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Sumário

1. PROGRAMA DA DISCIPLINA ........................................................................... 1


1.1 EMENTA .......................................................................................................... 1
1.2 CARGA HORÁRIA TOTAL ................................................................................... 1
1.3 OBJETIVOS ..................................................................................................... 1
1.4 CONTEÚDO PROGRAMÁTICO ............................................................................. 1
1.5 METODOLOGIA ................................................................................................ 1
1.6 CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO ............................................................................... 2
1.7 BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA .......................................................................... 2
CURRICULUM VITAE DO PROFESSOR ....................................................................... 2

2. TEXTO PARA ESTUDO ...................................................................................... 3


2.1 CONTRIBUIÇÕES ESPECIAIS. CONTRIBUIÇÕES SOBRE A FOLHA DE SALÁRIOS.
PIS/COFINS. CSLL. RETENÇÕES .............................................................................. 3
2.1.1 INTRODUÇÃO ............................................................................................... 3
2.1.2 ESPÉCIES DE CONTRIBUIÇÕES ....................................................................... 6
2.1.3 CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS: SEGURADOS, EMPRESA, ALÉM DE OUTRAS
(ART. 20, LEI Nº 8.212/1991) ................................................................................. 9
2.1.4. A COFINS E O PIS ....................................................................................... 15
2.1.5. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO - CSLL ............................... 26
2.2 IMPOSTO SOBRE RENDA E PROVENTOS DE QUALQUER NATUREZA (IR) ................ 26
2.2.1 O FATO GERADOR DO IMPOSTO..................................................................... 27
2.2.2 ASPECTO TEMPORAL .................................................................................... 31
2.2.3 ASPECTO PESSOAL ....................................................................................... 35
2.2.4ASPECTO QUANTITATIVO ............................................................................... 36
2.3 O ICMS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 E SUA REGULAMENTAÇÃO. .......................... 37
2.3.1 DO CAMPO DE INCIDÊNCIA DO ICMS ............................................................. 37
2.3.2 NÃO INCIDÊNCIA DO ICMS ........................................................................... 46
2.3.3 ASPECTO QUANTITATIVO: BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO .............................. 47
2.3.4 NÃO CUMULATIVIDADE DO ICMS ................................................................... 48
2.3.5 SELETIVIDADE DO ICMS ............................................................................... 49
2.3.6 ALÍQUOTAS DO ICMS ................................................................................... 50
2.3.7 BENEFÍCIOS FISCAIS NO ICMS ..................................................................... 52
2.4 IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA – ISS OU ISSQN ............... 53
2.4.1 ASPECTO MATERIAL...................................................................................... 53
2.4.2 ASPECTO QUANTITATIVO .............................................................................. 55
2.4.3 ASPECTO ESPACIAL ...................................................................................... 56
2.4.4 ASPECTO PESSOAL ....................................................................................... 56
2.4.5 ASPECTO TEMPORAL .................................................................................... 57
2.5 O SIMPLES ..................................................................................................... 57
1

1. PROGRAMA DA DISCIPLINA

1.1 Ementa
Contribuições Especiais. Contribuições sobre a folha de salários. PIS/COFINS. CSLL.
Retenções. IRPJ: Fato gerador, alíquota, base de cálculo. Progressividade, universalidade
e generalidade. ICMS: Fatos geradores. Substituição tributária. Guerra fiscal. Convênios.
Benefícios fiscais. ICMS na importação e exportação. ISSQN: fato gerador, base de cálculo,
alíquota mínima e máxima. Local do fato gerador. Sujeito passivo. Simples Nacional.
Definição de Microempresa (ME) e Empresa de Pequeno Porte (EPP). Conceito de Receita
Bruta. Tributos Alcançados.

1.2 Carga horária total


24 (vinte e quatro) horas/aula

1.3 Objetivos
Identificar as características centrais dos principais tributos, com seus princípios
informadores e a sistemática que cerca os elementos essenciais das respectivas formas de
incidência e seus critérios próprios de identificação constitucional e legal. Em associação a
isto, o objetivo deste módulo busca perceber as particularidades da repercussão destas
formas tributárias na vida das empresas, especialmente para identificar como o fenômeno
tributário recai nas atividades empresariais.

Em paralelo, procuraremos identificar as razões e formas jurídicas de criação do Simples


Nacional, sua forma de apuração tributária e as dificuldades operacionais decorrentes no
campo da fiscalização, cobrança e aspectos federativos.

1.4 Conteúdo programático


• Contribuições Especiais. Contribuições sobre a folha de salários. PIS/COFINS. CSLL.
Retenções.
• IRPJ: Fato gerador, alíquota, base de cálculo. Progressividade, universalidade e
generalidade.
• ISSQN: fato gerador, base de cálculo, alíquota mínima e máxima. Local do fato
gerador. Sujeito passivo.
• Simples Nacional. Definição de Microempresa (ME) e Empresa de Pequeno Porte
(EPP). Conceito de Receita Bruta. Tributos Alcançados.
• IMCS: fatos geradores e elementos de incidência. ICMS na Importação e
Exportação. Responsabilidades tributárias no ICMS. Substituição tributária.
• Guerra Fiscal. Convênios. Benefícios Fiscais. Limitações constitucionais e o Conselho
Nacional de Política Fazendária – CONFAZ.

1.5 Metodologia
Metodologia expositiva/participativa. Além do conteúdo básico dos fundamentos da
matéria, os alunos disporão de ferramentas para análise de casos decididos por
autoridades administrativas e pelo Poder Judiciário.

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1.6 Critérios de avaliação


Uma prova escrita e um trabalho, com pesos estabelecidos previamente para o somatório
da nota final. A prova será realizada em sala de aula com consulta apenas à legislação não
comentada. O trabalho, visando ao aprofundamento de um dos temas discutidos durante
o curso, deverá ser elaborado fora do horário de aula, sob orientação do professor. O
trabalho poderá ser substituído pela avaliação única da prova.

1.7 Bibliografia recomendada


Além de outras utilizadas ao longo do texto básico, recomendamos:
CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17ª ed. São Paulo: Malheiros, 2015
PAULSEN, Leandro. Direito Tributário – Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina
e da Jurisprudência. 9ª. ed., rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007
________ . Impostos Federais, Estaduais e Municipais, 4ª ed. Porto Alegre: livraria do
advogado
MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). As contribuições no sistema tributário brasileiro. São
Paulo: Dialética, Fortaleza, 2003.

Curriculum vitae do professor


IRAPUÃ BELTRÃO – doutorado em Direito pela Universidade Gama Filho (2014), com
Mestrado em Master of Law - University of Connecticut (2002) e pela Universidade Gama
Filho (2009) e, graduação em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1993),
com pós graduação em Direito Econômico pela FGV Rio (2001) e em Direito do Estado pela
UERJ (2006). Atualmente é Professor de Direito Tributário da UFRJ e dos cursos de pós-
graduação da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, da Escola da Magistratura
do Estado do Rio de Janeiro - EMERJ, da Fundação Getúlio Vargas – FGV/RJ, do Ibmec, da
Universidade Estácio de Sá e da Escola Nacional de Seguros. Procurador Federal da AGU
desde 1994.

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2. TEXTO PARA ESTUDO

2.1 Contribuições Especiais. Contribuições Sobre A Folha De


Salários. PIS/COFINS. CSLL. Retenções

2.1.1 Introdução
As contribuições surgiram como expressão de solidariedade entre componentes de
um grupo social ou econômico, objetivando um fim determinado. Na gênese, as
contribuições destinavam-se ao financiamento de interesses específicos destes grupos,
sobretudo para o financiamento dos modelos previdenciários a partir da gênese do
estabelecimento do modelo francês
Sendo assim, verifica-se que as contribuições diferem umas das outras pelo fim a
que se destinam. Até mesmo em virtude deste caráter, a natureza jurídica das
contribuições sempre foi muito debatida na doutrina, gerando divergências, oscilando entre
a aceitação de seu caráter tributário e a rejeição a este conceito.
Este ponto era o cerne das divergências acerca da natureza tributária ou não-
tributária das contribuições, posto que enquanto estas, em sua origem caracterizam-se
por expressão de solidariedade e são dotadas de destinação específica (tributos afetados
à execução de uma atividade estatal ou paraestatal específica, aproveitável ou não ao
contribuinte), o imposto se apoia no poder de império visando a manutenção do Estado,
sem qualquer vinculação. As contribuições parafiscais se diferenciam dos tributos em geral
já que encerram finalidades específicas de financiamento dos setores próprios. Morselli que
estudou o tema, já apresenta a seguinte característica, versando sobre o instituto da
parafiscalidade que justificava as contribuições:
“A teoria da parafiscalidade baseia-se na distinção das necessidades públicas em
fundamentais e complementares. As primeiras correspondem às finalidades do
Estado, de natureza essencialmente política (defesa externa, interna, justiça etc.).
As segundas correspondem às finalidades sociais e econômicas, as quais, sobretudo
recentemente, assumiram grandes proporções e novas determinações financeiras.
Trata-se principalmente de necessidades de grupos profissionais econômicos e de
grupos sociais. Assim, às necessidades fundamentais correspondem uma finança
fundamental (de entes públicos territoriais). A teoria da parafiscalidade explica a
finança complementar.”1

Nos antecedentes do atual ordenamento, as contribuições surgiam por leis


esparsas, sem qualquer disciplina. O próprio Código Tributário Nacional – CTN, além de
não as reconhecer, fazia referência genérica para a sua existência (art. 217 CTN) e deixava
de fora do tratamento sistematizado pelas normas gerais. Vale sempre recordar que o CTN
erigia a sua estrutura dos tributos a partir do fato gerador (art. 4o CTN), desconsiderando
a destinação dos recursos.
De todas as experiências praticadas no país sobre as contribuições ao longo do
século XX restou a controvérsia sobre a natureza da exação. Igual debate ocorreu em
outros sistemas tributários, marcados pelo surgimento de atividades anteriormente
estranhas ao agir público e com a fixação de recursos vinculados para tais finalidades. No
Brasil, o legislador constituinte definiu a competência para a instituição das contribuições

1
MORSELLI, Emanuele. Parafiscalidade e seu controle. Rio de Janeiro: Ed. Inst. Brasileiro de Direito Financeiro, 1954

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no capítulo que trata do Sistema Tributário Nacional (Capítulo I do Título VI), o que
estabeleceu, à luz do texto constitucional vigente, a característica tributária desta exação.
Atualmente, toda esta teoria já está consolidada, tanto assim que o Supremo Tribunal
Federal reconheceu a natureza tributária das contribuições parafiscais e seu elemento
distintivo pela finalidade dos recursos.
Como já teve oportunidade de afirmar o STF, as “contribuições são tributos, sujeitos
a regime jurídico próprio, e cuja propriedade decorre da destinação constitucional das
receitas e da submissão às finalidades específicas pelo art. 149, da CF, do qual se extrai
que as mesmas podem ser instituídas pela União e pelos Estados e Municípios como
instrumento de atuação na área social”2.
Por fim, podemos definir como características comuns aos empréstimos
compulsórios e às contribuições especiais a vinculação de receita, ou seja, a
obrigatoriedade de se haver previamente fixada a destinação específica do produto de sua
arrecadação. Enquanto nos impostos é bastante a ocorrência do fato imponível para o
nascimento da obrigação tributária, ao passo que nas contribuições, a obrigação surge
somente com o benefício e o fato descrito na norma ocorrendo concomitantemente.
Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, além do
reconhecimento e da ampliação das contribuições até aquele momento instituídas foram
criadas novas contribuições sociais, dentre elas novas formas de contribuições para o
financiamento da seguridade, a CIDE, a CSLL e a CPMF e posteriormente a COSIP, tendo
sido concedida à União Federal, via de regra, a competência para a instituição destes
tributos.
Até a Constituição de 1988 a doutrina não se encontrava pacificada em relação à
classe de tributo na qual as contribuições deveriam constar. Ruy Barbosa Nogueira e
Baleeiro atrelavam as contribuições por eles chamadas de “parafiscais” a tributos que ora
eram classificadas entre as taxas, ora dentre os impostos, não pertencendo, na ocasião a
uma espécie autônoma.
Doutro giro, Hugo de Brito Machado defendia que as contribuições eram dotadas de
especificidade e características próprias, sendo detentoras de espécie distinta e autonomia,
ainda que apresentasse a denominação genérica de contribuições sociais.
Tais ponderações clássicas partiam da identificação genérica dos sistemas
tributários conhecidos. Em geral, sistemas tributários contam com três grandes fontes de
arrecadação tributária: os impostos, as taxas e as contribuições e, excepcionalmente,
alguns instituem empréstimos compulsórios, sendo que aqueles primeiros se classificavam
a partir das contraprestações realizadas e o último por ser tributo restituível.
Quanto às contribuições, reconhecida sua essência tributária pelos tribunais, é de
sua natureza a obrigação do Estado de aplicar os recursos segundo a destinação específica
para a qual o tributo foi criado, atendendo assim, a finalidade específica contida na ocasião
da instituição. São tributos, portanto, com os recursos vinculados às finalidades para os
quais foram instituídos.
Ademais, a relevância da determinação da natureza tributária das contribuições
define o regime jurídico aplicável e a consequente submissão às normas gerais
determinadas pelo art. 146 CRFB e estabelecidas pelo Código Tributário Nacional. Capítulo
relevante desta consequência deu-se quanto ao tempo da prescrição e da decadência sobre
as contribuições previdenciárias, já que o Plano de Custeio da Previdência Social – Lei n.

2
STF – Informativo 357, no julgamento da ADI 3105, disponível em http://www.stf.jus.br//arquivo/informativo/documento/
informativo357.htm

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8.212, de 1990 – pretendia estabelecer prazo decenal para ambas, em detrimento do


quinquênio havido no CTN. Após intenso debate nos tribunais, o STF3 acabou resolvendo a
questão com a seguinte argumentação:
"Prescrição e decadência tributárias. Matérias reservadas a lei
complementar. Disciplina no Código Tributário Nacional.
Natureza tributária das contribuições para a seguridade social.
Inconstitucionalidade dos arts. 45 e 46 da Lei 8.212/1991 e
do parágrafo único do art. 5º do DL 1.569/1977. As normas
relativas à prescrição e à decadência tributárias têm natureza
de normas gerais de direito tributário, cuja disciplina é
reservada a lei complementar, tanto sob a Constituição
pretérita (art. 18, § 1º, da CF de 1967/1969) quanto sob a
Constituição atual (art. 146, b, III, da CF de 1988).
Interpretação que preserva a força normativa da Constituição,
que prevê disciplina homogênea, em âmbito nacional, da
prescrição, decadência, obrigação e crédito tributários.
Permitir regulação distinta sobre esses temas, pelos diversos
entes da federação, implicaria prejuízo à vedação de
tratamento desigual entre contribuintes em situação
equivalente e à segurança jurídica. Disciplina prevista no
Código Tributário Nacional. O Código Tributário Nacional (Lei
5.172/1966), promulgado como lei ordinária e recebido como
lei complementar pelas Constituições de 1967/69 e 1988,
disciplina a prescrição e a decadência tributárias. Natureza
tributária das contribuições. As contribuições, inclusive as
previdenciárias, têm natureza tributária e se submetem ao
regime jurídico-tributário previsto na Constituição.
Interpretação do art. 149 da CF de 1988. Precedentes.
Recurso extraordinário não provido. Inconstitucionalidade dos
arts. 45 e 46 da Lei 8.212/1991, por violação do art. 146, III,
b, da Constituição de 1988, e do parágrafo único do art. 5º do
DL 1.569/1977, em face do § 1º do art. 18 da Constituição de
1967/69. Modulação dos efeitos da decisão. Segurança
jurídica. São legítimos os recolhimentos efetuados nos prazos
previstos nos arts. 45 e 46 da Lei 8.212/1991 e não
impugnados antes da data de conclusão deste julgamento."
(RE 556.664 e RE 559.882, Rel. Min. Gilmar Mendes,
julgamento em 12-6-2008, Plenário, DJE de 14-11-2008, com
repercussão geral.)
No mesmo sentido: RE 505.771-AgR, Rel. Min. Eros Grau,
julgamento em 10-2-2009, Segunda Turma, DJE de 13-3-
2009; RE 560.626, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em
12-6-2008, Plenário, DJE de 5-12-2008, com repercussão
geral; RE 559.943, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 12-
6-2008, Plenário, DJE de 26-9-2008, com repercussão geral.

3
Além de resolver a questão, a Corte restou editando a Súmula vinculante n. 08, com a seguinte redação: São inconstitucionais o parágrafo
único do artigo 5º do Decreto-Lei nº 1.569/1977 e os artigos 45 e 46 da Lei nº 8.212/1991, que tratam da prescrição e decadência do crédito
tributário.

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Vide: RE 543.997-AgR, voto da Rel. Min. Ellen Gracie,


julgamento em 22-6-2010, Segunda Turma, DJE de 6-8-2010.

2.1.2 Espécies De Contribuições


A Lei n.º 5.172/66, denominada de Código Tributário Nacional (CTN), dispondo
sobre o Sistema Tributário Nacional e instituindo normas gerais de direito tributário
aplicáveis à União, Estados, Distrito Federal, e Municípios foi recepcionada pela
Constituição Federal de 1988 com status de Lei Complementar, vigente atualmente,
ressalvados os trechos sem efeito, posto que não recepcionados.
O advento do CTN em 1966, consolidando debates que já vinham sendo
promovidos, provocou uma evolução do Direito Tributário brasileiro e fez com que
surgissem diversas teorias sobre as espécies tributárias existentes, visando enquadrar
didaticamente as diferentes modalidades de tributos criadas pelo ente tributante.
Com fundamento no art. 217 do CTN (redação do Decreto-Lei n.º 27/66), criou-se
a possibilidade de, além das espécies presentes no rol taxativo do início do próprio CTN
(impostos, taxas e contribuições de melhoria), outras modalidades de tributos pudessem
ser cobrados. A estas demais modalidades a doutrina passou a denominar “contribuições
sociais”, sendo tributos destinados a financiar atividades oferecidas pelo Estado referentes
a direitos sociais ( seguridade social, educação, direitos trabalhistas, etc.).
A verdade é que o tratamento do CTN ficou bastante abalada com a identificação
pelo Supremo Tribunal Federal de outras formas tributárias. Os empréstimos compulsórios
e as contribuições parafiscais, sobretudo depois de sua inclusão na Constituição Federal de
88, nos art. 148 e 149 CRFB , (e dentro do Sistema Tributário Nacional), passam a ter
natureza tributária segundo o STF.
Portanto, os doutrinadores transitavam entre estas teorias sobre a matéria, até que
uma nova teoria foi sedimentada, sendo, atualmente, a mais aceita pela doutrina e
tribunais pátrios, a saber, a teoria pentapartite, que considera como tributos os impostos,
as taxas, as contribuições de melhoria, o empréstimo compulsório e as contribuições
especiais. Tal possibilidade (instituição das contribuições sociais) foi plenamente
recepcionada pela CRFB/88, que com previsão expressa no art. 149, facultou à União
instituir esta espécie de tributo. Ainda, o Constituinte Originário foi além e permitiu que a
União pudesse instituir outras contribuições, relacionadas à intervenção no domínio
econômico ou ao interesse de categorias profissionais/econômicas.
Doravante, a denominação contribuição social foi ampliada para representar o que
parte da doutrina chamou de “contribuição especial”, espécie esta que se dividiu em
contribuições sociais, contribuições de intervenção no domínio econômico e contribuições
de interesse de categorias profissionais ou econômicas.
Segundo a teoria pentapartite, são 5 (cinco) as espécies tributárias, o qual tem sido
o entendimento majoritário na doutrina e no STF, separando os tributos em:
I) impostos (art. 145,1, CF c/c art. 16 do CTN);
II) taxas (art.145,II CF c/c arts 77 e 78 do CTN);
III) contribuições de melhoria (art. 145, III CF c/c arts 81/82
CTN);
IV) empréstimos compulsórios (art. 148, CRFB);
V) contribuições especiais (art. 149 e art. 149-A, CRFB).

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Quanto às contribuições, temos as seguintes modalidades:


I. contribuições interventivas;
II. contribuições corporativas;
III. contribuições sociais e dentre estas:
a) sociais gerais;
b) sociais para a seguridade, e
c) outras contribuições para a seguridade;
IV. contribuições de iluminação pública.

Com tudo isto, podemos entender que as contribuições especiais são assim
divididas:

C Sociais gerais
Sociais
O Art. 149 Seguridade social Art. 195
N União Interventivas ou CIDE
T Profissionais ou corporativas
R
I
B
U
Art. 149-A COSIP
I
Municípios/DF (contribuição sobre iluminação pública)
Ç
Õ
E
S

A contribuição para o serviço de iluminação pública (COSIP), de competência dos


Municípios e do Distrito Federal surgiu com a edição da Emenda Constitucional 39/02, é
mais uma modalidade da exação da qual ainda se discute sua constitucionalidade.
Apesar de ser tradicional tributo de competência federal, o rol das contribuições
especiais ganhou importante inovação com a Emenda nº 39, de 2002, que não se confunde
com as demais e representa novel forma específica de financiamento de determinada
finalidade. Na forma do introduzido art. 149-A CRFB podem os Municípios instituir
contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública, cobrando-a na fatura de
consumo de energia elétrica. Tal dispositivo não apenas reconhece a competência do ente
local, como também admite no seu parágrafo a possibilidade de cobrança sobre os valores
da energia consumida.
Tratando deste tributo, o Supremo Tribunal Federal assim teve oportunidade de
afirmar:
“Entendeu-se que a COSIP constitui um novo tipo de contribuição
que refoge aos padrões estabelecidos nos artigos 149 e 195 da CF,
ou seja, é uma exação subordinada a disciplina própria (CF, art.
149-A), sujeita, contudo, aos princípios constitucionais tributários,
haja vista enquadrar-se inequivocamente no gênero tributo.
Ressaltou-se que, de fato, como a COSIP ostenta características
comuns a várias espécies de tributos, não haveria como deixar de
reconhecer que os princípios aos quais estes estão submetidos
também se aplicam, modus in rebus, a ela. Destarte, salientou-se

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8

que, apesar de o art. 149-A da CF referir-se apenas aos incisos I e


III do art. 150 da CF, o legislador infraconstitucional, ao instituir a
contribuição em análise, considerada a natureza tributária da
exação, estaria jungido aos princípios gerais que regem o gênero,
especialmente o da isonomia (art. 150, II) e o da capacidade
contributiva”. (RE nº 573.675/SC, rel. Min. Ricardo Lewandowski, j.
em 25/03/2009 – Informativo nº 540)

Além desta nova modalidade, o poder constituinte consolidou situação especifica no


§1º no artigo 149 da CRFB/88 no sentido de tornar a competência para instituição das
contribuições sociais de natureza comum, ou seja, todos os entes da Federação poderão
instituí-las, deixando de ser competência privativa da União, passando a estabelecer que:
Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão
contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em
benefício destes, do regime previdenciário de que trata o art.
40, cuja alíquota não será inferior à da contribuição dos
servidores titulares de cargos efetivos da União.

De tudo, esta previsão consolida grande exceção para a competência exclusiva da


União que, junto com a Contribuição para Financiamento da Iluminação Pública – COSIP,
permite a seguinte conclusão do Pretório Excelso:

O art. 149, caput, da Constituição, atribui à União a


competência exclusiva para a instituição de contribuições
sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse
das categorias profissionais e econômicas. Essa regra
contempla duas exceções, contidas no arts. 149, § 1º, e 149-
A, da Constituição. À exceção desses dois casos, aos Estados-
membros não foi atribuída competência para a instituição de
contribuição, seja qual for a sua finalidade. A competência,
privativa ou concorrente, para legislar sobre determinada
matéria não implica automaticamente a competência para a
instituição de tributos. Os entes federativos somente podem
instituir os impostos e as contribuições que lhes foram
expressamente outorgados pela Constituição. Os Estados-
membros podem instituir apenas contribuição que tenha por
finalidade o custeio do regime de previdência de seus
servidores. A expressão “regime previdenciário” não abrange
a prestação de serviços médicos, hospitalares, odontológicos
e farmacêuticos. STF, RE 573.540, Rel. Min. Gilmar Mendes,
julgamento em 14-4-2010, Plenário, DJE de 11-6-2010

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Importante observar que a atual redação do art. 149 ainda atribui algumas
características para as contribuições sociais e para a CIDE, tudo na forma do §2º, a saber:
- não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação;
- incidirão também sobre a importação de produtos estrangeiros ou serviços;
- poderão ter alíquotas, ad valorem, tendo por base o faturamento, a receita bruta
ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor aduaneiro; ou específica,
tendo por base a unidade de medida adotada.

