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ESCOLA DE DESIGN
CURSO SUPERIOR EM MODA
Navalha e Punhal
Proposta para o Desenvolvimento de Coleção de Moda inspirada em Zé Pelintra e
Maria Navalha
______________________________________________________
Rio de Janeiro
2021
Karen Oliveira de Andrade Martins
Navalha e Punhal
Proposta para o Desenvolvimento de Coleção de Moda inspirada em Zé Pelintra e
Maria Navalha
Rio de Janeiro
2021
AGRADECIMENTOS
Primeiro, agradeço à Deus, por tudo que proporcionou em minha vida, desde
meu nascimento até agora. Aos donos da minha coroa, Oxum e Oxóssi, por serem a
minha força, meu conforto e meus pilares, quando eu não sabia mais como continuar.
Aos meus padrinhos, Ogum e Iemanjá, pelo amparo e coragem, e à Iansã, que me fez
guerreira em mais um momento de minha vida. Agradeço a todos os guias espirituais
da Umbanda, aos pretos e pretas-velhas, aos caboclos, êres, boiadeiros, marinheiros,
ciganos, baianos e baianas, exus e pombo-giras, que me escutaram chorar e pedir
força para continuar essa caminhada, e de certa forma, me deram a mão.
E por fim, nessa tão amada parte espiritual, agradeço a Maria Navalha e Seu
Zé Pelintra, grandes inspirações desse trabalho, que caminham ao meu lado e que
me aconselham sempre que preciso. Em especial à Navalha, que toma conta dos
meus caminhos, me traz coragem e alegria. Obrigada por estarem sempre comigo!
Salve a malandragem!
A meus pais, Cláudio e Deyse, e meus irmãos, Karla e Hugo, meu obrigado e
imensa gratidão, pois embarcaram comigo nesse sonho que era me formar e trabalhar
na área de criação. E que nesses quatro anos me apoiaram, me ouviram chorar, me
viram surtar e me ajudaram sempre que possível. Sei que em qualquer momento
posso contar com vocês. À Paulo Segóvia, meu companheiro e amigo, que me ajudou
em diversos momentos durante o curso. À Clauvonir Rodrigues, minha “mainha”, por
cuidar de mim na parte espiritual, e me dar o apoio que inúmeras vezes precisei. E a
todos aqueles, que ao meu lado, são filhos e filhas da Tenda Espírita de São Miguel
Arcanjo, obrigada por estarem comigo me dando apoio!
Agradeço também à minha Vó Marina - que desde pequena me ensinou a
mexer em uma máquina de costura para saber fazer roupinhas de boneca -, e minhas
tias Marina (in memoriam) - que costurava as próprias roupas e as blusas de meu avô
- e Luzia - que fez minha primeira roupa de santo. Três costureiras que amaram que
eu seguiria o caminho da moda, e que sempre que estavam comigo perguntavam
como estava a minha costura, se eu queria algum molde ou dicas de costura.
Obrigada a todos aqueles que estiveram na minha vida nesses anos, que viram
minha caminhada e meus obstáculos, mas que nunca desacreditaram de mim.
Agradeço à espiritualidade, agradeço à Deus, aos Orixás e as entidades por
essa conquista!
RESUMO
JUSTIFICATIVA
Acredito ser relevante para o campo da moda ao para mostrar que coleções de
com temáticas religiosas não precisam se resumir a t-shirts com estampas localizadas
com a figura da entidade ou com estampas de pontos cantados; tendo também uma
relevância cultural de grande importância, já que tais entidades são presentes em
vários momentos no Rio de Janeiro, e a religião foi fundada no estado.
Por ser praticante da religião, falar sobre um tema que além de englobar
também a cidade que nasci, mostra como a malandragem dos terreiros de Umbanda
são sinônimo de coragem e alegria. Partindo de uma figura presente sob diversos
olhares no Rio de Janeiro, e para mim, uma entidade à qual tenho muito afeto e
gratidão, apresentar este tema rico em história de fé e resistência sob um olhar
distinto, representa a possibilidade de trabalhar a fé de uma forma mais diferenciada
no campo do design.
PROBLEMA
Tendo como um tema onde a maior parte histórica é cultura oral, e que cada
terreiro tem suas particularidades ao se tratar desta linha, ao apresentar os dois polos
da linha da malandragem, Zé Pelintra – polo masculino – e Maria Navalha - polo
feminino -, tais questionamentos são significativos: como transformar a vestimenta e
as características do malandro em uma coleção de moda sem prender ao trivial de
ternos brancos e blusas listradas? Como apresentar a estética de uma forma
desconstruída da atual perspectiva muito encontrada em esculturas e imagens,
apresentando uma nova ótica versátil e caminhando para um estilo casual e/ou
urbano?
OBJETIVO GERAL
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
• Apresentar a Umbanda
• Discorrer sobre a linha dos malandros dentro da Umbanda
• Identificar características das entidades desta linha
• Apresentar Zé Pelintra e Maria Navalha e suas características
• Descrever e relacionar as referências já conhecidas ao falar sobre tais
entidades
• Apresentar o período em que a calça se tornou presente no vestuário feminino
• Pôr em prática o conhecimento de técnicas assimiladas durante o curso de
Design de Moda, elaborando uma coleção de moda.
METODOLOGIA
6. RESULTADOS ESPERADOS
Se espera deste trabalho a obtenção de material teórico que será usado como
inspiração para a criação de produção de uma coleção de moda feminina a ser
desenvolvida a partir de referências e detalhes extraídos do tema apresentada, a linha
dos malandros nos terreiros de Umbanda.
LISTA DE FIGURAS
INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 14
1. INTRODUÇÃO
1.1 A Umbanda
A umbanda é uma religião brasileira, que tem seu mito fundador datado em
1908 no dia 15 de novembro, sendo anunciada por Zélio Fernandino de Moraes, que
de acordo com a história, em sua época, foi espírita kardecista, mas em uma
determinada sessão incorporou1 o Caboclo das Sete Encruzilhadas, dando início a
religião que é conhecida hoje.
1
Incorporação: ato de manifestação do espírito/entidade através do corpo do médium.
16
2
Tancredo da Silva Pinto foi um dos maiores nomes da religião, médium e escrito de livros dobre a Umbanda.
3
Orixás: Divindades africanas do povo Iorubá.
17
4
Linha de trabalho regida por Oxóssi, sustentados pela vibração das matas e conhecimento.
5
Linha de trabalho construída a partir da referência simbólica aos ancestrais trazidos da África para
serem escravizados. Trabalham com a regência de Obaluaê e Nanã.
6
Linha de trabalho de origem mítica, remete aos antigos pais e mães de santo da Bahia, e aos
nordestinos que sofreram por preconceitos e discriminações. Trabalham com a regência de Iansã.
7
Também chamados de Caboclos de Couro. Os guias que trabalham nessa linha, em grande parte,
os que sofreram preconceito como “sem raça”. Trabalham com a regência de Iansã e Ogum.
8
Linha de trabalho regida por Iemanjá, trabalham os homens e mulheres que em suas últimas
encarnações viveram do mar, pelo mar e para o mar.
9
Linha composta por espíritos que foram ciganos quando encarnados, e os não ciganos. Regência
Egunitá, sendo sincretizada como Santa Sara Kali.
10
Sessões religiosas
19
1.2 Malandragem
“Protegida de Zé Pelintra
Maria Navalha não brinca”
11
Exu: abordado aqui o exu entidade/guia espiritual. Não Esú, Orixá.
12
Povo de rua ou linha de esquerda: Exus, pombo-giras e exus-mirins.
13
Ver notas na página 4 sobre as entidades
20
Entidades que trabalham nessa específica linha, não são somente malandros
boêmios, como muitos leigos no assunto da religião acham, mas também espíritos
desencarnados de seres que em vida, trabalhavam em prol daqueles que obtinham
pouca assistência social e eram excluídos, como aponta Vieira (2015), sociólogos,
historiadores etc., sendo a palavra Malandro usada para denominar esse arquétipo as
entidades que falaram sobre problemas sociais e consequências. E ainda, esta linha
não é estritamente masculina, existindo e se manifestando entidades femininas, como
por exemplo, Maria Navalha.
Figura 5: Maria Navalha das Almas e Zé Pretinho da Lapa, médiuns Carolina Lanzarin e Macsuel
Douglas
para causar uma boa aparência, desta forma, entravam nos cassinos para os jogos
de cartas e dados.
O perispírito, também conhecido como corpo fluídico dos Espíritos e “[…] que une o corpo e o
14
15
Cânticos ritualísticos acompanhados por percussão em atabaques
16
Locais cuja energia e magnetismos são mais fortes, é o meio natural de sintonizar com as entidades. Podem
ser descritos como captadores e emanadores de energia.
26
Na Umbanda, ele vem para ajudar aqueles que andam na noite, nas ruas.
Trazendo além da proteção, as palavras de ajuda para a vida e um ombro amigo para
as mazelas diárias. O seu ponto de força seria a Lapa, local boêmio do Rio de Janeiro,
já que José dos Anjos, pernambucano que na juventude se mudou para a capital
carioca, e conheceu o reduto do samba e da malandragem. Como Monique Augras
(1997) o descreve, “é pernambucano e cidadão carioca, sertanejo e morador da Lapa,
macumbeiro e catimbozeiro, malandro e letrado.”
No entanto, dentro da própria religião, existem aqueles que ainda acreditam
que Zé Pelintra, assim como os Exus, é um espírito “desevoluído”, como aponta
Janderson Bax Carneiro (2012) em sua dissertação, em que uma entrevista e ida à
uma gira de esquerda (nome denominado para giras de Exu), os médiuns da casa e
os próprios guias espirituais apontam como os Exus, Pombo-Giras e Malandros como
seres de baixa evolução, estando em abaixo de Pretos e Pretas-Velhas e Caboclos,
e os mesmos referem a Seu Zé como um tipo de exu, tal como é descrito no texto de
Carneiro (2012), Exu Zé Pelintra.
Em contrapartida, na entrevista com Adriana, ela afirma que os guias que
trabalham na linha da malandragem, com as suas palavras: “São únicos, portanto não
há comparação, sendo coisas distintas”. Adriana diz não concordar também com a
denominação de Exu Zé Pelintra, segundo suas palavras:
28
A linha é descrita por ela como “Linha Modernizada, onde na concepção dela,
o mistério é tão forte que Zé Pelintra consegue se adaptar para a esquerda tanto para
a direita, considerando-o um povo de “linha de meio”.
Tuco, conta com a mesma ideia de Adriana. Onde ele afirma o que foi abordado
no começo do tópico, que Zé Pelintra é uma entidade que provém do Catimbó, mas
que no começo de suas manifestações, vinham juntamente com Exus e Pombo-Giras,
mas tal entidade pode trabalhar tanto da direita como na esquerda, de acordo com a
doutrina de cada casa, sendo então uma entidade que não tem lado de preferência.
De acordo com suas palavras: “Frisar que Zé Pelintra é apenas Exu seria limitar a
forma de trabalho desta entidade.”
Sobre a questão de espíritos “desevoluídos”, Tuco argumenta que “[...] Se o
espírito tem o poder de se manifestar, trazendo consigo relatos, histórias, vivências e
experiências de outras vidas, seria errado afirmar que a entidade - seja ela qual for -
é atrasada.”, trazendo uma questão que também é muito argumentada em diversos
terreiros, que apenas trabalham na Umbanda seres de luz e evoluídos
espiritualmente. Tuco, em sua fala, ainda completa
o mesmo fala que é difícil de ver esta entidade por ela ter deixado de incorporar em
algumas pessoas, por já ter ascendido espiritualmente.
No parágrafo anterior, ainda é dito que cada entidade tem sua história e
vivência, foi escolhido a história na entidade de Tuco, Zé Pelintra das Almas, para
afirmar tal passagem. Em sua história e área de trabalho é possível notar mais uma
desmitificação da imagem da entidade, a de amarração amorosa. Tuco diz que a
entidade ajuda nas questões amorosas, mas não faz amarração, e suas ligações com
os Orixás “regentes” de sua linha:
Trabalho com o Zé Pelintra das Almas, que tinha o nome de batismo de José
Augusto da Silva. Um mulato, trabalhador e que frequentava seus bares com
jogatinas. Sempre utilizava da malandragem para ganhar dinheiro em mesas
de carteado e dados. Devido a uma dívida foi morto à facadas. Trabalha na
linha de Ogum juntamente com Omolu, onde seu ponto de força é na rua do
lado de fora do cemitério. Trabalho com conselhos para o amor (não faz
amarração), para conseguir trabalho, para ajudar empresas, estudos e
conquistas que demandam empenho. (TUCO, 2021)
giras17, pois poucos são os terreiros que a cultuam dentro da linha que pertence, por
mostrarem também a feminilidade, muito vista geralmente nas pomba-giras.
De acordo com sua história mais conhecida dentre os praticantes da religião,
ela viveu na zona portuária do Rio de Janeiro no final do século XIX, mais
precisamente na primeira favela do bairro da Gamboa, Morro da Providência. Quando
jovem, perdeu os pais e teve que morar na rua, assim foi introduzida na noite e na
malandragem. Andou por cabarés, bares e ruas, e lá conseguiu sua fama e apelido.
Segundo sua história, ela bebia como marinheiro, brigava como um leão de chácara 18,
fumava como um estivador, mesmo assim sem nunca perder a feminilidade, e junto
de si, carregava sempre uma navalha. Desencarnou ao ser surpreendida em uma
noite, e levar uma faca nas costas, morreu na rua, sozinha.
Maior parte das histórias encontradas sobre a entidade, como a descrita acima,
são encontradas apenas em grupos e páginas sobre a religião na rede social
Facebook, por serem histórias relacionadas à vivência com a entidade, e que ela
passa para o médium, ou em entrevistas com médiuns que trabalham com a guia e
sabem da história de vida da mesma.
Figura 14: Pintura da entidade Maria Navalha, feita por Maria do Carmo (esq.); arte feita por Bruna
Reis (dir.)
17
Entidades femininas de linha de esquerda.
18
Forma coloquial de denominar segurança.
31
Com base na história contada acima, pode-se perceber que a entidade traz o
sentimento de liberdade, de querer não ser mandada nem obedecer a regras que
impossibilitem suas ações. Para tempos atuais, é possível fazer uma ligação à frase
“lugar de mulher”, onde na sociedade, as mulheres são postas em “gaiolas”, tendo
que se encaixar e submeter em padrões. Maria Navalha das Almas traz o ensinamento
que com esperteza e malandragem, no seu tempo encarnada, conseguiu passar por
cima das regras, se vestindo daquilo que era sinônimo de liberdade: um homem.
