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ANÁLISE JURÍDICA DOS IMPACTOS

Revista Eletrônica Casa de Makunaima - ISSN 2595-5888


Vol. 1 - Nº 1 / Jan./Jun. (2018)
SOCIOAMBIENTAIS E URBANOS DAS OBRAS DE
MACRODRENAGEM: IGARAPÉ CAXANGÁ EM BOA
VISTA, RORAIMA

Ítalo Giulliano Ozório de Souza


Acadêmico de Direito
Universidade Federal de Roraima
italosouzsa@gmail.com

Lucas Tavares da Silva


Acadêmico de Direito
Universidade Federal de Roraima
luk_tavares@hotmail.com

Zedequias de Oliveira Júnior


Prof. Msc. da Universidade Federal de Roraima
Promotor de Justiça do Ministério Público de Roraima Trecho do Igarapé Caxangá entre a Av. Gatúlio Vargas e
zedequiasjunior@hotmail.com Av. Sebastião Diniz

RESUMO RESUMEN

O presente artigo científico, por meio de análise críti- El presente artículo científico, por medio de análisis crí-
ca, da pesquisa bibliográfica e da visitação in loco, tem tico, de la investigación bibliográfica y de la visitación in
como objetivo traçar, prima facie, generalidades sobre loco, tiene como objetivo trazar, prima facie, generali-
a macrodrenagem, sua definição, consequências, a ne- dades sobre el macrodrenaje, su definición, consecuen-
cessidade de licenciamento ambiental para este tipo cias, la necesidad de licenciamiento ambiental para este
de empreendimento que é considerado potencialmente tipo de emprendimiento que es que se considera po-
poluidor em face de suas características e alcance, mor- tencialmente contaminante frente a sus características
mente sobre as que atingem, direta ou indiretamente y alcance, principalmente sobre las que alcanzan, direc-
o igarapé Caxangá, localizado na parte central de Boa ta o indirectamente el igarapé Caxangá, ubicado en la
Vista, capital do estado amazônico de Roraima. Disser- parte central de Boa Vista, capital del estado amazónico
ta-se, ainda, sobre as responsabilidades previstas no de Roraima. Se discutía, además, sobre las responsabi-
ordenamento jurídico-ambiental brasileiro comuns ao lidades previstas en el ordenamiento jurídico-ambien-
poder público e às empresas contratadas quando do co- tal brasileño comunes al poder público ya las empre-
metimento de infrações, sobretudo em relação as impli- sas contratadas cuando de la comisión de infracciones,
cações urbanas e os subsequentes efeitos ambientais e sobre todo en relación a las implicaciones urbanas y
sociais que estão correlacionados com o princípio cons- los subsecuentes efectos ambientales y sociales que
titucional do desenvolvimento sustentável. Desta forma, están correlacionados con el principio constitucional
é preciso compreender esta dinâmica da construção da del desarrollo sostenible. De esta forma, es necesario
produção e reprodução do espaço urbano frente as pre- comprender esta dinámica de la construcción de la pro-
missas cogentes, tendo em conta bases históricas dos ducción y reproducción del espacio urbano frente a las
problemas de obras do gênero e repercussão antrópicas premisas que se plantean, teniendo en cuenta bases
até a integração no sistema de macrodrenagem perten- históricas de los problemas de obras del género y reper-
cente ao projeto do Parque do Rio Branco. Indispensável cusión antrópica hasta la integración en el sistema de
é, entretanto, fomentar mecanismos legais que possam, macrodrenaje perteneciente al proyecto del Parque del
de algum modo, propiciar condições para validar o di- Río blanco. Sin embargo, indispensable es fomentar me-
reito humano fundamental de todos à sadia qualidade canismos legales que puedan, de algún modo, propiciar
de vida (art. 225, caput, da Constituição da República Fe- condiciones para validar el derecho humano fundamen-
derativa do Brasil). tal de todos a la sana calidad de vida (art. 225, caput,
Palavras - chave: Macrodrenagem. Igarapé Caxangá. Li- de la Constitución de la República Federativa del Brasil).
cenciamento. Responsabilidade. Desenvolvimento Sus- Palabras clave: Macrodrenaje. Igarapé Caxangá. La con-
tentável. Implicações. cesión de Licencias. Responsabilidad. Desenvolvimiento
Sustentable. Implicaciones.