2.1.3 Contribuições Previdenciárias: Segurados, Empresa, Além De Outras


(art. 20, Lei nº 8.212/1991)
O financiamento da seguridade social é responsabilidade de toda a sociedade, sendo
que suas fontes são oriundas de: receitas da União, contribuições sociais e outras fontes.
Dentre as contribuições sociais, há as previdenciárias, que são as contribuições das
empresas sobre a folha de salários (art. 195, I, “a” da Constituição) e dos trabalhadores
(art. 195, II da Constituição). São assim denominadas em razão da vinculação exclusiva
ao custeio da previdência social (art. 167, XI da Constituição).
A previsão constitucional destas várias contribuições para o financiamento da
seguridade autorizou a instituições de formas tributárias de solidariedade social sobre fatos
econômicos tradicionalmente ligados a impostos, como o lucro, o salário e a importação.
Restarão distintas dos impostos que adotem tais elementos em suas hipóteses de
incidência na medida da destinação finalística dos recursos obtidos. Outrossim, sem
prejuízo de serem tributos com recursos vinculados, não se pode afirmar serem tributos
vinculados em si, já que não haverá, como regra, a associação de qualquer atividade
estatal específica destinada ao contribuinte.
Assim, tem-se que as contribuições para a seguridade social, com previsão
constitucional no art. 195 da CRFB/1988 e art. 74 do ADCT, são submetidas ao princípio
da anterioridade nonagesimal (art. 195, § 6º, CRFB/1988), podendo ser instituídas
mediante a edição de lei ordinária. São aquelas que enfrentam as maiores controvérsias
no campo doutrinário e jurisprudencial.
De se notar que a Constituição da República define o que se deve entender por
seguridade social. E em seu art. 194 a conceitua como “um conjunto integrado de ações
de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos
relativos à saúde, à previdência e à assistência social”.
No mesmo diapasão, o art. 195 da Carta Política dispõe que a “seguridade social
será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei,
mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais” – aqui leia-se, contribuições para
a seguridade social – classificando-as nas seguintes subespécies:
(i) O inciso I, do art. 195, da CRFB/1988 (com redação dada pela Emenda Constitucional
nº 20, de 15/12/1998) prevê as contribuições do empregador, da empresa e da entidade
a ela equiparada na forma da lei, incidente sobre:
(a) folha de salário e demais rendimentos do trabalho, mesmo sem vínculo
empregatício, incluindo-se a contribuição previdenciária dos empregadores,
instituída pela Lei nº 8.212/1991 e a contribuição dos autônomos, criada pela LC
nº 84/1996 e revogada pela Lei nº 9.876/1999;

Direito Tributário II
10

(b) a receita ou faturamento, incluindo-se a COFINS, instituída pela LC nº 70/19914


e alterada pela Lei nº 9.718/19985 e pela Lei nº 10.833/20036, bem como o PIS,
hoje regulado pela Lei nº 9.715/1998, com as alterações da Lei nº 10.637/2002, e
que tem no art. 239 da Lei Maior o seu amparo constitucional;
(c) lucro; é a chamada CSLL, contribuição social sobre o lucro líquido, criada pela
Lei nº 7.689/1988, alterada pela Lei nº 7.856/1989, administrada pela União, por
meio da Receita Federal do Brasil.
(ii) Contribuições dos trabalhadores e demais segurados da previdência social,
disciplinada pelo inciso II, do art. 195, da CRFB/1988.
(iii) Contribuições incidentes sobre a receita de concursos de prognósticos, tratada
pelo inciso III, do art. 195, da CRFB/1988.
(iv) Contribuição do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei
a ele equiparar, novidade trazida pela Emenda Constitucional nº 42/2003, que
acrescentou o inciso IV ao art. 195, da CRFB/1988.
(v) Contribuição do produtor, do parceiro, do meeiro e do arrendatário rurais e do
pescador artesanal, bem como dos respectivos cônjuges, que exerçam suas
atividades em regime de economia familiar, sem empregados permanentes,
mediante a aplicação de uma alíquota sobre o resultado da comercialização da
produção, e fazendo jus aos benefícios nos termos da lei (conforme redação dada
pela EC nº 20/1998).

Note-se que o rol previsto na Carta Magna não é taxativo, porquanto o próprio §
4º, de seu art. 195 informa que “a lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir
a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecidas o disposto no art. 154, I”.
Nesse passo, o referido § 4º do art. 195, da CRFB/1988 atribui competência residual à
União Federal para, mediante lei complementar, instituir novas contribuições sociais, que
não digam respeito às referidas no caput do seu art. 195.7

2.1.3.1 As contribuições previdenciárias dos Segurados

Para os contribuintes individuais e facultativos, será, em regra, de 20% sobre o


respectivo salário de contribuição (podendo ser reduzida para 11% ou 5% em algumas
hipóteses, incluindo o MEI-Microempreendedor Individual).
A empresa será obrigada a arrecadar a contribuição do segurado contribuinte
individual a seu serviço, descontando-a da respectiva remuneração, e a recolher o valor
arrecadado (20%, 11% ou 5%), juntamente com a contribuição a seu cargo. Aplica-se
esta regra também à cooperativa de trabalho em relação à contribuição social devida pelo
seu cooperado (04/2003).
Ainda neste sentido, o contribuinte individual ficou obrigado a complementar,
diretamente, a contribuição até o valor mínimo mensal do salário-de-contribuição, quando
as remunerações recebidas no mês, por serviços prestados a pessoas jurídicas, forem

4
A LC nº 70/1991 sofreu alterações de texto com a edição da LC nº 85/1996.
5
Alterada pelas Leis nº 9.990/2000; nº 10.637/2002; nº 10.865/2004; nº 11.051/2004 e nº 11.196/2005, bem como pela MP nº 2.158-35/2001.
6
Alterada pelas Leis nº 10.865/2004; nº 10.925/2004; nº 10.996/2004; nº 11.051/2004; nº 11.196/2005; nº 11.307/2006; nº 11.434/2006; nº
11.452/2007; nº 11.488/2007 e, recentemente, pela Medida Provisória nº 413, de 2008.
7
De acordo com Luiz Emygdio F. da Rosa Junior, “o STF decidiu que a remissão contida na parte final do art. 195, § 4º da CF, ao art. 154,
refere-se somente à necessidade de lei complementar para criação de novas contribuições, não proibindo a coincidência da base de cálculo da
contribuição social com a base de cálculo de imposto já existente (RE 228.321-rs, REL. Min. Carlos Velloso, Plenário, 1/10/98, Informativo
STF n. 125, p.1)”. ROSA JUNIOR, Luiz Emygdio F. da. Manual de Direito Financeiro e Tributário. 16. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.
p. 425.

Direito Tributário II
11

inferiores a este patamar.


O contribuinte individual nesta situação é obrigado a complementar,
diretamente, a contribuição até o valor mínimo mensal do salário de contribuição, quando
as remunerações recebidas no mês, por serviços prestados a pessoas jurídicas, forem
inferiores a este.
Cabe ao próprio contribuinte individual que prestar serviços, no mesmo mês, a mais
de uma empresa, cuja soma das remunerações superar o limite mensal do salário de
contribuição, comprovar às que sucederem a primeira o valor ou valores sobre os quais já
tenha incidido o desconto da contribuição, de forma a se observar o limite máximo do
salário de contribuição (art. 216, §28, do Regulamento da Previdência Social - Decreto nº.
3.048/1999).
Nesta hipótese, a SRFB poderá facultar ao contribuinte individual que prestar,
regularmente, serviços a uma ou mais empresas, cuja soma das remunerações seja igual
ou superior ao limite mensal do salário de contribuição, indicar qual (is) empresa(s) e sobre
qual valor deverá proceder ao desconto da contribuição, de forma a respeitar o limite
máximo e dispensar as demais dessa providência, bem como atribuir ao próprio
contribuinte individual a responsabilidade de complementar a respectiva contribuição até
o limite máximo, na hipótese de, por qualquer razão, deixar de receber remuneração ou
receber remuneração inferior às indicadas para o desconto (art. 216, §29, do Regulamento
da Previdência Social - Decreto nº. 3.048/1999).
O disposto acima não se aplica ao contribuinte individual, quando contratado por
outro contribuinte individual equiparado a empresa ou por produtor rural pessoa física ou
por missão diplomática e repartição consular de carreiras estrangeiras, e nem ao brasileiro
civil que trabalha no exterior para organismo oficial internacional do qual o Brasil é membro
efetivo, pois nestas hipóteses será considerado segurado empregado, na forma do art. 12,
da Lei nº. 8.212/91.

2.1.3.2 Contribuições Previdenciárias das Empresas

Inicialmente, impõe-se reconhecer as referências já encontradas nos casos levados


ao STF, especialmente quanto a afirmação: “esta Corte firmou o entendimento de que o
termo ‘empregadores’, contido no art. 195, I, em sua redação original, não pode ser
interpretado estritamente, pois as contribuições para a seguridade social assentam na
solidariedade geral, conforme o caput do mencionado artigo. Por isso, a nova redação do
inciso I do art. 195, conforme a EC 20/1998, apenas explicitou o que o constituinte
originário já previa.” (RE 585.181-AgR-segundo, Rel. Min. Joaquim Barbosa,
julgamento em 31-8-2010, Segunda Turma, DJE de 8-10-2010). Sem prejuízo disto, diante
da polêmica dada pela redação original da Constituição, o poder reformador estabelece
que tal contribuição será devida pelo empregador, da empresa e da entidade a ela
equiparada na forma da lei.
Elencamos, abaixo, as contribuições previdenciárias pagas pelas empresas, na
forma do art. 22, da Lei nº. 8.212/91:
I – 20% sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer
título, durante o mês,8 aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem

8
“Aplica-se à tributação da pessoa jurídica, para as contribuições destinadas ao custeio da seguridade social, calculadas com base na
remuneração, o regime de competência. Assim, o tributo incide no momento em que surge a obrigação legal de pagamento, independentemente
se este irá ocorrer em oportunidade posterior. Agravo regimental ao qual se nega provimento.” (STF - RE 419.612-AgR, Rel. Min. Joaquim
Barbosa, j. em 1º-3-2011, 2ª Turma, DJE de 6-4-2011.)

Direito Tributário II
12

serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as
gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes
de reajuste salarial,9 quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à
disposição do empregador ou tomador de serviços, nos termos da lei ou do contrato ou,
ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa.
II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58, da Lei nº.
8.213/91- PBPS (aposentadoria especial), e daqueles concedidos em razão do grau de
incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre
o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados
empregados e trabalhadores avulsos (SAT ou RAT10):
• 1% para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes
do trabalho seja considerado leve;
• 2% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja
considerado médio;
• 3% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja
considerado grave.

A diferenciação das alíquotas desta contribuição encontra autorização no art. 195,


§9º, da Constituição Federal, e é determinada segundo o desempenho da empresa aferido
de acordo com o FAP (Fator Acidentário de Prevenção). No julgamento do RE nº.
343.446/SC, de relatoria do Ministro Carlos Velloso, o Supremo Tribunal Federal entendeu
pela validade da regulamentação por decreto dos critérios técnicos para fixação dessas
alíquotas de forma objetiva no caso concreto11.
A alíquota de contribuição de 1%, 2% ou 3%, destinada ao financiamento do
benefício de aposentadoria especial ou daqueles concedidos em razão do grau de incidência
de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, poderá ser
reduzida, na forma do art. 10, da Lei nº. 10.666/2003, em até 50%, ou aumentada, em
até 100%, conforme o fator acidentário previdenciário – FAP (ver art. 202-A, RPS), em
razão do desempenho da empresa em relação à respectiva atividade econômica, apurado
em conformidade com os resultados obtidos a partir dos índices de frequência, gravidade

9
“A compreensão da fundamentação dos votos da maioria vencedora revela a necessária restrição dos efeitos da declaração de
inconstitucionalidade do art. 4º da Lei 7.418/1985 e do art. 5º do Decreto 95.247/1987 exclusivamente no que concerne ao domínio tributário,
para afastar a incidência de contribuição previdenciária pelo só pagamento da verba em dinheiro, mantendo-se hígida, no mais, a sistemática
do vale-transporte para os demais fins, notadamente à luz dos domínios remanescentes do direito positivo.” (STF - RE 478.410-ED, Rel. Min.
Luiz Fux, j. em 15-12-2011, Plenário, DJE de 6-2-2012.)
10
A atual contribuição denominada de RAT (Risco Acidente de Trabalho) corresponde ao antigo SAT (Seguro Acidente de Trabalho). O art.
22, II, da Lei nº. 8.212/91 (com a redação dada pela Lei nº. 9.732/98) traz a previsão no plano infraconstitucional de incidência desta
contribuição. Como fundamentos constitucionais pode-se citar o art. 7º, XXVIII, que assegura ao trabalhador o seguro contra acidentes de
trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização que este esteja obrigado, em caso de dolo ou culpa; e o art. 201, §10, que estipula
a previsão de que lei disciplinará a cobertura do risco do acidente de trabalho, a ser atendida concorrentemente pelo regime geral da previdência
social e pelo setor privado.
11
CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO: SEGURO DE ACIDENTE DO TRABALHO - SAT. Lei 7.787/89, arts. 3º e 4º;
Lei 8.212/91, art. 22, II, redação da Lei 9.732/98. Decretos 612/92, 2.173/97 e 3.048/99. C.F., artigo 195, § 4º; art. 154, II; art. 5º, II; art. 150,
I. I. - Contribuição para o custeio do Seguro de Acidente do Trabalho - SAT: Lei 7.787/89, art. 3º, II; Lei 8.212/91, art. 22, II: alegação no
sentido de que são ofensivos ao art. 195, § 4º, c/c art. 154, I, da Constituição Federal: improcedência. Desnecessidade de observância da técnica
da competência residual da União, C.F., art. 154, I. Desnecessidade de lei complementar para a instituição da contribuição para o SAT. II. - O
art. 3º, II, da Lei 7.787/89, não é ofensivo ao princípio da igualdade, por isso que o art. 4º da mencionada Lei 7.787/89 cuidou de tratar
desigualmente aos desiguais. III. - As Leis 7.787/89, art. 3º, II, e 8.212/91, art. 22, II, definem, satisfatoriamente, todos os elementos
capazes de fazer nascer a obrigação tributária válida. O fato de a lei deixar para o regulamento a complementação dos conceitos de
"atividade preponderante" e "grau de risco leve, médio e grave", não implica ofensa ao princípio da legalidade genérica, C.F., art. 5º,
II, e da legalidade tributária, C.F., art. 150, I. IV. - Se o regulamento vai além do conteúdo da lei, a questão não é de inconstitucionalidade,
mas de ilegalidade, matéria que não integra o contencioso constitucional. V. - Recurso extraordinário não conhecido. (sem grifos no original).
RE nº. 343.446/SC, relator Ministro Carlos Velloso, Tribunal Pleno, julgado em 20.03.2003. No mesmo sentido, Agravo Regimental no RE
nº. 598.739/SC, relator Ministro Eros Grau, Segunda Turma, julgado em 20.10.2009.

Direito Tributário II
13

e custo12.
Para se determinar o valor correto da parcela básica do RAT é necessário identificar
em qual dessas duas situações a empresa se enquadra:
• se possui somente uma única atividade econômica, ou seja, quando todos os
funcionários da empresa trabalham em diversos setores, mas para a fabricação do
produto final. Ex: Construtora, Metalúrgica;
• se possui Atividade Econômica Preponderante13, ou seja, quando a empresa
tem várias atividades econômicas, ou seja, produz vários produtos como é o caso
de empresas que possuem várias fábricas com diversidade de produção. Ex.:
Grupos empresariais que fabricam adubos, medicamentos, ração, etc. Neste caso,
é necessário identificar qual é a Atividade Econômica do Grupo que tem o maior
número de funcionários e sua respectiva Classificação Nacional de Atividade
Econômica (CNAE). Essa será a Atividade Econômica Preponderante.

Importante destacar que, na forma da Súmula 351, do STJ, havendo inscrições


individualizadas dos estabelecimentos perante o CNPJ – Cadastro Nacional de Pessoas
Jurídicas do Ministério da Fazenda, a apuração da alíquota deve ser individualizada também
em cada um desses estabelecimentos. Havendo vários estabelecimentos, mas um único
cadastro no CNPJ, deverá a atividade preponderante ser apurada como um todo para fins
de incidência da alíquota de forma global.
STJ Súmula nº 351 - 11/06/2008 - DJe 19/06/2008 - A
alíquota de contribuição para o Seguro de Acidente do
Trabalho (SAT) é aferida pelo grau de risco desenvolvido em
cada empresa, individualizada pelo seu CNPJ, ou pelo grau de
risco da atividade preponderante quando houver apenas um
registro.

Afora a parcela básica, as empresas que exerçam atividades em condições


especiais, expondo seus trabalhadores a agentes nocivos, químicos ou biológicos,
prejudiciais a sua saúde e integridade física, estarão sujeitas também ao recolhimento de
um adicional do RAT, que será destinado ao financiamento das aposentadorias especiais,
da seguinte forma:
• Regra geral – utilizando-se as alíquotas de 6%, 9% e 12% incidentes
sobre a remuneração paga, devida ou creditada ao segurado
empregado ou trabalhador avulso, conforme o prazo para a
aposentadoria especial seja de 25, 20 ou 15 anos, respectivamente;

• Contribuinte individual filiado à cooperativa de produção - 6%,


9% e 12% incidentes sobre a remuneração paga ou creditada, tal como
ocorre na regra geral, para fatos geradores ocorridos após 01/04/2003,
conforme o prazo para a aposentadoria especial seja de 25, 20 ou 15
anos, respectivamente;

12
Cabe destacar que a fixação de alíquota da contribuição ao SAT a partir de parâmetros estabelecidos por regulamentação do Conselho
Nacional de Previdência Social constitui o Tema nº. 554 da Repercussão Geral do STF, de relatoria do Ministro Luiz Fux, ainda não analisado
até o presente momento.
13
Atividade preponderante é aquela que ocupa, na empresa, o maior número de empregados e avulsos.

Direito Tributário II
14

• Contribuinte individual filiado à cooperativa de trabalho – 5%,


7% e 9% incidentes sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura de
prestação de serviços, para fatos geradores ocorridos após 01/04/2003,
conforme o prazo para a aposentadoria especial seja de 25, 20 ou 15
anos, respectivamente.

Neste caso, a alíquota majorada tem incidência exclusiva sobre a remuneração dos
segurados expostos aos agentes nocivos, diferentemente do que ocorre com a parcela
básica, que, como visto anteriormente, incide sobre a remuneração de todos os segurados.
III – 20% do total das remunerações pagas ou creditadas a qualquer título, no
decorrer do mês, aos segurados contribuintes individuais que lhe prestem serviços;
IV – 15% sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços,
relativamente a serviços que lhe são prestados por cooperados por intermédio de
cooperativas de trabalho.
Importante destacar que a cota patronal não incide sobre o salário de contribuição,
conceito utilizado para o recolhimento da contribuição devida pelos segurados. Desta
forma, a contribuição previdenciária da empresa é calculada sobre a remuneração total,
não estando, portanto, sujeita ao limite máximo do salário de contribuição.
No caso de bancos comerciais, bancos de investimentos, bancos de
desenvolvimento, caixas econômicas, sociedades de crédito, financiamento e investimento,
sociedades de crédito imobiliário, sociedades corretoras, distribuidoras de títulos e valores
mobiliários, empresas de arrendamento mercantil, cooperativas de crédito, empresas de
seguros privados e de capitalização, agentes autônomos de seguros privados e de crédito
e entidades de previdência privada abertas e fechadas é devida a contribuição adicional de
2,5% sobre a base de cálculo definida nos itens I e III (remuneração dos segurados
empregados, avulsos e contribuintes individuais)
No caso de o empregador ser MEI, deverá reter e recolher a contribuição
previdenciária relativa ao segurado a seu serviço, ficando também obrigado a prestar
informações relativas ao segurado a seu serviço, na forma estabelecida pelo Comitê Gestor
do SIMPLES (Regime Tributário Simples) Nacional; e está sujeito ao recolhimento da
contribuição patronal, calculada à alíquota de 3% sobre o salário de contribuição do
segurado, ao invés dos tradicionais 20% sobre a remuneração No caso do EIRELI, a pessoa
jurídica contratante é responsável pelo ônus das contribuições previdenciárias no
percentual de 20% ( Lei 8.212/91, art. 22).
A contribuição sobre a remuneração de empregados, avulsos e contribuintes
individuais, previstas no art. 22, I e III da Lei n° 8.212/1991, normalmente fixada em
20%, poderá sofrer reduções para empresas que prestam serviços de tecnologia da
informação (TI) e de tecnologia da informação e comunicação (TIC). A redução será obtida
mediante a subtração de um décimo do percentual correspondente à razão entre a receita
bruta de venda de serviços para o mercado externo e a receita bruta total de vendas de
bens e serviços (art. 14, caput). As atividades classificadas como TI e TIC são:
I - análise e desenvolvimento de sistemas;
II - programação; processamento de dados e congêneres; elaboração de
programas de computadores, inclusive de jogos eletrônicos; licenciamento ou cessão de
direito de uso de programas de computação; assessoria e consultoria em informática;
suporte técnico em informática, inclusive instalação, configuração e manutenção de
programas de computação e bancos de dados; e planejamento, confecção, manutenção e
atualização de páginas eletrônicas e call center.

Direito Tributário II
15

Do empregador doméstico – 12% do salário de contribuição (e não a remuneração)


do empregado doméstico a seu serviço.

2.1.4. A COFINS e o PIS

2.1.4.1 PIS/PASEP

O Programa de Integração Social - PIS foi instituído pela Lei Complementar nº


7/70, com o objetivo de promover a integração do empregado na vida e no
desenvolvimento das empresas, sendo este o objetivo declarado no art. 1º da referida
norma.
Já o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público - PASEP foi
instituído pela Lei Complementar nº 8/70. Ambas formavam um patrimônio para ser dado
aos dois setores de atividade profissional e foram unificado ao PIS pela Lei Complementar
nº 26/75.
Art. 1º - A partir do exercício financeiro a iniciar-se em 1º de julho
de 1976, serão unificados, sob a denominação de PIS-PASEP, os fundos
constituídos com os recursos do Programa de Integração Social (PIS) e do
Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP),
instituídos pelas Leis Complementares nºs 7 e 8, de 7 de setembro e de 3
de dezembro de 1970, respectivamente.

Após sua instituição, tais contribuições sofreram diversas alterações. Já em


meados da década de 1970, a Lei Complementar nº 19, de 1974, os recursos gerados
pelo Programa de Integração Social (PIS) e pelo Programa de Formação do Patrimônio de
Servidor Público (PASEP)14, passarão a ser aplicados de forma unificada, destinando-se a
programas especiais de investimentos elaborados e revistos periodicamente segundo as
diretrizes e prazos de vigências dos Planos Nacionais de Desenvolvimento.
De qualquer forma, na virada da ordem constitucional, segundo o art. 239 da
Constituição Federal, as contribuições do PIS/PASEP passaram a financiar o seguro-
desemprego e o abono igual a um salário mínimo anual para os empregados que
recebem até dois salários mínimos mensais de empregadores que contribuem para os
fundos.
Art. 239. A arrecadação decorrente das contribuições para o
Programa de Integração Social, criado pela Lei Complementar nº 7, de 7 de
setembro de 1970, e para o Programa de Formação do Patrimônio do
Servidor Público, criado pela Lei Complementar nº 8, de 3 de dezembro de
1970, passa, a partir da promulgação desta Constituição, a financiar, nos
termos que a lei dispuser, o programa do seguro-desemprego e o abono de
que trata o § 3º deste artigo.

14
"O PASEP, sendo contribuição instituída pela própria Carta da República, não se confunde com aquelas que a União pode criar na forma
dos seus arts. 149 e 195, nem se lhe aplicam quaisquer dos princípios ou restrições constitucionais que regulam as contribuições em geral."
(STF - ACO 580, Rel. Min. Maurício Corrêa, j. em 15-8-2002, Plenário, DJ de 25-10-2002.)

Direito Tributário II
16

Este dispositivo constitucional, além de explicitar destacar a destinação dada aos


valores arrecadados, serviu também para expressamente recepcionar as contribuições.
Válida para tanto a definição reiterada do STF neste sentido:
“Programa de Integração Social e de Formação do Patrimônio do
Servidor Público – PIS/PASEP. Medida Provisória. Superação, por sua
conversão em lei, da contestação do preenchimento dos requisitos de
urgência e relevância. Sendo a contribuição expressamente
autorizada pelo art. 239 da Constituição, a ela não se opõem as
restrições constantes dos arts. 154, I, e 195, § 4º, da mesma Carta.”
(ADI 1.417, Rel. Min. Octavio Gallotti, julgamento em 2-8-1999,
Plenário, DJ de 23-3-2001.) No mesmo sentido: RE 432.413-AgR, Rel.
Min. Dias Toffoli, julgamento em 19-10-2010, Primeira Turma, DJE de
23-3-2011.

A partir de 1º de outubro de 1995, por força do disposto na Medida Provisória nº


1.212, a contribuição ao PIS passou a ser de 0,65% sobre o faturamento. Outra alteração
substancial na contribuição ao PIS foi introduzida pela Lei nº 9.718/98, que alterou a base
de cálculo desta contribuição, sendo este o regramento atual.
Segundo esta última norma as contribuições para o PIS/PASEP, devidas pelas
pessoas jurídicas de direito privado, serão calculadas com base no seu faturamento.
Assim, já temos:
Contribuinte => pessoas jurídicas de direito privado;
Base de cálculo => faturamento.

Por outro lado, ainda regendo os tributos, antes da reforma constitucional que
versava sobre as Medidas Provisórias, foi editada a Medida Provisória nº 2.158-35, de 24
de agosto de 2001, com a seguinte redação ainda hoje mantida15:
Art. 1º A alíquota da contribuição para os Programas de Integração
Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público - PIS/PASEP,
devida pelas pessoas jurídicas a que se refere o § 1º do art. 22 da Lei nº
8.212, de 24 de julho de 1991, fica reduzida para sessenta e cinco
centésimos por cento em relação aos fatos geradores ocorridos a partir de
1º de fevereiro de 1999.

Com isto, temos um outro elemento:


alíquota => 0,65% (sessenta e cinco centésimos por cento).

Estes elementos de cálculo são dados, portanto, pela Lei nº Da combinação das
disposições da Lei nº 9.718, de 1998, combinado com a Medida Provisória nº 2.158-35,
de 2001. Destas resulta que o ponto principal está na determinação daquela base de
cálculo.
Para fins de determinação da base de cálculo das contribuições a, excluem-se da
receita bruta:
I - as vendas canceladas, os descontos incondicionais concedidos, o Imposto
sobre Produtos Industrializados - IPI e o Imposto sobre Operações relativas à

15
Emenda nº 32, de 2001: Art. 2º As medidas provisórias editadas em data anterior à da publicação desta emenda continuam em vigor até que
medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional.

