Café Orgânico

INTRODUÇÃO Os primeiros sintomas da enfermidade nos cafezais é a alta densidade por área
Os cafeeiros estão sujeitos à incidência são pequenas manchas circulares de 0,5cm de plantas suscetíveis. Grandes áreas ou
de várias doenças. A ocorrência e os prejuí- de diâmetro, de cor amarelo-alaranjada, que mesmo regiões inteiras com cafeeiros de
zos que essas doenças podem causar de- aparecem na face inferior da folha. Sobre a cultivares suscetíveis, como o ‘Catuaí’ e
pendem dos fatores que atuam no sistema mancha, forma-se uma massa pulverulenta o ‘Mundo Novo’, favorecem o desenvol-
cafeeiro-patógeno-ambiente, que são variá- de uredosporos. No estádio mais avança- vimento da doença, proporcionando um
veis entre regiões, ou mesmo dentro de uma do, algumas partes do tecido foliar são maior potencial de inóculo e uma maior
região. Entre os vários fatores que deter- destruídas ou necrosadas (Fig.1). facilidade de disseminação deste entre as
minam uma epidemia estão a virulência do lavouras.
Fatores que favorecem
patógeno, a suscetibilidade ou a resistência Condições de alto enfolhamento das
a doença
das plantas, a densidade de plantio, o grau plantas, devido ao crescimento vegetativo
de enfolhamento, a carga pendente, o esta- Fatores relacionados com o ocorrido após o início das chuvas, em tem-
do nutricional dos cafeeiros e, ainda, os cafeeiro peraturas adequadas entre 21ºC e 23ºC, são
fatores ligados ao ambiente, como tempe- Um dos pontos importantes para a outro aspecto que determina a severidade
ratura, chuva, intensidade dos ventos, umi- ocorrência de uma epidemia de ferrugem da doença.
dade relativa, molhamento foliar, luz, dis-
ponibilidade de nutrientes no solo etc.
Todos esses fatores podem influenciar
em maior ou menor intensidade, na seve-
ridade das doenças que, de alguma forma,
podem ser manejadas, obtendo-se, assim,
uma diminuição do potencial de inóculo,
um aumento na resistência dos cafeeiros
às doenças ou uma promoção das condi-
ções menos favoráveis ao desenvolvimento
dos patógenos.
O conhecimento desses fatores pos-
sibilitará um manejo correto do sistema
cafeeiro-patógeno-ambiente, reduzindo os
danos que as doenças podem causar.
Para que o manejo das doenças dentro
do cultivo orgânico seja empregado corre-
tamente, serão apresentadas, a seguir, as
principais doenças do cafeeiro, os fatores A
que as favorecem, o seu desenvolvimento
e algumas práticas culturais, visando re-
duzir suas incidências.

FERRUGEM DO CAFEEIRO
Dentre as doenças que ocorrem no
cafeeiro, a ferrugem causada pelo fungo
Hemileia vastatrix Berk & Br. é a mais
importante, por causar grandes prejuízos
para a cultura e por ocorrer em todas as
regiões produtoras de café.
É uma doença foliar e seus danos estão
relacionados principalmente com o des-
folhamento que ela promove na planta.
Somando-se a queda natural com a queda
prematura de folhas, provocada pela fer- B
rugem, um grande desfolhamento causará Figura 1 - Ferrugem do cafeeiro
um baixo vingamento das flores, queda e NOTA: A - Folhas de cafeeiro apresentando sintomas de ferrugem nas partes superior
chochamento dos frutos. e inferior da folha; B - Cafeeiro atacado pela ferrugem.

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Café Orgânico 103

As folhas infectadas, remanescentes da enquanto que a Coffea arabica e a Coffea A temperatura atua diretamente sobre
estação seca anterior ao período chuvoso, liberica são mais suscetíveis. o processo de germinação e infecção do
proporcionam uma maior quantidade de Fungos das espécies Verticillium fungo que, depois de estabelecido, influen-
inóculo residual e as folhas sadias podem hemileiae (Fig. 2), Cladosporium hemileiae cia na incubação e latência. Além disso,
ser atingidas pelas gotículas de água car- e Glomerella cingulata são normalmente também pode atuar tanto diretamente sobre
regadas de uredosporos, promovendo a encontrados parasitando pústulas de fer- a fisiologia dos esporos, quanto indireta-
disseminação entre folhas e plantas. Cer- rugem. Quando as condições ambientais mente como fator de evaporação da água,
tamente haverá um bom pegamento das são favoráveis, podem, em maior ou menor promovendo uma menor duração do molha-
flores, quando as plantas estiverem bem grau, diminuir o potencial de inóculo. mento foliar. Temperaturas noturnas meno-
enfolhadas nos períodos que precedem Nesse aspecto, a manutenção do equi- res que 15ºC, assim como temperaturas
e/ou durante o florescimento. Essa situação líbrio biológico dentro da lavoura é impor- diurnas maiores que 30ºC podem limitar
traduzirá, dependendo de outros fatores, a tante e produtos químicos (inseticidas, fun- significativamente as epidemias.
uma maior carga pendente. gicidas e herbicidas), quando aplicados, A luminosidade é outro fator climático
Recentemente, várias pesquisas têm podem causar desequilíbrio ao ecossistema, que tem um papel importante no desenvol-
mostrado que o nível de produção das plan- reduzindo a população de inimigos naturais vimento epidemiológico da doença. O efeito
tas é também um fator que determina maior e, conseqüentemente, favorecendo o desen- da luz pode tanto ter ação direta sobre a
ou menor grau de infecção do cafeeiro pe- volvimento do patógeno. germinação dos uredosporos, quanto atuar
la ferrugem. Portanto, os cuidados com o indiretamente em relação às condições mi-
Fatores relacionados com croclimáticas de umidade e temperatura.
controle devem ser redobrados em plantas
o ambiente Nos últimos anos, a necessidade de uma
enfolhadas e/ou com cargas pendentes
O fungo, agente causal da ferrugem, melhor utilização das áreas, em busca de
altas. Esses fatores são fáceis de ser obser-
necessita de água livre, temperatura na faixa maiores rendimentos e retornos financeiros
vados e determinam quais medidas de con-
de 21ºC a 23ºC e ausência de luz direta, para mais rápidos, tem feito com que plantios
trole à ferrugem devem ser tomadas.
germinação e penetração dos uredosporos mais adensados sejam bastante utilizados.
Embora a ferrugem possa infectar os
pelos estômatos da folha (ALMEIDA, 1986). O aumento do número de plantas, por uni-
cafeeiros em todas as idades, observa-se que,
Os uredosporos só germinam na pre- dade de área, altera o ambiente ao redor da
no campo, a incidência é menor em plantas
sença de água em estado líquido e sob con- planta, formando um microclima que in-
novas ainda sem produção ou em cafeeiros
dições de baixa luminosidade. Portanto, a terfere em outros fatores como: luminosi-
recepados. Deve-se considerar, nesses casos,
chuva, além de promover a sua distribuição dade, taxa de evaporação e ação dos ven-
que além das condições fisiológicas das
entre folhas e plantas, é importante tanto tos (JARAMILLO-ROBLEDO, 1996). Essas
plantas, as condições do ambiente no campo
em relação à quantidade, quanto à hora de condições de ambiente serão plenamen-
(sombreamento, temperatura e molhamen-
seu início, influenciando na germinação te favoráveis ao desenvolvimento da fer-
to da superfície foliar) são desfavoráveis à
dos esporos. rugem do cafeeiro. Carvalho et al. (1999)
doença. Em cafeeiros novos ou recepados,
até a primeira grande produção, o controle
da doença não é necessário.

Fatores relacionados com


o patógeno
Mesmo que o hospedeiro seja susce-
tível e as condições fisiológicas das plantas
sejam favoráveis ao desenvolvimento da
doença, para que ocorra uma epidemia, o
patógeno precisa ser de uma raça virulenta.
A ferrugem (Hemileia vastatrix) possui
mais de 40 raças fisiológicas. No Brasil, são
conhecidas 12 raças virulentas ao cafeeiro,
sendo a raça II a mais disseminada. O fun-
go Hemileia vastatrix ataca todas as varie-
dades de café, porém, dentro do gênero
Coffea, existem diferenças em relação à pa-
togenicidade. A espécie Coffea canephora
tem uma maior resistência e/ou tolerância, Figura 2 - Pústula de ferrugem parasitada com Verticillium sp.

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.101-114, jan./abr. 2002


104 Café Orgânico

observaram, nos dois anos estudados com


a cultivar Catuaí, que ocorreu um aumento
de, aproximadamente, 40% na incidência da
ferrugem ao utilizar uma densidade de 5 mil
plantas/ha em relação a 2.857 plantas/ha,
sendo esse aumento ainda maior na densi-
dade de plantio 10 mil plantas/ha, chegando
a 60,93%. O Gráfico 1 mostra o progresso
da ferrugem, na média dos resultados de
quatro anos.

Quantificação da ferrugem
Em lavouras já implantadas, os fatores
ambientais relacionados com hospedeiro Gráfico 1 - Variação do progresso da ferrugem do cafeeiro em diferentes densidades de
e patógeno influenciam o sistema epide- plantio
miológico e é importante que sejam conhe- NOTA: Média dos anos de 1997/1998/1999/2000, EPAMIG - São Sebastião do Paraíso, MG.
cidos os índices de incidência e a evolução
da doença para que possam ser aplicadas
as medidas culturais e/ou controles alter-
nativos, visando reduzir a doença a níveis
economicamente aceitáveis (custo/bene-
fício).
A quantificação da ferrugem é feita pelo
monitoramento, através de medições de sin-
tomas ou sinais da doença dentro de um
talhão ou da lavoura.

Monitoramento da ferrugem
O monitoramento ou o acompanha-
mento da ferrugem nos cafezais possibilita
avaliar a intensidade da doença através da
incidência ou severidade dos sintomas ou Gráfico 2 - Curva de progresso da ferrugem do cafeeiro em função da precipitação e da
sinais, permitindo registrar sua evolução por temperatura média
NOTA: Dados médios dos anos de 1997/1998/1999/2000, EPAMIG - São Sebastião do Paraíso, MG.
meio da curva de progresso da doença e,
dessa forma, estabelecer um programa de
manejo eficiente, que evite danos econômi-
Caminhamento de
cos à cultura, devido aos altos índices da amostragem
doença (Gráfico 2).
Para fazer o monitoramento é necessário
amostrar os talhões, fazendo-se um cami-
nhamento ao acaso, em ziguezague, entre
as plantas (Fig. 3).
A seqüência de trabalho deverá ser co- Onde amostrar

mo a seguir:
a) dividir as lavouras em talhões uni-
formes;
b) coletar de cinco a dez folhas por
planta (no terceiro ou quarto par),
no terço médio da planta, perfazen-
do um total de 100 a 300 folhas por
talhão; Figura 3 - Como caminhar no talhão e onde coletar as folhas para avaliação da ferrugem

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.101-114, jan./abr. 2002


Café Orgânico 105

c) contar o número de folhas com ferrugem e determinar a porcentagem de infecção, O cultivo do cafeeiro no sistema orgâ-
conforme a fórmula a seguir: nico, em que o controle de doenças deve
ser feito basicamente por meio de medidas
no de folhas com ferrugem x 100 preventivas, a utilização de uma cultivar
% de infecção (I) = resistente e que seja adaptada ao ambiente
no total de folhas local consiste numa das melhores alterna-
tivas de controle da ferrugem (KIMEMIA;
NJOROGE, 1994), combinada com outras
medidas, para reduzir os danos que essa
A porcentagem de infecção (I) mostra Na fase de desenvolvimento dos fru-
doença pode causar aos cafeeiros.
a freqüência de ocorrência e o conjunto de tos, pode ocorrer redução nos teores fo-
Atualmente, a quase totalidade das cul-
observações, ao longo de um período, mos- liares de N, P, K, Ca e Mg, atingindo valores
tivares plantadas no Brasil são suscetíveis
tra a evolução da doença na lavoura. abaixo daqueles considerados adequados
à ferrugem. A introdução de cultivares
Este levantamento deve ser realizado (CHAVES; SARRUGE, 1984). É de se espe-
resistentes vem sendo feita gradativa-
pelo menos uma vez por mês, a partir de rar que, com adubações desequilibradas ou
mente. Entre estas cultivares, já em cultivo
dezembro. insuficientes e, conseqüentemente, cafeei-
no país e com sementes disponíveis no
ros mal nutridos, os prejuízos causados pela mercado, estão:
Controle cultural ferrugem possam ser maiores, acentuando
a) ‘Icatu’: portadora de resistência à fer-
a) fazer sempre adubações equilibradas ainda mais a queda prematura das folhas,
rugem do tipo horizontal, também co-
nas quantidades recomendadas; com diminuição de produção, principal-
nhecida como resistência de campo
b) fazer desbrotas, evitando-se o exces- mente naqueles anos de carga pendente
ou inespecífica, apresentando cafeei-
so de hastes e conseqüentemente o alta. Por isso, uma adubação correta e equi-
ros imunes até aqueles com esporu-
auto-sombreamento, promovendo librada, com base na análise do solo e em
lação da ferrugem com baixa inten-
um maior arejamento da cultura; tecidos foliares e dentro das recomenda-
sidade. O vigor vegetativo e o enfolha-
ções para a cultura, pode indiretamente
c) realizar podas nos cafeeiros, evitan- mento são semelhantes à cultivar
diminuir os efeitos do desfolhamento
do-se o fechamento da lavoura; Mundo Novo. A altura das plantas
causados pela ferrugem.
d) evitar espaçamentos excessivamente varia de 3,0 a 4,0 m, com diâmetro da
adensados, condição extremamente Controle genético copa entre 2,0 e 2,8 m, de acordo com
favorável à incidência da ferrugem; a progênie. A produtividade, matu-
Com relação ao controle genético, ração e sua uniformidade são compa-
e) dar preferência ao cultivo a pleno sol, Mendes e Guimarães (1996) afirmam que ráveis com as melhores cultivares
evitando-se o cultivo sombreado. o melhoramento que visa a resistência à de Mundo Novo. As cultivares Icatu
ferrugem (Hemileia vatatrix Berk e Br.) é, Vermelho IAC-2945 e Icatu Amarelo
Estado nutricional adequado
sem dúvida, uma linha de trabalho que vem IAC-2944 devem ser cultivadas no
Poucos e contraditórios estudos foram
merecendo maior atenção dos melhoristas espaçamento de 4,0 x 1,0 m. Já a cul-
feitos em cafeeiros, relacionando-se o aumen-
do cafeeiro em todo o mundo. Especial aten- tivar Icatu Precoce IAC-3282, de fru-
to ou a diminuição da tolerância das plantas
ção vem sendo dada aos híbridos naturais tos amarelos, deve ser cultivada em
à ferrugem com os teores dos nutrientes
ou artificiais, entre as espécies C. arabica e espaçamentos mais densos, devido
nas folhas através das adubações.
C. canephora, como o ‘Híbrido de Timor’, o à sua arquitetura, mas tem compor-
Em muitas relações hospedeiro-pató-
‘Icatu’ e outros, que apresentam resistên- tamento idêntico às demais cultivares
geno, a variação da tolerância ou da sus-
cia ao patógeno. de Icatu;
cetibilidade às doenças está ligada ao su-
primento adequado ou ao equilíbrio dos
nutrientes nas folhas (KRÜGNER, 1978, QUADRO 1 - Influência do nível de produção do cafeeiro sobre o índice de infecção da ferrugem
PRETTY, 1982, HUBER; WATSON, 1974).
Folhas com ferrugem
Uma alta carga pendente pode promo- (%)
Níveis de produção
ver a carência de alguns nutrientes nas
Dezembro Março Maio Julho
folhas, devido à translocação desses para
os frutos, tornando os cafeeiros mais sus- 0% de produção 8,33 22,00 27,33 32,83
cetíveis à ferrugem. Cafeeiros com uma alta
50% de produção 7,67 26,31 59,66 80,66
carga pendente podem ter até 60% mais
folhas com ferrugem em relação a cafeeiros 100% de produção 8,99 36,33 70,33 89,33
sem produção (Quadro1). FONTE: Carvalho et al. (1993).

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b) ‘Oeiras MG 6851’: resistente a todas f) ‘IBC Palma’: resistente a todas as início das aplicações deve ser com baixa
as raças de ferrugem encontradas nas raças de ferrugem prevalecentes no incidência da ferrugem, no máximo de 5%
regiões cafeeiras do estado de Mi- Brasil. Possui características de pro- de folhas com pústulas esporuladas, repe-
nas Gerais. A produtividade é com- dutividade, vigor e porte semelhan- tindo-se as aplicações a cada 30 dias. Pro-
parável à cultivar Catuaí Vermelho e tes à cultivar Catucaí, sendo o porte dutos alternativos, como biofertilizantes e
Amarelo. Apresenta altura e diâme- apenas ligeiramente superior e a outros, podem ser utilizados.
tro da copa ligeiramente inferiores à maturação um pouco mais precoce.
‘Catuaí’, com 2,58 m de altura e 1,65 m A copa apresenta angulação dos ra- CERCOSPORIOSE DO
de diâmetro de copa, frutos verme- mos mais aberta. Pode ser cultivada CAFEEIRO
lhos, bom vigor vegetativo e matu- tanto em plantios largos como aden-
A cercosporiose é uma das doenças
ração uniforme e intermediária às sados;
mais antigas do cafeeiro, tanto na Amé-
cultivares Catuaí e Mundo Novo. g) ‘Catucaí’: apresenta progênies com rica do Sul, quanto na América Central.
Devido ao seu porte e à sua arqui- frutos vermelhos ou amarelos, arqui- Na Colômbia, a cercosporiose é conside-
tetura, pode ser cultivada em plan- tetura variável de plantas cônicas, rada uma das principais enfermidades do
tios adensados com espaçamentos de bem abertas e outras cilíndricas e cafeeiro por ser amplamente distribuída e
2,0 a 2,5 m x 0,5 a 0,7 m; compactas; diâmetro da copa seme- por ocasionar grandes perdas na produção.
c) ‘Obatã’: porte baixo, internódios cur- lhante à cultivar Catuaí. O porte varia No Brasil, causa também perdas na produ-
tos, folhas longas, as novas pos- de baixo a médio. A maturação é mais tividade, além de afetar o tipo e a qualidade
suem a cor verde. Os frutos são graú- precoce que a cultivar Catuaí, varian- do café produzido.
dos, vermelhos e de maturação mais do entre as progênies. Algumas des- O agente causal dessa doença é o fungo
tardia. É exigente quanto à fertilidade tas progênies são imunes e outras com Cercospora coffeicola Berk & Cook, que
do solo e indicada preferencialmen- menos de 5% de incidência pela fer- recebe várias denominações, dependendo
te para plantios adensados ou em rugem, porém com pequeno número da região onde incide, como: cercosporio-
renque. Os espaçamentos podem de pústulas por folha. Apresenta se, mancha-de-olho-pardo, olho-de-pomba
variar de 2,0 a 2,5 m x 0,5 a 1,0 m ou boa adaptação às regiões cafeeiras. e olho-pardo. Os sintomas característicos
3,0 m x 0,5 a 1,0 m; As plantas são precoces na primeira nas folhas são manchas circulares de colo-
d) ‘Tupi’: porte baixo, internódios cur- produção, sendo um pouco mais exi- ração castanho-clara a escura, com o centro
tos, folhas novas de coloração bron- gentes quanto à nutrição. Pode ser branco-acinzentado, quase sempre envol-
zeada, frutos graúdos e vermelhos. cultivada em espaçamentos largos vidas por um halo amarelado. Nos frutos,
Maturação mais precoce que as cul- ou adensados. ocorrem lesões deprimidas de coloração
tivares Catuaí Vermelho e Obatã. escura, as quais se desenvolvem no senti-
É mais exigente quanto à fertilidade Controle dirigido
do polar. Podem ocorrer em frutos verdes,
do solo, sendo indicada para plan- Quando os fatores ambientais favo- causando maturação precoce da casca em
tios adensados ou em renque. Os recem o fungo e desfavorecem os cafeeiros, torno da mancha (Fig. 4). Nos últimos anos,
espaçamentos podem variar de 2,0 como nos cultivos em sistema adensado têm sido observados sintomas diferentes
a 2,5 m x 0,5 a 1,0 m, ou 3,0 m x 0,5 a ou em anos de carga pendente alta, em que nas folhas, caracterizados por manchas
0,6 m; o controle cultural ou o equilíbrio biológico escuras sem halo amarelado que, em algu-
e) ‘Iapar 59’: resistente a 30 raças do dentro da lavoura não são suficientes para mas regiões, têm sido denominadas cer-
fungo Hemileia vastatrix. Sua pro- reduzir a severidade da ferrugem, podem cóspora-negra.
dutividade inicial (quatro safras) é ser necessárias algumas pulverizações com Essa doença está presente em todas as
cerca de 20% superior à cultivar Catuaí, produtos protetores. O período de infecção regiões cafeeiras do Brasil, causando pre-
no mesmo espaçamento. A matu- da ferrugem estende-se normalmente de juízos tanto em mudas no viveiro, como em
ração é medianamente precoce e os dezembro a julho (Gráfico 2), podendo plantas novas e adultas no campo. Os prin-
frutos vermelhos. O vigor vegetativo chegar até setembro. O nível máximo de inci- cipais danos provocados são:
das plantas é inferior ao da ‘Catuaí’, dência geralmente ocorre nos meses de maio a) em viveiros: queda de folhas e ra-
sendo preferencialmente indicada pa- e junho ou julho, variando em função da quitismo das mudas;
ra solos mais férteis e plantios aden- região, da carga pendente e do clima.
sados. Essa cultivar deve ser mane- O controle preventivo pode ter início b) em pós-plantio: desfolhamento e atra-
jada com poda de rejuvenescimento em dezembro e estender-se até março. Para so no crescimento das plantas;
após o quinto ano de colheita. Os o uso das caldas viçosa, viça-café orgâni- c) em lavouras novas: queda de folhas,
espaçamentos para essa cultivar são co e cúpricos (sulfato tribásico de cobre, frutos e seca de ramos produtivos,
idênticos aos da cultivar Tupi; hidróxido de cobre e o óxido cuproso), o após as primeiras produções;
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A B

Figura 4 - Cercosporiose do cafeeiro


NOTA: A - Sintomas de cercosporiose em folhas; B - Sintomas nos frutos maduros e frutos com amadurecimento precoce, devido à
incidência da cercosporiose.

d) em lavouras adultas: queda de fo- desequilibrada em solos muito argilosos, em excesso interage negativamente com N,
lhas, amadurecimento precoce, que- muito arenosos ou solos compactados, diminuindo o efeito deste (FERNANDEZ-
da prematura de frutos e chocha- assim como sistemas radiculares deficien- BORRERO et al., 1966, LOPEZ-DUQUE,
mento. As lesões funcionam como tes ou pião torto, são fatores que predis- 1972). Os desequilíbrios da relação N/K
uma entrada para outros fungos que põem as plantas à doença. As condições também favorecem o desenvolvimento da
depreciam a qualidade do produto. do solo e do sistema radicular influenciam doença. Lavouras com deficiência de N ou
diretamente a nutrição da planta. Inúmeros excesso de K sofrerão maior incidência da
Fatores que favorecem trabalhos indicam que a nutrição deficien- doença.
a doença te ou desequilibrada tem efeito direto na Ao contrário do que ocorre com a fer-
Em geral, o fungo necessita de umidade intensidade de ataque da Cercospora. rugem, a incidência da cercosporiose é me-
relativa alta, temperatura baixa e excesso Doses maiores de N diminuem a inci- nor nos plantios adensados (Gráfico 3).
de insolação, para o seu desenvolvimento dência da Cercospora, enquanto que o K Além do auto-sombreamento, a maior dis-
(ALMEIDA, 1986).
Nos viveiros, além das condições cli-
máticas já citadas, os substratos pobres
em matéria orgânica ou sem as devidas
correções químicas, com relações desequi-
libradas dos nutrientes e solos com textura
inadequada (muito argilosos ou muito are-
nosos) são fatores que podem predispor
as mudas a uma incidência da cercospo-
riose. Nos plantios realizados no final do
período chuvoso (início da seca), é comum
ocorrerem ataques severos do fungo, pro-
movendo um desfolhamento acentuado das
plantas. O déficit hídrico, os ventos frios
ou quaisquer condições adversas após o
plantio predispõem as mudas ao ataque da
cercosporiose. A incidência é ainda mais
severa se o preparo das covas ou dos sul-
cos de plantios for inadequado. Gráfico 3 - Variação de progresso da cercosporiose do cafeeiro em diferentes densidades
Em lavouras adultas, além das condi- de plantio
ções climáticas, a nutrição deficiente e/ou NOTA: Média de 1997/1998/1999/2000, EPAMIG - São Sebastião do Paraíso, MG.