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Mato Grosso e as regiões ao norte do paralelo


13° S de Tocantins e Goiás e oeste do meridia-
INTRODUÇÃO no de 44° W do Maranhão (BRASIL. Lei 12.651,
2012, art. 3º, I), numa área total aproximada de
A expansão dos centros urbanos bra- 5.020.000 km² ou 58,95% do território
sileiros é acompanhada de muitos desafios brasileiro (IBGE, 2018).
socioambientais, dentre os quais estão os A capital de Roraima está localizada na
direitos básicos do cidadão à moradia e ao Amazônia Setentrional e inserida no Pedipla-
saneamento, considerados trincheiras para no Rio Branco, cuja superfície se estende até a
o desenvolvimento sustentável. A razão des- serra de Pacaraima ao Norte, vindo a compre-
ta assertiva está alicerçada na constatação ender uma área extensamente plana, algumas
da célere transformação evidenciada nestes vezes interrompida por pequenas ondulações
espaços diretamente propiciada pela concen- e depressões incipientes, por onde meandram
tração populacional, alinhado à ineficiência igarapés, intermitentes ou não, marcados por
das políticas públicas em nível federal, esta- alinhamento de veredas de buritis e inúmeras
dual ou municipal. lagoas fechadas ou parcialmente drenadas
Em face disto, soluções de engenharia (SCHAEFER, 1994; VALE JÚNIOR, 2000; VALE JÚ-
urbanística surgem para aliviar gargalos de NIOR, SOUSA, NASCIMENTO, 2014).
infraestrutura das grandes, médias e peque- A historicidade e seu contexto alusivo
nas cidades. Todavia, nem sempre estas es- ao mencionado curso d'água, seja quanto ao
tratégias coadunam com os princípios e dire- passado e presente, com suas graves conse-
trizes traçadas pela Política Nacional do Meio quências socioambientais, não pode olvidar
Ambiente, Lei nº 6.938 de 1981, e os preceitos de eventuais implicações acerca deste recur-
de ordem constitucional ambiental (art. 225) so natural para o futuro da proteção ambien-
que indica o meio ambiente como direito hu- tal nesta área.
mano fundamental e essencial à sadia quali- As obras de canalização que represen-
dade de vida. Imperioso, outrossim, é valer-se tam parte de sistema de macrodrenagem
das regras jurídicas aplicáveis à regularização existente e afeta diretamente o comentado
de empreendimentos do gênero pela via do igarapé, ademais, estão incluídas no projeto
licenciamento ambiental e das nuances san- municipal de construção do empreendimen-
cionatórias estabelecidas na ordem legal vi- to denominado Parque do Rio Branco que se
gente. constituem em elementos deveras importante
Neste artigo científico, o objeto principal nesta dinâmica urbana, social e ambiental.
é avaliar a influência das obras de macrodre- Para tanto, o processo formal e sistemá-
nagem realizadas no Igarapé Caxangá na pro- tico utilizado no desenvolvimento deste tra-
dução e reprodução do espaço urbano e seu balho envolveu o método científico dedutivo
paralelo com problemas socioambientais e aplicado para analisar, demonstrar e justificar
descumprimento de obrigações legais e cons- o objeto proposto por meio de recursos lógi-
titucionais, as quais deveriam garantir, efe- co-discursivos e levantamento de dados téc-
tivamente, a promoção do desenvolvimento nico-científicos de fontes bibliográficas acer-
sustentável. Referido curso d'água está loca- ca do tema e das normas jurídicas aplicáveis.
lizado no bairro central do município amazô- O racionalismo crítico, ademais, propiciou
nico Boa Vista, Estado de Roraima, que integra meios para arregimentar uma avaliação deste
a configuração geopolítica cuja terminologia é quadro e seus nefastos resultados.
Amazônia Legal, juntamente com os estados
do Acre, Pará, Amazonas, Rondônia, Amapá, DISCUSSÃO

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A MACRODRENAGEM COMO MEIO pelo aumento da velocidade de escoamento


superficial e a redução de recarga dos lençóis
DE INTEGRAÇÃO URBANA DE COR- freáticos.
REDORES NATURAIS DE ÁGUAS Do mesmo modo, a implementação de-
sorganizada de um sistema de drenagem pode
levar a graves consequências ambientais e
GENERALIDADES socioeconômicas como ao aumento das velo-
cidades de escoamento e consequente trans-
O sistema de drenagem é compreendido ferência de inundação para a jusante1; à elimi-
como um conjunto de obras de infraestrutu- nação de ecossistemas aquáticos; a processos
ra urbana destinado à realização de coleta, erosivos nas margens dos cursos d’água e a
transporte e lançamento final de águas su- elevados custos para o município, sem, neces-
perficiais. sariamente, obter resultados efetivos.
Nada mais é que uma série de medidas Durante anos, a estratégia utilizada
que visam a minimizar os riscos a que es- quando da execução de drenagens este-
tão expostas as populações em decorrência ve voltada à retificação de cursos de água e
de eventuais ou constantes inundações para ao revestimento de suas calhas. Atualmente,
possibilitar um desenvolvimento urbano har- porém, busca-se a despoluição dos corredo-
mônico, articulado e, principalmente, ambien- res de água e a manutenção das várzeas de
talmente sustentável. inundação, de forma a dispensar obras estru-
Referido sistema é comumente dividido turantes, reduzir custos e problemas gerados
em duas categorias: Microdrenagem e Macro- pelas mesmas, aproveitando-se o potencial
drenagem. urbanístico que as áreas verdes e parques li-
A microdrenagem é formada pelas redes neares podem gerar.
coletoras de águas pluviais (poços de visita, Partindo dessa perspectiva é que a aná-
sarjetas, bocas-de-lobo e meios-fios), con- lise jurídica dos itens seguintes será feita, de
junto de condutos pluviais presentes nos lo- modo que a substituir o binômio prevenção-
teamentos ou na rede primária urbana. São -integração pelo binômio prevenção-preser-
estruturas que conduzem as águas do esco- vação.
amento superficial para as galerias ou canais
urbanos para lidar com precipitações de risco LICENCIAMENTO AMBIENTAL PARA
moderado.
Por sua vez, a macrodrenagem abrange OBRAS DE CANALIZAÇÃO FLUVIAL
diversos sistemas de microdrenagem a fim de
suportar precipitações de maior risco de acor- Inexiste direito subjetivo à livre utiliza-
do com as circunstâncias socioambientais do ção dos recursos naturais, uma vez que o meio
local. ambiente é qualificado como patrimônio de
Como afirmado, a drenagem tem por fi- uso coletivo. Devido a isso, faz-se necessário
nalidade a prevenção de danos e a minimi- o consentimento estatal, o que se dá por meio
zação de riscos gerados principalmente por do licenciamento ambiental, instrumento de
enchentes ou inundações. Estas ocorrem es- gestão ambiental que busca a implementação
pecialmente pela ocupação indevida de popu- dos princípios do desenvolvimento sustentá-
lações em áreas de risco e pela urbanização, vel, da prevenção e da precaução.
responsável pela redução significativa da per- Esta compreensão, anterior mesmo à
meabilidade do solo e, consequentemente, Constituição Federal de 1988, é perceptível na
1 Ponto referencial a qual dirige-se o fluxo natural das águas, do local de maior altitude para o de menor
altitude.

