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MARINHA DO BRASIL

DIRETORIA DE PORTOS E COSTAS


ENSINO PROFISSIONAL MARÍTIMO

DIREITO COMERCIAL MARÍTIMO


(DIR-1)

1ª edição

Belém-PA

2011
1
© 2010 direitos reservados à Diretoria de Portos e Costas

Autor: José Mario da Costa Silva

Revisão pedagógica: Vanessa de Medeiros Gomes Adriano


Revisão gramatical: Esmaelino Neves de Farias

Maria Anice de Azevedo Banhos

Coordenação Geral: Glaydson Antônio Corrêa do Nascimento


Capitão de Corveta (T)

____________ exemplares

Diretoria de Portos e Costas

Rua Teófilo Otoni, no 4 – Centro

Rio de Janeiro, RJ

20090-070

http://www.dpc.mar.mil.br

secom@dpc.mar.mil.br

o
Depósito legal na Biblioteca Nacional conforme Decreto n 1825, de 20 de dezembro de 1907

IMPRESSO NO BRASIL / PRINTED IN BRAZIL

2
SUMÁRIO

Introdução ............................................................................................................................ 4

1 GENERALIDADES DO NAVIO ...................................................................................... 6

1.1 Conceito de navio......................................................................................................... 6

1.2 Natureza jurídica do navio ........................................................................................... 7

1.3 Armador, proprietário e construtor ............................................................................... 7

1.4 Peso e volume do navio quanto ao aspecto legal ......................................................... 8

1.5 Das dimensões do navio .............................................................................................. 8

1.6 Da construção de navios em harmonia com as Convenções SOLAS e MARPOL ........ 9

2 OS CONTRATOS NO DIREITO MARÍTIMO..................................................................... 10

2.1 Introdução histórica ................................................................................................... 10

2.2 Agentes auxiliares da navegação ............................................................................... 11

2.3 Conceitos ................................................................................................................... 13

2.4 Dos tipos de contrato de afretamento ......................................................................... 16

2.5 Da responsabilidade civil do transportador marítimo à luz do Novo Código Civil ........ 25

2.6 Conhecimento de embarque marítimo (Bill of Loading – B/L) ..................................... 41

2.7 Da gestão náutica e gestão comercial do navio.......................................................... 53

2.8 Dos contratos padrões ............................................................................................... 57

2.9 Do fixture .................................................................................................................... 58

3 DA NEGOCIAÇÃO DO FECHAMENTO DE NAVIOS E CARGAS ................................... 60

3.1 Da formação dos contratos de afretamento marítimo ................................................. 60

3.2 Da função do broker junto ao armador ....................................................................... 61

3.3 Dos requisitos básicos para o fechamento de uma negociação ................................. 61

3.4 Da expedição do recap............................................................................................... 62

3.5 Navio fechado ........................................................................................................... 63

3.6 Da conduta do broker defronte a prática de misrepresentation................................... 64

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 66

Referências ........................................................................................................................ 68
3
Introdução

O transporte marítimo sempre se fez presente na história da humanidade.


Desde o século XIV, sua utilização sempre teve um objetivo ímpar, qual seja, o de
permitir a troca de bens através de fronteiras ultramarinas, preterindo os grandes
óbices das barreiras geográficas para comércio internacional, devido à
modernização e melhoria das embarcações bem como a introdução do transporte de
contêiner que protege sobremaneira as mercadorias e permitem maior agilidade nas
operações de cargas e descargas nos portos.
No entanto, as mercadorias ofertadas aos importadores sujeitam-se a uma
transação comercial realizada no seu porto de origem para um determinado destino
(leia-se, exterior), o que invariavelmente tem um caráter internacional; portanto, esta
transação encontra-se afeta à aplicação de regulamentos dos países de destino.
Neste diapasão, surge a necessidade de criarem-se normas internacionais
padronizadas a fim de permitir uniformidade na regulamentação legal do transporte
internacional de mercadorias. A partir deste momento, entram em cena as diversas
convenções internacionais atinentes aos contratos de transporte marítimo.
Apesar de o Brasil encontrar-se debruçado sobre a teoria dualista, pela qual
reconhece distintamente o direito interno e o internacional, firmou as convenções
internacionais afetas aos contratos de transporte marítimo, mas não as ratificou.
Este singelo trabalho tem o fito de abordar alguns instrumentos internacionais
que regem o transporte internacional de mercadorias pela via marítima, bem como
normas do ordenamento jurídico brasileiro que regem a matéria.
O operador do Direito Marítimo no Brasil depara-se com diversos diplomas
legais do nosso arcabouço normativo, que tratam dos mais variados temas afetos ao
transporte marítimo: afretamentos, segurança da navegação, registro de
propriedade, Adicional de Frete para Renovação da Marinha Mercante, dentre outros
textos legais.
A não ratificação do Brasil às Convenções (Haia, Haia-Visby, Hamburgo,
Bruxelas,COGSA) que regem as responsabilidades do transporte marítimo
internacional, deixou o armador suscetível de amargar pela insegurança jurídica,

4
uma vez que, no que pertine especificamente a este tema, o ordenamento jurídico
brasileiro é omisso.
Mesmo com o advento do Novo Código Civil/2002, em vigor a partir de 2003,
este se manteve silente quanto à responsabilidade do transportador marítimo.
Socorre-se o causídico acerca da responsabilidade do transportador no Decreto
Legislativo n.º 2.681, de 07.dez.1912, mais conhecido como Decreto das Estradas
de Ferro, pois esta é a uma legislação que aborda especificamente a
responsabilidade do transportador e suas excludentes.
Urge que o Congresso Nacional acalente, com muita atenção, a elaboração
de um “Código da Navegação Brasileiro”, pelo qual deverá conter em seu bojo todos
os assuntos de relevante interesse à comunidade marítima. O Brasil ocupa
atualmente uma posição de destaque confronte o mercado internacional pelo notório
fato de ser um relevante produtor e exportador de diversas commodities, as quais
utilizam-se do transporte marítimo para alcançar seu destino.
Neste sentido, considerando que o transporte internacional por via marítima é
amplamente utilizado por exportadores brasileiros e importadores, o conflito de leis
enfrentadas entre as convenções internacionais aplicadas a esta matéria e as
disposições nacionais é uma questão recorrente e que não pode permanecer sem
um rumo definitivo.
Já nos contratos de afretamento, são prescindíveis legislações internacionais
uniformes para reger tal matéria. Raciocina-se que a natureza jurídica deste tratado
é locatícia, e, em se tratando de uma locação, um contrato (bilateral e oneroso) é o
suficiente para tornar a negociação revestida da mais plena e absoluta legalidade.
Todavia, estes contratos de afretamento internacional são padrões.
Destarte, a fim de fornecer uma descrição abrangente, algumas
características básicas e introdutórias do sistema legal brasileiro serão
apresentadas, seguidas de algumas definições relacionadas à logística de
transporte, que é uma área muito específica e de extrema importância para o
desenvolvimento das nações, como também são fontes de informações que
permitem discussões saudáveis e calorosas travadas em torno das convenções
internacionais e da legislação brasileira.

5
1 GENERALIDADES DO NAVIO

1.1 Conceito de navio

O navio é, juridicamente, uma coisa. Entretanto, respeitados estudiosos do


assunto, comparou-o a uma pessoa, mostrando que, ainda em concepção, no
estaleiro, já possui existência real, além de ser reconhecido por um nome, gozar de
uma nacionalidade e fixar-se com um domicílio.
Navio deriva do latim navigium, e, originariamente, designava toda construção
apta a percorrer quaisquer águas.
Na sua concepção mais ampla, navio deve ser toda construção destinada a
percorrer mares, lagos ou rios, transportando, para qualquer fim, pessoas ou coisas.
Nessas condições, para a conceituação de navio, pouco importa a sua forma de
construção, isto é, qualquer que seja o tamanho ou meio de propulsão.
Em harmonia com o saudoso jurista Waldemar Ferreira, nos ensina que
“navio é todo e qualquer aparelho destinado ao transporte de pessoas ou coisas por
água. Mas pode ter outros objetivos, como a pesca, o desporto, ou o serviço de
reboque. Pouco importa o material que se construa. Madeira. Ferro. Cimento
armado. Tão pouco o sistema por que se propulsione. Tanto faz que se mova por
força do vento, como do vapor. Ou pela eletricidade. (...)”1
No conceito do art. 11 da Lei n.º 2.180, de 05. fev.1.954 (Lei do Tribunal
Marítimo), navio ou embarcação mercante é “toda construção utilizada como meio
de transporte por água e destinada à indústria da navegação, quaisquer que sejam
as suas características e lugar de tráfego.”
No conceito da LESTA, art. 2.º, inc. V, embarcação é “qualquer construção,
inclusive as plataformas flutuantes e, quando rebocadas, as fixas, sujeita á inscrição
na autoridade marítima e suscetível de se locomover na água, por meios próprios ou
não, transportando pessoas ou cargas”.

1
Waldemar Martins Ferreira. Instituições de direito comercial. 4.ª ed. revista e aumentada, IV volume, São Paulo, Max
Limonard, 1955, p. 79.

6
1.2 Natureza jurídica do navio

Nos termos da noção dada pelo direito civil para os bens móveis e atendendo
ao conceito de navio, deve o navio figurar entre os bens móveis de natureza sui
generis, e a configuração com res conexa, um todo indivisível. Portanto, a natureza
jurídica do navio é de bem imóvel.
Embora seja um bem móvel, sujeita-se o navio, em alguns casos, ao regime
dos imóveis. Assim, a prova da sua propriedade só se faz mediante documento
escrito, devidamente transcrito no registro marítimo, não se podendo transferi-la a
outrem pela simples tradição manual. Além disso, é o navio suscetível de ser
hipotecado. A hipoteca é um instituto específico dos bens imóveis, o que contraria
sobremodo o regime dos bens móveis. Contudo, a semelhança dos navios aos
imóveis é sempre expressamente indicada em Lei.
Na hipoteca naval, por lei, a transmissão de propriedade se opera mediante
transcrição do respectivo bem por escritura pública. A hipoteca é indivisível e grava
o navio em todas as suas partes, considerando os acessórios parte integrante do
navio.
Não bastam as aparências externas para que o navio seja conceituado como
tal, ou seja, para que permaneça com sua natureza jurídica incólume. O navio
desarvorado, ou mesmo que lhe seja designada uma outra função, como, por
exemplo, uma escola para aquaviários, porém, imobilizado no porto, perde sua
essência: deixa de ser navio. Ou navega, ou deixa de ser navio. É prudente
perceber-se que, obrigatoriamente, o navio deve deter a qualidade da
navegabilidade, na qual reside sua razão de ser.

1.3 Armador, proprietário e construtor

Armador é a pessoa física ou jurídica que, em seu nome e sob sua


responsabilidade, apresta a embarcação com fins comerciais pondo-a ou não, a
navegar por sua conta.

7
Proprietário é a pessoa física ou jurídica em nome de quem a propriedade da
embarcação é inscrita na autoridade marítima e, quando legalmente exigido, no
Tribunal Marítimo. Quem designará a propriedade do navio é o registro de
Propriedade Marítima cujo ato de inscrição da embarcação será efetivado na
Capitania dos Portos (AM).
Construtor é toda pessoa jurídica que tem a responsabilidade de construir
navios em estaleiros sob a responsabilidade técnica de profissionais qualificados
como o engenheiro naval.

1.4 Peso e volume do navio quanto ao aspecto legal

Gross Tonnage é a capacidade volumétrica total do navio (também chamada


de Arqueação Bruta) e Net Tonnage é a capacidade volumétrica de carga do navio
(também chamada de Arqueação Líquida), que é o valor sobre o qual todos os
valores de seguro, impostos e frete são calculados.

1.5 Das dimensões do navio

- o comprimento do barco;
- o comprimento da linha d'água;
- o comprimento entre perpendiculares;
- a boca;
- o calado;
- o pontal; e
- a borda livre.

Comprimento do barco é a distância compreendida entre as extremidades


longitudinais da embarcação (medida de proa a popa).
Comprimento da linha d`água é uma faixa pintada com tinta especial no casco
dos navios, de proa a popa; sua aresta superior corresponde à linha de flutuação
máxima. São as intersecções do casco por planos horizontais. Elas aparecem em
verdadeira grandeza no plano de linhas d'água e são usualmente denominadas de
acordo com a sua altura acima do plano da base.
8
Comprimento entre perpendiculares é a distância medida entre as
perpendiculares a vante e a ré. Nesta medida, levamos em consideração a linha
d'água de projeto (ver definição das perpendiculares de vante e de ré). Quando nos
referirmos ao comprimento do navio e não for especificado como este foi medido,
devemos entender este como o comprimento entre perpendiculares.
Boca é a largura da seção transversal a que se referir; a palavra boca, sem a
referência à seção em que foi tomada, significa a maior largura do casco e, por isso
mesmo, é a medida da seção mestra.
Calado é a distância vertical entre a superfície da água e a parte mais baixa
do navio naquele ponto.
Pontal é distância vertical medida sobre o plano diametral e a meia-nau, entre
a linha do vau do convés principal e a linha da base moldada.
Borda livre é a distância vertical da superfície da água ao pavimento principal,
medida em qualquer ponto do navio no costado.

1.6 Da construção de navios em harmonia com as Convenções SOLAS e


MARPOL

Pautada na segurança da navegação, a Convenção SOLAS 74 tem por


finalidade exercer com rigor os ditames para padronização da construção de navios
no que tange à estabilidade , ao maquinário, à instalação elétrica, aos requisitos
para a proteção contra incêndios, salvamento; radiocomunicação, segurança na
navegação e transporte de materiais perigosos; controle da temperatura em
compartimentos de carga, considerações estruturais, dispositivos de fixação da
carga, suprimentos elétricos; equipamento de proteção radiológica e planos de
gestão, treinamento e de emergência a bordo de navios.

Já a Convenção MARPOL veio interferir na construção de navios após vários


acidentes ocorridos com petroleiros. Em consequência de tais acidentes da
navegação que abalaram frontalmente o ecossistema marinho, a MARPOL exigiu
que os navios desta categoria passassem a ter duplo fundo. A referida Convenção
sempre protegeu o meio ambiente marinho contra a poluição dos navios e exige que
9
um relatório seja emitido para o país costeiro mais próximo de qualquer incidente
que envolva a perda ou possível perda de quaisquer materiais perigosos ou
poluentes. Quaisquer ameaças graves com a segurança de um navio também terão
que ser reportadas de acordo com estes regulamentos.

2 OS CONTRATOS NO DIREITO MARÍTIMO

2.1 Introdução histórica

A utilização de contrato de afretamento remonta ao direito bizantino,


considerado o ponto de partida do direito marítimo medieval, onde "quando um
homem afreta um navio, o contrato deve ser escrito e assinado pelas partes, o que,
de outra forma será nulo".
Dessa forma a "carta partita" ou "charta partita" ou "charter party", era um
documento escrito em duplicata, porém, em apenas um pedaço de papel e,
posteriormente, cortado (ou rasgado) no meio, ficando cada parte contratante com
um pedaço do acordo. Escrito na língua inglesa, tem-se notícia de contrato de
afretamento por viagem (Voyage charter party) datado de 03 de julho de 1531, do
navio Charities.
Em tempos remotos, as companhias de navegação envolviam-se em todas as
operações relacionadas com o navio, incluindo-se a parte comercial. O armador-
proprietário – pessoa física ou jurídica – cuidava da armação, gerenciamento de
tripulação, operação técnica etc. Em alguns casos, era o próprio armador-
proprietário o comandante do navio.
Com passar dos tempos, as companhias de navegação foram gradualmente
modificando essa estrutura no sentido de tornarem-se mais ágeis.
O armador, enquanto considerado empresário, passou a ter funções
específicas e, em muitos casos, gerenciadas por terceiros: gerenciamento
financeiro; gerenciamento técnico (sobressalente, combustível, avarias etc.);
gerenciamento operacional (rotinas diárias do navio, pessoal etc.), e gerenciamento
comercial (emprego do navio etc.).
Convém, aqui, fazer-se uma breve diferenciação entre (armador) proprietário
e armador, figuras estas que se confundem, porém distintas no que diz respeito à

10
responsabilidade civil. Enquanto o proprietário é aquele a quem o navio pertence,
por estar registrado em seu nome nos órgãos competentes, o armador (que
eventualmente pode ser o mesmo proprietário) é aquele que arma o navio, ou seja,
apresta o navio colocando para que o mesmo esteja em condições de
navegabilidade.