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ponibilidade de água e de minerais é des- Práticas culturais em lavouras incidência da doença é março/abril (Gráfi-
favorável à doença. adultas co 4), período que coincide com a fase de
maturação dos frutos, podendo causar
a) fazer o planejamento das adubações,
Controle cultural sérios prejuízos. Deve-se seguir rigoro-
principalmente durante as primeiras
Sob o ponto de vista do manejo inte- samente o intervalo de 30 dias entre as
produções dos cafeeiros, a fim de
grado, a cercosporiose ou olho-pardo é aplicações.
evitar o desequilíbrio da relação par-
uma doença, com maior possibilidade de te aérea/sistema radicular, condição
ser controlada através do manejo e de prá- ROSELINIOSE
que não favorece a doença;
ticas culturais, podendo até dispensar o Roseliniose é uma doença do sistema
b) fazer o acompanhamento periódico
uso de agroquímicos. radicular do cafeeiro também chamada “mal
do estado nutricional das plantas,
através de análises foliares e de solo; de quatro anos”, em razão dos primeiros
Práticas culturais em viveiros
sintomas que ocorrem em torno de quatro
a) instalar os viveiros em lugares secos c) manter o equilíbrio da relação dos
anos após o plantio. O fungo Roselinea
e arejados; teores foliares de N/K em lavouras
sp. ataca também outras plantas cultivadas
adultas, principalmente em anos de
b) controlar o ambiente do viveiro, evi- e desenvolve-se bem em troncos, raízes,
carga pendente alta, visando diminuir
tando-se alta umidade, baixas tem- restos vegetais e na matéria orgânica em
a incidência da cercosporiose;
peraturas, ventos frios ou excesso decomposição. Os sintomas iniciais são o
de insolação; d) manter os cafeeiros sombreados ou amarelecimento e o murchamento das plan-
em sistemas de plantio adensado, a tas, queda das folhas e morte dos ramos.
c) encher os saquinhos com solo de
fim de reduzir a incidência da doença. O fungo causa o escurecimento das raí-
boa textura, a fim de proporcionar
um substrato com boa porosidade; zes e o desprendimento fácil da casca das
Controle dirigido raízes. Sobre o lenho e abaixo da casca das
d) preparar o substrato com esterco pu- Quando o controle cultural não for su- raízes, observam-se filamentos esbranqui-
ro e bem curtido; ficiente para reduzir a cercosporiose, as mu- çados que são as estruturas de crescimen-
e) manter as mudas com umidade ade- das no viveiro ou após o aparecimento dos to do fungo, chamadas rizomorfos que
quada, evitando-se o excesso ou a primeiros sintomas devem, de alguma forma, penetram na região do coleto das plantas
sua falta; ser tratadas preventivamente. ou raízes localizadas próximas à superfí-
f) adicionar nutrientes em quantidades Em condições de campo, em anos de cie.
adequadas (esterco, termofosfato e carga alta, a cercosporiose pode ser contro-
sulfato de potássio). lada com a aplicação de supermagro, calda Fatores que favorecem
viçosa, viça-café orgânica ou com cúpricos. a doença
Práticas culturais nas fases de
As aplicações podem ser feitas de dezem- a) plantio em terras anteriormente ocu-
plantio e pós-plantio
bro/janeiro a março/abril e a época de maior padas por matas;
a) evitar o plantio em solos arenosos
e/ou pobres;
b) fazer um bom preparo do solo, livre
de compactações e adensamentos
40
para proporcionar um bom arejamen-
to e desenvolvimento das raízes; 35

c) fazer, com certa antecedência, a aná- 30


lise de solo e as correções necessá-
Infecção (%)

25
rias, um bom preparo das covas e
dos sulcos de plantio. Seguir um 20

plano de adubação e nutrição ade- 15


quado, incluindo sempre a utilização
10
de compostos orgânicos;
d) estar atento ao controle dirigido, 5

principalmente se o plantio for feito 0


no final do período chuvoso, pois o jan. fev. mar. abr. maio jun. jul. ago . set. o ut. no v. dez.
excesso de insolação, ventos e a de-
ficiência hídrica predispõem as plantas Gráfico 4 - Curva de progresso da cercosporiose do cafeeiro, EPAMIG - São Sebastião
à incidência da cercosporiose. do Paraíso, MG

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Café Orgânico 109

b) ferimentos na região do colo e nas


raízes próximas à superfície do solo;
c) temperaturas e precipitações eleva-
das e pouca insolação;
d) presença de raízes e restos do desma-
tamento depois do preparo do solo;
e) terreno rico em matéria orgânica em
decomposição.

Controle cultural
a) evitar o plantio em áreas recém-des-
matadas;
b) fazer uma boa destoca e catação ri-
gorosa de raízes e restos vegetais
após o preparo do solo; Figura 5 - Sintomas de mancha-aureolada em folhas de café
c) fazer uma boa calagem em área total,
o que favorecerá a decomposição da
matéria orgânica; Os ventos promovem ferimentos nas fo- tural, sendo a aplicação de cúpricos utili-
d) evitar ferimentos nas raízes super- lhas e ramos novos, propiciando a penetra- zada apenas com a ocorrência da doença,
ficiais e no colo da planta durante as ção da bactéria. A ocorrência de chuvas mesmo assim, deve-se informar à certifi-
capinas; de granizo e o frio intenso podem provocar cadora.
lesões nas plantas, que também facilitam a
e) arrancar e queimar cafeeiros ataca-
entrada da bactéria. As condições de tem- MANCHA-DE-PHOMA
dos pelo fungo;
peraturas entre 20ºC e 25ºC, umidade rela-
f) fazer rotação de culturas (milho e/ou Esta doença é causada pelo fungo iden-
tiva alta próxima a 90% e precipitações de
arroz) em áreas extensas comprova- tificado pela primeira vez na Costa Rica co-
baixa intensidade e constantes favorecem
damente infectadas. mo Phoma costarricensis Ech, e necessita
a ocorrência da doença. Essas condições
de ferimentos prévios na planta, para que
ocorrem, normalmente, nos meses de outu-
Controle dirigido se desenvolva a infecção (ECHANDI, 1957).
bro e novembro.
Trabalhos realizados na Colômbia demons-
Fazer a aplicação de cal virgem (700 g/m2)
traram que o fungo Phoma sp. é capaz de pe-
nas reboleiras ou nos locais de arranquio Controle cultural
netrar e causar infecções nos brotos, frutos
de plantas infectados pelo fungo.
a) eliminar todos os resíduos de mudas e folhas na presença ou ausência de feri-
do viveiro anterior; mentos (FERNANDEZ-BORRERO, 1961).
MANCHA-AUREOLADA
b) construir viveiros protegidos de ven- No Brasil, além da Phoma costarricensis,
A mancha-aureolada do cafeeiro é uma tos frios; estudos mais recentes confirmam a ocor-
doença causada pela bactéria Pseudomonas rência de outras espécies desse fungo
c) evitar a umidade excessiva dentro
syringae pv. garçae que ocorre tanto em (SALGADO et al., 1997).
dos viveiros;
mudas no viveiro, onde causa maiores pre- Os sintomas nas folhas novas são
d) evitar a formação de lavouras em
juízos, quanto em plantas adultas. manchas circulares de coloração escura e
áreas sujeitas a ventos frios e fortes;
A denominação mancha-aureolada é em de tamanho variado que podem chegar a
decorrência da formação de um halo ama- e) programar a formação de quebra- 2cm de diâmetro. Quando as lesões atin-
relo que circunda as lesões. As áreas lesio- ventos junto à implantação da la- gem as bordas das folhas, elas encurvam-
nadas normalmente desprendem-se das voura; se, podendo apresentar rachaduras. Podem
bordas das folhas, proporcionando um f) eliminar mudas com sintomas. ocorrer nos ramos, iniciando-se a partir dos
aspecto rendilhado (Fig. 5). folíolos ou do ponto de abscissão das fo-
Controle dirigido lhas. Nos ramos atacados, observam-se
Fatores que favorecem a A aplicação preventiva de cúpricos tem lesões deprimidas e escuras (Fig. 6). Essas
doença sido uma alternativa para ajudar no controle lesões podem ocorrer também nos botões
As lavouras instaladas em locais de da doença. Entretanto, esse tipo de contro- florais, flores e frutos no estádio de chum-
maiores altitudes e desprotegidas da ação le não é recomendado no sistema orgânico. binho, causando a morte e a mumificação
dos ventos estão mais sujeitas à doença. O controle preventivo restringe-se ao cul- dos órgãos atacados.
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110 Café Orgânico

Fatores que c) fazer adubações equilibradas, se-


favorecem a doença gundo a análise do solo e em quan-
Lavouras expostas à ação tidades adequadas.
de ventos fortes e frios, prin-
cipalmente naquelas faces RHIZOCTONIOSE
voltadas para o sul, sudeste O agente causal da rhizoctoniose é o
e leste. fungo Rhizoctonia solani Kühn, que
A penetração do fungo habita o solo e sobrevive por longos perío-
é facilitada por danos mecâ- dos em restos de culturas. A doença pode
nicos nos tecidos da planta, causar perdas econômicas consideráveis
produzidos por insetos ou em sementeiras, viveiros e em plantas um
pelo roçar de folhas tenras ano após o plantio.
causado pelos ventos. A tem- Figura 6 - Sintomas de manchas-de-phoma em folhas do O fungo pode incidir sobre as plântulas
peratura tem grande influên- cafeeiro no viveiro e não causar as lesões no colo.
cia na incidência desse fungo, Quando essas mudas contaminadas forem
pois o micélio é infectivo a 240C e os picni- Fatores que favorecem a para o campo, um ano após o plantio, e as
diósporos a 180C-190C. Períodos intermi- doença condições forem favoráveis, a infecção pode-
tentes de frio, ventos frios e chuva favo- O fungo requer condições de clima se desenvolver e causar lesões no colo e
recem a doença. Durante o ano, essas con- semelhantes às exigidas pela Phoma sp. morte das plantas. Nessa fase, a doença
dições ocorrem geralmente nos meses de para que ocorra a infecção. Ventos frios, denomina-se rhizoctoniose tardia.
agosto a outubro e março a maio. Nessas chuvas contínuas e abertura de lesões nas Os sintomas característicos da doença
épocas, podem ocorrer surtos da doença, folhas, causadas por insetos ou chuva de em viveiros são lesões do colo, murcha e
porém, dependendo da região e das con- granizo, favorecem a incidência da doen- morte de plântulas e, até o primeiro par de
dições específicas de clima, pode evoluir ça.
folhas, devido às lesões e ao estrangula-
também em outros meses. A temperatura ideal para o desenvol- mento do colo, ocorre o tombamento des-
Controle cultural vimento do fungo situa-se em torno de tas em reboleira (Fig. 8). No campo, um ano
220C, e o seu crescimento é estimulado pe- ou mais após o plantio, as plantas ama-
a) evitar a instalação de lavouras em
la alternância de temperaturas altas e bai- relecem, murcham, secam e podem tombar,
áreas sujeitas a ventos frios;
xas. devido ao roletamento do caule na região
b) programar a instalação de quebra-
do colo.
ventos provisórios e/ou definitivos Controle cultural
a partir da implantação da lavoura;
a) evitar a instalação de lavouras em Fatores que favorecem a
c) fazer adubações equilibradas e em
áreas sujeitas a ventos fortes e frios; doença
quantidades adequadas.
b) programar a instalação de quebra- A doença é favorecida pelo excesso de
MANCHA-DE-ASCOCHYTA ventos provisórios e/ou definitivos umidade, de sombra e por temperaturas
Este fungo causa lesões foliares, de a partir da implantação da lavoura; altas. Temperaturas entre 18ºC e 28ºC e
tamanho variável e de colo- umidade em torno de 90% favorecem a
ração castanho-parda a cas- ocorrência da rhizoctoniose nos viveiros.
tanho-escura, que provo- Estruturas de resistência chamadas
cam a queda das folhas do escleródios e partes do micélio podem
cafeeiro, seu principal dano permanecer no solo, especialmente na
à cultura (Fig. 7). matéria orgânica por muitos anos. Por isso,
Os sintomas nas folhas o solo e a matéria orgânica são fontes de
são semelhantes aos causa- inóculo para os viveiros, caso estes estejam
dos pela Phoma sp. e ainda contaminados.
não se observaram diferen- Em condições de campo, quando as
ças no campo, sendo, por- mudas já contaminadas forem levadas
tanto, necessário diagnoses ao plantio, o excesso de umidade do so-
laboratoriais com o auxílio lo, devido ao período chuvoso intenso, e
de técnicas específicas pa- temperaturas altas da primavera/verão
ra identificar suas estru- Figura 7 - Sintomas de manchas-de-ascochyta em folhas propiciarão o desenvolvimento do fun-
turas reprodutivas. do cafeeiro go.

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Café Orgânico 111

Controle cultural d) mudar viveiros de local, periodica- ou de construções sobre o vivei-


mente; ro;
a) utilizar, no preparo do substrato, so-
lo de barranco (subsolo) isento de e) evitar excesso de umidade e sombra h) eliminar as reboleiras com sintomas
matéria orgânica; nos canteiros (máximo de 50% de da doença e as plantas que as circun-
sombra); dam;
b) como não é permitida a desinfecção
do substrato, fazer a solarização des- f) utilizar material orgânico bem curtido i) diminuir a irrigação e o sombreamen-
te; ou já compostado; to após o aparecimento da doença.
c) não reaproveitar as sacolinhas; g) evitar sombras excessivas de árvores
MANCHA-ANULAR
Esta doença, causada por vírus, é co-
nhecida por mancha-anular, leprose ou
Coffee ringspot virus. Apesar de conhecida
no Brasil desde 1935, não era considerada
importante para o cafeeiro.
A Nos últimos anos, foram constatados
ataques severos em algumas lavouras do
Alto Paranaíba. Hoje, a doença é também
observada em lavouras do Sul de Minas e
no estado da Bahia. Segundo Figueira et
al. (1996), algumas das áreas apresentaram
100% de plantas infectadas, com 20% de
redução na produção.
A doença causa desfolhamento inten-
so, de dentro para fora da planta, formando
o que se denomina “planta oca”, devido à
maior ocorrência de queda de folhas nas
partes mais internas da planta, local pre-
ferido pelo ácaro-vetor (MATIELLO et al.,
1995).
A virose causa manchas de cor verde-
pálida destacando-se do verde normal, qua-
B se sempre ao longo das nervuras principal
Figura 8 - Rhizoctoniose
e secundária das plantas. Nos frutos, no
estádio cereja, verificam-se círculos irre-
NOTA: A - Detalhe do sintoma de rhizoctoniose na plântula; B - Ataque em reboleira
no canteiro (tombamento). gulares pardo-amarelados (Fig. 9) e lesões

A B

Figura 9 - Mancha-anular
NOTA: A - Sintomas de incidência de mancha-anular nas folhas; B - Sintomas de incidência de mancha-anular nos frutos.

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112 Café Orgânico

necróticas nos frutos verdes. Podem apre- O biofertilizante nada mais é do que o Calda bordalesa
sentar também manchas no tom verde-claro, produto da disgestão aeróbica ou anaeró- Composição para 100 litros de solução:
destacando-se também do verde normal em bica de materiais orgânicos de origem animal - 1 kg de sulfato de cobre
forma de anéis. ou vegetal em meio líquido. O resultado da
- 1 kg de cal virgem
fermentação pode controlar as doenças de
Fatores que favorecem a várias maneiras: antibiose, competição, - 100 litros de água
doença parasitismo e predação (pela presença de Como preparar:
A intensa ocorrência desta virose, nos microrganismos antagônicos), indução de
a) dissolver 1 kg de sulfato de cobre em
últimos anos no Brasil, deve-se a um aumen- resistência bioquímica e/ou mecânica (tan-
25 litros de água. Para dissolver mais
to na população do ácaro-vetor Brevipalpus to pela presença de microrganismos como
rápido, deixar o sulfato de cobre na
phoenics (Geijskes), que normalmente é cons- pelos compostos químicos presentes) e
água de um dia para o outro;
tatado nas lavouras atacadas, atribuído a pela ação direta dos elementos minerais so-
condições climáticas favoráveis (estiagem b) dissolver 1 kg de cal apagada em 25
bre os patógenos ou indireta, como nutri-
prolongada) e/ou desequilíbrios provoca- litros de água;
entes, mantendo o equilíbrio nutricional
dos pelo uso contínuo de fungicidas e das plantas. c) despejar lentamente a solução de
inseticidas. A composição dos biofertilizantes va- sulfato de cobre sobre a solução de
As condições de clima, com períodos ria conforme o método de preparo, sendo a cal. Nunca ao contrário. Agitar bem
secos e temperaturas altas, favorecem o durante essa mistura. Completar para
principal característica, a presença dos mi-
desenvolvimento do ácaro. 100 litros e coar a solução antes de
crorganismos responsáveis pela decompo-
colocar no pulverizador.
sição da matéria orgânica. Como resultado
Controle cultural dessa decomposição, vários metabólitos, De acordo com o modo de preparação,
Preservar o equilíbrio entre os ácaros macro e micronutrientes, são produzidos, podem-se obter três tipos de calda com
predadores e os vetores, conforme descrito relação ao pH (ácido, neutro e alcalino). É
além da presença de uma grande flora mi-
em Reis et al. (2002). mais recomendável a calda neutra ou com
crobiana.
tendência à alcalina, pois a calda ácida pode
Com relação ao uso de biofertilizantes
provocar queima das folhas ou fitotoxidade
SUGESTÕES DE no controle de doenças do cafeeiro, poucos
causada pelo cobre livre. Para verificar se a
PRODUTOS ALTERNATIVOS estudos foram realizados. Entre eles o de
solução é ácida, pode-se usar um peagâmetro
UTILIZADOS NA Tratch e Bettiol (1997), que apresentou uma ou papel indicador. Uma forma prática e
PROTEÇÃO OU AUXÍLIO inibição total da germinação dos esporos aproximada de verificar a acidez é pingando
NO CONTROLE DE DOENÇAS e uma diminuição do tubo germinativo do uma gota da solução final em uma faca com
Além das práticas culturais, como me- fungo Hemileia vastatrix com a aplicação lâmina de ferro. A calda estará ácida se, após
didas de reduzir os danos causados pelas do biofertilizante em estudo na concentra- três minutos, formar uma mancha avermelhada
doenças nos cafeeiros, faz parte do manejo ção de 1%. no metal, sendo então necessário colocar
dessas doenças o uso de produtos como As alternativas para se produzir um bio- mais solução de cal na mistura.
caldas, cúpricos, preparados biodinâmicos fertilizante são variadas. A origem do com-
Cuidados especiais:
etc. Alguns desses produtos já são usados posto orgânico e a adição de sais, cinzas e
outros, assim como o tipo de fermentação, a) usar cal de boa qualidade e de eleva-
e são comprovadamente eficientes, outros
diferencia a composição do produto final. da pureza;
necessitam de maiores estudos para se veri-
ficar a eficácia. Deve-se lembrar que, para Segundo Pinheiro e Barreto (1996), não b) utilizar vasilhames de plástico, ci-
existem receitas para produzir um bioferti- mento ou madeira e nunca de ferro,
o uso desses produtos na cafeicultura orgâ-
lizante. O principal componente do biofer- latão ou alumínio, por reagirem com
nica, a entidade certificadora deve ser con-
tilizante é o esterco. Podem-se adicionar: o sulfato de cobre;
sultada.
cinzas, fígado de boi moído, leite, melaço, c) não armazenar a calda para ser uti-
Biofertilizante sangue, farinha de concha, calcário, açúcar, lizada em outras aplicações;
De acordo com Bettiol et al. (1998), o uso sais etc. d) lavar bem todo o equipamento, pois
de biofertilizantes no controle de doenças Alguns autores que descrevem sobre é um produto corrosivo;
de plantas constitui mais uma alternativa a formulação de biofertilizantes são aqui e) não adicionar à calda outros produ-
para os produtores de café orgânico, haja citados: Penteado (1999), Bettiol et al. (1998), tos, devido a sua alcalinidade.
vista que são poucos os produtos dispo- Pinheiro e Barreto (1996), Theodoro e Cai- Obs.: existe calda bordalesa pré-fabricada, em
níveis para esse sistema. xeta (1999) e Tratch e Bettiol (1997). forma de pó.

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Café Orgânico 113

Calda viçosa adaptada para sistemas orgânicos REFERÊNCIAS


Para 100 litros de água: ALMEIDA, S. R. Doenças do cafeeiro. In: RENA,
sulfato de cobre penta hidratado ......................................................... 500 g A.B.; MALAVOLTA, E.; ROCHA, M.; YAMADA,
sulfato de zinco .................................................................................... 300 g T. (Ed.). Cultura do cafeeiro: fatores que afetam
a produtividade. Piracicaba: POTAFOS, 1986.
sulfato de magnésio ............................................................................. 400 g
p.391-399.
ácido bórico ......................................................................................... 100 g
BETTIOL, W.; TRATCH, R.; GALVÃO, J. A. H.
óxido de cálcio ou hidróxido de cálcio .................................................... 350-550 g
Controle de doenças de plantas com bio-
pH ......................................................................................................... 6,0-6,5 fertilizantes. Jaguariúna: EMBRAPA-CNPMA,
Obs.: a quantidade de óxido de cálcio ou hidróxido varia com a qualidade do produto. 1998. 22p. (EMBRAPA-CNPMA. Circular
Técnica, 2).
Os sais devem ser dissolvidos separadamente do óxido de cálcio, numa caixa de
amianto e, logo após, vertidos sobre o óxido de cálcio. CARVALHO, V. L. de; CHALFOUN, S. M.;
Hoje, a calda viçosa está sendo preparada e distribuída por empresas que comercializam SALGADO, M.; SALGADO, B. G.; XAVIER,
os sais em mistura, com textura bastante fina, com quase 100% de solubilidade. E. P. Comportamento de doenças do cafeeiro
em sistema de plantio adensado. Fitopatologia
Produtos à base de cobre Brasileira, Brasília, v.24, p.272-273, ago. 1999.
Para a utilização dos produtos à base de cobre (óxido cuproso, sulfato tribásico de Suplemento. Resumos do XXXII Congresso
cobre e hidróxido de cobre), a entidade certificadora deve ser consultada previamente. Brasileiro de Fitopatologia.
É permitido o uso de 8 kg de cobre por hectare/ano até 31/12/2005 e, a partir de 01/01/2006,
_______; SOUZA, S. M. C. de; CARVALHO, V.
o limite máximo será de 6 kg de cobre por hectare/ano4.
D. de; CASTRO, H. A. de. Efeito dos níveis de
Nota: as indicações de defensivos contidas neste artigo não esgotam ou excluem outros produtos e carga pendente e estágio de desenvolvimento dos
marcas, nem significam a preferência destes por parte dos autores deste trabalho ou da EPAMIG. frutos sobre a evolução e intensidade de ataque de
Hemeleia vastatrix Berk & Br., agente da ferrugem
do cafeeiro. Ciência e Prática, Lavras, v.17,
CONSIDERAÇÕES FINAIS
n.4, p.351-356, out./dez. 1993.
Vários métodos atuais de controle de doenças, de manejo do solo e de cultivo,
praticados pela cafeicultura convencional ou racional, citados como as melhores práticas CHAVES, J. C. D.; SARRUGE, J. R. Alterações
de manejo, podem ser aplicados na cafeicultura orgânica. No entanto, muitos dos métodos nas concentrações de macronutrientes nos frutos
de cultivo que estão sendo recomendados e utilizados pelos produtores que usam o e folhas do cafeeiro durante um ciclo produtivo.
sistema de cultivo orgânico, necessitam de pesquisa e estudos para a quantificação e Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília,
validação científica que expliquem e comprovem a eficácia desses métodos. v.19, n.4, p.427-432, abr. 1984.
De maneira geral, a ocorrência e os prejuízos que as doenças podem causar, dependem ECHANDI, E. La quema de los cofetos causada
dos fatores que atuam sobre o sistema cafeeiro-patógeno-ambiente. Esses fatores, de por Phoma costarricensis n. sp. Revista de Bio-
alguma forma, podem ser manejados, com o objetivo de diminuir o potencial de inóculo, logia Tropical, San José, Costa Rica, v.5, n.1,
interferir no desenvolvimento e na etapa reprodutiva do patógeno e/ou aumentar a p.81-102, 1957.
resistência dos cafeeiros.
Entre as muitas práticas culturais usadas que podem atuar no sistema, reduzindo ou FERNANDEZ-BORRERO, O. Muerte descen-
mesmo evitando os danos causados pelas doenças, citam-se: escolha adequada; posição dente de los brotes del cofeto causado por especies
e fertilidade das áreas de plantio; realização de bom preparo do terreno antes do plantio; de Phama y Colletotrichum. Cenicafé, Caldas,
nutrição adequada dos cafeeiros; espaçamento adequado; uso de desbrotas e podas Colombia, v.12, n.3, p.127-140, jul./sep. 1961.
periódicas; uso de cultivares adaptadas às diferentes regiões de cultivo, resistentes ou
_______; MESTRE, A. M.; LOPEZ-DUQUE, S.
tolerantes às doenças; uso de quebra-ventos etc. Além das práticas culturais, alguns
Efecto de la fertilización en la incidência de la
produtos como caldas e cúpricos, quando necessários, podem ser usados, desde que
mancha de hierro (Cercospora coffeicola) en
permitidos pela empresa certificadora.
frutos de café. Cenicafé, Caldas, Colombia, v.17,
É, portanto, necessário e urgente o desenvolvimento de tecnologias próprias e a
n.1, p.516, 1966.
divulgação de novos conhecimentos, para que se possam auferir melhores retornos no
sistema orgânico de produção de café. FIGUEIRA, A. R.; REIS, P. R.; CARVALHO,

4
Informação obtida através do engenheiro agrônomo Sérgio Pedini, professor da Escola Superior de Agricultura e Ciências de Machado
(ESACMA) e Secretário Executivo da Associação de Cafeicultura Orgânica do Brasil (ACOB) – Machado em 2002.

