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UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA

ESCOLA DE DESIGN
CURSO SUPERIOR EM MODA

Karen Oliveira de Andrade Martins

Navalha e Punhal
Proposta para o Desenvolvimento de Coleção de Moda inspirada em Zé Pelintra e
Maria Navalha

______________________________________________________
Rio de Janeiro
2021
Karen Oliveira de Andrade Martins

Navalha e Punhal
Proposta para o Desenvolvimento de Coleção de Moda inspirada em Zé Pelintra e
Maria Navalha

Relatório apresentado para a disciplina


TCC1, como parte obrigatória na composição
da nota necessária para aprovação no
semestre e ingresso no conjunto de
disciplinas de TCC2, do Curso de
Bacharelado Superior em Moda da
Universidade Veiga de Almeida - UVA.

Prof.ª Márcia Mesquita


Professor(a) Orientador(a) de TCC 1

Rio de Janeiro
2021
AGRADECIMENTOS

Primeiro, agradeço à Deus, por tudo que proporcionou em minha vida, desde
meu nascimento até agora. Aos donos da minha coroa, Oxum e Oxóssi, por serem a
minha força, meu conforto e meus pilares, quando eu não sabia mais como continuar.
Aos meus padrinhos, Ogum e Iemanjá, pelo amparo e coragem, e à Iansã, que me fez
guerreira em mais um momento de minha vida. Agradeço a todos os guias espirituais
da Umbanda, aos pretos e pretas-velhas, aos caboclos, êres, boiadeiros, marinheiros,
ciganos, baianos e baianas, exus e pombo-giras, que me escutaram chorar e pedir
força para continuar essa caminhada, e de certa forma, me deram a mão.
E por fim, nessa tão amada parte espiritual, agradeço a Maria Navalha e Seu
Zé Pelintra, grandes inspirações desse trabalho, que caminham ao meu lado e que
me aconselham sempre que preciso. Em especial à Navalha, que toma conta dos
meus caminhos, me traz coragem e alegria. Obrigada por estarem sempre comigo!
Salve a malandragem!
A meus pais, Cláudio e Deyse, e meus irmãos, Karla e Hugo, meu obrigado e
imensa gratidão, pois embarcaram comigo nesse sonho que era me formar e trabalhar
na área de criação. E que nesses quatro anos me apoiaram, me ouviram chorar, me
viram surtar e me ajudaram sempre que possível. Sei que em qualquer momento
posso contar com vocês. À Paulo Segóvia, meu companheiro e amigo, que me ajudou
em diversos momentos durante o curso. À Clauvonir Rodrigues, minha “mainha”, por
cuidar de mim na parte espiritual, e me dar o apoio que inúmeras vezes precisei. E a
todos aqueles, que ao meu lado, são filhos e filhas da Tenda Espírita de São Miguel
Arcanjo, obrigada por estarem comigo me dando apoio!
Agradeço também à minha Vó Marina - que desde pequena me ensinou a
mexer em uma máquina de costura para saber fazer roupinhas de boneca -, e minhas
tias Marina (in memoriam) - que costurava as próprias roupas e as blusas de meu avô
- e Luzia - que fez minha primeira roupa de santo. Três costureiras que amaram que
eu seguiria o caminho da moda, e que sempre que estavam comigo perguntavam
como estava a minha costura, se eu queria algum molde ou dicas de costura.
Obrigada a todos aqueles que estiveram na minha vida nesses anos, que viram
minha caminhada e meus obstáculos, mas que nunca desacreditaram de mim.
Agradeço à espiritualidade, agradeço à Deus, aos Orixás e as entidades por
essa conquista!
RESUMO

Ao decorrer desta pesquisa será apresentado um estudo teórico sobre as


entidades da Umbanda, Zé Pelintra e Maria Navalha, assim como a apresentação da
Umbanda, e os aspectos gerais de ambientes relacionados à ambas as figuras.
A partir do tema, se tem como objetivo trazer uma visão atual e versátil das
vestimentas dessas duas entidades, fazendo uma releitura das mesmas. Junto da
pesquisa histórica, pesquisas Umbandistas serão de suma importância para o
entendimento de tais entidades. Pensando trazer essa estética para um campo mais
jovem, é desenvolvida uma pesquisa de público para levantar dados que auxiliem na
criação de uma marca e uma coleção de moda que atenda ao público, onde a tradução
de aspectos e informações do tema é o foco principal.

Palavras-chave: Design de Moda, Coleção Feminina, Umbanda, Malandragem, Zé


Pelintra, Maria Navalha.
TEMA
A temática deste trabalho a seguir procura apresentar as características do
universo das entidades de Umbanda Zé Pelintra e Maria Navalha. Falando sobre a
falange dos malandros do terreiro de Umbanda, o samba e a Lapa nos anos 30/40.

JUSTIFICATIVA

Acredito ser relevante para o campo da moda ao para mostrar que coleções de
com temáticas religiosas não precisam se resumir a t-shirts com estampas localizadas
com a figura da entidade ou com estampas de pontos cantados; tendo também uma
relevância cultural de grande importância, já que tais entidades são presentes em
vários momentos no Rio de Janeiro, e a religião foi fundada no estado.

Por ser praticante da religião, falar sobre um tema que além de englobar
também a cidade que nasci, mostra como a malandragem dos terreiros de Umbanda
são sinônimo de coragem e alegria. Partindo de uma figura presente sob diversos
olhares no Rio de Janeiro, e para mim, uma entidade à qual tenho muito afeto e
gratidão, apresentar este tema rico em história de fé e resistência sob um olhar
distinto, representa a possibilidade de trabalhar a fé de uma forma mais diferenciada
no campo do design.

PROBLEMA

Tendo como um tema onde a maior parte histórica é cultura oral, e que cada
terreiro tem suas particularidades ao se tratar desta linha, ao apresentar os dois polos
da linha da malandragem, Zé Pelintra – polo masculino – e Maria Navalha - polo
feminino -, tais questionamentos são significativos: como transformar a vestimenta e
as características do malandro em uma coleção de moda sem prender ao trivial de
ternos brancos e blusas listradas? Como apresentar a estética de uma forma
desconstruída da atual perspectiva muito encontrada em esculturas e imagens,
apresentando uma nova ótica versátil e caminhando para um estilo casual e/ou
urbano?
OBJETIVO GERAL

Criar peças de vestuário feminino, inspiradas na alfaiataria clássica presente


no tema, com modelagens contemporâneas, respeitando o clássico, mas
modernizando para virarem peças versáteis, onde possam ser usadas tanto para um
passeio na orla da praia sob um olhar casual, como para uma reunião de trabalho.
Assim, busca-se trazer a roupagem do malandro remodelada e as retratações da
Maria Navalha para o universo diário feminino.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

• Apresentar a Umbanda
• Discorrer sobre a linha dos malandros dentro da Umbanda
• Identificar características das entidades desta linha
• Apresentar Zé Pelintra e Maria Navalha e suas características
• Descrever e relacionar as referências já conhecidas ao falar sobre tais
entidades
• Apresentar o período em que a calça se tornou presente no vestuário feminino
• Pôr em prática o conhecimento de técnicas assimiladas durante o curso de
Design de Moda, elaborando uma coleção de moda.

METODOLOGIA

Para a realização deste trabalho acadêmico, pode-se descrever a aplicação de


três etapas: levantamento de estudo teórico e recolhimento de vivências e
aprendizados nos terreiros por meio de entrevistas, pesquisa e análise de público
consumidor e interpretação de possíveis norteadores estéticos para a coleção a ser
desenvolvida.
No capítulo 1, para a pesquisa teórica, foram selecionados textos acadêmicos,
artigos e livros de estudos sobre a religião, tais como “Zé Pelintra: Concepções sobre
a Umbanda e o Malandro” de Rodrigo de Souza da Silva, “Aspectos Psicológicos do
Zé Pelintra da Cultura do Rio de Janeiro” de Adriano Lima Souza, “Os guias espirituais
da Umbanda e seus atendimentos” de Lurdes de Campos Vieira, entre outros, que
abordam a religião e a entidade neste trabalho. Ainda no mesmo capítulo, será
abordada uma pesquisa histórica no campo da moda e do Rio de Janeiro,
ambientando ambos os assuntos no universo do tema.
Em seguida, no segundo capítulo, será apresentada a pesquisa de público,
juntamente com a análise, que tem como objetivo elucidar o público escolhido e a
possibilidade de veiculação de uma coleção de moda voltada a ele. Juntamente com
a criação e planejamento de uma marca autoral.
No terceiro, e último capítulo, trará possíveis similares do tema, esclarecendo
a estética escolhida que será um dos pilares para o desenvolvimento posterior de uma
coleção de moda atemporal feminina, além de apresentar a proposta de coleção a ser
idealizada, apontando possível paleta de cor, beneficiamentos, modelagens etc.

6. RESULTADOS ESPERADOS

Se espera deste trabalho a obtenção de material teórico que será usado como
inspiração para a criação de produção de uma coleção de moda feminina a ser
desenvolvida a partir de referências e detalhes extraídos do tema apresentada, a linha
dos malandros nos terreiros de Umbanda.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Disponível em: https://www.entreriosjornal.com.br/coluna-conhecendo-a-


umbanda-1685
Figura 2 - Disponível em: https://cefeco.wordpress.com/2015/05/19/as-umbandas-
dentro-da-umbanda/
Figura 3 - Disponível em: https://umbandaead.blog.br/2017/01/13/7-linhas-de-
umbanda/
Figura 4 - Disponível em: https://www.kickante.com.br/campanhas/salve-
malandragem
Figura 5 – Fotografia cedida pelos médiuns
Figuras 6 - Disponível em:
https://www.facebook.com/media/set/?vanity=salgueirooriginal&set=a.983015258440
239
Figura 7 - Disponível em: https://www.instagram.com/p/CHxspwkn5Eo/
Figura 8 - Disponível em:
https://tuflecheiroezepinga.blogspot.com/2017/08/malandros-de-ze-pilintra.html
Figura 9 - https://filhadeyansa.tumblr.com/post/121775836873/maria-navalha-na-
umbanda-maria-era-uma-moca
Figura 10 - Disponível em: https://www.instagram.com/p/CHVS7hmH9nD/
Figura 11 - Disponível em:
https://i.pinimg.com/originals/56/e6/2f/56e62fa2f921e20cb8873aaae9250770.jpg
Figura 12 (1) - Disponível em: https://www.instagram.com/p/Bo6tQ1GnCRe/
Figura 12 (2) – Fotografia cedida pelo médium
Figura 13 – Fotografias cedidas pelo médium
Figura 14 (1) - Disponível em:
http://salveamalandragem.blogspot.com/2013/03/maria-navalha.html
Figura 14 (2) - Disponível em: https://www.instagram.com/ventos_de_oya/
Figura 15 (1) - Disponível em: https://www.amandala.com.br/marianavalha-
pombogira20cm/prod-2781818/
Figura 15 (2) - Disponível em: https://www.cimaartesorixas.com.br/produtos/estatua-
pombagira-maria-navalha/
Figura 15 (3) - Disponível em: https://www.giselyartesa.com.br/MLB-1448095765-
maria-navalha-40cm-_JM
Figura 16 (1) - Disponível em: https://www.casadocigano.com.br/chapeu-linha-da-
malandragem-navalha-branco
Figura 16 (2) - Disponível em: https://produto.mercadolivre.com.br/MLB-
1535510937-so-os-3-chapeus-de-panama-de-ze-malandro-e-maria-navalha-_JM
Figura 16 (3) – Imagem cedida pela médium
Figura 17 – Disponível em:
https://www.facebook.com/media/set/?vanity=salgueirooriginal&set=a.983015258440
239
Figura 18 - Disponível em: http://conteudo.som.vc/samba-da-ilegalidade-a-
identidade-nacional/
Figura 19 - Disponível em:
https://raizdosambaemfoco.wordpress.com/2013/10/23/o-samba-e-a-censura/
Figuras 20 e 21 - Disponível em: http://brasilianafotografica.bn.br/?p=11127
Figura 22 - Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Malandragem#/media/Ficheiro:Arcos_da_Lapa.jpg
Figura 23 - Disponível em: http://www.blogdopaulonunes.com/v4/?p=28650
Figura 24 - Disponível em: http://wellingtondeayra.comunidades.net/lenda-de-ze-
pelintra2
Figura 25 – Imagem Instagram
Figura 26 (1) - Disponível em: https://diariodorio.com/santuario-em-homenagem-a-
ze-pelintra-e-vandalizado-na-lapa-antes-mesmo-da-inauguracao/
Figura 26 (2) - Disponível em:
https://twitter.com/nossosorixas/status/1347414472382689280
Figura 27 (1) - Disponível em: http://revide.blogspot.com/2014/07/greta-garbo-
segundo-ingmar-bergman.html
Figura 27 (2) - Disponível em: https://www.revistalofficiel.com.br/moda/10-fatos-
sobre-coco-chanel
Figura 27 (3) - Disponível em: https://medium.com/cinesuffragette/marlene-dietrich-a-
v%C3%AAnus-loira-17b7c2952593
Figura 28 - Disponível em: https://vintagedancer.com/1940s/womens-1940s-pants-
styles/
Figura 29 (1) - Disponível em: https://vintagedancer.com/1940s/womens-1940s-
pants-styles/
Figura 29 (2) - Disponível em:
http://vintageretroblog.canalblog.com/archives/2020/05/20/38307138.html
Figura 30 - Disponível em: https://g1.globo.com/mundo/noticia/morre-aos-96-anos-a-
heroina-de-cartaz-simbolo-do-feminismo.ghtml
Figura 31 (1 e 2) - Disponível em: https://www.menteflutuante.com.br/2014/10/anos-
40-moda-e-guerra.html
Figura 31 (3) - Disponível em: https://www.elinorflorence.com/blog/wartime-star-
weekly/
Figura 32 (1) - Disponível em: https://www.rebelsmarket.com/blog/posts/what-did-
women-wear-in-1940s-women-s-fashion-and-clothing-from-the-1940s
Figura 32 (2) - Disponível em:
http://vintageretroblog.canalblog.com/archives/2020/05/20/38307138.html
Figura 33 (1) - Disponível em: http://bloshka.info/2018/04/21/1930s-fashion/
Figura 33 (2) - Disponível em: http://bloshka.info/2019/01/05/1940sfashion/
Figura 34 - Disponível em: https://vintagedancer.com/1940s/where-to-buy-modern-
zoot-suits/
Figura 35 - Disponível em: https://www.flickr.com/photos/floridamemory/6298592762
Figura 36 – Compilação da autora
Figura 37 – Logo criada pela autora
Figura 38 – Compilado de fotos retiradas do blog, feito pela autora, disponível em:
https://www.sammijefcoate.com/
Figura 39 – Compilação da autora
Figura 40 – Disponível em: https://www.krya.com.br/store
Figura 41 – Disponível em: https://www.facebook.com/kryastore
Figura 42 – Disponível em: https://www.instagram.com/kryastore/
Figura 43 – Compilado de fotos dos produtos, feito pela autora, disponível em:
https://www.krya.com.br/store
Figura 44 – Disponível em: https://www.usenaloo.com/shop
Figura 45 – Disponível em: https://www.instagram.com/usenaloo/
Figura 46 – Disponível em: https://www.facebook.com/usenaloo/
Figura 47 – Compilado de fotos dos produtos, feito pela autora, disponível em:
https://www.usenaloo.com/shop
Figura 48 – Compilado de fotos do desfile, feito pela autora, disponível em:
https://www.vogue.com/fashion-shows/fall-2021-ready-to-wear/michael-kors-
collection
Figura 49 – Compilado de fotos do desfile, feito pela autora, disponível em:
https://www.vogue.com/fashion-shows/fall-2021-ready-to-wear/michael-kors-
collection
Figura 50 – Compilado de fotos do lookbook, feito pela autora, disponível em:
https://www.vogue.com/fashion-shows/resort-2021/brandon-maxwell
Figura 51 – Compilado de fotos do lookbook, feito pela autora, disponível em:
https://www.vogue.com/fashion-shows/resort-2021/brandon-maxwell
Figura 52 – Compilado de fotos do desfile, feito pela autora, disponível em:
https://www.vogue.com/fashion-shows/fall-2020-ready-to-wear/alexander-mcqueen
Figura 53 – Compilado de fotos do desfile, feito pela autora, disponível em:
https://www.vogue.com/fashion-shows/fall-2020-ready-to-wear/alexander-mcqueen
Figura 54 – Disponível em: https://ericjavits.com/collections/spring-summer-straw-
beach-bags-2021
Figura 55 – Disponível em: https://archello.com/project/casa-atibaia
Figura 56 – Disponível em: https://archello.com/project/casa-atibaia
Figura 57 – Compilado de capturas de tela do videoclipe feito pela autora, disponível
em: https://youtu.be/n5YbZr2cfxA
Figura 58 – Compilado de capturas de tela do videoclipe feito pela autora, disponível
em: https://youtu.be/n5YbZr2cfxA
Figura 59 – Compilação da autora
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 14

Capítulo 1 - Zé Pelintra e Maria Navalha: precursores da malandragem ........... 15


1.1 A Umbanda ........................................................................................................ 15
1.2 A Malandragem ................................................................................................. 19
1.2.1 Zé Pelintra: rei da boêmia ........................................................................... 26
1.2.2 Maria Navalha: em malandro ela dá nó ....................................................... 29
1.3 Redutos da Malandragem: Samba, Lapa e Rio de Janeiro ................................ 33
1.3.1 O Samba..................................................................................................... 33
1.3.2 A Lapa ........................................................................................................ 37
1.3.3 O Rio de Janeiro e a Malandragem ............................................................. 39
1.4 A moda nas décadas de 1930 e 1940 ................................................................ 43
1.4.1 Moda Feminina ........................................................................................... 43
1.4.2 Moda Masculina .......................................................................................... 47

Capítulo 2 – Pesquisa de mercado e consumidor ............................................... 50


2.1 Público-alvo ....................................................................................................... 50
2.2 Segmento - Moda Sustentável: Slow Fashion .................................................... 67
2.3 A Marca.............................................................................................................. 69
2.4 Plano de negócios para marca própria - Olidratins ............................................. 71

Capítulo 3 – Similares e proposta de coleção ...................................................... 90


3.1 Jacquemus ......................................................................................................... 90
3.2 Brandon Maxwell ............................................................................................... 92
3.3 Alexander McQueen ......................................................................................... 94
3.4 Eric Javits........................................................................................................... 97
3.5 Casa Atibaia ..................................................................................................... 98
3.6 Videoclipe Despedida - Mc Tha ....................................................................... 100
3.7 – Proposta de coleção...................................................................................... 101

BIBLIOGRAFIA ..................................................................................................... 104


ANEXO .................................................................................................................. 108
ANEXO I – Fichamentos ....................................................................................... 108
ANEXO II – Entrevistas Transcritas ...................................................................... 130
ANEXO III – Entrevistas (Prints)............................................................................. 132
14

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objeto de estudo as entidades Zé Pelintra e Maria


Navalha, figuras religiosas da linha da malandragem da Umbanda, seus aspectos e
localidades referentes a eles. Junto com a pesquisa histórica e entrevistas com
umbandistas, será apontado a moda nas décadas de 30 e 40, com o objetivo de
determinar possíveis ligações entre o tema, o período histórico e a moda.
Para melhor entendimento dos símbolos e os referenciais das entidades, será
feita uma pesquisa da origem de Zé Pelintra, assim como seus aspectos como
entidade na Umbanda, trazendo ligação do samba e da Lapa com a figura do malandro
carioca e a figura religiosa do mesmo.
No segundo capítulo será feita uma pesquisa de público com a finalidade de
identificar o público consumidor, bem como hábitos de consumo, gastos com
vestuário, preferência de modelagens e cores etc. No mesmo capítulo será levantado
informações sobre duas possíveis concorrentes, Na.Loo e Krya, com o objetivo de
discorrer sobre suas estratégias, produtos e modelagens.
Finalizando o capítulo 2 com o desenvolvimento de um plano de negócios para
uma nova marca, Olidratins, que criará produtos para o mesmo público das
concorrentes citadas acima.
No terceiro, e último, capítulo, serão apontados estudo de similares para
nortear a coleção a ser desenvolvida. Assim como a proposta de coleção, onde será
descrito como será abordado o tema e seus simbolismos. No mesmo capítulo terá
algumas idealizações sobre possíveis formas, beneficiamentos e tecidos.
15

Capítulo 1 – Zé Pelintra e Maria Navalha: precursores da malandragem

Neste capítulo será apresentado a Umbanda, trazendo como foco desta


pesquisa as entidades Zé Pelintra e Maria Navalha - entidades da Linha dos
Malandros na Umbanda - bem como a Lapa e o Samba, que se tornaram a identidade
da malandragem.

1.1 A Umbanda

A umbanda é uma religião brasileira, que tem seu mito fundador datado em
1908 no dia 15 de novembro, sendo anunciada por Zélio Fernandino de Moraes, que
de acordo com a história, em sua época, foi espírita kardecista, mas em uma
determinada sessão incorporou1 o Caboclo das Sete Encruzilhadas, dando início a
religião que é conhecida hoje.

Figura 1: Foto de um altar de Umbanda

A Umbanda trabalha com Caboclos, Pretos e Pretas-Velhas, Exus e Pombo-


Giras e erês (crianças espirituais), já que em reuniões kardecistas eram (e ainda é)
comum espíritos de escravos, negros e indígenas serem caracterizados como
incapazes de obter uma elevação espiritual (Da Silva, 2020), sendo taxados de
atrasados espiritual, cultural e moralmente. (ROHDE, 2009).

1
Incorporação: ato de manifestação do espírito/entidade através do corpo do médium.
16

Cabe ressaltar também, que alguns estudiosos e pesquisadores acreditam,


principalmente na concepção de Rodhe, que a Umbanda não nasceu apenas em
novembro de 1908, pois seus ritos seriam recorrentes a séculos, principalmente no
século XVII, com a escravidão e a forma de resistência dos escravos com a sua
religião. Porém, é afirmado que a data carrega um valor simbólico, mesmo que
somente em 1930 é reconhecido os cultos umbandistas com as características de
rituais que é conhecido atualmente.
A Umbanda é uma religião que engloba características e crenças do
espiritismo, catolicismo e raízes africanas, tendo como missão e lei suprema, a
caridade para com os outros, ou seja, ajudar aqueles que precisam por acreditarem
que está é a sua missão terrena. Dentro da própria religião, encontramos dois
aspectos: Umbanda Branca, onde não há presença de atabaques, assentamentos,
oferendas (rituais de raiz africana), os santos católicos são mais cultuados; e a
Umbanda Omolokô, também conhecida, mais comumente, como Umbanda “traçada”
pelos adeptos, que se acredita ter sido “criada” por volta de 1950 por Tancredo Da
Silva Pinto2, onde há presença dos rituais de origem africana, hierarquia dentro do
terreiro, culto aos Orixás3 etc. (Souza, 2016) Mesmo assim, não é comum fazer o
distanciamento entre as “duas Umbandas”, e sim utilizando a palavra doutrina para
diferenciar os cultos divergentes entre casas/terreiros de Umbanda, sendo hoje
também mais habitual que em todas as casas seja cultuado Orixás Africanos (figura
2).
Dentre eles, podemos citar os nove Orixás que, tem maior visibilidade, e em
alguns casos maior culto, porém é necessário esclarecer que o panteão africano não
se resume apenas a eles: Oxalá, Orixá masculino, Pai maior; Ogum, Orixá masculino
guerreiro; Oxóssi, Orixá masculino caçador; Xangô, Orixá masculino da justiça;
Obaluaê/Omulu, Orixá masculino da cura, Yemanjá, Orixá feminino do mar e mãe de
todas as cabeças; Oxum, Orixá feminino dos rios e do amor; Iansã, Orixá feminino
dos ventos e tempestades; Nanã Buruquê, Orixá feminino dos lagos e pântanos, e da
criação.

2
Tancredo da Silva Pinto foi um dos maiores nomes da religião, médium e escrito de livros dobre a Umbanda.
3
Orixás: Divindades africanas do povo Iorubá.
17

Figura 2: Orixás Africanos, presentes no Panteão Umbandista

Geralmente na Umbanda é cultuado as sete linhas de Umbanda (figura 3), que


seriam as manifestações vibracionais de Deus, sendo representados pelos Orixás,
como é explicado por Alexandre Cumino, cientista da religião (bacharelado pela
UNICLAR) e sacerdote de Umbanda Sagrada, em seu curso sobre a religião,
Umbanda EAD. Dentro dessas sete linhas, os Guias Espirituais, suas linhas de
trabalho e falanges trabalham sob regência de cada Orixá, obedecendo a doutrina de
caridade dentro da religião.

Figura 3: As Sete Linhas da Umbanda


18

As linhas de trabalho são as manifestações vibracionais de cada Orixá, sendo


elas sustentadas pelas energias elementais (matas, mar, pedras, fogo, etc.) Nas
falanges das Linhas de Trabalho atuam espíritos humanos que se apresentam como
Caboclos4, Pretos-velhos5, Baianos6, Boiadeiros7, Marinheiros8, Ciganos9 e outros.
(VIEIRA, 2015)
Uma “Linha” na Umbanda, é a uma organização de espíritos que se unem
por afinidades energéticas, vibratórias e conscienciais, em torno de uma
missão, e atuam nas esferas espirituais e materiais como uma corrente de
trabalho. (FLÁVIO, 2014)

De acordo com a citação acima, nem todos os guias espirituais de determinada


linha serão, por exemplo, nem todo baiano será pai ou mãe de santo, ou nordestino.
Alguns espíritos que trabalham nessa linha, foram agrupados nela por afinidade astral.
E dentro de cada linha de trabalho atua a regência de um Orixá, podendo atuar com
a vibração de outros Orixás, como por exemplo Caboclos na linha de Oxum: Pena
Dourada, Iracema, Jandira etc.
As giras10 são iniciadas pelo ato da defumação – queima de ervas específicas
para a limpeza astral do ambiente – seguidas pelo ato de bater cabeça, que é a
reverência à religião, entidades da casa, guias espirituais e aos Orixás. A prece a
Oxalá é a única presente em todos os terreiros, sendo a sequência seguinte (qual
orixá será saudado) que difere em cada casa, pois não há um certo ou errado. Cada
casa segue um fundamento para as saudações nos ritos. (Informações coletadas na
pesquisa com umbandistas de diferentes terreiros)

4
Linha de trabalho regida por Oxóssi, sustentados pela vibração das matas e conhecimento.
5
Linha de trabalho construída a partir da referência simbólica aos ancestrais trazidos da África para
serem escravizados. Trabalham com a regência de Obaluaê e Nanã.
6
Linha de trabalho de origem mítica, remete aos antigos pais e mães de santo da Bahia, e aos
nordestinos que sofreram por preconceitos e discriminações. Trabalham com a regência de Iansã.
7
Também chamados de Caboclos de Couro. Os guias que trabalham nessa linha, em grande parte,
os que sofreram preconceito como “sem raça”. Trabalham com a regência de Iansã e Ogum.
8
Linha de trabalho regida por Iemanjá, trabalham os homens e mulheres que em suas últimas
encarnações viveram do mar, pelo mar e para o mar.
9
Linha composta por espíritos que foram ciganos quando encarnados, e os não ciganos. Regência
Egunitá, sendo sincretizada como Santa Sara Kali.
10
Sessões religiosas
19

1.2 Malandragem
“Protegida de Zé Pelintra
Maria Navalha não brinca”

(Ponto Cantado de Mª Navalha, por Juliana D’Passos)

A Linha dos Malandros, também conhecida pelos adeptos da religião como


Malandragem, é a linha de entidades que trabalham a sob regência de Zé Pelintra.
Tal linha e entidade é vista, por algumas pessoas fora da religião ou até mesmo pelo
senso comum, como algo a se temer ou de influência negativa. Contudo, estudiosos
e escritores sobre a Umbanda mostram um outro aspecto de Seu Zé, como é
comumente chamado pelos praticantes. Contrapondo toda sua má imagem e
desmitificando percepções preconceituosas.
De acordo com Lurdes de Campos Vieira, em seu livro “Os Guias Espirituais
da Umbanda e seus Atendimentos” (2015): “Como Guia Espiritual, Zé Pelintra não é
Exu11, não é Baiano, não é boêmio nem pilantra, mas pode se apresentar em diversas
Linhas de Trabalho, nos terreiros em que não há gira específica para a Linha dos
Malandros.”, sendo assim não se pode afirmar que Zé Pelintra é único e
exclusivamente exu, e sim uma entidade que tem sua própria linha de trabalho. Pode-
se dizer então que, Zé Pelintra é uma entidade sem rótulos, que pode vir para trabalhar
onde é necessário, visando sempre a caridade, lei suprema da Umbanda.
Como cita de Zeca Ligiéro em seu livro, Malandro Divino (2004), a falange de
Zé Pelintra é a única no Panteão Umbandista que pode trabalhar em diversas linhas,
ou seja, pretos-velhos, povo de rua/linha de esquerda 12 ou baianos13. Mostrando
assim sua duplicidade por caminhar em trabalhos de cura energética (linha das almas)
e proteção (povo de rua).

11
Exu: abordado aqui o exu entidade/guia espiritual. Não Esú, Orixá.
12
Povo de rua ou linha de esquerda: Exus, pombo-giras e exus-mirins.
13
Ver notas na página 4 sobre as entidades
20

Figura 4: Imagem promocional do curta metragem Salve a Malandragem!

Entidades que trabalham nessa específica linha, não são somente malandros
boêmios, como muitos leigos no assunto da religião acham, mas também espíritos
desencarnados de seres que em vida, trabalhavam em prol daqueles que obtinham
pouca assistência social e eram excluídos, como aponta Vieira (2015), sociólogos,
historiadores etc., sendo a palavra Malandro usada para denominar esse arquétipo as
entidades que falaram sobre problemas sociais e consequências. E ainda, esta linha
não é estritamente masculina, existindo e se manifestando entidades femininas, como
por exemplo, Maria Navalha.

Figura 5: Maria Navalha das Almas e Zé Pretinho da Lapa, médiuns Carolina Lanzarin e Macsuel
Douglas

De acordo com o que Vieira (2015) e Edmundo Pellizzari, Zé Pelintra (entidade


original, do Catimbó) não trabalha mais incorporado, por já ter ascendido em nível
21

espiritual, e hoje, ele coordena a da falange dos malandros, como é mostrado na


citação a seguir:
Segundo Edmundo Pellizzari, mestres receberam mensagem do astral,
comunicando que o Zé Pelintra original não baixa mais, pois acumulou muitos
méritos e assumiu outras responsabilidades, e hoje se chama ‘Zé da Luz’.
Acreditamos que o Zé Pelintra original é o Hierarca, o Cabeça de Falange
dos muitos Guias Espirituais que se apresentam na Umbanda sob a
aparência-padrão de um malandro da boemia carioca e contam diferentes
histórias de Zés, da Bahia, de Pernambuco, do Rio de Janeiro, de Alagoas,
da Paraíba. (VIEIRA, 2015, p. 209)

Figura 6: Malandros no Ensaio Técnico do Salgueiro, 2016

Esta entidade costuma ser representada com vestimentas que se assemelham


à imagem arquetípica do malandro carioca na década de 20 a 30, onde ternos de linho
branco, lenço vermelho, chapéu Panamá e sapatos bicolores são veiculadas até hoje
à sua imagem (figura 8), porém, a imagem de Zé Pelintra, mestre catimbozeiro, se
difere, ao qual se veste, também de branco, com calças com barra dobrada na altura
da canela, pés descalços, chapéu de palha e lenço no pescoço, ambos com detalhes
vermelhos. Percebemos então que as duas figuras, no entanto mesmo que diferentes,
compartilham de dois aspectos: usar branco e o vermelho como ponto de cor (nas
fitas dos chapéus e nos lenços).
22

Figura 7: Detalhes da vestimenta dos Malandros

Acredita-se que essa imagem, que remete ao malandro carioca/sambista, foi


incorporada, por retratar a adequação da entidade para uma imagem mais urbana,
quando ele começou a manifestar-se em terreiros cariocas, já que a linha de baianos
não era comum como linha de trabalho, onde ao assumir um trabalho nas giras de
povo da rua, se fundiu com modos e vestimentas cariocas, utilizando a imagem
noturna da época para revelar-se entre os praticantes da Umbanda.

