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Resumo
Abstract
To think of the Revolution of 1817, held in Recife, is to think about optics and the
majority and hegemonic logic from the understanding of the events of the time and reveals
a silencing of other narratives and perspectives dear to the understanding of social facts
and historical narratives. Thinking about the perspective of the black enslaved population
and the relationship maintained with the revolution reveals points that check the concepts
of equality and freedom preached by the revolution. Freedom and equality for whom? In
view of this, this article - an exploratory character set up as a bibliographical review - has
the purpose of analyzing the courses of history and social facts that allowed the
participation of the enslaved mass in a primordial function for the maintenance of the
republic of Pernambuco, to which these narratives were owed and which their unfolding.
1
Graduandos em Licenciatura em Ciências Sociais pela Universidade de Pernambuco.
APONTAMENTOS INTRODUTÓRIOS
É nesse sentido, que Freyre (1961) contribui trazendo a diversidade corporal das
pessoas negras escravizadas a partir das marcas ocasionadas tanto pelos açoites e as
condições desumanas que eram impostas, quanto pelos trabalhos forçados, que nos clareia
a visão em perceber os traços da escravidão e objetificação desumana praticada pelos
senhores brancos contra as pessoas negras escravizadas:
Nestes termos, é natural que pensemos a série de revoltas sociais ocasionadas pela
população negra na tentativa de cessar os demandes, os açoitamentos e reivindicar a
liberdade, além do reconhecimento como cidadãos na construção da sociedade e da
cultura brasileira. No alvorecer do século XIX, já nos anos de 1807, 1809 e 1814
(FERRETI, 1988), uma série de revoltas de pessoas negras escravizadas, pessoas negras
que experimentaram a escravidão e seus descendentes, iniciam-se na busca pela liberdade
e melhores condições de vida. Silenciados, mortos e açoitados em praça pública as
revoltas se abafaram até 1826, quando retomam as insurreições.
A apesar das revoltas, a situação da população negra escravizada em nada se
alterava, pelo contrário. A quantidade de navios e pessoas escravizadas tendia ao aumento
exponencial. Somente entre os anos de 1816 e 1820, chegaram ao Brasil mais de 188 mil
pessoas negras para serem escravizadas2.Já no ano de 1817, foram encomendados em
Pernambuco 6.3053 pessoas negras para serem submetidas a escravidão, dessas, 589
morreram durante transporte. As pessoas negras que aqui chegaram se incluíram na massa
da população já escravizada e assim, forçadamente, receberam um novo estilo de vida.
Contudo, um episódio rearranja a forma de pensar a relação dos brancos com as
pessoas negras escravizadas. Em 6 de março de 1817, eclode em Recife uma revolução
separatista que institucionalizaria a república durante 75 dias em Pernambuco. Movida e
influenciada por ideais iluministas, lideranças políticas e religiosas proclamaram a
independência, por seguinte a república, aboliram impostos, institucionalizaram a divisão
dos poderes e estabeleceram a liberdade de credo e de imprensa. As pessoas negras
escravizadas – embora o movimento esboçasse um padrão liberal – coube ainda a
manutenção do trabalho escravo para não influenciar no conceito de propriedade imposto
pelo pensamento liberalista.
O ineditismo da Revolução Pernambucana de 1817, e sua relação com as pessoas
negras escravizadas, reside na permissão a essas em portarem armas e defenderem com a
própria vida os princípios da revolução. Outro fator que nos chama atenção é que mesmo
armadas, as pessoas negras escravizadas não se revoltaram durante esse período contra
os desmandes dos senhores de escravos ou sequer confabularam uma revolta por dentro
da revolta.
Diante disso, este artigo tem por objetivo analisar os cursos da história e dos fatos
sociais que permitiram a participação da massa escravizada em função primordial para
manutenção da república pernambucana, a que se deveu essas narrativas e quais seus
desdobramentos. Este artigo é parte da conclusão do curso de Aspectos da História do
Brasil – A Revolução de 1817, ministrado pela Professora Doutora Andrea Bandeira da
graduação em Licenciatura em Ciências Sociais, da Faculdade de Enfermagem Nossa
Senhora das Graças, da Universidade de Pernambuco.