Direito Tributário II
17

Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte


Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, quando cobrado pelo
vendedor dos bens ou prestador dos serviços na condição de substituto tributário;
II - as reversões de provisões e recuperações de créditos baixados como
perda, que não representem ingresso de novas receitas, o resultado positivo
da avaliação de investimentos pelo valor do patrimônio líquido e os lucros e
dividendos derivados de investimentos avaliados pelo custo de aquisição, que
tenham sido computados como receita;
IV - a receita decorrente da venda de bens do ativo permanente.
V - a receita decorrente da transferência onerosa a outros contribuintes do ICMS
de créditos de ICMS originados de operações de exportação.

2.1.4.2 A COFINS
A COFINS foi instituída pela Lei Complementar nº 70/91, com os recursos aplicados
em programas, projetos e atividades de saúde, previdência e assistência social. O
art. 1º da referida norma explicitamente cuida desta destinação, não afastando, por outro
lado, as contribuições anteriormente analisadas.
Art. 1° Sem prejuízo da cobrança das contribuições para o Programa
de Integração Social (PIS) e para o Programa de Formação do Patrimônio
do Servidor Público (Pasep), fica instituída contribuição social para
financiamento da Seguridade Social, nos termos do inciso I do art. 195 da
Constituição Federal, devida pelas pessoas jurídicas inclusive as a elas
equiparadas pela legislação do imposto de renda, destinadas
exclusivamente às despesas com atividades fins das áreas de saúde,
previdência e assistência social.

Ainda naquela norma inicial, era definida a alíquota (2% - dois por cento) e a
determinação de incidência sobre o faturamento das pessoas jurídicas. Dada a
similaridade de elementos de incidência, a contribuinte do COFINS foi também submetida
às regras da Lei nº 9.718, de 1998, e pela Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001.

Contribuintes
São contribuintes da COFINS as pessoas jurídicas de direito privado em geral,
inclusive as pessoas a elas equiparadas pela legislação do Imposto de Renda.

Base de cálculo
A partir de 01.02.1999, com a edição da Lei nº 9.718/98, a base de cálculo da
contribuição é a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevante
o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas.

Alíquotas
A alíquota geral é de 3% (a partir de 01.02.2001) ou 7,6% (a partir de 01.02.2004)
na modalidade não cumulativa. Entretanto, para determinadas operações, a alíquota é
diferenciada.

Direito Tributário II
18

2.1.4.2.1 Discussão acerca do conceito de faturamento

Com o objetivo de aumentar o universo das receitas provenientes do PIS e da


COFINS, foi editada a Lei nº 9.718, de 27/11/1998, publicada no Diário Oficial da União de
28/11/1998, de forma a incluir, como base de cálculo da COFINS, não só as vendas de
mercadorias e serviços, mas também todas as receitas auferidas pelas pessoas jurídicas,
ampliando, portanto, o conceito fixado no inciso I do art. 195 da Constituição Federal, na
seguinte forma:
Art. 2º – As contribuições para o PIS/PASEP e a COFINS, devidas
pelas pessoas jurídicas de direito privado, serão calculadas com
base no seu faturamento, observadas a legislação vigente e as
alterações introduzidas por esta Lei.
[...]
Art. 3º – O faturamento a que se refere o artigo anterior
corresponde à receita bruta da pessoa jurídica.
§ 1º – Entende-se por receita bruta a totalidade das receitas
auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de atividade
por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas.
[...]
Art. 17. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação,
produzindo efeitos:
I – em relação aos arts. 2º a 8º, para os fatos geradores ocorridos
a partir de 1º de fevereiro de 1999;

Com efeito, por força das alterações introduzidas pela Lei nº 9.718/1998, a partir
de 01 de fevereiro de 1999, houve um alargamento da base de cálculo da COFINS, eis que,
de acordo com a redação da citada lei, o faturamento das pessoas jurídicas corresponderia
à totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de
atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas, o que inclui,
inclusive receitas não operacionais.
Ocorre que, analisando a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior
Tribunal de Justiça, verifica-se que a definição de faturamento dada pelo § 1º do artigo 3º
da Lei nº 9.718/1998 é incompatível com o conceito de faturamento do artigo 195, inciso
I, da Constituição Federal vigente à época da publicação da referida lei federal. Conceito
de faturamento que juridicamente advém do Direito Comercial.
Portanto, a Lei nº 9.718/1998, ao ampliar o conceito de faturamento, criou, em
verdade, outra fonte de manutenção e financiamento da seguridade social. Entretanto, nos
termos do art. 195, § 4º da CRFB/1988, tal instituição somente poderia ser feita por lei
complementar, o que não é o caso da Lei nº 9.718/1998, que reveste a forma de lei
ordinária.
Ademais, o artigo 195, I, II e III da Constituição Federal (anteriormente à EC nº
20/1998) é claro ao dispor que a contribuição para a seguridade social tem como base de
cálculo a folha de salários, o faturamento ou o lucro, não existindo a base de cálculo
“receita”. Assim, resta evidente que a Lei nº 9.178/1998 nasceu inconstitucional, eis que
não existia no campo impositivo do sistema constitucional tributário a base de cálculo
receita, sendo criada nova fonte de custeio da seguridade social, sem que, repita-se, fosse
observado o processo legislativo exigido pelo artigo 195, § 4º da Constituição Federal.

Direito Tributário II
19

Soma-se que o artigo 110 do CTN preconiza a impossibilidade de a lei tributária


alterar definição, conteúdo, instituto, conceito e formas do Direito Privado, o que leva à
impossibilidade da Lei nº 9.718/1998 alterar o conceito de faturamento.
Posteriormente ao advento da Lei nº 9.718 (que é, como anotado, de 27 de
novembro de 1998), por meio da Emenda Constitucional nº 20, publicada no Diário Oficial
da União de 16 de dezembro de 1998, foi alterada a redação do inciso I do art. 195, da
Constituição, e também de outros dispositivos relacionados ao financiamento da
seguridade social, com a modificação da base de cálculo das contribuições incidentes sobre
os empregadores, para fazer constar o seguinte:

Art. 195 – [...]


I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na
forma da lei, incidentes sobre: [...]
b) a receita ou o faturamento;

A mudança consistiu na inclusão da receita como base de cálculo do PIS e da


COFINS. Antes da edição da Emenda Constitucional nº 20/1998, a base de cálculo das
contribuições sociais em referência era somente o faturamento, assim entendido como a
venda de mercadorias e/ou serviços – acolhendo-se o conceito de faturamento previsto na
LC nº 70/1991, e não aquele previsto na Lei nº 9.178/1998 (totalidade das receitas
auferidas pela pessoa jurídica).
Assim, a partir da Emenda Constitucional nº 20/1998, o PIS e a COFINS teriam
como base de cálculo tanto o faturamento como a receita, entendendo-se como receita a
“totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de
atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas”, conforme
disposto no artigo 3º da Lei nº 9.718/1998.
De início, passou-se a afirmar que a Emenda Constitucional n° 20/1998 tornara
inquestionável que o conceito de faturamento não admite interpretação extensiva, vez que
foi necessária emenda da Constituição para se incluir a expressão abrangente “receita ou
faturamento” (art. 195, I, alínea “a”, com a nova redação).
Ora, se a lei não comporta expressões supérfluas e se foi necessário acrescentar o
conceito receita para viabilizar a instituição de contribuições sociais por lei ordinária, além
dos limites das receitas compreendidas no faturamento, pode-se concluir que essa última
expressão não era suficiente para estender essa tributação a quaisquer outras ou à
totalidade das receitas da empresa.
Ocorre que nem mesmo a edição da Emenda Constitucional nº 20/1998 pacificou a
matéria. Isso porque é possível questionar se a edição da referida Emenda teria o condão
de constitucionalizar um diploma legal (Lei nº 9.718/1998) que já teria nascido
inconstitucional.
A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, por maioria, proferiu
acórdão reconhecendo que a Lei nº 9.718/1998, na parte em que alterou a base de cálculo
da contribuição ao PIS e da COFINS, afrontou o disposto no artigo 110 do Código de
Tributário Nacional. A seguir trecho do voto (em retificação) da Ministra Eliana Calmon:

Assim foi que a comunidade jurídica, inclusive esta Corte, abraçou


a ideia de que FATURAMENTO é igual à RECEITA BRUTA, como sendo
esta o resultado da venda de bens e serviços. Entretanto, não se
pode falar que as expressões sejam a mesma coisa de TOTALIDADE

Direito Tributário II
20

DAS RECEITAS AUFERIDAS, independentemente da classificação


contábil.
Afinal, pela EC 20/98, ficou a União autorizada a tributar o
faturamento ou a receita, ou seja, o resultado operacional da
empresa: faturamento (venda de bens e serviços) ou receita
(receita realizável).
A alteração constitucional fez-se necessária para ficar explicitado
que a COFINS incidiria não apenas sobre aquilo que fosse faturado
com “fatura” igual a nota fiscal. E isso porque os tributaristas
brasileiros, apegados à lista da lei, em norma do princípio da
tipicidade fechada, defenderam até mesmo a não incidência da
COFINS sobre venda de imóveis.
No entanto, a Lei 9.718/1998, ao optar por uma base de cálculo
diferente, fazendo a COFINS incidir sobre todas as receitas,
extrapolou, sem dúvida alguma, o conceito constitucional
estabelecido no artigo 195, I, letra “B” e assim agrediu o art. 110
CTN.16

Atualmente, a matéria já conta com a apreciação do Supremo Tribunal Federal (RE


nº 346.084/RS), que vinha, sistematicamente, atribuindo efeito suspensivo aos recursos
extraordinários interpostos pelos contribuintes, sustando o recolhimento da COFINS nos
termos da Lei nº 9.718/1998.17
Interessante, para a intelecção do tema, abordar a evolução da discussão travada
sobre a matéria no âmbito do Pretório Excelso que, iniciando o julgamento do RE nº
346.084-PR, interposto por contribuinte contra acórdão do TRF da 4ª Região que decidiu
pela constitucionalidade da Lei nº 9.718/1998, a princípio, nos termos do voto do Relator,
Ministro Ilmar Galvão, entendeu que, na vacatio legis a lei poderia receber o embasamento
constitucional que lhe faltava e, da mesma forma, que o conceito de faturamento poderia
ser alterado pela via de lei ordinária. Assim, o Ministro Relator proferiu seu voto no sentido
de conhecer, em parte, do recurso e lhe dar provimento para, fomentado no argumento
de que a partir da EC nº 20/1998 a Lei nº 9.718/1998 não mais carecia de embasamento
constitucional, fixar a data de 01/02/99 como termo a quo para a contagem do prazo
nonagesimal.
Tendo pedido vista o Ministro Gilmar Mendes, o julgamento foi retomado e, ao
proferir seu voto-vista, este considerou que inexiste conceito definitivo de faturamento
incorporado no bojo do texto constitucional. Assim, afastando a tese de que a definição
inserida na Lei Complementar nº 70/1991 teria incorporado ao art. 195, I da CRFB/1988,
um conceito definitivo, negou provimento ao recurso extraordinário, considerando, para
tanto, que a Lei nº 9.718/1998 seria constitucional, seja na sua redação original, seja
posteriormente à edição da EC nº 20/1998, haja vista que se refere à expressão
“faturamento”, contida no art. 195 da CRFB/1988.
Sob a égide do entendimento do Ministro Gilmar Mendes, o art. 195 da CRFB/1988
é norma constitucional aberta e de feição institucional, e já admitia acepções diversas
daquela adotada em seara de Direito Comercial, salientando, inclusive, que existem

16
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp n. 501.628-SC. Segunda Turma. Relator: Ministro Eliana Calmon. Julgado em 10 de fevereiro
de 2004. In: DJ, de 24 de maio de 2004.
17
Nesse sentido, AGR em MC no RE n. 386.056-BA. Relator: Ministro Gilmar Mendes; MC na petição nº 2.935-BA. Relator: Ministro Celso
Mello; Petição nº 2.891-ES. Relator: Ministro Carlos Velloso.

Direito Tributário II
21

inúmeros julgados do STF admitindo a assimilação do conceito de receita bruta ao de


faturamento.
A seguir, o julgamento foi adiado em razão do pedido de vista do Ministro Cezar
Peluso que, em seu voto-vista, conheceu do recurso e lhe deu provimento para declarar a
inconstitucionalidade do § 1º do art. 3º da Lei nº 9.718/1998, julgando, contudo,
constitucional o caput do art. 3º do mesmo diploma legal, dando-lhe interpretação
conforme a Constituição, nos moldes do julgamento proferido no bojo do RE nº 150.755-
PE, que entendeu a locução “receita bruta” no significado de faturamento.
Nessa linha de raciocínio, o Ministro Cezar Peluso lançou a assertiva de que houve,
em verdade, uma acomodação prática do termo constitucional “faturamento” às exigências
da própria evolução da atividade empresarial, e, assim, entendeu que o § 1º do art. 3º da
lei então impugnada, ao ampliar o conceito de receita bruta para toda e qualquer receita,
violou a noção de faturamento pressuposta no art. 195, I, “b”, da CRFB/1988 (na sua
redação original), ou seja, receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e
serviços e de serviços de qualquer natureza, consoante a reiterada jurisprudência do
Pretório Excelso.
E mais, considerou afrontado o § 4º do art. 195 da CRFB/1988 caso se admitisse
tal instituição de nova fonte de custeio de seguridade, eis que não observava o comando
normativo constitucional traduzido no art. 154, I, da CRFB/1988, salientando, igualmente
que, ainda que se entendessem compatíveis o atual art. 195, I, “b”, da CRFB/1988 e o art.
3º, § 1º, da Lei nº 9.718/1998, não haveria como sustentar possível convalidação e nem
recepção deste.
Finalmente, o Ministro Cezar Peluso afastou o argumento de que a edição da EC nº
20/1998, em data anterior ao termo a quo da produção de efeitos da lei federal impugnada,
poderia conferir-lhe fundamento de validade, considerando que a Lei nº 9.718/1998 entrou
em vigor na data de sua publicação, ou seja, 28/11/1998, portanto, 20 dias antes da
referida Emenda Constitucional.
Destarte, aditando seus votos, os Ministros Marco Aurélio, Carlos Velloso, Celso de
Mello e Sepúlveda Pertence acompanharam a linha de argumentação do Ministro Cezar
Peluso, divergindo, unicamente, quanto à parte dispositiva, para declarar, também, a
inconstitucionalidade do caput do art. 3º da Lei nº 9.718/1998.18
Posteriormente, pediu vista o Ministro Eros Grau e, assim, o Supremo Tribunal
Federal decidiu em 09/11/2005, por unanimidade, em conhecer do RE nº 346.084-PR e,
por maioria, dar-lhe provimento em parte, para declarar a inconstitucionalidade do § 1º,
do art. 3º da Lei nº 9.718/1998, vencidos, parcialmente, os Ministros Ilmar Galvão
(relator), Cezar Peluso e Celso de Mello e, integralmente, os Ministros Gilmar Mendes,
Maurício Corrêa, Joaquim Barbosa e o Presidente, Ministro Nelson Jobim. O Ministro
Sepúlveda Pertence reformulou, portanto, parcialmente, seu voto.

18
Em relação aos demais recursos extraordinários, o Ministro Marco Aurélio, relator, deles conheceu para lhes dar provimento parcial, na linha
do voto proferido pelo Min. Cezar Peluso, sendo, assim, seguido pelos Ministros Carlos Velloso, Celso de Mello e Sepúlveda Pertence.

Direito Tributário II
22

Mais recentemente houve grande debate sobre a inclusão de outros tributos neste
conceito de faturamento, especialmente se os valores relativos ao ICMS estariam inclusos
na base de cálculo do PIS/COFINS, considerando que aquele tributo é incluído
normalmente na fixação dos preços das mercadorias. Depois de longo debate, o STF assim
decidiu:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL.
EXCLUSÃO DO ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS
E COFINS. DEFINIÇÃO DE FATURAMENTO. APURAÇÃO ESCRITURAL
DO ICMS E REGIME DE NÃO CUMULATIVIDADE. RECURSO
PROVIDO.
1. Inviável a apuração do ICMS tomando-se cada mercadoria ou
serviço e a correspondente cadeia, adota-se o sistema de apuração
contábil. O montante de ICMS a recolher é apurado mês a mês,
considerando-se o total de créditos decorrentes de aquisições e o
total de débitos gerados nas saídas de mercadorias ou serviços:
análise contábil ou escritural do ICMS.
2. A análise jurídica do princípio da não cumulatividade aplicado
ao ICMS há de atentar ao disposto no art. 155, § 2º, inc. I, da
Constituição da República, cumprindo-se o princípio da não
cumulatividade a cada operação.
3. O regime da não cumulatividade impõe concluir, conquanto se
tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, não
se incluir todo ele na definição de faturamento aproveitado por este
Supremo Tribunal Federal. O ICMS não compõe a base de cálculo
para incidência do PIS e da COFINS.
3. Se o art. 3º, § 2º, inc. I, in fine, da Lei n. 9.718/1998 excluiu
da base de cálculo daquelas contribuições sociais
o ICMS transferido integralmente para os Estados, deve ser
enfatizado que não há como se excluir a transferência parcial
decorrente do regime de não cumulatividade em determinado
momento da dinâmica das operações.
4. Recurso provido para excluir o ICMS da base de cálculo da
contribuição ao PIS e da COFINS.
(STF – Pleno, RE 574706, rel. min. Carmen Lucia, j. 15.3.2017, DJe
29.9.2017)

2.1.4.2.2 PIS/COFINS no regime não cumulativo

No regime não cumulativo, a materialidade da hipótese de incidência do PIS e da


Cofins é mais ampla, abrangendo, nos termos do art. 1º da Lei nº 10.833/2003, a
totalidade da receita bruta:

Art. 1º A Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social -


COFINS, com a incidência não cumulativa, tem como fato gerador o
faturamento mensal, assim entendido o total das receitas auferidas
pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou
classificação contábil.

Direito Tributário II
23

§ 1º Para efeito do disposto neste artigo, o total das receitas


compreende a receita bruta da venda de bens e serviços nas
operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas
auferidas pela pessoa jurídica.

Apesar da definição tautológica e circular do § 1º do art. 1º, da Lei nº 10.833/2003,


a caracterização jurídica de receita bruta pressupõe a ocorrência de acréscimo ao
patrimônio líquido do contribuinte, o que a distingue dos meros ingressos de caixa e de
outros eventos sem repercussão patrimonial positiva19.
Trata-se, segundo destacado em estudo específico sobre o tema, de exigência que
decorre do art. 212, § 1º, da Constituição, e do art. 187, I, II, IV e § 1º, “a”, da Lei nº
6.404/1976:

A necessidade de repercussão patrimonial também é ressaltada por


Geraldo Ataliba e Cléber Giardino, quando ensinam que receita
constitui “acréscimo patrimonial que adere definitivamente ao
patrimônio do alienante. A ele, portanto, não se podem considerar
integradas importâncias que apenas ‘transitam’ em mãos do
alienante, sem que, em verdade, lhes pertençam em caráter
definitivo”. Nesse mesmo raciocínio, aliás, tem-se colocado
praticamente toda a doutrina dedicada ao estudo do tema,
considerando receita apenas “[...] a entrada que, sem quaisquer
reservas, condições ou correspondência no passivo, se integra ao
patrimônio da empresa, acrescendo-o, incrementando-o” (AIRES F.
BARRETO); “um ‘plus jurídico’ (acréscimo de direito), de qualquer
natureza e de qualquer origem, que se agrega ao patrimônio como
um elemento positivo, e que não acarreta para o seu adquirente
qualquer nova obrigação” (RICARDO MARIZ DE OLIVEIRA); o
“incremento do patrimônio” (ALIOMAR BALLEIRO); o “elemento
positivo do acréscimo patrimonial” (GISELE LEMKE); “a entrada de
riqueza nova no patrimônio da pessoa jurídica” (HUGO DE BRITO
MACHADO e HUGO DE BRITO MACHADO SEGUNDO); as “quantias
que a empresa recebe não para si” (HAMILTON DIAS DE SOUZA,
LUIZ MÉLEGA e RUY BARBOSA NOGUEIRA), que “possam alterar o
patrimônio líquido” (JOSÉ EDUARDO SOARES DE MELO); a entrada
“de cunho patrimonial” (MARCO AURÉLIO GRECO), que “tem o
condão de incrementar o patrimônio” (ALEXANDRE BARROS
CASTRO)20.

Em razão dessa particularidade, consoante destaca Solon Sehn:

“Antes de simples entrada de caixa, como decorre de preceitos


constitucionais (art. 212, § 1º) e de direito privado (Lei Federal nº
6.404/1976, art. 187, I, II, IV e § 1º, ‘a’), receita constitui um

19
Sobre o tema, cf.: SEHN, Solon. “O conceito de receita no direito privado e suas implicações no direito tributário (PIS-Cofins, IRPJ,
Simples).” Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 2006, n. 127. No mesmo sentido, cf.: SEHN, Solon. PIS-Cofins: não
cumulatividade e regimes de incidência. São Paulo: Quartier Latin, 2011.
20
SEHN, PIS-Cofins…, op. cit., pp. 152-153.

Direito Tributário II
24

ingresso de soma em dinheiro ou qualquer outro bem ou direito,


susceptível de apreciação pecuniária, decorrente de fato ou negócio
jurídico aptos a gerar alteração positiva do patrimônio líquido da
pessoa jurídica que lhe aufere, sem reservas, condicionamentos ou
correspondências no passivo”21.

Além disso, cumpre destacar que a receita bruta, para ser validamente tributada,
deve ser auferida pela pessoa jurídica, isto é, incorporada ao seu patrimônio, consoante
as regras ou critérios de reconhecimento da receita previstos na legislação tributária22.
Dois são os critérios de reconhecimento da receita: o regime de caixa e o de
competência. No primeiro, a receita é considerada obtida no momento do efetivo
recebimento da prestação pecuniária correspondente. No segundo, quando surge o direito
ao seu recebimento, independente da realização em moeda. Assim, nos contratos de
compra e venda, por exemplo, no regime de competência, a receita é reconhecida no
momento da entrega do bem, ao passo que, na prestação de serviços, após o cumprimento
da obrigação do contratado, independente da data do pagamento correspondente23.
O regime de competência é obrigatório para os contribuintes do IRPJ sujeitos ao
lucro real, ou seja, trata-se da regra geral aplicável ao regime não cumulativo do PIS e da
COFINS. Os contribuintes do lucro presumido, por sua vez, podem optar pelo regime de
caixa, nos termos do art. 20 da Medida Provisória nº 2.158/2001, desde que também o
façam no tocante ao IRPJ e à CSLL24. Também há outras exceções ao regime de
competência previstas em legislação específica, como as receitas decorrentes de variações
cambiais positivas (Medida Provisória nº 2.158-35/2001, art. 3025) e os contratos de
construção por empreitada ou de fornecimento de bens ou serviços com prazo de execução
superior a um ano (Lei nº 10.833/2003, art. 8º)26.

2.1.4.2.3 Não Cumulatividade

Os tributos podem ser cobrados por dois regimes: cumulativos ou não cumulativos.
A COFINS e o PIS sempre foram cobrados de forma cumulativa, pelo método
conhecido como cobrança em cascata. Como a Constituição não disciplinava a forma de
cobrança dessas contribuições, cabia ao legislador infraconstitucional escolher entre a
cumulatividade e a não cumulatividade.

21
Ibid. pp. 186-187.
22
Mesmo no regime cumulativo, a incidência está vinculada ao conceito de receita bruta, porque o faturamento, consoante destacado,
compreende a receita bruta da venda de mercadorias e da prestação de serviços. Não são, portanto, conceitos sinônimos, mas apresentam uma
relação de gênero (receita) e espécie (faturamento).
23
XAVIER, Alberto. Estudos sobre o imposto de renda. Belém: CEJUP, 1988. p. 98; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Imposto sobre a renda:
pessoas jurídicas. Rio de Janeiro: Adcoas-Justec, v. I, 1979. pp. 298-299; SEHN, PIS-Cofins..., op. cit., pp. 191 e ss.
24
“Art. 20. As pessoas jurídicas submetidas ao regime de tributação com base no lucro presumido somente poderão adotar o regime de caixa,
para fins da incidência da contribuição para o PIS/PASEP e COFINS, na hipótese de adotar o mesmo critério em relação ao imposto de renda
das pessoas jurídicas e da CSLL”.
25
“Art. 30. A partir de 1o de janeiro de 2000, as variações monetárias dos direitos de crédito e das obrigações do contribuinte, em função da
taxa de câmbio, serão consideradas, para efeito de determinação da base de cálculo do imposto de renda, da contribuição social sobre o lucro
líquido, da contribuição para o PIS/PASEP e COFINS, bem assim da determinação do lucro da exploração, quando da liquidação da
correspondente operação”.
26
“Art. 8º. A contribuição incidente na hipótese de contratos, com prazo de execução superior a um ano, de construção por empreitada ou de
fornecimento, a preço predeterminado, de bens ou serviços a serem produzidos, será calculada sobre a receita apurada de acordo com os
critérios de reconhecimento adotados pela legislação do imposto de renda, previstos para a espécie de operação”. O art. 10 do Decreto-Lei n.
1.598/1977, por sua vez, determina o reconhecimento da receita a partir do recebimento proporcional do preço em cada período de apuração.