Figura 8: Desenho da entidade Zé Pelintra

De acordo com Paulo Segóvia, médium que trabalha com o malandro Zé


Pelintra da Estrada, ele acredita que o fundamento do terno se dá a época boêmia em
que os malandros usavam os ternos finos, sapatos caros e lenços de seda no bolso
23

para causar uma boa aparência, desta forma, entravam nos cassinos para os jogos
de cartas e dados.

Figura 9: Modelos em ensaio fotográfico Zé Pelintra e Maria Navalha

No começo do Século XX, na estruturação da Umbanda, foi notado que os


malandros vinham nas giras de Esquerda, e a entidade se moldou ao malandro
carioca, com as vestimentas, modos de agir e falar, e adequou à categoria que
começou a se manifestar. Somente na década de 1990, nas comunidades do Rio de
Janeiro, nasce então a Linha de Trabalho dos Malandros, hoje totalmente
independente, podendo se manifestar em sessões específicas para eles, ou na de
Exu, sem haver nenhum problema. (Vieira, 2015)
Ainda na questão de vestimentas, de acordo com a mesma autora, além dos
valores de aparência da entidade, que muitos podem confundir com vaidade, suas
roupas trazem também caráter simbólico:

Dentro do chapéu Panamá e no couro dos sapatos, trazem seu mistério. O


chapéu, ornamento de respeito e credibilidade, assim como a fita que o
envolve, tem o formato de um círculo mágico que, além do respeito para com
a divindade regente do Guia, cobre e protege a coroa do médium contra
interferências externas. O couro dos sapatos associa-se magneticamente ao
couro dos atabaques. (VIEIRAS, 2015, p. 206)
24

Figura 10: Espaço/Altar para Zé Pelintra

Mas quem é a malandragem para os umbandistas? Em uma entrevista com


Adriana Aparecida dos Santos, 38 anos, residente de São Paulo, médium de
Umbanda e que trabalha com a entidade Maria Navalha do Cais, sua visão sobre a
Malandragem, é de um mistério que a Umbanda e o Candomblé não conseguem
explicar. Adriana diz ter um sentimento de gratidão e carinho pelas entidades, como
se olhasse para alguém que admira muito pela sabedoria passada para ela.
Para Tuco Borella, de 34 anos, também morador de São Paulo, médium de
Umbanda há quase 9 anos, que trabalha nas correntes mediúnicas como a entidade
Zé Pelintra das Almas, a linha de malandros vem mostrar que a malandragem é ser
inteligente, sendo então, inteligentes. “Mostram a nós os melhores caminhos nos
alertando sobre toda e qualquer demanda”.
Os guias espirituais na Umbanda utilizam o álcool e o fumo como elementos
manipulados de grande poder para a limpeza e purificação do consulente, ambiente e
médiuns. Durante os atendimentos, as entidades em terra incorporadas utilizam a
fumaça dos charutos, cachimbos, ou no caso da malandragem, cigarros, para uma
limpeza energética do períspirito14 ou aura do consulente, por meio de “baforadas.
Enquanto as bebidas trabalham como limpeza no campo energético do médium, para
que ele não absorva possíveis energias negativas do consulente (VIEIRA, 2015),
como é o caso da cerveja na linha dos malandros.

O perispírito, também conhecido como corpo fluídico dos Espíritos e “[…] que une o corpo e o
14

Espírito, é uma espécie de envoltório semimaterial. (Federação Espírita Brasileira, FEB)


25

O punhal e navalha carregado por ambas as entidades trazem o significado de


“cortar o mal”, servindo como para raio para contra vibrações de astral inferior, fazendo
a descarga eletromagnética do consulente e preservando a segurança do médium
(VIEIRA, 2015). Como pode ser percebido no ponto cantado 15 por Juliana D’Passos,
de Maria Navalha: “Ela traz uma navalha / Que corta o mal e a injustiça”; os objetos
afiados da malandragem trazem a conotação de proteção e segurança, sendo assim,
não tendo simbolismo de agressividade da entidade.
Além do punhal e da navalha, é encontrado também o baralho e os dados em
sua vibração. Conversando com a mãe de santo Clauvonir Rodrigues, ela explica que
os dados e o baralho são pontos de força de Zé Pelintra e de sua falange, pois os
guias espirituais em vida os utilizavam nos jogos, sendo assim são ligados
energeticamente com a entidade. Assim como colocar oferendas em postes, descidas
de morro, perto de bares e Lapa. Todos esses lugares são pontos de força 16 da
falange por serem ambientes frequentados por eles quando encarnados.
Em relação as oferendas, Clauvonir citou que são colocadas as comidas de
bar, com o mesmo fundamento dos dados e baralhos, sendo elas: sardinhas, queijo,
salaminho, ovos de codorna, azeitonas etc. As bebidas seguem pelo mesmo motivo,
eram encontradas nos botequins da época, cerveja, conhaque e uísque são exemplos.
Ela conta também que uma comida que ela faz para ser ofertada à Zé Pelintra, em
relação à sua origem nordestina, é a farofa com carne-seca, sendo a farofa com
linguiça a mais comum. Clauvonir ainda assinala que as comidas podem variar de
acordo com a entidade, e o que a mesma pede.
Mesmo não tendo um modo específico de colocar oferendas e objetos para as
entidades que trabalham na linha de malandros, pois variam de acordo com o
fundamento da casa e a entidade, os objetos descritos acima (como baralho, dados e
punhal) são comumente colocados por serem, novamente, pontos de força da linha.
Cravos vermelhos podem adornar as comidas dos malandros, e rosas vermelhas as
das malandras, com o comum uso velas de cores brancas e vermelhas. Onde se pode
pedir proteção, conselhos, caminhos abertos, ajuda financeira ou no trabalho.

15
Cânticos ritualísticos acompanhados por percussão em atabaques
16
Locais cuja energia e magnetismos são mais fortes, é o meio natural de sintonizar com as entidades. Podem
ser descritos como captadores e emanadores de energia.
26

1.2.1 Zé Pelintra: rei da boêmia

Alguns estudiosos acreditam que a entidade Zé Pelintra tem origem no Catimbó


uma religião do norte e nordeste do país, que tem como culto à Jurema Sagrada. O
Catimbó-Jurema é também considerada uma religião híbrida, ou seja, com influências
de outras religiões que adentraram o Brasil, sendo elas, cristianismo, religiões de
matriz africana e raízes indígenas, dentre outras. (MONT’MOR; HENEINE, 2019)

Figura 11: Pintura de Zé Pelintra feita por Maria do Carmo

A religião é xamânica, de práticas de pajelança, com a atuação de Mestres em


suas reuniões. Nos ritos é utilizado ervas e cachimbo para defumação, maracás para
chamar os espíritos ao plano carnal, e podendo ter também a presença de rezas e
imagens católicas, e como fundamento, era necessário beber a seiva da casca da
Jurema para a manifestação dos Mestres. (MONT’MOR; HENEINE, 2019)
Mas, sua ligação com Zé Pelintra se dá aos religiosos acreditarem que a
entidade fora em vida juremeiro, que ao desencarnar, foi para um local mítico e
trabalhava na assistência e cura daqueles que o procuravam. Seu Zé só se tornou
Mestre por ter sido iniciado no culto quando encarnado, pois só “baixa” na Jurema os
espíritos juremados (Vieiras, 2015). Porém a figura de Seu Zé é popular entre diversas
religiões de incorporação (Umbanda, Candomblé, Catimbó-Jurema).
27

Figura 12: Imagem Zé Pelintra na Lapa e Malandro incorporado

Na Umbanda, ele vem para ajudar aqueles que andam na noite, nas ruas.
Trazendo além da proteção, as palavras de ajuda para a vida e um ombro amigo para
as mazelas diárias. O seu ponto de força seria a Lapa, local boêmio do Rio de Janeiro,
já que José dos Anjos, pernambucano que na juventude se mudou para a capital
carioca, e conheceu o reduto do samba e da malandragem. Como Monique Augras
(1997) o descreve, “é pernambucano e cidadão carioca, sertanejo e morador da Lapa,
macumbeiro e catimbozeiro, malandro e letrado.”
No entanto, dentro da própria religião, existem aqueles que ainda acreditam
que Zé Pelintra, assim como os Exus, é um espírito “desevoluído”, como aponta
Janderson Bax Carneiro (2012) em sua dissertação, em que uma entrevista e ida à
uma gira de esquerda (nome denominado para giras de Exu), os médiuns da casa e
os próprios guias espirituais apontam como os Exus, Pombo-Giras e Malandros como
seres de baixa evolução, estando em abaixo de Pretos e Pretas-Velhas e Caboclos,
e os mesmos referem a Seu Zé como um tipo de exu, tal como é descrito no texto de
Carneiro (2012), Exu Zé Pelintra.
Em contrapartida, na entrevista com Adriana, ela afirma que os guias que
trabalham na linha da malandragem, com as suas palavras: “São únicos, portanto não
há comparação, sendo coisas distintas”. Adriana diz não concordar também com a
denominação de Exu Zé Pelintra, segundo suas palavras:
28

Se Seu Zé tem uma polaridade tão misteriosa, ele se encaixa em uma


energia, mas também se encaixa em uma energia de Preto-Velho. Isso se
encaixa não somente para os malandros, mas também para as malandras.
Porém nem todas as casas têm essa abertura. (ADRIANA, 2021)

A linha é descrita por ela como “Linha Modernizada, onde na concepção dela,
o mistério é tão forte que Zé Pelintra consegue se adaptar para a esquerda tanto para
a direita, considerando-o um povo de “linha de meio”.
Tuco, conta com a mesma ideia de Adriana. Onde ele afirma o que foi abordado
no começo do tópico, que Zé Pelintra é uma entidade que provém do Catimbó, mas
que no começo de suas manifestações, vinham juntamente com Exus e Pombo-Giras,
mas tal entidade pode trabalhar tanto da direita como na esquerda, de acordo com a
doutrina de cada casa, sendo então uma entidade que não tem lado de preferência.
De acordo com suas palavras: “Frisar que Zé Pelintra é apenas Exu seria limitar a
forma de trabalho desta entidade.”
Sobre a questão de espíritos “desevoluídos”, Tuco argumenta que “[...] Se o
espírito tem o poder de se manifestar, trazendo consigo relatos, histórias, vivências e
experiências de outras vidas, seria errado afirmar que a entidade - seja ela qual for -
é atrasada.”, trazendo uma questão que também é muito argumentada em diversos
terreiros, que apenas trabalham na Umbanda seres de luz e evoluídos
espiritualmente. Tuco, em sua fala, ainda completa

O que acontece é que cada entidade tem sua forma de manifestação e


energia. E, Zé Pelintra é uma entidade muito humilde e que traz traços de
uma vida pobre e dolorida. Em suas manifestações, apesar de prezar por
sua imagem de sempre bem-vestido, se coloca no seu lugar mas nunca se
rebaixando. Afirmar que não são evoluídos é um grande erro. (TUCO, 2021)

Zé Pelintra, como mostrado mais acima, há muito deixou de incorporar para


trabalhar fazer o seu trabalho no plano astral, sendo assim, as entidades que
trabalham sob sua falange se apresentam com diversos nome, utilizando ou não o
nome da “entidade original” (ex: Zé Pelintra da Lapa, Zé do Morro, Camisa Preta, Zé
da Estrada etc.) e, consequentemente, cada um com uma história de vida diferente.
Contudo, no processo de conseguir a autorização de uso de imagem e entrevistas, foi
encontrado um médium, Carlos Delanno, sacerdote da Umbanda e Juremeiro, que
afirma trabalhar com Zé Pelintra, Mestre Juremeiro, desde os 10 anos de idade, onde
29

o mesmo fala que é difícil de ver esta entidade por ela ter deixado de incorporar em
algumas pessoas, por já ter ascendido espiritualmente.

Figura 13: Zé Pelintra Mestre Juremeiro incorporado no médium Carlos Delanno.

No parágrafo anterior, ainda é dito que cada entidade tem sua história e
vivência, foi escolhido a história na entidade de Tuco, Zé Pelintra das Almas, para
afirmar tal passagem. Em sua história e área de trabalho é possível notar mais uma
desmitificação da imagem da entidade, a de amarração amorosa. Tuco diz que a
entidade ajuda nas questões amorosas, mas não faz amarração, e suas ligações com
os Orixás “regentes” de sua linha:

Trabalho com o Zé Pelintra das Almas, que tinha o nome de batismo de José
Augusto da Silva. Um mulato, trabalhador e que frequentava seus bares com
jogatinas. Sempre utilizava da malandragem para ganhar dinheiro em mesas
de carteado e dados. Devido a uma dívida foi morto à facadas. Trabalha na
linha de Ogum juntamente com Omolu, onde seu ponto de força é na rua do
lado de fora do cemitério. Trabalho com conselhos para o amor (não faz
amarração), para conseguir trabalho, para ajudar empresas, estudos e
conquistas que demandam empenho. (TUCO, 2021)

1.2.2 Maria Navalha: em malandro ela dá nó

Dona Navalha, como é chamada pelos médiuns, é uma entidade feminina da


Linha dos Malandros que traz os mesmos pontos de força de Zé Pelintra e da
Malandragem, como já descritos acima. Muitas vezes é confundida com pomba-
30

giras17, pois poucos são os terreiros que a cultuam dentro da linha que pertence, por
mostrarem também a feminilidade, muito vista geralmente nas pomba-giras.
De acordo com sua história mais conhecida dentre os praticantes da religião,
ela viveu na zona portuária do Rio de Janeiro no final do século XIX, mais
precisamente na primeira favela do bairro da Gamboa, Morro da Providência. Quando
jovem, perdeu os pais e teve que morar na rua, assim foi introduzida na noite e na
malandragem. Andou por cabarés, bares e ruas, e lá conseguiu sua fama e apelido.
Segundo sua história, ela bebia como marinheiro, brigava como um leão de chácara 18,
fumava como um estivador, mesmo assim sem nunca perder a feminilidade, e junto
de si, carregava sempre uma navalha. Desencarnou ao ser surpreendida em uma
noite, e levar uma faca nas costas, morreu na rua, sozinha.
Maior parte das histórias encontradas sobre a entidade, como a descrita acima,
são encontradas apenas em grupos e páginas sobre a religião na rede social
Facebook, por serem histórias relacionadas à vivência com a entidade, e que ela
passa para o médium, ou em entrevistas com médiuns que trabalham com a guia e
sabem da história de vida da mesma.

Figura 14: Pintura da entidade Maria Navalha, feita por Maria do Carmo (esq.); arte feita por Bruna
Reis (dir.)

Tal entidade se manifesta nos terreiros com samba no pé e sorriso no rosto,


trazendo os mesmos aspectos de Seu Zé. Suas roupas podem variar de saia branca,

17
Entidades femininas de linha de esquerda.
18
Forma coloquial de denominar segurança.
31

vermelha ou estampada de vermelho e branco, dando lugar à calça branca em


algumas entidades. A blusa listrada nas cores preta e branca, ou vermelha e branca,
dá lugar em alguns casos à camisas de cor lisa (branca, preta ou vermelha),e ainda
algumas malandras usam ternos branco, como os malandros (figura 14).

Figura 15: Esculturas de Maria Navalha

Como acessório de cabeça, algumas entidades têm preferência por chapéu de


Panamá branco ou preto, apenas com fitas das mesma cores que a blusa ou
adornados com flores e cartas. Em alguns casos o chapéu usado é todo preto, ou até
mesmo cartola baixa. Tal como os malandros, diversas entidades carregam o nome e
uma história (Maria Navalha da Lapa, Maria Navalha do Cais, Maria Navalha das
Almas etc.)

Figura 16: Possíveis chapéis usados pelas entidades malandras.

Em uma conversa com a médium Carolina Lanzarin Kehl, 26 anos, residente


de Santa Cruz do Sul – RS, ela conta a história de Maria Navalha das Almas, entidade
que trabalha com ela nas correntes mediúnicas. Carolina fala que a guia espiritual
ainda não contou toda sua história, mas compartilhou o que já sabe, citando que
32

Navalha (como Carolina chama) não teve moradia prolongada em um determinado


local:
Ela morou no Rio, em Minas, SP, só não no Sul como ela disse. Mas um lugar
que ela amou morar foi na Lapa. E ela sempre foi uma mulher simples, mas
nunca aceitou ser mandada por homem, nunca aceitou que ditassem as
regras e ela tivesse que seguir. Sempre reparava que tinha um horário certo
para as mulheres estarem na rua, e que depois disso, apenas as mulheres
comprometidas ou homens andavam nos botecos, tomando sua cerveja. E
por ela ser solteira, nunca aceitou de fato isso, então ela teve a ideia que se
começasse a usar roupas mais masculinas ela conseguiria ir e vir nas noites
sem ter que se submeter ao “machismo” da sociedade. Então ela começou a
utilizar calça, camiseta, suspensório e chapéu, assim ela conseguia ir e vir
nas madrugadas, nas bohemias. Porém ela viu que algumas pessoas
começaram a notar, algumas pessoas tinham interesse nela, e outras apenas
queriam se passar. Aí ela como uma boa malandra, passou a utilizar de uma
navalha para se proteger nas noites, uma arma discreta, e que conseguia ser
escondida. (CAROLINA, 2021)

Com base na história contada acima, pode-se perceber que a entidade traz o
sentimento de liberdade, de querer não ser mandada nem obedecer a regras que
impossibilitem suas ações. Para tempos atuais, é possível fazer uma ligação à frase
“lugar de mulher”, onde na sociedade, as mulheres são postas em “gaiolas”, tendo
que se encaixar e submeter em padrões. Maria Navalha das Almas traz o ensinamento
que com esperteza e malandragem, no seu tempo encarnada, conseguiu passar por
cima das regras, se vestindo daquilo que era sinônimo de liberdade: um homem.
Analisando o ponto cantado a seguir, de autor desconhecido, pode-se
exemplificar as ligações entre a entidade com os Orixás, sendo eles Ogum, Iansã e
Xangô. Ogum, Orixá guerreiro do ferro; Iansã, Orixá guerreira dos ventos e
tempestades; Xangô, Orixá da justiça. Assim, a ligação da entidade Maria Navalha
pode ser entendida como uma entidade de força (Ogum e Iansã) e justiça (Xangô).

“Coroada por Ogum


Amparada por Xangô
Com a força de Iansã
No terreiro ela chegou”

É uma entidade pouco conhecida no panteão umbandista, mas que, de acordo


com os religiosos, traz ensinamentos tais quais os malandros: o gingado para
contornar as dificuldades da vida, a sagacidade para resolver problemas e a felicidade
para caminhar, tendo em vista que tudo é passageiro.
33

Figura 17: Ensaio Técnico do Salgueiro, 2016 – Maria Navalha sendo retratada por passista

1.3 Redutos da Malandragem: Samba, Lapa e Rio de Janeiro

“Quando eu nasci, eu nasci com a perna bamba

A parteira logo disse: esse vai gostar de samba”

(Ponto Cantado de Malandro, autor desconhecido)

Aqui será abordado o samba e a Lapa, sinônimos da malandragem no Rio de


Janeiro. Tendo em vista que a imagem da malandragem nos terreiros de Umbanda
seja atrelada a figura boêmia carioca, não se pode deixar de falar de ambas as
características. Onde será falado tanto sobre a origem do samba, quanto a boêmia da
década de 30, e a Lapa, com sua história e ligação ao lado boêmio da cidade.
Finalizando com a ligação do Rio de Janeiro e a figura de Zé Pelintra.

1.3.1 O Samba

Ritmo originário de grupos de escravos africanos da Bahia no século XVIII, por


volta de 1860, os batuques ritmados foram ao longo dos anos se fragmentando e
transformando para serem inseridos na sociedade e na vida urbana, tal como diz
Muniz Sodré, jornalista e sociólogo brasileiro, em seu livro Samba – O dono do corpo:

[...] Os batuques modificavam-se, ora para se incorporarem às festas


populares de origem branca, ora para se adaptarem à vida urbana. As
34

músicas e danças africanas transformavam-se, perdendo alguns elementos


e adquirindo outros, em função do ambiente social. (SODRÉ, 1998, p. 13)

Figura 18: Arte Roda de Samba – Carybé

Acredita-se que o samba carioca, que é conhecido nos dias de hoje, tem ligação
direta com sambas de roda capoeiristas. Assim como cita Roberta Araujo, o samba
teve como seu reduto a periferia carioca, sendo sinônimo para muitos de algo atrasado
no Brasil, mas para outros era a representação da cultura do mesmo.

Desde 1910, o samba fazia sucesso na periferia e nos morros da cidade do


Rio de Janeiro. O gênero era visto, pela maioria da população, principalmente
pelas pessoas da elite, como coisa de vagabundo, de bandido. O ritmo dividia
opiniões de intelectuais. Enquanto, para alguns, ele era a maior
representação da cultura brasileira, para outros, ele representava o atraso
cultural do Brasil, pois remetia a um passado escravista que as camadas mais
altas da sociedade faziam de tudo para ser esquecido. (REIS, 2007, p. 09)

De acordo com Fenerick (2006) o malandro no samba aparece no final dos


anos 20, porém no mesmo texto a associação de malandro a vadio e morro se dá pelo
estereótipo que havia nessa determinada década:

A figura do malandro, que começou a povoar o samba por volta do final dos
anos 1920, talvez seja a denominação última de um tipo recorrente na cultura
brasileira. As características primordiais do malandro, como aquele que
recusa o trabalho e vive de expedientes e golpes aplicados em algum otário,
podem ser encontradas desde pelo menos o início do século XIX. Em lundus
e romances do século XIX, este personagem aparece com o nome de vadio,
cujo vínculo com a música popular se dá a partir de sua relação estreita com
a viola e a cachaça. (FENERICK, 2006, p. 27)

Na mesma década, o rádio havia chegado em terras brasileiras e se


popularizou, porém em vista de estar em todas as camadas da sociedade brasileira,
o samba foi incutido nas programações, assim, dez anos depois, sua popularização
35

abriu portas para a chamada “Era de Ouro”, durante o governo de Getúlio Vargas, que
utilizou o samba e sua popularidade para “pregar” o Estado Novo e a valorização do
trabalho.
No fim da década de 30, o Departamento Nacional de Propaganda (DNP) foi
substituído pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), que foi criado em
dezembro de 1939, servindo para censurar e propagar o novo governo, incluindo o
samba do malandro, que foi maior alvo da censura do DIP, onde as músicas que
tinham como foco a malandragem foram substituídas pelas de exaltação ao trabalho,
transformando então o samba como símbolo nacional, e servindo para promover as
ideias de Vargas sobre trabalho e valorização da pátria. (Reis, 2007)

Figura 19: Charge de Getúlio Vargas e o malandro, com um pandeiro em uma ratoeira

Na década de 30 o samba se transformou no símbolo de brasilidade durante o


governo Vargas, juntamente com a mídia, Carmem Miranda e o surgimento do
personagem do Walt Disney, Zé Carioca. Com a enfim popularização, o ritmo “desceu
o morro” e se tornou também algo que a classe média consumia. Assim então
deixando de ser um atraso brasileiro, e se tornando a alma da música brasileira. A
entrada da classe média ao samba, teve como grandes exemplos Ary Barroso e Mario
Lago, ambos bacharéis em direito; Alberto Ribeiro, médico homeopata; e Custódio
Mesquita, diplomado pela Escola Nacional da Música, entre outros. (Paranhos, 2003)
Noel Rosa, um jovem de classe média, morador de Vila Isabel, foi de grande
importância para legitimação do samba no “asfalto”, mas também foi quem mudou a
imagem do malandro carioca, onde era visto como uma figura arredia e vadio, e
36

afastou o samba das religiões de matriz africana, tornando o samba é apenas um


ritmo. Assim como aponta José Adriano Fenerick, doutor em História, em seu artigo
sobre o sambista:

Noel diz que em Vila Isabel o samba tem o feitiço e enfeitiça a quem o ouve,
tal como o samba era entendido anteriormente. Porém, é um feitiço diferente,
é um feitiço decente, o que de antemão já denota uma preocupação com a
aceitação social (e comercial). Tal como em Rapaz Folgado, onde Noel deixa
o malandro nu, decompondo o seu aspecto exterior (a navalha, o lenço no
pescoço, o tamanco), em Feitiço da Vila o samba também passa a ser
desprovido de suas significações exteriores. Continuando a ser feitiço, o
samba não carrega mais a significação religiosa da cultura afro-brasileira: a
vela, a farofa e o vintém. (FENERICK, 2006, p. 43)

Ao momento que Noel descaracteriza o malandro de rua (marginal) de Wilson


Batista, outro sambista com quem teve uma rixa, e utiliza o adjetivo derrotista,
afirmando que a palavra apenas serve para tirar o valor do sambista, ele entrega uma
nova imagem ao malandro, como um ser boêmio, transformando-o em um adjetivo de
“classe”, assim assinalado por Frenerick (2006) em outra passagem de seu artigo:

Noel Rosa vê o sambista/malandro como um boêmio. Nessa associação,


nasce um novo local para o samba: o botequim. O sambista/malandro boêmio
é um assíduo frequentador de botequins, seja no morro ou na cidade, e é lá
que o samba se faz com mais intensidade, e à mítica do samba do morro,
soma-se a mítica do samba de botequim como mais um elemento ‘do
verdadeiro samba’. Já se disse que o botequim é para o Rio de Janeiro o que
o pub é para Londres ou o café é para Paris: ‘antes de tudo um ponto de
encontro, um lugar de sociabilidade’. (FRENERICK, 2006, p. 33)

De acordo com Reis (2007, p. 35) “Outra coisa com a qual Noel não concordava
era a identificação do sambista como um malandro marginal. A figura do malandro em
suas músicas era mostrada por um lado mais humano, com alegrias e dificuldades.”.
Conduzindo a narrativa, mais uma vez, para a visão do malandro boêmio e alegre, e
não o quadro deturpado da personalidade há muito perpetuada.

Associar o malandro ao samba, ou mesmo tomar o malandro como sinônimo


de sambista, implica em reforçar a imagem do samba como sendo um
legítimo ‘produto do morro’, uma vez que o senso-comum da época
acreditava que os morros do Rio de Janeiro fossem habitados exclusivamente
por malandros. (FENERICK, 2006, p. 28)

Trazendo essas questões, confirmamos a discriminação existente, e a


motivação de Vargas para mudar também a imagem do malandro, trazendo-o mais
37

para o asfalto, e transformando-o um homem trabalhador, para que assim o samba


também perca a essência raiz. Porém, se para uns o malandro era sinônimo do morro
e características negativas, para outros ele era (e ainda é) sinônimo de alegria e
descrição brasileira da expressão francesa bon vivant.

1.3.2 Lapa

Bairro localizado entre a zona norte e sul do Rio de Janeiro, recebeu seu nome
em homenagem à Nossa Senhora da Lapa do Desterro em 1751. O maior símbolo do
bairro e ponto turístico, o Aqueduto Carioca, começou a ser construído em por volta
do século XVII, para diminuir os problemas de abastecimento de água, mas sua
construção terminou apenas em 1723. Em 1896, a estrutura começou a servir para a
travessia de bondes, já que o abastecimento de água tinha sido solucionado com
outras ideias.

Figura 20: Arcos da Lapa, Santa Teresa e Glória, Rio de Janeiro – Ano 1867

A Lapa Boêmia, foco desde tópico, teve seu ápice no início do século XX, com
o samba em sua magnitude, fazendo do bairro o lugar de encontro de diversos artistas,
mas também os intelectuais, explorando uma imagem de lazer da época, e sendo
comparada à Soho em Nova Iorque e Bastilha em Paris, sendo utilizada a frase “era
um canteiro de mendigos, hoje é um colar de pérolas da cidade”. (Velasques, 1994)
38

O bairro apresenta duas facetas, uma negativa sendo atribuído como uma local
de marginais e prostitutas, mantendo o Rio de Janeiro e o carioca, com a imagem de
vagabundos, viciados e malandros (conotação pejorativa), e a face cosmopolita, onde
os bares recebem artistas e letrados e a persona emblemática traz fascínio. A Lapa,
como hoje em dia é conhecida como essência, traz a bandeira do que seria dito como
um estilo de vida a se seguir, sendo, nesse momento, aceitável ser boêmio.

A boêmia constrói um modelo simetricamente inverso à vida privada


burguesa. Primeiramente por sua relação invertida com o tempo e o espaço;
vida noturna sem horários – o boêmio não usa relógio – de intensa
sociabilidade tendo como o palco a cidade, os salões, bares e avenidas. Os
boêmios ‘não conseguem dar dez passos na avenida sem encontrar um
amigo’. Conversar é seu prazer, sua principal ocupação. (VELASQUES,
1994, p. 18)

Seguindo por essa definição do boêmio, é encontrada basicamente a definição


do malandro. Em “conversar é seu prazer, sua principal ocupação”, é possível
interpretar que o malandro carioca, ao se tornar uma pessoa recorrente de bares e
botecos, teria essa mesma ação de conversar com aqueles presentes, acabando por
conhecer variadas pessoas, e por conseguinte, fazer vários amigos, onde pode-se
também ligar à frase da mesma citação “Os boêmios ‘não conseguem dar dez passos
na avenida sem encontrar um amigo”. Mas, como os malandros, que andavam pelas
noites, portanto encarado como um personagem de atmosfera negativa,
representavam o morro, que a dita “boa sociedade” queria afastar, ou seja: negros,
mulatos, práticas culturais religiosas e populares. (Velasques, 1994)

De acordo com Gasparino Damata (2007), a nova Lapa teve o seu nascimento
na década de 1910, na mesma época que surgiram os cabarés, cassinos, a
malandragem em si e o samba. Na década de 1930, consolidou-se como bairro
boêmio e tornou-se um lugar de alegria. E o declínio do bairro entre as décadas de 30
e 40, com as repressões policiais, a aproximação da Segunda Guerra Mundial e
Copacabana “roubando a cena”.
39

Figura 21: Arcos da Lapa, Rio de Janeiro – Ano 1906

Sendo a queda, perto do final da Era de Ouro do Samba, a Lapa perde seu
pedestal de brilho, e se consagra como o local da vida noturna carioca, o berço da
boêmia e da malandragem, e finalmente a figura do malandro é imortalizada.

Figura 22: Arcos da Lapa, Rio de Janeiro – Ano 2006

1.3.3 O Rio de Janeiro e a Malandragem

O Rio de Janeiro e sua conexão com a malandragem, como abordado nos


tópicos acima, tem aproximadamente 100 anos, porém sua imagem acabou se
tornando atemporal, servindo para descrever a alma do carioca, do Rio de Janeiro,
40

tanto que em muitos momentos a imagem do Malandro é vendida como souvenir em


pontos turísticos, como a Lapa.
Mas o Rio e a malandragem, também tem em sua parte histórica a capoeira. A
capoeira é registrada no Rio de Janeiro desde o início no século XIX, historicamente
sendo incialmente como um jogo que descrevia as situações reais da vida (mas hoje
descrita como uma expressão cultural brasileira), porém tendo controvérsias em
relação a sua criação, onde a dúvida reside em a capoeira ser uma invenção dos
escravos no Brasil, ou seria algo que os escravos trouxeram da África com eles, sendo
de extrema dificuldade saber a real origem. (Campos, 2001)
No Rio de Janeiro, os grupos de escravos capoeiristas eram chamadas de
Maltas, grupos que detinham suas próprias gírias e costumes, e existindo ramificações
do grupo, ou seja, não tinha apenas uma malta, e sim diversas. Ao passar dos anos,
a capoeira, inicialmente um ato de resistência urbana negra, se tornou ilegal e na visão
pública, uma ameaça para a população. No dia 11 de outubro de 1890, a capoeira se
tornou oficialmente delito, um crime de “vadios e desordeiros”, que sofreu duramente
repressão policial. (Cid, 2010), se tornando legal e legítima em 1937, quando
reconhecida por Getúlio Vargas como um esporte nacional, demorando quase meio
século.

