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As barragens hidrelétricas e os conflitos socioambientais na Amazônia


Hydroelectric dams and socio-environmental conflicts in the Amazon

Article · May 2018

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5 authors, including:

Carlos Otávio Rodrigues dos Santos Marcelo Marques


Universidade do Estado do Pará Universidade do Estado do Pará
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Dryelly Silva Ribeiro Antonio Pereira Junior


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MULTIDISCIPLINARY REVIEWS
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As barragens hidrelétricas e os conflitos socioambientais na Amazônia


Carlos Otávio Rodrigues dos Santosa, Marcelo Marques Coelhoa, Andrielly Oliveira de
Sousaa, Dryelly Silva Ribeiroa, Antônio Pereira Júniora
aUniversidade do Estado do Pará, Paragominas, PA, Brasil.

PALAVRAS-CHAVE RESUMO A região amazônica mantém a maior rede de drenagens do mundo,


alumínio;
política energética; aliado a isso, a bacia hidrográfica dessa região possui um potencial para geração
recursos hídricos de energia hidrelétrica maior que o atual patamar de produção brasileiro, o qual
Recebido
15 de maio de 2018
gera cerca de 78.000 MW. O objetivo dessa pesquisa foi a realização de uma
Aceito análise qualitativa entre a relação da política energética brasileira, associada ao
21 de maio de 2018 modelo de desenvolvimento adotado para a região Amazônica os conflitos que
Publicado online
26 de maio de 2018 isso origina. Os dados obtidos e analisados indicaram que no ano de 2016, a CPT
registrou 14 conflitos associados aos recursos hídricos na região, dos quais 57,9%
Cite este artigo: Santos COR et
al. (2018) As barragens envolvem barragens hidrelétricas. Com isso, a relação do modelo energético atual
hidrelétricas e os conflitos aplicado à Amazônia, encontra-se em desequilíbrio, o que resulta em conflitos
socioambientais na Amazônia.
Multidisciplinary Reviews 1:
com as comunidades onde as UHE’s são soerguidas.
e2018005.

Hydroelectric dams and socio-environmental conflicts in the Amazon

ABSTRACT The Amazon region maintains the largest drainage network in the world. In addition, the hydrographic
basin of this region has a potential for hydroelectric power generation greater than the current Brazilian
production level, which generates about 78,000 MW. The objective of this research was the accomplishment of
a qualitative analysis between the relation of the Brazilian energy policy, associated with the development model
adopted for the Amazon region, the conflicts that this originates. The data obtained and analyzed indicated that
in the year 2016, the CPT registered 14 conflicts associated with water resources in the region, of which 57.9%
involve hydroelectric dams. Thus, the relationship of the current energy model applied to the Amazon is
imbalanced, resulting in conflicts with the communities where UHE's are built.

