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SUSI PADILHA
Na internet
João de Almeida mostra
a cruz em Anitápolis, um
símbolo do Combate da
Serra da Garganta
No diario.com.br, o inter-
nauta vai encontrar fotos
antigas e atuais, mapa
interativo, documentos e
jornais da época e vídeos
com entrevistas sobre a
marcha revolucionária em
SC. E poderá conferir em
um infográfico como foi a
passagem dos rebeldes em
solo barriga-verde. Em um
áudio, com locução de JB
Schüller e graças à tecnolo-
gia 3D, será possível voltar
no tempo, ficar ambienta-
do na história e entender
por que a tomada de
Florianópolis foi decisiva
para a chegada de Getúlio
Vargas ao poder.
SC no caminho da história
A Revolução de 1930, que completa 80 anos em outubro, teve passagens marcantes em solo barriga-verde
ÂNGELA BASTOS núcleos populacionais da época, cidades do interior e em outros Depois, os corpos foram trans- Henrique Rupp Júnior ao seu
essas cidades tiveram suas áreas estados, se mantinha fiel ao sis- ladados – conta o aposentado líder Oswaldo Aranha dá ideia
A
nitápolis, entre a Mata ocupadas por acampamentos. tema do centro do país. João de Almeida Coelho Sobri- da movimentação dos revo-
Atlântica e distante 80 Pontos estratégicos foram toma- Para atingir o Rio, o comboio nho, 74 anos, de Anitápolis. lucionários em solo barriga-
quilômetros do mar, é dos, acessos bloqueados, comu- de Getúlio Vargas seguia de Nascido seis anos depois do verde. Rupp se deslocou para
marco de um movi- nicações interrompidas. Mas, di- trem e chegava a cidades como combate, o aposentado lem- Araranguá, onde se juntou aos
mento revolucionário deflagra- ferentemente de Florianópolis, Porto União, na divisa com o bra o que ouvia os mais velhos revolucionários.
do 80 anos atrás. Uma cruz em que seria a última entre as capi- Paraná. Para ocupar Florianó- contarem. Ele recorda que no O mesmo telegrama, que
madeira, a 18 quilômetros do tais brasileiras a se render, mui- Centro da cidade foi montado teria sido enviado também
Centro da cidade, com cerca de tos em SC simpatizavam com a um acampamento para 700 ao presidente Fúlvio Aducci,
3,3 mil moradores, na Grande causa e davam acolhida aos re- homens. A população ficou dá conta de que uma coluna
Florianópolis, registra o Comba- volucionários. Outros tantos se A população de muito assustada. Mas, ao con- com 6 mil homens se diri-
te da Serra da Garganta. juntavam às tropas. trário do que esperavam os giu para Blumenau. Mais 1,5
Trata-se de um dos episódios Além da estrada de ferro, Anitápolis ficou moradores, a violência deu-se mil desceram de Bom Retiro.
mais sangrentos da Revolução de principal ligação com o centro assustada com apenas no campo de batalha. Enquanto 8 mil da Coluna
1930. O lugar, no alto de uma es- do país, os lenços vemelhos, – As chances dos legalistas Litoral, comandados pelo ge-
trada em curvas, é símbolo do le- como eram chamados os rebel- um acampamento eram poucas, pois os revolu- neral Ptolomeu de Assis Bra-
vante irrompido em 3 de outubro des, chegaram a Santa Catarina que reunia cionários eram em maior nú- sil, marchavam sobre Floria-
daquele ano, no Rio Grande do por três frentes e a cavalo. Uma mero. Contam que um bugrei- nópolis. No livro Tombados e
Sul, e que atingiu Santa Catarina. delas foi a Coluna Miguel Costa 700 rebeldes ro (caçador de índio) indicou Esquecidos, o autor Valmir Le-
À frente da também chamada (que praticamente seguiu a li- em pleno Centro uma trilha pela serra, o que mos faz uma observação com
marcha revolucionária estava nha do trem em direção a Porto deixou o grupo encurralado. base em sua pesquisa:
Getúlio Vargas. Sua estratégia União). Outra foi a Coluna do da cidade Quem não morreu ficou ferido “De acordo com infor-
era chegar ao Rio de Janeiro, Nordeste (Vacaria–Lages), e, ou fugiu para o mato – explica. mações em documentos da
capital federal na época, e depor ainda, a Coluna do Litoral (Tor- época, no momento em que
o presidente Washington Luíz. res–Araranguá). Telegramas para chegava em Palhoça, o efetivo
Entre os objetivos da insatisfa- polis era necessário avançar por Aranha e Aducci total da coluna não ultrapas-
ção estavam o rompimento da Serra da Garganta: palco Anitápolis. A presença de forças sava 2,5 mil homens, o que,
chamada política do café com de um sangrento combate legalistas entrincheiradas na Pelas estações de Porto convenhamos, era muito su-
leite, que culminou com a elei- Serra da Garganta forçou o san- União e União da Vitória (PR) perior aos cerca de 500 que
ção de Júlio Prestes e o assassi- O monumento de Anitápolis grento combate. passaram 20 mil homens vin- em terra defendiam a Ilha.”