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114 Café Orgânico

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Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.101-114, jan./abr. 2002


Café Orgânico 115

Manejo de Resumo - A decisão de como manejar a área entre as linhas de plantio (entreli-
nhas ou ruas) de cafezais orgânicos deve ser tomada em função das características
da propriedade (tipo de solo, topografia etc.), da necessidade de incrementar a

entrelinhas adubação nitrogenada, das condições socioeconômicas do cafeicultor e da relação


custo/benefício. Uma alternativa simples e barata é a manutenção das plantas
espontâneas nas entrelinhas, roçando-as periodicamente para minimizar a com-

em cafezais petição com o cafeeiro. Com isso, além de manter o solo protegido, têm-se, após a
decomposição da biomassa, acréscimos de material orgânico ao solo. Um dos
desafios da agricultura orgânica é o fornecimento de nitrogênio às culturas, uma

orgânicos vez que nem sempre é possível fazê-lo apenas com a aplicação de esterco de
animais. O plantio de adubos verdes, principalmente leguminosas, nas entrelinhas
de cafezais orgânicos, é uma boa alternativa para o fornecimento de N para o ca-
feeiro. Em pequenas propriedades rurais, é hábito comum o plantio de culturas
anuais nas entrelinhas do cafezal. Socialmente, o cultivo intercalar é uma prática de
Izabel Cristina dos Santos1
elevada expressão, pois, além de geradora de alimentos ou renda adicional, contribui
Paulo César de Lima2
para fixar o trabalhador rural no campo; ambientalmente, é uma prática importante
Elifas Nunes de Alcântara3
para a quebra do quadro do monocultivo, aumentando a diversidade de espécies
Robert Nunes Mattos4
cultivadas na propriedade rural. Porém, a escolha e o manejo da cultura intercalar,
Aurélio Vaz de Melo5
seja ela um adubo verde, seja ela uma cultura anual, devem ser criteriosos para que
o desenvolvimento e a produção do cafeeiro não sejam prejudicados.

Palavras-chave: Agricultura orgânica; Cafeicultura orgânica, Culturas intercalares;


Manejo orgânico; Espaçamento.

1
Enga Agra, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTZM, Caixa Postal 216, CEP 36750-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: icsantos@ufv.br
2
Engo Agro, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTZM, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: plima@ufv.br
3
Engo Agro, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: epamig@ufla.br
4
Engo Agro, Bolsista DTI CNPq/ EPAMIG-CTZM, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: rnmattos@bol.com.br
5
Graduando em Agronomia, Bolsista CNPq/ EPAMIG-CTZM, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico:
vazdemelo@bol.com.br

Informe Agropecuário, Belo


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Horizonte,v.23, n.214/215,p.115-126,
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INTRODUÇÃO das como indicadores, de tal forma que os declivosas é a erosão hídrica, responsável
efeitos degradantes possam ser remedia- pela perda de material do solo, incluindo
Um dos aspectos mais discutidos sobre
dos, através de práticas reparadoras dessa nutrientes e matéria orgânica, com conse-
o manejo do cafezal em sistema conven-
degradação (KENNEDY; PAPENDICK, 1995). qüentes prejuízos à nutrição das plantas e
cional de produção é a competição entre
Atualmente, muitos cientistas acreditam armazenamento de água pelo solo. Baruqui
as plantas espontâneas e os cafeeiros pelos
que a melhoria da qualidade do solo é a pri- e Fernandes (1985) afirmam que as terras
fatores do ambiente, principalmente água
meira linha de ação para conter a poluição completamente cobertas estão em condi-
e nutrientes, que podem provocar perdas
do ar e da água (KENNEDY; PAPENDICK, ções ideais para resistir à erosão e absorver
significativas na produção, o que leva os
1995). De fato, o solo não é só um substra- as águas das chuvas, pois além de elimi-
cafeicultores a considerar essas plantas
to para o cultivo de plantas, mas é como nar o impacto das gotas sobre o solo, a
como daninhas. A manutenção das entre-
uma entidade viva que abriga milhares de cobertura vegetal diminui a velocidade da
linhas, totalmente livres de plantas de co-
habitats de uma miríade de seres diversos, água que escorre. Quanto maior a área co-
bertura, para evitar a concorrência com o
como minhocas, besouros, formigas, ne- berta, menores serão as perdas de solo e
cafeeiro, tem causado o desgaste do solo
matóides etc., e microrganismos que parti- água.
pela erosão, que também promove quedas
cipam da ciclagem de nutrientes e promo- A cobertura do solo proporcionada pe-
significativas de produtividade, não sendo
vem a formação e a manutenção da macro e las culturas é muito variável, levando a per-
esse um sistema considerado sustentável.
microporosidade do solo e de sua estrutu- das de solo e água proporcionais à área
Os herbicidas são proibidos para a cafei-
ra, responsáveis pela aeração, drenagem e exposta. Bertoni e Lombardi Neto (1990)
cultura em sistema orgânico de produção.
armazenamento de água. estimaram que o Brasil perde anualmente
Nesses sistemas, as entrelinhas do cafezal
A degradação do solo quase sempre 500 milhões de toneladas de terra por ero-
devem ser manejadas, visando à diminuição
resulta de manejo inadequado e constitui são. Esses mesmos autores, estudando o
da concorrência com o cafeeiro, à proteção
grande ameaça para a sustentabilidade e qua- efeito do tipo de uso do solo sobre as per-
do solo e, se possível, à produção de massa
lidade do meio (LAL, 1989, 1993, REICOSKY das por erosão, verificaram que, sob mata,
verde para incremento da matéria orgânica
et al., 1995), diminuindo o potencial pro- pastagem, cafezal e algodoal, as perdas de
do solo, assuntos que serão abordados
dutivo das áreas agricultáveis e a qualidade solo foram de 0,004; 0,4; 0,9 e 26,6 t.ha-1 e
neste artigo.
dos alimentos. as perdas de água foram de 0,7; 0,7; 1,1 e
Dentre os produtores que já optaram
Os componentes físicos e químicos do 7,2% da chuva, respectivamente (médias
pela cafeicultura orgânica, alguns o fizeram
solo são altamente dependentes do com- ponderadas para três tipos de solo do esta-
por acreditar que seja um sistema de pro-
ponente biológico, que está estritamente do de São Paulo). À primeira vista, parece
dução ecologicamente sustentável, eco-
ligado ao teor de matéria orgânica, que, por que as perdas de solo e água no cafezal fo-
nomicamente viável e socialmente justo;
sua vez, depende do manejo da cobertura ram pequenas, comparadas àquelas ocor-
outros acreditando na tendência mundial
vegetal. Correlações altamente significa- ridas em áreas cultivadas com algodão.
de aumento do consumo desses produtos.
tivas e diretamente proporcionais, entre o Mas para fazer esse tipo de comparação,
Todos eles devem ter em mente que, em
teor de matéria orgânica e diversas caracte- faz-se necessária uma análise criteriosa da
sistemas orgânicos, há um rompimento com
rísticas químicas e físicas do solo, demons- declividade das áreas estudadas, da área
o aspecto de monocultivo e que é necessá-
traram que a matéria orgânica foi fundamen- exposta no cafezal e no algodoal e da inten-
rio manejar e conservar o solo, a água e
talmente o maior agente de promoção da sidade das chuvas.
a biodiversidade. O cafeeiro deve crescer e
melhoria das condições de um Latossolo Castro (1987) cita três fatores básicos
desenvolver-se associado a outras espé-
Roxo sob cafeeiros, em São Sebastião do na determinação da taxa de erosão: chuva,
cies vegetais, aos animais, aos microrga-
Paraíso, MG (ALCÂNTARA, 1997). solo e topografia do terreno. A intensidade,
nismos do solo e ao homem.
Acredita-se que a base para a susten- a duração e a freqüência da chuva determi-
tabilidade da agricultura esteja no manejo nam o impacto da gota sobre o solo e o vo-
QUALIDADE E
adequado da cobertura vegetal, de tal forma lume e a velocidade da enxurrada. A textura,
MANEJO DO SOLO
que o teor de matéria orgânica do solo se- a estrutura, a permeabilidade, o teor de
A qualidade do solo tem sido avaliada ja conservado e, se possível, melhorado. matéria orgânica do solo, bem como suas
pela quantidade e qualidade de espécies Deve-se, portanto, procurar o equilíbrio características químicas e biológicas influ-
de plantas e animais encontradas em deter- entre dois objetivos: conservar o solo e enciam na erodibilidade, que é o grau de
minada área. Um conceito emergente de obter retorno econômico. facilidade com que um solo é erodido. A
qualidade do solo integra medidas descri- topografia da área, representada pela decli-
tivas e analíticas de componentes físicos, COBERTURA E vidade, pelo comprimento de rampa e pela
químicos e biológicos. Pequenas diferen- CONSERVAÇÃO DO SOLO forma da encosta, exerce grande influência
ças nesses componentes podem significar Uma das causas da diminuição da pro- na velocidade alcançada pela enxurrada e,
sinais precoces de degradação, e ser utiliza- dutividade em cafezais instalados em áreas portanto, na sua capacidade de arrastar

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.115-126, jan./abr. 2002


Café Orgânico 117

material sólido. A erosão hídrica é, conse- das entrelinhas não forem conveniente- d) reciclagem de nutrientes e manuten-
qüentemente, tanto maior quanto maior for mente manejados, o solo ficará totalmen- ção da matéria orgânica.
a intensidade da chuva e a declividade do te exposto aos efeitos diretos do sol e da
O manejo das plantas espontâneas é,
terreno e quanto menor for a permeabili- chuva (Fig. 1).
portanto, uma alternativa muito atrativa em
dade, a capacidade de armazenamento de Em cafezais em produção, o período
termos de prevenção da erosão e de econo-
água e a cobertura do solo. Apesar de cada de maior competição entre o cafeeiro e as
mia de mão-de-obra em cafezal sob cultivo
classe de solo, em função dos critérios que plantas espontâneas estende-se de outu-
orgânico, além de ser ecologicamente cor-
a definem, apresentar comportamento bro a abril, o qual coincide com o período
reta.
diferenciado quanto à suscetibilidade à de frutificação do cafeeiro e com a estação,
Diversas práticas de manejo do solo em
erosão (SOUZA; BAHIA, 1998), é certo chuvosa (GARCIA BLANCO et al., 1979,
culturas perenes permitem controlar as
que, quanto maior a declividade e menor a MATIELLO, 1997, OLIVEIRA et al., 1979,
plantas espontâneas e manter o solo co-
cobertura do solo, mais se deve preocupar 1985).
berto, contribuindo para melhorar suas
com a prevenção da erosão. O controle das plantas espontâneas
características físicas, químicas e físico-
Em termos de revolvimento do solo, as representa de 15% a 20% dos gastos
químicas (BARUQUI; FERNANDES, 1985,
culturas perenes são menos agressivas que para custeio anual da lavoura cafeeira
MESQUITA et al., 1992, VASCONCELLOS;
as anuais, já que o solo só é preparado por (MATIELLO, 1991). Além disso, a concor-
PACHECO, 1987). A roçada periódica das
ocasião do plantio das mudas. No entanto, rência das plantas espontâneas com o
plantas espontâneas a uma pequena altu-
se durante o crescimento dessas mudas as cafezal formado poderia levar a perdas da
ra do solo, deixando intacto seu sistema
plantas espontâneas forem sistematica- ordem de 55,9% a 77,2% da produção po-
radicular e pequena porção da parte aérea,
mente eliminadas, o solo ficará totalmente tencial (GARCIA BLANCO et al., 1982).
garante um mínimo de proteção ao solo e
desprotegido. Dependendo do espaça- Porém, se convenientemente manejadas, as
diminui a competição (Fig. 2). O uso de uma
mento adotado, mesmo com as plantas plantas espontâneas podem trazer os se-
cultura intercalar quebra o quadro de
adultas, boa parte do solo poderá continuar guintes benefícios:
monocultivo e pode auxiliar no controle de
exposta à ação do sol e da chuva.
a) proteção do solo contra o impacto pragas, doenças e plantas espontâneas. Se
direto das gotas de chuva e dimi- a cultura intercalar for um adubo verde, ele
MANEJO DAS nuição da velocidade da enxurrada; pode ser cortado periodicamente e deixado
PLANTAS ESPONTÂNEAS EM sobre a rua e sobre a linha da cultura, com
CAFEZAL ORGÂNICO b) diminuição da amplitude térmica do
o objetivo imediato de proteger o solo e, a
solo devido à proteção contra a inci-
O potencial de competição das plantas médio e a longo prazo, aumentar o teor de
dência direta dos raios solares;
espontâneas com o cafeeiro é muito grande, matéria orgânica. Quando o adubo verde é
principalmente durante a fase de implanta- c) alteração do ciclo de umedecimento uma gramínea, tem-se, após o corte, um
ção e formação da lavoura (ALCÂNTARA; e secagem; material com alta relação C:N, o que torna
CARVALHO, 2001). Algumas dessas plan-
tas, como Tagetes minuta (rabo-de-rojão),
Bidens pilosa (picão-preto) e Amaranthus
retroflexus (caruru), têm a capacidade de
absorver quatro a cinco vezes mais água e
nutrientes que o cafeeiro (GARCIA BLANCO
et al., 1982). Por ocasião do plantio, as co-
vas ou sulcos recebem grandes quantida-
des de adubos, o que favorece não só as
mudas de café, mas também as plantas
espontâneas, estabelecendo-se uma forte
Foto: Izabel Cristina dos Santos

competição por nutrientes. Com o início do


período seco, ocorre também a competi-
ção por água e se as plantas espontâneas
não forem controladas a tempo poderão
ficar maiores que as mudas, abafando-as,
impedindo a incidência de luz e, em casos
mais severos, competindo até por CO2 Figura 1 - Cafezal orgânico com 78 dias de condução
(SANTOS et al., 2000). Porém, se na fase NOTA: Danos causados pela chuva em parcela mantida livre de plantas espontâneas,
de formação do cafezal os espaços vazios EPAMIG - Fazenda Experimental Vale do Piranga, Oratórios, MG - fevereiro de 2002.

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23,n.214/215, p.115-126, jan./abr. 2002


118 Café Orgânico

sua decomposição mais lenta e, conseqüen- sição mais rápida e sua permanência sobre com o passar do tempo, uma camada de
temente, sua permanência sobre o solo o solo menor, com possibilidade de incre- cobertura morta que protege o solo e impe-
maior (Fig.3). Quando a planta escolhida é mento do teor de N do solo (Fig. 4 e 5). de ou dificulta a germinação das sementes
uma leguminosa, tem-se um material com Tanto a roçada das plantas espontâneas de plantas espontâneas. Se essa camada
baixa relação C:N, o que torna sua decompo- quanto o corte dos adubos verdes formam, de material vegetal (mulch) for colocada
periodicamente na lavoura (Fig. 6), mais
duradouros serão seus efeitos benéficos
para o solo.
Dechen e Lombardi Neto (1981), estu-
dando práticas de manejo da cobertura do
solo em cafezal implantado em Latossolo
Roxo, verificaram que o cultivo por seis anos
consecutivos de gramíneas foi mais eficien-
te que o cultivo de leguminosas no contro-
le da erosão. Efetiva redução da erosão,
Foto: Izabel Cristina dos Santos

aumento nos teores de matéria orgânica,


alteração do regime de água e temperatura
do solo e melhoria da atividade biológica,
com a proteção da superfície do solo com
uma camada de vegetal morto (mulch) em
toda a área das entrelinhas de plantio de
café, foi o resultado verificado por Medcalf
Figura 2 - Cafezal orgânico com 132 dias de condução (1956). Também para Miyasaka et al. (1966),
NOTA: Uso de roçadeira costal motorizada para manejo das plantas espontâneas, EPAMIG - o mulch mostrou ser excelente modera-
Fazenda Experimental Vale do Piranga, Oratórios, MG - abril de 2002. dor da variação térmica do solo, além de
Foto: Izabel Cristina dos Santos

Figura 3 - Cafezal orgânico com 132 dias de condução


NOTA: Cobertura morta e rebrota de setária (Setaria sphacelata), EPAMIG - Fazenda Experimental Vale do Piranga, Oratórios, MG -
abril de 2002.

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.115-126, jan./abr. 2002


Café Orgânico 119

proporcionar a maior produção de feijão. teores de carbono orgânico e o pH, e di- químicas e biológicas para a absorção de
Pavan et al. (1986) concluíram que a cober- minuindo a concentração de Al trocável. ions pelas raízes.
tura com resíduos vegetais foi o tratamen- Além disso, proporcionou maior absorção Marum et al. (1986) avaliaram o efeito
to mais efetivo na proteção e na recupera- de nutrientes pelo cafeeiro, provavelmente de práticas de condução da lavoura e de
ção da fertilidade do solo, aumentando os devido à melhoria nas condições físicas, manejo do solo sobre a recuperação de
um cafezal com seis anos, depauperado e
improdutivo, variedade Mundo Novo,
instalado em Latossolo Vermelho-Escuro
franco arenoso. Condução normal, recepa
alta ou condução normal + plantio dobra-
do não tiveram efeito sobre a produção até
três safras após aplicação dos tratamentos.
No entanto, a utilização de adubação verde
(AV) e composto orgânico (CO) aumentou
a produção em 22% em relação à adubação
Foto: Izabel Cristina dos Santos

mineral isolada; a utilização de AV + CO +


cobertura morta aumentou a produção em
87%. Estes autores concluíram que a cober-
tura morta foi a prática que mais influenciou
a produção de café. O uso de AV e cobertura
morta diminuiu significativamente o tempo
Figura 4 - Cafezal orgânico com 152 dias de condução necessário para a execução de capinas na
NOTA: Cobertura viva com estilosantes (Stylosanthes capitata) e resíduos da primeira
lavoura.
roçada da parte aérea, EPAMIG - Fazenda Experimental Vale do Piranga, Oratórios, Após chuvas de 70,8 e 49,6 mm, com
MG - abril de 2002. duração de uma hora e meia a duas horas,
Foto: Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata

Figura 5 - Cafezal agroecológico com 7 anos de condução, em fase de certificação para orgânico
NOTA: Manejo de lablabe (Dolichos lablab) na entrelinha, Araponga, MG - abril de 2002.

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120 Café Orgânico
Foto: Izabel Cristina dos Santos

Figura 6 - Cafezal orgânico com 132 dias de condução


NOTA: Cobertura morta feita com capim colonião (Panicum maximum), EPAMIG - Fazenda Experimental Vale do Piranga, Oratórios,
MG - abril de 2002.

em área com 18% de declividade média, ção de 2,5 sacas benefi-


Lani et al. (1996) verificaram que foram ciadas por hectare em re-
perdidas 9 t.ha-1 de solo e 8.444 L.ha-1 de lação à capina manual,
água, quando o cafezal foi mantido todo mas representou uma
capinado; houve redução de cerca de 77% economia de 46% no cus-
na perda de solo e de 55% na perda de to operacional. Além dis-
água, quando foram deixadas todas as ruas so, nesse tratamento, hou-
com vegetação natural. Lani et al. (1996) ve melhoria geral das ca-
analisaram quimicamente os sedimentos racterísticas químicas,
coletados em caixas e concluíram que a físicas e físico-químicas

Foto: Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata


perda de solo provocou perda de P, K, Ca, do solo. Uma alternativa
Mg e matéria orgânica. A permanência de para sistemas orgânicos
uma rua com vegetação natural, a cada duas seria a roçada do mato
ruas capinadas, não diminuiu significati- nas ruas e a capina na
vamente a produção em relação ao cafezal linha, onde o material
todo capinado, além de fornecer uma faixa roçado seria depositado
de retenção e diminuir o tempo gasto na como cobertura morta
capina. (Fig. 7), proporcionan-
Analisando os resultados obtidos por do ganhos em termos de
Alcântara (1997), após utilização de dife- proteção e conservação
rentes métodos de controle de plantas do solo e melhoria de
espontâneas em cafezal por dezoito anos, suas características quí-
percebe-se que a manutenção das linhas micas, físicas e bioló- Figura 7 - Cafezal orgânico com 1 ano de condução
NOTA: As plantas espontâneas foram roçadas e a massa obti-
capinadas e das plantas espontâneas ro- gicas a médio e a longo
da, colocada na linha de cafeeiros, Araponga, MG -
çadas nas ruas do cafezal, levou à diminui- prazo. março de 2002.