Direito Tributário II
25

Desse modo, foram editadas a Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e a Lei


nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003, instituindo a cobrança não cumulativa do PIS e
da COFINS.
Posteriormente, foi editada a Emenda Constitucional nº 42, de 19 de dezembro de
2003, que incluiu o parágrafo 12 ao artigo 195 da Constituição Federal, dispondo que a lei
definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições incidentes sobre
a receita ou o faturamento e, ainda, a contribuição do importador de bens ou serviços do
exterior, serão não cumulativas.
Tem-se que, no regime cumulativo, as contribuições ao PIS/COFINS incidem sobre
o total das operações ou prestação de serviços sem compensar as contribuições pagas nas
aquisições de bens.
Cumpre entender, porém, a diferenciação entre os dois regimes. Na definição
consensuada a não cumulatividade é própria dos tributos que comportam, por sua
natureza, a transferência do respectivo encargo financeiro.
As leis acima mencionadas aumentaram a alíquota dos tributos, além de terem
previsto vedações para muitos contribuintes que atuam em áreas específicas da produção
e prestação de serviços escolherem o regime de recolhimento de tributos e acabando com
direitos a crédito. As vedações se dirigiram, sobretudo, aos contribuintes cujo regime de
tributação do PIS/Pasep e da COFINS era, obrigatoriamente, não cumulativo.
Analisando o regime não cumulativo legalmente estabelecido para esses tributos,
percebe-se que houve uma deturpação na essência desse regime. Ao contrário do que se
dá em relação ao ICMS e ao IPI, cujo regime de não cumulatividade
[...] “significa que o imposto a ser pago na operação de saída é a
diferença entre o imposto incidente nesta e os que foram pagos nas
operações anteriores, no que concerne ao PIS e a COFINS, a
não cumulatividade significa que o tributo a pagar é
encontrado pela aplicação da alíquota sobre a diferença
entre receitas auferidas e receitas necessariamente
consumidas pela fonte produtora”.27

Na medida em que as novas leis, ao preverem um aumento nas alíquotas, que seria,
em tese, compensado pela existência de um regime não cumulativo, a vedação ao
creditamento gerou, segundo perfunctório estudo de Fernando Scaff,28 aumento
considerável da carga tributária para alguns contribuintes, quando passaram a tributar
pelo regime não cumulativo. Daí que, embora se reconheça a constitucionalidade, a priori,
do regime não cumulativo desde a EC nº 42/2003, muitos contribuintes, sentindo-se
prejudicados e invocando os princípios da igualdade tributária e da neutralidade
concorrencial da tributação, buscam o reconhecimento, no caso concreto, do regime
cumulativo.

27
SCAFF, Fernando Facury. Pis, Cofins, não-cumulatividade e direitos fundamentais. In: Revista Mestrado em Direito Osasco, ano 8, n.1,
2008. p. 276.
28
idem. p. 270.

Direito Tributário II
26

2.1.5. Contribuição Social Sobre O Lucro Líquido - CSLL


Como explicitamente autorizado pelo art. 195, I, as pessoas jurídicas são ainda
submetidas à incidência da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Desta forma,
todas as pessoas jurídicas e entes equiparados pela legislação do Imposto de Renda
submetem-se a tal tributo, sendo este também ao financiamento da seguridade social.
Sua instituição e disciplina ocorreu com a Lei nº 7.689, de 1988, sendo ali definida
sua destinação e finalidade (Art. 1º). De plano, fica evidente que o fato gerador é a
obtenção de lucro por pessoa jurídica ou equiparada.
Já no art. 2º da Lei nº 7.689, de 1988, a base de cálculo da CSLL é o valor do
resultado do exercício, antes da provisão para o Imposto de Renda.
A partir de 1º de maio de 2008, conforme determinação da Lei nº 11.727, de 2008,
art. 17, a alíquota da CSLL é de:
15% (quinze por cento), no caso das pessoas jurídicas de seguros
privados, das de capitalização e das referidas nos incisos I a VII, IX e X29
do § 1º do art. 1º da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001;
e
9% (nove por cento), no caso das demais pessoas jurídicas.

Aplicam-se à CSLL as mesmas normas de apuração e de pagamento estabelecidas


para o imposto de renda das pessoas jurídicas, mantidas a base de cálculo e as alíquotas
previstas na legislação em vigor (Lei 8.981, de 1995, artigo 57). Desta forma, além do
IRPJ, a pessoa jurídica optante pelo Lucro Real, Presumido ou Arbitrado deverá recolher
a Contribuição Social sobre o Lucro Presumido (CSLL), também pela forma escolhida.
Neste caso, para ilustrar, não é possível, por exemplo, a empresa optar por
recolher o IRPJ pelo Lucro Real e a CSLL pelo Lucro Presumido. Escolhida a opção, deverá
proceder a tributação, tanto do IRPJ quanto da CSLL, pela forma escolhida. Por isto, as
pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real trimestral devem apurar trimestralmente a
CSLL, seguindo o padrão do imposto de renda das pessoas jurídicas.
Por outro lado, a pessoa jurídica que apurar anualmente o imposto sobre a renda
com base no lucro real também deve apurar a CSLL anualmente com base no resultado
ajustado, em 31 de dezembro de cada ano. Os valores de CSLL efetivamente pagos
calculados sobre a base de cálculo estimada mensalmente, no transcorrer do ano-
calendário, podem ser deduzidos do valor de CSLL apurado anualmente (ajuste).

2.2 Imposto sobre Renda e Proventos de qualquer natureza (IR)


Imposto de grande arrecadação e relevância econômica federal, é um tributo com
função eminentemente fiscal, segundo um critério de preponderância. Evidente que esse
papel arrecadatório (predominantemente) não afasta a inegável função de redistribuição
de renda nacional. Como arrecada de todos, tal aspecto redistributivo se dará,
principalmente, na aplicação orçamentária dos recursos arrecadados em diversos
programas sociais implementados pelo Poder Público, segundo objetivos constitucionais.
Quando tributa a renda, em tese o poder público estará tributando as pessoas que
possuem maior poder aquisitivo, que obtêm rendimentos nas atividades exercidas. Por sua

29
I – os bancos de qualquer espécie; II – distribuidoras de valores mobiliários; III – corretoras de câmbio e de valores mobiliários; IV –
sociedades de crédito, financiamento e investimentos; V – sociedades de crédito imobiliário; VI – administradoras de cartões de crédito; VII –
sociedades de arrendamento mercantil; IX – cooperativas de crédito; X – associações de poupança e empréstimo;

Direito Tributário II
27

vez, considerando a aplicação posterior desses recursos pela lei orçamentária, essa
aplicação vai se dar geralmente em diversos programas sociais implementados pelo poder
público. Então tem uma função redistributiva também, uma função de redução de
desigualdade.
Sem prejuízo ainda do papel primordial de arrecadar, mas nada impede que o IR seja
utilizado também como forma de estimular ou desestimular determinada conduta por parte
do contribuinte. Por exemplo: investimento ou aplicações financeiras. Obviamente que se
o governo pretende estimular um determinado tipo de investimento, pode colocar uma
alíquota mais baixa de IR para os rendimentos provenientes daquele investimento.
Então agora, por exemplo, existe alíquotas regressivas do IR de acordo com o prazo
do investimento realizado. Então, quanto maior o prazo do investimento, menor vai ser a
alíquota incidente sobre os rendimentos provenientes desse investimento. Obviamente que
isso é um traço de extrafiscalidade do IR, porque quando aplica-se uma alíquota menor
para um investimento de longo prazo, a pretensão não é arrecadar; ao contrário, pretende-
se incentivar investimentos a longo prazo em comparação com os investimentos a curto
prazo.
Então não é absurdo falar que o IR pode ter traços de extrafiscalidade, só que o que
prepondera aqui é a função fiscal, ou seja, a função arrecadatória.
Justamente por conta desses papéis importantes, o Imposto de Renda sempre esteve
na competência federal, constando explicitamente nos textos constitucionais desde a Carta
de 1934, apesar de suas origens na virada do século XVIII e XIX. De todas estas previsões,
ficou patente que a base econômica do tributo aqui seria a renda e proventos de qualquer
natureza.
De nossa experiência restou consignado o imposto na forma do art. 153, III, CRFB/88,
apresentando, por conseguinte, conceitos bastante abertos de sua incidência, na medida
em que o legislador constituinte não optou por qualquer definição explícita ou conceitual.
Ainda que com parâmetros naturais dados pelas palavras renda e proventos, fica, portanto,
a cargo do legislador infraconstitucional e da doutrina a elaboração dos elementos para a
concretização normativa. Além do CTN (com as previsões contidas nos arts. 43 a 45), o
legislador federal editou diversos diplomas ordinários para disciplinar o imposto, a saber:
Lei 7.713/88; Lei 9.249/95; Lei 9.250/95; Lei 9.430/96; Lei 9.532/97 etc.
A verdade é que há múltiplas leis que tratam do IR, tornando quase impossível compilar
a normatização da espécie. Quase que cumprindo esta tarefa o Decreto 3000/99 – o
regulamento do IR – RIR, ajuda bastante, uma vez que ele compila uma série de normas
esparsas relativas à legislação do IR.

2.2.1 O Fato Gerador do Imposto


Existem dois tópicos relevantes aqui para ser tratado preliminarmente. O primeiro
deles diz respeito à utilização desse termo “renda” pela Constituição, que aqui tem uma
acepção técnica e restrita.
Técnica porque extrai-se da Constituição a delimitação daquilo que pode e daquilo que
não pode ser tributado. Então renda, por exemplo, não significa patrimônio. Não se pode
tributar o patrimônio por meio do IR. Renda, por exemplo, não significa faturamento.
Igualmente, não se pode tributar o faturamento através do IR. Da mesma forma, renda,
por exemplo, não significa receita. Impossível, portanto, confundir patrimônio,
faturamento ou receita com renda. Renda tem uma acepção mais restrita.
A Constituição, ao mencionar os termos ‘RENDA’ e ‘PROVENTOS DE QUALQUER

Direito Tributário II
28

NATUREZA’ delimita o âmbito da tributação, dando “o contorno do que pode ser tributado
e do que não pode ser tributado a tal título”30. Com isto resta evidenciado a ideia do que
pode e do que não pode ser tributado não pode ser apenas fixada pela lei. Segundo a
doutrina, está totalmente superada a concepção legalista do conceito de renda.
Como a Constituição não me disse o que era renda (e nem poderia ou deveria), renda
vai ser tudo aquilo que a lei estabelecer como renda, tudo aquilo que a lei disser que é
rendimento. Além da previsão constitucional no art. 153, III, o Imposto sobre a Renda, na
forma do art. 43 do CTN, tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica
ou jurídica, sendo ali ainda definidos os conceitos básicos para a incidência do imposto, da
seguinte forma:
• renda como qualquer fruto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
• proventos como qualquer outro acréscimo patrimonial não compreendido nos
conceitos acima.

Assim, por exemplo, quando há o trabalho e recebimento de salário, seria renda. Se


alguém for aposentado e receber um benefício de aposentadoria, isso se enquadraria, por
exclusão, na ideia de proventos de qualquer natureza. Um acréscimo patrimonial em
virtude de uma atividade ilícita, isso se enquadraria, por exclusão, aqui nos proventos de
qualquer natureza. Quer dizer, seriam todos aqueles acréscimos patrimoniais, tudo aquilo
que gera mais riqueza, que acrescenta ao patrimônio sem ser decorrente do capital, sem
que seja decorrente do trabalho, ou sem que seja decorrente da combinação de ambos.
Até por uma tradição histórica foi mantida essa divisão; renda - produto do capital e
trabalho ou a combinação de ambos; proventos de qualquer natureza – definidos por
exclusão, ou seja, tudo aquilo que não se enquadra na definição anterior vai ser acréscimo
patrimonial.
Verifica-se que, segundo definição do art. 43 (sobretudo conforme o § 1º), o nome
dado aos valores recebidos não são relevantes, nem tampouco da localização, condição
jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. Ainda para a
conceituação básica dos aspectos que cercam o fato gerador do imposto, define ainda o
art. 43, § 2º, CTN, que, na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a
lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade.
Tais conceitos devem possuir limites. Muito embora não haja uma definição efetuada
pelo legislador constitucional dos conceitos de renda e proventos, existe uma natural
demarcação dada pela Carta Magna. A partir dos sentidos dados pelo constituinte, a lei
(aí incluído o próprio Código) não pode tudo. Se a lei pudesse chamar de compra e venda
o que não é compra e venda, de importação o que não é importação, de exportação o
que não é exportação, de renda o que não é renda, todo o modelo de repartição de
competências lá definido cairia por terra, desmoronando todo o Sistema Tributário
inscrito na Constituição.
Assim, não se admite uma concepção puramente legalista, no sentido de que o conceito
de renda poderia ser livremente definido pela lei ordinária instituidora do imposto. Logo, o
conceito de renda compreende o produto do capital (como os rendimentos obtidos com
uma aplicação financeira), do trabalho (como o salário e as remunerações por serviços
prestados) ou da combinação de ambos (como o pró-labore recebido pelos sócios de uma
sociedade).
De igual senso, a expressão proventos de qualquer natureza, por sua vez, é

30
PAULSEN, Leandro. Impostos Federais, Estaduais e Municipais, p. 45

Direito Tributário II
29

definida por exclusão, compreendendo todos os acréscimos patrimoniais não enquadráveis


no conceito legal de renda. Mas não apenas o sentido de percepção de valores, e sim o
sentido de “riqueza nova” auferida pela pessoa.
O que a Constituição autoriza a tributação, segundo a doutrina e a jurisprudência,
como o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA frequentemente utiliza, é “riqueza nova”, que vai
acrescentar o patrimônio, que vai gerar mais riqueza para o seu titular.
(...) 12. O imposto sobre a renda incide sobre o produto da atividade de
auferir renda ou proventos de qualquer natureza, que constitua riqueza
nova agregada ao patrimônio do contribuinte e deve se pautar pelos
princípios da progressividade, generalidade, universalidade e capacidade
contributiva, nos termos do artigos 153, II, § 2º, I, e 145, § 1º, da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Sob o viés da
matriz constitucional, foi recepcionado o conceito do artigo 43, do CTN,
de renda e proventos, que contém em si uma conotação de
contraprestação pela atividade exercida pelo contribuinte.
13. O conceito doutrinário de renda tributável é, assim, cediço: "Estamos
notando, assim, que para o Direito, os conceitos de renda e proventos
não coincidem com os da Economia, que considera qualquer acréscimo
patrimonial passível de sofrer a tributação em pauta. Nas hostes jurídicas
tais conceitos tem uma extensão bem mais restrita: acréscimo
patrimonial, experimentado durante certo lapso de tempo , que só pode
ser levado à tributação quando atende aos princípios da isonomia, da
capacidade contributiva e da não confiscatoriedade - e, portanto, prestigia
a vida, a dignidade da pessoa humana e a propriedade, preservando 'o
exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o
bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores
supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos'
valores supremos que levaram os representantes do Povo Brasileiro,
reunidos em Assembléia Nacional Constituinte, a inscrevê-los já no
Preâmbulo da Constituição da República Federativa do Brasil. (...)
Deveras, parece-nos que dentre os diversos conceitos de renda e
proventos de qualquer natureza, fornecido pelas Ciência Econômica, pode
o legislador ordinário apenas optar por um deles, e, ainda assim, desde
que sua escolha permita compatibilizar a incidência com os princípios
constitucionais que norteiam tal tributação, máxime o da capacidade
contributiva. É que, de acordo com a Constituição , renda e proventos de
qualquer natureza devem representar ganhos ou riquezas novas. Do
contrário, não será atendido o princípio da capacidade contributiva.
Realmente, os conceitos de renda e proventos de qualquer natureza
precisam levar em conta, dentre outros princípios, o da capacidade
contributiva do sujeito passivo tributário. (...) Porque o princípio da
capacidade contributiva informa a tributação por via de impostos (art.
145, § 1º da CF).
Nesse sentido a lição escorreita de Antonia Agulló Agüero: 'Uma definição
fiscal de renda há de ser apta a medir a capacidade contributiva e esta
característica é precisamente o que a diferencia de outras definições que,
como a contábil ou a estritamente econômica, perseguem fins tais como
a comparação entre os resultados de vários exercícios econômicos ou o

Direito Tributário II
30

cômputo de valor agregado num processo de produção. (...) Mesmo


cientes disto, observamos, de bom grado, que o próprio Código Tributário
Nacional, desde que interpretado de modo adequado, não ultrapassou os
limites constitucionais." (Carrazza, Roque Antônio, in "Imposto sobre a
renda (perfil constitucional e temas específicos)", São Paulo: Malheiros,
2005, p. 48, 52/53 e 55).31

Por outro lado, não se pode desconhecer que o sentido dado para as expressões de
incidência do imposto será distinto para os valores percebidos pelas pessoas naturais em
relação às pessoas jurídicas. Justamente para reconhecer essa distinção, nosso legislador
infraconstitucional tem conferido tratamento normativo distinto para esses dois grupos de
pessoas atingidas.
O CTN fala ainda em aquisição de disponibilidade jurídica ou econômica sobre renda
ou sobre os proventos de qualquer natureza. Uma primeira distinção que é feita aqui é que
não há nenhum consenso na doutrina sobre o que seja disponibilidade jurídica ou
disponibilidade econômica, mas há duas grandes linhas de raciocínio: a primeira é mais
simples, mais simplória e limitada, consequentemente. Ela fala que disponibilidade jurídica
seria o acréscimo patrimonial cuja fonte seja lícita. Então, trabalhou e recebeu o salário,
teria a disponibilidade jurídica sobre aquela quantia.
Disponibilidade econômica seria a disponibilidade que se obtém sobre certa quantia
em desacordo com o direito, cuja origem seja ilícita. Diz MARCELO GUERRA MARTINS no livro
dele: “A disponibilidade econômica, ao contrário, independe da licitude de sua fonte,
podendo ser fruto, por exemplo, da contravenção, de crime, de atos civilmente nulos, etc.”.
Então, a disponibilidade jurídica é mais simplória, quando se aufere renda em
conformidade com o direito. Exemplo: um investimento e seu rendimento, o trabalho
prestado e o salário recebido, o valor de remuneração a título de uma prestação de serviço,
etc. Já, nesta visão, da atividade ilícita – exemplifica-se: tráfico de entorpecentes realizado
por determinada pessoa. A disponibilidade aqui não é jurídica, seria meramente
econômica.
Essa visão é mais restrita e não é suficiente para tratar do IR. Existe outra visão que
afirma o seguinte: para que ocorra a disponibilidade econômica, basta que o patrimônio
resulte economicamente acrescido por um direito, ou por um elemento material,
identificável como renda ou como proventos de qualquer natureza. A disponibilidade
econômica é o simples acréscimo patrimonial, já a disponibilidade financeira é a existência
física dos recursos em caixa.
Então, há quem distinga disponibilidade econômica da disponibilidade financeira.
Então, por exemplo, regime de caixa e regime de competência. Quando se fala em regime
de caixa há a certeza de que houve o ingresso de dinheiro no caixa, caracterizando a
disponibilidade tanto econômica quanto financeira. Quando se fala em regime de
competência, há a disponibilidade econômica, mas não a disponibilidade financeira.
Exemplo: uma empresa brasileira que tenha uma determinada empresa coligada ou
controlada situada no exterior. A empresa do exterior fechou o balanço e apurou resultado
positivo. Isso já é renda para a matriz situada no Brasil, ou só no momento em que essa
filial depositar o dinheiro numa conta à disposição da matriz? Mas, sem prejuízo desta
polêmica, verifica-se dos tribunais pátrios o reconhecimento desta dupla forma de
incidência do imposto:

31
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 1ª seção. EREsp n. 1057912, rel. Min. Luiz Fux, j. em 23.2.2001, DJe

Direito Tributário II
31

CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA E PROVENTOS DE


QUALQUER NATUREZA. SÓCIOS-COTISTAS. RETENÇÃO NA FONTE.
CARACTERIZAÇÃO DO FATO GERADOR. DISPONIBILIDADE JURÍDICA OU
ECONÔMICA DA RENDA. ART. 35 DA LEI 7.713/1988.
INCONSTITUCIONALIDADE CONDICIONAL. NECESSIDADE DE SE AFERIR
SE HÁ A EFETIVA DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS. NECESSIDADE DE
REEXAME DO QUADRO FÁTICO-PROBATÓRIO. Conforme decidiu esta
Corte, “a norma insculpida no artigo 35 da Lei nº 7.713/88 mostra-se
harmônica com a Constituição Federal quando o contrato social prevê a
disponibilidade econômica ou jurídica imediata, pelos sócios, do lucro
líquido apurado, na data do encerramento do período-base”32.

2.2.2 Aspecto temporal


Existe discussão acadêmica e jurisprudencial acerca da natureza do fato gerador do
imposto incidente sobre a renda. É comum o entendimento de que o fato gerador do
imposto de renda seja anual, de forma complexa (ou complexivo), mas fato é que nem a
Constituição nem o Código Tributário Nacional colocam esse período como requisito
essencial de apuração e cobrança do imposto. A ideia de período aqui é quase essencial ao
próprio tributo. A CR em nenhum momento fala que o período é mensal, semestral,
trimestral ou anual, a Constituição não fala em período, fala que o tributo incide sobre o
rendimento, só que a própria ideia de rendimento, de acréscimo patrimonial pressupõe
que eu veja um determinado período de tempo.
Ilustra-se esta situação no caso das Pessoas Jurídicas - PJ, por exemplo. Numa PJ isso
é absolutamente imprescindível, por que, por exemplo, o rendimento da PJ não é qualquer
receita. O rendimento, num sentido muito amplo e muito abstrato, por ora, seria o lucro;
ou seja, seria o resultado positivo da atividade econômica exercida por essa PJ. Para saber
se houve esse resultado positivo, para saber se ela obteve lucro, necessariamente haverá
de se considerar um período de tempo. Não tem como fazer isso por dia, verificar o que
entrou e o que saiu em um dia e concluir qual é o imposto devido.
Se o imposto não incide sobre todas as receitas, mas sim sobre o rendimento, que
seria o lucro obtido por aquela pessoa jurídica na atividade por ela exercida, é
imprescindível que se verifique esse lucro em um determinado período. Período esse em
que ela vai ter ingressos, receita e despesas, de forma a calcular a partir daí o lucro por
ela obtido nessa atividade. Analisando diariamente ou até mesmo semanalmente fica
complicado fazer esse tipo de cálculo.
Vem daí a adoção e conceitos acerca do fato gerador complexivo, a partir das
multiplicidades de fenômenos da tributação sobre a renda. Assim:
a) lei poderá estipular que cada aumento de patrimônio seja tributado
independentemente dos demais;
b) em outro sentido, a lei ordinária poderá apenas considerar o aumento
patrimonial ocorrido após o período-base para, então, disciplinar a tributação; e
c) poderá, ainda, determinar que após o término do período-base (que geralmente
ocorre entre 1º de janeiro e 31 de dezembro para as pessoas naturais) realize-se
um ajuste, verificando a alteração patrimonial ocorrida, incidindo IR (se existir
majoração) ou não (se ocorrer perda ou eventualmente estabilidade patrimonial).

32
STF – 2ª Turma, RE 396215 AgR, rel. Min. Joaquim Barbosa, j. em 25.9.2012, DJe 25/10/2012

Direito Tributário II
32

Em síntese, o momento da incidência do Imposto de Renda dependerá da lei ordinária


específica que poderá eleger a sistemática dinâmica, estática ou mista. Todavia, eleita a
sistemática, não poderá a mesma ser validamente alterada antes de completada a incidência
(aspecto material) relativamente ao fato concreto.
Trata-se de imposto com fato gerador complexivo, como regra, o que exige a definição
legal do momento em que se deva considerar como ocorrido o fato gerador, ou seja, a
definição legal da hipótese de incidência tributária. No IRPF (pessoa física), considera-se
ocorrido o fato gerador em 31 de dezembro do ano-calendário. Até último dia de abril do
subsequente, verifica-se o imposto sobre a renda e proventos efetivamente devidos,
compensando-se o montante que já foi objeto de adiantamentos mensais (carnê-leão ou
retenção), apurando-se, então, o saldo a restituir (em caso de pagamento antecipado a maior)
ou a pagar (em caso de pagamento antecipado a menor), efetuando-se o pagamento, se for
o caso, à vista ou parceladamente.
No IRPJ (pessoa jurídica), tem-se período de apuração trimestral33, podendo a
pessoa jurídica que pagar com base no lucro real optar pelo período anual, com
antecipações mensais. No trimestral, considera-se ocorrido o fato gerador ao final de cada
trimestre civil; no anual, em 31 de dezembro do ano-calendário.
O imposto incidente sobre a renda e proventos de qualquer natureza alcança fatos
ocorridos não apenas no território nacional, como fora dele, especialmente pela aplicação
dos parágrafos do art. 43 do Código. Aqui se fala numa extraterritorialidade do IR, que
para muitos autores seria decorrente da própria ideia de universalidade. Como destaca
Sacha Calmon, “o Brasil adotou o sistema de renda mundial, como ocorre nos países
desenvolvidos. São tributados no Brasil os rendimentos aqui auferidos e no resto do
mundo”.34 A questão central é a tributação no âmbito internacional (muitas vezes tratados
em acordos internacionais para evitar a bitributação), associada à questão da
territorialidade.
Em relação a tributação da Pessoa Jurídica houve a modificação dos critérios, passando
a ser chamado de tributação em bases universais, que começou a ocorrer com a lei
9249/95, cujos arts 25 e 26 criaram expressamente a ideia da tributação em bases
universais também para as PJ’s.
Art. 25. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior
serão computados na determinação do lucro real das pessoas jurídicas
correspondente ao balanço levantado em 31 de dezembro de cada ano.
(...)
§ 2º Os lucros auferidos por filiais, sucursais ou controladas, no exterior,
de pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil serão computados na apuração
do lucro real com observância do seguinte:

Art. 26. A pessoa jurídica poderá compensar o imposto de renda incidente,


no exterior, sobre os lucros, rendimentos e ganhos de capital computados
no lucro real, até o limite do imposto de renda incidente, no Brasil, sobre
os referidos lucros, rendimentos ou ganhos de capital.