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Lei 6938/1981, em seu art. 9ª, IV, que relaciona Sendo um procedimento administrativo,
o licenciamento ambiental como instrumen- o licenciamento ambiental é um conjunto de
to da Política Nacional de Meio Ambiente cuja atos que deve obedecer às etapas previstas
definição, por sua vez, está prevista no art. 2ª, no art. 10 da Resolução do Conselho Nacional
I, da Lei Complementar 140/2011, in verbis: do Meio Ambiente (CONAMA) nº 237/97, norma
que prevê o procedimento e critérios utiliza-
dos em tal instrumento.
[...] procedimento administrativo destinado a li- Dentro desse conjunto de atos, destaca-
cenciar atividades ou empreendimentos utiliza-
-se a imprescindibilidade de estudos ambien-
dores de recursos ambientais, efetiva ou poten-
cialmente poluidores ou capazes, sob qualquer tais que devem ser realizados para subsidiar
forma, de causar degradação ambiental. a análise da licença requerida. Conforme o
inciso I da norma sob análise, cabe ao órgão
ambiental competente, com a participação do
Nesse contexto, a construção de obras empreendedor, definir qual o estudo ambien-
de infraestrutura destinadas à Macrodrena- tal pertinente ao empreendimento desejado.
gem não escapa à necessidade do referido li- Porém, em se tratando de instalação de
cenciamento, de forma prévia inclusive, como obra ou atividade potencialmente causadora
nítido no art. 3ª, III Resolução 005/1988 e no de significativa degradação do meio ambien-
art. 2ª, caput, e anexo I da Resolução 237/1997, te, na forma do art. 225, §1ª, IV, da Constituição
ambas do Conselho Nacional do Meio Am- Federal de 1988, há obrigatoriedade de Estudo
biente: Prévio de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório
de Impacto Ambiental (RIMA).
Res. 005/1988, Art. 3º - Ficam sujeitas a licencia-
Ademais, em se tratando de obra pública
mento as obras de sistemas de abastecimento de receptora de recursos do Ministério da Inte-
água sistemas de esgotos sanitários, sistemas de gração2, a instituição financeira que liberou
drenagem e sistemas de limpeza urbana a seguir e liberará valores deveria, obrigatoriamente,
especificadas: atuar em conformidade com a redação do art.
[...]
III - Em Sistemas de Drenagem:
12 da Lei de Política Nacional do Meio Ambien-
a) obras de lançamento de efluentes de sis- te, condicionando quaisquer repasses a regu-
temas de microdrenagem; laridade do procedimento do licenciamento
b) obras de canais, dragagem e retificação ambiental e, criteriosamente, ao cumprimen-
em sistemas de macrodrenagem. to das normas, critérios e padrões expedidos
Res. 237/1997, art. 2º - A localização, construção,
pelo CONAMA.
instalação, ampliação, modificação e operação Em face das implicações cogentes quan-
de empreendimentos e atividades utilizadoras to a forma com que recursos públicos deve-
de recursos ambientais consideradas efetiva ou riam ser utilizados, especialmente quando
potencialmente poluidoras, bem como os empre- há alteração da qualidade ambiental (art. 3º
endimentos capazes, sob qualquer forma, de cau-
sar degradação ambiental, dependerão de prévio
da Lei nº 6.938/1981), deveria ser exigido pre-
licenciamento do órgão ambiental competente, visão nos projetos técnicos da realização de
sem prejuízo de outras licenças legalmente exigí- obras e aquisição de equipamentos destina-
veis (grifo nosso) dos ao controle de degradação ambiental e
[...] que pudessem redundar na melhoria da qua-
Anexo 1 – Atividades ou empreendimentos sujei-
tos ao Licenciamento Ambiental Obras Civis
lidade do meio ambiente. Estas inserções, ex
- Canais para Drenagem. vi legis, não são opções a cargo do financiador
e muito menos do município de Boa Vista que
é o gestor dos repasses no interesse da coleti-
2 Conforme extrato de contrato que prevê o Termo de Compromisso nº 065/2016/Ministério da Integra-
ção. Disponível no Diário Oficial da União de 29 de dezembro de 2017.

