Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Editorial ------------------------------------------------------------ p. 5
Benício Gon -------------------------------------------------------- p. 7
Duayer -------------------------------------------------------------- p. 12
Íris Ladislau ------------------------------------------------------- p. 19
Maria Isabel Machado ------------------------------------------ p. 25
Gabriele Rosa ----------------------------------------------------- p. 30
Thiago Soares ----------------------------------------------------- p. 34
Daniel Rodas ------------------------------------------------------ p. 39
Miriam Freitas ---------------------------------------------------- p. 45
O Rei Ricardo Coração de Leão ------------------------------ p. 50
Milena Martins Moura ------------------------------------------ p. 56
Luciana Assunção ------------------------------------------------ p. 60
Ivan Nicolau Corrêa --------------------------------------------- p. 67
Vivian Pizzinga --------------------------------------------------- p. 75
Nitiren Queiroz --------------------------------------------------- p. 78
Luciana Moraes -------------------------------------------------- p. 85
Giovani Miguez --------------------------------------------------- p. 97
Nuno Gonçalves ------------------------------------------------- p. 103
Agradecimentos ------------------------------------------------- p. 115
Editorial
Da terceira dentição:
O dente cresceu
Dente agora é onça
O dente cresceu
Dente agora coça
Dente que é dente coça
Dente que é dente onça
Onça ruge onça ruge onça ruge onça ruge onça ruge onça
ruge onça ruge onça ruge onça
Raaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaauuuuuuuuuuuuuuuuu
uuuu!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Voo do Kururu!
Sucuru cresceu. Sucuru não tem medo de gente. Sucuru é gente. Sucuru é bicho. Sucuru
é gente que é gente e bicho. É bicho que é bicho e gente. Sucuru é gente. Gente e agente
secreto. Gente e agente concreto. Do hoje. Do agora. Do passado no facão da hora.
Cortando o tempo em fatias.
Sucuru é canto. É o canto da origem do mundo. Canto-origem do mundo. Sempre no
canto. Nunca no mudo. Fritando a origem do fundo. Britando os muros do mundo. Para
além do sol: visagem. Para além do sol: paisagem. Para além da lua: miragem? Não:
Construção. Sucuru constrói no povão. No grito do rio e do cão. Latindo: olhar da roça.
Rugindo: rolar da onça. Engolindo o sol pra nascer a Arte. Engolindo a Arte pra nascer
o sol. Desfiando o sol pra fazer a Arte. Desgolindo a Arte pra nascer o sol.
Arte e sol: faz parte. Quente do mundo-sertão. Mundo de origem. Céu de visão.
Nascendo semente da terra. Crescendo na várzea e na serra. Quer guerra? Parte! Quer
guerra? Arte!
Toda Arte é Arte de guerra. Toda Arte é guerra sem guerra. Toda Arte nasce. Toda Arte
cresce. Do ventre solado da Mãe-Terra. Do corpo gerado da Mãe-Serra. Quem nasceu?
Quem viveu? Quem resiste e nunca morreu. Quem resiste pois nunca morreu. Quem
morreu? Eu. Quem nasceu? Eu.
Quem morreu em nome do povo: Presente! Quem morreu explorando o povo: Ausente!
Quem nasceu como parte do povo: Pressente! Quem nasceu como Arte do povo:
Presente!
Toda Arte toda gente é povo. Toda Arte é parte do novo. Nascer crescer. Morrer nascer.
Ciclo infinito. Ciclo no rito. Ao grito incontido. Nascer infinito. Morrer desmorrido.
Sempre em frente. Sempre enfrente. Nunca ausente:
Sucuru!
Equipe Sucuru
OBÁ
Nasceu em Tombos, na Zona da Mata em Minas Gerais. Reside no Rio de Janeiro desde
os 10 anos de idade, com breves passagens por Teresina (1991) e Vitória (2010-2013).