33
Lei 9430/96: Art. 1° A partir do ano-calendário de 1997, o imposto de renda das pessoas jurídicas será determinado com base no lucro real,
presumido ou arbitrado, por períodos de apuração trimestrais, encerrados nos dias 31 de março, 30 de junho, 30 de setembro e 31 de dezembro
de cada ano calendário, observada a legislação vigente, com as alterações desta Lei.
34
COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. p. 436.

Direito Tributário II
33

Então na prática a PJ domiciliada no Brasil que tem lá uma filial, uma controlada ou
uma coligada no exterior passou também que contribuir sobre o lucro obtido no exterior.
Essa lei 9249/95 tinha um problema que era a questão da disponibilidade, sendo, naquele
momento, regulada pela Secretaria da Receita Federal da seguinte forma:
IN 38/96 - Art. 2º Os lucros auferidos no exterior, por intermédio de
filiais, sucursais, controladas ou coligadas serão adicionados ao lucro
líquido do período-base, para efeito de determinação do lucro real
correspondente ao balanço levantado em 31 de dezembro do ano-
calendário em que tiverem sido disponibilizados.
§ 1º Consideram-se disponibilizados os lucros pagos ou creditados à
matriz, controladora ou coligada, no Brasil, pela filial, sucursal, controlada
ou coligada no exterior.
§ 2º Para efeito do disposto no parágrafo anterior, considera-se:
I - creditado o lucro, quando ocorrer a transferência do registro de seu
valor para qualquer conta representativa de passivo exigível da filial,
sucursal, controlada ou coligada, domiciliada no exterior;
II - pago o lucro, quando ocorrer:
a) o crédito do valor em conta bancária em favor da matriz, controladora
ou coligada, domiciliada no Brasil;
b) a entrega, a qualquer título, a representante da beneficiária;
c) a remessa, em favor da beneficiária, para o Brasil ou para qualquer
outra praça;
d) o emprego do valor, em favor da beneficiária, em qualquer praça,
inclusive no aumento de capital da filial, sucursal, controlada ou coligada,
domiciliada no exterior.

Significou dizer que a Instrução Normativa atrelou a ideia do rendimento a ser


tributado no Brasil à disponibilidade financeira desse rendimento pela matriz situada no
Brasil, com muitas críticas doutrinárias e debates judiciais.
Tal determinação, todavia, fica patente no § 1º do art. 43, notadamente com a
imposição de que a incidência do imposto independe da localização, condição jurídica ou
nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. Tanto assim que o § 2º
seguinte determina que, na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a
lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins
de incidência do imposto.
A redação destes parágrafos adveio de reforma realizada pela Lei Complementar n°
104, de 2001, servindo ainda de autorização para que o governo federal editasse, naquele
mesmo ano, a Medida Provisória n° 2.158-35, com o polêmico art. 74:
Art. 74. Para fim de determinação da base de cálculo do imposto de renda
e da CSLL, nos termos do art. 25 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de
1995, e do art. 21 desta Medida Provisória, os lucros auferidos por
controlada ou coligada no exterior serão considerados
disponibilizados para a controladora ou coligada no Brasil na data
do balanço no qual tiverem sido apurados, na forma do
regulamento.
Parágrafo único. Os lucros apurados por controlada ou coligada no
exterior até 31 de dezembro de 2001 serão considerados disponibilizados
em 31 de dezembro de 2002, salvo se ocorrida, antes desta data,

Direito Tributário II
34

qualquer das hipóteses de disponibilização previstas na legislação em


vigor.

Após muitos debates nos tribunais, o STF posicionou-se definitivamente sobre o tema
em 2013, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 2588, mantendo este
princípio de universalidade, para dar interpretação conforme a Constituição, com eficácia
erga omnes e efeito vinculante, no sentido de que não se aplicaria às empresas coligadas
localizadas em países sem tributação favorecida (não “paraísos fiscais”), e que se aplicaria
às empresas controladas localizadas em países de tributação favorecida ou desprovidos de
controles societários e fiscais adequados (“paraísos fiscais”, assim definidos em lei).
Deliberou-se, ainda, pela inaplicabilidade retroativa do parágrafo único do aludido
dispositivo, ex vi:
(...) julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação direta
ajuizada, pela Confederação Nacional da Indústria - CNI, contra o § 2º do
art. 43 do CTN, acrescentado pela LC 104/2001, que delega à lei ordinária
a fixação das condições e do momento em que se dará a disponibilidade
econômica de receitas ou de rendimentos oriundos do exterior para fins
de incidência do imposto de renda, e o art. 74, caput e parágrafo único,
da MP 2.158-35/2001, que, com o objetivo de determinar a base de
cálculo do IRPJ e da CSLL, considera disponibilizados, para a controladora
ou coligada no Brasil, os lucros auferidos por controlada ou coligada no
exterior, na data do balanço no qual tiverem sido apurados. Estabeleceu-
se que, ao art. 74 da MP 2.158-35/2001, seria dada interpretação
conforme a Constituição, com eficácia erga omnes e efeito
vinculante, no sentido de que não se aplicaria às empresas
coligadas localizadas em países sem tributação favorecida (não
“paraísos fiscais”), e que se aplicaria às empresas controladas
localizadas em países de tributação favorecida ou desprovidos de
controles societários e fiscais adequados (“paraísos fiscais”,
assim definidos em lei). Deliberou-se, ainda, pela inaplicabilidade
retroativa do parágrafo único do aludido dispositivo.
Arrematou-se que os lucros auferidos no exterior seriam tributados nos
termos da Medida Provisória 2.158-35/2001 a partir de 1º.1.2002, quanto
ao IRPJ, e após 24.11.2001, no que concerne à CSLL. De outro lado, os
fatos havidos antes desses períodos submeter-se-iam à legislação
anterior. Observou-se empate no tocante à situação de empresas
coligadas em “paraísos fiscais” e controladas fora de “paraísos fiscais”. Os
Ministros Marco Aurélio, Sepúlveda Pertence, Ricardo Lewandowski e
Celso de Mello emprestavam ao art. 43, § 2º, do CTN, interpretação
conforme a Constituição, para excluir alcance que resultasse no desprezo
da disponibilidade econômica e jurídica da renda. Além disso, declaravam
a inconstitucionalidade do art. 74 da Medida Provisória 2.158-35/2001.
(STF – ADI 2588, rel. p/acórdão Joaquim Barbosa, j. em 10.4.2013,
Informativos 700 e 701 – negrito nosso)

A partir da consolidação desta posição, o tema passou por nova elaboração


legislativa, sendo a matéria hoje detalhada pela Lei n. 12.973, que traz as disposições
gerais sobre a tributação em bases universais para em seguida detalhar o tratamento

Direito Tributário II
35

das sociedades controladas, coligadas, filiais e etc.

2.2.3 Aspecto pessoal


Além da disciplina do fato gerador, o CTN traz o restante da estrutura básica do
imposto, com o destaque que será considerado contribuinte qualquer pessoa (física ou
jurídica) que tenha a anteriormente citada aquisição de disponibilidade.
Claro que essa incidência normal sobre o titular da disponibilidade não impede que
a lei possa atribuir essa condição de contribuinte ao possuidor, a qualquer título, dos bens
produtores de renda ou dos proventos tributáveis. É determinado ainda que a lei possa
atribuir à fonte pagadora da renda ou dos proventos tributáveis a condição de responsável
pelo imposto cuja retenção e recolhimento lhe caibam. Além do Código Tributário Nacional,
a legislação específica entra em detalhamento do imposto.
São contribuintes do IRPJ as pessoas jurídicas e firmas individuais, como
consolidado no regulamento do imposto:
Art. 146. São contribuintes do imposto e terão seus lucros apurados de
acordo com este Decreto (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 27):
I - as pessoas jurídicas (Capítulo I);
II - as empresas individuais (Capítulo II).
§ 1º As disposições deste artigo aplicam-se a todas as firmas e
sociedades, registradas ou não (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 27,
§ 2º).
§ 2º As entidades submetidas aos regimes de liquidação extrajudicial e
de falência sujeitam-se às normas de incidência do imposto aplicáveis às
pessoas jurídicas, em relação às operações praticadas durante o período
em que perdurarem os procedimentos para a realização de seu ativo e o
pagamento do passivo (Lei nº 9.430, de 1996, art. 60).
§ 3º As sociedades civis de prestação de serviços profissionais relativos
ao exercício de profissão legalmente regulamentada são tributadas pelo
imposto de conformidade com as normas aplicáveis às demais pessoas
jurídicas (Lei nº 9.430, de 1996, art. 55).
§ 4º As empresas públicas e as sociedades de economia mista, bem como
suas subsidiárias, são contribuintes nas mesmas condições das demais
pessoas jurídicas (CF, art. 173, § 1º, e Lei nº 6.264, de 18 de novembro
de 1975, arts. 1º a 3º).
§ 5º: As sociedades cooperativas de consumo, que tenham por objeto a
compra e fornecimento de bens aos consumidores, sujeitam-se às
mesmas normas de incidência dos impostos e contribuições de
competência da União, aplicáveis às demais pessoas jurídicas (Lei nº
9.532, de 1997, art. 69).

Nesse caso, sempre importante recordar que para ser considerada contribuinte, e como
tal sujeitar-se ao pagamento do imposto de renda como pessoa jurídica, basta a aquisição
de disponibilidade econômica ou jurídica de renda, esteja ou não devidamente legalizada,
conforme predicados definidos pelo Código Tributário Nacional nas regras sobre a
capacidade passiva (art. 126, III).

Direito Tributário II
36

2.2.4 Aspecto quantitativo


Em outro aspecto do IR, reconhece o art. 44, CTN, que a base de cálculo do imposto é
a montante, real, arbitrada ou presumida, da renda ou dos proventos tributáveis. A partir
dessa disposição do Código na definição da base de cálculo a legislação, além de definir a
incidência de todos os valores recebidos pelas pessoas físicas, detalhou a compreensão
daqueles montantes.
Na pessoa jurídica a situação é um pouco mais complicada do que para a pessoa física.
A pessoa jurídica, por sua vez, submete-se, ordinariamente, ao imposto de renda calculado
com base no lucro real ou com base no lucro presumido, podendo, ainda, vir a ser tributada
com base no lucro arbitrado. Já no caso de tributação do Imposto de Renda (IRPJ) para
as pessoas jurídicas, dispõe de três formas básicas. Sinteticamente:
Apuração pelo lucro real – é a forma de apurar o lucro exato tributável da empresa,
com base em sua escrituração comercial, verificadas as adições, exclusões e
compensações. Sobre esse lucro é aplicada a alíquota, obtendo-se o imposto
devido.
Apuração pelo lucro presumido – determinada pela aplicação de um percentual
sobre a receita bruta da empresa, podendo o parâmetro variar conforme o tipo de
atividade econômica desenvolvido. De modelo mais simplificado, não é permitida
a toda pessoa jurídica.
Apuração pelo lucro arbitrado – usualmente realizada quando o contribuinte não
tiver condições de demonstrar o seu lucro (real ou presumido), restando para a
autoridade fazendária arbitrar, a partir de elementos apurados pela situação da
empresa.

A tributação pelo lucro presumido e arbitrado envolve a utilização de bases


substitutivas ao lucro real, ou seja, ao rendimento real auferido pelo contribuinte. De todas
essas formas incidentes sobre as pessoas jurídicas, a mais delicada é a utilizada no modelo
arbitrado, mesmo porque o mecanismo tende a adotar patamares que onerem bastante os
sujeitos passivos.
Tanto assim deve ser empregado com cuidado que o extinto Tribunal Federal de
Recursos – TFR havia consolidado antes da Constituição vigente o seguinte entendimento
sumulado:
Súmula 76. Em tema de Imposto de Renda, a desclassificação da escrita
somente se legitima na ausência de elementos concretos que permitam a
apuração do lucro real da empresa, não se justificando o simples atraso
na escrita.

Claro que essas são disposições genéricas para a incidência sobre os rendimentos
anuais, mas não estão afastadas aquelas situações com tributação específica e exclusiva
no momento da ocorrência do fato imponível com ganhos eventuais. Nesses casos, a norma
legal vai definir, além da incidência, também a dimensão da base de cálculo.
Pela existência desses diversos eventos submetidos ao imposto e suas múltiplas
modalidades de ocorrência, o tributo possui várias alíquotas aplicáveis, sendo fundamental
imputar para cada operação o percentual determinado legalmente.

Direito Tributário II
37

2.3 O ICMS na Constituição de 1988 e sua regulamentação.


Malgrado a suposta necessidade de mudança constitucional a que sempre se propõe
com a reforma da tributação sobre o consumo e as diversas críticas que se fazem ao
modelo da tributação havida no ICMS, na análise do Imposto sobre operações relativas à
circulação de mercadorias e sobre a prestação de serviços de transporte interestadual e
intermunicipal e de comunicação (ICMS) o elemento histórico se tornou ponto
determinante de seu entendimento.
A verdade é que a forma de estipulação do referido imposto na Constituição Federal
de 1988 representou grande passo de evolução da exação, mormente se comparada com
sua versão original de 1966. Além, é claro, de agregar ao imposto a incidência sobre os
produtos especiais (combustíveis etc.) e serviços (comunicação e transporte interestadual)
que antes estavam no poder federal. O legislador constituinte último teceu várias e
profundas considerações sobre o imposto, modificando bastante sua estrutura anterior,
resultando, com isso, na adoção de um parágrafo (§ 2º do art. 155) com quantidade
significativa de assuntos abordados (e consequentemente incisos). Além disso, a
Constituição cuidou ainda de reconhecer a necessidade da edição de uma lei complementar
que verse sobre vários pontos do imposto, na forma do inciso XII, sempre do § 2º do art.
155.
LEI COMPLEMENTAR Nº 87, DE 13 DE SETEMBRO DE 1996 - Dispõe sobre
o imposto dos Estados e do Distrito Federal sobre operações relativas à
circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte
interestadual e intermunicipal e de comunicação, e dá outras providências. (LEI
KANDIR)

2.3.1 Do campo de incidência do ICMS


Até mesmo por isto, o ICMS ganhou contornos constitucionais elevados, sendo
previstos originariamente as seguintes materialidades como fatos geradores:
• alienação de mercadorias;
• serviços de transporte interestadual e intermunicipal;
• serviços de comunicação.

Estas mesmas situações que constituem fato gerador do ICMS estão previstas na LC
nº 87/96, nos seguintes termos:
Art. 2º O imposto incide sobre:
I – operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o
fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e
estabelecimentos similares;
II – prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal,
por qualquer via, de pessoas, bens, mercadorias ou valores;
III – prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio,
inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a
retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer
natureza; (...)

Percebe-se que o ICMS abrange, na realidade, diversas materialidades distintas. A


primeira corresponde à incidência sobre operações relativas à circulação de
mercadorias; a segunda diz respeito às prestações de serviços de transporte

Direito Tributário II
38

interestadual e intermunicipal; e a terceira é a relativa aos serviços de comunicação.


Mas, cada uma delas bem distinta das demais, como já se reconheceu:
Segundo a regra do art. 155, II, da CF/88, o ICMS comporta três núcleos
distintos de incidência: (i) circulação de mercadorias; (ii) serviços de
transporte; e (iii) serviços de comunicação (STJ – 1ª Seção, REsp nº
842.270, rel. p. acórdão Min. Castro Meira, j. em 23.5.2012, DJe
26.6.2012).

2.3.1.1 Circulação de Mercadoria

Desde a edição do CTN encontra-se na competência estadual a tributação sobre as


mercadorias em circulação. E, desde aquele momento, não sendo adotada qualquer referência
de consumo ou para a alienação simples de bens, foi indispensável perquirição a respeito dos
caracteres distintivos entre os conceitos dos “bens jurídicos” como um todo para a
“mercadoria”. Nessa esteira, há muito, já indicava o mestre Fran Martins que “chamam-se
mercadorias as coisas que comerciantes adquirem com a finalidade específica de revender”.35
De todo se reconhece que as mercadorias só podem ser bens móveis, mas ainda
assim tal característica não é suficiente. Já na doutrina clássica, e sempre atual, de
Carvalho de Mendonça, encontramos as linhas para diferenciar as mercadorias:
As coisas móveis, consideradas como objeto de circulação comercial, tomaram
o nome específico de mercadoria. A mercadoria está, portanto, para a coisa,
como a espécie para o gênero. Todas as mercadorias são necessariamente
coisas; nem todas as coisas, porém, são mercadorias. Não há, como se vê,
diferença de substância entre coisa e mercadoria; a diferença é a destinação.
Tudo que pode ser objeto de comércio, vendido ou locado é mercadoria.
Mercadoria é coisa comercial, por excelência, na frase de Vidari. Nesse sentido,
fala-se em mercar, isto é, comprar e vender, especular, e de mercancia,
significando mercadoria.36

Em razão disso, a alienação de um bem do ativo permanente, como um bem37 por uma
pessoa jurídica prestadora de serviços, por exemplo, não dá margem à exigência do
tributo. Pelo mesmo motivo não incide o imposto quando da alteração da titularidade de
bens em razão de operação societária de cisão, fusão ou incorporação.38
A compreensão da exata dimensão desse imposto demanda, em um primeiro
momento, a intelecção de certos conceitos. Operações nada mais são do que negócios
jurídicos. Circulação, por sua vez, significa a transferência de propriedade de mercadorias.
Diante dessa tormentosa conceituação e dada a repercussão nacional, o ICMS sempre
passou por diversas discussões, a começar pelo seu fato gerador, produzindo os tribunais
pátrios vários posicionamentos que servem para compreender o alcance do tributo. Nesse
sentido, para ilustrar alguns posicionamentos, encontramos:
Súmula 573, STF. Não constitui fato gerador do ICM a saída física de
máquinas, utensílios e implementos a título de comodato.
Súmula 166, STJ. Não constitui fato gerador do ICMS o simples

35
MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. 22. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 473.
36
MENDONÇA, José Xavier Carvalho de. Tratado de Direito Comercial brasileiro. Campinas: Russel, 2006. v. V, p. 28.
37
STF – 2ª Turma, AI 835104, rel. Min. Ayres Brito, j. em 7/2/2012, DJe 16/3/2012.
38
STJ – 1ª Turma, REsp 242.271, rel. p/acórdão Min. Humberto Gomes de Mattos, j. em 19.6.2001, DJ 17.9.2001.

Direito Tributário II
39

deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do


mesmo contribuinte.

Exemplo notório dessa compreensão é o entendimento versado na Súmula 166. Se a


mercadoria foi transferida entre estabelecimentos de uma mesma pessoa jurídica, não há
alteração de titularidade de sua propriedade, razão pela qual o imposto não é devido. Em
similar sentido, a antiga Súmula 573 do STF já determinava que a mera transferência da
posse direta (a título de comodato), sem a alienação do domínio, não importa no fato
imponível do imposto. O STF reforça a posição já tomada, afirmando: “O Supremo Tribunal
Federal fixou entendimento no sentido de que o simples deslocamento da mercadoria de
um estabelecimento para outro da mesma empresa, sem a transferência de propriedade,
não caracteriza a hipótese de incidência do ICMS. Precedente.”39
Em todos os casos fica patente que é indispensável a caracterização da circulação
jurídica da mercadoria. Numa situação de bem dado em consignação, o STJ assim ratifica
a necessidade de verificação in concreto de todos estes elementos:
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO
OCORRÊNCIA. ICMS. OPERAÇÃO DE VENDA PELA AGÊNCIA DE
AUTOMÓVEIS DE VEÍCULO USADO CONSIGNADO PELO PROPRIETÁRIO.
NÃO INCIDÊNCIA.
1. Recurso especial pelo qual se discute se a operação de venda
promovida por agência de automóveis de veículo usado consignado pelo
proprietário está sujeita, ou não, à incidência de ICMS a ser pago pelo
estabelecimento comercial.
2. Constatado que a Corte a quo empregou fundamentação suficiente para
dirimir a controvérsia, é de se afastar a alegada violação do art. 535 do
CPC.
3. A Primeira Seção, ao julgar o REsp 1.125.133⁄SP, Rel. Min. Luiz Fux,
DJe 10⁄9⁄2010, submetido ao rito dos recursos repetitivos (art. 543-C do
CPC), decidiu que "a circulação de mercadorias versada no dispositivo
constitucional [art. 155, II] refere-se à circulação jurídica, que pressupõe
efetivo ato de mercancia, para o qual concorrem a finalidade de obtenção
de lucro e a transferência de titularidade", que "pressupõe a transferência
(de uma pessoa para outra) da posse ou da propriedade da mercadoria
[...] (Roque Antonio Carrazza, in ICMS, 10ª ed., Ed. Malheiros, p. 36⁄37)".
4. Ponderado esse entendimento jurisprudencial, constata-se que a mera
consignação do veículo cuja venda deverá ser promovida por agência de
automóveis não representa circulação jurídica da mercadoria, porquanto
não induz à transferência da propriedade ou da posse da coisa,
inexistindo, dessa forma, troca de titularidade a ensejar o fato gerador do
ICMS. Nesse negócio, não há transferência de propriedade (domínio) à
agência de automóveis, pois, conforme assentado pelo acórdão recorrido,
ela não adquire o veículo de seu proprietário, mas, apenas, intermedeia
a venda da coisa a ser adquirida diretamente pelo comprador. De igual
maneira, não há transferência de posse, haja vista que a agência de
automóveis não exerce nenhum dos poderes inerentes à propriedade (art.
1.228 do Código Civil). Isso porque a consignação do veículo não

39
STF – 2ª turma, RE 422051 AgR, rel. Min. Eros Grau, j. em 8.6.2010, DJe 24.6.2010

Direito Tributário II
40

pressupõe autorização do proprietário para a agência usar ou gozar da


coisa, nem tampouco a agência pode dispor sobre o destino da mercadoria
(doação, locação, destruição, desmontagem, v.g.), mas, apenas,
promover a sua venda em conformidade com as condições prévias
estabelecidas pelo proprietário. Em verdade, a consignação do veículo
significa mera detenção precária da mercadoria para fins de exibição,
facilitando, dessa forma, a consecução do serviço de intermediação
contratado.
5. Recurso especial não provido.40

Esse entendimento dos tribunais foi dado justamente para afastar a pretensão de
legalidade a partir da literalidade da LC nº 87/96, que assim dispunha:
Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
I – da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que
para outro estabelecimento do mesmo titular;

Todas essas situações são indispensáveis na caracterização do produto como


mercadoria, bem como o sentido a ser dado para a sua circulação. Como já presente em
outras formas, não basta a mera movimentação física dos bens. Para a configuração do
fato imponível, além de ser um bem em mercado, é fundamental que ocorra a transferência
de titularidade por tal operação mercantil, não ocorrendo, por exemplo, na alienação de
bens que integravam o ativo fixo:
ICMS. ALIENAÇÃO DE BENS DO ATIVO FIXO. OPERAÇÃO NÃO HABITUAL.
NÃO INCIDÊNCIA. SÚMULA 279/STF. 1. A jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal é firme no sentido de que não há incidência de ICMS em
operações não habituais de alienação de bens do ativo fixo. Precedentes
(STF – 2ª Turma, AI 835104, rel. Min. Ayres Brito, j. em 7/2/2012, DJe
16/3/2012).