Figura 23: Jogo de Capoeira

Mas qual seria a ligação entre o malandro com os capoeiristas? De acordo com
Nestor Capoeira (2010), os maltas de 1880 teriam as características, que cerca de 40
anos depois, formariam o malandro carioca. Sendo basicamente, uma “evolução” do
41

mesmo personagem, porém com nomes e vestes diferentes. Pois se em 1880, o


capoeirista era tirado como marginal, em 1920 o malandro tem a discursiva de vadio,
e também marginal, por que não seriam a evolutiva da mesma? Trazendo para o
discurso religioso, as palavras de Souza (2016), descrevem a evolução que ocorreu
entre os séculos: “Logo, se no século XIX havia as maltas de escravos capoeiras e no
século XX os malandros cariocas, hoje o que encontramos é a Falange mítica do
Malandro Zé Pelintra.”

Figura 24: Imagem de Zé Pelintra com o Pão de Açúcar de fundo

Hoje é possível ver a típica imagem do malandro carioca, ou do malandro


encostado em um poste de luz, em souvenirs e acessórios para presentear alguém,
se tornando uma imagem carioca, e perdendo a essência religiosa. O chapéu de
Panamá teve o efeito o contrário, o acessório que foi de extremo uso pelos sambistas
na década de 20 e 30, foi atrelado a imagem religiosa e se tornou motivo para, em
alguns casos, discurso de intolerância religiosa.
Como foi o caso de Marcelo Crivella, prefeito em exercício em 2020, que
durante o debate contra Eduardo Paes, disse que o seu rival dava dinheiro para o
carnaval do Rio de Janeiro, pois queria desfilar no carnaval e usar o “chapeuzinho de
Zé Pelintra”: “[...] Ele queria desfilar no carnaval, ele ia lá com o chapeuzinho de Zé
Pelintra, saia na capa do jornal”. (Debate Globo, vídeo disponível no YouTube,
momento 21:40min)
42

A fala de Crivella repercutiu por toda a cidade, por trazer, ao entendimento de


variadas pessoas, conotação de intolerância religiosa. Promovendo então a comoção
de ir votar no candidato Eduardo Paes, com o chapeuzinho de Zé Pelintra. (figura 26)

Figura 25: Cantora Alcione compartilhando em sua rede social a sua ida à votação com chapéu de
malandro

Com isso, a conexão entre Rio de Janeiro e a malandragem, mais propriamente


Zé Pelintra, é demonstrada como uma cultura carioca, que faz parte, e ninguém pode
tentar tirar. Mais um exemplo é o santuário, dedicado à entidade, localizado sob os
Arcos na Lapa, que seria sua morada, ou de acordo com a religião, seu ponto de força.
(figura 26)
Figura 26: Santuário destinado à Seu Zé na Lapa, Rio de Janeiro.
43

1.4 A moda nas décadas de 1930 e 1940

Escolhendo a roupagem típica do Zé Pelintra em sua “versão” malandro


carioca, parte do norte estético serão os anos 30 e 40 – período de grande
transformação no samba e do auge da boêmia carioca – e suas transformações no
vestuário feminino, tal como o uso de calças. Será abordado além da moda feminina,
a masculina, apresentando o tradicional terno completo, com a visibilidade de trazer
tais elementos para uma coleção de moda feminina em modelagens mais modernas.

1.4.1 Moda Feminina

Em 1930, a moda feminina trouxe uma silhueta mais justa no corpo, com saias
até o tornozelo e a inovação do corte enviesado, godê ou evasê. O tailleur, já
imortalizado por Gabrielle Chanel, continua no dia a dia feminino, assim como os
blazers por cima de saias, vestidos ou conjuntinhos, calças e shorts. As roupas e
alguns acessórios masculinos já eram vistos sendo usados por mulheres modernas.
Por volta de 1840, Amelia Jenks Bloomer, escritora e conferencista dos direitos
das mulheres, popularizou a calça Bloomer – calças largas presas na altura do
tornozelo e usadas por debaixo dos vestidos – que mesmo não sendo criada por
Amelia, recebeu o nome pela mesma escrever a favor e utilizá-las em suas
conferências (TORTORA, 2013), porém com as diversas críticas caiu no abandono,
apenas no final do século elas retornaram como roupas para esportes, mais
precisamente a bicicleta, ou sendo usadas como roupas de praia, já que tal local foi
um dos primeiros onde a mulheres poderiam usar calças em público. (MINDIAK, 2019)
Mas somente na década de 1930 a peça teve seu início na real aceitação como
parte do traje informal feminino. Gabrielle Chanel, Greta Garbo e Marlene Dietrich
foram alguns dos nomes das mulheres que adotaram e apoiaram o uso das calças,
onde obtiveram o adjetivo “ousada” para descrever o contínuo uso da peça. Sendo
Marlene Dietrich a maior responsável pela difusão das vestimentas masculinas e da
calça no vestuário feminino. (STEFANI, 2005) (Figura 27)
44

Figura 27: Greta Garbo, Gabrielle Chanel e Marlene Dietrich

Com a Segunda Guerra Mundial, as mulheres tiveram que se inserir no campo


de trabalho, aumentando o uso e a procura de calças e os macacões, principalmente
por muitas mulheres irem trabalhar em fábricas e como mecânicas e por serem trajes
que facilitavam o dia a dia no trabalho. Assim, as calças tiveram seu caminho para o
guarda-roupa feminino, entrando na normalidade dos trajes, e as inspirações militares
do final da década de 1930 continuaram para a 1940, transformando o vestuário
feminino para um estilo mais sóbrio, rígido e prático. (SILVEIRA, 2017). O famoso
ready-to-wear, pronto para usar, foi a forma de produção de roupas em grande escala
durante a guerra principalmente.

Sem dúvida, o isolamento de Paris fez com que os americanos se sentissem


mais livres para inventar sua própria moda. Nesse contexto, foram criados os
conjuntos, cujas peças podiam ser combinadas entre si, permitindo que as
mulheres pudessem misturar as peças e criar novos modelos. A partir daí,
um grupo de mulheres lançou os fundamentos do sportwear americano. Com
isso, o ready-to-wear, depois chamado de prêt-à-porter pelos franceses, que
até então havia sido uma espécie de estepe para tempos difíceis, se
transformou numa forma prática, moderna e elegante de se vestir.
(EMBACHER, 1999, p.125)
45

Figura 28: Mulheres de calças e macacões

Por conta do isolamento em Paris, os modismos durante a segunda guerra


acabaram por conta nos Estados Unidos, que sentindo-se mais livres fizeram sua
própria moda, o sportswear americano (como mencionado acima), se estabelecendo
na moda mundial mesmo no pós-guerra (STEFANI, 2005). Com isso o ready-to-wear
virou um jeito prático e mais acessível financeiramente de se vestir, podendo ser
consumindo de casa, por meio de catálogos. (SILVEIRA, 2016) (Figura 29)

Figura 29: Catálogos de Sportswear na década de 1940

As mulheres no campo de trabalho também estiveram nas imagens


promocionais da Segunda Guerra Mundial, trazendo trajes de mecânicas com as
46

denominações de “soldados sem armas” (figura 31). Uma das imagens mais famosas
é o cartaz de J. Howard Miller, We Can Do It (1943), que tinha a finalidade levantar a
moral dos trabalhadores durante a guerra. (figura 30)

Figura 30: Cartaz Promocional de J. Howard Miller

Figura 31: Cartazes promocionais: “Soldiers without guns” e “Woman Ordanance Worker”; militares
prestando continência para a mulher trabalhadora.

Durante e após a guerra as mulheres continuaram usando as calças mesmo


fora do trabalho, além do motivo ser o estilo americano sportswear, as calças se
mostram uma peça versátil, possibilitando variados movimentos. Assim a calça que
no começo do século era usada apenas para esportes, virou uma peça normal no
guarda-roupa básico da mulher.
47

Figura 32: Mulheres usando calças no dia a dia

1.4.2 Moda masculina

Poucas mudanças são notadas entre as duas décadas no vestuário masculino,


o que se pode dizer é que a aparência esnobe das roupas começara em 1930. O
fechamento duplo se popularizou, os ombros do paletó e as calças eram largas,
trazendo o ar da modernidade. O chapéu modelo fedora era o que estava em voga na
época, usado de lado ou apontado para baixo, assim como a boina, popular entre os
homens da classe trabalhadora. (Universidade de Vermont, UVM)

Figura 33: Ilustração do vestuário masculino nas décadas de 30 e 40.

O Zoot Suit foi o estilo de terno que em 1930 tomou conta das ruas do subúrbio
dos Estados Unidos (figura 30), sendo uma versão exagerada do drape cut – silhueta
48

que a cintura do paletó é mais apertada e as costas e peito tem mais tecido e estrutura
– que faziam sucesso nos salões de dança. O estilo de terno tinha mais tecido no
peito, a jaqueta alongada até as coxas e mangas largas, sendo muito usado pelos
jovens das zonas mais pobres do país. (REDDY, 2019)

Figura 34: Homens com o Zoot Suit.

Nos anos 40 a moda se manteve basicamente, mudando apenas os tecidos


pela escassez devido à guerra, os tecidos sintéticos vieram para suprir a demanda, e
a inclusão dos suéteres no guarda-roupa. Os chapéus fedora continuaram na moda,
porém o Zoot Suit passou a ser visto como símbolo de marginais, a ponto de a Câmara
de Municipal de Los Angeles aprovar um decreto que proibia o Zoot Suit,
argumentando que eram símbolo de delinquência e desperdício de recurso, assim
aqueles que usavam tal roupa passaram a ser perseguidos e humilhados, tendo suas
roupas queimadas se pegos, surgindo então a revolta dos ternos Zoot (LINCOLINS,
2020). A Zoot Suit Riots foi o nome da série de conflitos em Los Angeles, Califórnia,
no período de 3 à 8 de junho de 1943 onde mais de 150 pessoas foram feridas e mais
de 500 detidas.
49

Figura 35: Rayfield McGhee em um Zoot Suit

No Brasil, principalmente no Rio de Janeiro, os ternos ganharam seu espaço


entre os sambistas feitos no linho por ser um tecido mais fresco permitindo aguentar
o calor na cidade tropical. O vestuário dos malandros, além do terno de linho branco,
também se assemelhava levemente ao Zoot Suit, mas de acordo com Karina dos
Santos (2019) e José Alfredo Beirão Filho (2019), as roupas do malandro tem
grandes raízes capoeiristas, não sendo somente semelhantes aos ternos:

Muito da indumentária deste malandro vem dos capoeiristas, que tinham


regras rígidas, tais como: não usar armas de fogo, sendo permitido somente
navalha, não comparecer aos trabalhos às segundas, usar gingado próprio,
e ser fiel com a sua roupa, que era composta de: calça larga de boca fina,
paletó aberto, botina de bico fino e lenço no pescoço, obrigatoriamente de
seda, sendo que este tecido acreditava-se cegar o fio da navalha. O uso do
branco servia para acusar as marcas de queda no chão; já, o chapéu,
carecia de uma fita de coloração malta, uma vez que o vermelho era para
os Nagoas, e o branca para os Guaiamus. (SANTOS; BEIRÃO FILHO,
2019, p. 10)

Com isso, o foco deste trabalho será apresentar a estética e os simbolismos do


universo boêmio da malandragem nos terreiros de Umbanda, com o objetivo de criar
uma coleção de moda com aspectos da moda nas décadas de 1930 e 1940, trazendo
assim uma leitura moderna, onde ao mesmo tempo que o propósito é fugir do conceito
de design clássico da alfaiataria, os acabamentos que o segmento trouxe para a moda
serão mantidos e transformados no diferencial da coleção.
50

Capítulo 2 – Pesquisa de mercado e consumidor

Neste capítulo serão apresentadas, respectivamente, pesquisas quantitativas


e qualitativas que serão necessárias para a formação de um caminho a ser seguido
para uma coleção de moda feminina com peças com base alfaiataria inspiradas em
duas figuras religiosas. Após, será apresentado o estudo do segmento de mercado
escolhido para a atuação, apresentação da marca e dados sobre possíveis
concorrentes. Por último, será retratado um plano de negócios voltada para a criação
da marca Olidratins, desenvolvida para esse projeto de conclusão de curso.

2.1 Público-alvo

Os dados presentes nesse tópico foram coletados via formulário online, Google
Forms, e de cinco entrevistas diretas. Eles servirão para compreender o público
determinado, e suas reações com o tema proposto e o segmento da coleção a ser
desenvolvida.
A primeira pesquisa, pesquisa quantitativa, foi feita em forma de formulário
composto por 25 perguntas, dentre elas perguntas sobre estilo pessoal, modelagem
de roupa, opção de cores etc., que foi distribuída na rede social Instagram e pelo
WhatsApp, tendo foco alcançar um público em sua maioria do Rio de Janeiro.
Para entrevista direta, pesquisa qualitativa, foi escolhido 5 mulheres de idades
diferentes para uma pesquisa mais abrangente, que seriam da faixa etária do público:
Ana Beatriz Tavares (23), Beatriz Lopes (23), Monique Correa (34), Thabata
Fernandes (30) e Bárbara Oggioni (40).
Na pesquisa quantitativa, percebemos que a grande maioria das respostas
vieram de mulheres entre 20 e 30 anos (72,5%), e em segundo mulheres entre 30 e
40 anos (19,6%). Ambas as faixas etárias são o foco de idade que será trabalhado na
marca. Tendo consciência da possível divergência de gostos, a proposta é alcançar
ambas as faixas com um mesmo estilo, já que no cenário moderno, algumas jovens
de 20 anos já estão mais inclinadas a escolher peças de um corte diferenciado, e
utilizá-las no seu dia a dia de acordo com o seu estilo pessoal.
51

Gráfico 1 – Faixa etária

Foi pensado também perguntar sobre a religião por ser um tema sobre
entidades da Umbanda, religião brasileira de matriz africana, onde tais religiões
sofrem ainda intolerância. O objeto desta pergunta é entender se uma coleção com
essa temática seria aceita por pessoas não praticantes da religião ou outras religiões.
No gráfico pode-se perceber que sua grande maioria é umbandista (43,1%),
sendo seguido por pessoas que não tem religião, mas acreditam em Deus (15,7%),
pessoas que não tem religião, mas que acreditam em algo (11,8%), católicos (9,8%)
e evangélicos (7,8%). Sendo esses os dados mais significantes (totalizando 88,2%),
onde é apontado que 45,1% das repostas não são praticantes de nenhuma religião
de matriz africana.

Gráfico 2 - Religião
52

Na próxima pergunta, foi colocado a questão de gênero, pelo fato de que muitos
consumidores, mesmo não sendo do gênero feminino, consomem peças e marcas
femininas. Em sua grande maioria (88,2%) as respostas foram de pessoas que se
identificam com o gênero feminino, que é o objetivo dessa pesquisa.

Gráfico 3 - Gênero

Por ser uma marca carioca, mesmo que as vendas sejam por meio de e-
commerce, foi questionado a localidade, por ser uma coleção voltada ao clima tropical
e com referências cariocas. A pergunta após essa foi a zona em que a pessoa mora
– Zona Norte, Oeste, Sul, Centro, Baixada e outras localidades – para melhor
obtenção de dados. Dentre essas respostas, uma possível confusão foi feita, já que
obtive respostas de outros estados.

Gráfico 4 - Localidade

A maioria de respostas são de moradores do Rio de Janeiro (84,3%), e dentro


da cidade, a maioria é moradora da Zona Norte (47,1%), seguidos por moradores da
53

Zona Oeste (23,5%) e moradores da Zona Sul (9,8%). Alguns dos dados são
irrelevantes devido a confusão das respostas dadas.

Gráfico 5 – Localidade no Rio de Janeiro

Após foi feita a pergunta para aqueles que não moram no Rio de Janeiro
(15,7%), onde novamente foi obtido certa confusão por parte daqueles que
responderam o questionário. Porém analisando todos os dados do gráfico, foi possível
coletar que 17% das respostas são de Santa Cruz do Sul (localizado no Rio Grande
do Sul), e 12,6% de São Paulo.

Gráfico 6 – Demais localidades

A pergunta sobre rede social foi pensada para escolher a melhor veiculação
online de promoções e marketing da marca, com base dos dados foi escolhido o
Instagram, que obteve a maior escolhe entre as respostas (90,2%).
54

Gráfico 7 – Redes sociais

As próximas perguntas foram com base na renda familiar, já que possivelmente


pessoas na faixa etária escolhida para o público-alvo ainda morem com os pais, ou
dividam as contas de casa com alguém. Assim a primeira pergunta nessa etapa foi
se a pessoa morava sozinha, onde em sua minoria (7,5%) a resposta foi positiva.

Gráfico 8 - Moradia

Pela maioria das repostas (92.2%) ter sido negativa, a próxima pergunta
levantou a quantidade de pessoas que moram junto com a pessoa. Onde dentro das
opções dadas a maioria mora com 2 pessoas (34,8%), seguido por quem mora com 3
pessoas (24,1%), quem mora com apenas 1 pessoa (23,9%) e quem mora com mais
de 3 pessoas (15,2%).
As respostas obtidas pelo gráfico são relevantes pela próxima pergunta (renda
familiar mensal), onde podemos ter noção mais para frente quanto a pessoa está
disposta a pagar, mesmo morando com mais pessoas, sendo assim, possivelmente
dividindo as contas de casa.
55

Gráfico 9 – Segunda parte moradia

A pergunta de renda mensal confirmou a renda escolhida para o público-alvo,


que seriam consumidoras com renda a partir de 5 salários mínimos, e finalizou a etapa
geral. Das respostas, 7,8% ganham até 1 salário mínimo, 33,3% entre 1 e 3 salários
mínimos, 27,5% entre 3 e 6 salários mínimos, 15,7% entre 6 e 9 salários mínimos, e
15,7% acima de 9 salários mínimos.
Totalizando a porcentagem de respostas entre 3 e 6 salários mínimos, 6 e 9
salários mínimos e acima de 9 salários mínimos, 58,9%, sendo a maioria das repostas
obtidas pessoas com faixa salarial do público alvo.

Gráfico 10 – Renda mensal

Agora, as perguntas são voltadas para o campo da moda. Onde a primeira


pergunta é a frequência de compras de peças de vestuário ou acessório. Por ser uma
marca que é adepta do consumo consciente, a pergunta foi necessária para entender
os hábitos de compra do público que seria o foco da marca.
56

Em sua grande maioria, as respostas obtidas foram a cada 2 meses ou acima


do mesmo, com um total de 60,7% das respostas são de pessoas que tem a
frequência de consumo espaçada, indo até as compras apenas uma vez por ano
(3,9%). Dessas 60,7% de respostas, a cada 2 meses (29,4%), a cada 4 meses
(17,6%), a cada 6 meses (13,7%).
Esta pergunta também pode ser de ajuda na questão de espaço de lançamento
de coleções cápsulas.

Gráfico 11 – Frequência de compras

O gráfico a seguir mostra que em sua grande maioria, o consumo médio em


vestuário fica entre até R$200 (49%) e entre R$200 e R$500 (45,1%). Assim podemos
ter base para os preços da marca a ser criada e do consumo das peças entre estes
valores. Peças acima de R$500 se dividem em, entre R$500 e R$700 (3,9%) e acima
de R$700 (2%).

Gráfico 12 – Consumo médio de vestuário


57

No questionário também foi perguntado a questão de lojas online (e-commerce)


que será o meio de veiculação das peças da marca. Foi levantada a questão de antes
e durante a pandemia do novo Corona vírus (Covid-19), por se tratar de uma época
que o índice de compras online subiu. Nessa primeira pergunta as respostas de
dividiram entre quem comprava em loja física (58,8%) e quem já comprava em ambas
(41,2%).

Gráfico 13 – Método de compras

Com a pandemia e sua “nova forma” de compras, algumas pessoas que mesmo
comprando online preferem loja física (45,1%) e pessoas que não fazem compras
online pois não gostam desse método (13,7%). Sendo assim, quem gosta e pretende
continuar a fazer compras online totaliza apenas 33,3%. Sendo pessoas que não
começaram a fazer compras online com a pandemia e querem começar totalizam
7,8%.

Gráfico 14 – Método de compras


58

Quanto a peça, a qualidade foi o que ganhou em sua maioria (82,4%), seguido
por modelagem (62,7%), preço (58,8%), durabilidade (39,2%) e tecido (37,3%). Na
entrevista, Bárbara disse que todas as características a chamam atenção.

“Pode ser tudo isso? Tipo, primeiro o caimento, tem roupa linda que não cai
bem! Depois modelagem, cor, estampa... Preço também conta muito”
(BARBARA, 2021)

Gráfico 15 – Características da peça

Por ser uma marca que se preocupa com a sustentabilidade, o gráfico que
pergunta sobre o possível consumo de uma peça de valor mais alto por ser sustentável
foi maioria, com 80,4% das respostas, dá a entender que o público alvo consumiria
uma peça com esta característica.

Gráfico 16 – Consumo de peça sustentável

No gráfico a seguir, a noção de um estilo pessoal eclético entre o público alvo


se mostra bem presente. Dentre as respostas a maioria se identifica com o estilo
59

casual (54,9%), seguido pelo estilo urbano (19,6%), estilo clássico (11,8%) e
romântico (9,8%). Assim, o gráfico pode ser usado para atingir um público de todos
os estilos.

“Pagaria sim! Acho importante inserir esse tipo de consumo, tentar ‘tornar
popular’.” (ANA BEATRIZ, 2021)

“Penso em algum dia começar a consumir sim! [...] Eu acho que investiria se
for mais caro, mas tenho que mudar meu modo de consumir roupa... Ter
menos roupa que se combinem de diferentes formas!” (BÁRBARA, 2021)

“Estaria disposta, sim. Tenho visto bastante coisa a respeito de fraldas


sustentáveis e roupas de criança sustentáveis. E vejo que a longo prazo vale
mais a pena.” (MONIQUE, 2021)

Gráfico 17 – Estilo pessoal

(Imagens utilizadas para escolha no gráfico. Dir à esq.: casual, urbano, clássico, romântico, rocker)

Para a preferência na peça, foi utilizado dois gráficos. Para o gráfico sobre
escolha de cor, a escolha de ambas as opções foi maioria das respostas (51%), e
aqueles que preferem cores neutras (39,2%). Com o gráfico, a escolha de paleta de
cores para a coleção pode ser feita tanto em cores vivas ou neutras, pois percebe-se
a aprovação para ambos os estilos.
60

Gráfico 18 – Preferência peças: cores

No segundo gráfico, a escolha foi entre peças lisas, peças estampadas ou


ambas. Sendo a maioria desse resultado peças lisas (49%) e depois a opção ambas
(41,2%). Com isso, o mais aconselhável seria uma coleção com grande parte das
peças lisas, para abranger mais público. Uma das entrevistadas apontou que gosta
de estampas, mas nada muito chamativo.

“Gosto, mas não muito "cheguei"! Mais discretas também.” (BARBARA, 2021)

Gráfico 19 – Preferência peças: lisas ou estampadas

Finalizando a pesquisa, as perguntas seguiram para o foco da coleção, sendo


as peças em alfaiataria. Em sua maioria (84,3%) as peças foram aprovadas com
chances de uso, sendo as minorias: gostei e não usaria e gostei, mas não usaria
nessas cores, com a mesma porcentagem de respostas (7,8% cada), resultando em
um total de chance de não uso 15,6%.
61

Gráfico 20 – Peças em alfaiataria (modelagem)

(Colagem apresentada no formulário)

Já neste gráfico, é buscado o conhecimento sobre o possível uso em uma forma


mais contemporânea. Pode-se entender por sair do uso “normal” das peças, que
seriam de ambiente de trabalho, e usar mais para o lazer, com peças como o tênis,
tops cropped etc. A aprovação para o uso foi maioria (86,3%), enquanto as outras
respostas seguiram para a opção de gostei, mas não usaria (13,7%), diminuindo o
total de respostas em negativa da pergunta anterior, tendo então mais aceitação entre
o público.
62

Gráfico 21 – Peças em alfaiataria (estilo contemporâneo de uso)

(Colagem apresentada no formulário)

Quando perguntada a questão sobre essas peças pensadas para o clima


tropical 94,1% responderam que gostariam. Já na pesquisa qualitativa, a mesma
pergunta teve respostas:

“Seria ótimooo! Sou suspeita, apaixonada nesse estilo de roupa. Além de


perder esse ar de “só de olhar já dá calor”.” (ANA BEATRIZ, 2021)

“Usaria com certeza!” (BARBARA, 2021)

“Acho ótimoo” (BEATRIZ, 2021)


63

“Acho ótimo. Eu sou fã da alfaiataria do jeito que der pra usar” (THABATA,
2021)

Gráfico 22 – Peças pensadas para o clima

Sobre o tema, foi perguntado sobre as figuras que são inspirações da coleção,
Zé Pelintra e Maria Navalha. Zé Pelintra por ser uma imagem muito conhecida em
quase todo o Brasil, principalmente o Rio de Janeiro, teve uma resposta favorável de
conhecimento (90,2%).

Gráfico 23 – Zé Pelintra
64

(Imagem apresentada no gráfico)

Enquanto Maria Navalha, entidade pouco conhecida, geralmente mais notável


entre os umbandistas, teve em comparação a pergunta anterior, uma resposta baixa,
mas ao mesmo tempo favorável (70,6%).

Gráfico 24 – Maria Navalha


65

(Imagem apresentada no gráfico)

O questionário foi finalizado com a pergunta chave: interesse em uma coleção


com essas duas figuras como inspiração. Em sua maioria (84,3%) as respostas foram
positivas. Nas entrevistas, quando perguntadas, uma das entrevistas diz não se
importar com o tema, outras duas gostaram da ideia.

“Nossa ia ser lindo! Super interessaria.” (ANA BEATRIZ, 2021, não praticante
de nenhuma religião)

“Me interessaria sim! Não lembro muito bem como era a pergunta do
formulário, mas me induziu a responder não. O "não" era porque eu não
conheço muito a história, então não é uma coisa que eu buscaria sozinha.
Mas uma coleção que trouxesse o conceito, da forma que você falou,
atrelando a uma época, às peças modernas, eu compraria! (BÁBARA, 2021,
espírita kardecista)

“Eu me interessaria, sim. Acho que existem lojas que trabalham esse tema,
como as de samba, mas nada que tenha a inspiração nas figuras
umbandistas para a confecção das peças.” (MONIQUE, 2021, umbandista)

“Pra mim não importa a inspiração, desde que eu goste da roupa e vista bem”
(THABATA, 2021, não praticante de nenhuma religião)
66

Gráfico 25 – Interesse na coleção

Nas entrevistas, abrimos mais o questionário, fazendo perguntas com temática


de consumo consciente e peças sustentáveis, assim como hábitos antes da
pandemia, para um conhecimento mais profundo do público.
Em relação a lugares que tinham hábito de ir antes da pandemia, a resposta de
todas as cinco entrevistadas foi a mesma, praia e barzinhos. Confirmando os hábitos
do público alvo. Já em relação a peças sustentáveis (disposição para pagar um valor
mais alto) e consumo consciente, Thabata disse não se importas com ambas as
características e que não estaria disposta. Enquanto as outras entrevistadas tem
ações que podem ser vinculadas ao consumo consciente.

“Às vezes. Tipo, nunca comprei na SheIn porque acho muito barato e cismo
que tem costureira escravizada (fonte: vozes da minha cabeça kkkk). Mas
não é uma pesquisa que faço sempre em relação as lojas que gosto.” (ANA
BEATRIZ, 2021)

“Deveria me preocupar. Mas para roupas ainda não pratico. Evito descartar
rapidamente as roupas, mas ao comprar peças mais baratas, acaba que elas
perdem a qualidade mais rapidamente também... Tipo, alarga, desbota. [...] A
minha única ação com relação à pensar no trabalho foi parar de comprar
roupa na Riachuelo quando os salários dos funcionários foram reduzidos com
a nova lei do trabalho” (BÁRBARA, 2021)

“Não costumo jogar roupa fora, eu dou a roupa, mas não penso como a peça
foi feita” (BEATRIZ, 2021)

“Eu conheço pouco a respeito, mas depois de ser mãe eu tenho tido uma
cabeça diferente a respeito. As condições de trabalho não são coisas que eu
vejo com frequência, mas o evitar comprar demais ou comprar e doar, eu me
preocupo.” (MONIQUE, 2021)

De acordo com os dados coletados, o público tem idades entre 20 e 40 anos,


faixa salarial a partir de 3 salários mínimos, com consumo médio de até R$500, e
67

frequência de compras todo mês ou a cada dois meses. Com base nas respostas da
pesquisa, o que as chama atenção em uma peça são a durabilidade, preço e
modelagem da peça, com ambas as cores neutras e vivas e em peças lisas. Que
mesmo de estilos diferentes, gostariam e consumiriam uma peça de acabamento em
alfaiataria.

Figura 36: Moodboard público-alvo

2.2 Segmento – Moda Sustentável: Slow Fashion

A moda sustentável se caracteriza como aquela que preza pelo respeito ao


meio ambiente e à sociedade, valorizando as pessoas envolvidas na produção e
incentivando o consumo consciente. (SEBRAE, 2015). Sendo assim pilares como a
utilização de matéria-prima de baixa poluição, redução de desperdícios, remuneração
justa (sem exploração de mão de obra), peças com design e funcionabilidade,
favorecendo a durabilidade. Peças de tecidos de fibras naturais ou tecidos alternativos
(reciclados de garrafa PET) se encontram na definição de peças sustentáveis, assim
como o reaproveitamento de tecido.
68

O conceito de slow fashion também faz parte da sustentabilidade na moda,


onde é defendido um ritmo de produção e consumo adequados ao bem-estar
ambiental, pessoal, social e econômico. (SEBRAE, 2015)

O conceito de slow fashion surge como um movimento que promove a cultura


e os movimentos lentos. Inspirado no movimento slow food, iniciado em 1986
na Itália, que vincula o prazer da comida à consciência e à natureza
responsáveis na sua produção. O slow fashion é mais do que a redução da
velocidade de produção, mas representa uma nova forma de ver o mundo,
onde há uma ruptura com as práticas atuais do setor com os valores do fast
fashion. (Fletcher; Groose, 2011)

No espaço de tampo entre a publicação do SEBRAE sobre nichos de moda em


2015, onde é apontado que no Brasil esse é um mercado ainda pouco explorado, e
atualmente, é perceptível o aumento de marcas brasileiras sustentáveis ou que se
preocupam com sustentabilidade. Com isso, as oportunidades dentro desse nicho
acabam por ficarem saturadas, onde o diferencial pode estar nos fornecedores, peças
com detalhes artesanais, a transparência da marca e o valor pessoal que é agregado
às peças. “Segundo os Institutos Akatu e Ethos, o percentual da população brasileira
que adere a valores e comportamentos mais sustentáveis de consumo é de 5%, quase
10 milhões de pessoas” (SEBRAE, 2015)
Sobre essa nova “onda de sustentabilidade”, onde muitas marcas agregam
esse discurso para si, na matéria da Forbes em 2020, a stylist e consultora de moda
Chiara Gadaleta, fundadora da Ecoera, apontou sobre esse conceito:
“Sustentabilidade nunca foi uma tendência de moda. [...] A crise atual escancara a
necessidade de transparência por parte das marcas, que terão que lidar com um
consumidor mais consciente, inclusivo e diverso.”
Com o segmento em mente, mesmo que sem rótulo de marca sustentável, a
Olidratins será uma marca slow fashion, trazendo alguns pilares da moda sustentável
como preferência em tecidos naturais ou reciclados, transparência e design
atemporal.

