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Lilian Ferrari
RESUMO
U
ma das principais premissas da Linguística Cognitiva (LC) é a de
que léxico e sintaxe não constituem módulos rigidamente separados,
mas formam um continuum de construções, partindo de elementos
muito específicos, como o item lexical cadeira ou a expressão idiomática dar no
pé, até padrões mais abstratos, tais como a categoria “verbo” ou a construção
transitiva [SN1 V SN2]. A premissa da continuidade léxico-sintaxe sustenta-
se, por sua vez, em outro postulado básico da LC, que é o pareamento entre
forma e significado de acordo com padrões gerais (ou esquemas) que captam
características comuns entre várias instanciações específicas. Por exemplo, as
sentenças “O menino quebrou um copo” e “Eles perderam a cabeça” são ambas
Ferrari, Lilian. Modelos de gramática em
150 linguística cognitiva: princípios convergentes e perspectivas complementares
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ROSCH, E. On the internal structure of perceptual and semantic categories. In:
MOORE, T. (ed.), Cognitive Development and the Acquisition of Language. New York:
Academic Press, 1973, pp.111-44.
ROSCH, E. Principles of categorization. In Rosch, E. e Lloyd, B. (eds.), Cognition and
Categorization, Hillsdale, NJ; NY: Lawrence Erlbaum1978, pp. 27-48.
6
LAKOFF, G & JOHNSON, M. Metaphors we live by. Chicago: The University of
Chicago Press, 1980.
7
FAUCONNIER, G.Mental spaces. Cambridge: Cambridge University Press, 1994.
FAUCONNIER, G. Mappings in thought and language. Cambridge: Cambridge University
Press, 1997.
8
No âmbito da LC, o termo “gramática” tem sido usado de duas formas diferen-
tes: em sentido restrito, gramática corresponde ao conjunto de características sintá-
ticas (por ex., padrões de ordem vocabular) e morfológicas (por ex., flexões); em sentido
amplo, gramática envolve o funcionamento da linguagem de um modo geral, não
se restringindo apenas à sintaxe e à morfologia, mas incluindo outros níveis de
análise, tais como fonologia, semântica e pragmática. O presente artigo assume o
sentido amplo.
Ferrari, Lilian. Modelos de gramática em
152 linguística cognitiva: princípios convergentes e perspectivas complementares
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WITTGENSTEIN, L. Philosophical investigations.(Trad. G.E.M Ascombe). Lon-
don: Basil Blackwell, 1958.
10
BERLIN, B. e KAY, P. Basic color terms: their universality and evolution. Berkeley:
University of California Press, 1969.
11
ROSCH, E. On the internal structure of perceptual and semantic categories. In:
MOORE, T. (ed.), Cognitive Development and the Acquisition of Language. New
York: Academic Press, 1973, pp. 111-44.
ROSCH, E. Principles of categorization. In Rosch, E. e Lloyd, B. (eds.), Cognition
and Categorization, Hillsdale, NJ; NY: Lawrence Erlbaum1978, pp. 27-48.
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BERLIN, B., BREEDLOVE, D. e RAVEN, P. General principles of classification
and nomenclature in folk biology. American Anthropologist 75, 1973, pp. 214-242,
13
ROSCH, E., MERVIS, C., GRAY, W., JOHNSON, D. e BOYES-BRAEM, P.
Basic objects in natural categories. Cognitive Psychology 8, 1976, pp. 382-439.
14
LAKOFF, G & JOHNSON, M. Metaphors we live by. Chicago: The University of
Chicago Press, 1980.
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154 linguística cognitiva: princípios convergentes e perspectivas complementares
3. Modelos de gramática
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CROFT, W. Radical Construction Grammar; syntactic theory in typological pers-
pective. Oxford: Oxford University Press, 2001.
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158 linguística cognitiva: princípios convergentes e perspectivas complementares
ENTIDADES
↓ ↓
COISAS RELAÇÕES
(NOMES)
↓ ↓
ATEMPORAIS PROCESSOS (VERBOS)
↓ ↓
RELAÇÕES RELAÇÕES
ATEMPORAIS ATEMPORAIS
SIMPLES COMPLEXAS
(ADJETIVOS) (ADVÉRBIOS)
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FILLMORE, C. The mechanisms of ‘Construction Grammar’. Berkeley Linguistics
Society 14, 1988, pp. 35-55.
18
GOLDBERG, A . Constructions. Chicago: University of Chicago Press, 1995.
GOLDBERG, A. Constructions at work: the nature of generalization in language.
Oxford: Oxford University Press, 2006
19
A composicionalidade determina que o significado do todo corresponde à soma
dos significados de suas partes componentes.
Ferrari, Lilian. Modelos de gramática em
160 linguística cognitiva: princípios convergentes e perspectivas complementares
↓ ↓ ↓ ↓
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No caso de “colocar”, a correspondência é colocador-causa, colocado-tema e local de colo-
cação-alvo; no caso de “chutar”, a correspondência é chutador-causa e chutado-tema; e no
caso de “cabecear”, o papel que se compatibiliza é cabeceador-causa.
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CHOMSKY, N. Knowledge of language. New York: Praeger, 1986.
22
LEVIN, B. e RAPAPORT, M. Lexical subordination. CLS 24, Part 1, 1988, pp. 275-289.
23
FAUCONNIER, G. e TURNER, M. Conceptual blending and the mind´s hidden
complexities. New York: Basic Books, 2002
24
PEREIRA, F. 2008. Audi equipa um Q7 V12 com acabamento digno de um iate.
In Quatro Rodas. São Paulo:Abril. (http://quatrorodas.abril.com.br/reportagens/sa-
lao/salao_carro_272115.shtml).
Ferrari, Lilian. Modelos de gramática em
162 linguística cognitiva: princípios convergentes e perspectivas complementares
atraente, então saiba que a Audi já pensou nisso e assim criou a proposta de
seu coastline. (...) O branco domina o exterior e o interior do veículo, que foi
intencionalmente criado para parecer um iate terrestre.
A tabela abaixo representa a mesclagem decorrente da projeção analó-
gica entre os domínios “automobilístico” e “náutico”, ativada pelo termo iate
terrestre25:
Embora o termo iate terrestre selecione elementos lexicais que não são
contrapartes nos inputs, esses itens são suficientes para construir a mescla, pos-
sibilitando uma série de correspondências projetivas entre os dois domínios,
como demonstra a Tabela 2.
Com relação às construções sentenciais, Fauconnier e Turner reto-
mam as construções de movimento causado, analisadas por Goldberg, pro-
pondo uma análise baseada em mesclagem conceptual. Para ilustrar a proposta
dos autores, observemos a representação da mesclagem ativada pela constru-
ção O jogador cabeceou a bola para o gol:
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A análise é análoga à que foi sugerida, por Fauconnier e Turner (2002: 357), para
a expressão inglesa correspondente “land yatch”.
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Movimento
CAUSAR
Tema (SN) Bola Bola/tema
MOVER
Alvo (SP) Para o gol Para o gol/alvo
Tabela 3 – Mesclagem conceptual referente à construção “O jogador cabeceou a
bola para fora o gol”.
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O verbo cabecear estabelece apenas um papel participante, e costuma ser usado para indicar
movimento voluntário ou involuntário com a cabeça, como nas sentenças Enquanto dormia,
o rapaz cabeceava e Aquele jogador é quem melhor cabeceia na seleção.
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4. Conclusão
ABSTRACT