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movimentos seminais na
O pensamento de
Rodolfo Kusch
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América profunda
Rodolfo Kusch
movimentos seminais na
O pensamento de
Porto Alegre
2019
CONSELHO EDITORIAL
CONSELHO CIENTÍFICO
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convivência de caos e opostos no cosmos e nos sujeitos indígenas e popu-
lares. Esse encontro com a profundidade da terra talvez explique a opção
por viver os últimos anos de sua vida em Maimará (Jujuy).
O tema das VIII Jornadas, “Territorialidades e Interculturali-
dades: movimentos seminais na América Profunda”, revela as iden-
tificações do grupo vinculado à Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS) e à Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC) com o
“Programa Pensamiento Americano”, da Universidad Nacional Tres de
Febrero (UNTREF), de Buenos Aires, que promoveu várias das edições
anteriores do evento, sempre posicionadas num movimento descolonial e
intercultural, inspirador de espaços de re-existência. Realizada pela pri-
meira vez em Porto Alegre, a proposta pretendeu, primeiramente, apro-
fundar a compreensão da obra kuscheana enquanto desafio de vincular
os pensamentos indígena, popular e acadêmico e com isso construir um
relato próprio em torno de identidades histórico-culturais dos povos in-
do-afro-latino-americanos desde a América. Também houve a intenção
de provocar o diálogo dessa obra com as de autores ligados a áreas como
pensamento social, educação, artes, e ainda com a práxis de coletivos no
Brasil que inserem modos de sentir, pensar e fazer baseados em matrizes
civilizacionais não ocidentais.
Tais motivações guiaram a estruturação do evento. Na abertura as
vozes originárias se fizeram presentes desde a apresentação do coral Gua-
rani Mbyá e as falas entoadas das sábias Iracema Nascimento e Talcira
Gomes, respectivamente dos povos Kaingang e Guarani Mbyá. Seguiram
na conferência em que estiveram Casé Angatu Xucuru Tupinambá, An-
dila Nĩvygsãnh Inácio e Malvina Dorneles, mediados por Bruno Ferrei-
ra (UFRGS e Instituto Estadual de Educação Indígena Ângelo Manhká
Miguel). Ao longo do evento, as intenções dialógicas e as oposições com-
plementares guiaram a Programação. Foram organizadas 3 Mesas de sa-
bedoria, que contaram com os seguintes participantes: Mesa I – Saberes
Indígenas na escola, com Miguel Ribeiro (Escola Indígena Kaingang
– Terra Indígena Guarita, RS) Joel Pereira (Escola Indígena Guarani Vi-
cente karai Okendá – Getúlio Vargas, RS) e Ivone Daniel (Escola Indíge-
na Kaingang – Terra Indígena Ligeiro, RS), com a mediação de Susana
Inácio (UFRGS e Terra indígena Serrinha); Mesa II : Territórios e
Territorialidades, com Santiago Franco (Liderança Guarani-Mbyá –
Tekoa Yvy Poty), Eduardo Davi de Oliveira (UFBA) e José Mauricio
Nilian Carcamo (Universidad Popular Originaria /UPO, do povo Mapu-
che), com a mediação de Fernanda Brabo Sousa ; e a Mesa III: Perspecti-
vismo intercultural, com Walter Boechat (UFRJ), Zaqueu Key Claudino
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(UFRGS e Escola Kaingang Guarita, RS) e Mario Vilca (UNJu/Jujuy),
com a mediação de Ana Luísa Teixeira de Menezes . Houve ainda sessões
com 4 Mini-Conferências simultâneas: Estética - Dimensión estética del
pensamiento kuscheano - Juan Pablo Perez (UNTREF) e debatedor Dan-
nilo Melo; Alma Brasileira -Walter Boechat (UFRJ) e debatedora: Fáti-
ma Souza, Interculturalidade e Educação – Neusa Vaz e Silva (UFRGS)
e debatedora Magali Mendes de Menezes; e Kusch e Educação – José
Alejandro Tasat (UNTREF) e debatedora Maria Aparecida Bergamaschi.
O mesmo espírito seminal marcou a Conferência de encerramento: O
Popular como re-existência: Freire e Kusch, com a presença de Baldui-
no Andreola (UFRGS, Brasil) e Carlos Cullen (UNTREF/UBA, Argen-
tina). Nessa aproximação entre os dois pensadores é notória a confluência
de ideias libertárias que seguem influenciando reflexões, práticas docen-
tes e sociais que emergem das urgências da geocultura americana, ou seja,
da realidade situada.
Cabe destacar a série de atividades que compuseram momentos de
sentir-pensar-fazer: a exposição fotográfica de Verá Poty Benites e Da-
nilo Christidis; a exposição comentada da artista Silvia Ricopa (Shipibo-
-Konibo, Peru); as sessões de filmes de autorias indígenas e não indíge-
nas, organizadas por Ana Letícia Meira e José Tasat; as aprendizagens
Vivenciais através de biodança, com Rudimar Florindo Merlo; de con-
tação de histórias, com o Grupo Quem conta um conto; de conversa com
Josias Loureiro de Mello e Marcos Vesolosquiki Kaingang, indígenas uni-
versitários; de conversa com Cidara Loguercio e Vherá Poty sobre diálo-
go intercultural no Museu; e de Roda de Capoeira Angola com o grupo
Africanamente. Lembramos ainda das experiências em saídas de cam-
po para aldeia Guarani, comunidade Quilombola e lugares de resistência
urbana no centro de Porto Alegre.
Foram realizadas também sessões de apresentação de comunica-
ções orais em torno de 11 eixos temáticos formulados com o aporte do
pensamento de Kusch, a saber: Educação, interculturalidades e liberta-
ção; Povos indígenas: educação, cosmologias e línguas; Filosofias do sul e
processos de libertação; Histórias, memórias e narrativas; Corporeidade,
espiritualidade e saúde; Colonialismo, colonialidade e pensamento decolo-
nial; Teatro, artes, literaturas e estéticas; Políticas e estudos de América;
Mulheres, sabedorias e lutas; Territórios, territorialidades e modos de es-
tar sendo; e América profunda, democracias e movimentos sociais. Desses
debates surgiu este livro composto pelos resumos expandidos encaminha-
dos pelos participantes das VIII Jornadas O pensamento de Rodolfo
Kusch. Embora tenham sido originalmente formulados enquanto propos-
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tas de apresentação de acordo com os eixos temáticos do evento, apare-
cem aqui reconfigurados. Por partilharem de inúmeros pontos de contato
sugeridos de antemão pela multifacetada reflexão kuscheana, apresentam
pensamentos de fronteira, vale dizer, contaminados de impurezas e de
opostos. E, como tal, desafiam o medo de habitar o mundo com a potência
das sementes que irrompem com e a partir do lugar. Não é coincidência
que muitos dos textos reportam existências a partir do “estar no más” e
de circunstâncias que demandam o enfrentamento do que ainda é colo-
nial neste continente. Mesmo os textos conceituais e reflexivos trazem as
arestas do saber tenebroso e bárbaro que acerca a pretensão sem corpo do
saber causal, aquele que convida a “ser alguien”.
Gravitados pelo solo comum, americano, e inspirados pela força dos
encontros entre disciplinas e entre culturas ocorridos nessa margem de
rio/lago ao sul do Brasil, compartilhamos com os leitores esse pensar
vivo, desde o corpo e o ritual, que emerge de criadores de saberes coletivos
e horizontais. Começamos com a seção “Com os pés no solo e no sagrado:
vozes da América profunda”, que destaca algumas enunciações indígenas.
Com “Por que lo que es semilla llegará a ser fruto: experiências em educa-
ção a partir de Kusch”, apresentamos a partilha de práticas que nascem do
solo. Na seção seguinte, acrescentamos contribuições acerca de fazeres e
pensares de resistência: “De um nosotros colonial a um nosotros nas prá-
ticas e lutas situadas”. Continuamos com a seção dedicada às criações: “El
sentido de una obra no se agota con el autor, sino con el pueblo que la ab-
sorbe: o monstruoso, o dual, o amorfo e o bárbaro na América profunda”.
Trazemos ainda textos permeados de contaminações de ideias na seção
“Vivir es saber, saber es pensar siendo: reflexões em torno das trevas que
acercam o saber lúcido”.
Os escritos aqui reunidos em sua forma e conteúdo traduzem po-
tências do pensamento kuscheano. Como textos “sem medo de habitar
o mundo”, esperamos que inspirem lutas e re-existências que seguem
urgentes em tempos novamente sombrios. É possível imaginar que, es-
tivessem Rodolfo Kusch e Paulo Freire vivos, impulsionariam emancipa-
ção e rebeldias nas salas de aula, no campo, nas montanhas, nos rituais
e mesmo nas cidades conflituosas em sua aparente ocidentalização. Seus
pensamentos seguem como sementes de libertação para sujeitos e co-
letivos comprometidos em mudar a própria história frente a novas (ve-
lhas) opressões.
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os pés no solo e no sagrado
vozes da América
profunda
Com
seção 1
HistóriA de mumbucA: memóriA, tempo e espAço
[...] aqui numa comunidade que nois tinha muito amor. Que. por muitos
anos... minha mãe nasceu aqui.. eu to com sessenta anos, sessenta e seis
anos... e não sou a primeira filha não. Sou a terceira filha (Mumbuquense
4, 66 anos).
Quando querem voltar a um tempo mais distante, que está para além
da sua própria existência, os mumbuquenses nos dizem: “a vó da gente”,
“a bisavó”, “o mais velho”. A comunidade expõe em lugar central (na loja
da associação), a árvore genealógica que foi construída recentemente4 em
que se pode perceber que a formação da comunidade ocorreu pela união
de três famílias: Beato, Bento e Pereira.
No seio da comunidade, a pessoa mais velha é D. Laurentina Matos,
94 anos, tratada pelos moradores como Vó Laurentina, Vó Lôra ou Vó
Grossa. Ela é bisneta de um dos casais fundadores (José Delfino Bento e
Maria Jacinta). D. Laurentina Matos foi parteira durante 40 anos. É des-
cendente do tronco dos Pereira, porque o seu avô materno, Emídio Perei-
ra, ao contrair casamento com uma filha dos Bento, atribuiu sobrenome à
sua mãe, Laurina Pereira, que foi casada com o Sr. Silvério Ribeiro Matos,
representantes da terceira geração da família.
No momento em que a pesquisa acontece5, a história da comunidade
está ancorada na terceira geração, porque a lembrança da história de vida
da D. Laurina Pereira é sempre trazida à tona, por ser a pessoa que criou a
técnica do artesanato do capim dourado, principal atividade desenvolvida
pela comunidade para a geração de renda.
A produção do artesanato com os fios do capim dourado e da seda
do buriti foi herdada pela filha de D. Laurina Pereira, chamada Guilher-
mina Ribeiro da Silva, conhecida como D. Miúda, falecida em novembro
de 2010. A tradição do capim dourado é retratada nas peças de teatro que
contam a história de resistência e luta dos ancestrais. Na letra da músi-
ca, a força da família Pereira é comparada com um pau (madeira, árvore)
muito forte, que fulora (floresce), mas não cai, o pau pereira: “Pau pereira,
pau pereira, é um pau de opinião, todo pau fulora e cai, mas o pau pereira não.”
(Cantiga de roda da Comunidade Mumbuca).
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pela cor da pele, pois encontramos um grupo misto composto por pessoas
negras, brancas e mestiças.
Ainda que a miscigenação possa ter ocorrido ao longo do tempo,
Jamerson Jr. (2002, p. 203), afirma que “os europeus adentraram inicial-
mente na área que atualmente constitui os Estados de Goiás e Tocantins
em busca de escravos indígenas e, depois, ouro e diamantes”.
Nessa linha é possível conceber que a Comunidade Mumbuca já sur-
giu miscigenada. No contexto da procura de terra livre, outra mumbu-
quense nos conta sobre os seus antepassados com mais detalhes:
[...] eles eram escravos e quando a Princesa Isabel decretou a Lei Áurea, a
lei que libertou os escravos, alguns fazendeiros que tinham a fazenda mui-
to grande, eles deram um pedaço de terra para essas pessoas. E outros não,
mandaram embora. E esse pessoal foram vindo pra cá e foram habitando
essa região aqui (Mumbuquense, 3).
6 O Estado do Tocantins foi criado em 1988. No período da escravidão essa região era
considerada o norte do Estado de Goiás.
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O Parque Estadual do Jalapão é uma Unidade de Conservação Inte-
gral, que ocupa uma área de quase 150 mil hectares de terra no município
de Mateiros. Pela regra legal, nesse parque não é permitida a presença de
moradores em seu interior. Todavia, o fato é que os moradores de Mum-
buca residem no local há mais de um século. Em face disso, a criação do
Parque gerou uma série de conflitos que deixam a comunidade numa si-
tuação de vulnerabilidade social.
A localização da Comunidade Quilombola Mumbuca está inteira-
mente situada no município de Mateiros, Estado do Tocantins. Esse mu-
nicípio faz divisa com o Estado do Piauí e concentra a maior região eco-
turística do Jalapão.
A comunidade está com o processo de regularização fundiária for-
malizado no Incra/TO, possui a Certidão de Auto-reconhecimento emi-
tida pela Fundação Cultural Palmares, desde 16 de janeiro de 2006, ainda
assim o território ainda não foi reconhecido e nem titulado.
Dentre as comunidades certificadas pela Fundação Cultural Palma-
res no Estado do Tocantins, a Comunidade Quilombola Mumbuca nos
permite pensar o sentido do humano no contexto da realidade latino-ame-
ricana, assim como nos propõe Rodolfo Kusch, em sua obra Esbozo de uma
Antropologia Filosófica Americana (1978).
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Referências
ARNON, et Al. Campo do turista. Violinha de vereda viola de buriti. Arnon &
Mauricio. Comunidade Mumbuca. Voz e performance na tessitura das palavras e
do capim dourado: as manifestações dos artesãos do Tocantins. Faixa 16, Funar-
te/CEULP/ULBRA. s/d. 1CD-ROM
JAMESON JÚNIOR, D. M. A economia de Goiás no século XIX. In: GIRAL-
DIN, O. (Org). A (trans)formação histórica do Tocantins. Goiânia: Editora
da UFG, 2002, p. 203-227.
KUSCH, Rodolfo. Esbozo de uma Antropologia Filosófica Americana. Bue-
nos Aires: Ediciones Castañeda, 1978.
PEREIRA, Ana Lúcia. FAMÍLIAS QUILOMBOLAS: história, resistência e
luta contra a vulnerabilidade social, insegurança alimentar e nutricional
na Comunidade Mumbuca - Estado do Tocantins. Tese de Doutorado. Ara-
raquara. Universidade Estadual Paulista, 2012.
SANTINHA. Pau pereira. Intérprete: executado pelo grupo. In: MEDINA, M.
F. (Coordenadora da pesquisa.); MEDINA, J. (Direção musical); BORGES, T.
(Gravação). Cantigas de Roda: Comunidade Mumbuca. Funarte/CEULP/
ULBRA. s/d. 1CD. Faixa 11.
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os estudAntes indígenAs e os desAfios AcAdêmicos
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isso, buscamos conhecer melhor a sociedade não indígena ocidental para
podermos construir um diálogo mais igual, horizontal. Com essa determi-
nação vamos ocupando os cursos que entendemos ser necessário para nos-
sas lutas e para a construção de políticas pública condizentes para nossos
povos. No caso específico do povo Kaingang do Rio Grande do Sul, em um
primeiro momento foram eleitos os cursos Direito, História, Pedagogia e
Agronomia (início dos anos 1990). Com o passar dos tempos, a gama de
cursos de graduação vai se estendendo para outros cursos escolhidos pelas
lideranças kaingang, atendendo a preocupação em formar profissionais em
uma gama mais abrangente. Dentro deste movimento destaco a importân-
cia das ações afirmativas, que ajudam a diminuir as desvantagens.
Num segundo movimento, é a chegada aos Programas de Pós-Gra-
duação (Mestrados e Doutorados); a busca pela construção de pesquisas
que apresentem e representem o seu povo indígena para a universidade e
de maneira geral para a sociedade não indígena, mostrando nossas diferen-
ças, nossa língua, nossos costumes, nossas tradições, nossa cultura, nossos
conhecimentos, outro jeito de ver o mundo. Mostrar que somos povos que
temos como nosso regulador social a reciprocidade, o coletivo imperando
sobre a individualidade, com conhecimentos construídos a partir de nossas
ancestralidades de forma coletiva. Nesse sentido, trazendo outros concei-
tos de sociedades e colocando em questionamentos antigas visões a respei-
to dos indígenas, que sempre foram apresentados como uma coisa velha,
sem valor, no passado, com o forte olhar do preconceito e da discriminação.
Acredito que a escolha da universidade como uma das parceiras
para as lutas indígenas vem muito por ser um espaço de produção de re-
flexões, em que nós indígenas também podemos trazer nossos conceitos
para serem compartilhados e mostrar nossos valores diante das demais
sociedades. Os indígenas, ao longo do tempo, vêm mantendo e susten-
tando a vida de forma limpa e saudável, garantindo a sobrevivência das
gerações do presente e do futuro.
É claro que a universidade é desafiadora para os indígenas. Estou
falando de um espaço que ainda nos é desconhecido, uma instituição que
está distante de nossas realidades, mas que tem suas importâncias, qual
seja o de auxiliar os indígenas que a frequentam, construindo com esses
uma opinião crítica diante das realidades sociais e no reconhecimento cien-
tífico, tecnológico e cultural dos indígenas. Nesse sentido, servirá como
um instrumento fortalecedor de nossas lutas, com o comprometimento
da construção de uma sociedade mais justa e respeitosa diante das diver-
sidades étnica, linguística, cultural e epistêmica. Porém, aos poucos as
barreiras vão se rompendo, pois nós estudantes indígenas também vamos
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impondo-nos de forma qualificada, numa clara posição de trazer e afirmar
nossos jeitos próprios de construir conhecimentos, muito evidenciados
nas escritas de nossos trabalhos, uma escrita que vem do movimento de
dentro para fora, na busca do equilíbrio da emoção com a razão, eviden-
ciada de forma muito forte na oralidade. Penso que além de adquirirmos
os conhecimentos e as tecnologias oferecidos pela universidade, é preci-
so estar atento para a manutenção de nossa identidade cultural, nossos
costumes, tradições, as formas próprias de construir e transmitir nossos
conhecimentos, nossas metodologias. A preocupação é como que a univer-
sidade acolhe esse estudante com as suas diferentes formas de produzir
conhecimento e de se expressar, que tem como princípio a oralidade e não
a escrita. Isso ainda carece de muitas reflexões por parte dos docentes,
junto com os estudantes indígenas. Por ser desafiador, é necessário e ur-
gente fazer um diálogo levando em consideração essas questões.
Outras situações importantes a serem observadas nos estudantes in-
dígenas e que dizem respeito à questão específica de suas famílias é a perma-
nência do estudante na cidade com a sua família, pois muitas das vezes es-
ses(as) estudantes são casados(as), têm filhos(as). Aliás, esta é uma realidade
da maioria, pois, segundo nossas culturas, não vivemos separados um dos
outros; de maneira especial, não nos distanciamos de nossos parentes. Isso
causa incompreensões entre os estudantes indígenas, a universidade e os
professores. Para o povo Kaingang, segundo sua tradição, todos são Kanh-
kã2, onde um sustenta o outro, o desenvolvimento de uma filosofia própria,
pensar e propor pensar sobre o ser da América (KUSCH, 1976).
Para os indígenas, sendo de tradição oral, a escrita é um desafio na
relação de produção do estudante indígena na vida acadêmica e carece
de uma atenção muito especial, pois como já dito, os indígenas têm como
meio principal de transmitir seus conhecimentos a oralidade. Diante disso,
a escrita passa a ser um grande desafio: são dois mundos distintos. Nesse
sentido é importante compreender o “poder” da oralidade para os indíge-
nas. A oralidade permite os indígenas criarem e recriarem suas histórias,
suas narrativas que vão se movimentando ao longo dos tempos e dos di-
ferentes contextos e assim vão criando e repassando seus conhecimentos.
Existe uma dinâmica de se atualizar a cada situação de tempo e espaço.
A oralidade e a escrita evocam situações distintas, entretanto coexistem
em nossa sociedade, mesmo nesse tempo-espaço de triunfo da linguagem
Referências
BERGAMASCHI, Maria Aparecida. Nhembo’e. Enquanto o encanto perma-
nece! Processos e práticas de escolarização nas aldeias Guarani. Tese de Douto-
rado. Porto Alegre: Programa de Pós-Graduação em Educação, UFRGS, 2005.
KUSCH, Rodolfo. Geocultura Del Hombre Americano. Colección Estúdios
Latinoamericanos. Buenos Aires, 1976.
SILVA, Luiz Fernando e (org). Coletânea da legislação indígena brasileira.
Brasilia: CGDTI/FUNAI, 2008.
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A interculturAlidAde dentro dA filosofiA KAnHgág
Dorvalino Cardoso1
Introdução
Desenvolvimento
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[...] a pluralidade das culturas (um fato incontestável) não impede,
de modo algum, a unidade da humanidade (outro fato incontestá-
vel), nem, portanto, o julgamento que estabelece a realidade dos
atos bárbaros e dos gestos civilizados. Nenhuma cultura traz em
seu bojo a marca de barbárie, nenhum povo é definitivamente ci-
vilizado; todos podem tornar-se bárbaros ou civilizados. Esse é o
caráter próprio da espécie humana.
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sim de exploração da natureza. Eu e o meu povo, que nos criamos junto da
natureza, por exemplo, dos animais, das árvores, da cosmologia, dos rios,
acreditamos que todas estas coisas têm uma sabedoria. Elas são uma vida,
então elas têm uma sabedoria. É essa leitura que eu fazia, quando vivia junto
à floresta. Como etnia, gostamos de contar quando nasceram as coisas. Gos-
tamos de trabalhar também os pensamentos, ou seja, de contar os valores,
vamos dizer, dos rios, os valores dos animais, a valor da água e os valores
da humanidade. A ciência, ela separa o humano. A humanidade da natureza.
E os professores trabalham separadamente isso, humanidade e natureza. E
nós como etnia entendemos assim, que nós somos a natureza.
No momento que nós matamos a terra, nós estamos nos matando.
No momento em que a gente polui os rios, que o rio tem veneno, nós es-
tamos envenenando o nosso corpo. E nós precisamos dessa natureza. No
momento que a gente não viver da luz do sol, nós nos prejudicamos. Por
isso que dá doença depois. O contato do humano com a luz do sol fortalece
a gente. O homem precisa desta energia para sobreviver. E o sol nasceu
para isso. É para humanizar toda a natureza. Ele tem sua força. Os indíge-
nas adoravam o sol como Deus.
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sando das memórias para o registro, conforme descrito por Bergamaschi
(2012, p. 108):
[...] como contam os mais velhos, em tempos priveros, eram dois sóis que
existiam, o que implicava a ausência da noite, do orvalho, da água e, como
conseqüência, a impossibilidade de multiplicação das plantas, das pessoas,
dos rios...da vida como um todo.Mas, transcorrida uma briga entre os dois,
um deles, o Sol vencedor, vazou os olhos do outro, o Sol perdedor. Este
enfraquecido, transformou-se em lua, dando início á noite e aos ventos
para refrescar a Terra. Em sua origem, portanto, Sol e Lua (ex-Sol) são o
mesmo ser. O dia /Sol e a Lua / noite complementam o mundo, permitin-
do a existência da vida, pois a fertilidade vem da oposição e a complemen-
taridade de tudo que existe.
Devo destacar que estes mitos fazem parte da nossa filosofia como
povo e sobretudo que somente por intermédio desses relatos orais que atual-
mente passaram a ser registrados, que as explicações referentes a origem
dos cosmos encontram a sua explicação lógica. Volto a reafirmar que pen-
sando e agindo dessa forma, todos os seres que existem no mundo voltam a
relacionar. Todos os movimentos estão entrelaçados. O presente que vive-
mos se concentra no passado, presente e futuro em um presente contínuo.
Deste conhecimento “popular [...] que emerge do sofrimento da
vida, de uma resistência que se faz teimosia, popular como marca de um
povo, antítese necessária para que sujeitos possam dizer (a si mesmos) que
existem. “ (KUSCH, 1978, p. 675).
Referências
BERGAMASCHI, Maria Aparecida. DALLA ZEN, Maria Isabel Habckost. XA-
VIER, Maria Luisa Merino de Freitas (Organizadoras). Povos Indígenas &
Educação. 2. ed. Porto Alegre: Mediação, 2012.
KUSCH, Rodolfo. Esbozo de uma antropologia filosófica americana. Buenos
Aires: Ediciones Castaneda, 1978.
TODOROV, Tzvetan. O medo dos bárbaros: para além do choque das civili-
zações. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.
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relAto de experiênciA: implementAção dAs
leis 10.639/03 e 11.645/08 em esteio
Graziela Oliveira Neto da Rosa
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A construção da autoestima da criança negra, segundo Cerqueira
(2005), depende muito do ambiente escolar pois é onde a criança vivencia
parte do seu dia a dia. As relações estabelecidas na interação em classe
podem contribuir para que a criança negra cresça sentindo-se diferente,
mas não desigual.
Comparo o modo como me sinto aos Malês, movimento de negros
que resistiram e reagiram quando algo lhes foi imposto, principalmente
quando atingia sua crença e cultura. Da forma como a história tentou si-
lenciar meu povo, hoje vejo a oportunidade de também resistir, ao invés se
ser mais uma a se calar.
A trajetória percorrida em múltiplos espaços da educação, oportuni-
zou-me diferentes experiências, assim me encorajando a buscar a ciência
e a pesquisa como ferramentas de trabalho para acabar com o preconceito
nos diferentes ambientes. Fui uma das responsáveis pela implementação
das leis 10.639/03 e 11.645/08 na educação da cidade, mesmo antes de
tornar-me uma pesquisadora da temática. Conforme Meinerz (2017), era
uma professora negra que, motivada pela causa, fazia as coisas acontece-
rem na escola.
Ao longo do tempo, descobri que o mesmo ocorria com os demais
professores, por ideal e por afeto à causa, faziam valer a lei. Souza (2002)
diz que o educador se depara, frequentemente, com uma série de evidên-
cias das questões raciais e do preconceito, tendo ou não clareza delas e, al-
gumas vezes, utiliza práticas do senso comum, que, segundo a autora, po-
dem até mesmo reforçar o racismo. Na intencionalidade de reverter essa
situação, que se iniciou um forte trabalho nas escolas municipais, acreditar
que é imprescindível descolonizar nossas atitudes, foi determinante para
muitos professores.
Vivemos um momento dolorido, em que as pessoas estão assumindo
que são racistas. Esse cenário social vem refletindo diretamente no con-
texto escolar, e como educadora venho me questionando sobre como a
escola e a família está lidando com essa situação. O egoísmo, o não envol-
vimento com as políticas públicas de forma sistemática e o descrédito com
os agentes públicos, certamente tem levado o nosso país para uma crise
cultural. Por vezes impossibilitando uma troca de aprendizagens entre as
diferentes culturas.
O fato é que, infelizmente, a cultura escolar prioriza o homogêneo.
E nesse sentido, as diferenças são consideradas um “problema” a resolver.
Compreendendo este cenário, que o Grupo de Trabalho Africanidades
(GTA), percebe a necessidade de estudar coletivamente as leis 10.639/03
e 11.645/08. Foi através desses estudos no GTA que garantimos a imple-
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mentação nos Projetos Políticos Pedagógicos das escolas o projeto Diver-
sidade, assim como a aplicabilidade das Leis no currículo escolar.
Sabemos que a educação tem um objetivo maior do que somente
preparar os alunos para o mercado de trabalho, o foco central da educação
deve estar nos sujeitos de direitos, eles são diversos em gênero, credo,
etnia, entre outros. De fato, essa diversidade tem sido tratada de forma
desigual e discriminatória ao longo dos séculos e ainda não foram devida-
mente equacionadas pelas escolas e seus currículos.
Ao longo dos anos, foi possível realizar diferentes ações, sempre
construindo com os colegas professores, tínhamos a responsabilidade, por
garantir as atividades e projetos realizados nos espaços escolares. Com a
indicação de um professor ou professora, por escola, foi possível articular,
acompanhar e qualificar o trabalho da diversidade no espaço escolar. No
decurso desses anos, houveram diferentes formações e capacitações, com
o intuito de multiplicar saberes e ressignificar o lugar das diferenças, pois
a ideia de ter um espaço delimitado no calendário escolar, nessa proposta,
estava sendo totalmente descartada.
Após formação do Grupo Africanidades, foram construídas estra-
tégias que garantiram nos anos de 2012 até 2016 a efetivação do traba-
lho na escola, processo este que foi criando formas e possibilitando novas
ideias e outros caminhos. Uma das ações realizadas na rede municipal de
ensino, foi o I Colóquio Municipal, que teve como tema central “O lugar
da diferença nas práticas cotidianas”, o evento resultou numa publicação,
que foi fruto de uma sequência de atividades viabilizadas pela Secretaria
Municipal de Educação do município de Esteio.
E hoje, como está sendo garantido a aplicabilidade das leis 10.639/03
e 11.645/08 na rede municipal de ensino? Conseguimos efetivamente des-
colonizar a educação de Esteio?
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Referências
BERGAMASCHI, Maria Aparecida, GOMES, Luana Barth. A Temática In-
dígena na Escola: ensaios de educação intercultural. Disponível em: http://
www.curriculosemfronteiras.org/vol12iss1articles/bergamaschi-gomes.pdf.
CERQUEIRA, Valdimarina Santos. A construção da auto-estima da criança ne-
gra no cotidiano escolar. In.: OLIVEIRA, Iolanda de; SILVA, Petronilha Beatriz
Gonçalves; PINTO, Regina Pahim. (orgs.). Negro e educação: escola, identi-
dades, cultura e políticas públicas. São Paulo: Ação Educativa/ANPED, 2005.
MEINERZ, Carla Beatriz. Ensino de História, Diálogo Intercultural e Relações
Étnico-Raciais. Educação e Realidade, v. 42, n. 1, p. 59-77, 2017.
SANTOS, Boaventura de Souza. A Construção Multicultural da Igualdade e
da Diferença. OFICINA DO CES. Nº 135 - 1999: Publicação seriada do Centro
de Estudos Sociais. Praça D. Dinis. Colégio São Jerónimo, Coimbra. Disponível
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carteira. Porto Alegre: Mediação, 2002.
46
o testemunHo de um estudAnte guArAni
e seu duplo pertencimento
Isael S. Pinheiro1
Introdução
A vida na aldeia
48
comunidade, aprendi as coisas da vida Guarani, Kaingang, Xetá, das lições
morais, espirituais e as necessidades para a vida material e sociocultural.
Além disso, frequentei todas as atividades religiosas e comunitárias. Gos-
tava de pescar, caçar, brincar com meus amigos, gostava de ir para a esco-
la, trabalhar na roça e ajudar a minha avó nas atividades diárias.
Diante de uma situação extremamente oposta em relação àquela vi-
vida pelos nossos antepassados, hoje, nossos parentes e demais Guaranis
sobrevivem em pequenas áreas reduzidas muito aquém do que foi o nos-
so território tradicional. As condições que enfrentamos atualmente são
marcadas por vários problemas decorrentes da falta de espaço físico e da
escassez de recursos naturais essenciais para a nossa reprodução física e
cultural. Isso tem levado muitas famílias a se tornarem dependentes do
trabalho assalariado nas fazendas e cidades próximas às aldeias.
A vida na universidade
49
era a segunda vez que eu estava saindo da minha aldeia. Foram dois anos
de curso e de muito trabalho. Além disso, foi um novo cenário, ou melhor,
um novo mundo, tanto cultural, intelectual e científico.
Pude participar de grupos de estudos e atuei como coordenador
de um grupo de estudos com os universitários indígenas num projeto de
pesquisa denominado “Observatório da Educação Escolar Indígena, in-
titulado: Interculturalidade e interdisciplinaridade na educação escolar
indígena no Paraná: contribuição à alfabetização, formação de professores
e elaboração de materiais didáticos bilíngues, financiado pela CAPES/
DEB/SECADI/INEP”, que durou até o começo de 2017. Esse projeto
contava com estudantes indígenas matriculados em diversos cursos. Em
nossas atividades de pesquisa, leituras e discussões, foram produzidos vá-
rios trabalhos que foram essenciais para a minha formação.
Participei também de alguns eventos internos, porém, mesmo com
bolsa de estudos da CAPES/OBEDUC, no período, estive restrito por
condições financeiras de participar de eventos de maiores impactos. Um
dos mais importantes eventos que pude participar com apoio para trans-
porte e estadia foi o “Seminário Internacional de Etnologia Guarani”, rea-
lizado na Universidade Federal de Grande Dourados (UFGD), no muni-
cípio de Dourados (MS). Através da minha orientadora recebi o convite
para participar das reuniões do Programa Institucional de Bolsas de Ini-
ciação à Docência (Pibid) Diversidade, onde participavam alguns univer-
sitários indígenas dos cursos de graduação. Muitos desses universitários
provinham das mesmas terras indígenas que eu frequentava, possibilitan-
do-me assim entender melhor o modo de vida deles, já que muitos haviam
saídos de suas aldeias.
Um dos primeiros eventos nacionais que estive envolvido ocorreu,
entre os dias 15 e 19 de outubro de 2017, em Brasília, na UnB, III Fórum
Nacional da Educação Escolar Indígena, com a participação de, aproxima-
damente, 400 pessoas, representantes de 29 povos indígenas de 17 Estados,
entre professores, lideranças e universidades. No evento foi enfatizado que
a Educação Escolar Indígena deveria ser tratada como prioridade nas po-
líticas públicas, tendo em vista que os povos indígenas são elementos fun-
dantes na constituição do nosso país, tendo o Estado brasileiro uma dívida
histórica imensa, que só será resgatada com o cumprimento da Constituição
Federal e dos Direitos Humanos. Nesse encontro tive a oportunidade de dis-
cutir junto com outros grupos indígenas os grandes desafios agravados
pelo governo e me propus estudar de forma analítica o sistema político
brasileiro. Outro encontro importante que estive foi a II Conferência Na-
cional de Educação Escolar Indígena (CONEEI), que ocorreu em Brasília
50
(DF), entre os dias 20 a 22 de março de 2018, com o tema “O sistema na-
cional de Educação Escolar Indígena: regime de colaboração participação
e autonomia dos povos indígenas”. Antes da etapa nacional, eu já havia
participado da etapa regional, realizada em Florianópolis (SC). A etapa
nacional contou com presença de pelo menos 600 delegados – entre indíge-
nas, gestores, apoiadores – e mais de 90 convidados e observadores. Foram
três dias de intensos debates, oscilando entre otimismos com o futuro da
educação e pessimismo pelo contexto atual de corte de verbas e imposição
de limites e regras pelo governo federal. Essa segunda conferência teve
como objetivo avaliar os avanços, impasses e desafios da Educação Escola
Indígena (EEI); construir propostas para consolidar a política nacional de
educação escolar indígena; reafirmar o direito à educação específica e di-
ferenciada e ampliar o diálogo do regime de colaboração. Estive durante
todos os dias lendo as propostas locais e estaduais. De certa forma, minha
participação teve pontos positivos, pois consegui junto com outros grupos
indígenas a aprovação de uma proposta sobre o Ensino Médio, Educação
Profissional e Tecnológica e Ensino Médio Profissionalizante. Foram 25
propostas aprovadas na II CONEEI, essas propostas reafirmaram a vonta-
de das comunidades e dos movimentos indígenas de lutarem pelo cumpri-
mento das políticas de educação escolar indígena no país.
Considerações finais
51
investigAción sobre memoriAs de conflictividAd
de mujeres mApucHe en lA ArAucAníA
Margarita Canio Llanquinao1
Solange Cárcamo Landero2
54
la anexión territorial. La autora advierte sobre la continuidad de formas
de violencia del periodo colonial, pero a la vez sugiere el reforzamiento
de tensiones en las relaciones intra-étnicas. Como consecuencia de lo an-
terior, las mujeres fueron reducidas al rol de madres y esposas, se vieron
impedidas de tomar decisiones en la comunidad, lo cual, en definitiva, las
hizo especialmente vulnerables frente a la violencia en espacios públicos y
privados (Painemal Morales y Álvarez Díaz, 2016).
La reconstrucción de las historias de conflictividad y violencias
supone adentrarse en las memorias y testimonios de quienes han pro-
tagonizado estos eventos. Algunas fuentes relevantes en este sentido
son testimonios de sobrevivientes (Canío y Pozo, 2013) y textos que
entrecruzan memoria oral y construcción narrativa de las historias de
vida, como es el caso del relato Katrilef de Graciela Huinao (2015). En
el análisis que hace Llamunao Vega (2016) de este texto, identifica una
serie de mecanismos a través de los cuales se expresa la violencia y mar-
ginación hacia la mujer mapuche.
