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MÉTODOS
O estudo realizado foi do tipo retrospectivo descritivo, vi-
sando levantamento de dados sobre os acidentes envolvendo
a mão, durante o ano de 2000, no Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de
São Paulo (HCFMRP-USP).
Os materiais utilizados como fonte de coleta dos dados dos
indivíduos foram os prontuários, que ficam arquivados sob a
responsabilidade do Serviço de Arquivo Médico do hospital. Gráfico 1 – Total dos traumas atendidos em 2000 no Hospital das
O referido hospital é um centro de referência terciário no tra- Clínicas da FMRP-USP
Do total geral de casos atendidos em 2000 no referido hos- De todos os casos estudados, 73,2% do total (260), os trau-
pital, 5,4% foram traumas de mão. mas nas mãos não vieram associados a nenhum tipo de lesão
Neste estudo, a distribuição das freqüências das idades no em outras partes do corpo. Os politraumatizados ficaram em
momento do trauma apresentou grande amplitude, variando segundo lugar, com 52 casos, 14,6% (tabela 1). Esses casos
de um mês até 88 anos. A média de idade foi de 27 anos. O estavam associados a traumas mais graves, como queimadu-
sexo predominante foi o masculino, com 264 casos (74,4%). ras e acidentes de trânsito, com lesões extensas e múltiplas.
Da amostra analisada, 66,6% (235) dos casos eram proce-
dentes de Ribeirão Preto e 33,4% (118), encaminhados de TABELA 1
outros municípios; em apenas dois casos não havia essa espe- Lesões ocorridas em 2000 nas mãos associadas
ou não a outras partes do corpo, na amostra
cificação no prontuário. estudada no Hospital das Clínicas da FMRP-USP
Com relação à ocupação principal, a amostra dos casos aten-
Lesões associadas Freqüência %
didos com traumas das mãos apresentou freqüência maior entre
os classificados como menores e estudantes, com 28%; segui- Não 260 073,2
dos pelas profissões de nível técnico que lidam com ferra- Politraumatizado 052 014,6
mentas, como marceneiros, carpinteiros, mecânicos, pedrei- MMSS 015 004,2
ros, com 24%, seguidos por outras ocupações. Os indivíduos Face, pescoço, cabeça, tronco 020 005,7
MMII 007 02,
auto-identificados como ligados ao comércio e serviços ge-
Não especificado 001 000,3
rais e as mulheres classificadas como do lar tiveram distribui-
Total 355 1000,
ção similar: 14% e 12%, respectivamente. Já ocupações liga-
das a atividades como de profissionais liberais, funcionários
públicos e profissionais das letras e artes tiveram baixa fre- As causas mais freqüentes dos traumas nas mãos foram os
qüência de lesões da mão. acidentes de trânsito, com 17,5%, seguidos pelos ferimentos
Dos casos analisados neste estudo, a mão mais lesada foi a por vidro ou latas e por máquinas e ferramentas, com percenta-
direita, com 49,9%, com pequena diferença com relação à gens similares, 14,2% e 14%, respectivamente (tabela 2). Ca-
mão esquerda, com 41,3%. Uma pequena percentagem so- sos como explosões por fogos de artifício e arrancamento de
freu lesão bilateral, 8,2%, geralmente associada a queimadu- dedos em postes de cabos elétricos residenciais metálicos tipo
ras. Apenas dois casos não continham a informação do lado “torrinha” tiveram baixa incidência neste estudo. As picadas de
lesado no prontuário (gráfico 2). escorpião apareceram com freqüência duas vezes maior do que
as mordeduras de animais, respectivamente, 4,5% e 2,1%.