É jornalista formado pela UFF (Universidade Federal Fluminense). Iniciou sua carreira
em veículos de comunicação como repórter na Rádio Jornal do Brasil e como fotógrafo
na Revista Manchete.
Tem quatro livros infantis publicados e alguns outros em preparação. Em 2020 lançou o
livro ―Salve-se Quem Puder – Cartuns e Fotos de Duayer‖, obra com suas fotografias,
cartuns e breve pincelada de sua biografia, comemorando os 50 anos do Jornal O
Pasquim.
Teve trabalhos publicados nos jornais Última Hora, Diário de Notícias, Jornal do Brasil,
A Crítica, etc; em revistas nacionais como Playboy, Status, Mad, Ficção, Revista do
Faustão, Visão e em revistas internacionais como a World Press Review, nos Estados
Unidos, Free Press na Holanda, Libération, na França; possui algumas premiações em
fotografia e cartuns e seus trabalhos foram expostos em vários países da Europa e
América Latina.
A primeira
A mais amada
Rebeldia involuntária
paixão malsã
eu mordi a maçã
Geena
ao caminho perdido
Escolha aliciada
A fogueira crepitava
e eu vendo-me acesa
joguei-me enlevada
se não me calo
se muito vejo
se não cedo
ao teu apelo
Estase na noite
liturgias vespertinas
Letargia arquejante
epifania velada
quebro o realejo
Ver-te, tocar-te
O mistério te consagrou
e o mistério te enfraqueceu
ESFERA CELESTE
PRONUNCIAMENTO
fui pequena numa cidade menor ainda. lembro de correr na rua livremente. girar e girar
e girar com os olhos fechados até cair gargalhando no mato alto e fofinho e cortante.
sozinha e comigo mesma. comer bolo quente da vó no fim de tarde com os pés sujos de
barro. gosto do barro vermelho. carregava o meu agasalho pra todos os lugares.
amarrado na cintura. voltava sempre carregada de frutinhas roubadas nas árvores do
caminho. queria ter tempo. ensinar a vida boa e simples para minha cria. manicure tem
licença-maternidade? a vida é fácil quando se é criança. um dia meu pai não voltou para
casa. só lembro das lágrimas da minha vó me dando uma de suas xícaras, a que eu mais
gosto, a de asinha quebrada. o barulho do motor do ônibus embalava meu sono. o
corredor comprido de muitos assentos ocupados foi minha casa durante quatro dias.
minha mãe brincava comigo durante os dias, sentadas juntinhas no banco quadrado.
sacolejava muito e como eu sorria! foi uma grande aventura. meu casamento é uma
grande aventura. ninguém é perfeito. o ônibus parou. chegamos num lugar
movimentado. muitas luzes. cores. lembro da mamãe dizendo que precisaria de óculos
com tamanha claridade. tudo era grande e cheio e rápido. tia Sandra esperava pela
gente, ela era uma moça alta e muito magrinha, bonita, batom vermelho na boca, eu ri,
mamãe ralhou comigo baixinho. as moças da vizinhança não usavam batom. meu
agasalho, amarrado na cintura, ficou carregado de areia e cheiro de mar.
dívida
bacilo
anamorfose
não há palavras
não há silêncio
nem mão nem sopro
contra as fechaduras.
sem ventos e
os corpos ainda
desaparecidos.
no meio do caminho
apenas a vespa
espasmo
torção e cisco
buraco no objeto
asas, chaves
morte/milagre
Nota: Gilgamesh é o personagem principal do poema épico sumério Epopeia de Gilgamesh, escrito em acadiano por volta do século
XX A.C., sendo considerado o texto poético mais antigo de que se tem notícia – antecedendo a obra de Homero em mais de mil anos.
A narrativa acompanha Gilgamesh, o lendário rei de Uruk, em uma série de aventuras que culminam numa busca existencial pelo
segredo da vida e a imortalidade. Inspirado na linguagem da epopeia e em seus elementos simbólicos, este poema parte do arquétipo
do herói mítico e o reconstrói numa narrativa contemporânea, mesclando elementos de diferentes culturas.