En un plano teórico-político, Nahuelpan (2013) acude al concepto
de “zonas grises de la memoria mapuche” para referirse a las interaccio-
nes sociales e intersubjetivas que configuran experiencias de sufrimiento
social en hombres y mujeres mapuche en condiciones de marginalidad,
desigualdad social y violencia colonial. Las zonas grises configuran espa-
cios sociales y cognitivos que desafían las representaciones establecidas
en los discursos sobre la conflictividad chileno-mapuche al develar expe-
riencias de sujetos en su cotidianeidad.
En síntesis, si bien, como hemos visto, existen investigaciones pre-
liminares que se aproximan al estudio de la conflictividad intercultural y
memorias de violencia de mujeres mapuche en La Araucanía, se hace ne-
cesario profundizar en la expresión de las subjetividades de las mujeres en
relación al problema identificado. Dado que la conflictividad y la violencia
se manifiestan en narraciones autobiográficas, esta línea propone un cruce
analítico entre memorias, historias de vida y discurso como práctica social.
Socialización lingüística, trayectorias vitales y tensiones identita-
rias de mujeres mapuche en La Araucanía
Como correlato de la primera línea de investigación, nos propone-
mos estudiar procesos de socialización lingüística y trayectorias vitales de
mujeres mapuche de La Araucanía, bajo el supuesto de que estos operan
como espacios sociales de conflictividad intra e intercultural que repercu-
ten directamente en sus configuraciones identitarias.
Las memorias orales permiten observar el despliegue a través del
tiempo de prácticas y procesos de resistencia cultural a nivel individual,
55
familiar y social-comunitario (Comunidad de Historia Mapuche, 2012 y
2015). Las experiencias de estas personas y los colectivos de los que for-
man parte se sitúan en coordenadas históricas y territoriales con sus pro-
pias especificidades. No obstante, las prácticas y discursos de resistencia
se nutren de un sistema de pensamiento socio-religioso que, a su vez, con-
figura un entramado cultural que encuentra en el mapuzungun su propia
vía de expresión (Quidel, 2014).
En relación a este último aspecto, los estudios sobre la vitalidad del
mapuzungun suelen enfocarse en la dimensión cuantitativa del problema,
enfatizando su condición de lengua en peligro. Las investigaciones publi-
cadas en los últimos años describen este escenario de desplazamiento to-
mando en cuenta variables territoriales, generacionales y situacionales, con
escasa atención a la variable de género (Zúñiga y Olate, 2017). Lo anterior
contrasta con el rol fundamental que le cabe a la mujer en la transmisión
de la lengua y la cultura en el ámbito intrafamiliar, además de ciertos ro-
les específicos en las prácticas socio-religiosas. En la dimensión cualitativa,
algunos trabajos se enfocan en los significados que los propios hablantes
atribuyen a la pérdida de vitalidad del mapuzungun sobre la base de sus tra-
yectorias vitales (Wittig, 2009; Teillier, Llanquinao y Flores-Farfán, 2016),
sin embargo, no se profundiza en las redes de socialización lingüística “pro-
pias” de las mujeres mapuche, que trascienden el espacio intrafamiliar y se
expresan también en redes de asociatividad intra y extracomunitarias.
Se trata de una interpretación situada en un territorio y una tem-
poralidad específicos. Otros trabajos que analizan biografías sociolin-
güísticas de hablantes de mapuzungun (por ejemplo, Wittig, 2009 y Mu-
ñoz-Cruz, 2010) plantean la necesidad de profundizar en el análisis del
papel que cumple la lengua en las configuraciones identitarias de los ha-
blantes en sus distintas etapas de vida. Sin embargo, por las característi-
cas metodológicas de tales estudios, no es posible hacer planteamientos de
mayor alcance respecto de dinámicas de socialización lingüística propias
de mujeres mapuche.
Para avanzar en estas indagaciones, se requiere un abordaje que in-
tegre las dimensiones de la memoria y las configuraciones identitarias, por
una parte, las continuidades y transformaciones del pensamiento y las prác-
ticas socio-religiosas mapuche, por otra. Se requiere, entonces un enfoque
que trascienda las categorías convencionales del análisis sociolingüístico,
pues las dimensiones aquí señaladas adquieren su sentido más profundo en
una conceptualización de la lengua como dispositivo de una representación
particular del mundo en tensión con las propias vivencias de subalternidad
y resistencia (Teillier, Llanquinao y Flores-Farfán, 2016).
56
A partir de estas consideraciones, se propone un estudio de al-
cance exploratorio que indague en las experiencias de socialización y
transmisión de la lengua mapuche en mujeres mapuche que permitan,
por una parte, profundizar en la idea del bilingüismo cíclico esbozado
por Durán y Ramos (1989), teniendo en cuenta las transformaciones del
contexto sociocultural en que se desenvuelven las mujeres mapuche en
la actualidad y, por otro, la recuperación de memorias orales de mujeres
mapuche que, desde una epistemología propia, otorguen nuevos signifi-
cados a los relatos dominantes respecto de la continuidad/discontinui-
dad del mapuzungun en los escenarios sociales contemporáneos. En una
mirada alcance general que enfatiza en la condición de lengua en peligro
del mapuzugun, se reconoce a La Araucanía como una región con mayo-
res índices de vitalidad.
De este modo, buscamos investigar experiencias vivenciadas por
mujeres mapuche en la Araucanía desde discursos narrativos autobiográ-
ficos que rescaten lo cotidiano en su heterogeneidad y dinamismo. Parti-
mos del supuesto de que los discursos y las experiencias relatadas re-con-
figuran procesos socioculturales complejos como: el género en relación
con lo étnico-cultural y el territorio; las prácticas socio-comunitarias y su
incidencia en la organización social; conflictividad intercultural presente
en la transmisión de la lengua; identidades tensionadas que reflejan ro-
les tradicionales y modernos en permanente transformación, entre otros.
(Mora, Fernández y Ortega, 2016).
57
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59
Afro-repArAção e educAção superior: A práxis negrA
62
Tabela 1 - Elementos de apoio e influência na reserva de vagas para ne-
gros(as) nas IES
Ano/Local Evento/Descrição
Projeto de Lei nº 1.332 (Câmara dos Deputados) - ação
1983
compensatória com reserva de vagas e alteração curricu-
(Brasília - Brasil)
lar.
1990 Conferência Mundial sobre as Reparações à África e
(Lagos/Nigéria) aos Africanos da Diáspora.
Abuja Pan-African Conference on Reparations For
African Enslavement, Colonization And Neo-Colo-
nization - “Calls upon the international community to
recognize that there is a unique and unprecedented moral
debt owed to the African peoples which has Yet to be paid
1993 - the debt of compensation to the Africans as the most
(Abuja/Nigéria) humiliated and exploited people of the last four centuries
of modern history”. (ORGANIZATION OF AFRICAN
UNITY, 1993).
64
Lei nº 10.558 (Programa Diversidade na Universidade)
2002
- incentiva as IES a desenvolver estratégias de inclusão
(13 de novembro/
social e combate à discriminação racial, e prevê apoio fi-
Brasil)
nanceiro.
Nota ao Alto Comissariado para os Direitos Huma-
nos da ONU. “Informa que o governo brasileiro adotou
2003
em parceria com a sociedade civil, uma série de medidas
(ONU/Genebra)
inspiradas nos dispositivos acordados em Durban” (SIL-
VA, 2011, p.244).
Medida Provisória n° 111 e Lei nº 10.678 - Cria a Se-
cretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade
Racial da Presidência da República - SEPPIR par asses-
soria a Presidência da República na execução de políticas
2003
para a promoção da igualdade racial; coordenar as políti-
(21 de março/
cas nessa área, promover programas de cooperação com
Brasil)
organismos nacionais e internacionais, públicos e priva-
dos; acompanhar a implementação de legislação de ação
afirmativa em cumprimento aos compromissos interna-
cionais assinados pelo Brasil.
Decreto nº 4.886 (Política Nacional de Promoção da
Igualdade Racial - PNPIR) -transforma a promoção da
2003
igualdade racial em uma política de Estado, tem como re-
(20 de novembro/
ferência o definido na Conferência de Durban/2001 e os
Brasil)
compromissos assumidos no Programa Brasil Sem Ra-
cismo.
Parecer MEC CNE/CP nº 03/2004 (Diretrizes Cur-
riculares Nacionais para a Educação das Relações Étni-
co-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-
2004 -Brasileira e Africana) - “O parecer procura oferecer uma
(10 de março/ resposta, entre outras, na área da educação, à demanda
Brasil) da população afrodescendente, no sentido de políticas de
ações afirmativas, isto é, de políticas de reparações, e de
reconhecimento e valorização de sua história, cultura,
identidade”. (BRASIL, 2004, p.9)
2007 Decreto nº 6.096 (Programa de Apoio a Planos de
Reestruturação e Expansão das Universidades Federais
(24 de abril /
- REUNI) - incentivo financeiro para a ampliação das po-
Brasil) líticas de inclusão e assistência estudantil.
65
Decreto nº 7.037 (Programa Nacional de Direitos Hu-
manos do Brasil/PNDH-3) - Menciona no Eixo Orienta-
2009 dor III (Objetivo estratégico V, h e Objetivo estratégico
(21 de dezembro/ VI, h), medidas compensatórias para a população negra
Brasil) de apoio a superação da sua condição social, como as
ações afirmativas no ensino superior e no âmbito da ad-
ministração pública.
Decreto nº 7.234 (Programa Nacional de Assistência
Estudantil/PNAES) - recurso financeiro para fomentar
2010 ações nas áreas de moradia estudantil; alimentação; trans-
(19 de julho/ porte; atenção à saúde; inclusão digital; cultura; esporte;
Brasil) creche; apoio pedagógico; acesso, participação e aprendi-
zagem de estudantes com deficiência, transtornos globais
do desenvolvimento e altas habilidades e superdotação.
Lei nº 12.288 (Estatuto da Igualdade Racial) - indica a
2010
adoção de programas de ação afirmativa para a população
(20 de julho/
negra na área da educação com o objetivo de reparar as
Brasil)
distorções e desigualdades sociais.
2012 Lei nº 12.711 e Decreto nº 7.824 - a reserva de vagas
(29 de agosto/ nas universidades federais e nas instituições federais de
Brasil) ensino técnico de nível médio passa a ser direito jurídico.
Portaria MEC nº 389 (Programa de Bolsa Permanência)
- disponibiliza auxílio financeiro para estudantes da gra-
2013 duação com objetivo de minimizar desigualdades sociais
(Brasil) e étnico-raciais e viabilizar a permanência de estudantes
em situação de vulnerabilidade socioeconômica, em espe-
cial os indígenas e quilombolas, nos cursos de graduação.
Convenção Interamericana Contra o Racismo, a Dis-
criminação Racial e Formas Correlatas de Intolerân-
2013 (5 de junho/ cia - Considerou como vítimas do racismo, discriminação
Guatemala - Or- racial e intolerância nas Américas os afrodescendentes,
ganização dos Es- povos indígenas, e outros grupos raciais e étnicos afeta-
tados Americanos dos por essas manifestações. E definiu como dever dos
- OEA) Estados prevenir, eliminar, proibir e punir atos e manifes-
tações de racismo, discriminação racial e formas correla-
tas de intolerância.
66
Lei nº 13.005 (Plano Nacional de Educação/PNE 2014-
2024) - meta “11.13” menciona a ação afirmativa como
2014
mecanismo de combate a desigualdade étnico-racial e na
(25 de junho/
meta “12.9” indica o uso de políticas de ação afirmativa na
Brasil)
educação superior. Disponível em: http://portal.stf.jus.
br/processos/detalhe.asp?incidente=2691269
Acórdão na Argüição de Descumprimento de Precei-
to Fundamental 186/DF - Com relação a cotas em IES
para negros(as) registra: “todos nós temos a responsabi-
lidade de reparar os danos causados pelos equívocos de
2014 nossos antepassados, sob pena de, ao contribuir, ainda que
(STF- Brasil) por omissão, para a perpetuação daquelas mazelas, nos
tornarmos partícipes desses erros lastimáveis”. (BRASIL.
STF. 2014,Voto p. 9).
67
Acórdão na Ação Declaratória de Constitucionalida-
de 41/DF (Lei nº 12.990/2014) - com relação a cotas
em IES para negros(as) registra que “o primeiro funda-
mento é uma reparação histórica a pessoas que herdaram
2017 o peso e o custo social do estigma moral, social e eco-
(STF - Brasil) nômico, que foi a escravidão no Brasil”.(BRASIL. STF.
2017, Relator,p.7-8).
68
As informações expostas nesse texto permitem considerar como fa-
tor condicionante da reserva de vagas para negros(as) no Brasil fatores
políticos decorrentes de uma práxis negra, resultante da manifestação,
organização e articulação do movimento negro que estruturou relações
de solidariedade em uma luta antirracista. E igualmente considerar, que
69
no Brasil a partir do inicio dos anos 2000, a ascensão ao Poder Executivo
de um grupo ideológico-político sensível a algumas pautas do movimento
negro e com o qual existiam algumas alianças anteriores as eleições do
ano de 2002, influenciou em forma de legislação a elaboração de uma po-
lítica de Estado de combate ao preconceito, a discriminação e ao racismo.
70
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71
A contAção de HistóriAs e A resistênciA pelA identidAde
culturAl brAsileirA
Primeiras considerações
[...]
Por que mesmo que queimem a escrita,
Não queimarão a oralidade.
Mesmo que queimem os símbolos,
Não queimarão os significados.
Mesmo queimando nosso povo,
Não queimarão a ancestralidade.
(BISPO, 2015, p.45).
75
pela preservação da mesma. Ambas contribuindo para a construção da
identidade cultural brasileira.
De acordo com Said (1993, s/p), “em nossa época, o colonialismo
direto se extinguiu em boa medida; [já] o imperialismo [...] sobrevive
onde sempre existiu, numa espécie de esfera cultural geral, bem como em
determinadas práticas políticas, ideológicas, econômicas e sociais”. Nessa
direção, compreende-se que a colonização de forma direta no Brasil se ex-
tinguiu, no entanto, os povos afro-pindorâmicos continuam sendo ataca-
dos de outras formas, como com o silenciamento de suas culturas. Negar
a tradição oral e tentar substituí-la pela escrita, ao invés de propor que
as duas coexistam, é uma tentativa de re-colonização por parte do pensa-
mento ocidental. Assim, a resistência cultural se faz como forma de en-
frentar o etnocídio vivenciado no Brasil (Ibdem). A contação de histórias
apresenta-se como possibilidade de preservação e repositório da história e
memória dos povos afro-pindorâmicos para resistir ao genocídio cultural
que assola o país e que tenta excluir a tradição oral.
Posto isto, a vivência da prática de contação de histórias pela so-
ciedade como um todo mostra-se como prática essencial para a preser-
vação da herança cultural brasileira manifestada pelos povos afro-pin-
dorâmicos. Experienciando-a de modo intenso, contínuo e frequente, e
integrando-a como constituinte da rotina e possibilidade de aproxima-
ção com a terra, assim como os povos originários e diaspóricos a viven-
ciam desde as nossas origens.
Considerações finais
76
bém encarregues pela manutenção e preservação desse conhecimento e
herança ancestral. Dito isto, a contação de histórias se posiciona com uma
relevância social de suma importância, ao preservar esta herança cultural
a sociedade tem mais força para resistir às imposições culturais externas,
inserindo o Brasil no centro de produção e manutenção do seu próprio
conhecimento.
Referências
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CNPQ, 2015.
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memória e estímulo à imaginação. Nau Literária, v. 4, n. 1, 2008.
77
que lo que es semilla
llegará a ser fruto
experiências em
educação a partir
de Kusch
por
seção 2
A sAbedoriA guArAni e A psicologiA complexA
como contribuições à educAção
82
conflui com a psicologia complexa à medida em que respeita a organicida-
de, os símbolos e a individualidade do ser humano, contribuindo de forma
elementar para a germinação dessa luta por uma educação com alma.
A compreensão da educação se reflete, por fim, nesse diálogo de cos-
mologias e de concepções educativas, percebidas ao longo da convivência.
A sabedoria Guarani apresenta uma educação assentada em princípios: a
relação entre o divino e o humano, entre o espírito e o corpo, sendo esse
último almado, em uma busca pela perfeição. Essa corporeidade foi viven-
ciada nos encontros através de vivências de biodança, em que desenvol-
vemos o olhar para o outro. Nessa percepção, as crianças representam o
limiar dessa relação divino-humano, o que provoca esse olhar diferenciado
a elas. Falamos, dessa forma, de uma educação intercultural como encon-
tros cosmológicos, em que corpo e espírito se integram em uma mesma
dimensão (BERGAMASCHI; MENEZES, 2016).
O projeto de encontros foi tão bem aceito que decidimos dar-lhe
continuidade, formando novos grupos de estudantes, de diferentes anos
escolares, a serem trabalhados durante o segundo semestre de 2019. En-
tendendo a comunidade escolar como dotada de alma e de completude,
vimos também a necessidade de estender este projeto aos professores da
instituição. Trabalhando com uma metodologia de pesquisa colaborativa
e participante, concluímos que as práticas e princípios educativos Gua-
rani contribuem com uma educação integrada ao sensível, ativando uma
função psíquica simbólica no pensamento. Temos experienciado as apren-
dizagens interculturais com os Guarani como espaços de formação educa-
tiva, através dos quais a vivência, a intuição e a imagem são integradas à
educação e ao autoconhecimento no diálogo e ressignificação da aprendi-
zagem na educação básica.
Referências
BERGAMASCHI, Maria Aparecida; MENEZES, Ana Luisa Teixeira de. Crian-
ças indígenas, educação, escola e interculturalidade. Revista e-Curriculum,
[S.l.], v. 14, n. 2, p. 741 - 764, ago. 2016.
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Valdemar de Amaral. Petrópolis: Vozes, 1981.
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Ross, 2012.
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TASAT, José Alejandro; PÉREZ, Juan Pablo (orgs.). Arte, estética, literatura
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84
o diálogo de freire e KuscH com A educAção indígenA
86
O pensamento de Rodolfo Kusch
Referências
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ZITKOSKI, Jaime José. Horizontes da refundamentação em educação popu-
lar. Frederico Westphalen: Editora URI, 2000.
89
cAminHos pArA o ninHo de resistênciA e sAberes
indígenAs em espAço escolAr
92
em andamento um projeto chamado “Língua materna”, proposta como
processo de “levantamento” de sua língua originária. Segundo Ana Lúcia
Ferreira de Souza, que é diretora da escola, em seu trabalho de conclusão
de curso “A história do povo Karapoto Plak-ô no processo de reelabora-
ção linguística”, já estão atuando na escola para recuperação da língua
do tronco Macro-Jê, através da gramática kariri. Para Souza, “a língua
indígena foi deixada para trás, sendo substituída pelo Português, mas aos
poucos está sendo levantada” (2007, p.34). Levantar significa erguer e não
se ergue algo que já se perdeu, mas figurativamente, lembro uma árvore,
curvada pelo vento e que após a tempestade retorna seu tronco em direção
ao sol do meio dia. Ergue-se, majestosa, apoiada em suas raízes.
Considerando que o Brasil é um país multilíngue, compreende-se
as políticas que justificam esta condição, mas, na prática, sem ações efeti-
vas que atendam aos falantes de línguas diversas. Aos povos indígenas é
dado o direito ao “fortalecimento das práticas socioculturais e da língua
materna de cada comunidade indígena”, disposto no Art. 2º do Decreto
nº 6.861/2009, ao tratar sobre os objetivos da educação escolar indígena.
Na Escola Estadual Indígena Itapó, apesar de ainda constar como
projeto, a língua materna vai sendo reelaborada e com força para ser in-
troduzida no currículo escolar, como determina a Lei de Diretrizes e Ba-
ses da Educação Nacional – LDBN/96.
Fonte: A autora
93
Percebo que a escola, mesmo sendo denominada indígena e funcio-
nando em seu território, não é espaço para revelação dos segredos de sua
cultura e religiosidade. Estes continuam protegidos dos “cabeça-seca”2.
A escola, então, se revela apenas um instrumento para “ser” e aprender a
conviver com o mundo ocidental, para o indígena um “não-lugar”3, sem
referência identitária, em oposição ao espaço antropológico que é a terra/
aldeia indígena, criadora de identidade. Mas, mesmo assim escutamos o
que reverbera na escola, desse estar indígena.
Durante a formação, várias atividades foram sendo propostas e ela-
boradas. Três grupos foram formados e cada um ficou responsável por
refletir e produzir de acordo com os saberes tradicionais e as práticas
coletivas. A primeira atividade foi a confecção de um calendário, em forma
de mandala, com os meses do ano escritos na língua materna. Em função
do tempo, apenas três indicadores foram utilizados: climáticos, da comu-
nidade e da escola. Sobre a mandala, Kusch (2000) diz que sua origem está
na sabedoria dos povos originários; segundo o autor, os conhecimentos
indígenas são mandálicos.
A mandala criada pelos professores contempla atividades escolares
comuns a qualquer espaço escolar não indígena, exceto nos meses de ja-
neiro e fevereiro (tuãdara e piracema), quando a comunidade vivencia seus
rituais. O calendário foi caracterizado por uma dimensão bilíngue (ima-
gem abaixo), proposto e elaborado pelos professores indígenas.
Fonte: A autora
Ao fundo, o som da maraca... Durante todo o dia a maraca foi tocada, não
ousei perguntar quem ou porque aquele som se fez presente todo o tempo.
(...) Neste dia retorno da escola, localizada no município de São Sebastião,
bastante feliz, encharcada de esperança e entusiasmo, culpa da chuva que
o tempo todo insistia em invadir a sala pelas brechas das telhas. Sentia que
começava a vislumbrar o ninho... (Diário de campo, 10 jul. 2019).
96
Referências
AUGÉ, Marc. Não-Lugares: Introdução a uma antropologia da supermo-
dernidade. São Paulo: Papirus, 1994.
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dade de Formação de Professores de Penedo – FFPP da Fundação Educacional
do Baixo São Francisco Dr. Raimundo Marinho – FEBSF. 2007.
97
encontro com As culturAs indígenAs: quAndo As AulAs
podem ser um espAço-tempo pArA problemAtizAr e recriAr
formAs de ver, dizer e celebrAr As diferençAs
100
história que foi (e continua sendo) drasticamente alterada pela realidade
da colonização (ISA, 2015a).
O processo de povoamento dessas terras, desencadeado pelos co-
lonizadores europeus, propôs agrupamentos e divisões desses grupos
de habitantes em tribos, famílias e troncos linguísticos. Assim, referir-se
aos indígenas3 habitantes do território rio-grandense, até os dias de hoje,
pressupõe considerar sua família linguística.
Por outro lado, cabe reafirmar que os atuais povos indígenas brasi-
leiros são os grupos descendentes dos primeiros habitantes do continente
4
3 A expressão genérica povos indígenas refere-se a grupos humanos espalhados por todo
o mundo, e que são bastante diferentes entre si. É apenas o uso corrente da linguagem
que faz com que, em nosso país e em outros, fale-se em povos indígenas. (ISA, 2015b).
4 Atualmente encontramos no Brasil povos indígenas falantes de mais de 150 línguas dife-
rentes. Esses povos somam, segundo o Censo IBGE 2010, aproximadamente 897 mil indí-
genas. Sendo que, aproximadamente 324 mil vivem em cidades e 572 mil vivem em áreas ru-
rais, o que corresponde aproximadamente a 0,47% da população total do país. (ISA, 2015a).
5 A população Guarani no Brasil esteve estimada, em 2008, em aproximadamente 51
mil pessoas entre os Kaiowá (31.000), Ñandeva (13.000) e Mbya (7.000), distribuídas em
vários estados do Brasil, inclusive no Rio Grande do Sul.(ISA, 2015c)
101
Resultados e discussões
[...] que a escola ajudasse, não apenas a constatar o óbvio (há uma multi-
plicidade de entes diferentes de mim), mas que essas diferenças não fossem
mais vistas como ameaça ou anomalia. Esse esforço de alteridade pode (e
deve) ser papel da escola e de nós, professores.
Considerações finais
Referências
INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL (ISA). Instituto Socioambiental. Disponí-
vel em: http://pib.socioambiental.org/pt/c/no-brasil-atual/ quem-sao/povos-
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______. Disponível em: http://pib.socioambiental.org/pt/c/no-brasil-atual/
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ensinar geografia: rompendo rotações. Porto Alegre: Evangraf, 2015. p. 55-71.
103
A comunidAde e os fenômenos coletivos como elementos
fundAmentAis dA quAlidAde nA educAção básicA
Introdução
106
Os elementos indicados pelo autor com relação a aspectos que im-
pactam positivamente na aprendizagem e, dessa forma, são relevantes
para uma “escola bem-sucedida”, exponho a seguir. Não é possível fazer
uma escala precisa de quais elementos elencados impactam mais nos re-
sultados dos alunos, pois estão relacionados a uma série de variáveis, mas
os três primeiros se mostraram bastante relevantes, sendo que o primeiro
impacta mais nos resultados dos alunos do que todos os outros juntos:
107
educação na história recente do Brasil a partir do movimento organizado
dos secundaristas que, no ano de 2016, ocuparam centenas de escolas em
todo o país. Assim, a percepção de qualidade expressa neste conflito parece
estar muito mais ligada à valorização da eficácia da escola em proporcionar
o desenvolvimento individual dos sujeitos, propiciando que sejam capazes
de pôr em prática seus projetos de vida e de carreira pessoal de manei-
ra isolada, negando a possibilidade da escola de fomentar um projeto de
amadurecimento social e comunitário pautado nas relações humanas e no
desenvolvimento coletivo. Esta situação é acompanhada pelos sistemas de
avaliação implementados, que costumam utilizar instrumentos de avaliação
individual, sem reconhecer uma potente inteligência coletiva que pode ser
criada com a articulação e aproximação dos grupos humanos.
Considerações finais
108
Referências
ANTUNES, Diogo Silveira Heredia y. Da inovação em educação às escolas
emergentes: papel social, valores e estratégias para formação humana. 2018. 168
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canos sobre maneiras de se relacionar.Trad.: Débora Weinberg. 2ª Ed. São
Paulo: Odysseus Editora, 2007.
109
referentes éticos mApucHe en lA investigAción
científicA: unA necesidAd urgente en contextos
interétnicos e interculturAles
Fernando Fuica-García1
1 ffuica@uct.cl
111
El campo de la educación, o mapunche kimeltuwün, se orienta por
principios éticos que refiere al zapin zugu o cultivo de la persona; el pekan-
gekelay ta che, entendido como alguien que se dice ser persona, que no se
orienta por idea erráticas y/o descuidados en plantear su razonamiento y,
por último, en el kishu günewkelay ta che, donde el ser humano se rige por el
orden del mundo existente y no es conveniente transgredirlo, dado que al
hacerlo compromete el equilibrio de los demás (Catriquir y Durán, 2007).
En este enfoque cultural mapunche, el ser che implica regirse por el prin-
cipio valórico de la reciprocidad de la vida intra-societal mapunche, cuya
relación se da tanto a nivel interpersonal, intercomunitario y más allá de
ello, con la naturaleza y las fuerzas superiores.
A partir de lo anterior, se observa una necesidad de incorporar los
elementos sustantivos de la identidad y entender del pueblo mapuche en
los espacios de construcción de conocimiento formal. Desde la constitu-
ción del Comité de Ética de la Investigación (en adelante CEI) de la UCT,
cuyo objetivo es resguardar los estándares éticos de las investigaciones
científica, se responde a la necesidad de aplicar criterios como el de dis-
cernimiento y el de pertinencia en los proyectos presentados en contexto
intercultural. Esto es relevante, no solo porque responde a la Visión y
Misión de la UCT, sino porque atiende a la realidad geográfica y cultural
del contexto en el que se instala. En un CEI situado, la ausencia de este
tipo de referentes en la revisión y evaluación de los proyectos presenta-
dos, tensiona el contrastar los objetivos y metodologías propuestas, con
los valores y principios que sustenta la ética mapuche.
En la revisión realizada de distintos CEI de Chile, se constata la
ausencia de una reglamentación que haga explícita tanto los puntos de
referencia posibles que sustentan la cosmovisión mapuche, como la gene-
ración de alguna instancia de devolución objetiva de los resultados de las
investigaciones que recaen en los denominados “grupos estudiados”. Con
esto se recoge una antigua demanda de la comunidad mapuche a quienes
muchas veces se los ve sólo como objeto de investigación. Si se incorporan
como referentes éticos del marco teórico en los proyectos de los investiga-
dores, algunos de los principios éticos propios del mundo mapuche, como
por ejemplo: Kümeche, Kimche, Norche, Külfünche, sus resultados permiten
contribuir en la concreción del llamado Küme Mongen (el buen vivir) en la
sociedad mapuche y no-mapuche.
Cuando reflexionamos acerca de estos valores presentes en el mun-
do mapuche necesariamente nuestros planteamientos nos conducen a re-
pensar lo que se viene denominando como interculturalidad, lo primero
que aflora es la pregunta ¿Existe un pensamiento ético latinoamericano
112
que se inspire en la axiología indígena? ¿Hay una identidad ontológica o
epistemológica de la investigación que sea tributaria de autores nacidos
y formados en un contexto poscolonial y que sean críticos de la episte-
mología eurocéntrica? Sin duda que responder a las cuestiones anteriores
implica no sólo trascender la influencia, innegable, de la tradición greco
romana, o pensamiento occidental, sino que implica asumir en qué medida
es posible plantear otra reflexión que sea, a la vez, original y distinta de
lo planteado desde un euro centrismo epistémica que ha permeado por
décadas la formación intelectual y académica de los científicos.
No se trata de afirmar la tesitura de que pensadores y filósofos de
nuestra América construyan referentes identitarios desde un horizonte
puramente latinoamericano. En efecto, la sola pregunta de si existe algo
así como una “filosofía” o un pensamiento propio y original surgido desde
estas latitudes, es en sí mismo un horizonte de problematicidad. Es inne-
gable que las premisas fundantes han sido heredadas y remiten a la tra-
dición occidental, pero lo anterior no implica necesariamente desconocer
el profundo valor de los saberes indígenas, y que requerimos abrirnos a
unos espacios nuevos de convergencia y dialogicidad que reúna a la vez
una propuesta e interpretación que no desconoce la referencia iniciada en
la Grecia de Sócrates y Platón acerca del eidos y de la episteme, pero que al
mismo tiempo cuestiona la visión limitada de que en otras sociedades no
se haya encontrado formas profundas de saber. La crítica al colonialismo
eurocéntrico es que desconoce la existencia de una diversidad de saberes
y de cosmovisiones que existían previo a la llegada de los colonizadores,
y que nos aportan hasta hoy de una especificidad referencial y existencial
fundando elementos precisos de análisis de la realidad cósmica y humana
que no pueden ser descartados a priori.
Lo que la interculturalidad actual nos plantea en definitiva es abrir
un espacio de diálogo de saberes que, en sí mismo, supere toda posible
asimetría de primacía de un pensamiento sobre otro. En este contexto
que la filosofía de Kusch es un gran aporte a la reflexión de la América
profunda de una américa que nos abre a saberes y mundos de la bella
morenidad (Chihuailaf). Desde este pensar situado, tanto desde la epis-
temología hasta la antropología surge nuevas formas de interpelación
y de construcción de lo que se denomina “filosofía intercultural”. No
cabe duda que el pensador argentino se atreve a trascender la cosmovi-
sión impuesta desde los referentes histórico-filosóficos que han sido el
sustento tradicional de la formación y enseñanza en Filosofía, lo que lo
convierte en un punto de referencia indudable cuando planteamos un
pensamiento original desde el continente.
113
En todas las sociedades, tradicionales y modernas, hay prácticas que
involucran un conjunto amplio de actores sapienciales que interactúan
entre sí y con otros. Estas interacciones, a partir de valores, desarrollan
acciones, creencias, teorías y principios, idealmente en constante evalua-
ción (Olivé, 2009). Esto desafía el espacio de la ética y la investigación
científica, puesto que al incorporar la cosmovisión mapuche se atiende a
una epistemología descentralizada e intercultural.
Asimismo Gunther Dietz, Mateo Cortés y Laura Selenecoaut
(2011) señalan que en el contexto latinoamericano de la última década,
el discurso intercultural ha conseguido la apropiación de académicos
y políticos donde se constata un ‘giro poscolonial y/o descolonial’. Se
atiende cuidadosamente a la coexistencia de conocimientos, lenguas y
culturas de sociedades distintas, pero se sigue imponiendo unas sobre
otras, de forma evidente y avasalladora, manteniendo la asimetría, la
subalternación y “la matriz colonial de poder, [se]… hace legítima, y lo
que es peor, la reproduce permanentemente en su discurso de inclusión
o reconocimiento” (Quintriqueo, Quilaqueo, Lepe-Carrión, Riquelme,
Gutiérrez y Peña-Cortés, 2014, p. 24).
Romper con el discurso de inferiorización instalado desde la colo-
nialidad y que permita entender la importancia de los saberes mapuche, es
incorporar los conocimientos de aquellos a los que históricamente se les
ha desplazado y revalorar su cosmovisión, con la que cuenta y ha hereda-
do. Sin embargo, esto ha de hacerse no sólo con una intención de reivin-
dicación, al enmarcarles/nos en un lugar que los reconoce como “otros”
-puesto que ello sería mantener una diferenciación que segmenta y por
ende excluye-, sino como pueblos con cultura propia y con un patrimonio
(Quilaqueo, Quintriqueo y Cárdenas, 2005).
Referencias
114
CEPEDA, Juan. (2010). Ontología del estar: una aproximación a la obra de Ro-
dolfo Kusch. Análisis. Revista Colombiana de Humanidades, (77), 163-177.
115
trAjetóriAs AmeríndiAs em seus itinerários de
escolArizAção: umA reflexão do pensAmento de rodolfo
KuscH com A educAção escolAr indígenA no rs
Francisco Moreira Alves1
Íris Pereira Guedes2
Jaqueline da Rosa Cunha3
Rafael Frizzo4
Apresentação
118
Ao indicar possibilidades para a autonomia das escolas indígenas, pare-
ce aproximar-se um pouco mais dos sistemas de educação indígenas da
América Latina, no sentido de construir alternativas mais independentes
das mãos governamentais e criar sistemas de educação escolar autônomos
(BERGAMASCHI; SOUSA, 2015, p. 154).
Nhü significa campo; Porã tudo aquilo que é bom, belo e bonito. Nhü
Porã é sentimento da palavra guarani que ressoa como memória viva na tem-
poralidade das paisagens de campos, florestas, montanhas, lagoas e mar no
litoral sul do Brasil. No presente etnográfico como Terra Indígena Mbyá-
-Guarani no município de Torres (RS), localiza-se às margens do KM7, da
BR-101, sendo exemplo de referência a galpões de madeira erguidos sobre
áreas indígenas adquiridas através de medidas compensatórias nas obras
de duplicação da rodovia, com investimentos públicos que não condizem
ao estado de conservação e a estrutura de suas instalações; e que refletem,
sobretudo, o descompasso da atenção que governos apresentam para a atual
situação da Educação Escolar Indígena no Estado do Rio Grande do Sul.
Como exemplo empírico de uma escola fundada por decreto esta-
dual no ano de 2002, os dados educacionais de Nhü Porã (INEP, 2018 apud
QEDU, 2018) permitem problematizar alguns dos horizontes que gesto-
res não indígenas - juruá – exercem sobre o chão dessas escolas. Ao ana-
lisar o acesso dos números de matrículas e das infraestruturas referentes
ao ano de 2018, para a Escola Estadual Indígena de Ensino Fundamental
(EEIEF) Nhü Porã, registram-se uma média de 11 alunos matriculados
na pré-escola, 25 alunos nos anos iniciais, entre o 1ª e 5ª ano, e 3 alunos
nos anos finais, entre 6º e 9º ano; sem registrar a presença constante de
crianças – enquanto número de matrícula – no atendimento da creche ou
na modalidade da Educação de Jovens e Adultos (EJA).
De acordo com os mesmos registros, o público escolar não possui
acessibilidade adequada às dependências da escola referentes à inclusão
de portadores de deficiências. Seus sanitários, consequentemente, também
não possuem acessibilidade diferenciada. Mesmo possuindo cozinha am-
pla e refeitório para o preparo e oferecimento dos alimentos, a escola não
contém laboratório de informática, tampouco sala de ciências e biblioteca
como ambiente específico de leitura e estudo. Quadra de esportes inexiste,
120
como também espaços diferenciados para atendimentos especiais. Apenas
um computador é registrado para uso dos alunos, e dois para uso admi-
nistrativo, ambos com internet restrita. Na mesma sala da direção fica a
sala de trabalho dos professores – indígenas e não indígenas –, servindo
ao atendimento necessário das demandas especificas. Localizada numa re-
gião de abundancia de águas, seu abastecimento potável é por poço arte-
siano, alimentado por energia da rede pública, mas que têm como destino
final um inadequado esgotamento sem o registro de fossas. O lixo, segun-
do nos mesmos dados, é coletado periodicamente pela municipalidade.