TABELA 2
Causas dos traumas das mãos ocorridos no ano de 2000,
na amostra estudada no Hospital das Clínicas da FMRP-USP
Causa do trauma Freqüência %
Com relação ao diagnóstico, na amostra como um todo, as Smith et al(15) encontraram 54% de lesões na mão direita,
fraturas foram as mais freqüentes, com 117 casos (33%), se- 44% na esquerda e 2% bilaterais, em um hospital do Reino
guidas pelas lesões dos tendões flexores em associação aos Unido, corroborando os achados deste estudo. Thomas et al(17)
nervos, com 72 casos, correspondendo a 20,3% do total (ta- encontraram, em um estudo entre crianças na Índia, 61,3%
bela 3). dos casos de lesões na mão direita. Isso possivelmente se deve
ao fato de a maioria das pessoas na população em geral ser
TABELA 3 destra e os acidentes geralmente ocorrerem quando o indiví-
Diagnósticos da amostra estudada dos traumas das mãos duo usa a mão dominante numa situação de risco. É um item
ocorridos em 2000 no Hospital das Clínicas da FMRP-USP importante a ser levantado, justamente pela relação que pode
Diagnóstico Freqüência % ser estabelecida entre a dominância e a mão lesada no trauma
e suas conseqüências em termos de seqüelas funcionais per-
Fraturas/luxações 117 33,
Lesão tendões flex. e nervos 072 020,3
manentes, levando muitas vezes o indivíduo a ter que alternar
Amputações/semiamput. 041 011,5 a dominância ou até ficar incapaz para algumas atividades
Lesões associadas múltiplas 035 009,9 bimanuais no trabalho. Casos de lesões intencionais têm maior
Ferimentos corto-contusos 034 009,6
probabilidade de ocorrer com a mão dominante(9). Apesar da
Lesões de pele tipo queimadura 032 09,
Contusões 016 004,5 aparente importância dessa informação, em poucos prontuá-
Esmagamentos 003 000,8 rios estava descrita a dominância do indivíduo que sofreu uma
Total 355 1000, lesão traumática na mão, ficando, portanto, inviável a análise
dessa variável. A inclusão desse item nas fichas do atendi-
mento inicial dos acidentados da mão poderia ser útil para
estudos da relação entre dominância e mão lesada com o tipo
DISCUSSÃO
de trauma e atividade realizada.
Comparando os dados obtidos nesta amostra com a litera- Os acidentes com as mãos são na sua grande maioria isola-
tura, foi observada incidência maior em adultos jovens, con- dos, decorrentes de traumas diretos ou durante o manuseio de
cordante com outros estudos, com pequenas variações. Clark ferramentas em tarefas do dia-a-dia, como ocorreu nesta amos-
et al(27) encontraram acometimento na faixa etária entre 12 e tra, com 73,2% dos casos.
29 anos. Batista e Filgueira(10) encontraram indivíduos com Os traumas graves, embora menos freqüentes, são os que
idade entre 20 e 40 anos, acima do verificado no presente mais podem deixar seqüelas, com relação à perda funcional e
estudo, possivelmente devido à amostra escolhida para análi- estética, pois em geral levam a amputações mutilantes. Os
se. Smith et al(15) detectaram a média de idade de 25 anos, traumas por socos em portas de vidro, em geral nos adultos,
com variação de 11 a 80 anos. A média de idade mais próxi- estão associados ao consumo de álcool(20,29) e às agressões(7,18).
ma foi a do trabalho de Hill et al(16), com 27,2 anos, além da Já nas crianças estão associados às atividades domésticas(16).
moda de 21 a 25 anos, e variação de um a 93 anos de idade. Na amostra estudada, analisando os indivíduos de ambos os
Na amostra estudada houve acentuado predomínio do sexo sexos na faixa etária denominada crianças e jovens com até
masculino, com 74,4%. Os dados deste trabalho apresenta- 17 anos de idade, houve percentagem maior de casos de le-
ram resultados similares aos dos de Santos et al(28); Lopes(29) e sões com fogo e líquidos ferventes no sexo feminino, com
Batista, e Filgueira(10). Pardini et al(5) encontraram, em um 27,3%, comparadas com o masculino, 10,2%. Já nas crianças
estudo de 1.000 casos de acidentes de trabalho, 93,2% de ho- e jovens do sexo masculino, as maiores percentagens foram
mens com lesão traumática da mão. Os valores encontrados igualmente distribuídas com ferimentos por vidros e latas, trau-
vão ao encontro da experiência clínica, em que é sabido que o mas diretos, quedas e picadas de escorpião, com 13,6% cada.
homem, mais sujeito a situações de risco no trabalho, no trân- Os traumas com crianças estão na maioria relacionados às
sito e também a casos de violência urbana, está mais propen- situações ligadas aos acidentes domésticos, no esporte ou la-
so a sofrer acidentes na mão(28). zer(14,17). Houve apenas um caso de amputação de uma mão
Neste estudo os indivíduos com ocupações técnicas que por moedor de carne ocorrido em uma criança.
lidavam com ferramentas cortantes como serras foram o se- No grupo de pacientes do sexo feminino, considerados neste
gundo grupo em incidência. Sendo jovem, a amostra pesqui- estudo como sendo os adultos, com idade maior ou igual a 18
sada, muitos casos foram de menores ou estudantes. anos, foi observado que a maior incidência de lesões foi do
Rev Bras Ortop. 2006;41(5):181-6
Traumas da mão: estudo retrospectivo 185
tipo ferimento por vidro ou lata, com 31,7%. Isso talvez se líticos posteriores poderão ser úteis no sentido de tentar corre-
deva ao fato de a mulher apresentar maior risco de lesões do- lacionar informações mais específicas, como os acidentes de
mésticas, com portas e copos de vidro, ou ao abrir e manusear trânsito relacionados às fraturas, o uso de ferramentas às le-
latas na cozinha. sões de partes moles ou até sobre as diferentes faixas etárias;
No grupo de homens considerados adultos, com idade maior ou ainda a relação da mão lesada com a dominância e o local
ou igual a 18 anos, os acidentes de trânsito e o uso de máqui- do trauma, entre outros.
nas e ferramentas foram as causas mais freqüentes, com 20,7% Com base nos dados levantados neste e em estudos com-
e 16,3%, respectivamente. Denota-se claramente a relação cau- plementares e com o objetivo de orientar futuramente a popu-
sal com as atividades laborativas. No levantamento realizado lação sobre a importância de prevenir acidentes que podem
em um hospital universitário em 1990, 16,5% sofreram lesão gerar lesões nas mãos, poderá ser elaborado por um grupo
por serra circular no trabalho(5). multiprofissional um programa de prevenção através da ela-
É possível constatar também neste estudo, como na prática boração de folder e cartazes com textos explicativos, junta-
clínica, que as lesões dos tendões flexores devem ser analisa- mente com imagens fotográficas. A adoção de medidas sim-
das separadamente dos tendões extensores, visto sua ocorrên- ples de prevenção no cotidiano, nos espaços de trabalho, de
cia ter sido bem maior. lazer, de habitação ou de circulação de pessoas poderá prova-
Este estudo descritivo serviu de base para a aquisição de velmente evitar alguns acidentes, com conseqüentes lesões e
dados relativos aos traumas das mãos durante um ano. Apesar seqüelas funcionais nas mãos dos indivíduos.
de ser apenas uma amostra, foi representativa no sentido de
levantar de maneira inicial o perfil do acidentado da mão que CONCLUSÕES
foi encaminhado à Unidade de Emergência do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP, no 1) Os traumas da mão e dedos foram responsáveis por
ano de 2000. 27,6% de todos os traumas atendidos no HCFMRP-USP, duran-
O modelo de banco de dados informatizado baseado no te o ano de 2000.
programa Epi-Info 6,04D mostrou ser eficaz na armazena- 2) As principais causas dos traumas da mão e dedos foram
gem e análise dos dados. Outros estudos a partir deste podem os acidentes de trânsito, ferimentos por vidro e latas.
coletar os dados referentes a outros anos na mesma institui- 3) Houve predomínio das fraturas e lesões dos tendões fle-
ção para comparação ou até em arquivos de outros hospitais xores e nervos.
secundários e unidades primárias de atendimento de trauma- 4) Novos estudos são necessários para a estruturação de
tizados, visando novas análises e comparações. Estudos ana- um programa de prevenção de acidentes com as mãos.
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