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ISSN: 0104-7485
RESUMO
Este artigo relata uma pesquisa sobre crenças e emoções de professoras de inglês. Questionários semiabertos,
entrevista narrativa e notas de campo foram utilizados. Os resultados sugeriram uma relação interativa entre
crenças e emoções, crenças dos professores sobre a desmotivação dos alunos e emoções de frustração sobre a
escola.
ABSTRACT
This article reports on a research study about beliefs and emotions of school teachers of English Semi
structured questionnaires, narrative interviews and field notes were used. The results suggest an
interactive relationship between beliefs and emotions, teachers’ beliefs about students’ demotivation and
emotions of frustration related to schools.
Introdução
1
Este artigo é um recorte da pesquisa de Iniciação Científica conduzida em 2012-2013. Agradecemos o apoio do
CNPq no financiamento da bolsa de PIBIC.
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Teoria Crítica, os Estudos Feministas e a Filosofia Educacional sugerem que cognição e emoção
não podem ser adequadamente compreendidas como fenômenos separados. Apesar disso, o
estudo das emoções e crenças ainda é bastante tímido dentro dos trabalhos de crenças. Nos
últimos anos, esse panorama parece ter mudado um pouco, com o surgimento de alguns estudos
sobre emoções de aprendizes de línguas (ARAGÃO, 2005, 2007; MASTRELLA, 2002;), e mais
recentemente, com professores de línguas em formação inicial (CANDIDO RIBEIRO, 2012;
REZENDE, 2014; RODRIGUES, 2015) no Brasil, e no exterior (GOLOMBEK & DORIAN,
2014).
Este artigo relata resultados de um estudo que investigou as crenças e emoções de 11
professoras das escolas públicas de uma cidade situada na Zona da Mata Mineira. Ele está
dividido em quatro seções. Na primeira, discutimos os conceitos de crenças e emoções na
formação de professores. Na segunda, discorremos sobre metodologia, contexto, participantes e
instrumentos utilizados. Na terceira, apresentamos e discutimos os resultados. Concluímos com
sugestões para pesquisas futuras e implicações para o estudo de emoções na cognição de
professores de línguas.
O interesse pela pesquisa de crenças teve seu início em meados dos anos 70 com
estudos que tinham como foco o aprendiz e suas contribuições para o processo de aprender: suas
experiências, pensamentos e crenças (BARCELOS, 2004; BREEN, 2001; KALAJA &
BARCELOS, 2003). Estudos pioneiros foram feitos por Horwitz (1985), Wenden, (1986); e no
Brasil por Leffa (1991), Almeida Filho (1993) e Gimenez (1994). A pesquisa sobre crenças
ganhou interesse no Brasil a partir de meados dos anos 90 e desde então, teve uma rápida
expansão e se encontra hoje como área de pesquisa consolidada com vários livros, artigos e
livros a respeito (BARCELOS, 2003, 2004; BARCELOS & VIEIRA-ABRAHÃO, 2006;
BARCELOS & KALAJA, 2013; BERNAT & GODSVENKO, 2005; BORG, 2003; BORG,
2006; KALAJA & BARCELOS, 2003; KALAJA & BARCELOS, 2013; WOODS, 1996;).
A importância das crenças de professores sobre ensino e aprendizagem de línguas está
relacionada a três fatores principais: (1) compreensão das ações e processo de tomada de
decisões dos professores em sala de aula (BORG, 2003; JOHNSON, 1999; PAJARES, 1992;
WOODS, 1996); (2) a sua importância no ensino reflexivo: a reflexão encoraja professores a
questionarem suas crenças para compreender como ensinam (RICHARDS & LOCKHART,
1994); e (3) compreensão do processo de mudança educacional já que nenhuma mudança
efetiva acontece sem uma mudança de crenças.