2.2 Agentes auxiliares da navegação


Prático;
Agente marítimo;
Consignatário;
Cargo broker (broker ou corretor de cargas); e
Corretores de navio.

Prático é a figura mais relevante como auxiliar da navegação. A Autoridade


Marítima, através da NORMAM 12 (Serviços de Praticagem), cujo propósito é
estabelecer normas para atuação da praticagem nas Águas Jurisdicionais
Brasileiras, determina, em todo o território nacional, as Zonas de Praticagem (ZP)
pelo óbvio motivo de ser a responsável pela segurança do tráfego aquaviário,
porque tais ZPs exigem extremada cautela para a perfeita singradura das
embarcações, uma vez que ocorrem em trechos de rios, baías, lagos, possuidores
peculiaridades geográficas percebidas exclusivamente pelos práticos da respectiva
região.
De acordo com a NORMAM 12, o prático é o profissional aquaviário não
tripulante que presta Serviços de Praticagem embarcado2.
Enquadra-se o prático como aquaviário porque todos os profissionais que são
habilitados pela Diretoria de Portos e Costas (DPC), assim são qualificados em
harmonia com a NORMAM 13 (Aquaviários), da qual reservou à figura do prático o
5.º grupo.

2
Conceito de Prático segundo o item 0119, do capítulo 1, da NORMAM 12.

11
Agente marítimo caracteriza-se por dois aspectos fundamentais: 1. atuam na
figura contratual de mandato; e 2. nada mais é que o representante do proprietário
do navio, do armador, gestor ou afretador/transportador. O agente marítimo pode ser
pessoa física ou jurídica que representa o proprietário na armação e no transporte
marítimo.
Efetivamente o agente marítimo poderá realizar todos os trabalhos
necessários ao atendimento do armador, ou ser apenas agente comercial ou agente
operacional. Inclusive, encarrega-se de despachar o navio em portos de operação
comercial, e assistir o comandante na prática de atos jurídicos necessários a
conservação do navio e providenciar a continuidade da viagem.
A figura jurídica do agente marítimo tornou-se tão relevante no Direito
Comercial Marítimo que goza de absoluta legitimidade para receber, em nome da
empresa de navegação que representa, a citação oriunda de uma pendenga judicial.
O ensinamento do advogado e professor Paulo Henrique Cremoneze disserta o
seguinte:

“A citação (entenda-se também: intimação e notificação), quando


levada efeito perante o Agente Marítimo do transportador no Brasil, é
perfeitamente válida, configurado ato jurídico-processual perfeito, que não
comporta qualquer reparo.
Como dissemos, o Agente Marítimo tem poderes para receber
citações em nome do transportador. O mandato que este confere a aquele,
através do chamado Contrato de Agenciamento, inclui, a rigor o poder-dever
de receber citações e intimações judiciais. E mesmo quando não o inclui, o
interesse público revela-se predominante, tendo primazia.
(...) Tão rigoroso é o tratamento que o ordenamento jurídico brasileira
dá à questão que nem mesmo a presença, no mandadto conferido ao
Agente Marítimo, de cláusula expressa vedando o recebimento de citações,
é capaz de impedir o ato determinado pelo Estado-juiz, em consonância
com a lei e a lógica jurídica, pois nunca é demais lembrar os fundamentos
3
da validade de toda e qualquer norma contratual.”

3
CREMONEZE, Paulo Henrique, Prática de Direito Marítimo – O Contrato do Transporte Marítimo e a Responsabilidade
Civil do Transportador – São Paulo: Quartier Latin, 2009.

12
Consignatário é a figura que se diferencia basicamente do agente marítimo
pela temporariedade; porém, detém as mesmas características: atua por mandato
na representação de uma empresa, e também é o representante do armador cujos
interesse deve zelar. Com efeito, são mandatários temporários do armador e são
nomeados por empresas que atuam na navegação liner, navegação rápida.
Cargo broker (broker ou corretor de cargas), por força do costume no jargão
comercial marítimo, é amplamente conhecido por broker ou, raramente, corretor de
praça, é um prestador de serviço que atua na função de angariar carga para os
navios (ou área de reserva de praça de navios). O cargo broker também viabiliza a
logística de transporte necessária à transferência da mercadoria desde o pátio da
indústria do exportador até o porto de embarque ou, se for o caso, até o destino
final. Não obstante toda essa vasta atuação do cargo broker, ressalte-se que o
mesmo não realiza despachos aduaneiros.
Corretor de navio é aquele que tem o principal mister de firmar contratos de
operações de corretagem relativas ao engajamento de cargas, ao afretamento e à
compra e venda de navios. Realiza também tradução sobre os contratos de compra
e venda de navios e de afretamentos, além de acompanhar toda a movimentação
dos navios desde a chegada até a partida do porto, perante os órgãos da
Administração como Capitania dos Portos, Imigração, Receita Federal, ANVISA etc.;
acompanha as operações de carga e descarga; promove pagamento dos impostos
sobre as operações realizadas e providencia o seguro (sobre casco, carga, entre
outros) do navio.

2.3 Conceitos

Armador (owner) é o proprietário do navio, ou melhor, é o responsável pelo


navio uma vez que mantém a responsabilidade de armar o navio (prover com
tripulação, óleo combustível – leia-se, lubrificante também – e víveres). Tanto pode
ser uma pessoa física como uma empresa (pessoa jurídica). É uma das partes do
contrato, isto é, a parte que cede o navio mediante o pagamento de frete (hire) ou o
pagamento de uma locação por período previamente determinado (Time Charter).
Deve-se atentar que todo proprietário do navio pode ser o armador. Todavia, na
forma inversa, não tem a mesma legitimidade jurídica. Nem todo armador pode ser o
13
proprietário da embarcação. Quando uma pessoa jurídica ou física afreta uma
embarcação, esta passa a ser o Armador, ou seja, assume a plena e irrestrita
responsabilidade da embarcação, porém, não é o proprietário.
Armador-proprietário (owner) é o proprietário de embarcação que,
aprestando-a, a explora no transporte, ou a cede, por afretamento a emprego de
terceiro.
Armador-locatário (shipowner) é aquele que, através da formalização de
contrato de locação (afretamento) com o proprietário, apresta a embarcação para
explorá-la no transporte ou, então, para cedê-la a outrem (subafretamento).
Registro de Armador é ato obrigatório o registro no Tribunal Marítimo de
armador cuja embarcação mercante esteja sujeita a registro de propriedade4,
mesmo quando a atividade for exercida diretamente pelo próprio proprietário. No
Brasil o tema é regido pela Lei nº 7.625/885.
Inscrição de Armador é o ato que obriga o armador a manter seu cadastro em
órgão competente da Autoridade Marítima, mais precisamente na Capitania dos
Portos - NORMAM nº 02.
Armador x Transportador. O comércio marítimo é exercido de formas
variadas, não se esgotando em fórmula única. Daí porque nem sempre a figura do
armador coincide com a do transportador. Identificar aquele que se obriga pelo
transporte, ou seja, o transportador é, na prática, tarefa árdua, por vezes, dada a
possibilidade da existência de vários contratos de sublocação transferindo às partes
o exercício da gestão comercial da embarcação. O armador, ao contrário, é
facilmente identificado, pois ainda que tenha cedido o exercício da gestão comercial
da embarcação a terceiro, sempre restará determinado naquele que deter e
responder pela gestão náutica.
NVOCC (Non Vessel Operating Common Carrier). Não há uma tradução
específica para a língua portuguesa acerca de tal expressão, porém, em livre
tradução é algo como Operador de Transporte Não-Armador que, em conformidade
com a Resolução nº 9.068, de 01/04/86, da extinta Sunamam - Superintendência

4
O registro de proprietário é exigido à embarcações que possuem arqueação bruta (AB) superior a 100 toneladas (NORMAM
-02).
5
Dispõe sobre registro de propriedade marítima.

14
Nacional da Marinha Mercante, o operador que assume todas as responsabilidades
da movimentação da carga de ponto a ponto, emitindo documentação apropriada e
utilizando navios de terceiros, na qualidade de usuário.
Operador de navio (Ship’s operator). É, em geral, a empresa de navegação
que além da atividade principal que possa desenvolver como armador/transportador,
intermedia negócios empregando navios afretados de terceiros, obtendo, assim,
receita que resulta da diferença entre o valor da locação que faz e da sublocação
que realiza.
Abalroamento (Collision). Primeiramente, é prudente ovacionar que o termo
traduzido para a língua inglesa, collision, dá nítida conotação de sua tradução com
rigor literal, qual seja, “colisão”, cujo termo só se deve empregar tecnicamente em
Direito Marítimo quando há uma colisão entre uma embarcação e um outro objeto
qualquer que não seja outra embarcação. No idioma inglês se usa indistintamente –
collision. No entanto, o termo abalroamento significa o choque entre duas ou mais
embarcações.
Fortuna do Mar – Caso Fortuito (Act of God). São eventos originários por
causas naturais, direta e exclusivamente, sem a intervenção humana, e que não
poderiam ser evitadas por qualquer tipo de previsão e cuidados razoáveis. É o fato
natural imprevisível e por isso inevitável. É o fruto do acaso e provém das forças
naturais, ou de uma causa cujos efeitos não era possível prever-se ou evitar.
Alijamento de carga (jettison). A prática do alijamento de carga ou parte desta
para salvar o navio, sua tripulação, e parte da carga, perde-se nas brumas do
tempo. Todos os códigos, antigos e modernos, conceituam o alijamento, como a
modalidade mais perfeita de avaria grossa. Alijar carga é o mesmo que arremessar
ao mar a quantidade de carga considerada necessária para devolver ao navio as
condições mínimas de navegabilidade (seaworthiness); é um ato voluntário,
consciente e cercado de embasamento técnico. Nos abalroamentos e colisões, nos
encalhes e durante as tormentas, pode-se tornar necessário muitas vezes, aliviar o
navio para que possa continuar flutuando com segurança. Sempre que possível,
recorre-se ao “alívio” (lighterage) em vez do alijamento pura e simples, tendo em
vista a obrigação moral e profissional do Comandante de minimizar os efeitos
negativos e prejudiciais àquela empreitada marítima.

15
Varação (Putting by , beaching). É a decisão tomada pelo Comandante em
encalhar seu navio voluntariamente, no firme propósito de salvaguardar as vidas
humanas, a carga, o navio e, dependendo das circunstâncias, o meio ambiente
também.
Encalhe (grounding, stranding). Fato decorrente da imprudência, da imperícia
ou da negligência da navegação cujo agente não teve a intenção de cometê-lo.
Arribada (route desviation). Trata-se da entrada do navio em um porto, não
conste na rota do navio, em caráter de emergência. Essa entrada emergencial se dá
por vários motivos, entre os quais o de abrigar-se de mau tempo ou, em guerra, para
fugir do inimigo; extrema necessidade em vista de alterações nas condições seguras
da navegabilidade (seaworthiness), como por exemplo, avaria no sistema de
propulsão, “água aberta” etc, ou ainda, doença ou acidente grave de tripulante,
escassez de víveres, água potável ou combustível; em suma, um desvio de rota
plenamente justificado. Poderá também ser fruto de um erro do Comandante ou de
algum membro da tripulação. O Tribunal Marítimo conceitua a arribada como um
acidente de navegação, e o desvio da rota como um fato da navegação. O Código
Comercial, em seu artigo 740, diz ser a arribada a entrada de um navio em um porto
ou lugar distinto daquele a que se destinava.

2.4 Dos tipos de contrato de afretamento

De forma bastante didática, pode-se afirmar que a expressão afretamento


nada mais é do que o contrato de aluguel para utilização do navio ou dos serviços
do navio. Todavia, na Inglaterra, o contrato de afretamento tem uma conotação
ambivalente: utilização do navio de seus serviços, como para o mero transporte de
mercadorias.
O Brasil regula os contratos de afretamento através da Lei nº 9.432/97, que
discorre acerca da ordenação do transporte aquaviário.
São três as espécies do gênero contrato de afretamento: contrato de
afretamento a casco nu; contrato de afretamento por tempo e contrato de
afretamento por viagem.

16
Primeiramente, atentemos aos conceitos empregados aos contratos de
afretamento pela norma em epígrafe:

“Para os efeitos desta Lei, são estabelecidas as seguintes definições:


I – afretamento a casco nu: contrato em virtude do qual o afretador
tem a posse o uso e o controle da embarcação, por tempo determinado,
incluindo o direito de designar o comandante e a tripulação;
II – afretamento por tempo: contrato em virtude do qual o afretador
recebe a embarcação armada e tripulada, ou parte dela, para operá-la por
tempo determinado;
III – afretamento por viagem: contrato em virtude do qual o fretador se
obriga a colocar o todo ou parte de uma embarcação, com tripulação, à
disposição do afretador para efetuar transporte em uma ou mais viagens;”

O certo é que o legislador brasileiro utilizou-se dos conceitos já existentes há


anos na seara do Direito Comercial Marítimo internacional. Doravante observaremos
o conceito de forma mais abrangente de cada uma das espécies dos contratos de
afretamento.
A Agência Nacional de Transportes Aquaviários, ANTAQ, também
manifestou-se em classificar os tipos de contratos de afretamento através da
Resolução n.º 1.557-ANTAQ, de 11 de dezembro de 2009:

“Art. 2.º Para efeitos desta nora, consideram-se:


III – afretamento a casco nu: contrato em virtude do qual o afretador tem a
posse, uso e as gestões náutica e comercial da embarcação, por tempo
determinado, incluindo o direito de designar o comandante e tripulação;
IV – afretamento por tempo ou período: contrato em virtude do qual o
afretador recebe a embarcação, ou parte dela, armada e tripulada, para
operá-la por tempo determinado, cabendo ao fretador a gestão náutica da
embarcação e ao afretador a sua gestão comercial;
V – afretamento por viagem: contrato em virtude do qual o afretador se
obriga a colocar o todo ou parte de uma embarcação, com tripulação, à
disposição do afretador para efetuar transporte em uma das viagens,
ficando o fretador com as gestões náutica e comercial da embarcação;”

17
2.4.1 Contrato de afretamento a casco nu (bareboat ou demise charter party)

O contrato de afretamento a casco nu detém essa atípica nomenclatura pelo


singelo motivo de representar rigorosamente a forma pela qual o fretador entregará
o navio ao afretador, qual seja, totalmente desarmado (daí a origem do termo “casco
nu”), cabendo a este obrigação de suprir a embarcação com tripulação, víveres,
combustível e demais itens necessários à navegabilidade e segurança do navio.
Neste caso, o afretador passa a denominar-se de armador-disponente, o que
significa assumir integral posse, controle e responsabilidade do navio como se
proprietário fosse. A partir da entrega do navio ao afretador, o fretador (que após a
assinatura do contrato desincumbe-se do status quo de armador) gozará ampla
isenção no que concerte à responsabilidade civil e/ou criminal perante terceiros que
se sintam lesados por qualquer que seja o acidente ou fato da navegação provocado
por seu navio. Esse contrato será celebrado por tempo determinado, cabendo ao
afretador uma retribuição denominada hire (cujo termo em português – frete – nunca
é usado no jargão do direito marítimo) pagável em intervalos determinados durante o
período do contrato. É um contrato de utilização do navio.
O fato de o navio ser entregue em afretamento completamente desarmado
não pressupõe que o armador-disponente não possa receber do fretador indicação
de alguns tripulantes para o navio por força de larga experiência com a embarcação,
mormente no que tange à função do comando e da chefia da praça de máquinas,
contudo, remunerados pelo afretador.
Tem-se, pois, as seguintes partes na relação contratual: de um lado,
proprietário do navio - pessoa física ou jurídica, em nome de quem a propriedade da
embarcação é inscrita na autoridade marítima e, quando legalmente exigido, no
Tribunal Marítimo (no caso do Brasil há necessidade de inscrição no Tribunal
Marítimo); do outro, o afretador a casco nu, pessoa física ou jurídica que muito
embora não seja o proprietário do navio, arma e detém o total controle do navio
(gestões náutica, de pessoal e comercial) assumindo a posição de armador
disponente (ou armador pro hac vice – armador beneficiário). Dessa forma, deverá
tomar todas as providências como se fora o proprietário (contratar seguros de casco,
máquina, P&I Club etc.), além de poder direcionar o navio para qualquer parte,

18
observadas as normas internacionais de segurança e salvaguarda da vida humana
no mar.
Tem importância o contrato de afretamento a casco nu em eventual relação
com terceiros e suas conseqüências. Vejamos alguns exemplos dentre vários:
(1) nos casos de danos causados ao navio: a responsabilidade do afretador a
casco nu será aquela do direito civil, que regem os contratos, e decorrentes dos
estritos termos do contrato em questão;
(2) quanto aos fretes gerados pelo navio durante o período do contrato: o
proprietário do navio, por não ter a posse do mesmo, não terá direito aos fretes.
Estes são do afretador a casco nu;
(3) pelos atos do comandante e tripulação: o proprietário do navio não é
responsável perante os embarcadores e/ou consignatários, posto que são eles
prepostos do afretador a casco nu;
(4) os conhecimentos de embarque (bill of lading) assinados pelo comandante
vinculam o afretador a casco nu e não o proprietário; e o afretador a casco nu é,
para todos os efeitos, o transportador das mercadorias;
(5) Nos casos de colisão ou abalroação pelo navio: responderá o afretador a
casco nu perante terceiros (e, da mesma forma, perante o proprietário).