2.3.1.2 Imposto sobre o transporte

No mesmo sentido, importa observar a competência estadual para tributar os serviços,


desde que caracterizados como de comunicação e transporte – este último desde que
intermunicipal ou interestadual. Também na questão conceitual, é relevante determinar
qual serviço corresponde ao negócio jurídico caracterizado pela assunção de uma obrigação
de fazer por um dos contratantes. Pressupõe a existência de um negócio jurídico, não se
pode cogitar da incidência do imposto na hipótese do que impropriamente se denomina
autosserviço.
Na forma do Código Civil, a prestação de serviço é um contrato típico com
características centrais dadas no art. 594, CC., especial para afirmar que toda a espécie
de serviço ou trabalho lícito, material ou imaterial, pode ser contratada mediante
retribuição. Mas, como já destacado, nem todo serviço está no campo da incidência do
ICMS.
A primeira hipótese é o transporte. Este vem no sentido de conduzir, de levar pessoas
ou coisas de um lugar a outro. Parece claro que pressupõe o sentido de dinamismo e de
movimentação, com nítido sentido de percurso ou de itinerário realizado. Por óbvio, sem a

40
STJ – 1.turma, REsp 1.321.681, Rel. Min. Benedito Gonçalves, j. em 26.2.2013, DJe 5.3.2013

Direito Tributário II
41

deslocação não existirá o sentido transporte. O ato ou o efeito de transportar pode ser
tanto de pessoas ou coisas, mediante a necessária ideia de remuneração estampada no
art. 594, CC. Para os fins do ICMS, o transporte que nos interessa é o deslocamento de
pessoas ou coisas a título oneroso, de cunho econômico. E mesmo assim, se a operação
ocorrer entre municípios ou entre estados.
Neste sentido, a jurisprudência nacional reconhece a incidência sobre todos os objetos
de transporte, inclusive o de passageiros, como se ilustra abaixo:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO
TRIBUTÁRIO.ICMS.PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE
RODOVIÁRIO DE PASSAGEIROS. INCIDÊNCIA.CONSTITUCIONALIDADE.
1. É constitucional a incidência de ICMS sobre a prestação de serviços de
transporte rodoviário de passageiros. 2. Agravo regimental a que se nega
provimento.
(STF – 1ª turma, RE 896752 – AgR, rel. Min. Edson Fachin, j. em
15.9.2015)

Por outro lado, em razão da mais recente interpretação das normas constitucionais
acerca da extensão da imunidade recíproca em favor da Empresa de Correios – ECT,
impõe-se destacar que na hipótese de serviços de transporte de encomendas realizados
por aquela empresa haverá a não incidência do imposto. Este tema tem sido
reiteradamente afirmado pelo Pretorio Excelso, como se ilustra em recente decisão:
TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NA AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA.
EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. ICMS. INCIDÊNCIA.
ATIVIDADE DE TRANSPORTE DE ENCOMENDAS. IMUNIDADE RECÍPROCA.
AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal concluiu pela concessão da
imunidade recíproca à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT,
mesmo quando relacionada às atividades em que a empresa não age em
regime de monopólio. (RE 627.051/PE, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Pleno,
Dje 11/2/2015). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF – Pleno, ACO 1454 - AgR, rel. Min. Teori Zavascki, j. em 18.12.2015)

No transporte intermunicipal realizado dentro de um único estado não há dúvidas quanto


a competência para exigência do imposto. Na hipótese desse imposto incidente sobre as
atividades de transporte interestadual, por outro lado, o imposto é devido ao Estado de
origem; já quando se trata de transporte internacional destinado a ponto dentro do território
nacional, a lei prevê a competência do Estado de destino da mercadoria. Estas hipóteses
estão expressamente mencionadas na L. C. 87, de 1996, ainda que a título de definição do
aspecto temporal destas incidências:
Art. 11. O local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança
do imposto e definição do estabelecimento responsável, é:
II - tratando-se de prestação de serviço de transporte:
a) onde tenha início a prestação;
b) onde se encontre o transportador, quando em situação irregular pela
falta de documentação fiscal ou quando acompanhada de documentação
inidônea, como dispuser a legislação tributária;
c) o do estabelecimento destinatário do serviço, na hipótese do inciso XIII
do art. 12 e para os efeitos do § 3º do art. 13;

Direito Tributário II
42

Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:


(...)
V - do início da prestação de serviços de transporte interestadual e
intermunicipal, de qualquer natureza;
VI - do ato final do transporte iniciado no exterior;

Por outro lado, não há incidência sobre o transporte internacional iniciado no Brasil com
destino a ponto no exterior, por força da imunidade do art. 155, §2°, X ‘a’ CRFB/88. Neste
aspecto, importante destacar que a imunidade está unicamente ligada ao transporte
internacional, não abrangendo as situações de transporte interno de mercadorias que
posteriormente serão exportadas. O tema não é novo nos tribunais, mas ainda recorrente,
como se novamente ilustra por recente decisão do STF:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL
EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. TRIBUTÁRIO. SERVIÇO
UTILIZADO NOTRANSPORTE INTERESTADUAL OU INTERMUNICIPAL DE
PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS DESTINADOS AO EXTERIOR.
PRETENDIDA NÃO INCIDÊNCIA DO ICMS. ART. 155, § 2º, X, A, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. A imunidade tributária prevista no artigo
155, § 2º, X, a, da Constituição Federal é benefício restrito às operações
de exportação de produtos industrializados, não abrangendo o serviço
utilizado no transporte interestadual ou intermunicipal dos referidos bens.
2. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental a que se
nega provimento.
(STF – 1ª turma, Emb Decl. RE 602399, rel. Min. Roberto Barroso, j. em
15.12.2015)

2.3.1.3 Imposto sobre a comunicação

O ICMS incide também sobre a prestação de serviços de comunicação. Para que haja
comunicação é imperativo que haja um agente emissor, um agente receptor e uma
mensagem. Para que haja a incidência do imposto é imperativo que o serviço prestado
tenha natureza onerosa, nas mais diversas modalidades modernas de comunicação. Em
razão disso, não se cogita da incidência do tributo em razão da prestação de serviços de
comunicação praticada de recepção gratuita, conforme, aliás, didaticamente dispõe o art.
155, § 2º, X, d, do próprio texto constitucional. De toda forma, incide sobre as operações
de comunicação telefônica (nas diversas formas), sobre a comunicação de serviços de TV
por assinatura etc.
Apesar de tais situações parecerem simples, o cotidiano apresentou várias situações
polêmicas, resultando na edição de várias discussões nos Tribunais. O imposto incide
apenas sobre o serviço de comunicação, o que exclui a sua exigência sobre todos os atos
periféricos e preparatórios para a prestação de tal serviço, tais como o cadastro, a
habilitação, a instalação etc. Nesse sentido, consolidou o Superior Tribunal de Justiça –
STJ por súmula:
Súmula 350. O ICMS não incide sobre o serviço de habilitação de telefone
celular.

Direito Tributário II
43

O ato de habilitação do celular não constitui um serviço de comunicação, nada mais


sendo que um ato preparatório ao uso do celular. Este, sem dúvida, é um serviço de
comunicação, mas não aquele que o antecede, nem nos serviços acessórios ou
suplementares àquele.41
Ainda em razão das modernidades da vida das comunicações, não é estranho perceber
a existência de várias formas de serviços associados a um só evento. Especialmente no
caso da telefonia móvel, com os serviços de roaming para usuários localizados fora da
praça normal de uso, os tribunais tiveram oportunidade de reconhecer a multiplicidade
desses serviços, como restou pacificada na compreensão do STJ.42
Também não pode incidir o imposto sobre os serviços prestados por provedor de
Internet. Nessa hipótese, entende-se que os provedores não ofertam o serviço de
comunicação em si, mas apenas propiciam aos consumidores acesso à rede mundial de
computadores. Para tanto, outra súmula do STJ foi editada:
Súmula 334. O ICMS não incide no serviço dos provedores de acesso à
Internet.

Como o imposto sofreu grandes modificações com a passagem constitucional e o


legislador constituinte reconheceu a existência de vários pontos críticos, o art. 155 traz
extenso § 2º com várias regras para o tributo, com casos de incidência e não incidências
específicas (incisos IX e X).

2.3.1.4 ICMS – importação

Dessas hipóteses destaca-se a previsão do inciso IX, alínea a, que pretendia pacificar
a incidência da tributação sobre as mercadorias advindas do exterior, mas resultou em
grandes discussões de interpretação em alguns casos concretos. O Superior Tribunal de
Justiça foi o primeiro a enfrentar algumas questões, posicionando-se da seguinte forma
ainda na década de 1990:
Súmula 155. O ICMS incide na importação de aeronave, por pessoa física,
para uso próprio.
Súmula 198. Na importação de veículo por pessoa física, destinado a uso
próprio, incide o ICMS.

A discussão sobre a incidência do ICMS nessas hipóteses não era pacífica,


especialmente nas situações em que os importadores-compradores não eram contribuintes
do imposto, nem realizavam aquelas operações com habitualidade ou volume, afastando-
lhes completamente o status de comerciante.
Ainda para chegar-se a melhor interpretação sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal
também consolidou seus posicionamentos, especialmente para afastar a incidência sobre
pessoas que não se enquadrassem nos conceitos de sujeição passiva do imposto:
Súmula 660. Não incide ICMS na importação de bens por pessoa física ou
jurídica que não seja contribuinte do imposto.

41
“...A prestação de serviços conexos ao de comunicação por meio da telefonia móvel (que são preparatórios, acessórios ou intermediários da
comunicação) não se confunde com a prestação da atividade fim — processo de transmissão (emissão ou recepção) de informações de qualquer
natureza —, esta sim, passível de incidência pelo ICMS. Desse modo, a despeito de alguns deles serem essenciais à efetiva prestação do serviço
de comunicação e admitirem a cobrança de tarifa pela prestadora do serviço (concessionária de serviço público), por assumirem o caráter de
atividade meio, não constituem, efetivamente, serviços de comunicação, razão pela qual não é possível a incidência do ICMS....”( STJ, 1ª
seção, REsp 1176753, rel. p/acórdão Min. Mauro Campbell Marques, j. em 28.11.2012, DJe 19.12.2012)
42
STJ, 1ª Turma, REsp 1202437, rel. Min. Benedito Gonçalves, j. em 8.11.2011, DJe 23.11.2011.

Direito Tributário II
44

A posição do STF foi dada em razão dos casos que chegavam à Corte, diante da redação
primária da Constituição, ainda que o verbete somente tenha sido aprovado e publicado
em 2003. Mas a situação normativa já havia sido alterada, para incluir a referência a
algumas pessoas. Tanto assim que a atual redação da referida alínea foi dada pela Emenda
nº 33, em 2001, sendo que, até aquele momento, não havia a referência constitucional
sobre pessoas físicas ou jurídicas, ainda que não fossem contribuintes habituais do
imposto.
Mas, para que ninguém estranhe a redação da Súmula 660, STF, cuidado para lembrar
que foi elaborada em cima de casos anteriores à referida Emenda. Ainda assim, o Tribunal,
na Sessão Plenária de 26/11/2003, recusou a proposta de alteração da Súmula 660,
constante do Adendo nº 7. Foi republicado o respectivo enunciado nos Diários da Justiça de
28/3/2006, 29/3/2006 e 30/3/2006, com o teor aprovado na Sessão Plenária de 24/9/2003,
retirando da redação inicialmente publicada a expressão inicial que dizia “Até a vigência da
EC 33/2001[...]”, que tinha aparecido na publicação realizada no Diário de Justiça de
5/8/2004.
Com a redação atual e complacência dos tribunais, incide sobre a entrada de qualquer
bem ou produto, ainda que não destinado a comércio nem que se caracterize como
mercadoria. Também incide na importação realizada por qualquer pessoa, contribuinte
usual ou não. Assim, exige-se o ICMS na entrada de qualquer bem estrangeiro no
território nacional. Trata-se, praticamente, de um segundo imposto sobre a importação
– sobre a entrada no território –, perdendo, inclusive, o aspecto de tributação sobre o
comércio. Ainda que tenha havido modificação conceitual do tributo, o que justifica a
cobrança do ICMS na entrada da mercadoria é a neutralidade fiscal, para que a
concorrência não fique desequilibrada.
A Lei Complementar nº 87 também faz referência a essa incidência:
Art. 2º, § 1º O imposto incide também:
I – sobre a entrada de mercadoria ou bem importados do exterior, por
pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do
imposto, qualquer que seja a sua finalidade;
II – sobre o serviço prestado no exterior ou cuja prestação se tenha
iniciado no exterior; [...]

Sem prejuízo de toda essa polêmica, o fundamento de tal norma se coaduna com todo
o espírito das demais disposições constitucionais que adotaram como regra para os tributos
sobre a circulação e produção a incidência quando da entrada (importação) do produto no
país e a não incidência no caso de saída (exportação). Assim se dá, por exemplo, nas
contribuições especiais (art. 149, § 2º, CRFB/88) e no IPI (art. 46, CTN, e art. 153, § 3º,
CRFB/88).
E, recentemente, o STF reafirmou a constitucionalidade desta incidência sobre a
importação de bens, sendo irrelevante a classificação jurídica do ramo de atividade da
empresa importadora.43
Além disto, é ainda importante que somente ocorrerá a incidência se presentes os
demais elementos que caracterizam a circulação jurídica das coisas, não se bastando a
mera circulação física do bem para dentro do território nacional. Ou seja, mesmo que o
bem ingresse fisicamente no território nacional, sem a transferência de titularidade, não
haverá a incidência do imposto. Este tema foi objeto de grande discussão no caso dos

43
STF – Pleno, RE 439796 e RE 474267, rel. Min. Joaquim Barbosa, j. em 6.11.2013, Informativo 727

Direito Tributário II
45

produtos que vieram na forma de leasing clássico:


ICMS. NÃO INCIDÊNCIA. ENTRADA DE MERCADORIA IMPORTADA DO
EXTERIOR. ARTIGO 155, II, DA CB. LEASING DE AERONAVES E/OU
PEÇAS OU EQUIPAMENTOS DE AERONAVES. OPERAÇÃO DE
ARRENDAMENTO MERCANTIL. AUSÊNCIA DE OPÇÃO DE COMPRA. 1.
Importação de aeronaves e/ou peças ou equipamentos que as
componham em regime de leasing sem a posterior transferência ao
domínio do arrendatário. 2. A circulação de mercadoria é pressuposto de
incidência do ICMS. O imposto --- diz o artigo 155, II da Constituição do
Brasil --- é sobre “operações relativas à circulação de mercadorias e sobre
prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de
comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no
exterior”
(STF – 2ª Turma, RE 194.255, rel. Min. Eros Grau, j. em 24.6.2008, DJe
14.8.2008)

Outra questão definida é quem será o sujeito ativo do imposto neste caso e o
momento da exigência do pagamento do imposto. Isso porque, como extraído da
redação constitucional, a competência do imposto é do estado destinatário dos bens e
das mercadorias, e não aquele onde ocorra a entrada no território nacional.
O determinado é que o ICMS seja devido ao estado do destinatário da mercadoria ou
bem, mesmo o fato gerador ocorrendo no desembaraço aduaneiro em outra unidade
federativa. Como afirma a Constituição, é o estado do destino e não da entrada no território
nacional. Não importa o porto ou o aeroporto de entrada no país, mas sim a destinação
jurídica do adquirente interno.
Há casos em que, ainda na importação, aparece um terceiro agente, fazendo-se uma
triangulação nas importações, quando, por exemplo, uma empresa traz mercadoria para
outra empresa. Essas empresas intermediárias, em regra, estão estabelecidas em
unidades federativas que concedem vantagens na importação, com prejuízo para os
estados onde estão os reais importadores.
O STF entende que o imposto é devido ao estado em que se localiza o importador de
direito, pois é ele que é o destinatário final. No caso de operações em que há os
intermediários, o STF afasta a figura do intermediário e determina que o ICMS é devido ao
estado do real importador da mercadoria.44
Sem prejuízo de a competência ser do estado do destino, temporalmente, é possível
a exigência do imposto no momento da realização do desembaraço aduaneiro dos bens
e mercadorias. Novamente, o Supremo Tribunal Federal solidificou seu posicionamento
em súmula, cuja redação é a seguinte:
Súmula 661. Na entrada de mercadoria importada do exterior, é legítima a
cobrança do ICMS por ocasião do desembaraço aduaneiro.

2.3.1.5 ICMS – outros serviços

Além de todo esse debate sobre a correta exegese da primeira alínea, a outra previsão
de incidência especial do ICMS também deve ser lembrada, já que permite a tributação
de outros serviços que não transporte e comunicação.

44
STF – 2ª Turma, RE 555.654, rel. Min. Ayres Britto, j. em 8/11/2011, DJe 15.12.2011.

Direito Tributário II
46

De toda sorte, é importante observar que somente será possível tal incidência se os
serviços forem fornecidos junto com mercadorias e, mesmo assim, se não estiverem no
âmbito da competência do imposto municipal sobre serviços (art. 155, § 2º, IX b,
CRFB/88).
No mesmo sentido, dispôs a Lei Complementar nº 87:
Art. 2º [...]
IV – fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não
compreendidos na competência tributária dos Municípios;
V – fornecimento de mercadorias com prestação de serviços sujeitos ao
imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, quando a lei
complementar aplicável expressamente o sujeitar à incidência do imposto
estadual.

Mas cuidado com o campo de atuação do dispositivo. Determina a alínea b daquele


inciso a seguinte situação: caso a mercadoria esteja sendo fornecida vinculada a serviços,
e estes não estejam incluídos na lista taxativa do Imposto sobre Serviço, a base de cálculo
adotada para efeitos do ICMS será o valor total da operação. A priori, ainda que pareça
estranha tal disposição, na prática tem-se evitado bastante a evasão tributária, já que a
lei complementar do ISS se tornou bastante insuficiente no que tange à quantidade de
serviços ali previstos.
Grande exemplo disso é o fornecimento de refeições em bares e restaurantes,
acompanhadas ou não de bebidas, que constitui uma operação mista, pois inclui o
fornecimento de mercadorias (ingredientes da refeição e bebidas) e serviço (preparo e
higienização da louça). Servindo de boa ilustração sobre a hipótese, novamente encontra-
se enunciado do Superior Tribunal de Justiça:
Súmula 163. O fornecimento de mercadorias com a simultânea prestação
de serviços em bares, restaurantes e estabelecimentos similares
constitui fato gerador do ICMS a incidir sobre o valor total da
operação.
Já nesse sentido, por expressa disposição da Lei Complementar nº 87, de 1996, o “[...]
fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos
similares[...]” é dado como fato gerador do ICMS (art. 2º, I).

2.3.2 Não incidência do ICMS


A Constituição estabelece, ainda, imunidade para a incidência do ICMS sobre algumas
operações específicas, sem afastar, por óbvio, as diversas imunidades já dadas na
capitulação das limitações ao poder de tributar (art. 150, VI, CRFB/88), notadamente a do
livro, jornal e periódico, papel, fonogramas e videofonogramas que afasta hipótese de
incidência do ICMS.

Nesse sentido, o inciso X do art. 155, § 2º, estipulou quatro hipóteses de não incidência
constitucional do Imposto, também denominada por alguns de Imunidades Específicas,
a saber:
• sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre
serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção
e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e
prestações anteriores;

Direito Tributário II
47

• sobre operações que destinem a outros Estados o petróleo, lubrificantes,


combustíveis líquidos e gasosos derivados de petróleo e energia elétrica;
• sobre o ouro, quando a lei o defina como ativo financeiro ou instrumento
cambial;
• nas prestações de serviço de comunicação nas modalidades de radiodifusão
sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita.

A primeira se coaduna com as demais disposições constitucionais, notadamente no


caso das contribuições (art. 149, § 2º, CRFB/88) e do IPI (art. 46, CTN, e art. 153, § 3º,
CRFB/88). A ideia é desonerar as exportações como forma de torná-las mais interessantes.
Em outras palavras, não incidindo o ICMS, o produto chega ao exterior mais em conta,
tornando-o assim mais competitivo no mercado internacional, além de incentivar o
produtor nacional a realizar a venda internacional. Uma forma adicional de incentivar as
exportações é garantir aos exportadores a manutenção do crédito do ICMS, fato este
expressamente definido no texto constitucional.
No caso dos produtos especiais (petróleo e seus derivados) e energia elétrica, é de se
observar que somente as operações interestaduais são imunes. As operações no âmbito
dos Estados não são imunes. Vale lembrar que o etanol (álcool) não é derivado de petróleo.

2.3.3 Aspecto quantitativo: base de cálculo do imposto


Além dessas polêmicas sobre a caracterização das duas hipóteses de incidência, a
dimensão econômica também merece algum apontamento. De forma direta, poder-se-ia
dizer que a base de cálculo do imposto seria o valor da operação que materializa a
circulação de mercadoria ou a prestação de serviços.
Evidentemente que a legislação específica (art. 13 da Lei Complementar nº 87, de
1996) detalha as diversas hipóteses e situações que se verificam que isso ocorra. Mas
genericamente será o valor da operação decorrente da circulação de mercadoria (inciso I
daquele art. 13) e o preço do serviço (inciso III daquele art. 13). Sem prejuízo dessa
simplificação, debateram os Tribunais diversos aspectos da base de cálculo do imposto em
situações específicas, com a edição das seguintes conclusões:
Súmula 237, STJ. Nas operações com cartão de crédito, os encargos
relativos ao financiamento não são considerados no cálculo do ICMS.
Súmula 391, STJ. O ICMS incide sobre o valor da tarifa de energia elétrica
correspondente à demanda de potência efetivamente utilizada.
Súmula 395, STJ. O ICMS incide sobre o valor da venda a prazo constante
da nota fiscal.
Súmula 457, STJ. Os descontos incondicionais nas operações mercantis
não se incluem na base de cálculo do ICMS.

De todas, verifica-se a preocupação dos tribunais em reconhecer a base econômica


real das operações submetidas ao imposto. Se o comerciante vendeu o produto a prazo,
deve ser considerada a base de cálculo o valor efetivamente apurado pelo comerciante. O
financiamento eventual agrega-se ao valor do comércio realizado. Já se a forma de crédito
e financiamento deu-se por operação de parcelas em cartão de crédito, isto não afeta
a base de cálculo do imposto.
Outro ponto a merecer atenção está nos contratos de fornecimento de energia
elétrica. Ainda que contratada com determinada capacidade para fornecimento, somente

Direito Tributário II
48

haverá a incidência sobre a quantidade de energia que foi efetivamente consumida. A


repercussão na base de cálculo é óbvia: o aspecto quantitativo deve apurar o quanto
realmente foi consumido e não aquela potencialidade de fornecimento.
A situação mais delicada está na última súmula transcrita acima. Para tanto,
importante observar que descontos incondicionais são aqueles concedidos no preço das
mercadorias ou produtos vendidos e dos serviços prestados como parcelas redutoras do
preço de venda. Normalmente, constam da nota fiscal de venda dos bens ou da fatura de
serviços e não dependem, para sua concessão, de evento posterior à emissão desses
documentos.
Na prática mercantil, o desconto incondicional, também chamado de desconto
comercial, é uma redução de preço concedida no ato da venda. Em geral, é utilizado como
forma de atrair o cliente para a compra ou de incentivá-lo a adquirir uma quantidade maior
de mercadorias, como é o caso do desconto promocional.
A ideia é justamente para se diferenciar dos concedidos sob condição. Ilustra-se: há a
compra de uma mercadoria a prazo e o comprador decide antecipar o pagamento para auferir
10% de desconto. Nesse caso, o desconto está naturalmente associado a uma condição. Para
que fique claro, só haverá o desconto se o pagamento for realizado antecipadamente. Essa
sistemática na formulação dos preços representa elemento essencial para a base de cálculo
do imposto.
De qualquer forma, como o imposto recai sobre operações e negócios realizados por
comerciantes e prestadores de serviços submetidos, portanto, a aspectos mercadológicos,
a base de cálculo deve ser o valor que efetivamente representar o interesse realizado.
Alguns Estados optavam por predeterminar o valor de algumas transações,
desprezando o montante decorrente da operação. Apresentavam uma tabela
preestabelecida para algumas mercadorias; esse procedimento passou a ser conhecido
como pauta fiscal ou pauta de valores. O STJ afastou o uso indiscriminado desse
mecanismo, mesmo porque contraria a essência do imposto, que é a existência de uma
operação mercantil, submetida à alternância de valores.
Súmula 431. É ilegal a cobrança de ICMS com base no valor da mercadoria
submetido ao regime de pauta fiscal.

2.3.4 Não cumulatividade do ICMS


De toda forma, esse imposto possui critérios bem definidos na Constituição,
notadamente no art. 155, § 2º, devendo obedecer, obrigatoriamente, ao Princípio da Não
Cumulatividade (incisos I e II), na mesma forma do IPI. Trata-se de tentativa de se fazer
com que o ICMS incida sobre o valor agregado. Representa assim uma técnica para fazer
que o produto chegue menos oneroso ao consumidor final. Evita a incidência do imposto
em cascata, a cumulatividade, ou seja, o imposto incidindo sobre o imposto.
Já a disposição do art. 155, § 2º, I, CRFB/88, determina que esse critério não
cumulativo implica na compensação do que for devido em cada operação relativa à
circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas
anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal. No momento de adquirir
o produto, há o creditamento do valor do imposto pago quando da aquisição. O valor do
imposto irá incidir somente sobre o valor agregado à mercadoria.
Regulamentou o tema a Lei Complementar nº 87/96, especialmente pela previsão
inicial do art. 19/20:
Art. 19. O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido

Direito Tributário II
49

em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de


serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação
com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado.

Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é


assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto
anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada
de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a
destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o
recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou
de comunicação.

Interessante observar alguns aspectos. Em primeiro lugar, o fato de que existe ainda
sim o direito de crédito na hipótese de comerciantes adquirirem bens para o seu ativo
fixo, como explicitamente indicado pelo legislador nacional. Tal determinação – na
medida em que contrariou a posição de alguns estados – foi ainda corroborada pelos
tribunais nacionais;
ICMS. PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE. CREDITAMENTO. BENS
DESTINADOS AO CONSUMO OU AO ATIVO PERMANENTE. AQUISIÇÃO
POSTERIOR AO ADVENTO DA LEI COMPLEMENTAR 87/1996.
POSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. I – O art. 155, § 2º, I, da CF não
confere direito a crédito de ICMS quando o imposto é recolhido em razão
da aquisição de bens destinados ao consumo ou ao ativo permanente do
contribuinte. Por outro lado, o aludido dispositivo da Constituição não
impede a concessão desse direito por meio de legislação
infraconstitucional, desde que observadas as limitações constitucionais
para a previsão de benefícios fiscais relativos ao tributo. II – Esta Corte,
no julgamento da ADI 2.325-MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, reconheceu,
com base na redação original da Lei Complementar 87/1996, o direito ao
crédito de ICMS pago em razão de operações de aquisição de bens
destinados ao consumo ou ao ativo permanente do estabelecimento.
Precedentes (STF 2ª Turma, RE 541.166, Rel. Min. Ricardo Lewandowski,
j. em 15/2/2021, DJe 25/5/2012).

2.3.5 Seletividade do ICMS


De acordo com o inciso III do art. 155, § 2º, da Constituição, o ICMS poderá ser
seletivo em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços. A Seletividade do
ICMS permitirá ao Estado tributante realizar de certa forma sua justiça fiscal, adotando
alíquotas diferenciadas em razão da essência da mercadoria ou do serviço. Certamente,
tal permissivo constitucional permite a consideração sobre a necessidade ou não da figura,
admitindo a incidência em valores maiores às denominadas mercadorias e serviços
supérfluos.
Destaque-se, desde já, que, ao contrário do IPI, tal seletividade não constitui
elemento obrigatório do ICMS, estando expressa sua facultatividade, haja vista a
adoção do termo de que o imposto “poderá ser seletivo, em função da essencialidade
das mercadorias e serviços”. O caráter facultativo da norma contrapõe-se à
obrigatoriedade prevista para o IPI, sendo muito comum a abordagem disso em provas.