Daniel Rodas (Teixeira-PB – 1999) é escritor, poeta e dramaturgo. Estudante de Letras
(UEPB). Editor da Revista Sucuru. Autor da plaquete Eros e Saturno (Editora Primata,
2021), tem textos publicados em vários meios eletrônicos, a exemplo das revistas
Mallarmargens, Ruído Manifesto, Toró e Subversa. Faz parte do grupo de teatro
ExperIeus da cidade de Monteiro-PB, onde colabora como ator. Pensa na poesia como
um fluxo, como o fluir incontrolável da vida. Publica seus textos no blog:
www.faroisnoturnos.blogspot.com.br
PESTE
Apocalipse e morte –
Das avós.
Os insetos invisíveis
INOMINÁVEL
às margens da vida
como ofício.
atravessa a carne,
a espada de prata
UMA CANÇÃO
transformando em carícias
e sal.
mistérios no horizonte
2.
as gotas esquecendo no parabrisa
à espera de um calor
que lhes enxugue as formas
e se refletem
como contas sem colar
acumulando nas quinas
Era quase uma adolescente quando vi uma mesa de café da manhã nordestina pela
primeira vez. Foi uma revelação de que a vida podia ser opulenta e afável. Até então,
todo o meu universo era contido, até áspero, como as histórias de Cora Coralina. Goiás
tem uma alma um pouco avara, de carestia. Ainda que não seja pobre, é simples, básica
e espartana. Uma consciência de que se é possível sobreviver com pouco, para que ter
mais.
Não há espaço para as metáforas no imaginário goiano. Cresci numa família literal. A
vida exige praticidade. Os bolos são de fubá ou, no máximo, o mané pelado (de
mandioca). Bolo de bolo, um café preto. Às vezes, uma broa ou um biscoito frito de
polvilho com queijo. A pamonha só na época da safra de milho.
Acho que as comidas que ofertamos ou cozemos traduzem um bocado do que somos.
Aquelas mesas nordestinas repletas de opções quentes e frias, um banquete diário, são o
próprio cerne hospitaleiro e afetivo dos baianos e piauienses. Provavelmente de todo o
Nordeste, uma região que se forjou à base da doçura da cana-de-açúcar. Não que o
melado escorresse para a senzala, muito pelo contrário. Mas não estou aqui para evocar
Gilberto Freyre.
A vontade de reunir o clã para boas prosas em torno da abundância deixava a menina
surpresa e feliz quando estava de férias nas bandas de lá. Banana da terra e abóbora
cozidas, fruta-pão, bolo de goma, atas, caldinhos diversos, cuscuz, carne de sol matinal,
pão de ―massa fina‖, pão de ―massa grossa‖, mungunzá… Opulência gastronômica lá
em casa somente nas datas especiais: Natal, Páscoa e Dia das Mães. No dia a dia, só a
comida de subsistência mesmo.
Nem no Rio de Janeiro, cidade que sempre visitava com a madrinha, ela experimentava
essa vontade de servir e de ser servido com cores e sabores múltiplos a cada manhã, a
cada almoço e a cada lanche da tarde, como sói ter os nordestinos.
Ontem, meu amigo piauiense afirmou: ―me desculpe, acho que vai ficar chateada, mas
as festas juninas de Brasília são uma bosta!‖. HaHaHa, como comparar com as
verdadeiras festas sertanejas? Claro que são. Ninguém bate o Nordeste em matéria de
calor humano e folia regados a comidinhas confortáveis.
As casas dos goianos, ainda que sejam ―bem de vida‖, são simplórias. A mentalidade de
escassez, de parcimônia, é a tônica. Decoração, pra quê? Mamãe vivia num dos bairros
mais elegantes da capital federal sem quadros e sem aparelho de som. Era algo
completamente inimaginável para mim. Insisti muito para que comprasse umas telas,
coisa que fez sem dar a mínima bola, provavelmente para a caçula parar de lhe encher o
saco.
