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Portugal: o Estado Novo

O triunfo das forças conservadoras

O golpe de 28 de maio de 1926 obteve o apoio de monárquicos, católicos, republicanos e


de setores tradicionalistas nacionalistas ligados ao Integralismo Lusitano. Permaneceu a
instabilidade política, traduzida na tomada de posse de vários chefes de governo – Mendes
Cabeçadas, Gomes da Costa, Sinel de Cordes e Óscar Carmona. A ação destes governos não se
revelou eficaz quanto à questão financeira, e o défice agravou-se.

Em 1928, António de Oliveira Salazar foi convidado para a pasta das Finanças, impondo
condições para assumir o cargo, que equivaliam a uma ditadura financeira: controlar os
orçamentos dos diferentes ministérios e vetar qualquer aumento de despesa. O primeiro
orçamento ficou marcado pelo equilíbrio das contas públicas e Salazar foi considerado o salvador
da pátria. Restabeleceu a ordem financeira, através da diminuição da despesa e do aumento dos
impostos. Em 1930, assumiu a pasta das Colónias e a 5 de julho de 1932, foi nomeado presidente
do Conselho.

Entre 1930 e 1933, foram criadas instituições e publicadas legislações:

• O Ato Colonial, o Estatuto do Trabalho Nacional e a criação do Secretariado de


Propaganda Nacional;
• As bases da organização da União Nacional, em 1930 – partido único – liderado por Salazar
em 1932;
• A promulgação da constituição de 1933, decisiva na consagração do novo poder – o Estado
Novo.

O fascismo italiano marca o contexto político e ideológico europeu e, desta forma


algumas práticas e instituições do Estado Novo aproximam-se do ideário fascista.

Ideologias

→ E STADO AUTORITÁRIO , ANTIDEMOCRÁTICO, ANTILIBERAL, ANTIPARLAMENTAR E ANTIPARTIDÁRIO

O Estado Novo rejeitou a DEMOCRACIA PARLAMENTAR , assumindo-se como um REGIME


AUTORITÁRIO que se propunha romper com a desordem da Primeira República. As lutas políticas e
os partidos eram o principal entrave à ordem. Criou-se um PARTIDO ÚNICO – a União Nacional, uma
entidade nacional que englobava todos os portugueses preocupados com o bem comum,
estando acima dos interesses individuais. O Estado Novo recusou também o DEMOLIBERALISMO e
do PLURIPARTIDARISMO, levando à afirmação de um Estado forte e autoritário – tudo pela nação,
nada contra a nação.

Com a constituição de 1933, o estado passa a assentar em quatro órgãos: o Presidente da


República, a Assembleia Nacional, o Governo e os Tribunais. Previa o voto universal e direto. A
aparência democrática era contrariada pelo princípio do partido único, pelo autoritarismo e
supremacia do chefe de governo e pelas restrições à liberdade de associação. O poder executivo
(Governo), controlado por Salazar, sobrepõe-se ao poder legislativo (Assembleia Nacional). O
poder centrou-se em Salazar, considerado chefe da nação, cuja imagem era objeto de culto e
centro de propaganda do regime.

→ E STADO NACIONALISTA , TRADICIONALISTA E CONSERVADOR

O NACIONALISMO constituiu-se como um princípio ideológico do Estado Novo, com base


no culto do passado histórico da nação – mitificou-se a ideia do passado glorioso da pátria e dos
portugueses como um povo de heróis; valorizam-se as tradições populares e os elementos
tipicamente portugueses; exaltou-se a singularidade da nação. O Estado Novo assentou nos
valores da TRADIÇÃO e do CONSERVADORISMO . Sob a defesa de Deus, Pátria e Família erguiam-se os
valores nacionais, inquestionáveis. A religião era um pilar fundamental, não se discutia Deus. A
família assentava na autoridade do pai, obediência dos filhos, honra e submissão da mulher. O
salazarismo procurou dotar a sociedade de uma nova moral, vivia-se de forma pacata, cultivava-
se a simplicidade – os valores materiais subordinavam-se aos valores materiais.