Sob o olhar dos mais velhos e o entendimento pedagógico quase que
silencioso das mulheres, os empecilhos burocráticos oferecidos cotidiana-
mente pelos serviços estatais às escolas indígenas no Rio Grande do Sul,
observam entendimentos de completo desrespeito e que servem apenas
como mecanismos de desvalorização frente à autonomia das comunida-
des indígenas em seu entendimento espiritual e político do que entendem
como Educação. Quando a materialidade de recursos básicos para o fun-
cionamento mínimo de uma escola funcionar é escassa, quanta alegria nos
corações é necessária para transbordar o descaso com que cada criança
“matriculada” convive a cada dia, entre a pré-escola e as turmas de primei-
ro ao nono ano, na educação de jovens indígenas?
Considerações Finais
121
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ra/sobre>.
122
lA interculturAlidAd como sAber emergente y
trAnsversAl en lA educAción primAriA de lA
provinciA de córdobA, ArgentinA
Hebe Gargiulo1
Carlos Norry2
124
educativos de forma que nos permita reconocer los sentidos de la inter-
culturalidad en la escuela con el fin, no solo de describir qué pasa, sino de
poder reconocer la interculturalidad como un emergente que interpele a
las instituciones y sus contextos.
Referencias
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WALSH, C. Interculturalidad crítica y (de)colonialidad. Ensayos desde Abya
Yala. Quito: Abya-Yala, 2012.
125
fAzeres educAtivos no estAr sendo
dA teKoá yvy poty
Jéferson Pereira Tanger1
Introdução
Metodologia
128
Algumas imagens ficaram gravadas na minha memória: como o mo-
vimento dos corpos unidos de aproximadamente seis crianças, que rodea-
vam uma mulher adulta deitada no chão, por onde refletia a luminosidade
do sol. Seus corpos, em harmonia, estavam intimamente conectados à na-
tureza, pelo contato com a grama e pela energia emanada pelo astro. Em
outra oportunidade, como relatei em meu caderno de campo, avistei um
grupo de aproximadamente dez crianças e adolescentes que dialogavam
próximos a uma árvore. O som de suas vozes se confundia com o som do
silêncio que modelava a totalidade da comunicação e das percepções. Per-
cebi que se educavam e eram educados pela integralidade emanada pelas
almas, pela alternância de sons e silêncios e pela disposição dos grafismos
espalhados pelos espaços da aldeia. Mais tarde fui convidado a participar
de uma descida ao rio, localizado na parte baixa da aldeia. Ao caminhar
com os indígenas senti a reciprocidade e a temporalidade, em gestos e di-
zeres profundos, onde os Guarani se educam. A atividade na água é lúdica
e divertida (figura 02). Na volta, próximo à escola indígena, ao entardecer,
assisti à dança Guarani. Momentos criativos de retorno ao passado que se
faz presente e atualiza a cosmologia deste povo.
Se trata del estar como algo anterior a ser y que tiene como significación
profunda el acontecer. En el estar se acontece, porque se esta en la expec-
tación de una possibilidad que se da en un ámbito pré- ontico, al margen
de cualquier necessidad de crear superestruturas a eso que acontece, antes,
por lo tanto, de la constituición de objetos (KUSCH, 1978, p. 227).
129
Para este autor o estar cotidiano dentro da cultura adquire profun-
do significado no acontecer. O momento vivido antecede a palavra expli-
cativa e gera saber antes das definições causualisticas, da racionalidade
como praticamos e entendemos. Os movimentos no estar acontecem de
maneira criativa e com uso da imaginação poética que constrói o presente.
Buscam assim, os elementos da educação individual e coletiva, bem como,
a criatividade e a força para viver o tempo que é um só. Desde as primeiras
aproximações senti que os Mbyá da Yvy Poty concedem bastante liberda-
de às crianças, nos espaços da aldeia. Fazendo com que se desenvolvam no
estar sendo consigo mesmo e com a coletividade nos acontecimentos vi-
vidos na reciprocidade, e também com a totalidade existencial de cuidado
mútuo. Na Tekoá Yvy Poty os indígenas se reúnem todas as manhãs em
um puxado de madeira, ao lado de uma casa grande (figura 04), onde vive
o cacique com sua família. Todos ficam no centro do diálogo onde falam
sobre política, temas que afetam a vida diária e sobre assuntos de sua cul-
tura. Neste espaço, onde as decisões são tomadas, também são revelados
os conteúdos dos sonhos e de acontecimentos, que evocam imagens do
passado compartilhado, no transcorrer da vida diária.
130
En segundo término dicha sobredeterminación señala la importancia que
el pensamento del grupo adquiere para comprender todo lo que se refiere
al mismo. Se trata de un pensamiento condicionado por el lugar, o sea que
hace referencia a un contexto firmemente estructurado mediante la inter-
sección de lo geográfico con lo cultural (2009, p. 253).
131
Percebi que a trilha, na parte alta da aldeia, é uma maneira de ensi-
nar e aprender para os Guarani desta Tekoá. Cada criança tem seu tempo
e suas reações respeitadas. Alguns nascem para praticar uma sabedoria,
outros para serem guerreiros e outros para serem professores, mas todos
devem praticar o modo de ser Guarani e devem ser respeitados. Constatei
que o comportamento durante as atividades são observados e expressam
as qualidades e as “fases de desenvolvimento”. Para os Guarani quando
alguma atividade importante é realizada na mata, como na produção des-
tes desenhos, as crianças que ficam afastadas ou assustadas estão mos-
trando respeito. Os que estão sentados e calmos demonstram coragem
para aprender e estão mais prontos para a lição daquela sabedoria, para a
apreensão imagética do mito. A trilha é como uma escola de desenvolvi-
mento. Lá é feito um trabalho educativo diário que está relacionado com
a escola da aldeia. Os traços e cores ativam o passado no presente através
da percepção de cada um. Ao mesmo tempo em que são observados ob-
servam. Sentem e pensam intuindo nesta totalidade de sensações e fazeres
gerados na reciprocidade.
Considerações finais
Referências
KUSCH, Rodolfo. Geocultura del Hombre Americano. Rosario-Provincia de
Santa Fé: Editorial Fundación Ross, 2009.
______. Esbozo de una Antropologia Filosófica Americana. Buenos Aires:
Ediciones Castañeda, 1978.
132
o “estAr sendo”
mbyA guArAni professor nA
construção dA educAção diferenciAdA no território do
litorAl norte do rio grAnde do sul
Josieli Silva1
Referências
KUSCH, Rodolfo. América Profunda. Em: Obras Completas Tomo II. Editorial
Fundación Ross, 2009, p. 01-254.
KUSCH, Rodolfo. El Pensamiento Indígena y Popular en América. Em:
Obras Completas Tomo II. Editorial Fundación Ross, 2009, p. 255-546.
KUSCH, Rodolfo. Geocultura del Hombre Americano. Em: Obras Completas
Tomo III. Editorial Fundación Ross, 2009, p. 05-239.
134
educAção indígenA sob o ponto de vistA
de seus protAgonistAs
Juçara Benvenuti1
Maria Aparecida Bergamaschi2
137
com a temática indígena e que se dispuseram a colaborar com esta produção
que, sem dúvida, constitui um marco histórico na educação brasileira.
Os 22 artigos apresentados nos permitem conhecer muitos costu-
mes, tradições, conhecimentos próprios e grande parte da cosmovisão dos
povos originários, nos permitindo uma aproximação com sua cultura, que,
como afirma Canclini (2007), são hoje os povos mais preparados para o
diálogo. Também vai ao encontro das ideias de Rodolfo Kusch (2009), que
afirma a continuidade de um passado americano no presente, a crença
em um pensamento indígena que permite o pensar desde América como
uma perspectiva para descolonizar. Diz o autor que não se trata de negar
o pensamento ocidental, mas de afirmar que há também um pensamento
local, um pensamento que decorre de uma geocultura. Portanto, se trata
de afirmar também saberes e conhecimentos originários que vigoram na
contemporaneidade, como os apresentados neste livro.
Importante ressaltar o cuidado que tivemos com os textos dos es-
critores. Para manter as características dos textos orais e não mudar a
significação atribuída ao texto, mantivemos sempre que possível as cons-
truções frasais originais. Então, é por cuidar de manter essa característi-
ca, que mesmo passando os textos por correção gramatical, mantêm-se
algumas repetições. Esse fato enfatiza a oralidade como o mais importante
meio de transmissão de saberes dos povos originários e enquadra a escola
como um recurso que agregaria os conhecimentos dos brancos, que dessa
forma agiria como um elemento facilitador do trânsito do indígena entre
as duas sociedades.
A escola, portanto, necessita ser pensada, administrada, organiza-
da pela comunidade em que está inserida, sustentada filosoficamente por
seus valores, mas a colaboração da sociedade envolvente é igualmente ne-
cessária. O diálogo intercultural é essencial para que isso se concretize,
apesar de parecer uma utopia.
O grande educador Paulo Freire ensina que o professor pode espe-
rar a concretização de seus sonhos utópicos, mas para que isso realmente
aconteça tem que desenvolver uma práxis libertadora, baseada no diálogo.
Para Freire, a educação que respeita “crenças, valores, sonhos, desejos,
aspirações, medos, ansiedades, vontades e possibilidade de saber, fragili-
dade e grandeza humanas” (FREIRE, 2000, p. 15) aponta para o conceito
do “inédito-viável” (FREIRE, 1976, p. 107) que compreende o germe das
transformações possíveis voltadas para um futuro mais humano e ético.
Ao mesmo tempo em que se apresentam os depoimentos dos pro-
fessores mostrando seus esforços em conciliar saberes teóricos e práticos,
ciência e vivência, fazemos questão de mostrar que não é necessário deixar
138
de lado um conhecimento ancestral para agregar um novo conhecimento
acadêmico. Isto nos coloca na situação de equilíbrio entre o coloquial e o
formal, entre a oralidade típica do povo indígena e a necessidade de regis-
tro escrito da academia.
Temos a valorização da fala dos mais velhos, dos sábios da aldeia,
depoimentos como: “a minha base educacional advém do universo indí-
gena, e o que aprendi na Universidade foi para adquirir somente o que
interessa para o meu povo”, estabelecendo a seguinte metáfora: adquirir
conhecimento é como pescar um peixe e comê-lo: “deveria comer somente
a carne e a espinha eu deixaria de lado”.
Referências
139
trAjetos dA práticA interculturAl no diálogo
com AgroecologistAs de mAquiné
Leonardo Castro Dorneles1
*****
143
Referências
KUSCH, Rodolfo. Esbozo de Una Antropologia Filosófica Americana. Bue-
nos Aires: Ediciones Castañeda, 1978.
______. América Profunda. Buenos Aires: Biblos, 1999.
144
A educAção dAs relAções etnicorrAciAis como método de
conHecer e vAlorizAr novAs formAs de conHecimento
145
centrada nas dinâmicas da tradição, do estilo de vida, da origem de classe
social, da proximidade ou afastamento com os meios de produção e das
riquezas, segundo o autor essa é a principal função da instituição escolar
tradicional: garantir a manutenção dos interesses dominantes através da
sistematização institucional dos conhecimentos e costumes de forma hie-
rárquica, deixando claro para a sociedade o que seriam hábitos apropria-
dos para a civilidade e o que não seria digno de ser prestigiado. É a partir
dessa lógica que a sociologia compreende as construções das violências no
cotidiano da sociedade, como que esse sistema de verticalização orienta
o que se chama de ‘campo simbólico’ e resulta em cotidianas agressões a
indivíduos e a setores inteiros da comunidade.
Na formação da América Latina, mais especificamente do Brasil,
esse sistema de violência simbólica tem suas relações diretas com nosso
passado colonial, a sociedade brasileira vive uma realidade que denuncia
através das estatísticas atuais seus séculos de exploração escrava de in-
dígenas e negros, os índices de 2018 que apontam que a população mais
pobre do país e composta 78% de negros deflagra que a grande desigual-
dade brasileira está vinculada a origem racial, resultado dos processos de
violência iniciados no período das colonizações mas que perdura no ima-
ginário social até hoje devido a um sistema de colonização mais profundo,
uma colonização cultural que durante a história foi tão sistematizada em
nossa dinâmica social cotidiana que é esse sistema colonialista que até
hoje estrutura nossas instituições.
Em 2003 foi sancionada a lei 10.639 que estabelece a obrigatorie-
dade do ensino de ‘cultura e história africana’ dentro das disciplinas que
já fazem parte do currículo das escolas, mais tarde em 2008 essa lei foi
ampliada pela lei 11.645 que acrescentou ‘história e cultura indígena’ no
texto. Ao perceber as tendências eurocêntricas que são intrínsecas a ins-
tituição da escola tradicional a presença de uma lei que preveja a obriga-
toriedade do ensino dessas outras histórias que ao mesmo tempo que se
fazem tão presentes no cotidiano da sociedade são invisibilizadas quando
buscam ocupar esses espaços institucionais é importante para provocar
pelo menos o início de uma ruptura com as dinâmicas etnocêntricas dos
saberes reproduzidos nas escolas. Em meus estudos no curso de Ciên-
cias Sociais sobre as diretrizes curriculares nas escolas públicas de Porto
Alegre e nas atividades que exerço no Colégio de Aplicação da UFRGS
percebi que a obrigatoriedade imposta pela lei 11.645 ainda é insuficiente
para se desconstruir o distanciamento que se estabeleceu entre o universo
dos saberes escolares com os saberes dessas outras culturas dentro dos
moldes da escola padrão, ainda que tenha se dado mais espaço dentro das
146
salas de aula para discussão de assuntos que abordem a história africana
e cultura dos povos indígenas a escola tradicional ainda se mostra inca-
paz de apresentar esses conhecimentos de forma horizontal, pois todo o
processo de formação de conhecimento que se consagrou dentro dessas
instituições de ensino e que até hoje é o procurado e reproduzido é fun-
damentalmente eurocentrado, que encontra valor intelectual só naquilo
que dialoga diretamente com o método científico e fazendo com que essas
histórias que antes eram invisibilizadas dentro das escolas agora ocupem
algum espaço mas ainda exercendo um certo nível de inferioridade, como
se fossem menos aptas ao conhecimento, menos desenvolvidas em seus
pensamentos acerca da criação do saber e, portanto, acabaram por subme-
terem-se ao desenvolvimentismo do colonizador.
O desafio de quem tenta se inserir nessa dinâmica escolar com o
objetivo de promover a educação das relações etnicorraciais de forma
complexa e intercultural é justamente saber reconhecer e amenizar os
obstáculos do etnocentrismo que é presente a todo o momento dentro das
escolas. Em 2017 quando iniciei trabalhos com esses interesses no Colé-
gio de Aplicação juntamente com a professora Tanise Müller o primeiro
e mais evidente obstáculo que se percebeu foi a total ausência de repre-
sentatividade de outras culturas dentro da escola, pois o colégio, assim
como a grande maioria das escolas, apresenta um número extremamente
reduzido de estudantes negros e nenhum professor negro integra o corpo
docente do colégio. Buscando proporcionar uma aproximação que clara-
mente faltava no ambiente escolar recorremos ao projeto das saídas de
campo em parceria com a Tekoá Guarani Mbya Pindó Mirim de Itapuã,
com o quilombo do Areal da Baronesa, o Quilombo dos Alpes, o percurso
dos Territórios Negros em Porto Alegre, que foi extinto pela prefeitura
no início de 2017. A ideia de se deslocar até esses lugares não é apenas
para despertar um maior interesse nos alunos, também é importante para
reforçar a ideia de que devemos entender que não é apenas dentro de um
colégio que se constrói conhecimento, estando em contato com essas dife-
rentes realidades e enxergando empiricamente como essas culturas e tra-
dições permanecem vivas e presentes em nossa comunidade os estudantes
se afastam da percepção que é construída isolada dentro dos muros da
escola, aonde eles estudam de forma distante como se aquilo não perten-
cesse de fato a eles, enquanto através da valorização e do descobrimento
cada vez mais aprofundado dessas identidades podemos iniciar um traba-
lho de construção de uma educação intercultural que de fato represente
dentro do espaço escolar de forma horizontal as diferentes formas de ex-
pressão da diversidade humana. Além do deslocamento até esses locais
147
tradicionais fora do colégio também é muito importante buscar ocupar
cada vez mais o espaço escolar com essas referências culturais outrora
invisibilizadas, durante esses anos foi feito um trabalho com os alunos do
quarto ano dos anos iniciais que buscava também estudar as origens da
nossa identidade assim como as origens dos nossos conhecimentos, muito
foi questionado sobre o que seria ciência e o que seria mitologia, sempre
tendo como plano de fundo a educação das relações etnicorraciais. Em
diversas aulas foi discutido sobre o que um saber precisava atingir para
ser considerado ciência e foi através de exposições sobre as civilizações
Americanas do período pré-colonial, Incas, Astecas, Mayas, e reflexões
sobre mitologia indígena e africana que discutimos sobre as tecnologias e
saberes que esses povos tinham, os motivos de não sabermos mais sobre
as suas histórias, e porque nossa sociedade não enxerga os saberes dessas
culturas como científicos. Os estudantes do quarto ano construíram um
projeto de iniciação cientifica que busca exatamente analisar os conheci-
mentos dessas culturas que foram marginalizados pela história, mas que
de certa forma estão presentes em nossas vidas todos os dias, como a rela-
ção com a natureza, a alimentação, os olhares sobre os planetas e estrelas,
entre outras fontes de saber que já faziam parte da sociedade das Améri-
cas antes da chegada dos europeus.
Durante o desenvolvimento desse projeto pude perceber o quão en-
riquecedor poderia ser a descolonização do conhecimento como já estu-
dado pelo sociólogo peruano Aníbal Quijano(1998) e também a descolo-
nização do currículo escolar, a partir do momento em que passamos a nos
relacionar com o conhecimento de forma menos etnocentrada se estabele-
ceu de forma quase que orgânica um espaço muito mais facilitador para a
interdisciplinaridade na abordagem dos assuntos, tanto durante as aulas
como nas produções feitas pelos estudantes, traçando paralelos entre his-
tória, religião, ciências, línguas, toda uma nova forma de se movimentar
os próprios saberes que talvez não tivesse sido tão bem aproveitada se
permanecêssemos nos métodos moldados pelo padrão de escola ocidental.
Esses movimentos iniciais de ruptura com os vínculos coloniais es-
tabelecidos com o norte são fundamentais para uma compreensão mais
aprofundada da realidade da América Latina, como foi estudado por Ro-
dolfo Kusch(2000) , ao perceber a necessidade de uma nova epistemologia,
uma visão do mundo a partir dos olhares latino-americanos, ou seja, uma
forma de se desestruturar a noção sistemática de saberes eurocentrados
reconhecendo-os como como inadequados para se refletir realmente sobre
o continente americano, fica como responsabilidade de quem objetiva a
construção cada vez maior do espaço das discussões da educação das rela-
148
ções etnicorraciais reformar gradualmente, com potencial revolucionário,
os espaços já legitimados pelas instituições ocidentais como territórios
de formação de conhecimento, abrindo os muros das escolas a serviço da
sociedade e de um futuro menos violento.
Referências
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149
Aprendiendo A HAcer investigAción juntos: los procesos
de trAnsmisión de prácticAs comunicAtivAs bilingües
guArAní-cAstellAno en unA escuelA de fAmiliA
AgrícolA de corrientes, ArgentinA
Lucrecia Zárate1
Tamara Alegre2
Introducción
1 Profesora de Filosofía. Escuela de Familia Agrícola “Ñande Róga” I-36, del departa-
mento de San Miguel, Corrientes-Argentina.
2 Profesora en Ciencias de la Educación. Becaria doctoral UNNE-CONICET.
151
Py, 2003). También compartimos con estos autores la idea sobre las ven-
tajas de reemplazar la noción clásica de competencia por la de repertorio
lingüístico (Gumperz, 1972) ya que esta noción presupone la existencia de
un sujeto libre y activo que ha acumulado un repertorio de recursos y que
activa este repertorio de acuerdo a su necesidad, conocimiento o voluntad,
modificándolos o combinándolos, si resultara necesario.
Objetivos
Materiales y Métodos
152
• Junio y julio. Elaboramos los árboles genealógicos, una práctica
ya instalada del Plan de Búsqueda del primer año.
• Agosto. Elaboramos los árboles genealógicos lingüísticos y pri-
meros registros de observación de eventos comunicativos en las
casas.
• Septiembre. Elaboramos cuatro mapas según las zonas de resi-
dencia de las familias del primer año. Los estudiantes se ubican
geográficamente en el mapa de Corrientes. Realizamos la pues-
ta en común sobre los registros de observación de los eventos
comunicativos en las casas. Teniendo hechas estas actividades
– árboles, registros de observación y mapas según las zonas de
residencia- elaboramos un mapa sociolingüístico preliminar de
las familias del primer año.
Resultados
153
Figura 1. Mapa sociolingüístico preliminar correspondiente a las familias
del primer año de la EFA Ñande Roga, cohorte 2017.
Referencias
Conclusiones
154
dónde el hablante va “activando” los recursos que tiene disponibles en su
repertorio comunicativo: más guaraní, más castellano, mezclado, bilingüe;
y como un “buen mbojere” dándole un orden en función de quiénes son
los interlocutores, los temas de conversación, los ámbitos y las actitudes
lingüísticas que se van interpretando en la interacción.
Las producciones sobre los eventos comunicativos nos muestran
una heterogeneidad de usos lingüísticos posibles, presentando un con-
tinuum entre una lengua y otra, entre el castellano y el guaraní o a la
inversa. En ese continuum, el uso de las lenguas se da en función de los
elementos que van constituyendo el evento comunicativo. Allí observa-
mos gradualidades, más – menos uso del castellano, más – menos uso del
guaraní, el “hablar bilingüe” en términos de los estudiantes.
De esta manera, los estudiantes fueron mostrando en cada actividad
aspectos del objeto de investigación que serían inaccesibles para “el inves-
tigador social” sin la metodología en colaboración.
Referencias
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una escuela rural: usos y significaciones. Buenos Aires: Antropofagia, 2007.
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New York, 1987.
156
movimentos de fAgocitAção e de descolonizAção
nA escolA indígenA mbyá guArAni
*****
La intuición que bosquejo aquí oscila entre dos polos. Uno es el que lhama
el ser, o ser alguien, y que descubro en la actividad burguesa de la Europa
del silgo XVI y, el outro, el estar, o estar aquí, que considero una modali-
dad profunda de la cultura precolombina y que trato de sonsacar a la cró-
nica del indio Santa Cruz Pachacuti. Ambas son dos raíces profundas de
nuestra mente mestiza – de la que participamos blancos y pardos – y que
se da en la cultura, en la política, en la sociedad y en la psique de nuestro
ámbito (KUSCH, 2007, vol. 2, p. 5 e 6).
158
Ser e estar simbolizam duas estruturas existenciais, a primeira, pró-
pria do Ocidente, a segunda, própria do indígena. O ser como cosmovisão
que é fruto do projeto ocidental para a humanidade, calcada no advento da
técnica e, historicamente, representada pela Revolução Francesa, a Revo-
lução Industrial, o contexto urbano e a democracia. A Modernidade, cen-
trada nas ideias de ciência e de progresso, é um paradigma que engendra
o ser. Desse encontro, o estar, como fundo existencial muito mais antigo e
profundo, arraigado numa solução natural como resposta humana ao caos
do mundo2 – não numa resposta artificial, pela criação de outro mundo
-, estabelece o equilíbrio entre culturas: “Se trata de la absorción de las
pulcras cosas de Ocidente por las cosas de América, como a modo de equi-
líbrio y reintegración de lo humano en estas tierras” (KUSCH, 2007, v.2,
p. 18). É da fagocitação que surge o estar sendo como categoria existencial
na América, fruto da nossa hibridez, conjunção entre estar e ser3. A fagoci-
tação é, portanto, uma sabedoria, sabedoria da América, processo fruto de
uma lógica que admite a coexistência de opostos-complementares.
Dessa lógica que não admite a coexistência de opostos surge a nar-
rativa da “aculturação”: num olhar superficial, observamos os indígenas
utilizando objetos produzidos pela cultura ocidental, como televisões, te-
lefones celulares, geladeiras, alimentos industrializados; somado a isso,
o fato de que muitas etnias indígenas resguardam seus assuntos sobre
o sagrado – diferentemente de algumas religiões cristãs, não levantam
templos imponentes nem batem nas portas das casas buscando a conver-
são de outros -, o que é visível na superfície é uma suposta aculturação,
a perda dos costumes que são base da cultura, uma degeneração que só
pode, inevitavelmente, ser resolvida por uma política assimilacionista – de
integração do indígena à sociedade. A narrativa da aculturação também
é estratégia de controle e de dominação, como decisão política ocultar a
cosmovisão indígena - ao negá-la como outra forma legítima de viver o
mundo -, com o intuito de, justamente, negar a efetividade de direitos que
possam conferir garantia à preservação e reprodução das culturas indíge-
nas como, por exemplo, nas sucessivas políticas de governo que fragilizam
e dificultam a demarcação de terras indígenas.
A ideia expressa pela fagocitação em Kush é negada porque empo-
dera o pensamento indígena, empodera os indígenas, o pensamento do
2 Sobre o mero estar: “Lo visto hasta aquí es la solución natural frente a lo que llamamos
la ira divina, o sea lo que se da como mera naturaleza” (KUSCH, 2007, v.2, pág. 97).
3 Como fala Kusch: “Nuestra autenticidad no radica en lo que Occidente considera au-
téntico, sino en desenvolver la estructura inversa a dicha autenticidad, en la forma estar-
-siendo como única posibilidad.”(KUSCH, 2007, v.3, pág. 239).
159
Outro da Europa4 (no contexto de discussão da colonialidade na Améri-
ca). Empoderar o Outro significa, nesse contexto, reconhecer a sua sub-
jetividade, a subjetividade representada no pensamento e no seu modo
específico de viver. E isso já significa inverter a lógica da aculturação ou
assimilação - uma perspectiva de integração do Outro pela extirpação de
tudo o que não é espelho para a Europa -, e é pela interculturalidade com
os Guarani, como potência para a descolonização, que tenho encontrado
caminhos para perceber-sentir-compreender a América – e a escola indí-
gena - fora desse contexto de comparação:
4 A própria criação de um que é centro, referência como normal, natural, universal pro-
duz a categoria do outro. A América se constitui historicamente como o outro que provo-
ca horror ou seduz a Europa. Exemplo disto são os relatos antagônicos sobre a natureza
e as pessoas encontradas pelos Europeus ao chegarem nas Américas, compilados na obra
“La disputa del Nuovo mondo: Storia di uma polemica” (1955) de Antonello Gerbi. A
própria expressão “Novo mundo” evidencia o eurocentrismo que ignora a história mile-
nar dos povos das Américas.
160
dos mais novos, numa disposição carinhosa e cuidadosa, de preocupação
com o aprendizado do outro. Uma disposição que reverbera ancestralida-
de, uma ancestralidade que se faz presente porque os Guarani educam uns
aos outros nessa permanente atualização do passado. Presencio cotidiana-
mente um acompanhamento de perto feito pela comunidade: mães, pais e
avós, acompanham discreta e respeitosamente a rotina da escola, sem, no
entanto, deixar de mostrar que estão presentes, o que revela mais um dos
aspectos da sua resistência:
Estos pueblos no sólo superaron la prueba del periodo colonial, sino tam-
bién el de los embates de la asimilación e integración de tiempos más re-
cientes. Cómo lo lograron? Y hasta qué punto conseguirán mantener esa
alteridad e identidad diferente? Los pueblos indígenas han mantenido su
alteridad gracias a estrategias, de las cuales una es la acción pedagógica.
En otros términos: ha seguido habiendo en estos pueblos una educación
indígena que permite que el modo de ser y la cultura se reproduzcan en
las generaciones nuevas, pero también se encare com relativo éxito nuevas
situaciones. (MELIÀ, 1998, apud PAULA, 1999)
Essa capacidade de fagocitar que o estar indígena evoca toda vez que
se confronta com novas situações - embora todas partam de uma mesma
estrutura social colonialista de imposições a culturas que não se curvam
diante da força homogeneizadora – é expressa numa atitude profunda-
mente reflexiva.
É no contexto humano de convivência que tenho visto desvelar
meus próprios conceitos preconcebidos e juízos carregados de compara-
ção – engendrados pela mentalidade urbana e ocidental -, buscando um
caminho de descolonização, de visibilidade ao que foi negado/ocultado
como experiência humana singular e tão legítima quanto à experiência
europeia de estar no mundo. A experiência americana tem seu contexto
próprio, seus próprios paradigmas e conhecimentos, sua cosmologia, sua
filosofia – precisamos, como fala Kusch, apostar no nosso próprio cultivo,
reconhecendo a ancestralidade da semente que compartilhamos na Améri-
ca, indígenas e não-indígenas.
161
Referências
BERGAMASCHI, Maria Aparecida; MENEZES, Ana Luísa Teixeira de. Edu-
cação ameríndia: a dança e a escola guarani. 2. Ed. Santa Cruz do Sul: EDU-
NISC. 2015.
KUSCH, Rodolfo. Obras completas, pocket 1ª ed. Rosario: Fundácion A. Ross,
2007, v. 2.
______________. Obras completas, pocket 1ª ed. Rosario: Fundácion A. Ross,
2007, v. 3.
MENEZES, Ana Luísa Teixeira de; VIÇOSA, Raquel Maria de Oliviera. Esco-
la diferenciada guarani: entre o viver seminal e o viver ocidental. Holos, Ano
31, vol 8, 2015. Disponível em: <http://www2.ifrn.edu.br/ojs/index.php/HO-
LOS/article/view/2430>. Acesso em 07 jun. 2019.
PAULA, Eunice Dias de. A interculturalidade no cotidiano de uma esco-
la indígena. Cadernos CEDES, Campinas, v. 19, n. 49, p. 76-91, Dec. 1999.
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi-
d=S0101-32621999000200007&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 10 jul. 2019.
162
estrAtegiAs politicAs pArA lA inclusion sociAl
164
creímos fundamental generar espacios de encuentro, intercambio y goce
donde la participación se propone para conocer, disfrutar y dialogar con
y desde propuestas artísticas culturales, en la posibilidad de crearse como
persona y como comunidad. Esto permitió, incipientemente, problemati-
zar, abrir y crear la propia identidad, de ser, estar y hacer en comunidad,
hacer memoria, y elegir hacia donde ir, cómo, con quienes. La propuesta
se dispuso a brindar espacios y proponer procesos educativos atentos a
habilitar modos de hacer (transformar) desde la diversidad, la expresión
y el intercambio artístico en el sentido creativo del hacer. La palabra, el
diálogo, la expresividad también generan desarrollo. La creatividad es un
saber hacer en el cotidiano, está presente en el modo de ser humano y ser
comunidad, es por lo que todas las áreas de la enseñanza deberían promo-
ver el desarrollo de la creatividad (el desarrollo de procesos autónomos
de exploración activa, de expresión personal, y búsquedas de estrategias
para el desarrollo). De este modo se apunta a la reflexión entre las alum-
nas jóvenes y adultas con los artistas no solo sobre la producción de las
obras compartidas sino también sobre las condiciones y modos específicos
y culturales de esta producción.
Cuando nos dispusimos a trabajar con la música, pensamos en dis-
poner de obras y de grupos de trabajadores que no sean los que las es-
tudiantes estuvieran habituados a escuchar en la radio, o por internet,
o … aquellos que se han logrado masivizar, es decir: tomando un rasgo
popular, ponerle valor por sobre otros y hacerlo identidad. Nos interesaba
la música porque nos permitía rescatar aquello que aunque sea en la me-
moria familiar o comunitaria, fuera de los medios o discográficas, pudiera
estar presente. Pensábamos en canciones con las que nos acunan, en las
que les escuchamos a las abuelas o a las tías, o a los hermanos mayores…
pero una memoria, un recuerdo que los una con el afecto de la raíz… la
raíz negada o silenciada. Volver a ponerle valor… de algún modo. En ese
preciso momento estábamos reconociendo lo negado, lo silenciado por el
estado (Escuela) y por el mercado (medios y discográficas). Sin expresarlo
de ese modo, elegíamos grupos y obras que de otro modo, no escucharían.
Supusimos que recuperar los modos cotidianos, negados, desvalori-
zados y disponerlos dentro de la Escuela, cambiar el lugar del Rito, una
práctica placentera y amorosa como es la música, el cantar, el disponerse
a la fiesta, podía de algún modo valorizar, y hacer que estas personas,
que fueron expulsadas del sistema educativo, y maltratadas por la socie-
dad, por no haberse podido sostener allí, puedan valorar esas prácticas, y
saberes y haceres propios. De esas familias, de esa comunidad. Pensar/
disputar el modo de conocimiento Occidental, racional, estático, para el
165
empleo no vital e ir hacia pensar el trabajo como tarea de transformación/
creación del mundo y de la vida, creación/producción que transforma a
las sujetas hacedoras, y a quienes participan del ritual en el cual estas
obras se disponen.
Tal vez por eso es que elegimos la música en un programa de inclu-
sión social y trabajo, porque de algún modo es aún un terreno fangoso, frá-
gil, movedizo, “simpático pero inútil”… salvo que lo convirtamos en mer-
cancía, rentable, generadora de ingresos y riquezas. Como monetarizar lo
sensible? Como monetarizar la memoria que ahí se despliega, los recuerdos
y afectos que se desparraman, en cada acorde que se ejecuta, que el ejecu-
tante dispone, y que el participante en la escucha atenta recupera de si?.
En relación al lugar de los trabajadores de la Docencia, disponen de
algún modo, de unos bienes, saberes valiosos. El conocimiento científico
que “otros” produjeron. Trabajan con libros de historia escritos por otros,
con conocimientos de física construidos por otros, con literatura escrita
por otros. Unos otros valiosos, y cuyas obras/objetos, son valiosos. Valio-
sos, tangibles, fácilmente inventariables. Y Además unos rituales valiosos,
en los cuales estos objetos se disponen, las aulas, los patios, la escuela mis-
ma. El titulo de Profesor. Tendríamos en términos de Kusch, unos obje-
tos tangibles, correspondientes al eje objetual. Unos productores de esos
conocimientos donde entraría a jugar el eje subjetivo, pero también un
eje ritual en le cual los actores concretos disponen una serie de acciones
para dar sentido a esos objetos y a esos sujetos en relación. Un ritual en el
que el amor, el compromiso, lo sensible hace trabajo, a la transformación,
a la creación, a la novedad vinculada a la tradición y la memoria. No se
monetariza esa disposición? Cuánto cuesta el afecto? Porque es útil? como
es el rito en el cual esa disposición afectiva actúa?. Es en el ritual donde
estos “objetos” adquieren sentidos, valor colectivo, y se comprenden en
una experiencia vital, supra individual porque en esa obra se condensa la
historia y el trabajo de muchas otras personas, memorias, costumbres y
biografías. Es una experiencia colectiva en tanto encuentro de unos otros
sentidos y actualiza aquellos dispuestos en las memorias, y re significado
en su nivel contextual.
En relación a las obras/producciones culturales dispuestas, ya no
como esencias, sino como relación, cada uno de estos episodios opera en
la tradición, se inserta en la tradición, pero al mismo tiempo tiene el ca-
rácter de novedad por los sentidos subjetivos dispuestos de su autor en
la producción de la obra y el encuentro con los sentidos contextuales. La
pregunta que aun late es ¿Cuál es el valor heurístico de esta experiencia
que incluye una totalidad dinámica y en expansión?
166
Referencias
Kush, R. La negación en el pensamiento popular. Buenos Aires: Las cuarenta,
2008.
Kush, R. América Profunda (Obras Completas Tomo II. Buenos Aires: Funda-
ción Ross), 2018.
167
re-existênciA indígenA nA ufrgs: movimentos do estAr
sendo indígenA universitário
170
Larrosa (2013) diz que assim como a língua é um dispositivo de
acolhida e pertencimento, também é um dispositivo de rechaço e exclusão.
Dialogando com o autor, ouso dizer que também pode ser um dispositivo
de re-existência, como nos mostram indígenas quando ocupam a universi-
dade, encontrando frestas para sua língua originária, conectando-se atra-
vés da língua do coração.
Outro aspecto bastante evidente no (des)encontro dos coletivos in-
dígenas com a universidade diz respeito às temporalidades. No encontro
entre as diferentes temporalidades, vemos que o tempo da universidade,
marcado pela linearidade, o enquadramento, a medição e fragmentação,
que pretende controlar a tudo e a todos, se sobrepõe à temporalidade vivi-
da pelos coletivos indígenas. Essa temporalidade hegemônica, conectada
a uma concepção ocidental de mundo, caracteriza-se pela velocidade, a
obsessão pela novidade, que lança o olhar para frente, no que deve ser,
sempre jogada para o futuro, numa ideia de progresso contínuo.
A monocultura do tempo linear, assim caracterizada por Santos
(2007), justamente por ser a produção de apenas uma cultura pautada por
rígidos parâmetros temporais, não acolhe outras manifestações de tempo-
ralidade, e, com isso, desperdiça o momento presente, o espaço do estar,
da pausa, da experiência. É preciso ter em vista que essa lógica é uma
entre tantas outras existentes e que, apesar de hegemônica, não é a mais
praticada tendo em vista a multiplicidade de manifestações existentes em
diferentes povos. Dorvalino Cardoso, intelectual Kaingang, expressa sua
compreensão de tempo da seguinte forma: “Para nós o passado também é
presente, e o futuro também. Mas a gente sabe que esse futuro, esse tempo
do futuro não é nosso, na verdade é de Deus, mas o passado pra nós é o
presente também” (Diário de Campo, 04.11.2015). Ao evidenciar a centra-
lidade no presente, no qual todos os tempos se fundem no aqui e agora,
também coloca no futuro a dimensão do imponderável, do incontrolável,
por isso é preciso confiá-lo a Deus.