2.4.2 Contrato de afretamento por tempo (time charter party)

Contrato de afretamento por tempo (time charter-party) caracteriza-se pela


utilização (arrendamento) do navio, por um tempo determinado, no qual o
proprietário ou armador disponente coloca o navio completamente armado, equipado
e em condição de navegabilidade, à disposição do afretador por tempo, o qual
assume a posse e o controle do mesmo mediante uma retribuição – hire – pagável
em intervalos determinados durante o período do contrato. É um contrato de
utilização dos serviços do navio.
Diferencia-se do contrato de afretamento a casco nu nos seguintes pontos:

19
(1) no contrato de afretamento a casco nu, o Comandante e os tripulantes são
empregados do afretador a casco nu, enquanto que no contrato de afretamento por
tempo, estes são empregados do proprietário ou do armador-disponente;
(2) no contrato de afretamento a casco nu, as despesas de óleo combustível,
diesel, lubrificantes, água, víveres (rancho), soldadas (salários dos tripulantes) são
de responsabilidade do afretador a casco nu. Já no contrato de afretamento por
tempo, apenas as despesas com óleo combustível, diesel, navegação de apoio,
praticagem e, em alguns casos lubrificantes, são de responsabilidade do afretador
por tempo;
(3) no contrato de afretamento a casco nu, todas as despesas portuárias
relativas ao navio e seus tripulantes são de responsabilidade do afretador a casco
nu. No contrato de afretamento por tempo, as despesas portuárias relativas ao navio
são de responsabilidade do afretador por tempo, permanecendo as despesas
referentes aos tripulantes de responsabilidade do proprietário ou armador
disponente;
(4) nos contratos de afretamento a casco nu, a recompensa por salvatagem
irá para o afretador a casco nu. Nos contratos de afretamento por viagem, a
recompensa por salvatagem irá para o proprietário ou armador-disponente;
(5) nos contratos de afretamento a casco nu, o armador-disponente não
poderá colocar o navio off hire (fora de contrato), porque não haverá
descumprimento de cláusula contratual por parte do proprietário, pois sua única
obrigação é a entrega do navio. Poderá o proprietário, no entanto, apenas colocar o
navio off hire pelo não pagamento do hire (preço do afretamento). No contrato de
afretamento por tempo, o afretador por tempo poderá colocar o navio off hire em
qualquer hipótese que afete a navegabilidade ou operacionalidade do navio
(deficiência de equipamento, propulsão etc.);
(6) no contrato de afretamento a casco nu, o proprietário jamais será
responsabilizado por eventual avaria à carga perante o embarcador ou
consignatário, pois será, sempre, o armador disponente, o transportador.
Ainda, os contratos de afretamento por tempo podem se resumir a uma
viagem específica, isto é, por um período de tempo pré-determinado, de um porto a
outro especificado, ou mesmo a uma viagem redonda (e.g. embarque no porto A,

20
descarga no porto B, embarque no porto B e descarga no porto A, com um tempo de
90 dias / 10 dias mais ou menos).
Existem vários tipos de contrato de afretamento por tempo. No entanto, os
mais divulgados e utilizados, em formulários padrão aprovados pelo BIMCO (The
Baltic and International Maritime Council) são:

• BIMCHEMTIME 2005, contratos utilizados para o transporte de produtos


químicos;
• GENTIME (General Time Charter Party), contratos utilizados tanto para
transporte de carga seca, como para contêineres;
• NYPE 93 (New York Produce Exchange Time Charter). Este contrato foi
revisado e aprovado pela ASBA (Association of Ship Brokers and Agents,
Inc. [USA]) em 14 de setembro de 1993, e posteriormente aprovado pelo
BIMCO;
• SUPPLYTIME 2005 (Time Charter Party for Offshore Service Vessels). Este
contrato fora aprovado na Assembleia Geral do Centenário da BIMCO, em
Copenhagen, maio de 2005. São contratos de afretamento de offshore que
dão apoio a navios; e
• BALTIME 1939, é o contrato de afretamento por tempo mais tradicional da
BIMCO. Seu nome foi dado devido a sua larga utilização na região do Báltico.
Podemos ressaltar as seguintes cláusulas, comuns aos formulários padrão,
acima mencionados:
Descrição do navio, a qual descreve em detalhes, o navio a ser afretado, ou
seja: nome, tonelagem, classe, potência de máquinas principal e auxiliares,
capacidade de carga, equipamentos, velocidade cruzeiro, consumo de combustível e
diesel etc. Normalmente tais dados são informados na base, quer dizer, são dados
com certa tolerância para mais ou para menos, não devendo exceder 5%;

Período de afretamento é o período de utilização do navio. Expresso em


anos, meses e dias (ou uma combinação dos três). Também se utiliza a expressão
"mais ou menos" ou "mínimo" ou "máximo" com relação ao período, com o objetivo
de determinar-se uma tolerância;
21
Limites de rotas e utilização são os limites geográficos onde o navio poderá
ser utilizado. E, também, a especificação do tipo de carga que poderá ser
transportada (mercadorias legalmente permitidas); especificação de portos e berços
seguros (conforme doutrina internacional); especificação de calado par que o navio
"sempre flutue em segurança"; eventual restrição quanto ao tipo de carga a ser
transportada.

Autorização de subafretamento, a qual permite ao afretador subfretar o navio


a terceiro. Porém, do ponto de vista da relação jurídica, o afretador continua
responsável, perante o armador, pelo cumprimento do contrato;
Entrega do navio significa o início do contrato, data necessária para entrega
do navio em data e horário especificados; em local – estaleiro, porto berço, ou
qualquer outro lugar onde o navio esteja flutuando em segurança. Deverá, também,
e é condição sine qua non, estar em condições de navegabilidade, além de pronto
em todos os aspectos para receber (embarcar e descarregar) as mercadorias
permitidas em contrato;
Cláusula de cancelamento é a que permite a rescisão do contrato, pelo
afretador, no caso de não apresentação do navio nas datas estipuladas ou não
estando o navio em condições para cumprir o contrato;
Pagamento do hire (contraprestação pela utilização dos serviços do navio)
estipula as condições de pagamento: local, datas, valores (normalmente é efetuado
mensal ou quinzenalmente e adiantado);
Off hire (fora de contrato) especifica as condições em que o afretador estará
isento do pagamento do hire, quando o navio não estiver totalmente à disposição do
afretador (e.g. em casos de acidente, problemas de máquinas; docagem etc.);
Dedução (pecuniária) do hire permite ou proíbe deduções quando do
pagamento do hire (e.g. adiantamentos feitos pelo afretador por conta e ordem do
armador; deficiência de velocidade do navio etc.);
Retirada (rescisão) do navio pelo não pagamento de hire permite ao armador
retirar o navio (rescindir o contrato) nos casos de não pagamento do hire; ou
pagamento após a data estipulada no contrato; ou pagamento parcial. No entanto, o
22
armador deverá notificar expressamente o afretador de sua intenção. Se o navio
estiver em viagem (com carga), quando da rescisão, a mesma deverá ser terminada
e o transporte (normalmente coberto por bill of loading) deverá ser executado, pelo
afretador, até o final. Na prática o navio é reafretrado em níveis de hire diferentes;
Emprego do navio e nomeação de agentes permite ao afretador controlar o
emprego do navio (do ponto de vista comercial) e nomear os agentes nos vários
portos de escala;
Assinatura de "conhecimentos de embarque" determina, expressa ou
implicitamente, quem deverá assinar os conhecimentos de embarque: se o
comandante do navio ou o agente;
Reentrega do navio, quando do término do contrato, determina o local ou a
área onde o navio será reentregue, ou seja, retornará à posse do armador
(proprietário) nas mesmas boas condições em que foi entregue.

2.4.3 Contrato por viagem (voyage charter party)

O termo por viagem não tem significado restritivo, quer dizer, não determina
que o contrato deva ser por apenas uma viagem. Pode ser por várias viagens com o
mesmo navio. O termo apenas demonstra que o contrato é de transporte de
mercadorias, de acordo com a Convenção de Roma, de 1980, sobre Obrigações
Contratuais.
De maneira geral, nos contratos de transporte por viagem, obriga-se o
transportador a transferir coisas de um lugar para outro. Nesses contratos, há duas
pessoas, físicas ou jurídicas, que são o transportador (carrier) e o fretador ou
charteador (charterer).
É o transportador aquele que fornece o espaço a bordo de seu navio,
enquanto que o fretador (que pode ser também o embarcador – shipper) é aquele
que toma o espaço do navio, mediante o pagamento de uma contrapartida – o frete
– para o transporte de sua mercadoria.
Nestes contratos, a responsabilidade civil do transportador é objetiva, quer
dizer, é independente de culpa.

23
2.4.4 Do hire e off-hire
2.4.4.1 Hire

O frete é a contraprestação pecuniária no contrato de fretamento, isto é, a


retribuição pela utilização do navio, ou a contraprestação do transporte das
mercadorias. Hire é termo análogo a frete. É uma expressão utilizada para o preço
da utilização do navio, isto é, nos contratos de fretamento, e frete como retribuição
paga ao transportador pelo transporte das mercadorias.
Em sede de contrato de fretamento, não obstante a suposição de que a CP
deve determinar, expressamente, a moeda de pagamento, a unidade de medida a
que se relaciona e quando e onde o pagamento deve ser efetuado, ou seja, as
regras de pagamento do frete, há de se suscitar algumas peculiaridades atinentes a
três questões relevantes: a) quem paga; b) a quem deve ser pago, isto é, quem
recebe; e c) quando deve ser pago.

2.4.4.2 Off hire (suspensão do contrato de fretamento)

Off-hire é hipótese peculiar de suspensão de contrato de fretamento


consubstanciada na colocação do navio fora de pagamento por indisponibilidade.
Na expressão off-hire se enquadram as hipóteses de o navio estar de
fretamento, ou seja, em inavegabilidade absoluta ou relativa e deixar, por
conseguinte, de atender às condições acordadas no contrato de fretamento.
Em regra, se consagrada a situação off-hire, em algumas hipóteses
específicas às modalidades de contrato, o hire não é pago e nem pode ser exigido.
Independentemente da modalidade do contrato de fretamento, usualmente a
prerrogativa de off-hire encontra fundamento em cláusula contratual específica.
A off-hire clause (ou breakdown clause) é a cláusula que permite a colocação
do navio fora de fretamento nas hipóteses em que o navio deixe de atender às
condições acordadas. Usualmente, qualquer cláusula que torne o navio indisponível
para o afretador autorizar a suspensão automática do pagamento do frete.
O off-hire se prova pelo off-hire certificate, certificado que prova que o navio
está fora de utilização. O off-hire é assinado pelo comandante do navio e pelo
24
afretador e deve registrar a hora de interrupção e mencionar quantidade de água e
óleo existentes a bordo.

2.5 Da responsabilidade civil do transportador marítimo à luz do Novo Código


Civil

O Direito da navegação é essencialmente de ordem pública, contendo


inúmeras normas internacionais. Disciplina, predominantemente, as chamadas
regras de marinharia. Vale dizer: trata da regulamentação do tráfego visando à
segurança da navegação, nos portos, nas vias navegáveis e no alto-mar (exemplo:
regras de sinalização e de uso de bandeiras).
Logo se vê que o Direito Marítimo é mais amplo que o da Navegação,
abrangendo questões mais complexas, normalmente de ordem contratual.
Pois bem, posicionado o Direito Marítimo, faz-se importante comentar a
ferramenta que instrumentaliza os transportes marítimos de cargas, qual seja: o
contrato de transporte.
O contrato de transporte marítimo é o instrumento que estabelece o vínculo
jurídico entre o transportador e o consignatário das mercadorias transportadas. O
embarcador, ou seja, aquele incumbido de embarcar as mercadorias (normalmente
o produtor das mesmas), embora expressamente citado no contrato de transporte,
não é parte principal dele, uma vez que ele contrata por conta e ordem do
consignatário.
É denominado Conhecimento de Embarque, Conhecimento de Frete,
Conhecimento de Carga, Conhecimento de Transporte e, mais comumente,
Conhecimento Marítimo. Universalmente, se faz conhecido pela expressão inglesa
Bill of Loading (B/L).
O Conhecimento Marítimo, sua emissão e legitimidade, é regulado por leis
específicas e, principalmente, pela Convenção de Bruxelas, conhecida por Regras
de Haia, de 1924. No Brasil, os dispositivos legais que regulam o referido
instrumento negocial estão genericamente contidos no Código Comercial e,
especialmente, no Decreto nº 19.473/30 (regula os conhecimentos de transporte por
terra, por água ou ar).
25
O contrato de transporte marítimo é um típico contrato de adesão. O
embarcador e o consignatário submetem-se às cláusulas e condições estabelecidas
unilateralmente pelo transportador. Estas cláusulas e condições já vêm impressas
no anverso do contrato, não cabendo aos aderentes qualquer disposição de
vontade.
Daí, dizer-se que mesmo sendo um contrato, o contrato de transporte
marítimo não se ajusta, na sua plenitude, com o primado universal dos contratos que
é o da livre manifestação de vontades entre as partes contratantes. Nele, somente
prevalece a vontade de um, a do transportador marítimo.
Há de notar-se que sendo um contrato de adesão, a doutrina e a
jurisprudência têm entendido que as chamadas cláusulas impressas devem ser
interpretadas, preferencialmente, com base na eqüidade, sendo certo que, havendo
dúvida a interpretação deve favorecer a parte que foi obrigada a aderir, minimizando,
assim, os efeitos negativos da imposição ditada pelo transportador.
Atualmente, a interpretação dos contratos de transporte marítimo deve estar
imantada da legislação consumerista, haja vista o fato de o transportador marítimo
ser um típico prestador de serviços e o consignatário, o destinatário (consumidor)
final destes serviços. Logo, conforme dispõe o Código de Defesa do Consumidor,
eventuais cláusulas abusivas, como as que limitam a responsabilidade do
transportador, são tidas como não válidas, juridicamente ineficazes (nulas, na
verdade).
Por fim, convém esclarecer, como será visto mais adiante, que o contrato de
transporte marítimo, como todo contrato de transporte, é um contrato de fim, ou seja,
aquele em que o resultado positivo da obrigação pactuada é imprescindível para o
seu regular aperfeiçoamento enquanto negócio jurídico. Nele, o devedor da
obrigação, vincula-se ao resultado propriamente dito e não apenas aos meios para
se obtê-lo.
Assim, tem nascedouro a idéia de responsabilidade civil do transportador
marítimo.
O contrato de transporte pode ter por objeto a condução de pessoas, bens ou
notícias, e se opera pelos diversos modos disponíveis: terrestre, aéreo, fluvial,