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.115-126, jan./abr. 2002


Café Orgânico 121

CULTURAS INTERCALARES relação à testemunha. O plantio de cinco linha de soja e a linha do café. As varie-
linhas de feijão não alterou e o de sete li- dades de soja Doko e IAC-8 apresentaram,
A utilização da área livre entre as linhas
nhas diminuiu a primeira produção. Soja em média, maiores rendimentos de grãos, e
de plantio de café, para cultivo de plantas
anuais, é prática antiga e discutível. Se por (duas a seis linhas), feijão-de-porco (duas Doko apresentou a maior massa total. Em
um lado a competição entre cafeeiros e cul- a seis linhas), milho de porte normal (uma a geral, verificou-se interação competitiva
turas intercalares (CI) diminui a produ- três linhas) e milho de porte baixo (duas a sobre a emissão de ramos plagiotrópicos
tividade do cafezal em muitas situações, três linhas) interferiram competitivamente no cafeeiro, quando foram plantadas mais
por outro, a redução de mão-de-obra para com o cafeeiro, diminuindo a primeira pro- de duas linhas de soja. As cultivares de
as capinas das entrelinhas diminui custos dução. Dando continuidade ao trabalho, soja não interferiram no crescimento de
e propicia benefício adicional com o con- durante sete anos, Melles et al. (1985b) uti- ramos plagiotrópicos, na altura do cafeeiro,
sumo ou venda da produção das culturas lizaram as mesmas culturas intercalares no nem no teor foliar dos nutrientes N, P, K,
anuais, prática comum entre os agriculto- cafezal. A produção média do período mos- Ca, Mg, S, B, Cu, Fe, Mn e Zn em nenhuma
res familiares. Além disso, os prejuízos em trou que somente o feijão (três linhas) e o das densidades avaliadas.
épocas de baixo preço do café seriam me- arroz (uma linha) tiveram interferência com- Santinato et al. (1975a) avaliaram o uso
nores. plementar, aumentando a produção em re- do feijão das águas (FA) e do feijão da seca
Outra vantagem das CIs é a formação lação à testemunha. Milho, soja e feijão- (FS) como CI em cafezal, com espaçamento
de microclima que muitas vezes pode ser de-porco causaram as maiores reduções na de 4 x 2 m, aos 19 meses de idade, em Latos-
benéfico ao desenvolvimento do cafeeiro, produção média do período em relação à solo Vermelho-Amarelo (LVA) húmico, do
principalmente nos primeiros anos após a testemunha. município de Caratinga (MG), através dos
implantação da lavoura. Por isso, a escolha Em estudo de CI em cafezais recepados seguintes tratamentos:
da CI a ser utilizada deve-se basear no inte- a 20 cm de altura, no Paraná, Chaves (1977b) a) testemunha;
resse do agricultor (consumo ou comér- concluiu que não houve competição por
nutrientes entre os cafeeiros e as culturas b) sete fileiras de FA e sete fileiras de
cio), na aptidão de clima e solo da área e na
de feijão, arroz, milho ou soja, e, em todas as FS a 0,5 m da linha de café;
interferência da CI para o desenvolvimento
e/ou produção do cafeeiro. parcelas, o teor de N nas folhas dos cafeeiros c) cinco fileiras de FA e cinco de FS a
A interferência causada pela CI na cultu- que conviveram com as CIs foi maior que 1,0 m da linha de café;
ra principal (CP) foi classificada por Sanchez nos cafeeiros testemunhas. Também não d) três fileiras de FA e três de FS a 1,5 m
(1981) em três categorias: houve interferência das CIs sobre o cresci- da linha de café.
a) interferência não-competitiva: a pro- mento e desenvolvimento do caule dos ca-
Resultados da análise de amostras de
dução da CP não é alterada pela CI; feeiros (dados do 2o ano após recepa).
Com o objetivo de determinar os perío- folhas de café, coletadas após a granação
b) interferência competitiva: a produção do feijão, mostraram que o FA e o FS, adu-
dos críticos de competição entre o cafeeiro
da CP é diminuída na presença da bados e no espaçamento a partir de 0,5 m
e arroz, milho, feijão ou soja, e verificar qual
CI; das linhas de café, não concorreram em N,
dessas culturas é menos limitante para o
c) interferência complementar: a pro- desenvolvimento do cafeeiro, Chebabi (1984) P, K, Ca, Mg, Zn, B e Cu, nem prejudicaram
dução da CP é aumentada na pre- conduziu um experimento em casa de ve- a produção do café no segundo ano após
sença da CI. getação, em vasos, para forçar a competi- plantio da lavoura. Além disso, proporcio-
Em cafezais em formação, é comum ção entre as plantas. Concluiu-se que as naram renda líquida adicional e redução de
ocorrer interferência complementar, prova- culturas que menos concorreram com o 75,5% nos tratos culturais do cafezal. So-
velmente devido à proteção que a CI oferece cafeeiro foram, pela ordem, feijão, arroz, soja mente o tratamento 2 provocou acréscimo
contra ventos (MELLES et al., 1985b). Além e milho e que a competição é mínima até a da operação de adubação do cafeeiro, da
disso, a CI protege o solo contra a ação di- fase de floração das culturas anuais, a partir ordem de 8,3%.
reta do sol e da chuva, diminuindo a perda da qual o desenvolvimento normal do O efeito acumulativo do cultivo inter-
excessiva de água por evaporação, a ampli- cafeeiro pode ser limitado. calado do FA e do FS com o café, nos três
tude térmica e as perdas de solo e nutrientes A possibilidade de consorciação do ca- primeiros anos de formação, foi analisado
por erosão hídrica. feeiro com a soja (cultivares Doko, IAC-8 e em cafeeiros plantados no espaçamento 4
Em cafezal espaçado de 4 x 1m, sub- Paranaíba) foi estudada por Barros et al. x 1,5 m, em LVA, em Miraí (MG). Santinato
metido a dois anos de cultivos intercalares, (1990), em cafezal de três anos, com espaça- et al. (1977b) concluíram que o cultivo de
Melles e Silva (1978) verificaram que arroz mento de 3,5 x 0,8 m e 1 planta/cova. Foram FA e FS, a partir de 0,5m da linha de café,
(uma a cinco linhas), feijão (três linhas) ou plantadas duas, três, quatro ou cinco linhas não concorreu em N, P, K, Ca e Mg no 1o,
milho de porte baixo (uma linha), promo- de soja nas distâncias de 1,50; 1,25; 1,0 ou 2o e 3o ano de formação, nem prejudicou a
veram aumento na primeira produção em 0,75m, respectivamente, entre a primeira produção no 2o e 3o ano.
Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23,n.214/215, p.115-126, jan./abr. 2002
122 Café Orgânico

Outros estudos, que mostram a viabi- em nutrientes no 1o, 2o e 3o ano, nem alte- b) o feijão é a cultura mais indicada e
lidade de uso do feijão como CI em cafezais, rou significativamente a produção dos ca- também a mais utilizada pelos cafei-
foram apresentados por Santinato et al. feeiros no 2o e 3o ano. Somente a partir do cultores (Fig. 8);
(1976b), Chaves (1977a), Melles et al. (1979, 3o ano, a batata começou a dificultar os tra- c) o algodão e o milho devem ser evita-
1985a), Martins et al. (1980), Chebabi (1984). tos culturais do café. dos como CI;
Chaves et al. (1996) sugerem a utilização A utilização do fumo (Nicotina tabacum)
d) o número de linhas da CI depende
do amendoim-cavalo (Arachis hipogaea) como CI foi estudada por Santinato et al.
basicamente do tipo de cultura a ser
como alternativa para o cultivo intercalar (1975b, 1976a), em cafezal espaçado de 4 x
feita e do espaçamento utilizado no
em cafezais, com base na ótima capacidade 2 m (2 plantas/cova), LVA, em Astolfo Dutra
cafezal, devendo ficar uma faixa livre
de crescimento e cobertura do solo por esta (MG). Estes autores concluíram que, se adu-
de plantio de cada lado das linhas
espécie, o que dificulta a germinação de bado e plantado a partir de 1m de distância
de cafeeiros, com largura de meio
sementes de plantas espontâneas, refle- da linha de café, o fumo não concorre em
metro a partir da projeção da copa.
tindo na diminuição das capinas. Além nutrientes com o cafeeiro no 1o e 2o ano de
disso, o amendoim-cavalo produz razoável formação, nem interfere na produção no De modo geral, as CI, segundo Melles
quantidade de massa verde e de grãos, cuja 2o ano, além de proporcionar renda adicio- e Silva (1978), apresentam como aspectos
demanda tem aumentado, principalmen- nal e reduzir os serviços de capina do ca- positivos:
te no Paraná, devido ao seu uso freqüente fezal. a) redução dos custos de formação da
como adubo verde. Diante disso, verifica-se que: lavoura;
De acordo com resultados obtidos por a) é possível utilizar CI em cafezais em b) maior atrativo para a fixação do ho-
Santinato et al. (1976c, 1977a), Lima et al. formação, recepados ou em recupe- mem no campo;
(1977), a batata (Solanum tuberosum L.), ração, desde que seja feita a correta
adubada e conduzida a partir de 0,8m de adubação da cultura intercalar, para c) diversificação de culturas;
distância das linhas de café, não concorreu evitar a concorrência com o cafeeiro; d) proteção/conservação do solo;

Foto: Paulo César de Lima

Figura 8 - Cafezal orgânico com 26 meses de condução


NOTA: Feijão-preto como cultura intercalar, Unidade Experimental EPAMIG na Fazenda Serra das Águas, município de Heliodora,
MG - abril de 2002.

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.115-126, jan./abr. 2002


Café Orgânico 123

e) proteção do cafeeiro contra ventos Espécies com maior capacidade de enraiza- seguido do feijão-bravo-do-Ceará (1,59 m),
em lavouras mais expostas; mento profundo, além de contribuir para a feijão-de-porco e lablabe (0,9 m), crota-
f) uso racional do solo; reciclagem de nutrientes, promovem, du- lárias e mucuna preta (0,21 a 0,49 m)
rante o crescimento, morte e decomposição (ALVARENGA,1993).
g) diversificação econômica da empre-
de raízes, a liberação de materiais orgânicos Considerando apenas as características
sa agrícola.
que atuam na estruturação do solo, sendo físicas do solo, o plantio de leguminosas
ainda os canais deixados após a decompo- nas ruas do cafezal e o seu manejo através
ADUBAÇÃO VERDE sição das raízes, essenciais para a infiltra- de roçadas periódicas, é uma alternativa
A adubação verde deve receber aten- ção de água. promissora com relação ao aumento da
ção especial quando se trata de agricultura A capacidade de penetração das raízes aeração, aumento da capacidade de dre-
orgânica. Essa prática consiste na utiliza- de leguminosas no solo, em profundidades nagem, redução do escoamento superficial,
ção de plantas em rotação ou em consórcio não atingidas pelas culturas em geral, tem redução de superfícies de encrostamento
com culturas de interesse econômico. Tais sido verificada. De acordo com dados de re- e, conseqüentemente, redução na erosão.
plantas podem ser incorporadas ao solo visão realizada por Alvarenga (1993), raízes Entretanto, são necessárias pesquisas para
ou roçadas e mantidas na superfície, pro- de estilosantes foram encontradas a 1,5 m indicar as espécies, a população e o manejo
porcionando, em geral, melhoria das carac- de profundidade; de guandu a 2,95 m e de que seriam mais adequados à consorciação
terísticas químicas, físicas e biológicas do lablabe a 3,4 m. Entretanto, a maior parte com o cafeeiro, de modo que a produti-
solo (ESPÍNDOLA et al., 1997). dos sistemas radiculares concentrava-se vidade não seja seriamente afetada.
Além de promover a manutenção da nas camadas superiores da terra (20-30 cm). Espécies com elevada capacidade de
matéria orgânica no solo, segundo Ribeiro Embora existam relatos de que raízes enraizamento lateral, como o guandu por
et al. (1999), a adubação verde contribui de leguminosas são capazes de romper exemplo, não deveriam ser plantadas nas
para: camadas compactadas do solo, verifica-se entrelinhas, mas nos cordões de contorno,
que essa capacidade é limitada pela dimen- onde a capacidade de competir com o ca-
a) melhoria da fertilidade do solo, que
são da resistência mecânica do terreno e feeiro seria minimizada e a capacidade de
pode constituir-se na principal fon-
pela espécie de leguminosa. Em experimento infiltração de água ampliada, potencia-
te de nitrogênio para a cafeicultura
conduzido no campo por dezoito meses, lizando uma das funções dos cordões de
orgânica;
em solo podzólico, o feijão-guandu foi a contorno. Provavelmente, as espécies pe-
b) controle de pragas, doenças e plan- leguminosa com a maior capacidade de renes não trepadeiras, rasteiras ou de porte
tas espontâneas; penetração de raízes (2 m), conseguindo baixo, como amendoim-forrageiro (Fig. 9),
c) diversificação de culturas na pro- também explorar um maior volume de solo, estilosantes (Fig. 4) e outras, sejam as mais
priedade;
d) melhoria da aeração, da estabilidade
térmica e da retenção de umidade no
solo;
e) reciclagem de nutrientes com o uso
de espécies de raízes profundas.
A contribuição da adubação verde para
a melhoria da fertilidade do solo, especial-
mente com leguminosas, pode ser verifi-
cada em Lima et al. (2002) e Guimarães et al.
(2002). Aqui será dada maior ênfase à con-
tribuição da adubação verde para as pro-
priedades físicas e biológicas do solo.
Foto: Izabel Cristina dos Santos

Com relação às propriedades físicas me-


lhoradas pela adição de matéria orgânica,
De-Polli et al. (1996 apud ESPÍNDOLA et
al., 1997) destacaram a estabilidade de agre-
gados, a densidade, a porosidade, a taxa
de infiltração de água e a retenção de umi-
dade. É preciso observar, entretanto, que a Figura 9 - Cafezal orgânico com 132 dias de condução
melhoria dessas propriedades físicas é ini- NOTA: Entrelinha totalmente coberta por amendoim forrageiro (Arachis pintoi), EPAMIG -
ciada pela cobertura do solo pelas plantas. Fazenda Experimental Vale do Piranga, Oratórios, MG - abril de 2002.

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23,n.214/215, p.115-126, jan./abr. 2002


124 Café Orgânico

indicadas para ser plantadas nas entreli- Uma outra simbiose que é estimulada espontâneas, reduzindo o número de
nhas e conduzidas com roçadas periódicas, entre leguminosa e cafeeiro é a formação espécies e a matéria seca delas. Esse fato
permitindo boa cobertura do solo, fixação micorrízica, que se refere à associação entre refletiu em redução de 57% com os gastos
de N e reciclagem de nutrientes, sem neces- raízes da grande maioria das plantas su- de mão-de-obra com a capina, constituin-
sidade de replantio. periores e certas espécies de fungos. Nes- do-se importante prática para a exploração
Estudos de espaçamentos do cafezal se caso, o fungo micorrízico aumenta o econômica da cafeicultura, especialmente
também devem ser realizados. O adensa- volume de solo que é explorado e, em con- nas pequenas e médias propriedades.
mento dos cafeeiros na linha de plantio seqüência, a absorção de água e de nutrien-
contribui para o controle de erosão e reduz tes, especialmente aqueles de menor mo- CONSIDERAÇÕES FINAIS
a carga de frutos por planta que possivel- bilidade no solo, como o P, o Zn e o Cu
Como a agricultura orgânica proíbe o
mente promove maior longevidade da (LIMA, 1991). Esses nutrientes minerais
uso de herbicidas e preconiza a biodiver-
lavoura, mas o adensamento das linhas são fornecidos às raízes das plantas que,
sidade, o manejo das plantas espontâneas
inviabilizaria a adubação verde em poucos por sua vez, liberam açúcares, principal-
ou o plantio de uma cultura de interesse
anos devido ao crescimento dos cafeeiros mente a sacarose, como fonte de energia
econômico ou ecológico são alternativas
e fechamento das entrelinhas. para o fungo. Ao analisarem os efeitos do
viáveis para utilização nas entrelinhas de
A ciclagem de nutrientes no solo pode cultivo de leguminosas de verão nas entre-
cafezais sob sistema orgânico de cultivo.
ser considerada uma das atividades bio- linhas, Colozzi Filho et al. (2000) comprova-
As vantagens de plantar adubos verdes
lógicas mais importantes para a susten- ram o estímulo no crescimento da biomas-
nas entrelinhas de cafezais foram descritas
tabilidade de cafezais em sistemas orgâ- sa microbiana e das micorrizas na projeção
em várias pesquisas. Resultados de pes-
nicos e precisa ser quantificada e avaliada das copas dos cafeeiros. No solo cultivado
quisas mostram a possibilidade de uso de
para o benefício de sua exploração. Algu- com leucena, observaram maior população
culturas anuais, desde que a escolha das
mas leguminosas extraem nutrientes em de rizóbio capaz de nodular o feijoeiro.
espécies e das densidades de plantio seja
profundidades onde a cultura normalmente Outros efeitos da adubação verde so-
criteriosa, de modo que não venha a pre-
não alcança. Nessas regiões elas absorvem bre as características biológicas do solo,
judicar o desenvolvimento dos cafeeiros e
os nutrientes, inclusive os lixiviados, e os como o crescimento e a diversificação da
sua produção. Porém, a maioria dos resul-
imobilizam na sua biomassa. Posterior- população microbiana, o aumento na ativi-
tados apresentados foi obtida em cafezais
mente, com a decomposição da leguminosa dade de minhocas e o controle de nema-
estabelecidos com cultivares antigas e em
como adubo verde, os nutrientes são grada- tóides, também foram revisados e registra-
espaçamentos maiores, comuns na época
tivamente disponibilizados para as cul- dos por Espíndola et al. (1997). O aumento
de condução das pesquisas. Por isso, no-
turas. Assim, a contribuição da adubação da população microbiana deve-se, de modo
vos estudos da interferência entre CI e cafe-
verde para o fornecimento de nutrientes geral, à adição de matéria orgânica como
eiros, sob o sistema orgânico de cultivo,
depende diretamente da biomassa produ- fonte de energia e à maior estabilidade nas
devem envolver as cultivares e os espaça-
zida. Estima-se ainda que 30% a 50% do condições de umidade e temperatura do
mentos mais utilizados na cafeicultura na
total de nutrientes imobilizados pela planta solo, favorecendo a atividade biológica, o
atualidade, buscando conhecer a associa-
estejam nas raízes (ALVARENGA, 1993). crescimento da população de minhocas e a
ção ideal entre cafeeiros e outras espécies
Outro aspecto importante da ciclagem reciclagem de nutrientes. A adubação ver-
vegetais.
de nutrientes, a fixação biológica de N pode de favorece o crescimento e a atividade de
ser realizada por microrganismos de vida microganismos benéficos às plantas e
livre no solo e na água ou por microrganis- pode contribuir no controle daqueles que REFERÊNCIAS
mos associados às plantas, com destaque causam danos às culturas. Crotalárias, mu-
ALCÂNTARA, E.de N. Efeito de diferentes
para as leguminosas e mesmo para certas cunas e guandu, por exemplo, têm mos-
métodos de controle de plantas daninhas na
gramíneas, entre elas, culturas de impor- trado efeitos benéficos no controle de ne- cultura do cafeeiro (Coffea arabica L.) sobre
tância econômica nos trópicos (FRANCO; matóides (SANTOS; RUANO, 1987 apud a qualidade de um latossolo roxo distrófico.
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em suas raízes com bactérias dos gêneros para reduzir os gastos com capinas, confor-
Rhizobium e Bradyrhizobium. O N fixado me constatado por Chaves (2000) em ______; CARVALHO, G. R. de. Efeito de métodos
pelas bactérias é transferido para as raízes experimento onde o cafezal plantado com de controle de plantas daninhas no desenvolvi-
na forma de aminoácidos, enquanto que as espaçamento 4 x 2 m foi consorciado com mento e rendimento de cafeeiros em formação.
leguminosas fornecem carboidratos às uma ou duas linhas de leucena por rua de In: SIMPÓSIO DE PESQUISA DOS CAFÉS DO
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Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.115-126, jan./abr. 2002


Café Orgânico
Orgânico 127

Aspectos da colheita, Resumo - A cafeicultura convencional, nos


últimos anos desenvolveu-se, tanto do ponto
de vista científico quanto tecnológico, e veio

preparo e qualidade assegurar altas produtividades e bons lucros.


No entanto, é extremamente dependente de
altas doses de adubos de elevada solubilidade

do café orgânico e de defensivos agrícolas. A cafeicultura orgâ-


nica vem-se destacando como uma alternativa
Sílvio Júlio de Rezende Chagas1 para se produzir cafés de qualidade sem causar
Adélia Aziz Alexandre Pozza2 danos ao meio ambiente. Este tipo de café tem
Maria Juliana C.L. Guimarães3 mercado garantido na Europa, Japão e Estados
Unidos, e já é reconhecido pelos consumidores.
Os cuidados e as técnicas utilizadas para se
produzir um café de qualidade superior, des-
de as fases de pré como a de pós-colheita, são
indispensáveis ao cafeicultor, tanto no sistema
convencional, principalmente naquele em
conversão ao sistema orgânico, quanto na
produção orgânica propriamente dita.

Palavras-chave: Cafeicultura orgânica; Agri-


cultura orgânica; Subprodutos; Águas resi-
duárias; Efluentes.

1
Engo Agro, M.Sc., EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: ctsm@epamig.ufla.br
2
Enga Agra, M.Sc., Bolsista CBP&D-Café/EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: adelia@ufla.br
3
Enga Agra, Bolsista CBP&D-Café/EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-00 Lavras-MG. Correio eletrônico: paulotgg@ufla.br

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23,


Horizonte, n.214/215,
n.214/215,
p.127-135,
p.127-135,
jan./abr.
jan./abr.
2002 2002
128 Café Orgânico

INTRODUÇÃO listas como um segmento de qualidade radamente os frutos que secaram na plan-
gourmet; para outros, não pode ser asso- ta e os que caíram no chão, por estes esta-
A agricultura orgânica pode ser defini-
ciado aos cafés especiais, pois, dentro des- rem contaminados com microrganismos,
da como aquela ecologicamente viável e so-
sa categoria, encontram-se diferentes qua- evitando-se, assim, a mistura com aquele
cialmente justa e humana, sendo chamada
lidades. No mercado dos cafés especiais, café colhido no pano.
também de natural, alternativa, entre outras
afirma-se que o café orgânico tem grande O café orgânico pode ser processado
denominações. A cafeicultura convencio-
potencial econômico. Sua inclusão na cate- da mesma maneira que no sistema tradi-
nal, depois de muitos anos de rendimentos
goria não pode ser atribuída a uma melhoria cional ou convencional, ressaltando-se os
espetaculares na produção, valendo-se do
inevitável do sabor, resultante da utilização cuidados inerentes a este método de cul-
uso das adubações e de protetores quími-
de métodos de agricultura orgânica em sua tivo. O processamento pode ser:
cos, sente a necessidade de reforçar suas
produção, mas ao fato de que, sendo um a) por via úmida: o produto assim pre-
doses de fertilizantes e de defensivos, oca-
café Arábica, é possível incluí-lo em mes- parado recebe as denominações café
sionando uma degradação acelerada do
clas que podem ser vendidas como café despolpado ou café lavado, devido
ecossistema e da qualidade de vida dos
gourmet, desde que, além de ter sido cer- à grande quantidade de água utili-
seres humanos e animais. Isso tem obriga-
tificado como orgânico, satisfaça a prefe- zada na lavagem, no despolpamen-
do os produtores a pensar no desenvolvi-
rência dos consumidores por um produto to e no transporte do café. O fruto
mento de uma agricultura que minimize o
de qualidade superior (ORGANIZAÇÃO..., maduro é despolpado e degomado,
uso excessivo ou inadequado de práticas
1997). retirando-se a polpa e a mucilagem
da agricultura moderna.
Um dos pontos fundamentais, que ca- (goma). Em seguida, seca-se o grão
No Brasil, a cafeicultura orgânica já é
racterizam o café orgânico como um café que está envolto apenas pelo perga-
uma realidade. Este tipo de agricultura tem
especial, é o padrão de qualidade capaz de minho;
aumentado consideravelmente, principal-
atender às exigências dos consumidores.
mente em alguns municípios do Sul de b) por via seca: neste processo, o fruto
Uma bebida fina é de fundamental impor-
Minas, da Zona da Mata e da Região Mo- colhido é lavado e levado diretamen-
tância para que o produtor de café orgânico
giana do estado de São Paulo, com um mer- te para a secagem em terreiros ou
permaneça no mercado. Não se admite ter
cado internacional garantido para quase secadores, com todas as suas partes
todos os cuidados para se produzir um ca-
100% da produção. Conforme informações constituintes. O produto seco obti-
fé orgânico e, na comercialização, ele ser
do Jornal do Café (2000), a produção na sa- do recebe a denominação café em
classificado, por exemplo, como uma bebi-
fra 1998/1999 foi de 23 mil sacas beneficia- coco.
da rio. Assim, o conhecimento dos cuida-
das de 60kg, sendo 22.700 sacas exporta- Nos países onde o processamento é
dos e das técnicas utilizadas na produ-
das. Na safra 1999/2000, a produção foi de feito por via úmida, realiza-se a colheita a
ção de um café de melhor qualidade, desde
40 mil sacas e a exportação de 39.400 sacas. dedo, dos frutos maduros, para a operação
a fase de pré-colheita até o armazenamen-
Estavam previstas para a safra 2000/2001, de despolpamento. No Brasil, a colheita é
to, é indispensável ao produtor, tanto no
uma produção de 60 mil sacas e uma expor- feita por derriça. Neste tipo, é colhida uma
sistema convencional, quanto naquele em
tação de 58.800 sacas. mistura de frutos de diferentes graus de
conversão ou orgânico. Nesse aspecto,
O café orgânico é um nicho de mercado maturação, densidade e teores de umida-
ressalta-se a importância da preservação
atraente e o marketing atual está direcio- de, identificados pelos seguintes nomes:
do ambiente, como fator essencial neste
nado aos Estados Unidos, Europa e Japão. frutos verdes e cereja, que apresentam
sistema de produção de café.
Existe também no Brasil, um segmento nas- de 50% a 70% de umidade; frutos do tipo
cente para os produtos orgânicos ou culti- passa, com 30% a 50%; bóias, com 25% a
COLHEITA DO CAFÉ
vados de acordo com as normas da agricul- 35% e o coquinho, com menos de 25%. No
tura sustentável, que englobam os âmbitos Existem dois tipos de colheita de café cultivo orgânico, esses frutos devem ser
econômico, ecológico e socioeconômico empregados no cultivo tradicional e que separados (Fig. 1).
da produção. Dados do Banco do Brasil podem ser utilizados no cultivo orgânico. Essa mistura de diferentes tipos de
afirmam que o segmento de orgânicos já A colheita a dedo, que é uma colheita sele- frutos ocorre devido à desuniformidade de
movimenta cerca de R$ 400 milhões no tiva em que se colhem somente os frutos maturação, provocada pelas várias floradas
país. Nos EUA, de acordo com a Transfair maduros de café (cereja), é também utilizada ocorridas em diferentes épocas. O amadu-
USA, grupo que vem liderando o movimen- para a produção de sementes. Um segundo recimento ocorre entre o sexto e o nono
to naquele país, em 2005, cerca de 5% dos tipo é a colheita por derriça, em que todos mês após o florescimento, geralmente de-
US$ 18 milhões movimentados pelo café os frutos, em diferentes graus de maturação, pois dos meses de abril-maio até agosto,
deverão ser de orgânicos (JORNAL DO são derriçados em panos ou outros recipi- variável em função da cultivar, da região e
CAFÉ, 2000). entes, com a finalidade de evitar o contato de sua homogeneidade, que depende muito
O café orgânico é visto por alguns ana- com o chão. Dessa forma, colhem-se sepa- do número de floradas. Em poucos dias,
Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.127-135, jan./abr. 2002
Café Orgânico 129

A rapidez na operação de colheita é


muito importante porque a deterioração
dos frutos ocorre em função da tempe-
ratura, umidade relativa do ar e tempo de
exposição. Esta deterioração é causada por
contaminações microbiológicas na polpa e
mucilagem, que contêm alto teor de umida-
de (80-90%) e alta concentração de açúca-
res (20%), tornando-as, por isso, um exce-
lente substrato para o desenvolvimento
de fungos, que induzem a fermentações
indesejáveis, com a formação de sabores e
Foto: Sérgio Pereira

aromas desagradáveis, que irão interferir


na qualidade da bebida.