Crenças têm sido investigadas através de uma variedade de métodos e abordagens
(KALAJA & BARCELOS, 2013), desde abordagens mais positivistas com uso de questionários
fechados que definem crenças como construtos mentais fixos até abordagens mais contextuais
que fazem uso de narrativas, entrevistas, observações, dentre outros. Estudos atuais2 dentro de
uma abordagem contextual têm conceituado crenças como dinâmicas, emergentes, socialmente
construídas e situadas contextualmente. Elas constituem um sistema dinâmico e complexo que é
inter-relacionado, não linear e multidimensional (BARCELOS & KALAJA, 2011; MERCER,
2011). Neste trabalho, crenças são definidas como:
2
Por limitações de espaço e tempo esses estudos não serão revisados aqui. Vide Barcelos & Kalaja
(2011); Kalaja & Barcelos (2013); Barcelos & Kalaja (2013) para revisão mais recente da literatura.
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Emoções de Professores
Existem tantas definições quanto as muitas emoções que sentimos e suas combinações.
As emoções colorem nossas percepções e influenciam como escolhemos agir no futuro
(HANSEN, 1999). Na Psicologia, Izard (1991) explica que “uma emoção é vivenciada como um
sentimento que motiva, organiza e guia percepção, pensamento e ação” (p. 14). Na Linguística
Aplicada (doravante LA), So (2005: 43) define as emoções como “o resultado psicológico das
interações dinâmicas entre diferentes camadas de sistemas internos e externos – fisiológicos,
cognitivos, comportamentais e sociais”. Solomon (2004) afirma que as emoções incluem
aspectos que são frequentemente entrelaçados, tais como aspectos comportamentais, fisiológico
(hormonal, neurológico e neuromuscular), fenomenológico (sensações físicas e meta-emoções),
cognitivos (percepções, pensamentos e reflexões sobre nossas emoções, e sociais). Além disso,
as emoções, definidas por vários autores dentro da Psicologia (BOSMA & KUNNEN; 2001;
MESQUITA & MARKUS, 2004; ZEMBYLAS, 2004), são vistas como ativas (e não estados
passivos, como geralmente se acredita), interativas e construídas socialmente, culturalmente e
discursivamente (BARCELOS, 2013).
Zembylas (2006) critica a visão estritamente interpessoal de emoção e defende uma
abordagem mais discursiva, que, segundo ele, permite ver o lugar da emoção na identidade do
professor e como as emoções estão relacionadas com questões de poder, identidade e resistência
no ensino. Para o autor, as emoções são performativas, isto é, as maneiras pelas quais os
professores compreendem, vivenciam, atuam e falam sobre as emoções estão altamente
relacionadas com seu senso de identidade.
As emoções estão intrinsicamente relacionadas às crenças, embora essa relação não
tenha sido ainda muito discutida na LA. No Brasil, as emoções são ainda um tópico bastante
recente em LA, com poucos trabalhos (vide ARAGÃO, 2005, 2011). Mais recentemente, o
aspecto emocional veio a ser tema de dissertações sobre professores em pré-serviço (CANDIDO
RIBEIRO, 2012; RODRIGUES, 2015) e em serviço (REZENDE, 2014). No exterior, essa relação
tem sido investigada sob a perspectiva sociocultural na formação de professores nos trabalhos de
Golombek e Doriah (2014) e Johnson e Worden (2014).
Entretanto, tanto nas ciências sociais (FRIJDA et al. 2000; HANNULA et al., 2004)
quanto na área de educação, a relação entre crenças e emoções tem sido sugerida por alguns
pesquisadores que enxergam emoções e cognições como interconectadas e inseparáveis (VAN
VEEN & LASKY, 2006). Essa relação se dá na forma como: a) “as crenças estabelecem
contextos meta-afetivos para a experiência da emoção” e como o “afeto estabiliza as crenças”
(HANNULA et al., 2004: 7-8); b) “as emoções influenciam o conteúdo e a força das crenças de
um indivíduo e sua resistência à modificação” (HANNULA et al., 2004: 1); e c) “as emoções
energizam e organizam o pensamento e a ação” (IZARD, 1999: 23).