Práticas levadas a cabo para implementação da ideologia

→ E STADO DOUTRINADOR E ENQUADRAMENTO DE MASSAS

Foram criadas diversas instituições e utilizados vários meios para o enquadramento de


massas. O partido único, a União Nacional, garantiu o apoio ao regime e às suas atividades,
eliminando a oposição. O SECRETARIADO DE PROPAGANDA NACIONAL, dirigido por António Ferro,
divulgou doutrina salazarista, através da propaganda que contribuiu para projetar a imagem de
Salazar, para exaltar obras do regime e para valorizar a tradição cultural portuguesa.
Em 1936, a reforma do ensino fez da instrução meio de doutrinação e de imposição dos
valores do Estado Novo. Através do livro único, o ensino difundia os valores da tradição, do
conservadorismo, da moral cristã e exaltava Salazar e o Estado Novo. Procurava doutrinar as
crianças e incutir o sentimento de submissão e de conformismo. O enquadramento da juventude
foi promovido através da MOCIDADE PORTUGUESA , uma organização para jovens entre os 11 e os 14
anos, que preparava cívica e fisicamente os jovens para o militarismo, a disciplina a obediência e
o patriotismo a par de uma educação cristã.

A LEGIÃO PORTUGUESA era uma organização paramilitar para adultos, cujo objetivo era lutar
contra o comunismo e manter a unidade do Estado. A adesão aos princípios do regime foi
conseguida com a obrigatoriedade de os funcionários públicos declararem a sua fidelidade ao
Estado Novo.

Para ocupar o tempo livre dos funcionários foi criada a Fundação Nacional para a Alegria
no Trabalho, em 1935, para garantir o desenvolvimento físico, moral e intelectual dos
trabalhadores. O enquadramento das mulheres fez-se com a MOCIDADE PORTUGUESA FEMININA e
com o movimento da Obra das Mães pela Educação Nacional, para reeducar a mulher, levando-a
para o lar novamente. Nestes, valorizava-se a educação na família e os papéis tradicionais.
Ensinava-se a cuidar dos filhos e dor lar, defendiam-se os bons costumes, a prática da caridade e
a colaboração com a escola na educação moral e cívica.

→ UMA ECONOMIA SUBMETIDA AOS IMPERATIVOS POLÍTICOS : PRIORIDADE À ESTABILIDADE FINANCEIRA

A constituição de 1933 consagrou a intervenção do Estado na economia, competindo a


este regular as relações da economia nacional, em termos internos e externos. Garantia a
iniciativa particular e estabeleceu regras para evitar a concorrência desleal. Promoveu a autarcia
económica.

O controlo das finanças e o equilíbrio orçamental foram uma prioridade para o Estado
Novo. Quando Salazar ocupou a pasta das Finanças, a estabilização financeira e monetária era a
sua prioridade. Os orçamentos de 1928 a 1931 apresentaram um saldo positivo – o superavit, a
melhor gestão das contas públicas e a política de austeridade permitiram aderir ao padrão-ouro,
em 1931. Este foi conseguido sobretudo através da criação de novos impostos. Nos anos 30, as
contas públicas adquiriram uma maior solidez. A política intervencionista levada a cabo pelo
Estado, com vista a garantir a autarcia, com o capitalismo liberal, lançou as bases do
desenvolvimento económico.
→ A DEFESA DA RURALIDADE

A defesa da ruralidade foi uma das imagens de propaganda. Portugal era um país rural,
em que a maior parte da população ativa trabalhava no setor primário (agricultura). A aposta na
ruralidade permitiu relançar a economia, a par do equilíbrio financeiro. A valorização e o fomento
agrícola visavam garantir a autarcia, diminuindo a dependência face ao estrangeiro e aumentando
as exportações.

Em 1929, Salazar lançou a CAMPANHA DO TRIGO. Esta traduziu-se num aumento da produção
do cereal, permitindo abastecer os mercados interno e externo. Traduziu-se também numa
redução do desemprego rural e contribuiu para o desenvolvimento de setores industriais ligados
à produção agrícola. Salazar promoveu outras campanhas agrícolas: da vinha, da produção de
azeite, da cortiça, da batata e da fruta.

A política económica do Estado Novo ficou ainda marcada pelo PLANO DE FLORESTAÇÃO -
para converter terrenos áridos em terras aráveis - e pelo APROVEITAMENTO DE RECURSOS HIDRÁULICOS
- construíram-se barragens e canais para melhor irrigação dos solos.

→ OBRAS PÚBLICAS

O Estado Novo, com Duarte Pacheco – o ministro de Salazar – empreendeu um programa


de obras públicas, para modernizar o país, impulsionar o desenvolvimento económico e reduzir
o desemprego.

INFRAESTRUTURAS :

• construção de estradas, de pontes, de uma rede de autoestradas, facilitando a ligação com


o interior;
• rede ferroviária com melhorias na qualidade das locomotivas, carruagens e da
eletrificação;
• portos melhorados e alargados (Leixões, Lisboa, Funchal);
• novos aeroportos (Portela, Porto e Funchal);
• construção de barragens e centrais hidroelétricas, diminuindo a dependência energética
do país face ao exterior.