KEYWORDS: aluminum; energy policy; water resources

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CONTATO Antônio Pereira Júnior – antonio.junior@uepa.br
Santos et al (2018) www.multireviews.net
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Introdução
Atualmente, o Brasil detém cerca de 78.000 Megawatts (MW) de potência instalada em sua matriz
hidrelétrica (Souza e Jacobi 2015), o que corresponde a aproximadamente 70% da geração de energia elétrica
de todo país (Brasil 2017). Isso representa menos da metade do potencial hidráulico total do país, de
aproximadamente 260.000 MW (Brasil 2008). A maior parte do potencial não aproveitado encontra-se nos rios
da região Amazônica, nas Bacias Hidrográficas Amazônica e Tocantins, as quais detém um potencial de 107.143
MW e 26.285 MW, respectivamente, equivalente a 51,31% de todo o potencial hidrelétrico brasileiro (Brasil
2006b).
Apesar do grande potencial hidrelétrico presente no Brasil, a implantação de novas usinas tem provocado
reações negativas de diversos setores da sociedade, e o escrutínio sob o qual estes projetos se encontram se
intensifica à medida em que os rios amazônicos têm sido utilizados para a geração de eletricidade (Sales e
Goldemberg 2017).
Nesse contexto, o ”Plano 2010”, elaborado pela Eletrobrás em 1987, listou ao todo, 79 projetos
hidrelétricos na Amazônia, dos quais, atualmente: 10 estão em operação, um em construção e 68 planejados.
De todos os projetos contidos no Plano 2010, 39,2% se encontram no estado do Pará, dos quais destaca-se as
Usinas Hidrelétricas – UHE’s de Curuá-una e Tucuruí, que estão em operação; o Complexo Hidrelétrico do Tapajós
- CHT, em fase de planejamento; e a UHE Belo Monte, que está em construção. As setenta e nove represas
inundariam aproximadamente 100.000 km², ou 3% da porção brasileira da floresta amazônica, a qual possui
extensão de aproximadamente 3.500.000 km²; e a maioria dos locais favoráveis para o desenvolvimento
hidrelétrico está situada ao longo dos trechos altos e médios dos rios Xingu, Tocantins, Araguaia e Tapajós
(Fearnside 2015a).
Em relação aos impactos, o que vemos no histórico de construção de hidrelétricas no Brasil, como o caso
de Tucuruí, no Pará, ou Balbina, no Amazonas, é a falta de diálogo para tratar e enfrentar a questão com
equilíbrio em nome do desenvolvimento do país, e buscar as melhores soluções de tecnologia e engenharia para
reduzir os impactos ambientais gerados por um projeto de usina hidrelétrica. A alternativa foi a expansão
hidrelétrica, quando possível, com usinas a fio d’água (Abinee 2015).
Estas usinas não possuem um reservatório para regular a vazão do rio que, no caso da Amazônia,
geralmente possui alta sazonalidade. Um bom exemplo disso é Belo Monte, por exemplo, cuja capacidade de
11,2 mil MW só estará disponível durante três meses do ano. Nos meses de setembro e outubro, quando o rio
Xingu fica naturalmente mais seco, a capacidade instalada aproveitável da hidrelétrica não será maior do que
1.172 MW. Ou seja, 90% da usina ficará parada (Bermann 2012).
Ademais a crise de oferta do setor energético brasileiro, esse debate é necessário para benefício não
apenas da preservação do meio ambiente e proteção das populações tradicionais na Amazônia, mas para
assegurar os interesses de toda a população do Brasil (Bermann 2013). Neste sentido, a implantação de políticas
públicas juntando interesses de indústrias e sociedade, na forma de tornar eficiente a utilização dos recursos
hídricos, faria com que toda a população vivesse com maior qualidade (Venancio et al 2015), e diminuiria o atual
número de conflitos que envolvem recursos hídricos.
Nesse contexto, estudo efetuado pela Comissão Pastoral da Terra – CPT (2017) concluiu que, em relação
ao território paraense, ocorreram quatorze conflitos envolvendo recursos hídricos no ano de 2016 que afetaram
9182 famílias. Desses conflitos, 57,14% envolvem barragens hidrelétricas e são responsáveis por 90,24% das
famílias afetadas. Ao todo foram afetadas Tribos Indígenas - TIs (Xipaiá Kuruáia, Paquiçamba, Juruna, Xicrin, Arara
da Volta Grande do Xingu, aldeias Cateté e Djudjê-kô), Colônia de pescadores z-57, Gleba Bacajaí e Comunidades
Ribeirinhas (Acari e de Pescadores do Rio Fresco).
Logo, esses problemas são reais e atuais, e é necessário estudá-los, o que justifica a realização e
incrementa a relevância dessa pesquisa, cujo objetivo é analisar a relação de causa-efeito quanto a política
energética brasileira associada ao modelo de desenvolvimento adotado para a região Amazônica, e os conflitos
socioambientais nas áreas onde estão instalados os empreendimentos hidrelétricos.