Analisando o ponto cantado a seguir, de autor desconhecido, pode-se
exemplificar as ligações entre a entidade com os Orixás, sendo eles Ogum, Iansã e
Xangô. Ogum, Orixá guerreiro do ferro; Iansã, Orixá guerreira dos ventos e
tempestades; Xangô, Orixá da justiça. Assim, a ligação da entidade Maria Navalha
pode ser entendida como uma entidade de força (Ogum e Iansã) e justiça (Xangô).
Figura 17: Ensaio Técnico do Salgueiro, 2016 – Maria Navalha sendo retratada por passista
1.3.1 O Samba
Acredita-se que o samba carioca, que é conhecido nos dias de hoje, tem ligação
direta com sambas de roda capoeiristas. Assim como cita Roberta Araujo, o samba
teve como seu reduto a periferia carioca, sendo sinônimo para muitos de algo atrasado
no Brasil, mas para outros era a representação da cultura do mesmo.
A figura do malandro, que começou a povoar o samba por volta do final dos
anos 1920, talvez seja a denominação última de um tipo recorrente na cultura
brasileira. As características primordiais do malandro, como aquele que
recusa o trabalho e vive de expedientes e golpes aplicados em algum otário,
podem ser encontradas desde pelo menos o início do século XIX. Em lundus
e romances do século XIX, este personagem aparece com o nome de vadio,
cujo vínculo com a música popular se dá a partir de sua relação estreita com
a viola e a cachaça. (FENERICK, 2006, p. 27)
abriu portas para a chamada “Era de Ouro”, durante o governo de Getúlio Vargas, que
utilizou o samba e sua popularidade para “pregar” o Estado Novo e a valorização do
trabalho.
No fim da década de 30, o Departamento Nacional de Propaganda (DNP) foi
substituído pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), que foi criado em
dezembro de 1939, servindo para censurar e propagar o novo governo, incluindo o
samba do malandro, que foi maior alvo da censura do DIP, onde as músicas que
tinham como foco a malandragem foram substituídas pelas de exaltação ao trabalho,
transformando então o samba como símbolo nacional, e servindo para promover as
ideias de Vargas sobre trabalho e valorização da pátria. (Reis, 2007)
Figura 19: Charge de Getúlio Vargas e o malandro, com um pandeiro em uma ratoeira
Noel diz que em Vila Isabel o samba tem o feitiço e enfeitiça a quem o ouve,
tal como o samba era entendido anteriormente. Porém, é um feitiço diferente,
é um feitiço decente, o que de antemão já denota uma preocupação com a
aceitação social (e comercial). Tal como em Rapaz Folgado, onde Noel deixa
o malandro nu, decompondo o seu aspecto exterior (a navalha, o lenço no
pescoço, o tamanco), em Feitiço da Vila o samba também passa a ser
desprovido de suas significações exteriores. Continuando a ser feitiço, o
samba não carrega mais a significação religiosa da cultura afro-brasileira: a
vela, a farofa e o vintém. (FENERICK, 2006, p. 43)
De acordo com Reis (2007, p. 35) “Outra coisa com a qual Noel não concordava
era a identificação do sambista como um malandro marginal. A figura do malandro em
suas músicas era mostrada por um lado mais humano, com alegrias e dificuldades.”.
Conduzindo a narrativa, mais uma vez, para a visão do malandro boêmio e alegre, e
não o quadro deturpado da personalidade há muito perpetuada.
1.3.2 Lapa
Bairro localizado entre a zona norte e sul do Rio de Janeiro, recebeu seu nome
em homenagem à Nossa Senhora da Lapa do Desterro em 1751. O maior símbolo do
bairro e ponto turístico, o Aqueduto Carioca, começou a ser construído em por volta
do século XVII, para diminuir os problemas de abastecimento de água, mas sua
construção terminou apenas em 1723. Em 1896, a estrutura começou a servir para a
travessia de bondes, já que o abastecimento de água tinha sido solucionado com
outras ideias.
Figura 20: Arcos da Lapa, Santa Teresa e Glória, Rio de Janeiro – Ano 1867
A Lapa Boêmia, foco desde tópico, teve seu ápice no início do século XX, com
o samba em sua magnitude, fazendo do bairro o lugar de encontro de diversos artistas,
mas também os intelectuais, explorando uma imagem de lazer da época, e sendo
comparada à Soho em Nova Iorque e Bastilha em Paris, sendo utilizada a frase “era
um canteiro de mendigos, hoje é um colar de pérolas da cidade”. (Velasques, 1994)
38
O bairro apresenta duas facetas, uma negativa sendo atribuído como uma local
de marginais e prostitutas, mantendo o Rio de Janeiro e o carioca, com a imagem de
vagabundos, viciados e malandros (conotação pejorativa), e a face cosmopolita, onde
os bares recebem artistas e letrados e a persona emblemática traz fascínio. A Lapa,
como hoje em dia é conhecida como essência, traz a bandeira do que seria dito como
um estilo de vida a se seguir, sendo, nesse momento, aceitável ser boêmio.
De acordo com Gasparino Damata (2007), a nova Lapa teve o seu nascimento
na década de 1910, na mesma época que surgiram os cabarés, cassinos, a
malandragem em si e o samba. Na década de 1930, consolidou-se como bairro
boêmio e tornou-se um lugar de alegria. E o declínio do bairro entre as décadas de 30
e 40, com as repressões policiais, a aproximação da Segunda Guerra Mundial e
Copacabana “roubando a cena”.
39
Sendo a queda, perto do final da Era de Ouro do Samba, a Lapa perde seu
pedestal de brilho, e se consagra como o local da vida noturna carioca, o berço da
boêmia e da malandragem, e finalmente a figura do malandro é imortalizada.
Mas qual seria a ligação entre o malandro com os capoeiristas? De acordo com
Nestor Capoeira (2010), os maltas de 1880 teriam as características, que cerca de 40
anos depois, formariam o malandro carioca. Sendo basicamente, uma “evolução” do
41
Figura 25: Cantora Alcione compartilhando em sua rede social a sua ida à votação com chapéu de
malandro
Em 1930, a moda feminina trouxe uma silhueta mais justa no corpo, com saias
até o tornozelo e a inovação do corte enviesado, godê ou evasê. O tailleur, já
imortalizado por Gabrielle Chanel, continua no dia a dia feminino, assim como os
blazers por cima de saias, vestidos ou conjuntinhos, calças e shorts. As roupas e
alguns acessórios masculinos já eram vistos sendo usados por mulheres modernas.
Por volta de 1840, Amelia Jenks Bloomer, escritora e conferencista dos direitos
das mulheres, popularizou a calça Bloomer – calças largas presas na altura do
tornozelo e usadas por debaixo dos vestidos – que mesmo não sendo criada por
Amelia, recebeu o nome pela mesma escrever a favor e utilizá-las em suas
conferências (TORTORA, 2013), porém com as diversas críticas caiu no abandono,
apenas no final do século elas retornaram como roupas para esportes, mais
precisamente a bicicleta, ou sendo usadas como roupas de praia, já que tal local foi
um dos primeiros onde a mulheres poderiam usar calças em público. (MINDIAK, 2019)
Mas somente na década de 1930 a peça teve seu início na real aceitação como
parte do traje informal feminino. Gabrielle Chanel, Greta Garbo e Marlene Dietrich
foram alguns dos nomes das mulheres que adotaram e apoiaram o uso das calças,
onde obtiveram o adjetivo “ousada” para descrever o contínuo uso da peça. Sendo
Marlene Dietrich a maior responsável pela difusão das vestimentas masculinas e da
calça no vestuário feminino. (STEFANI, 2005) (Figura 27)
44
denominações de “soldados sem armas” (figura 31). Uma das imagens mais famosas
é o cartaz de J. Howard Miller, We Can Do It (1943), que tinha a finalidade levantar a
moral dos trabalhadores durante a guerra. (figura 30)
Figura 31: Cartazes promocionais: “Soldiers without guns” e “Woman Ordanance Worker”; militares
prestando continência para a mulher trabalhadora.
O Zoot Suit foi o estilo de terno que em 1930 tomou conta das ruas do subúrbio
dos Estados Unidos (figura 30), sendo uma versão exagerada do drape cut – silhueta
48
que a cintura do paletó é mais apertada e as costas e peito tem mais tecido e estrutura
– que faziam sucesso nos salões de dança. O estilo de terno tinha mais tecido no
peito, a jaqueta alongada até as coxas e mangas largas, sendo muito usado pelos
jovens das zonas mais pobres do país. (REDDY, 2019)
2.1 Público-alvo
Os dados presentes nesse tópico foram coletados via formulário online, Google
Forms, e de cinco entrevistas diretas. Eles servirão para compreender o público
determinado, e suas reações com o tema proposto e o segmento da coleção a ser
desenvolvida.
A primeira pesquisa, pesquisa quantitativa, foi feita em forma de formulário
composto por 25 perguntas, dentre elas perguntas sobre estilo pessoal, modelagem
de roupa, opção de cores etc., que foi distribuída na rede social Instagram e pelo
WhatsApp, tendo foco alcançar um público em sua maioria do Rio de Janeiro.
Para entrevista direta, pesquisa qualitativa, foi escolhido 5 mulheres de idades
diferentes para uma pesquisa mais abrangente, que seriam da faixa etária do público:
Ana Beatriz Tavares (23), Beatriz Lopes (23), Monique Correa (34), Thabata
Fernandes (30) e Bárbara Oggioni (40).
Na pesquisa quantitativa, percebemos que a grande maioria das respostas
vieram de mulheres entre 20 e 30 anos (72,5%), e em segundo mulheres entre 30 e
40 anos (19,6%). Ambas as faixas etárias são o foco de idade que será trabalhado na
marca. Tendo consciência da possível divergência de gostos, a proposta é alcançar
ambas as faixas com um mesmo estilo, já que no cenário moderno, algumas jovens
de 20 anos já estão mais inclinadas a escolher peças de um corte diferenciado, e
utilizá-las no seu dia a dia de acordo com o seu estilo pessoal.
51
Foi pensado também perguntar sobre a religião por ser um tema sobre
entidades da Umbanda, religião brasileira de matriz africana, onde tais religiões
sofrem ainda intolerância. O objeto desta pergunta é entender se uma coleção com
essa temática seria aceita por pessoas não praticantes da religião ou outras religiões.
No gráfico pode-se perceber que sua grande maioria é umbandista (43,1%),
sendo seguido por pessoas que não tem religião, mas acreditam em Deus (15,7%),
pessoas que não tem religião, mas que acreditam em algo (11,8%), católicos (9,8%)
e evangélicos (7,8%). Sendo esses os dados mais significantes (totalizando 88,2%),
onde é apontado que 45,1% das repostas não são praticantes de nenhuma religião
de matriz africana.
Gráfico 2 - Religião
52
Na próxima pergunta, foi colocado a questão de gênero, pelo fato de que muitos
consumidores, mesmo não sendo do gênero feminino, consomem peças e marcas
femininas. Em sua grande maioria (88,2%) as respostas foram de pessoas que se
identificam com o gênero feminino, que é o objetivo dessa pesquisa.
Gráfico 3 - Gênero
Por ser uma marca carioca, mesmo que as vendas sejam por meio de e-
commerce, foi questionado a localidade, por ser uma coleção voltada ao clima tropical
e com referências cariocas. A pergunta após essa foi a zona em que a pessoa mora
– Zona Norte, Oeste, Sul, Centro, Baixada e outras localidades – para melhor
obtenção de dados. Dentre essas respostas, uma possível confusão foi feita, já que
obtive respostas de outros estados.
Gráfico 4 - Localidade
Zona Oeste (23,5%) e moradores da Zona Sul (9,8%). Alguns dos dados são
irrelevantes devido a confusão das respostas dadas.
Após foi feita a pergunta para aqueles que não moram no Rio de Janeiro
(15,7%), onde novamente foi obtido certa confusão por parte daqueles que
responderam o questionário. Porém analisando todos os dados do gráfico, foi possível
coletar que 17% das respostas são de Santa Cruz do Sul (localizado no Rio Grande
do Sul), e 12,6% de São Paulo.
A pergunta sobre rede social foi pensada para escolher a melhor veiculação
online de promoções e marketing da marca, com base dos dados foi escolhido o
Instagram, que obteve a maior escolhe entre as respostas (90,2%).
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Gráfico 8 - Moradia
Pela maioria das repostas (92.2%) ter sido negativa, a próxima pergunta
levantou a quantidade de pessoas que moram junto com a pessoa. Onde dentro das
opções dadas a maioria mora com 2 pessoas (34,8%), seguido por quem mora com 3
pessoas (24,1%), quem mora com apenas 1 pessoa (23,9%) e quem mora com mais
de 3 pessoas (15,2%).
As respostas obtidas pelo gráfico são relevantes pela próxima pergunta (renda
familiar mensal), onde podemos ter noção mais para frente quanto a pessoa está
disposta a pagar, mesmo morando com mais pessoas, sendo assim, possivelmente
dividindo as contas de casa.
55
Com a pandemia e sua “nova forma” de compras, algumas pessoas que mesmo
comprando online preferem loja física (45,1%) e pessoas que não fazem compras
online pois não gostam desse método (13,7%). Sendo assim, quem gosta e pretende
continuar a fazer compras online totaliza apenas 33,3%. Sendo pessoas que não
começaram a fazer compras online com a pandemia e querem começar totalizam
7,8%.
Quanto a peça, a qualidade foi o que ganhou em sua maioria (82,4%), seguido
por modelagem (62,7%), preço (58,8%), durabilidade (39,2%) e tecido (37,3%). Na
entrevista, Bárbara disse que todas as características a chamam atenção.
“Pode ser tudo isso? Tipo, primeiro o caimento, tem roupa linda que não cai
bem! Depois modelagem, cor, estampa... Preço também conta muito”
(BARBARA, 2021)
Por ser uma marca que se preocupa com a sustentabilidade, o gráfico que
pergunta sobre o possível consumo de uma peça de valor mais alto por ser sustentável
foi maioria, com 80,4% das respostas, dá a entender que o público alvo consumiria
uma peça com esta característica.
casual (54,9%), seguido pelo estilo urbano (19,6%), estilo clássico (11,8%) e
romântico (9,8%). Assim, o gráfico pode ser usado para atingir um público de todos
os estilos.