Apesar de vermos a colonialidade do ser operando na universidade
através da organização e imposição do tempo linear, contrastando com a
natureza da própria vida, que é gestada em ciclos, indígenas universitários
mostram que o tempo ameríndio está relacionado com outros critérios,
que podem estar ligados aos sonhos, à intuição, ao clima, ao resguardo da
saúde, e, acima de tudo, pautado pela vontade. Desse modo, identifico que,
ao trazerem seus corpos insurgentes para a universidade, mesmo que em
um contexto opressor que os engole em muitas situações, também lutam
por manter suas temporalidades, criando estratégias de manutenção de
seus modos de existência, como expressão de re-existência.
171
A terceira forma de estar sendo na universidade que destaco diz
respeito à re-existência epistêmica. No contato com a universidade, in-
dígenas acadêmicos, mesmo que raramente dentro dos currículos ou em
aulas regulares, criam formas de expressão de seus conhecimentos: no
envolvimento em grupos de pesquisa, na elaboração dos trabalhos de con-
clusão de curso, na criação de espaços como os Encontros Nacionais de
Estudantes Indígenas, entre outros. Desse modo, apropriam-se da lingua-
gem e conhecimentos acadêmicos, fazendo com que estes dialoguem com
os seus, construindo conhecimentos fronteiriços. Esses conhecimentos de
re-existência se expressam muito conectados com o compromisso com os
coletivos de origem, gerando saberes pertinentes, a serviço da vida e da
manutenção dos povos.
Assentada na pesquisa e na vivência junto aos estudantes posso afir-
mar que uma das principais estratégias encontradas por eles para re-exis-
tir na universidade é estarem juntos, no coletivo, mantendo a dimensão
do comunitário através de práticas de solidariedade como um valor fun-
damental para ser conservada no contexto da universidade. “Eles chegam
em bando!”, é uma expressão bastante utilizada na instituição para descre-
ver os movimentos dos acadêmicos pelos espaços da universidade, onde
andam em pares, em grupos, carregando suas crianças consigo. Fenômeno
que perturba, desacomoda, porém povoa com humanidades outras esse es-
paço tão calcado pela competição, pelo ranqueamento, pelo produtivismo,
pelo consumo acadêmico, por relações utilitaristas de cada um por si.
No processo de construção da pesquisa, foi possível compreender
que o encontro dessas pessoas com a universidade irrompe como um acon-
tecimento, tanto na vida dos próprios indígenas, suas famílias e coletivos,
quanto para a instituição, que se vê desacomodada diante de tal presença.
A relação estabelecida entre esses diferentes atores ainda não se
expressa de forma simétrica e horizontal, configurando-se muito mais
como uma política fundada em uma visão de interculturalidade funcio-
nal (WALSH, 2012), que quer normalizar, diluir e incorporar o outro ao
mesmo, colaborando com os desenhos globais de poder, capital e mercado,
do que em uma perspectiva crítica de interculturalidade, calcada em um
projeto político de descolonização, transformação e criação de um modelo
de sociedade alternativo.
No encontro com esses coletivos, a universidade se depara com ou-
tros modos de estar, de se movimentar, de conhecer. Outras cores, cheiros
e jeitos que passam a habitar esse espaço e instauram desordem, com suas
presenças disruptivas, uma desordem que, conforme Balandier (1997),
torna-se criadora. Para Kusch (2012, p. 7), “las crisis dan siempre que pensar.
172
Son en el fondo fecundas porque siempre vislumbran un nuevo modo de concebir
lo que nos pasa. Irrumpe una nueva, o mejor, una muy antigua verdad”.
Nesse sentido, as dimensões de re-existência identificadas nesse es-
tudo, anunciam modos de estar sendo indígena universitário como um
odor exalado por esses povos que impregna a pulcra universidade. Para
Cullen (2013), o fedor da América, expresso em tudo o que não conhece-
mos, que não temos controle, que nos causa medo porque nos tira da segu-
rança, insiste e persiste. Esse odor é tudo que faz recordar nossas origens
autóctones e que nos faz lembrar quem somos e de onde viemos. O autor
afirma que “El hedor viene de abajo y de lo colectivo, es decir, del pueblo” e, por
isso, “se teme la fecunda unión ritual de los opuestos […] y se teme también que
acontezca lo imprevisible” (Idem, p. 80).
Esses movimentos, que trazem consigo imprevisibilidade e desor-
dem, têm gerado frestas que se fazem no encontro com os rígidos padrões
de ser da universidade. Tais fissuras, espaços de re-existência, permitem a
emergência do novo desde a re-conexão com o originário, parindo formas
antigas de conviver, aprender, compartilhar, estar e ser pessoa e coletivo,
formas essas que ensejam práticas pedagógicas outras na universidade.
173
Referências
ALBÁN, Adolfo Achinte. Epistemes “Otras”: ¿Epistemes Disruptivas? Revista
KULA: Antropólogos del Atlántico Sur, n. 6, p. 22-34, abr. 2012.
BALANDIER, Georges. A desordem: elogio do movimento. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil,1997.
CULLEN, Carlos. El hedor de América insiste y persiste. Consideraciones tem-
pestivas e intempestivas y algunos aforismos desorientados, a propósito del tex-
to de Rodolfo Kusch “El hedor de América”, publicado en Dimensión en 1961. In:
TASAT, J. A.; PÉREZ, J. P. El hedor de América: reflexiones interdisciplinarias
a 50 años de la América Profunda de Rodolfo Kusch. Saénz Peña: Universidad
Nacional de Tres de Febrero; Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Ediciones del
Centro Cultural de la Cooperación Floreal Gorini, 2013.
KUSCH, Rodolfo. América Profunda. Buenos Aires: Biblos, 1999.
KUSCH, Rodolfo. La negacióndel pensamiento popular. Rosario: Fundación
A. Ross, 2012.
LARROSA, Jorge. Uma lengua para la conversación. In: LARROSA, Jorge;
SKLIAR, Carlos (Coords.). Entre pedagogía y literatura. Buenos Aires: Miño
y Dávila, 2013.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Renovar a teoria crítica e reinventar a eman-
cipação social. São Paulo: Boitempo, 2007.
WALSH, Catherine. Interculturalidad crítica y (de)colonialidad: ensayos
desde Abya Yala. Ediciones Cideci-Unitierra Chiapas, 2012.
174
por umA escolA interculturAl: repensAndo A iniciAção
científicA no currículo dos Anos iniciAis do
colégio de AplicAção dA ufrgs
176
cebeu que as visões de mundo entre elas, crianças não-indígenas, e o povo
mbya eram diferentes e necessitavam de visibilidade e diálogo.
No momento em que uma aluna da turma se reportou ao cacique
mencionando o sol como uma estrela na perspectiva do olhar científico,
e o cacique por sua vez se referiu ao mesmo astro como uma entidade es-
piritual, a turma começou a trilhar caminhos diferentes ao voltar para a
escola. O deslocamento geográfico nos impulsionou ao deslocamento do
pensamento, desencadeando nosso projeto nomeado “Um olhar intercul-
tural para o mesmo céu”, em que tivemos a oportunidade de romper com a
lógica oficial escolar e acadêmica que enxerga o céu através das narrativas
científicas em direção a um modo de pensar mais plural e dialógico, pois
intercultural. Elementos presentes nas narrativas de matrizes indígenas
e africanas, assim, receberam visibilidade naquele projeto, ampliando nos-
sa forma de conceber a nós mesmos e as nossas relações. A pluralidade
de olhares, fossem eles astronômicos, históricos, culturais, mitológicos ou
religiosos foram constituindo um projeto interdisciplinar e antirracista,
ocupado em muito da educação das relações etnicorraciais entre os sujei-
tos que dele participaram.
Na sequência, em outra saída a campo que fizemos com a turma, já
no Quilombo dos Alpes situado em Porto Alegre (RS), pudemos perceber
o protagonismo negro na construção de nossa história enquanto mora-
dores desta cidade, rompendo com as narrativas tradicionais centradas
na saga dos povos europeus. Por meio da matriarca quilombola Janja, as
crianças ouviram histórias sobre um passado de escravidão e de resistên-
cia, cujos feitos perduram até hoje em nós. Ouviram a história da família
daquela senhora conhecedora de ervas, que precisou fugir de uma fazenda
em Charqueadas (RS) que usava a força de trabalho escrava de pessoas
advindas da África para se isolar no alto do morro do Morro da Glória,
em Porto Alegre (RS), constituindo aquilo que reconhecemos atualmente
como parte dos Territórios Negros da cidade. A história desta família,
assim, retrata nossa própria história enquanto sociedade que marginaliza
e discrimina, levando-nos a refletir sobre nossos privilégios, sobre o ra-
cismo nosso de cada dia, sobre a opressão e a falta de oportunidades a que
determinados segmentos da sociedade são submetidos.
Como sustenta Kusch (2000), não existe um estilo único e unifor-
me de vida em nossa América em uma análise profunda, embora sejamos
ensinados a assim pensar, o que termina por atingir nossas identidades
no sentido de um verdadeiro descolamento dos modos de ser e de pensar
indígenas e africanos. Nosso objetivo junto às crianças, assim, foi visibili-
zar outras possíveis histórias constituidoras daquilo que somos realmen-
177
te, problematizando pensamentos rigorosamente importados. Levamos o
estudo para o Salão UFRGS Jovem 2018, em que as crianças tiveram a
experiência de atuarem como comunicadores, tomando para si o dever
de apresentar seus estudos, suas vivências. Recebemos o prêmio destaque
durante cerimônia na Reitoria da Universidade e percebemos o quanto
nossas heranças culturais estão implicadas em nossos avanços científicos.
Neste viés, seguimos com o mesmo grupo de alunos em 2019, dando
sequência aos estudos do ano passado, agora com uma turma de quarto
ano do Ensino Fundamental. Nossa pesquisa de Iniciação Científica neste
ano se chama “Nós seguimos as pegadas dos nossos ancestrais” e, através
dela, buscamos narrativas familiares em suas conexões com movimentos
mais amplos, o que nos coloca em relação com a história dos povos origi-
nários, tradicionais e da diáspora. Assim, o estudo histórico, geográfico,
político, cultural, religioso, de nossos ancestrais nos leva a uma percepção
e reflexão acerca de quem somos nós, bem como de nossos processos cons-
tituidores enquanto sujeitos com determinados padrões, visões de mundo
e preconceitos. Ainda em fase de desenvolvimento, esse projeto tem le-
vado-nos à compreensão de que aquilo que fora erigido como Ciência na
escola e na universidade pode ser profundamente colocado em suspenso,
ao abrirmos a possibilidade de tratar os saberes historicamente margina-
lizados como conhecimentos válidos e constituidores daquilo que somos.
Como postula Nilma Lino Gomes (2008), estamos diante do desa-
fio de descolonizar os currículos escolares, dialogando com outros para-
digmas de conhecimento que podem promover uma inovação curricular,
promovendo rupturas epistemológicas e culturais. Faz-se necessário, pois,
agir de forma coletiva, refletindo sobre culturas negadas e/ou silenciadas
na escola, renovando o imaginário pedagógico através de uma lógica me-
nos livresca e mais apoiada na ação política que visibiliza lutas e protago-
nistas históricos marginalizados e relegados à condição de não-saber no
cotidiano da escola e dos currículos. O diálogo intercultural, assim, pode
consistir como estratégia de descolonização curricular, em que silêncios
são rompidos em direção à abertura à possibilidade de falar. Falar sobre
preconceitos, sobre privilégios, sobre igualdade e diferença, sobre raça e
etnia enquanto questões importantes para compreender a nós mesmos,
nossas relações e nossos modos de ser e estar no mundo. Acreditamos que
esta é uma atitude que provoca mudança profunda cultural e politicamen-
te em nosso pensar e agir dentro e fora da escola.
178
Referências
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei Federal n°
9.394/1996;
______. História e Cultura Africana, Afro-Brasileira e Indígena. Lei Federal
n°11.645/2008;
GOMES, Nilma Lino. Descolonizar os currículos: um desafio para as pesquisas
que articulem a diversidade étnico-racial e a formação de professores. In: Encon-
tro Nacional de Didática e Prática de Ensino, 14, 2008, Porto Alegre. Anais
do XIV Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino, Porto Alegre, 2008.
KUSCH, Rodolfo. Obras Completas. Tomo II. Córdoba, Argentina: Editorial
Fundación Ross, 2000.
179
percebendo formAs de estAr: A sAlA de AulA
e As práticAs de envolvimento com o Ambiente
182
ma de mistério instaurado pela literatura produzida no Modernismo, por
exemplo, que propõe uma Amazônia fascinante e ao mesmo tempo exó-
tica, selvagem e incompreensível em muitos aspectos. Para dinamizar es-
sas perspectivas, trouxemos exemplos de produções que geralmente têm
menos alcance e acabam por não fazer parte do nosso imaginário sobre
a região, por exemplo, as obras de arte de artistas indígenas. Como esse
universo é realmente diverso, escolhemos algumas que já compunham o
nosso repertório: a arte do povo Huni Kuin (representada por uma pintu-
ra de Bane Huni Kuin) e o filme “O Abraço da serpente” (que não é uma
produção feita inteiramente por indígenas, mas lida com essa perspectiva
das cosmologias que habitam a floresta e a sua relação com a colonização,
as fronteiras, as línguas etc.).
Outra parte dessa atividade que provocou um debate bastante rico
foi sobre o bioma da Mata Atlântica, que é um dos biomas mais importan-
tes do nosso país e, no entanto, é um dos mais devastados. Conversando,
percebemos alguns fatos: a Mata Atlântica cobria praticamente toda a fai-
xa litorânea do Brasil, a colonização do território brasileiro começa pelo
litoral e, justo nessa região, estão situados os maiores centros urbanos, e
também os polos de produção cultural mais reconhecidos (por exemplo,
São Paulo e Rio de Janeiro). Tais centros são responsáveis por muito do
que existe de produção editorial (de grande circulação), e também muitas
das representações que partem principalmente das capitais do sudeste,
não representam a natureza da região, mas sim outras paisagens do Bra-
sil, inclusive a floresta Amazônica.
O que também aparece é que a Mata Atlântica já quase não existe
mais, e por isso não encontramos mais grupos que representem a sua re-
lação com a natureza (e, a partir disso, se preocupem mais com a relação
com a cidade, por exemplo). No entanto, quando trouxemos um livro de
fotografias bastante recente (de 2015), produzido por um fotógrafo Gua-
rani Mbyá, Verá Poty, as imagens retratam outra realidade: a Floresta
bastante presente e viva; o povo Guarani Mbyá, que está lá há milhares
de anos, o que faz deles conhecedores de cada parte desse território; tudo
isso representado pelas lentes de um jovem Mbyá, numa produção con-
temporânea que traz elementos da tradição e também tecnologias con-
temporâneas para produzir arte. A Mata Atlântica, pelas fotografias e
palavras do fotógrafo, não é apenas um bioma em extinção, mas é a casa,
fonte de alimento, medicina e tudo mais que é necessário para a existência
do seu povo. Pelas fotografias acessamos outras possibilidades, não só de
conhecer mais sobre a Mata, mas também sobre a cultura e a vida do povo
Guarani Mbya do sul e do sudeste do Brasil.
183
O que ficou também costurando a aula temática foi a questão de
que a ordem imposta pelo sistema colonial impôs outras formas para a
vida dos povos originários de maneira a praticamente destituí-los de seus
meios de sobrevivência. O mundo do colonizador era baseado na perspec-
tiva de que um sujeito precisava ser alguém e ter posses (KUSCH, 2007), e
ainda agir no seu entorno numa tentativa incansável de controle das pes-
soas e da natureza ao redor. O ímpeto moderno, materializado na postura
do ser alguém, dá origem ao que hoje seria uma política do desenvolvimen-
to que, disfarçada de política pública, devasta os territórios impedindo que
as populações que vivem da terra possam “estar no más” (KUSCH, 2007).
Esta distinção entre o ser e o estar é bastante importante para com-
preender o que significou a chegada do colonizador nas Américas: o mun-
do do estar está completamente integrado com a natureza e seus ciclos,
não só no que diz respeito à sobrevivência e obtenção de condições mate-
riais para a vida (água, fogo, alimento, etc.), mas também por seu signifi-
cado cosmológico, sagrado. Faz parte do estar sendo, outra percepção do
tempo e dos elementos da natureza, se vive o tempo da contemplação e se
convive com a incompletude e movência das coisas (KUSCH, 2007). Em
oposição a isso, o mundo do ser cria formas para se afastar da natureza,
construindo um ambiente sintético, onde as coisas são processadas para
individualizar e hierarquizar os grupos humanos. Ailton Krenak3, em suas
falas, frequentemente, retorna a imagem da criança na sociedade não indí-
gena, que é quase sempre questionada sobre o que ela “quer ser” quando
crescer; para o escritor, essa pergunta é extremamente mal formulada,
pois destitui a criança de absolutamente tudo que ela é. Essa obsessão por
querer/ter é o que move o mundo o qual vive em função de seus projetos
fincados no horizonte, quase como hologramas para o futuro. Dessa for-
ma, os processos que se desdobram no caminho são menos importantes,
isso reflete a incapacidade de viver o presente.
É novamente a política do desenvolvimento que aparta as pessoas da
sua condição de pertencentes ao ambiente, num movimento antropocêntri-
co que se opõe ao que Ailton Krenak aponta como uma política de envol-
vimento, que seria justamente a compreensão de que fazemos parte de um
universo no qual as ações e reações estão estritamente conectadas, e qual-
quer movimento que nos coloque à parte disso pode gerar consequências.
O que nós vivemos na América foi de fato a experiência de um dese-
quilíbrio na “zona de contato”, pois a partir do momento em que o coloni-
4 Ainda que saibamos que, na mesma medida em que houve violência colonial, houve
resistência por parte dos povos dominados, não se pode negar que a truculência do co-
lonizador foi a grande causadora de genocídios que, infelizmente seguem acontecendo,
nunca sem resposta daqueles que lutam para manter seu direito à terra.
185
pesquisas não estejam herméticas (blindadas pelas construções retóricas),
afastando discursos da prática e cristalizando comportamentos que não
geram transformação efetiva.
Dessa forma, enquanto estivermos atentos à potência que emana
dos encontros, sejam eles na escola, nos pré-vestibulares e pré-universitá-
rios, na academia ou na escola, acredito que seja possível construir um co-
tidiano mais “envolvido” com seu entorno, que proporcione participação
ativa (mesmo nas atitudes mais sutis) na desestabilização das estruturas
da colonialidade. Sem superstimar movimentos simples e nem subestimar
a criatividade e a possibilidade de trangressão, seguimos juntos percor-
rendo a trajetória registrada pela memória daqueles que vivem a larga
historia, como nos aponta Rodolfo Kusch.
Referências
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186
A educAção dAs relAções etnicorrAciAis e o diálogo inter-
culturAl: fortAlecendo A necessidAde dAs leis 10.639/2003
e 11.645/2008 nA escolA contemporâneA brAsileirA
188
de uma escola de qualidade, capaz de garantir o direito de todos à educação.
Assim, podemos pensar o diálogo intercultural como uma necessidade e uma
possibilidade de se ressignificar a organização da escola contemporânea, trans-
formando (e talvez reinventando) seus modos de conhecer, saber, sentir e viver.
Penso que as identidades negras e ameríndias, dentre tantas que
tradicionalmente eram tratadas pela escola como “outras”, “desviantes”,
“anormais”, hoje encontram a possibilidade de serem produzidas de modo
afirmativo na relação com os outros no interior da instituição escolar. As
diversidades nascem, assim, como a emergência de vozes que servem de
contraponto ao etnocentrismo presente na escola. O diálogo intercultu-
ral, portanto, coloca-se como uma forma de descolonizar o espaço escolar,
promovendo também a educação das relações etnicorraciais.
Eis o tempo em que está instaurado o “desafio dialógico”, para usar
as palavras do professor Reinaldo Fleuri (2009). Trata-se do diálogo ne-
cessário para se questionar o absolutismo e a insuficiência da epistemolo-
gia do pensamento único, fundada junto com a escola moderna no século
XVII. O que se coloca, portanto, é a emergência de uma perspectiva in-
tercultural, em que o diálogo entre culturas é condição para potenciali-
zar cada cultura em particular (FLEURI, 2009). Assim, as leis 10.639 e
11.645 institucionalizam o reconhecimento do diálogo intercultural na
escola, ao mesmo tempo em que incitam essa ação na tentativa de garantir
a todos os alunos condições de igualdade e de sucesso escolar.
Reconhecer as diversidades, desse modo, implica descolonizar tudo o
que historicamente fora erigido na escola: os saberes considerados válidos,
os ajustes espaço-temporais, a filosofia, as concepções, as metas e objetivos,
a epistemologia do conhecimento, dentre outros, no sentido de incluir deter-
minadas vozes antes desvalorizadas, descreditadas e marginalizadas no cur-
rículo escolar. Se o etnocentrismo se constitui na possibilidade de enxergar o
mundo apenas sob um prisma único, o diálogo intercultural cria a possibili-
dade de produzir um olhar caleidoscópio na escola, pois aberto à visibilidade
de diferentes formas de conhecer, sentir e viver. Talvez fosse o caso de “natu-
ralizar” na escola também os modos de ver, sentir e conhecer indígena e afro-
-brasileiro, produzindo nos sujeitos uma identificação com tais diversidades.
Um dos caminhos que se coloca para a educação intercultural pode
ser o de historicizar e contextualizar o pensamento científico que se co-
locou como um “etnossaber” na escola ocidental, criando canais de visibi-
lidade para um pensamento profundo latino, ameríndio e afroamericano,
inspirado nos estudos de Rodolfo Kusch (2000). Significa, portanto, inda-
gar a vida cotidiana, desapegando-se dos esquemas únicos europeus com
os quais estamos habituados a enxergar o mundo.
189
Seria o caso de valorizarmos mais o subjetivo e menos o científico?
Ou fazer do reconhecimento da diferença uma forma de ciência, como
inaugura Geertz (1986, p. 82): “Imaginar a diferença (o que não significa,
é claro, inventá-la, mas torná-la evidente) continua a ser uma ciência da
qual todos precisamos”. Estaríamos assim diante da emergência de uma
“ciência nômade”, como refere Gruzinski (2001), pois mestiça em termos
de consideração das diversidades em suas diferentes epistemologias. Nes-
ta direção, o reconhecimento de nossas próprias ancestralidades enquanto
plurais permitiria um maior diálogo entre aquilo que nos aproxima e di-
ferencia, como reflete o pesquisador indígena Daniel Munduruku (2002).
Parece que é isso que Kusch (2000) referiu ao defender a necessida-
de de uma “doutrina da contemplação” na América contemporânea. Isso
implica em uma postura acadêmica, intelectual e docente mais subjetiva,
regionalizada, comunitária, contemplativa, reflexiva, artística... Temos
muito o que ouvir e contemplar com as diversidades ameríndias e afroa-
mericanas para a constituição de uma cosmologia que faça do intercultu-
ral o modo de existência dentro da escola.
Referências
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190
umA propostA interculturAl por meio
de sAberes quilombolAs
3 Cabe elucidar que a estudante Vanda Aparecida Fávero Pino é aluna do Programa de
Pós-graduação em Letras, nível de Doutorado da UFRGS com ingresso Ingressante no
semestre 2017/2, sob a orientação da Professora Ana Lucia Liberato Tettamanzy. Tem
aproximação com as comunidades quilombolas da Arvinha e a Mormaça (Sertão/RS) em
razão de ter participado do processo de ingresso de pessoas pertencentes a essas comu-
nidades como estudantes de nível médio e superior no IFRS – Campus Sertão e, a partir
disso, passado a desenvolver projetos de ensino, pesquisa e extensão nesses espaços.
192
busca investigar em um acervo de narrativas orais de moradores das co-
munidades quilombolas Arvinha e Mormaça (Sertão/RS), a identificação de
saberes afro-brasileiros na região em que as comunidades estão situadas e,
com base nisso, construir oficinas e atividades didáticas que sirvam de apoio
para o ensino da cultura afro-brasileira na escola. Do mesmo modo, objeti-
va a elaboração, em conjunto com os comunitários, de um roteiro turístico
cultural sustentável com vistas à valorização do legado afro-brasileiro na
região, na perspectiva de um pedagogia cultural com base na educação das
relações étnico-raciais em um espaço não formal de ensino.
A busca pelas narrativas já foi realizada por um projeto institucional
do IFRS, o qual a autora coordenou no ano de 2018 e que continua em
atividades no ano de 2019 sob coordenação de outro servidor do IFRS. Na
oportunidade buscou-se junto a este projeto conversar com os moradores
e ouvi-los em suas memórias e vivências.
É importante salientar que o IFRS – Campus Sertão, conhecido na re-
gião como uma instituição de ensino que historicamente trabalhou com cur-
sos na área agrícola e agropecuária4, está situado em uma região de presença
quilombola. No município de Sertão, onde se localiza o Campus, situa-se em
seu espaço territorial duas comunidades pesquisadas. Tendo em conta tal
cenário, o IFRS, dentre outras observâncias, tem como missão promover
“a formação integral de cidadãos para enfrentar e superar desigualdades
sociais, econômicas, culturais e ambientais” (IFRS, 2019). Assim, obser-
va-se como condição fundamental dentro do IFRS – Campus Sertão, a
promoção de ações afirmativas que objetivem o ingresso, a permanência,
a conclusão com êxito nos cursos e a representação cultural de pessoas
pertencentes às comunidades quilombolas que circundam o Campus.
Dessa forma, especialmente desde um ingresso de maior vulto de es-
tudantes quilombolas a partir do ano de 2018 na instituição, começaram a
ser postos em prática projetos de ensino, pesquisa e extensão nas referidas
comunidades. É importante pontuar que um dos pressupostos metodológi-
cos do projeto em questão é que a equipe conte com bolsistas quilombolas
atuantes em todas as frentes do projeto (estudo teórico, trabalhos de campo,
realização de oficinas, etc), prerrogativa que julgamos fundamental para o de-
senvolvimento das atividades. Assim, organizou-se por meio do material de
áudio coletado a proposta de uma oficina que discuta a presença quilombola
na região e a importância dessa representatividade no espaço escolar. Os par-
ticipantes das oficinas têm a oportunidade de conhecer narrativas transcria-
das a partir da narração dos moradores e de performatizar essas narrativas.
4 Embora atualmente trabalhe também com outros cursos nas áreas da Educação, Infor-
mática e Técnicas Comerciais.
193
As oficinas começaram a ser ministradas em novembro de 2018 e já
atenderam centenas de alunos e profissionais da educação em instituições
de ensino. A equipe do projeto também já apresentou os resultados parciais
às próprias comunidades e participou de eventos temáticos e acadêmicos,
estando com uma agenda significativa de atividades. É válido lembrar que o
material organizado para as oficinas não se esgota, apenas perfaz um exem-
plo de como podem ser trabalhados os saberes quilombolas na escola. Dessa
forma, os arquivos de áudio e a transcriação de textos produzidos a partir
das narrativas ficam depositadas no Memorial do IFRS – Campus Sertão5
para consulta de pesquisadores e profissionais da educação. O próximo pas-
so do projeto visa discutir se é interesse da comunidade a proposta de um
roteiro cultural, em que os grupos possam conhecer os marcos históricos,
ouvir as histórias que perfazem as oficinas e refletir sobre a luta e atualidade
dos quilombos por meio do protagonismo dos moradores. As primeiras re-
uniões foram iniciadas e as comunidades estão abertas a construir o roteiro,
mas ainda cabem discussões e decisões. Para esse processo entendemos ser
importante a compreensão do “tempo” das comunidades na reflexão de um
projeto de tal responsabilidade. Nesse sentido, é com esse intuito que bus-
camos trazer os primeiros resultados da pesquisa e discutir a proposta do
roteiro nas VIII Jornadas o Pensamento de Rodolfo Kusch.
A partir da avaliação do trabalho realizado pelo projeto por meio
dos participantes das oficinas, é comum que estudantes, mesmo os que
estão no ensino superior, citarem que não sabiam da existência das comu-
nidades quilombolas na região antes da participação nas oficinas e ma-
nifestarem sua satisfação em relação às histórias que foram contadas e
performatizadas. Muitos estudantes do IFRS – Campus Sertão, com essa
participação, buscaram saber mais sobre os quilombos e envolveram-se
em atividades relacionadas a outros projetos desenvolvidos nas comuni-
dades. Também é avaliado como positivo pelos participantes das oficinas
e pelos comunitários o fato de as estudantes quilombolas participarem
ativamente do projeto, ministrando as oficinas, pesquisando e falando a
partir da realidade que vivem.
Referências
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196
um nosotros Colonial
a um nosotros nas
práticas e lutas
situadas
de
seção 3
“sou umA negrA ângelA, umA iyAlorixá”: vivênciAs de
umA mulHer negrA de terreiro no sul do brAsil
203
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204
lA utopíA del fundAmento: Aciertos fundAntes de lAs
cienciAs en occidente y lA construcción de lA figurA del
productor situAdo de conocimientos
Daniel Badagnani1
206
a nuestros colegas periféricos? A partir de este diagnóstico, nuestro plan
para el siguiente ciclo deberá incluir propuestas concretas para aliviar
nuestra situación periférica. Propuestas pequeñas y realizables, que es-
tarán muy lejos de resolver la problemática. Lo importante es dar pasos,
avanzar. También es importante explicitar los instrumentos con los que
evaluaremos el éxito o no de nuestras propuestas. La evaluación será par-
te del diagnóstico en el siguiente ciclo. La instancia de sistematización
puede implementarse a nivel institucional como parte de la evaluación de
la actividad científica, y esa sistematización puede ayudar a diseñar los
formatos de los futuros proyectos y sus modos de evaluación.
No podemos saber a priori cuál sería el resultado de aplicar este
proceso de reflexión sistemática. Por lo pronto se trata de una forma con-
creta de responder a la demanda de los investigadores periféricos que to-
mamos contacto con estas temáticas y somos sensibles a ellas: todo muy
interesante, pero ¿Cómo se hace en concreto la ciencia decolonial? Nos
hemos propuesto recorrer ese camino en nuestra práctica concreta como
investigadores en Ushuaia (Tierra del Fuego, Argentina), habiendo pro-
ducido nuestras primeras reflexiones a priori en Badagnani (2018), y que
encuentran un correlato con los hallazgos de Albarracín (2012) para las
prácticas científicas en el Centro Austral de Investigaciones Científicas
(CONICET), ubicado en Ushuaia. Nuestra reflexión ocurrió en parale-
lo con nuestra formulación de un proyecto de investigación que articula
producción de modelos para la Física de Partículas, el análisis de imáge-
nes satelitales de Radar de Apertura Sintética, la simulación de corrien-
tes oceánicas, la simulación de la asimilación de cambios tecnológicos en
territorios inhomogeneos y estudios de Bioimpedancia, la producción de
software específico de dominio para el desarrollo de esos modelos jun-
tamente con el desarrollo de una metodología de gestión y planificación
de estos proyectos, así como la vinculación científica y tecnológica desde
las políticas públicas con los agentes relevantes del territorio, y el desar-
rollo de redes de conocimiento tendientes a su desarrollo. En la fase de
planificación se partió del diagnóstico de que quienes llevamos adelante
investigaciones de lo que suele llamarse “ciencias básicas” con alto con-
tenido de herramientas cuantitativas trabajamos en soledad, y decidimos
nuestro curso de acción a partir de la producción esperada y los recursos
disponibles. La primera se piensa en función de las revistas en las que
se espera poder publicar, los segundos ocurren en forma de subsidios a
partir de evaluaciones que consideran como parámetro las publicaciones
ya mencionadas. Cuando los subsidios son internacionales los recursos
suelen ser mayores, y claramente la planificación estratégica está fuera
207
de nuestras manos, pero incluso cuando los subsidios son locales, dado
que las publicaciones tienen lineas editoriales concordantes con los in-
tereses en el centro del sistema-mundo, indirectamente la planificación
estratégica está igualmente fuera de nuestras manos. El resultado neto
es un esquema extractivista, en el que recursos altamente formados con
financiación local producimos para y en función de intereses que no son
locales y que escasamente llegamos a comprender. El plan propuesto fue
dar continuidad a nuestras respectivas lineas, pero iniciando por un lado
un acompañamiento mutuo, y por otro un diálogo interdisciplinario con
el fin de lograr cooperaciones significativas. Esperamos que en el mediano
plazo esta cooperación nos permita apropiarnos localmente de parte del
valor intelectual de nuestras producciones. En el corto plazo, el beneficio
provendría de contar con los desarrollos de cada linea como recursos de
las restantes, desarrollando capacidades locales que sean transversales.
La comprensión del valor potencial de nuestras producciones y de su po-
sible relevancia para el territorio fueguino deberá servir como guía para
la planificación estratégica de nuestras propias actividades. Finalmente,
la reflexión sistemática nos permitirá hacer conscientes nuestras propias
prácticas y nuestras innovaciones metodológicas, permitiéndonos evaluar
su funcionalidad. Por último, este proceso nos puede permitir apropiarnos
subjetivamente de nuestras producciones, alejándonos paulatinamente de
la alienación que el mero acomodo acrítico a la situación dada tiende a
producir en el cientfico de la periferia.
Al momento de redactar este trabajo, el grupo que informalmente
hemos llamado “Sistemas Complejos” se encamina a cumplir los diez me-
ses. Se encuentran en ejecución un proyecto acreditado y financiado por
la Universidad Nacional de Tierra del Fuego que articula las lineas de
investigación ya mencionadas, y un proyecto de extensión también acre-
ditado y financiado por esa Universidad, que está iniciando un camino de
articulación con programas locales de formación continua de cuadros téc-
nicos para la industria. Consideramos cumplido un objetivo no menor: ya
no estamos solos y una incipiente comunidad ya se percibe claramente. La
colaboración en aspectos científicos y técnicos ya tiene lugar, en algunos
casos con gran vigor.
208
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213
A crise AmbientAl e As mediAções pedAgógicAs
como lócus de (des)coloniAlidAde
Introdução
Qual deve ser, então, o ethos que nos permite conviver, vindos das
mais diferentes regiões da Terra, com suas diferenças e valores éticos?
Como é possível aos sujeitos a saída da menoridade, subserviente e servil,
para a maioridade que implique em coragem de fazer uso do seu próprio
entendimento que culmine na ousadia de conhecer (KANT, 2008) para
além do que está posto pela colonialidade? O esclarecimento exige liber-
dade, logo a educação deve persistir na meta de formar sujeitos livres,
reflexivos e não reflexos (FREIRE, 2018). É neste contexto que a prática
pedagógica pode suscitar mecanismos de ‘autodefesa’ das populações do
sul indicando alternativas de superação da colonialidade e promovendo a
transformação social.
No processo de mediação, entendida como relação entre o mediato
e o imediato para a chegada do conhecimento (ADAMS, 2018) “é central
a relação dialética entre a prática e a teoria, e a práxis, na relação com
mediações, implica nova postura diante da realidade e ação coerente com
um engajamento na luta pela transformação da realidade local, na relação
com o mais amplo contexto” (ADAMS et. al., 2017, p.11). O imediato per-
cebido e apreendido pelos sentidos e o mediato refletido pela razão/cons-
ciência redundam no processo de mediação que pode se dá tanto na esfera
da educação sistemática, como na assistemática de forma a culminar em
processos de descolonialidade.
Os problemas ambientais impactam diretamente na qualidade da
água, do ar, na mobilidade urbana, na ocupação irregular de terras, nos
produtos cultivados com agrotóxicos, no descarte de resíduos sólidos
em lixões ou aterros próximos às moradias de pessoas mais carentes,
resíduos que, por vezes, são provenientes de países do norte que des-
cartam os seus dejetos nos territórios do sul. Tais questões refletem
apenas impactos diretamente antropológicos, contudo, crimes como
o desmatamento, queimadas, contaminação das águas, proliferação de
vetores de doenças, enchentes, etc. atingem os humanos, mas também
o equilíbrio ecossistêmico que produz os serviços ambientais favorá-
veis à vida de todos. Há animais, cujo habitat foram totalmente ocupa-
dos pelo mercado imobiliário, correndo riscos iminente de extinção. A
questão ética que se impõe é: Os seres extra-humanos (HANS, 2015)
não têm direito a viver ou não possuem valor intrínseco? A proposta
não é radicalizar ao ponto de ter nos animais nenhuma possibilidade
de consumo, por exemplo, mas compreender que a palavra de ordem é
a busca por equilíbrio.
217
Tais questionamentos suscitam temas geradores (FREIRE, 2014)
importantes que, fazendo parte das vivências e do conhecimento prévio
dos educandos, são passíveis de problematização e reflexão que promovam
a superação das contradições e desigualdades, sobretudo daquelas decor-
rentes do processo de colonialidade presente nos discursos oriundos de
um currículo colonizado e de práticas reflexas e não refletidas (FREIRE,
2018) que reproduzem o olhar colonizador, limitando a possibilidade de
esclarecimento e a saída da menoridade dos sujeitos (KANT, 2008), inte-
grando-os e não adaptando-os aos cosmos de modo decolonial.