2.3 A Marca

O nome Olidratins vem da junção dos três sobrenomes da fundadora - Oliveira


de Andrade Martins - e mesmo com um nome que traz o pensamento de “marca
gringa”, ela foi pensada para falar sobre o Brasil, a natureza e as diversas culturas
69

presentes no país, tendo como objetivo criar peças que possam ser usadas com clima
tropical do país. A imagem de um gato na logo personifica a elegância, leveza e
agressividade felina que se encontra no interior de toda a mulher. Agressividade para
batalhar por como quer viver, elegância e leveza para concluir a batalha. O arquétipo
de mulher selvagem encontra o litoral carioca.

Figura 37: Logo Olidratins

A ideia de uma marca com peças versáteis, sendo algumas delas em


alfaiataria, veio a partir de um questionamento, quando pensamos nesse quesito
versátil, por que o jeans ou então uma t-shirt, é a primeira peça que vem na cabeça?
Então, foi imaginada uma forma de descontruir a visão atual da alfaiataria
clássica – para fora dos escritórios e com mais presença no dia a dia – assim como a
blogueira britânica, Sammi Jefcoate (figura 37), que foi grande inspiração da marca e
traz elementos da alfaiataria com t-shirts e peças de visual gótico, já que a mesma
descreve, ela sempre será uma gótica no coração.19

Figura 38: Blogueira Sammie Jefcoate

19
Frase encontrada no site da Sammie.
70

Sem perder o acabamento impecável desse estilo, a Olidratins busca


desmitificar que a moda tem regras. E para isso, o objetivo é apresentar novos usos
de peças de alfaiataria e mostrar que ela pode ser usar em qualquer ambiente e por
qualquer estilo, nas ruas asfaltadas e nas faixas de areia. Utilizando a desconstrução
do clássico, e utilizando como base a pesquisa de público (ver pesquisa de público no
2.1), onde no cenário atual da moda, o estilo pessoal muitas vezes independe da
idade, assim, trazendo no cerne uma marca onde as peças se encaixam nos estilos
de qualquer faixa etária.
Sendo assim, ainda que a marca tenha uma grande variedade de peças em
alfaiataria, esse não será o estilo exclusivo. Com base na modernidade, dentro do mix
de produtos da Olidratins, poderá ser encontrado como exemplo, tops cropped,
vestidos midi, e peças de moda mais casual, onde tais peças poderão trazer a visão
descontruída de clássicos da moda social, tal como: um top cropped com modelagem
baseado em um colete de terno masculino. Assim, a Olidratins sai do rótulo de peças
sociais ou “moda corporativa”, e traz o foco de uma moda liberta de rótulos.
Sendo o estilo atemporal a base das coleções, as peças a serem feitas serão
pensadas no uso contínuo da peça, seja ela uma calça pantalona com acabamento
em alfaiataria, ou uma blusa básica de modelagem solta, mas sem perder também as
principais tendências, como cores em alta e possíveis modelagens diferenciadas em
coleções cápsulas.

Figura 39: Moodboard de identidade visual da marca


71

Como cores para serem usadas na identidade visual, foram escolhidas três
cores presentes na cidade do Rio de Janeiro e duas representando o abstrato. O
vermelho - encontrado na Escadaria Selarón, na Lapa - que sendo uma cor forte é
associado a sentimentos como entusiasmo, paixão e ação. O verde – encontrado nas
matas que existem no Rio de Janeiro – com associações a saúde, natureza, felicidade
e esperança. O azul – encontrado nas praias – que passa sentimento de confiança,
paz e calma. O preto que se associa a mistério, poder e sofisticação e o branco com
aspectos de tranquilidade e, também, sofisticação.
A escolha das concorrentes Krya e Na.Loo foram baseadas no estilo de peças,
porém saindo da caixa onde moda alfaiataria é tons terrosos e neutros. A Olidratins é
a alma extrovertida carioca, sem perder a elegância presente nas mulheres. É o
encontro da mulher de negócios com a praiana do litoral. É o encontro do concreto e
da natureza. Então, por que não utilizar a dualidade da mulher carioca para a moda?
A Krya, traz sua essência mais zona sul, onde a mulher é retratada com um ar
requintado, transmitido um olhar mais luxuoso. A Na.Loo traz um estilo minimalista,
mas sem perder toques da leveza carioca.. A Olidratins é tudo isso, e mais um pouco.
O agito do centro da cidade, a calma de Grumari e Prainha, as alegrias da zona norte
e, claro, a elegância da zona sul. Tudo sem se ater a rótulos.

2.4 Plano de negócios para marca própria - Olidratins

Sócio
Nome: Karen Oliveira de Andrade Martins
Cidade: Rio de Janeiro
Estado: Rio de Janeiro
Produtora de moda, com curso de marketing digital e estudante de design de moda.
Atribuições do Sócio:
Chairwoman e CEO da empresa na parte executiva, designer principal na área de
criação de coleções a serem produzidas.
Nome da Empresa: Olidratins
CNPJ/CPF: 121.386.027-02
72

Missão da empresa:

Produzir peças que transmitam a versatilidade, onde materiais de origem


natural e uma modelagem mais moderna acompanhem a constante evolução pessoal.
Trazer o estilo clássico para fora do escritório, e em breve fortalecer a denominação
classy and sassy (clássica e atrevida), onde pode-se mesclar e trazer diversos estilos
para o dia a dia, com peças com o acabamento impecável da alfaiataria, mas em uma
visão mais jovem e moderna, com incentivo de tirar o rótulo de peças sociais, e trazer
também a moda casual no exterior para o dia a dia brasileiro.

Visão da empresa

A Olidratins acredita que na moda é possível transitar entre três estilos que são
a base da marca (porém não os únicos): clássico, causal e urbano. Uma peça dita
clássica pode ser usada em um look urbano ou casual, - ou seja, uma calça cenoura
em linho no bar do fim de semana - trazendo assim a singularidade presente em cada
indivíduo. Traz em sua essência a natureza, a versatilidade e o slow fashion.

Setor de atividade: Comércio de vestuário feminino. Loja online.

Forma Jurídica: MEI – Microempreendedor Individual

Fonte de Recursos: Investimento próprio da sócia.

Características gerais do público


Mulheres que encontrem na moda uma forma de se identificar. Que gostem do
agito do barzinho e da calma da praia.

Mercado
A marca irá trabalhar exclusivamente com e-commerce, com envios para todo
o Brasil, podendo expandir para outros países no futuro. Estimativa de preço entre as
concorrentes, tendo total transparência com a composição da peça, quem produziu e
a qualidade dos materiais. Com o segmento sendo principalmente o de alfaiataria, em
crescimento atualmente, busca-se o diferencial nos pequenos detalhes.

Público-alvo
Mulheres entre 20 e 40 anos, que possuem renda total a partir de 4 salários-
mínimos, se preocupam com o ambiente e gostam de versatilidade em roupas no dia
73

a dia, e estejam dispostas a pagar um preço elevado por uma peça de qualidade. (Ver
pesquisa de público no 2.1)

Comportamento dos clientes


Indivíduos que tenham apreço por qualidade de roupas, e que não rotulam uma
peça de roupa para determinados eventos. Que queiram se sentir bem e modernas
com peças de produção sustentável. Os clientes da Olidratins se preocupam com o
visual, mas além de tudo, que a peça lhes faça bem e exteriorizem a beleza. São
pessoas com os mais diversos os estilos de vida: praianas, urbanas, caseiras,
baladeiras, workaholics.

Área de abrangência
Em todo o Brasil. A Olidratins sendo uma marca carioca, traz em sua essência
o estilo descontraído das praias do litoral, e o moderno de uma cidade que está
sempre se reinventando, sem perder suas raízes. As clientes da marca podem levar
a alma carioca elegante para todos os estados do Brasil.

Concorrente Krya

Marca lançada em 2013, a Krya tem como base peças descomplicadas e


recortes geométricos, que traduzem o “estilo light chic” da mulher carioca. Mesmo que
a Olidratins não se baseie em rótulos, a Krya traz uma estética de peças que a fazem
concorrente da marca.

Figura 40: Apresentação do e-commerce KRYA


74

A marca carioca tem uma escolha de cores mais viva nas peças e nas redes,
como Instagram, e-commerce. Sendo o Facebook uma rede desatualizada (postagens
pararam em 2017), o foco se tornou o Instagram da marca, onde o feed foi organizado
para dar destaque às cores das peças.

Figura 41: Página do Facebook KRYA

Figura 42: Feed do Instagram da KRYA.

A paleta usada para as peças, a Krya utiliza cores fortes como o amarelo ou o
bordeaux, não se prendendo a cores neutras (tons de marrom, preto ou branco) onde
se encontra em minoria no mix de produtos, e usando também o mix de cores em uma
só peça. As modelagens já entram em uma forma mais moderna, com cortes
75

diferenciados e uso de formas com tecido, e em algumas peças o estilo clássico


prevalece, como exemplo o blazer.

Figura 43: Fotos dos produtos da KRYA

A Krya tendo seu nascimento na zona sul do Rio de Janeiro, mais precisamente
Ipanema, passa o rosto da mulher chic da zona sul, algo que a Olidratins busca não
focar, sendo uma marca que tenha a identidade da mulher carioca, de zona norte à
zona sul.

Concorrente Na.Loo

A Na.Loo foi lançada em 2017 por Anna Luisa Fernandes, com a proposta de
vestir mulheres independentes e que sabem o que querem, onde o objetivo – de
acordo com a marca - é que a consumidora se sinta deslumbrante onde quer que
esteja. Tendo como foco visual, apresentar a moda minimalista carioca.
Trazendo uma leitura do estilo da cidade (natureza e concreto), a Na.Loo utiliza
peças em design simples e atemporal, onde pela marca, é garantido a longevidade da
peça, já que a Na.Loo é uma empresa de consumo consciente.
76

Figura 44: Apresentação E-Commerce da Na.Loo

Na rede social, Instagram, a Na.Loo é uma marca que se mantém ativa em dar
dicas para as consumidoras assim como responder em quaisquer dúvidas
apresentadas na página da marca. As fotos do feed entregam uma estética casual,
com fotos simples, com o mesmo cenário e estilo de pose e edição, se mantém
organizado ao apresentar somente as peças – detalhes mais próximos e possíveis
combinações e nada mais. A página no Facebook se mantém desatualizada desde
junho/2020.

Figura 45: Feed do Instagram da Na.Loo


77

Figura 46: Página Facebook Na.Loo

A Na.Loo utiliza de uma paleta de cores extensa, indo do azul claro ao verde
musgo, cores neutras e cores fortes. Assim, é possível apontar uma caracteristica
presente em ambas as concorrentes escolhidas: uso de cores. Ainda que não tenha
um rótulo, é possível encontrar diversas peças com o acabamento e com design
clássico da alfaiataria, assim como a Krya, onde o design atemporal é pilar.
Ao mesmo momento que a Na.Loo se mantém com o estilo de peças clássicas,
é encontrada peças de design mais moderno, com recortes e drapeados, e
modelagens como croppeds, blusas com amarrações e releituras de coletes.
Trazendo o casual para encontro do clássico.

Figura 47: Fotos dos produtos da Na.Loo

A Na.Loo traz um visual mais moderno e jovial, diferenciando da Krya e se


aproximando da Olidratins. Com roupas com um conceito que se aproxima mais a um
lado da mulher carioca litorânea, sem tanto o ar de um determinado status da Krya.
78

Como por exemplo, uma mulher mais despreocupada e tranquila, mas ainda com
vestígios do clássico.

Tabela 1 – Comparativo concorrentes

Tabela Pontos de Preço Condições de Localização Tipo de Serviços ou


Qualidade Praticado Pagamento Atendimento Garantias
comparativa médio oferecidas
Olidratins Modelagens Preços entre Via Rio de E-Commerce Devolução
modernas e R$95 até PagSeguro Janeiro, RJ - Instagram em até sete
clássicas, R$950, Débito em Brasil Facebook dias após o
abrangendo dependendo conta; Boleto WhatsApp recebimento,
todos os do tecido Bancário; sem sinais
estilos, paleta utilizado e da Cartão de de uso, com
de cor modelagem Crédito em etiqueta e na
variada, até 3x sem mesma
peças em juros embalagem;
tecidos troca por
naturais e tamanho ou
reciclados. defeito em
até trinta
dias;
primeira
troca arcada
pela marca.
Krya Modelagens Entre R$258 Via Rio de E-Commerce Devoluções
modernas e até R$2.298 PagSeguro Janeiro, RJ - Instagram em até sete
diferenciadas, (a peça mais Débito em Brasil Facebook dias corridos
paleta de cara da conta; Boleto (Desatualizado) após o
cores vivas, marca) Bancário; WhatsApp recebimento
peças Cartão de do pedido
estampadas, Crédito em (aceitas
mix de cores até 3x sem apenas com
juros em etiqueta
compras fixada no
acima de produto e
R$400,00 não usadas);
trocas no
prazo de até
trinta dias
após o
recebimento
da
mercadoria;
peças
compradas
em
liquidação
podem ser
trocadas;
solicitações
por defeitos
em até
noventa dias
após o
recebimento.
79

Na.Loo Peças Entre R$118 Pagamentos Rio de E-Commerce Troca e


clássicas com e R$288. via cartão de Janeiro, RJ Instagram devolução
novas Podendo ser crédito ou - Brasil Facebook garantidas
estéticas, mais baixo boleto. Para (Desatualizado) até 7 dias
modelagens em peças de compras corridos da
atemporais, liquidação. feitas no entrega.
uso de cores cartão de Primeira
vivas, crédito, troca por
praticamente parcela em conta da
nenhuma ate 6x, com marca. A
estampa. parcela partir da
mínima de segunda
R$ 60. troca, custos
de frete para
devolução e
novo envio
por conta do
cliente.

Conclusões Sendo uma A Olidratins Todas as O foco das O atendimento Serviços


marca nova, será uma formas de concorrentes da Olidratins gerais
a Olidratins, marca com pagamento é o e- será via parecidos.
mesmo com preços entre são commerce, o WhatsApp,
o mesmo ambas as parecidas, mesmo que chat do e-
norte estético concorrentes, apenas será a commerce e
de alfaiataria, mostrando destacando Olidratins. chat no
tem espaço que os que no e- instagram. Os
no mercado preços são commerce mesmos
já que o coerentes da Na.Loo a veículos de
objetivo é com o possibilidade atendimento de
ressignificar público. de mais ambas as
esses Onde será parcelas concorrentes.
modelos, com procurado pode ser
cores e também uma
modelagens oferecer característica
mais peças com que
modernas, preços mais influencie na
mas ainda acessíveis, hora da
com toques mas com o compra.
clássicos. mesmo nível
de qualidade.

(Tabela 2) Fornecedores e Matérias-primas


Descrição dos Nome do Preço Condições Prazo de Localização
Itens a Serem Fornecedor de entrega (estado e/ou município)
Adquiridos pagamento
(Matérias-primas,
insumos,
mercadorias e
serviços)
Linho Clássico TEX Prima R$83,40 Cartão de Em média São Paulo, SP
LOF metro Crédito 5 dias
100% Linho úteis
Cotton Eco Leve Br TEX Prima R$42,00 Cartão de Em média São Paulo, SP
LOF metro Crédito 5 dias
85% Algodão 15% úteis
Poliéster Reciclado
Cambraia de Linho Maximus R$99,00 Cartão de 8 dias São Paulo, SP
Cru Tecidos metro Crédito úteis
80

100% Linho
Tecido Gazze Maximus R$45,00 Cartão de 8 dias São Paulo, SP
Algodão Tecidos metro Crédito úteis

100% Algodão
Tricoline Maximus R$39,00 Cartão de 8 dias São Paulo, SP
Tecidos Crédito úteis
100% Algodão
Botão de Coco Cia dos R$68,22 Cartão de Em média São Paulo, SP
Personalizado Botões 144 Crédito 4 dias
unidades úteis
Tam. 32
Botão de Coco Cia dos R$46,08 Cartão de Em média São Paulo, SP
Personalizado Botões 144 Crédito 4 dias
unidades úteis
Tam.: 18
Zíper Invisível Armarinho R$5,49 Cartão de 3 a 5 dias Londrina, PR
São José 10 Crédito úteis
15cm unidades

Estratégia de marketing

Principais produtos
▪ Blazers
▪ Blusas sociais
▪ Calças de alfaiataria
▪ Shorts alfaiataria
▪ Tops

Média de preço

A Olidratins vai ter peças de custos entre R$95 e R$950, onde as peças de
maiores custos envolvem a modelagem e o tecido utilizado, também sendo fator para
o valor acima beneficiamentos utilizados em alguma coleção. Pela escolha de matéria
prima ser focada em tecidos de origem natural e reciclados, o seu preço é mais
elevado do que um tecido sintético, agregando dentre os muitos benefícios, caimento
e qualidade.

Estratégias de promoção

Como estratégia de divulgação, será usado a rede social Instagram, que foi
apontada como rede social mais utilizada na pesquisa de público, com parcerias (via
81

permuta ou parcerias pagas) com influencers com as características do público


consumidor, e que tenham um engajamento favorável para uma marca nova no
mercado. Exemplo: Monique Campos, influencer de moda, que transita entre os
estilos mencionados (casual, urbano e clássico). A marca também será promovida em
eventos presenciais como feiras (Babilônia Feira Hype), e pelo Google Ads.
Como promoção, ajudando a alavancar o estilo defendido pela marca, nos
posts em redes sociais – principalmente no Instagram – será apresentado formas de
se usar as peças em alfaiataria da marca, de uma forma mais casual e
descontextualizada do normal encontrado em sites e páginas de moda clássica.

Custo de promoções

Todas as promoções serão um tipo de investimento na visibilidade da marca,


esperando retorno quase imediato, já inclusas em uma planilha de gastos. Será
incentivado também que as clientes postem fotos ou stories marcando a marca, com
uma hashtag própria da marca e o próprio “arroba” (@). Trazendo a possibilidade de
criar conteúdo com as clientes reais, e não apenas as modelos. Assim, o intuito é nos
aproximar das consumidoras como uma marca também afetiva.

Entregas e custos

As entregas serão feitas para todo o Brasil pelos Correios, modalidade PAC ou
Sedex, e no Rio de Janeiro – Zona Sul, Zona Norte, Zona Oeste, Centro e Duque de
Caxias – as entregas serão feitas pela RioBike Courrier, uma empresa de entregas
sustentáveis. Os custos serão arcados pelo cliente, onde o frete será calculado na
plataforma de e-commerce da marca.

Capacidade máxima de produção, volume de produção e comercialização

Inicialmente a marca lançará uma coleção com um mix de produtos total de 450
peças, sendo divididas entre tops, shorts, calças, camisas e blazers, com grade de
tamanho abrangendo do PP ao GG. Nessa primeira coleção será incluída peças
básicas e fixas na marca, tendo como denominação peças básicas. O lançamento de
coleções será dividido entre sazonais e cápsulas, onde cada coleção contará com ao
menos 2 peças fixas, podendo aumentar de acordo com o balanço de vendas da
82

mesma. A coleção também será composta por peças “exclusivas”, ou seja, baixo
estoque e sem reposição.
A produção de novas peças, de coleções já veiculadas, terá início quando o
estoque estiver baixo, visando uma produção consciente, e fazendo apenas peças
que temos registros de saída acelerada.

Investimentos fixos

A – Máquinas e equipamentos

Tabela 3 – Máquinas e equipamentos


Descrição Quantidade Valor Unitário Total
Notebook 1 R$3.300 R$3.300
Impressora 1 R$458,10 R$458,10
Ferro de passar a 1 R$98 R$98
seco
Máquina 1 R$2.299,00 R$2.299,00
Ultralock
Singer
Máquina reta 1 R$2.499,99 R#2.499,99
Industrial Yamata
Sub-total(a) $ R$8.655,09

B – Móveis e utensílios

Tabela 4 – Móveis e utensílios


Descrição Quantidade Valor Unitário Total
Mesa de 1 R$1.965,00 R$1.965,00
Corte/Modelagem
Tesoura de 1 R$96,00 R$96,00
Tecido
Tábua de Passar 1 R$256,00 R$256,00
Réguas de 1 kit R$60 R$60
Modelagem
Banquetas Altas 1 kit com 2 R$92,00 R$92,00
Banquetas
Cadeira para 1 R$352,90 R$352,90
Costura com
rodinhas
Subtotal(a) $ R$2.821,90

Tabela 5 – Total investimentos fixos


Total dos investimentos (A+B) $ R$11.476,90
fixos
83

Capital de giro – Estimativa de estoque inicial


Tabela 6 – Estoque inicial
Descrição Quantidade Valor Unitário Total
Linho Clássico 15m R$83,40 R$1.251,00
metro
100% Linho
Cotton Eco Leve 15m R$42,00 R$630,00
Br metro

85% Algodão
15% Poliéster
Reciclado
Cambraia de 15m R$99,00 R$1.485
Linho metro

100% Linho
Tecido Gazze 15m R$45,00 R$675,00
Algodão metro

100% Algodão
Tricoline 15m R$39 R$585,00
metro
100% Algodão
Aviamentos Diversos - R$176,88

Total de A R$4.802,88

Prazo médio de vendas


Tabela 7 –Prazo médio vendas
Modalidade (%) Número de Média Ponderada
dias em dias
a vista 25% - 0
a prazo 45% 30 13,5
a prazo 25% 60 15
a prazo 5% 90 4,5
Prazo médio 33 dias
total 36 dias

Prazo médio de pagamentos dos fornecedores


Tabela 8 – Prazo médio de pagamentos dos fornecedores
(%) Número de dias Média
Ponderada em
dias
a vista 50% -
a prazo 50% 30 15
84

Prazo médio 15 dias


total

Tabela 9 – Estoque matéria prima


Necessidade média de estoques Número de dias= 15 dias
Tabela 10 – Dias capital de giro
Recursos da empresa fora do seu Dias (de quanto em quanto tempo
caixa se recebe)
1. Contas a Receber – prazo médio 33
de vendas
2. Estoques – necessidade média de 15
estoques
Subtotal 1 (item 1 + 2) = 48
Recursos de terceiros no caixa da Dias (de quanto em quanto tempo
empresa (dinheiro para pagar os se paga fornecedores)
fornecedores)
3. Fornecedores – prazo médio de 15
compras
Subtotal 2 = 15
Necessidade Líquida de Capital de 33
Giro em dias (Subtotal 1 – Subtotal
2)

Tabela 11 – Caixa mínimo


1. Custo fixo mensal (Quadro 5.1) R$2.653
2. Custo variável (Subtotal 2 do quadro $2.281,90
mensal de capital de giro acima)
3. Custo total da (item 1 + 2 desta tabela) R$4.934,90
empresa
4. Custo total diário (item 3 total da desta R$164,49
tabela ÷ 30 dias)
5. Necessidade Líquida (vide resultado do 33
de Capital de Giro em quadro anterior)
dias
Total de B – Caixa mínimo (item 4 x R$ 5.428,39
5)

Capital de giro – Resumo


Tabela 12 – Resumo capital de giro
Investimentos financeiros R$
A – Estoque inicial R$4.802,88
B – Caixa mínimo R$ 5.428,39
Total do capital de giro necessário =R$ 10.231,27
(A +B)

Tabela 13 – Investimentos pré-operacionais


85

Investimentos pré-operacionais R$
Despesa MEI R$56,00
Registro INPI R$298
Divulgação R$250,00
Outras despesas R$150,00
Total R$754,00

Investimento total
Tabela 14 – Investimento total
1. Investimentos Fixos – Quadro 5.1 R$8.655,00
2. Capital de Giro – Quadro 5.2 R$ 10.231,27
3. Investimentos Pré-Operacionais – R$754,00
Quadro 5.3
Total (1 + 2 + 3) 100% R$19.640,27

Tabela 15 – Capital inicial


Fontes de recursos (R$) (%)
Valor
1. Recursos próprios R$19.640,27 100%
Total R$19.640,27 100%

Estimativa de custos com produtos


Produto 1 - Camisa Social
Tabela 16 – Custo produto 1
Material Quantidade Custo Unitário Total (R$)
(R$)
1.Tecido 2m R$83,40 R$166,80
Linho Clássico
2.Linha 10m R$0,02/m R$0,20
3. Botão 8 R$0,32 R$2,56
4. Etiqueta 1 R$0,51 R$0,51
5. Papel de Seda 1 R$1,10 R$1,10
6. Caixa 1 R$7,37 R$7,37
Personalizada
Total R$178,54

Produto 2 - Calça Social


Tabela 17 – Custo produto 2
Material Quantidade Custo Unitário Total (R$)
(R$)
1.Tecido 2m R$42 R$84
Cotton Eco Leve
2.Linha 10m R$0,02/m R$0,20
86

2. Zíper 1 R$0,55 R$0,55

3. Botão 1 R$0,48 R$0,48


4. Etiqueta 1 R$0,51 R$0,51
5. Papel de Seda 1 R$1,10 R$1,10
6. Caixa 1 R$7,37 R$7,37
Personalizada
Total R$94,21

Produto 3 - Short
Tabela 18 – Custo produto 3
Material Quantidade Custo Unitário Total (R$)
(R$)
1.Tecido 1,50m R$39,00 R$58,50
Tricoline
2.Linha 10m R$0,02/m R$0,20
3. Zíper 1 R$0,55 R$0,55
4. Botão 1 R$0,48 R$0,48
5. Etiqueta 1 R$0,51 R$0,51
6. Papel de Seda 1 R$1,10 R$1,10
7. Caixa 1 R$7,37 R$7,37
Personalizada
Total R$68,71

Produto 4 - Blazer
Tabela 19 – Custo produto 4
Material Quantidade Custo Unitário Total (R$)
(R$)
1.Tecido 2,50 $99,00 R$247,50
Cambraia de
Linho
2.Tecido 2,50 R$39,90 R$99,75
Tricoline Forro
3.Linha 10m R$0,02/m R$0,20
4. Botão 1 R$0,48 R$0,48
5. Etiqueta 1 R$0,51 R$0,51
6. Papel de Seda 1 R$1,10 R$1,10
7. Caixa 1 R$7,37 R$7,37
Personalizada
Total R$356,91

Produto 5 – Top
Tabela 20 – Custo produto 5
87

Material Quantidade Custo Unitário Total (R$)


(R$)
1.Tecido Gazze 1,50m R$45 R$67,50
Algodão

2.Tecido 1,50m R$39,90 R$59,85


Tricoline Forro
3.Linha 10m R$0,02/m R$0,20
4. Botão 3 R$0,48 R$1,44
5. Etiqueta 1 R$0,51 R$0,51
6. Papel de Seda 1 R$1,10 R$1,10
7. Caixa 1 R$7,37 R$7,37
Personalizada
Total R$137,97

Tabela 21 – Estimativa custo médio dos produtos


Estimativa de custo médio com produtos

(produto 1 + 2 + 3 + 4 + 5/5) = R$167,27


custo médio total:

Estimativa de vendas
Tabela 22 – Estimativa de vendas
Preço de venda Expectativa de Total (Preço x
unitário(R$) vendas em unidades Quantidade)
mensal R$
1. R$445,90 15 R$6.688,50
2. R$235,00 10 R$2.350,00
3. R$170,00 25 R$4.250,00
4. R$890,00 5 R$4.450,00
5. R$330 20 R$6.600
Total = R$24.338,50

Impostos
Tabela 23 – Impostos
Descrição % do imposto Faturamento Custo Total (R$)
Estimado
SIMPLES 4% R$24.338,50
ICMS – Imposto 1,5%
sobre Circulação
de Mercadorias e
Serviços
INSS 5%
88

Propaganda 2%
Taxa de 3,79%
administração do
cartão de crédito
Subtotal 2
TOTAL (Subtotal 1 + 2) =R$20.373,76

“As empresas optantes pelo SIMPLES devem desconsiderar o recolhimento


dos seguintes impostos: IRPJ, PIS, COFINS e Contribuição Social” (SEBRAE, 2013)

Viabilidade econômica
Tabela 23 - Viabilidade econômica
Saídas(R$) A Entradas(R$) B
Investimentos por 1 R$19.640,27 -
ano
Valor estimado de R$31.836 -
custos fixos por 1 ano
Valor estimado de R$122.775,24 -
custos de giro por 1
ano
Valor estimado de - R$292.062
vendas por 1 ano
Total R$174.251,51 R$244.485,10
(Impostos Descontados)
Total geral (entradas totais A – saídas totais B) R$70.233,59
=

▪ Pontos fortes: Peças modernas, marca com o pilar de sustentabilidade –


produção das peças, tags, envios -, vendas online (qualquer pessoa no Brasil,
se interessando poderá adquirir), mix de produtos que incluem peças fixas e
exclusivas, contato mais próximo dos clientes.
▪ Pontos fracos: Valores elevados, marca nova no mercado.

Nesse capítulo, com as análises de público alvo, segmento e escolha das


concorrentes, foi possível adquirir uma característica da Olidratins: ser uma marca que
esteja no meio de ambas as concorrentes citadas. Onde o objetivo central é trazer
uma imagem mais jovem e urbana para peças com histórico mais clássico, e também
sem perder o luxo que determinados momentos da vida pedem. Com um
relacionamento mais íntimo com as consumidoras, a Olidratins será uma “marca-
89

amiga” que irá trazer os opostos em um mesmo ambiente, com preços acessíveis e
justos, tecidos de qualidade e modelagens mais modernas.
Os dados aqui apresentados irão servir de base para o desenvolvimento do
projeto de coleção de moda feminina atemporal, em conjunto com os similares a
serem apresentados no próximo capítulo, com propósito de definir um caminho a se
seguir para o sucesso da Olidratins.
90

Capítulo 3 – Similares e proposta de coleção

Este capítulo trará a análise de coleções e objetos das áreas do design e arte,
que de alguma forma, estejam relacionados ao tema ou ao estilo da coleção. Assim,
será apresentado imagens, juntamente com a análise de proximidade e
distanciamento. Para que assim, haja ligação entre o tema na parte teórica e estética
da coleção a ser criada. Finalizando o capítulo, será apresentada a proposta de
coleção, com ideias e objetos a serem trabalhados na parte prática.

3.1 Jacquemus – Primavera 2021 Ready-to-Wear

Imagem 48: Desfile primavera ready-to-wear 2021 – Jacquemus

Designer/marca: Simon Porte Jacquemus, nasceu em um vilarejo no sudeste da


França, sendo a região que é normalmente a inspiração para as suas peças, assim
como o estilo de vida simples. (YAHN, FFW, 2018)20
Simon começou sua marca – batizada com o sobrenome de solteira de sua
mãe Jacquemus – com 19 anos, sendo uma marca com o crédito de trazer frescor ao
cenário de moda de Paris, com coleções desconstruídas, surrealistas e “não seguras
para o trabalho21”, onde suas peças transitam entre o comercial e o conceitual. (BOF22,
tradução nossa.)