2
Fonte: IBGE – Brasil 500 anos: Território Brasileiro e Povoamento - Negros
3
Fonte: Slave Voyages
DE ESCRAVOS A HENRIQUES: HIERARQUIA, CONDIÇÕES DE VIDA E AS
RELAÇÕES SOCIAIS EM PERNAMBUCO NO 1817
Atrás apenas de Rio de Janeiro e Salvador, Recife foi a terceira capital com maior
contingente de pessoas negras escravizadas do Brasil, onde a população escravizada
representava mais que 51% da população total local (COSTA, 2013). Aqui, essas pessoas
assumiam posições diferentes dentro da hierarquia social imposta pela população branca.
Divididas em castas de acordo com os tipos de trabalhos realizados, as pessoas negras
escravizadas seguiam uma espécie de cartilha de comportamento e roupas a serem
utilizadas para diferenciação entre as funções exercidas nessa sociedade escravista.
As condições de vida e alocações dentro dos engenhos seguia à risca a hierarquia
social imposta. Em 1711, André João Antonil, escreve o livro “Cultura e Opulência do
Brasil’, uma obra caracterizada pelas orientações sociais para controle e manutenção da
sociedade colonial, bem como instruções sobre cuidados e trajes para as pessoas negras
escravizadas (ANTONIL, 1982). As roupas e o comportamento dessas pessoas revelavam
socialmente o prestígio dos senhores e senhoras de engenho, embora, retomemos, que os
trajes deveriam ser adequados ao tipo de serviço prestado.
Destarte, as pessoas negras escravizadas eram tratadas de maneira similar,
contudo respeitando uma hierarquia social. Aquelas que trabalhavam no campo,
geralmente, estavam descalças, apenas vestidas com uma camisa longa e andavam,
portanto, seminuas. Permaneciam maltrapilhas a maior parte do tempo pelo desgaste
causado pelo trabalho forçado e braçal; sendo as mais maltratadas em condições de vida
e por açoitamentos corriqueiros. Essa nudez não assustava a sociedade que estava
inteiramente imersa as regras de comportamento impostas socialmente.
As que trabalhavam na casa-grande, por modos e decência, vestiam calças ou
vestidos, usavam sapatos, cabelos curtos ou raspados, e poderiam fazer uso de joias que
carregavam consigo a incumbência de demonstrar a riqueza dos senhores.
Em seus corpos, marcados por uma enorme quantidade de cicatrizes e marcas de
açoites, as pessoas negras escravizadas carregavam a estrutura social e demonstravam a
todos as “práticas corretivas” aplicadas pelo bem entender dos senhores de engenho. Os
castigos praticados como dominação do corpo foi um mecanismo de poder, adequado aos
interesses das elites (SANTOS, 2013). Nesse sentido, Souza (2017) acrescenta que as
hierarquias sociais estabelecem o exercício do poder como questão central em toda
sociedade escravista. Esse exercício deveria ser legitimado e sistêmico, garantindo a
estrutura e o funcionamento da sociedade.
A estrutura social do período ainda anterior à 1817 se alterava à medida que as
pessoas negras passavam a nascer já libertas, portando um status social radicalmente
diferente de seus precedentes, essa mesma população era vista constantemente como uma
ameaça a manutenção do sistema.
A própria natureza da escravidão, tão fortemente arraigada no Recife de 1817,
incumbia a essas pessoas a estigmatização e a ocupação de funções sociais consideradas
subalternas e nada luxuosas. Era natural, dessa maneira, o emprego das pessoas negras
livres em funções de batalhas e na composição de milícias ou exércitos paramilitares na
defesa dos interesses impostos pela estrutura social da sociedade escravista, além de servir
como uma tentativa de repreensão a insurgências pelos seus semelhantes. Nesse sentido,
acrescentando a ideia de participação da massa escravizada, Carvalho (2006) acrescenta
que os proprietários considerados “patriotas” costumavam armar as pessoas negras
escravizadas em busca de proteção pessoal.