Sintomático que dois amigos goianos tenham me dito, em ocasiões distintas: ―acho que
minha casa é mais decorada por você do que por mim‖, de tantos presentes que lhes dei
para aplacar o branco excessivo do apê de ambos.
Conjecturo que o espírito goiano não tem paciência para firulas e rapapés. É um pé de
boi. O do nordestino é um vestido de chita, uns bonecos de barro delicados. Deve ser
por isso que a música de raiz do Goiás tem chifres (de todos os tipos), curral, terra
vermelha, botinas e botinadas. É uma música sem adereços, que diz ao que veio. Do
Nordeste, ainda que falem do sofrimento sertanejo, tem flor de mandacaru nos cabelos
das moças. É alegre em sua essência rítmica de xotes, baiões e frevos.
Não pensem que estou renegando minhas origens. Gosto muito da minha parcela
goiana. Me identifico 100% com ela. Aqui são apenas digressões sobre as diferenças na
amálgama de dois povos que, em Brasília, se mesclam e dão o tom dessa mistura de tatu
com cobra. Metade esquiva e caipira a la goianos. Metade matreira e resiliente tal qual
os nordestinos.
P.S.: a expressão popular tatu com cobra faz referência a pessoas sem vontade, sem garra,
porém, sempre ouvi mamãe utilizá-la como ―mistura esquisita ou coisa que não tem nada a ver
uma com a outra". É nesse sentido da memória afetiva que me valho nessa crônica.
Boreste
O barco, ainda que ancorado no meio do lago, não se permite a imobilidade. Primeiro,
flutua. Ação estóica e altiva para um ente com tamanho peso.
O barco não se conforma com a âncora que lhe tolhe. Faz rotações em torno de si. A
popa vira proa e vice-versa.
Se o observador fechar os olhos por átimos, captura outro ângulo. Um barco, portanto, é
sempre proparoxítono: átomo e tônico.
Pancetti deve haver enxergado a impermanência quando movia os pincéis de sua arte na
areia das enseadas.
O barco, ainda que domado, não permanece estático. Ele sabe que o único destino é
navegar.
Nem naufragado o barco é morto. Torna-se casa de peixes. Conta uma história de terror.
Por isso, enquanto se revela e se rebela sobre as águas, à espera de singrar no boreste, o
barco emite sons fantasmagóricos.
Seres imperceptíveis a olho nu cutucam o casco. Gnomos de guelras batem os pés na
quilha sob a lâmina aquática.
Tu, qtiz, clim, grum. Barulhos irreproduzíveis no abecedário dos humanos, capaz
apenas de ouvi-los como um mantra de assombrada quietude.
É na tensão entre a custódia e a liberdade do barco, que as sereias ficam alertas: instante
no qual decidem se o encantam ou se o ignoram.
Vórtices
"Agora abria as janelas e portas, escancarando-as para que o ar penetrasse nos aposentos
e tirasse de lá minhas ansiedades mofadas e todas as moléstias possíveis".
(Olga Tokarczuk, em Sobre os Ossos dos Mortos)
Segredismo
Cavalguei um segredo no domingo. Olhando para ele não parecia tão misterioso ou
indecifrável. Por isso não tive medo. Subi num impulso só, me acomodei em seu lombo
e pronto. Estava domado. Puxei a rédea de sua liberdade com determinação. Não se
pode deixar segredo correr sem direção. Segredo é segredo e sempre pede constrição,
comedimento. Se assim não fosse, era caso de livro aberto e não algo que se esconde.