“Pagaria sim! Acho importante inserir esse tipo de consumo, tentar ‘tornar
popular’.” (ANA BEATRIZ, 2021)
“Penso em algum dia começar a consumir sim! [...] Eu acho que investiria se
for mais caro, mas tenho que mudar meu modo de consumir roupa... Ter
menos roupa que se combinem de diferentes formas!” (BÁRBARA, 2021)
(Imagens utilizadas para escolha no gráfico. Dir à esq.: casual, urbano, clássico, romântico, rocker)
Para a preferência na peça, foi utilizado dois gráficos. Para o gráfico sobre
escolha de cor, a escolha de ambas as opções foi maioria das respostas (51%), e
aqueles que preferem cores neutras (39,2%). Com o gráfico, a escolha de paleta de
cores para a coleção pode ser feita tanto em cores vivas ou neutras, pois percebe-se
a aprovação para ambos os estilos.
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“Gosto, mas não muito "cheguei"! Mais discretas também.” (BARBARA, 2021)
“Acho ótimo. Eu sou fã da alfaiataria do jeito que der pra usar” (THABATA,
2021)
Sobre o tema, foi perguntado sobre as figuras que são inspirações da coleção,
Zé Pelintra e Maria Navalha. Zé Pelintra por ser uma imagem muito conhecida em
quase todo o Brasil, principalmente o Rio de Janeiro, teve uma resposta favorável de
conhecimento (90,2%).
Gráfico 23 – Zé Pelintra
64
“Nossa ia ser lindo! Super interessaria.” (ANA BEATRIZ, 2021, não praticante
de nenhuma religião)
“Me interessaria sim! Não lembro muito bem como era a pergunta do
formulário, mas me induziu a responder não. O "não" era porque eu não
conheço muito a história, então não é uma coisa que eu buscaria sozinha.
Mas uma coleção que trouxesse o conceito, da forma que você falou,
atrelando a uma época, às peças modernas, eu compraria! (BÁBARA, 2021,
espírita kardecista)
“Eu me interessaria, sim. Acho que existem lojas que trabalham esse tema,
como as de samba, mas nada que tenha a inspiração nas figuras
umbandistas para a confecção das peças.” (MONIQUE, 2021, umbandista)
“Pra mim não importa a inspiração, desde que eu goste da roupa e vista bem”
(THABATA, 2021, não praticante de nenhuma religião)
66
“Às vezes. Tipo, nunca comprei na SheIn porque acho muito barato e cismo
que tem costureira escravizada (fonte: vozes da minha cabeça kkkk). Mas
não é uma pesquisa que faço sempre em relação as lojas que gosto.” (ANA
BEATRIZ, 2021)
“Deveria me preocupar. Mas para roupas ainda não pratico. Evito descartar
rapidamente as roupas, mas ao comprar peças mais baratas, acaba que elas
perdem a qualidade mais rapidamente também... Tipo, alarga, desbota. [...] A
minha única ação com relação à pensar no trabalho foi parar de comprar
roupa na Riachuelo quando os salários dos funcionários foram reduzidos com
a nova lei do trabalho” (BÁRBARA, 2021)
“Não costumo jogar roupa fora, eu dou a roupa, mas não penso como a peça
foi feita” (BEATRIZ, 2021)
“Eu conheço pouco a respeito, mas depois de ser mãe eu tenho tido uma
cabeça diferente a respeito. As condições de trabalho não são coisas que eu
vejo com frequência, mas o evitar comprar demais ou comprar e doar, eu me
preocupo.” (MONIQUE, 2021)
frequência de compras todo mês ou a cada dois meses. Com base nas respostas da
pesquisa, o que as chama atenção em uma peça são a durabilidade, preço e
modelagem da peça, com ambas as cores neutras e vivas e em peças lisas. Que
mesmo de estilos diferentes, gostariam e consumiriam uma peça de acabamento em
alfaiataria.
2.3 A Marca
presentes no país, tendo como objetivo criar peças que possam ser usadas com clima
tropical do país. A imagem de um gato na logo personifica a elegância, leveza e
agressividade felina que se encontra no interior de toda a mulher. Agressividade para
batalhar por como quer viver, elegância e leveza para concluir a batalha. O arquétipo
de mulher selvagem encontra o litoral carioca.
19
Frase encontrada no site da Sammie.
70
Como cores para serem usadas na identidade visual, foram escolhidas três
cores presentes na cidade do Rio de Janeiro e duas representando o abstrato. O
vermelho - encontrado na Escadaria Selarón, na Lapa - que sendo uma cor forte é
associado a sentimentos como entusiasmo, paixão e ação. O verde – encontrado nas
matas que existem no Rio de Janeiro – com associações a saúde, natureza, felicidade
e esperança. O azul – encontrado nas praias – que passa sentimento de confiança,
paz e calma. O preto que se associa a mistério, poder e sofisticação e o branco com
aspectos de tranquilidade e, também, sofisticação.
A escolha das concorrentes Krya e Na.Loo foram baseadas no estilo de peças,
porém saindo da caixa onde moda alfaiataria é tons terrosos e neutros. A Olidratins é
a alma extrovertida carioca, sem perder a elegância presente nas mulheres. É o
encontro da mulher de negócios com a praiana do litoral. É o encontro do concreto e
da natureza. Então, por que não utilizar a dualidade da mulher carioca para a moda?
A Krya, traz sua essência mais zona sul, onde a mulher é retratada com um ar
requintado, transmitido um olhar mais luxuoso. A Na.Loo traz um estilo minimalista,
mas sem perder toques da leveza carioca.. A Olidratins é tudo isso, e mais um pouco.
O agito do centro da cidade, a calma de Grumari e Prainha, as alegrias da zona norte
e, claro, a elegância da zona sul. Tudo sem se ater a rótulos.
Sócio
Nome: Karen Oliveira de Andrade Martins
Cidade: Rio de Janeiro
Estado: Rio de Janeiro
Produtora de moda, com curso de marketing digital e estudante de design de moda.
Atribuições do Sócio:
Chairwoman e CEO da empresa na parte executiva, designer principal na área de
criação de coleções a serem produzidas.
Nome da Empresa: Olidratins
CNPJ/CPF: 121.386.027-02
72
Missão da empresa:
Visão da empresa
A Olidratins acredita que na moda é possível transitar entre três estilos que são
a base da marca (porém não os únicos): clássico, causal e urbano. Uma peça dita
clássica pode ser usada em um look urbano ou casual, - ou seja, uma calça cenoura
em linho no bar do fim de semana - trazendo assim a singularidade presente em cada
indivíduo. Traz em sua essência a natureza, a versatilidade e o slow fashion.
Mercado
A marca irá trabalhar exclusivamente com e-commerce, com envios para todo
o Brasil, podendo expandir para outros países no futuro. Estimativa de preço entre as
concorrentes, tendo total transparência com a composição da peça, quem produziu e
a qualidade dos materiais. Com o segmento sendo principalmente o de alfaiataria, em
crescimento atualmente, busca-se o diferencial nos pequenos detalhes.
Público-alvo
Mulheres entre 20 e 40 anos, que possuem renda total a partir de 4 salários-
mínimos, se preocupam com o ambiente e gostam de versatilidade em roupas no dia
73
a dia, e estejam dispostas a pagar um preço elevado por uma peça de qualidade. (Ver
pesquisa de público no 2.1)
Área de abrangência
Em todo o Brasil. A Olidratins sendo uma marca carioca, traz em sua essência
o estilo descontraído das praias do litoral, e o moderno de uma cidade que está
sempre se reinventando, sem perder suas raízes. As clientes da marca podem levar
a alma carioca elegante para todos os estados do Brasil.
Concorrente Krya
A marca carioca tem uma escolha de cores mais viva nas peças e nas redes,
como Instagram, e-commerce. Sendo o Facebook uma rede desatualizada (postagens
pararam em 2017), o foco se tornou o Instagram da marca, onde o feed foi organizado
para dar destaque às cores das peças.
A paleta usada para as peças, a Krya utiliza cores fortes como o amarelo ou o
bordeaux, não se prendendo a cores neutras (tons de marrom, preto ou branco) onde
se encontra em minoria no mix de produtos, e usando também o mix de cores em uma
só peça. As modelagens já entram em uma forma mais moderna, com cortes
75
A Krya tendo seu nascimento na zona sul do Rio de Janeiro, mais precisamente
Ipanema, passa o rosto da mulher chic da zona sul, algo que a Olidratins busca não
focar, sendo uma marca que tenha a identidade da mulher carioca, de zona norte à
zona sul.
Concorrente Na.Loo
A Na.Loo foi lançada em 2017 por Anna Luisa Fernandes, com a proposta de
vestir mulheres independentes e que sabem o que querem, onde o objetivo – de
acordo com a marca - é que a consumidora se sinta deslumbrante onde quer que
esteja. Tendo como foco visual, apresentar a moda minimalista carioca.
Trazendo uma leitura do estilo da cidade (natureza e concreto), a Na.Loo utiliza
peças em design simples e atemporal, onde pela marca, é garantido a longevidade da
peça, já que a Na.Loo é uma empresa de consumo consciente.
76
Na rede social, Instagram, a Na.Loo é uma marca que se mantém ativa em dar
dicas para as consumidoras assim como responder em quaisquer dúvidas
apresentadas na página da marca. As fotos do feed entregam uma estética casual,
com fotos simples, com o mesmo cenário e estilo de pose e edição, se mantém
organizado ao apresentar somente as peças – detalhes mais próximos e possíveis
combinações e nada mais. A página no Facebook se mantém desatualizada desde
junho/2020.
A Na.Loo utiliza de uma paleta de cores extensa, indo do azul claro ao verde
musgo, cores neutras e cores fortes. Assim, é possível apontar uma caracteristica
presente em ambas as concorrentes escolhidas: uso de cores. Ainda que não tenha
um rótulo, é possível encontrar diversas peças com o acabamento e com design
clássico da alfaiataria, assim como a Krya, onde o design atemporal é pilar.
Ao mesmo momento que a Na.Loo se mantém com o estilo de peças clássicas,
é encontrada peças de design mais moderno, com recortes e drapeados, e
modelagens como croppeds, blusas com amarrações e releituras de coletes.
Trazendo o casual para encontro do clássico.
Como por exemplo, uma mulher mais despreocupada e tranquila, mas ainda com
vestígios do clássico.
100% Linho
Tecido Gazze Maximus R$45,00 Cartão de 8 dias São Paulo, SP
Algodão Tecidos metro Crédito úteis
100% Algodão
Tricoline Maximus R$39,00 Cartão de 8 dias São Paulo, SP
Tecidos Crédito úteis
100% Algodão
Botão de Coco Cia dos R$68,22 Cartão de Em média São Paulo, SP
Personalizado Botões 144 Crédito 4 dias
unidades úteis
Tam. 32
Botão de Coco Cia dos R$46,08 Cartão de Em média São Paulo, SP
Personalizado Botões 144 Crédito 4 dias
unidades úteis
Tam.: 18
Zíper Invisível Armarinho R$5,49 Cartão de 3 a 5 dias Londrina, PR
São José 10 Crédito úteis
15cm unidades
Estratégia de marketing
Principais produtos
▪ Blazers
▪ Blusas sociais
▪ Calças de alfaiataria
▪ Shorts alfaiataria
▪ Tops
Média de preço
A Olidratins vai ter peças de custos entre R$95 e R$950, onde as peças de
maiores custos envolvem a modelagem e o tecido utilizado, também sendo fator para
o valor acima beneficiamentos utilizados em alguma coleção. Pela escolha de matéria
prima ser focada em tecidos de origem natural e reciclados, o seu preço é mais
elevado do que um tecido sintético, agregando dentre os muitos benefícios, caimento
e qualidade.
Estratégias de promoção
Como estratégia de divulgação, será usado a rede social Instagram, que foi
apontada como rede social mais utilizada na pesquisa de público, com parcerias (via
81
Custo de promoções
Entregas e custos
As entregas serão feitas para todo o Brasil pelos Correios, modalidade PAC ou
Sedex, e no Rio de Janeiro – Zona Sul, Zona Norte, Zona Oeste, Centro e Duque de
Caxias – as entregas serão feitas pela RioBike Courrier, uma empresa de entregas
sustentáveis. Os custos serão arcados pelo cliente, onde o frete será calculado na
plataforma de e-commerce da marca.
Inicialmente a marca lançará uma coleção com um mix de produtos total de 450
peças, sendo divididas entre tops, shorts, calças, camisas e blazers, com grade de
tamanho abrangendo do PP ao GG. Nessa primeira coleção será incluída peças
básicas e fixas na marca, tendo como denominação peças básicas. O lançamento de
coleções será dividido entre sazonais e cápsulas, onde cada coleção contará com ao
menos 2 peças fixas, podendo aumentar de acordo com o balanço de vendas da
82
mesma. A coleção também será composta por peças “exclusivas”, ou seja, baixo
estoque e sem reposição.
A produção de novas peças, de coleções já veiculadas, terá início quando o
estoque estiver baixo, visando uma produção consciente, e fazendo apenas peças
que temos registros de saída acelerada.
Investimentos fixos
A – Máquinas e equipamentos
B – Móveis e utensílios
85% Algodão
15% Poliéster
Reciclado
Cambraia de 15m R$99,00 R$1.485
Linho metro
100% Linho
Tecido Gazze 15m R$45,00 R$675,00
Algodão metro
100% Algodão
Tricoline 15m R$39 R$585,00
metro
100% Algodão
Aviamentos Diversos - R$176,88
Total de A R$4.802,88
Investimentos pré-operacionais R$
Despesa MEI R$56,00
Registro INPI R$298
Divulgação R$250,00
Outras despesas R$150,00
Total R$754,00
Investimento total
Tabela 14 – Investimento total
1. Investimentos Fixos – Quadro 5.1 R$8.655,00
2. Capital de Giro – Quadro 5.2 R$ 10.231,27
3. Investimentos Pré-Operacionais – R$754,00
Quadro 5.3
Total (1 + 2 + 3) 100% R$19.640,27
Produto 3 - Short
Tabela 18 – Custo produto 3
Material Quantidade Custo Unitário Total (R$)
(R$)
1.Tecido 1,50m R$39,00 R$58,50
Tricoline
2.Linha 10m R$0,02/m R$0,20
3. Zíper 1 R$0,55 R$0,55
4. Botão 1 R$0,48 R$0,48
5. Etiqueta 1 R$0,51 R$0,51
6. Papel de Seda 1 R$1,10 R$1,10
7. Caixa 1 R$7,37 R$7,37
Personalizada
Total R$68,71
Produto 4 - Blazer
Tabela 19 – Custo produto 4
Material Quantidade Custo Unitário Total (R$)
(R$)
1.Tecido 2,50 $99,00 R$247,50
Cambraia de
Linho
2.Tecido 2,50 R$39,90 R$99,75
Tricoline Forro
3.Linha 10m R$0,02/m R$0,20
4. Botão 1 R$0,48 R$0,48
5. Etiqueta 1 R$0,51 R$0,51
6. Papel de Seda 1 R$1,10 R$1,10
7. Caixa 1 R$7,37 R$7,37
Personalizada
Total R$356,91
Produto 5 – Top
Tabela 20 – Custo produto 5
87
Estimativa de vendas
Tabela 22 – Estimativa de vendas
Preço de venda Expectativa de Total (Preço x
unitário(R$) vendas em unidades Quantidade)
mensal R$
1. R$445,90 15 R$6.688,50
2. R$235,00 10 R$2.350,00
3. R$170,00 25 R$4.250,00
4. R$890,00 5 R$4.450,00
5. R$330 20 R$6.600
Total = R$24.338,50
Impostos
Tabela 23 – Impostos
Descrição % do imposto Faturamento Custo Total (R$)
Estimado
SIMPLES 4% R$24.338,50
ICMS – Imposto 1,5%
sobre Circulação
de Mercadorias e
Serviços
INSS 5%
88
Propaganda 2%
Taxa de 3,79%
administração do
cartão de crédito
Subtotal 2
TOTAL (Subtotal 1 + 2) =R$20.373,76
Viabilidade econômica
Tabela 23 - Viabilidade econômica
Saídas(R$) A Entradas(R$) B
Investimentos por 1 R$19.640,27 -
ano
Valor estimado de R$31.836 -
custos fixos por 1 ano
Valor estimado de R$122.775,24 -
custos de giro por 1
ano
Valor estimado de - R$292.062
vendas por 1 ano
Total R$174.251,51 R$244.485,10
(Impostos Descontados)
Total geral (entradas totais A – saídas totais B) R$70.233,59
=
amiga” que irá trazer os opostos em um mesmo ambiente, com preços acessíveis e
justos, tecidos de qualidade e modelagens mais modernas.
