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Captura Críptica:
direito, política, atualidade
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Revista Discente do Curso de Pós-Graduação em Direito
da Universidade Federal de Santa Catarina
Conselho Editorial
Ademar Pozzatti Júnior (CPGD-UFSC)
Carla Andrade Maricato (CPGD-UFSC)
Danilo dos Santos Almeida (CPGD-UFSC)
Felipe Heringer Roxo da Motta (CPGD-UFSC)
Francisco Pizzette Nunes (CPGD-UFSC)
Leilane Serratine Grubba (CPGD-UFSC)
Liliam Litsuko Huzioka (CPGD/UFSC)
Luana Renostro Heinen (CPGD-UFSC)
Lucas Machado Fagundes (CPGD-UFSC)
Marcia Cristina Puydinger De Fázio (CPGD-UFSC)
Matheus Almeida Caetano (CPGD-UFSC)
Moisés Alves Soares (CPGD-UFSC)
Renata Rodrigues Ramos (CPGD-UFSC)
Ricardo Miranda da Rosa (CPGD-UFSC)
Ricardo Prestes Pazello (CPGD-UFSC)
Vinícius Fialho Reis (CPGD-UFSC)
Vivian Caroline Koerbel Dombrowski (CPGD-UFSC)
Periodicidade Semestral
É isto aí:
O facão da ordem prepotente
Ou o estilete dum rato de esgoto
Do capitalismo ocidental,
Com seu big stick,
Seus quintais latino-americanos.
Hollywood acabou.
O canastrão aposentado
Mora hoje na Casa Branca,
Fala do russo, pelo Afeganistão,
Mas devora Granada,
Pondo o olho grosso
Na Nicarágua.
Gatos rondam
Na praça mercantil,
Merda na cuca,
Recalques,
Consumismo, loto, loteria,
Boca rica.
Mestre em Filosofia e Teoria do Direito pelo Curso de Pós-Graduação em Direito da
Universidade Federal de Santa Catarina (CPGD/UFSC), onde integrou o Núcleo de Estudos e
Práticas Emancipatórias (NEPE/UFSC), e professor de Antropologia Jurídica, na Universidade
Federal do Paraná. Correl: ricardo2p@yahoo.com.br
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tudo termina
tudo tem um fim
o dia acaba na noite
a noite acaba no dia (p. 96)
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LEMINSKI, Paulo. Ensaios e anseios crípticos. Curitiba: Pólo Editorial do Paraná, 1997, p. 24.
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SANTOS, Boaventura de Sousa. A gramática do tempo: para uma nova cultura política. São
Paulo: Cortez, 2006, p. 90.
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estás descontente
há quanto tempo
não te revoltas
da revolução
e tosta mista
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passaste ao sermão
e tasca mística
vês o que eles veem
deve estar escuro
passas não passas
não vês o muro
fronteira traiçoeira
do lado de cá
a vida é bala
do lado de lá
a vida é bala
os muros estão fartos de cabeças (p. 28)
és puta puta
mulher homem de negócios
negação do ócio
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negoceias ócios
e fumos e sombras
e os loucos sobem
pela alma acima
não há alma porra
só há rima
és índio
filha da puta
és negra
filha da puta
és imigrante
filha da puta
és mulher
filho da puta
és refugiado
filha da puta
és terrorista
filha da puta
és e serás
filho da puta
de mulher honrada
não há putas que cheguem
até os deuses
são orfãos (p. 14-15)
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a obscenidade
é método (p. 37)
Mas Queni é o factóide do sociólogo que não pode falar pela boca da
academia. Pouco plausível seria apontar para um irreal preconceito contra o
periférico retratado da forma que foi, de modo “global”. Mas estigmatizante não
seria de todo incoerente. De qualquer modo, que reste claro, o ímpeto
desestabilizador não tem essa intenção, pois tem outra:
as vacas malhadas
são a única
democracia racial
o êxtase ocidental
se não fosse mortal
seria acidental (p. 77)
é preciso começar
pelo fim
lição do hulk
planeta
de carne e osso
só há estilhaços
só há destroços (p. 29)
Mas será que só pode haver estilhaços? Difícil seria rebater que, em
relação à mítica massa que juntava todas as matérias imediatamente antes da
grande explosão – divulgada como teoria científica e ilustrativa da física
midiática hawkingiana – que partejou as galáxias e o sistema solar, em especial,
o planeta Terra não é mero caco de substância. Entretanto, em relação à
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pois bem, esse rap tem o mérito de, marotamente, encher de palavrões
páginas polidas de um histórico intelectual português e estimular a rebeldia pela
poesia; esse rap também tem algumas fixações, como o ódio ao consumismo e a
ode anti-metafísica; e esse rap inocorre também na tremenda contradição de
adotar a imanência como ponto de partida (o global, o factual, o clichê, o
mercadológico, o midiático e o policialesco); mas, acima de tudo, esse rap
sugere, sem respeito a regras de pontuação, uma importante reflexão:
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“Evidentemente, los años que siguen no serán fáciles para aquellos que escojan la via de esta
ciencia rebelde y subversiva: no habrá para ellos fondos ni fondaciones corrientes, ni cargos
seguros, ni títulos pomposos, ni premios, ni prebendas. Habrán de ser así doblemente ingeniosos,
porque tendrán que crear no sólo una ciencia insurgente sino una ciencia humilde, para pobres,
una ciencia sencilla, sin diseños estrambóticos ni complicaciones innecesarias, pero útil para los
fines que se persiguen”. BORDA, Orlando Fals. Ciencia propia y colonialismo intelectual.
México, D. F.: Nuestro Tiempo, 1970, p. 19.
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Não que não se precise traduzir as culturas. Mas a tradução não é só o trazer
pois que também é o trair. E, se de fato, a vida real só melhora a comédia, não é
menos verdade que só fazendo todos viverem-assistirem a esta comédia que
deixará de ser também tragédia. É o próprio poeta quem no-lo diz:
jesus caminha
caminha com alguém
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