26
marítimo e por meio de carros, carretas, caminhões, trens, aviões, chatas, barcos,
navios, etc.
A responsabilidade civil do transportador marítimo, a exemplo dos
transportadores em geral, é de natureza contratual e é regida pela teoria objetiva
imprópria.
A teoria objetiva imprópria é aquela em que a culpa do transportador,
havendo inadimplemento do contrato de transporte, é sempre presumida.
O transportador só conseguirá eximir-se dessa presunção legal de culpa
provando a existência, no caso concreto, de alguma das causas excludentes de
responsabilidade previstas pelo ordenamento jurídico brasileiro.
A adoção da teoria objetiva imprópria encontra fundamento jurídico no
Decreto Legislativo (Lei Federal) nº 2.681/12, mais conhecido como "Decreto das
Estradas de Ferro" (também "Decreto dos Transportes", que regula a
responsabilidade civil das estradas de ferro).
O Decreto Legislativo (Lei Federal) nº 2.681/12, aplicável aos transportadores
em geral, elaborado no início do século, e o Código Comercial, datado da época do
Império, foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, razão pela qual
estão em pleno vigor, produzindo todos os efeitos jurídicos a que se destinam, em
especial o de regular a responsabilidade civil dos transportadores de bens.
Diz o art. 1º do Decreto Legislativo (Lei Federal) nº 2.681/12 que: "Art. 1º —
será sempre presumida a culpa do transportador". Vê-se nas suas letras inaugurais
que o dito dispositivo legal adotou a idéia de responsabilidade objetiva para regrar a
situação jurídica dos transportadores — posição vanguardista à época.
Referida norma jurídica foi elaborada, como já se disse, para disciplinar a
responsabilidade civil dos transportadores ferroviários, tanto assim que é mais
conhecido pela expressão "Decreto das Estradas de Ferro". Hoje, porém, é pacífico
o entendimento de ele ser aplicável aos transportadores em geral, entre eles o
transportador marítimo.

27
A propósito, diz Carlos Roberto Gonçalves:

"No direito brasileiro a fonte dessa responsabilidade encontra-se na Lei n.


2.681, de 7 de dezembro de 1912, que regula a responsabilidade civil das
estradas de ferro. Tal lei, considerada avançada para a época em que foi
promulgada, destinava-se a regular, tão-somente a responsabilidade civil
das estradas de ferro. Entretanto, por uma ampliação jurisprudencial, teve a
sua aplicação estendida a qualquer outro tipo de transporte: ônibus, táxis,
lotações, automóveis, etc. Inicialmente, referida lei teve a sua aplicação
estendida aos bondes elétricos, dada a sua semelhança com os trens.
Posteriormente, a idéia foi transferida para os ônibus, automóveis e todas
6
as espécies de transportes, até mesmo os elevadores."

A redação dos sobreditos artigos evidenciam que a obrigação do


transportador marítimo é a de resultado, devendo ele entregar os bens confiados
para o transporte em idênticas condições as recebidas, sob pena de se configurar, a
rigor, o inadimplemento da obrigação assumida e, com ela, a respectiva
responsabilidade.
Como é sabido, a obrigação nasce de diversas fontes e deve ser cumprida
livre e espontaneamente pelo credor. O contrato de transporte marítimo, por
exemplo, é fonte de obrigação específica. Pois bem, quando não ocorre o pronto
cumprimento da obrigação pactuada, surge a responsabilidade. Obrigação e
responsabilidade são figuras jurídicas afins, porém inconfundíveis. Esta decorre do
inadimplemento daquela, sendo considerada a consequência jurídica e patrimonial
do descumprimento da relação obrigacional, conforme prescreve o artigo 186 do
Código Civil, in verbis:

“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou


imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

6
Responsabilidade Civil, Saraiva, 4ª ed., São Paulo: 1988, p. 111.

28
A limitação da responsabilidade civil do transportador encontra amparo no
Código Civil, art. 750, o qual dispõe que a responsabilidade do transportador, limita
ao valor constante do conhecimento, começa no momento em que ele, ou seus
prepostos, recebem a coisa e termina quando é entregue ao destinatário, ou
deposita em juízo, se aquele não for encontrado.
Transcreve-se o referido artigo do Novo Código Civil:

“Art. 750. A responsabilidade do transportador, limitada ao valor


constante do conhecimento, começa no momento em que ele, ou seus
prepostos, recebem a coisa; termina quando é entregue ao destinatário, ou
depositada em juízo, se aquele não for encontrado.”

No instante em que recebe os bens, o transportador marítimo assume a


mesma natureza de um depositário. A natureza de depositário implica dever objetivo
de cuidado, nas modalidades guardar, conservar e restituir. Somente com a efetiva e
boa entrega dos bens a quem de direito, é que o negócio jurídico a que o
transportador estava vinculado se aperfeiçoa, extinguindo-se, pois, a sua
responsabilidade.
Havendo qualquer dano nos bens, falta e/ou extravio, é imputada ao
transportador a presunção de culpa independentemente de prova (a
responsabilidade pelo descumprimento da relação obrigacional).
Inverter o ônus da prova é dizer que o credor do contrato de transporte
inadimplido não está obrigado a provar a culpa do devedor, porque legalmente
presumida, mas o devedor, entenda-se: transportador, querendo afastar a sua
responsabilidade pelo dano, está obrigado a provar a existência de alguma das
causas excludentes já mencionadas.
É o que diz a lei e o que entende a doutrina brasileira.
Agostinho Alvim, por exemplo, discorre:

29
"Realmente, a obrigação do transportador é de fim e não de meio. Não se
obriga ele a tomar providências e cautelas necessárias para o bom sucesso
do transporte; obriga-se pelo fim, isto é, garante o bom êxito. Daí a
7
apreciação rigorosa da sua responsabilidade"

Os tribunais brasileiros já se manifestaram quanto à responsabilidade do


transportador marítimo:

APELAÇÃO CÍVEL n.º 40.779 – SÃO PAULO – Tribunal Federal de


Recursos – 3.ª Turma – DIREITO MARÍTIMO – TRANSPORTE MARÍTIMO
– MARCADORIAS AVARIADAS.
O transportador presume-se responsável pelas perdas e avarias ocorridas
às coisas que lhe foram confiadas. Cabe-lhes provar o caso fortuito ou força
maior, se invocadas.
Os conhecimentos limpos indicam que a mercadoria foi entregue em
perfeitas condições ao transportador.
Tratando-se de navios dos mais modernos, não é possível deixar de
presumir encontra-se em condições d enfrentar ventos violentos e
tempestades ao longo de suas viagens, com inteira insegurança à tripulação
e carga transportada, desde que hajam adotado as providências e cuidados
indicados.
A Única prova da ré, acerca da ocorrência de furacões que se abateram
sobre o navio, consta de “protestos de bordo” que foi ratificado apenas no
Consulado Geral do País, da nacionalidade do barco e não em Juízo.
Insuficiência da prova para conduzir à irresponsabilidade da ré pelos danos
causados.
Fatos e circunstâncias que levam a não emprestar-se significação decisiva
ao protesto mencionado.
O mau tempo e a tempestade sendo fatos previsíveis, não constituem “caso
fortuito”, mas acontecimentos normais em navegação, devendo os naivios
estarem em condições de suportá-los, como j´pa decidiu o Tribunal fedeal
de Recursos, na Apelação Cível n.º 27.664. Não provou a ré também o

7
Agostinho Alvim . Da Inexecução das Obrigações e suas Consequências, Saraiva, 1955, p. 341.

30
correto acondicionamento da mercadoria nos porões do navio. (Diário da
8
Justiça da União – Edição: Brasília, 26.10.1978, p. 8.462)

No mesmo diapasão, Rubens Walter Machado, advogado paulista também


especializado em Direito Marítimo, é muito feliz ao tratar o assunto:

"Ao transportador, incumbindo-se de transportar mercadorias, cumpre


entregá-las ao destinatário no lugar convencionado e no estado e
quantidade em que as recebeu, de conformidade com o exposto no art. 519
do Código Comercial: O capitão é considerado verdadeiro depositário da
carga e de quaisquer efeitos que receber a bordo, e como tal está obrigado
a sua guarda, bom acondicionamento e conservação, e à sua pronta
entrega à vista dos conhecimentos. (...) A responsabilidade do capitão a
respeito da carga principia a correr desde o momento em que a recebe e
continua até o ato da sua entrega no lugar que se houver convencionado,
ou que estiver em uso no porto de descarga. (...) Não o fazendo, cumpre-
lhe, também, o ônus da prova para elidir a sua responsabilidade pelo
inadimplemento do contrato firmado. (...) Sua responsabilidade é, portanto,
sempre presumida, amparada pela teoria da culpa sem prova, que tem seu
nascedouro na infração das regras pré-estabelecidas da obrigação em si, tal
qual dispõe o art. 1.056 do Código Civil, responsabilidade essa que se
origina não da culpa aquiliana, mas, sim, do contrato firmado. (...) É
presumida a culpa do transportador por motivos óbvios de lógica jurídica, e
sua caracterização — tal qual um depositário — predomina nas obrigações
de guardar, conservar e restituir. (Revista do IRB, Aspectos Jurídicos: o que
interessa ao seguro, 44, (232), Set/Dez, 1983, Rio de Janeiro, p. 20).

Os dizeres do estimado Mestre, Rubens Walter Machado, enfatizam bem o


conceito de responsabilidade objetiva (contratual) e consagram a idéia da culpa
presumida, institutos estes afetos a todo transportador marítimo. Há de se destacar,
porém, dois aspectos apontados por ele e que merecem especial atenção: o
primeiro é o fato de o capitão do navio ser preposto do transportador marítimo, e o
segundo é a natureza de depositário assumida pelo transportador marítimo.

8
Jurisprudência extraída do livro Prática do Direito Marítimo, de Paulo Henrique Cremoneze, São Paulo: Quartier Latin,
2009.

31
Invertendo a ordem lógica em benefício da didática, comecemos pelo
segundo ponto destacado: a natureza de depositário do transportador marítimo.
Entende-se por depositário, no plano do Direito das Obrigações, todo aquele
que tem o dever jurídico-contratual de guardar um bem até que a outra parte o
reclame.
É, aliás, o que se depreende da simples leitura do art. 629 caput, do Novo
Código Civil: "Art. 629. O depositário é obrigado a ter na guarda e conservação da
coisa depositada o cuidado e diligência que costuma com o que lhe pertence, bem
como a restituí-la com todos os frutos e acrescidos, quando o exija o depositante."
Maria Helena Diniz, ao comentar o referido artigo, especificamente o contrato
de depósito, diz:
"Dever de guardar e conservar a coisa depositada. O depositário terá a
obrigação de guardar ma coisa sob seu poder, sendo-lhe permitido invocar
a ajuda de auxiliares, que ficarão sob sua responsabilidade. Deverá ter na
custódia do bem o cuidado e a diligência que costuma ter com o que lhe
pertence, respondendo pela perda ou deterioração se culposamente
9
contribuiu para que isso acontecesse (TRT, 690:136, 536:117; ejstj, 16:43)"

O contrato de depósito importa, ao depositário, deveres de guardar, conservar


e restituir a coisa depositada, tendo na custódia da coisa o cuidado e a diligência
que costuma ter com o que lhe pertence. Deveres estes, como salientado acima,
também afetos aos transportadores.
No que se refere à ideia de o depositário responder pelos danos que
culposamente contribuiu para acontecer, nosso entendimento, contudo, ousa ser
ligeiramente diverso.
Tratando-se de contrato de depósito não há que se falar a respeito da
eventual culpa na conduta do depositário, uma vez que esta é sempre presumida. O
depositário tem a sua responsabilidade civil regida pela teoria objetiva imprópria,
logo é irrelevante verificar, no mundo dos fatos, se ele culposamente contribuiu ou
não para o dano havido no bem que lhe foi contratualmente confiado. Haja ou não
culpa, o depositário é, sempre, presumidamente culpado. Ele, o depositário,

9
Maria Helena Diniz . Código Civil Anotado, Saraiva, 8.ª ed. atual. com o NCC. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 406.

32
responde pelo que é e não pelo que fez ou deixou de fazer. Daí dizer-se que a sua
responsabilidade é a de natureza contratual-objetiva.
A natureza jurídica do contrato de depósito importa responsabilidade civil
objetiva imprópria e, a reboque, o instituto da culpa presumida. Somente o caso
fortuito, a força maior e o vício de origem são capazes de afastar a presunção de
culpa do depositário em caso de inadimplemento contratual, daí não se falar na
caracterização de culpa. Tal postulado, bom frisar, é de inteira aplicação aos
transportadores.
Tão desnecessário é o fato de ter o depositário contribuído ou não
culposamente para o dano no bem confiado e tão objetiva é a responsabilidade civil
dele, que há quem defenda que esta responsabilidade objetiva é a da sua
modalidade mais absoluta e rigorosa, qual seja: a responsabilidade civil objetiva
própria, aquela que não reconhece qualquer causa excludente de responsabilidade.
Imperioso é ressaltar que hoje, o sistema normativo brasileiro prescreve que a
responsabilidade do depositário, em caso de inadimplemento da obrigação de
depósito, é de ordem objetiva (imprópria), informada pela ideia de presunção legal
de culpa.
Eis o motivo pelo qual é correto equiparar as obrigações do transportador
marítimo com as do depositário. É feliz a comparação porque ela é revestida de
lógica jurídica e tem a capacidade de fazer a justaposição da norma com o contexto
fático. Explica-se: o transportador marítimo, ao receber os bens contratualmente
confiados para o transporte, deve, antes, guardá-los e conservá-los para, depois de
feita a viagem marítima, restituí-los, entregá-los, a quem de direito e no local de
destino.
O contrato de transporte, pois, reclama, ainda que às avessas e/ou de forma
indireta, o de depósito, não existindo aquele sem que, no plano dos fatos, dos
acontecimentos do mundo, tenha havido, antes, este.
Finda a primeira observação, entenda-se, comentário do primeiro ponto
abordado por Rubens Walter Machado, há que se perscrutar os caminhos da
segunda observação, versando o primeiro ponto tratado pelo referido especialista
em sua manifestação, qual seja, aquele que trata do capitão do navio, preposto do
transportador marítimo.