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Recursos hídricos na Amazônia oriental


A bacia amazônica, segundo dados da Agência Nacional de Águas – ANA, é constituída pela mais extensa
rede hidrográfica do globo terrestre, ocupando uma área total da ordem de 6.110.000 km², da qual se encontra
em território brasileiro 64,88% ou, aproximadamente 3.869.953 km², dos quais 27,86% estão em território
paraense (Brasil 2006a).
Quanto à recarga hídrica dessa bacia, sabe-se que ela é dependente da taxa de precipitação de chuvas
anuais na região amazônica, em regiões próximas do equador, como é o caso do estado do Pará, é geralmente
superior a 2.000 milímetros. A região da foz do rio Amazonas e o setor noroeste da Amazônia apresentam
precipitação anual superior a 3.000 milímetros (Limberger e Silva 2016). A precipitação média histórica na Região
Hidrográfica Amazônica é 2.205 mm. Em território brasileiro, a contribuição em recursos hídricos é da ordem de
132.145 m³/s, o que representa 73,43% do total do país, enquanto sua disponibilidade hídrica é de 73.748 m³/s,
e representa 80,8% da disponibilidade do Brasil. A região lança no oceano cerca de 6.700 km³ de água por ano
(Ana 2013; 2017).
Enfim, todos esses números refletem um excelente potencial de recursos hídricos na região amazônica, o
qual aponta que projetos importantes poderão ser viabilizados nos próximos anos, a despeito da crescente
complexidade socioambiental que, normalmente, impõe estágios de desenvolvimento extensos (Brasil 2013).

O setor energético brasileiro


Em relação ao setor energético brasileiro, segundo o Plano Decenal de Energia – PDE – 2016-2026 (Figura
1), o consumo energético brasileiro aumentará a uma taxa média de 1,9% ao ano durante o horizonte decenal,
o que acarreta um incremento de mais de quarenta tera-watt-hora - TWh ao ano de consumo na rede elétrica,
e gera uma taxa média de aumento de 3,5% anuais do setor elétrico, com maior incremento advindo das
indústrias, cujo consumo aumentará a uma taxa média de 3,9% anuais (Brasil 2017).

35
Pecentual de contribuicão (%)

30

25

20

15

10

0
NE SE R C P AGP TRP IND
2016 6,9 10,4 9,7 3,3 1,6 4,4 32,2 31,5
2026 6,6 11,8 9,7 4 1,6 4,2 29,6 32,6

Fonte: Brasil (2017)

Figura 1. Contribuição (%) por setor, na demanda de energia no horizonte decenal (NE – não energético, SE –
setor energético, R – residencial, C – comercial, P – público, AGP – agropecuário, TRP – transporte, IND –
industrial).

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A definição do perfil industrial brasileiro tem grande impacto na quantidade e no tipo de energia final que
se deve produzir, isso provoca o surgimento de um percentual de contribuição da demanda de consumo do
segmento industrial dentro do horizonte decenal do PDE (Figura 2). Historicamente, o país é um grande produtor
de produtos intensivos no uso de energia elétrica, como papel, celulose, ferro, aço e alumínio (Goldemberg e
Lucon 2007).

5
- 4,8
17,4
Ferro-gusa e aço 16,7
1,4
Ferro-ligas 1,4
3,8
Mineração e pelotização 3,7
6,8
Não ferrosos e outros de metalurgia 7,1
7,1
Química 6,7
27,8
Alimentos e bebidas 28,7
1,1
Têxtil 1,1
14,8
Papel e celulose 16,7
5,6
Cerâmica 5,2
outros 9,1
7,9
0 5 10 15 20 25 30

2016 2026
Figura 2. Contribuicão (%) industrial por segmento, na demanda de energia ao longo do horizonte decenal.
Fonte: Brasil (2017)