O sol estava majestoso lá em cima. Derramava amarelo que verdejava profundamente a
pastagem e a plantação de eucaliptos. Queria me afastar o mais longe possível de
qualquer sinal de humanidade para compartilhar aquele segredo só comigo. Um segredo
de mim para mim. Corri. Galopei. Em poucos segundos, o chapéu voou. Não teve
coragem de viver aquela intimidade. Vermelho esquecido no marrom da estrada.
Segui partilhando meu segredo morro acima. A subida num fôlego só, profundo,
bufante. Aos poucos eu não sabia mais onde começava o segredo e terminava a minha
pulsação. Monobloco de artérias e suor. Segredo se revelava para mim uma espécie
orgulhosa, cheia de personalidade, quase selvagem. Mas não é característica de todo
sigilo essa volúpia?
Não é à toa que coça a língua, formiga o corpo, dá tremeliques. Guardar segredo é tarefa
hercúlea. Porque ele quer se soltar no vento, no pasto, na ribanceira. Segredo quer ser
livre de qualquer cabresto. Quer ser ele mesmo, não outro. Não mais um. Não dois.
Segredo que viver sua vida sem dar satisfação e reverência a ninguém. Muito menos aos
que não sabem como cavalgá-lo com altivez.
Então me pus ereta, confiante. Gritei: vamos! E chegamos ao topo do mundo. Pelo
menos daquele mundo. Éramos nós dois e a paisagem lá embaixo. Nossos corações
batiam no mesmo ritmo intenso e confidente. Já nos entendíamos sem palavras ou
gestos bruscos.
O oculto clareou e imperceptivelmente me tornei um centauro. Quimera. Segredo abriu
seus flancos e me absorveu. Fagocitose. Impossível não sorrir como quem conquistava
um império.
Vísceras e gerânios
Kafka
A chuva se arma para a batalha contra a terra. Convoca os aliados: ar de trovões e fogo
de relâmpagos, lançados sobre árvores assustadas.
Sementes e folhas alcançam o solo: passos sorrateiros de gnomos invisíveis.
A barata cruza a calçada em busca de outro abrigo,
apressada.
Nuvens grávidas, pesadas, sentem as dores do parto. Movimentam-se furiosas, em
agonia.
A chuva ameaça, se prepara para furar o bloqueio do chão compacto.
Boa parte das vezes, mera bravata.
(sorte da barata e azar o meu)
Faro(lete)
Há 38 anos ele suporta a cangalha. Por isso não era de se estranhar que perdesse a noção
de si mesmo, sem o peso do jugo daquele apetrecho que apenas cambiava de cor, de
grau ou de forma, mas mantinha o domínio.
Contudo, bastou um momento de deslize do parasita para, de repente, se perceber digno.
Uma montanha escarpada, sólida, bem desenhada pela combinação de genes. A crista
alongada, despida de relevos perceptíveis. Inexistentes depressões e fraturas.
Alpinistas morreriam para escalar aquela face, um deles, inclusive, ousou afirmar que
seria perfeito. Assim se sentiu ao se tatear desprovido do indefectível adereço opressor.
Liberto, não somente durante o sono, mas ainda lúcido, permitiu-se a alegre solidão de
ser longilíneo e delicado. Às vezes, úmido pelas gotas de orvalho que apareciam de uma
hora para a outra.
Estável e simétrico, sem dúvida. Seus túneis esculpidos com precisão, quase sempre
desimpedidos, rumam para o interior sem pedágios.
Concluiu, então, que ele era, de fato, um monte sagrado de ar respirável. Talvez um
vulcão pacífico a dominar a paisagem do rosto que, ao contrário dele e para lhe dar mais
fidalguia, era impreciso.
Luciana Assunção, Lulupisces, jornalista e publicitária formada pela Universidade de
Brasília (UnB), com pós-graduação em Comunicação com o Mercado pela Escola
Superior de Propaganda e Marketing (ESPM-SP). Nasci em Brasília e não escapei à
sina de ser servidora pública federal, desconsolada como Drummond. Pisciana com
ascendente em Leão, vivi em Sampa e em Nova Iorque. Autora do blog de textos
―Pisciana de Juba‖: lulupisces.blogspot.com
Meu livro de estreia, As desventuras de uma mulher que levou um susto em sobreviveu,
foi lançado pela editora carioca Confraria do Vento, em 2019.