20
https://ffw.uol.com.br/noticias/gente/entenda-por-que-a-moda-esta-se-apaixonando-por-simon-porte-
jacquemus/
21
No original: NSFW
22
Business of Fashion. Informações obtidas no site
https://www.businessoffashion.com/community/people/simon-porte-jacquemus
91

“Suas coleções têm um espírito infantil e uma sensação de liberdade, muitas


vezes apresentando designs assimétricos, silhuetas "rígidas" de grandes dimensões,
maquiagem experimental e modelos descalços ou sem camisa.” (BOF, tradução
nossa.) A marca Jacquemus tem como conceito, o espírito de elegância despojada,
sensual e atemporal; e com isso Simon foi finalista do prêmio LVMH em 2015 e
vencedor do prêmio especial em 2016. (YAHN, FFW, 2018)

Descrição: A coleção L’Amour, representa o amor e a celebração, como o mesmo


disse em uma entrevista antes do desfile, “como um simples casamento no campo ou
festival da colheita”. (VOGUE RUNAWAY, 2020, tradução nossa)
Utilizando referências provençais – região qual Simon nasceu – a coleção conta
com roupas que apresentam uma estética delicada e neutra, com peças de
modelagem diferenciada e acabamento alfaiataria. O cenário determina o visual leve
e bucólico, enquanto algumas peças trazem o urbano e contemporâneo (1ª foto,
imagem 48). A paleta de cores neutras segue em harmonia com o cenário escolhido.

Detalhes Técnicos: Peças produzidas em algodão, cânhamo, linho; tais tecidos


podem ser ligados ao clima mediterrâneo da Provença francesa (verão quente e seco,
inverno chuvoso e de baixas temperaruas), sendo tecidos leves e respiráveis,
adequados para climas mais quentes.
As pregas e estrutura das peças adquirem uma leitura mais refinado,
contrapondo, e complementando, a visão leve e campestre da coleção.

Figura 49: Desfile primavera ready-to-wear 2021 – Jacquemus

Aproximações: O visual da alfaiataria em peças sem o ar de “social” e para trabalho


caracteriza como aproximação. Assim como o uso de cortes e detalhes na modealhem
92

diferenciadas (3ª foto, figura 49). O aspecto do campo também pode ser citado, já que
a raiz de Zé Pelintra traz uma visão mais leve e campal.

Distanciamentos: A paleta de cores, consistente em cores neutras, caracteriza como


distanciamento. A coleção a ser criada tem como objetivo o equilibrar o uso de cores
neutras e fortes. Cortes incomuns (2ª foto, figura 49), também entram como
distanciamento, por ser uma coleção que procura a versatilidade em poder ser usada
em um look casual.

3.2 Brandon Maxwell - Resort Pré-Primavera 2021

Figura 50: Lookbook Resort 2021 – Brandon Maxwell

Designer/marca: Designer de moda norte americano, Brandon Maxwell é diretor


criativo de sua marca homônima, criada em 2015. Estudou fotografia na faculdade St.
Edward’s em Austin – Texas, e em 2012 se estabilizou na carreira de styling,
trabalhando com Lady Gaga, e em campanhas de moda e editoriais. Brandon é
inspirada pelas mulheres fortes a quais ele se cerca, sua marca registrada é a
alfaiataria nítida e detalhes esculturais, a cada temporada o design evolui, mas a musa
continua a mesma.
Ganhador de vários prêmios, sendo alguns deles o Designer do Ano 2020 da
AAFA23, Designer de Moda Feminina do Ano 2019 da CFDA 24, Estrela de Moda 2019

23
American Apparel & Footwear Association – Associação americana de vestuário e calçados.
24
Council of Fashion Designer of America – Conselho de designers de moda da América
93

da FGI25; Maxwell lançou sua marca com o desejo de fazer as mulheres se sentirem
bonitas, sofisticadas e poderosas, com peças atemporais e de corte impecável. 26

Descrição: A coleção conta com 15 looks que passam uma imagem mais casual e
urbana, sem perder a sofisticação. “Malha de gola alta e calças de moletom podem
transitar entre trabalho e noite com a adição de um salto.” (Tradução nossa, frase de
descrição encontrada no site)27
A coleção conta com peças fluídas (2ª foto, imagem 51) e estruturadas (1ª foto,
imagem 50). Com cores vibrantes que, de acordo com o release, passam sentimentos
de otimismo, alegria e entusiasmo.28 Tais sentimentos podem ser vistos também nas
expressões faciais da modelo. Com peças em alfaiataria e malharia, a estética
descontraída é refletida nas cores e formas, mesmo nas peças clássicas (1ª foto,
imagem 50).
Cintos de camurça e plissados, trazem textura e movimento para o look, junto
com o recorte superior, encontrado no vestido rosa. (4ª foto, imagem 51) O visual
acetinado das peças traz um ar de sofisticação para o descontraído.

Figura 51: Lookbook Resort 2021 – Brandon Maxwell

Detalhes Técnicos: Peças produzidas em algodão, lã, rayon, seda e lã virgem. As


fotos apresentam a fluidez presente nas peças e o visual despreocupado.

25
Fashion Geoup International – Grupo de moda internacional
26
Informações obtidas no site oficial da marca. Disponível em:
https://brandonmaxwellstudio.com/about/designer/. Acesso em: 10 de maio de 2021.
27
Descrição disponível em: https://brandonmaxwellstudio.com/collections/p-s-21/. Acesso em: 10 de
maio de 2021.
28
Descrição disponível em: https://www.vogue.com/fashion-shows/resort-2021/brandon-maxwell
94

Aproximações: O uso de detalhes como recortes e a modelagem mais casual e


versátil das peças trazem a aproximação do que se procura apresentar na coleção. A
imagem chique e descontraído se aproximam do que será proposto para a coleção,
com peças fluídas que representam o semblante leve da entidade Zé Pelintra.

Distanciamentos: Paleta de cores muito extensa, indo do laranja vibrante até o


bordô, tons de verde e cores pasteis. O uso do jeans também configura um
distanciamento, por ser uma coleção que terá em grande parte tecidos leves como o
linho, e não visa o uso do jeans.

3.3 Alexander McQueen - Outono Ready-to-Wear 2020

Figura 52: Desfile outono ready-to-wear 2020 – Alexander McQueen

Designer/marca: Marca lançada em 1992, que leva o mesmo nome de seu criador.
Alexander McQueen começou sua carreira como alfaiate na Anderson & Sheppard,
em Londres, quando largou a escola aos 16 anos, e como figurinista teatral. Trabalhou
com os designers Koji Tatsuno em Londres, e com Romeo Gigli na Itália. Quando
voltou à Londres, McQueen cursou a faculdade de moda Central Saint Martins durante
o período de 1990-1992, quando produziu um desfile para a sua coleção de formatura,
que chamou a atenção da designer londrina Isabella Blow, que comprou toda primeira
coleção de McQueen.
Em 1996 foi nomeado o Designer Britânico do Ano, e no mesmo ano assumiu
a direção criativa da Givenchy, onde ficou durante 5 anos, até voltar a focar na sua
95

própria marca em 2001. Como marca registrada, suas peças traziam designs com
características românticas sombrias, modelagens atrevidas, peças dramáticas que
remetem à influência do teatro em sua vida, trabalhando com opostos: luz e escuridão,
vida e morte etc.
No mesmo ano, Sarah Burton, atual diretora criativa da marca, trabalhou para
McQueen durante sua formação na Central Saint Martins. Assim que formada, Sarah
voltou a trabalhar com Alexander McQueen, sendo nomeada em 2000 como designer
chefe da coleção feminina da marca, cargo que permaneceu até 2010, quando
McQueen faleceu, e Sarah foi anunciada como sucessora. 29

Descrição: A coleção de outono 2020 de Alexander McQueen tem como inspiração


o País de Gales, terra de mitos e criatividade. Sarah Burton, em uma visita ao Museu
Nacional de História St. Fagans, teve como chamariz de atenção o Quilt em alfaiataria
Wrexham, confeccionado à noite, em um período de 10 anos a partir de 1842, por um
alfaiate que usava sobras de tecidos dos uniformes que ele fazia durante o dia. As
inspirações galesas como as colheres de amor e os tradicionais cobertores também
construíram a imagem da coleção. A coleção apresenta as mulheres guerreiras de
McQueen. (VOGUE RUNAWAY, 2020, tradução nossa)
Com elementos que passam força, como exemplo o blazer alongado e
estruturado (2ª foto, imagem 52), a coleção de McQueen apresenta a força e a
delicadeza, com peças texturizadas e com cores fortes. A fluidez do tule junto com o
visual romântico da renda, trazem a estética de delicadeza e ao mesmo tempo
diferenciação (peça escolha do tom de vermelho). A coleção conta também com peças
acetinadas, acessórios e acabamentos em couro.

29
Informações obtidas nos sites: https://www.businessinsider.com/alexander-mcqueen-legendary-fashion-
designer-life-career#alexander-mcqueen-is-often-regarded-as-one-of-the-most-innovative-designers-of-all-
time-1; https://www.britannica.com/biography/Alexander-McQueen. Acesso em 13 de maio de 2021.
96

Figura 53: Desfile outono ready-to-wear 2020 – Alexander McQueen

Detalhes Técnicos: Na coleção, foi incluída as flanelas de coleções passadas da


Alexander McQueen, junto com alfaiataria gráfica e costura bem-feita, refletindo
releituras contemporâneas do alfaiate da Era Vitoriana. Aplicações de renda guipir,
uso de tecidos estruturados e design inovador das peças trazem a imagem de força,
junto com modelagens mais amplas e cores mais delicadas como o rosa, que
representam as anáguas costuradas pelas mulheres galesas no tom de rosa claro.

Aproximações: O uso de aplicações de renda, onde se aproximam pelo tema se


tratar também de uma religião onde é utilizada a renda para as roupas de santo de
médiuns mulheres, também trazem o visual mais feminino da entidade Maria Navalha,
cuja imagem é retratada também em saias de babados ou saias longas e fluídas.
As cores fortes e a estrutura de determinadas peças se aproximam de uma
leitura mais conceitual e luxuosa da coleção.

Distanciamentos: Estamparia presente em outras peças da coleção, assim como o


uso da cor rosa, que não se encaixa no tema proposto. As peças também trazem uma
imagem mais séria, não estando de acordo com a coleção a ser criada.
97

3.4 Bolsa Lil Dagger Straw Bag – Eric Javits

Figura 54: Bolsa Lil Dagger

Designer/marca: Eric Javits é um designer norte americano que frequento a Escola


de Design de Rhode Island, onde estudou pintura e escultura. Ao descobrir a
chapelaria, descobriu um meio de conectar o amor pela arte e o interesse pela moda,
abrindo então sua empresa de chapéus femininos em 1985.
Após 10 anos, Eric lançou o chapéu Squishee ®, que podia ser enrolado para
a viagem e voltar a sua forma original (feito de palha de ráfia). O conceito Squishee
evoluiu para bolsa em 1997, para calçados em 2001, e há pouco para acessórios
como carteira e pulseiras.
Eric Javits é membro do Conselho de Designers de Moda da América, e seus
designs estão inclusos nos aquivos do Instituto de Vestuário do Museu Metropolitano
de Arte.30

Descrição: A Lil Dagger Straw Bag faz parte da coleção 2021 de bolsas de palha
para praia da marca Eric Javits. Tal coleção conta com bolsas na cor de palha e
coloridas, com detalhamentos em bordados, metalizados e tassel.

Detalhes Técnicos: Bolsa em palha Squishee ®, com detalhes em couro prateado e


alça removível de couro. Dimensões: 22cm x 21,5cm x 12,5.

30
Informações disponíveis em: https://ericjavits.com/pages/about-us
98

Aproximações: O uso da palha remete ao chapéu de panamá, utilizada por ambas


as entidades (Zé Pelintra e Maria Navalha), cujo acessório é feito de palha de toquilla.
A adaga em couro metálico prateado lembra o aço presente nas navalhas e punhais,
presentes como símbolos da malandragem.

Distanciamentos: A princípio, o visual praiano difere do proposto na coleção.

3.5 Casa Atibaia

Figura 55: Casa Atibaia – Charlotte Taylor e Nicholas Préaud

Designers: Charlotte Taylor é uma ilustradora e designer londrina, formada em belas


artes na faculdade de artes de Chelsea, fundadora da Maison de Sable. E Nicholas
Préaud um arquiteto francês, fundador da ni.acki.

Descrição: A Casa Atibaia, localizada no rio Atibaia em São Paulo, foi inspirada pelo
modernismo brasileiro, e em especial a Casa de Vidro, da arquiteta ítalo-brasileira,
Lina Bo Bardi. O projeto é a primeira colaboração da dupla, sendo composta de
concetro e vidro, podendo ser considerado um exemplo relevante do modernismo
brasileiro. (CASA COR, 2021)

“Casa Atibaia fica entre a essência delicada e arejada e um


aspecto brutal e primitivo” (CHARLOTTE TAYLOR, tradução
nossa)

De acordo com Charlotte, no site de arquitetura Archello, o modernismo brasileiro,


para a dupla, significa viver por dentro com a ilusão de estar do lado de fora.
99

Figura 56: Casa Atibaia – Charlotte Taylor e Nicholas Préaud

Detalhes Técnicos: Com a estrutura construída ao redor de rochas já existentes no


ambiente, que servem como pilares naturais da fundação, o projeto possuí suas
paredes em fachadas de vidro com molduras pretas, criando movimentos curvos e
permitindo a visualização da mata. A brutalidade das pedras também é presente no
design interior, onde o banheiro e o vestiário foram esculpidos em tais formas, e as
rochas menores usadas como elementos de mobília. (CHARLOTTE TAYLOR,
tradução nossa)
A estrutura segue os princípios geométricos do modernismo, mas abre espaço
para um pátio interno que se curva em função a vegetação. (Figura 55)

Aproximações: O conceito do modernismo na arquitetura de simples, mas não


simplório já pode ser considerado como aproximação, já que a proposta da coleção é
são peças contemporâneas de estética simples, porém bem confeccionadas. As
formas básicas/geométricas também podem ser usadas no design da coleção,
optando por linhas e curvas.
A questão da natureza envolvida também caracteriza como aproximação, tanto
pela raiz juremeira de Zé Pelintra, como também pelo uso de ervas pela religão. O
projeto contextualiza o encontro da raiz de Zé Pelintra e a figura urbana carioca.

Distanciamentos: Sendo os materiais mais usados e bases na arquitetura


modernista (o concreto, aço e vidro), a falta de cor na paleta devido ao uso dos
100

materiais confere como distanciamento, já que o verde natural das matas o único
ponto de cor forte do projeto. A coleção a ser produzida visa utilizar cores mais fortes.

3.6 Videoclipe Despedida - Mc Tha

Figura 57: Cenas do videoclipe da música Despedida

Direção de fotografia: Martina Quezado

Direção criativa: Vitor Nunes

Descrição: O vídeo escolhido como similar é o videoclipe da sétima faixa do primeiro


álbum da cantora Mc Tha, Rito de Passá, lançado em 2020. A produção do videoclipe
é inteira feita nas cores vermelho e branco, sendo usadas em fundos, detalhes e nos
figurinos. Com cenários e objetos de cena simples, o foco de todo o vídeo é a cantora,
Mc Tha, no plano fotográfico de foco, onde o rosto da cantora é destacado em diversas
cenas.
A narrativa do videoclipe segue, junto com a letra da música, uma mulher que
esta se despedindo de uma parte dela mesma ao se despedir de um relacionamento.
Durante o decorrer do vídeo pode-se notar a ligação do vermelho, podendo
representar o amor e o branco, respectivamente, o renascimento, em uma nova fase
pós término de relacionamento.
O uso de flores (figura 57) e miçangas (figura 58) trazem uma estética mais
luxuosa, se contrapondo com outros cenários e figurinos do mesmo vídeo.
101

Figura 58: Cenas do videoclipe da música Despedida

Aproximações: O uso das miçangas em bordados e detalhes se aproxima da estética


mais luxuosa que será proposta em algumas peças dentro da coleção. A escolha de
cores, utilizada para uma visão mais suntuosa e próxima do sentimento de paixão,
também configura aproximação, já que as cores são presentes na estética do
malandro.
O uso dos babados entra como aproximação, por ser uma estética presente em
uma das imagens de Maria Navalha, como comentado no tópico 3.3. Ainda que os
babados sejam demasiadamente dramáticos, pelo uso de muito tecido, no clipe, a
proposta da coleção será um uso mais brando e em menor quantidade.

Distanciamentos: A modelagem ampla, sem a marcação do corpo (1ª foto, figura 58),
configura como distanciamento pela escolha de peças mais justas, assim como a
imagem de “pouca pele” aparente, já que por ser uma coleção pensada também no
clima tropical e quente, algumas peças utilizarão recortes e comprimento menor

3.7 – Proposta de coleção

A partir das pesquisas e do conteúdo apresentados nesse trabalho, pretende-


se desenvolver uma coleção de moda feminina - com inspirações no corte reto da
alfaiataria assim como em cortes mais modernos - com peças versáteis em sua
maioria, trazendo também peças luxuosas (apresentadas nos similares) em uma
parcela dos looks, como o uso de bordado com miçangas. Procura-se retratar a
102

malandragem de Zé Pelintra e Maria Navalha, entidades umbandistas, de uma forma


mais moderna, transitando do estilo clássico para se tornar mais urbano e casual.
No capítulo 1 é apresentada a temática, seu contexto religioso e histórico,
assim como histórias sobre as entidades citadas como objeto de pesquisa e a
Umbanda. Também foram apontadas a Lapa e o samba, ambos sinônimos da
malandragem, e finalizando o capítulo, a moda feminina e masculina nas décadas de
30 e 40, nortes estéticos da coleção, e a introdução de calças no vestuário feminino.
No capítulo 2, por meio de análise de entrevistas e pesquisas, foi possível obter
informações e confirmações sobre o público escolhido para esse projeto, que se
caracteriza como um público feminino, entre as faixas etárias 20 à 40 anos, que
buscam peças versáteis, estando dispostas a pagar um preço elevado por uma peça
com durabilidade e sustentável. Mulheres, em sua maioria, com estilo pessoal casual,
clássico ou urbano.
No mesmo capítulo, foi apresentada a marca desenvolvida para essa coleção,
Olidratins, que é uma marca baseada nos estilos casual, clássico e urbano, onde
peças de alfaiataria são apresentadas sob uma ótica de dia-a-dia, como exemplo
praias e bares, saindo do estereótipo de roupa de ambiente de trabalho. Também
foram apontadas duas possíveis concorrentes diretas, KRYA e Na.Loo.
No capítulo 3, foi abordado um estudo de similares de áreas do design e arte,
que poderiam assemelhar-se ao tema escolhido ou a estética de modelagem e
segmento. Com isso, foi definido as aproximações e distanciamentos, selecionando
então as formas, elementos visuais, estética que ajudarão a criar as peças da coleção.
Também foi definida previamente uma paleta de cores com base no tema, sendo as
cores principais vermelho, branco e preto, mostradas nos similares de moda. Além
das cores principais, serão aplicadas cores como o verde-oliva e o amarelo, presentes
nos objetos e referências da temática da malandragem.
A coleção nomeada Navalha e Punhal, apresentará 15 look com seguindo o
conceito de peças versáteis, como calças pantalona, vestidos, blusas, tops etc.,
compondo uma coleção de peças clássicas de alfaiataria e peças mais casuais.
Elementos como o baralho, os dados, e os propriamente ditos punhal e navalha serão
apresentadas de forma subjetiva, assim como, de forma direta, dependendo da peça.
Padronagens e estampas, serão presentes, mas não amplamente trabalhadas, de
forma que o foco das peças seja o design e modelagem, com o uso de formas
103

geométricas e linhas apresentadas como similar no objeto de ambiente. (ver tópico


3.5)
Junto com as peças com uma estética mais próxima do casual, será proposto
um número reduzido de peças mais luxuosas, com bordados e aplicações de outros
tecidos, apresentando uma mesclagem de texturas. Serão usadas miçangas
exclusivamente nas cores branco e vermelho, ou preto e branco, baseadas nos fios
de conta31 utilizados para representar as entidades na linha dos malandros.
Pensando no clima tropical, e com base nos resultados da pesquisa de público
(ver tópico 2.1), os tecidos principais a serem utilizados serão o linho e o algodão, que
permitem a respiração da pele. A laise de algodão e rendas serão utilizadas para
representar as roupas habituais nos terreiros de Umbanda. Também serão utilizados
tecidos de pet reciclado, trazendo a sustentabilidade de uma forma mais forte e em
forma têxtil, assim como o Lyocell e o Modal.

Figura 60: Mood board inspiracional para a proposta de coleção.

31
Colares feitos de miçanga que servem para estabilidade mediúnica e energética, também atuam como
proteção do médium.
104

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em História) – Universidade Federal Fluminense, UFF.
108

ANEXO 1
FICHAMENTO 01 1920. Para se consolidar como meio de
comunicação das massas, o rádio lançou mão
Título/Subtítulo: Era de Ouro da Música da música genuinamente brasileira como forma
Popular Brasileira de penetrar em todas as camadas da
Autor(es): REIS, Roberta Arujo dos sociedade.”
Ano: 2007
Páginas: 9-38 p. 22 – “O DIP foi criado em 1939, em
Fonte: REIS, Roberta Arujo dos. ERA DE substituição ao Departamento Nacional de
OURO DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA: Propaganda (DNP), com o objetivo de propagar
a construção do discurso. Rio de Janeiro, a ideologia estadonovista, visando fazer da
2007. 58 p. Monografia (Bacharel em política da época um discurso presente nas
Comunicação Social, habilitação em ruas de todo o país.”
Radialismo) - Escola de Comunicação da p. 22 – 23 – “Cabia ao Departamento coordenar
Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ. propagandas, censurar peças teatrais, filmes e
Cidade: Rio de Janeiro diversões públicas, organizar 22 manifestações
Editora: UFRJ patrióticas e dirigir o programa de radiodifusão
do governo.”
Resumo
p. 23 – “O DIP deu atenção especial à cultura.
Era de Ouro da Música Popular Brasileira faz (...)Também estimulou a criação de um samba
um estudo dos anos 30 a 45, e a valorização do que valorizava o trabalho, além, é claro, do
samba na Era Vargas, onde se era o foco a samba exaltação, como assinala Coutinho
divulgação da música popular brasileira. (2002, p.50): “No Estado Novo, quando se torna
Mostrando os fatores que ajudaram a trazer dominante a ideologia de culto ao trabalho, não
essa denominação, os maiores nomes do há mais lugar para a filosofia da
samba, mudanças políticas, econômicas e malandragem”.”
sociais que tiveram grande importância
p. 23 – “Desde o início de sua história, na
Citações década de 1920, as letras de samba contavam,
em sua maioria, com a temática do o malandro.
p. 9 – “Desde 1910, o samba fazia sucesso na Com sua filosofia de aversão ao trabalho, esse
periferia e nos morros da cidade do Rio de personagem, à margem da sociedade
Janeiro. O gênero era visto, pela maioria da capitalista em franco desenvolvimento, era
população, principalmente pelas pessoas da exatamente o oposto da ideologia divulgada
elite, como coisa de vagabundo, de bandido. O pelo Estado”
ritmo dividia opiniões de intelectuais. Enquanto,
para alguns, ele era a maior representação da p. 23-24 – “O chamado samba malandro foi o
cultura brasileira, para outros, ele representava principal alvo dos censores do DIP. As músicas
o atraso cultural do Brasil, pois remetia a um de valorização da malandragem foram
passado escravista que as camadas mais altas substituídas pela exaltação ao trabalho. Desta
da sociedade faziam de tudo para ser forma o samba foi 23 consolidado como
esquecido.” símbolo da música e da cultura nacional. A
música servia para divulgar os ideais varguistas
p. 10 – “Durante o governo de Vargas, a música de trabalho e valorização da pátria.”
popular brasileira viveu sua “Época de Ouro”, o
rádio se consolidou como principal meio de p. 25 – “Em 1926, chegou ao Brasil a vitrola. O
comunicação do país e o presidente soube desenvolvimento da gravação elétrica e a
como poucos utilizar os benefícios do rádio e da inauguração de várias gravadoras no país
música, tanto para atingir a todas as camadas possibilitaram a revelação de novos cantores e
da sociedade, em todos os cantos do Brasil, compositores e a maior popularização da
quanto para doutrinar o povo” música popular. O sucesso dos discos de
samba fez com que a indústria cultural se
p. 10 – “Após receber um incremento voltasse para um novo foco, o morro.”
significativo nos anos 1920, o samba se tornou
hegemônico na década de 1930 na área da p. 26 – “O ritmo brasileiro se espalhou pelo
produção musical brasileira. (PARANHOS, Brasil e passou a gerar discussões inflamadas
2007).” sobre sua participação no cenário cultural do
país. Para alguns intelectuais, o samba, devido
p. 17 “A “Era de ouro da Música Brasileira” a sua origem mestiça, demonstrava o atraso
coincide com o início da popularização do rádio, cultural da nossa sociedade, enquanto para
que havia chegado ao Brasil no início dos anos outros ele era o símbolo da evolução da nossa
110

cultura, o retrato da nova sociedade que estava Batista. Nascido em campos, cidade
sendo formada.” fluminense, participou, ainda criança, da banda
Lira de Apolo, onde tocava triângulo. Ao mudar-
p. 33 – “O samba nasceu na chamada Pequena se para o Rio de Janeiro, no início da década
África, região da Praça Onze, no centro da de 38 1920, transformou-se em um dos
cidade do Rio de Janeiro, no início do século principais personagens da boemia da Lapa.”
XX. Oficialmente, a primeira música de samba
a ser gravada foi “Pelo telefone”, de 1917, de p. 38 – “Suas músicas falavam de
autoria de Donga e Mauro de Almeida. malandragem, preconceito e questões sociais.”
(MOURA, 2004)”
p. 33 – “Uma das figuras mais emblemática da FICHAMENTO 02
turma do Estácio foi Ismael Silva. (...) Na
década de 1920, foi procurado pelo cantor Título/Subtítulo: Noel Rosa e as
Francisco Alves, que queria comprar as Transformações do Samba na Década de
músicas de Ismael e assinar como autor, fato 1930.
muito comum na época. O sambista aceitou a Autor(es): FENERICK, José Adriano
proposta e a parceria durou até 1935. Foi Ano: 2006
através de Francisco Alves que o samba Páginas: 16-46
ganhou popularidade e passou a predominar Fonte: FENERICK, José Adriano. Noel Rosa e
nas rádios na década de 1930, como explana as Transformações do Samba na Década de
Souza (2003, p.33): “Através da grande 1930. Revista de Humanidades – UFRN,
popularidade do rei da voz (e apesar de sua Caicó, V. 08. N. 20, p. 16-46. fev./mar. de 2006.
afeição pouco afeita ao sincopado), este novo Cidade: Caicó
samba do Estácio – que serviria de molde para Editora: Revista de Humanidades – UFRN
o modelo básico vigente até hoje – passou a
predominar.”.” Resumo
O artigo tem foco em apresentar Noel Rosa e o
p. 35 – “A adesão da classe média à música que ele mudou, simbolicamente, no samba na
popular pode ser notada pelas composições de década de 30. Fala-se da figura do malandro, e
Noel Rosa, estudante de medicina; Ary da polêmica briga entre Noel Rosa e Wilson
Barroso, bacharel em direito e Braguinha, Batista. Traz a história de Noel no samba, e
arquiteto, isso só para citar alguns. Essa como ele se tornou um “profissional do samba”.
expansão territorial e social da música popular É contado também um pouco do samba no
pode ser perfeitamente exemplificada pela início do século XX.
parceria entre Ismael Silva, negro, do bairro
pobre do Estácio, e Noel Rosa, branco, de Vila Citações
Isabel. (PARANHOS, 2007)”
p. 18 – “O samba da época de Donga e Sinhô,
p. 35-36 – “Outra coisa com a qual Noel não o samba da década de 1920 (ou mesmo
concordava era a identificação do sambista anterior), na grande maioria dos estudos sobre
como um malandro marginal. A figura do o assunto (especialmente os de caráter
malandro em suas músicas era mostrada por jornalístico e/ou memorialístico), tem sido
um lado mais humano, com alegrias e insistente e anacronicamente identificado como
dificuldades. Essa questão alimentou um samba-amaxixado, ao passo que o samba do
verdadeiro conflito musical entre Noel Rosa e Estácio de Sá, consagrado pelos meios de
Wilson Batista.” difusão musical a partir da década de 1930, por
sua vez, acabou entrando para a história como
p. 36 – “Quando em 1933, Batista escreveu a já o verdadeiro samba, como o samba ‚puro‛,
mencionada “Lenço no pescoço”, Noel aquele que conseguiu se libertar do maxixe.”
respondeu com “Rapaz folgado”, onde ele dizia
que malandro que é malandro trabalha. Wilson p. 18-19 – “(...) pois temos que levar em conta
não fez por menos e lançou “Mocinho da Vila”, que em cada geração de sambistas há pelo
em que critica Noel por falar de malandro. A menos dois tipos de samba: o que foi gravado
réplica do compositor da Vila veio com “Palpite em disco e o que não foi -, nas festas das tias
Infeliz”, que batista respondeu com “Frankstein baianas (como a famosa Tia Ciata), realizado
da Vila”, zombando dos problemas físicos de como partido-alto que ‚não é nunca cantado em
Noel, que não respondeu, dando fim ao duelo. desfile, mas sempre em roda‛ (2). Já o samba
(SOUZA, 2003)” do Estácio, segundo o próprio Ismael Silva, era
um samba feito para se brincar no carnaval,
p. 37-38 – “Outro notável compositor da “Era de para se desfilar no carnaval.”
Ouro da Música Popular Brasileira” foi Wilson
111

p. 22 – “Noel nunca se referiu à Cidade Nova, do samba, por meio dos compositores do
local de onde saíram os sambistas da geração Estácio (15).”
de Donga, Sinhô e Pixinguinha, como sendo
também um reduto de bambas. Assim, o Poeta p. 28 – “Associar o malandro ao samba, ou
da Vila, num primeiro momento, desloca o mesmo tomar o malandro como sinônimo de
samba do fundo das casas das tias baianas sambista, implica em reforçar a imagem do
(uma vez que ele o desconsidera) para o morro samba como sendo um legítimo ‚produto do
e o subúrbio, os locais doravante preferenciais morro‛, uma vez que o senso-comum da época
para o samba manter (ou passar a ter) sua acreditava que os morros do Rio de Janeiro
originalidade.” fossem habitados exclusivamente por
malandros.”
p. 22 – “Noel, ao cantar a sua Vila Isabel, que
curiosamente só aparece em três de seus p. 33 – “Noel Rosa vê o sambista/malandro
sambas, ao contrário de outros locais – como a como um boêmio. Nessa associação, nasce um
Mangueira e o Salgueiro, por exemplo – muito novo local para o samba: o botequim. O
mais citados, deixa a entender que não é sambista/malandro boêmio é um assíduo
apenas no morro que o samba é feito, nos freqüentador de botequins, seja no morro ou na
bairros suburbanos ele também tem seu valor.” cidade, e é lá que o samba se faz com mais
intensidade, e à mítica do samba do morro,
p. 26 – “Com o aparecimento do samba do soma-se a mítica do samba de botequim como
Estácio, morro e cidade passam a significar mais um elemento do ‚verdadeiro samba‛. Já se
universos antagônicos para o samba. (...) O disse que o botequim é para o Rio de Janeiro o
que se observa, no entanto, é que a visão sobre que o pub é para Londres ou o café é para
o morro que o sambista tem não é Paris: ‚antes de tudo um ponto de encontro, um
exclusivamente geográfica, mas sim de postura lugar de sociabilidade‛”
diante do samba, é uma ‚visão de mundo‛, ou
mesmo uma visão mítica. Em O x do problema, p. 34 – “(...) o sambista não é mais visto como
Noel mostra que o que está em questão não é aquele detentor dos antigos segredos do
exatamente se o samba é do morro ou da partido-alto ou das velhas tradições, mas sim
cidade, mas sim o antagonismo entre duas como um malandro boêmio, que perambula
posturas distintas que decorrem do pelos morros e pela cidade, pelo Rio de Janeiro
antagonismo entre cidade e morro: a postura enfim. Ou seja, a mudança de local e de
burguesa e a postura malandra, sendo que personagens relacionados com o samba,
apenas a segunda se enquadraria gradualmente vão transformando-o em carioca,
perfeitamente no samba.” em uma música intrinsecamente ligada ao Rio
de Janeiro.”
p. 27 – “A figura do malandro, que começou a
povoar o samba por volta do final dos anos p. 35 – “Segundo Letícia Vianna, a polêmica
1920, talvez seja a denominação última de um entre Noel e Wilson Batista pode ser vista como
tipo recorrente na cultura brasileira. As ‚duas formas de representação do malandro no
características primordiais do malandro, como samba: ambas afirmam a fronteira entre o
aquele que recusa o trabalho e vive de trabalho e o lazer, mas uma aproxima o
expedientes e golpes aplicados em algum malandro sambista do mundo da contravenção
otário, podem ser encontradas desde pelo e do crime, valorizando sua valentia, e a outra
menos o início do século XIX. Em lundus e o afasta deste mundo, mantendo-o na boêmia
romances do século XIX, este personagem e valorizando sua inteligência‛ (20).”
aparece com o nome de vadio, cujo vínculo com p. 36 – “No samba de Wilson Batista temos a
a música popular se dá a partir de sua relação descrição da indumentária do malandro, o
estreita com a viola e a cachaça.” ‚chapéu do lado‛, o ‚lenço no pescoço‛, o
p. 28 – “Ainda no século XIX, em obras literárias ‚tamanco arrastando‛ e a ‚navalha no bolso‛.
do período, o vadio tornar-se-á o capadócio. Ou Aos aspectos exteriores do malandro, à sua
seja, apenas uma nova denominação para o indumentária, soma-se o seu modo de andar
mesmo personagem, cujas características se gingado, seus atos de provocador e desafiador.
mantêm quase as mesmas (14). E por fim, no Orgulhoso desse seu modo, o malandro
início do século XX, o vadio e o capadócio se recrimina os otários que trabalham e continuam
transformam no malandro, visto pela imprensa na miséria, e por fim, diz que sua inclinação
da época quase como um sinônimo de natural para a malandragem vem desde
sambista, uma vez que a identidade entre criança, avaliada por seu talento em tirar
sambista e malandragem ocorre no mesmo sambas.”
momento em que se dá a mudança estilística
112