Os dados aqui apresentados irão servir de base para o desenvolvimento do
projeto de coleção de moda feminina atemporal, em conjunto com os similares a
serem apresentados no próximo capítulo, com propósito de definir um caminho a se
seguir para o sucesso da Olidratins.
90
Este capítulo trará a análise de coleções e objetos das áreas do design e arte,
que de alguma forma, estejam relacionados ao tema ou ao estilo da coleção. Assim,
será apresentado imagens, juntamente com a análise de proximidade e
distanciamento. Para que assim, haja ligação entre o tema na parte teórica e estética
da coleção a ser criada. Finalizando o capítulo, será apresentada a proposta de
coleção, com ideias e objetos a serem trabalhados na parte prática.
20
https://ffw.uol.com.br/noticias/gente/entenda-por-que-a-moda-esta-se-apaixonando-por-simon-porte-
jacquemus/
21
No original: NSFW
22
Business of Fashion. Informações obtidas no site
https://www.businessoffashion.com/community/people/simon-porte-jacquemus
91
diferenciadas (3ª foto, figura 49). O aspecto do campo também pode ser citado, já que
a raiz de Zé Pelintra traz uma visão mais leve e campal.
23
American Apparel & Footwear Association – Associação americana de vestuário e calçados.
24
Council of Fashion Designer of America – Conselho de designers de moda da América
93
da FGI25; Maxwell lançou sua marca com o desejo de fazer as mulheres se sentirem
bonitas, sofisticadas e poderosas, com peças atemporais e de corte impecável. 26
Descrição: A coleção conta com 15 looks que passam uma imagem mais casual e
urbana, sem perder a sofisticação. “Malha de gola alta e calças de moletom podem
transitar entre trabalho e noite com a adição de um salto.” (Tradução nossa, frase de
descrição encontrada no site)27
A coleção conta com peças fluídas (2ª foto, imagem 51) e estruturadas (1ª foto,
imagem 50). Com cores vibrantes que, de acordo com o release, passam sentimentos
de otimismo, alegria e entusiasmo.28 Tais sentimentos podem ser vistos também nas
expressões faciais da modelo. Com peças em alfaiataria e malharia, a estética
descontraída é refletida nas cores e formas, mesmo nas peças clássicas (1ª foto,
imagem 50).
Cintos de camurça e plissados, trazem textura e movimento para o look, junto
com o recorte superior, encontrado no vestido rosa. (4ª foto, imagem 51) O visual
acetinado das peças traz um ar de sofisticação para o descontraído.
25
Fashion Geoup International – Grupo de moda internacional
26
Informações obtidas no site oficial da marca. Disponível em:
https://brandonmaxwellstudio.com/about/designer/. Acesso em: 10 de maio de 2021.
27
Descrição disponível em: https://brandonmaxwellstudio.com/collections/p-s-21/. Acesso em: 10 de
maio de 2021.
28
Descrição disponível em: https://www.vogue.com/fashion-shows/resort-2021/brandon-maxwell
94
Designer/marca: Marca lançada em 1992, que leva o mesmo nome de seu criador.
Alexander McQueen começou sua carreira como alfaiate na Anderson & Sheppard,
em Londres, quando largou a escola aos 16 anos, e como figurinista teatral. Trabalhou
com os designers Koji Tatsuno em Londres, e com Romeo Gigli na Itália. Quando
voltou à Londres, McQueen cursou a faculdade de moda Central Saint Martins durante
o período de 1990-1992, quando produziu um desfile para a sua coleção de formatura,
que chamou a atenção da designer londrina Isabella Blow, que comprou toda primeira
coleção de McQueen.
Em 1996 foi nomeado o Designer Britânico do Ano, e no mesmo ano assumiu
a direção criativa da Givenchy, onde ficou durante 5 anos, até voltar a focar na sua
95
própria marca em 2001. Como marca registrada, suas peças traziam designs com
características românticas sombrias, modelagens atrevidas, peças dramáticas que
remetem à influência do teatro em sua vida, trabalhando com opostos: luz e escuridão,
vida e morte etc.
No mesmo ano, Sarah Burton, atual diretora criativa da marca, trabalhou para
McQueen durante sua formação na Central Saint Martins. Assim que formada, Sarah
voltou a trabalhar com Alexander McQueen, sendo nomeada em 2000 como designer
chefe da coleção feminina da marca, cargo que permaneceu até 2010, quando
McQueen faleceu, e Sarah foi anunciada como sucessora. 29
29
Informações obtidas nos sites: https://www.businessinsider.com/alexander-mcqueen-legendary-fashion-
designer-life-career#alexander-mcqueen-is-often-regarded-as-one-of-the-most-innovative-designers-of-all-
time-1; https://www.britannica.com/biography/Alexander-McQueen. Acesso em 13 de maio de 2021.
96
Descrição: A Lil Dagger Straw Bag faz parte da coleção 2021 de bolsas de palha
para praia da marca Eric Javits. Tal coleção conta com bolsas na cor de palha e
coloridas, com detalhamentos em bordados, metalizados e tassel.
30
Informações disponíveis em: https://ericjavits.com/pages/about-us
98
Descrição: A Casa Atibaia, localizada no rio Atibaia em São Paulo, foi inspirada pelo
modernismo brasileiro, e em especial a Casa de Vidro, da arquiteta ítalo-brasileira,
Lina Bo Bardi. O projeto é a primeira colaboração da dupla, sendo composta de
concetro e vidro, podendo ser considerado um exemplo relevante do modernismo
brasileiro. (CASA COR, 2021)
materiais confere como distanciamento, já que o verde natural das matas o único
ponto de cor forte do projeto. A coleção a ser produzida visa utilizar cores mais fortes.
Distanciamentos: A modelagem ampla, sem a marcação do corpo (1ª foto, figura 58),
configura como distanciamento pela escolha de peças mais justas, assim como a
imagem de “pouca pele” aparente, já que por ser uma coleção pensada também no
clima tropical e quente, algumas peças utilizarão recortes e comprimento menor
31
Colares feitos de miçanga que servem para estabilidade mediúnica e energética, também atuam como
proteção do médium.
104
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANEXO 1
FICHAMENTO 01 1920. Para se consolidar como meio de
comunicação das massas, o rádio lançou mão
Título/Subtítulo: Era de Ouro da Música da música genuinamente brasileira como forma
Popular Brasileira de penetrar em todas as camadas da
Autor(es): REIS, Roberta Arujo dos sociedade.”
Ano: 2007
Páginas: 9-38 p. 22 – “O DIP foi criado em 1939, em
Fonte: REIS, Roberta Arujo dos. ERA DE substituição ao Departamento Nacional de
OURO DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA: Propaganda (DNP), com o objetivo de propagar
a construção do discurso. Rio de Janeiro, a ideologia estadonovista, visando fazer da
2007. 58 p. Monografia (Bacharel em política da época um discurso presente nas
Comunicação Social, habilitação em ruas de todo o país.”
Radialismo) - Escola de Comunicação da p. 22 – 23 – “Cabia ao Departamento coordenar
Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ. propagandas, censurar peças teatrais, filmes e
Cidade: Rio de Janeiro diversões públicas, organizar 22 manifestações
Editora: UFRJ patrióticas e dirigir o programa de radiodifusão
do governo.”
Resumo
p. 23 – “O DIP deu atenção especial à cultura.
Era de Ouro da Música Popular Brasileira faz (...)Também estimulou a criação de um samba
um estudo dos anos 30 a 45, e a valorização do que valorizava o trabalho, além, é claro, do
samba na Era Vargas, onde se era o foco a samba exaltação, como assinala Coutinho
divulgação da música popular brasileira. (2002, p.50): “No Estado Novo, quando se torna
Mostrando os fatores que ajudaram a trazer dominante a ideologia de culto ao trabalho, não
essa denominação, os maiores nomes do há mais lugar para a filosofia da
samba, mudanças políticas, econômicas e malandragem”.”
sociais que tiveram grande importância
p. 23 – “Desde o início de sua história, na
Citações década de 1920, as letras de samba contavam,
em sua maioria, com a temática do o malandro.
p. 9 – “Desde 1910, o samba fazia sucesso na Com sua filosofia de aversão ao trabalho, esse
periferia e nos morros da cidade do Rio de personagem, à margem da sociedade
Janeiro. O gênero era visto, pela maioria da capitalista em franco desenvolvimento, era
população, principalmente pelas pessoas da exatamente o oposto da ideologia divulgada
elite, como coisa de vagabundo, de bandido. O pelo Estado”
ritmo dividia opiniões de intelectuais. Enquanto,
para alguns, ele era a maior representação da p. 23-24 – “O chamado samba malandro foi o
cultura brasileira, para outros, ele representava principal alvo dos censores do DIP. As músicas
o atraso cultural do Brasil, pois remetia a um de valorização da malandragem foram
passado escravista que as camadas mais altas substituídas pela exaltação ao trabalho. Desta
da sociedade faziam de tudo para ser forma o samba foi 23 consolidado como
esquecido.” símbolo da música e da cultura nacional. A
música servia para divulgar os ideais varguistas
p. 10 – “Durante o governo de Vargas, a música de trabalho e valorização da pátria.”
popular brasileira viveu sua “Época de Ouro”, o
rádio se consolidou como principal meio de p. 25 – “Em 1926, chegou ao Brasil a vitrola. O
comunicação do país e o presidente soube desenvolvimento da gravação elétrica e a
como poucos utilizar os benefícios do rádio e da inauguração de várias gravadoras no país
música, tanto para atingir a todas as camadas possibilitaram a revelação de novos cantores e
da sociedade, em todos os cantos do Brasil, compositores e a maior popularização da
quanto para doutrinar o povo” música popular. O sucesso dos discos de
samba fez com que a indústria cultural se
p. 10 – “Após receber um incremento voltasse para um novo foco, o morro.”
significativo nos anos 1920, o samba se tornou
hegemônico na década de 1930 na área da p. 26 – “O ritmo brasileiro se espalhou pelo
produção musical brasileira. (PARANHOS, Brasil e passou a gerar discussões inflamadas
2007).” sobre sua participação no cenário cultural do
país. Para alguns intelectuais, o samba, devido
p. 17 “A “Era de ouro da Música Brasileira” a sua origem mestiça, demonstrava o atraso
coincide com o início da popularização do rádio, cultural da nossa sociedade, enquanto para
que havia chegado ao Brasil no início dos anos outros ele era o símbolo da evolução da nossa
110
cultura, o retrato da nova sociedade que estava Batista. Nascido em campos, cidade
sendo formada.” fluminense, participou, ainda criança, da banda
Lira de Apolo, onde tocava triângulo. Ao mudar-
p. 33 – “O samba nasceu na chamada Pequena se para o Rio de Janeiro, no início da década
África, região da Praça Onze, no centro da de 38 1920, transformou-se em um dos
cidade do Rio de Janeiro, no início do século principais personagens da boemia da Lapa.”
XX. Oficialmente, a primeira música de samba
a ser gravada foi “Pelo telefone”, de 1917, de p. 38 – “Suas músicas falavam de
autoria de Donga e Mauro de Almeida. malandragem, preconceito e questões sociais.”