Preparo por via úmida


No preparo do café orgânico por via
Figura 1 - Café colhido no estádio ideal para a colheita
úmida, devem-se receber os cafés maduros,
semi-secos ou passas, ou secos, separá-
sua cor passa de verde para vermelha ou dos (rastelação), bem abanados (peneira- los no lavador, através do fluxo de água, e
amarela, de acordo com a cultivar. Perma- do), separados das impurezas e não mistu- procurar fazer o despolpamento a seco,
necem nesse estádio por uma semana ou rados ao café colhido no pano. É o chamado reduzindo-se desta forma o volume de
mais, dependendo das condições climáti- “café de varreção” ou “café de varrição”. águas residuárias. O transporte dos frutos
cas e, então, tornam-se gradualmente ma- O café colhido no pano também deve ser maduros ao despolpador, e da polpa até o
cios (passas) e escurecem, tornando-se pre- abanado, eliminando-se ao máximo as impu- local de descarga, deve ser feito através de
tos (coquinhos). rezas como folhas, paus, torrões etc. Todas parafuso sem fim, evitando-se o contato
Em muitas regiões, o período de colhei- estas operações devem ser feitas no mesmo com a água. A água utilizada no lavador,
ta coincide com um longo período seco, dia, sendo o café transportado, no máximo, na classificação dos frutos e no despolpa-
que provoca rápida passagem do estádio no final do dia, quando será lavado e con- mento deve ser reaproveitada, instalando-
cereja para o estádio parcialmente seco, duzido ao terreiro de alvenaria ou aos seca- se bombas para fazer a recirculação nos
tornando-se impossível colher uma grande dores. Não se deve deixar o café ensacado, equipamentos, quando então será lançada
quantidade de frutos maduros. Este pe- amontoado na lavoura, na carreta ou no nos tanques de decantação. Realizando-
ríodo seco tende a minimizar a deterioração terreiro, a fim de evitar fermentações preju- se esta operação eficientemente, consegue-
por microrganismos. Em outras regiões, em diciais à qualidade do produto final. se uma economia de até 90% da água uti-
que ocorre um período maior com umida- A colheita deve ser iniciada quando os lizada e também da água residuária, que é o
de elevada na colheita, provocando uma frutos estiverem no ponto ótimo de matu- maior problema deste processo, por causar
deterioração mais rápida, há permanência ração e antes que se inicie uma queda muito efeitos drásticos ao ambiente.
maior de frutos maduros na planta. Nesse grande dos grãos secos. O ideal seria iniciar Antes de iniciar as atividades, recomen-
caso, o processo de despolpamento seria a colheita com o menor percentual possível da-se limpar e revisar os equipamentos, a
mais indicado, podendo-se produzir o café de frutos verdes (no máximo 10%), porque fim de evitar perdas na qualidade do café.
do tipo cereja descascado ou o café obtido a presença deles gera um dos piores de- O despolpamento do café maduro deve ser
por via úmida. feitos do café, que além de depreciar a be- realizado nas primeiras quatro a cinco horas
Como no sistema convencional de cul- bida, provoca perda de peso do produto depois de colhido ou recebido. Após esse
tivo de café, antes do início da colheita, obtido. tempo, corre-se o risco de iniciar o processo
faz-se a coroação ou arruação que consiste Às vezes, é preferível ter mais frutos fermentativo dos frutos, prejudicando a
na limpeza do terreno, em volta e sob o ca- secos, mesmo os caídos, no caso de zonas qualidade.
feeiro, para proporcionar um ambiente mais de solo arenoso e clima seco, a antecipar Os equipamentos utilizados para pro-
seco e evitar que o café caído no chão se muito a colheita e ter frutos verdes em duzir o café despolpado deverão ser, den-
misture com o mato, folhas e demais impu- excesso. Em regiões muito úmidas, podem tro do possível, projetados ou modificados
rezas. Os frutos caídos no solo devem ser ocorrer fermentações prejudiciais tanto nos para funcionarem com o mínimo de água,
coletados separadamente, pois podem-se frutos que já caíram no chão, quanto na- reduzindo-se as contaminações ambientais
encontrar deteriorados, devendo ser varri- queles presos à planta. (Fig. 2). Na produção de café do tipo cereja
Informe Agropecuário, Belo Horizonte, n.214/215, p.127-135, jan./abr. 2002
130 Café Orgânico

descascado, por não existir o processo de grãos, deverá ser de forma natural. Esta presentes. Em seguida, o café é lavado com
degomagem e a conseqüente lavagem, o remoção também poderá ser feita através água corrente para tirar a mucilagem aderida
consumo de água poderá ser menor. Na de desmuciladores. Na desmucilagem, o ao pergaminho. Nesta etapa, recomenda-
produção do café do tipo cereja descas- café despolpado é colocado em caixas de se utilizar o mínimo de água, que deve ser
cado gasta-se 1 L de água para 1 L de grão, madeira ou de alvenaria, por um período de limpa e sem cloro, para evitar contamina-
devido ao reaproveitamento de água. 12 a 48 horas, dependendo da temperatura ções (Fig. 3 e 4).
A fermentação na degomagem, que tem ambiente, altura da massa de café, estádio No despolpamento, pode-se também
como objetivo remover a mucilagem dos de maturação dos frutos e microrganismos fazer uso de desmuciladores e, neste pro-
Foto: Sérgio Pereira

Foto: Sérgio Pereira


Figura 2 - Ao ser despolpado, o café é levado aos desmuciladores Figura 3 - Água de lavagem do café nos tanques de degomagem

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.127-135, jan./abr. 2002


Café Orgânico 131

Em propriedades onde há talhões de


café orgânico e convencional, como no ca-
so de propriedades em transição, todo o
processo de colheita, preparo e armaze-
namento deve ser feito separando-se os
dois sistemas.
O beneficiamento deve iniciar pelo café
orgânico, limpando previamente os equi-
pamentos. Não se deve aproveitar a pri-
meira saca de café colhido como sendo
orgânico. Dessa forma, evitam-se a conta-
minação e os riscos de ser considerado
impróprio como orgânico, numa possível
Foto: Gilmar José Cereda

análise de resíduos.

RELAÇÃO ENTRE
COMPOSIÇÃO QUÍMICA E
QUALIDADE DO CAFÉ ORGÂNICO
Figura 4 - Água residuária proveniente da degomagem do café produzido “via úmida”,
lançada de forma inadequada em tanques de decantação A qualidade do café está diretamente
relacionada com os diversos constituintes
físico-químicos e químicos responsáveis
cesso, não se faz uso de água. De outra for- meiramente limpar bem as máquinas e pelo aroma e sabor da bebida. Segundo
ma, o café segue para os tanques de dego- equipamentos, com a finalidade de extrair Clifford (1975), a composição química do
magem e é lavado para retirar os resíduos todos os resíduos de café anteriormente grão de café cru depende dos fatores gené-
de mucilagem. beneficiados, evitando-se a contaminação ticos e ambientais e das condições de mane-
O café degomado, recém-lavado, é do produto. jo pré e pós-colheita. Além disso, a torração
levado ao terreiro para secar. No caso do é um fator essencial para a produção de
café orgânico, a secagem deve ser prefe- ARMAZENAGEM DO CAFÉ compostos que conferem as características
rivelmente ao sol ou em secadores mecâ- Independente do método de obtenção, de aroma e sabor ao café. Os açúcares e as
nicos, reduzindo-se a umidade de cerca de os cafés, após a secagem, são guardados proteínas do grão cru são os principais
55% para 10% a 12%, quando então estará em tulhas de descanso ou homogeneiza- compostos que contribuem para o sabor e
disponível para o armazenamento e comer- ção, esperando o momento para ser bene- o aroma do café torrado.
cialização. ficiados ou comercializados. Os armazéns Dentre os compostos orgânicos estu-
devem ter as condições adequadas, mesmo dados, destaca-se a enzima polifenoloxi-
Preparo por via seca que sejam mínimas. Cada saca deve ser rotu- dase (PFO), a qual está correlacionada po-
O café colhido é logo lavado, separan- lada com o logotipo e/ou nome da proprie- sitivamente com a qualidade da bebida do
do-se o verde e o cereja do seco e do bóia, dade ou organização que irá comercializá- café, conforme Amorim e Silva (1968),
que irão para o terreiro ou secadores em la, constando a frase “café orgânico”. Os Carvalho et al. (1989), Leite (1991), Chagas
lotes diferentes. O café deverá ser colhido lotes devem ser identificados também com (1994), Pimenta (1995), Souza (1996), Pereira
com o mínimo de frutos verdes. No caso o nome da propriedade ou organização, no- (1997), Lopes (2000).
do tipo cereja descascado, o fruto verde é me e código do produtor, município, altitude Amorim (1978) relata que, in vivo, a en-
separado do cereja, que será utilizado para e tipo de café (orgânico ou não). zima PFO encontra-se ligada às membranas
obter um café de melhor qualidade. Tanto Não se deve armazenar café em locais celulares e é ativada somente quando libe-
no lavador, quanto nos descadores de ce- onde existem outros produtos, já que facil- rada destas. Esta enzima tem sido encon-
reja, deve-se evitar o excesso de água. Em mente absorveria odores estranhos, des- trada na polpa de frutos e nas camadas
seguida, estes cafés são levados aos terrei- qualificando o produto. Ao empilhar os externas e parte central do grão.
ros. Ao utilizar secadores mecânicos, evitar lotes, é necessário utilizar estrados de ma- Amorim e Teixeira (1975) observaram
o contato com a fumaça, no caso de forna- deira para isolá-los do piso. que as transformações bioquímicas inde-
lhas de fogo. Todos os equipamentos, como embala- sejáveis que ocorrem no grão, durante a
No beneficiamento do café, tanto o des- gens, veículos, contêineres e outros, deve- pós-colheita, e que levam à formação de
polpado quanto o produzido por via seca rão estar limpos e livres de resíduos conta- diversos tipos de bebida, são principal-
ou como cereja descascado, deve-se pri- minantes. mente de natureza enzimática, envolvendo

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, n.214/215, p.127-135, jan./abr. 2002


132 Café Orgânico

a PFO, glicosidase, lípase e protease. no chão, ou café de varrição. A atividade gem 4,9%, o pergaminho 11,9% e o grão
Vários autores estudaram a qualidade da PFO, que determina a qualidade da be- 55,4%. Esta distribuição, com base na ma-
da bebida do café sob diversos aspectos. bida, foi significativa em todos os sistemas téria seca, é variável entre as variedades de
Entre eles pode-se citar Prete (1992), que de produção e tipos de colheita, sendo evi- café Arábica. De modo geral, o fruto seco é
relata que os piores cafés, em termos de dente a melhor qualidade dos cafés colhi- formado por 50% de casca e 50% de grão.
qualidade da bebida, indicam importantes dos no pano. Os sistemas convencional e A polpa pode ser utilizada na produção
reações oxidativas durante o processo de orgânico apresentaram maior atividade da de composto orgânico, de vermicomposto
deterioração dos grãos, sugerindo inten- PFO nos cafés colhidos no pano. Nos cafés e inclusive para silagem utilizada na ali-
sa peroxidação de lipídios. Já, Northmore colhidos no chão, o sistema em conversão mentação animal. A casca do café, obtida
(1967) encontrou, nos melhores cafés, uma apresentou uma tendência de maior valor pelo preparo via seca, pode ser usado como
maior quantidade de clorogenato de magné- da PFO. Já os colhidos no pano, no sistema adubo orgânico na lavoura, na produção
sio, correlacionando este composto com a convencional (65,89 U./Min./g. de amostra) de composto orgânico e vermicomposto e
cor verde-azulada dos cafés. e orgânico (66,42 U./Min./g de amostra), também substituir o milho em até 30% da
Segundo Amorim e Silva (1968), os ca- foram classificados como cafés finos de ração animal.
fés de pior qualidade, ou seja, os que tive- “bebida mole” “apenas mole” e, no siste-
ram seu sabor afetado por condições adver- ma em conversão (62,27 U./Min./g de amos- Manejo das águas residuárias
sas, têm também baixa atividade da PFO. tra), como de qualidade aceitável “bebida resultantes do
Conforme Chagas (1994), dentre os fato- dura”. Os cafés do chão, provenientes dos processamento de frutos
res que influenciam a composição química sistemas convencional (60,33 U./Min./g de do cafeeiro
e a qualidade do café, destacam-se a infec- amostra), em conversão 61,05 U./Min./g de Este assunto foi tratado com muita pro-
ção microbiana, a maturação dos frutos e amostra) e orgânico (60,09 U./Min./g de
priedade por Matos et al. (2001b), os quais
as condições ambientais. amostra) foram classificadas como de “be-
afirmam que, no processamento dos frutos
Carvalho et al. (1989) e Meirelles (1990) bida dura” de qualidade aceitável.
do cafeeiro, as atividades de lavagem,
retratam que a composição química e a flora Os demais parâmetros químicos ana-
descascamento e mucilagem de frutos do
microbiana dos grãos variam com o local lisados, como cafeína, fenólicos totais,
cafeeiro são geradoras de grandes volumes
de cultivo e o tipo de preparo do café após açúcares (redutores, não-redutores e to-
de águas residuárias, principalmente no
a colheita, predominando diversas espécies tais) e acidez titulável total encontraram-se
processo via úmida. Essa água é rica em
de fungos, os quais, dependendo da inten- dentro ou próximos dos valores indicados
material orgânico e inorgânico e, se for lan-
sidade de infestação, podem comprometer para o café.
çada sem tratamento em cursos d’água,
seriamente a qualidade da bebida.
pode causar grandes problemas ambien-
O manejo adequado após a colheita e a SUBPRODUTOS DO
tais, como a degradação da flora e da fauna,
influência do tempo de fermentação antes PROCESSAMENTO DO CAFÉ
além de comprometer a qualidade da água
do despolpamento, além de outros fatores,
Os subprodutos do café: a casca ou a tanto para o consumo humano quanto para
diminuíram os ataques microbianos e as
polpa, a mucilagem e as águas residuárias, o animal. Segundo Isaza H. (1995), somente
fermentações indesejáveis, propiciando
uma melhoria na qualidade da bebida. devem ser manejados adequadamente para 0,75% da água da terra está disponível pa-
Os fatores climáticos como excesso de minimizar a contaminação ambiental e ser ra o homem, portanto, toda água deve ser
chuva, seca, geada etc., e o ataque de pra- aproveitados pelo seu valor nutricional. devolvida para a natureza. Entretanto, a
gas e doenças que atingirem diretamente Na distribuição dos componentes do capacidade de autodepuração natural é
os grãos, podem provocar distúrbios na fruto maduro até a obtenção da bebida, limitada e esse recurso finito está sendo
maturação dos frutos, gerando grãos dete- constata-se que apenas 6% do peso do fru- demandado por uma população cada vez
riorados que comprometerão a classifica- to fresco é utilizado na bebida. Os 94% maior. Sendo assim, torna-se necessário o
ção quanto ao tipo e bebida do café. Além restantes são constituídos de águas e sub- tratamento prévio das águas residuárias.
disso, as próprias condições climáticas e a produtos do processo. Na maioria dos ca- O principal efeito ecológico da poluição
flora microbiana, predominante em certas sos, os subprodutos não são utilizados e orgânica em um curso d’água é a diminui-
regiões, podem propiciar a obtenção de convertem-se em fontes de contaminação ção da concentração de oxigênio dissolvi-
cafés de pior ou melhor qualidade. ambiental. Durante o processo via úmida, do, utilizado pelas bactérias aeróbias em
Theodoro (2001) realizou trabalho obtêm-se os seguintes subprodutos: o fruto seus processos metabólicos de degradação
enfatizando alguns parâmetros químicos fresco é constituído de 39% de polpa e 22% do material orgânico. O decréscimo da con-
em amostras de café, provenientes dos de mucilagem (VASCO, 2000). Bressani centração do oxigênio na água pode ser
sistemas de produção convencional, orgâ- (1978), tomando como base a matéria seca fatal para peixes e outros animais aquáti-
nico e em conversão, e do tipo de colheita, do fruto, constatou que a polpa representa cos, além de originar odores desagradáveis.
ou seja, café colhido no pano e café colhido 28,7% da matéria seca da cereja, a mucila- A Legislação Ambiental do estado de Mi-
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Café Orgânico 133

nas Gerais através da Deliberação Norma- mento de espécies que podem vir a pre- essa forma de tratamento apresenta um
tiva da Copam no 10/86 (MATOS et al., judicar o ecossistema aquático. custo que varia entre 30% e 50% do custo
2001b) estabelece que, para o lançamento O valor das águas residuárias como dos sistemas convencionais.
de águas residuárias em corpos hídricos, a fertilizante é um forte indicativo da possi- As formas de deposição sobre o solo
demanda bioquímica de oxigênio (DBO), bilidade de sua utilização no sistema solo- podem ser por infiltração, escoamento su-
medida da quantidade de material orgânico planta, como forma de tratamento dessas perficial ou fertirrigação. Pelo método de
presente na água residuária, deve ser de águas (MATOS et al., 2001b). tratamento por escoamento superficial, as
60mg L-1 e a eficiência do sistema de tra- águas residuárias são aplicadas, em taxas
tamento, para remoção da DBO, deve ser Tratamento de superiores à da capacidade de infiltração
superior a 85%. Os órgãos de fiscalização águas residuárias da água no solo, em terrenos inclinados
ambiental, na tentativa de fazer cumprir a O volume médio de água utilizado no e cultivados com vegetação rasteira, ge-
legislação, passaram a exigir que, no pro- processo de beneficiamento de 1kg de café ralmente gramínea. À medida que a água
cessamento do café, as unidades de bene- despolpado é de 40 L, sendo 20 L no despol- residuária escoa sobre o terreno, uma par-
ficiamento sejam adaptadas segundo as pamento propriamente dito e 20 L após a te se evapora, outra pequena parte infiltra-
normas vigentes. degomagem. Isto equivale a 8,3m3 de água se no solo e o restante é coletado em canais,
Na Colômbia e nos países da América por tonelada de café cereja (VASCO, 2000). praticamente limpa. Durante o percurso
Central, caracterizados por pequenas pro- Segundo Matos et al. (2001b), o trata- de escoamento, o sistema solo-planta, jun-
priedades e por adotar em sua totalidade o mento de águas residuárias pode ser divi- tamente com os microrganismos que se
processamento do produto via úmida, o dido em preliminar, primário e secundário, desenvolvem nesse meio, constituem um
problema da contaminação é bastante sério, segundo o grau de tratamento imposto. No filtro natural, possibilitando a degradação
causado principalmente pelo mau uso das tratamento preliminar, removem-se os só- de parte do material orgânico e a retenção
águas residuárias. lidos mais grosseiros, por meio de grades química e física de constituintes inorgâ-
As principais características físicas, quí- com malhas convenientemente calculadas. nicos.
micas e bioquímicas das águas residuárias No tratamento primário, são removidos os A grande vantagem da técnica do es-
da lavagem e da despolpa do café tipo cereja sólidos passíveis de sedimentação, poden- coamento sobre solo é permitir o tratamento
estão apresentadas no Quadro 1. Os eleva- do também ocorrer degradação anaeróbia de grandes volumes em pequenas áreas
dos valores da DBO e da demanda química do material orgânico em suspensão. Dentre e tornar possível o aproveitamento do po-
de oxigênio (DQO) indicam que essas águas os tratamentos primários, o autor descreve tencial fertilizante da água residuária apli-
possuem grande carga orgânica e podem os tanques de sedimentação, filtros orgâ- cada. A cobertura vegetal produzida po-
trazer muitos problemas para corpos hídri- nicos e lagoas anaeróbias. No tratamento de ser transformada em feno ou ensilagem
cos receptores, se forem lançadas sem trata- secundário, predomina a remoção por ação para alimentação animal, usada na forma
mento prévio. Apresentam também elevada de microrganismos que se desenvolvem no de matéria fresca, ou como adubo verde. O
concentração de sólidos totais, que podem meio líquido ou a remoção pelo sistema solo- solo da rampa de escoamento superficial
ser removidos por tratamento biológico. No planta. deve ser continuamente cultivado, para
que se refere ao valor como fertilizante na Uma alternativa de tratamento secun- que ocorra uma constante remoção de seus
agricultura, pode-se verificar que as águas dário para os efluentes dos filtros ou dos nutrientes, evitando-se, assim, a saliniza-
residuárias contêm concentrações relati- tanques de sedimentação seria a sua depo- ção.
vamente elevadas de N e principalmente sição sobre o solo. Esta técnica apresenta A fertirrigação é outra técnica em que
de K. Se lançadas em cursos d’água, sem uma série de vantagens, podendo-se citar, se prioriza o aproveitamento dos nutrientes
tratamento prévio, podem resultar no enri- dentre outras, o uso como fertilizante, o presentes na água residuária pela lavoura
quecimento nutricional dessas águas (eutro- baixo custo de implantação e operação, e o de café, razão suficiente para que este mé-
fização), proporcionando o desenvolvi- baixo consumo de energia. Estima-se que todo seja considerado ideal para deposi-

QUADRO 1 - Resultados das análises físicas, químicas e bioquímicas das amostras de águas residuárias da lavagem e do despolpamento de café cereja
SP(1) ST(1) SFT(1) SVT(1) CE NT NaT PT KT DQO DBO
(ds/m) pH(1) (mg/L) (mg/L) (mg/L) (mg/L) (mg/L) (mg/L)
(ml/L) (g/L) (g/L) (g/L)
45 3,67 0,53 3,14 0,95 5,2 186 a 246 1,5 a 2,0 4,5 a 6,5 44 a 111 3.429 a 5.524 1.837 a 3.242

FONTE: Matos et al. (2001b).


NOTA: SP - Sólidos sedimentáveis; ST - Sólidos totais; SFT - Sólidos fixos totais; SVT - Sólidos voláteis totais; CE - Condutividade elétrica; NT - Nitrogênio
total; NaT - Sódio total; PT - Fósforo total; KT - Potássio total; DQO - Demanda química de oxigênio; DBO - Demanda bioquímica de oxigênio.
(1) Dados médios.