Resumindo, a influência das crenças nas emoções (e vice versa) se dá de quatro
maneiras principais. Primeiro, provocando mudanças nas operações mentais e na produção de
imagens no cérebro bem como mudanças corporais (DAMASIO, 1994). Assim, quando estamos
tristes produzimos menos imagens mentais, ao contrário de quando estamos felizes. Segundo, as
emoções fornecem evidência para as crenças (WINOGRAD, 2003). Terceiro, as emoções
conduzem nossa atenção para informações que acreditamos ser relevantes. Por fim, as emoções
influenciam as crenças alternando-as, ampliando-as ou as tornando mais resistentes à mudança
(FRIJDA et al., 2000). Basicamente, as emoções podem tornar as crenças mais fortes ou mais
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fracas (BARCELOS, 2013). Essa influência das emoções nas crenças vai depender basicamente
de nossos objetivos emocionais.
Metodologia
Contexto e participantes
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Análise de Dados
A análise dos dados foi feita de acordo com os procedimentos de análise de pesquisa
qualitativa. Primeiramente, foi feita a redução dos dados através de notas em forma de frases
curtas, ideias chaves e conceitos, focalizando a atenção nas palavras usadas pelos participantes
(CRESWELL, 1998; PATTON, 1990). Em seguida, os dados foram codificados através da
classificação das unidades significativas referentes às crenças e emoções das professoras, bem
como suas afirmações sobre diversos aspectos do ensino e da aprendizagem de inglês, bem
como a relação entre suas crenças e emoções (LINCOLN & GUBA, 1985). As unidades
similares que apresentavam características em comum foram agrupadas em categorias
(HOLLIDAY, 2002) que foram revisadas várias vezes.
As professoras caracterizam seus contextos de trabalho como difícil e citam três razões
principais para isso: a carga horária excessiva, a falta de estrutura adequada para trabalhar e a
violência.
Em relação à carga horária insuficiente das aulas de inglês, das onze professoras, seis
lamentam que “a carga horária é muito pequena” (Clara, E1: 6) “o conteúdo é bem extenso”
(Angelina, E1, p. 10) e que “o tempo é pouco” (Little Teacher, E1:5) “duas aulas só por semana é
insuficiente [...] com certeza precisaríamos de mais aulas” (Dedete, E1: 2). Uma das professoras
ainda relatou que “em algumas escolas a gente ainda tem uma só por semana” (Clara, E1:6).
Assim, de um lado, existe o conteúdo extenso que precisa ser trabalhado ao longo do ano e,
de outro, uma carga horária que, segundo as professoras, não é suficiente para que elas possam
cumprir tal conteúdo. Em relação ao número de alunos por turma, Nice destaca que “as salas são
superlotadas [...] aquele monte de menino falando com salas cheias desse jeito é impossível”
(Nice, E1: 6). Essa fala sugere que a crença que diz que um número menor de alunos por turma
favorece a aprendizagem. Dedete também defende que com “um grupo menor o professor
trabalha mais, o aluno desenvolve mais, porque ele fica perto, ele conhece o coleguinha que tá
do lado, então é diferente” (Dedete, E1:3). Angelina, por sua vez, acredita que é “muito
desafiador, muito frustrante tanto pra quem tá ensinando e quem tá aprendendo uma segunda
língua com turmas muito cheias [...] como que a gente aprende uma língua estrangeira com uma
sala com mais de 30 alunos?” (Angelina, E1:.6). Para essas professoras, o número excessivo de
alunos por turma é um fator agravante, que compromete a aprendizagem.