p. 37 – “Em Mulatinho bamba, marcha gravada anteriores, o samba passa a ser apenas
por Carmem Miranda, o sambista apresentado música, um gênero musical.”
é um malandro bom de samba, que samba com
elegância e conquista os corações das mulatas, p. 44-45 – “Contribuindo ao debate que opôs a
mas não anda armado, não tem lenço no cidade ao morro, Noel propõe uma alternativa
pescoço e nem chapéu de palha. Como está na diferente para entendermos o samba não é
marcha, o personagem descrito é um malandro nem do morro e nem da cidade.”
educado e refinado, tal como o samba (que o p. 45 – “Noel não fala de nenhum lugar
malandro representa) deveria ser entendido no geograficamente definido, pois se o “samba
momento.” não vem nem do morro e nem da cidade” é
p. 38 – “se antes a malandragem era vista em porque ele nasce em algum outro lugar, ou
imagem como uma escola de vida, que mesmo em ambos os lugares, ou ainda em
ensinava como sobreviver numa ordem social algum lugar que não é nem um e nem o outro,
onde as possibilidades de realização eram enfim, ele nasce “no coração”.”
restritas, agora – para os músicos, pelo menos FICHAMENTO 03
– era também um modo de ascender
socialmente sem a necessidade de um trabalho Título/Subtítulo: A Lapa Boêmia: Um Estudo
mal remunerado. E embora já fosse parte do da Identidade Carioca
processo de produção social, a música não Autor(es): VELASQUES, Maria Clara Chaves
aparecia para o compositor como uma forma de Ano: 1994
trabalho. Por isso, o sambista parecia realizar o Páginas: 3-113
sonho de acumular sem precisar trabalhar. Fonte: VELASQUES, Maria Clara Chaves. A
(22)” Lapa Boêmia: Um Estudo da Identidade
p. 39 – “. Para Vagalume, o samba que Carioca. Niterói, 1994. 129 p. Dissertação de
pertence à roda é ora o samba do passado e Mestrado (Programa de Pós-Graduação em
ora o samba de um presente que parece não História) – Universidade Federal Fluminense,
pertencer ao tempo, no caso: o morro. Ou UFF.
melhor, por desdenhar totalmente o samba Cidade: Niterói
gravado, o samba industrializado, Vagalume se Editora: UFF
apega ao samba antigo, do tempo da Tia Ciata
(feito na intimidade da casa), ou ao samba Resumo
produzido no morro, que (na opinião de A dissertação fichada a seguir tem como ideia
Vagalume) estaria fora do processo de apresentar a identidade carioca e Lapa, nos
modernização. Assim, tal como Noel, anos 30, 40 e 60. Onde ações políticas e
Vagalume também utilizar-se-á da oposição grandes personagens da Lapa são estudados,
entre o morro (local idílico do sambista assim como o arquétipo da malandragem
espontâneo) e a cidade (local da deturpação do carioca, discorrendo também sobre marcos
samba realizada pela indústria de diversão).” como o aqueduto carioca e o personagem Zé
p. 43 – “Noel diz que em Vila Isabel o samba Carioca, criado por Walt Disney.
tem o feitiço e enfeitiça a quem o ouve, tal como É apresentado os motivos da Lapa virar a
o samba era entendido anteriormente. Porém, referência do Rio de Janeiro, percorrendo por
é um feitiço diferente, é um feitiço decente, o arquitetura, história, samba e personalidades
que de antemão já denota uma preocupação de grande importância, que fizeram da Lapa
com a aceitação social (e comercial). Tal como sua morada e palco de aventuras.
em Rapaz Folgado, onde Noel deixa o
malandro nu, decompondo o seu aspecto Citações
exterior (a navalha, o lenço no pescoço, o
tamanco), em Feitiço da Vila o samba também p. 3 – “[...] A possibilidade de uma Lapa que
passa a ser desprovido de suas significações venha a servir de ponto de referência artístico e
exteriores. Continuando a ser feitiço, o samba intelectual para a cidade, resgatando seu
não carrega mais a significação religiosa da tradicional espírito de “boêmia sadia” ganha
cultura afro-brasileira: a vela, a farofa e o novos adeptos. Trata-se, segundo um dos
vintém.” coordenadores do Projeto Fundição Professo,
de ‘(...) fazer da Lapa um local de encontro de
p. 43 – “Só que a liberdade proposta por Noel artistas e intelectuais, reverter essa tendência
para o samba inclui um afastamento do de decadência e explorar sua vocação natural
universo negro lúdico/religioso até então para o turismo e o lazer cultural’.”
associado a ele. Desprovido de seus sinais
externos e desligado de seus locais e práticas
113

p. 4 – “Os argumentos de que o ‘bairro está p. 18 – “A boêmia constrói um modelo


para ficar para o Rio como o Soho para Nova simetricamente inverso à vida privada
Iorque e a Bastilha para Paris’, ou ainda que a burguesa. Primeiramente por sua relação
‘Lapa, que era um canteiro de mendigos, hoje é invertida com o tempo e o espaço; vida noturna
um colar de pérolas na cidade’, fortalecem o sem horários – o boêmio não usa relógio – de
discurso de que após as reformas tudo voltou a intensa sociabilidade tendo como o palco a
ser como antes, ou seja, o bairro conseguiu cidade, os salões, bares e avenidas. Os
trazer de volta a população que fazia parte boêmios ‘não conseguem dar dez passos na
deste grande centro cultural da cidade.” avenida sem encontrar um amigo’. Conversar é
seu prazer, sua principal ocupação.”
p. 7 – “Pode-se perceber que, frente ao
momento presente, as lembranças dos velhos p. 19 – “Sem se distanciarem de suas
frequentadores e moradores do bairro, atividades como intelectuais, estes boêmios
aproximam-se a um sentimento de perda e de tomam locais públicos noturnos para suas
esperança. A Lapa é vista então de diferentes discussões e produção, aproximando-se das
formas: como um local violento, como um gueto classes populares já que são elas que
de marginai, como um centro de referência tradicionalmente ocupam estes locais.”
artística, cultural e intelectual – já que possui
uma vocação natural para tal – ou como local p. 20 – “É na Lapa que estes jovens vão
detentor de um tradicional espírito de boêmia encontrar o espaço para os calorosos debates
sadia.” intelectuais de suas gerações. São boêmios,
mas antes de tudo intelectuais.”
p. 7 – “[...] Em uma versão mais datada, a ‘idade
áurea’ do bairro teria se passado nos anos trinta p. 22 – “Frequentar a Lapa, e principalmente
e a decadência teria se iniciado na década de morar nela, fazia parte deste roteiro que
40.” começava no dia a dia das pensões baratas e
se estendia a noites pelos cafés e bares do
p. 7-8 – “Na primeira face, ligada à conotação bairro. Com ou sem garçonetes, músicas ou
negativa do bairro e de seus frequentadores, a shows, bebiam em meio a muita conversa. A
Lapa é local de prostituição e marginalidade e frequência destes estabelecimentos crescia
faz lembrar um discurso acusatório que toma o especialmente após os horários de trabalho,
Rio de Janeiro como a cidade do não-trabalho, reunindo estudantes jornalistas, funcionários
do vício e da malandragem. Já na segunda públicos, comerciários, entre outros.”
face, onde a boêmia e o lazer estão ligados ao
lado positivo do bairro, a presença da p. 23 – “[...] o jovem intelectual mostra
intelectualidade instaura um certo modismo claramente o muro que levantava ante uma
cosmopolita e os personagens ‘típicos’ outra Lapa não tão sadia. Esta outra Lapa tem
exercem grande fascínio. Esta dimensão como referências as figuras populares do
positiva vai de encontro a um discurso de bairro, também associadas à vida noturna.
‘defesa’ da cidade, que entende o Rio de Malandros e prostitutas são vistos, na verdade,
Janeiro como palco de ações complementares, como componentes de um cenário, pano de
entre a boêmia e o trabalho.” fundo para os intelectuais boêmios, estes sim
os atores principais.”
p. 9 – “[...] Assim, a boêmia, essência da Lapa,
passa a ser marca também de certo ‘espírito’ p. 24 – “Quanto a essa possibilidade de
atribuído pelo imaginário coletivo ao carioca, o contemplação da vida noturna ‘subterrânea’, a
que faz com que o bairro possa ser tomado, escolha do bairro da Lapa como local de
neste sentido, como um microcosmo da confraternização intelectual pode ser vista
cidade.” também como em função de uma perspectiva
de aproximação com os modelos vividos pela
p. 17 – “Na Paris analisada por Michelle Perrot, intelectualidade europeia, aos quais nos
são os jovens estudantes que, chegando à referimos através do trabalho de Michelle
cidade para cursar Direito ou Medicina, Perrot. Mais um aspecto positivo da Lapa, aos
acabavam por prolongar suas estadias, olhos dos intelectuais que a frequentavam: ela
formando a ‘tribo boêmia’. Para classificar os deixava de ser um local obscuro e passa a se
diferentes componentes da boêmia, Perrot concretizar uma transplantação do ambiente
toma como referência o texto clássico de Henry intelectual europeu. [...]”
Murger, localizando, em contraste com os
artistas, o grupo de boêmios ‘amadores’, que p. 27 – “Gasparino Damata localiza o
podem ser tomados como paradigmas do nascimento dessa ‘nova Lapa’ a partir de
comportamento dos intelectuais que viveram e meados da década de 10, quando começam
recordaram a Lapa.” surgir as primeiras ‘casas suspeitas’, e o
114

convívio da boêmia, da malandragem, de ao início do século, não é esta Lapa, cercada


sambistas, dos cabarés e dos cassinos pela presença política da época, que irá
famosos, que passam a dar o tom da ‘vida alimentar o movimento de busca de sua
noturna da capital’.” tradição. É a lapa que começa s urgir em fins
de década de 1910 e que tem seu apogeu
p. 28 – “[...] Se a chamada ‘Revolução de 30’ durante praticamente toda a década de 30, o
significa em grande medida uma renovação na referencial de sua verdadeira identidade: a
política e traria para a capital uma leva de ‘Lapa de crimes passionais, de boêmia
políticos no campo literário-boêmio, aquele desenfreada, de malandragem, de sambistas,
momento também seria marcado pelo desordeiros perigosos (...), dos cabarés e
surgimento de uma ‘nova’ geração de cassinos (...)’. Ou seja, é boêmia, e não a
intelectuais que assumiria o bairro – a ‘geração política, o coração do bairro da Lapa.”
de 30’ – que dará continuidade à recém-
inaugurada vida literária da Lapa. [...] É esta p. 56 – “É esta imagem atraente da cidade,
nova geração de 30 que acabará por consolidar intimamente ligada aos prazeres de uma
a Lapa como bairro boêmio – de uma boêmia atitude boêmia, que a Lapa passa a encarnar.
literária por excelência – tornando-a um local Aglutinando este discurso que valora
alegre, agitado, cheio de música e iluminado positivamente as peculiaridades do Rio, a Lapa
pelas tabuletas indicando as casas noturnas.” representa a diversidade, o movimento e
cosmopolitismo.”
p. 28 – “O terceiro momento da Lapa é
justamente o da decadência. Os anos finais da p. 59 – “A Lapa não é boa nem má (ou melhor,
década de 30 e a década de 40 marcam esta é boa ou má), mas na verdade é o local que
fase, e três motivos são levantados pelos permite a convivência de diferentes ‘tipos’
autores para explicar o declínio de importância cariocas, é o bairro aglutinador dos prazeres e
do bairro: a repressão policial; os ventos da emoções da cidade.”
Segunda Guerra e as luzes de Copacabana.
Era como se a desconstrução do cenário da p. 64 – “A boêmia estaria então entre a
vida boêmia determinasse a decadência da ingenuidade e a criminalidade. Encarnava,
Lapa.” portanto a ambiguidade, o duplo, logo era
perigosa. Artistas, jovens ou não, radicais
p. 32 – “[...] A boêmia saudável dos intelectuais, políticos, visionários, excêntricos, pobres ou
especialmente no período áureo de fins dos ocasionalmente pobres, os rejeitados por suas
anos 20 e década de 30, confere à Lapa, famílias, todos estariam vivendo baseados em
segundo essa visão, a característica de uma existência marginal, que se opunha a
repositária da alma noturna do Rio de Janeiro. admitir uma ‘identidade social estável e
[...]” limitada’. O estilo de vida deste grupo acabaria
por representar os ‘conflitos inerentes ao
p. 32 – “A boêmia define o espírito do bairro da caráter burguês’.”
Lapa nos anos em questão. Sobre este espírito,
as memórias e relatos dos intelectuais tem p. 93 – “[...] As narrativas sobre a malandragem
muito a nos dizer. Mas, o espírito boêmio da Lapa dos anos 30 e 40 raramente
vagava por um corpo físico, que os moralistas ultrapassam as fronteiras dos textos literários e
não chegam a mapear em detalhes. [...]” sambas. É bem verdade que, estando fora das
regras de conduta da sociedade do trabalho, o
p. 37-38 – “A outra obra arquitetônica que malandro é a todo momento objeto da
definia marcantemente a fisionomia do local era repressão, produzindo-se, por parte das
o Aqueduto Carioca, construído em um primeiro autoridades policiais e judiciárias, registros de
projeto em 1723, com o objetivo de abastecer o suas manifestações.”
centro da cidade. Os Arcos da Lapa, em sua
forma atual, porém, daram a reconstrução do p. 96 – “Portanto, o malandro de verdade era
aqueduto em meados do mesmo século XVIII.” aquele que impunha respeito e medo. Tinha
que ser considerado perigoso e seus atos de
p. 46 – “O malandro, que pelas noites seria valentia deviam ser públicos, principalmente
personagem central da Lapa, tem sua origem quando desafiavam a autoridade policial.”
associada à atmosfera negativa com que se
apresenta o morro. Encarna aqueles a quem a p. 97 – “Valente, boêmio, vivendo de práticas
‘boa sociedade’ gostaria de afastar: os negros criminalizadas, além de diferentes no trajar,
e mulatos, as práticas religiosas e culturais dos falar e gesticular, o malandro criava em seu
populares.” território – e a Lapa era este espaço por
excelência – uma espécie de lugar de
p. 51 – “[...] No entanto, se a dimensão nacional desordem na cidade.”
caminha próxima à Lapa desde as referências
115

p. 100 – “A famosa Lapa não caiu no gosto personagem de Walt Disney, o Zé Carioca,
popular ou tornou-se conhecida nacionalmente criado especialmente para o momento. O
apenas pela sua frequência intelectual, mas papagaio Zé Carioca vestia-se como um
também porque nela atuavam indivíduos que, autêntico malandro e sua esperteza, jeito de
ao construírem elos de ligação com a cultura falar e andar, aproximavam-no ainda mais da
popular do período eram também porta vezes figura do malandro.”
de um discurso nitidamente formador da
imagem carioca. Este outro grupo – boêmio e p. 113 – “O malandro boêmio, não era mais da
divulgador do bairro da Lapa – tem a sua frente Lapa e nem da cidade do Rio de Janeiro.
os compositores de samba, que ao retratarem Ressignificado e ‘politizado’, passou a servir os
o cotidiano de suas vidas, acabaram por cantar ‘interesses nacionais’. O malandro da Lapa era
quase que permanentemente o bairro.” do brasil.”

p. 110 – “A denominação de malandro, desde FICHAMENTO 04


muito, esteve ligada ao samba. Pelo menos,
desde os anos 20, os negros sambistas dos Título/Subtítulo: Zé Pelintra: Concepções
bairros da Estácio, Cidade Nova, Saúde, Morro sobre a Umbanda e o Malandro.
da Favela, Gamboa, Catumbi e Morro de São Autor(es): DA SILVA, Rodrigo de Souza
Carlos, já carregavam a designação de Ano: 2020
malandros. Com sua mudança do samba, para Páginas: 133-145
uma cadência sincopada, o que ocorre Fonte: DA SILDA, Rodrigo de Souza. Zé
simultaneamente à difusão deste tipo de Pelintra: Concepções sobre a Umbanda e o
música, os sambistas passam a carregar cada Malandro. EM FAVOR DE IGUALDADE
vez mais a designação, tanto a partir da RACIAL, Rio Branco – Acre, V.3 N.2, p. 133-
imprensa, como do público que ouvia suas 145, fev/jul 2020.
canções.” Cidade: Rio Branco
Editora: Revista Em Favor da Igualdade
p. 110 – “Nos anos 30, a imagem do malandro Racial.
já está plenamente difundida. A malandragem
e a boêmia fazem parte do ‘samba do Resumo
malandro’, marcado pelo personagem principal
e por suas aventuras em meio ao cotidiano da O artigo fichado a seguir mostra desde o mito
cidade. Porém, o samba malandro é a caixa de fundador da Umbanda, como também o a
ressonância de uma conduta marginal para o demonização do Exu e características da
governo doestado Novo – o não-trabalho – e de entidade Zé Pelintra, trazendo à tona a
locais também marginais. Se a malandragem e proximidade de tais entidades com o humano.
a boêmia estão juntas, a Lapa não fica de fora, No artigo é citado estudos sobre a religião e
pois a lógica do samba, que muitas vezes canta conhecidos arquétipos do malandro na
o bairro, é essencialmente a lógica do samba Umbanda.
malandro.”
p. 112 – “Malandro dissimulado, malandro Citações
pseudo-regenerado, seu território continua
sendo o bairro boêmio da Lapa, aqui em p. 134 – “A Umbanda teria surgido a partir de
oposição à religiosidade da Penha. Portanto, se conflitos dentro do espiritismo Kardecista,
a figura do malandro apropriada pelos entidades de negros, por exemplo, não seriam
sambistas, ao tornar-se ‘regenerado’, compreendidas como seres espiritualmente
conseguiu burlar os ouvidos da censura, por elevados, levando membros que interpretavam
outro lado, o próprio governo por vezes essas entidades como seres evoluídos a
apropria-se também de sua imagem. Aí, é articular cultos a essas entidades.”
claro, não interessa o malandro enquanto não-
trabalhador, mas sim a esperteza típica do p. 134 – “Primeiro se compreende que a religião
personagem.” já teria se formado a partir de Zélio e o
rompimento com o kardecismo, ou seja, seu
p. 112 – Ao apropriar-se da figura do malandro, ritos, estruturas e símbolos existiram como
o governo demonstrar sua profunda identidade consolidados, contudo, essa formação se
com o elemento popular. Não é casual, por constrói no decorrer do século XX, não nasce
conseguinte que após a aproximação com os pronta. Segundo, deixa-se os conflitos sociais
EUA, na fase da política da boa-vizinhança, a presentes a partir da década de 1930 as
figura que caracterizará o Brasil margens do diálogo, por exemplo, discursos
internacionalmente será, ao lado da baiana nacionalistas que direcionam negros e suas
imortalizada por Carmem Miranda, o entidades a margem dos objetivos “nacionais”,
116

a figura do negro estará associada em certa questões a serem problematizadas, ela cita o
medida a vadiagem, presente inclusive em nome Umbanda como originário de membros
alguns malandros representados por kardecistas e que o início da religião remete ao
entidades.” século XIX e início do XX, porém, o grupo que
rompeu com o kardecismo não era
p. 135 – “Convém ressaltar que, propriamente umbandista, pois estaria distante
compreendendo que a partir da década de da relação com rituais afro. Seria uma linha, ou
1930 a entidade estará representando seja, uma nova forma de compreensão
personagens que não seriam de interesse dos espiritual, porém, sem uma construção
acontecimentos político, como exemplo, o ritualística definida.”
malandro e capoeira, a própria entidade estará
representando uma dualidade, pois, ao mesmo p. 138 – “Nessa compreensão, existiriam atritos
tempo que é uma entidade negra também já foi dentro do espiritismo kardecista em relação a
um homem negro que representava tudo aquilo evolução dos espíritos de negros, indígenas e
que se banalizava no discurso da década de caboclos. As discussões estariam voltadas a
1930.” elevação espiritual desses espíritos, o que teria
levado um grupo que compreendia esses
p. 135 – “Seus rituais são marcados pela espíritos como seres de luz, a romper com o
presença de seres espirituais, no candomblé se grupo Kardecista. Zélio e o Caboclo das Sete
cultuam os orixás, entretanto, na Umbanda Encruzilhadas, nesta perspectiva, não teriam
ocorre uma diversificação ainda maior, se impulsionado esse rompimento.”
fazem presentes: pretos velhos (seres
espirituais que possuem experiência de outras p. 138 – “Assim, não teria surgido um
vidas, seja para a cura ou auxílio em outros movimento umbandista propriamente dito, ou
problemas), caboclos (seres de origem seja, teria surgido uma compreensão mais
indígena/nativa) e também eres (crianças ampla em relação as entidades cultuadas,
espirituais).” negros, caboclos e índios fariam parte.”
p. 136 – “Nessa reunião começaram a se p. 138 – “[...] Rohde vai além, ele não
manifestar diversos espíritos de negros compreende a religião da Umbanda como
escravos e indígenas nos médiuns presentes, e formada no século XIX ou XX, mas, sim, que
esses espíritos eram convidados a se retirar não existe a criação da religião. A estrutura do
pelo dirigente da mesa que os julgava (como culto, incorporações e trabalho de cura
era e continua sendo comum entre os existiriam desde o século XVII, portanto, a
kardecistas) atrasados espiritual, cultural e religião não teria sido criada, seus rituais
moralmente. (ROHDE, 2009, p. 80).” aconteciam a séculos, contudo, mesmo os
rituais estando presente desde os séculos XVII
p. 136 – “Nesta compreensão haveria uma (concepção de ROHDE), não podemos
diferenciação dentro do próprio espiritismo em caracterizar com cultos umbandistas, pois,
relação a função e aceitação de entidades, na somente a partir de 1930 se incorpora esse
compreensão Kardecista (ao menos na nome com toda característica ritualista que
interpretação de Rohde) o espírito de caboclos, conhecemos atualmente.”
negros e escravos não são compreendidos
como capazes de se elevar espiritualmente, p. 138-139 – “A Umbanda recebe influência de
portanto, seriam atrasados.” outras religiões, por exemplo, do catolicismo e
do Candomblé (SILVA, 2014). Porém, mesmo
p. 136 – “Mesmo fazendo uso de um dos mitos possuindo esses elementos ela ainda possui
fundadores da Umbanda descritos por Rohde, sua individualidade. Algumas entidades, como
convém ressaltar que o autor não compreende exemplo, Zé Pelintra, se faz presente também
esse mito (ou qualquer outro) como fundador em outra religião além da Umbanda. Ou seja,
da Umbanda, ele reconhece seu valor ele aparece na Umbanda, porém, também se
simbólico, mas critica essa interpretação [...].” faz presente na Jurema sagrada. Na Jurema
p. 137 – “Convém ressaltar que, Vanessa ele atua como mestre, no entanto, na Umbanda
Mauro compreende a consolidação da ele pode baixar (se manifestar) em várias
Umbanda a partir do século XIX e início do linhas, entre elas: do malandro, Exú e até
século XX, o mito fundador para ela é o mesmo do Preto Velho (BARBIERI, 2017).”
responsável pelo surgimento da religião, uma p. 139 – “A linha em que a entidade baixa não
compreensão seguida por muitos é uma unanimidade, para explicar este
pesquisadores.” elemento estaremos recorrendo ao pai de santo
p. 137 – “Devemos entender que a Alan Barbieri, no vídeo intitulado Zé Pelintra,
interpretação de Vanessa nos possibilita muitas ele explica que a entidade faz parte de uma
117

falange, portanto, não existe apenas um Zé malandro e letrado. Pertence aos bas-fond e à
Pelintra, mais vários espíritos que se alta sociedade. Não há porque escolher uma só
apresentam com esse nome e suas direção” (AUGRAS, 1997, P. 46).”
características (BARBIERI, 2017), neste caso,
cada aparição da entidade se torna ímpar, sua p. 143 – “Nos escritos de Pimentel temos um
performance, história de vida e profissão contexto a ser explorado, as características
podem variar.” descritas, como exemplo, negro, mal vestido, e
navalha no bolso, são descrições
p. 139 – “[...] mesmo existindo várias histórias compreendidas como próximas da violência, se
relacionadas a origem da entidade Zé Pelintra, levamos em consideração a consolidação da
não significa que alguma seja falsa, mas, sim, Umbanda a partir do ano de 1930,
que cada ser sagrado (pertencente a falange) entenderemos que “no projeto de progresso, o
possui em sua memória uma vida que associa malandro, vadio, boêmio, que não trabalha
ser a de sua origem. Mesmo com essa devia ser reeducado” (PIMENTEL, 2011, p.03).”
diversidade de histórias em relação a sua
origem, existem elementos comuns” p. 143 – “Em síntese, as características que Zé
Pelintra carrega e o público que o procura,
p. 139 – “[...] Devemos compreender que Zé remeteria a um contexto contrário ao que se
Pelintra é uma das muitas entidades existentes pensava, poderia se pensar em progresso,
na Umbanda, a religião possui uma diversidade porém, os negros, capoeiras e os malandros,
de seres sagrados, estes variam de caboclos a nesse sentido, sujeitos que não teriam
pretos velhos, porém, a diversidade é grande trabalhos, estariam nesse progresso? A
[...]” entidade traz a torna e simboliza o que o dito
progresso queria negar/esquecer.”
p. 140 – “O que podemos perceber através de
Oliveira é que a religião da Umbanda sofre com p. 143 – “Importa ressaltar que, os seguidores
atritos e conflitos nas vertentes: política, moral da entidade compreendem as características,
e religiosa, contudo, as ações policiais e morais como exemplo, a malandragem, capoeira e até
direcionadas a religião não surgem ao acaso. mesmo das vestimentas, como elementos que
Mesmo em uma conjuntura que eleva a aproximam a entidade do mundo humano, ou
valorização da identidade nacional, a religião seja, a entidade seria mais próxima dos fiéis,
da Umbanda não é apresentada enquanto pois, já havia sido humana e conheceria os
parte desse contexto, no entanto, ela em si prazeres terrenos.”
seria uma autêntica religião brasileira.”
p. 143 – “[...] segundo Assunção (2010, p. 176)
p. 141 – “No escrito de Oliveira, chama atenção, “Zé Pelintra é visto como o malandro que
a característica atribuída ao papel do exu, pois, representa a astúcia, o livre trânsito pela brecha
sua proximidade com a vida humana seria e pelo proibido, o uso dos meios não-
responsável pela sua demonização, ou seja, sancionados pelas normas morais”. Nessa
sua sexualidade, seu gosto pelo prazer das perspectiva, a ação do malandro seria na
coisas mundanas, como a bebida e o poder, por resolutiva de problemas utilizando métodos
exemplo. Nesta interpretação, não seria o além dos convencionais, ou seja, através de
humano o demoníaco? Ou a regra se aplicaria trabalhos espirituais.”
apenas a um grupo de entidades, de uma
religião socialmente não aceita pela maioria?” p. 144 – “[...] Zé Pelintra é uma entidade
complexa, traz elementos espirituais, porém,
p. 142 – “Este é uma entidade identificada com conhecimento mundano, conhece os dois
os malandros que viviam nas periferias e na lados, o do malandro e o espiritual.”
boemia das capitais do Rio de Janeiro,
Pernambuco, Alagoas, Espírito Santo, e p. 144 – “As entidades da Umbanda trazem
representa bem o particular do sagrado da ensinamentos, experiências e também diálogos
Umbanda. A figura, que vive à margem do com imposições oficiais, o desconhecimento
socialmente aceitável, é hoje muito popular em sobre a história da religião e principalmente
vários terreiros de Umbanda Brasil afora, sobre seus seres sagrados, cria estereótipos.”
estando presente também na Jurema Sagrada, p. 145 “[...] Zé Pelintra se divide em dois
onde é mestre juremeiro. (MAURO, 2016, p 1- malandros, o ritualístico que faz uso de
2).” bebidas, brinca com as mulheres, porém, busca
p. 142 – “Zé Pelintra e descrito dentro de uma trabalhar espiritualmente. E o malandro negro
dualidade, Augras parte dessa perspectiva “é capoeirista que relembra a exclusão de
pernambucano e cidadão carioca, sertanejo e personagens humildes.”
morador da Lapa, macumbeiro e catimbozeiro, FICHAMENTO 05
118

mesmo nas referências por vezes superficiais


Título/Subtítulo: Vou subir o morro para ver nos textos das tramas televisivas. Sob uma
quem vem na umbanda” : Zé Pelintra e as perspectiva de detração, exaltação ou mera
ressignificações do malandro na prática composição estética, essas figuras são
religiosa umbandista facilmente encontradas fora dos altares,
Autor(es): CARNEIRO, Janderson Bax gongás e assentamentos, suas moradas
Ano: 1994 simbólicas preferenciais.”
Páginas: 22-151
Fonte: CARNEIRO, Janderson Bax. Vou subir p. 24 – “[...] o “zé” da umbanda é, antes de tudo,
o morro para ver quem vem na umbanda”: apresentado fora dos terreiros a partir de uma
Zé Pelintra e as ressignificações do figura popular e altamente inteligível na cultura
malandro na prática religiosa umbandista. brasileira. [...] É um herói, ou anti-herói,
Rio de Janeiro, 2012. 157 p. Dissertação para constitutivo do nosso imaginário social de forma
obtenção do grau de Mestre (Departamento de tal que está presente na música, no teatro ou
Ciências Sociais) – Pontifícia Universidade mesmo na imagem constantemente vendida
Católica – PUC Rio. aos estrangeiros sobre o Brasil, mais
Cidade: Rio de Janeiro precisamente sobre o Rio de Janeiro, em sua
Editora: PUC inquestionável vocação para a vida mansa e
descontraída, não obstante as agruras de sua
gente.”
Resumo
p. 30 – “A figura ideal do malandro, tal como foi
A tese fichada a seguir traz notas de descrita anteriormente, é construída em grande
vivências de um terreiro de Umbanda parte em um processo correlato ao
localizado na Zona Oeste do RJ, Campo desenvolvimento do samba carioca, enquanto
Grande. Além dessas, também uma reflexão da gênero musical reconhecido para além das
entidade e de suas facetas, tendo em vista classes originalmente produtoras desse tipo de
também comentar sobre a Lapa, região música. Esse processo se deu a partir da
geográfica que é palco das imagens de Zé década de 1920 do século XX e teve entre os
Pelintra. seus principais protagonistas os compositores
da região do Estácio, junto com a Lapa, Cidade
Nova, Gamboa, Catumbi, Morro da favela, etc.
Citações Essas localidades compunham a região da
cidade marcada pela expressiva concentração
p. 22 – “No terreiro de umbanda, de negros, pobres, ex-escravos e seus
sintomaticamente, há uma categoria de descendentes. Figuras historicamente
entidades denominada “malandragem”, excluídas do processo de modernização da
definida como um conjunto de entes espirituais cidade, esses sujeitos atuariam
classificados como malandros. Na principal significativamente na conformação do que ficou
unidade de culto observada durante a conhecido como cultura nacional brasileira.”
pesquisa, essa “falange”16 é cultuada em meio
aos exus. [...] Em suas representações p. 33 – “De acordo com Matos, o malandro
imagéticas, os membros da “malandragem” na típico das primeiras décadas do século XX é
umbanda são identificados com a figura típico uma personagem que entrelaça mito e história.”
ideal do malandro da Lapa das décadas de p. 33 - Se o samba-malandro se mantém na
1920 e 1930. As roupas, a narrativa mítica que fronteira entre a fruição total do espaço do
circula nos terreiros, e os elementos poéticos samba e a problemática que aguarda o
mobilizados na louvação dos “zés” evidenciam proletário fora desse espaço, entre o
a construção estereotípica que vincula as descoroamento carnavalesco das classes
entidades às aventuras nos meios subalternos dominantes e o seu recoroamento no resto do
e marginalizados. À distância, a “malandragem” ano, é porque o próprio malandro é um ser da
da umbanda parece simplesmente reprodução fronteira, da margem. Seus domínios
mimética de uma figura típico-ideal da cultura geográficos não são nem os morros nem os
brasileira. No entanto, malandro e bairros de classe média, mas os lugares de
malandragem são noções extremamente passagem como a Lapa e o Estácio. Ele não se
polissêmicas.” pode classificar nem como operário bem
p. 23 – “s. Essas personagens sagradas comportado nem como criminoso comum: não
circulam nos meios não religiosos a partir de é honesto mas também não é ladrão, é
suas representações visuais, dos elementos malandro. Sua mobilidade é permanente, dela
poéticos presentes na música popular, ou depende para escapar, ainda que
119

passageiramente, às pressões do sistema. sobrevivência mantidas pelos cidadãos comuns