218
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219
A HistóriA, o legAdo e A importânciA dAs mulHeres nA
sAúde, nA AlimentAção e conquistAs sociAis
Introdução
RESULTADOS E DISCUSSÃO
223
nativas, perpetuação das sementes crioulas, biodiversidade, agricultura fa-
miliar, reforma agrária, direitos trabalhistas e o fim da exploração, opres-
são” (p. 232), assim como os povos indígenas. Sob outra ótica, autoras
como Chagas e Chagas (2017, 233) vê as mulheres como
Mulheres e lutas
5 Tradução livre: “América sugiere una economia negra, cuya base há de radicar en cier-
tos imponderables imprevisibiles” (KUSCH, 1999, p. 503)
224
violadas, violentadas ou mortas, cujas reinvindicações desde o direito ao
voto, até os dias atuais retratam uma realidade ainda presente e marcada
por machismo, misoginia, racismo, desigualdades que precisam cessar.
Esse processo ao longo de muitas décadas até os dias atuais ren-
deram frutos não apenas para mulheres urbanas e do campo, mas para a
sociedade, segundo Cisne (2015),
Considerações finais
225
Referências
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226
reinventAr: ser y HAcer en el territorio:
presente, pAsAdo y futuro
Gabriela Aznares1
Rocío Belén Galvez2
Silvana Priscila Salzano3
1 Directiva de la ESS13.
2 Universidad Nacional de General Sarmiento.
3 Universidad Nacional de General Sarmiento.
4 Rosalía hace en este poema un homenaje a las mujeres de los emigrantes que son las
verdaderas heroínas por quedarse solas realizando las duras labores del campo y de la
casa en la más triste soledad, como auténticas viudas de maridos vivos.
227
jeres, “viudas de vivos y viudas de los muertos”. A ellas, la tierra no sólo
las salvó y suministró comida, sino que también fue el espacio donde sanar
a través de vínculos de reciprocidad.
Al evocar la tierra, ya sea cómo terreno, casa o estabilidad referimos
a un espacio donde se puede estar y ser, conjugar otros horizontes. La tier-
ra es acción y contemplación, orden y desorden, momento y movimiento.
Al encarar y proponer políticas y proyectos, la diversidad aparece
como una forma de hablar de la realidad, se presenta como un horizonte de
significaciones que nos permiten pensar en que las cosas pueden cambiar,
pueden ser mejores. Partiendo de una idea política, como actoras sociales,
y operando a través de una utopía que nos motiva a actuar, a movernos, a
transformarnos. La interculturalidad, la pluralidad de voces y perspecti-
vas nos permiten intercambios horizontales, simétricos y recíprocos.
Con estas perspectivas en la mira, nació la idea de una huerta es-
colar-barrial en San Miguel, Buenos Aires, Argentina. Este proyecto
nos invita a trabajar la tierra, pero no solo con el objeto de revindicar
la soberanía alimentaria, sino también, los vínculos, los conocimientos
e interacciones. Un constante proceso de construcción intercultural. Y
entendemos interculturalidad en armonía a la idea que plantea la in-
vestigadora Claudia Briones, como una “forma de relación basada en
intercambios horizontales, simétricos y recíprocos”. Ante una Pacha-
mama generosa por demás, sentimos la necesidad de generar “distintos
espacios, y revisar los arreglos y acuerdos sociales de convivencia más
amplios” (BRIONES: 2009, p. 47)
Dicho proyecto consiste en una huerta escolar-barrial-comunitaria.
Hace tres años, un grupo de mujeres empezamos a crear junto con los
estudiantes y vecinos del barrio un espacio verde, un pulmón en medio de
la ciudad. Decidimos cambiar lo que era un basural a cielo abierto por un
paraíso. Esto también es parte de la territorialidad, intervenir para trans-
formar el espacio donde convivimos, donde transitamos. La influencia de
la otredad conlleva una movilización de estructuras, invita a repensar lo
aprendido, a repensarnos con el otro.
Esto nos plantea qué tipo de relaciones sociales buscamos promover
y desde qué lugar lo hacemos, en una continua retroalimentación cultu-
ral. Desde una perspectiva kuscheana, intentamos ‘ver cómo, a partir de
la tiniebla, vislumbramos la posibilidad de la luz’. Nos asumimos como
partes de este “acto cultural” y comprendemos la educación como “el acto
de encuentro simbólico” por medio del cual fomentamos “la inseguridad
auténtica de sentir que el fundamento está, pero resbala entre las manos.”
(KUSCH: 1978, p. 137)
228
Por todo esto, habitar un espacio, un territorio, en armonía con el en-
torno y la biodiversidad que nos rodea, implica desafíos y antagonismos con
un sistema que prima la rentabilidad económica por sobre la rentabilidad
humana. Armonizar el estar siendo dentro de un espacio común, habilita un
horizonte de transformación emancipado. Volver lo contradictorio en equi-
librio, convertir oposición en complementariedad y disolver las diferencias
aparentemente irreductibles entre hombres y mujeres. Esto puede tomar
diversas formas, en nuestra labor, una comunidad de agricultores urbanos.
Nosotros nos reinventamos, intervenimos en nuestro presente, con nuestro
hacer diario en ese pequeño paraíso en medio de la ciudad, nuestra sinta-
xis reactualiza dinámicas y significados que vienen desde la antigüedad.
Reivindicar lo ancestral, la sabiduría de antaño es una forma de darle voz a
todas aquellas anónimas que trabajaron en lo mismo que nos y también, de
construir un presente a partir de un tiempo pasado.
El encuentro y reencuentro con la otredad en el espacio educativo,
contribuye a poner en juego al otro como sujeto, considerarlo como un ser
cargado de historias, subjetividades, ideas, cosmovisiones particulares. Pone
en evidencia la existencia de diferentes universos dentro del espacio áulico.
Pensarlos y pensarnos como sujetos, actores sociales, es asumir el compro-
miso de romper los moldes, ayudarles a romper estereotipos y prejuicios.
Presentar la otredad, la interculturalidad desde un lugar dialógico de un
modo que nos permita vivenciar y reconocer esas diversas formas de pensa-
miento y formas de vida coexistentes. Abrir horizontes para establecer un
plano de igualdad tanto en el espacio áulico como en el plano social.
América contiene la fuerza de la Pachamama. Habilitar ese contacto,
ese espacio de saberes propio de nuestro lugar, incorporar saberes ances-
trales en el espacio educativo y resignificar aquellos conocimientos des-
valorizados. Brindar herramientas que con el correr del tiempo se fueron
dejando de lado en el plano educativo. La enseñanza dentro de la natura-
leza siendo parte de la naturaleza, con sus factores climáticos, sus ciclos
lunares, sus procesos de espera y su satisfacción de cosecha. Así, habilita-
mos herramientas nuevas a las diferentes problemáticas ya instaladas en
los nuevos espacios áulicos.
Para llevar a cabo una enseñanza desde esta perspectiva, desde otro
lugar, entendemos la necesidad de educadores dispuestos a pensar una edu-
cación de la naturaleza sin prescindir de ella. A pensar la escuela como parte
activa del territorio y en relación con él. Como escribiera Paulo Freire:
La importancia de la relación entre las cosas, de los objetos entre sí, de las
palabras entre ellas en la composición de las frases y de éstas entre sí en la
estructura del texto. La importancia de las relaciones entre las personas,
229
de la manera como se unen-la agresividad, la amorosidad, la indiferencia,
el rechazo o la discriminación subrepticia o abierta-. Lo importante que
resultan, en suma, las relaciones entre educandos y educadoras, entre su-
jetos cognoscentes y objetos cognoscibles (FREIRE: 1993, p. 123).
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KUSCH, R. Esbozo de una antropología filosófica americana. Castañeda, 1978.
230
rigobertA mencHú tum e A lutA pelos
direitos HumAnos nA guAtemAlA
231
investimento em reformas políticas que inovaram e auxiliaram o povo da
zona rural, da área trabalhista, da saúde, da educação e da economia, um
dos líderes da Revolução, Jacobo Arbenz, foi eleito presidente em 1950.
Em 1953, aprovou a Lei da Reforma Agrária, que propunha a expropria-
ção das terras não cultivadas para camponeses solicitantes, a industriali-
zação sob controle nacional e o fim da servidão no campo. Em um contex-
to de Guerra Fria, a ação foi considerada um projeto comunista e, devido
a uma conspiração norte-americana, em 1954, as forças conservadoras
triunfam com a justificativa de projeto anticomunista. Rigoberta nasce
em 1959, na Aldeia Chimel do povo Quiché Maia, no início de um longo
período de Ditaduras Militares, em um contexto pobre, em uma sociedade
excludente e racista. Filha de Juana Tum Kótoja e Vicente Menchú Pérez,
um membro ativo do Comité de Camponeses, ela viveu e sentiu na pele, já
cedo, as barreiras culturais, linguísticas e políticas.
Ajudando desde seus primeiros anos na agricultura familiar, viu o
país passar por um período de forte crescimento industrial com gran-
de investimento estrangeiro, além da diversificação e aumento da gera-
ção de produtos agrícolas. Esse último demandava uma disponibilida-
de maior de terras, questão que foi resolvida pelo Estado por meio de
compras forçadas, ocupações violentas e expropriações ilegais. Houve
um amplo crescimento econômico, em contrapartida, o setor camponês
sofreu grande empobrecimento, questão que afetou principalmente a po-
pulação indígena, visto que esta parcela da população tradicionalmente
possui os níveis de vida mais baixos do país e as piores condições de pro-
teção jurídica. Seu povo sofreu na Primeira Explosão Guerrilheira, onde
mais de 75.000 indígenas foram assassinados e 600 povoados destruídos;
no Massacre de Panzós, que durante uma concentração indígena pací-
fica, 102 camponeses foram mortos; na Política da Terra Queimada, em
que mais de 400 aldeias maias foram incendiadas, 2 mil pessoas foram
mortas e 1 milhão forçadas ao exílio; em uma constante invisibilização
do seu povo, da sua voz e das suas lutas.
Em 1979, ano em que um de seus irmãos foi preso, torturado e as-
sassinado, Rigoberta se filia ao Comitê da União de Camponeses (CUC),
organização que seu pai, assassinado no ano seguinte pelo Exército na
embaixada Espanhola, ajudou a criar depois de ter sido preso e torturado,
acusado de comunismo. Em um momento de auge dos movimentos so-
ciais, Rigoberta se destaca, principalmente, em uma greve organizada pela
CUC por melhores condições para trabalhadores agrícolas da costa do
Pacífico, em 1981, e por se aliar a Frente Popular, educando a população
camponesa indígena como ato de resistência à opressão militar. Ela acaba
232
por se exilar no México, no mesmo ano, em decorrência de ameaças, po-
rém permanece organizando movimentos de resistência à opressão e luta
pelos direitos dos povos indígenas.
No ano de 1992, coincidindo com os 500 anos da chegada de Co-
lombo à América, Rigoberta ganha o Nobel da Paz, em reconhecimento
a sua trajetória de dedicação e luta pela justiça social e pela reconciliação
etno-cultural. Em seu discurso na cerimônia de premiação, ela alegou di-
reitos históricos negados aos povos indígenas e denunciou a perseguição
sofrida desde a chegada dos europeus. Ressaltou a necessidade de paz e
desmilitarização na Guatemala, visando a busca pelos direitos de todos e
justiça social, respeito à natureza e igualdade para as mulheres. A entrega
do Nobel possibilitou a abertura da Fundação Rigoberta Menchú Tum,
programa que contribui para recuperar e enriquecer os valores humanos
para a construção de uma ética da Paz Mundial. A Fundação possui ati-
vidades e programas na área da educação, promovendo a construção de
uma educação com pertinência cultural e transformadora de relações so-
ciais harmoniosas, tendo como ponto de partida a pluralidade guatemal-
teca. Além disso, a fundação é responsável pela Iniciativa Indígena por la
Paz (IIP), rede de líderes e personalidades indígenas do mundo que tem
como objetivo estabelecer a comunicação entre diversos povos indígenas
do mundo e possibilitar investigações e pesquisas que fortaleçam o seu
reconhecimento e proteção.
Foi também nomeada Embaixadora da Boa Vontade da ONU para o
Ano Internacional dos Povos Indígenas na Conferência Mundial dos Di-
reitos Humanos de Viena, na Áustria e em 1996 foi nomeada Embaixado-
ra da UNESCO. Fundou o Winaq (em maia: “a totalidade do ser humano),
primeiro partido político indígena da Guatemala. Em 2007, foi candidata
à presidência em uma aliança ao partido de esquerda Encuentro por Gua-
temala. Apesar de não ganhar a eleição, incentivou diversos indígenas a
votarem e terem mais participação e interesse pela política.
Suas lutas são questões chave para que o direito à Educação, direito
garantido no artigo 26 da Declaração Universal dos Direitos Humanos,
seja concedido a parcelas escamoteadas da população, para que essa edu-
cação promova a compreensão, a tolerância e a amizade entre as nações e
grupos étnicos ou religiosos. Afirmando movimentos, iluminando ques-
tões apagadas da história e promovendo a equidade. Atualmente o país
possui políticas de educação bilíngue intercultural (MINISTERIO DE
EDUCACIÓN, 2017).
233
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234
territoriAlidAdes, interculturAlidAdes e As mulHeres dos
quilombos de são lourenço do sul-rs/brAsil
Por la condición política en que viven, las mujeres están sometidas al po-
der en los más diversos ámbitos de sus vidas y en distintos niveles. No
sostengo aqui que el poder es absoluto o unidireccional. Por el contrario,
la opresión de la mujer, y en concreto el poder patriarcal a que están so-
metidas las mujeres, implican que desde la opresión genérica ellas también
ejercem el poder (LAGARDE Y DE LOS RÍOS, 2015, p. 139).
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240
A relAção dos povos guArAni e KAiowá com o
território: um cAminHo pArA A conservAção AmbientAl
Introdução
Os povos indígenas atribuem nomes aos lugares, aos rios, às plantas e aos
animais. Eles conhecem os mais diversos ecossistemas, classificam os lu-
gares para fins de moradia, realização de atividades econômicas e práticas
culturais, bem como para a preservação do meio ambiente (OLIVEIRA,
2006, p. 13).
Considerações
244
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Considerações finais
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252
A terrA me disse: lições e sAberes tupi guArAni
sobre sustentAbilidAde
Para que que índio quer tanta terra? Pra quê? Pra simples-
mente preservar para um futuro, para o futuro. Para que um
dia as crianças possam saber o que é uma árvore, o que é um
remédio do mato porque muita gente não conhece. Se a gen-
te não tivesse aqui isso tudo aqui de praia seria, hoje, seria
prédios, casas e não teria mais vida, né? Não teria mais mato,
não teria mais nada, né? [...] (Guaciane, janeiro, 2019 - fala
presente no documentário - A Terra Me Disse).
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257
AlternAtivA decoloniAl de mundo
260
en lugar de la superación del mismo, busca la conciliación del hombre con el
mundo, conciliación que implica una “iluminación” o una preparación, que
en este caso solo se logra mediante el fortalecimiento interno, que Kusch
(Tomo II, 2007) diría “Siguiendo el antiguo mecanismo de todo mito, según el
cual esta aflora en ese margen en donde el inconsciente pasa sus signos a la cons-
ciencia y ésta domina a aquél mediante los ritos.”, se puede notar entonces desde
la cultura estática una reacción de concentración en aquello que puede ser
problemático, como en este caso es el inconsciente y que además encuentra
solución a partir de la aceptación de “lo otro”, puesto que en tanto que es
consciente del mismo y lo fortalece a través del consciente consigue de al-
guna manera una mediación entre estos opuestos. En esta posición por lo
tanto el mundo no es reemplazable, porque precisamente es la cultura que
mantiene el juego antagónico del mundo y busca la conciliación de los ele-
mentos contrarios, la reacción desde este ángulo frente al mundo encuentra
la solución y amparo en “la intimidad”, en el interior.
261
encuentra una solución a este problema de “estar al filo de la vida y la muer-
te”. Kusch nos muestra una cultura que no concibe el mundo sin la dualidad,
y esto se ve representado en el dios Inca Viracocha descrito por Kusch, ca-
racterizado por cinco signos que son; La sabiduría o enseñanza, La riqueza
o abundancia, Tunupa o posibilidad de relación del dios con el mundo, La
dualidad (es varón y mujer) y por último el circulo que es la realización,
el fruto. Encontramos en el dios los elementos que deben ser conciliados
con el caos, es decir el dios es la oposición del mundo, Pero Kush agrega
algo importante a este problema cuando dice; “Pero parece que la oposición
es más bien cosa del mundo y no de viracocha. Este une a los opuestos, mientras
que el mundo los separa.” (Kusch, 2007) Pero en este caso Kusch dice mun-
do refiriéndose al caos, por lo tanto el mayor problema para aquel que se
encuentra en esta postura no es el cómo supero aquello que me amenaza o
aquello que es diferente a lo propio, puesto que es necesario para la creación
del mundo, sino cómo pueden encontrarse para que sea posible el mundo
y además para mantenerlo. En el relato contado por Kusch este encuentro
entre caos y orden desata una lucha en la cual, el orden representado por el
héroe Tunupa enviado por Viracocha logra salvarse gracias a la sabiduría
que posee por ser hijo de Viracocha y por consiguiente restaura el orden,
aunque este orden sea fugaz por su constante tensión con el caos, lo que
implica un mantenerse en una constante lucha de unión de las fuerzas, en la
que el hombre “yecto” hace posible el mundo a través de la conjuración del
caos mediante el rito (como símbolo divino).
Si nos preguntáramos qué aporta la postura decolonial a este pro-
blema a propósito del ordenamiento del mundo, la respuesta seria la im-
portancia que tiene la dualidad, la presencia de elementos diferentes para
poder crear mundo, que si predomina un solo elemento no es posible un
mundo habitable y por ende se está más cerca de las escasez y todo lo re-
lacionado con este como la muerte, la oscuridad, etc.
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262
rodolfo KuscH: lA culturA como HerrAmientA
pArA unA filosofíA situAdA
Se trata de que nos coloquemos antes del hecho de que haya historia. En
otras palabras, de recobrar el escenario en que vivimos, en donde no caben
las abstracciones y en donde, en cambio, se posibilita la historia misma.
En ese escenario recién habré de averiguar si tiene sentido de que la haya
(KUSCH, 2008, p. 84).
De este modo, aparece ante nosotrxs la dimensión del estar, que se di-
ferencia en Kusch de la dimensión de ser y muestra que el pensamiento euro-
peo del ser alguien, del poder-ser del existente, que es la dimensión en la que
la decisión del agente configura el mundo «en consideración a» su proyecto,
no puede dar cuenta de la totalidad de la cultura. Que junto a la producción
de esencias como proceso de transformación del mundo, hay otra dimensión
que apunta a algo así como la sobrevida del organismo cultural. Pero que, en
referencia al existente, es el estar de cara a la pregunta por lo condicionante
en el sentido de estar ahí existiendo, ósea del puro hecho de darse (KUSCH,
2008. p. 92) o de la pura posibilidad de ser (KUSCH, 2008, p. 85).
3 De acuerdo a esta consideración la idea de cultura como totalidad puede ser y ha sido
asociada a las ideas de una cosmovisión o concepción del mundo [weltanschuung], del
“mundo de la vida” (lebenswelt) husserliano o de la “vida histórica” hermenéutica -de allí
que, líneas más arriba, hablásemos de historicismo-; también podría asociársela a una
metafísica en el sentido del olvido heideggeriano, para pensar un humanismo cultural-
mente determinado, en este sentido, sería ésta una metafísica a la que le va en su esencia
una compresión culturalmente determinada del ser. Creemos que en un sentido muy
similar habla Maturo (2007) de un “humanismo culturalmente determinado”.
265
En este escenario, una cultura se convierte en “una estrategia para
vivir en un lugar y en un tiempo […] una política para vivir” (KUSCH,
1976, p. 104)
Una cultura tiene en su esencia su razón de ser en algo que es muy profun-
do, y que consiste en una estrategia para vivir, que un pueblo esgrime con
los signos de su cultura (KUSCH, 1976, p. 104).
“Una cultura no es una totalidad rígida, sino que comprende además una
estrategia para vivir. Una producción literaria, un ritual mágico, o una má-
quina son formas de estrategias para habitar mejor el mundo” (KUSCH,
1976, p. 98)
“Detrás de toda cultura está siempre el suelo […] Y ese suelo así enuncia-
do, que no es ni cosa, ni se toca, pero que pesa, es la única respuesta cuando
uno se hace la pregunta por la cultura. Él simboliza el margen de arraigo
que toda cultura debe tener. Es por eso que uno pertenece a una cultura y
recurre a ella en los momentos críticos para arraigarse y sentir que está
con una parte de su ser prendido al suelo. No hay otra universalidad que
esta condición de estar caído en el suelo” (KUSCH, 1976, p. 74)
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Abreviaciones
GHA: Geocultura del hombre americano.
AP: América Profunda
LNPP: La negación en el pensamiento popular.
268
o pátio de objetos sintéticos do coloniAlismo:
AproximAções entre rodolfo KuscH e
Antônio bispo dos sAntos
271
É necessário mais que pequenas atitudes de cuidado com o ambiente
para modificar a realidade material de nossa sociedade. Como nos
mostram as teorias abordadas, a forma de vida que reifica os objetos e
prima pelo sintético é mais que uma consequência do sistema econômico,
é também um aspecto significativo da herança do colonialismo no Brasil
e na América.
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272
lA esclAvitud culturAl de AméricA lAtinA
A pArtir de lA colonizAción
1 Mestranda em Filosofia pelo PPG de Filosofia PUCRS. Bolsista Cnpq- Pesquisa: Pen-
samiento auténtico latinoamericano en Leopoldo Zea.
273
las costumbres, el pensamiento, la religiosidad y sobretodo la identidad la-
tinoamericana. El despoblamiento fue más allá de los territorios. Hubo un
despoblamiento cultural y del pensamiento. Sacaron el alma del pueblo y de
la tierra, justificados por sus verdades absolutas, blancas y cristianas.
Según Ianni (1993, p. 12), aunque los países de América Latina sean
independientes uno del otro, existe algo que los unifica: su geografía, su
historia de colonización y su sociedad. Una sociedad marcada por la falta
de estabilidad política, por sus luchas sociales y un débil desarrollo econó-
mico. Esos factores son influyentes para la marca negativa de la identidad
cultural de un pueblo. Pero, en este trabajo iremos fijarnos principalmente
en la historia común de colonización y esclavitud.
Es importante acordarse que los hechos históricos están relacionados
con la manera como el pueblo se reconoce culturalmente y generan distintas
interpretaciones para otras naciones y para el propio pueblo latinoamericano:
274
Motivados por el repudio a ese sistema exploratorio y autoritario,
mestizos y mulatos empezaron una lucha de resistencia, pero, debido a la
gran variedad de razas, clases e intereses, las reivindicaciones que, a veces,
eran internas, no llegaban a los españoles.
La crisis económica que España estaba pasando en Europa abrió es-
pacio para innúmeras demandas y guerras de independencia en América
Latina que duraron quince años. Durante las guerras estaba claro lo que
querían las clases sociales: Libertad.
El legado de esas guerras fue la independencia y consecuente for-
mación de más países dentro de la América Española. Las independencias
fueron desplegándose entre 1809 y 1821, con el apoyo del gobierno de Es-
tados Unidos que creía ser esta una buena oportunidad de libre comercio.
Por eso, América Latina aún sigue buscando su identidad, intentan-
do superar años del encubrimiento de su cultura e historia y de las marcas
negativas del imperialismo norteamericano:
Esta la razón por que existen hombres de menos valor, para con los cuales
se debe usar de coacción y violencia. Son esclavos natos. Los espíritus su-
periores son llamados por la naturaleza para puestos de comando. Los
retardados (con cuerpos robustos) parecen destinados para servir (…) To-
más prosigue: esa característica de inferioridad se encuentra sobre todo
entre los pueblos primitivos, los cuales falta tanto escritura, como derecho
escrito. Por eso viven o vegetan rumbo a la imbecilidad y a costumbres
animalescos (HOFFNER, Joseph. 1906, p. 78).
El centro se impuso sobre la periferia desde hace cinco siglos. Pero ¿hasta
cuándo?
276
¿No habrá llegado a su fin la preponderancia geopolítica del centro?
¿Podemos vislumbrar un proceso de liberación creciente del hombre de la
periferia? (DUSSEL, Enrique 1977 p.15)
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277
concepções sobre o processo de colonizAção dAs
AméricAs à luz dA teoriA de rodolfo KuscH
3 Prehistory and Human Ecology of the Valley of Oaxaca, Mexico – Estudo dirigido
por Kent Vaughn Flannery, em cooperação com demais colegas da Universidade de Mi-
chigan, entre 1966 a 1980.
280
povos do novo continente. Esta ideia faz parte de um processo maior e
intencional denunciado por Marx (1989) na formação da superestrutura
ideológica e política que dá sustentáculo ao capital para expropriar e sub-
jugar o homem. Nesse quesito István Mészáros (2011) nos adverte, a su-
perestrutura de organização e conduta social, dos mecanismos coercitivos
do Estado, opera como mecanismo de controle um “usurpador a serviço
dos usurpadores da riqueza social” (p. 99). A história é contada, salvo ex-
ceções raras, pelos vencedores e sempre pelo ponto de vista de quem de-
tém os meios de comunicação e veiculação da informação. Existe um pro-
vérbio moçambicano que diz: “até que os leões tenham os seus próprios
historiadores, as histórias da caça continuarão glorificando o caçador”.
O movimento de desconstrução desse processo de aculturação e de
expropriação da cultura dos povos subjugados perpassa pela necessidade
de reescrita da história, mas não por aqueles que venceram, mas sim pelos
atores que foram privados de voz e de expressão em nome do desenvol-
vimento. O frei Bartolomeu4 de las Casas e outros escritores do perío-
do colonial registraram algumas das atrocidades realizadas em nome da
“descoberta do novo mundo”.
O processo de conquista reflete o movimento realizado para criar
uma realidade paralela que negue a cultura do outro, vista como inferior
e apregoe o chamado “desenvolvimento”. Os escritos de Rodolfo Kusch,
contribuem de maneira fecunda para o acirramento do debate e conse-
quente processo de desconstrução histórico-cultural, chamado por Kusch
“de-colonialismo” para, a partir desse movimento, direcionarmos para o
centro das pesquisas as riquezas técnicas, científicas e culturais produzi-
das pelas civilizações pré-colombianas.
Kusch retoma o debate fenomenológico na distinção do ser-alguém
e do mero-estar. O europeu aqui chegou e se deparou com uma filosofia
de vida e de “estar” no mundo que era incompatível com os interesses co-
loniais. Propõe a história da América do período das invasões até a atuali-
dade como a história menor das Américas em detrimento de uma história
maior, com início na pré-história e reforça a importância de resgate das
heranças nativistas para o processo de de-colonização. Sobre essa relação
entre o ser e o estar o autor esboçou que
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284
AntiguAs y nuevAs AfectAciones de los AcHé
Sebastián Castiñeira1
Lilian Morinigo2
Sara Quintana3
286
rivado también de su nueva forma de vida. Apartir de su sedentarización,
la pérdida de territorios ancestrales ha afectado la idea del hombre Aché
como cazador y recolector, no así su identificación con la naturaleza. Se
debe tener en cuenta que si bien las referencias se expresan en términos
generales, existen diferencias entre cada comunidad respecto a sus prác-
ticas culturales.
El monocultivo de la soja si bien sigue trayendo consecuencias nega-
tivas en la reducción de los territorios ancestrales y en la salud de los inte-
grantes de las comunidades, (a consecuencia del uso de los agrotóxicos), la
mayoría de las comunidades obtienen recursos económicos de la producción
de soja o del alquiler de sus tierras para la producción de la misma.
Las afectaciones y cambios del pueblo Aché no deberían ser toma-
das sólo como acciones sufridas de forma meramente pasiva por los Aché
sino que las mismas conllevan a diversos modos de transformación, resig-
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mujeres mApucHe y polifoníA de lA conflictividAd
interculturAl en el ngulumApu
Solange Cárcamo-Landero1
292
expresado en las demandas y reivindicaciones del movimiento social ma-
puche que permanentemente se reconstruye desde memorias de despojo,
violencia, injusticias y discriminación, por una parte, y desde memorias
de comunalidad, reciprocidad, resistencia y prácticas culturales, por otra
(COMUNIDAD DE HISTORIA MAPUCHE, 2012).
Según lo planteado, esta ponencia toma como ejemplos la escritura-
-autoría de Margarita Calfío Montalva (2012, 2016) y de Margarita Canío
Llanquinao (CANÍO, 2018; CANÍO Y POZO, 2013), entre otras, para dia-
logar con algunas claves existenciales que Rodolfo Kusch (2007 [1973],
p. 563) propone, especialmente, “el puro hecho de darse, de estar ahí exis-
tiendo” como trasfondo para respetar la “voluntad de ser” del Otro y de la
Otra que, en este caso, se traduce en reconocer a las mujeres mapuche y
sus luchas a partir de “sus propias lógicas de negación”.
La conclusión plantea que las memorias de conflictividad intercul-
tural de mujeres mapuche constituyen procesos político-epistémicos de li-
beración. La oralidad y la escritura de mujeres mapuches aportan nuevas
interpretaciones de la conflictividad intercultural en el Ngulumapu que
contribuyen a una mejor comprensión de dimensiones específicas que con-
forman la problemática intercultural. Sus narrativas se orientan a la recons-
trucción de las memorias de violencia social desde una perspectiva históri-
ca, relacional y constructiva de la conflictividad intercultural. Ello permite
el despliegue a través del tiempo de prácticas de resistencia cultural indivi-
duales y colectivas, cuyo carácter situado abre sus propias vías de expresión.
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294
AndilA KAingáng: A trAjetóriA dA liberdAde
[…] A invasão de nossas terras para o vosso povo tem significado sim-
plesmente um problema jurídico, ou como queiram chamá-lo, para o meu
povo não, são problemas que nós caingangues sentimos como feridas que
nos atormentam no mais alto dos sentimentos, fazendo-nos diminuídos,
oprimidos e transformando as nossas noites e vigílias na esperança de ver
ao amanhecer nossas terras desocupadas pelos brancos e, no entardecer,
mais um dia de desilusão, iniciando-se uma nova esperança... pois a cada
dia que passa sentimos o nosso sangue cada vez mais espesso e nossas
veias cada vez mais finas, quando então, muitos dos nossos encontram con-
formismo no terrível vício do alcoolismo […] (A ÍNDIA, 1975. p. 20-21).
5 Informação obtida por meio de comunicação oral, promovida entre autora e Andila
Kaingáng, na data de 22 de julho de 2019, na Terra Indígena Serrinha/RS.
6 Primeiro curso de graduação em Educação Específica para Povos Indígenas na Amé-
rica Latina, tendo colado grau 198 Professores Indígenas pertencentes a 36 Povos Indí-
genas do Brasil, em Junho/2006.
297
sores Kaingáng, já consolidada tanto por sua experiência como professora
bilíngue em comunidades Kaingáng, como por sua militância no movi-
mento indígena. Embora tenha trabalhado 35 anos na Funai (atualmente
é aposentada) não deixou de militar a favor dos interesses dos Povos Indí-
genas: sempre defendeu a ideia de que os interesses da Funai nem sempre
se coadunam aos interesses dos Povos Indígenas, pelo contrário, muitas
vezes são totalmente antagônicos e no confronto de interesses, ela ficaria
do lado dos indígenas! Tão marcante sua atuação no movimento indígena,
especialmente junto aos professores indígenas Kaingáng no RS, que em
1999 foi cedida pela Funai a fim de assessorar a Organização Indígena
APBKG – Associação dos Professores Bilíngües Kaingáng e Guarani do
RS, na qual assumiu a presidência por duas gestões (04 Anos), contribuin-
do para os debates e reivindicações dos Kaingáng na implementação de
políticas públicas voltadas à educação escolar indígena.
A experiência de atuação na Organização Indígena APBKG trouxe
novas perspectivas de enfrentamento das demandas nas comunidades indí-
genas, muito diferente da vivenciada no órgão indigenista, enquanto insti-
tuição governamental. Como resultado dessa incursão pelo terceiro setor,
Andila, logo após sua aposentadoria, articula a criação da Organização In-
dígena Instituto Kaingáng (INKA), fundada em 2002, instituição na qual
a “guerreira Kaingáng”, encontrou a oportunidade de dar continuidade ao
seu trabalho em educação Kaingáng em parceria com profissionais, lideran-
ças e comunidades indígenas, sem mais sofrer a ingerência estatal.
Neste momento, Andila Kaingáng já se encontrava residindo na
Terra Indígena Serrinha, com sua família desde 2000, participando da
retomada deste território tradicional expropriado dos Kaingáng ainda no
século XIX:
Inh my há ti!9
7 Embora o INKA não seja constituído somente por mulheres, desde sua fundação a ges-
tão sempre foi exercida por mulheres em reconhecimento ao seu protagonismo.
8 Em Kaingáng “Kanhgág Jãre” significa “Raiz Kaingáng”.
9 “Muito obrigado”, na língua Kaingáng.
299
Referências
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GIZ/FUNAI, , 2012.p.116-127.
300
el sentido de una obra no se
agota Con el autor, sino Con el
pueblo que la absorbe
seção 4
o bárbaro na
o monstruoso, o
América profunda
dual, o amorfo e
A circum-nAvegAção de cArolinA como decoloniAlidAde
Alice Soares1
Adotou depois o nome de Sakunar. Este nunca ria […] Como se quisesse
reencarnar a figura de Malisera, de quem se dizia ser filho bastardo […]
Só a revolução lhe poderia devolver o que julgava ser seu. Só com a vio-
lência. A violência revolucionária. Oposta à outra pela qual os legítimos
proprietários foram desapossados. Movia-o apenas o instinto de vingança
(CARDOSO, 2013, p. 48 e 49).
– Feminina?
uma dúvida que gostaria de ver esclarecida pela minha irmã. Cujas apre-
ciações são muito rigorosas. Nunca me disse de que gênero faço parte. Por
enquanto tenho-me sentido bem na pele de uma sandália
– As sandálias não têm sexo. Têm inclinações.
uma revelação que em vez de me deixar perplexa, liberta-me de certas fo-
bias. Por exemplo, o medo do abismo ou de não saber a que lado pertenço.
Inclino-me para a leviandade. (CARDOSO, 2013, p. 167)
[...] Para sua surpresa, leu a inscrição por cima da laje. Dizia Aqui Jaz
António Pigafetta...
– Quem é esse?
perguntou Carolina ao ver o sacristão defalecido...
– O meu antepassado
disse Carolina lendo as palavras nos lábios do sacristão. (CARDOSO,
2013, p.165)
– Vou-me embora
disse Carolina entre soluços. Mas para onde?
Não tinha para onde ir. Lembrou-se de que havia sempre Manumera para
onde regressar. A avó Aurora para a receber (CARDOSO, 2013, p. 218).
305
– Estou de volta
gritou Carolina quando desceu da microlete e correu em direção a casa da
avó Aurora. (CARDOSO, 2013, p. 231)
Um diário local, em língua portuguesa, editou uma manchete com o título
No ano e que se prepara a independência de Timor-Leste, Pigafetta completou
a circum-navegação. Um regresso após cinco séculos. Não os seus restos
mortais. Como seria de esperar. Mas em carne e osso.
Referências
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KUSCH, Rodolfo. El pensamiento indígena y popular em América y la nega-
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306
os indígenAs e seu cAminHAr pelo interior do nosso
estAdo: memóriAs e nArrAtivAs presentes
no ser e estAr do futuro
Introdução
Desenvolvimento
308
se passaram desde que os “bugres” foram embora da cidade, mas deixaram
ali as suas marcas.
O nome da cidade é um dos muitos mistérios que foram silenciados.
Sendo um nome indígena, como foi negada a passagem destes povos in-
dígenas pelo local? Devo ressaltar ainda que segundo Kusch (1976) geo-
grafia e cultura confirmam uma identidade cultural. Cultura essa que foi
negada, esquecida, mas que fez parte da cidade.
E a família originária de Levis Strauss (1980) deve ser apresentada.
Os primeiros indígenas que ali se reuniram. Como era a vida dentro desta
comunidade? Quantos eram ao todo? Eram todos de fato parentes? Tudo
deve ser abordado e registrado, pois daqui se espalharam e formaram no-
vos núcleos familiares em diferentes espaços que agora precisam ser ma-
peados e recuperados.
Esses são somente os conceitos iniciais, pois os mesmos serão am-
pliados bem como surgirão demais referenciais teóricos ao longo da pes-
quisa. Mas já demonstram o marco que irá orientar o caminho inicial a ser
perseguido ao longo dos registros destas memórias e narrativas.
Algumas considerações...