nato de João Pessoa. prova a resistência da Força Pú- – Aqui morreram oito ho- dos do RS em direção ao centro Fatos que marcaram esta
Cidades catarinenses como blica Catarinense em defesa da mens, sete da Força Pública do país. O dado consta no livro história são contados nestas
Porto União, Lages, Joinville, Blu- Capital do Estado. Mesmo com Catarinense e um revolucio- Apontamentos Históricos de páginas do Diário Catarinen-
menau, Tubarão e Araranguá tes- o cerco a Florianópolis, o gover- nário. Foram enterrados nes- União da Vitória (1768-1933), se e no diario.com.br.
temunharam os deslocamentos no liderado por Fúlvio Aducci, te lugar, menos o gaúcho, que escrito por Cleto da Silva.
das colunas rebeldes. Principais ao contrário do que ocorria em deve ter sido levado para o RS. Um telegrama enviado por angela.bastos@diario.com.br
40 Geral
REVOLUÇÃO DE 1930
FOTOS DIEGO REDEL
“É preciso
reacender
a história”
Pesquisadora Karla Nunes diz que episódio
teve reflexo direto na queda da Velha República
A
professora Karla Leono- ral Nestor Sezefredo dos Passos
ra Dashe Nunes é uma (Ministério da Guerra) e o contra-
estudiosa da Revolução almirante Arnaldo Siqueira Pinto
de 1930. Sua pesqui- da Luz (Ministério da Marinha).
sa para a tese de doutorado pela Isso pode ter tido consequên-
Universidade Federal de Santa Ca- cias na forma como o governo de
tarina (UFSC) durou cinco anos.
Parte feita no Arquivo Histórico
Santa Catarina se comportou. Os
cargos de ministros pareciam ter Bombardeio HERMÍNIO NUNES
do Exército, no Rio de Janeiro. caráter de “um presente”ao Estado
– Sou uma inconformada em e não de um “reconhecimento”. no Estreito
saber que muitos catarinenses
desconhecem este importante A chegada dos Ramos Sob a Ponte Hercílio Luz, o apo-
episódio da história que vai ter ao poder após 1930 sentado Osman Noceti, 72 anos,
reflexo direto na queda da Velha recorda das escaramuças da Revo-
República – observa. Os principais e mais influentes lução de 1930 na Capital.
Karla é coordenadora do cur- representantes do Partido Re- Noceti ouviu dos mais velhos re-
so de especialização de História publicano Catarinense eram os latos sobre a presença dos rebeldes
Militar, na Unisul, e prepara para irmãos Adolpho Konder, Marcos no Estreito. Especialmente do pe-
outubro um congresso acadêmico Konder, Victor Konder e Fúlvio ríodo em que a chamada Divisão
sobre os 80 anos do movimento. Aducci, entre outros. Da Alian- Litoral do general Ptolomeu de As-
A pesquisadora lembra que San- ça Liberal, entre os nomes mais sis Brasil estacionou neste local do
ta Catarina, por meio de sua Força conhecidos estão Nereu Ramos, Continente. A posição fez com que
Pública Militar, aliada às forças Francisco Barreiros Filho, Oswal- o barco fosse castigado pela arti-
militares federais da Marinha e do do Mello e Gustavo Neves. lharia dos navios de guerra fiéis ao
Exército, não conteve o movimento. Com a Revolução e suas con- governo. Entre 13 e 23 de outubro,
Mas representou um estorvo para a sequências, os Ramos, que não os bombardeios ocorreram dia-
força revolucionária: tinham vez no poder, até então riamente. Apesar de visados pela
– As memórias, as narrativas, exercido pelos Konder Reis, con- artilharia dos destróieres, desde
os documentos produzidos sobre seguem alcançá-lo. Imbituba, não sofreram uma úni-
esses conflitos foram, curiosamen- A mudança de estrutura de po- ca baixa. As granadas causaram
te, deixados à parte, minimizados. der é, na opinião da professora, estragos em propriedades de Pa-
Não os encontramos na historio- uma das diferenças visíveis em SC lhoça, São José e no Estreito.