O processo de constituição de um novo grupo social e atribuição miliciana a seus
indivíduos, segundo Silva (2013), causa uma troca de exponentes: de desumanizado a
conversão em coisa, e logo em seguida uma ressocialização, re-humanização no novo
sentido de uma nova identidade a ser adotada pelo assujeitamento dos sujeitos a uma nova
função social mais prestigiosa que a condição de escravo.
Ainda para Silva (2013) há um processo chamado de psicogênese, onde
Ora pois, naõ (sic) havendo deliberaçaõ (sic) sobre este importante
objeto, na manhã do dia 7, pelas seis horas, correram talvez 400
pessoas de todas as cores, e idades, descalços e quasi (sic) nus pela
maior parte, armados de chuços, espingardas, e espadas, à testa dos
quaes (sic) se vê D. J. Martins, e mais cabeças da desordem (...)
(CORREIO BRAZILIENSE, 1817, p. 662)
Ainda para Carvalho (2006), a fuga – apesar de ser considerada uma escolha
radical - foi uma das principais forças de resistência após a Revolução de 1817 e com isso
a formação de novos quilombos ou a tentativa de se agregar a algum já existente. A
escolha não era simples, se esperava abandono de algumas características de vida dentro
dos engenhos, além de saúde. Além disso, o açoitamento para aqueles que fugiram para
um quilombo era ainda mais brutal.
Assim, deixando os assujeitamento aos açoites, se desligando da falsa promessa
de liberdade, igualdade e fraternidade pregada pela revolução, impulsionada pelos ideais
da Revolução Francesa e obrigados a esquecer da porventura condição de cidadão, as
pessoas negras escravizadas escreveram uma nova narrativa histórica. Dessa forma,
caíram na ilegalidade mas marcaram momentos na constituição de quilombo.
Para boas pessoas negras escravizadas fugidas, restou a formação do Quilombo
do Catucá4, um resultado e subproduto do caos político instituído pela Revolução de 1817.
Esse quilombo desenvolveu-se em um alto grau de complexidade, e foi findado em 1835.
(CARVALHO, 1991)
CONCLUSÕES
4
Sobre a localização do Quilombo, Carvalho (1991), descreve: “serpenteava a área mais populosa da
província, a zona da mata seca, ao norte do Recife. Cortada por muitas estradas e picadas, ela começava
nos limites de Beberibe, antigo subúrbio do Recife, passava pelo sítio dos Macacos e por São Lourenço,
mais a oeste da capital, lançando-se entre os engenhos costeiros e a serra a oeste do Recife em direção ao
norte. Passava pelos mangues e rios da região, chegando não muito longe da costa em Paratibe e daí a
Pasmado, perto da ilha de Itamaracá, até o povoado de Tejucupapo, próximo à vila de Goiana, já quase na
fronteira com a província da Paraíba. O centro do quilombo estava num pedaço dessa floresta, situada
entre as matas dos engenhos Timbó e Monjope, entre as freguesias de Paratibe, Paulista e Recife, um
local de terreno acidentado, cortado por riachos e brejos, conhecido como Cova da Onça.”
certa forma, tivessem optado por enxergarem a expressividade da igualdade humana e a
nefasta posição escravagista, poderiam ter, assim impulsionado e fortalecido os
movimentos pelo fim da escravidão na nova república e o fortalecimento imensurável
desta.
Embora seja um período bastante floreado, detém em si uma série de contradições
incondizentes com o pensamento ao que o baliza. De fato, durante a revolução e ao fim
dela, a escravidão foi mantida, mas o espírito luta deixado pelo sonho de se tornar uma
república independente, ficou vivo após seu fim da república, e impulsionou
enormemente a população negra nos anos seguintes a continuarem a luta pela liberdade
de seu povo e sua história, e principalmente, aqueles que fugiram, regozijando o fim dos
açoites.
REFERÊNCIAS