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134 Café Orgânico

ção/tratamento dessas águas. Nutrientes se no fato de que a aplicação de água resi- REFERÊNCIAS
como N, K e P são fundamentais ao culti- duária seria feita em período de reconhe-
AMORIM, H. V. Aspectos bioquímicos do grão
vo do cafeeiro. Dessa forma, acredita-se cido déficit hídrico para a cultura do café,
verde relacionados com a deterioração da
que métodos de tratamento, que não permi- com conseqüente redução de custos com
qualidade. 1978. 85f. Tese (Livre Docência em
tam a reciclagem de nutrientes, estão con- adubação potássica.
Bioquímica) – Escola Superior de Agricultura “Luiz
denados a desaparecer num futuro pró-
de Queiroz”, Piracicaba.
ximo. A fertirrigação com águas residuárias, CONSIDERAÇÕES FINAIS
quando praticada com o devido cuidado, Os cuidados e as técnicas utilizadas na _______; SILVA, D.M. Relationship between the
possibilita o aumento da produtividade e produção de um café de melhor qualidade, polyphenol oxidase activity of coffee beans and
da qualidade dos produtos colhidos e a desde a fase de pré-colheita até o arma- quality of the beverage. Nature, London, v.219,
redução da poluição ambiental, além de zenamento, aqui apresentados são indis- n.27, p.381-382, July 1968.
promover melhorias nas características pensáveis, quer seja no sistema conven- _______; TEIXEIRA, A.A. Transformações bio-
químicas, físicas e biológicas do solo. cional, quer seja naquele em conversão químicas, químicas e físicas dos grãos de café verde
Matos et al. (2001a), para avaliar o efei- ou, sobretudo, orgânico. Ressalta-se ainda e a qualidade da bebida. In: CONGRESSO BRA-
to de diferentes doses de águas residuárias a importância da preservação do meio SILEIRO DE PESQUISAS CAFEEIRAS, 3., 1975,
da lavagem e despolpa de frutos do cafeeiro ambiente como fator essencial neste sis- Curitiba. Resumos... Rio de Janeiro: IBC –
na produtividade da planta e na fertilida- tema de produção de café. GERCA, 1975. p.21.
de residual do solo, conduziram um tra- Os resíduos devem ser aproveitados e,
balho em Viçosa (MG). As doses de águas dessa forma, a polpa pode ser utilizada na BRESSANI, R. Subproductos del fruto del café.
residuárias aplicadas foram 210, 420, 840 e produção de composto orgânico, vermi- In: BRAHAM, J.E.; BRESSANI, R. (Ed.). Pulpa
1.260 L/planta, valores correspondentes a composto e inclusive para silagem na ali- de café: composicion, tecnologia y utilización.
uma, duas, quatro e seis vezes a dose de K mentação animal. A casa do café, obtida Ciudad de Guatemala: Instituto de Nutricion de
recomendada, sem que a cultura recebesse pelo preparo via seca, pode ser usada como Centro América y Panamá, 1978. p.9-17.
qualquer outra fonte de adubação. Estes adubo orgânico na lavoura, na produção CARVALHO, V.D. de; CHALFOUN, S.M.;
autores verificaram que a produtividade de composto orgânico e vermicomposto e CHAGAS, S.J.R. Relação entre classificação do ca-
dos cafeeiros apresentou tendência de que- também substituir o milho em até 30% da fé pela bebida e composição físico química, química
da com o aumento da quantidade de água ração animal. No que se refere ao valor co- e microflora do grão beneficiado. In: CONGRESSO
residuária aplicada por planta, em compara- mo fertilizante na agricultura, pode-se veri- BRASILEIRO DE PESQUISAS CAFEEIRAS, 15.,
ção com as parcelas que receberam aduba- ficar ainda que as águas residuárias contêm 1989, Maringá. Trabalhos apresentados... Rio
ção química. Foi observado, entretanto, concentrações relativamente elevadas de de Janeiro: IBC, 1989. p.25-26.
que aplicações entre 600 e 700 L/planta N e, principalmente, de K. Se lançadas em
concorreram para recuperação da produção CHAGAS, S.J. de R. Caracterização química e
cursos d água sem tratamento prévio, po-
qualitativa de cafés de alguns municípios
do cafeeiro. Acredita-se que, caso houves- dem resultar no enriquecimento nutricional
de três regiões produtoras de Minas Gerais.
se a adição de todos os fertilizantes reco- dessas águas (eutrofização), proporcio-
1994. 83f. Dissertação (Mestrado em Ciência dos
mendados para a cultura, excetuando-se os nando o desenvolvimento de espécies que
Alimentos) – Escola Superior de Agricultura de
potássicos, que seriam fornecidos pela podem vir a prejudicar o ecossistema aquá-
Lavras, Lavras.
própria água residuária, a produtividade tico, neste sentido foram descritas também
seria aumentada em relação à obtida pelas as técnicas alternativas para tratamento CLIFFORD, M. N. The composition of green
plantas que recebessem apenas adubação dessas águas, evitando-se a contaminação and roasted coffee beans. Process Biochemistry,
química convencional. Tal hipótese baseia- ambiental. Rickmansworth, p.20-23, 1975.

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.127-135, jan./abr. 2002


Café Orgânico 135

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Informe Agropecuário, Belo Horizonte, n.214/215, p.127-135, jan./abr. 2002


136 Café Orgânico

Certificação de café orgânico


Vanessa Cristina de Almeida Theodoro1

Resumo - Com a crescente demanda por alimentos produzidos de forma orgânica,


principalmente na última década, tornou-se necessário disciplinar tanto o setor
produtivo, como os setores industrial e comercial, de modo que venha a assegu-
rar a autenticidade desses produtos para os consumidores. Na produção de café
legitimamente orgânico, tanto para o consumo interno, como para a exportação e
nas diversas etapas desde o plantio até o consumo, a origem orgânica do produto
deve ser garantida, através da certificação da unidade produtora, dos insumos
agrícolas utilizados nas lavouras e das torrefadoras. Inspeções periódicas e visitas
inesperadas são realizadas, com o objetivo de verificar o cumprimento das normas
e um contrato é firmado entre a certificadora, os cafeicultores e as empresas. Para
que o café receba a denominação orgânico, deverá apresentar o selo oficial de
certificação de instituições reconhecidas pelo Ministério da Agricultura.
Palavras-chave: Cafeicultura orgânica; Normatização; Norma; Inspeção; Selo;
Fair trade.

1
Enga Agra, M.Sc., Técnica Inspetora da Associação de Agricultura Orgânica (AAO), Rua Francisco Matarazzo, 455, CEP 05001-900 São Paulo-SP.
Correio eletrônico: theodoro@lavras.br

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.136-148, jan./abr. 2002 Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/15, p.136-148, jan./abr. 2002
Café Orgânico 137

INTRODUÇÃO o custo de produção e inviabilizado a sus- A certificação é o processo de legiti-


tentabilidade do agroecossistema cafeeiro, mação da produção, ou seja, é necessário
O amplo desenvolvimento científico e
gerando uma total dependência de insumos que alguém ateste que determinado pro-
tecnológico da cafeicultura convencional industrializados. duto é realmente orgânico. Através de ins-
do século XX vem assegurando uma alta O cultivo legitimamente orgânico de peções, um técnico (engenheiro agrônomo,
produtividade e lucratividade. No entan- cafeeiros vem crescendo em todo o mundo, técnico agrícola ou veterinário, conforme
to, a difusão de pacotes tecnológicos que firmando-se como uma tendência neces- o caso) visita a propriedade e verifica se o
preconizam a utilização de altas dosagens sária e irreversível. A única exigência dos cafeicultor pode ou não ser considerado
de adubos químicos e o controle de pragas importadores é a certificação que garanta a um produtor de café orgânico.
e doenças, como métodos para resguardar origem orgânica dos produtos, realizada No Quadro 1 é apresentada uma relação
o potencial produtivo das lavouras, obri- por entidades não-governamentais reco- de certificadores com os seus respectivos
gam o produtor a utilizar aplicações siste- nhecidas pelo Ministério da Agricultura, endereços.
máticas de agrotóxicos, o que tem elevado Pecuária e Abastecimento. O conceito de selo orgânico emitido

QUADRO 1 - Relação e endereços de algumas certificadoras que trabalham com cafeicultura orgânica (continua)

Certificadora Endereço

Av. Francisco Matarazzo, 455, Prédio do Fazendeiro, 2o andar, sala 20,


AAO – Associação de Caixa Interna 24, CEP 05001-900 São Paulo-SP.
Agricultura Orgânica tel: (11) 3673-8013 / fax: 3875-2625
e-mail: organica@uol.com.br
site: www.aao.org.br

ABIO – Associação de Jardim Botânico de Niterói – Alameda São Boaventura, 770 - Fonseca,
Agricultores Biológicos do CEP 24120-191 Niterói-RJ.
Estado do Rio de Janeiro tel: (24) 2452-1875

ANC - Associação de Av. Aquidabã, 107, Shopping Zentrum, Loja 43, CEP 13010-020 Campinas-SP.
Agricultura Natural de tel: (19) 239-0744
Campinas e Região e-mail: anc@correionet.com.br

Rua Conselheiro Furtado, 324, sala 305, 3o andar - Liberdade,


APAN - Associação dos CEP 01511-000 São Paulo-SP.
Produtores de tel: (11) 278-5163 / 3271-7045 / fax: (11) 3275-4831
Agricultura Natural e-mail: contato@apan.org.br
site: www.apan.org.br

Caixa Postal 159, CEP 13400-970 Piracicaba-SP.


tel: (19) 3411-4041 / fax: (19) 3411-3913
BCS Öko-Garantie GmbH
e-mail: gbacchi@terra.com.br
site: www.bcs-oeko.de

Rua Maria Venância Franco, 115, CEP 37550-000 Pouso Alegre-MG.


Certificadora Sapucaí tel/fax: (35) 3422-3782
e-mail: sapucaiong@uol.com.br

CHÃO VIVO - Associação Avenida Frederico Grulke, 612, sala C - Centro


de Certificação de CEP 29645-000 Santa Maria de Jetibá-ES.
Produtos Orgânicos do tel: (27) 3263-1495
Espírito Santo e-mail: organicacert@chaovivo.com.br

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/15, p.136-148, jan./abr. 2002


138 Café Orgânico

(conclusão)

Certificadora Endereço

CMO - Certificadora Rua 6, no 1373 – Centro, CEP 13500-190 Rio Claro-SP.


Mokiti Okada tel: (19) 533-3267 / fax: (19) 533-3290
e-mail: certcmo@terra.com.br

Rua José Bonifácio, 675, 2o andar - Bonfim


Coolméia - Cooperativa CEP 90040-130 Porto Alegre-RS.
Ecológica e-mail: coolmeia@coolmeia.com.br
site: www.coolmeia.com.br

Ecocert Brasil e-mail: ecocert@matrix.com.br

Rua Silveira Lobo, 32, Casa Forte,


FVO Brasil - CEP 52061-030 Recife-PE.
Farm Verified Organic tel: (81) 3074-0455 / fax: (81) 3441-2343
e-mail: fvobr@terra.com.br

Caixa Postal 321, CEP 18603-970 Botucatu-SP.


tel: (14) 6822-5066 / fax: (14) 6821-7862
IBD – Instituto Biodinâmico
e-mail: ibd@ibd.com.br
site: www.ibd.com.br

Rua Itapicuru 369, cj. 2.104, CEP 05006-000 São Paulo-SP.


IMO Control tel.: (11) 3868-2578 / fax: (11) 3873-6597
e-mail: imocontrol@terra.com.br

Minas Orgânica - Associação Rua Almandina, 33 - Bairro Floresta,


Mineira para Certificação de CEP 31010-080 Belo Horizonte-MG.
Produtos Orgânicos tel.: (31) 3213-8260

Rua Augusta, 1939, sala 61, CEP 01412-000 São Paulo-SP.


OIA Brasil - Organização tel: (11) 3083-4043 / fax: (11) 3068-9743
Internacional Agropecuária e-mail: oiabrasil@uol.com.br
site: www.certificacionoia.com

Av. Brigadeiro de Faria Lima, 1685, 5o andar, sala 5i - Jardim Paulista,


CEP 01451-001 São Paulo-SP.
Skal Brasil Control Union tel: (11) 3819-0019 / fax: (11) 3814-1384
e-mail: skalbrasil@daventria.net

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/15, p.136-148, jan./abr. 2002


Café Orgânico 139

pelas certificadoras abrange aspectos re- pação no processo de certificação, através versidade dos ecossistemas, natural ou
lativos à qualidade nutricional e isenção do acompanhamento do desenvolvimento transformado, em que se insere o siste-
de agrotóxicos, à preservação do meio de leis e portarias que fornecem a base legal ma produtivo;
ambiente na condução da cultura e ao res- de atuação da agricultura orgânica. Além
c) a conservação das condições físicas,
peito ao ser humano. A utilização do selo disso, espera-se um maior apoio e fomento
químicas e biológicas do solo, da água
denota estar o produtor em conformidade aos programas de pesquisas e extensão de
e do ar;
com a legislação ambiental e trabalhista, técnicas verdadeiramente ecológicas.
preocupado com a qualidade de seus pro- O Brasil já possui normas oficiais que d) o fomento da integração efetiva entre
dutos e com a saúde dos consumidores. O disciplinam a produção, tipificação e iden- agricultor e consumidor final de produ-
produtor passa a ter direito ao uso do selo, tificação da qualidade de produtos orgâni- tos orgânicos e o incentivo à regiona-
quando são atendidas certas exigências cos, sejam de origem animal, sejam vegetal, lização da produção destes produtos
que incluem obviamente a obediência às conforme Instrução Normativa no 7 de 17 para os mercados locais.
normas de produção da instituição certi- de maio de 1999, do Ministério da Agricul-
1.2. Considera-se produto da agricultura
ficadora, vistorias, avaliações e contrato tura e do Abastecimento, publicada no
orgânica, seja in natura ou processado,
entre as partes (THEODORO, 2001). Diário Oficial no 94 de 19 de maio de 1999, a
todo aquele obtido em sistema orgânico
primeira norma que trata desse assunto no
de produção agropecuária e industrial. O
NORMAS PARA Brasil (BRASIL, 1999).
conceito de sistema orgânico de produção
CERTIFICAÇÃO ORGÂNICA
agropecuária e industrial abrange os deno-
As normas visam manter os padrões NORMAS DISCIPLINADORAS
minados ecológico, biodinâmico, natural,
fundamentais da produção orgânica. Entre- PARA A PRODUÇÃO, TIPIFICAÇÃO,
sustentável, regenerativo, biológico, agro-
tanto, a essência da agricultura orgânica PROCESSAMENTO, ENVASE,
ecológico e permacultura. Para efeito desta
não se deixa resumir em normas, pois exige DISTRIBUIÇÃO, IDENTIFICAÇÃO E
Instrução, considera-se produtor orgânico,
respostas sempre renovadas às diferentes CERTIFICAÇÃO DA QUALIDADE DE
tanto o produtor de matérias-primas como
situações em que forem cumpridas. Ainda PRODUTOS ORGÂNICOS, SEJAM DE
o processador das mesmas.
assim, há a necessidade de definir um pa- ORIGEM ANIMAL OU VEGETAL
drão mínimo, a partir do qual um produto 2 . DAS NORMAS DE PRODUÇÃO
1. DO CONCEITO
possa ser considerado orgânico, o que pos- ORGÂNICA
1.1. Considera-se sistema orgânico de pro-
sibilita clareza, entendimento e confiança Considera-se unidade de produção, a pro-
dução agropecuária e industrial, todo
entre produtores e consumidores. O pro- priedade rural que esteja sob sistema orgâ-
aquele em que se adotam tecnologias que
dutor que utilizar as normas, buscando nico de produção. Quando a propriedade
otimizem o uso de recursos naturais e socio-
somente eventuais “brechas” para aplicá- inteira não for convertida para a produção
econômicos, respeitando a integridade
las, visando objetivos econômicos, mos- orgânica, a certificadora deverá assegurar-
cultural e tendo por objetivo a auto-susten-
trar-se-á inapto para praticar agricultura se de que a produção convencional está
tação no tempo e no espaço, a maximização
orgânica e deverá buscar outra forma ou devidamente separada e passível de inspe-
dos benefícios sociais, a minimização da
meio de produção. Impedir que esse tipo de ção.
dependência de energias não-renováveis
equívoco aconteça, é uma das tarefas das e a eliminação do emprego de agrotóxicos 2.1. DA CONVERSÃO
certificadoras e inspetores (INSTITUTO..., e outros insumos artificiais tóxicos, orga- Para que um produto receba a denominação
2000). nismos geneticamente modificados-OGM/ de orgânico, deverá ser proveniente de um
Ressalta-se a necessidade de as normas transgênicos, ou radiações ionizantes em sistema onde tenham sido aplicadas as
de produção orgânica não se transformarem qualquer fase do processo de produção, bases estabelecidas na presente Instrução,
num novo pacote de medidas para a agri- armazenamento e de consumo, e entre os por um período variável de acordo com a
cultura. O aspecto dinâmico da agricultura mesmos, privilegiando a preservação da utilização anterior da unidade de produção
orgânica deve ser preservado através de saúde ambiental e humana, assegurando a e a situação ecológica atual, mediante as
mecanismos que acompanhem a evolução transparência em todos os estádios da análises e a avaliação das respectivas insti-
da pesquisa e da produção. O verdadeiro produção e da transformação, visando: tuições certificadoras (Anexo I).
espírito da normatização deve ser o da
promoção e do desenvolvimento dessa a) a oferta de produtos saudáveis e de ele- 2.2. DAS MÁQUINAS E DOS
agricultura. Em resumo, a normatização tem vado valor nutricional, isentos de qual- EQUIPAMENTOS
quer tipo de contaminantes que ponham
por obrigação tornar a produção mais orgâ- As máquinas e os equipamentos usados
em risco a saúde do consumidor, do
nica em qualidade e quantidade (SILVA, na unidade de produção não podem conter
agricultor e do meio ambiente;
1998). resíduos contaminantes, dando-se priori-
O governo também tem a sua partici- b) a preservação e a ampliação da biodi- dade ao uso exclusivo à produção orgânica.
Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/15, p.136-148, jan./abr. 2002
140 Café Orgânico

2.3. SOBRE OS PRODUTOS DE nagem, desqualifica o produto para efeito presente Instrução;
ORIGEM VEGETAL E OS de certificação, de acordo com o subitem
RECURSOS NATURAIS e) dispor de instalações higiênicas, fun-
(PLANTAS, SOLOS E ÁGUA)
2.1. da presente Instrução. cionais e confortáveis;
Tanto a fertilidade, como a atividade bioló- 2.3.2. As sementes e as mudas deverão f) praticar um manejo capaz de maximizar
gica do solo e a qualidade das águas, deve- ser oriundas de sistemas orgânicos. uma produção de alta qualidade bioló-
rão ser mantidas e incrementadas mediante, 2.3.2.1. Não existindo no mercado semen- gica e econômica;
entre outras, as seguintes condutas: tes oriundas de sistemas orgânicos, ade- g) utilizar raças, cruzamentos e melhora-
a) proteção ambiental; quadas a determinada situação ecológica mento genético (não-OGM/transgê-
b) manutenção e preservação de nascentes específica, o produtor poderá lançar mão nicos) compatíveis com as condições
e mananciais hídricos; de produtos existentes, desde que avalia- ambientais e que estimulem a biodiver-
dos pela instituição certificadora, excluin- sidade.
c) respeito e proteção à biodiversidade; do-se todos os organismos geneticamente
2.4.1. Entende-se por bem-estar animal, a
d) sucessão animal-vegetal; modificados (OGM/transgênicos).
permanência deste animal livre de dor, de
e) rotação e/ou associação de culturas; 2.3.2.2. Para culturas perenes, não haven- sofrimento, angústia e com vida em um
f) cultivo mínimo; do disponibilidade de mudas orgânicas, ambiente onde possa expressar proximi-
estas poderão ser oriundas de sistemas dade com o comportamento de seu habitat
g) sustentabilidade e incremento da maté-
convencionais, desde que avaliadas pela original: movimentação, territoriedade,
ria orgânica no solo;
instituição certificadora, excluindo-se to- vadiagem, descanso e ritual reprodutivo.
h) manejo da matéria orgânica; dos os organismos geneticamente modifi-
2.4.2. Os insumos permitidos e proibidos
i) utilização de quebra-ventos; cados/transgênicos e de cultura de tecido
na alimentação animal estão especificados
vegetal, quando as técnicas empregadas
j) sistemas agroflorestais; no Anexo IV da presente Instrução.
conduzam a modificações genéticas ou
k) manejo ecológico das pastagens. induzam a variantes soma-clonais. 2.4.3. O transporte, o pré-abate e o abate
2.3.1. O manejo de pragas, doenças e plan- dos animais devem seguir princípios huma-
2.3.3. Os produtos oriundos de atividades
tas invasoras deverá ser realizado mediante nitários e de bem-estar animal, assegurando
extrativistas só serão certificados como
a adoção de uma ou várias condutas, de a qualidade sanitária da carcaça.
orgânicos, caso o processo de extração não
acordo com os Anexos II e III desta Instru- comprometa o ecossistema e a sustentabi- 2.4.4. Excepcionalmente, para garantir a
ção, que possibilitem: lidade do recurso explorado. saúde ou quando houver risco de vida de
a) incremento da biodiversidade no sistema animais, na inexistência de substituto per-
produtivo; 2.4. PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL mitido, poder-se-ão usar medicamentos
Os produtos orgânicos de origem animal convencionais.
b) seleção de espécies, variedades e culti-
vares resistentes; devem provir de unidades de produção, 2.4.4.1. É obrigatório comunicar à certifi-
prioritariamente auto-suficientes quanto à cadora o uso desses medicamentos, bem
c) emprego de cobertura vegetal, viva ou
geração de alimentos para os animais em como registrar a sua administração que de-
morta, no solo;
processo integrado com a produção vege- ve respeitar o que estabelece o subitem
d) meios mecânicos de controle; tal, conforme o Anexo IV, da presente Ins- 2.4.4. desta Instrução. O período de carên-
e) rotação de culturas; trução. Para a efetivação da sustentabi- cia a ser cumprido, estipulado pela bula do
lidade, esses sistemas devem obedecer os produto, deverá ser multiplicado pelo fator
f) alelopatia;
seguintes requisitos: três, podendo ainda ser ampliado de acordo
g) controle biológico (excetuando-se OGM/ com a instituição certificadora.
a) respeitar o bem-estar animal;
transgênicos);
b) manter um nível higiênico em todo o 2.4.4.2. São permitidas todas as vacinas
h) integração animal-vegetal;
processo criatório, compatível com as previstas por lei.
i) outras medidas mencionadas nos Ane- normas de saúde pública vigentes; 2.4.5. Preferencialmente, a aquisição dos
xos II e III da presente Instrução.
c) adotar técnicas sanitárias preventivas, animais deve ser feita em criações orgâni-
2.3.1.1. É vedado o uso de agrotóxico sin- sem o emprego de produtos proibidos; cas.
tético, seja para combate ou prevenção, d) contemplar uma alimentação nutritiva, 2.4.5.1. No caso de aquisição de animais
inclusive na armazenagem. sadia e farta, incluindo-se a água, sem de propriedades convencionais, estes de-
2.3.1.2. A utilização de medida não-orgâ- a presença de aditivos químicos e/ou vem prioritariamente ser incorporados à
nica, para garantir a produção ou a armaze- estimulantes, conforme o Anexo IV da unidade produtora orgânica, com a idade

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/15, p.136-148, jan./abr. 2002