309
to de fala; 2) o entrevistado, que no momento está respondendo à per-
gunta formulada e ocupando o lugar de discursar; 3) o campo que vou
associar, de qual local está se falando, se menciona alguma área de estudo ou
atuação; e, 4) o material utilizado, se esta voz foi gravada, escrita, se foi repeti-
do o mesmo assunto durante várias etapas da conversa, como estava o entre-
vistado durante o processo, seus modos, seus comportamentos, seus gestos.
Devo estar disposta a escuta. Escutando até mesmo os meus silên-
cios. Como um observador que procura antes de tudo respostas. Procurar
resgatar memórias e oralidades. E ao final colocar tudo no papel. História
que precisa antes de tudo ser recontada.
Referências
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GOLDENBERG, M. A arte de pesquisar. Rio de Janeiro: Record, 1997.
310
o pensAmento decoloniAl e As poéticAs orAis:
sArAus e slAms
Introdução
[…] la cultura y el arte popular, es decir, los creados por el pueblo, por las
clases bajas o subalternas. Por extensión, suele llamarse también arte po-
pular al desarrollado por miembros de otros estratos sociales que adoptan,
consolidan y reelaboran los puntos de vista del pueblo, deseando servir a
sus intereses de clase y al desarrollo de su conciencia y valores. Cuando
Bertold Brecht afirma que un arte, para definirse como popular, debe ser
comprensible para las amplias masas y tomar y enriquecer sus formas de
expresión, se está refiriendo sin duda a un arte para el pueblo, que será po-
sitivo si refuerza a su cultura y negativo en la medida en que la sustituya,
subrogándose y expropiando la palabra a las clases bajas (COLOMBRES,
2007, p. 7).
O pensamento decolonial
312
Pedagogías que animan el pensar desde y con genealogías, racionalidades,
conocimientos, prácticas y sistemas civilizatorios y de vivir distintos. Pe-
dagogías que incitan posibilidades de estar, ser, sentir, existir, hacer, pen-
sar, mirar, escuchar y saber de otro modo, pedagogías enrumbadas hacia y
ancladas en procesos y proyectos de carácter, horizonte e intento decolo-
nial (WALSH, 2013, p. 28).
313
Conclusão
Referências
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314
em buscA dA terceirA mArgem: nAs fronteirAs
dA AméricA profundA
Introdução
1 E-mail: danischeifler@gmail.com
315
Porém, ao longo do livro, no capítulo chamado de Iniciação, Pozzo-
bon relata seu primeiro contato com os índios Makus e a desconstrução
que sofreu ao entrar em contato com o modo de vida simples deles que,
inicialmente, o antropólogo via como sinal de atraso com relação aos ín-
dios Tukanos. Sobre isso Fanon (1980), vai questionar o valor normativo
de certas culturas o qual é decretado unilateralmente por definições que
são, segundo ele, egocentristas e sociocentristas:
Objetivos
Metodologia
316
como os Makus se relacionam com o com o sagrado e com a natureza. Os
Makus temem o trovão, atribuem esse fenômeno da natureza a Boraró,
temem a natureza que eles não controlam, por isso se relacionam com ela
de modo a respeitá-la profundamente, de modo sagrado. Os sonhos e os
antepassados funcionam como parte atuante da vida e da morte:
Conclusão
Eu percebi muito cedo que esse mundo que a gente chama de mundo dos
brancos, que pode ser o Ocidente, imprime marcas no mundo, abre rotas, e
essas rotas são movidas por um interesse de saquear o roteiro. É um roteiro
317
que vai saqueando o caminho. Ele não semeia no caminho, ele só colhe. Ele sa-
queia o caminho. Percebi isso muito cedo. Há trinta, quarenta anos, eu já tinha
esse entendimento sensível, as relações que eram estabelecidas nesse caminho,
nesse trajeto, não tinham investimento para que durassem. Eram todos casa-
mentos temporários, casamentos de circunstâncias (KRENAK, 2016, p. 171).
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318
os filHos dA terrA semeAndo pAlAvrAs:
A cosmovisão indígenA e o pensAmento seminAl em
yvyrupA - A terrA umA só
Diego Bonatti1
Ana Lúcia Liberato Tettamanzy2
321
assinalada quando da narração do percurso em direção à “Terra do sol
nascente”. Nesse trajeto, à medida que descobrem novos espaços e esco-
lhem palavras para nomeá-los, espalham sementes, fazem a Terra brotar
e se tornar um lugar sagrado onde homens-animais-divindades possam
habitar. Essa semeadura não é somente física, mas simbólica: ao perpetuar
a vida por meio da semeadura, eles permitem que a palavra-semente ga-
nhe vida, nasça, cresça, dê frutos e dê continuidade ao eterno processo de
existir. A semente, nessa perspectiva, é mais do que portadora da planta
em potência: ela é a própria vida, porque leva, dentro de si, a gênese do
pensamento do povo.
Conforme Kusch (2007), o Pensamento Seminal explica o modo exis-
tir indígena, caracterizado pelo estar, muito mais do que ser. De acordo com
Kusch, a sabedoria indígena opera com base no equilíbrio entre ordem e
caos, apresentando, assim, um ritmo de vida único, e que os permite oscilar
entre os planos transcendental e físico, ou seja, habitar um espaço hetero-
gêneo, em que o sobrenatural é cotidiano, e a quebra desta ordem é que é
incomum. Assim, esta forma de pensar não só se apresenta inédita, como se
firma enquanto prática de fagocitação do branco pelo indígena, em outras
palavras, o indígena age com base na aculturação, a inversão do modo de
existir baseado no ser imposto pelo Ocidente, para o mero estar, uma forma
de permanecer sobre a Terra com base em princípios residuais, de práticas
ancestrais de convivência pacífica com o meio ambiente (Kusch, 2007).
Pensar a vida enquanto semente revela duas peculiaridades da gê-
nese do espaço para o Guarani. A primeira é de que, ao lançar sementes
ao solo, ele fecunda a Terra e torna-a algo vivo e sagrado, já que as divin-
dades se fazem presente em tudo que os rodeia. A segunda diz respeito
à gênese do espaço pela fecundação com palavras. O movimento circular
que os levou do centro da Terra (Paraguai), passando pelos Andes, até
chegar ao extremo Sul, e finalmente à margem do Oceano Atlântico, fez
com que os Guarani, por onde passassem, atribuíssem nomes para cada
espaço. Nomear a Terra a partir de características geolocalizadas como
“vento bom ou frio”, “lugar onde o sol nasce e se põe” é semear a Terra
com palavras e fazer da língua um instrumento de conexão do cosmos
interno com o externo.
Conforme Kusch (2007), em “El pensamiento indígena e popular en
América”, quando discute a questão de Limite, observa que os esquemas
de classificação, para os indígenas, opera a partir de percepções de afeto,
o que, portanto, constitui uma forma de conhecimento. O antropólogo
argentino explica que a relação eu-outro pelos indígenas envolve um pro-
cesso de percepção dos objetos que passa pelo intelecto e pela abstração,
322
recebendo as imagens de estereótipos e arquétipos que são exteriorizados
sob a forma de afeição ao encontrar o outro, ou a coisa. Esse processo é
uma cadeia aberta e de duplo sentido: ao mesmo tempo a saída de percep-
ções ocorre de forma diferente, por observar o sentimento que determina-
da circunstância causava no sujeito, e não seu pensamento racional frente
à questão, também a internalização de estímulos é singular. O indígena
olha para a realidade e significa-a de forma que o outro não seja alguém
exógeno, mas sim parte de um sistema em que os dois coabitam e existem
em relação. Assim sendo, o limite de percepção do indígena é o não limite.
A posição de mediação desempenhada pelo afeto na gestação da Terra
ilustra uma relação construída pela interdependência entre eu-outro-Ter-
ra, existindo senão em relação e constituindo um universo plural.
No mito de criação da Terra na perspectiva Tupi-Guarani em
Yvyrupa – A terra uma só, a reprodução da vida pelo humano acontece, além
do sexo, por aquilo de mais sagrado e que melhor traduz sua maneira de
entender este mundo: por meio das palavras. A palavra, para os Guarani
Mbya, significa, também, alma. Então, tudo que tem palavra, isto é, nome,
possui alma, vida. Portanto, conforme circula pelo território, o indígena
não apenas fertiliza a Terra com sementes, mas também com palavras. À
medida que se move circularmente, o Gurani reproduz o modo de pen-
sar transmitido pela semente: nascer, crescer, morrer e retornar ao solo,
reiniciando o ciclo da vida. A sabedoria trazida pelo Pensamento Seminal
de Kusch (2007) permite aos Guarani-Mbya uma inovação na maneira
de existir, que os faz pensar a partir da Terra e se ver enquanto parte
dela. Assim, em Yvyrupa - A terra uma só, o mito indígena faz com que os
filhos da terra, a partir da semeadura de palavras, construam o território
a partir de uma a cosmovisão própria e de uma estrutura de pensamento
seminal, quer dizer, circular.
323
Referências
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Dimensión Ontológica de las Epistemologías del Sur. AIBR - Revista de An-
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324
feminismo negro: pensAndo o lugAr dA mulHer
e do protAgonismo negro nA literAturA
de conceição evAristo
326
teria que ser uma pessoa de mil facetas para poder encarnar todas as per-
sonagens que queria descrever.
Ao passar para um exercício de leitura, Conceição Evaristo situa o
seu princípio desde a escola primária, com os próprios livros didáticos e
paradidáticos que ela leu. Leu o que pôde acessar na época e, ironicamen-
te, Evaristo diz que foi leitora de Monteiro Lobato. Durante a juventude,
leu também Lúcia Casasanta, Luzia Machado Brandão, Alaíde Lisboa de
Oliveira, Henriqueta Lisboa de Oliveira, as poesias de Olavo Bilac. Logo,
sua referência de leitura na infância e em grande parte da juventude é de
uma literatura que já estava canonizada naquele tempo. Como se lia Ma-
chado de Assis sem nunca pensar que era negro, sua referência de autores
negros vai se dar a partir do movimento social negro e, nesse sentido,
afirma-se que a pauta do movimento social negro é muito mais dinâmica
do que a pauta acadêmica.
A autora teve contato com o texto de Lima Barreto e Cruz e Sousa
a partir do movimento social negro. Já a literatura de Carolina Maria de
Jesus ela leu a partir de movimento católico Juventude Operária Católi-
ca (JOC), isso ainda nos anos 1960. Ademais, Evaristo teve contato com
Lélia Gonzalez dentro do movimento social e sem sombra de dúvida essa
intelectual negra marcou o movimento social negro. Do mesmo modo
como Beatriz Nascimento, Helena Teodoro, Neusa Santos com famoso
livro Tornar-se negro. Cada vez mais Evaristo foi se aprofundando, até o
projeto mesmo de escrita quando ela encontra escritores negros como o
grupo quilombhoje: Cuti, Miriam Alves, Esmeralda Ribeiro, Márcio Bar-
bosa, o Grupo Negrice do Rio de Janeiro, que depois por um tempo se
transformou no coletivo de escritores negros. Nessa época, uma pessoa
do coletivo de escritoras negras era Elisa Lucinda, e Salgado Maranhão
era também um autor do coletivo. É notório que ela foi encontrando com
esses escritores e conhece as escrituras negras. O seu projeto de escri-
ta para trazer essa ambiência negra também vai se fortalecendo, vai ga-
nhando corpo através das discussões que se empreendiam. Assim, o que
se pode afirmar é que essa autoria negra é marcada ou por pessoas que
estão diretamente dentro do movimento social negro ou por escritores
e escritoras que são formadas a partir do discurso do movimento negro,
elas contaminadas por esse discurso. Ressaltamos que a pauta acadêmica
é mais lenta ou menos aberta para descobrir determinados textos, pois há
uma tendência de trabalhar com os textos de escritores canônicos.
Isto posto, intenciona-se pesquisar a representação da mulher ne-
gra e do seu protagonismo no texto de Conceição Evaristo, com base nas
questões de gênero, discriminação, opressão, silenciamento e representa-
327
ção. Assim, a pesquisa reúne os seguintes aportes teóricos: Spivak (2010),
Dalcastagnè (2005), Ribeiro (2017), Berth (2018), hooks (2018), Hollanda
(1994), Perrot (2005), entre outros (as).
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332
becos dA memóriA: umA Análise contrA-coloniAl sobre o
território nA escritA de conceição evAristo
334
escrevivência, a partir da escolha temática, do vocabulário que se usa, do
enredo a partir de suas vivências e opções. A minha escrevivência e a es-
crevivência de autoria de mulheres negras se dá contaminada pela nossa
condição de mulher negra na sociedade brasileira. Toda minha escrita é
contaminada por essa condição. É isso que formata e sustenta o que estou
chamando de escrevivência (EVARISTO, 2017, s.p.).
A cada família que saía, era uma confirmação de que chegaria nossa vez.
Ofereciam duas opções ao morador: um pouco de material, tábuas e alguns
tijolos para que ele construísse outro barracão num lugar qualquer ou
uma indenização simbólica, um pouco de dinheiro. (...) Uma quantia tão
irrisória, que acabava sendo gasta ali mesmo (EVARISTO, 2013, p. 102)
dava a impressão de que nem eles sabiam direito porque estavam erradi-
cando a favela. Diziam que era para construir um hospital ou uma com-
panhia de gás, um grande clube, talvez. As famílias estavam mudando há
um ano, mas tempo antes, já havia a ameaça de tudo que iria acontecer.
(...) Não se sabia se os pretensos donos seriam de uma companhia par-
ticular ou se gente do governo. Vinha o medo. (...) Em época de eleição,
apareciam por lá candidatos a votos e juravam que fariam alguma coisa
por nós. (...) Às vezes ganhavam, quando isto acontecia, a nossa situa-
ção era a mesma, nós éramos os que não ganhavam nunca (EVARISTO,
2013, p. 163 e 165).
336
de vida, suas expressões culturais e seus territórios, isto é, as suas formas
de resistência e de auto-organização comunitária contra colonial (p. 26).
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337
el discurso público y lA nArrAtivA de sAcerdotes
indígenAs mApucHe, en lA región de lA ArAucAníA: unA
mirAdA en perspectivA HermenéuticA interculturAl
Otro aspecto son los relatos de sacerdotes mapuche, que han tra-
bajado con su pueblo en la evangelización e inculturalización desde una
institución como la iglesia católica, a partir de una vocación religiosa; lo
que resulta extremadamente valiosos, dado el papel que ha ocupado por
siglo dicha institución en América, con todos sus errores y aciertos. En
este sentido, los discursos de los sacerdotes mapuches, también establecen
un dialogo intercultural, que en alguna forma permiten generar las con-
diciones para que el sujeto moral tenga siempre la posibilidad de someter
a crítica su vida y sus acciones, con una actitud reflexiva y de sospecha
frente a las tradiciones que la están constituyendo. De tal forma que le
permita construir críticamente un nuevo espacio, que se sitúa en forma
distinta no-tradicional para rearticular el encuentro con el “otro”.
En consecuencia el reconocimiento es el principio fundamental de una
ética intercultural donde la dignidad humana es un valor atribuido a cada
persona y no puede ser sustituido por otros valores teniendo las caracterís-
ticas de ser intersubjetivo, donde el sujeto es superado por el otro y por los
otros, haciéndose la sociedad más humana e inclusiva (ARAYA, 2009, 2010).
340
En síntesis, los relatos de los sacerdotes mapuches, tocan diferentes
aspectos de las relaciones conflictivas entre Mapuches y chilenos, y dan
cuenta de una realidad que debe ser transformada, por las injusticias y
exclusiones que se producen y el sufrimiento que, finalmente, tiene como
resultado la violencia y el odio. Así, la comprensión y reflexión que nos
dejan los distintos relatos es que para acoger los saberes y razones, las
formas de pensar y ver la realidad según la visón mapuche, es necesario
un principio vinculante que establezca un proceso de construcción de vo-
luntades y criterios de simetría, que cambie el discurso de dominación que
produce una comunicación distorsionada. Así, la aceptación de diferentes
miradas culturales permitirá recomponer el diálogo, que es una poten-
cialidad que desarrollan los individuos autónomos y autoreflexivos. Este
punto, es un principio que sustenta la justicia intercultural, que exige que
las personas pertenecientes a diferentes culturas, sean consideradas como
seres dotados de competencia comunicativa, y capacidad de autonomía,
en otras palabras, se necesita de una ética intercultural (ARAYA, 2010).
Por consiguiente, una reflexión filosófica intercultural parte de una com-
prensión dialógica de las culturas, lo que significa aprender nuevos códi-
gos culturales reconociendo la presencia de otras tradiciones culturales y
prácticas sociales distintas a las propias.
Uno de los obstáculos principales para una ciudadanía intercultural,
en el caso de Chile, está representado por la ausencia de reconocimiento
jurídico-político del pueblo mapuche y la implementación de políticas cul-
turales de asimilación y segregación por medio del aparato estatal, con el
objetivo de justificar la homogeneidad sociocultural del Estado Nacional.
De este modo, se construye una identidad instrumental que excluye la
diferencia interna en beneficio de una nación homogénea en el ámbito
lingüístico, racial y religioso. En la actualidad el Estado-nación de Chile,
aunque ha perdido su posición monopolista a causa de la globalización y
de ciertas leyes de tolerancia, sigue ejerciendo regulación sobre las mino-
rías por medio de la educación, la economía, la salud y la religión.
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342
As nArrAtivAs do tAmbor como práticAs decoloniAis
345
e escamoteação, presentes no período colonial e vigentes em boa medida
ainda hoje em formas reinventadas de violência racial. Tratam-se de pe-
dagogias questionadoras e desafiantes da razão ocidental moderna que
retornam à ancestralidade negra para construir novos conhecimentos.
Pretendemos, através das pedagogias decoloniais descritas neste artigo,
enfrentar o racismo que legitima relações dominadoras europeias, instau-
rando práticas contra-hegemônicas que possibilitam o cruzamento de vo-
zes na constituição cultural latino-americana.
Esta explanação se justifica nas VIII Jornadas O Pensamento de
Rodolfo Kush na medida em que, se estivesse vivo, o filósofo da América
profunda teria satisfação em perceber a mudança – ainda que gradual –
nos currículos das universidades, cujos professores comprometidos com
a proposta decolonial aceitam as transformações culturais que aceitam
novas formas de pensar e de dialogar sobre os saberes pluriculturais que
vêm chegando timidamente ao espaço acadêmico.
346
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347
A AncestrAlidAde em sAlA de AulA: livros
e documentários Ameríndios como recursos didáticos
Introdução
Metodologia
[...] a voz dos próprios indígenas contando sua história e seu modo de
vida. As publicações produzidas hoje por intelectuais e professores indíge-
nas oferecem possibilidades singulares para estudo na escola e a relativa
quantidade de publicações de escritores indígenas no Brasil, produzidas na
atualidade por dezenas de etnias.
351
Também há a escritora Eliane Potiguara, que é poeta, professora,
ativista e empreendedora. Fundou a Rede Grumin de Mulheres Indíge-
nas. É autora de várias obras, entre elas são “A Cura da Terra” e “Metade
Cara, Metade Máscara”.
Por fim, trago Aílton Krenak, que é jornalista, produtor gráfico e
líder indígena. Foi alfabetizado aos 18 anos. A partir da década de 80,
passou a dedicar-se exclusivamente à articulação do movimento indíge-
na no Brasil. É autor de diversos livros, entre eles “Ideias para adiar o
fim do mundo”.
As obras desses e de outros escritores ameríndios vêm sendo uti-
lizadas nas escolas, retratando de forma mais fiel o tema e apresentando
a realidade e as narrativas dos diversos povos indígenas existentes no
Brasil.
Há um projeto brasileiro importante no reconhecimento e na pro-
moção da autoria indígena que é o “Vídeo nas Aldeias”3. Existente desde
1986, este dedica-se à formação de cineastas indígenas e a produção
e difusão de seus filmes. Entre as produções, há o documentário “Mo-
koi Tekoá Petei Jeguatá – Duas aldeias, uma caminhada” (2008) retrata
o dia-a-dia de no contexto atual duas comunidades Mbyá Guarani no
Rio Grande do Sul: a Tekoá Anhetenguá (Aldeia Verdadeira) e a Tekoá
Koenjú (Aldeia Arvorecer).
Já o documentário “Tava, a casa de pedra” (2012) traz o registro e a
interpretação das memórias e das narrativas Mbyá Guarani acerca das
Reduções Jesuíticas, traçando um panorama entre três países: Brasil, Pa-
raguai e Argentina.
Os diferentes recursos didáticos apresentados nessa seção, carre-
gam consigo a identidade do indígena, seus costumes e suas formas de
vida. Além disso, trazem algo mais: o fato de as narrativas serem contadas
a partir da voz dos protagonistas dessa história.
Considerações finais
353
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354
A músicA nA AméricA lAtinA como AntAgonismo
Ao mercAdo culturAl
Maicon Dorigatti1
356
tradições, retratando um universo extremamente rico de saberes, habili-
dades e conhecimentos populares.
Ao mesmo tempo, enquanto região influenciada pelos processos
prevalentes e numa perspectiva de globalização apresenta expressões que
como em todo o mundo, refletem o impasse entre linguagens artísticas que
manifestam a cultura de um povo e são assimiladas por ele como tal, e uma
música de difusão internacional que não tem necessariamente uma preocu-
pação com a estética de uma região ou povo específico (NEVES, 1981).
No processo de desenvolvimento ocorrido na música europeia, ao
passar de cada século os sistemas técnicos, estéticos e etnomusicológicos
se sucederam de forma quase natural, baseados em ampla literatura teó-
rica, textos e tratados, em que cada inovação correspondeu a uma neces-
sidade, cada característica valeu a uma época, em mais de dez séculos de
registro histórico não existem mistérios ou acidentes, se não um enrique-
cimento gradual e um maior conhecimento do mundo (CARPENTIER,
1983, p. 7). Dessemelhante, a música na América Latina não se baseia num
processo tão ordenado de construção. Devoto (1983, p. 21 e 22) expõe que,
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365
memóriAs de um insurgente guArAni mbyA
no litorAl norte do rio grAnde do sul:
biogrAfiA AutorizAdA pArA juruA
368
Como instrumento básico foi realizada uma entrevista narrativa, di-
vidida em temáticas combinadas previamente com o participante. Nesse
sentido, cabe ressaltar que partiu da liderança indígena a busca por alguém
(não indígena) que pudesse “escrever num livro a história Guarani que eu sei
contar aqui no Litoral!” (Diário de Campo/ fala exploratória: nov. 2018).
A entrevista áudio-gravada (foi dividida em temas) e transcrita.
Com orientação do participante, os depoimentos foram ilustrados com
imagens e fotografias. Essa prática, segundo Guran (2011) permite a
complementação textual, um modo de evitar que haja dúvidas no diálogo
entre escritor e leitor, tanto que nas margens das ilustrações podem ser
incluídos pequenas explicações.
Como esta pesquisa está registrando, há uma epistemologia valoro-
sa nas falas desse insurgente indígena, consolidada sem a intervenção do
sistema escolar convencional. Tanto que uma das bandeiras levantada e
edificada pelo indígena, com a ajuda de apoiadores indigenistas, foi a bio-
construção de uma escola autônoma, a qual deverá “responder ao imagi-
nário do estado” de ensino, mas ensinar, com maior ênfase, o currículo das
“vivências” que os Guarani Mbya precisam para não perderem a tradição.
Trata-se de uma experiência de “inovação institucional” (VENÂNCIO,
2012) ou étnico-institucional (SCHEFER, 2018).
Cabendo, desse modo, ponderar sobre a existência de outro modo de
aprender e de ensinar valores e práticas para viver bem em comunidade
(BAUMAN, 2003), a qual perpassa por questões étnicas. Conhecimen-
tos ancestrais, artesanais, que têm garantido a sobrevivência indígena em
meio às relações periféricas (SCHEFER, 2015) do presente.
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370
nArrAtivAs e memóriAs de mulHeres
negrAs em suAs escriturAs
372
a maio de 2019, as mulheres confiaram-me os seguintes documentos, que
constituem as materialidades de suas práticas de escrita ordinárias:
Liliane 68 anos Porto Alegre Cinco cader- Cadernos: “para registros das
nos brochu- ajudas do Alto”
ras pequeno,
um caderno Agenda: organização da vida
espiral pe- laboral, saúde, finanças, famí-
quenos e uma lia, receitas, relações.
agenda
Todos da década de 1990.
Mariana 61 anos Caçapava do Duas agen- Duas agendas: indicação de
Sul das e um versículos bíblicos lidos, dias
caderno bro- de jejum e dias de culto. Uma
chura do ano 2015 e outra 2017.
373
Walty, Fonseca e Cury (2000, p. 42) em análise acerca do processo
de escrita e leitura, registram: “Nos atos de escrever e ler ativam-se visões
de mundo, vivências, leituras e escritas anteriores, que interferem, condi-
cionam, particularizam a leitura e os textos”. Há, portanto, uma íntima
relação entre as práticas de leitura e escritura. Durante o desenvolvimen-
to desta pesquisa, pautada em conversas prévias informais com cada uma
das mulheres, pude compreender diferentes tempos e momentos da relação
delas com a leitura e a escrita. Para Joana, destaca-se o registro motiva-
do pelo outro, pelo pedido do neto para que escrevesse suas vivências na
comunidade quilombola. Para Liliane, Mariana e Natalina, as práticas de
escrita estão relacionadas às leituras espirituais, onde buscaram conforto
para momentos de vida mais turbulentos. Mariana trouxe a materialidade
mais antiga desta pesquisa: seu caderno de música de juventude. Para Dé-
bora, o conjunto confiado à pesquisa relaciona-se diretamente à sua ativi-
dade laboral exercida por mais tempo, a de cozinheira, e destaca-se o afeto
que tem por seu caderno de questionário, da época do colégio, que vem so-
brevivendo ao tempo e às mudanças de residência há trinta e quatro anos.
Assim, esta pesquisa propicia pensar as relações das escreventes com seu
processo de alfabetização – heterogêneo –, as suas memórias da escola, a
forma como utilizam o código escrito, os gestos que alimentam a sua pro-
dução manuscrita, que se faz acompanhada de uma relação com a leitura.
Cabe lembrar que existe um longo processo histórico que possibili-
tou, inicialmente na Europa ocidental, a partir do século XVIII a expan-
são das relações privadas das pessoas com a prática de leitura, abrindo
caminho para a prática da escrita privada e da escrita de si. O processo
de alfabetização tampouco foi homogêneo e coube às camadas populares
e às mulheres pobres o último momento. No Brasil, pode-se afirmar que
somente com expansão do acesso à escola pública na segunda metade do
século XX foi possível às camadas populares o domínio da cultura escrita
– tão importante nas sociedades gráficas para oportunidades de trabalho
e relacionamentos. Assim, pesquisar as práticas de escrita ordinárias das
mulheres negras configura também a possibilidade de refletir sobre o mo-
mento histórico em que elas o realizam, sendo relevante perguntar como
e quando o fazem e que significado elas dão às suas escrituras.
Para Gomes (2004), a intenção de produzir uma memória de si e dos
familiares acerca da vida em outro tempo pode ser lida como uma busca
por “dotar o mundo que os rodeia de significados especiais, relacionados
com suas próprias vidas [...]” (GOMES, 2004, p. 11). Ao mesmo tempo,
ao confiar ao papel suas vivências, seus registros tornam-se testemunhos
sobre suas relações sociais, aproximando-se da assertiva de Arfuch (2010,
374
p. 141) de que a narrativa individual envolve uma trama de lembranças de
outros – parentes, descendentes, conhecidos –, tornando possível, assim,
que ao falar de si, seja possível mirar o contexto socio-histórico e cultural
em que está inserido e refletir sobre o espaço da coletividade. Esta relação
com o outro está intrinsecamente relacionada ao reconhecimento de sua
identidade, como analisam Shons e Grigoleto (2008, p. 407): “Ao escrever
sobre si, o sujeito escreve também sobre o outro, que o determina na sua
construção identitária”.
Aqui finalizo, visando enfatizar a importância de pesquisar sobre
as narrativas que as mulheres negras e quilombolas produzem sobre si, e
também sobre as suas relações sociais e comunitárias.
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375
de nuestrA AméricA A lA AméricA profundA: un diálogo
entre josé mArtí y rodolfo KuscH
Contextos en diálogo
378
imperialistas de Estados Unidos empezaban a ser una amenaza para la
independencia recién lograda en muchas naciones, para las formas de go-
bernarlas y para la identidad de los pueblos.
Por su parte, América Profunda se piensa, se escribe y se publica en
un continente que estaba preparando golpes de estado contra gobiernos de-
mocráticos. Las tierras de Sudamérica enfrentaban un contexto polarizado,
de militarización y una atmósfera de violencia como vehículo para construir
el Estado. Los diversos modos de autoritarismo emergente, atentaban con-
tra los derechos humanos, contra las prácticas culturales, contra los saberes
propios, contra los propósitos modernizadores que guiaban la consolida-
ción de los gobiernos, etc. A su vez, y como respuesta a la injusticia e ine-
quidad, se levantaban sueños revolucionarios y movimientos sociales que
matizaban y tensionaban los contextos latinoamericanos.
Como se ve, son más de 70 años los que separan la publicación de
Nuestra América de la América profunda. Podría pensarse, a priori, que
los contextos, las luchas y necesidades que enmarcaron cada época fueron
muy diferentes. Pero no puede negarse que nuestro continente se ha visto
afectado por problemas que han sobrevivido al paso de los siglos. La ne-
cesidad de luchar por justicia, libertad, respeto a la diversidad y la equidad
han trascendido; las luchas identitarias se han mantenido y diversificado;
la defensa de los derechos humanos de los ataques de gobiernos opresores
e imperialistas es una constante; el colonialismo cultural que niega las
prácticas culturales de la diversidad americana es permanente. Seguimos
viviendo y sobreviviendo a la larga noche de los 500 años.
Y en este cúmulo de adversidades, en este “hervidero espantoso”,
hay algo que nos cohesiona y es la conciencia plena de que “...algo nos im-
pide ser totalmente occidentales aunque nos los propongamos” (KUSCH,
1962, p. 180). Nos une nuestra raiz mestiza, germinada en la diversidad,
en el encuentro de opuestos, nacida de la violencia, de los sobrevivientes
del exterminio, de la compra de modelos importados, que se encuentran
con nuestros modos profundos de estar en el mundo. Diría Kusch “Amé-
rica es un mundo de opuestos rotundos y evidentes. El indio se ve a sí
mismo frente al comunismo, y el rico frente al pobre y la mujer honorable
frente a la prostituta. Siempre se trata de una realidad escindida.” (Op.cit.,
p. 223). Martí lo retrataría de la siguiente forma:
Y “Por que lo que es semilla, llegará a ser fruto” (KUSCH, 1962, p. 223).
Reflexiones finales
Referências
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edición 1953. Editorial Fundación Ross. Rosario Argentina, 2007.
MARTÍ, José. Obras Completas. La Habana, Cuba: Editorial Ciencias Sociales,
1992.
RODRÍGUEZ, Pedro. De todas partes. Perfiles de José Martí. La Habana,
Cuba: Centro de Estudios Martianos, 2012.
VIVEROS, Alejandro. Enfoques sobre la filosofía de Rodolfo Kusch. El método,
lo popular y el indígena como horizontes de pregunta en la filosofía americana.
Revista Alfa. Número 42. Julio de 2016. Disponible en https://scielo.conicyt.
cl/pdf/alpha/n42/art_14.pdf
[...] Quando você coloca terras digitais, quando você cria esse ambiente
de construção, onde o outro é responsável por algo que é dele, ele vai dizer
que é dele: “é minha rádio”. Então, quando todos assumem que a Rádio
Yandê é deles, vão colaborar, vão construir, vão dar opinião, vão criticar e
a gente vai ouvir e vai respeitar isso tudo! E aí, a diversidade étnica apare-
ce. O conceito etnomidiático, ele se aflora! Ele só se demonstra! Ele sai de
linhas mal escritas, redigidas, tortas, pra ficar mais tortas, mas mais bem
redigidas e com formatos, com biomas, com identidades. Essas palavras
simplesmente passam de ser mais palavras e de conceitos, para se trans-
formarem em seres [...] (MUNIZ, TUPINAMBÁ HÃ HÃ HÃE, 2018).
384
A realidade múltipla latino-americana com seus ricos modos de vidas
ameríndios e afro-americanos foi reduzida, como nos lembra Maldonado
(2011), a termos pejorativos como “bagunça”, “atraso” e aos anacronis-
mos sociais medidos por parâmetros de vida estadunidense, compreen-
dida como o que há de mais moderno. Essa ocidentalização, não apenas
nos invade como é internalizada como único parâmetro possível para a
construção do nosso pensamento, como nos traz Kusch (1978). No entan-
to, o filósofo argentino coloca que o pensamento popular nos aponta para
outra forma de ser, algo que nos exige procedimentos e metodologias que
reconheçam esses saberes como pensamentos autênticos. Para isso, diria
Martín Barbero (1988), é preciso romper com a imposição de uma simu-
lação de modernidade tecnológica, condição empurrada por países ricos
que forçam a tarefa de aplicá-la e consumi-la. Na prática, significa quebrar
com as mesmas concepções de ciência, de estudo científico e de sua função
na sociedade engendradas por um modelo funcionalista de matrizes verti-
cais e unidirecionais, que seguem vivas e sobre as quais se pensa a história
e a dominação de modo racional, oculto e justificado.
A comunicação acontece no cosmos, nos rios, nas montanhas e
quando a despersonalizamos, considerando apenas como atributo exclu-
sivo dos seres humanos, esses lugares se tornam não apenas resíduos da
atividade industrial e extrativista. Para Ailton Krenak (2019) é como se
assinássemos o divórcio de interação e integração com a nossa Mãe Terra
que aos poucos nos deixa órfãos de suas sabedorias. É preciso adentrar,
como argumenta Kusch (1978), no solo e nos símbolos para resgatar o
vínculo com o absoluto. Aventurar-se, pois, pela psicosfera humana, vol-
tando à consciência natural, para a compreensão dos sintomas do mundo
e de como o espírito do ser humano nos comunica. A comunicação, não
como cérebro e sistema central de um organismo cuja a função é a so-
brevivência, mas a comunicação como alma-palavra, que na cosmovisão
Mbyá Guarani, é ação em carne viva e se concretiza no desafio diário de
“el saber escuchar la palabra, el saber hacer escuchar la palabra, el saber
hacer fluir la palabra, el saber decir la palabra” (MAIDANA, 1993, p. 218).
Se claras estão “as carências das elites ineficientes, medíocres e ig-
norantes que nos governam”, do mesmo modo não podemos mais fechar
os olhos para as “formas de vida comunitária que conservam formas cola-
borativas, tribais, ritualísticas e de solidariedade como elementos centrais
de sua vida cotidiana e produtiva” (MALDONADO, 2011, p. 4). A partir
de culturas com suas cosmovisões, cosmologias, sabedorias ancestrais mi-
lenares, podemos pensar a etnomídia indígena como território de comuni-
cação alter/nativa, escrita desta maneira por Torrico Villanueva (2016),
385
para sublinhar o poder de alteridade do cidadão nativo frente à comuni-
cação, com a possibilidade de (re)construir um outro nativo, considerando
não apenas a dimensão geográfica, mas refletindo esta ambiência sobre as
circunstâncias a partir das quais se elabora o pensar (KUSCH, 1978).
A etnomídia indígena proposta pela Rádio Yandê busca uma comu-
nicação mais humana, social, comunitária, inclusiva e democratizante, na
promoção do diálogo e da escuta de seres, espíritos, valores, saberes e nar-
rativas de culturas ancestrais. Constatamos um veículo multimidiático de
resistência que luta contra os processos hegemônicos de exclusão social
(SOUSA SANTOS, 2006), uma alter/nativa aos modos dominantes de
desenvolvimento e de conhecimento, ao agregar linguagens dos meios,
dos códigos, das percepções, do reconhecimento dos meios de enunciação
do popular e do étnico.
Referências
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KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. 1ª ed. - São Paulo; Com-
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com.br/2016/08/11/etnomidia-por-uma-comunicacao-dos-povos-originarios/
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contextualização, pesquisa empírica e pesquisa teórica. In:______. Metodolo-
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gena”: um dos fundadores e coordenadores da Rádio Yandê, fala sobre as tec-
nologias de comunicação indígena, da pintura corporal à produção audiovisual,
durante o evento Mekukradjá - Círculo de Saberes, ocorrido no Itaú Cultural.
São Paulo, 6 de out. 2017. Disponível em https://soundcloud.com/itaucultural/
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TORRICO VILLANUEVA, Erick R. Hacia la Comunicación decolonial. Se-
rie Integrar. Volumen Nº2. Sucre, Bolivia: Universidad Andina Simón Bolívar
(UASB), 2016.
387
quAndo o nArrAdor se cAlA e fAz-se urgente ouvir
o “outro”, enquAnto ele existe: “cedo-lHe pois, muito
contente, A pAlAvrA (ou A fAlA?... e A voz?...)...”
E diz mais e não resisto em alinhar, a alinhavar, porque por mais ficção que
isto tudo também tenda a ser, ou venha a ser, ou queira ser, não sou capaz,
constato uma vez mais, de me impor o exercício para mim contra-natura,
de tentar articular só anedotas capazes talvez de cativar toda a gente... (de
qualquer maneira o que estou a ordenar não é para publicar assim, estou
só a arrumar) (CARVALHO, 2005b, p. 159).