grafia nacional, quer no campo da depois de 1930. – Os rebeldes se amontoaram
história política ou mesmo militar. pelo lado de cá. Dizem que a pon-
A professora lembra que a Re- te foi eletrificada e que a madeira
volução era apoiada por parte da Profes- do piso foi retirada para eles não
oligarquia, porém, o governador sora prepara atravessarem para a Ilha.
do Estado, que à época era o re- um congresso Pescador por mais de 50 anos,
cém-empossado Fúlvio Aducci, acadêmico em Noceti recorda o que ouvia depois
manifestou total apoio a Washing- outubro, mês que a Revolução acabou:
ton Luiz. que marca os
– Depois, casas foram demolidas
Naquele governo, foram três ca- e encontrada munição. Era gente
80 anos da
tarinenses ministros: Victor Kon- simpática à causa, mas que não fa-
der (Ministério da Viação), gene- Revolução lavam com medo de perseguição.
o ódio
de vargas
Jutta Hagmann tinha quatro anos
quando os revolucionários chegaram
a Joinville. O pai era funcionário do
Banco do Brasil e, com a notícia da
chegada dos rebeldes, ele foi aconse-
lhado a mudar-se para mais perto do
Batalhão de Caçadores.
– Papai contava que, certa manhã,
viu um caminhão passando com cor-
pos de rebeldes e soldados do governo.
Jutta conta que sua família não ti-
nha envolvimento com os revolucio-
nários, mas lembra da morte do pri-
mo Laudelino Menezes. O rapaz foi
convocado para o batalhão em Porto
União, onde morreu afogado.
– Não sei se por isso, mas minha
tia tinha um ódio muito grande de
Getúlio Vargas.
A cor
Medo e Fuga encarnado
Therezinha Wolff é assessora de
para o mato Porto União Mafra Joinville
Cultura em Porto União. Autora de
Dona Luci Pacheco da Rosa tem dois livros, cartilhas e artigos em
92 anos. Uma senhora aposentada jornais, reúne material fotográfico
com uma memória privilegiada que sobre a passagem dos revolucio-
vive no Bairro do Estreito, em Flo- nários pela cidade localizada no
rianópolis. Luci era uma “mocinha” Itajaí Planalto Norte de Santa Catarina.
quando os revolucionários de 1930 Blumenau – A cor encarnado (vermelha)
chegaram à região de Florianópolis. Chapecó era da moda, principalmente pe-
Sua família morava em Ratones, in- Herval Rio do Sul los estudantes que se alinhavam
terior da Ilha de SC. com as ideias revolucionários.
Na época, lembra, tudo era muito Therezinha conta que a cidade
distante. As informações eram pou- ficou em polvorosa com a chegada
Marcelino
polis
cas e o medo se espalhava entre a São José do comboio trazendo Getúlio Var-
população. Ramos gas, no dia 16 de outubro:
Lages
ianó
Impulsos
O
registros da passagem era um homem de rádio. Soube
dos rebeldes e as im- explorar como ninguém o veículo
plicações da marcha de grande massa. Seus discursos
revolucionária por incendiavam a nação. Mas, espe-
da juventude
Santa Catarina estão nos jornais cialmente sobre a Revolução de
da época. Em alguns, o chamado 30 em SC, o rádio não teve grande Em 1980, o poeta Mario Quin-
distanciamento da notícia parece papel divulgador. A explicação é tana foi entrevistado pelo jorna-
ausente. Isso tem uma explicação, de Ricardo Medeiros, doutor em lista Sérgio da Costa Franco, no
observa o professor de Jornalismo Rádio pelo Departamento de His- Correio do Povo, de Porto Alegre.