Apesar de a expansão dos empreendimentos hidrelétricos nos últimos trinta anos do século XX, garantir
o suprimento de eletricidade necessária à industrialização e urbanização do Brasil, teve como contrapartida
empreendimentos polêmicos, que não se justificam, do ponto de vista dos impactos gerados e da quantidade de
energia que produzem. Dentro desse contexto, as hidrelétricas de Balbina e Tucuruí são questionadas
internacionalmente em função dos impactos socioambientais gerados (Souza e Jacobi 2015).
Quanto à crise energética atual, a resposta é que esta representa também uma oportunidade para
reorganizar o sistema energético em bases mais sólidas e sustentáveis. As bases para tal reorganização são a
eficiência, a maior participação das fontes renováveis e a descentralização da produção de energia (Goldemberg
e Lucon 2009).

Os conflitos socioambientais
Em relação aos conflitos socioambientais, ora denominados impactos socioambientais, eles ocorrem na
região onde as UHE são implantadas, como o caso da UHE Balbina, cuja construção se motivou pela criação da
Zona Franca de Manaus, a qual demandaria grandes quantidades de energia elétrica. A UHE está localizada no
rio Uatumã, em Presidente Figueiredo, há 110 km de Manaus, na Amazônia Central, e ao abrir suas comportas
inundou 2360 km² de floresta, o que afetou o modo de vida das pessoas que ali viviam, inclusive a etnia indígena
Waimiri-Atroaris, que precisou se deslocar para outros territórios (Scherer e Corrêa 2016) e ao todo, foram
alagados 300 km² de área indígena no represamento de Balbina (Rodrigues e Fearnside 2014).

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Outro exemplo de conflitos foi o que houve durante a construção da UHE Tucurí, que inundou uma área
de 2.830 km² e remanejou mais de 25.000 pessoas, conforme dados oficiais, foram atingidas 5.700 famílias.
Foram atingidas comunidades tradicionais camponesas, ribeirinhas e quilombola (Corrêa 2009) além de TI’s
indígenas atingidas diretamente através do alagamento, como os Asuriní, Gavião, Suruí, Parakanã e Xikrín, bem
como as áreas Guajará e Krikatí pela construção das linhas de transmissão (Koifman 2001).
No caso da UHE Belo Monte, ao não inundar diretamente os territórios indígenas, o projeto se adequa à
concepção dos projetos hidrelétricos em voga, de desconsiderar as consequências socioambientais das
populações não inundadas pela formação dos reservatórios. Este artifício permitiu que o projeto não se
sujeitasse ao disposto nos parágrafos 3º e 5º do Artigo 231 da Constituição Federal-CF, que impede a remoção
das populações indígenas sem consulta prévia. (Bermann 2012).
Por isso, é preciso procurar um equilíbrio entre os interesses contrariados dos que são atingidos pelos
empreendimentos, e os interesses de populações muito maiores, que se beneficiam a grandes distâncias do local
onde o empreendimento é implantado (Goldemberg e Lucon 2007).

Pará
O estado em tela apresenta geografia de destaque quanto aos empreendimentos hidrelétricos, pois o
governo vê a combinação de jazidas de minérios, e rios capazes de produzir energia hidráulica, como uma
oportunidade para explorar uma vantagem competitiva na exportação desses produtos (Fearnside 2015b).
Segundo o PDE-2026, os estudos para conexão e escoamento da energia gerada pelo Complexo
Hidrelétrico do Tapajós – CHT (Tabela 1), no Pará, formado pelos aproveitamentos hidrelétricos no rio Tapajós e
no rio Jamanxim, e que totalizam cerca de 12.600 MW, já foram iniciados pela Empresa de Pesquisa Energética
- EPE (Brasil 2017).