Que autor, de facto, não terá sonhado escrever um livro que seja quem for
o venha a abrir numa hora qualquer para encontrar aí uma cumplicidade
que talvez nem sempre lhe tenha assistido ao longo do seu próprio destino,
ou uma ou duas páginas que as possa sentir escritas não só para si mas
também por si mesmo? (CARVALHO, 2005b, p. 11).
Severo [...] sabia que não era bem assim, nem ia ser simples assim o que
estava para dar-se em Angola, a exaltar a cor local de solidariedades mar-
ginais e de circunstância e a pôr isso a cozinhar no caldeirão nacionalista.
Eram coisas que andavam, afinal, a ser recuperadas, também, pela cozinha
do império (CARVALHO, 2005b, p. 75).
391
“eu” no narrador, que por sua vez vai se colocar em personagem, como
receptor de e-mails de Severo, para, afinal, passar seu papel de narrador
ao próprio emissor das narrações, Severo; transcrevendo simplesmente as
suas palavras, marcadas pelo itálico.
Se em Os papéis do inglês, o narrador, um etnógrafo, utiliza do pre-
texto de escrever cartas a uma interlocutora para passar seu conheci-
mento sobre o sul de Angola; em As paisagens propícias este narrador irá
articular “a estória verdadeira, neste caso a viagem, vivida como ficção”
(CARVALHO, 2005b, p. 13) e “um caderno onde já antes registou o que
alguém que tinha coisas para revelar contou àquele que irá narrar-lhe a
estória agora” (CARVALHO, 2005b, p. 12). O narrador tem, portanto, a
função de organizar as narrações de Severo, e de elaborar um livro, que é
apresentado como inacabado, estando em processo de confecção, processo
este do qual o leitor participa:
O que o narrador tem aqui a fazer, [...] é para dar a essa sucessão de frases,
ideias, lembranças, observações, comentários, exegeses, uma ordem, para
seu governo, que depois dê para achar uma maneira qualquer de tornar
isto publicável. Umas vezes transcrevendo, outras reportando-se aos con-
teúdos que o texto fornece para ir entrelaçando os fios com que fabrique,
acrescente, enrole, aumente o cordão da narrativa, o fio da narração que
está a ver se tece, se acontece (CARVALHO, 2005b, p. 140).
Premir a tecla que imprime o ponto até achar que se deteve o justo tempo
que lhe convém para inscrever respirações da fala [...] debitar palavras
mas ao jeito da maneira da fala [...] fazer intervir na escrita esses silên-
cios que acomodam a fala... imobilizam, agitam ou encapelam a cama de
silêncios que a expressão aciona, singrando sintaxes [...] (CARVALHO,
2005b, p. 227).
Referências
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porains dans les littératures de l’Angola et du Mozambique”. L’Afrique au-
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KLINGER, Diana. Escritas de si, escritas do outro: auto-ficção e etnogra-
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www.poscritica.uneb.br/wp-content/uploads/2014/08/DIANA-KLINGER-
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MICELI, Sonia. Contar para vivê-lo, viver para cumpri-lo: Autocolocação e
construção do livro na trilogia ficcional de Ruy Duarte de Carvalho. 2011. Dispo-
nível em http://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/3635/1/ulfl088723_tm.pdf
394
yvyrupA: sem penA nem cocAr, umA perspectivA
sobre o mito fundAdor e A cosmovisão
guArAni mbyá
396
tórios e da diversidade cultural. A territorialidade e a ancestralidade é o
que conecta o ser humano ao sagrado. Segundo o autor, a ancestralidade
surge da memória viva que orienta visionar um futuro, e que os povos
originários vivem em comunidade, compartilham a terra e por isso estão
em defesa dos territórios.
Os conceitos de ontologia relacional e ontologia política que são
desenvolvidos por Escobar (2016), servem para revelar os estudos sobre
as Epistemologias do Sul, e olhar para os saberes periféricos, estigmati-
zados e subalternos – e é o sentir/pensar a Terra, que Escobar (2016)
trabalha em seu texto. Esses saberes contribuem de modo alternativo nos
problemas da atualidade a partir da diferença que as culturas têm. Mas
essa relação vai além da perspectiva, passando pelas trocas, chegando até
uma fagocitação que Rodolfo Kusch (2007) alude em América Profunda,
sugerindo uma conjunção de ser/estar, de existir a partir da relação.
O livro Yvyrupa retrata os fundamentos da criação do mundo. Con-
forme a literatura oral do povo Guarani, e narra os pensamentos e sabe-
res, com uma escrita poética, constituem conexões entre o significado do
mito e a cosmovisão. Assim como na tradição judaico-cristã, descrito na
bíblia “sagrada”, que no princípio tudo era escuro, além da ciência que
explicou o surgimento do mundo, o povo Guarani Mbyá, a partir de sua
cosmologia, também faz sua analogia e acredita que não havia vidas antes
do surgimento da luz e do pai da criação - Nhamandu Tenondegua. E com
sabedoria e amor infinito Nhamandu criou seu assento divino, com cocar
de plumas, com orvalho das flores e surgiu o colibri, o pássaro que voou
no meio da noite e que alimentou o pai da criação.
Nhamandu criou as três origens divinas: a origem das palavras, o
canto divino, o amor infinito, portanto cria a linguagem, o canto dos ritos
e o amor por tudo, é essa a ontologia relacional, que Escobar (2016) diz
que acontece na relação das coisas e dos seres, e só têm definição com o
contato – momento e estado: “Da sabedoria de Nhamandu, da sua chama
e da sua neblina divina, nascem as belas palavras, ayu rapyta. Ele é o dono
da palavra” (POPYGUA, 2017, p. 17).
Os guaranis têm a sabedoria sobre não ocuparem o mundo e sim
habitá-lo. A ancestralidade e os territórios fazem parte da memória viva e
que garantirá o futuro desses povos. Sobre o mito apresentado em Yvyru-
pa está associado ao território e à ancestralidade guarani. Timóteo Verá
Tupã (2017, p. 55 e 56), na fala final do livro, após a apresentação do mito,
acrescenta sobre a importância dos territórios:
397
Nhanderu criou a Terra para que possamos todos viver nela. Apesar de os
Guarani viverem na amplidão e sem fronteiras, desde os anos 1970, muito
tempo depois do desaparecimento das bandeiras e dos bandeirantes, no
Estado de São Paulo, onde cresci, os Guarani Mbya se viram novamente
obrigados a lutar pela defesa de seu território e reconhecimento de suas
Terras, visando à demarcação das aldeias.
A luta pela terra é para que esses povos possam garantir o futuro
das crianças e de suas comunidades, afinal de contas foram os juruá (não
indígenas) que destruíram seus territórios, e por isso a escolha de Popy-
gua (2017) ao trazer a história do mito fundador Guarani. É só lendo e
escutando o que esses povos têm a dizer que saberemos, na prática, que os
territórios e o saber podem desparecer junto com eles, assim como muitas
etnias e línguas que já desapareceram.
Para explicar parte do título deste trabalho “Sem pena nem cocar”, é
uma referência aos estereótipos que muitas pessoas ainda carregam, acre-
ditando que os indígenas vivem com cocar, nus e pintados da cabeça aos
pés. Afinal, índio não pode ter celular? E “branco” – não indígena - não
pode o quê então? É de extrema importância a literatura indígena para
combater a desinformação e servir de resistência aos povos originários.
398
Referências
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vel em http://icci.nativeweb.org/boletin/60/walsh.html
399
es saber,
saber es pensar siendo
ViVir
reflexões em
torno das trevas
que acercam
o saber lúcido
seção 5
A sAúde bucAl e do ser numA perspectivA interculturAl
nA educAção escolArizAdA guArAni mbyA de pindo mirim
Introdução
Metodologia
Resultados e discussão
404
todas as mudanças alimentares atuais devido a introdução de outros alimentos
na dieta da aldeia, é relevante desenvolver um projeto sobre a prevenção e ações
na saúde bucal dos estudantes? A partir deste primeiro encontro onde con-
versarem entre si, os karaí (Pajé/xamã) da aldeia e as outras lideranças,
como o Agente de Saúde Indígena (AIS), Agente Indígena de Saneamento
(AISAN), professores Guarani, professora não indígena, Cacique e comu-
nidade, aceitaram a implementação do presente projeto. Uma vez aprova-
do o projeto, os alunos da Escola Nhamandu Nhemopu’ã construíram um
Mapa Mental bilíngue, ou seja, em português e guarani, com alguns con-
ceitos relacionados com a saúde bucal [Figura 1]. Neste mapa, foi possí-
vel perceber que as crianças estabeleceram alguns conceitos que envolvem
ou afetam a saúde (Texa’i) diretamente - como, por exemplo, o ato de “to-
mar banho”, de “cuidar dos dentes”, de se alimentar e de “tomar água” - e
conceitos que envolvem o tratamento de doenças, como o de “remédio” e
de “médico”. Ficou evidente, também, que as crianças associam ao con-
ceito de saúde, práticas que envolvem a si próprio, a natureza (“saúde do
espaço onde se vive”), a espiritualidade (“casa de reza”) e a família. Nesse
sentido, os Guarani, assim como outros povos ameríndios, possuem uma
sabedoria milenar tradicional de cura que vem acompanhando as gerações
através do Nhemonguetá (aconselhamentos) compartilhados e repassados
pelos mais velhos, assim como o Karai (Pajé/xamã), considerados sábios
dentro da cultura Mbya. Suas práticas religiosas relacionadas a espiritua-
lidade acontecem na Opy (casa de reza e cerimônias), local que realizam
suas conexões com as divindades. Para os Guarani, Deus é Nhanderu e a
saúde do Ser está diretamente conectada com o sagrado; portanto eles uti-
lizam seus conhecimentos medicinais tradicionais de cura para as doen-
ças do corpo e da alma. Conforme Ferreira (2007), os sistemas médicos
tradicionais indígenas estão inseridos em contextos étnicos particulares,
onde os saberes e práticas que promovem a saúde por prevenir e curar
doenças estão associados à religião, à política, à economia, à arte, entre
outros aspectos. Vale ressaltar que os costumes tradicionais Guarani não
se restringem ao passado, mas sim à identidade do grupo, que é neces-
sariamente dinâmica e composta por elementos próprios, permitindo a
caracterização étnica.
405
Figura 1: Mapa mental construído com os alunos da Escola Nhamandu
Nhemopu’ã
406
xejary’i (avós), mães, estudantes e alguns pais, o que foi muito produtivo já
que não se esperava a presença dos mesmos. Durante a conversa, bilíngue,
a comunidade trouxe a necessidade de ter um “escovódromo” nas depen-
dências da escola para que a instalação de pias adaptáveis conforme faixa
etária, as escovações e o armazenamento das escovas aconteçam de forma
mais higiênica e eficaz. Os membros da comunidade pontuaram o quanto
está sendo válido o projeto tanto para saúde bucal quanto para discutir a
importância de uma alimentação com menos açúcares e alimentos indus-
trializados, promovendo a consciência de quanto a família é importante
também nesse papel de orientação aos filhos e demais da comunidade.
A educação tradicional indígena pode ser considerada como o pro-
cesso no qual os mais velhos, que já possuem em sua memória pessoal
e as taxonomias culturais, tentam transmitir os saberes aos mais novos,
inserindo-os nesse saber local e próprio. Essa educação se dá prioritaria-
mente pela transmissão oral (ITURRA, s.d). Tendo em vista que o projeto
presente visa educação escolar, de membros jovens, é relevante ressaltar
a importância da participação dos membros mais velhos da comunidade
no desenvolvimento das práticas propostas frente a inevitável interação
existente entre a cultura indígena e ocidental.
Considerações finais
407
Referências
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mentos. Campinas: Papirus, 1998.
FERREIRA, Luciane O. Limites e possibilidades da articulação entre as medici-
nas tradicionais indígenas e o sistema oficial de saúde”. In: FERREIRA, Luciane
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estrategias y experiencias regionales andinas. Lima: Coordinadora Andina
de Organizaciones Indigenas, Morgan, D. L. Focus group as qualitative research
(2nd ed.). Thousand Oaks, California: Sage, 1997.
408
por umA educAção situAdA: reflexões A pArtir
de rodolfo KuscH
Ser alguién implica el afán de serlo y ese deseo se identifica, en este con-
texto, con el progreso, con la sustitución de los frutos por (la acumulación
de) simples cosas, con la obsesión de sumar objetos. Así, la perfección del
ser, em última instancia, implica tener [...] El individuo busca la perfec-
ción y ésta se identifica com um afán de progresso infinito relacionado con
los objetos, um progreso que implica la negación del viejo deseo de mínima
que simplemente pretendia conservar la vida, comprometido con el mero
estar (CULLEN, 2003, p. 53).
410
Influenciados por essa visão europeia, não suportamos o medo e o
estar, pois isso nos angustia, diferentemente do indígena, que ao sentir
medo recorria aos bruxos em busca de ajuda. Para eles, assumir nossa di-
mensão humana é viver a nível da terra e enfrentar nossos temores. Para
nós, isso não é suficiente, pois queremos tudo claro, esclarecido e passível
de ser compreendido pela razão. É como se houvesse um imperialismo da
racionalidade que, na verdade, revela a nossa fraqueza e impotência frente
à totalidade daquilo que deveríamos pensar. Somos incapazes de simbo-
lizar ao pensarmos em termos ocidentais, pois queremos reduzir tudo a
uma relação de causa e efeito.
[...] Ni lo que llamamos cultura nos brinda un saber total [...] Cultura
cotidianamente, supone un saber de libros y de datos igual que en caso de
la ciencia. El mejor ejemplo es la librería. Entrarnos en ella y siempre sen-
timos nuestra inferioridade frente a tanto saber volcado en el objeto libro.
Seguimos viviendo la enciclopedia científica a nível de cultura. Se piensa
que esse saber acumulativo que se da en la enseñanza y que se cristaliza
em la librería es una ventaja del siglo [...] Lo que en el siglo XX se llama
cultura, se reduce entonces a un simple fetichismo (KUSCH, 2000, p. 22).
Detrás de toda cultura está siempre el suelo [...] Y ese suelo así enunciado,
que no es ni cosa, ni si toca, pero que pesa, es la única respuesta cuando
uno se hace la pregunta por la cultura. Él simboliza el margen de arraigo
que toda cultura debe tener [...] No hay outra universalidad que esta con-
dición de estar caído en el suelo, aunque se trate del altiplano o de la selva.
De ahí el arraigo y, peor que eso, la necesidad de ese arraigo, porque, si no,
no tiene sentido la vida (KUSCH, 2000, p. 109-110).
Isso quer dizer, explica Kusch, que nas culturas ocidentais, e que é
bem manifesto na América, o ser se sobrepôs ao estar conquistando-o. Po-
rém, a trajetória do estar se confunde com o caos de um mundo que angús-
tia, de um “mundo que é assim” e que deve ser contemplado e vivido, não
no sentido de um progresso e de explicações científicas, simplesmente.
Se de um lado, o mundo do ser europeu aparentemente resolveu
o problema da hostilidade e do medo que o mundo oferece, por meio da
teoria e da técnica, por outro lado, o mundo do estar americano não supõe
uma superação da realidade, mas faz uma invocação a ela, colocando-a e
colocando-se frente a ela. Enquanto o Ocidente cria a ciência e a educação
412
para se contrapor e enfrentar o medo – diríamos, as paixões -, o indígena
se mantém em sua “magia”, em seus rituais, conservando a realidade do
mundo, limitando-se a interagir com a natureza, retirando dela o melhor
proveito, mas com um profundo respeito.
Considerações finais
413
Referências
CHELINI, M. E. J. Kusch y la posibilidad de un nuevo pensar desde el “estar”
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414
educAção trAdicionAl: re-existenciA de modo
de ser guArAni?
416
Na dinâmica das Tekoa todos são, em certa medida, professores. Os
adultos têm, frente a educação das crianças, uma atitude muito mais pas-
siva contemplativa do que ativa, uma vez que acreditam que a educação
está na cultura de forma integral. Estão ali como observadores, acompa-
nhando as crianças em suas atividades específicas, olhando com cuidado
as atitudes próprias de cada criança, para além do julgamento moral do
que é certo e errado, vendo como esta é e se movimenta no mundo. É in-
teressante ressaltar a perspectiva de não criar expectativas no modo de
agir da criança.
Para os Guarani, os ensinamentos têm relação intrínseca com o
idioma que os produziu, pois sem a palavra não há o existir Guarani. Por
isso, a palavra é uma marca importante da educação tradicional, ela “se
reveste de sabedoria e se materializa em conselhos” (BERGAMASCHI,
2005). Ao invés da repressão, usam a persuasão (realizada através da fala)
como instrumento de educação, sendo persuasão entendida para além de
uma forma de convencimento, um mecanismo de resolução de conflitos,
de ensinamentos, aconselhamento e transmissão de valores tradicionais.
Entende-se as situações de conflito como espaços de aprendizagem para
lidar com as próprias emoções e seus limites. Nas relações, a delicadeza
das palavras e dos gestos é muitas vezes mais forte do que a própria pro-
núncia da palavra, essa delicadeza é um dos fatores que contribui para a
notável tranquilidade dos ambientes e das relações.
Tendo a autonomia como preceito, as crianças são respeitadas como
sujeito de sua própria educação, sendo levadas a observar tudo à sua volta,
pois terão em algum momento que fazer por si mesmas. Por isso, em mui-
tas comunidades as crianças são as únicas que podem circular por todos
os espaços da aldeia. Dentro dessa perspectiva, elas têm poder de escolha
na seleção do que se quer aprender e, com dizem autoras que estudam a
educação Guarani, “é visível o esforço que as crianças fazem para apren-
der, muito maior que a iniciativa dos adultos de ensinar”. São elas que
buscam o conhecimento, predominando a concepção de nunca antecipar
a resposta, mas esperar o momento da pergunta. A não intervenção do
adulto parece ser o que cria a curiosidade nas crianças (...) “talvez essa seja
uma explicação para a esperteza, agilidade e presteza que demonstram os
Guaranis para aprender”.
Outro processo constantemente incentivado na educação tradicio-
nal é o imitar. Por isso é tão importante a convivência entre crianças de
diferentes idades, pois os aprendizados se dão através da observação, ex-
perimentação e, mais tarde, através da imitação dos gestos e das tarefas. A
criança deve ir “buscando assemelhar-se ao outro e a partir daí construir
417
um comportamento próprio”. Dentro das Tekoa, as crianças estão sempre
juntas, cuidando e ensinando umas às outras. Isso pude também observar
nas visitas que realizei às aldeias Guarani Yvy Poty e Jatai’ty durante o
primeiro semestre de 2019.
Do lado de fora das aldeias, vivemos em uma sociedade que entende
a criança como um “vir a ser”, tendo a infância como uma fase incompleta
da vida. Reservamos a elas espaços próprios, como parquinhos, creches, na
tentativa de separá-las dos espaços tidos como “adultos”. Nas escolas, re-
tiramos a autonomia das mesmas frente a própria educação, apresentando
um conhecimento unicamente ocidental, quase que exclusivamente racio-
nal e científico. Fragmentamos esse conhecimento e o parcelamos, acredi-
tando que exista uma etapa adequada para o aprendizado de cada parcela.
Retiramos das crianças a possibilidade de escolha do que, do quando e de
onde aprender, retirando-as de seus lugares de sujeitos sociais e colocan-
do-as como objetos passivos de educação.
Os Guaranis têm a escola como uma porta aberta para o mundo não
indígena, entendem que esta precisa estar aberta para que a criança possa
conhecer esse mundo, sendo sua escolha quando e como frequentar esse
espaço. Ao deixarem para a criança essa escolha, além de contribuir para
a autonomia, tornam esse espaço um ambiente suave, leve e tranquilo,
sendo um ambiente complementar de aprendizagem.
Entende-se que o conhecimento essencial se dá no cotidiano da al-
deia, na convivência com as outras crianças, na escuta atenta aos mais
velhos e na observação da natureza, pois a escola é toda a vida Guarani.
Enxerga-se que o educar na cultura é integral, sendo “educar em todas
as coisas [...] aprender no estar ai, ao dar-se ao mundo”. Segundo Kusch
(2000), o saber indígena se refere “exclusivamente al hecho puro de vivir”.
E talvez resida aqui a possibilidade de existir e re-existir deste povo tam-
bém por meio da educação tradicional.
A educação tradicional se apresenta, portanto, como pressuposto
para a existência e re-existência do modo de ser Guarani, pois é através
dela que são passados os costumes, valores e sabedorias que permitem as
novas gerações vivenciarem o nhande reko. Essa reprodução carrega em si
uma decisão, individual e coletiva, da continuidade indígena na América
(KUSCH, 2000). Sendo assim, a educação é uma forma de resistência, uma
vez que é responsável pela possibilidade do povo Guarani manter-se a si,
sua língua e seus costumes.
Por outro lado, ao permitirem a entrada de escolas nas aldeias, o
povo Guarani busca formas de re-existir, à medida que permite conscien-
temente re-elaborar a vida em condições adversas (BARCELOS), não dei-
418
xando de lado a educação tradicional, mas agregando a ela outra forma
de educação, cada vez mais presentes e necessárias para a existência no
mundo moderno. Como me escreveu a professora Cida, “resistência que se
dá por meio da re-existência que busca espaços para germinar seu modo de ser”.
Referências
BERGAMASCHI, Maria Aparecida. Nhembo’e. Enquanto o encanto per-
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419
educAção escolAr indígenA: refletindo
com o pensAmento de rodolfo KuscH
Introdução
Contextualização
422
Foram elaborados textos sintéticos com as principais informações coleta-
das, ilustrados com desenhos representando cada temática. Também foi
construído um mapa do território Assuriní do Trocará, com a localização
dos rios e igarapés e de cada comunidade. Esse processo de construção
proporcionou um repertório de conhecimentos sobre o território da etnia
Assuriní do Tocantins, abrangendo dimensões ambientais, sociais, econô-
micas, culturais, da saúde e da educação, oferecendo potencialidades de
articulação com conteúdos escolares de diversas áreas. Além disso, propi-
ciou memórias e compreensões importantes sobre a história e a situação
atual da aldeia, com reflexões sobre as transformações ocorridas, as prin-
cipais ameaças atuais do território e as demandas comunitárias.
Através da disciplina “Saberes indígenas e estudos de biologia”, fo-
ram desenvolvidas pesquisas com elaboração de roteiros e realização de
entrevistas na comunidade, sobre temas diversos da tradição Assurini.
As pesquisas originaram a produção de materiais pedagógicos para a es-
cola, como cartazes e cartilhas, com informações na língua portuguesa
e na língua assurini. Os conhecimentos foram ilustrados com desenhos
detalhados, representando plantas medicinais, frutos, peixes, artesanatos,
alimentos e pinturas corporais.
Ao longo da disciplina “Cultura corporal e povos indígenas”, foram
desenvolvidos trabalhos de pesquisa sobre as manifestações corporais da
etnia Assurini do Tocantins e seus significados, incluindo danças, esportes
e brincadeiras, através de entrevistas com pessoas mais velhas da aldeia.
Esses trabalhos incluíram uma atividade com apresentação de danças
na escola, formando dois grupos que ensaiaram com turmas de alunos
as músicas Arytinga Se’engara e Wyracakawa. Foram realizadas pinturas
corporais nas crianças, específicas para cada dança, utilizando urucum. O
evento contou com a participação de dois idosos da comunidade, os quais
fizeram demonstrações das danças, orientando os movimentos e cantan-
do junto com as crianças. Após a apresentação, houve uma fala de alguns
professores e do cacique, enfatizando sobre a importância da língua, das
danças, das músicas e da pintura corporal. Essa disciplina também pro-
porcionou a organização de um encontro cultural, no período da noite,
com a presença de grande parte da comunidade, incluindo apresentações
de danças e músicas, discursos e confraternização.
No evento final de apresentações dos trabalhos, foram expostos de-
senhos representando as danças, as pinturas corporais e os animais que as
danças simbolizam, acompanhados pelas letras das músicas, em assurini
e em português. Foi explicado que as letras das músicas, as melodias e os
passos das danças, com seus significados, são recebidos em sonhos pelo
423
Pajé. Nas danças apresentadas, as pessoas representavam animais, com
seus gestos e sons, e com pinturas corporais específicas.
Reflexões
424
Ao longo das atividades, apresentações, diálogos e materiais produ-
zidos, fui observando vários tipos de conexões entre aspectos da sociedade
que costumam ser vistos de forma separada pelo pensamento ocidental,
como ambiente, cultura, arte, política, espiritualidade, educação e saúde.
Para Kusch (2009, p. 102), a cultura indígena está em função do sentimen-
to de totalidade, o qual se expressa de forma ritualizada, no aqui e agora.
Por trás de toda a cultura está sempre o solo, como um lastro, no sentido
de ter os pés no chão, na forma de um apoio espiritual. A cultura simboliza
uma raiz, sem a qual a vida não tem sentido. Na escola Assurini, esse sen-
timento de totalidade se manifesta em uma prática interdisciplinar, com
estratégias de integração entre diferentes áreas e formas de conhecimen-
to, e na relação dos saberes com o território e com a vida comunitária,
como pode ser observado em depoimentos de estudantes da Licenciatura,
como os que seguem:
425
Considerações finais
Referências
KUSCH, R. Obras completas. Rosário: Fundación A. Ross, 2009, v. 2, 3 e 4.
REPETTO, Maxin; SILVA, Lucilene Julia da. Experiências inovadoras na for-
mação de professores indígenas a partir do Método Indutivo Intercultural no
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426
educAção dAs relAções étnico-rAciAis e educAção pArA
mAnejo do mundo: pedAgogiAs emergentes nA AméricA
428
os saberes produzidos, articulados e sistematizados pelo Movimento Ne-
gro para a prática e para o pensamento educacional” (GOMES, 2017, p.
137 e 138). Dialoga com a perspectiva da interculturalidade crítica e da
decolonialidade (WALSH, 2013), na medida em que destaca o papel do
diálogo com os movimentos sociais para a descolonização dos currículos
(GOMES, 2012) de história.
Busca respostas parciais dentro do referencial teórico acerca das es-
pecificidades do racismo no Brasil, num contexto de estruturas socioeco-
nômicas de dominância, marcadas pela extrema desigualdade social pró-
pria do desenvolvimento das sociedades capitalistas. Tais estruturas em
dominância são interseccionadas pela chave de leitura do racismo como
central na concretização das relações de poder na sociedade. Em outras
palavras, no caso brasileiro, o racismo estrutura as relações de poder nas
práticas sociais vividas no cotidiano. Segundo Fanon (1969),
429
Referências
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Ecuador, noviembre 2013. Pp. 23-68.
430
método KuscH: lA voluntAd entre el estAr y el
“ser”-ego: el cAmino del estAr-siendo pArA un nuevo
pensAmiento AbyA yAlense (“AmericAno”)
[rodolfo KuscH filósofo de lA liberAción]
Carlos Francisco Bauer1
1 UNILA. carlosfrancisco120@yahoo.com.ar
431
No se trata de una mera vuelta al pasado, sino de una actualización de
lo profundo de América. Esta es una condición sine qua non para pro-
yectarnos en el futuro, o mejor, para poder vivir armoniosamente (buen
vivir), integrándose en la naturaleza en lugar de destruirla, ya que nos
desintegramos con esa destrucción.
Recorreremos la obra de Kusch a fin de mostrar su camino hacia
(método) el estar y el estar-siendo. Pensamos que el autor nos propone
un método o como dijimos un camino hacia una parte profunda de nuestra
realidad nuestro-americana. Se trata de un elemento profundo de nuestra
realidad, pero no el único y señalarlo de esta manera hace parte de la pro-
puesta metodológica que aquí presento para llamar la atención sobre la
apertura a otros elementos profundos constitutivos de nuestra y vuestra
América2, develándonos otras claves de nuestras particularidades y que
por lo tanto deberemos seguir indagando, de acuerdo a las respuestas que
aun buscamos y precisamos. Solo dejaré las ventanas abiertas pero no
desarrollaré estos otros elementos porque excederían los límites de este
escrito. Por todo esto proponemos este título en nuestro trabajo con el
sentido de establecer un atajo por ciertos ramales principales. Las poste-
riores citas relacionadas que recorreremos de acuerdo al develamiento de
este aspecto de la realidad (Estar/Estar-siendo), es para que los mismos
sean vislumbrados con mayor afinidad, proximidad y apertura de vincula-
ción con otros elementos fundamentales de nuestra realidad histórica que
he tratado en otros trabajos y que abordaré en escritos posteriores.
433
céu, mAr, terrA, corAção... sopremos ventos do sul
437
O processo de diálogo, na relação com alteridades, é também (ou pode ser)
um processo de autoconhecimento, ou melhor, de auto-re-conhecimento
da colonialidade que nos constitui.
Mas isso exige humildade.
438
Sinto-me fluida como a água do mar, tão vital para mim. Mas a flui-
dez não tem espaço neste mundo, na selva de pedra em que vivo. Tive meu
ser fluido congelado para me solidificar e caber em caixinhas. Para isso,
fui colocada em uma forma, tal como a que produz cubinhos de gelo. Es-
friada pelo ambiente em que me encontro, congelei e comecei a caber nos
quadradinhos. Talvez seja por isso que não goste do frio. Agora percebo
que sempre que aqueço (por dentro ou por fora) eu me derreto um pouqui-
nho e atravesso os casulos da forma, misturando experiências, percepções,
sentimentos e reflexões. Às vezes, experimento até mesmo o prazer de me
derramar da forma. Mas é por pouco tempo. O ambiente gélido me segura
de novo. Então, fico confusa e insegura, porque as experiências, percep-
ções, sentimentos e reflexões, da maneira misturada que se apresentam
agora, não cabem nos quadradinhos. Sinto-me deslocada, fora de lugar.
Fico, assim, espremida entre as paredes dos quadrados que me rejeitam e
o frio, que me congela e paralisa. Desfluidificando-me.
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440
pensAr, com rodolfo KuscH, A educAção como escutA
442
qualquer situação que se queira. Como num momento de encontro com os
amigos, no ritual de um bar... O que acontece com aquele que passa? Qual
minha ligação e relação com ele? O que poderia nos aproximar? Penso que
aqui podemos considerar todo aquele que passa por nós. Há, todos os dias,
pessoas passando por nossa vida. E, aqui, devo dizer que nessa forma de
visitar o outro que passa, ainda que apenas vendo, já somos tocados e cha-
mados a verificar todas as diferenças existentes entre nós, especialmente
quando vemos os explorados, desvalidos, marginalizados e sem o alcance
de uma forma de vida que seja, ao menos, digna de ser vivida, pois a vida
estrangeira o tomou por completo, tirando-lhe de suas raízes.
Kusch teve uma formação filosófica muito forte, consistente e abran-
gente. Era um estudioso da Filosofia e dela se ocupava como campo para
construir conceitos. Se pode considerar que os filósofos, de maneira geral,
pensam a partir da contemplação. Kusch pensa a partir de uma realidade
próxima e própria, mesmo que seu pensamento tenha também uma cons-
trução filosófica de origem grega. Por sua vez, quer valorizar a cultura
local. Seu método é o da ‘escuta’. Todos estamos dentro ou diante de uma
paisagem, um lugar, uma cultura que podem ser vistos, apreciados, escu-
tados. Então, pergunta-se: aprende-se para saber muito e ter informações,
ou aprende-se para poder inscrever a própria vida na paisagem? Acaso
não se aprende apenas para viver? A paisagem é o símbolo mais profundo
no qual nos firmamos de pé e como se fosse uma espécie de escrita onde
cada um habita. Daí a alma como nosso lugar (paisagem) mais profundo.
A intenção aqui, com o pensador, é trazer a crítica no sentido de
não aceitar o que está já cristalizado na sociedade. Do ponto de vista filo-
sófico, Descartes diz: Penso, logo existo. Por sua vez, Kusch diz: Existo,
logo penso. Então, é sumamente fundante pensar a existência de si, de
forma arraigada, situada, realizada. Pensar o epistemicídio: o que afirma e
exige que não há outras formas de conhecer senão pelo formato imposto.
Recriar a vida de outra forma, diante de um cotidiano único e próprio.
Em América Profunda Kusch indica a América como dicotomias: ‘hedor’ e
‘pulcritud’, sempre demonstrando uma dualidade. O fedor somente existe
porque existe o cheiroso. O sujo e o limpo. Habitamos um capitalismo
que não necessita de pessoas boas e bem formadas, mas de consumidores,
bem como uma busca de distanciamento da dor. A ideia disseminada é que
quanto mais longe da dor se está, mais vida há. Eis o erro capitalista.
O discurso filosófico tem um único sujeito: o ser. A filosofia é o
discurso de uma cultura que encontra o sujeito e esta deve ser sua tarefa
em todos os lugares, valorizando o seu próprio. Assim, buscar e conside-
rar pensamentos excluídos. Formas de cultura e de pensamentos negados
443
pela cultura hegemônica. Portanto, é fundamental ter em conta cada indi-
víduo, cada pessoa, seu contexto e sua formação, dentro de uma cultura e
tudo o que daí consegue expressar seu próprio ser. Comumente ouvimos
relatos de pensamentos que não são nossos, mas pertencentes ao exterior,
estrangeiro e distante de nossa realidade verdadeiramente constituída.
Kusch busca o pensamento indígena americano; pensamentos localizados,
arraigados, os quais iniciaram o povo.
Por sua vez, cada língua tem sua forma de expressar e carrega con-
sigo um pensamento; muitas vezes, dependendo de sua localidade, reali-
dade e política, pode ser soberana ou subestimada e subserviente. Então,
carece haver entre nós uma espécie de diálogo que encontre o saber situa-
do como forma de superar o modo de enunciação cristalizado como único
na América latina, ensinado a nós desde a infância. Pensar cada terreno
(solo) onde se vive.
Precisamos animar-nos a escutar o outro (na educação também).
Justamente essa intenção de Kusch está presente em suas obras, insti-
gando o pensar sobre a realidade a partir da América. Sem deixar seus
autores inspiradores de lado, seu pensamento se aprofunda em realidades
próximas e verdadeiramente destas terras, com os indígenas. O ser como
sujeito que observa tudo ao seu redor e verifica cada situação de vida; aqui
não com a intenção de dominar o outro, mas como sendo parte integrante
desta realidade daqui, instaurando-se o estar como um compromisso dian-
te da realidade em que se vive, não mais diferenciando sujeito de objeto.
Conforme afirma Elisabeth:
445
Referências
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po.infonews.com/nota/111052/la-biblioteca-de-rodolfo-kusch-est-a-a-disposi-
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ção em Educação. Universidade Estadual Paulista – Júlio de Mesquita Filho.
Faculdade de Filosofia e Ciências. Unesp/Marília/SP. Maio de 2019.
446
temporAlidAde mbyá-guArAni no museu: umA experiênciA
de curAdoriA compArtilHAdA A pArtir
de diálogos interculturAis
448
a sentir, que o tempo na aldeia era outro, mais calmo, pautado pelos sons,
pela atmosfera presente, de quietude, de respeito. É difícil transpor para a
escrita as sensações e os significados aprendidos nesses espaços de tempo,
marcados pela desaceleração do nosso ritmo de vida.
Já bem próximo da data de abertura da exposição tivemos mais um
encontro com o Jaime Vherá a fim de mostrar os textos curatoriais cons-
truídos pela turma a partir das falas dele. Para nós foi um momento tenso,
de ouvir dele se tínhamos captado os significados de suas falas sobre a
cosmologia Mbyá-Guarani, sobre seu calendário, suas vivências. Sempre
muito acolhedor, o cacique Jaime Vherá fez pequenos apontamentos, o que
foi imprescindível para dar mais força e protagonismo indígena sobre a
narrativa exposta e assim pudemos seguir adiante. Para a composição do
núcleo indígena tínhamos encomendado cestos inacabados, para transmi-
tir a ideia de um tempo processual e cíclico, ideia que havia previamente
sido exposta e aprovada pelo Jaime Vherá. Também nesse dia buscamos
a encomenda de taquaras que seriam usadas para compor as paisagens
sonoras presentes na exposição, através de pequenas caixas de som embu-
tidas no alto das taquaras de onde sairiam sons de bugio, cigarra e coruja.
Essas conversas foram essenciais para potencializar, não somente
a narrativa expográfica, mas principalmente para aprofundar as apren-
dizagens sobre a cultura dos Mbyá-Guarani. Por exemplo, quando Jaime
Vherá nos questionou se já tínhamos o milho para expor, e ao responder
que sim, ele nos mostrou espigas provenientes de sementes crioulas e nos
ofertou generosamente para que usássemos na exposição. São pequenos
gestos como este, carregados de significados e simbologias, que nos per-
mitiram compreender a importância da fala e principalmente da escuta,
através de laços que foram se construindo e se estreitando ao longo do
processo. Essa pequena mudança, do tipo de milho exposto, potencializou
a narrativa, trazendo à tona a guarda de um patrimônio material e ima-
terial por parte desse povo, que reverberou no discurso expográfico, e o
mais importante, tendo partido da fala de um agente desse discurso, foi
possível promover ainda mais a sua autorepresentação.