Café Orgânico 141

mínima em que possam ser recriados sem a 3.5.2. É obrigatório explicitar, no rótulo do cada instituição certificadora manter o
presença materna. produto, os tipos e as quantidades de registro atualizado dos produtores e dos
aditivos, os coadjuvantes de fabricação e produtos que ficam sob suas responsa-
2.4.5.2. Os animais adquiridos em criações
outros produtos de origem não-orgânica bilidades.
convencionais devem passar por quaren-
tena tradicional, ou outra a ser definida pela nele contidos, sempre de acordo com o sub-
7. DA RESPONSABILIDADE
certificadora. item 3.1. da presente Instrução.
Os produtores certificados assumem a
3.5.3. Os ingredientes de origem não- responsabilidade pela qualidade orgânica
3. DO PROCESSAMENTO
orgânica serão permitidos em percentuais de seus produtos e devem permitir o acesso
Processamento é o conjunto de técnicas definidos no Anexo VII da presente Ins- da certificadora a todas as instalações,
de transformação, conservação e envase trução. atividades e informações relativas ao seu
de produtos de origem animal e/ou vegetal.
4 . DA ARMAZENAGEM E DO processo produtivo.
3.1. Somente será permitido o uso de aditi- TRANSPORTE 7.1. À instituição certificadora cabe a res-
vos, coadjuvantes de fabricação e outros
Os produtos orgânicos devem ser identi- ponsabilidade pelo controle da qualidade
produtos de efeito brando (não-OGM/trans-
ficados e mantidos em local separado dos orgânica dos produtos certificados, permi-
gênicos), conforme mencionado no Ane-
demais de origem desconhecida, de modo tindo o acesso do Órgão Colegiado Esta-
xo V da presente Instrução, e quando auto-
que venha a evitar possíveis contamina- dual ou do Distrito Federal a todos os atos,
rizados e mencionados nos rótulos das
ções, seguindo o que prescreve o Anexo procedimentos e informações pertinentes
embalagens.
VI da presente Instrução. ao processo de certificação.
3.2. As máquinas e os equipamentos uti-
4.1. A higiene e as condições do ambiente 8. DOS ÓRGÃOS COLEGIADOS
lizados no processamento dos produtos
de armazenagem e do transporte serão
orgânicos deverão estar comprovadamente 8.1. O Órgão Colegiado Nacional será com-
fatores necessários para a certificação de
limpos de resíduos contaminantes, confor- posto paritariamente de 5 (cinco) membros
sua qualidade orgânica.
me estabelecem os termos desta Instrução do poder público, titular e suplente e 5
e seus anexos. 4.2. Todos os produtos orgânicos devem (cinco) membros de Organizações Não-
estar devidamente acondicionados. Governamentais, titular e suplente, que
3.3. Em todos os casos, a higiene no pro-
tenham reconhecida atuação junto à socie-
cessamento dos produtos orgânicos será 5. DA IDENTIFICAÇÃO
dade no âmbito da agricultura orgânica, de
fator decisivo para o reconhecimento de Além de atender às normas vigentes quanto
sua qualidade. Para efeito de certificação, forma que venha a respeitar a paridade de
às informações que devem constar nas um representante por região geográfica,
as unidades de processamento devem cum- embalagens, os produtos certificados de-
prir, também, as exigências contidas nesta chegando a um total de até 10 (dez) mem-
verão conter um selo de qualidade regis- bros.
Instrução e nas legislações vigentes espe- trado no Órgão Colegiado Nacional, espe-
cíficas. 8.1.1. A escolha dos membros das Orga-
cífico para cada certificadora, atendendo
3.3.1. A higienização das instalações e dos às condições previstas no Anexo VII da nizações Governamentais será de respon-
equipamentos deverá ser feita com pro- presente Instrução, além das contidas a sabilidade exclusiva do Ministério da Agri-
dutos biodegradáveis, e caso esses produ- seguir: cultura e do Abastecimento.
tos não estejam disponíveis no mercado, 8.1.2. A escolha dos membros das Orga-
a) será mencionada no rótulo, a denomi-
deverá ser consultada a certificadora. nizações Não-Governamentais obedecerá
nação “produto orgânico”;
3.4. Para o envase de produtos orgânicos, a sistemática própria dessas organizações.
b) o nome e o número de registro da cer-
deverão ser priorizadas embalagens produ- 8.2. Os Órgãos Colegiados Estaduais e do
tificadora junto ao Órgão Colegiado Na-
zidas com materiais comprovadamente Distrito Federal serão compostos paritaria-
cional.
biodegradáveis e/ou recicláveis. mente de 5 (cinco) membros do Poder Pú-
No caso de produto a granel, o mesmo será blico, titular e suplente e 5 (cinco) membros
3.5. Poderá ser certificado como produto
acompanhado do certificado de qualidade de Organizações Não-Governamentais, ti-
processado orgânico, aquele cujo compo-
orgânica. tular e suplente, que tenham reconhecida
nente principal seja de origem orgânica.
atuação junto à sociedade, no âmbito da
3.5.1. Os aditivos e os coadjuvantes de 6 . DO CONTROLE DA QUALIDADE
ORGÂNICA agricultura orgânica, chegando a um total
fabricação de origem não-orgânica serão
de até 10 (dez) membros.
permitidos em percentuais a serem de- A certificação e o controle da qualidade
finidos pelas certificadoras e pelo Órgão orgânica serão realizados por instituições 8.2.1. A escolha dos membros das Orga-
Colegiado Nacional, conforme estabelece certificadoras credenciadas nacionalmente nizações Governamentais, nas Unidades
o Anexo V da presente Instrução. pelo Órgão Colegiado Nacional, devendo Federativas, será de responsabilidade

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/15, p.136-148, jan./abr. 2002


142 Café Orgânico

exclusiva das Delegacias Federais de Agri- cos, certificados em seu país de origem, em mais de uma das alíneas, tanto como
cultura. está condicionada às exigências sanitárias, pessoa física ou jurídica.
fitossanitárias e de inspeção animal e ve-
8.2.1.1. A escolha dos membros das Orga- 9.4.2. São obrigações das certificadoras:
getal, de conformidade com as leis vigentes
nizações Não-Governamentais obedecerá a) manter atualizadas todas as informações
no Brasil, complementada com prévia
sistemática própria dessas organizações. relativas à certificação;
análise e autorização de uma certificadora
8.3. Cabe ao Órgão Colegiado Nacional fis- credenciada no Órgão Colegiado Nacio- b) realizar quantas visitas forem neces-
calizar as atividades dos Órgãos Colegia- nal. sárias, com o mínimo de uma por ano,
dos Estaduais e do Distrito Federal, de para manter atualizadas as informações
acordo com as normas vigentes. 9.3. As instituições certificadoras, para ser
sobre seus produtores certificados;
credenciadas, devem satisfazer os seguin-
8.4. Cabe aos Órgãos Colegiados Esta- c) promover a capacitação e assumir a
tes requisitos:
duais e do Distrito Federal fiscalizarem as responsabilidade pelo desempenho dos
atividades das certificadoras locais. As que a) requerer o credenciamento através dos
integrantes da comissão técnica;
não cumprirem a legislação em vigor serão Órgãos Colegiados Estaduais e do Dis-
passíveis de sanções, de acordo com as trito Federal; d) no caso de destinação para o comércio
normas vigentes. exterior não comercializar produtos e
b) anexar cópias dos documentos reque-
insumos, nem prestar serviços de con-
8.5. Ao Órgão Colegiado Nacional, com- ridos, devidamente registrados em car-
sultorias, assistência técnica e elabo-
petem o deferimento e o indeferimento dos tório;
ração de projetos;
pedidos de registro das entidades certifi- c) descrever detalhadamente seu processo
cadoras encaminhados pelos Órgãos Co- e) no caso de destinação para comércio
de certificação com o respectivo regula-
legiados, citados no subitem anterior. interno, não comercializar produtos e
mento de funcionamento, demonstran-
insumos;
8.6. Aos Órgãos Colegiados Estaduais e do suas etapas, inclusive os mecanis-
do Distrito Federal, competem a fiscalização mos de auto-regulação ética; f) manter a confiabilidade das informa-
e o controle, bem como o encaminhamento ções, quando solicitadas pelo produtor
d) apresentar as suas normas técnicas para
dos pedidos de registro das entidades certi- orgânico;
aprovação do Órgão Colegiado Nacio-
ficadoras para o Órgão Colegiado Nacio- nal; g) cumprir as demais determinações esta-
nal. belecidas pelos Colegiados Nacional,
e) descrever as sanções que poderão ser
8.6.1. Na inexistência de Órgãos Colegia- Estaduais e do Distrito Federal.
impostas, em caso de descumprimento
dos Estaduais e do Distrito Federal, o de suas normas;
Órgão Colegiado Nacional cumprirá essas 10. DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
atribuições. f) comprovar a capacidade própria ou de
Os demais atos necessários para a comple-
alguma contratada para realizar as aná-
ta operacionalização da presente Instrução
9. DAS ENTIDADES CERTIFICADORAS lises, se necessárias, no processo de cer-
Normativa serão estabelecidos pela Secre-
tificação.
9.1. Os produtos de origem vegetal ou ani- taria de Defesa Agropecuária, do Minis-
mal, processados ou in natura, para ser 9.4. As instituições certificadoras devem tério da Agricultura e do Abastecimento.
reconhecidos como orgânicos, devem ser dispor, na sua estrutura interna, dos seguin-
certificados por pessoa jurídica, sem fins tes membros: ANEXO I
lucrativos, com sede no território nacional, a) Comissão Técnica: corpo de técnicos res- DO PERÍODO DE CONVERSÃO
credenciada no Órgão Colegiado Nacional, ponsáveis pela avaliação da eficácia e 1. Produção vegetal de culturas anuais:
e que tenha seus documentos sociais qualidade da produção; para a unidade de produção em conversão,
registrados em órgão competente da esfera deverá ser obedecido um período mínimo
pública. b) Conselho de Certificação: responsável
pela análise e aprovação dos pareceres de doze meses de manejo orgânico, para
9.2. As instituições certificadoras adota- emitidos pela Comissão Técnica; que o ciclo da produção subseqüente seja
rão o processo de certificação mais ade- considerado orgânico.
quado às características da região em que c) Conselho de Recursos: decide sobre ape-
2. Produção vegetal de culturas perenes:
atuam, desde que observadas as exigências lações de produtores e outros interes-
sados. para a unidade de produção em conversão,
legais que tratam da produção orgânica no deverá ser obedecido um período mínimo
país e das emanadas pelo Órgão Colegiado 9.4.1. Aos integrantes de quaisquer das de dezoito meses de manejo orgânico, pa-
Nacional. estruturas mencionadas nas alíneas a, b e ra que a colheita subseqüente seja certifi-
9.2.1. A importação de produtos orgâni- c do subitem 9.4., é vedada a participação cada.

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Café Orgânico 143

3. Produção vegetal de pastagem perene: microorganismos, aminoácidos e en- 2. Meios contra pragas:
para a unidade de produção em conversão, zimas, desde que não sejam OGM/ preparados viróticos, fúngicos e bacte-
deverá ser obedecido um período mínimo transgênicos; riológicos, que sejam OGM/transgê-
de doze meses de manejo orgânico ou de cinzas e carvões vegetais; nicos (só com permissão específica da
pousio. certificadora);
pó de rocha;
Observação: Os períodos de conversão extratos de insetos;
biofertilizantes;
mencionados poderão ser ampliados pela
argilas ou ainda vermiculita; extratos de plantas;
certificadora, em função do uso anterior e
da situação ecológica da unidade de pro- compostagem urbana, quando oriun- emulsões oleosas (sem inseticidas quí-
dução, desde que seja julgada a conve- da de coleta seletiva e comprovada- mico-sintéticos);
niência. mente livre de substâncias tóxicas. sabão de origem natural;
b) Somente se constatada a necessi- pó de café;
ANEXO II dade através de análise, e livres de
gelatina;
ADUBOS E CONDICIONADORES substâncias tóxicas:
DE SOLOS PERMITIDOS pó de rocha;
termofosfatos;
1. Da própria unidade de produção (desde álcool etílico;
adubos potássicos - sulfato de po-
que livres de contaminantes): tássio, sulfato duplo de potássio e terras diatomáceas, ceras naturais, pró-
composto orgânico; magnésio, este de origem mineral polis e óleos essenciais, a critério da
natural; certificadora;
vermicomposto;
micronutrientes; como solventes: álcool, acetona, óleos
restos orgânicos; vegetais e minerais;
sulfato de magnésio;
esterco sólido ou líquido; como emulsionantes: lecitina de soja
ácido bórico, quando não usado dire-
restos de cultura; tamente nas plantas e solo; não-transgênica;
adubação verde; carbonato, como fonte de micronu- homeopatia.
biofertilizantes; trientes;
3. Meios de captura, meios de proteção e
fezes humanas, somente quando com- guano. outras medidas biológicas:
postadas na unidade de produção e não controle biológico;
empregadas no cultivo de olerícolas; ANEXO III
feromônios, desde que utilizados em
microorganismos benéficos ou enzimas, PRODUÇÃO VEGETAL
armadilhas;
desde que não sejam OGM/transgêni- 1. Meios contra doenças fúngicas:
armadilhas de insetos com inseticidas
cos; enxofre simples e suas preparações, a permitidos no item 2, do Anexo III;
outros resíduos orgânicos. critério da certificadora;
armadilhas anticoagulantes para roedo-
pó de pedra; res;
2. Obtidos fora da unidade de produção:
a) Somente se autorizados pela certifica- um terço de sulfato de alumínio e dois meios repelentes mecânicos (armadilhas
dora: terços de argila (caulim ou bentonita) e outros similares);
em solução 1%;
vermicomposto; repelentes naturais (materiais repelentes
sais de cobre, na fruticultura; e expulsantes);
esterco composto ou líquido;
biomassa vegetal; própolis; métodos vegetativos, quebra-vento,
cal hidratada, somente como fungicida; plantas companheiras e repelentes;
resíduos industriais, chifres, sangue,
pó de osso, pêlo e penas, tortas, vi- iodo; preparados que estimulem a resistência
nhaça e semelhantes, como comple- das plantas e que inibam certas pragas
extratos de plantas ;
mentos da adubação; e doenças, tais como: plantas medici-
extratos de compostos e plantas; nais, própolis, calcário e extratos de
algas e derivados, e outros produtos
de origem marinha; vermicomposto; algas, bentonita, pó de pedra e similares;

peixes e derivados; calda bordaleza e calda sulfocálcica, a cloreto de cálcio;


pó de serra, cascas e derivados, sem critério da certificadora; leite e derivados;
contaminação por conservantes; homeopatia. extratos de produtos de origem animal.

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144 Café Orgânico

4. Manejo de plantas invasoras: 2. Técnicas permitidas sob o controle da


sementes e mudas isentas de plantas certificadora:
invasoras; uso de equipamentos de preparo de solo
técnicas mecânicas; que não impliquem na alteração de sua
estrutura, na formação de pastagens e
alelopatia; cultivo de forragens, grãos, raízes e
cobertura morta e viva; tubérculos;
cobertura inerte, que não cause conta- aquisição de alimentos não-certificados
minação e poluição, a critério da institui- orgânicos, equivalentes a até 20% e 15%
ção certificadora; do total da matéria seca de alimentos
para animais monogástricos e para ani-
solarização;
mais ruminantes, respectivamente;
controle biológico como manejo de plan-
aditivos, óleos essenciais, suplementos
tas invasoras.
vitamínicos e sais minerais;

ANEXO IV suplementos de aminoácidos;


PRODUÇÃO ANIMAL amochamento e castração;
1. Condutas desejadas: inseminação artificial.
maximização da captação e uso de ener- 3. Técnicas proibidas:
gia solar;
uso de agrotóxicos nas pastagens e cul-
auto-suficiência alimentar orgânica; turas de alimentos para os animais;
diminuição da dependência de recursos restrições especificadas nos Anexos II
externos no processo produtivo; e III, quanto à produção vegetal;
associação de espécies vegetais e ani- uso do fogo no manejo de pastagens;
mais; confinamentos que contrariam o item 2.4.
criação a campo; e suas subdivisões desta Instrução, e
abrigos naturais com árvores; demais técnicas que restrinjam o bem-
estar animal;
quebra-ventos;
uso de aditivos estimulantes sintéticos na
conservação das forragens com silagem alimentação, na engorda e na reprodução;
ou fenação (desde que de origem orgâ-
nica); descorna e outras mutilações;

mineralização com sal marinho; presença e manejo de animais genetica-


mente modificados;
suplementos vitamínicos (óleo de fí-
promotores de crescimento sintéticos;
gado de peixe e levedura);
uréia;
aditivos permitidos: algas calcinadas,
plantas medicinais, plantas aromáticas, restos de abatedouros na alimentação;
soro de leite e carvão vegetal; qualquer tipo de esterco para ruminan-
suplementação com recursos alimenta- tes ou para monogástricos da mesma
res provenientes de unidade de produ- espécie;
ção orgânica; aminoácidos sintéticos;
aditivos para arraçoamento: leveduras transferência de embriões.
e misturas de ervas e algas;
4. Insumos que podem ser adquiridos fora
aditivos para silagem: açúcar mascavo, da unidade de produção, segundo a espé-
cereais e seus farelos, soro de laticínio e cie animal e sob orientação da assistên-
sais minerais; cia técnica e controle da certificadora:
homeopatia, fitoterapia e acupuntura. silagem, feno, palha, raízes, tubérculos,

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Café Orgânico 145

bulbos e restos de culturas orgânicas; gatórias; ANEXO VI


cereais e outros grãos e seus derivados; adotar programas sanitários com bases DA ARMAZENAGEM E DO
profilática e preventiva; TRANSPORTE
resíduos industriais sem contaminantes;
realizar limpeza e desinfecções com agen- Os produtos orgânicos devem ser man-
melaço;
tes comprovadamente biodegradáveis, tidos separados de produtos não-orgâni-
leite e seus derivados; cos.
sabão, sais minerais solúveis, perman-
gorduras animais e vegetais; ganato de potássio ou hipoclorito de Todos os produtos deverão ser adequa-
farinha de osso calcinada ou autoclavada sódio em solução 1:1000, cal, soda cáus- damente identificados durante todo o pro-
e farinha de peixe. tica, ácidos minerais simples (nítrico e cesso de armazenagem e transporte.
fosfórico), oxidantes minerais em enxá- O Órgão Colegiado Nacional deverá
5. higiene e desinfecção: gües múltiplos, creolina, vassoura de estabelecer padrões para a prevenção e
cumprir o programa de vacinações obri- fogo e água. controle de poluentes e contaminantes.
Produtos orgânicos e não-orgânicos
não poderão ser armazenados ou transpor-
tados juntos, exceto quando claramente
ANEXO V identificados, embalados e fisicamente
ADITIVOS PARA PROCESSAMENTO E OUTROS PRODUTOS QUE PODEM separados.
SER USADOS NA PRODUÇÃO ORGÂNICA A certificadora deverá regular as formas
e os padrões permitidos para a desconta-
Nome Condições especiais
minação, limpeza e desinfecção de todas
Água potável as máquinas e equipamentos, onde os
Cloridato de cálcio Agente de coagulação produtos orgânicos são mantidos, manu-
seados ou processados.
Carbonato de cálcio Antiumectante
As condições ideais do local de arma-
Hidróxido de cálcio Agente de coagulação zenagem e do transporte de produtos são
Sulfato de cálcio Agente de coagulação fatores necessários para a certificação de
Carbonato de potássio Secagem de uvas sua qualidade orgânica.

Dióxido de carbono
ANEXO VII
Nitrogênio DA ROTULAGEM
Etanol Solvente A pessoa física ou jurídica, legalmente
responsável pela produção ou processa-
Ácido de tanino Auxílio de filtragem
mento do produto deverá ser claramente
Albumina branca de ovo identificada no rótulo conforme se segue:
Caseína 1. produtos de um só ingrediente poderão
Óleos vegetais ser rotulados como “produto orgânico”,
desde que certificado;
Gel de dióxido de silicone ou solução
2. produtos compostos de mais de um
Coloidal
ingrediente, incluindo aditivos, onde
Carbono ativo nem todos os ingredientes sejam de
Talco origem certificada orgânica, deverão ser
rotulados da seguinte forma:
Betonina
a) os produtos compostos, que apresen-
Caolinita
tarem um mínimo de 95% de ingre-
Perlita dientes de origem orgânica certifi-
Cera de abelha cada, serão rotulados como produto
orgânico;
Cera de carnaúba
b) os produtos compostos, que apresen-
Microrganismos e enzimas
tarem um mínimo de 70% de ingre-
(não-OGM/transgênicos)
dientes de origem orgânica certifi-
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146 Café Orgânico

cada, serão rotulados como produtos res, lavouras cafeeiras, campos agrí- a uma associação certificadora, o
com ingredientes orgânicos, de- colas e criatórios animais) para a produtor preenche uma proposta de
vendo constar nos rótulos as pro- produção de alimentos orgânicos, sócio, pagando uma taxa anual. As
porções dos ingredientes orgânicos segundo as normas técnicas de cada despesas do processo de certifica-
e não-orgânicos; associação de agricultura orgânica; ção constam de taxa de visita para
c) os produtos compostos que não b) certificação de produtos alimentícios inspeção e despesas com quilome-
atenderem às exigências contidas de origem orgânica, manufaturados tragem e hospedagem (Quadro 2);
nas alíneas “a” e “b”, anteriormente ou processados por firmas ou indús- b) processo de certificação: por ocasião
mencionadas, não serão rotulados trias, segundo as normas técnicas da inspeção da propriedade, é elabo-
como orgânicos. de cada associação de agricultura rado um questionário ou relatório
Água e sal adicionados não poderão orgânica; técnico que é, em seguida, analisado
ser incluídos no cálculo do percentual de c) certificação de insumos naturais de pela comissão técnica da entidade,
ingredientes orgânicos. origem orgânica, biológica, mineral para verificar o enquadramento da
Todas as matérias-primas deverão estar ou física, tais como: fertilizantes propriedade dentro das normas téc-
listadas no rótulo do produto, em ordem orgânicos e minerais, extratos de nicas. A propriedade deverá receber
de peso percentual, de forma que fique claro plantas, preparados biodinâmicos, inspeções durante o ano, que ates-
quais são os materiais de origem certificada sementes, mudas e outros propá- tem a observância das normas e
orgânica e quais não são. gulos vegetativos produzidos por comprovem a liberação dos selos
Todos os aditivos deverão estar lista- viveiristas orgânicos; implementos correspondentes ao volume a ser
dos com o nome completo. Quando o per- e aparelhos próprios para a agricul- comercializado. Para o fornecimento
centual de ervas e condimentos for infe- tura orgânica; aditivos naturais e do selo ou etiqueta orgânica, a enti-
rior a 2%, estes poderão ser listados como outras substâncias de uso autoriza- dade cobra uma taxa com custo
“temperos”. do na manufatura, processamento, variável, mantendo um controle
embalagem, estocagem e transporte rígido da sua emissão, para garantir
MODALIDADES DE de alimentos orgânicos. Tais insu- o emprego correto destes. As pro-
CERTIFICAÇÃO mos devem ser produzidos ou extraí- priedades orgânicas devem, obriga-
O processo de certificação e de auto- dos e aplicados de acordo com as toriamente, manter uma contabili-
rização do uso de um selo oficial é feito normas técnicas de cada associação dade e controle administrativo das
para três modalidades: de agricultura orgânica. suas atividades que comprovem o
emprego das normas e a saída e en-
a) certificação de propriedades (fazen-
ETAPAS DA CERTIFICAÇÃO trada de produtos;
das, sítios, chácaras, granjas etc.) ou
partes da propriedade (hortas, poma- a) filiação à certificadora: para filiar-se c) período de transição: caso não se-

QUADRO 2 - Demonstrativo resumido dos custos de certificação da AAO e do IBD


AAO IBD
Descrição
(R$) (R$)
(1)
Filiação 60,00/ano ————
(2)
Inscrição ———— De 100,00 a 3.000,00
(3)
Diária de inspeção 120,00 a 200,00 265,00 a 420,00

Deslocamento, hospedagem etc. A combinar A combinar

Análises de resíduos Depende do caso. Na maioria das vezes, não é Sempre exigida. Valores entre 240,00 e 790,00 por
exigida princípio ativo, por amostra

Uso da marca 1% do valor recebido pelo produto comercializado 0,5% a 2,0% do valor anual comercializado ou um valor
com a marca da entidade pré-fixado em alguns casos do mercado interno
NOTA: AAO – Associação de Agricultura Orgânica; IBD – Instituto Biodinâmico.
(1) Caso o produtor não queira se filiar, os valores terão um acréscimo de 50%. (2) De acordo com o movimento financeiro anual. (3) Na AAO as visitas
são semestrais e no IBD, anuais.