Tabela 1. Barragens que formam o CHT e que geram energia para o Estado do Pará.
Nome da Barragem Área inundada (km²) UF
São Luiz do Tapajós 722 PA
Jatobá 420 PA
Chacorão 616 PA/AM
Cachoeira do caí 420 PA
Jamanxin 74 PA
Cachoeira dos Patos 116 PA
Jardim de ouro 426 PA

Barrragens e aproveitamento hidrelétrico


O histórico de empreendimentos hidrelétricos no estado do Pará tem início com a construção da UHE
Tucuruí, no período compreendido entre 1975 e 1984 pela Eletronorte; localizada no rio Tocantins, no município
de Tucuruí, a UHE de Tucuruí é a maior em potência 100% brasileira (8.370 MW), cujo funcionamento exigiu a
formação de um lago artificial, que inundou uma área de 2.830 km2 (Santana et al. 2014). A usina iria abastecer
de energia as indústrias beneficiam a bauxita, matéria-prima para a reprodução de alumínio e alumina, extraída
nas regiões do rio Trombetas, de Paragominas e de Juruti, todas no Pará (Pinto 2012).
Atualmente, a principal barragem em foco nesse estado é a UHE Belo Monte, que apesar de todas as
críticas continuou sua construção sob alegação de que a interrupção criaria “grave lesão à economia pública”,
via de regra, mencionando os investimentos já incorridos ou a perda de postos de trabalho em virtude da
interrupção (Bermann 2012).
Há que se falar ainda no aproveitamento hidrelétrico do CHT, na bacia do Tapajós, que está ligado também
ao avanço do agronegócio para o Norte do país. Uma importante opção para o escoamento da produção de grãos
na região central do país é a hidrovia Teles Pires-Tapajós (Figura 3).

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Figura 3. Hidrovia Tapajós – Teles Pires.


Disponível em: <https://pt.slideshare.net/aplop/i-encontro-de-portos-da-cplp-apresentao-da-companhia-docas-
do-par>.

Nas condições atuais, a navegabilidade de 662 km está distribuída em três trechos (Baixo Tapajós, a
montante de Buburé e na cidade de Jacareacanga), mas seu potencial para a navegação pode alcançar 1.043 km,
por meio de intervenções como barragens, derrocamentos e eclusas que permitirão transitar desde sua foz em
Santarém, no Pará, até a região de Cachoeira Rasteira, no Mato Grosso (Pompermayer et al 2014). Em 2009,
entidades do agronegócio de Mato Grosso criaram o Movimento Pró-Logística, cuja lista de prioridades é
encabeçada pela hidrovia (Alargon et al 2016).

Indústria de commodities, consumo energético e o extrativismo mineral

Alumínio (Al)

O estado do Pará é o maior exportador de alumínio primário do Brasil. Para a produção de uma tonelada
de alumínio primário, o custo da energia elétrica chega a 46% do total, e o atual patamar do custo da energia
torna não somente o alumínio, mas outros produtos eletrointensivos em condições pouco competitivas em
relação ao mercado mundial. No perfil da indústria de transformação paraense se sobressaem os produtos desta
cadeia, com destaque para alumina e alumínio, respondendo por 77% do que é exportado pelo setor (Pará 2014).
Porém, os agentes setoriais têm reiterado a perda de competitividade da indústria de alumínio primário
no país, sobretudo por conta de condições mais atrativas de aquisição de energia elétrica oferecidas por outros
países (Brasil 2013). Um conjunto de relativamente poucos segmentos industriais, aqui denominados grandes
consumidores industriais de energia elétrica, responde por importante parcela (em torno de 40%) do consumo
industrial de eletricidade. Segundo a projeção da demanda de energia elétrica (Figura 4), representada em
Toneladas equivalentes de petróleo – Tep, o alumínio primário é, atualmente, o maior consumidor, e em 2050
terá uma leve queda, porém manterá sua posição de maior consumidor de energia dentre os grandes
consumidores industriais (Brasil 2016).
Apesar da produção de alumínio está debilitada recentemente por perda de competitividade decorrente
do aumento de custo da energia elétrica, espera-se que parte da utilização da capacidade instalada seja
retomada nos próximos anos, incentivada pela perspectiva de melhoria dos condicionantes do setor elétrico
(Brasil 2017). Mas a implicação de que a fundição de alumínio primário esteja contribuindo para o alívio da
pobreza e do desemprego no Brasil é enganadora porque o custo de produzir os poucos empregos que são