MEIOS DE COMUNICAÇÃO : tiveram um importante desenvolvimento e as redes de telefone e de


telégrafo foram expandidas.
Foram construídos edifícios públicos, como hospitais, escolas, tribunais, prisões, estádios,
pousadas e bairros para os trabalhadores. Outros foram restaurados, como o Palácio de Queluz
e o Teatro de S. Carlos.

Foi adotado o CONDICIONAMENTO INDUSTRIAL – uma política anticrise, consolidada com as leis de
1931 e de 1937. O atraso das estruturas produtivas era marcante e o setor secundário tinha pouco
peso na estrutura da população ativa de 30 a 40 anos. Tinha como OBJETIVOS:

• Promover a intervenção do Estado na economia;


• Impor regras para evitar a superprodução;
• Defender o nacionalismo económico;
• Regular a atividade produtiva e a concorrência;
• Atenuar o desemprego.

O Estado era o mediador entre os interesses privados e os interesses coletivos. As firmas


instaladas no mercado podiam contestar a criação de novas empresas pois, segundo esta
conceção, a entrada de uma empresa concorrente significava a queda dos preços dos produtos,
a diminuição da qualidade e dificultava o abastecimento de matérias-primas. Ao Estado cabia
autorizar a instalação de novas fábricas, a montagem e a substituição de maquinaria. O
condicionamento industrial, característico do Estado Novo, nos anos 30 e 40, impediu a
concorrência, protegeu empresas, favoreceu a concentração industrial, limitou a modernização.

• A CORPORATIVIZAÇÃO DOS SINDICATOS

Através do Estatuto do Trabalho Nacional, em 1933, o corporativismo foi adotado como forma de
organização económico-social. Assumiu-se como uma alternativa ao capitalismo liberal e ao
coletivismo socialista. Procurava a criação do máximo de riqueza e de produção, em equilíbrio
com os princípios de harmonia social e dos interesses do Estado.

• Visava garantir a colaboração entre classes, através da ação do Estado;


• Conciliava os interesses do patronato e dos assalariados;
• Assegurava o bem comum e promovia a unidade nacional;
• Garantiu a ordem, a disciplina e autoridade, no campo social e económico;
• Promovia a manutenção de baixos salários e de longas jornadas.
A adoção do corporativismo levou à criação da Câmara Corporativa, que estava submetida à
Assembleia Nacional e ao Governo. Os organismos corporativos estavam submetidos ao poder
central e organizados hierarquicamente:

• Corporações, que integravam os setores económicos (agricultura, pesca, comércio), as


corporações morais para assistência e caridade (hospitais, creches), e corporações
culturais, no âmbito da educação física, arte, ciência e cultura (universidades, academias,
associações científicas, literárias e desportivas);
• Federações e Uniões, nacionais ou regionais, que compreendem associações de
sindicatos, uniões de grémios e uniões de casa do povo;
• Grémios, que reúnem o patronato e empresas privadas em geral;
• Sindicatos nacionais, distritais, que reúnem trabalhadores do comércio e da indústria (as
profissões liberais formavam um sindicato nacional único, sedeado em Lisboa, algumas
constituíam-se em ordens);
• Casas do povo, reúnem agricultores e proprietários agrícolas, de cada freguesia;
• Casa dos pescadores, reúnem pescadores e seus patrões, de cada freguesia.

Através da regulação corporativa, definiam-se contratos de trabalho, salários e cotas de


produção. O corporativismo considerou a greve um delito político e uma rebelião, condenando
o despedimento coletivo pelos patrões (lockout). Os sindicatos livres foram abolidos e foi
decretada a inscrição obrigatória nos sindicatos nacionais, aprovados pelo governo. A 18 de
janeiro de 1934, um conjunto de greves, de sabotagem das redes elétricas e ferroviárias e
levantamentos da marinha grande não impediram a corporativização dos sindicatos. A ação
repressiva do governo pôs fim ao movimento sindicalista livre, durante o Estado Novo.

→ A POLÍTICA COLONIAL

O Ato Colonial, promulgado em 1930 e integrado na constituição de 1933, consagrou a


noção de império colonial português (integrava a metrópole e as colónias). Valorizou a mística de
vocação imperial de Portugal, que resultava do papel civilizador do país no mundo. A soberania
da administração dos territórios coloniais e a defesa dos indígenas era exercida a partir da
metrópole. A ação de Portugal nas colónias era como uma missão civilizadora, para educar e
cristianizar os povos autóctones.