33
No que abrange algumas especificidades do Direito Marítimo, é tecnicamente
certo dizer que o comandante do navio é aquele que representa, em tudo e para
tudo o que for relacionado ao navio e a viagem. Conforme o caso, poderá
representar o proprietário, o armador ou mesmo o afretador (aquele que loca
espaços do navio ou todo este). É largamente cediço no Direito Marítimo que o
comandante é o representante daquele que emitiu o conhecimento marítimo
(contrato de transporte marítimo), e que é chamado de transportador marítimo.
Com efeito, tão pacificado está o assunto no Direito brasileiro que o Supremo
Tribunal Federal houve por bem sumulá-lo: "STF - SÚMULA 341 - É presumida a
culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto."
Tal enunciado da súmula é bem empregado no caso específico do
transportador marítimo, este entendido como aquele que tem a gestão náutica de
um navio e/ou emite conhecimentos de embarque (contrato de transporte) em
relação aos atos do capitão, a pessoa natural que incorpora o comando do navio. O
transportador marítimo, a quem se incumbe bem escolher os seus prepostos ou
representantes, responde pelos atos do comandante não por que tenha dado causa
direta pelo fato danoso, mas, sim, pelo que é, pela natureza da relação jurídica que
tem com o seu preposto e, sobretudo, pelo modo como se apresenta perante o
terceiro que com ele celebra o Contrato de Transporte Marítimo.
Em homenagem à síntese, sobre todo o exposto, vale dizer: acerca da
primeira parte destes modestos comentários, pode-se dizer o seguinte:
1. a responsabilidade civil dos transportadores marítimos é de natureza
contratual e é, segundo o ordenamento jurídico brasileiro, ditada pela teoria objetiva
imprópria, aquela em que a sua culpa, em caso de inadimplemento do contrato, é
sempre presumida;
2. a presunção legal de culpa, segundo o entendimento do Direito brasileiro, é
tão inequívoca que alcança os atos praticados pelos empregados e prepostos dos
transportadores marítimos, em especial o capitão, comando do navio;
3. o transportador marítimo tem a obrigação de zelar pelo bem confiado para
o transporte tal e qual um depositário, sendo os seus deveres os de guardar,
conservar e restituir o bem em condição idêntica a recebida;

34
4. o contrato de transporte marítimo só se aperfeiçoa com a perfeita entrega
dos bens dados contratualmente para o transporte a quem de direito. Não havendo o
adimplemento dessa obrigação, há a presunção legal de culpa do transportador,
devendo ele responder pelos prejuízos decorrentes, salvo se conseguir provar, no
caso concreto, a existência de alguma das causas legais excludentes de
responsabilidade.

2.5.1 Das excludentes legais de responsabilidade do transportador

O corpo normativo brasileiro é rígido quanto à isenção de responsabilidade do


transportador. O vetusto Código Comercial, na sua extinta primeira parte,
enumerava as três excludentes de responsabilidade, quais sejam:
1. Vício de origem;
2. Caso fortuito; e
3. Força maior.
Hodiernamente, o judiciário brasileiro dá guarida à isenção de
responsabilidade por parte do transportador em caso da mercadoria embarcar com
“vício de embalagem” ou “vicio de origem”. Todavia, a doutrina jamais pode ser
preterida num todo. Deve, de igual forma, atentar-se às demais excludentes de
responsabilidade do transportador.
O vício de origem abraça outras modalidades: vício de embalagem, culpa
exclusiva do credor da obrigação de transporte e vício redibitório.
Vício de origem é o vício existente na própria coisa confiada para transporte.
Em outras palavras, é o vício ou defeito oculto da coisa já existente quando da
entrega para o transporte marítimo, que impede sua utilização ou importa
desvalorização.
Ora, se os danos constatados nos bens confiados para transporte marítimo
preexistiam ao próprio transporte, não há que se falar em culpa do transportador.
Mesmo em se considerando a responsabilidade objetiva, é manifestamente
injusto obrigar o transportador a responder por danos os quais nem minimamente
deu causa.

35
Trata-se, pois, de uma causa excludente de responsabilidade que bem se
ajusta aos muitos mecanismos de calibragem do sistema jurídico brasileiro e,
mesmo, internacional.
Mas, a prova da existência do vício de origem compete exclusivamente ao
transportador marítimo, por conta e ordem do império da teoria da inversão do ônus
da prova, um dos pilares da teoria objetiva imprópria.
Assim, em sendo alegado pelo transportador eventual ocorrência de vício de
origem, caberá a ele próprio a respectiva produção de prova, normalmente por meio
de perícia judicial.
Não havendo prova específica em tal sentido, mantém-se, em desfavor do
transportador, a presunção de culpa pelo inadimplemento contratual.
Dá-se isso porque o transportador muito provavelmente, num caso dessa
natureza, recebeu a carga para transporte sem qualquer ressalva no conhecimento
marítimo, vale dizer, “limpa a bordo”.
O vício de embalagem é mais comumente alegado nas lides forenses sobre
Direito Marítimo.
De certo modo, o conceito de vício de origem é parecido com o de vício de
embalagem.
O vício de embalagem é o defeito existente na proteção da carga confiada
para transporte.
O artigo 746 do N. Código Civil expressamente prevê que “O transportador
poderá recusar a coisa cuja embalagem seja inadequada, bem como possa por em
risco a saúde das pessoas ou danificar o veículo e outros bens.”
Sendo conferida, por lei, a possibilidade de o transportador recusar a coisa,
cuja embalagem seja inadequada, muito difícil será a caracterização de vício de
embalagem.
De fato, ao receber a carga, o transportador automaticamente reconhece que
a embalagem é adequada, pois se assim não fosse, poderia ter exercitado a
faculdade disposta no citado artigo 746 do N. Código Civil.
Logo, para se ter caracterizada a figura do vício de embalagem, é preciso
provar, ainda, que o vício e defeito da mesma estivesse oculto no momento do
embarque.
36
E, ao se falar em “oculto”, fala-se oculto aos olhos e às máximas de
experiência, ao bom-senso e conhecimento da tripulação do navio, que sabe, a rigor,
quais embalagens são ou não adequadas para a maioria das cargas que lhes são
confiadas por meio de sucessivos transportes.
Importante destacar que vício de embalagem jamais poderá ser confundido
com vício de estivagem da carga.
O vício de estivagem, apesar do nome, não tem nada que ver com o vício
oculto. Trata-se, sim, de grave modalidade de falta contratual do transportador
marítimo, que se revela desidioso quanto aos seus deveres operacionais.
Com efeito, a estivagem, ainda que operada por terceiro, é de inteira
responsabilidade do transportador, por meio do comandante do navio.
O vício de estivagem nada mais é do que a falha operacional do transportador
marítimo em arrumar as cargas a bordo do navio.
Força maior e caso fortuito, são as causas excludentes de responsabilidade
mais alegadas pelos transportadores marítimos e as que são objeto das maiores
discussões, posto que a sua caracterização, não raro, é difícil de ser constatada no
mundo fático, motivo pelo qual serão tratadas, doravante, com especial atenção.
Referidas causas fazem parte do gênero fortuidade, sendo diferentes,
apenas, no que diz respeito ao agente causador. Explica-se: enquanto na força
maior o agente causador é a conduta humana, no caso fortuito, o agente é a força
da natureza.
É importante destacar que esse entendimento não é pacífico na doutrina
mundial. O Direito comparado apresenta a doutrina alemã em sentido contrário. Para
os alemães, o conceito de força maior implica força da natureza e o de caso fortuito,
a conduta humana.
Há quem considere caso fortuito e força maior expressões sinônimas, sem
distinção de qualquer natureza, uma vez que o que é relevante ao ordenamento
jurídico é a projeção dos efeitos legais e concretos de um e de outro e que são
praticamente os mesmos.
Em que pese o antagonismo conceitual existente entre os diversos
ordenamentos jurídicos do mundo, o certo é que os efeitos são os mesmos e as
consequências, no mundo dos fatos e no mundo do Direito, também.
37
Operando-se o gênero fortuidade, é possível compreender melhor os
institutos e postulados que regem as espécies, força maior e caso fortuito.
A caracterização da fortuidade depende dos seguintes elementos, tidos como
pressupostos essenciais: imprevisibilidade, inesperabilidade e irresistibilidade. Não
basta haver um fato considerado como anormal e provocador de um determinado
dano para alegar-se a fortuidade, é preciso que este fato seja absolutamente
imprevisível, inesperado e irresistível.
Nesse sentido é interessante o entendimento de Pedro Calmon Filho,
professor universitário e advogado especializado em Direito Marítimo:

"Por caso fortuito, ou força maior, que muitos consideram expressões


sinônimas, temos os fatos imprevisíveis ou irresistíveis, que vencem a
normal diligência e perícia que se pode razoavelmente esperar do armador
e seus prepostos. São os fatos inesperados que ultrapassam a capacidade
do homem de prevenir contra um perigo não normalmente esperado, ou lhe
10
fazer face depois de deflagrado."

A força maior, segundo o entendimento dado pelo Direito brasileiro, é o fato


relevante ao mundo jurídico e que foi provocado pela conduta humana. A conduta
humana, por sua vez, é entendida como toda ação ou omissão finalisticamente
orientada para um dado resultado e que, inserida num certo contexto fático,
interessa ao Direito.
O caso fortuito é o evento da natureza não esperado, totalmente imprevisível
e de força irresistível. É o fato que não depende da conduta humana, superando-a
em todos os seus limites. É algo que acontece no mundo concreto, um verdadeiro e
devastador happening, ou seja, um fenômeno invencível e que produz efeitos
relevantes ao mundo jurídico.
Muito importante observar que a fortuidade reclama os requisitos
imprevisibilidade, inesperabilidade e irresistibilidade. São, aliás, requisitos
concorrentes e imprescindíveis. Explicando melhor: para haver a fortuidade, faz-se
necessária a prova no sentido de ter existido, no caso concreto e ao mesmo tempo,

10
Estudos do Mar Brasileiro - A Lei do Mar, Renes, Rio de Janeiro: 1972, p. 152

38
a incidência das três condições. Significa dizer que o transportador marítimo, para se
valer da fortuidade, precisa provar que o fato que o envolveu foi, ao mesmo tempo,
imprevisível, irresistível e inesperado.
Em outras palavras: a falta de apenas um dos requisitos em destaque tem o
condão de afastar eventual caracterização de fortuidade. A força maior e o caso
fortuito só existem se coexistirem os referidos três requisitos, capazes de superar os
limites máximos de cuidado do transportador marítimo em relação aos bens sob sua
custódia.
A falta de apenas um deles é o bastante para se ter afastada qualquer
pretensão no sentido de se caracterizar a fortuidade. É de vital significado, ter-se
como postulado esse entendimento, porque é muito comum os transportadores,
diante de casos concretos, alegarem fortuidade, com base em apenas um dos
referidos requisitos. Fazem-no porque continuam defendendo a ideia, há muito
ultrapassada, segundo a qual a expedição marítima é uma verdadeira aventura,
sujeita a inúmeros riscos e perigos, todos imprevisíveis ao homem.
Sobre o tema fortuidade em relação à navegação nos dias de hoje, Rubens
Walter Machado, tão estimado mestre, é mais uma vez feliz ao dizer:

"...a força maior ou o caso fortuito previstos por nossa legislação comercial,
são os fatos imprevisíveis ou irresistíveis que superam a normal diligência e
perícia que se podem exigir do comando do navio. São os fatos inesperados
que extrapolam a capacidade do homem prevenir-se contra um perigo não
esperado, ou de enfrentar depois de iniciado. Em nossos dias, com o
avanço da tecnologia, os navios são planejados e construídos para
enfrentar os usuais perigos do mar. Os meios de comunicação existentes
permitem que o comando do navio tenha uma exata e perfeita informação
das condições do mar a ser enfrentado, permitindo que se afastem — quase
que por completo — os fatos imprevisíveis, imprevistos e inesperados." (op.
cit., p. 21)

A lição acima evidencia a atual tendência pelo repúdio à ideia malsã de a


expedição marítima continuar sendo, hoje, final do século XX, considerada uma
aventura (tese ampla e isoladamente defendida pelos transportadores marítimos e
seus simpatizantes).
39
Existem inúmeras razões e motivos para repudiar a idéia da aventura. É fato
notório que o constante avanço da tecnologia impulsionou um enorme
desenvolvimento da engenharia naval. Nos dias de hoje, os navios são planejados e
construídos para suportarem as adversidades próprias do mar. São, aliás,
construídos para superarem os mares mais furiosos e tempestuosos. Não é só: com
a explosão da informática, a ciência meteorológica foi premiada com poderosos
recursos e fantásticos equipamentos. Os modernos meios de comunicação
existentes permitem que o comando do navio, por meio dos poderosos radares e
computadores de bordo, diretamente ligados a satélites de última geração, tenha
uma exata, ampla e segura informação, a qualquer tempo, das condições do mar e
do clima a serem enfrentados.
Logo, se bem trabalhando o conceito de fortuidade, é muito difícil, para não dizer
impossível, haver, nos dias atuais, um caso concreto em que um navio, no curso de
uma expedição marítima, venha a ser colhido por um fato, ao mesmo tempo
inesperado, imprevisível e irresistível.
A questão, bom observar, está praticamente pacificada no Tribunais
brasileiros, subsistindo dúvidas não mais em relação ao suporte jurídico, e à forma
de entendê-lo e aplicá-lo em um dado caso concreto, mas, sim, ao próprio suporte
fático do tema. Vale dizer: se determinado acontecimento é ou não é um fato
merecedor de ser amparado pela fortuidade.
No que se refere ao caso fortuito, a dificuldade de apreciação persiste apenas
no fato de se constatar se um sinistro foi ou não objeto de sua incidência, ou seja, se
ele está realmente acobertado pelo requisitos inafastáveis para a caracterização da
excludente legal.
Nos casos em que é previamente avisado pelas autoridades competentes que
um evento da natureza (a storm) está se aproximando, e o comandante da
embarcação recebe ordem da empresa para zarpar, exime-se o transportador de
suscitar a excludente de responsabilidade subsidiado no caso fortuito.
Equivocado é o raciocínio que o comandante estará respaldado pelos boletins
metereológicos recebidos durante a travessia, na verdade o importante não é o fato
de as forças da storm terem sido demasiadamente elevadas, mas sim da previsão,
pior, esperada. Uma adversidade climática é sempre uma adversidade climática e a

40
sua fúria pode variar em intensidade, razão pela qual, sabendo previamente da sua
ocorrência, a ninguém é dado enfrentá-la sem o devido preparo. Quem o faz,
assume, integralmente, todos os riscos, não podendo, posteriormente e mediante a
constatação de infortúnio, alegar o benefício legal do caso fortuito.
O caso ilustrado é bastante emblemático e serve para enfatizar a ideia de
hoje ser muito difícil, talvez impossível, a caracterização de fortuidade,
especialmente caso fortuito, em face de todo o aparato tecnológico existente e que
faz previsível, senão esperado, todas as eventuais ocorrências de adversidades
climáticas. Com efeito, se o evento é, de qualquer forma esperado, ou previsível,
ainda que irresistível, não há como subsistir a excludente de responsabilidade em
estudo.
Naquilo que toca o conceito de força maior, o aspecto mais problemático e
bastante relevante é o da questão do roubo de mercadorias a bordo do navio
transportador.

2.6 Conhecimento de embarque marítimo (Bill of Loading – B/L)

A Convenção de Bruxelas, de 1924, que se traduziu nas “Regras de Haia”,


delineou o conhecimento de transporte, ou bill of loading, que é o documento
representativo do contrato de transporte marítimo. No Brasil, os dispositivos legais
que regulam o referido instrumento negocial estão genericamente contidos no
Código Comercial e, especialmente, no Decreto nº 19.473, de 10 de dezembro de
1930.
O conhecimento de embarque é o documento mais importante da navegação,
e um dos mais importantes do comércio exterior. É um documento de emissão do
armador, podendo ser assinado pelo comandante do navio, bem como pela agência
marítima representante do armador, em seu nome.
O conhecimento do embarque marítimo consagra-se com a evidência escrita
do contrato de transporte. Comumente denominado “conhecimento de transporte
marítimo” e “conhecimento de carga”. Indubitavelmente é considerado um dos
documentos mais importante do comércio exterior em geral. No Brasil o B/L é de
emissão obrigatória (art. 744 do CC) e tem força de escritura pública.

41
“Art. 744. Ao receber a coisa, o transportador emitirá conhecimento com a
menção dos dados que a identifiquem, obedecido o disposto em lei
especial.
Parágrafo único. O transportador poderá exigir que o remetente lhe
entregue, devidamente assinada, a relação discriminada das coisas a serem
transportadas, em duas vias, uma das quais, por ele devidamente
autenticada, ficará fazendo parte integrante do conhecimento.”

