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A eficácia da lei no espaço: direito internacional privado

1. Aplicação da norma jurídica no espaço


A aplicação da lei ao caso concreto é questão associada à soberania estatal.
Em regra, adotou-se o princípio da territorialidade, por meio do qual se aplicam as leis brasileiras
aos fatos ocorridos no território nacional.
No entanto, há hipóteses de aplicação da lei estrangeira a fatos ocorridos no território brasileiro,
bem como a aplicação da lei brasileira a fatos ocorridos no território estrangeiro. Nessas hipóteses,
tem-se a aplicação do princípio da extraterritorialidade.
O ordenamento jurídico brasileiro adotou, de acordo com as disposições da Lei de Introdução às
Normas do Direito Brasileiro (LINDB), a regra do princípio da territorialidade mitigada,
temperada ou moderada, pois, em certas circunstâncias, adota-se o princípio da territorialidade e,
em outras circunstâncias, o princípio da extraterritorialidade.

1.1. Critério do estatuto pessoal


A partir das regras do estatuto pessoal, será aplicável a norma legal do domicílio do estrangeiro
para reger as suas relações jurídicas referentes ao começo e ao fim da personalidade jurídica, ao
nome, à capacidade e aos direitos de família.
Com efeito, o art. 7º da LINDB dispõe que: “a lei do país em que domiciliada a pessoa determina as
regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família”.
Assim, “realizando-se o casamento no Brasil, será aplicada a lei brasileira quanto aos impedimentos
dirimentes e às formalidades da celebração” (art. 7º, § 1º, LINDB).
“O casamento de estrangeiros poderá celebrar-se perante autoridades diplomáticas ou consulares do
país de ambos os nubentes” (art. 7º, § 2º, LINDB).
No mais, “tendo os nubentes domicílio diverso, regerá os casos de invalidade do matrimônio a lei
do primeiro domicílio conjugal” (art. 7º, § 3º, LINDB) e “o regime de bens, legal ou convencional,
obedece à lei do país em que tiverem os nubentes domicílio, e, se este for diverso, a do primeiro
domicílio conjugal” (art. 7º, § 4º, LINDB).
Ademais, “o estrangeiro casado, que se naturalizar brasileiro, pode, mediante expressa anuência de
seu cônjuge, requerer ao juiz, no ato de entrega do decreto de naturalização, se apostile ao mesmo a
adoção do regime de comunhão parcial de bens, respeitados os direitos de terceiros e dada esta
adoção ao competente registro” (art. 7º, § 5º, LINDB).
O divórcio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os cônjuges for brasileiro, somente será
reconhecido no Brasil depois de um ano da data da sentença, salvo se houver sido antecedida de
separação judicial por igual prazo, caso em que a homologação produzirá efeito imediato,
obedecidas as condições estabelecidas para a eficácia das sentenças estrangeiras no país. 
Obs.: Este trecho deve ser lido em consonância com a EC n. 66/2010, que não trouxe previsão
de qualquer prazo para o divórcio (STJ: SEC 4.445/EX).
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), na forma de seu regimento interno, poderá reexaminar, a
requerimento do interessado, decisões já proferidas em pedidos de homologação de sentenças
estrangeiras de divórcio de brasileiros, a fim de que passem a produzir todos os efeitos legais (art.
7º, § 6º, LINDB).
Adotou-se, assim, o Sistema da Territorialidade Moderada, ou seja, o direito pátrio é eficaz, mas,
em determinadas situações, poderá haver coexistência, no território nacional, com o sistema
alienígena, no chamado estatuto pessoal dos sujeitos, com base na lei da nacionalidade ou do
domicílio – ou seja, é a situação jurídica em que o estrangeiro será regido pelas leis de seu país de
origem.
Devem ser, portanto, observadas as seguintes regras:
 Não se aplicam leis, sentenças ou atos estrangeiros no Brasil quando ofenderem a soberania
nacional, a ordem pública e os bons costumes.
 Não se cumprirá sentença estrangeira no Brasil sem exequatur (cumpra-se), ou seja, a
permissão dada pelo STJ para que a sentença tenha efeitos, conforme o art. 105, I, i, da
Constituição Federal (CF/1988).
Por exemplo: 1) art. 7º, LINDB. A lei do país em que é domiciliada a pessoa determina as regras
sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família lex
domicilii.
Também é aplicável a regra do estatuto pessoal no que concerne aos bens móveis que o
proprietário tiver consigo ou se destinarem ao transporte de outros lugares, ao penhor, e à
capacidade de suceder, ou seja, de receber herança ou legado.
Assim, o art. 8º, § 1º, LINDB, determina que se aplique a lei do país em que for domiciliado o
proprietário, quanto aos bens móveis que ele trouxer ou se destinarem a transporte para outros
lugares.
Além disso, o critério do estatuto pessoal é adotado no tratamento dispensado às pessoas
jurídicas, que devem obedecer à lei do Estado em que se constituíram.