(Matos, 1982: 54)” das grandes cidades brasileiras.”
p. 33 – “Sob essa perspectiva, o discurso do p. 40 – “[...]Zé Pelintra e todos os malandros
“samba malandro” é considerado uma brecha cultuados na umbanda seriam correlatos
para uma maior elucidação acerca do religiosos de uma figura popular do nosso
fenômeno da malandragem, entendida aqui imaginário: o característico malandro da Lapa,
enquanto estilo de vida de determinados como idealizado na primeira metade do século
segmentos sociais marginalizados durante as XX. No entanto, o mínimo de aproximação com
primeiras décadas do século XX. Em o terreiro é suficiente para demonstrar que tal
antagonismo a outro veio poético crescente no identificação não corresponde a uma
período, de cunho nacionalista, o samba associação simples, estática e isenta de
dedicado às temáticas próprias da contradições. É preciso assinalar que Zé
malandragem, de certa forma, exalta o modus Pelintra é um malandro sacralizado. É alvo de
vivendi oposto àquele cada vez mais valorizado culto em distintas manifestações religiosas do
entre as décadas de 1930 e 1940, com a campo afro-brasileiro, como o catimbó e a
ascensão da ideologia trabalhista.” umbanda. E o fato de ser cultuado em
modalidades religiosas marcadas pela
p. 34 – “[...] No entanto, seja como for, aquilo centralidade da possessão impõe a Zé Pelintra
que é cantado pelos sambistas identificados inúmeras peculiaridades. Em outras palavras,
com a malandragem é, em grande parte, o no terreiro ele é um malandro que morreu,
exato oposto ao projeto de modernização e transformou-se em espírito, ascendeu à
implementação do ideal de “civilização” em condição de entidade espiritual e “baixa” na
voga no período. [...] A crescente valorização Terra para fazer algo em benefício dos seus
do trabalhismo não poderia tolerar a negação protegidos. Se, por um lado, ele é pensado
do trabalho como um valor. Nesse contexto, a como um malandro, tipo nacional marcado e
identidade do sambista, intimamente ligada à até datado, por outro, é invocado enquanto
imagem de malandro, foi alvo de inúmeras “companheiro” espiritual dotado de atribuições
perseguições e polêmicas. As contradições no tempo presente.”
foram evidentes mesmo no interior da
comunidade de compositores e músicos do p. 41 – “[...] Os entes espirituais da umbanda
período.” não vêm ao terreiro simplesmente para a
celebração. Tais seres do mundo espiritual vêm
p. 36 – “Nos versos mencionados, Noel à Terra principalmente para “trabalhar”, ou seja,
desqualifica com sutil ironia a malandragem. Ao para a intervenção no mundo dos vivos. Como
associar tal forma de vida ao derrotismo, o sugere Birman (1985), a umbanda é uma
poeta da Vila despe o malandro de sua aura religião preocupada em “resolver problemas”.”
romantizada, evidenciando o jogo de
posicionamentos ideológicos. Segundo o p. 42 – “Nesse sentido, classificar Zé Pelintra
antagonismo poético empreendido por Noel, como a expressão de um tipo cristalizado no
não há nenhum traço positivo em sair “com tempo e reverenciado nas casas de culto seria
lenço no pescoço”, “navalha” ou encarnar uma negar uma das habilidades mais significativas
atitude de “provocação” e “desafio”. Assim, o dos terreiros de umbanda: a sua capacidade de
compositor da Vila indica os ingredientes para dialogar com a realidade social circundante,
que o malandro seja “regenerado”, assumindo engendrando novas e significativas práticas e
um novo padrão de comportamento e, representações em torno dos entes espirituais
simultaneamente, um novo estilo de invocados. Ou seja, a umbanda é uma religião
composição, representado pelo samba-canção, plástica, dotada de sensibilidade e notável
expressão musical indubitavelmente mais adaptabilidade ao meio em que está inserida
aceita pelos segmentos elitizados da sociedade (ver Souza, 2004)”
brasileira.”
p. 46 – “[...]Zé Pelintra é malandro? Melhor
p. 37 – “Sem sombra de dúvidas, tanto do ponto dizendo: ele é somente malandro? As
de vista estético quanto dos elementos poéticos observações anteriores sugerem que, mesmo
tradicionalmente articulados no “discurso do ponto de vista das performances manifestas
malandro”, as aproximações entre o típico no contexto ritual, essa entidade não é somente
malandro carioca e o Zé Pelintra da umbanda um malandro em sua expressão idílica, como
são sensíveis. [...] Seu Zé partilha, ao menos do sugerem suas imagens visuais mais
ponto de vista das representações mais corriqueiras. Mesmo em sua dimensão
generalizadas, de uma construção imagética tipológica, o conjunto de “zés” da umbanda não
que o afasta sobremaneira do universo do está restrito ao ideal idílico de malandragem.”
trabalho e das formas de obtenção da
120

p. 46 – “Nesse sentido, a própria denominação umbanda é um tipo genérico, o “zé” de cada um


Zé Pelintra acaba por designar não apenas dos filhos de santo ouvidos durante a pesquisa,
uma entidade do universo umbandista, mas um apresenta trajetória particular, formas próprias
conjunto de entes espirituais agrupados por de ação concreta no mundo dos vivos. A
afinidades apresentadas em suas trajetórias proximidade identificada entre os “zés” e os
terrenas, marcadas pela marginalidade social.” homens de carne e osso e a patente fluidez
ética atribuída a essas entidades resultam
p. 47 – “[...] A significativa alcunha de “zé” numa gama de possibilidades de intervenção
salienta a subalternidade desses espíritos, no mundo dos vivos riquíssima, pois traz à baila
pensados como pessoas comuns, homens do os anseios mais imediatos dos seus fiéis.”
povo que, após a morte, continuam a circular e
intervir no meio dos vivos.” p. 59 – “[...] “guerra nada particular”, para usar
a expressão de Silva (2007), que assume
p. 50 – “Assim, temos a seguinte situação: por notabilidade no campo religioso brasileiro: as
um lado, tanto do ponto de vista poético quanto disputas desencadeadas entre os
da performance corporal, as representações do representantes de determinados segmentos
malandro são compostas a partir da evocação evangélicos e os praticantes das religiões de
de elementos datados, cristalizados no tempo e matriz africana. Nesse contexto, percebe-se a
na memória, como as vestimentas dinâmica de acentuada demonização das
características do malandro típico da Lapa. Por entidades cultuadas nos terreiros de umbanda
outro lado, o malandro, ainda que tipificado, é e candomblé, bem como dos seus símbolos
associado a uma série de elementos religiosos mais evidentes. Aliás, o processo de
contemporâneos, alguns simbolicamente demonização das religiões de matriz africana
inscritos mesmo no âmbito da marginalidade constitui, de certa forma, mais do que apenas
característica dos centros urbanos brasileiros um dos elementos diacríticos da prática
do século XXI.” religiosa neopentecostal, ou seja, o
p. 50-51 – “Podemos perceber, no plano permanente combate ao demônio constitui a
semântico dos ritos, a sensível plasticidade principal estratégia de evangelização dessas
dessa categoria de entidades. Expressão da igrejas, como observa Ricardo Mariano (2007).”
marginália, ela parece dialogar de forma mais p. 62-63 – “[...]. Não são poucos os argumentos
explícita com as concretudes dos dias atuais. defensivos sumariamente levantados pelos
Os caboclos estão imersos nos mistérios das umbandistas ou pelas próprias entidades diante
matas, os alquebrados pretos velhos podem das acusações feitas por seus detratores34 .
estar muito alheios a tudo o que se passa em Explícita ou implicitamente, a identificação das
um universo terreno demais para quem já entidades da umbanda aos demônios da
alcançou a purificação. Oxalá pode estar muito cosmogonia neopentecostal está
distante dos seus “filhos da Terra”. Mas os “zés” constantemente em pauta. O assunto é
estão por aí. Acompanham seus devotos nas frequente nas conversas informais entre os
ruas perigosas que conhecem muito bem, religiosos, nas explanações doutrinárias mais
orientam seus protegidos diante de mulheres elaboradas ou mesmo nas falas das entidades
de conduta duvidosa e, quando sobra tempo, incorporadas. A defesa é espontânea. Logo
bebem uma cervejinha com os seus que começamos a conversar sobre o seu
“companheiros” da Terra.” malandro, a mãe de santo do Terreiro do
p. 52 – “Dessa forma, a categoria Mendanha observou que os malandros são
malandragem, empregada no terreiro de confundidos com o Diabo, pois são “executores
umbanda, em referência a um subtipo de exu, da justiça divina” e, também, porque mantém
o exu malandro, engloba inúmeros elementos “hábitos humanos”, como o de fumar e beber.”
constitutivos das diferentes noções de p. 72 – “[...]. Os orixás, divindades africanas
malandro e de malandragem aqui associadas a domínios específicos da natureza
mencionadas. Nas representações ou a atividades humanas, não incorporam com
coletivamente construídas em torno da figura frequência no terreiro. Geralmente são
das entidades de tipo zé, são perceptíveis reverenciados nas aberturas dos “trabalhos”,
inúmeras características do malandro quando os ogãs dirigem uma cantiga em
romantizado, personagem identificado homenagem a cada divindade africana ali
sobretudo nas temáticas do samba carioca das cultuada. Eventualmente, um filho da casa ou a
primeiras décadas do século XX. Por outro própria sacerdotisa, incorpora um orixá, que, no
lado, as vivências individuais dos fieis junto às entanto, fica pouco tempo entre os mortais.”
entidades tendem a contribuir para a
personalização do que a princípio é uma ideia p. 72 – “Esses seres divinos são considerados
vaga, um tipo. Se, a princípio, o malandro da muito elevados na hierarquia espiritual e sua
121

pouca proximidade com os fiéis parece p. 122 – “[...] Assim, os pretos velhos são os
evidenciar seu grau de divinização. Não falam, mestres de uma sabedoria popular advinda das
não fumam e não bebem. Apenas dançam ao dificuldades do cativeiro, os caboclos exímios
som dos atabaques, executando em suas manipuladores das propriedades curativas das
danças um gestual alusivo ao domínio da matas. Mas são os exus, sem sombra de
natureza ou às atividades a eles relacionadas. dúvidas, os entes mais requisitados diante de
Assim, quando uma filha é tomada por Iemanjá, situações mais densas, vivenciadas pelos
por exemplo, esta dança simulando em suas seres humanos em circunstâncias perigosas ou
mãos o balanço das ondas do mar. Ogum, moralmente dúbias.”
identificado à caça e à guerra, executa passos
vigorosos, simulando a posse de uma espada p. 148 – “[...] As entidades que ‘baixam’ no
na mão. Às vezes, os orixás “bradam”, ou seja, terreiro são pensadas, antes de tudo, como
emitem um som característico contribuindo pessoas que já existiram na Terra e, após a
para que sejam identificados no grupo.” morte, ganharam o direito de retornar ao mundo
dos vivos, a fim de ‘prestar a caridade’.”
p. 73 – “[...] Assim, tanto pretos velhos e
caboclos quanto os exus, conversam com os p. 148 – “[...]A umbanda é uma religião que
homens, dão conselhos e, por vezes, bebem, vislumbra a resolução de problemas, como
ou seja, apresentam uma notável interatividade expõe Birman (1985). É nesse sentido que os
com o mundo dos vivos. São essas entidades entes espirituais invocados são concebidos
que ministram passes, prescrevem a melhor como verdadeiros especialistas. Para cada tipo
forma de condução das atividades religiosas da de problema, um tipo específico de entidades é
casa e, principalmente, dão consulta. É, acionado. Há uma percepção de que certos
portanto, no conjunto de variações nas “trabalhos” são impensáveis para determinadas
expressões de humanidade, ou melhor, de categoria de guias.”
proximidade com os seres humanos, que as p. 149 – “[...]A força da “malandragem” consiste
entidades cultuadas na casa mais diferem na habilidade para transitar nas zonas obscuras
umas das outras.” engendradas no curso da civilização.”
p. 83 – “[...] os “companheiros” atuam como p. 149 – “Dessa forma, os malandros
“guardiões” e propulsores de uma “energia representam a negação das amarras que a
telúrica”. O emprego da expressão moral e a “evolução espiritual” podem trazer,
“companheiros” não é gratuito ou ocasional. É quando a necessidade concreta de ação neste
assim que os exus são usualmente mundo é evidente. Sem sombra de dúvidas, a
identificados na casa. Nesse sentido, a forma noção de que a proximidade com os mortais é
de tratamento da entidade funciona, de certa um fator da eficácia de atuação dos entes
maneira, como um elemento diacrítico de sua espirituais certamente não é referente apenas
posição no sistema simbólico do terreiro.” aos malandros.”
p. 84 – “[...]’Companheiro’ é, portanto, p. 151 – “Bastante escorregadios, os malandros
tratamento que atenua, no plano semântico, a da umbanda parecem driblar todos os esforços
distância entre seres humanos e entidades de compartimentalização arquetípica. Estudos
espirituais no Terreiro, transformando em de maior vulto quantitativo e dimensões macro
parceiros ou “camaradas”, agentes deste e do analíticas também apontam para essa
outro mundo. Sob essa ótica, os exus são característica dos “zés”. O sociólogo Lísias
apresentados como entes espirituais mais Negrão (1996), em sua análise sobre o campo
próximos dos homens e, portanto, dotados de umbandista em São Paulo, identifica os
habilidade para lidar com as aflições que malandros como pertencentes a uma categoria
atingem os seus fiéis.” à parte dos exus, a dos “zés pilintras”. Negrão
p. 99-100 – “[...]Se, para os neopentecostais, aponta para essas entidades como as mais
todos os exus são demônios, para Zé dos ambivalentes no cenário umbandista paulista.
Malandros, apenas alguns são malignos, pois Quanto aos exus, o sociólogo afirma que não
não são em verdade exus, mas espíritos que pairam dúvidas quanto à categorização
“usam os nomes” dos “companheiros” para “esquerda/direita”, o que não ocorreria com os
criar desequilíbrios entre os mortais.” “zés pilintras”, ora pensados como verdadeiros
advogados dos pobres, ora como entidades
p. 119 – “[...]De um tipo genérico, Zé Pelintra perigosas por sua total inserção na
passou a um espírito extremamente popular marginalidade.”
entre membros e amigos do terreiro. É uma das
entidades mais procuradas e homenageadas FICHAMENTO 06
na casa.”
122

Título/Subtítulo: O processo de sacralização agentes definem por si próprio como querem


do malandro e a ressignificação da atuar no culto espiritualista da Umbanda sem
personalidade histórica. precisarem terem sido realmente índios
Autor(es): PIMENTEL, Pedro Guimarães brasileiros (para o caso dos caboclos) ou
Ano: 2011 escravos idosos (para o caso dos pretos e
Páginas: 441-454 pretas-velhas), podendo terem desencarnados
Fonte: PIMENTEL, Pedro Guimarães. O em momentos mais contemporâneos.”
processo de sacralização do malandro e a
ressignificação da personalidade histórica. p. 454 – “[...]Seu Zé é um mestre no espaço
Revista de Humanidades – UFRN, Caicó, V. mítico-sagrado de onde provêm todos (ou
11. N. 29, p. 435-463. jan./jul. de 2011. quase todos) os espíritos que trabalham na
Cidade: Caicó “Lei de Umbanda”: a Aruanda.”
Editora: Revista de Humanidades – UFRN

Resumo FICHAMENTO 07
O fichamento a seguir parte do texto Título/Subtítulo: BAIANOS E MALANDROS: A
que tem como objetivo mostrar o processo de SACRALIZAÇÃO DO HUMANO NO PANTEÃO
sacralização do malandro, porém se atém a UMBANDISTA DO SÉCULO XX.
interpretar pontos cantados e sambas- Autor(es): DE SÁ JUNIOR, Mario Teixeira.
malandro dos anos 30. Trazendo uma visão Ano: 2004
mais interpretativa do que histórica sobre o Páginas: 16-23
assunto. Fonte DE SÁ JUNIOR, Mario Teixeira.
Citações BAIANOS E MALANDROS: A
SACRALIZAÇÃO DO HUMANO NO PANTEÃO
p. 441 – “[...] A Umbanda acrescenta, ainda, UMBANDISTA DO SÉCULO XX. Revista de
em sua reminiscência de tradições africanas, História, Campo Grande. V. 8. N. 15. 9-29,
um rito mais ampliado e mais festivo, com a jan./jun. 2004.
presença de cânticos, roupas, cheiros, Cidade: Campo Grande - MS
fumaças, bebidas e comidas. Cria um cenário Editora: Revista de História
mais complexo em que cada item ganha em
complexidade, permitindo que estes mesmos Resumo
sejam percebidos em toda sua capacidade de
trazerem consigo um pedaço do sagrado. Este artigo procura examinar a relação
Neste sentido, o chapéu usado pelo malandro entre os novos personagens surgidos no
(incorporado) é sagrado, assim, como sua panteão umbandista (baianos e malandros)
gravata vermelha, sua bengala, sua camisa, com as transformações pelas quais passou a
seu sapato, sua cerveja, sua farofa e seu sociedade brasileira ao longo das décadas de
cigarro. Todos estes são objetos que fazem 1930 a 1960 e, em especial, percebendo as
parte de uma hierofania ampliada – não só especificidades dessas transformações nas
sócio-temporal – mas idiossincrática. Cada cidades de Dourados (MS) e Rio de Janeiro
parte tem sua relevância no todo, e não pode (RJ). A partir dessas análises proponho colocar
ser retirada, com o risco de prejudicar à esses novos personagens como inseridos em
própria manifestação e atuação do todo.” uma das lógicas da umbanda, ou seja, o de
ressignificação de personagens marginalizados
p. 444 – “[...] Para o caso dos malandros, os pela estrutura social, política e econômica,
diversos pólos pelos quais deslizam (Linha das dando a eles um lugar sacralizado dentro das
Almas e Povo de Rua, por exemplo) estão práticas umbandistas. Indo além, pretendo
reunidos numa categoria espiritual que demonstrar como esses novos personagens
expressa sua especificidade de acordo com a dividem o espaço com um outro, o exu, onde
novidade de cada consulta, mas que não essa medida visa abrir o campo dos artigos
escapa da identidade espiritual religiosos da Umbanda aos seus
correspondente para que pudessem ser consumidores, além de fragmentar as críticas
reconhecidos em outra categoria. É importante aos exus enfraquecendo os ataques a esse
destacar ainda que esta noção está baseada arquétipo.
(e por isso mesmo é reforçada) nas
considerações feitas pelos próprios agentes Citações
espirituais quando afirmam, por exemplo, que p. 16 – [...]A figura de Zé Pelintra está
escolhem uma linha para atuarem: a dos associada a um grande leque de religiões de
pretos(as)-velhos(as), boiadeiros, exus, possessão no Brasil. Provavelmente originário
pombo-giras, caboclos, etc. Ou seja, estes
123

do Catimbó (Cascudo, 1978), esse arquétipo se FICHAMENTO 08


popularizou nos ritos de Jurema, Macumba,
Umbanda e Candomblés de Caboclos. Muitas Título/Subtítulo: Vou subir o morro para ver
estórias são contadas sobre a vida terrena quem vem na umbanda” : Zé Pelintra e as
desse personagem. Assunção8 recolheu uma ressignificações do malandro na prática
dessas versões em que ele é apresentado religiosa umbandista
como beberrão e desobediente. Ao morrer, Autor(es): CARNEIRO, Janderson Bax
teria ido viver na jurema, local mítico, onde ele, Ano: 1994
que “só se salvou de um lado” viria ajudar aos Páginas: 22-151
homens no mundo terreno” Fonte: CARNEIRO, Janderson Bax. Vou subir
o morro para ver quem vem na umbanda”:
p. 17 – “Nas macumbas ou umbandas do Rio Zé Pelintra e as ressignificações do
de Janeiro o Seu Zé Pelintra é associado à malandro na prática religiosa umbandista.
figura do malandro carioca. Veste terno branco, Rio de Janeiro, 2012. 157 p. Dissertação para
camisa de seda, sapato bicolor, chapéu obtenção do grau de Mestre (Departamento de
panamá e gravata vermelha. Os trejeitos se Ciências Sociais) – Pontifícia Universidade
remetem a esse arquétipo da boemia carioca. Católica – PUC Rio.
O falar carregado de gíria, o andar Cidade: Rio de Janeiro
escorregadio, a aversão ao trabalho, a Editora: PUC
propensão às falcatruas e a paixão pelas
mulheres, apresentados nas versões acima, Resumo
representam alguns dos elementos da
composição desse personagem” Este fichamento tem a finalidade de
utilizar as citações aqui presentes para a
p. 18 – “Ele também possui o seu argumentação com base nas entrevistas feitas
correspondente feminino. Como as baianas, o com umbandistas.
primeiro nome mais comum que encontrei em
pesquisas de campo foi o de Maria, associado Citações
a um segundo, esse mais variado. Um exemplo
disso é Maria Navalha. São mais femininas que
as baianas e se aproximam, ainda mais, do p. 73 - “Os caboclos e pretos velhos são
arquétipo feminino do exu.” apontados, pelos médiuns ou mesmo por
p. 21 – “[...] Aparentemente nativo do Rio de outras entidades, como seres espiritualmente
Janeiro, esse personagem é associado à figura “mais evoluídos” do que os exus, o que não
do negro. O seu espaço de circulação é o situa, ao menos no plano discursivo, estes
centro da velha cidade do Rio de Janeiro, onde últimos no âmbito das trevas.”
ele insistiu em permanecer, se esgueirando p. 82-83 – “Afinal, Zé Pelintra e seus
pelas ruas do cais do porto nas noites cariocas, congêneres são reverenciados no terreiro 83
mesmo após as reformas efetuadas pelo junto aos “companheiros”. São homenageados
prefeito Pereira Passos que visavam impor um e chamados ao trabalho nas mesmas ocasiões.
ar europeu ao Rio, transformando-o assim em Recebem até a mesma saudação: “Laroiê!”, por
um cartão de visita do Brasil moderno. Esse vezes acrescida de um complemento: “Salve a
personagem, ao lado do nordestino, recebeu malandragem!” O acréscimo na saudação
nos grandes centros tratamento pejorativo e assinala, em termos cerimoniais, a
também foi culpabilizado pelas malezas especificidade dessas entidades: são membros
sociais, dividindo com os migrantes daquilo que no terreiro é classificado como
nordestinos, os quais chegariam em massa a “malandragem”, uma subcategoria entre os
partir da metade do século XX, o mesmo exus. Como afirma Ricardo, ogã do terreiro:
espaço das periferias cariocas.” Malandro é cultuado na energia de Exu na
p. 23 – “Os arquétipos do baiano e do malandro, nossa casa (…).Eu acho que na maioria delas
transportados para a Umbanda, eram o Zé Pelintra é encaixado nas falanges de Exu,
representantes de dois grupos, historicamente pode ter as suas diferenças, porque a umbanda
marginalizados na sociedade brasileira do é muito diversa, mas na maioria dos casos a
século XX: os negros e os nordestinos. Essa é falange de malandro, é cultuada na falange de
uma característica marcante da religiosidade Exu (…)É porque os Exus Malandros, que são
umbandista, onde vários personagens Exus Zé Pelintras, tiveram suas vivências
subalternos do cotidiano brasileiro têm o seu diferentes de um caso do Senhor trancaruas,
status social invertido e, de coadjuvantes se do Exu de Calunga que é um e Exu-caveira,
tornam atores principais.” tiveram as suas vivências, e experiências
dessas vivencias diferentes.”
124

Título/Subtítulo: ASPECTOS
PSICOLÓGICOS DO ZÉ PELINTRA NA
p. 86 – “. Na sua fala, Zé Pelintra e os CULTURA DO RIO DE JANEIRO
malandros em geral aparecem como amigos, Autor(es): SOUZA, Adriano Lima
“camaradas”, mas antes de tudo como entes Ano: 2016
espirituais potencialmente perigosos. Ela conta Páginas: 2-81
para as meninas presentes que seu filho Fonte: SOUZA, Adriano Lima. Aspectos
“carrega o Zé Pelintra”. A senhora expõe com Psicológicos do Zé Pelintra da Cultura do
orgulho o fato de seu filho fazer um sucesso Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2016, 94 p.
descomunal com as mulheres. Apesar de Dissertação de Mestrado (Programa de Pós-
destacar que o rapaz é muito bonito, é graduação Mestrado em Psicologia (PPGPSI))
categoricamente à ação de Zé Pelintra que ela – Universidade Federeral Rural do Rio de
atribui o incomum poder de sedução do jovem. Janeiro, UFRRJ
Ela disse: “O Zé dá muita mulher pra ele! Ele Cidade: Rio de Janeiro
vai pra cabaré, pra Lapa (…) Ele se separou, tá Editora: UFRRJ
na pista. Quando ele bebe, vem gingando
assim com um sorriso de lado (...)”. Ao Resumo
classificar o seu filho como alguém que
“carrega” Zé Pelintra, a senhora construiu uma A dissertação fichada apresenta mais sobre Zé
imagem do rapaz consideravelmente Pelintra e seus aspectos culturais no Rio de
identificada aos atributos do malandro como Janeiro. Fala sobre a Umbanda e suas duas
costumeiramente representado no imaginário vertentes, como também faz ligações com os
popular, enfatizando elementos como ginga, capoeiristas, além de contar a história por trás
jogo de cintura, poder de sedução e a forte da entidade, em sua verão nordestina
atração pelo sexo oposto.” (Catimbó) e carioca (na Umbanda).
p. 87 – “A senhora advertiu a uma das mais
novas: “olha, Seu Zé diz que é seu marido? Não
deixa não! Ele vai afastar tudo quanto é Citações
namorado que você arrumar, porque vai p. 2 – “Zé Pelintra assume função sagrada na
acreditar que é seu marido mesmo!” A menina umbanda e, para tanto, a malandragem
afirmou acreditar que isso já esteja precisou ser sacralizada, sua dimensão
acontecendo.” “profana” é ressignificada ao assumir o
p. 92 – “A discussão em torno do local de cumprimento da lei de umbanda.”
realização da gira de exu tornou evidente a p. 6 – “No livro Candomblé e Umbanda:
extrema valorização dessa hierarquia e o temor caminhos da devoção brasileira, Silva (2005)
em subvertê-la. Em decorrência da chuva, nos informa sobre o sincretismo já presente na
alguém chegou a sugerir que a sessão fosse formação do panteão das religiões afro-
realizada na parte coberta, que fica em um brasileiras, anterior ao surgimento da umbanda.
patamar físico superior, e não no primeiro, a Diversas etnias de negros, antes mesmo de
céu aberto, como de costume. Mas a ideia foi serem trazidas para o Brasil, compartilhavam
logo abolida. O plano mais elevado do terreiro em suas tradições conceitos que possibilitaram
está destinado aos trabalhos junto às entidades a associação entre os deuses. Os Iorubas e
“mais evoluídas”, como caboclos, pretos velhos seus cultos aos orixás, os Jejes se
e, claro, os orixás. O próprio Zé dos Malandros, relacionavam com os voduns, por sua vez
em outro momento da noite afirma: “Lá em cima semelhantes ao conceito de inquices dos
é pros evoluído, os desevoluído fica aqui Bantos.”
embaixo mesmo.”
p. 7 – “Encontramos no norte do Brasil o
p. 96 – “A partir da chegada das pombagiras, catimbó, com forte influência da cultura
há uma acentuação das distinções de gênero e indígena, seu culto é dirigido aos mestres,
da sexualidade entre as entidades presentes. assim nomeada as entidades que se
Diferentemente dos exus dos cemitérios, apresentam como espíritos de índios
sisudos e simbolicamente assexuados em suas (caboclos), ou de antigos chefes de cultos. A
expressões corporais, as pombagiras são presença do altar com imagem de santos
mulheres por excelência. É com elas que os católicos, defumação por meio do cachimbo, a
“zés” formam os pares mais evidentes da noite” utilização de maracá para evocar os espíritos e
FICHAMENTO 09 as rezas católicas são elementos presentes nos
rituais do catimbó. A jurema é uma árvore que
assume lugar sagrado nos rituais, de sua casca
125