Direito Tributário II
50

Esta faculdade dada ao legislador estadual significa, na verdade, certa dose de


discricionariedade em identificar quais mercadorias ou serviços deveria ser tratada
como essenciais. Possivelmente esta definição variará entre os diversos estados e, no
liminar, poderá ser analisado pelo Poder Judiciário (desde que via adequada) no sentido
da correta aplicação do princípio constitucional num processo comparativo entre as
mercadorias e serviços.45

2.3.6 Alíquotas do ICMS


Por outro lado, se o legislador de 1988 deu todo aquele poder aos Estados, retirou
grande parte deste na definição das ALÍQUOTAS do imposto. Por se tratar de um tributo
que envolve a circulação entre Estados, atingindo diretamente assim a Federação como
um todo, determinou a Carta Constitucional que as alíquotas da imposição sofreriam
disciplina primeira pelo Senado Federal.
Nesse aspecto, preferiu a Lei Maior determinar que a fixação direta dos valores se
daria, num primeiro mecanismo de controle, pelos representantes dos Estados junto ao
Governo Federal. Sendo assim, os Senadores, em nome daquela qualidade tão marcante
do legislativo bicameral de repercussão federativa, possuem o poder de determinação
daquelas, tal qual disposto nos incisos IV e V do § 2º do art. 155, CRFB/88.
Dada sua importância, o ICMS tem suas alíquotas reguladas pelo Senado Federal, seja
fixando a aplicável às operações interestaduais ou os limites da alíquota interna, tudo na
forma dos incisos IV a VIII do § 2º. De qualquer forma, muito cuidado porque, na redação
original da Constituição, já existiam duas configurações para as alíquotas:
• alíquotas para as operações interestaduais estabelecidas pelo Senado
Federal (inc. IV), que somente será aplicada nas operações entre contribuintes
estabelecidos em Estados diferentes (inc. VII) e com a necessidade de
pagamento do diferencial (inc. VIII);
• alíquotas internas estabelecidas pela lei de cada um dos Estados e pelo
Distrito Federal, mas observando os limites fixados pelo Senado Federal (inc.
V), que será, via de regra, maior que a outra (inc. VI).

Relevante destacar que deverá ser adotada uma disciplina para as alíquotas
interestaduais e de exportação e outra distinta para as internas dos Estados. A primeira
será necessariamente fixada pelo Senado Federal, nos termos do inciso IV, enquanto que
no aspecto interno dar-se-á a faculdade do Senado estabelecer parâmetros máximos e
mínimos, de acordo com o inc V.
Das competências outorgadas ao Senado, é fundamental observar que a Carta
Constitucional determina que aquela casa legislativa “estabelecerá as alíquotas aplicáveis
às operações e prestações, interestaduais e de exportação”, ao passo que lhe é facultado
estabelecer alíquotas mínimas nas operações internas e fixar alíquotas máximas nas
mesmas operações para resolver conflito específico que envolva interesse de Estados.
Como regra geral, orientou o legislador constituinte que as alíquotas internas
deverão ser superiores às alíquotas incidentes sobre operações interestaduais,
como previsto no inciso VI daquele mesmo parágrafo. Ainda que não seja uma regra de

45
A orientação das Turmas que integram a Primeira Seção/STJ firmou-se no sentido de que a verificação da seletividade, conforme a
essencialidade do bem, depende de ampla e criteriosa análise das alíquotas do ICMS incidentes sobre as outras espécies de mercadorias, sendo
que tal verificação depende, necessariamente, de dilação probatória, o que é incompatível com a via do mandamus. (STJ – 2ª turma, AgRg no
AREsp 320070, rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. em 6.8.2013, DJe 13.8.2013)

Direito Tributário II
51

caráter absoluto, define a política estabelecida constitucionalmente para o imposto e seus


objetivos de estimular o comércio interestadual entre sujeitos das operações comerciais.
Veja-se que toda essa disciplina se dá no sentido de tentar que os Estados produtores
das mercadorias não restrinjam sua circulação em caráter interno, sendo importante para
toda a Federação que haja uma distribuição das mercadorias (principalmente) por todo o
território brasileiro. As demais regras sobre as alíquotas (incisos VII e VIII) também se
faziam nesse sentido. Tudo isso será controlado pelas Resoluções do Senado Federal, mas
fica patente que as alíquotas interestaduais serão estabelecidas com o objetivo de
privilegiar as regiões com menor desenvolvimento econômico.
Da redação constitucional original verificava-se que, para a aplicação da alíquota
interestadual, o destinatário deve ser contribuinte do imposto. Dessa situação estampada
no inciso VII, e somente nesse caso de operações interestaduais entre contribuintes do
imposto, o destinatário recolherá a diferença entre as alíquotas internas e interestaduais,
nos termos do inciso VIII do art. 155, § 2º, da CRFB/88. Esse é conhecido como o
“diferencial de alíquota”.
Acontece que com o incremento do comércio eletrônico – no qual os consumidores
passaram a diretamente comprar (com muitas facilidades) dos estabelecimentos
localizados em outros estados – este quadro mostrou-se insustentável. Apesar de prevista
a operação interestadual entre contribuintes e do diferencial de alíquota, o que cada vez
mais era ocorria era a compra direta somente gerando a incidência e recolhimento dos
valores ao estado da localização dos comerciantes.
Este quadro foi objeto de diversos questionamentos políticos, tanto que o Congresso
Nacional restou por aprovar a Emenda nº 87, em 2015, passando a ser determinado o
seguinte sobre as operações interestaduais:
Art. 155, §2º CRFB
VII - nas operações e prestações que destinem bens e serviços a
consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro
Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de
localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a
alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual;
a) (revogada);
b) (revogada);
VIII - na hipótese da alínea "a" do inciso anterior, caberá ao Estado da
localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a
alíquota interna e a interestadual;
VIII - a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à
diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso
VII será atribuída:
a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto; (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 87, de 2015)
b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto,
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 87, de 2015)

Entretanto, como tal nova disposição implicaria naturalmente numa reversão do


quadro de arrecadação do que estava sendo praticado até aquele momento, a
manifestação de poder constituinte reformador ainda modulou a produção dos efeitos das
novas regras com a inclusão da seguinte disposição no ADCT:
Art. 99. Para efeito do disposto no inciso VII do § 2º do art. 155, no caso

Direito Tributário II
52

de operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor


final não contribuinte localizado em outro Estado, o imposto
correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual será
partilhado entre os Estados de origem e de destino, na seguinte
proporção:
I - para o ano de 2015: 20% (vinte por cento) para o Estado de destino
e 80% (oitenta por cento) para o Estado de origem;
II - para o ano de 2016: 40% (quarenta por cento) para o Estado de
destino e 60% (sessenta por cento) para o Estado de origem;
III - para o ano de 2017: 60% (sessenta por cento) para o Estado de
destino e 40% (quarenta por cento) para o Estado de origem;
IV - para o ano de 2018: 80% (oitenta por cento) para o Estado de destino
e 20% (vinte por cento) para o Estado de origem;
V - a partir do ano de 2019: 100% (cem por cento) para o Estado de
destino.

2.3.7 Benefícios fiscais no ICMS


Daquela discriminação do inciso XII destaca-se situação importante quanto às isenções
do imposto (alínea g) que serão concedidas por convênio dos Estados e do Distrito
Federal, escapando aos rigores da necessidade de lei específica do art. 150, § 6º,
CRFB/88. Já antes da Constituição de 1988 existia tal necessidade, sendo editada a Lei
Complementar nº 24, de 1975. Segundo tal norma, é estabelecida necessidade de
Convênios entre os Estados para concessão de benefícios fiscais relativos ao ICMS (art. 1º,
LC nº 24).
Dispõe sobre os convênios para a concessão de isenções do imposto sobre
operações relativas à circulação de mercadorias, e dá outras providências.

Não obstante o ICMS ser de competência dos Estados, essa competência é limitada,
principalmente no que tange aos benefícios fiscais. Devem os Estados conceder ou
revogar isenções por meio de convênios entre eles estabelecidos. Trata-se de pré-
requisito para a validade de benefícios por qualquer estado, somente sendo válida a
disposição por determinada unidade da federação se previamente prevista por tal
convênio deliberativo.
O caráter federativo do ICMS impõe, dessa forma, regramento peculiar quanto ao
estabelecimento de isenções ou de benefícios fiscais. Considerando que a outorga de
benesses por um ente federativo potencialmente impacta diretamente nas finanças de seus
pares, qualquer medida nesse sentido só tem valia se aprovada por unanimidade por todos
os estados-membros e pelo Distrito Federal em órgão denominado Conselho Nacional de
Política Fazendária (CONFAZ), conforme previsto no art. 155, § 2º, XII, da Constituição e
na Lei Complementar nº 24.
A exigência de consenso entre todos os entes federativos competentes do ICMS quanto
à concessão de isenções,46 incentivos e benefícios fiscais47 torna praticamente inviáveis
tais políticas e inviabiliza a pretensão dos estados-membros de adotar tais medidas. Por
isso, hoje é prática comum a previsão, grosseiramente inconstitucional, por diversos entes

46
STF – Pleno, ADI 2345, rel. Cezar Peluso, j. em 30.6.2011, DJe 4.8.2011.
47
STF – Pleno, ADI 3794, rel. Min. Joaquim Barbosa, j. em 1/6/2011, DJe 29/7/2011.

Direito Tributário II
53

federativos, de benefícios fiscais concedidos de forma unilateral. O STF tem repelido de


forma veemente a concessão irregular destes benefícios, declarando a
inconstitucionalidade por vício formal no caso de falta de deliberação anterior.
Mas, é imperioso ainda destacar que o convênio é ato do poder executivo, sem
qualquer crivo ou referendo do legislativo dos Estados. Além disso, os Convênios são
ratificados pelos estados por Decreto do próprio Governador de cada estado, havendo
algumas críticas contra a concessão de isenção por convênio e não por lei. De fato,
representa hipótese constitucional de exceção ao sentido estrito da legalidade.

2.4 Imposto sobre Serviços de qualquer natureza – ISS ou ISSQN


A função do imposto sobre serviços – ISS é também predominantemente fiscal. Sua
função precípua é arrecadar recursos para os cofres públicos em virtude da manifestação
de riqueza exteriorizada na operação de serviços, sendo mais um dos impostos incidentes
sobre o consumo.
Ainda nos aspectos vestibulares, o ISS pode ser classificado como tributo direto ou
indireto (possibilidade de repasse do custo a terceiros) conforme as circunstâncias fáticas
de cada caso. O próprio STJ48 entende que o ISS é espécie tributária que admite essa
dicotomia como tributo direto ou indireto, a depender do evento concreto. Esse aspecto
será fundamental e relevante para os fins de eventual direito de repetição de indébito.
A Constituição atribuiu aos Municípios (e ao Distrito Federal) a competência para criar
o Imposto Sobre Serviços, ISS (ou ISSQN) a incidir sobre a prestação de serviços listados
em lei complementar, excluídos os serviços onerados pelo ICMS, quais sejam, os serviços
de transporte intermunicipal e interestadual e os serviços de comunicação.
Portanto, já decorrente do plano constitucional, o ISS é considerado imposto “residual”
no campo da incidência dos fatos econômicos, somente podendo tributar as atividades que
não sejam diretamente conferidas ao plano estadual. Dessa forma, no caso concreto de
um serviço, primeiro deve ser examinado se incide o ICMS ou alguma das operações
absorvidas pelo IOF. Se não estiver na abrangência de nenhum dos dois impostos, somente
aí será possível verificar o abarcamento do imposto municipal.

2.4.1 Aspecto material


Como anotado nas considerações do ICMS, a noção de serviço corresponde ao negócio
jurídico caracterizado pela assunção de uma obrigação de fazer por um dos contratantes.
Pressupõe a existência de um negócio jurídico.
O fato gerador é a prestação e execução de serviços, desde que estejam previstos em
listagem taxativa (numerus clausus) em lei complementar do Congresso Nacional,
conforme explícita determinação dada pelo art. 156, III, CRFB/88.
Não apenas por conta daquele artigo, mas por força do disposto no art. 146 da
Constituição, cediço que cabe à lei complementar dispor sobre normas gerais em matéria
tributária e, em relação aos impostos, definir sua base de cálculo, fato gerador e
contribuintes. Esse papel já era desenhado pelo CTN em seu art. 71. No entanto, essas
disposições foram revogadas com o advento do Decreto-lei nº 406, de 1968, que também
já teve suas disposições revogadas pela superveniência da Lei Complementar nº 116, de
2003, que consolidou a listagem de serviços submetidos ao imposto municipal,

48
A Primeira Seção do STJ definiu, sob o regime do art. 543-C do CPC, que o ISS é espécie tributária que, a depender do caso concreto,
pode se caracterizar como tributo direto ou indireto (REsp 1.131.476/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, DJe 1.2.2010).

Direito Tributário II
54

recentemente adicionada em alguns serviços pela Lei Complementar nº 157, de 29 de


dezembro de 2016.
Assim, teremos a verificação da ocorrência do fato gerador do ISS com a prestação de
serviços constantes da lista presente na LC nº 116/03, ainda que estes não se constituam
como atividade preponderante do prestador.
Naturalmente o ISS não incide sobre os serviços de transporte intermunicipal e
interestadual e de comunicação, pois estes estão compreendidos na competência dos
Estados (CRFB/88, art. 155, II), abrangidos, portanto, pelo ICMS.
Além desse limite constitucional, a própria Lei Complementar cuida de situações que,
por óbvio, não terão a incidência desse imposto municipal, como, por exemplo, a prestação
de serviços em relação de emprego, dos trabalhadores avulsos, dos diretores e membros de
conselho consultivo ou fiscal de sociedades e fundações, sócios-gerentes e dos gerentes-
delegados etc. (art. 2º, LC nº 116/03).
Observada a Lei Complementar nº 116, de 2003, inclusive quanto à lista de serviços,
os Municípios podem instituir o ISS, descrevendo seu fato gerador em lei ordinária
municipal.
Em razão de todo esse engessamento e da tipicidade fechada adotada no Direito
Brasileiro, o STJ entendeu que a lista de serviços anexa à LC nº 116/03 é taxativa. No
entanto, como a lista é pródiga em termos indefinidos como congêneres, semelhantes,
similares e qualquer espécie, o próprio também entendeu ser possível a interpretação
extensiva ou por analogia, desde que mantida a coerência e estrutura da listagem.49 Tal
compreensão foi determinante para abranger novas modalidades de execução que não
seriam conhecidas pelo legislador, como o ocorrido com o avanço da tecnologia e as
inovações setoriais. Ilustra-se, nesse sentido, com os serviços bancários.
Súmula 424, STJ. É legítima a incidência de ISS sobre os serviços
bancários congêneres da lista anexa ao DL nº 406/1968 e à LC nº
56/1987.

Entretanto, nem o legislador complementar pode qualquer coisa nessa definição de


serviços. Naturalmente, deve estar apegado ao sentido de serviços dados pela lei civil,
sendo defeso que trate como tal outras formas de contratação que não compreendidas no
sentido típico daquele negócio jurídico. A terminologia constitucional do Imposto sobre
Serviços revela o objeto da tributação.
Tal assertiva lógica foi decisiva no caso da locação de bens. A locação é uma operação
que tem por objeto uma prestação de dar ou permitir o uso de coisa, ainda que por tempo
determinado. Fato é que tal locação não constitui prestação de serviços, mesmo porque é
tratada como contrato típico distinto no Código Civil. Conflita com a Lei Maior dispositivo
que imponha o tributo considerado contrato de locação de bem móvel. Em Direito, os
institutos, as expressões e os vocábulos têm sentido próprio, descabendo confundir a
locação de serviços com a de móveis, práticas diversas regidas pelo Código Civil, cujas
definições são de observância inafastável. Dessa forma, não confundida a locação com a
prestação de serviços, sobre aquela não ocorre a incidência do ISS. O tema foi encerrado
com a edição de súmula vinculante do STF:
Súmula Vinculante 31. É inconstitucional a incidência do Imposto sobre

49
A jurisprudência do STJ pacificou-se no sentido de reconhecer que a lista de serviços anexa ao Decreto-lei 406/1968, para efeito de
incidência de ISS sobre serviços bancários, é taxativa, mas admite leitura extensiva de cada item a fim de enquadrar serviços idênticos aos
expressamente previstos (STJ – 2ª Turma, AgRg no REsp nº 1286193, rel. Min. Herman Benjamin, j. em 2/8/2012, DJe 23/8/2012).

Direito Tributário II
55

Serviços de Qualquer Natureza – ISS sobre operações de locação de bens


móveis.

2.4.2 Aspecto quantitativo


A base de cálculo é o valor do serviço, conforme explicitado no art. 7º da Lei
Complementar nº 116. Entretanto, em algumas prestações de serviços específicas, em que
a composição de preço possui elementos de posterior repasse a terceiros, têm se verificado
decisões e interpretações com a admissão da retirada de tais componentes da base de
cálculo do serviço. Ilustra tal cenário a situação das empresas prestadoras de planos de
saúde, em que as Turmas do STJ ratificaram jurisprudência de que a base de cálculo do
ISS sobre planos de saúde é o preço pago pelos consumidores, diminuído dos repasses
feitos pela contribuinte aos demais prestadores de serviços de saúde (hospitais, clínicas,
laboratórios, médicos etc.).50
Já as alíquotas serão dadas pela lei de cada município. Sobre a competência da lei
complementar em matéria de ISS, vale ainda observar o contido no art. 156, § 3º, que
determina a existência de alíquotas máximas e mínimas, a forma e as condições como
isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados e a previsão de
eventual não incidência do imposto sobre serviços destinados ao exterior.
Tal dispositivo resulta de muita “guerra fiscal” havida entre os Municípios em relação
a esse Imposto. A redação original da Constituição já prescrevia a determinação de um
patamar máximo, mas a determinação de alíquota mínima veio constitucionalizada pela
Emenda nº 37, de 2002. Naquele momento, além de reforma do inciso I do art. 156, § 3º,
houve também a previsão de norma transitória até que fosse elaborada a Lei
Complementar, não podendo qualquer Município tributar em patamar inferior a 2%,
consoante art. 88 do ADCT. E tais disposições foram recentemente regulamentadas pela
Lei Complementar nº 157, de 2016, que adicionou a seguinte disposição:
“Art. 8º-A. A alíquota mínima do Imposto sobre Serviços de Qualquer
Natureza é de 2% (dois por cento).
§ 1ºO imposto não será objeto de concessão de isenções, incentivos ou
benefícios tributários ou financeiros, inclusive de redução de base de
cálculo ou de crédito presumido ou outorgado, ou sob qualquer outra
forma que resulte, direta ou indiretamente, em carga tributária menor
que a decorrente da aplicação da alíquota mínima estabelecida no caput,
exceto para os serviços a que se referem os subitens 7.02, 7.05 e 16.01
da lista anexa a esta Lei Complementar.
§ 2º É nula a lei ou o ato do Município ou do Distrito Federal que não
respeite as disposições relativas à alíquota mínima previstas neste artigo
no caso de serviço prestado a tomador ou intermediário localizado em
Município diverso daquele onde está localizado o prestador do serviço.
§ 3º A nulidade a que se refere o §2ºdeste artigo gera, para o prestador
do serviço, perante o Município ou o Distrito Federal que não respeitar as
disposições deste artigo, o direito à restituição do valor efetivamente pago
do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza calculado sob a égide
da lei nula.

50
STJ – 2ª Turma, REsp 1237312, rel. Min. Herman Benjamin, j. em 20.10.2011, DJe 24.10.2011.

Direito Tributário II
56

2.4.3 Aspecto espacial


A regra definida pelo legislador nacional é a verificação do fato gerador no local de
estabelecimento do prestador, com algumas ressalvas. Assim define a norma
complementar:
Art. 3º O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do
estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do
domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII,
quando o imposto será devido no local: [...]

Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça tem invertido tal determinação, privilegiando a


verificação do fato gerador em si, como se verifica no seguinte aresto:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ISS. COMPETÊNCIA. LOCAL DA
PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. QUESTÃO PACIFICADA PELA PRIMEIRA
SEÇÃO. RESP 1.117.121/SP. APLICAÇÃO DO ART. 543-C DO CPC.1. A
Primeira Seção desta Corte, consolidou o entendimento no sentido
de que o ISS deve ser recolhido no local da efetiva prestação de
serviços, pois é nesse local que se verifica o fato gerador (nos
termos do art. 12, letra b, do DL nº 406/1968 e art. 3º, da LC nº
116/2003). 2. In casu, a empresa encontra-se sediada em Belo Horizonte,
prestando serviços de manutenção e aluguel de maquinaria e
equipamentos para indústrias em diversos outros Municípios, dentre eles
a MBR, em sua unidade denominada Mina do Pico, em Itabirito. Logo, o
fato gerador ocorreu no Município de Itabirito e, assim, a ele cabe a
cobrança do tributo. Agravo regimental improvido.51

A confusão persiste na vida prática. Após a edição da Lei Complementar nº 116/03, a


regra explícita de competência passou a ser o local do estabelecimento prestador, nos
termos dos seus arts. 3º e 4º, salvo para os serviços ali indicados que permaneceriam
pagando no local da execução. Para estes, a posição do STJ é firme no sentido de dizer
que é competente para exigir o ISS o município em cujo território a prestação dos serviços
ocorreu. Mas, se não estiver naquelas hipóteses expressamente tratadas pela lei, deverá
ser recolhido ao munícipio do estabelecimento do prestador.
Mais recentemente a Lei Complementar nº 157, do final do ano de 2016, pretendeu
incluir novas atividades que deveriam ser identificadas no local da prestação, modificando
as referências dos incisos do art. 3º (além de incluir novos incisos), mas a questão
rapidamente se judicializou no STF com a edição de liminar para suspender a aplicação dos
dispositivos da lei, com decisão monocrática do Ministro relator da ADI nº 5835.

2.4.4 Aspecto pessoal


No polo passivo, não há dúvidas. O contribuinte é a empresa ou profissional autônomo
prestador do serviço, com ou sem estabelecimento fixo. Tudo isso sem prejuízo da
possibilidade de fixação de responsabilidade tributária aos tomadores do serviço, com a lei
determinando o dever de retenção na fonte, por ocasião da remuneração dos serviços
realizados ou contratados. Como admite o art. 6º da LC nº 116, de 2003, os Municípios e
o Distrito Federal, mediante lei, poderão atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo

51
STJ – AgRg no Ag 1318064/MG, Rel. Ministro Humberto Martins, 2ª Turma, j. em 5/4/2011, DJe 13/4/2011.

Direito Tributário II
57

crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação,


excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo
do cumprimento total ou parcial da referida obrigação, inclusive no que se refere à multa
e aos acréscimos legais.
Já no polo ativo a questão não é simples em razão da verificação do local da ocorrência
do fato gerador. Como se verifica nas normas nacionais do imposto (antiga previsão no
art. 12 do Decreto-lei nº 406/68 e atual determinação do art. 3º da LC nº 116/03), o
município competente para a exigência do ISS é, como regra, o do local do estabelecimento
do prestador. Segundo padrão da própria norma legal, em algumas hipóteses, apenas,
seria dado no local da efetiva prestação do serviço.
Por entendimento pacificado do STJ (entendimento contra legem para alguns), será o
local da efetiva prestação dos serviços, privilegiando os aspectos decorrentes da análise
do fato gerador do imposto.

2.4.5 Aspecto temporal


De toda a base extraída dos demais elementos do imposto, resta evidente que o fato
gerador é a própria execução do serviço, compreendido no seu aperfeiçoamento segundo
as regras típicas da lei civil e dos negócios jurídicos. Ainda que na prática seja comum a
associação deste à circunstância da emissão da nota correspondente, há de ser entendido
o fato gerador independentemente desta. Mesmo porque a emissão do documento fiscal
representa o cumprimento de obrigação acessória, não se confundindo,
consequentemente, com as verificações da obrigação principal.
Igualmente, não se confunde o momento do fato gerador com o tempo do efetivo
pagamento do serviço. Esse adimplemento contratual entre as partes não afasta a
existência em si da atividade, até porque é perfeitamente razoável a pactuação de condição
de pagamento futuro.

2.5 O Simples
A redação original da Constituição de 1988 tratava da micro e pequena empresa dentre
as formas de intervenção do Estado no domínio econômico, prevendo no art. 179 –
portanto, fora do capítulo tributário –, que “a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim
definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação
de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela
eliminação ou redução destas por meio de lei”. Este comando era orientado pelo princípio
geral de tratamento favorecido contido no art. 170, IX da própria norma constitucional.
Todavia, a estipulação inicial não diligenciou para qualquer uniformização deste
tratamento entre os diversos níveis de governo. No exercício desta previsão do legislador
constituinte originário, o governo federal editou a Lei nº 9.317, de 5 de dezembro de 1996,
instituindo o Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições – Simples. Tal
instituto não significava a existência de um tributo novo, nem a supressão dos existentes.
Mas, abraçando alguns tributos federais, simplifica-lhes os procedimentos, criando um
mecanismo de pagamento unificado para as microempresas e empresas de pequeno porte.
Naturalmente, não cuidava dos tributos estaduais ou municipais, mas apenas admitia
que, mediante convênio, poderia abranger os tributos devidos aos Estados e aos
Municípios. A maioria dos demais entes políticos não aderiu ao Simples e instituiu regimes
próprios de tributação, o que acabou resultando em distintos tratamentos tributários

Direito Tributário II
58

estaduais em todo o Brasil.