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criados pelo alumínio primário significa sacrificar a oportunidade para o Brasil usar seus recursos financeiros e
energéticos em outras maneiras mais benéficas (Fearnside 2015b).
As principais oportunidades referem-se à implantação de atividades industriais do quarto e quinto ciclo,
ou seja, produção de transformados e manufaturados de alumínio, pois a quantidade de empregos diretos na
indústria de extração e de transformação começa a ser cada vez menor, devido às inovações e o nível de
automação (Pará 2014).

Tabela 2. Projeção de demanda energética dos grandes consumidores industriais de energia elétrica.
2013-2050
Segmento 2013 2020 2030 2040 2050
(% ao ano)

Alumínio Primário 14.826 15.258 13.326 13.020 12.907 -0,37%


Alumina 299 287 268 259 255 -0,42%
Bauxita 13 13 12 12 12 -0,24%
Aço Bruto 507 484 443 446 449 -0,33%
Pelotização 49 48 47 46 45 -0,20%
Sonda-Cloro 2.727 2.709 2.657 2.623 2.597 -0,13%

Petroquímica
1.573 1.531 1.486 1.486 1.467 -0,19%
(eteno)

Celulosa 980 944 902 884 878 -0,30%


PAR 2.189 2.147 2.060 2.024 2.009 -0,23%
Papel 791 791 791 791 791 0,00%
Ferroligas 8.471 8.834 9.180 9.192 9.202 0,22%
Cobre 1.545 1.485 1.427 1.404 1.394 -0,28%
Cimento 112 108 101 97 93 -0,50%
Fonte: Brasil (2016)

As unidades de conservação e a construção de barragens


Sobre a construção de barragens em Unidades de Conservação - UCs, a direção do Instituto Chico Mentes
de Biodiversidade - ICMBio, posicionou-se no sentido de que, embora não fosse admissível prosseguir com o
processo de licenciamento ambiental de UHE’s cujos reservatórios incidissem sobre uma UC, não haveria
qualquer impedimento se a área afetada fosse desafetada (Huertas 2014).
Para a construção do CHT, seria inundado um total estimado de 207.559 hectares, tanto de TI’s quanto
de UC’s: três Parques Nacionais - Parnas (da Amazônia, do Jamanxim e do Juruena) e cinco Florestas Nacionais -
Flonas (Itaituba I, Itaituba II, Jamanxim, Crepori e Altamira). Notadamente a TI Munduruku, onde cerca de 18.720
hectares – nos quais se situam mais de vinte aldeias – seriam inundados pela UHE Chacorão. O licenciamento
dessas barragens não poderia ocorrer, e para isso o governo reduziu 75.630 hectares de cinco Unidades de
Conservação - UC federais para abrir caminho aos reservatórios das duas primeiras barragens do CHT: São Luiz
do Tapajós e Jatobá (Milikan 2016).
Nesses casos, a solução passa por compensações ambientais, pelas quais o empreendedor deve alocar
pelo menos 0,5% do valor total da implantação de seu projeto na criação de novas unidades de conservação ou
na manutenção das existentes. Além disso, outras medidas são indispensáveis, como o reassentamento
adequado das populações atingidas pela construção das usinas. A mudança do perfil de exportação de produtos
intensivos para produtos menos intensivos pode alterar, no longo prazo, a demanda de energia no país e
adicionar valor à nossa produção e exportações (Goldember e Lucon 2007).

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Portanto, o caminho para construir um novo quadro passa pela elaboração e definição de um regramento
para as questões indígenas e de áreas protegidas – UC’s federais e estaduais, além de maior diálogo entre os
setores de energia, planejamento e o de meio ambiente (Abinee 2015).