Em relação à falta de estrutura física das escolas, as queixas são muitas: desde falta de
material escolar, cópias, até projetor de mídia. As professoras afirmam que a escola não fornece
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cópias reprográficas, o que inviabiliza trabalhar com material extra. A fala de Nice ilustra bem
essa estrutura escolas quando ela diz “não pode tirar cópias para levar uma coisa diferente para
os meninos, então fica aquela mesmice” (Nice, E1:.3). A professora Kahena também afirma que
“não vê estrutura para o professor [...] sempre tem que criar material para levar para a sala de
aula. Você tem que pagar do seu bolso. Para você buscar coisa chamativa você tem que
comprar” (Kahena, E1: 4). Kahena também acredita que “o giz, o quadro, a folha xerocada é
pouco para eles. Eles não estão mais interessados no giz, nas folhas xerocadas” (Kahena, E1: 4-
5). Essa professora parece reconhecer que os alunos não querem mais o tradicional. No entanto,
ela não explicita o que os alunos gostariam de fazer ou como essa prática tradicional poderia ser
mudada. Clarice também afirma que “não tem estrutura, não tem data show onde eu dou aula,
então eu não posso levar uma apresentação pra eles [...] um aparelho de DVD muito ruim, de
vez em quando funciona” (Clarice, E1: 6). É claro que precisamos ter escolas com estruturas
adequadas para o ensino de todas as matérias. Talvez, pelo acúmulo de turmas, cargos e
trabalho, para esses professores, procurar alternativas ou soluções criativas, e criação e
elaboração de material diferente para a sala de aula, seja visto como algo externo a seu trabalho.
Acreditamos que as parcerias com as universidades, seja na forma do programa PIBID ou com
os estágios possam auxiliar os professores nesse sentido.
Por fim, em relação à violência, as professores mencionaram o clima de insegurança e
violência que vivenciam. Duas participantes afirmaram ter sofrido ameaças por parte dos
alunos. Segundo Clarice, “[...] um aluno me ameaçou na sala de aula [...] Me ameaçou, me
chamou de idiota, de otária, falou que eu precisava levar uns tiros, que eu ia apanhar de uma
gangue” (Clarice, E1: 7). Kahena também passou por essa lamentável experiência, como explica
neste excerto:
Esses relatos sugerem um clima hostil dentro das escolas que não contribui em nada para
emoções mais serenas e apaziguadoras entre professores e alunos, diretores e alunos. Isso gera
emoções de frustração, desmotivação e principalmente, medo nesses professores que pensam em
desistir de suas profissões. Clarice, por exemplo, afirma não desejar atuar mais em escolas
públicas. Kahena se matriculou em um curso visando uma carreira administrativa.
Em resumo, o contexto de atuação desses professores parece propício para certas
crenças a respeito dos alunos e emoções em relação à profissão e aos alunos, tópicos que
discutiremos a seguir.
A análise dos dados apontou para a existência de crenças sobre o professor e sobre os
alunos, bem como emoções sobre a escola e também em relação aos alunos. Por questões de
espaço e tempo, neste artigo discutimos apenas as crenças e emoções referentes aos alunos e as
escolas e como essas se relacionam. Quase todas as participantes (sete dentre as onze) possuem
crenças bastante negativas em relação a seus alunos, sendo que somente uma professora falou
de seus alunos de maneira positiva.
A crença das professoras sobre os alunos se refere à motivação dos mesmos. Segundo as
professoras, a maioria está desmotivada, isto é, não se interessa pelo conteúdo nem pelas
atividades propostas. As crenças manifestaram-se em frases recorrentes sobre os alunos durante a
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entrevista, tais como: “eles não estão nem aí” (Clarice, E1:8-9) ou “eles não querem nada com
nada” (Angelina, E1:2) ou ainda “o desinteresse deles é muito grande” (Kahena, E1:8), “eles
querem tudo pronto e acabado” (Nice, E1:4). A participante Clara nos relata por vezes que se
“depara com alunos desmotivados” (Clara, E1: 6). Clarice também acredita que “a desmotivação
dos alunos [...] é muito grande” (Clarice, E1:6). Além disso, acreditam também na falta de
conhecimento ou de “base” do aluno, expressa nos seguintes dizeres bastante comuns nas
entrevistas: “os meninos não têm noção de nada” (Nice, E: 4), “eles não se esforçam” (Clara, E1: 7),
“eles não dão valor” (Kahena, E1: 5), “eles não têm expectativas” (Clarice, E1: 6) e “eles não têm
base mesmo” (Angelina, E1: 8). Percebe-se o uso constante de frases negativas e uma visão dos
alunos como deficitários. Os alunos são assim caracterizados como seres que não tem conhecimento
ou expectativas, não se esforçam, não gostam e não valorizam o ensino.