Tempestades
mim.
sensação...
lascívia...
inefáveis e disformes,
a forma de um sentimento
outros...
poema? ...
subjetividade
movem ...
E se movem... E conversam...
É finito e infinito,
Feio e belo,
É real e surreal,
de sentido e de saudade?;
ou um nome/forma e imagens
Imutáveis ...
Mergulham na sede:
Ah, o sentido!
O sentido do sentir,
navegantes e móveis...
as várias faces da mesma face ...
todos os fragmentos...
se formando e deformando,
se transformando...
pluriformes... inacabados...
em processos de mudança...
perfeitamente imperfeitos...
belamente horrendos...
Os mares e a assimetria da simetria ...
vida/morte/transcendência/transformação,
do som do trovão,
do que brota,
escorre, se esvai,
que vive,
pulsa, arde,
respira,
na multiplicidade,
no único vasto,
noite
(você no escanteio)
bocas discutindo entre si quando o mais certo seria fechar os olhos e dormir, à noite.
Na praia da pedra
moldam-se
novos corpos de lama
Na cheia da lua
habitam sururus,
alimentam-se do sal
das águas:
Serpente enrolada,
prepara o salto da pedra
à boca do andrógino:
o anoitecer na mata de vidro
acoberta a fumaça
do alecrim.
(a natureza do ferro
me revela o caminho)
Submerso na lama, o
iniciado monta o caranguejo
e oferta
fumo ao pai do mangue —
também se ajoelha para Nanã,
cuja bela face
tão poucos puderam
vislumbrar.
É no canal
que as águas
copulam
para fecundar
esta terra.
No silêncio do canal
vi
minha mãe
a cantar o padê.
Ostentava a calunga
fazendo
da água fermento
agora massa
movida
pelo pássaro que
rodeia o mundo.
5
Não me abandone
minha mãe à fúria
dos aratus, fogos
que correm
pelas raízes expostas
dos manguezais.
Salva-me da risada
dos caranguejos.
Nota: Os poemas da série ―Pequenos Voos Na Lama‖ fazem parte do livro Pelos Olhos
do Jaguar que lancei ano passado, e foram escritos quando estava no Quilombo de
Siqueira em Rio Formoso - PE (a família da minha esposa é de lá).
Nitiren Queiroz nasceu em Carapicuíba, SP, em 1980. Atualmente mora em Osasco,
SP, com sua esposa e sua filha. Educador e dançarino. Mestre em Psicologia
Educacional e graduado em Comunicação e Artes do Corpo. Membro do coletivo de
Hip-Hop Guetto Freak desde 1995, foi a partir de suas vivências nas linguagens do
Breaking e do Rap que adentrou o universo da poesia. Foi membro do coletivo Tantas
Letras que organiza o sarau Lapada Poética. É autor dos livros Nêfesh pela Dobra
Editorial (2014) e Pelos Olhos do Jaguar pela Editora Urutau (2020), além de participar
da antologia Nada Mais Parecido a Um Fascista do que Um Burguês Assustado pela
Editora Hecatombe e publicação de poemas na Revista Subversa e no Portal E.M.
Cioran.