2.6.1 Da emissão do B/L

Para que o conhecimento de embarque exerça a sua força probatória, a sua


emissão deve atender às exigência legais.
Como mencionado no art. 578 do Código Comercial, o conhecimento será
assinado e entregue pelo Comandante ao embarcador no prazo de 24 horas, após o
término do carregamento. Mesmo que a norma comercial atribua ao Comandante a
obrigação de assinar os conhecimentos, atualmente, estes “são emitidos pelas
empresas de navegação, proprietárias ou armadoras das embarcações, a quem
cabem as obrigações e prerrogativas que o Código estabelecera para o Capitão.”11
O B/L também poderá ser assinado, como é usual, pela agência marítima
representante do transportador.
No transporte internacional, não obstante a adversidade de modelos de BLs,
destacam-se os contratos-padrão Conlinebill, da BIMCO, e Visconbill.
O B/L geralmente é emitido em três vias, sendo duas negociáveis (negotiable
bill of loading) e transferíveis por endosso, e uma via não negociável (non negotiable
bill of loading ou non negotiable).
O teor das informações a serem lançadas no B/L é variável. Em tese, devem
estar contidos no B/L os dados exigidos pela legislação aplicável ao título. A
indicação de outros dados tem apenas valor informativo e, regra geral, estes não
podem se sobrepor a dados semelhantes exigidos por lei ou regulamento em outros
documentos constantes do despachos aduaneiro.

11
Fábio Ulhoa Coelho, Código Comercial e legislação complementar anotados. À luz do Novo Código Civil. 5ª Ed. São
Paulo, Saraiva, p. 188.

42
Como regra, são exigidas as seguintes informações: denominação da
empresa emissora; número de conhecimento; data da emissão; nome e viagem do
navio; embarcador; depositário, nome de quem vai ser notificado quando da
chegada da mercadoria; tipo de mercadoria e suas características (quantidade, peso
bruto, embalagem, volumes, marcas etc.); forma de pagamento do frete (em
algarismos e por extenso); nome do agente da companhia transportadora no porto
de embarque, com o carimbo e assinatura do responsável; carimbo do local de
estiva da mercadoria (shipped on board); portos ou pontos de embarque, destino e
transbordo. No verso do B/L estão delineadas as cláusulas que retratam as
condições do transporte. Destacam-se, em essencial e pela relevância, A cláusula
Paramount12 de legislação aplicável, a cláusula de competência jurisdicional, as
cláusulas limitativas e/ou exonerativas de responsabilidade do transportador
marítimo durante o transporte, cláusulas de avarias grossas, entre outras.

2.6.2 Da natureza jurídica do B/L

O B/L apresenta tripla natureza. Inicialmente, é a evidência escrita ou prova


da existência do contrato de transporte; secundariamente, consagra-se recibo da
mercadoria ao transportador ou a bordo do navio; e, por fim, reveste-se da
legitimidade jurídica de um título de crédito.
Apresentamos um adiante um contrato padrão de transporte emitido pela
BIMCO:

COMBINED TRANSPORT BILL OF LADING


Adopted by The Baltic and International Maritime Council in January, 1971 (as revised 1995)
Code Name: "COMBICONBILL"

12
A cláusula paramount é também conhecida como cláusula principal. Trata-se de cláusula que determina a
legislação aplicável. Comumente remete-se à aplicabilidade de um regime convencional – geralmente a
Convenção de Bruxelas para a Unificação de Certas Regras em Matéria de Conhecimento de Embarque (1924,
Regras de Haia), as Regras de Haia-Visby, as Regras de Hamburgo, a Cogsa 1936 (EUA) – ou uma determinada
lei estatal.

43
I. GENERAL PROVISIONS

1. Applicability.

Notwithstanding the heading "Combined Transport", the provisions set out and referred to in this Bill of
Lading shall also apply, if the transport as described in this Bill of Lading is performed by one mode of
transport only.

2. Definitions.

"Carrier" means the party on whose behalf this Bill of Lading has been signed. "Merchant" includes the
Shipper, the Receiver, the Consignor, the Consignee, the holder of this Bill of Lading and the owner of
the goods.

3. Carrier's Tariff.

The terms of the Carrier's applicable Tariff at the date of shipment are incorporated herein. Copies of
the relevant provisions of the applicable Tariff are available from the Carrier upon request. In the case
of inconsistency between this Bill of Lading and the applicable Tariff, this Bill of Lading shall prevail.

4. Time Bar.

All liability whatsoever of the Carrier shall cease unless suit is brought within 9 months after delivery of
the goods or the date when the goods should have been delivered.

5. Law and Jurisdiction.

Disputes arising under this Bill of Ladinq shall be determined by the courts and in accordance with the
law at the place where the Carrier has his principal place of business.

II. PERFORMANCE OF THE CONTRACT

6. Methods and Routes of Transportation.


(1) The Carrier is entitled to perform the transport and all services related thereto in any reasonable
manner and by any reasonable means, methods and routes.
(2) In accordance herewith, for instance, in the event of carriage by sea, vessels may sail with or
without pilots, undergo repairs, adjust equipment, drydock and tow vessels in all situations.

44
7. Optional Stowage.
(1) Goods may be stowed by the Carrier by means of containers, trailers, transportable tanks, flats,
pallets, or similar articles of transport used to consolidate goods.
(2) Containers, trailers, transportable tanks and covered flats, whether stowed by the Carrier or
received by him in a stowed condition from the Merchant, may be carried on or
under deck without notice to the Merchant.

8. Hindrances etc. Affecting Performance.


(1) The Carrier shall use reasonable endeavours to complete the transport and to deliver the goods at
the place designated for delivery.
(2) If at any time the performance of the contract as evidenced by this Bill of Lading is or will be
affected by any hindrance, risk, delay, difficulty or disadvantage of whatsoever kind, and if by virtue of
sub-clause 8 (1) the Carrier has no duty to complete the performance of the
contract, the Carrier (whether or not the transport is commenced) may elect to:
(a) treat the performance of this Contract as terminated and place the goods at the Merchant's
disposal at any place which the Carrier shall deem safe and convenient; or
(b) deliver the goods at the place designated for delivery.
(3) If the goods are not taken delivery of by the Merchant within a reasonable time after the Carrier
has called upon him to take delivery, the Carrier shall be at liberty to put the goods in safe custody on
behalf of the Merchant at the latter's risk and expense.
(4) In any event the Carrier shall be entitled to full freight for goods received for transportation and
additional compensation for extra costs resulting from the circumstances referred to above.

III. CARRIER'S LIABILITY


9. Basic Liability.
(1) The Carrier shall be liable for loss of or damage to the goods occurring between the time when he
receives the goods into his charge and the time of delivery.
(2) The Carrier shall be responsible for the acts and omissions of any person of whose services he
makes use for the performance of the contract of carriage evidenced by this Bill of Lading.
(3) The Carrier shall, however, be relieved of liability for any loss or damage if such loss or damage
arose or resulted from:
(a) The wrongful act or neglect of the Merchant.
(b) Compliance with the Instructions of the person entitled to give them.
(c) The lack of, or defective conditions of packing in the case of goods which, by their nature, are liable
to wastage or to be damaged when not packed or when not properly packed.
(d) Handling, loading, stowage or unloading of the goods by or on behalf of the Merchant.
(e) Inherent vice of the goods.
(f) Insufficiency or inadequacy of marks or numbers on the goods, covering, or unit loads.

45
(g) Strikes or lock-outs or stoppages or restraints of labour from whatever cause whether partial or
general.
(h) Any cause or event which the Carrier could not avoid and the consequence whereof he could not
prevent by the exercise of reasonable diligence.
(4) Where under sub-clause 9 (3) the Carrier is not under any liability in respect of some of the factors
causing the loss or damage, he shall only be liable to the extent that those factors for which he is
liable under this Clause have contributed to the loss or damage.
(5) The burden of proving that the loss or damage was due to one or more of the causes or events,
specified in (a),(b) and (h) of sub-clause 9 (3) shall rest upon the Carrier.
(6) When the Carrier establishes that in the circumstances of the case, the loss or damage could be
attributed to one or more of the causes or events, specified in (c) to (g) of sub-clause 9 (3), it shall be
presumed that it was so caused. The Merchant shall, however, be entitled to
prove that the loss or damage was not, in fact, caused either wholly or partly by one or more of the
causes or events.

10. Amount of Compensation.


(1) When the Carrier is liable for compensation in respect of loss of or damage to the goods, such
compensation shall be calculated by reference to the value of such goods at the place and time they
are delivered to the Merchant in accordance with the contract or should have been so delivered.
(2) The value of the goods shall be fixed according to the commodity exchange price or, if there be no
such price, according to the current market price or, if there be no commodity exchange price or
current market price, by reference to the normal value of goods of the same kind and quality.
(3) Compensation shall not, however, exceed two Special Drawing Rights per kilogramme of gross
weight of the goods lost or damaged.
(4) Higher compensation may be claimed only when, with the consent of the Carrier, the value for the
goods declared by the Shipper which exceeds the limits laid down in this Clause has been stated on
the face of this Bill of Lading at the place indicated. In that case the amount of the declared value shall
be substituted for that limit.

11. Special Provisions for Liability and Compensation.


(1) Notwithstanding anything provided for in Clauses 9 and 10 of this Bill of Lading, if it can be proved
where the loss or damage occurred, the Carrier and the Merchant shall, as to the liability of the
Carrier, be entitled to require such liability to be determined by the provisions contained in any
international convention or national law, which provisions:
(a) cannot be departed from by private contract, to the detriment of the claimant, and
(b) would have applied if the Merchant had made a separate and direct contract with the Carrier in
respect of the particular stage of transport where the loss or damage occurred and received as
evidence thereof any particular document which must be issued if such international convention or
national law shall apply.

46
(2) Insofar as there is no mandatory law applying to carriage by sea by virtue of the provisions of sub-
clause 11 (1), the liability of the Carrier in respect of any carriage by sea shall be determined by the
International Brussels Convention 1924 as amended by the Protocol signed at Brussels on February
23rd 1968 - The Hague/Visby Rules. The Hague/Visby Rules shall also determine the liability of the
Carrier in respect of carriage by inland waterways as if such carriage were carriage by sea.
Furthermore, they shall apply to all goods, whether carried on deck or under deck.

12. Delay, Consequential Loss, etc.


If the Carrier is held liable in respect of delay, consequential loss or damage other than loss of or
damage to the goods, the liability of the Carrier shall be limited to the freight for the transport covered
by this Bill of Lading, or to the value of the goods as determined in Clause 10, whichever is the lesser.

13. Notice of Loss of or Damage to the Goods.


(1) Unless notice of loss of or damage to the goods, specifying the general nature of such loss or
damage, is given in writing by the Merchant to the Carrier when the goods are handed over to the
Merchant, such handing over is prima facie evidence of the Delivery by the Carrier of the goods as
described in this Bill of Lading.
(2) Where the loss or damage is not apparent, the same prima facie effect shall apply if notice in
writing is not given within three (3) consecutive days after the day when the goods were handed over
to the Merchant.

14. Defences and Limits for the Carrier, Servants, etc.


(1 ) The defences and limits of liability provided for in this Bill of Lading shall apply in any action
against the Carrier for loss or damage to the goods whether the action can be
founded in contract or in tort.
(2) The Carrier shall not be entitled to the benefit of the limitation of liability provided for in sub-clause
10 (3), if it is proved that the loss or damage resulted from a personal act or omission of the Carrier
done with intent to cause such loss or damage or recklessly and with knowledge that damage would
probably result.
(3) The Merchant undertakes that no claim shall be made against any servant, agent or other persons
whose services the Carrier has used In order to perform this Contract and if
any claim should nevertheless be made, to indemnify the Carrier against all consequences thereof.
(4) However, the provisions of this Bill of Lading apply whenever claims relating to the performance of
this Contract are made against any servant, agent or other person whose services the Carrier has
used in order to perform this Contract, whether such claims are founded in contract or in tort. In
entering into this Contract, the Carrier, to the extent of such provisions, does so not only on his own
behalf but also as agent or trustee for such persons. The aggregate liability of the Carrier and such
persons shall not exceed the limits in Clauses 10, 11 and 24, respectively.

47
IV. DESCRIPTION OF GOODS
15. Carrier's Responsibility.
The information in this Bill of Lading shall be prima facie evidence of the taking in charge by the
Carrier of the goods as described by such information unless a contrary indication, such as "shipper's
weight, load and count", "Shipper-packed container" or similar expressions, have
been made in the printed text or superimposed on the Bill of Lading. Proof to the contrary shall not be
admissible when the Bill of Lading has been transferred, or the equivalent electronic data interchange
message has been transmitted to and acknowledged by the Consignee who in good faith has relied
and acted thereon.

16. Shipper's Responsibility.


The Shipper shall be deemed to have guaranteed to the Carrier the accuracy, at the time the goods
were taken in charge by the Carrier, of the description of the goods, marks, number, quantity and
weight, as furnished by him, and the Shipper shall defend, indemnify and hold harmless the Carrier
against all loss, damage and expenses arising or resulting from inaccuracies in or inadequacy of such
particulars. The right of the Carrier to such indemnity shall in no way limit his responsibility and liability
under this Bill of Lading to any person other than the Shipper. The Shipper shall remain liable even if
the Bill of Lading has been
transferred by him.

17. Shipper-packed Containers, etc.


(1) If a container has not been filled, packed or stowed by the Carrier, the Carrier shall not be liable for
any loss of or
loss or expense incurred by the Carrier, if such loss,
damage or expense has been caused by:
(a) negligent filling, packing or stowing of the container;
(b) the contents being unsuitable for carriage in
container; or
(c) the unsuitability or defective condition of the container unless the container has been supplied by
the Carrier and the unsuitability or defective condition would not have been apparent upon reasonable
inspection at or prior to the time when the container was filled, packed or stowed.
(2) The provisions of sub-clause (1) of this Clause also apply with respect to trailers, transportable
tanks, flats and pallets which have not been filled, packed or stowed by the
Carrier.
(3) The Carrier does not accept liability for damage due to the unsuitability or defective condition of
reefer equipment or trailers supplied by the Merchant.

48
18. Dangerous Goods.
(1) The Merchant shall comply with all internationally recognised requirements and all rules which
apply according to national law or by reason of international Convention, relating to the carriage of
goods of a dangerous nature, and shall in any event inform the Carrier in writing of
the exact nature of the danger before goods of a dangerous nature are taken into charge by the
Carrier and indicate to him, if need be, the precautions to be taken.
(2) Goods of a dangerous nature which the Carrier did not know were dangerous, may, at any time or
place, be unloaded, destroyed, or rendered harmless, without compensation; further, the Merchant
shall be liable for all expenses, loss or damage arising out of their handing over
for carriage or of their carriage.
(3) If any goods shipped with the knowledge of the Carrier as to their dangerous nature shall become
a danger to any person or property, they may in like manner be landed at any place or destroyed or
rendered innocuous by the Carrier without liability on the part of the Carrier except to General
Average, if any.

19. Return of Containers.


(1) For the purpose of this Clause the Consignor shall mean the Person who concludes this Contract
with the Carrier and the Consignee shall mean the person entitled to receive the goods from the
Carrier.
(2) Containers, pallets or similar articles of transport supplied by or on behalf of the Carrier shall be
returned to the Carrier in the same order and condition as handed over to the Merchant, normal wear
and tear excepted, with interiors clean and within the time prescribed in the Carrier's tariff or
elsewhere.
(3)(a) The Consignor shall be liable for any loss of, damage to, or delay, including demurrage, of such
articles, incurred during the period between handing over to the Consignor and return to the Carrier for
carriage.
(b) The Consignor and the Consignee shall be jointly and severally liable for any lose of, damage to,
or delay, including demurrage, of such articles, incurred during the period between handing over to the
Consignee and return to the Carrier.