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vidade, seja ou não diretamente afetada pelo encontra arcabouço na Constituição Federal,
empreendimento. em seu art. 225, §3ª:
Também constituem atos de grande re-
levância ambiental dentro do contexto da ma-
crodrenagem a emissão de Certidão da Prefei- § 3º As condutas e atividades consideradas le-
tura Municipal, cuja finalidade é declarar que sivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores,
pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e
o local e o tipo de empreendimento ou ativi- administrativas, independentemente da obriga-
dade adequam-se à regulamentação do uso e ção de reparar os danos causados (grifo nosso)
ocupação do solo local, e a autorização para
supressão de vegetação, uma vez que as áreas
periféricas aos igarapés de Boa Vista (em uma Apesar de o art. 225, caput, da Constitui-
variação de 50m a 100m) são áreas de preser- ção Federal impor ao Estado (lato sensu) o de-
vação ambientais (APA’s). ver de defender e preservar o meio ambiente,
Após a conclusão de todas as etapas do isso não impede que uma pessoa jurídica de
art. 10 da Resolução 237/97, a Administração direito público e as de direito privado pres-
Pública expedirá licença ambiental, ato admi- tadoras de serviços públicos (construtoras,
nistrativo pelo qual o órgão ambiental com- na hipótese) no exercício de suas atribuições,
petente estabelece condições, restrições e eventualmente causem dano a tal bem de in-
medidas de controle ambiental que deverão teresse difuso.
ser obedecidas pelo empreendedor. Para tais hipóteses, prevê o §6ª do art. 37
da Carta Maior:
A RESPONSABILIDADE CIVIL, ADMI-
NISTRATIVA E PENAL ENTRE O PO- § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as
de direito privado prestadoras de serviços públi-
DER PÚBLICO E AS CONSTRUTORAS cos responderão pelos danos que seus agentes,
nessa qualidade, causarem a terceiros, assegura-
Em decorrência do princípio do Polui- do o direito de regresso contra o responsável nos
dor-Pagador (Princípio da Responsabilidade), casos de dolo ou culpa.
todas as despesas e custos quanto à realiza-
ção de estudos de impacto ambiental recairão Tais normas constitucionais, atreladas
sobre o proponente do projeto (empreende- à definição de “poluidor” externada pela Lei
dor). 6938/1981, art. 3ª, IV, torna inquestionável a
Dessa forma, às expensas do empreen- possibilidade de responsabilização do Poder
dedor, os estudos necessários ao processo de Público e da pessoa jurídica de direito priva-
licenciamento ambiental serão necessaria- do prestadora de serviços públicos por danos
mente realizados por profissionais legalmen- ao meio ambiente: “poluidor, a pessoa física
te habilitados. ou jurídica, de direito público ou privado, res-
A responsabilidade pelo conteúdo dos ponsável, direta ou indiretamente, por ativi-
estudos, do mesmo modo, recai sobre o em- dade causadora de degradação ambiental”.
preendedor e sobre seus autores de forma Estabelecida essa assertiva, passamos à aná-
que estão sujeitos à tríplice sanção: adminis- lise de cada modalidade de sanção.
trativa, civil e penal, todas autônomas entre No que tange à responsabilidade civil,
si. suficiente é a análise do art. 14, §1ª, da Lei nº
Tamanha a relevância do bem jurídico 6938/1981 para verificar que a mesma é obje-
em questão (meio ambiente ecologicamente tiva.
equilibrado), que a tríplice responsabilização

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ção penal da pessoa jurídica independente-