(MOURA, 2004)”
p. 33 – “Uma das figuras mais emblemática da FICHAMENTO 02
turma do Estácio foi Ismael Silva. (...) Na
década de 1920, foi procurado pelo cantor Título/Subtítulo: Noel Rosa e as
Francisco Alves, que queria comprar as Transformações do Samba na Década de
músicas de Ismael e assinar como autor, fato 1930.
muito comum na época. O sambista aceitou a Autor(es): FENERICK, José Adriano
proposta e a parceria durou até 1935. Foi Ano: 2006
através de Francisco Alves que o samba Páginas: 16-46
ganhou popularidade e passou a predominar Fonte: FENERICK, José Adriano. Noel Rosa e
nas rádios na década de 1930, como explana as Transformações do Samba na Década de
Souza (2003, p.33): “Através da grande 1930. Revista de Humanidades – UFRN,
popularidade do rei da voz (e apesar de sua Caicó, V. 08. N. 20, p. 16-46. fev./mar. de 2006.
afeição pouco afeita ao sincopado), este novo Cidade: Caicó
samba do Estácio – que serviria de molde para Editora: Revista de Humanidades – UFRN
o modelo básico vigente até hoje – passou a
predominar.”.” Resumo
O artigo tem foco em apresentar Noel Rosa e o
p. 35 – “A adesão da classe média à música que ele mudou, simbolicamente, no samba na
popular pode ser notada pelas composições de década de 30. Fala-se da figura do malandro, e
Noel Rosa, estudante de medicina; Ary da polêmica briga entre Noel Rosa e Wilson
Barroso, bacharel em direito e Braguinha, Batista. Traz a história de Noel no samba, e
arquiteto, isso só para citar alguns. Essa como ele se tornou um “profissional do samba”.
expansão territorial e social da música popular É contado também um pouco do samba no
pode ser perfeitamente exemplificada pela início do século XX.
parceria entre Ismael Silva, negro, do bairro
pobre do Estácio, e Noel Rosa, branco, de Vila Citações
Isabel. (PARANHOS, 2007)”
p. 18 – “O samba da época de Donga e Sinhô,
p. 35-36 – “Outra coisa com a qual Noel não o samba da década de 1920 (ou mesmo
concordava era a identificação do sambista anterior), na grande maioria dos estudos sobre
como um malandro marginal. A figura do o assunto (especialmente os de caráter
malandro em suas músicas era mostrada por jornalístico e/ou memorialístico), tem sido
um lado mais humano, com alegrias e insistente e anacronicamente identificado como
dificuldades. Essa questão alimentou um samba-amaxixado, ao passo que o samba do
verdadeiro conflito musical entre Noel Rosa e Estácio de Sá, consagrado pelos meios de
Wilson Batista.” difusão musical a partir da década de 1930, por
sua vez, acabou entrando para a história como
p. 36 – “Quando em 1933, Batista escreveu a já o verdadeiro samba, como o samba ‚puro‛,
mencionada “Lenço no pescoço”, Noel aquele que conseguiu se libertar do maxixe.”
respondeu com “Rapaz folgado”, onde ele dizia
que malandro que é malandro trabalha. Wilson p. 18-19 – “(...) pois temos que levar em conta
não fez por menos e lançou “Mocinho da Vila”, que em cada geração de sambistas há pelo
em que critica Noel por falar de malandro. A menos dois tipos de samba: o que foi gravado
réplica do compositor da Vila veio com “Palpite em disco e o que não foi -, nas festas das tias
Infeliz”, que batista respondeu com “Frankstein baianas (como a famosa Tia Ciata), realizado
da Vila”, zombando dos problemas físicos de como partido-alto que ‚não é nunca cantado em
Noel, que não respondeu, dando fim ao duelo. desfile, mas sempre em roda‛ (2). Já o samba
(SOUZA, 2003)” do Estácio, segundo o próprio Ismael Silva, era
um samba feito para se brincar no carnaval,
p. 37-38 – “Outro notável compositor da “Era de para se desfilar no carnaval.”
Ouro da Música Popular Brasileira” foi Wilson
111
p. 22 – “Noel nunca se referiu à Cidade Nova, do samba, por meio dos compositores do
local de onde saíram os sambistas da geração Estácio (15).”
de Donga, Sinhô e Pixinguinha, como sendo
também um reduto de bambas. Assim, o Poeta p. 28 – “Associar o malandro ao samba, ou
da Vila, num primeiro momento, desloca o mesmo tomar o malandro como sinônimo de
samba do fundo das casas das tias baianas sambista, implica em reforçar a imagem do
(uma vez que ele o desconsidera) para o morro samba como sendo um legítimo ‚produto do
e o subúrbio, os locais doravante preferenciais morro‛, uma vez que o senso-comum da época
para o samba manter (ou passar a ter) sua acreditava que os morros do Rio de Janeiro
originalidade.” fossem habitados exclusivamente por
malandros.”
p. 22 – “Noel, ao cantar a sua Vila Isabel, que
curiosamente só aparece em três de seus p. 33 – “Noel Rosa vê o sambista/malandro
sambas, ao contrário de outros locais – como a como um boêmio. Nessa associação, nasce um
Mangueira e o Salgueiro, por exemplo – muito novo local para o samba: o botequim. O
mais citados, deixa a entender que não é sambista/malandro boêmio é um assíduo
apenas no morro que o samba é feito, nos freqüentador de botequins, seja no morro ou na
bairros suburbanos ele também tem seu valor.” cidade, e é lá que o samba se faz com mais
intensidade, e à mítica do samba do morro,
p. 26 – “Com o aparecimento do samba do soma-se a mítica do samba de botequim como
Estácio, morro e cidade passam a significar mais um elemento do ‚verdadeiro samba‛. Já se
universos antagônicos para o samba. (...) O disse que o botequim é para o Rio de Janeiro o
que se observa, no entanto, é que a visão sobre que o pub é para Londres ou o café é para
o morro que o sambista tem não é Paris: ‚antes de tudo um ponto de encontro, um
exclusivamente geográfica, mas sim de postura lugar de sociabilidade‛”
diante do samba, é uma ‚visão de mundo‛, ou
mesmo uma visão mítica. Em O x do problema, p. 34 – “(...) o sambista não é mais visto como
Noel mostra que o que está em questão não é aquele detentor dos antigos segredos do
exatamente se o samba é do morro ou da partido-alto ou das velhas tradições, mas sim
cidade, mas sim o antagonismo entre duas como um malandro boêmio, que perambula
posturas distintas que decorrem do pelos morros e pela cidade, pelo Rio de Janeiro
antagonismo entre cidade e morro: a postura enfim. Ou seja, a mudança de local e de
burguesa e a postura malandra, sendo que personagens relacionados com o samba,
apenas a segunda se enquadraria gradualmente vão transformando-o em carioca,
perfeitamente no samba.” em uma música intrinsecamente ligada ao Rio
de Janeiro.”
p. 27 – “A figura do malandro, que começou a
povoar o samba por volta do final dos anos p. 35 – “Segundo Letícia Vianna, a polêmica
1920, talvez seja a denominação última de um entre Noel e Wilson Batista pode ser vista como
tipo recorrente na cultura brasileira. As ‚duas formas de representação do malandro no
características primordiais do malandro, como samba: ambas afirmam a fronteira entre o
aquele que recusa o trabalho e vive de trabalho e o lazer, mas uma aproxima o
expedientes e golpes aplicados em algum malandro sambista do mundo da contravenção
otário, podem ser encontradas desde pelo e do crime, valorizando sua valentia, e a outra
menos o início do século XIX. Em lundus e o afasta deste mundo, mantendo-o na boêmia
romances do século XIX, este personagem e valorizando sua inteligência‛ (20).”
aparece com o nome de vadio, cujo vínculo com p. 36 – “No samba de Wilson Batista temos a
a música popular se dá a partir de sua relação descrição da indumentária do malandro, o
estreita com a viola e a cachaça.” ‚chapéu do lado‛, o ‚lenço no pescoço‛, o
p. 28 – “Ainda no século XIX, em obras literárias ‚tamanco arrastando‛ e a ‚navalha no bolso‛.
do período, o vadio tornar-se-á o capadócio. Ou Aos aspectos exteriores do malandro, à sua
seja, apenas uma nova denominação para o indumentária, soma-se o seu modo de andar
mesmo personagem, cujas características se gingado, seus atos de provocador e desafiador.
mantêm quase as mesmas (14). E por fim, no Orgulhoso desse seu modo, o malandro
início do século XX, o vadio e o capadócio se recrimina os otários que trabalham e continuam
transformam no malandro, visto pela imprensa na miséria, e por fim, diz que sua inclinação
da época quase como um sinônimo de natural para a malandragem vem desde
sambista, uma vez que a identidade entre criança, avaliada por seu talento em tirar
sambista e malandragem ocorre no mesmo sambas.”
momento em que se dá a mudança estilística
112
p. 37 – “Em Mulatinho bamba, marcha gravada anteriores, o samba passa a ser apenas
por Carmem Miranda, o sambista apresentado música, um gênero musical.”
é um malandro bom de samba, que samba com
elegância e conquista os corações das mulatas, p. 44-45 – “Contribuindo ao debate que opôs a
mas não anda armado, não tem lenço no cidade ao morro, Noel propõe uma alternativa
pescoço e nem chapéu de palha. Como está na diferente para entendermos o samba não é
marcha, o personagem descrito é um malandro nem do morro e nem da cidade.”
educado e refinado, tal como o samba (que o p. 45 – “Noel não fala de nenhum lugar
malandro representa) deveria ser entendido no geograficamente definido, pois se o “samba
momento.” não vem nem do morro e nem da cidade” é
p. 38 – “se antes a malandragem era vista em porque ele nasce em algum outro lugar, ou
imagem como uma escola de vida, que mesmo em ambos os lugares, ou ainda em
ensinava como sobreviver numa ordem social algum lugar que não é nem um e nem o outro,
onde as possibilidades de realização eram enfim, ele nasce “no coração”.”
restritas, agora – para os músicos, pelo menos FICHAMENTO 03
– era também um modo de ascender
socialmente sem a necessidade de um trabalho Título/Subtítulo: A Lapa Boêmia: Um Estudo
mal remunerado. E embora já fosse parte do da Identidade Carioca
processo de produção social, a música não Autor(es): VELASQUES, Maria Clara Chaves
aparecia para o compositor como uma forma de Ano: 1994
trabalho. Por isso, o sambista parecia realizar o Páginas: 3-113
sonho de acumular sem precisar trabalhar. Fonte: VELASQUES, Maria Clara Chaves. A
(22)” Lapa Boêmia: Um Estudo da Identidade
p. 39 – “. Para Vagalume, o samba que Carioca. Niterói, 1994. 129 p. Dissertação de
pertence à roda é ora o samba do passado e Mestrado (Programa de Pós-Graduação em
ora o samba de um presente que parece não História) – Universidade Federal Fluminense,
pertencer ao tempo, no caso: o morro. Ou UFF.
melhor, por desdenhar totalmente o samba Cidade: Niterói
gravado, o samba industrializado, Vagalume se Editora: UFF
apega ao samba antigo, do tempo da Tia Ciata
(feito na intimidade da casa), ou ao samba Resumo
produzido no morro, que (na opinião de A dissertação fichada a seguir tem como ideia
Vagalume) estaria fora do processo de apresentar a identidade carioca e Lapa, nos
modernização. Assim, tal como Noel, anos 30, 40 e 60. Onde ações políticas e
Vagalume também utilizar-se-á da oposição grandes personagens da Lapa são estudados,
entre o morro (local idílico do sambista assim como o arquétipo da malandragem
espontâneo) e a cidade (local da deturpação do carioca, discorrendo também sobre marcos
samba realizada pela indústria de diversão).” como o aqueduto carioca e o personagem Zé
p. 43 – “Noel diz que em Vila Isabel o samba Carioca, criado por Walt Disney.
tem o feitiço e enfeitiça a quem o ouve, tal como É apresentado os motivos da Lapa virar a
o samba era entendido anteriormente. Porém, referência do Rio de Janeiro, percorrendo por
é um feitiço diferente, é um feitiço decente, o arquitetura, história, samba e personalidades
que de antemão já denota uma preocupação de grande importância, que fizeram da Lapa
com a aceitação social (e comercial). Tal como sua morada e palco de aventuras.
em Rapaz Folgado, onde Noel deixa o
malandro nu, decompondo o seu aspecto Citações
exterior (a navalha, o lenço no pescoço, o
tamanco), em Feitiço da Vila o samba também p. 3 – “[...] A possibilidade de uma Lapa que
passa a ser desprovido de suas significações venha a servir de ponto de referência artístico e
exteriores. Continuando a ser feitiço, o samba intelectual para a cidade, resgatando seu
não carrega mais a significação religiosa da tradicional espírito de “boêmia sadia” ganha
cultura afro-brasileira: a vela, a farofa e o novos adeptos. Trata-se, segundo um dos
vintém.” coordenadores do Projeto Fundição Professo,
de ‘(...) fazer da Lapa um local de encontro de
p. 43 – “Só que a liberdade proposta por Noel artistas e intelectuais, reverter essa tendência
para o samba inclui um afastamento do de decadência e explorar sua vocação natural
universo negro lúdico/religioso até então para o turismo e o lazer cultural’.”
associado a ele. Desprovido de seus sinais
externos e desligado de seus locais e práticas
113
p. 100 – “A famosa Lapa não caiu no gosto personagem de Walt Disney, o Zé Carioca,
popular ou tornou-se conhecida nacionalmente criado especialmente para o momento. O
apenas pela sua frequência intelectual, mas papagaio Zé Carioca vestia-se como um
também porque nela atuavam indivíduos que, autêntico malandro e sua esperteza, jeito de
ao construírem elos de ligação com a cultura falar e andar, aproximavam-no ainda mais da
popular do período eram também porta vezes figura do malandro.”
de um discurso nitidamente formador da
imagem carioca. Este outro grupo – boêmio e p. 113 – “O malandro boêmio, não era mais da
divulgador do bairro da Lapa – tem a sua frente Lapa e nem da cidade do Rio de Janeiro.
os compositores de samba, que ao retratarem Ressignificado e ‘politizado’, passou a servir os
o cotidiano de suas vidas, acabaram por cantar ‘interesses nacionais’. O malandro da Lapa era
quase que permanentemente o bairro.” do brasil.”
a figura do negro estará associada em certa questões a serem problematizadas, ela cita o
medida a vadiagem, presente inclusive em nome Umbanda como originário de membros
alguns malandros representados por kardecistas e que o início da religião remete ao
entidades.” século XIX e início do XX, porém, o grupo que
rompeu com o kardecismo não era
p. 135 – “Convém ressaltar que, propriamente umbandista, pois estaria distante
compreendendo que a partir da década de da relação com rituais afro. Seria uma linha, ou
1930 a entidade estará representando seja, uma nova forma de compreensão
personagens que não seriam de interesse dos espiritual, porém, sem uma construção
acontecimentos político, como exemplo, o ritualística definida.”
malandro e capoeira, a própria entidade estará
representando uma dualidade, pois, ao mesmo p. 138 – “Nessa compreensão, existiriam atritos
tempo que é uma entidade negra também já foi dentro do espiritismo kardecista em relação a
um homem negro que representava tudo aquilo evolução dos espíritos de negros, indígenas e
que se banalizava no discurso da década de caboclos. As discussões estariam voltadas a
1930.” elevação espiritual desses espíritos, o que teria
levado um grupo que compreendia esses
p. 135 – “Seus rituais são marcados pela espíritos como seres de luz, a romper com o
presença de seres espirituais, no candomblé se grupo Kardecista. Zélio e o Caboclo das Sete
cultuam os orixás, entretanto, na Umbanda Encruzilhadas, nesta perspectiva, não teriam
ocorre uma diversificação ainda maior, se impulsionado esse rompimento.”
fazem presentes: pretos velhos (seres
espirituais que possuem experiência de outras p. 138 – “Assim, não teria surgido um
vidas, seja para a cura ou auxílio em outros movimento umbandista propriamente dito, ou
problemas), caboclos (seres de origem seja, teria surgido uma compreensão mais
indígena/nativa) e também eres (crianças ampla em relação as entidades cultuadas,
espirituais).” negros, caboclos e índios fariam parte.”