Em termos económicos, estabelecia-se a complementaridade entre a economia da


metrópole e das colónias. As colónias eram mercadas de escoamento dos produtos industriais
metropolitanos, como têxteis produtos alimentares e cimento. A metrópole recebia matérias-
primas coloniais a preços reduzidos, como algodão, açúcar, minérios. Assim, as colónias
submetiam-se aos interesses da metrópole. A mística imperial e a vocação civilizadora foram
propagandeadas através de congressos, colóquios, conferências coloniais e exposições
(exposição colonial do Porto e Exposição do Mundo Português).

→ O PROJETO CULTURAL DO REGIME

Num país rural, os valores conservadores e ruralistas refletiam-se na cultura. A


modernidade foi afastada e as formas de expressão, como o individualismo criativo, a emoção e
intuição, foram abandonas. Através do SPN, foi desenvolvida a Política do Espírito, para elevar o
nível cultural do povo, valorizando a cultura popular e o espírito nacional. O espírito da nação, o
gosto popular, os valores da tradição, o amor à pátria e a grandeza do império estavam enraizados
no novo gosto e nova mensagem, pela política cultural. A arte foi dominada pelo mítico povo
lusitano, pela sua história, pela arte popular e pelo pitoresco. A cultura foi padronizada e a livre
produção cultural foi restringida.

O SPN promoveu exposições, festivais de folclore, concursos literários e artísticos, para


propagandear os ideais do regime e promover a educação popular, e por apoiar artistas e
escritores na divulgação de atividades culturais.

O regime do Estado Novo procurou ganhar visibilidade no exterior, participando em exposições


em Paris e em Nova Iorque. Em Portugal, através das exposições Colonial do Porto e do Mundo
Português (1940), a grandiosidade do Império e os valores nacionais foram exaltados. Foram
associadas duas datas importantes na construção da nacionalidade – a fundação de Portugal, em
1143, e a restauração da independência, em 1640.

→ E STADO REPRESSIVO

O Estado Novo fez uso de meios de repressão para controlar a informação e evitar a
contestação e a dissidência política. A CENSURA foi um meio de repressão. Apesar de consagrada
a liberdade de expressão, na prática, o controlo da imprensa, da rádio e do cinema visava impedir
a difusão de ideologias contrárias ao regime. Os censores deviam identificar os conteúdos
considerados perigosos e, que por isso, eram cortados.

A POLÍCIA POLÍTICA, denominada Polícia de Vigilância e de Defesa do Estado (PVDE) e depois de


Polícia Internacional de Defesa do Estado (PIDE), vigiava, perseguia, prendia e torturava os
opositores ao regime. Podia fazer prisões sem culpa formada ou ordem judicial. Depois da prisão,
o detido era isolado, durante vários dias, submetido a torturas físicas ou psicológicas, com longos
períodos de fome. As confissões obtidas através da tortura eram consideradas válidas pelos
tribunais. Os comunistas foram os principais alvos da polícia política.

→ SEGUNDO MODERNISMO PORTUGUÊS


• Mário Eloy: dimensão psicológica, de raiz expressionista; pintou cenas populares
urbanas, a construção de um mundo sonhado e um profundo dramatismo; afastou-se da
representação do real e assumiu um carácter utópico e intimista; simplicidade do
desenho, esbatimento de planos e cores contrastantes, aproximando-se da
bidimensionalidade.

Júlio dos Reis Pereira: cunho de ingenuidade e de intimismo, pureza de cores, linhas e formas, e
carácter lírico; forte crítica social (surgem burgueses e prostitutas que revelam o decadentismo
da sociedade).

• Sarah Affonso: influenciada pela arte popular, com a temática popular e infantil;
simplificação gráfica e maior pureza das cores; temas: cenas de casamentos, ex-votos e
retratos da vida no campo; importância das tradições populares; paleta de cores eras
depurada, o traçado reduzido a elementos essenciais; deixou de pintar o povo, para pintar
como o povo.

Literatura: revista Presença como um meio de expressão (João Gaspar Simões, Branquinho da
Fonseca e José Régio), que continha nomes como Júlio, Mário Eloy, e Sarah Affonso; não se
identifica com a vida intelectual da capital; defesa de valores: originalidade e ingenuidade.

Arquitetura: princípios mais racionais e geométricos, com simplicidade e linhas direitas; Raul Lino
(cinema Tivoli), Jorge Segurado (casa da moeda), Cottinelli Telmo (expansão da universidade de
Coimbra) e Cassiano Branco (cineteatro Éden).

Música: Luís de Freitas Branco, com Segunda Suíte Alentejana; Lopes Graça, com Variações Sobre
um Tema Popular Português.

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