[…] é o poluidor obrigado, independentemente mente da responsabilização simultânea de
da existência de culpa, a indenizar ou reparar os pessoa física, não havendo aplicação da teo-
danos causados ao meio ambiente e a terceiros, ria da dupla imputação conforme a jurispru-
afetados por sua atividade. O Ministério Público dência dos tribunais superiores.
da União e dos Estados terá legitimidade para Por fim, destaca-se a responsabilidade
propor ação de responsabilidade civil e criminal,
por danos causados ao meio ambiente (grifo nos- administrativa, incidente em toda conduta co-
so). missiva ou omissiva que viole as regras jurídi-
cas de relativas a uso, gozo, promoção, prote-
Assim, para surgir a obrigação de inde- ção e recuperação do meio ambiente.
nizar ou reparar os danos ambientais, basta Essa modalidade de responsabilidade
a comprovação do dano e do nexo de causa- não exige dano efetivo ao meio ambiente.
lidade. A responsabilidade civil é tida, ainda, Basta a infração à legislação administrati-
pelo Superior Tribunal de Justiça como solidá- va ambiental, porém, diferentemente do que
ria e imprescritível. ocorre quanto à responsabilidade civil, é ne-
Por sua vez, quanto à responsabilidade cessário comprovar a infração (responsabili-
penal, é indispensável a comprovação do ele- dade subjetiva).
mento subjetivo da conduta, sendo imputável Nada obstante a abrangência dessa res-
inclusive a pessoas jurídicas, na forma do art. ponsabilidade, em decorrência do princípio
3ª da Lei 9.605/98, regulamentadora do §3ª do da legalidade é preciso que o ato esteja defi-
art. 225 da Constituição Federal, no que tange nido em lei ( lato sensu) como infração admi-
a crimes ambientais (cuja ação penal é sem- nistrativa, cabendo, na hipótese, as sanções
pre pública incondicionada) e a infrações ad- do art. 72 da Lei 9.605/98 e art. 3ª do Decreto
ministrativas: 6.514/08, cuja aplicação constitui exercício do
poder de polícia.
Tem-se que na obra de macrodrenagem
Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabiliza- sob análise, sendo constatado a existência de
das administrativa, civil e penalmente conforme
infração ambiental por qualquer funcionário
o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração
seja cometida por decisão de seu representante dos órgãos ambientais integrantes do Siste-
legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, ma Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA),
no interesse ou benefício da sua entidade. com atribuição para atividades fiscalizadoras,
Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas é possível a lavratura de auto de infração am-
jurídicas não exclui a das pessoas físicas, auto-
biental e instauração de processo administra-
ras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato.
tivo para averiguação dos requisitos específi-
cos de cada responsabilização.
Desta forma, para responsabilização Afinal, nada obstante ser um empreen-
penal de pessoas jurídicas, hipótese aceita dimento executado pela própria Prefeitura do
inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça e Município de Boa Vista, por meio de pessoa
pelo Supremo Tribunal Federal, deve-se ob- jurídica de direito privado, é plenamente pos-
servar se o crime foi cometido no interesse ou sível a responsabilização de ambas as pesso-
benefício da entidade e, outrossim, por deci- as jurídicas e até mesmo de pessoas físicas,
são de representante legal, contratual ou ór- partindo-se da interpretação conjunta de
gão colegiado. Caso contrário, há inépcia da normas constitucionais e infraconstitucionais
inicial e trancamento da ação proposta neces- acima exposta.
sariamente pelo Ministério Público Estadual.
Nota-se, ainda, viável a responsabiliza-

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O EXEMPLO LOCAL DO IGARAPÉ lou os degraus da concentração populacional


de forma exponencial, em números, aduzem
MIRANDINHA os autores Araújo e Tavares (2018, p. 37):

Tendo como pedra de toque a situação


socioambiental pela qual passou e passa o Nos últimos 30 anos, a cidade de Boa Vista no
Igarapé Mirandinha, é possível ter-se uma no- estado de Roraima passou por intenso proces-
ção dos impactos a que estão sujeitos o Iga- so de expansão urbana. Segundo dados do Ins-
tituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE,
rapé Caxangá.
2016), na década de 1980 o município contava
O processo de (des)construção da ca- com 67.017 habitantes. No ano de 2015, este quan-
nalização do igarapé Mirandinha somado à titativo representa 320.714 habitantes, dos quais
ausência de conscientização ambiental por 277.799 habitantes viviam na zona urbana e 42.915
parte da comunidade ensejou o processo de na zona rural, ou seja, 86,62% da população vi-
vem no espaço urbano consolidado de Boa Vista.'
destruição do mesmo e consequente desres-
peito ao direito à sadia qualidade de vida da
população local.
Conforme estudos locais3, os principais O acelerado processo de expansão da
danos sofridos pelo igarapé foram: retirada da cidade, alinhado às ineficientes políticas pú-
mata ciliar, altos índices de eutrofização em blicas de Estado, resultaram em consequên-
decorrência do despejo de esgoto in natura cias normais a concentração desordenada de
das residências ribeirinhas, perda significati- pessoas, em especial, no que tange a moradia
va da capacidade de autodepuração e perda e o saneamento básico, que são direitos cons-
da rica fauna aquática do local. titucionalmente garantidos.
A estes prejuízos de dificílima reparação A peculiar geografia do território boavis-
também está sujeito o Igarapé Caxangá caso tense propiciou a ocupação de áreas impro-
as atuais obras de Macrodrenagem restrin- prias, como as margens de canais de águas,
jam-se a integrar o curso d’água ao já supera- regionalmente denominados de igarapés.
do ambiente antrópico, alheio à manutenção Diante disso, problemas reflexos a este tipo
do equilíbrio ecológico. de assentamento irregular emergiram em
nossa capital. Neste sentido, pontua Antônio
O IGARAPÉ CAXANGÁ Carlos (2015, p. 15):

A URBANIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE O crescimento populacional fez com que áreas


BOA VISTA E OS HISTÓRICOS PRO- impróprias fossem ocupadas, principalmente áre-
as próximas a cursos d’água, as quais por cons-
BLEMAS ANTRÓPICOS DA BACIA HI- tituírem planícies de inundação têm suas áreas
DROGRÁFICA DO IGARAPÉ CAXAN- comprimidas, impermeabilizadas, aterradas e
mata ciliar retirada, fatores estes que impedem
GÁ o retrocesso das ações oriundas de inundações e
agravam problemas relacionados a alagamentos.
O espaço ao qual, atualmente, denomi-
namos de Boa Vista transforma-se a passos
largos. Com o galopar dos anos, passamos de Mercê do exposto, é possível compreen-
latifúndio real para proteção de fronteira pá- der o processo de urbanização das margens
tria à capital de ente federado. do Igarapé Caxangá e suas trágicas consequ-
Nas últimas décadas, o município esca- ências ao ambiente. Antemão, vale ressaltar
3 Em especial os de Warner Velasque Ribeiro (2012)

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que o Caxangá nasce da confluência entre os instalação de equipamentos que promovam a


igarapés Tiririca e Jararaca, ademais, a impor- atração do público e turística no local, marina
tante bacia hidrográfica também recebe aflu- flutuante, cortinas d’água, calçadão e espaço
ência do corredor d’água do Mecejana, os três para construção de prédios administrativo.
riachos já completamente canalizados. Estima-se que o empreendimento pú-
No entanto, precipuamente os proble- blico possa custar ao tesouro aproximada-
mas socioambientais do Igarapé Caxangá des- mente cem milhões de reais e seja entregue
pontam-se a partir da margem direita da Av. aos cidadãos em quatro anos. A primeira fase
Ville Roy (sentido centro), bairro São Vicente, de obras de infraestrutura iniciou neste ano
até sua foz no bairro Caetano Filho. (2018), com a obra de macrodrenagem urbana
O trecho citado do veio fluvial é margea- do Igarapé Caxangá, pela qual toda a extensão
do em toda sua extensão por uma população do córrego será canalizada, etapa orçada em
vulnerável e que historicamente sofre com os R$ 46.300.000,00 (quarenta e seis milhões e
desequilíbrios antrópicos. Poluição, enchen- trezentos mil reais).
tes, deslizamentos de terra, doenças hídricas, Os seguintes registros fotográficos bem
são alguns dos inconvenientes promovidos indicam a extensão e potencial do empreen-
pela destruição da mata ciliar, assentamento dimento no local do fato, inclusive o desen-
populacional irregular com despejo de esgoto volvimento das obras financiadas com recur-
no curso de água, e inexistência de políticas sos do Ministério da Integração.
de saneamento básico eficazes.

O PARQUE DO RIO BRANCO E A MA-


CRODRENAGEM DO CAXANGÁ

Com o objetivo de solucionar os proble-


mas urbanísticos e ambientais que envolvem
o Igarapé Caxangá e, sobretudo o embaraço
social na qual se encontra o bairro Caetano Fi-
lho, região entregue ao tráfico ilícito de entor-
pecentes e sujeita, rotineiramente, a ocorrên-
Figura 1. Placa de contrato de obra pública
cias de inundações em função da proximidade
Fonte: Arquivo pessoal (2018).
com o principal curso d'água que é o rio Bran-
co, veio o município de Boa Vista a propor um
ambicioso plano de revitalização do local, o
qual altera radicalmente sua concepção origi-
nal e estruturação ao longo do tempo.
O projeto de construção do Parque do
Rio Branco, empreendimento este anunciado
no pretérito ano e que englobará, ao término,
a desapropriação de pelo menos 242 imóveis,
tal como haverá necessidade de elevação da
Av. Sebastião Diniz, bem como, segundo dados
e informações do município: a canalização do
córrego Caxangá; obras de macrodrenagem; Figura 2. Trecho do Igarapé Caxangá entre a Av. Ville
ajuste do nível para prevenção de enchentes; Roy e Av. Nossa Sra. da Consolata.
Fonte: Arquivo pessoal (2018).

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Figura 3. Trecho do Igarapé Caxangá entre a av. Nossa Figura 4. Trecho do Igarapé Caxangá entre a Av.Beija-
Sra. Da Consolata e av.Beijamin Constant min Constant e Av. Gatúlio vargas
Fonte: Arquivo pessoal (2018). Fonte: Arquivo pessoal (2018).

Figura 5. Trecho do Igarapé Caxangá entre a Av.Beija- Figura 4. Trecho do Igarapé Caxangá entre a Av. Gatúlio
min Constant e Av. Gatúlio Vargas (perspectiva interna) Vargas e Av. Sebastião Diniz
Fonte: Arquivo pessoal (2018). Fonte: Arquivo pessoal (2018).