p. 136 – “Nessa reunião começaram a se p. 138 – “[...] Rohde vai além, ele não
manifestar diversos espíritos de negros compreende a religião da Umbanda como
escravos e indígenas nos médiuns presentes, e formada no século XIX ou XX, mas, sim, que
esses espíritos eram convidados a se retirar não existe a criação da religião. A estrutura do
pelo dirigente da mesa que os julgava (como culto, incorporações e trabalho de cura
era e continua sendo comum entre os existiriam desde o século XVII, portanto, a
kardecistas) atrasados espiritual, cultural e religião não teria sido criada, seus rituais
moralmente. (ROHDE, 2009, p. 80).” aconteciam a séculos, contudo, mesmo os
rituais estando presente desde os séculos XVII
p. 136 – “Nesta compreensão haveria uma (concepção de ROHDE), não podemos
diferenciação dentro do próprio espiritismo em caracterizar com cultos umbandistas, pois,
relação a função e aceitação de entidades, na somente a partir de 1930 se incorpora esse
compreensão Kardecista (ao menos na nome com toda característica ritualista que
interpretação de Rohde) o espírito de caboclos, conhecemos atualmente.”
negros e escravos não são compreendidos
como capazes de se elevar espiritualmente, p. 138-139 – “A Umbanda recebe influência de
portanto, seriam atrasados.” outras religiões, por exemplo, do catolicismo e
do Candomblé (SILVA, 2014). Porém, mesmo
p. 136 – “Mesmo fazendo uso de um dos mitos possuindo esses elementos ela ainda possui
fundadores da Umbanda descritos por Rohde, sua individualidade. Algumas entidades, como
convém ressaltar que o autor não compreende exemplo, Zé Pelintra, se faz presente também
esse mito (ou qualquer outro) como fundador em outra religião além da Umbanda. Ou seja,
da Umbanda, ele reconhece seu valor ele aparece na Umbanda, porém, também se
simbólico, mas critica essa interpretação [...].” faz presente na Jurema sagrada. Na Jurema
p. 137 – “Convém ressaltar que, Vanessa ele atua como mestre, no entanto, na Umbanda
Mauro compreende a consolidação da ele pode baixar (se manifestar) em várias
Umbanda a partir do século XIX e início do linhas, entre elas: do malandro, Exú e até
século XX, o mito fundador para ela é o mesmo do Preto Velho (BARBIERI, 2017).”
responsável pelo surgimento da religião, uma p. 139 – “A linha em que a entidade baixa não
compreensão seguida por muitos é uma unanimidade, para explicar este
pesquisadores.” elemento estaremos recorrendo ao pai de santo
p. 137 – “Devemos entender que a Alan Barbieri, no vídeo intitulado Zé Pelintra,
interpretação de Vanessa nos possibilita muitas ele explica que a entidade faz parte de uma
117
falange, portanto, não existe apenas um Zé malandro e letrado. Pertence aos bas-fond e à
Pelintra, mais vários espíritos que se alta sociedade. Não há porque escolher uma só
apresentam com esse nome e suas direção” (AUGRAS, 1997, P. 46).”
características (BARBIERI, 2017), neste caso,
cada aparição da entidade se torna ímpar, sua p. 143 – “Nos escritos de Pimentel temos um
performance, história de vida e profissão contexto a ser explorado, as características
podem variar.” descritas, como exemplo, negro, mal vestido, e
navalha no bolso, são descrições
p. 139 – “[...] mesmo existindo várias histórias compreendidas como próximas da violência, se
relacionadas a origem da entidade Zé Pelintra, levamos em consideração a consolidação da
não significa que alguma seja falsa, mas, sim, Umbanda a partir do ano de 1930,
que cada ser sagrado (pertencente a falange) entenderemos que “no projeto de progresso, o
possui em sua memória uma vida que associa malandro, vadio, boêmio, que não trabalha
ser a de sua origem. Mesmo com essa devia ser reeducado” (PIMENTEL, 2011, p.03).”
diversidade de histórias em relação a sua
origem, existem elementos comuns” p. 143 – “Em síntese, as características que Zé
Pelintra carrega e o público que o procura,
p. 139 – “[...] Devemos compreender que Zé remeteria a um contexto contrário ao que se
Pelintra é uma das muitas entidades existentes pensava, poderia se pensar em progresso,
na Umbanda, a religião possui uma diversidade porém, os negros, capoeiras e os malandros,
de seres sagrados, estes variam de caboclos a nesse sentido, sujeitos que não teriam
pretos velhos, porém, a diversidade é grande trabalhos, estariam nesse progresso? A
[...]” entidade traz a torna e simboliza o que o dito
progresso queria negar/esquecer.”
p. 140 – “O que podemos perceber através de
Oliveira é que a religião da Umbanda sofre com p. 143 – “Importa ressaltar que, os seguidores
atritos e conflitos nas vertentes: política, moral da entidade compreendem as características,
e religiosa, contudo, as ações policiais e morais como exemplo, a malandragem, capoeira e até
direcionadas a religião não surgem ao acaso. mesmo das vestimentas, como elementos que
Mesmo em uma conjuntura que eleva a aproximam a entidade do mundo humano, ou
valorização da identidade nacional, a religião seja, a entidade seria mais próxima dos fiéis,
da Umbanda não é apresentada enquanto pois, já havia sido humana e conheceria os
parte desse contexto, no entanto, ela em si prazeres terrenos.”
seria uma autêntica religião brasileira.”
p. 143 – “[...] segundo Assunção (2010, p. 176)
p. 141 – “No escrito de Oliveira, chama atenção, “Zé Pelintra é visto como o malandro que
a característica atribuída ao papel do exu, pois, representa a astúcia, o livre trânsito pela brecha
sua proximidade com a vida humana seria e pelo proibido, o uso dos meios não-
responsável pela sua demonização, ou seja, sancionados pelas normas morais”. Nessa
sua sexualidade, seu gosto pelo prazer das perspectiva, a ação do malandro seria na
coisas mundanas, como a bebida e o poder, por resolutiva de problemas utilizando métodos
exemplo. Nesta interpretação, não seria o além dos convencionais, ou seja, através de
humano o demoníaco? Ou a regra se aplicaria trabalhos espirituais.”
apenas a um grupo de entidades, de uma
religião socialmente não aceita pela maioria?” p. 144 – “[...] Zé Pelintra é uma entidade
complexa, traz elementos espirituais, porém,
p. 142 – “Este é uma entidade identificada com conhecimento mundano, conhece os dois
os malandros que viviam nas periferias e na lados, o do malandro e o espiritual.”
boemia das capitais do Rio de Janeiro,
Pernambuco, Alagoas, Espírito Santo, e p. 144 – “As entidades da Umbanda trazem
representa bem o particular do sagrado da ensinamentos, experiências e também diálogos
Umbanda. A figura, que vive à margem do com imposições oficiais, o desconhecimento
socialmente aceitável, é hoje muito popular em sobre a história da religião e principalmente
vários terreiros de Umbanda Brasil afora, sobre seus seres sagrados, cria estereótipos.”
estando presente também na Jurema Sagrada, p. 145 “[...] Zé Pelintra se divide em dois
onde é mestre juremeiro. (MAURO, 2016, p 1- malandros, o ritualístico que faz uso de
2).” bebidas, brinca com as mulheres, porém, busca
p. 142 – “Zé Pelintra e descrito dentro de uma trabalhar espiritualmente. E o malandro negro
dualidade, Augras parte dessa perspectiva “é capoeirista que relembra a exclusão de
pernambucano e cidadão carioca, sertanejo e personagens humildes.”
morador da Lapa, macumbeiro e catimbozeiro, FICHAMENTO 05
118
pouca proximidade com os fiéis parece p. 122 – “[...] Assim, os pretos velhos são os
evidenciar seu grau de divinização. Não falam, mestres de uma sabedoria popular advinda das
não fumam e não bebem. Apenas dançam ao dificuldades do cativeiro, os caboclos exímios
som dos atabaques, executando em suas manipuladores das propriedades curativas das
danças um gestual alusivo ao domínio da matas. Mas são os exus, sem sombra de
natureza ou às atividades a eles relacionadas. dúvidas, os entes mais requisitados diante de
Assim, quando uma filha é tomada por Iemanjá, situações mais densas, vivenciadas pelos
por exemplo, esta dança simulando em suas seres humanos em circunstâncias perigosas ou
mãos o balanço das ondas do mar. Ogum, moralmente dúbias.”
identificado à caça e à guerra, executa passos
vigorosos, simulando a posse de uma espada p. 148 – “[...] As entidades que ‘baixam’ no
na mão. Às vezes, os orixás “bradam”, ou seja, terreiro são pensadas, antes de tudo, como
emitem um som característico contribuindo pessoas que já existiram na Terra e, após a
para que sejam identificados no grupo.” morte, ganharam o direito de retornar ao mundo
dos vivos, a fim de ‘prestar a caridade’.”
p. 73 – “[...] Assim, tanto pretos velhos e
caboclos quanto os exus, conversam com os p. 148 – “[...]A umbanda é uma religião que
homens, dão conselhos e, por vezes, bebem, vislumbra a resolução de problemas, como
ou seja, apresentam uma notável interatividade expõe Birman (1985). É nesse sentido que os
com o mundo dos vivos. São essas entidades entes espirituais invocados são concebidos
que ministram passes, prescrevem a melhor como verdadeiros especialistas. Para cada tipo
forma de condução das atividades religiosas da de problema, um tipo específico de entidades é
casa e, principalmente, dão consulta. É, acionado. Há uma percepção de que certos
portanto, no conjunto de variações nas “trabalhos” são impensáveis para determinadas
expressões de humanidade, ou melhor, de categoria de guias.”
proximidade com os seres humanos, que as p. 149 – “[...]A força da “malandragem” consiste
entidades cultuadas na casa mais diferem na habilidade para transitar nas zonas obscuras
umas das outras.” engendradas no curso da civilização.”
p. 83 – “[...] os “companheiros” atuam como p. 149 – “Dessa forma, os malandros
“guardiões” e propulsores de uma “energia representam a negação das amarras que a
telúrica”. O emprego da expressão moral e a “evolução espiritual” podem trazer,
“companheiros” não é gratuito ou ocasional. É quando a necessidade concreta de ação neste
assim que os exus são usualmente mundo é evidente. Sem sombra de dúvidas, a
identificados na casa. Nesse sentido, a forma noção de que a proximidade com os mortais é
de tratamento da entidade funciona, de certa um fator da eficácia de atuação dos entes
maneira, como um elemento diacrítico de sua espirituais certamente não é referente apenas
posição no sistema simbólico do terreiro.” aos malandros.”
p. 84 – “[...]’Companheiro’ é, portanto, p. 151 – “Bastante escorregadios, os malandros
tratamento que atenua, no plano semântico, a da umbanda parecem driblar todos os esforços
distância entre seres humanos e entidades de compartimentalização arquetípica. Estudos
espirituais no Terreiro, transformando em de maior vulto quantitativo e dimensões macro
parceiros ou “camaradas”, agentes deste e do analíticas também apontam para essa
outro mundo. Sob essa ótica, os exus são característica dos “zés”. O sociólogo Lísias
apresentados como entes espirituais mais Negrão (1996), em sua análise sobre o campo
próximos dos homens e, portanto, dotados de umbandista em São Paulo, identifica os
habilidade para lidar com as aflições que malandros como pertencentes a uma categoria
atingem os seus fiéis.” à parte dos exus, a dos “zés pilintras”. Negrão
p. 99-100 – “[...]Se, para os neopentecostais, aponta para essas entidades como as mais
todos os exus são demônios, para Zé dos ambivalentes no cenário umbandista paulista.
Malandros, apenas alguns são malignos, pois Quanto aos exus, o sociólogo afirma que não
não são em verdade exus, mas espíritos que pairam dúvidas quanto à categorização
“usam os nomes” dos “companheiros” para “esquerda/direita”, o que não ocorreria com os
criar desequilíbrios entre os mortais.” “zés pilintras”, ora pensados como verdadeiros
advogados dos pobres, ora como entidades
p. 119 – “[...]De um tipo genérico, Zé Pelintra perigosas por sua total inserção na
passou a um espírito extremamente popular marginalidade.”
entre membros e amigos do terreiro. É uma das
entidades mais procuradas e homenageadas FICHAMENTO 06
na casa.”
122
Resumo FICHAMENTO 07
O fichamento a seguir parte do texto Título/Subtítulo: BAIANOS E MALANDROS: A
que tem como objetivo mostrar o processo de SACRALIZAÇÃO DO HUMANO NO PANTEÃO
sacralização do malandro, porém se atém a UMBANDISTA DO SÉCULO XX.
interpretar pontos cantados e sambas- Autor(es): DE SÁ JUNIOR, Mario Teixeira.
malandro dos anos 30. Trazendo uma visão Ano: 2004
mais interpretativa do que histórica sobre o Páginas: 16-23
assunto. Fonte DE SÁ JUNIOR, Mario Teixeira.
Citações BAIANOS E MALANDROS: A
SACRALIZAÇÃO DO HUMANO NO PANTEÃO
p. 441 – “[...] A Umbanda acrescenta, ainda, UMBANDISTA DO SÉCULO XX. Revista de
em sua reminiscência de tradições africanas, História, Campo Grande. V. 8. N. 15. 9-29,
um rito mais ampliado e mais festivo, com a jan./jun. 2004.
presença de cânticos, roupas, cheiros, Cidade: Campo Grande - MS
fumaças, bebidas e comidas. Cria um cenário Editora: Revista de História
mais complexo em que cada item ganha em
complexidade, permitindo que estes mesmos Resumo
sejam percebidos em toda sua capacidade de
trazerem consigo um pedaço do sagrado. Este artigo procura examinar a relação
Neste sentido, o chapéu usado pelo malandro entre os novos personagens surgidos no
(incorporado) é sagrado, assim, como sua panteão umbandista (baianos e malandros)
gravata vermelha, sua bengala, sua camisa, com as transformações pelas quais passou a
seu sapato, sua cerveja, sua farofa e seu sociedade brasileira ao longo das décadas de
cigarro. Todos estes são objetos que fazem 1930 a 1960 e, em especial, percebendo as
parte de uma hierofania ampliada – não só especificidades dessas transformações nas
sócio-temporal – mas idiossincrática. Cada cidades de Dourados (MS) e Rio de Janeiro
parte tem sua relevância no todo, e não pode (RJ). A partir dessas análises proponho colocar
ser retirada, com o risco de prejudicar à esses novos personagens como inseridos em
própria manifestação e atuação do todo.” uma das lógicas da umbanda, ou seja, o de
ressignificação de personagens marginalizados
p. 444 – “[...] Para o caso dos malandros, os pela estrutura social, política e econômica,
diversos pólos pelos quais deslizam (Linha das dando a eles um lugar sacralizado dentro das
Almas e Povo de Rua, por exemplo) estão práticas umbandistas. Indo além, pretendo
reunidos numa categoria espiritual que demonstrar como esses novos personagens
expressa sua especificidade de acordo com a dividem o espaço com um outro, o exu, onde
novidade de cada consulta, mas que não essa medida visa abrir o campo dos artigos
escapa da identidade espiritual religiosos da Umbanda aos seus
correspondente para que pudessem ser consumidores, além de fragmentar as críticas
reconhecidos em outra categoria. É importante aos exus enfraquecendo os ataques a esse
destacar ainda que esta noção está baseada arquétipo.