1.2. Outros critérios


 Além do critério do estatuto pessoal, a Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro se vale de
outros para aplicação do princípio da territorialidade mitigada.
a) Critério da lex rei sitae: a aplicação da lei do lugar em que a coisa se situa para regular as
relações de propriedade e posse de bem imóveis (art. 8º, caput, LINDB).
b) Critério do locus regit actum: quanto às obrigações, deve ser aplicada a lei do país onde foram
constituídas, reputando-se constituída no lugar em que residir o proponente (art. 9º, LINDB).
c) Critério da lei do domicílio do falecido ou do ausente pra regular a sucessão por morte ou
ausência: Quanto ao tema, veja o que dispõe o inciso XXXI do art. 5º da CF/1988: “a sucessão de
bens de estrangeiros situados no País será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou
dos filhos brasileiros, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do ‘de cujus’”.
Esse dispositivo constitucional é reflexo do princípio da proteção da família brasileira e implica
a aplicação pelo juiz brasileiro competente da lei mais benéfica ao cônjuge sobrevivente e aos filhos
brasileiros, seja brasileira ou estrangeira, na sucessão dos bens situados no Brasil, pertencentes ao
estrangeiro falecido.
1.3. Outros pontos para aplicação da lei e da sentença estrangeiras no Brasil
 No mais, para aplicação do direito estrangeiro no Brasil, pode o juiz exigir de quem o invoca prova
de seu texto e vigência, na forma dos arts. 14, da LINDB, e 376, do Código de Processo Civil
(CPC).
Ainda, “a prova dos fatos ocorridos em país estrangeiro rege-se pela lei que nele vigorar, quanto ao
ônus e aos meios de produzir-se, não admitindo os tribunais brasileiros provas que a lei brasileira
desconheça” (art. 13 da LINDB).
É competente a autoridade judiciária brasileira, quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver
de ser cumprida a obrigação, sendo que somente ela poderá conhecer ações relativas a imóveis
situados no Brasil (art. 12, § 1º; art. 8º da LINDB).
Anuncia, então, a LINDB, em seu art. 15, que será executada no Brasil a sentença proferida no
estrangeiro que reúna os seguintes requisitos:
 haver sido proferida por juiz competente;
 terem sido as partes citadas ou haver-se legalmente verificado à revelia;
 ter passado em julgado e estar revestida das formalidades necessárias para a execução no
lugar em que foi proferida;
 estar traduzida por intérprete autorizado;
 ter sido homologada pelo Superior Tribunal de Justiça.

Assim, sendo concedido o exequatur, a autoridade brasileira as cumprirá segundo a forma


estabelecida na lei brasileira, observando, porém, a lei do país estrangeiro quanto ao objeto das
diligências.
Na aplicação da lei estrangeira, ademais, deve o juiz se limitar ao seu conteúdo isoladamente, não
sendo possível considerar qualquer remissão feita a outras leis (art. 16 da LINDB).
Estabelece o art. 17 da LINDB, que as leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer
declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a
ordem pública e os bons costumes.
A concepção de ordem pública e de bons costumes deve ser vislumbrada com olhos voltados a
valores vigentes em determinado tempo e o conteúdo desses valores deve ser compatível com os
princípios constitucionais, dada a teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais
constitucionais.  
Por fim, assim revela o art. 18:
tratando-se de brasileiros, são competentes as autoridades consulares
brasileiras para lhes celebrar o casamento e os mais atos de Registro Civil e de
tabelionato, inclusive o registro de nascimento e de óbito dos filhos de
brasileiro ou brasileira nascido no país da sede do Consulado.

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