Alguns poucos municípios aderiram ao Simples federal, mas a verdade é que a quase
totalidade não ofereceu qualquer benefício para as microempresas e empresas de pequeno
porte estabelecidas em seus territórios. Mas, o sucesso do SIMPLES federal, estimulou sua
criação em 21 Estados da Federação, onde foram criados sistemas simplificados para
tributos estaduais no âmbito de suas competências. Entretanto, os limites de
enquadramento das empresas e as alíquotas de recolhimento são muitos diferenciados
entres os Estados da Federação.
A solução para uma uniformização começou a ser definida pela Emenda Constitucional
nº 42, de dezembro de 2003, que trouxe a boa experiência do Simples federal para dentro
do capítulo do Sistema Tributário Nacional, incorporando ao artigo 146 a alínea ‘d’ no inciso
III e seu parágrafo único. Além de aumentar o rol de matérias a serem uniformizadas entre
as unidades federativas pelas normas gerais, foram ali estabelecidos os pilares
constitucionais de um novo modelo.
Como afirmamos antes, o princípio de uniformização é evidente, tanto assim que, além
da previsão das normas no art. 146, houve ainda a determinação para o encerramento das
normas próprias de cada um dos entes políticos com a cessação da validade das normas
federais, estaduais, distritais e municipais sobre o tratamento da micro e pequena
empresa.
Art. 146. Cabe à lei complementar: (...)
III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária,
especialmente sobre: (...)
d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as
microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes
especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das
contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a
que se refere o art. 239.
Parágrafo único. A lei complementar de que trata o inciso III, d, também
poderá instituir um regime único de arrecadação dos impostos e
contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
observado que:
I – será opcional para o contribuinte;
II – poderão ser estabelecidas condições de enquadramento diferenciadas
por Estado;
III – o recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da
parcela de recursos pertencentes aos respectivos entes federados será
imediata, vedada qualquer retenção ou condicionamento;
IV – a arrecadação, a fiscalização e a cobrança poderão ser
compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único
de contribuintes.

E para determinar aquele encerramento foi ainda incluído o art. 94 no ADCT


Art. 94. Os regimes especiais de tributação para microempresas e
empresas de pequeno porte próprios da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios cessarão a partir da entrada em vigor do regime
previsto no art. 146, III, d, da Constituição.

Direito Tributário II
59

Mas do texto constitucional, notadamente por aquela inclusão realizada no art. 146,
extrai-se a intenção de que o novo modelo seja baseado em alguns pilares bem
importantes:
1) opcional para o contribuinte;
2) condições de enquadramento diferenciadas por Estado;
3) unificar e centralizar o recolhimento dos tributos, com distribuição imediata da
parcela de recursos pertencentes aos respectivos entes federados, sem qualquer
retenção ou condicionamento;
4) permitir que os entes federados compartilhem a arrecadação, a fiscalização e a
cobrança, adotando o cadastro nacional único de contribuintes.

Em razão de todas estas previsões constitucionais, foi editada a Lei Complementar nº


123, de 14 de dezembro de 2006, autodenominado Estatuto Nacional da Microempresa e
Empresa de Pequeno Porte, com especial inovação da parte tributária no que tange à
instituição do Simples Nacional. Em 14 de agosto de 2007, foi sancionada a Lei
Complementar nº 127 com estas pequenas modificações, seguida de maior reforma em
dezembro de 2008, com a Lei Complementar nº 128 e outra de pequeno efeito pela Lei
Complementar nº 133, de dezembro de 2009. Ainda sobre o sistema houve Lei
Complementar nº 139/2011 e a Lei Complementar nº 147/2014 e, mais recentemente, a
Lei Complementar nº 155, de 2016.
Em primeiro lugar, cumpre observar do próprio texto da Lei Geral que se trata de
norma geral (art. 1º), editada, portanto, no âmbito da competência concorrente dos entes
federativos, não pretendendo ou podendo esgotar todas as matérias. Ainda que tenha
disciplinado inúmeros aspectos não está afastada a possibilidade de edição de normas
estaduais suplementares, em consonância com o art. 24, da Constituição.
Ademais, apesar de ter sido bastante celebrada quanto aos aspectos tributários, a LC
nº 123, de 2006, cuida de vários aspectos predominantes relativos à Microempresa – ME
e Empresa de Pequeno Porte – EPP:
• regime único de arrecadação dos impostos e contribuições de todas as unidades
federativas;
• cumprimento de obrigações trabalhistas e previdenciárias;
• ao acesso a crédito e ao mercado;
• ao cadastro nacional único de contribuintes a que se refere o inciso IV do parágrafo
único do art. 146, in fine, da Constituição Federal.

Como a lei cuida de diferentes aspectos – sendo certo que aqui nos concentramos na
parte tributária – e estes demandam inúmeras medidas de regulamentação, atualização e
disciplina de temas envolvendo interesses da União, dos Estados, dos Municípios e da
sociedade civil, foi também previsto a criação de um Comitê Gestor que terá várias
competências definidas nas matérias definidas na Lei Complementar.
Art. 2º O tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às
microempresas e empresas de pequeno porte de que trata o art. 1o desta
Lei Complementar será gerido pelas instâncias a seguir especificadas:
I – Comitê Gestor do Simples Nacional, vinculado ao Ministério da
Fazenda, composto por 4 (quatro) representantes da Secretaria da
Receita Federal do Brasil, como representantes da União, 2 (dois) dos
Estados e do Distrito Federal e 2 (dois) dos Municípios, para tratar dos
aspectos tributários; e

Direito Tributário II
60

II – Fórum Permanente das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte,


com a participação dos órgãos federais competentes e das entidades
vinculadas ao setor, para tratar dos demais aspectos.
III - Comitê para Gestão da Rede Nacional para Simplificação do Registro
e da Legalização de Empresas e Negócios - CGSIM, vinculado à Secretaria
da Micro e Pequena Empresa da Presidência da República, composto por
representantes da União, dos Estados e do Distrito Federal, dos Municípios
e demais órgãos de apoio e de registro empresarial, na forma definida
pelo Poder Executivo, para tratar do processo de registro e de legalização
de empresários e de pessoas jurídicas. (Redação pela Lei Complementar
nº 147, de 2014)

No mais, a redação original da Lei Complementar nº 123 definindo como


microempresas a pessoa com receita bruta anual não superior a R$ 240.000,00 (art. 3º,
I) e como de pequeno porte aqueles cuja receita ultrapasse a tal montante mas não exceda
a R$ 2.400.000,00 no exercício financeiro (art. 3º, II). Posteriormente, tais montantes
foram revistos para constar nas seguintes montas atuais:
Art. 3º Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se
microempresas ou empresas de pequeno porte, a sociedade empresária,
a sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e
o empresário a que se refere o art. 966 da Lei n. 10.406, de 10 de janeiro
de 2002 (Código Civil), devidamente registrados no Registro de Empresas
Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso,
desde que:
I - no caso da microempresa, aufira, em cada ano-calendário, receita
bruta igual ou inferior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais);
e
II - no caso da empresa de pequeno porte, aufira, em cada ano-
calendário, receita bruta superior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta
mil reais) e igual ou inferior a R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos
mil reais).

E mais recentemente o patamar foi elevado, tendo a Lei Complementar nº 155 (neste
ponto com efeitos a partir de 1º de janeiro de 2018) dado a seguinte redação:
II - no caso de empresa de pequeno porte, aufira, em cada ano-
calendário, receita bruta superior a R$ 360.000,00 (trezentos e
sessenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 4.800.000,00
(quatro milhões e oitocentos mil reais).

Definidos tais patamares, estabelece ainda a norma quais pessoas jurídicas não estão
inclusas no regime diferenciado (art. 3º, § 4º) e como receita bruta o produto da venda
de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o
resultado nas operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os
descontos incondicionais concedidos (art. 3º, § 1º).
Art. 3º. § 1º Considera-se receita bruta, para fins do disposto no caput
deste artigo, o produto da venda de bens e serviços nas operações de
conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações
em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os descontos

Direito Tributário II
61

incondicionais concedidos.

Portanto, definindo aquele campo de abrangência, estipula o novo estatuto – no § 4º


do art. 3º – que a empresa não será enquadrada no tratamento diferenciado e favorecido
previsto se possuir qualquer uma das seguintes características:
I - de cujo capital participe outra pessoa jurídica;
II - que seja filial, sucursal, agência ou representação, no País, de pessoa jurídica com
sede no exterior;
III - de cujo capital participe pessoa física que seja inscrita como empresário ou seja
sócia de outra empresa que receba tratamento jurídico diferenciado nos termos
desta Lei Complementar, desde que a receita bruta global ultrapasse o limite de
que trata o inciso II do caput deste artigo;
IV - cujo titular ou sócio participe com mais de 10% (dez por cento) do capital de outra
empresa não beneficiada por esta Lei Complementar, desde que a receita bruta
global ultrapasse o limite de que trata o inciso II do caput deste artigo;
V - cujo sócio ou titular seja administrador ou equiparado de outra pessoa jurídica com
fins lucrativos, desde que a receita bruta global ultrapasse o limite de que trata o
inciso II do caput deste artigo;
VI - constituída sob a forma de cooperativas, salvo as de consumo;
VII - que participe do capital de outra pessoa jurídica;
VIII - que exerça atividade de banco comercial, de investimentos e de
desenvolvimento, de caixa econômica, de sociedade de crédito, financiamento e
investimento ou de crédito imobiliário, de corretora ou de distribuidora de títulos,
valores mobiliários e câmbio, de empresa de arrendamento mercantil, de seguros
privados e de capitalização ou de previdência complementar;
IX - resultante ou remanescente de cisão ou qualquer outra forma de
desmembramento de pessoa jurídica que tenha ocorrido em um dos 5 (cinco) anos-
calendário anteriores;
X - constituída sob a forma de sociedade por ações.
XI - cujos titulares ou sócios guardem, cumulativamente, com o contratante do
serviço, relação de pessoalidade, subordinação e habitualidade.

Mas, um dos principais pontos reside nos tributos abrangidos ou não pelo recolhimento
simplificado, sendo extraído do art. 13 e seu § 1º a seguinte visão:

Direito Tributário II
62

INCLUÍDOS NÃO INCLUÍDOS NO RECOLHIMENTO ÚNICO


I – Imposto sobre a Renda I – IOF;
da Pessoa Jurídica - IRPJ; II – II;
II – Imposto sobre III –IE;
Produtos Industrializados IV – ITR;
- IPI; V – IR, em aplicações de renda fixa ou variável;
III – Contribuição Social VI – IR, nos ganhos de capital;
sobre o Lucro Líquido - VII – CPMF;
CSLL; VIII – FGTS;
IV – Contribuição para o IX – Contribuição da Seguridade Social, do trabalhador;
Financiamento da X – Contribuição da Seguridade Social, do empresário;
Seguri dade Social - XI – IR rela tivo aos pagamentos ou créditos efetuados
Cofins; pela pessoa jurídica a pessoas físicas;
V – Contribuição para o XII – PIS/Pasep, Cofins e IPI na importação;
PIS/Pasep; XIII – ICMS devido:
VI – Contribuição Patronal a) nas operações de substituição tributária;
Previdenciária, a cargo b) por terceiro, a que o contribuinte se ache obrigado;
da pessoa jurídica, de que c) na en trada, no território do Estado ou do Distrito
trata o art. 22 da Lei no Federal, de petróleo, inclusive lubrificantes e
8.212, de 24 de julho de combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, bem
1991; como energia elétrica, quando não destinados à
VII – Imposto sobre comercialização ou industrialização;
Operações Relativas à d) por ocasião do desembar aço aduaneiro;
Circulação de e) na aquisição ou manutenção em estoque de
Mercadorias e sobre mercadoria desacobertada de documento fiscal;
Prestações de Serviços de f) na operação ou prestação desacobertada de
Transporte Interestadual documento fiscal;
e Intermunicipal e de g) nas operações com mercadorias sujeitas ao regime de
Comunicação - ICMS; antecipação do recolhimento do im posto,
VIII – Imposto sobre h) nas aquisições em outros Estados e no Distrito
Serviços de Qualquer Federal de bens, relativo à diferença entre a alíquota interna
Natureza - ISS. e a interestadual;
XIV – ISS devido:
a) nos serviços em substituição tributária ou retenção na
fonte;
b) na importação de serviços;
XV - demais tributos.

As microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional serão


dispensadas do pagamento das demais contribuições instituídas pela União, inclusive as
destinadas às entidades privadas de serviço social e de formação profissional vinculadas
ao sistema sindical e demais entidades de serviço social autônomo. A dispensa prevista no
art. 13, § 3º alcança o salário-educação e as contribuições destinadas ao Sesc, Sesi, Senai,
Senac, Sebrae e seus congêneres.
Ainda para disciplinar todas as questões tributárias sobre a atividade da ME e da EPP
e seus empresários, o artigo 14 da LC nº 123/2006 isentou do Imposto de Renda, na fonte
e na declaração de ajuste da pessoa física, os valores efetivamente pagos ou distribuídos
a título de lucros, aos sócios ou titular de microempresa ou empresa de pequeno porte
optante pelo Simples Nacional, sem atingir as remunerações que corresponderem a pró-
labore, aluguéis ou serviços prestados.
Art. 14. Consideram-se isentos do imposto de renda, na fonte e na
declaração de ajuste do beneficiário, os valores efetivamente pagos ou
distribuídos ao titular ou sócio da microempresa ou empresa de pequeno
porte optante pelo Simples Nacional, salvo os que corresponderem a pró-
labore, aluguéis ou serviços prestados.
§ 1º A isenção de que trata o caput deste artigo fica limitada ao valor

Direito Tributário II
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resultante da aplicação dos percentuais de que trata o art. 15 da Lei nº


9.249, de 26 de dezembro de 1995, sobre a receita bruta mensal, no caso
de antecipação de fonte, ou da receita bruta total anual, tratando-se de
declaração de ajuste, subtraído do valor devido na forma do Simples
Nacional no período.
§ 2º O disposto no § 1º deste artigo não se aplica na hipótese de a pessoa
jurídica manter escrituração contábil e evidenciar lucro superior àquele
limite.

Seguindo a determinação constitucional, reafirma a Lei Geral que o ingresso no sistema


será facultativo, mediante opção do interessado, de caráter irretratável para aquele ano-
calendário (art. 16), cabendo ainda a regulamentação para tal formalização pelo Comitê
Gestor. As microempresas e empresas de pequeno porte que já estavam inscritas no
Simples da Lei nº 9.317, de 1996, serão automaticamente acolhidas pelo Simples Nacional,
exceto se estiverem impedidas de optar por alguma vedação imposta pelo novo estatuto.
Art. 16. A opção pelo Simples Nacional da pessoa jurídica enquadrada na
condição de microempresa e empresa de pequeno porte dar-se-á na
forma a ser estabelecida em ato do Comitê Gestor, sendo irretratável para
todo o ano-calendário.
§ 1º Para efeito de enquadramento no Simples Nacional, considerar-se-á
microempresa ou empresa de pequeno porte aquela cuja receita bruta no
ano-calendário anterior ao da opção esteja compreendida dentro dos
limites previstos no art. 3º desta Lei Complementar.
§ 2º A opção de que trata o caput deste artigo deverá ser realizada no
mês de janeiro, até o seu último dia útil, produzindo efeitos a partir do
primeiro dia do ano-calendário da opção, ressalvado o disposto no § 3º
deste artigo.
§ 3º A opção produzirá efeitos a partir da data do início de atividade,
desde que exercida nos termos, prazo e condições a serem estabelecidos
no ato do Comitê Gestor a que se refere o caput deste artigo.
§ 4º Serão consideradas inscritas no Simples Nacional, em 1º de julho de
2007, as microempresas e empresas de pequeno porte regularmente
optantes pelo regime tributário de que trata a Lei nº 9.317, de 5 de
dezembro de 1996, salvo as que estiverem impedidas de optar por
alguma vedação imposta por esta Lei Complementar. (redação dada pela
LC nº 127, de 14 de agosto de 2007)
§ 5º O Comitê Gestor regulamentará a opção automática prevista no § 4º
deste artigo.
§ 6º O indeferimento da opção pelo Simples Nacional será formalizado
mediante ato da Administração Tributária segundo regulamentação do
Comitê Gestor.

Interessante observar que, por inclusão de regra posterior àquele art. 16, a opção
mencionada implicará na aceitação de utilização do sistema de comunicação eletrônica no
âmbito da administração tributária:
§ 1º-A. A opção pelo Simples Nacional implica aceitação de sistema de
comunicação eletrônica, destinado, dentre outras finalidades, a:
I - cientificar o sujeito passivo de quaisquer tipos de atos administrativos,

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64

incluídos os relativos ao indeferimento de opção, à exclusão do regime e


a ações fiscais;
II - encaminhar notificações e intimações; e
III - expedir avisos em geral.
§1º-B. O sistema de comunicação eletrônica de que trata o § 1º-A será
regulamentado pelo CGSN, observando-se o seguinte:
I - as comunicações serão feitas, por meio eletrônico, em portal próprio,
dispensando-se a sua publicação no Diário Oficial e o envio por via postal;
II - a comunicação feita na forma prevista no caput será considerada
pessoal para todos os efeitos legais;
III - a ciência por meio do sistema de que trata o § 1º-A com utilização
de certificação digital ou de código de acesso possuirá os requisitos de
validade;
IV - considerar-se-á realizada a comunicação no dia em que o sujeito
passivo efetivar a consulta eletrônica ao teor da comunicação; e
V - na hipótese do inciso IV, nos casos em que a consulta se dê em dia
não útil, a comunicação será considerada como realizada no primeiro dia
útil seguinte.

Independente dos montantes de faturamento, o art. 17 da Lei Complementar no 123,


de 2006, estabeleceu longa (e polêmica) lista de atividades que não poderão ingressar no
Simples Nacional, (com várias modificações e fruto de debates nacionais), a saber:
Art. 17. Não poderão recolher os impostos e contribuições na forma do
Simples Nacional a microempresa ou a empresa de pequeno porte:
I - que explore atividade de prestação cumulativa e contínua de serviços
de assessoria creditícia, gestão de crédito, seleção e riscos, administração
de contas a pagar e a receber, gerenciamento de ativos (asset
management), compras de direitos creditórios resultantes de vendas
mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring);
II - que tenha sócio domiciliado no exterior;
III - de cujo capital participe entidade da administração pública, direta ou
indireta, federal, estadual ou municipal;
IV - (REVOGADO)
V - que possua débito com o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS,
ou com as Fazendas Públicas Federal, Estadual ou Municipal, cuja
exigibilidade não esteja suspensa;
VI - que preste serviço de transporte intermunicipal e interestadual de
passageiros, exceto quando na modalidade fluvial ou quando possuir
características de transporte urbano ou metropolitano ou realizar-se sob
fretamento contínuo em área metropolitana para o transporte de
estudantes ou trabalhadores;
VII - que seja geradora, transmissora, distribuidora ou comercializadora
de energia elétrica;
VIII - que exerça atividade de importação ou fabricação de automóveis e
motocicletas;
IX - que exerça atividade de importação de combustíveis;
X - que exerça atividade de produção ou venda no atacado de:
a) cigarros, cigarrilhas, charutos, filtros para cigarros, armas de fogo,

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munições e pólvoras, explosivos e detonantes;


b) bebidas não alcoólicas a seguir descritas: :
1 – (revogado);
2. (Revogado);
3. (Revogado);
c)bebidas alcoólicas, exceto aquelas produzidas ou vendidas no
atacado por:
1. micro e pequenas cervejarias;
2. micro e pequenas vinícolas;
3. produtores de licores;
4. micro e pequenas destilarias;
XI - (Revogado);
XII - que realize cessão ou locação de mão-de-obra;
XIII - (Revogado);
XIV - que se dedique ao loteamento e à incorporação de imóveis.
XV - que realize atividade de locação de imóveis próprios, exceto quando
se referir a prestação de serviços tributados pelo ISS.
XVI – com ausência de inscrição ou com irregularidade em cadastro fiscal
federal, municipal ou estadual, quando exigível.

Uma vez participantes optantes do regime, as empresas estarão submetidas a um


sistema de cálculo com o emprego de tabelas constantes na forma anexa da lei, variando
conforme atividades comerciais, industriais e/ou de prestação de serviços. Além daquele
tratamento dado para as atividades comerciais e industriais, existem também na lei
diversos regramentos para os prestadores de serviços, tendo a norma considerado
tratamento diferenciado por alguns tipos de serviços.
Como dali se extrai, tais tabelas, além de prever a alíquota incidente, também
determina os percentuais de repasse relativo a cada um dos impostos ou contribuições
abrangidas neste modelo. Isto porque, para os participantes do novo Simples, o
recolhimento será feito em um documento único (arts. 13 e 21), sendo que o valor devido
mensalmente será dado pelas tabelas constantes do anexo da lei, naquele amplo complexo
sistema de variação das alíquotas a partir da receita bruta adotada como base de cálculo.
Art. 21. Os tributos devidos, apurados na forma dos arts. 18 a 20 desta
Lei Complementar, deverão ser pagos:
I – por meio de documento único de arrecadação, instituído pelo Comitê
Gestor;
II – (revogado pela Lei Complementar nº 127, de 14 de agosto de 2007);
III – enquanto não regulamentado pelo Comitê Gestor, até o último dia
útil da primeira quinzena do mês subsequente àquele a que se referir;
IV – em banco integrante da rede arrecadadora do Simples Nacional, na
forma regulamentada pelo Comitê Gestor. (redação dada pela LC nº 127,
de 14 de agosto de 2007).
§ 1º Na hipótese de a microempresa ou a empresa de pequeno porte
possuir filiais, o recolhimento dos tributos do Simples Nacional dar-se-á
por intermédio da matriz.
§2º Poderá ser adotado sistema simplificado de arrecadação do Simples
Nacional, inclusive sem utilização da rede bancária, mediante
requerimento do Estado, Distrito Federal ou Município ao Comitê Gestor.

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§ 3º O valor não pago até a data do vencimento sujeitar-se-á à incidência


de encargos legais na forma prevista na legislação do imposto sobre a
renda.
(...)
§ 5º O Comitê Gestor regulará o modo pelo qual será solicitado o pedido
de restituição ou compensação dos valores do Simples Nacional recolhidos
indevidamente ou em montante superior ao devido.

Além de todas as anteriores previsões da LC nº 123 sobre o Comitê Gestor de


Tributação que, entre outras, disciplinará a forma da opção de ingresso (art. 16), o
documento único de arrecadação (art. 21, I) e eventual pedido de restituição (art. 21, §
5º), possui o CGSN competência para cuidar do sistema de repasses do total arrecadado
(art. 22). Em relação a este ponto, afirma citado dispositivo que caberá, como natural:
• ao Município ou Distrito Federal, o valor correspondente ao ISS;
• ao Estado ou Distrito Federal, o valor correspondente ao ICMS;
• ao INSS, o valor das contribuições para a manutenção da Seguridade Social.
Art. 22. O Comitê Gestor definirá o sistema de repasses do total
arrecadado, inclusive encargos legais, para o:
I - Município ou Distrito Federal, do valor correspondente ao ISS;
II - Estado ou Distrito Federal, do valor correspondente ao ICMS;
III - Instituto Nacional do Seguro Social, do valor correspondente à
Contribuição para manutenção da Seguridade Social.
Parágrafo único. Enquanto o Comitê Gestor não regulamentar o prazo
para o repasse previsto no inciso II do caput deste artigo, esse será
efetuado nos prazos estabelecidos nos convênios celebrados no âmbito
do colegiado a que se refere a alínea g do inciso XII do §2º do art. 155
da Constituição Federal.

Seguindo o mesmo princípio de facilitação, caberá ao Conselho Gestor aprovar modelo


de declaração única e simplificada de informações socioeconômicas e fiscais (art. 25) para
o cumprimento das obrigações acessórias.
Mas, a existência daquela uniformização das obrigações acessórias não dispensará as
microempresas e empresas de pequeno porte da prestação de informações relativas a
terceiros (art. 26, § 3º), tais como as declarações exigidas das fontes pagadoras pela
retenção e recolhimento de tributos devidos na fonte ou por substituição tributária.
De toda sorte, as ME e EPP, sem prejuízo da possibilidade de adoção de contabilidade
simplificada (art. 27), devem, consoante art. 26:
– emitir documento fiscal de venda ou prestação de serviço, de acordo com
instruções expedidas pelo Comitê Gestor;
– manter em boa ordem e guarda os documentos que fundamentaram a apuração
dos impostos e contribuições devidos e o cumprimento das obrigações acessórias
enquanto não decorrida a decadência e não prescritas eventuais ações.
Admite ainda o novo regramento que o Comitê Gestor poderá estabelecer outras
obrigações acessórias a serem cumpridas pelas microempresas e empresas de pequeno
porte, com características nacionalmente uniformes (art. 26, § 4º). Entretanto, veda a
disposição legal o estabelecimento de regras unilaterais pelas unidades políticas que
participarem do Simples Nacional.
Como se trata de um sistema optativo, os contribuintes poderão se retirar

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voluntariamente, mediante comunicação, até o último dia de janeiro de cada ano (art. 28
c/c 30, I e 31, I). Contudo, ocorrendo quaisquer das vedações previstas na lei, a retirada
é obrigatória a partir do mês seguinte ao da ocorrência (art. 30, II c/c 31, II). Tudo isto,
é claro, sem prejuízo da possibilidade da exclusão de ofício (art. 29). Assim, temos um
sistema que admite que a exclusão do Simples Nacional poderá ocorrer:
a) de ofício,
b) por opção do contribuinte, ou
c) por obrigatoriedade, quando a empresa incorrer nas vedações da lei complementar.

Por fim, como envolve vários tributos, cuidou ainda a lei de estabelecer a competência
para fiscalizar o cumprimento das obrigações principais e acessórias relativas ao Simples
Nacional. Esta atribuição, e também a verificação da ocorrência das hipóteses de exclusão,
foi designada para Secretaria da Receita Federal e das Secretarias de Fazenda ou de
Finanças do estado ou do Distrito Federal, segundo a localização do estabelecimento.
Tratando-se de prestação de serviços sujeitos ao ISS, a competência será também do
município. Para maior harmonia entre todos estes diversos níveis de governo, é ainda
reconhecida a possibilidade de celebração de convênio das Secretarias de Fazenda ou
Finanças dos estados com os municípios de sua área para atribuir a eles a fiscalização.

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