Outro momento marcante e significativo nessa curadoria compar-
tilhada foi ter a presença do cacique Jaime Vherá e sua família na noite
de abertura da exposição, quando também tiveram a possibilidade de
mostrar e vender seu artesanato. Os contatos ainda seguem, no sentido
de dar continuidade a esse processo de fazer emergir a história, os sabe-
res e os patrimônios provenientes desses povos. Uma vez estabelecidos
os laços, acreditamos ser de suma importância mantê-los vivos e cada
vez mais fortes.
449
Nesse sentido, é importante colocar que a Museologia, em especial a
Sociomuseologia, tem muito a contribuir para dar visibilidade e voz as nar-
rativas dos povos indígenas que têm sido sistematicamente negligenciados
na constituição das memórias oficiais. Cabe a nós dar continuidade nesses
processos de aproximações e projetos compartilhados que buscam dar voz
e protagonismo a esses agentes, rompendo com os discursos hegemônicos
e colonizados que desconsideram e invisibilizam esses povos no presente.
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tips/download/marcadores-de-tempo-indigenas-educaao-ambiental-e-etnoma-
tematica>
450
“los desconocidos de siempre tAmbién existen”
Para este ensayo he elegido como eje temático “Filosofías del Sur y
procesos de liberación” pues para poder pensarnos como sujetos LIBRES
de toda imposición de pensamientos hegemónicos y dominantes debemos
DESCOLONIZAR LA FILOSOFIA. Tenemos la posibilidad de pensar-
nos en un marco de las diversas cosmovisiones para recuperar una Filo-
sofía que nos permita encontrar un fondo común de la experiencia Hu-
mana y así poder cuestionar e interpelar y a la vez hacernos las grandes
preguntas filosóficas sobre quienes podemos pensar y que pensar. Estas
dos preguntas van juntas. De aquí surgirá la experiencia dialógica entre
el pensamiento de Rodolfo Kusch y el pensamiento indígena, la negación
de la cultura y pensamiento africano, en definitiva, el campo del pensa-
miento cultural que surge de los sujetos que buscan su identidad y ser
visibilizados por medio de acciones sociales emancipadoras. He aquí pen-
sar un reencuentro con la FILOSOFIA POSTERGADA. De esta manera
poder abordar la filosofía y el filosofar como el campo donde se dirimen
tensiones dando paso a otros modos de existencia y de convivencia que
permitan celebrar las diferencias y de esta manera cuestionar la realidad
y los conceptos ya construidos para poder De construirlos. Ir hacia una
de construcción verdadera abandonando la negación del pensamiento in-
dígena, afrodescendiente y popular para dar paso a la diversidad y los
particularismos enmarcados en una verdadera inclusión social, basada en
la convicción ideológica que son los pueblos americanos y sus culturas
ancestrales, la filosofía del estar siendo.
Comenzaremos reflexionando a partir de Rodolfo Kusch quien bus-
ca provocar en su interlocutor la necesidad casi imperiosa de revisar las
viejas categorías en la que fuimos formados y contrastarlas con ese mismo
“real” que es lo americano. Aquí vemos que Kusch produce un corte epis-
temológico profundo con la cultura europea moderna superpuesta desde
el S XV a ese ser originario de América. Pero no solo se produce en Amé-
rica negando nuestro pensamiento autóctono sino también se produce una
452
que se han dado con el humano mismo. Y también estas preguntas se han
hecho en África, en América, en Asia y tantos lugares como culturas han
existido y siguen existiendo.
¿Podemos hablar entonces de una filosofía africana? Si, por supuesto
aun cuando escuchamos sobre África afirmaciones que no existe. En-
tonces la aplicación africana a la filosofía se torna de nuevo en una
categoría inexistente desde una visión occidental del mismo modo
que con el indio. La negación que lo torna inexistente.
En torno a esto que he expuesto aparecen muchas discusiones pos-
teriores, algunas de las cuales nos llegan hoy. Entre ellas afloro la cuestión
de la filosofía implícita. Esto se traduce en ver si las condiciones lingüís-
ticas y culturales de una filosofía pueden ser explicadas por los conceptos
filosóficos de una cultura diferente. Podríamos traducir esta afirmación
pensando si: ¿es posible por medio de los conceptos occidentales poder
explicar este pensamiento implícito? Entonces esta reflexión nos conduce
a una pregunta de mayor rigor: ¿Existe una filosofía africana o una filoso-
fía en África? Esta respuesta es difícil de dar, pero lo cierto es que algunos
filósofos africanos eluden el folclorismo para destacar, como los antropó-
logos han centrado su atención en las cosmovisiones populares de África
y las han elevado al estatus de filosofía continental.
En otros lugares mejor situados cuando se quiere conocer su filosofía
no se recurre a campesinos, ancianos o sacerdotes fetichistas para la inda-
gación filosófica sino se recurre a pensadores concretos en lo posible en
persona. Se infiere que el pensamiento tradicional africano deberá primero
compararse con el pensamiento popular occidental. Por lo menos para em-
pezar a rescatar el pensamiento africano genuino. Y solo así buscar el Ser
en su expresión más profunda. Teniendo en cuenta que lo que se denomina
pensamiento africano moderno no es otra cosa que ideas importadas de
la filosofía occidental y de escasa africanización. Y nada han aportado al
conocimiento de las sociedades africanas, justamente porque sabían más de
Aristóteles y de Marx que de sus propios pensadores africanos.
Sin duda, el pensamiento africano existe a pesar de que lo desco-
nozcamos o se lo pretenda invisibilizar. De hecho, son pocos los investi-
gadores occidentales que se interesan por esta filosofía, a pesar de su im-
portancia. Pero, ¿y en el continente africano? Tampoco parece que tenga
un peso demasiado importante la “filosofía” como tal, a pesar de la cada
vez más abundante aparición de escritos de esta índole, sí en cambio las
enseñanzas y la sabiduría del pensamiento tradicional. Kwasi Wiredu,
filósofo africano, incide sobre la necesidad de superar el hablar sobre fi-
losofía africana y su existencia para pasar a elaborarla, lo que enlaza con
453
la cuestión de si en el momento actual la reflexión filosófica tiene el lugar
que se merece y es pertinente que ocupe en el continente africano siempre
que sea propia, independiente y genuina.
Nkogo Ondo otro filosofo importante ecuatoguineano de la actuali-
dad afirma que una de las causas del empobrecimiento económico y social
de África radica en la previa depauperación de las mentes africanas, a las
que se ha condenado exclusivamente a tratar de sobrevivir. Sin sus filóso-
fos y pensadores, sin sus intelectuales, sin sus mantenedores y transfor-
madores de sus culturas primigenias, África se debate hoy en la agonía,
cuando en realidad no es sino el continente de la vida y de la esperanza.
Si queremos que progrese, África debe recuperar, en primer lugar, su dig-
nidad. Y esa dignificación pasa, necesariamente, por la recuperación de
sus culturas, por la revitalización de su ser interior.
En la misma línea de análisis tomando como ejemplo al continente
africano tenemos a nuestra América Profunda de Rodolfo Kusch.
El objetivo de este trabajo es pensar con Rodolfo Kusch y reconocer
el lugar de su pensamiento. No cabe duda alguna que pensar con el autor
implica en un sentido muy amplio dejarlo hablar, porque así se podrá ver
lo central para nosotros que es su Filosofía, que nos permitirá indagar,
volver a preguntar por esta cuestión ontológica sobre el ser americano.
Intentaremos priorizar sus particularidades respondiendo a las in-
fluencias que mantuvo con diferentes filósofos europeos en busca de una
apertura hacia sus propios horizontes de la pregunta.
Su Filosofía nos enmarca en un estilo que va encontrando diferentes
formas de explicarse y ejemplificarse provocando en el lector la curio-
sidad frente a los problemas de índole ontológico, axiológico, político e
identitario, en un contexto propiamente interpelador y de un cuestiona-
miento fundamental respecto de un pensamiento filosófico propiamente
americano como así también la conexión de estos conceptos con la coyun-
tura actual de América.
Pero lo admirable de Kusch es que vuelve a lo autóctono desde la
tradición europea en una relación de dialogo y de tensión a la vez con
ella. Y es aquí donde debemos detenernos para poder comprender desde
donde se parte para no negar la realidad que fuimos conquistados y esa
parte de la Historia con sus consecuencias que debemos comprender y
no podemos excluirla.
Para abordar este tema introduciremos los conceptos de pulcritud
y hedor como así también encontrar en esta relación el miedo a ser ame-
ricanos. Para Kusch, como seres occidentales que somos, tenemos el co-
nocimiento piel para afuera, y eso nos permite asegurarnos de lo exterior
454
que nos acosa, aunque surge así una gran paradoja: ¿Que sucede piel para
adentro? Y es aquí donde aparece el miedo de mostrar la verdad. Porque
esto significa abandonar la búsqueda de fundamentos y el porqué de la
existencia, dejando emerger una conciencia que nos dice que somos muy
poco y que nuestra verdadera condición es la de “estar no más” compar-
tiéndonos en un mundo donde los dioses sirven de aliento ante esa miseria
que nos constituye, el puro miedo. Y lo más importante es que nos cons-
tituimos en misterio al no saber nada de nosotros mismos. Es el miedo al
estar en silencio y contemplando lo exclusivamente americano, sabiéndo-
nos que somos producto del enciclopedismo europeo y el temor a que ese
fundamento seguro se rompa ante la conciencia que nos dice que somos
indígenas. Ante esta cobardía nos queda creer en el suelo, símbolo del
arraigo, y aceptar una transformación cultural que implica incluir nuevas
formas de pensar la cultura y dejar de lado esa escisión que niega y oculta
la verdad de la América Profunda.
Vamos a analizar la negación de lo indígena y popular a partir de
dos conceptos opuestos pero que de ningún modo se excluyen: el hedor
y la pulcritud. Entendiendo el primero, como aquello que nos diferencia
desde la posición occidental, de lo eurocéntrico con lo exclusivamente
americano. Es el ambiente seguro de las ciudades en tanto que caracteri-
za al medio urbano con sus clases medias, observando que propicia a su
vez cierta seguridad y comodidad, evitando todo contacto con su opuesto.
Mientras el pulcro recorre las calles de algún pueblito del altiplano, los
adjetivos que se hacen presentes para describir ese ambiente son: ma-
loliente, andrajoso, sucio, hediento, incomodo, molesto. Y seguidamente
viene la comparación de la ciudad, por vivir en ella con todas las comodi-
dades y confort.
Entonces se nos viene la pregunta: si esto es la pulcritud, ¿Que es
el hedor? El hedor es un signo que no logramos entender, pero que se ex-
presa. Podríamos explicarlo como un estado emocional de aversión irre-
mediable, afirma Kusch. Un sentimiento especial, que en vano tratamos de
disimular. Es la inseguridad que se manifiesta cuando vemos a alguien que
viene caminando y no sabemos si se acerca una tormenta imprevista, ese
paisaje desolador imposible de abarcar con nuestros ojos, es el cansancio
físico al recorrer las calles en subida hasta sentir el ahogo que nos produ-
ce la altura, es la gente mendiga que tal vez le damos la limosna, aunque
sepamos que ya no cumple ninguna finalidad, pues viven en la indigencia
producto de la negación y el olvido. Es el silencio del indio, al querer
uno descolocar con preguntas ansiosas. Todo esto descripto por Kusch
es lo que siente la persona que vive con ese afán de pulcritud. Y para re-
455
sumir lo dicho hasta aquí, podemos afirmar que el hedor es todo lo que
acosa desde afuera que viene a irrumpir la seguridad del ciudadano. Es
ese sentimiento de inseguridad ante el afuera que resulta extraño. Es el
miedo a la pérdida del fundamento que se construyó desde occidente. Esa
seguridad que se vuelve insegura ante el extrañamiento. Nos hallamos
como sumergidos en otro mundo, que resulta misterioso, incognoscible e
incómodo. Del que queremos huir, pero a la vez transitarlo. Y nos acosa
tal inseguridad al punto de hacernos sentir incomodos. Esto es el senti-
miento que tiene la persona en su afán de pulcritud y seguridad propia del
ciudadano. Y que, en el fondo, ante ese mundo exterior de caos y hedor, su
sentir es una gran angustia ante la imposibilidad de explicación y ante lo
extraño a él/ella que pone en riesgo su zona de confort. Kusch nos invita
a pensar otro modo de existencia y de convivencia a través de su Filosofía
del estar como salida de la postergación y negación de América que, en el
juicio sobre el hedor y la pulcritud, se halla implícito el afán de encubrir
una ira que nadie quiere ver. Este antagonismo que parece ser trágico e
irreconciliable para Kusch no lo es y tiene una salida como una especie
de dialéctica no al estilo hegeliana sino como mediadora, en un sentido
abierto y que el autor llama FAGOCITACION.
Para concluir Kusch define este proceso como un proceso incons-
ciente donde se da una absorción de las pulcras cosas de occidente por las
cosas de América.
Citando al autor y para finalizar en introducción a América, en
América Profunda dirá:
456
Referencias
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noremos o lo desconozcamos . Afribuku – Cultura africana contemporánea.
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457
AwA vAnA: grAfismo yAwAnAwA e o xAmAnismo feminino
460
nas práticas xamânicas, especialmente, os Pajés no período de resguardo
com a utilização contínua da uni ou de outras medicinas da floresta con-
seguem se comunicar com os yuxyn. Estes transmitem conhecimentos que
são aprimorados com o tempo. No caso, específico dos kene, os quais são
atualmente reproduzidos nas aldeias por jovens e adultos é de conheci-
mento de todos Yawanawa a influência que Hushahu, exerceu para reno-
vação e popularização deles.
Um dos recortes analíticos efetuados, por intermédio dos dados do
trabalho de pesquisa sinalizados neste resumo e no trabalho a ser apre-
sentado nos remetem a análise dos kenes que tem como simbologia no gra-
fismo as borboletas (asas, o corpo das borboletas ou outras composições
gráficas relacionadas as borboletas) que contenham por analogia, aspec-
tos transformacionais a serem explorados e relacionados com o universo
de formação do xamanismo feminino. Nesse sentido, procuro explorar as
correlações analíticas dos dados etnográficos com a revisão bibliográfica
efetuada. Entre as referências teóricas duas aproximações são aqui refe-
ridas e problematizadas ao longo do trabalho. A abordagem desenvolvida
no âmbito da etnologia ameríndia pela antropóloga Els Lagrou (2009).
Ao mencionar que no universo ameríndio a onipresença da figura da ana-
conda ou jiboia primordial presente nos diversos motivos decorativos usa-
dos na pintura corporal, na pintura das panelas, no trançado dos cestos
e na tecelagem de tecidos indica “que se trata de algo mais do que uma
simbologia idiossincrática de uma cultura particular, trata-se de um dado
transcultural amazônico, um símbolo-chave da região” (LAGROU, 2009,
p. 76). Referência oportuna e inspiradora tendo em vista que a autora
mostra que nas relações com os mitos dos Wayana a cobra tem uma dupla
identidade uma aquática, onde é a cobra-grande, e outra terrestre onde é a
larva de borboleta, animal com essência predatória semelhante à da cobra
e que depois da transformação, essas larvas assumem belas cores e voam
(LAGROU, 2009, p. 77). No recente contexto de revalorização dos kenes,
dos sites (cantos tradicionais Yawanawa) e de sua visibilidade na formação
de novas gerações de mulheres pajés cabe inferir uma possivel releitura
dos kenes e de suas simbologias.
De outra forma destaco no texto a experiencia vivenciada em campo
na ocasião, em que todo meu corpo e a face foram pintados com tintura
extraída do jenipapo. Refiro tal vivencia como paradigmática para refletir
sobre xamanismo a partir da teoria do perspectivismo desenvolvida por
Eduardo Viveiros de Castro (2004) que problematiza a dualidade natu-
reza-cultura, defendendo a ideia de que a humanidade é uma questão de
perspectiva. Para o autor o mundo é habitado por diferentes espécies de
461
sujeitos e pessoas, humanos e não humanos que o apreendem (assimilam/
captam) segundo pontos de vistas distintos (VIVEIROS DE CASTRO,
2004). O que significa que é possível perceber as relações entre humanos
e não humanos a partir de um campo relacional onde a natureza passa a
ser concebida entre diferentes perspectivas provocando a superação de
modelos explicativos dicotômicos (naturalistas ou culturalistas) pela com-
preensão das relações entre sociedade e natureza (VIVEIROS DE CAS-
TRO, 2004). O que pode ser constatado, particularmente, nos estudos do
xamanismo na Amazônia. O kene escolhido para a pintura do meu rosto
foi uma das expressões gráficas da cobra jiboia, a cabeça da jiboia (Runu
Mapu). No período em que a pintura permaneceu na minha face foi possi-
vel observar alguns dos aspectos transformacionais relacionados a pintu-
ra no universo cosmológico vivenciado. Pois existia uma intencionalidade
manifesta da pintura conduzir a transformação da pessoa e de vivenciar
a alteridade. Portanto, a experiencia de campo propiciou indagações as
quais busco explorar. Por exemplo: ao “tornar-se outro”, pela vivência da
alteridade estamos falando de uma mudança de perspectiva propiciada pe-
los kenes? Quais os significados desta mudança de perspectiva nas práticas
xamânicas de cura?
Referências
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Filosofia da Puc-Rio.n.18, 2004.
462
invisibilizAção ou fronteirAs dAs diferençAs: situAções
perceptivistAs A pArtir do mbyá reKó
ou fugAs ontocosmoecológicAs
Leonardo de O. Guaragni1
464
que no texto O pesa-nervos afirma: “Toda a escritura é uma porcaria”
(ARTAUD, 1995, p. 139).
Procurarei situações etnográficas observadas e escutadas por mim
pra que dê exemplificações do que colo aqui como teoria. Essa proble-
mática linguística é sempre observada no contato interétnico, em espe-
cial quando indígenas são chamados a discursar em ambientes juruá, dos
brancos – das cidades, disso que Kusch contrasta ao “hedor de América”.
Sempre que é começada uma fala indígena em ambiente juruá há
críticas evidentes ao distanciamento linguístico e à impossibilidade de
uma fala complexa aos moldes do Mbyá Rekó, ou seja, que discursem
sobre suas vidas em suas línguas. Qualquer tradução, tendo como finalidade
a identificação de modos de vida a pessoas de outras culturas, redunda
numa dificuldade, talvez ainda uma ambiguidade até o impossível, se ti-
vermos em vista o acima colocado por Wittgenstein.
Porém, como vimos do trecho de Kusch anteriormente citado, não
é uma questão evidente de certo ou errado: a prática é o principal, e sa-
bemos, das experiências etnográficas particulares e compartilhadas, que
quando se está interagindo os significados estão presentes – a própria
prática é o significado das coisas, no fazer os significados vêm à tona, e as
percepções compartilhadas explicitam o contato interétnico como possi-
bilidade de fugas fronteiriças das diferenças.
465
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466
reflexões político-sociológicAs: no cenário
brAsileiro contemporâneo
Liliana Ferreira1
Vinicius da Silva2
469
pular, social, precisa elaborar o seu próprio saber”. Ademais, “estamos em
presença de atividades de educação popular quando, independentemente
do nome que levem, se está vinculando a aquisição de um saber (que pode
ser muito particular ou específico) com um projeto social transformador”
(BRANDÃO, 1983, p. 47).
Dessa forma, segundo versa Brandão (1983, p. 47), a educação “é
popular quando, enfrentando a distribuição desigual de saberes, incorpora
um saber como ferramenta de libertação nas mãos do povo”. Fazendo seu
objeto de alavanca social e de pertencimento, como forma de auto elevação
e autonomia perante o sistema pré-estabelecido.
Assim, conforme os primeiros escritos de Paulo Freire, a educação
popular, uma forma de “prática cultural para a liberdade”, constituindo,
“um movimento revolucionário de educadores surgia contra a educação
institucionalizada e constituída oficialmente, seja como sistema escolar
seriado, seja como educação não-formal de adultos. Emergia como pro-
posta de re-escrever a prática pedagógica do ato de ensinar-e-aprender”,
fazendo “repensar o sentido político do lugar da educação” no contexto
social (BRANDÃO, 1983, p. 48).
Assim diante do exposto nota se uma grande necessidade do cida-
dão de classe mais humilde, tem de ter sua autonomia na sociedade, a sen-
sação de pertencimento, de compreender os por quês das coisas, ou seja,
por meio da pedagogia social e da educação popular, vai lhe dando, uma
grande consciência de seu papel na sociedade bem como do seu valor em
quanto cidadão diante do conhecimento do seu poder de voto e escolha.
Essa discussão implica, ainda, no questionamento do papel da edu-
cação na produção das desigualdades nos ambientes educativos, proble-
matizando questões caras à educação, como seu papel emancipador, entre
outros. Nesta perspectiva percebe-se que o papel emancipador do indiví-
duo está relacionado a educação e é o que leva o indivíduo atuar plena-
mente como ser humano na sociedade moderna.
Ademais, segundo leciona Berlotto (2009, p. 10), que “os indivíduos
se constituem como pessoas unicamente porque, da perspectiva dos ou-
tros que assentem ou encorajam, aprendem a se referir a si mesmos como
seres a que cabem determinadas propriedades e capacidades”. Sendo que,
“por isso, partimos da ideia de que a identidade social de um indivíduo
está associada ao conjunto de vinculações de um sistema social.” Assim “é
a identidade social que permite ao indivíduo localizar-se e ser localizado
socialmente” (BERLOTTO, 2009, p. 10).
Sendo esse o papel da pedagogia social e da educação popular, tra-
zer ao seio da nossa sociedade os indivíduos excluídos, fora do contexto
470
escolar formal, utilizando das mais variadas formas de ensinar, arte, cine-
ma, música e por aí vai. Vislumbra-se sua condição de ser humano com
direitos e deveres, proporcionando-lhe autonomia enquanto integrante da
sociedade, bem como conferindo-lhe melhor condição de escolher seus
representantes no parlamento brasileiro.
Agora quando fora de períodos eleitoral, pode e deve utilizar-se das
manifestações e mobilizações populares, sendo que a democracia exige a
participação permanente e ativa do povo. É o que faz da democracia o que
ela realmente é.
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477
mAnifestAciones del espíritu ecológico KuscHiAno en
colombiA: consultAs populAres como AproximAción
A los sAberes AmericAnos
480
Relación naturaleza-cultura: en este tópico se menciona la rela-
ción naturaleza-cultura que ha sido planteada por occidente en ontologías
dualistas, como lo expone Philippe Descola no para profundizar en los
binarismos que se proponen frente a esa relación sino para superarlos tal
y como lo propone Kusch (2007, p. 39) al afirmar que “la oposición misma
es mera ficción, (...) al unir los opuestos rebaja la categoría de ambos, en
que los opuestos nada valen”.
Una respuesta inconsciente para superar esta dicotomía parece con-
figurarse en las narrativas de los movimientos sociales que promueven las
consultas populares, ya que al ser un mecanismo de participación resultante
de las luchas plebeyas de occidente, frente al pensamiento ecológico-cósmi-
co en donde el territorio se configura como un hábitat vital, logra expresar
las formas americanas y mestizas del estar siendo aquí y ahora, en el vaivén
de la inconsciencia social y la conciencia (Kusch 2007 p. 49)
¡SI a la Vida no a la Mina! ¡El agua vale más que el oro! Son arengas
vertebrales de la movilización, donde al posicionar al río y la montaña
como centro de èstas se pervierte, resuena y des-coloca esta cosmogonía
de “dos planos” de occidente, sobre una ontología más propia donde se
privilegia la noción del territorio desde la atribución a èste como ancestro
y pariente próximo; es aquí donde la vida se presenta como una exigencia
sempiterna para defender los territorios denotando la categoría del “estar
en la tierra”
Tránsitos hacia una nueva noción del territorio: el hecho de que
la movilización de las consultas populares en más de 57 municipios se
centrará en la preservación de las montañas, los ríos y ecosistemas estra-
tégicos también podría leerse como la comprensión de otras nociones de
territorios que exceden los patrones convencionales. Tres dimensiones
menciona Haesbaert (1997) al referirse a la categoría de territorio; la pri-
mera es la dimensión política, para expresar las relaciones de poder allí
presentes, la segunda es la simbolico-cultural, la cual prioriza la experien-
cia subjetiva y la tercera es la dimensión económica donde el territorio se
entiende como fuente de recursos.
Respecto a esto, lo que vemos en el fenómeno de las consultas popu-
lares en Colombia es la presencia de las tres dimensiones antes descritas,
sin embargo con una peculiaridad y es que aparece la vida como eje arti-
culador. Un territorio que empieza a vincularse a partir de la vida y que
va más allá de las relaciones de poder, muestra una noción distinta del
territorio. Este entendimiento ecológico hace que cada entidad humana o
no humana ocupe un lugar ontológico en las relaciones territoriales, don-
de la ambientalización de las luchas en América han comenzado a superar
481
las relaciones utilitaristas-mercantilistas del territorio para dar prioridad
a las relaciones entre comunidades respecto al suelo y a la vida.
Lo celebrativo y lo popular: Los carnavales por la vida, el agua
y/o la tierra, son parte fundamental en las consultas populares, ya que
hacen parte de una estrategia de visibilización de lo otro. En muchos de
estos festivales dentro de lo celebrativo popular es característico la re-
presentación con el cuerpo, carteles o máscaras, las características de las
entidades no humanas presentes en el paisaje: él loro, la guacamaya, la
montaña, a fin de entender lo vital como prioridad. Los carnavales y las
fiestas giran en torno a la necesidad de enunciar la vida desde la materia-
lidad y su carga espiritual, tal como lo expone Cosci (2008), retomando
a Kusch, al referirse al rito y al gesto dentro de un exceso ontológico no
asimilable desde la lógica occidental.
Es por eso que este último tópico, conecta el paisaje material con las
expresiones culturales, entendidas aquí como acciones cargadas de senti-
do simbólico para las comunidades, permitiendo así la defensa de la vida
de la montaña. En ese sentido Kusch (2012, p. 14) propone que la cultura
es “el baluarte simbólico en el cual uno se refugia para defender la signi-
ficación de su existencia”. Para este caso, las fiestas y celebraciones como
muestras culturales, posibilitaron la defensa de la existencia y significan-
cia, de otras vidas, otras realidades que cargan de significado ancestral-
-cosmológico las relaciones entre la naturaleza y la cultura.
Conclusión
482
Referencias
ALFONSO, H. Una filosofía ecológica en Rodolfo Kusch. Análisis. Re-
vista Colombiana de Humanidades, n. 77, pp. 137-152, 2010.
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DIETZ, K. Consultas populares mineras en Colombia: Condiciones de
su realización y significados políticos. El caso de La Colosa. Colombia
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KUSCH, R. Esbozo de una Antropología Filosófica Americana. Edi-
ciones Castañeda, 2012.
483
del pAcHAKuti Al pAcHAKutxA: sAber tenebroso,
espirituAlidAd y literAturA en el
estAr-sentir-pensAr-viAjAr de rodolfo KuscH
3 Asumimos en el trabajo el término “Americano”, por respeto a Kusch, pese a que sabe-
mos que es un nombre colonial. Y lo asumimos desde su propia convicción: “…hay una
comunidad de destino de América en la cual entran todas las capas sociales. Es lo que constituye
el estilo de vida americano. ¿Podremos encuadrarlo en un término filosófico que sea realmente
propio? (Kusch, 1977: 249).
486
tros” permanentemente constituyen el mundo de miedo; y el brujo, indígena,
aymara o lo popular constituyen no sólo el mundo sin miedo y distinto a la
racionalidad moderna/colonial, sino un mundo desde la frontera. Esta pala-
bra debe comprenderse en el contexto de lo que significa el conocimiento y
la comprensión desde la diferencia colonial. En todo caso, Kusch habla desde
una zona epistémica de pensamiento fronterizo (Mignolo: 2003: 64)
Por lo dicho, Kusch establece el desprendimiento de su clase4, “sien-
do” desde la frontera, borrando lo que “es” (clase media blanca colonizada),
e inaugurando las condiciones para dar el Pachakuti o vuelco decolonial.
Aquí, en este “salto al revés”, se da el Pachakuti epistémico, pues Kusch se
transforma plenamente y asume el lugar y la identidad del mundo otro. Es
cuando Kusch duda del estereotipo fundamental sobre nuestra geocultura5.
Es el momento en que deja el “nosotros” colonial, su clase occi-
dentalizada, y localiza un locus pleno de enunciación en un nosotros sin
miedo: “Y he aquí nuestra paradoja existencial. Nuestra autenticidad no
radica en lo que Occidente considera auténtico, sino en desenvolver la es-
tructura inversa a dicha autenticidad, en la forma del ‘estar siendo’ como
una única posibilidad. Se trata de otra forma de esencialización a partir de
un horizonte propio. Sólo el reconocimiento de este último dará nuestra
autenticidad” (p. 157-158).
4 Paulo Freire dice que para que un intelectual se comprometa con los oprimi-
dos, debe cometer un “suicidio de clase”, negar las lógicas opresoras de su clase.
Kusch va más allá, podríamos decir: suicidio epistémico de clase.
5 “Nuestra aparente inferioridad sudamericana” (p. 34)
6 El sentido de apropiación lo entendemos desde Arturo Escobar; lo existencial es dis-
tinto al planteamiento de Heidegger sobre el ser en cuanto éste es el despliegue tras-
cendente de sí mismo. Así, lo existencial intersubjetivo da cuenta no sólo del diálogo y
comprensión desde el mundo del otro sino a la ontología relacional o relacionalidad del
pluriverso de mundos (Escobar 2014).
487
Este vuelco consumado, del pachakuti al pachakutxa, en tanto tene-
mos a un Kusch transformado y localizado en un nosotros decolonial, re-
dondea su capacidad de comprender la realidad desde una sabia episteme
otra y de afirmar la plenitud de la comunicación intercultural e interepis-
témica desde la corpo-política del cuerpo y espiritualidad. En este sentido
y desde una zona fronteriza, es la sabia episteme de Kusch que establece
la re-conexión sobre un suelo mítico e historizado por comunidades indí-
genas, dioses, cosmos y naturaleza.
7 Acudimos al debate propuesto por Patricio Guerrero en su libro La chakana del corazo-
nar (2018) en el sentido de epistemologizar las sabidurías o nutrir las epistemologías de
sabidurías. Compartimos la idea de nutrir de sabidurías las epistemologías. Al igual que
Kusch, Guerrero plantea establecer su propia especificidad a las sabidurías sin subordi-
narlas al logos y episteme modernos. Por ello la noción de sabia-episteme, pues se trata
de relievar las sabidurías y luego relacionar a la episteme.
488
espiritualidad y el tejido lingüístico de Kusch con la literatura y el saber
científico dominante y la manera cómo hoy en día los aportes de Kusch
son relevantes para comprender la crisis climática, las geopolíticas de co-
nocimiento y el saber literario en las universidades públicas y en las uni-
versidades indígenas de Abya Yala/América Latina.
Referencias
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rollo, territorio y diferencia. Medellín: UNAULA, 2014.
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YAMPARA, Simón. El ayllu y la territorialidad en Los Andes. Una aproxi-
mación a Chambi Grande. La Paz: Q’aman Pacha CADA, 2001.
489
povos originários dA nossA AméricA: Autores do sul que
vAlorizArAm A presençA e culturA indígenAs
492
Simón Rodrígues, que foi tutor (professor) do ‘libertador’ Simón Bo-
lívar, em 1826 desenvolveu um projeto educativo para jovens indígenas.
Na Argentina, Domingo Faustino Sarmiento, quem estabeleceu a
Educação Pública para todos em seu país, preocupou-se com a população
indígena. Porém, no sentido oposto à sua valorização. Ao contrário, ele se
opunha à miscigenação, promovendo a imigração europeia e a urbaniza-
ção. Censurando e discriminando as populações do campo.
O brasileiro Manoel Bomfim foi um defensor dos indígenas e revela
em seus escritos que eles não foram nada passivos, como muitos livros o
retratam. José Vasconcelos praticou uma convicção antinorteamericana, a
defesa do índio e das populações marginalizadas. Gabriela Mistral, escri-
tora chilena mundialmente conhecida, foi a primeira personalidade latino-
-americana a receber o prêmio Nobel de Literatura, em 1945. Aludia, em
seus textos, a mestiçagem, bem como a necessidade de reconhecimento do
índio na sociedade da época, pois ela sabia muito bem o que era a discrimi-
nação e suas consequências. Alinhou-se a Vasconcelos com relação à causa
indígena, quando esteve no México.
Elizardo Pérez instalou escolas em meio aos campesinos e indíge-
nas. O peruano José Carlos Mariátegui defendeu o socialismo e levou para
o debate público a problemática agrária indígena. No Brasil, Darcy Ribei-
ro exerceu a defesa de negros e indígenas bem como de populações mar-
ginalizadas em geral. Na defesa dos povos da floresta tivemos o grande
líder, seringueiro, Chico Mendes, assassinado durante sua luta e por causa
dela, deixando memória como importante e premiada liderança brasilei-
ra. Por fim o enigmático Subcomandante Marcos, do movimento para a
liberação chamado, do movimento Zapatista também lutou pela defesa das
mulheres, dos indígenas e das classes marginalizadas.
São alguns autores destacados a partir do trabalho de Streck, que
chama a atenção para o conjunto e nos permite aprofundar. Trata-se de
estudos que podemos considerar “silenciados” em nome da hegemonia
eurocêntrica ainda vigente.
Investir no estudo e difusão das obras e atuação destes líderes do
continente é relevante para compensar a secular influência europeia em
nossas mentes e instituições. Fruto de nossa mente colonizada, da “colo-
nização epistêmica e subjetiva”, como refere Walter Mignolo (2010), urge
que mudemos este rumo eurocêntrico da formação humana que profes-
samos em todos os níveis educacionais, que vem aumentando dia a dia,
apesar das raras exceções.
Assim, atribuir a importância ao conhecimento de nossa própria his-
tória territorial poderá fortalecer nossa cidadania, o que nos vincula ao
493
movimento e teorias descoloniais e decoloniais. Uma guinada continental
é um movimento necessário para nós brasileiros, que tendemos a olhar
para o mar... em busca da idealizada Europa.
Percebe-se a grande distância entre índios e brancos em toda a Amé-
rica Latina; no Brasil essa temática é colocada de forma bem fragmentada,
como consta no livro “A temática indígena na escola”, de Aracy Lopes da
Silva e Luís Donisete Benzi Grupioni:
494
la región, el país con el menor índice de desempleo, con una proyección
futurista al estilo europeo. Bolivia no tiene deudas con países extranjeros,
por el contrario presta dinero a otros países, las universidades son gratui-
tas, van mejorando el nivel de educación en los bolivianos y bolivianas; la
inseguridad en Bolivia desapareció, la indigencia y la desprotección infan-
til se acabó...Bolivia es el país suramericano con el mayor desarrollo del
continente y lo dirige un ‘indio’, castrochavista, basando su economía en
ideas sociales y de izquierda.
Referências
LIMA, Stela Macedo. Pensadores latino-americanos e suas contribuições
para a educação em perspectiva descolonial. 2018. 142. f. Dissertação (Mes-
trado em Educação) – Universidade do Planalto Catarinense, Lages, 2018. Dis-
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STRECK, Danilo R. Fontes da Pedagogia Latino-Americana. Belo Horizon-
te: Autêntica, 2010.
495
lA dis-torsión del deseo de conocer entre lA levedAd
del eros (ser Alguien) y lA grAvidez
del suelo (estAr-siendo)
Como también se dice que Tales, mientras estudiaba los astros y miraba
hacia arriba, cayó en un pozo, y que una bonita y graciosa criada tracia se
burló de que quisiera conocer las cosas del cielo y no advirtiera las que
tenía junto a sus pies (DK 11 A 9, Los Filósofos presocráticos, Ed. Gredos,
fr. 10).
498
legitimadas por expertos que aún responden a un tipo de racionalidad ilus-
trada. En esta desadaptación de “temples epocales” creo que se encuentra
una de las causas del debilitamiento del deseo en relación al conocimiento
en la educación actual. En síntesis, la posmodernidad con sus modos alie-
nantes de fragmentación cognitiva y de dispersión informativa debilita el
“deseo de conocer” al modo en que se lo solía entender hasta la modernidad.
Sin embargo, el pensamiento de Rodolfo Kusch nos puede dar otra
clave explicativa, si la hay, para comprender desde un enfoque situado en
Nuestra América Profunda este mismo fenómeno, aquí donde el es y el no
es siguen jugando su eterno juego:
499
gravidez local. La misma imperfección del filosofar hace a la filosofía
americana. En el defecto en suma habrá de darse la verdad, o en otras
palabras, nuestra verdad siempre deforma lo que se pretende instituir
formalmente (KUSCH, 1978, p. 259).
Referencias
ARISTÓTELES. Libro I (Alpha) en Metafísica. Buenos Aires: Sudamericana,
1986.
CULLEN, C. Las relaciones del docente con el conocimiento. In: ______. Crítica
de las razones de educar. Buenos Aires: Paidós, 1997
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502