(e por isso mesmo é reforçada) nas
considerações feitas pelos próprios agentes Citações
espirituais quando afirmam, por exemplo, que p. 16 – [...]A figura de Zé Pelintra está
escolhem uma linha para atuarem: a dos associada a um grande leque de religiões de
pretos(as)-velhos(as), boiadeiros, exus, possessão no Brasil. Provavelmente originário
pombo-giras, caboclos, etc. Ou seja, estes
123
Título/Subtítulo: ASPECTOS
PSICOLÓGICOS DO ZÉ PELINTRA NA
p. 86 – “. Na sua fala, Zé Pelintra e os CULTURA DO RIO DE JANEIRO
malandros em geral aparecem como amigos, Autor(es): SOUZA, Adriano Lima
“camaradas”, mas antes de tudo como entes Ano: 2016
espirituais potencialmente perigosos. Ela conta Páginas: 2-81
para as meninas presentes que seu filho Fonte: SOUZA, Adriano Lima. Aspectos
“carrega o Zé Pelintra”. A senhora expõe com Psicológicos do Zé Pelintra da Cultura do
orgulho o fato de seu filho fazer um sucesso Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2016, 94 p.
descomunal com as mulheres. Apesar de Dissertação de Mestrado (Programa de Pós-
destacar que o rapaz é muito bonito, é graduação Mestrado em Psicologia (PPGPSI))
categoricamente à ação de Zé Pelintra que ela – Universidade Federeral Rural do Rio de
atribui o incomum poder de sedução do jovem. Janeiro, UFRRJ
Ela disse: “O Zé dá muita mulher pra ele! Ele Cidade: Rio de Janeiro
vai pra cabaré, pra Lapa (…) Ele se separou, tá Editora: UFRRJ
na pista. Quando ele bebe, vem gingando
assim com um sorriso de lado (...)”. Ao Resumo
classificar o seu filho como alguém que
“carrega” Zé Pelintra, a senhora construiu uma A dissertação fichada apresenta mais sobre Zé
imagem do rapaz consideravelmente Pelintra e seus aspectos culturais no Rio de
identificada aos atributos do malandro como Janeiro. Fala sobre a Umbanda e suas duas
costumeiramente representado no imaginário vertentes, como também faz ligações com os
popular, enfatizando elementos como ginga, capoeiristas, além de contar a história por trás
jogo de cintura, poder de sedução e a forte da entidade, em sua verão nordestina
atração pelo sexo oposto.” (Catimbó) e carioca (na Umbanda).
p. 87 – “A senhora advertiu a uma das mais
novas: “olha, Seu Zé diz que é seu marido? Não
deixa não! Ele vai afastar tudo quanto é Citações
namorado que você arrumar, porque vai p. 2 – “Zé Pelintra assume função sagrada na
acreditar que é seu marido mesmo!” A menina umbanda e, para tanto, a malandragem
afirmou acreditar que isso já esteja precisou ser sacralizada, sua dimensão
acontecendo.” “profana” é ressignificada ao assumir o
p. 92 – “A discussão em torno do local de cumprimento da lei de umbanda.”
realização da gira de exu tornou evidente a p. 6 – “No livro Candomblé e Umbanda:
extrema valorização dessa hierarquia e o temor caminhos da devoção brasileira, Silva (2005)
em subvertê-la. Em decorrência da chuva, nos informa sobre o sincretismo já presente na
alguém chegou a sugerir que a sessão fosse formação do panteão das religiões afro-
realizada na parte coberta, que fica em um brasileiras, anterior ao surgimento da umbanda.
patamar físico superior, e não no primeiro, a Diversas etnias de negros, antes mesmo de
céu aberto, como de costume. Mas a ideia foi serem trazidas para o Brasil, compartilhavam
logo abolida. O plano mais elevado do terreiro em suas tradições conceitos que possibilitaram
está destinado aos trabalhos junto às entidades a associação entre os deuses. Os Iorubas e
“mais evoluídas”, como caboclos, pretos velhos seus cultos aos orixás, os Jejes se
e, claro, os orixás. O próprio Zé dos Malandros, relacionavam com os voduns, por sua vez
em outro momento da noite afirma: “Lá em cima semelhantes ao conceito de inquices dos
é pros evoluído, os desevoluído fica aqui Bantos.”
embaixo mesmo.”
p. 7 – “Encontramos no norte do Brasil o
p. 96 – “A partir da chegada das pombagiras, catimbó, com forte influência da cultura
há uma acentuação das distinções de gênero e indígena, seu culto é dirigido aos mestres,
da sexualidade entre as entidades presentes. assim nomeada as entidades que se
Diferentemente dos exus dos cemitérios, apresentam como espíritos de índios
sisudos e simbolicamente assexuados em suas (caboclos), ou de antigos chefes de cultos. A
expressões corporais, as pombagiras são presença do altar com imagem de santos
mulheres por excelência. É com elas que os católicos, defumação por meio do cachimbo, a
“zés” formam os pares mais evidentes da noite” utilização de maracá para evocar os espíritos e
FICHAMENTO 09 as rezas católicas são elementos presentes nos
rituais do catimbó. A jurema é uma árvore que
assume lugar sagrado nos rituais, de sua casca
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é feito a bebida ingerida e é dela a matéria Espiritismo europeu decodificado por Allan
utilizada no defumador.” Kardec. Nesse sentido, Zélio pode ser
reconhecido como o mito de fundação da
p. 12 – “A umbanda constituiu-se, portanto, Umbanda, ou mesmo como o fundador de uma
como uma forma religiosa intermediária entre escola da umbanda. Assim como seu fundador,
os cultos populares já existentes. Por um lado muitos dos seus praticantes eram oriundos dos
preservou a concepção kardecista do carma, grupos kardecistas. Os santos católicos
da evolução espiritual e da comunicação com ocupam papel central, assim como a influência
os espíritos e, por outro, mostrou-se aberta às da literatura e das práticas espíritas kardecistas
formas populares de culto africano. Contudo, são facilmente reconhecidas e, por outro lado,
não sem antes purificá-las, retirando os pode ser percebida a ausência de elementos e
elementos considerados muito bárbaros e, por símbolos ritualísticos africanos, como, por
isso, estigmatizados: o sacrifício de animais, as exemplo, os atabaques, os assentamentos, as
danças frenéticas, as bebidas alcoólicas, o oferendas.”
fumo e a pólvora. Ou, então, quando se fazia
necessário o uso desses elementos, p. 23 – “Talvez menos conhecido pelos
explicando-os “cientificamente”, segundo o praticantes das diversas umbandas, Tancredo
discurso racional do kardecismo. (p. 112)” da Silva Pinto (Tata Ti Inkice), ou Tata
(SILVA, 2005) Tancredo, é o fundador de outra escola: a
omolokô. Encontraremos na umbanda omolokô
p. 12 – “Os cultos afro-brasileiros sofreram a presença dos elementos africanos em sua
grande repressão policial durante o período do ritualística. Para seu fundador a raiz da
Estado Novo. Somente quando as elites umbanda está na África. Nesse sentido
intelectuais e artísticas empreenderam o poderão ser reconhecidos fundamentos
movimento de valorização da cultura popular, presentes no candomblé e em outras práticas
assumindo assim o objetivo de definição de religiosas afro-brasileiras. Se na umbanda
uma identidade nacional, é que as práticas branca, como sinalizamos acima, muitos de
religiosas ganharam algum espaço. É na seus praticantes eram participantes do
esteira desse movimento que a umbanda espiritismo kardecista, a escola omolokô
ganhou certa organização, sendo liderada acolheu em seus terreiros praticantes de
principalmente por atores oriundos da classe candomblé e outras religiões afro-brasileiras.
média, minimizando, porém, as influências Nessa escola de umbanda estarão comumente
africanas. Em contrapartida, se por um lado presentes em sua ritualística: culto aos orixás;
havia o movimento de embranquecimento dos sacrifícios e oferendas, obrigações que
valores religiosos da macumba, havia também acompanham o desenvolvimento de seus
o empretecimento dos valores europeus do praticantes; hierarquia sacerdotal etc”
kardecismo, algo longe da nossa realidade.”
p. 23 – “A Umbanda compartilha com as mais
p. 22 - “Nas religiões afro-brasileiras, pela diversas expressões religiosas afro-brasileiras
diversidade de seus adeptos, há também uma a ausência de poder centralizador ou
diversidade de rituais e de formas de institucionalização reguladora, como é possível
transmissão do conhecimento. A essas várias reconhecer, por exemplo, na Igreja Católica e
formas de entendimento e de vivência outras instituições religiosas cristãs. Assim, não
denominamos escolas afro-brasileiras” (RIVAS será marcada por sistematização e rigidez
NETO, 2012, p.105). Rivas Neto argumenta doutrinária. Logo, encontraremos em cada
também que as várias escolas correspondem a escola, terreiros que se assemelham e
cosmovisões de suas matrizes formadoras: diferenciam-se no desenvolvimento de suas
indo-europeia, africana e ameríndia. De acordo rito-liturgias.”
com suas influências predominantes, a escola
em questão terá igual expressão ritu-litúrgica. p. 24 – “A variedade de tendências doutrinárias
(Ibdem, p. 53) sob a qual se mantinha o movimento
umbandista não tardou a provocar as primeiras
p. 23 - “Essa afirmativa pode ser facilmente dissidências. Se o Primeiro Congresso de
constatada ao examinarmos duas Umbanda teve como um dos temas centrais
denominações, ou escolas, umbandistas que criar a imagem de uma umbanda “pura”,
podem ser observadas no distanciamento de “branca”, através da eliminação dos elementos
suas práticas rituais, são elas: Umbanda africanos tidos como maléficos (ou quimbanda),
Branca (ou cristã) e Umbanda Omolokô.” a partir da década de 1950 setores dessa
p. 23 – “A umbanda branca, ou cristã, tem Zélio religião provenientes dos estratos mais baixos
Fernandino de Moraes como seu fundador e da população, geralmente negros e mulatos,
apresenta fortes influências do Catolicismo e do começaram a contestar o distanciamento da
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umbanda das práticas africanas. À “umbanda nas mesas e giras do Catimbó são eguns, como
branca” opôs-se a tendência de recuperação acontece na Umbanda, são espíritos de
dos valores africanos presentes na pessoas que já morreram, e em sua vida
religiosidade popular. (Ibdem, p. 116).” pregressa foram Mestres dirigentes desses
mesmos rituais. Após a morte foram enterrados
p. 38 – “A imagem difundida por seus aos pés da Jurema, ou no cemitério dos
seguidores e geralmente encontrada nos catimbozeiros e a partir disso passaram a
Terreiros de Umbanda é a do negro vestido de habitar o Encantado, o espaço mítico da
terno branco, gravata vermelha, chapéu estilo Jurema Sagrada. Já na Umbanda, esses
panamá com faixa vermelha, sapato bicolor e espíritos que passaram por uma vida humana
bengala. Quando observado em seus rituais, se organizam em Falanges, assumindo o
incorporados em médiuns caracterizados com estereótipo desses grupos. Por isso, na
sua vestimenta, representado nas estatuetas Umbanda, cada Zé Pelintra tem uma história de
ou em outras ilustrações, não é difícil a vida singular.”
associação com a imagem do malandro
carioca. Zé Pelintra é o Rei da Malandragem.” p. 44 – “Zé Pelintra Valentão, José Phelintra de
Aguiar, Zé Phelintra, José Gomes da Silva, são
p.39 – “A partir das pesquisas realizadas pela alguns dos possíveis nomes deste que, após
MPF, Oneyda Alvarenga inclui o Catimbó no sua morte física, sempre cercada de mistério,
grupo de religiões populares, de formação tornar-se-ia um Mestre cultuado no Catimbó.
nacional, comumente observada no Norte e Para melhor ilustrar nossa pesquisa,
Nordeste brasileiros. Compartilha com a abordaremos brevemente algumas das
Pajelança7 e no Candomblé-de-Caboclo8 a histórias registradas por Alkimin (1997).
existência de elementos “tomados à feitiçaria
afrobrasileira, ao catolicismo, ao espiritismo e Em meados do século XIX a família de José
principalmente, as reminiscências dos dos Anjos, fugindo de um intenso período de
costumes ameríndios, que constituem a sua estiagem, partiu para a cidade de Recife – PE
parte principal e caracterizadora” (p.57).” a procura de uma vida melhor, ou com menos
sofrimento. Porém, não era isso que o futuro
p. 40 – “No Catimbó, os Mestres “são os guias, reservara para José dos Anjos, ainda criança a
orixás sem culto, acostando, espontaneamente morte leva seus pais. Órfão, cresceu pelas ruas
ou invocados para servir.” (RIBEIRO, 1992, da capital aprendendo com a malandragem os
p.24). Os devotos mais regulares conseguem segredos para enfrentar o mundo. Ainda
reconhecer os diferentes Mestres, pois estes criança circulava pelas regiões marginais,
possuem fisionomia própria, gestos, maneiras dormia no cais do porto e era o garoto de
diferentes de atuação.” recado das prostitutas.
p. 40 – “Para invocação de cada Mestre, há Certa vez, já adolescente, envolveu-se em uma
uma toada diferente. São, geralmente, briga com policiais dentro de um cabaré, na
composições de harmonia simples que dizem cidade de Recife. Durante a peleja, acertou um
sobre as atividades sobrenaturais, a força e o dos soldados com golpe de faca, o que foi
poder de cada um. A música é elemento revidado com uma dúzia de tiros, porém, não
fundamental para que a fumaça aconteça.” foi atingido por nenhum. Fato que lhe rendeu a
p. 41 – “Negros, indígenas e europeus fama de possuir o corpo fechado. (ALKIMIN,
fundiram-se no Catimbó. A concepção da 1997) “
magia, processos de encantamento, termos, p. 45 – “O que é contado sobre sua morte é
orações, são da bruxaria ibérica, vinda e cercado de mistério. Conta-se que uma de suas
transmitida oralmente. A terapêutica vegetal é mulheres havia feito um feitiço para ele. O
indígena pela abundância e proximidade, além motivo teria sido o não reconhecimento de um
da tradição médica dos Pajés. O bruxo europeu filho e por não querer abandonar as outras
também, já trazia o hábito e encontrou no amantes. Passado o prazo de sete semanas
continente a fartura das raízes, vergônteas, que lhe fora dado para esse fim, Zé Pelintra
folhas, cascas, flores e ainda uma ciência Valentão foi encontrado morto, sem ferimentos
secular aborígene na mesma direção e aparentes. (ALKIMIN, 1997)”
horizonte. A convergência foi imediata.