Considerações Finais
O atual modelo desenvolvimentista adotado para a Amazônia gera intenso debate envolvendo diversos
atores como ONG’s, setores energético e ambiental do governo, e comunidades tradicionais, onde cada um
defende seus interesses e, até o momento, não se encontrou um ponto que possa atender a todos os
interessados. Então, na relação causa-efeito, há uma série de questões como, por exemplo, a demarcação e não
inundação de terras indígenas. Como isso não ocorre, surgem os conflitos entre esses atores. O método indicado
para amenizá-los são as compensações ambientais pagas pelos empreendedores, e, geral, aos municípios, e não
aos que tiveram algum tipo de perda como áreas cultiváveis, além da criação de novas UC’s para tentar
“proteger” o meio ambiente.
Portanto, os conflitos no âmbito desses empreendimentos e a pouca mobilização do governo para atenuá-
los, deixam claro que estas questões precisam se tornar palco principal dos debates que envolvem os rumos da
política energética brasileira, a qual possui uma série de desafios a serem superados.

Referências
Abinee (2015) Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica. Aperfeiçoamento do setor elétrico: 10 pontos capitais.
Documento elaborado com base nos debates realizados no Workshop de abertura do AbineeTEC. Disponível em:
http://www.abinee.org.br/programas/prog16.htm. Acesso em: novembro 28, 2017.
Alargon, DF, Guerrero, NR, Torres M (2016) “Saída pelo Norte”: A articulação de projetos de infraestruturas e rotas logísticas
na bacia do tapajós. In: Alarcon DF, Milikan B, Torres M (ed) OCEKADI: Hidrelétricas, conflitos socioambientais e resistência
na bacia do Tapajós. Brasília, 43-78.
Bermann, C. (2012) O projeto da Usina Hidrelétrica Belo Monte: a autocracia energética como paradigma. Novos Cadernos.
doi: http://dx.doi.org/10.5801/ncn.v15i1.895
Bermann, C (2013) A resistência às obras hidrelétricas na Amazônia e a fragilização do Ministério Público Federal. Novos
Cadernos. doi: http://dx.doi.org/10.5801/ncn.v16i2.1205
Brasil (2006a) Ministério do Meio Ambiente – MMA Caderno da Região Hidrográfica Amazônica. Secretaria de Recursos
Hídricos. Brasília, DF. ISBN 85-7738-065-3.
Brasil (2006b) Ministério do Meio Ambiente – MMA Caderno setorial de recursos hídricos: geração de energia hidrelétrica.
113 f. Secretaria de Recursos Hídricos. Brasília, DF.
Brasil (2008) Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL. Atlas de Energia Elétrica do Brasil. 3 ed. Brasília, DF.
Brasil. (2013) Agência Nacional de Águas - ANA. Conjuntura dos Recursos Hídricos no Brasil: Agência Nacional de Águas:
Brasília.
Brasil (2013) Plano Decenal de Energia 2012-2022. Empresa de Pesquisa Energética – EPE. Ministério de Minas e Energia –
MME. Brasília.
Brasil. (2016) Plano Nacional de Energia - PNE 2050: Demanda de energia-2050. Ministério de Minas e Energia – MME.
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Brasil (2017) Agência Nacional de Águas - ANA. Projeto Amazonas: ação regional na área de recursos hídricos. 24 p. Agência
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Brasil (2017) Plano Decenal de Energia-PDE 2016-2026. Ministério de Minas e Energia - MME. Empresa de Pesquisa Energética
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Corrêa SRM (2009) O Movimento dos Atingidos por Barragem na Amazônia: um movimento popular nascente de “vidas
inundadas”. Revista NERA 12:34-65.
Corrêa SRM (2016) Neodesenvolvimentismo e conflitos sociais: o caso da Hidrelétrica de Belo Monte. Novos Cadernos. doi:
http://dx.doi.org/10.5801/ncn.v19i3.2610

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