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A Metáfora
A Metáfora
A Metáfora
REFERÊNCIAS
Paul Ricoeur (1913-2005)
_ 1913, Valence, França - 2005, Rennes
_ 1956-1965: Sorbonne
_ o sentido próprio de uma palavra é dado pelo pertencimento a um agrupamento previamente dado, a
um gênero e a uma espécie de coisas; o sentido figurado se liga a uma palavra ou termo emprestado
de outra categoria (RICOEUR, 1975, p. 66)
_ o termo emprestado, tomado em seu sentido figurado, é substituído a uma palavra ausente [...]. Entre
o sentido figurado do termo de empréstimo e o sentido próprio da palavra ausente [...] existe uma razão
de transposição. (id.)
. Função identificante (ou singularizante) e função predicativa (universal) são atravessadas pela
metáfora. “La fonction identifiante désigne toujours des Êtres qui existent (ou dont l’existence est
neutralisée, comme dans la fiction); [...] la notion d’existence est liée à la fonction singularisante du
langage [...]. En revanche, la fonction prédicative concerne l’inexistant en visant l’universel. [...] La
dissymétrie des deux fonctions implique donc aussi la dissymétrie ontologique du sujet et du prédicat.”
(RICOEUR, 1975, p. 94)
Três momentos da metáfora e duas dobras
2. A metáfora e a predicação no campo da semântica
Traços do discurso
. Todo ato de discurso abrange um aspecto de locução e de ilocução. A ilocução é aquilo que se
realiza ao dizer. É de especial importância o ato ilocucionário subjacente e presente na constatação (e na
metáfora): é a crença ou a hipótese de verdade.
. Todo ato de discurso aponta uma referência ao mundo e uma referência ao locutor. “La référence
est elle-même un phénomène dialectique, dans la mesure où le discours se réfère à une situation, à une
expérience, à la réalité, au monde, bref à l’extra-linguistique, il se réfère aussi à son propre locuteur par
des procédés qui sont essentiellement de discours et non pas de langue.” (RICOEUR, 1975, p. 98)
_ nova pertinência semântica, atribuída ao ente singular, que faz reidentificar a identidade inicial
Três momentos da metáfora e duas dobras
3. A metáfora e o discurso para a hermenêutica
_ Uma nova problemática emerge com esse novo ponto de vista [hermenêutico]: não se trata mais da
forma da metáfora enquanto figura de discurso focalizada sobre a palavra; nem mesmo apenas o sentido
da metáfora enquanto instauração de uma nova pertinência semântica; mas a referência do enunciado
metafórico enquanto poder de ‘redescrever’ a realidade. [...] A metáfora se apresenta, então, como
uma estratégia de discurso que, ao preservar e desenvolver a potência criativa da linguagem, preserva e
desenvolve o poder heurístico implantado pela ficção. (RICOEUR, 1975, p. 10; ênfase nossa)
_ [...] um parentesco estabelecido [...] entre o funcionamento da metáfora nas artes e o funcionamento
dos modelos nas ciências. (id., p. 11)
Três momentos da metáfora e duas dobras
4. Metáfora e realidade
_ [...] por sua estrutura própria, a obra literária desdobra um mundo apenas sob a condição de que seja
suspensa a referência do discurso descritivo. [...] Pode ser, com efeito, que o enunciado metafórico
seja precisamente aquele que mostra claramente a relação entre referência suspensa e referência
desdobrada. Assim como o enunciado metafórico é aquele que conquista seu sentido como metafórico
sobre as ruínas do sentido literal, ele é também aquele que adquire sua referência sobre as ruínas do
que podemos designar, por simetria, de sua referência literal. (RICOEUR, 1975, p. 279)
_ A visão do semelhante, que produz o enunciado metafórico, não é uma visão direta, mas uma visão que
podemos chamar, ela também, de metafórica [...]. [O] novo estado de coisas é percebido apenas na
espessura de um estado de coisas deslocado por um desprezo categorial. (RICOEUR, 1975, p. 290)
Três momentos da metáfora e duas dobras
4. Metáfora e realidade
_ A função poética [...] visa redescrever a realidade pelo caminho desviado de uma ficção heurística. A
metáfora é, a serviço da função poética, a estratégia do discurso pela qual a linguagem se despoja de
sua função de descrição direta para aceder ao nível mítico, no qual sua função de descoberta é
desbloqueada. Podemos nos arriscar a falar de verdade metafórica para designar a intenção ‘realista’
que se liga ao poder de redescrição da linguagem poética. (RICOEUR, 1975, p. 311)
_ [...] a pretensão do enunciado metafórico de alcançar, de alguma maneira, a realidade. Para dizê-lo da
forma mais radical possível, é preciso introduzir a tensão no ser metaforicamente afirmado. Quando o
poeta diz: “a natureza é um templo onde pilares viventes…”, o verbo ser não se limita a religar o
predicado ‘templo’ ao sujeito ‘natureza’ segundo a tensão tripla que descrevemos; a cópula não é
somente relacional; ela implica, além disso, que, pela relação predicativa, é redescrito aquilo que é
[...] (id.; ênfases do autor)
Três momentos da metáfora e duas dobras
4. Metáfora e realidade
_ [Ernst Cassirer] não chega a distinguir apenas dois sentidos do verbo ser: o sentido relacional e o
sentido existencial? Esse seria o caso se tomássemos o próprio verbo ser em sentido literal. Mas não
haveria, para o próprio verbo ser, um sentido metafórico, no qual seria mantida a mesma tensão
encontramos inicialmente nas palavras (entre natureza e templo), depois entre as duas interpretações
(interpretação literal e interpretação metafórica), enfim entre a identidade e a diferença? (id.)
Três momentos da metáfora e duas dobras
5. “Não é” e “é como”: a metáfora no limiar entre imaginação e conhecimento
_ [...] chega-se assim a reiterar a tese do caráter ‘tensional’ da verdade metafórica e do ‘é’
[metafórico] que carrega a afirmação. [...] Não há outro modo de fazer justiça à noção de verdade
metafórica que não seja pela inclusão da ponta crítica do ‘não é’ (literalmente) na veemência ontológica do
‘é’ (metaforicamente). [...] É essa constituição tensional do verbo ser que recebe sua marca gramatical no
‘ser-como’ da metáfora desenvolvida em comparação, ao mesmo tempo que está marcada a tensão entre
o mesmo e o outro na conjunção relacional.
[...] a função do poeta não é contar o que aconteceu, mas aquilo que poderia acontecer, o que é possível
(ARISTÓTELES, Poética, 1451a, 37-40)
INDICAÇÕES, por Drummond (trecho)
Te olhei. E há um tempo
Entendo que sou terra. Há tanto tempo
Espero
Que o teu corpo de água mais fraterno
Se estenda sobre o meu. Pastor e nauta
REFERÊNCIAS E BIBLIOGRAFIA
BEARDSLEY, Monroe.The Metaphorical Twist. Philosophy and Phenomenological Research. Vol. 22,
No. 3 (Mar., 1962). pp. 293-307
KOHL, Katrin. Metapher. Stuttgart: Verlag J. B. Metzler, 2007.
PELLAUER, David and DAUENHAUER, Bernard. Paul Ricoeur. The Stanford Encyclopedia of
Philosophy (Spring 2021 Edition), Edward N. Zalta (ed.). Disponível em:
https://plato.stanford.edu/archives/spr2021/entries/ricoeur/. Acesso em 30/abr/2021.