(RIBEIRO, 1992, p. 17)” p. 45 – “Devoto de Nossa Senhora do Carmo,
Zé Phelintra também foi introduzido no Catimbó
p. 42 – “[...] uma importante diferença entre a por seu amigo Mestre Zinho. Frequentando as
Umbanda e o Catimbó. Neste último, como mesas de Catimbó da Paraíba e de
veremos na citação abaixo, as entidades Pernambuco, Zé Phelintra entregou-se de
espirituais denominadas por Mestres cultuados corpo e alma à prática do Catimbó, e dominou
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os seus segredos. Uma das coisas que Zé apenas encostada em seu corpo. Seu chapéu
Phelintra conseguia através do seu é de palha, ornamentado com uma fita
conhecimento mágico era transformar-se em vermelha, cor também utilizada no lenço que
bananeira sempre que era perseguido por cobre seu pescoço.”
policiais. (Ibidem, p. 28)”
p. 48 – “Já a representação carioca de Zé
p. 45 – “Nos diferentes relatos sobre sua vida Pelintra é aquela que imortalizou o malandro,
terrena, alguns elementos são frequentes. O personagem presente no cenário urbano da
afastamento precoce dos pais, ora pela cidade do Rio de Janeiro. As imagens
orfandade, ora por situações conflituosas; a reproduzem um jovem senhor negro, ou
mudança da zona rural para a capital, como já mestiço, vestido com o terno branco, marca de
citado anteriormente; a vida caracterizada pela sua elegância. O chapéu de palhinha, ou
circulação entre as zonas marginais, a boemia panamá, tem a facha vermelha ou preta que o
e os locais mais elitizados. Registro de vida identifica. Vermelho também é a cor de sua
marcada pela violência e valentia; e por fim, o gravata, e do lenço que carrega dobrado no
encontro com a morte se dá sempre de maneira bolço de seu paletó. Diferente da imagem do
misteriosa, e sua transmutação mítica como Mestre do Catimbó, seus pés calçam sapatos
entidade espiritual divinizada.” bicolor. Aos seus pés está colocado um livro,
que faz alusão à sabedoria de Seu Zé, homem
p. 46 – “No entanto, a sua chegada à cidade do letrado nos mistérios da natureza e do mundo
Rio de Janeiro é mais um dos mistérios que espiritual. Para alguns autores o que vemos
cercam a divindade, objeto de nossa pesquisa. próximo aos seus pés é, na verdade, um
Seguindo os caminhos apontados pelos pontos baralho, representando tanto o prazer pelos
cantados em seu ritual, e reforçado pelas jogos, quanto seu instrumento sagrado para a
histórias compartilhadas por seus fiéis na leitura, no plano astral, da vida de seus
Umbanda, torna-se plausível identificar Seu Zé consulentes”
como mais um dos muitos nordestinos que
chegaram à capital do país nas primeiras p. 48 – “Observamos a ocorrência de uma série
décadas do século XX, e logo torna-se mais um de mudanças entre esses dois momentos da
malandro presente nos mais diversos locais da saga de Zé Pelintra. Tais transformações são
cidade.” simbolizadas pelas alterações em seu vestuário
e objetos de uso pessoal. O lenço vermelho do
p. 46 – “A questão de seu aparecimento no Rio campesino transforma-se na gravata
de Janeiro não foi nunca esclarecida de forma encarnada. O facão que víamos na mão do Zé
convincente. Teria o Zé, a pessoa física, que, do Sertão torna-se uma navalha, peça presente
segundo algumas fontes, atendia pelos nomes no altar de Zé Pelintra, mas excluído de suas
de José dos Anjos e José Gomes, realmente estatuetas. Zé do Sertão fuma cachimbo, ao
migrado para esse estado na década de 1920? passo que Seu Zé prefere cigarros ou charutos.
Alguns autores afirmam categoricamente que Enquanto o do Sertão tem as pernas abertas
não, e juram que ele foi enterrado no famoso semi-arcadas, plantadas no chão, o Zé Carioca
cemitério dos catimbozeiros em Pernambuco. as mantém juntas, além de mostrar um corpo
Outros, porém, respaldados pelo relato de sinuoso como de uma serpente, atento,
muitos pontos cantados (alguns já publicados) concentrado e aparentemente desarmado, mas
em uso nos terreiros de Umbanda atualmente, sempre alerta para eventuais ataques inimigos,
evocam passagens de sua saga, ainda em mesmo na hora em que examina seu oráculo,
vida, pelas ruas do Rio de Janeiro Boêmio do seja este o livro aberto sobre o solo ou o
começo do século XX. Nenhuma prova baralho no qual ele lê a sorte dos desvalidos.
concreta sustenta essas versões, que nem por (LIGIÉRO. 2004 p. 55- 56)”
isso deixam de ser verdadeiras, já que
professadas por muitos, compondo uma p. 48 – “Dentro do chapéu Panamá e no couro
história múltipla de um mito. O fato é que a dos sapatos trazem seu mistério. O chapéu,
figura mística de Zé Pelintra, gerada a princípio ornamento de respeito e credibilidade, assim
nos Catimbós do Nordeste, adquire imensa como a fita que o envolve, tem o formato de um
popularidade no Rio de Janeiro. (LIGIÈRO, círculo mágico que, além do respeito para com
2004, p. 27)” a divindade regente do Guia, cobre e protege a
coroa do médium contra interferências
p. 47 – “A versão nordestina de Zé Pelintra é externas. O couro dos sapatos associa-se
retratada como caboclo jovem, vestido de magneticamente ao couro dos atabaques.
branco, com as calças dobradas até a canela, (VIEIRA, 2015, p. 206)”
seus pés estão descalços e pisando no chão.
Em uma das mãos o Mestre segura uma p. 49 – “Com o movimento de aceitação as
garrafa; na outra mão uma peixeira, bengala ou entidades que se manifestavam em nome da
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p. 60 – “Logo, se no século XIX havia as maltas algumas de suas Linhas Trabalho e patronando
de escravos capoeiras e no século XX os outros espíritos que também se apresentam
malandros cariocas, hoje o que encontramos é como Zé Pelintra. O Guia Espiritual Zé Pelintra
a Falange mítica do Malandro Zé Pelintra. original baixou primeiramente na Jurema, no
Alguns dos pontos cantados nos rituais para a Catimbó nordestino, e, se isso aconteceu, é
falange do Malandros fazem alusão ao porque ele conheceu esse universo.
tensionamento com o Estado.”
p.203 – “Se Seu Zé Pelintra baixou inicialmente
p. 81 – “A Umbanda é uma religião na Jurema, no Catimbó, é porque ele foi
genuinamente brasileira, marcada pela “juremado”, ou seja, é porque em vida ele foi
multiplicidade, o que reflete em diferentes iniciado nesse culto, bebeu jurema e ‘se
denominações.” levantou’. Na Jurema só baixam espíritos
p. 81 – “[...] Com história semelhante, seja ‘juremados’”
como carioca ou como Mestre catimbozeiro,
assume um lugar duplo na Umbanda, podendo p. 204 – “Nas ‘macumbas cariocas’ Zé Pelintra
manifestar na linha das almas, ou do Povo de baixou como Exu, pois, nessa época, a Linha
Rua. A duplicidade é um traço fundamental de de Baianos ainda não se apresentava nas
sua personalidade.” incorporações. Ali, Exu tinha especialidades e
Zé Pelintra também ficou famoso, pois sempre
FICHAMENTO 10 chegava muito falante, trabalhando com tudo e
quebrando regras.”
Título/Subtítulo: Os Guias Espirituais da
Umbanda e seus Atendimentos p. 204 – “No inicio do século XX, quando a
Autor(es): VIEIRA, Lurdes de Campos Umbanda se estruturou, essa entidade
Ano: 2015 continuou se apresentando na Esquerda, até o
Páginas: 201-210 advento da Linha dos Baianos, onde passou a
Fonte: VIEIRA, L. C. Proteção e Solidariedade baixar, adequando-se a ela e moldando-se
dos Malandros. In: VIEIRA, L. C. Os guias como malandro carioca. No final da década de
espirituais da umbanda e seus 1980 e início da década de 1990, nasce nos
atendimentos. São Paulo: Madras, 2015. p. morros cariocas a Linha dos Malandros, hoje
201-210 independente.”
Cidade: São Paulo
Editora: Madras p. 204 – “[...]Os Malandros são um
agrupamento de espíritos que viveram suas
Resumo reencarnações na pobreza e no sofrimento,
O capítulo fichado discorre sobre a Linha de mas souberam driblar a miséria e baixo astral.
Malandros na Umbanda, onde apresenta e cita Por onde passam, esses espíritos levam alegria
características das entidades presentes nessa e arrancam sorrisos e gargalhadas, com seu
linha, explica sua origem e vestimentas. É um samba no pé, sua ginga e malandragem, pois
texto importante para conhecer mais sobre a são resultado da grande miscigenação cultural
linha, trazendo ensinamentos sobre como e racial brasileira, e retratam as populações
essas entidades de luz trabalham em prol da marginalizadas e desfavorecidas, pobres e
caridade. sofredoras dos morros e das periferias do país,
tanto rurais quanto urbanas.”
Citações
p. 202 – “A controvérsia surge do uso do termo p. 204 – “Esses espíritos chamados malandros
“Malandro”, na denominação dessa Linha de do astral não são marginais do além, como
Trabalho, mas esse foi o arquétipo do escolhido muitos supõem. São amigos, voltados para a
no astral para que os Guias manifestantes nela prática da caridade espiritual e material,
falem das crises da sociedade e de suas propagam o respeito ao ser humano, a
consequências. Nessa linha podem manifestar- tolerância religiosa, a humildade, os bons
se, inclusive, espíritos que, encarnados, foram exemplos, o amor ao próximo, o amparo às
sociólogos, historiadores e outros profissionais crianças desamparadas, às mulheres
ligados às denúncias dessas crises e na defesa sofredoras e aos idosos.”
da população excluída.”
p. 205 – “Há muitas opiniões divergentes sobre
p. 202 – “Na época em que viveu, Zé não quem é o Senhor Zé Pelintra. Como Guia
conheceu a Umbanda, que não havia chegado Espiritual, Zé Pelintra não é Exu, não é Baiano,
ao sertão nordestino, mas, como espírito, não é boêmio nem pilantra, mas pode se
integrou-se a essa egrégora, laborando em apresentar em diversas Linhas de Trabalho,
130
nos terreiros em que não há gira específica energias negativas. Não são utilizados para
para a Linha dos Malandros.” corte físico, sendo mais um simbolismo.
O que eu sinto em relação a eles é uma sessão fosse realizada na parte coberta, que
gratidão, um carinho. Sabe quando você olha fica em um patamar físico superior, e não no
para alguém que você admira muito, alguém da primeiro, a céu aberto, como de costume.
sua família, alguém mais velho que você que Mas a ideia foi logo abolida. O plano mais
você admira por conta da sabedoria que aquela elevado do terreiro está destinado aos
pessoa passa para você? É o que eu sinto em trabalhos junto às entidades “mais
relação a eles. evoluídas”, como caboclos, pretos velhos e,
claro, os orixás. O próprio Zé dos
Malandros, em outro momento da noite
P: Na sua casa/templo, a malandragem tem afirma: “Lá em cima é pros evoluído, os
gira específica? Ou trabalham em giras de desevoluído fica aqui embaixo mesmo.”
Exu e Pombo-gira?
R: Na minha casa antiga que foi feito meu Finalizando, você descreveria a entidade
desenvolvimento não tinha uma gira específica. como um ser de baixa evolução ou, como
Eles vinham de acordo com a necessidade. descrito na citação, “desevoluído”?
Mas tudo começou a mudar quando a Navalha
que trabalha comigo chegou, ela trouxe a
banda da malandragem toda com ela, ai
começaram a trabalhar com a linha da R: Não concordo em caracteriza-los assim, eles
malandragem. Porém, não tem esse negócio não se encaixam, eles são únicos. É como as
de ele é da linha da esquerda ou da linha da falanges. Você não vai comparar um caboclo a
direita, ele é malandragem. um êre. Você não vai comparar um exu com um
marinheiro. Eu não concordo porque, pela
Malandragem é uma coisa fora do perfil, direita energia que é passada, Seu Zé tem a
(Preto-Velho, Caboclo e Êre) e esquerda (Exu, polaridade tão misteriosa, que ele se encaixa
Pombo-gira). em um gira de exu e também se encaixa numa
energia de preto-velo. Então se a gente parar
A casa nova que eu frequento tem uma gira pra pensar é muito maior do que a gente tem
especificamente para malandros. na consciência, no nosso aprendizado. E isso
não é só para os malandros, isso também se
encaixa para as malandras. O porém é que as
P: Sobre as citações a seguir, retiradas de casas não tem essa abertura, só quem trabalha
um artigo sobre Zé Pelintra, qual sua com eles que começa a entender parte dos
opinião: mistérios, por se tratar de uma linha mais
modernizada, vamos dizer dessa forma.
“Malandro é cultuado na energia de Exu na
nossa casa (…).Eu acho que na maioria A gente que trabalha com ele entende que eles
delas o Zé Pelintra é encaixado nas falanges não têm relação, Seu Zé o mistério dele é tão
de Exu, pode ter as suas diferenças, porque forte que ele consegue trabalhar virado na
a umbanda é muito diversa, mas na maioria esquerda, a energia dele se adapta tanto pra
dos casos a falange de malandro, é cultuada esquerda quanto pra direita. Mas eu
na falange de Exu (…)É porque os Exus consideraria um povo de linha do meio.
Malandros, que são Exus Zé Pelintras,
tiveram suas vivências diferentes de um P: E por último, você tem alguma vivência
caso do Senhor trancaruas, do Exu de ou algum conhecimento a mais sobre Zé
Calunga que é um e Exu-caveira, tiveram as Pelintra e Maria Navalha, ou até mesmo sabe
suas vivências, e experiências dessas a história de alguma entidade (malandro ou
vivencias diferentes.” malandra), que quer compartilhar?
R: O malandro é uma entidade que não tenho
a história por ser recente o trabalho dele
Você concorda em caracterizar Zé Pelintra comigo. Mas a Dona Navalha sei que o nome
como Exu? Por quê? dela é Maria Navalha do Cais, é a malandra que
trabalha na minha corrente.