In loco, constata-se o encaixotamento outrossim, está completamente livre para a


com estrutura de concreto armado do curso construção do canal de macrodrenagem, haja
d’água até o trecho entre as Av. Nossa Senho- vista que as históricas casas de palafita que
ra da Consolata e Av. Benjamin Constant. compunham o ambiente e ocupavam as mar-
Ato contínuo a seção entre Av. Benjamin gens do veio de água foram demolidas e a po-
Constant e a Av. Getúlio Vargas está em pro- pulação remanejada.
cesso de adequação para integrar o projeto Considerando as circunstâncias socio-
de macrodrenagem. ambientais do trecho da bacia hidrográfi-
O trecho mais caudaloso do Caxangá, ca do Caxangá, ora em análise, é perceptível
localizado entra as Av. Getúlio Vargas e Av. que todas as expectativas negativas de uma
Sebastião Diniz, teve vários imóveis desapro- aérea ribeirinha urbana irregularmente ocu-
priados, em razão do assentamento insalubre pada são confirmadas com visita no local. A
e insustentável. A obra de canalização deste miserabilidade com a qual conviviam os mu-
trecho deve ocorrer nos próximos meses. nícipes instalados naquela região é cristalina,
A extensão do igarapé que corta o bairro doravante isso, tais condições encontram-se
Caetano Filho, a partir da Av. Sebastião Diniz, frontalmente contrárias àquelas pensadas
pelo legislador quando do fazimento da Lei

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nº 6.938 de 1981. objetivos elencados pela Política Nacional


dos Recursos Hídricos (Lei nº 9.433/ 1997):

Art 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente vi-


sará: Art. 1º A Política Nacional de Recursos Hídricos
I - à compatibilização do desenvolvimento baseia-se nos seguintes fundamentos:
econômico-social com a preservação da qualida- I - a água é um bem de domínio público;
de do meio ambiente e do equilíbrio ecológico; II - a água é um recurso natural limitado,
II - à definição de áreas prioritárias de dotado de valor econômico; [...]
ação governamental relativa à qualidade e ao IV - a gestão dos recursos hídricos deve
equilíbrio ecológico, atendendo aos interesses da sempre proporcionar o uso múltiplo das águas;
União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Terri- V - a bacia hidrográfica é a unidade territo-
tórios e dos Municípios; rial para implementação da Política Nacional de
[...] Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional
IV - ao desenvolvimento de pesquisas e de tecno- de Gerenciamento de Recursos Hídricos;
logias nacionais orientadas para o uso racional VI - a gestão dos recursos hídricos deve ser
de recursos ambientais; descentralizada e contar com a participação do
[...] Poder Público, dos usuários e das comunidades.
VI - à preservação e restauração dos recursos
ambientais com vistas à sua utilização racional Art. 2º São objetivos da Política Nacional de Re-
e disponibilidade permanente, concorrendo para cursos Hídricos:
a manutenção do equilíbrio ecológico propício à I - assegurar à atual e às futuras gerações
vida; a necessária disponibilidade de água, em pa-
drões de qualidade adequados aos respectivos
usos;
O poder público municipal compreen- II - a utilização racional e integrada dos re-
cursos hídricos, incluindo o transporte aquaviá-
deu, a despeito do projeto do Parque do Rio rio, com vistas ao desenvolvimento sustentável;
Branco, que a área da bacia hidrográfica do III - a prevenção e a defesa contra eventos
Caxangá deveria ser prioridade para ações go- hidrológicos críticos de origem natural ou decor-
vernamentais relativas ao saneamento básico rentes do uso inadequado dos recursos naturais.
e urbanização. IV - incentivar e promover a captação, a pre-
servação e o aproveitamento de águas pluviais.
Por décadas ao fio os problemas socio-
ambientais foram marginalizados, ao passo
que as intensas e sucessivas enchentes e caos
social experienciado pelos moradores au- Em sentido contrário aos supracitados
mentavam. Assim sendo, pode-se afirmar que preceitos, à integração do corredor natural
a ideal compatibilização do desenvolvimento d’água a infraestrutura de macrodrenagem
econômico-social com a preservação da qua- pode acarretar os mesmos danos experimen-
lidade do meio ambiente e do equilíbrio eco- tados pela canalização do Igarapé Mirandinha
lógico não encontrava assento na realidade e outros flumens urbanos desta cidade, o que
do Caxangá. deveria servir de exemplo a não ser seguido.
Não obstante a isso, o ponto central a Transparece que obras do gênero tem por pre-
ser atentamente observado, in casu, é a es- tensão direta é o gasto dos recursos públicos
colha do Município em utilizar a técnica de e indireta o interesse da sociedade e, num
canalização do igarapé ante a outras possibi- plano distante, a proteção do meio ambiente.
lidades ecologicamente acertadas e que, real- Pontua-se que, apesar da grande pro-
mente, restaurariam os recursos naturais ali moção política da obra, os documentos es-
existentes. senciais ao empreendimento, como os que
Destarte, vale frisar os fundamentos e deveriam ser produzidos e instruir o procedi-