é feito a bebida ingerida e é dela a matéria Espiritismo europeu decodificado por Allan
utilizada no defumador.” Kardec. Nesse sentido, Zélio pode ser
reconhecido como o mito de fundação da
p. 12 – “A umbanda constituiu-se, portanto, Umbanda, ou mesmo como o fundador de uma
como uma forma religiosa intermediária entre escola da umbanda. Assim como seu fundador,
os cultos populares já existentes. Por um lado muitos dos seus praticantes eram oriundos dos
preservou a concepção kardecista do carma, grupos kardecistas. Os santos católicos
da evolução espiritual e da comunicação com ocupam papel central, assim como a influência
os espíritos e, por outro, mostrou-se aberta às da literatura e das práticas espíritas kardecistas
formas populares de culto africano. Contudo, são facilmente reconhecidas e, por outro lado,
não sem antes purificá-las, retirando os pode ser percebida a ausência de elementos e
elementos considerados muito bárbaros e, por símbolos ritualísticos africanos, como, por
isso, estigmatizados: o sacrifício de animais, as exemplo, os atabaques, os assentamentos, as
danças frenéticas, as bebidas alcoólicas, o oferendas.”
fumo e a pólvora. Ou, então, quando se fazia
necessário o uso desses elementos, p. 23 – “Talvez menos conhecido pelos
explicando-os “cientificamente”, segundo o praticantes das diversas umbandas, Tancredo
discurso racional do kardecismo. (p. 112)” da Silva Pinto (Tata Ti Inkice), ou Tata
(SILVA, 2005) Tancredo, é o fundador de outra escola: a
omolokô. Encontraremos na umbanda omolokô
p. 12 – “Os cultos afro-brasileiros sofreram a presença dos elementos africanos em sua
grande repressão policial durante o período do ritualística. Para seu fundador a raiz da
Estado Novo. Somente quando as elites umbanda está na África. Nesse sentido
intelectuais e artísticas empreenderam o poderão ser reconhecidos fundamentos
movimento de valorização da cultura popular, presentes no candomblé e em outras práticas
assumindo assim o objetivo de definição de religiosas afro-brasileiras. Se na umbanda
uma identidade nacional, é que as práticas branca, como sinalizamos acima, muitos de
religiosas ganharam algum espaço. É na seus praticantes eram participantes do
esteira desse movimento que a umbanda espiritismo kardecista, a escola omolokô
ganhou certa organização, sendo liderada acolheu em seus terreiros praticantes de
principalmente por atores oriundos da classe candomblé e outras religiões afro-brasileiras.
média, minimizando, porém, as influências Nessa escola de umbanda estarão comumente
africanas. Em contrapartida, se por um lado presentes em sua ritualística: culto aos orixás;
havia o movimento de embranquecimento dos sacrifícios e oferendas, obrigações que
valores religiosos da macumba, havia também acompanham o desenvolvimento de seus
o empretecimento dos valores europeus do praticantes; hierarquia sacerdotal etc”
kardecismo, algo longe da nossa realidade.”
p. 23 – “A Umbanda compartilha com as mais
p. 22 - “Nas religiões afro-brasileiras, pela diversas expressões religiosas afro-brasileiras
diversidade de seus adeptos, há também uma a ausência de poder centralizador ou
diversidade de rituais e de formas de institucionalização reguladora, como é possível
transmissão do conhecimento. A essas várias reconhecer, por exemplo, na Igreja Católica e
formas de entendimento e de vivência outras instituições religiosas cristãs. Assim, não
denominamos escolas afro-brasileiras” (RIVAS será marcada por sistematização e rigidez
NETO, 2012, p.105). Rivas Neto argumenta doutrinária. Logo, encontraremos em cada
também que as várias escolas correspondem a escola, terreiros que se assemelham e
cosmovisões de suas matrizes formadoras: diferenciam-se no desenvolvimento de suas
indo-europeia, africana e ameríndia. De acordo rito-liturgias.”
com suas influências predominantes, a escola
em questão terá igual expressão ritu-litúrgica. p. 24 – “A variedade de tendências doutrinárias
(Ibdem, p. 53) sob a qual se mantinha o movimento
umbandista não tardou a provocar as primeiras
p. 23 - “Essa afirmativa pode ser facilmente dissidências. Se o Primeiro Congresso de
constatada ao examinarmos duas Umbanda teve como um dos temas centrais
denominações, ou escolas, umbandistas que criar a imagem de uma umbanda “pura”,
podem ser observadas no distanciamento de “branca”, através da eliminação dos elementos
suas práticas rituais, são elas: Umbanda africanos tidos como maléficos (ou quimbanda),
Branca (ou cristã) e Umbanda Omolokô.” a partir da década de 1950 setores dessa
p. 23 – “A umbanda branca, ou cristã, tem Zélio religião provenientes dos estratos mais baixos
Fernandino de Moraes como seu fundador e da população, geralmente negros e mulatos,
apresenta fortes influências do Catolicismo e do começaram a contestar o distanciamento da
126

umbanda das práticas africanas. À “umbanda nas mesas e giras do Catimbó são eguns, como
branca” opôs-se a tendência de recuperação acontece na Umbanda, são espíritos de
dos valores africanos presentes na pessoas que já morreram, e em sua vida
religiosidade popular. (Ibdem, p. 116).” pregressa foram Mestres dirigentes desses
mesmos rituais. Após a morte foram enterrados
p. 38 – “A imagem difundida por seus aos pés da Jurema, ou no cemitério dos
seguidores e geralmente encontrada nos catimbozeiros e a partir disso passaram a
Terreiros de Umbanda é a do negro vestido de habitar o Encantado, o espaço mítico da
terno branco, gravata vermelha, chapéu estilo Jurema Sagrada. Já na Umbanda, esses
panamá com faixa vermelha, sapato bicolor e espíritos que passaram por uma vida humana
bengala. Quando observado em seus rituais, se organizam em Falanges, assumindo o
incorporados em médiuns caracterizados com estereótipo desses grupos. Por isso, na
sua vestimenta, representado nas estatuetas Umbanda, cada Zé Pelintra tem uma história de
ou em outras ilustrações, não é difícil a vida singular.”
associação com a imagem do malandro
carioca. Zé Pelintra é o Rei da Malandragem.” p. 44 – “Zé Pelintra Valentão, José Phelintra de
Aguiar, Zé Phelintra, José Gomes da Silva, são
p.39 – “A partir das pesquisas realizadas pela alguns dos possíveis nomes deste que, após
MPF, Oneyda Alvarenga inclui o Catimbó no sua morte física, sempre cercada de mistério,
grupo de religiões populares, de formação tornar-se-ia um Mestre cultuado no Catimbó.
nacional, comumente observada no Norte e Para melhor ilustrar nossa pesquisa,
Nordeste brasileiros. Compartilha com a abordaremos brevemente algumas das
Pajelança7 e no Candomblé-de-Caboclo8 a histórias registradas por Alkimin (1997).
existência de elementos “tomados à feitiçaria
afrobrasileira, ao catolicismo, ao espiritismo e Em meados do século XIX a família de José
principalmente, as reminiscências dos dos Anjos, fugindo de um intenso período de
costumes ameríndios, que constituem a sua estiagem, partiu para a cidade de Recife – PE
parte principal e caracterizadora” (p.57).” a procura de uma vida melhor, ou com menos
sofrimento. Porém, não era isso que o futuro
p. 40 – “No Catimbó, os Mestres “são os guias, reservara para José dos Anjos, ainda criança a
orixás sem culto, acostando, espontaneamente morte leva seus pais. Órfão, cresceu pelas ruas
ou invocados para servir.” (RIBEIRO, 1992, da capital aprendendo com a malandragem os
p.24). Os devotos mais regulares conseguem segredos para enfrentar o mundo. Ainda
reconhecer os diferentes Mestres, pois estes criança circulava pelas regiões marginais,
possuem fisionomia própria, gestos, maneiras dormia no cais do porto e era o garoto de
diferentes de atuação.” recado das prostitutas.
p. 40 – “Para invocação de cada Mestre, há Certa vez, já adolescente, envolveu-se em uma
uma toada diferente. São, geralmente, briga com policiais dentro de um cabaré, na
composições de harmonia simples que dizem cidade de Recife. Durante a peleja, acertou um
sobre as atividades sobrenaturais, a força e o dos soldados com golpe de faca, o que foi
poder de cada um. A música é elemento revidado com uma dúzia de tiros, porém, não
fundamental para que a fumaça aconteça.” foi atingido por nenhum. Fato que lhe rendeu a
p. 41 – “Negros, indígenas e europeus fama de possuir o corpo fechado. (ALKIMIN,
fundiram-se no Catimbó. A concepção da 1997) “
magia, processos de encantamento, termos, p. 45 – “O que é contado sobre sua morte é
orações, são da bruxaria ibérica, vinda e cercado de mistério. Conta-se que uma de suas
transmitida oralmente. A terapêutica vegetal é mulheres havia feito um feitiço para ele. O
indígena pela abundância e proximidade, além motivo teria sido o não reconhecimento de um
da tradição médica dos Pajés. O bruxo europeu filho e por não querer abandonar as outras
também, já trazia o hábito e encontrou no amantes. Passado o prazo de sete semanas
continente a fartura das raízes, vergônteas, que lhe fora dado para esse fim, Zé Pelintra
folhas, cascas, flores e ainda uma ciência Valentão foi encontrado morto, sem ferimentos
secular aborígene na mesma direção e aparentes. (ALKIMIN, 1997)”
horizonte. A convergência foi imediata.
(RIBEIRO, 1992, p. 17)” p. 45 – “Devoto de Nossa Senhora do Carmo,
Zé Phelintra também foi introduzido no Catimbó
p. 42 – “[...] uma importante diferença entre a por seu amigo Mestre Zinho. Frequentando as
Umbanda e o Catimbó. Neste último, como mesas de Catimbó da Paraíba e de
veremos na citação abaixo, as entidades Pernambuco, Zé Phelintra entregou-se de
espirituais denominadas por Mestres cultuados corpo e alma à prática do Catimbó, e dominou
127

os seus segredos. Uma das coisas que Zé apenas encostada em seu corpo. Seu chapéu
Phelintra conseguia através do seu é de palha, ornamentado com uma fita
conhecimento mágico era transformar-se em vermelha, cor também utilizada no lenço que
bananeira sempre que era perseguido por cobre seu pescoço.”
policiais. (Ibidem, p. 28)”
p. 48 – “Já a representação carioca de Zé
p. 45 – “Nos diferentes relatos sobre sua vida Pelintra é aquela que imortalizou o malandro,
terrena, alguns elementos são frequentes. O personagem presente no cenário urbano da
afastamento precoce dos pais, ora pela cidade do Rio de Janeiro. As imagens
orfandade, ora por situações conflituosas; a reproduzem um jovem senhor negro, ou
mudança da zona rural para a capital, como já mestiço, vestido com o terno branco, marca de
citado anteriormente; a vida caracterizada pela sua elegância. O chapéu de palhinha, ou
circulação entre as zonas marginais, a boemia panamá, tem a facha vermelha ou preta que o
e os locais mais elitizados. Registro de vida identifica. Vermelho também é a cor de sua
marcada pela violência e valentia; e por fim, o gravata, e do lenço que carrega dobrado no
encontro com a morte se dá sempre de maneira bolço de seu paletó. Diferente da imagem do
misteriosa, e sua transmutação mítica como Mestre do Catimbó, seus pés calçam sapatos
entidade espiritual divinizada.” bicolor. Aos seus pés está colocado um livro,
que faz alusão à sabedoria de Seu Zé, homem
p. 46 – “No entanto, a sua chegada à cidade do letrado nos mistérios da natureza e do mundo
Rio de Janeiro é mais um dos mistérios que espiritual. Para alguns autores o que vemos
cercam a divindade, objeto de nossa pesquisa. próximo aos seus pés é, na verdade, um
Seguindo os caminhos apontados pelos pontos baralho, representando tanto o prazer pelos
cantados em seu ritual, e reforçado pelas jogos, quanto seu instrumento sagrado para a
histórias compartilhadas por seus fiéis na leitura, no plano astral, da vida de seus
Umbanda, torna-se plausível identificar Seu Zé consulentes”
como mais um dos muitos nordestinos que
chegaram à capital do país nas primeiras p. 48 – “Observamos a ocorrência de uma série
décadas do século XX, e logo torna-se mais um de mudanças entre esses dois momentos da
malandro presente nos mais diversos locais da saga de Zé Pelintra. Tais transformações são
cidade.” simbolizadas pelas alterações em seu vestuário
e objetos de uso pessoal. O lenço vermelho do
p. 46 – “A questão de seu aparecimento no Rio campesino transforma-se na gravata
de Janeiro não foi nunca esclarecida de forma encarnada. O facão que víamos na mão do Zé
convincente. Teria o Zé, a pessoa física, que, do Sertão torna-se uma navalha, peça presente
segundo algumas fontes, atendia pelos nomes no altar de Zé Pelintra, mas excluído de suas
de José dos Anjos e José Gomes, realmente estatuetas. Zé do Sertão fuma cachimbo, ao
migrado para esse estado na década de 1920? passo que Seu Zé prefere cigarros ou charutos.
Alguns autores afirmam categoricamente que Enquanto o do Sertão tem as pernas abertas
não, e juram que ele foi enterrado no famoso semi-arcadas, plantadas no chão, o Zé Carioca
cemitério dos catimbozeiros em Pernambuco. as mantém juntas, além de mostrar um corpo
Outros, porém, respaldados pelo relato de sinuoso como de uma serpente, atento,
muitos pontos cantados (alguns já publicados) concentrado e aparentemente desarmado, mas
em uso nos terreiros de Umbanda atualmente, sempre alerta para eventuais ataques inimigos,
evocam passagens de sua saga, ainda em mesmo na hora em que examina seu oráculo,
vida, pelas ruas do Rio de Janeiro Boêmio do seja este o livro aberto sobre o solo ou o
começo do século XX. Nenhuma prova baralho no qual ele lê a sorte dos desvalidos.
concreta sustenta essas versões, que nem por (LIGIÉRO. 2004 p. 55- 56)”
isso deixam de ser verdadeiras, já que
professadas por muitos, compondo uma p. 48 – “Dentro do chapéu Panamá e no couro
história múltipla de um mito. O fato é que a dos sapatos trazem seu mistério. O chapéu,
figura mística de Zé Pelintra, gerada a princípio ornamento de respeito e credibilidade, assim
nos Catimbós do Nordeste, adquire imensa como a fita que o envolve, tem o formato de um
popularidade no Rio de Janeiro. (LIGIÈRO, círculo mágico que, além do respeito para com
2004, p. 27)” a divindade regente do Guia, cobre e protege a
coroa do médium contra interferências
p. 47 – “A versão nordestina de Zé Pelintra é externas. O couro dos sapatos associa-se
retratada como caboclo jovem, vestido de magneticamente ao couro dos atabaques.
branco, com as calças dobradas até a canela, (VIEIRA, 2015, p. 206)”
seus pés estão descalços e pisando no chão.
Em uma das mãos o Mestre segura uma p. 49 – “Com o movimento de aceitação as
garrafa; na outra mão uma peixeira, bengala ou entidades que se manifestavam em nome da
128

falange de Zé Pelintra ganham linha de trabalho sambista e com reconhecimento de bamba.


própria, a Linha dos Malandros. Apesar de Zé Todos são adjetivos necessários para ser
Pelintra ser o nome mais conhecido, a nova denominado malandro. Vale ressaltar de
Linha agrega os vários espíritos que imediato que esse grupo de malandros era
anteriormente também se apresentavam em constituído de negros e mestiços que
diferentes giras, “os Zés (Pelintras, Navalhas, mantinham firmes sua singularidade.”
Capoeiras), os Sibambas, as Marias Navalhas
e outros.” (VIEIRA, 2015, p.201)” p. 55 – “É nesse período, início do século XX,
que começa a circular pela cidade o
p. 49 – “Seu Zé Pelintra tem o início de sua personagem abordado no estudo que
jornada na dimensão espiritual como Mestre no realizamos. Ele será reconhecido como
Catimbó nordestino, baixou primeiro nos rituais importante interlocutor dos projetos de
da Jurema. Para tanto, de acordo com práticas remodelação do espaço urbano, que eram
desse ritual, em vida foi um iniciado nesse culto. acompanhados de remoções de comunidades
Ocupam assim como outros Mestres, as populares de áreas com potencial valorização
práticas de cura, o segredo das ervas e o saber imobiliária. É um recurso primoroso abordar a
necessário para auxiliar seus devotos na imagem do Malandro, posteriormente
resolução dos problemas materiais e eternizado na entidade Zé Pelintra, pelo seu
espirituais. O que lhe garante o livre acesso aos aspecto de resistência social, e a compensação
outros rituais existentes na Umbanda” psicológica (consciente ou inconscientemente)
individual e/ou coletiva. Porque o surgimento do
p. 49 – “Já nas Macumbas Cariocas, Zé Pelintra Malandro, Zé Pelintra, está marcado pela
baixou como um Exu. Posteriormente, no início configuração de populações afro-ameríndias
do século XX, com a estruturação da Umbanda, que habitavam as favelas e as zonas marginais
Seu Zé ainda permanece por algum tempo nas primeiras décadas do século passado, já
sendo reconhecido como Exu. Com o como fenômeno das remoções.”
desenvolvimento da Linha dos Baianos é que
Zé Pelintra começará manifestar-se nesse ritual p. 60 – “As maltas, denominação dada aos
e apresentar-se de outra maneira, já mais grupos de escravos capoeiras, começaram a
adequado à imagem do malandro carioca. “No fazer parte da realidade da cidade do Rio de
final da década de 1980 e inicio da década de Janeiro no começo do século XIX. Cada malta
1990, nasce nos morros cariocas a Linha dos era dona de um território e, dessa maneira, os
Malandros, hoje independente”. (VIEIRA, 2015, escravos se apropriavam de determinadas
p. 204)” partes da cidade, sendo as praças os principais
locais de escolha. Para a manutenção do poder
p. 50 – “De acordo com Ligiéro (2004) Zé sobre determinado território, as maltas estavam
Pelintra e a Falange de Malandros, por ele em constante conflito com a polícia e com
comandada, é a única Linha no Panteão outras maltas. Logo, era perceptível a
Umbandista que pode manifestar-se no ritual existência de uma cidade forjada pelos negros
da Linha das Almas, dedicados aos caboclos, capoeiras. (CAPOEIRA, 2010)”
pretos e pretas-velhas; e no ritual do Povo da
Rua onde compartilha o espaço com os Exus e p. 60 – “Nestor Capoeira (2010) identifica, nas
pombas-gira. Mais uma evidência de sua maltas dos anos 1880, traços que mais tarde
duplicidade.” constituirão o Malandro carioca. Uma das
estratégias utilizadas pelas maltas em suas
p. 51 – “Há muitas opiniões divergentes sobre disputas era o combate singular em que dois
quem é o Senhor Zé Pelintra. Como Guia capoeiras se enfrentavam. Por vezes esses
Espiritual, Zé Pelintra não é Exu, não é Baiano, conflitos eram flagrados pela polícia. Quando
não é Boêmio nem pilantra, mas pode se isso acontecia os dois grupos conseguiam fugir
apresentar em diversas Linhas de Trabalho, de maneira organizada e todos passavam pela
nos terreiros em que não há uma gira específica polícia sem serem presos.”
para a Linha dos Malandros. Sempre muito
alegre e de aparência madura, Seu Zé p. 60 – “De acordo com Capoeira (2010), o
apresenta-se como um jovem senhor muito malandro é um personagem que aparece na
sério e atencioso; é bastante compenetrado em cidade do Rio de Janeiro no começo do século
seu trabalho. (VIEIRA, 2015, p. 205)” XX, sendo a continuidade das antigas maltas
cariocas. Por volta da década de 1920 a
p. 53 – “Contar a história de Zé Pelintra é dizer imagem do malandro ganha maior destaque e
sobre a história dos malandros, agentes a filosofia da malandragem encontra nos
singulares que marcaram significativamente a sambas o caminho de divulgação, chegando às
dinâmica da cidade do Rio de Janeiro. Boêmio, diversas regiões do Brasil, nas ondas do rádio”
jogador, amigo das prostitutas, capoeirista,
129

p. 60 – “Logo, se no século XIX havia as maltas algumas de suas Linhas Trabalho e patronando
de escravos capoeiras e no século XX os outros espíritos que também se apresentam
malandros cariocas, hoje o que encontramos é como Zé Pelintra. O Guia Espiritual Zé Pelintra
a Falange mítica do Malandro Zé Pelintra. original baixou primeiramente na Jurema, no
Alguns dos pontos cantados nos rituais para a Catimbó nordestino, e, se isso aconteceu, é
falange do Malandros fazem alusão ao porque ele conheceu esse universo.
tensionamento com o Estado.”
p.203 – “Se Seu Zé Pelintra baixou inicialmente
p. 81 – “A Umbanda é uma religião na Jurema, no Catimbó, é porque ele foi
genuinamente brasileira, marcada pela “juremado”, ou seja, é porque em vida ele foi
multiplicidade, o que reflete em diferentes iniciado nesse culto, bebeu jurema e ‘se
denominações.” levantou’. Na Jurema só baixam espíritos
p. 81 – “[...] Com história semelhante, seja ‘juremados’”
como carioca ou como Mestre catimbozeiro,
assume um lugar duplo na Umbanda, podendo p. 204 – “Nas ‘macumbas cariocas’ Zé Pelintra
manifestar na linha das almas, ou do Povo de baixou como Exu, pois, nessa época, a Linha
Rua. A duplicidade é um traço fundamental de de Baianos ainda não se apresentava nas
sua personalidade.” incorporações. Ali, Exu tinha especialidades e
Zé Pelintra também ficou famoso, pois sempre
FICHAMENTO 10 chegava muito falante, trabalhando com tudo e
quebrando regras.”
Título/Subtítulo: Os Guias Espirituais da
Umbanda e seus Atendimentos p. 204 – “No inicio do século XX, quando a
Autor(es): VIEIRA, Lurdes de Campos Umbanda se estruturou, essa entidade
Ano: 2015 continuou se apresentando na Esquerda, até o
Páginas: 201-210 advento da Linha dos Baianos, onde passou a
Fonte: VIEIRA, L. C. Proteção e Solidariedade baixar, adequando-se a ela e moldando-se
dos Malandros. In: VIEIRA, L. C. Os guias como malandro carioca. No final da década de
espirituais da umbanda e seus 1980 e início da década de 1990, nasce nos
atendimentos. São Paulo: Madras, 2015. p. morros cariocas a Linha dos Malandros, hoje
201-210 independente.”
Cidade: São Paulo
Editora: Madras p. 204 – “[...]Os Malandros são um
agrupamento de espíritos que viveram suas
Resumo reencarnações na pobreza e no sofrimento,
O capítulo fichado discorre sobre a Linha de mas souberam driblar a miséria e baixo astral.
Malandros na Umbanda, onde apresenta e cita Por onde passam, esses espíritos levam alegria
características das entidades presentes nessa e arrancam sorrisos e gargalhadas, com seu
linha, explica sua origem e vestimentas. É um samba no pé, sua ginga e malandragem, pois
texto importante para conhecer mais sobre a são resultado da grande miscigenação cultural
linha, trazendo ensinamentos sobre como e racial brasileira, e retratam as populações
essas entidades de luz trabalham em prol da marginalizadas e desfavorecidas, pobres e
caridade. sofredoras dos morros e das periferias do país,
tanto rurais quanto urbanas.”
Citações
p. 202 – “A controvérsia surge do uso do termo p. 204 – “Esses espíritos chamados malandros
“Malandro”, na denominação dessa Linha de do astral não são marginais do além, como
Trabalho, mas esse foi o arquétipo do escolhido muitos supõem. São amigos, voltados para a
no astral para que os Guias manifestantes nela prática da caridade espiritual e material,
falem das crises da sociedade e de suas propagam o respeito ao ser humano, a
consequências. Nessa linha podem manifestar- tolerância religiosa, a humildade, os bons
se, inclusive, espíritos que, encarnados, foram exemplos, o amor ao próximo, o amparo às
sociólogos, historiadores e outros profissionais crianças desamparadas, às mulheres
ligados às denúncias dessas crises e na defesa sofredoras e aos idosos.”
da população excluída.”
p. 205 – “Há muitas opiniões divergentes sobre
p. 202 – “Na época em que viveu, Zé não quem é o Senhor Zé Pelintra. Como Guia
conheceu a Umbanda, que não havia chegado Espiritual, Zé Pelintra não é Exu, não é Baiano,
ao sertão nordestino, mas, como espírito, não é boêmio nem pilantra, mas pode se
integrou-se a essa egrégora, laborando em apresentar em diversas Linhas de Trabalho,
130

nos terreiros em que não há gira específica energias negativas. Não são utilizados para
para a Linha dos Malandros.” corte físico, sendo mais um simbolismo.

p. 206 – “Dentro do chapéu Panamá e no couro


dos sapatos, trazem seu mistério. O chapéu, P: Por que as imagens de Zé Pelintra
ornamento de respeito e credibilidade, assim geralmente são atreladas a Lapa?
como a fita que o envolve, tem o formato de um
círculo mágico que, além do respeito para com R: Tanto a Lapa, quanto no pé morro ou porta
a divindade regente do Guia, cobre e protege a de bar por exemplo, são pontos de força da
coroa do médium contra interferências entidade. É lá que a energia é magneticamente
externas. O couro dos sapatos associa-se mais forte. Por isso que geralmente quando se
magneticamente ao couro dos atabaques.” coloca um agrado à malandragem bota-se na
porta de bar, por exemplo.
p. 206 – “É um doutor de corações e almas, tem
grande importância nos catimbós e macumbas
cariocas, além de ser o protetor dos
P: E a comida? Tem um porque de se usar a
comerciantes, principalmente bares,
linguiça calabresa?
lanchonetes, restaurantes e boates. Seu Zé
representa o povo brasileiro, sofrido e R: Na comida no malandro vai a comida de bar.
guerreiro, que não desiste nunca.” Linguiça calabresa, azeitonas. Pode colocar
também como um agrado a eles queijo em
p. 209 – “Segundo Edmundo Pellizzari, mestres cubos, salaminho, ovo colorido. Tudo que for
receberam mensagem do astral, comunicando relacionado a esse clima de boteco
que o Zé Pelintra original não baixa mais, pois basicamente.
acumulou muitos méritos e assumiu outras
responsabilidades, e hoje se chama ‘Zé da Faço também uma farofa que vai carne seca
Luz’. Acreditamos que o Zé Pelintra original é o desfiada, pela raiz nordestina da entidade. Mas
Hierarca, o Cabeça de Falange dos muitos nem toda casa faz, é algo que eu gosto de fazer
Guias Espirituais que se apresentam na para agradar.
Umbanda sob a aparência-padrão de um
malandro da boemia carioca e contam
diferentes histórias de Zés, da Bahia, de Adriana Aparecida dos Santos, 38 anos,
Pernambuco, do Rio de Janeiro, de Alagoas, da médium a 6 anos. Entrevista em 05 de Abril.
Paraíba.”

Anexo II P: A quanto tempo você frequenta a


Umbanda?
Entrevistas transcritas
R: Eu conheci a Umbanda em em 2009, mas eu
comecei o desenvolvimento mediúnico em
2015. Descobri que tenho Dona Navalha em
Clauvonir de Souza Rodrigues, 57 anos, meu caminho entre 2015/2016.
dirigente da Tenda Espírita de São Miguel
Arcanjo. Entrevista em 05 de Maio.
P: Para você, o que a malandragem (Zé
Pelintra, Maria Navalha e outros malandros),
P: Qual o motivo de serem usados dados e significam? Pode ser adjetivo, sentimento.
baralhos para os trabalhos com a
malandragem? R: Um mistério que a Umbanda e o Candomblé
não conseguem explicar. Eu sinto, quando
R: São objetos encontrados em jogos de bar, trabalho tanto com Seu Zé Pelintra quanto com
podem ser descritos como objetos com a Dona Navalha que é alguma coisa como se
magnetismo da energia da malandragem. fosse uma adaptação, ele vem com um
ensinamento totalmente diferenciado da
esquerda e diferenciado da direita. É como se
P: E os punhais e navalhas? Existe motivo realmente pertencesse a outro culto que não
para uso? tem a ver com o Candomblé, não tem a ver com
a Umbanda, pode ser o Catimbó mesmo, eu
R: Eles são usados como forma de corte não consigo desvendar.
energético, assim, são proteções contra
131

O que eu sinto em relação a eles é uma sessão fosse realizada na parte coberta, que
gratidão, um carinho. Sabe quando você olha fica em um patamar físico superior, e não no
para alguém que você admira muito, alguém da primeiro, a céu aberto, como de costume.
sua família, alguém mais velho que você que Mas a ideia foi logo abolida. O plano mais
você admira por conta da sabedoria que aquela elevado do terreiro está destinado aos
pessoa passa para você? É o que eu sinto em trabalhos junto às entidades “mais
relação a eles. evoluídas”, como caboclos, pretos velhos e,
claro, os orixás. O próprio Zé dos
Malandros, em outro momento da noite
P: Na sua casa/templo, a malandragem tem afirma: “Lá em cima é pros evoluído, os
gira específica? Ou trabalham em giras de desevoluído fica aqui embaixo mesmo.”
Exu e Pombo-gira?
R: Na minha casa antiga que foi feito meu Finalizando, você descreveria a entidade
desenvolvimento não tinha uma gira específica. como um ser de baixa evolução ou, como
Eles vinham de acordo com a necessidade. descrito na citação, “desevoluído”?
Mas tudo começou a mudar quando a Navalha
que trabalha comigo chegou, ela trouxe a
banda da malandragem toda com ela, ai
começaram a trabalhar com a linha da R: Não concordo em caracteriza-los assim, eles
malandragem. Porém, não tem esse negócio não se encaixam, eles são únicos. É como as
de ele é da linha da esquerda ou da linha da falanges. Você não vai comparar um caboclo a
direita, ele é malandragem. um êre. Você não vai comparar um exu com um
marinheiro. Eu não concordo porque, pela
Malandragem é uma coisa fora do perfil, direita energia que é passada, Seu Zé tem a
(Preto-Velho, Caboclo e Êre) e esquerda (Exu, polaridade tão misteriosa, que ele se encaixa
Pombo-gira). em um gira de exu e também se encaixa numa
energia de preto-velo. Então se a gente parar
A casa nova que eu frequento tem uma gira pra pensar é muito maior do que a gente tem
especificamente para malandros. na consciência, no nosso aprendizado. E isso
não é só para os malandros, isso também se
encaixa para as malandras. O porém é que as
P: Sobre as citações a seguir, retiradas de casas não tem essa abertura, só quem trabalha
um artigo sobre Zé Pelintra, qual sua com eles que começa a entender parte dos
opinião: mistérios, por se tratar de uma linha mais
modernizada, vamos dizer dessa forma.
“Malandro é cultuado na energia de Exu na
nossa casa (…).Eu acho que na maioria A gente que trabalha com ele entende que eles
delas o Zé Pelintra é encaixado nas falanges não têm relação, Seu Zé o mistério dele é tão
de Exu, pode ter as suas diferenças, porque forte que ele consegue trabalhar virado na
a umbanda é muito diversa, mas na maioria esquerda, a energia dele se adapta tanto pra
dos casos a falange de malandro, é cultuada esquerda quanto pra direita. Mas eu
na falange de Exu (…)É porque os Exus consideraria um povo de linha do meio.
Malandros, que são Exus Zé Pelintras,
tiveram suas vivências diferentes de um P: E por último, você tem alguma vivência
caso do Senhor trancaruas, do Exu de ou algum conhecimento a mais sobre Zé
Calunga que é um e Exu-caveira, tiveram as Pelintra e Maria Navalha, ou até mesmo sabe
suas vivências, e experiências dessas a história de alguma entidade (malandro ou
vivencias diferentes.” malandra), que quer compartilhar?
R: O malandro é uma entidade que não tenho
a história por ser recente o trabalho dele
Você concorda em caracterizar Zé Pelintra comigo. Mas a Dona Navalha sei que o nome
como Exu? Por quê? dela é Maria Navalha do Cais, é a malandra que
trabalha na minha corrente.

“A discussão em torno do local de


realização da gira de exu tornou evidente a
extrema valorização dessa hierarquia e o
temor em subvertê-la. Em decorrência da
chuva, alguém chegou a sugerir que a
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Anexo III – Pesquisas


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