V. FREIGHT AND LIEN


20. Freight.
(1) Freight shall be deemed earned when the goods have
been taken in charge by the Carrier and shall be paid in any
event.
(2) The Merchant's attention is drawn to the stipulations concerning currency in which the freight and
charges are to be paid, rate of exchange, devaluation and other contingencies relative to freight and
charges in the relevant tariff conditions. If no such stipulation as to devaluation exists or is applicable
the following shall apply:

49
If the currency in which freight and charges are quoted is devalued between the date of the freight
agreement and the date when the freight and charges are paid, then all
freight and charges shall be automatically and immediately increased in proportion to the extent of the
devaluation of the said currency.
(3) For the purpose of verifying the freight basis, the Carrier reserves the right to have the contents of
containers, trailers or similar articles of transport inspected in order to ascertain the weight,
measurement, value, or nature of the goods.

21. Lien.
The Carrier shall have a lien on the goods for any amount due under this Contract and for the costs of
recovering the same, and may enforce such lien in any reasonable manner,
including sale or disposal of the goods.

VI. MISCELLANEOUS PROVISIONS


22. General Average.
(1) General Average shall be adjusted at any port or place at the Carrier's option, and to be settled
according to the York-Antwerp Rules 1994, or any modification thereof, this covering all goods,
whether carried on or under deck. The New Jason Clause as approved by BIMCO to be considered as
incorporated herein.
(2) Such security including a cash deposit as the Carrier may deem sufficient to cover the estimated
contribution of the qoods and any salvage and special charges thereon, shall, if required, be submitted
to the Carrier prior to delivery of the goods.

23. Both-to-Blame Collision Clause.


The Both-to-Blame Collision Clause as adopted by BIMCO shall be considered incorporated herein.

24. U.S. Trade.


(1) In case the contract evidenced by this Bill of Lading is subject to the Carriage of Goods by Sea Act
of the United States of America, 1936 (U.S. COGSA), then the provisions stated in the said Act shall
govern before loading and after discharge and throughout the entire time the goods are in the Carrier's
custody.
(2) If the U.S. COGSA applies, and unless the nature and value of the goods have been declared by
the shipper before the goods have been handed over to the Carrier and
inserted in this Bill of Lading, the Carrier shall in no event be or become liable for any loss of or
damage to the goods in an amount exceeding USD 500 per package or customary
13
freight unit.

13
https//WWW.bimco.org/~/media/Docoments/Document_Samples/Bill_of_Ladings_Copy_COMBICONBILL.ashx

50
2.6.3 Das principais cláusulas do conhecimento de embarque
• Cláusula Paramount;
• Cláusula de jurisdição;
• Cláusula de abalroamento em caso de culpa de ambos os navios (both to
blame);
• Cláusula de avaria grossa (general avarege clause) e cláusula new jason;
• Cláusula de identificação do transportador (identity of carrier clause);
• Cláusula de definição de viagem (scope of voyage);
• Cláusula de exceção geral (exception general clause).

Cláusula Paramount é uma das principais cláusulas do B/L, na qual


determinará a legislação aplicável, ou seja, um regime convencional internacional,
geralmente a Convenção de Bruxelas para a Unificação Certas Regras em Matéria
de Conhecimento de Embarque (1924 – Regras de Haia), as Regras de Hamburgo,
a Cogsa 1936 (Carriage of Goods by Sea Act), a Convenção de York Antuérpia ou
uma determinada lei estadual.
Cláusula de jurisdição é a cláusula de jurisdição ou de eleição do foro que
determina a competência jurisdicional. Nesta cláusula as partes contraentes
decidirão pelo local onde poderá ser ajuizada eventual demanda judicial, caso não
se alcance uma solução amistosa, justa.

Cláusula de abalroamento em caso de culpa de ambos os navios (both to


blame collision). Esta cláusula reza que, em havendo abalroamento por culpa
recíproca, os transportadores serão responsabilizados de acordo com o percentual
de sua culpa. A Convenção de Bruxelas sobre Abalroamento e Assistência Marítima
(1910), normatiza hipótese de abalroamento concorrente, de culpa comum dos
navios envolvidos no acidente. Neste caso, a responsabilidade é proporcional à
gravidade da culpa; se não determinada, o prejuízo será assumido em 50% para
cada uma das partes. Esta cláusula não é aceita nos EUA.

51
Cláusula de avaria grossa (general average clause) e cláusula New Jason. A
cláusula de avaria grossa determina a legislação aplicável na regulação de avarias
grossas. Geralmente, nelas são aplicáveis as Regras de York e Antuérpia. A
cláusula New Jason autoriza o armador de um navio a exigir contribuição da
regulação de avaria grossa mesmo na hipótese de falta, erro ou negligência suas,
pelos quais o armador não responda por lei.

Cláusula de identificação do transportador (identity of carrier caluse). É usual


a inserção em B/L da cláusula em comento que visa, exatamente, definir quem
deverá ser considerado o transportador. A relevância desta definição é por força do
ônus de assumir a responsabilidade pertinente às gestões náutica e comercial
quando a Carta Partida está atrelada ao TCP (Time Charter Party). A GN a cargo do
armador-fretador e a GC sob responsabilidade do afretador.
Cláusula de definição de viagem. Esta cláusula concede determinadas
facilidades ao transportador relativas à expedição marítima. Usualmente são
incluídas as circunstâncias atinentes a escalar portos não previstos, rebocar e ser
rebocado, salvar vidas e bens, reparar o navio ou abastecê-lo, entre outras.
Cláusula de exceção geral (exception general clause). É a cláusula que
ampara as excludentes de responsabilidade do transportador. De teor variável,
comumente abrange hipótese de excludentes relativas aos atos do comandante ou
tripulação, perigos do mar, atos de guerra, inimigos públicos, aos defeitos latentes,
às greves, às perturbações da ordem pública e de força maior.

Cláusula de negligência (negligence clause). Sob a designação de cláusulas


de negligência se agrupam as cláusulas de não responsabilidade do transportador.
Via de regra, as cláusulas de negligência versam sobre três tipos de exonerações do
armador: a) exoneração por faltas cometidas por seus prepostos; b) relativas a
determinadas ocorrências designadas concretamente; e c) exonerações gerais,
desde que se prove que o armador tenha exercido diligência razoável e não tenha
cometido faltas na estiva ou apresentado navio inavegável.
Cláusula lien (lien clause). Esta cláusula prevê privilégios que podem ser
concedidos ao transportador ou ao embarcador. Entende-se como privilégio o direito

52
de retenção da carga ou do navio em casos que uma das partes tornou-se credora
por uma obrigação não adimplida da outra. Em geral essa cláusula beneficia ambos
os contratantes.

Cláusula de despesas de carga e descarga (condições de frete) As cláusulas


relativas às despesas de carga e descarga geralmente fazem referência às
condições de frete que, normalmente utilizadas em navios de linha regular (liner),
sendo os armadores responsáveis pela carga de costado a costado. O armador é
responsável pelas despesas referentes ao embarque, desembarque e estiva. Cabe
ao embarcador colocar a mercadoria livre junto ao costado do navio. Esta
modalidade é também conhecida pela sigla FFA (free from alongside – livre junto ao
costado do navio).

Cláusula on board ou shipped on board. Esta cláusula é usual no caso de


mercadoria embarcada como carga geral ou a granel. A inserção dessa cláusula
caracteriza que a mercadoria foi colocada no porão do navio, evitando que a carga
seja transportada no convés. Quando a carga for transportada em contêiner, esta
cláusula torna-se prescindível (sem a devida necessidade de seu uso).

2.7 Da gestão náutica e gestão comercial do navio

Podemos dividir a gestão de um navio, para fins de estudo de afretamento,


em Gestão Náutica(GN) e Gestão Comercial(GC).

2.7.1 Gestão náutica

A gestão náutica refere-se à armação do navio, ou seja, à administração dos


fatos relativos ao aprovisionamento, aos salários da tripulação, à manutenção do
navio, aos custos de reparos e seguros, à segurança pessoal e material a bordo, a
operação técnica em geral (navegação, manobra do navio, carregamento, descarga,
estabilidade etc.), ao cumprimento das normas internacionais, à manutenção

53
apropriada da embarcação/navio, à navegação e a tudo mais que se fizer necessário
à navegação.
A gestão náutica se subdivide em gestão administrativa e gestão náutica
propriamente dita. A gestão administrativa se ocupa dos cuidados com o casco, as
máquinas propulsoras e aparelhos do navio que fazem parte da Seção de Máquinas,
seu aprovisionamento, equipagem, certificados etc. A gestão náutica propriamente
dita se refere à navegação, estabilidade, manobra do navio e aos seus aparelhos de
carga e de suspender. Além disso, a gestão náutica é encarregada da implantação e
atualização, a bordo, de Convenções, Regulamentos, circulares e portarias
emanadas da Autoridade Marítima. Como exemplo temos a Convenção SOLAS, a
MARPOL, o STCW, o ISM Code, o ISPS, a LESTA e outras.

2.7.2 Gestão comercial

Considera-se gestão comercial a administração dos fatos relativos à operação


de carga e descarga, à negociação do contrato de transporte e de
locação/sublocação da embarcação/navio, e ao adimplemento das obrigações
comerciais assumidas quer na esfera pública quer na esfera privada, despesas de
escalas e de portos, relacionamento com os corretores, acondicionamento das
mercadorias a bordo, estivagem, cuidados com as cargas durante a viagem e
outros.
A gestão comercial se reflete nos assuntos pertinentes à carga, tais como
angariar e contratar, recebimento e entrega; conclusão de contratos de afretamento
e de transporte, acondicionamento das mercadorias a bordo, estivagem, cuidados
da carga e outros.
Temos, então, que no afretamento por viagem (VCP) o fretador/armador
(OWNER) conserva em suas mãos a totalidade da gestão do navio, tanto a gestão
náutica como a gestão comercial. No afretamento a tempo (TCP), somente é
passada ao afretador a gestão comercial, ou seja, é o responsável pelos contratos
de fretamento, angariar cargas etc; enquanto a gestão náutica fica por conta do
fretador. No afretamento a casco nu (BCP), há transferência de ambas as gestões
para o afretador.

54
Contrato de Gestão Gestão
fretamento Náutica Comercial

BAREBOAT – BCP Afretador Afretador

VOYAGE – VCP Fretador Fretador

TIME – TCP Fretador Afretador

A ANTAQ definiu, através de resolução, as gestões náutica e comercial, com


uma roupagem especificamente voltada à navegação brasileira. Transcreve-se:

“Art. 2.º Para efeitos desta norma, consideram-se:


I – gestão náutica da embarcação: é o controle efetivo pela empresa
brasileira de navegação sobre a administração dos fatos relativos ao
aprovisionamento, equipagens, à navegação, estabilidade e manobra do
navio, à segurança do pessoal e material existente a bordo, à operação
técnica em geral, ao cumprimento das normas nacionais e internacionais
sobre segurança, prevenção da poluição do meio ambiente marinho e
direito marítimo, e à manutenção apropriada da embarcação;
II – gestão comercial da embarcação: é o controle efetivo pela
empresa brasileira de navegação sobre a negociação de contratos de
transporte ou de operações de apoio marítimo e portuário, inclusive
manobra, recebimento e entrega de cargas e suprimentos,
acondicionamento e estivagem a bordo, negociação e conclusão de
contratos de afretamento, adimplemento das obrigações comerciais
14
assumidas nas esferas públicas e privadas;”

Pelo que vimos acima, é de suma importância que as pessoas designadas


para desempenharem os papéis de encarregados das gestões, provenham de
quadros envolvidos com a Marinha Mercante, pois não basta ter “pequenos cursos”
de conhecimentos e atualização, é necessário vivência profissional, principalmente a

14
Resolução nº 1.557-ANTAQ, de 11 de dezembro de 2009.

55
bordo. Alguns armadores, principalmente os nacionais, agora é que estão
despertando para esta necessidade.
A armação e a propriedade são conceitos distintos. A propriedade é uma
noção exclusivamente jurídica e o direito sobre o navio, que confere a seu titular
uma atividade estática por excelência. Proprietário é a pessoa física ou jurídica, em
nome de quem a propriedade da embarcação é inscrita na Autoridade Marítima.
A armação, a contrario sensu, importa em uma noção dinâmica do exercício
da atividade empresarial da navegação.
Armação é o ato de armar o navio, provendo-o de todos os meios para
empreender uma expedição marítima. O conceito de armação abrange toda a
atividade economicamente organizada pelo armador para o provimento de uma
embarcação e sua exploração comercial. Ademais, armar um navio é aprestá-lo e,
concluído o aprestamento, colocá-lo em estado de navegabilidade.
Armador é o empresário individual (pessoa física) ou sociedade empresarial
(pessoa jurídica) que procede a armação da embarcação de sua propriedade ou não
e a explora comercialmente. Efetivamente, armador é pessoa que exerça titularidade
da função náutica ou empresa da navegação.
O armador, em seu nome e sob sua responsabilidade, apresenta a
embarcação com fins comerciais, pondo-a a navegar por sua conta. Evidencia-se,
portanto, que na pessoa do armador consagra-se o empresário da navegação
marítima. Destarte, na acepção jurídica, o armador providencia a armação do navio
e também o explora comercialmente e, via de consequência, assume obrigações
empresariais advindas da exploração econômica do meio flutuante.
A exegese finalista que decorre da análise precedente resvala na
pressuposição básica de que o armador detém e responde pela gestão náutica,
independentemente de ser ou não o proprietário do navio (shipowner, armador
original).
Nos termos de análise precedente, infere-se que a GN é de responsabilidade
do afretador, apenas no BCP (fretamento a casco nu). Nos fretamentos a tempo –
TCP – e por viagem – VCP, a GN fica a cargo do fretador. Depreende-se, por
conseguinte, que o armador é o fretador no VCP e TCP.

56
Há de se ressaltar, além disso, que independentemente da modalidade de
fretamento, o fretador original, ou principal, é sempre o proprietário do navio. Nos
fretamentos principais VCP e TCP se configuraram, portanto, a figura jurídica do
armador–fretador–proprietário.
No BCP o armador é o afretador na figura do armador disponente, ainda
denominado doutrinariamente armador-beneficiário, tendo em vista que vai explorar
o navio que não é de sua propriedade e vai deter a GN e a GC.

2.8 Dos contratos padrões


2.8.1 Asbatankvoy

Devido à dinâmica da negociação no mercado de afretamento, faz-se


necessária a utilização de contratos do tipo padrão para cada fechamento, sem que
haja necessidade de confeccionar um contrato novo a cada navio fechado.
Normalmente, as empresas Majors são as que ditam os contratos que serão o
padrão do mercado, exceção ao modelo de contratos VCP denominado
ASBATANKVOY, criado pela ASBA (Association of Ship Brokers and Agents). Todas
as empresas afretadoras adotam um contrato padrão. As que não têm um de criação
própria, adotam um contrato de outra empresa. Além do contrato padrão, há
alterações que lhes são feitas por intermédio dos denominados Riders, que
modificam a estrutura do contrato padrão, criando então um contrato padrão
modificado. Com isso, cada empresa tem seu contrato padrão distinto, que atenda
às suas peculiaridades.
Obviamente, não se tratam de contratos de adesão, cabendo então
negociação de ambas as partes. Normalmente se chega a um consenso nos termos
do contrato; mas, por vezes ocorre de fechamentos serem cancelados por impasses
na negociação dos termos. Estes contratos são utilizados para o transporte de
líquidos, como combustíveis em geral.

57
2.8.2 GENCON

Em princípio, as partes contratantes são livres de celebrar os termos do


contrato como acharem mais convenientes para si. Mas, usualmente, assinam o
contrato numa forma padronizada, v.g., segundo o modelo aprovado pelo
Documentary Commitee of the Chamber of Shipping, da Grã-Bretanha. Aí os termos
e cláusulas variam de acordo com o tipo de negócio concluído. As formas aprovadas
e que são mais usadas são indicadas por códigos (code names). Por exemplo:
GENCON (Uniform General Charter), aprovado pelo Conselho Marítimo
Internacional e Báltico, BIMCO (Baltic and International Maritime Council). São
contratos que regem os transportes de grãos.

2.9 Do fixture

A negociação de um contrato de fretamento engloba alguma fases pré-


contratuais de extrema relevância sob os aspectos logísticos, operacional e jurídico.
Em conformidade com os conceitos precedentes, denota-se, portanto, a fase
pré-contratual da negociação assumir extrema importância e englobar estratégias de
custos e segurança jurídica. Essencialmente a visão sistêmica é indispensável.
Destarte, é imprescindível verificar a formação dos contratos desde a fase de
negociação.
Portanto, após rigorosamente observadas pelos contraentes todas as
cláusulas vigentes no contrato de fretamento, dá-se lugar ao ato do fechamento do
contrato ou sua consolidação (fixing).
No doutrina americana, Michael Wilford, um dos autores do livro Time
Charters, prega o seguinte ensinamento:

“Fixture before formal charter signed


In the usual case, an oral agreement to charter a vessel is
subsequently confirmed is writing by a fixture letter or telex, and all of the
details agreed to are ultimately set forth in a final typewritten or printed
charter signed by both parts. The final written charter then becomes the
evidence of the contract, and all prior oral or written agreements on details
58
are deemed to have been merged therein. Interocean Shipping Co. v.
National Shipping and Trading Corp., above. This principle is especially
important where there are differences between the fixture telex and the final
charter. In Interocean, for example, there were a number of differences
between the fixture telex and the final document on details such as trading
limits, speed, performance, penalties and method of payment. The court
held that this disparity did not vitiate the agreement, and stated that the
terms of the telex “should be viewed as having merged in the subsequent
writing document, whether favorable to one side or de other. The party that
wanted a provision which was omitted or altered could have pressed for its
15
inclusion in the final writing instrument.”

Quando as partes pretendem efetivar um eventual acordo, regras serão


definidas no contrato de afretamento. No entanto, a questão é saber se este contrato
é apenas para ratificar os termos já esposados, ou se é para discutir algumas
cláusulas de forma que as partes venham encontrar um comum acordo, para que o
contrato venha a satisfazer ambas as partes e, por fim, revestir-se da devida
formalidade através das assinaturas dos contraentes.

É imperioso que um contrato, antes de formalizado pelas partes, deva ter


suas nuances amplamente discutidas. No caso dos afretamentos de navios, há o
costume de se entabular primeiramente um acordo verbal posteriormente
confirmado na forma escrita através de troca de mensagens fac-simile ou e-mails.
Tal prática é adotada por dois relevantes motivos: primeiro, pela agilidade da
negociação; e segundo, pela real possibilidade de as sedes dos armadores
envolvidos situarem-se um em países diferentes.

15
Michael Wilford, Terence Coghlin, Nicholas J. Healy, Jr, John D. Kimball. Time Charters. Second edition, London:
Lloyd’s of London Press Ltd., 1982. p. 9.

59
3 DA NEGOCIAÇÃO DO FECHAMENTO DE NAVIOS E CARGAS

3.1 Da formação dos contratos de afretamento marítimo

A negociação internacional de um contrato de fretamento engloba algumas


fases pré-contratuais de extrema relevância sobre os aspectos logístico, operacional
e jurídico.
Em conformidade com os conceitos precedentes, denota-se a extrema
importância da fase pré-contratual da negociação a qual consuma e engloba
estratégias de custos e segurança jurídica. Essencialmente a visão sistêmica é
indispensável. Destarte, é imprescindível verificar a formação dos contratos desde a
fase de negociação.
Emergem no mercado tramp fórmulas distintas de contratação de fretamento.
Primeiramente, destaca-se a fórmula tradicional de contratação, consubstanciada na
assinatura de instrumento escrito inter presentes, geralmente um contrato padrão
(standard form) com cláusulas adicionais.
A segunda fórmula é notadamente a mais usual, e engendra contratação
entre ausentes, realizando-se a proposta e efetiva ultimação do negócio através da
troca de e-mail, fax, telex ou outros meios de correspondência, para posterior
assinatura de contrato de fretamento.
No tangente à validade do contrato de fretamento cuja manifestação de
vontade seja tácita, há que se observar a questão em específico na respectiva
legislação aplicável ao contrato.
Efetivamente, não se consagra a oralidade do contrato de fretamento e se
exige que este seja representado por um instrumento escrito carta-partida, estando
inclusive sujeito a requisito de forma. Destaca-se, em especial, as legislações
brasileira (art. 566 e 567 do Código Comercial Brasileiro), espanhola e argentina,
entre outras. Não foram detectadas legislações que amparem a celebração do
contrato de fretamento de forma verbal ou ainda cuja manifestação de vontade seja
tácita.

60
3.2 Da função do broker junto ao armador

O cargo broker é um intermediário especializado em fretamentos marítimos;


ele atua em nome dos fretadores e afretadores prestando serviço na área de reserva
de praça e celebração de contratos de afretamento.
Como o contrato de afretamento pode ser entabulado entre dois armadores
cujas sedes de suas empresas estejam situadas em países diferentes o broker pode
atuar como representante de um desses armadores (desde que legitimamente
constituído como procurador de uma das partes).
O broker pode atuar como representante de um dos armadores justificado
pela imperiosa necessidade da formalização do contrato de afretamento por escrito,
pois, em regra, os ordenamentos jurídicos consagram a proposta como elemento
formador do contrato, legítima manifestação de vontade das partes, seja ela por
escrito ou por outros meios de correspondência, como fax, e-mail, telex, ou até de
forma tácita, se decorrer de fatos que autorizem seu reconhecimento. Daí justificar-
se a presença de um terceiro sujeito interveniente (para a consagração de um
instrumento particular, mister se faz a presença de dois sujeitos intervenientes
fundamentais – fretador e afretador) que é o cargo broker.

3.3 Dos requisitos básicos para o fechamento de uma negociação

Geralmente, se destacam as seguintes fases da negociação de um contrato


de fretamento:
I – proposta, comumente denominada oferta firme (firm offer);
II – respostas;
III – recap (recaptulation);
IV – fechamento do contrato (fixture).
Nos contratos preliminares, a contratação, como regra, se inicia com a
apresentação de proposta owners firm offer (oferta firme do armador) cujo teor varia
de acordo com a modalidade de contrato de fretamento e referencia o prazo de
aceitação da proposta. Analisada a proposta, o afretador se manifesta:

61
I – aceitando parcialmente (charterers accept owners, except ...), resposta
comumente denominada contra (counter);
II – recusando a maioria dos termos e reinviando uma contraproposta (counter
offer);
III – recusando totalmente os termos oferecidos (charterers declaine owners
offer without); e
IV – aceitando e procedendo ao fechamento do contrato (fixture).

Nas respostas contra e contrarrespostas, é usual a adoção de subjects to


details. As negociações continuarão neste envio sucessivo de propostas e
contrapropostas, até que se encontre um ponto de equilíbrio e se tenha atingido a
concordância nos termos contratuais.

3.4 Da expedição do recap

Usualmente o fechamento do contrato é precedido de uma fase de


recapitulação e edição de um documento final (recap) para última análise pelos
contratantes dos termos essenciais que embasarão o contrato. O recap
(recaptulation) resume, efetivamente, as condições de fechamento do contrato de
fretamento.
Inexiste consenso a respeito do valor vinculativo do recap. Para determinação
do exato valor vinculativo, primeiramente, há que se analisar o momento da fase de
recapitulação e elaboração do recap.
Nas hipóteses de o recap ser efetuado antes da conclusão do acordo ou
ainda, na hipótese de haver recap logo após o fechamento do contrato (fixture) e
ocorrer uma transcrição exata das condições antes convencionadas em comum
acordo, o recap representa efetivamente a própria consolidação do contrato.
Todavia, se o recap efetuado antes da ultimação do acordo de vontades não
é aceito por um dos contratantes ou, alternativamente, na hipótese do recap ser
apresentação após a contratação e houver inserção de alguma condição nova, o
recap não será considerado um roteiro final dos termos efetivamente contratados.

62
A fase final da contratação enseja o fechamento do contrato, sua respectiva
celebração e a especificação dos details.
Portanto, após todos os detalhes acordados sob última análise, dar-se-á o
contrato de afretamente concluído, consolidando-se o fixture.

3.5 Navio fechado

O termo em epígrafe tem enorme afinidade com os navios tramps, cujas


viagens são promovidas com carregamentos destinados a um importador, ou usados
por um exportador para atender um ou mais importadores. O importante é ressaltar
que, o termo navio fechado pressupõe o transporte de um tipo de carga, ou o
afretamento exclusivo para um afretador.

A expressão em debate é mais aplicável aos casos de contrato de


afretamento do navio por viagem (VCP), cuja natureza jurídica deste contrato é
indefinida como visto anteriormente, pois, em se tratando de contrato de afretamento
de navio, sua natureza jurídica é locatícia. Apesar de este contrato ser definido como
de afretamento, há divergência doutrinária pelo fato do afretador não deter a
responsabilidade das gestões náutica e comercial, o que dá ampla caracterização de
um contrato de transporte.

No entanto, sem adentrar na questão meritória da natureza jurídica do


contrato de afretamento por viagem, quis-se exaltar este instrumento particular com
o objetivo de demonstrar que tal avença é praticada quando o importador, ou
exportador, tem a intenção de “fechar o navio” com um único tipo de carga. E tais
contratos de afretamento são mais usuais entre os navios graneleiros, mineleiros,
tanque, gaseiros.

Pode-se citar como um exemplo clássico todos os navios-tanques, químicos e


gaseiros que não fazem parte da frota da TRANSPETRO, mas que distribuem os
derivados de petróleo (GPL, gasolina, diesel, querosene) em toda a costa brasileira.
Todos esses navios encontram-se afretados à TRANSPETRO pelo simples motivo
de esta empresa de navegação não deter uma frota suficiente para atender à
demanda nacional. Portanto, como esse tipo de carga é una, a TRANSPETRO firma

63
contratos de afretamento por viagem com diversas empresas que distribuem
combustível por toda a costa brasileira. Contratos esses em que o navio transporta
um tipo ou mais de um tipo de carga; entretanto, o afretador utiliza-se de todo o
espaço do navio para, então definir-se o destino da carga. Mas o importante é que o
navio está plenamente comprometido – “navio fechado”.

3.6 Da conduta do broker defronte a prática de misrepresentation

Misrepresentation é uma figura jurídica que pode emergir nos contratos de


afretamento. Significa uma falsa informação ou declaração (no rigor da tradução)
acerca do objeto foco da transação comercial, declarada por uma das partes em
detrimento da outra, no firme propósito de induzir em erro para tirar vantagem para
si. Por exemplo: uma empresa de navegação está com sua saúde financeira
abalada e seus navios estão sem cargas; nesse momento, aparece uma outra
empresa interessada em fechar um contrato de afretamento visando alguns navios
daquela empresa. Contudo, a empresa que será a eventual fretadora fica sabendo
que a empresa interessada deseja consolidar a negociação desde que os navios
apresentem determinadas especificações como, por exemplo, apresentarem porões
com certa metragem cúbica, velocidade de cruzeiro “x” e consuma uma determinada
tonelagem de fuel oil.
Como a empresa fretadora necessita chegar ao fixture do contrato, informa à
empresa afretadora que todos os seus navios atendem perfeitamente às suas
exigências, quando na verdade os porões são de menor capacidade, a velocidade
de cruzeiro não é a desejada e o consumo de óleo combustível é maior que o
pretendido do afretador. Nesse caso, está caracterizado o misrepresentation, uma
vez que as informações foram fraudulentas, ou seja, revestidas de plena má-fé com
um único objetivo: o de induzir em erro a outra parte.
Para a inequívoca caracterização do misrepresentation é necessário que tais
informações eivadas de vícios tenham sido proferidas por alguém que tenha perfeito
domínio técnico sobre o tema.
A parte lesada na referida avença pode rescindir o pacto. Assim é o
posicionamento de Michael Wilford:

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“Rescission for misrepresentation

A party who has been induced to enter a contract by a


misrepresentation will usually have the right to rescind that contract, whether
the misrepresentation was made fraudulently, negligently or innocentely.
Rescission means that the way refuse to perform (or perform further) and
16
may take proceedings to recover money paid property transferred.(…)”

16
Michael Wilford, Terence Coghlin, Nicholas J. Healy, Jr, John D. Kimball. Time Charters. Second edition, London:
Lloyd’s of London Press Ltd., 1982. p. 25.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Dentro do contexto abordado, nota-se que a carência de um ordenamento


internacional para dirimir eventuais pendengas oriundas de avarias provocadas às
mercadorias durante o percurso do navio. Já é tempo de o Brasil interagir
definitivamente com o comércio globalizado.
Corroborando com a ausência da chancela brasileira em favor das
Convenções internacionais atinentes à responsabilização do transportador marítimo,
há uma profunda lacuna pertinente à literatura especializada que aborde o Direito
Marítimo no Brasil.
É notória a necessidade de se promover discussões e pesquisas sobre este
tema como também preparar profissionais, acadêmicos e especialistas, para
enfrentar a realidade das diferenças normativas existentes entre as convenções
internacionais e a legislação brasileira.
Patente está que o direito interno não se ajusta às necessidades dos
proprietários da carga e armadores no sentido de estabelecer tanto as
responsabilidades como as suas excludentes. Os dispositivos normativos brasileiros
não são detalhados, tampouco elaborados para suportar um transporte
internacional.
Uma das normas que ainda se encontra vigendo no seio do universo
normativo brasileiro é o obsoleto Código Comercial, que remonta do ano de 1.850,
ou seja, uma legislação promulgada sob a lavra de D. Pedro II.
A legislação nacional atende sim aos contratos nacionais. Todavia, não é o
suficiente: o Brasil deve entrar em sintonia com os avanços da globalização em
curso.
Nesta esteira de raciocínio, conclui-se pela enorme desvantagem para um
país, como o Brasil, exponencial exportador, encontrar-se desassitido de fornecer
uma legislação eficaz e completa, a fim de garantir a segurança jurídica às entidades
estrangeiras para realizarem mutuamente negociações prósperas.
O atual cenário jurídico afeto ao transporte marítimo internacional encontra-se
tão defasado no Brasil, que muitos exportadores, ou consignatários, sujeitam-se a
firmar o B/L cuja legislação a ser aplicada (determinada na Paramount Clause) será
a Convenção de Bruxelas.

66
Na mesma dinâmica em que os contratos de transporte são firmados, os
contratos de afretamento acompanham o mesmo ritmo. Estes encontram-se
umbilicalmente relacionados com o cargo broker, que atua sobretudo nos navios
liners. A figura do cargo broker tem relevante importância no cenário do transporte
marítimo, pois é o responsável para completar as praças dos navios. Tanto o
exportador como o armador necessitam de seus serviços. Aquele porque tem que
despachar a sua mercadoria vendida ao destino do importador. Já o segundo, é pelo
óbvio fato de que o navio deve navegar com mercadoria, cujo objeto da prestação
de serviço é a sua receita para manter a boa saúde financeira da empresa.
De outra banda, o cargo broker também pode operar como representante do
armador a fim de consolidar os contratos de afretamento.
No entanto, conclui-se pela iminente adoção das normas internacionais, haja
vista que a teoria dualista adotada pelo Brasil não permite a tácita recepção de uma
convenção internacional a não ser que seja devidamente submetida à apreciação do
Congresso Nacional para, em seguida, ser sancionada pelo Presidente da República
através de decreto (o único que detém força de lei ordinária), tal qual exige a nossa
Carta Magna/88.
Do contrário, o Brasil quedar-se-á suscetível de enfrentar verdadeiros
conflitos de competência no que tange à legislação aplicável, provocados pela
resistência oferecida à não ratificação de quatro diferentes convenções (Regras de
Hamburgo, Haya-Visby, Regras de Haya [Conveção de Bruxelas] e COGSA-1936),
que regem o transporte marítimo internacional, responsável, nos dias de hoje, por
cerca de 80% do comércio mundial.
No caso do Brasil, navegar é preciso!

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Referências

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