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mento de licenciamento ambiental, por exem- tíveis da implantação de empreendimento de


plo, não estão disponíveis na rede mundial de
macrodrenagem, esteja ou não inserido em
computadores, o que cerceia uma visão mais um contexto maior como é o projeto do Par-
aprofundada desta análise científica e, nota-
que do Rio Branco, observa-se do ordenamen-
damente, da comunicação geral de todos os to jurídico a existência de princípios que de-
que são beneficiários do meio ambiente (art.veriam ser cumpridos, antes, durante e após
225, caput, da Constituição da República de a execução das obras, como o do ambiente
1988), infringindo, portanto, os princípios da
ecologicamente equilibrado, o do desenvol-
informação e da participação. vimento sustentável e o da sadia qualidade
Enfim, é certo que o grandioso projetode vida reconhecidos como direitos humanos
do Parque Rio Branco pode decretar a morte fundamentais.
do igarapé Caxangá pois, canalizá-lo é mate- A perspectiva da incidência destas obri-
rializar sua função de mero canal para águasgações cogentes são imanentes à natureza da
residuais que, muita das vezes, pode ser ins-
matéria em estudo que cobra uma visão inter-
trumento para disposição, ilegal, do termo disciplinar e holística a açambarcar não só o
popularmente conhecido como esgoto. direito, mas toda e qualquer área do conheci-
A compatibilização das nuances apli- mento científico que possa, de algum modo,
cáveis ao desenvolvimento sustentável que contribuir para cumprir tais regras em nome
é, destacadamente, uma das ferramentas da sociedade.
impostas pelo Estatuto da Cidade (Lei nº Para compreender esta dinâmica, sua
10.257/2001) para todos os municípios do Bra-
constituição física e humana e implicações
sil, deveria ter por referencial a internalização
que tem por condão modificar e produzir o
da responsabilidade constitucional da pro- espaço urbano, deve ser auxiliada de forma
moção do “adequado ordenamento territorial, conglobante e integral por mecanismos de
mediante planejamento e controle do uso, do ordem técnica e científica, razão pela qual as
parcelamento e da ocupação do solo urbano” instituições de pesquisa podem exercer pa-
(art. 30, VIII), situação esta que envolve qual-
pel fundamental na construção de resoluções
quer empreendimento público. que minimizem ou, no melhor das hipóteses,
As consequências socioambientais, por-evitem os gravames ambientais, sociais, cul-
tanto, ao longo do tempo, com a implantação turais, econômicos, políticos e urbanísticos.
da macrodrenagem no igarapé Caxangá, va- Afinal de contas, os maiores prejudica-
lendo-se do que já ocorreu no igarapé Miran-dos com eventuais problemas decorrentes da
dinha, podem ser esperadas como negativas, implantação do empreendimento é, de fato e
prejudiciais e nocivas e, muito das vezes, irre-
de direito, a coletividade, com destaque para
versíveis. aqueles que utilizam o espaço que está sen-
Um fiel e adequado acompanhamento do alterado radicalmente pelo poder público
do licenciamento ambiental, decerto, poderiamunicipal.
ensejar uma melhor resposta aos interesses É imprescindível que a administração
metaindividuais preteridos, isto sem olvidarpública perceba os recursos naturais como
da ação de medidas compensatórias e mitiga- meio de prevenção de danos outros, como os
tórias dos efeitos lesivos do empreendimentosociais, urbanísticos, culturais e até econômi-
a curto, médio e longo prazos. cos, isto valendo-se dos predicados de con-
servação (uso racional) e, nalguns casos, da
CONSIDERAÇÕES FINAIS própria preservação que incute maior prote-
ção. Tal razão de ser é devido a constatação
Apar das consequências certas e percep- de que, em grande parte, os referidos danos

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são meros reflexos da atuação humana desor- -rr.html >. Acesso em: 31 mai. 2018.
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damente insustentável. ARAÚJO JÚNIOR, A. C. R.. Bacias hidrográficas e
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cais circundantes às áreas de maior importân-
cia ambiental a fim de viabilizar a realização Domínio sobre a natureza e a (des) constru-
de obras não-estruturais que sejam abaliza- ção de áreas de risco à inundação na cidade
das técnica e cientificamente. de Boa Vista - Roraima. In: Simpósio Nacional
E, a partir desse ponto, é real a neces- de Geografia Urbana, 2015, Fortaleza. Anais do
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implementação de padrões de controle mais 2015. Disponível em: < https://drive.
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urbano, inclusive embasada no cumprimento
fidedigno dos pressupostos normativos apli- ARAÚJO JÚNIOR, A. C. R.; TAVARES JÚNIOR, S. S..
cáveis em nível federal, estadual e, sobretudo, Expansão urbana e fatores de risco à inun-
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social que leve em consideração a proteção load/49680/35359 >. Acesso em: 01 jun. 2018.
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