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Café Orgânico 147

ja aprovado imediatamente como trados pelo departamento técnico da mento de comércio justo que estabelece
produtor orgânico, geralmente são certificadora; critérios especiais para um comércio sus-
apresentadas sugestões ou indica- f) produtos proibidos, estocados na tentável, principalmente em pequenas
do um consultor independente para propriedade devido aos sistemas de propriedades, opõe-se a um desenvolvi-
orientar o interessado nas alterações cultivo convencionais anteriores à mento injusto do setor. As normas mais
necessárias para sua posterior apro- certificação, deverão ser cadastra- importantes são:
vação. Normalmente, as proprieda- dos e controlados através de visitas a) uma parte fixa da receita (do preço
des passam por um período de tran- de inspeção. No caso de descarte, final) é utilizada para programas
sição de até doze meses na produção deverá ser relatado e comprovado o sociais, dentro da comunidade ou
de hortaliças e cultivos anuais, e de destino do produto, que deverá aten- cooperativa de trabalhadores;
até dezoito meses em cafeicultura e der também às normas e leis do meio
cultivos perenes, para obterem a cer- b) as relações de comércio são estabe-
ambiente;
tificação. lecidas, visando sua manutenção a
g) na constatação de que, na proprie- longo prazo;
dade com cultivos paralelos ou em
ALGUMAS CARACTERÍSTICAS c) parte da receita é destinada direta-
transição na área vizinha, há o uso
DO PROCESSO DE de pulverização com agrotóxicos ou mente aos produtores de forma que
CERTIFICAÇÃO outras práticas convencionais po- venha a torná-los mais indepen-
luentes ou degradadoras do ambien- dentes, sem necessitar da ajuda de
a) o certificado orgânico é de caráter
te, barreiras físicas deverão existir créditos oferecidos por bancos, que
temporário, cabendo ao Departa-
para que impeçam ou minimizem a cobram, em geral, altas taxas de ju-
mento Técnico, através do Conselho
contaminação ou degradação da ros.
de Certificação, ratificar ou rejeitar
pedidos de certificação, como can- lavoura, do solo e/ou área certifica- Tanto a agricultura orgânica como o
celar, a qualquer tempo, a certificação da, bem como dos mananciais para comércio justo consideram o bem-estar do
da unidade produtora, sendo que, irrigação. ser humano como prioridade principal,
nesse caso, o produtor poderá recor- visando o desenvolvimento sustentável de
rer da decisão através do Conselho CERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL todos os agentes envolvidos no processo.
de Ética e Recursos da entidade; (COMÉRCIO JUSTO) Do ponto de vista dos produtores euro-
b) o Departamento Técnico será encar- O mercado de café orgânico é deter- peus, os dois conceitos deveriam ou pode-
regado de administrar o programa de minado por consumidores relacionados riam unir-se porque utilizam questionários
certificação, podendo realizar visitas com as questões ligadas à saúde, health semelhantes na inspeção, podendo, nesse
ao associado, a qualquer momento food market, mas a publicidade desse tipo caso, economizar forças e trabalho. Já do
que lhe for conveniente, por agenda- de produto vem-se deslocando para um ponto de vista dos consumidores euro-
mento ou inesperadamente; mercado de consumidores que têm em peus, os dois movimentos possuem focos
mente questões de caráter ambiental e de padrões e critérios bastante distintos: o
c) as taxas de admissão, inspeção para
social. Esse fenômeno vem ocorrendo prin- comércio justo é mais direcionado ao pro-
cadastramento ou atualização e aná-
cipalmente na Europa, onde a imagem de cesso em si, enquanto que a agricultura
lises solicitadas por quaisquer das
um comércio ético, fair trade, tem sido orgânica sustenta-se no método de produ-
partes ocorrerão por conta do pro-
ligada à imagem da agricultura sustentá- ção. O comércio justo inicia-se normalmente
dutor, sendo que, no ato do paga-
vel e orgânica (CONSELHO..., 1997). em cooperativas com baixíssimos níveis de
mento destas, não fica implícito a
O movimento de comércio justo (fair justiça social, abrindo caminhos para possí-
aprovação da unidade produtora
trade) começou há 25 anos, como uma veis soluções ao longo do desenvolvi-
como orgânica;
forma de conceito educativo, utilizando mento da cooperativa ou organização em
d) qualquer visita de inspeção deve ser métodos alternativos de comércio para questão. Nesse caso, a justiça social é um
separada da assessoria e/ou consul- mostrar ao público europeu as injustiças e objetivo a ser alcançado durante todo o
toria e venda de insumos e produ- os desequilíbrios sociais causados pelo processo. Já na agricultura orgânica, os pa-
tos; comércio internacional. Naquela época, as drões devem ser alcançados e as normas
e) os estabelecimentos que fabricam condições de comércio (terms of trade = cumpridas, visando obter a justiça social,
somente produtos orgânicos não relação entre o preço da matéria-prima e o antes mesmo do processo de certificação,
devem possuir insumos proibidos. bem processado) começavam a desenvol- mantendo-os durante todo o tempo.
No caso de produtos tolerados, estes ver-se intensamente a favor dos países Considerando-se as perspectivas de
deverão ser autorizados e cadas- industrializados. Formou-se, então, o movi- produtores e a percepção dos consumi-

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148 Café Orgânico

dores europeus, como mencionado acima, organicamente ou café “orgânico”. Londres, BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
conclui-se que a cooperação entre os dois 1997. 19p. Apostila.
ALIMENTOS orgânicos: selo para garantir ori-
movimentos deve ser intensificada. Apesar gem e qualidade. In: AGRIANUAL 2000. Anuá-
INSTITUTO BIODINÂMICO DE DESENVOL-
de já existirem alguns programas de tra- VIMENTO RURAL. Diretrizes para o padrão rio da Agricultura Brasileira. São Paulo: FNP, 2000.
balho mútuos, é necessário que os efeitos de qualidade orgânico “Instituto Biodinâ- p.65-66.
de sinergia que surgem, devido às seme- mico”. 9.ed. Botucatu, 2000. 67p. ASSOCIAÇÃO DE AGRICULTURA ORGÂNI-
lhanças existentes em ambos os conceitos,
CA. Manual de certificação, normas de pro-
sejam mais bem aproveitados. SILVA, M.A.C. da. Normatização e certificação
dução e regulamentos. São Paulo, 2000. 21p.
da produção orgânica: presente e futuro. In: CON-
REFERÊNCIAS FERÊNCIA BRASILEIRA DE AGRICULTURA PASCHOAL, A.D. Produção orgânica de ali-
BRASIL. Ministério da Agricultura e do Abasteci- BIODINÂMICA, 3., 1998, Piracicaba. Anais... mentos: agricultura sustentável para os séculos
mento. Instrução Normativa, no 7, de 17 de maio A agroecologia em perspectiva. São Paulo: Se- XX e XXI. Piracicaba, 1994. 191p.
de 1999. Dispõe sobre a produção de produtos cretaria de Estado do Meio Ambiente, 1998. PENTEADO, S. R. Introdução à agricultura
orgânicos vegetais e animais. LEX – coletânea p.163-165. orgânica: normas e técnicas de cultivo. Campi-
de Legislação e Jurisprudência: legislação fe- nas: Grafimagem, 2000. 113p.
THEODORO, V.C. de A. Caracterização de
deral e marginália, São Paulo, ano 63, t.5, p.2465-
sistemas de produção de café orgânico, em THEODORO, V.C. de A.; CAIXETA, I.F.;
2476, maio 1999.
conversão e convencional. 2001. 214p. Dis- PEDINI, S. Bases para a produção de café
CONSELHO INTERNACIONAL DO CAFÉ. sertação (Mestrado em Fitotecnia) - Universida- orgânico. Lavras: UFLA, 1999. 68p. (UFLA.
Análise agroeconômica do café cultivado de Federal de Lavras, Lavras. Boletim Técnico de Extensão, 38).

Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/15, p.136-148, jan./abr. 2002


Café Orgânico 149

Comercialização de café orgânico


Ivan Franco Caixeta1 Resumo - São ressaltadas as qualidades do
Sérgio Pedini2 café produzido sob sistema orgânico que
conta com a preocupação com o ambiente,
com o trabalhador rural e com a remuneração
justa ao produtor, estimulando, também,
aqueles preocupados com a saúde, com o
bem-estar social e ecológico. São discutidas
as potencialidades do mercado do café
orgânico e as metas dos grupos envolvidos
neste sistema.
Palavras-chave: Cafeicultura orgânica; Merca-
do orgânico; Potencialidade.

1
Engo Agro, M.Sc., Prof. Escola Superior de Agricultura e Ciências de Machado (ESACMA) / Presidente da Associação de Cafeicultura Orgânica
do Brasil (ACOB), Rua Major Feliciano, 1000, CEP 37750-000 Machado-MG. Correio eletrônico: caixeta@axnet.com.br
2
Engo Agro, M.Sc., Prof. Escola Superior de Agricultura e Ciências de Machado (ESACMA) / Secretário Executivo da Associação de Cafeicultura
Orgânica do Brasil (ACOB), Rua 7 de Setembro, 222, CEP 37750-000 Machado-MG. Correio eletrônico: spedini@axnet.com.br

Informe Agropecuário, Belo Horizonte,v.23, n.214/215, p.149-152, jan./abr. 2002


150 Café Orgânico

INTRODUÇÃO Poço Fundo, de Jacuí e de Nova Resende, Peru, Costa Rica, Nicarágua, Guatemala e
A cafeicultura orgânica, assim como Assessoria e Serviço a Projetos em Agri- outros países latino-americanos estão cul-
toda a agricultura orgânica, ainda depende cultura Alternativa (AS-PTA), Rede e com tivando café orgânico. O México foi o pri-
de estudos e pesquisas mercadológicas outros produtores independentes que se meiro país a ter o seu café certificado como
para definir suas características, pois ainda organizam para participar das feiras de pro- orgânico. Hoje, México e Peru são os prin-
não se constitui numa cadeia com con- dutores orgânicos. Todos os envolvidos cipais fornecedores. Outros países como a
tornos perfeitamente definidos. As poucas têm o intuito de divulgar e difundir as técni- Indonésia, Uganda, Tanzânia e Etiópia
informações disponíveis têm dificultado a cas, os métodos de produção de café orgâ- estão planejando cultivar café orgânico
visualização e o funcionamento dessa ca- nico e a comercialização de seus produtos. (FALTAM..., 1999).
deia de um modo claro e coordenado, exis- Mais recentemente, o Estado e entidades A agricultura orgânica reaparece como
tindo ainda pontos obscuros a ser deli- financeiras, como o Banco do Brasil, tam- uma alternativa para tentar reequilibrar os
neados, os quais exigem estudos mais bém vêm participando e estimulando esse exageros e os desequilíbrios causados pe-
profundos. mercado, em especial, a Delegacia Federal la agricultura química que, apesar de altas
No agronegócio café orgânico, os elos de Agricultura de Minas Gerais (DFA-MG) tecnologias e da chamada revolução verde,
da cadeia mostram-se bastante fragmen- através da formação do Colegiado Estadual, não resolveu a falta de alimentos no mun-
tados e com poucas possibilidades de ar- que visa fortalecer e dar credibilidade oficial do, mas trouxe grandes danos ao nosso
ticulação, porque estão quase que total- a esse segmento. ecossistema e à qualidade de vida do con-
mente voltados para a produção. Poucos Produtores independentes e ONGs têm- sumidor.
conseguiram desenvolver mecanismos ou se esforçado para organizar e dinamizar os Hoje, a pressão por parte de organiza-
alianças estratégicas que fortalecessem o mercados interno e externo, dando credibi- ções internacionais e do próprio consumi-
movimento até o consumidor final. Tem-se lidade e dinamismo a esse grande filão dor, quanto a aspectos de preservação e
observado uma presença marcante de Orga- mercadológico, que se impõe como uma sustentabilidade do ambiente, tem levado
nizações Não-Governamentais (ONGs), que força capaz de revolucionar a cafeicultura os órgãos públicos a adotarem medidas
se esforçam sobremaneira no sentido de nos países em desenvolvimento. restritivas quanto ao uso dos recursos na-
facilitar a comercialização. Existe a neces- turais. Isso proporcionou uma legislação
sidade de união dessas ONGs para que se MERCADO própria para a adequação de tecnologias,
fortaleçam, buscando uma coordenação visando à preservação e à qualidade ambi-
A agricultura orgânica está em franca
geral da cadeia que leve a ganhos em todos ental.
expansão em todo o mundo. Na Europa e
os segmentos. A comercialização dos produtos lim-
nos Estados Unidos, a área cultivada sem
O envolvimento institucional que englo- pos ou orgânicos vem-se deslocando de
defensivos agrícolas está crescendo 30%
um mercado onde os consumidores preo-
ba esses segmentos é composto basica- ao ano e, no Brasil, o aumento anual chega
cupavam-se sobretudo com a saúde, para
mente pela atuação de associações, das a cerca de 10%. A agricultura orgânica tem
um mercado onde, além disso, tem-se em
ONGs e do Estado. As cooperativas ainda sido tema de recentes debates sobre os
mente questões de caráter ambiental e so-
estão tímidas, talvez por sua grande depen- rumos da produção e é hoje uma realidade
cial.
dência financeira na venda de agroquími- nacional e internacional (FOLHA..., 1998).
O consumidor tem consciência de que
cos. As ONGs têm o importante papel de “O setor de café orgânico é o segmen-
a maior proporção do prêmio ou ágio que
orientar e organizar os diferentes segmen- to que mais cresce dentro do setor de ca-
ele paga a mais, irá favorecer o ambiente,
tos da cadeia, além de discutir e estabelecer, fés especiais, mercado que movimenta,
contribuir para uma maior eqüidade socio-
com as associações, os códigos, normas e anualmente, US$18 bilhões e a expectativa
econômica, além de chegar diretamente aos
certificação, de maneira mais justa e regio- é de que haja aumento na produção e na
produtores rurais (fair trade).
nalizada. Os melhores resultados desse demanda nos próximos anos. Segundo
Pesquisas do Instituto Gallup ressal-
trabalho estão acontecendo entre certifica- Dave Griswold, presidente do Environment
tam alguns resultados interessantes, sobre
doras como a Associação de Agricultura Committee of the Specialty Coffee Asso-
o potencial de mercado de produtos orgâ-
Orgânica (AAO), Instituto Biodinâmico ciation of America, o “orgânico” é respon-
nicos na capital paulista:
(IBD), Centro de Assessoria Sapucaí (Sapu- sável por 5% do segmento de cafés espe-
caí), que atuam em Minas Gerais e seguem ciais que, por sua vez, representa de 20% a a) cerca de 72% da população aceita pa-
normas internacionais que precisam ser 30% do mercado norte-americano do pro- gar 20% a 30% a mais por produtos
adaptadas para as condições brasileiras. duto. O café orgânico é o segmento que se comprovadamente sem agrotóxicos;
Esse assunto deve ser amplamente debati- desenvolve mais rápido, com um cresci- b) mais de 70% da população sabe que
do com associações como a Associação de mento anual de 18% comparado com os consome produtos com agrotóxicos
Cafeicultura Orgânica do Brasil (ACOB), 8% ou 9% para o restante do mercado de e do efeito nocivo à saúde que estes
Associação de Pequenos Produtores de cafés especiais, disse Griswold. O México, proporcionam;
Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.23, n.214/215, p.149-152, jan./abr. 2002
Café Orgânico 151

c) mais da metade da população (52%) POTENCIAL DE MERCADO DO de cafés de qualidade, com garantias
já tem conhecimento da existência CAFÉ ORGÂNICO de origem e certificação do produto,
de produtos sem agrotóxicos; O café é a segunda maior commodity para as diversas exigências do con-
d) uma imensa maioria (90%) sente-se em valor, no mercado mundial, seguida do sumidor final;
insegura e gostaria de dispor de um petróleo. Os cafés especiais, entre eles o c) o mercado interno tem condições de
certificado de garantia da qualidade orgânico, são os únicos produtos que estão absorver quantidades expressivas
e procedência dos produtos. com crescimento expressivo em todos os destes cafés diferenciados, pois, atual-
principais mercados consumidores mun- mente, o percentual é muito pequeno
Esses resultados mostram o imenso
diais, como é o caso de toda a Europa, Amé- diante de um mercado consumidor
potencial para o mercado de produtos sem
rica do Norte e Japão. Em todos eles e nos próximo a 15 milhões de sacas/ano;
defensivos agrícolas entre os consumi-
principais países produtores, a cafeicultura d) os principais países consumidores
dores brasileiros.
orgânica é considerada um filão expressivo, dos cafés diferenciados são também
No mercado internacional, essa reali-
por valorizar os aspectos ambiental, social os que mais consomem o café tradi-
dade ainda é mais expressiva. Tem-se hoje,
e econômico. Não existem barreiras para cional, como os EUA, a Alemanha,
algo em torno de 24 mil produtores certifi-
os cafés produzidos sem agrotóxicos ou o Japão, os Países Baixos, a Suíça, a
cados, distribuídos entre a Europa (10 mil),
que não afetam o ambiente. Itália, a França, a Áustria, a Espanha,
os EUA (10 mil) e outros países (4 mil). No
Podem-se ressaltar alguns aspectos o Canadá, entre outros;
Brasil, estimam-se mil produtores certifi-
importantes, quanto ao potencial do mer-
cáveis. e) a grande dificuldade de comerciali-
cado de café orgânico:
Dados sobre uma pesquisa de mercado zação dos cafés diferenciados é en-
em alguns países, com relação aos prin- a) para o Brasil, é uma ótima oportu-
contrar os caminhos de vendas dire-
cipais atributos dos produtos orgânicos, nidade de melhorar a imagem de seus
tas. Para isso, é necessária a busca
concluem que o “preço é o de menos” (Qua- cafés de qualidade, de forma compe-
de alianças estratégicas. O produtor
dro 1). titiva no mercado internacional, e
precisa ter bons contatos, volume e
A influência de garantias ecológicas oferecer um produto saudável e que
uma qualidade uniforme do produ-
sobre o desejo de compra de produtos preserve o ambiente;
to e ainda, uma grande confiabili-
orgânicos na França é apresentado no Qua- b) há condições, em um curto período, dade e ética profissional para atender
dro 2. de oferecer quantidades expressivas com presteza os exigentes compra-
dores;
QUADRO 1 - Principais atributos dos produtos orgânicos avaliados por consumidores em países do
f) outra grande dificuldade encontrada
Norte e do Sul
é o chamado “Custo Brasil”, que one-
Países do Norte Países do Sul ra nossa capacidade de exportar. Se
Principais atributos
(%) (%) esse custo fosse reduzido, melhorar-
Natural 46,6 73,1 se-iam as condições de concorrer-
Saudável 73,1 48,6 mos com produtores de outros países.
Nutritivo 26,7 35,0
Barato 9,1 4,7 METAS DOS
Sem substâncias agrotóxicas 64,8 57,6 GRUPOS ENVOLVIDOS NO
Vitaminas e sais minerais 38,9 28,1 MERCADO ORGÂNICO
FONTE: Instituto Biodinâmico (IBD).
A agricultura orgânica não é uma volta
QUADRO 2 - Incitação na compra de produtos orgânicos, por consumidores da França
ao passado, como muitos afirmam, nem se
trata de um grupo que repudia as pesquisas
Características pesquisadas Percentual
tecnológicas; ao contrário, procura também
O produto tem garantias de higiene e segurança 84
somar informações e buscar novas tecno-
O preço é competitivo 81
logias que visem uma produção mais limpa
O produto é produzido na França 74
ou projetos que integrem todo o ecossis-
O produto porta sinal de qualidade 71
tema. Prova disso é o grande passo que já
A marca inspira confiança 68
O produto tem garantias ecológicas 64
foi dado com a tecnologia do plantio di-
O produto é fabricado na minha região 59 reto. Até bem pouco tempo, o sistema con-
O fabricante do produto defende causas humanitárias 51 vencional de plantio era um dogma e hoje
O produto é fabricado na Europa 49 o plantio direto é uma realidade, inclusive
FONTE: Instituto Biodinâmico (IBD). para o plantio de café em grandes áreas.

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152 Café Orgânico

As principais metas dos grupos envol- consumo de cafés especiais é ainda muito GOVERNO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
vidos na produção e comercialização de pequeno, apesar de apresentar um cresci- Itamar Augusto Cautieiro Franco
Governador
café orgânico são: mento expressivo. No caso específico do
a) conseguir o apoio de instituições, uni- café orgânico, os produtores ligados à SECRETARIA DE ESTADO
DE AGRICULTURA, PECUÁRIA E
versidades e entidades afins, no sen- ACOB contribuem com uma produção de ABASTECIMENTO
tido de desenvolver projetos de pesqui- pouco mais que 0,2% da produção bra- Paulino Cícero de Vasconcellos
sileira, conforme estimativas do ano de Secretário
sa que dêem suporte e segurança ao
produtor, ao trabalhador rural e ao 2000. Entretanto, desde 1992 esse cresci-
consumidor, aumentando a produti- mento é de mais de 100% ao ano. Do ano
vidade e a qualidade do produto, que de 1998 para o ano 2000, o Brasil passou de
um volume de 22 mil para 60 mil sacas e de EPAMIG
tenham custo de produção acessível Empresa de Pesquisa Agropecuária de
e promovam uma renda digna ao pro- 6 produtores, em 1997, para mais de 50 pro-
Minas Gerais - EPAMIG
dutor; dutores, no ano 2000.
Presidência
Fernando Cruz Laender
b) buscar o comércio justo, onde o pe- CONSIDERAÇÕES FINAIS Diretoria de Operações Técnicas
queno produtor tenha seus ganhos Marcelo Fideles Braga
O café orgânico não é um modismo que Diretoria de Administração e Finanças
assegurados, mesmo com uma pe-
passará, como dizem os pessimistas, mas Ricardo Saud
quena produção. Deve ser tarefa das Gabinete da Presidência
um produto que ganha mercado a passos
instituições de pesquisa, das asso- Sylvio Santos Vasconcellos
largos, onde existem muitos consumidores Assessoria de Marketing
ciações e do próprio governo criar
envolvidos interessados e não somente Luthero Rios Alvarenga
estratégias que encontrem soluções Assessoria de Planejamento e
ecologistas radicais. O mercado consumi-
mercadológicas e estimulem os gru- Coordenação
dor fortalece-se em todo o mundo, princi- Maria Lélia Rodriguez Simão
pos de pequenos produtores a ter um
palmente nos países desenvolvidos, o que Assessoria Jurídica
maior acesso à comercialização do José Geraldo Ribas
não deixa de ser uma forma de transferir
café orgânico; Assessoria de Informática
riquezas destes países para os menos desen- Mauro Lima Baino
c) aprimorar a certificação, adequando- volvidos, pois os cafés orgânicos e espe- Auditoria Interna
Geraldo Dirceu de Resende
a às peculiaridades das regiões tro- ciais sempre conseguem um prêmio ou ágio
Departamento de Pesquisa
picais, diferentes daquelas de clima na sua comercialização. Por ser um produto Glória Zélia Teixeira Caixeta
frio, é de suma importância para sua nobre, não só por suas qualidades, mas Departamento de Produção
Edson Marques da Silva
aplicabilidade. O consumidor final e por sua preocupação com o ambiente, com
Departamento de Ações e Desenvolvimento
o produtor devem ter a tranqüilidade o trabalhador rural e com a remuneração Francisco Lopes Cançado Júnior
de saber de onde vem e com quais justa ao produtor, estimula consumidores Departamento de Recursos Humanos
José Eustáquio de Vasconcelos Rocha
garantias ele recebe um produto em também preocupados com a saúde e com Departamento de Patrimônio e
sua mesa. Não somente garantias de questões sumamente importantes como o Administração Geral
qualidade, mas garantias sociais, da Marlene do Couto Souza
bem-estar social e ecológico.
forma de produção e de proteção do Departamento de Contabilidade e Finanças
José Roberto Enoque
ambiente; REFERÊNCIAS
Centro Tecnológico-Instituto de Laticínios
FALTAM padrões para o “café orgânico”. Gazeta Cândido Tostes
d) fortalecer as associações, tanto de
Mercantil, São Paulo, 8 set. 1999. Geraldo Alvim Dusi
pequenos produtores como do pro-
FOLHA DE SÃO PAULO, São Paulo, 20 out. Centro Tecnológico-Instituto Técnico de
duto café. Isso vem fortalecer o setor, Agropecuária e Cooperativismo
aumentar o poder de comercialização 1998. Agrofolha. Marco Antonio Lima Saldanha
e de marketing. Como exemplo, um Centro Tecnológico do Sul de Minas
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA Adauto Ferreira Barcelos
ano após a fundação da ACOB, já se
PASCHOAL, A. D. Produção orgânica de ali- Centro Tecnológico do Norte de Minas
colhiam resultados promissores em Cláudio Egon Facion
mentos: agricultura sustentável para os séculos
termos de reconhecimento, tanto po- Centro Tecnológico da Zona da Mata
XX e XXI. Piracicaba, 1994. 191 p.
lítico quanto comerial, apesar do pe- Domingos Sávio Queiróz
queno número de associados; PRIMAVESI, A. O manejo ecológico do solo: Centro Tecnológico do Centro-Oeste
agricultura em regiões tropicais. 4.ed. São Paulo: Waldir Botelho
e) promover a filantropia com fins so- Centro Tecnológico do Triângulo e
Nobel, 1982. 541 p.
ciais e ecológicos, buscando resgatar Alto Paranaíba
THEODORO, V.C. de A. ; CAIXETA, I.F.; Roberto Kazuhiko Zito
desastres que danificaram pessoas e o
PEDINI, S. Bases para a produção de café A EPAMIG integra o Sistema Nacional
ambiente em qualquer parte do mundo. de Pesquisa Agropecuária, coordenado
orgânico. Lavras: UFLA, 1999. 68p. (UFLA.
pela EMBRAPA
No Brasil, tanto a produção quanto o Boletim Técnico de Extensão, 38).

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