"Apartamento", Gonzalo Sicre (1967-)_ diálogo ecfrástico
,)
Vermos Plêiades no atlas aberto
enquanto o besouro passa na cortina
e no quarto (,
dias asfixiados
informes
destinados, sim
a experiência intrauterina das cores
como na rua deserta
noite iminente
apenas na presença
do
poste e árvore
mundo constelado
submundo dos segundos:
Maria acalentando seu bebê
Joana esperando
ver o lindo Sol
no rosto único /sede/
/assim/ da expressão /qualquer/
interna dança /coisa/
do infinitesimal /serena/
tempo do sopro
E colorir é a raiz da equação que
perdemos
entre a ação da britadeira e a
combustão
dela A floresta
E colorir é raro
morre
E colorir é rápido
sonho
E colorir é a razão
E
E colorir
E colo
Eco
E se
,)
Vermos Plêiades no atlas aberto
hoje (,
Peregrino no PandeMundo
Versão de 5 haicais
A morte é viagem
Carne viva abre a janela:
bebe toda cor
***
O sonho é imagem
Carne viva abre a janela:
arde a madrugada
***
Música da noite
A carne lança a palavra:
som do germe oculto
***
Um corpo com fome
peregrina e olha a lua:
um homem sem nome
***
arde a madrugada
Ás de toda cor
pulsa em cada dor
toca em vários tons
canta com a noite
som do germe oculto
o sonho é miragem
cresce com a noite
som da madrugada
e cai o germe oculto
cresce a madrugada
***
Lembranças
Luto
entre
a
vida e a morte
Luto
tanto
Luto
***
como
meia
vida
anda
à meia-noite
entre
tanto
luto
sonha
***
ávida
sangue
entre
vista
eé
a morte papapá
luto
entre
vida
há
e
***
nu e
gozo
plânula
viva
água
de molho luto entre
tanto
somo
veste
à esta
noite
***
vem
só
hoje
Luto pela
vi(n)da
só
no
***
Vi
vida
e
morte
geolocalizadas
entre
O
luto
luto
***
este
brinco
cai
sente
esquálido abandono
vida
rara
em
si
***
plano
pano
Luto
Começar a vida
entre
tanto
Luto
***
se
luto
acho
poema
ardo com a vida
entre
raro
ar
ar
***
um
entre
luto
hoje
ontem no jornal
eu e
Nós
ester-
tor
tan-
tos
***
Sim
chove
lembro
Anoto
e teço
Lembro meio sem vida lavo
e com lu-
to na lava
entro sem
morte ra-
ro ar e ar
Da criaçã0 em zer0
..____..____._____.____._____\|/.___
A hoje, somamos o aparente-
Mente inevitÁvel:
bolas de
lama na
p r a i a,
n/ã/o/se/mis/tu/ram/
não/se/m/is/tu/ram
a/quase/
nad/a.
Arte de Koen Lybaert (1965-), ''Mirria III''. Watercolor on paper.
Sementes à flor da pele quando nestes anos
Na língua materna ou
visitando o estrangeiro cais.
A surpresa não nasce de ten-
tativas. Exploro este espaço.
Choveu.
"Abstract Spiral Galaxies" (2008), Kazuya Akimoto. Diálogo ecfrástico
***
Sinestesia orbital
no céu
Jyotisha
um objeto no céu
corta meus devaneios.
um objeto no céu
cativa-me em meus passeios.
no céu, firmo
minhas devoções.
no céu, confirmo
minhas inspirações.
no céu, a cartografia
de uma ciência.
no céu, desenhos
mitológicos se formam.
estrela morta
deito no chão
olho a esmo para o céu
busco alguma sensação
algum encanto
naquela escuridão
salpicada de brilho
em todo canto.
lá longe, bem longe
uma estrela não brilha
apagada
uma pequena ilha
negra
porém, destacada
fora da regra.
morta, a estrela
chama minha atenção
dou trela
para aquele ponto
aquela escuridão
não me desaponto.
na estrela morta
encontro uma porta
que me transporta
cosmogônica
a Terra é mãe
fecundada pelo Real
evento sideral
pleno de Criação
emanação
regida por cada constelação
pelos astros
que conformam a psique
do mundo
que por milênios
foi deixando lastros
na consciência
de Gaia.
nossa humanidade
desde a mais tenra idade
exala divindade
por isso essa necessidade
de religar-nos
à realidade.
somos regidos
por deusas e deuses
imaginados
apenas em seus predicados
mas ungidos
no elementais
nas divindades naturais
por isso tão reais
espirituais
ainda assim
materiais.
o kiarô, Oxóssi
o kiarô, Oxóssi
filho de Oxalá e Iemanjá
caçador na noite
meu Orixá.