Francisco Karam, da Universida- tória da Université du Maine (Lê O jornal publicava um suplemen-
de Federal de Santa Catarina. Mans-França). to especial sobre os 50 anos da
Naquela época, especialmen- – Nossa primeira emissora de rá- Revolução de 1930. Na entrevista,
te, os jornais transmitiam ideais. dio surgiu em Blumenau, em 1937. o jornalista perguntou:
Havia aqueles engajados nas lu- Algumas famílias tinham aparelhos – Do que adiantam as revolu-
tas revolucionárias e os que de- antes disso e sintonizavam emisso- ções?
fendiam a manutenção do poder ras do Centro do país. No começo, o Quintana respondeu, sugerindo
e das elites. Uma realidade sem rádio era coisa da elite e a maioria outra pergunta:
tentativas de passar para o leitor da população era analfabeta, mora- Lemos: rebeldes em SC em livro Medeiros: “Rádio era coisa da elite” – Do que adiantou a Revolução
isenção ou neutralidade. Bem an- va em lugares sem energia elétrica e Francesa?
tes dos anos 1930, o país passou distante. Talvez, por isso, os ecos da A entrevista falava da partici-
por movimentos onde os jornais
tiveram grande engajamento,
revolução não tivessem tido grande
alcance por aqui. dicas de leitura pação de Quintana na Revolução
de 1930. Com 24 anos, o jovem se
como a antimonarquia e a aboli- Para o ex-comandante da Polí- CHATÔ - O REI TOMBADOS E
apresentou como voluntário no 7º
ção da escravatura. cia Militar de SC, coronel Valmir DO BRASIL ESQUECIDOS
Batalhão de Caçadores, atual 7º Ba-
As distâncias de SC do centro Lemos, os livros que hoje contam A biografia do 1930 – A Marcha
talhão de Infantaria Blindado, em
do país faziam com que jornais a história da Revolução de 1930 jornalista Assis Cha- Revolucionária sobre
Porto Alegre. O menino de Alegre-
chegassem com relativo atraso. são importantes para que não se teaubriand escrita SC, do coronel Valmir
te, ex-aluno do Colégio Militar, re-
Em média, as publicações locais perca este capítulo que teve des- por Fernando Morais. Lemos. Editora Nova
velaria um certo espírito militar.
rodavam semanalmente. Alguns dobramentos no futuro do país Editora Companhia Letra. 406 págs.
Em 3 de outubro de 1930, aten-
a cada 15, 30 dias. Muitas vezes, os (queda da Velha e surgimento da das Letras. 735 págs. Blumenau - SC.
deu ao apelo “O Rio Grande de Pé
fatos atropelavam o tempo. Mes- Nova República). São Paulo - SP.
Pelo Brasil”. Seguiu para o Rio, via
mo assim, o jornal, mesmo que Quando entrou para a reserva, ferroviária, para apoiar a derru-
não popular por causa do anal- Lemos se mostrou disposto a mos- APONTAMEN- ESTREITO
bada de Washington Luiz. Lá per-
fabetismo da população, teve seu trar parte dessa história que nem a TOS HISTÓRI- - VIDA E
maneceu por cerca de seis meses
destaque. corporação conhecia: a marcha re- COS DE UNIÃO MEMÓRIA
como soldado, retornando a Porto
– Apesar disso, e mesmo não volucionária em solo barriga-verde DA VITÓRIA Autor Iaponan
Alegre em 1931, quando retomou
sendo uma era midiática como e, especialmente, o combate da Ser- 1768–1933 Soares. Editora
a consagrada carreira de poeta. A
hoje, os impressos tiveram sua ra da Garganta, em Anitápolis. Pes- Autor Cleto da Lunardelli. 158 págs
poesia falou mais alto e Quintana,
importância naquele momento quisas, entrevistas e acesso a docu- Silva. Governo do Florianópolis - SC.
na mesma entrevista, reconheceu:
– observa Karam. mentos lhe permitiram escrever o Paraná. 250 págs.
– Foi coisa dos impulsos da ju-
Por outro lado, Getúlio Vargas livro Tombados e Esquecidos. Curitiba - PR
ventude.