Essas crenças indicam que as professoras parecem não confiar em seus alunos, nem
acreditar em seu potencial. É como se acreditassem que estivessem ensinando para seres que
não tem interesse ou curiosidade em aprender. Uma crença fundamental de qualquer educador é
a crença no potencial do ser humano para aprender e na sua capacidade de se interessar, de
sentir curiosidade. Não é o que se percebe aqui. Essa crença gera uma emoção de frustração,
desmotivação e insatisfação, conforme reconhece uma das professoras. Angelina afirma que
“[...] não é só o aluno que tá sem interesse não. Essa falta de interesse do aluno gera também no
professor uma insatisfação muito grande e com isso dificulta” (Angelina, E1:7). As crenças
influenciam nossos comportamentos e nossas emoções (BARCELOS, 2010). A crença na falta
de interesse e motivação do aluno influencia as emoções dessas professoras que se sentem
desmotivadas e isso, por sua vez, pode produzir certa desmotivação dos alunos, alimentando um
círculo vicioso.
A repetição dessas crenças encontra respaldo nos discursos das diretoras, pais e mídia
que tentam encontrar um culpado para a situação (LEFFA & BOTELHO, 2009) que ora é o
governo, ora o professor, ora a escola ou mesmo os alunos. De acordo com Leffa e Botelho
(2009), existe a difusão de um discurso que o pobre não precisa aprender uma língua estrangeira,
porque não terá possibilidades de viajar para fora do Brasil, ou que a escola não tem condições
estruturais de ensinar uma língua estrangeira seja pela falta de conhecimento dos professores seja
pela ausência de recursos. Paralelo a isso, há ainda a existência da crença errônea de que se o aluno
não aprendeu nem português não tem motivos para estudar língua estrangeira como sugerido por
uma das professoras do estudo (Nice, E1: 3). Acreditar nisso é desacreditar na capacidade do aluno
em aprender. Ao propagar essa crença, a culpa passa a ser do aluno, isentando o professor de ensinar
e buscar novas possibilidades para ensinar. Uma frase muito repetida entre a grande maioria das
participantes foi “eles não querem [aprender], fazer o quê?”. Como afirmam Leffa e Botelho
(2009:118), “essa auto-exclusão que aparentemente parte do aluno, de dentro para fora, na verdade
parte da sociedade, de fora para dentro, como um cavalo de Tróia, colocado no aluno para destruir
de dentro seu desejo de aprender”. Leffa e Botelho (2009) argumentam que o professor includente
precisa fazer com que seus alunos se sintam pertencentes a esse grupo restrito que é essa
comunidade dos falantes da língua estrangeira, já que “o elemento fundamental do desejo não é a
satisfação, mas o caminho percorrido para tentar alcançá-la”. O professor sempre estará cercado
de obstáculos a começar pela falta de recursos materiais e uma possível resistência inicial dos
alunos, mas para que haja êxito é preciso “contaminar os outros com o nosso entusiasmo”
(LEFFA & BOTELHO, 2009:120).
Apenas uma participante demonstrou crenças otimistas em relação aos seus alunos.
Paula vê seus alunos como “pessoas que sonham em falar inglês” (Paula, E1: 6) e defende que é
preciso “levar material interessante pra eles e considerar esses alunos super mega candidatos a
qualquer vaga [...]” (Paula, E1:6). A fala da professora parece remeter a duas de suas outras
crenças: (1) de que os alunos se interessam pelo conteúdo desde que o material trabalhado seja
interessante e faça sentido no contexto em que estão inseridos; (2) o trabalho que ela realiza
com os alunos deve fazê-los acreditar que eles podem ser candidatar a qualquer concurso desde
que haja uma preparação e um bom investimento no processo de aprendizagem. Apesar dessas
crenças, Paula se mostra consciente da realidade que a cerca, dos problemas que sua escola
possui e principalmente do contexto em que seus alunos vivem. Como ela afirma em sua
entrevista, a escola onde ela trabalha atende
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Paula acredita que, para lidar com esse contexto, “o educador, principalmente nesse nível de
escola pública e de formação, tá ali formando, ajudando a formar seres humanos, indivíduos,
brasileiros que têm uma deficiência enorme de família, de afeto” (Paula, E1:9). As crenças de
Paula revelam uma crença oculta, mas presente na sociedade brasileira de que somente alguns
alunos de certas escolas podem ser aprovados no vestibular. Não fosse assim, os alunos de
escola pública aprovados não seriam manchetes nacionais, como vemos às vezes na mídia.
“Meu primeiro dia de aula foi traumático, porque eu não gostei [...]
estava meu marido e um amigo brindando meu primeiro dia de trabalho
[...] e eu assim em choque [...] me empurraram pra dentro de uma sala
de aula, eu não tinha entrado de verdade numa sala, então eu entrei de
improviso e eu não gostei daquilo [...] meu primeiro dia de trabalho foi
frustrante” (Paula, E1:3-4).
Paula atrela essas emoções ao fato de que não tinha entrado antes numa sala de aula e
por isso estava despreparada para enfrentar uma turma. Isso foi feito de surpresa e esse fato
acarretou emoções tão fortes que a fizeram manter essas lembranças na memória. Camila
também nos fala sobre esse primeiro contato: “sofrido, não tinha material, onde buscar, o quê
buscar” (Camila, E1: 3). Já Clarice se demonstra decepcionada com relação à realidade da
escola em geral que, segundo ela, não acreditava ao ouvir as professoras falando tempos atrás e
julgava exagerado e pessimista. Paula demonstra também emoções de tristeza e frustração em
relação às imposições do governo, à política de aprovação automática dos alunos e em relação
aos seus colegas ao perceber que eles cedem a essa política.
A falta de recursos da escola onde lecionou pela primeira vez também despertou emoções
de desânimo que marcaram o início de carreira de Camila. Angelina também se queixa, afirmando
que “se você for levar muito a ferro e fogo você fica doente. Você tá dentro do sistema ou você
concorda com ele ou sai dele ou então você pira” (Angelina, E1:11). Essa fala sugere que a
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professora não concorda com a maneira na qual o sistema educacional se encontra, mas que não
tem outra opção a não ser se conformar com ele para então se proteger de emoções que acabam
por afetar a sua saúde. Ao falar sobre isso, foi possível perceber o aumento de sua voz ao dizer o
verbo “tem” sugerindo que ela acredita ter que aceitar o que o sistema impõe para não adoecer.
Além desses fatores, Angelina e Clarice sentem-se frustradas e desmotivadas porque não
conseguem ensinar a habilidade oral. Segundo Angelina, é “bem frustrante, bem desgastante, bem
desestimulante” (Angelina, E1: 6-7) tanto para o professor ensinar quanto para o aluno aprender
uma segunda língua com salas que comportam mais de 40 alunos. O que se percebe são emoções
fortes de desmotivação, desânimo, frustração em relação ao contexto em que atuam e ao ambiente
agressivo e desgastante no qual a escola se transformou, conforme relata Clarice no trecho que
segue:
Somente uma das professoras mostrou certos indícios de otimismo ao falar sobre a
profissão. Todas as demais ressaltaram os sofrimentos advindos dos mais variados fatores como
a falta de material, a obrigação de aceitar as imposições do sistema, o medo de que as escolas
piorem no futuro, com turmas de mais 40 alunos, o que gera frustrações tanto para as
professoras quanto para os alunos.
Em relação às emoções sobre os alunos, surpreendentemente, pela entrevista não foi
possível detectar muitas ocorrências sobre isso. Acreditamos que isso pode ter ocorrido devido a
duas razões. A primeira, ao tipo de instrumento utilizado. Poderíamos ter utilizado instrumentos
diferentes como outra entrevista, narrativas escritas e observação de aulas e do contexto escolar.
A segunda diz respeito à relação entre crenças e emoções. As professoras demonstraram ter
muitas crenças sobre os alunos e, como sabemos, as crenças possuem um fator emocional.
Dessa forma, mesmo não tendo revelado emoções explícitas sobre os alunos, ao identificarmos
suas crenças, foi possível perceber que suas crenças sobre os alunos geraram emoções de
frustação, desânimo e desmotivação. Fomos capazes de detectar algumas instâncias em que
ficou claro que as emoções que prevalecem são de desmotivação e tristeza. As emoções das
professoras em relação aos alunos são emoções que variam entre o bem estar na lida cotidiana e
tristeza, medo e nervosismo por acreditar na falta de domínio do conteúdo e na falta de respeito
por parte dos discentes. Assim, Kahena deixa claro como se sente antes de entrar em sala:
“[...] eles falam que eu sou muito calma, que eu tenho uma... um...
que sou calma. Mas mesmo assim, dentro da minha calma, eu fico
com as minhas mãos tremendo, tremendo tem dias que eu saio da sala
de aula /Humhum/ De tanto que o aluno faz mal criação, te responde
mal.” (Kahena, E1: 6).
Nesse excerto, percebe-se que a professora tenta controlar suas emoções em sala de
aula, pois sente que antes da aula, suas emoções transparecem em seu corpo. Como já discutido
anteriormente, ou seja, as emoções são visíveis na nossa expressão corporal.
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Angelina, por sua vez, sente tristeza por acreditar que os alunos não se interessam pelo
inglês. Nessa emoção de rejeição, as crenças que minam o desejo de ensinar vão ganhando
proporções maiores e essas mesmas emoções vão sendo compartilhadas em interações que
disseminam frustrações e a falta de otimismo entre os docentes. Clarice também afirma que o
comportamento dos alunos gera desmotivação:
Clarice deixa claro o que ela vê como desmotivação dos alunos, bem como a
indisciplina que contagia gerando também uma desmotivação. A única professora que expressou
uma emoção mais positiva em relação aos alunos foi Kahena. Ela afirma gostar muito dos
alunos, que aprecia a lida pessoal com eles e isso é o lado bom de sua profissão. Ela afirma que
“Eu tenho medo [...] Eu tenho medo, que eu acho que eu não tenho
base. Acho que eu não vou ter estrutura. [...] Será que eu dou conta de
entrar em uma pós-graduação da [nome da instituição] Né? Será que
eu tenho base para o mestrado na [nome da instituição]?” (Kahena,
E1: 10).
Percebe-se que talvez, mais dos que emoções sobre os alunos, as professoras parecem
mais preocupadas e demonstram emoções em relação a seu próprio desempenho na língua e
como isso influencia sua prática e sua interação com os alunos. Elas parecem sentir vergonha ou
medo de se expressar na língua com os alunos.
Em resumo, as emoções que prevalecem sobre os alunos são de tristeza, desânimo e
frustração. As crenças vistas anteriormente também sugerem o sentimento de medo em relação à
disciplina e desrespeito por parte dos alunos. Mas como as crenças se relacionam com as
emoções? Tratamos disso na próxima seção.
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Considerações finais
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