és vontade de cantar
escrever, pintar, esculpir, dançar
mas, também
plantar, colher, caçar, viver
ah, viver!
no teu trono
conhecimento
em tua comodidade
ergo meu templo
minha criatividade
admiro e contemplo
desejo ociosidade
para revoar
pensar.
penitência
subiu a escadaria
da igreja
para pagar sua
penitência.
a vela, acesa
seu maior desafio
pois, o pavio
andava bastante
curto.
a santa pesava
menos que a consciência
por isso, precisava
da penitência.
Giovani Miguez é escritor, poeta, filosofante e caminhante. De Volta Redonda, RJ.
Atualmente vive na capital fluminense. Sou formado em Gestão Pública (UGB, 2008)
com extensão em jornalismo de políticas públicas (ECO/UFRJ, 2009), especialista em
Sociologia (UGF, 2010) e mestre e doutorando em Ciência da Informação
(IBICT/UFRJ, 2016). Autor de Quase Histórias: Est(éticas) Existenciais (Autografia,
2019); Animal Poético: Diário Est(ético) (Multifoco, 2020); Da Ilha da Poesia (com
Ricardo Garcia, Selin Trovoar, 2020) e, saindo do forno, Um Poema por Dia (Selin
Trovoar, 2020), Nem te conto e outros contos (Selin Trovoar, 2021) e Em terceira
pessoa e outros poemas (Outra Margem, 2021, prelo). Possui também quatro e-books
exclusivos para formato kindle
Os materiais com os quais os filhos do povo de Ar erguem
suas casas
-- silenciosamente ruidosos –
arrastando às coleiras
anatomia da burocracia
e sangue
sangue
calcinada / infértil
e seus porcos que se criam como porcos e que se vendem como porcos e
já / já / já
inevitável
que cava tão fundo quanto um tatu que escapa ao faro do cão
e à enxada do caçador
reencarna
num cais chamado Santa Rita / onde navega a cabeça de uma suicida
/ onde navega /
de amar e em silêncio amar outra vez até que no amor pereça tudo que jamais
/ a poesia é o que está sempre em outro lugar e o mais leve roçar em seus lábios
o mistério da insônia
ou
tapetes e o chão
zumbido fraternal e pequenos insetos domésticos ou
quando
do que não pode ser visto / do que não deve ser visto / do
como uma égua do século XIX puxando uma carroça de fogo saída de um engenho
aqui
cabeça do cavalo que dança e ao dançar é todo ele oração e seu êxtase é meu na
branco
é também um inventário das coisas que se dizem / das coisas que se fazem /
vem
dentro do grito da poeta que pede ao rio que lhe conceda o asilo da morte /
estrelas na
risca
esses morcegos que gotejam entre as frestas das telhas quando nos abraça a insônia
ainda / ainda
ainda
o dia amanhece / o sol queima os últimos trapos da noite
nuno g.
A Eva Wilma Rodas Ramalho e Fernando Antônio Ramalho de Amorim – pelo apoio de
sempre.
A todxs nossxs colaboradorxs, leitorxs e amigxs – sem os quais a Sucuru não existiria.
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
Contatos
---------------------------------------------------------------------------------------------------
Envie seu texto em formato word (letra Times 12) para o nosso e-mail:
revistasucuru@gmail.com. Responderemos o mais breve possível.
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
VIVA A SUCURU!
SSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSS
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
CCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCC
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
RRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRR
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
SSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSS
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
CCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCC
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
RRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRR
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
SSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSS
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
CCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCC
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
RRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRR
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU