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Crônicas Gastronômicas
2017
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Suzana Solar
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“Eu não uso maquiagem, não preciso de vários
sapatos...
Ainda tenho uma arara de roupas no
apartamento da minha mãe e não sei o que vou
fazer com elas.”
Eu uso o necessário
Somente o necessário
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O extraordinário é demais
Eu digo necessário
Somente o necessário
Por isso é que essa vida eu vivo em paz
Suzana é sol!
No caminho...
Era para ter sido há duas semanas, mas sabe
quando tudo dá errado? Foram semanas complicadas,
além dos problemas para resolver que impossibilitavam
o passeio, uma chuva que não parava!
Eu tenho uma relação muito próxima com São
Pedro, costumávamos brigar muito quando eu andava
de moto. Muitas vezes, o dia lindo de sol e eu em casa...
Era só ter que sair, o tempo fechava e a chuva me
encontrava no meio do caminho. Agora, com o Johnny,
os dias estão mais bonitos e divertidos (ainda adoro
andar de moto, mas não tenho mais condições de pilotar
na chuva... Vivia doente).
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de uma hora.
Câmera, vinho branco, sobremesas: OK
Protetor solar, pen-drive (para garantir a trilha da
viagem), água: OK
Trocados para pagar o pedágio: OK (aqui ele custa 2,60
para veículos leves).
E lá vamos nós... Ao som de “These boots are made for
walkin’” - Nancy Sinatra, pegamos a estrada.
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Nenhuma tradução que fizesse sentido pra mim, que
recém-chegada, ainda estava encantada com o pouco
que conheci. Procurei uma tradução em tupi para
“paraíso”, mas eles não acreditavam em céu, inferno
nem paraíso... Fiquei sem palavras para nomear a
cidade , certamente, não seria nada com “pedra”.
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ele vai fazendo aquela cara de desespero? Era eu, a
perfeita Pateta!
Entendi Pessoa,
...Navegar é preciso!
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Receita: Risoto de Camarão
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Decore com camarões grandes dourados na
manteiga
Bom apetite!
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Mas e a comida, o que se come na Transilvânia?
europeia!
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alguém diz que nasceu na Transilvânia e na mesma
Castelos.
estudar.
Brasil.
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"Eu tinha ganhado uma bicicleta
vi minha bicicleta...
precisando!"
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vou ter que voltar aqui para saber mais desta lenda!
No caminho...
sério, em abril.
em Garopaba.
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O Google Maps foi ligado assim que chegamos
casa.
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Lembro que naquele verão havia um bar na
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curva acentuada demais. A melhor parte foi quando ela
viver.
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RECEITA: Klausenburger Kraut – Chucrute à
moda de Klausenburgo
1 xícara de arroz
anterior.
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picado. Refogado com azeite e misturado com o bacon
frito.
A montagem
Sirva quente
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Gaden Opetit !
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Calma, calma, isso não quer dizer que o resto de
churrasco não fica uma delícia (eu adoro!), só não
deveria ter esse nome.
Como disse o Caio,
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Ainda tem aquele pessoal que vai dizer que é
apropriação cultural...
No caminho...
O sábado estava com cara de domingo, daqueles
que a gente não quer sair da cama. Bem nublado e com
chance de chover ainda na parte da manhã, mas
compromisso é coisa séria. O único bolo que eu dou são
aqueles de comer, sem chance de faltar aos
compromissos. Desta vez, quem demorou para acordar
foi o Johnny... Acho que ele não queria sair na chuva,
mesmo sendo um passeio bonito e perto de casa, ele
demorou pra acordar. Nada que um carinho e uma
conversa não resolvam, ele reclamou, mas sabia que era
muito importante pra mim.
Câmera, tripé, brownie com avelã e uma panela de barro
(feita por mim), tudo pronto!
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Deixei o Johnny na rua ao lado do apartamento,
uma senhora lavava a calçada e não tinha movimento na
rua. Ela disse que era seguro deixar ali, que muitos
moradores deixam os carros na rua e que ela ficaria de
olho naquele “fusquinha lindo”. O Johnny costuma
atrair a atenção das pessoas, 90% sempre tem um elogio
pra ele. Os outros 10% ficam contidos, só olhando e
admirando.
Tem uma padaria na esquina, não tive tempo de
conhecer (eu adoro padarias), tem coisa melhor que
cheirinho de pão fresco, panetones, sonhos,... ?
A padaria vai ficar pra outro dia, hoje tem carreteiro!
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Receita: Legítimo Carreteiro
Modo de fazer
Bom apetite!
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Talvez porque o trabalho era menos pesado do que
quem ficava na roça, na cidade tinha tempo para
conhecer e usar um temperinho.
Perto das três da tarde, de longe já se sentia o
cheiro do café... Café de vó, café de tia!
A farofa de banana, os bolinhos, aquele bolinho frito de
banana, bem manézinho, tinha muita fritura e ninguém
era gordo. As coisas eram mais puras, a banana madura
era só buscar no quintal.
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No caminho...
Domingo chuvoso, friozinho, daqueles com cara
de domingo mesmo. Vontade de ficar na cama até
tarde... Mas hoje, não!
Eu coloquei um anúncio nas minhas redes sociais
procurando pessoas que gostem de cozinhar e tenham
boas histórias para contar, parece que está funcionando.
Estou recebendo muitas mensagens de pessoas
interessadas no meu projeto. Parece que todo mundo
tem um cantinho reservado para as memórias afetivas,
muitas delas quase se perdendo com o tempo.
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tenho esperança de um dia morar num local plano, com
ciclovias e pessoas conscientes da importância de
respeitar o espaço e o próximo.
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havia na casa da tia.
Com o meu atraso, atrasei o preparo do almoço
também. Direto para a cozinha!!!
1 xícara de açúcar
1 xícara de trigo
1 xícara de aveia
8 bananas maduras
canela à gosto
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Misture a manteiga com o açúcar até ficar cremosa
Tá na mesa!!!
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A flor da Pereira
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O Brasil vivia um período de mudanças, muitas
delas infelizmente não chegariam a maior parte da
população, como a carne também não chegava. A carne
"verde" era só no sábado de aleluia, o peixe era farto,
não tinha trigo. O pão era de milho, assado na folha de
bananeira e se parecia com bolo. Tinha berbigão,
marisco, caldo de peixe e muito pirão.
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melhor lugar: as receitas, as rezas, os nomes, os
números, os poemas, as músicas.
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cochiladas entre uma Ave Maria e outra, acredito que
Deus está sempre ouvindo seus anseios.
No caminho...
Foram várias tentativas frustradas para
encontrar minha personagem: a chuva não deu trégua
por semanas seguidas, o que impossibilitava minha ida
ao sítio e a vinda da Dona Glória para o apartamento na
cidade; quando o tempo melhorava, ela não tinha tempo
para entrevistas. Tinha seus compromissos com as
amigas e o Grupo de Poetas, do qual faz parte ou com os
filhos que sempre inventam algum compromisso e
carregam a vó com eles.
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antigo é como criança, precisa de um chamego para
acordar) liguei para meus tios, para me certificar que
não perderia a viagem e conseguiria umas horinhas para
conversar com ela.
O sítio fica aproximadamente a 45 quilômetros
de Florianópolis, seguindo pela BR-101, sentido sul.
Passando o Morro dos Cavalos, aquele que sempre tem
alguma notícia no jornal sobre acidentes ou sobre
disputa de propriedade entre os índios e o Estado, são
cinco quilômetros de estrada de chão. Na verdade, mais
buracos que estrada! Mais árvores, mais pedras e mais
pássaros também!
Neste lugar o tempo passa devagar, as casas
ainda sem grades nas janelas, as cercas de arame
farpado não deixam os animais irem para a rua. Falo
dos animais grandes, porque as galinhas sempre dão um
jeito de fugir.
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Havia muito escravo na nesta região. Dizem que ainda
se ouvem gritos, choro e barulhos de correntes
arrastando. As lendas permanecem vivas, quase nada
mudou. Os mais velhos falam de um tesouro enterrado e
contam que é melhor não passar pelo Morro da Boneca
à noite. Se for noite de Lua Cheia, melhor mesmo é nem
colocar os pés para fora. Morcego não vira vampiro, mas
bruxas estão sempre fazendo arte.
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bom e não seríamos incomodadas. Regulei o tripé,
posicionei a câmera e fui buscar a Dona Glória.
A infância
da casa de pau-a-pique
lá em cima do fogão...
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As brincadeiras eram simples e eu era uma
moleca, gostava de subir em árvore, plantar bananeira,
subia morro e descia dando cambalhotas. Os vizinhos
fofoqueiros contavam para meu pai que eu amarrava o
vestido na cintura e descia o morro rolando, aquilo não
era coisa de menina! Eu apanhava, ficava de castigo...
Mas, no outro dia estava brincando de novo.
A adolescência
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Depois as coisas se complicaram, tive que ir
morar com um irmão mais velho na Laguna. Ele disse
pra minha mãe que ia me ensinar a ler e escrever, ia me
colocar na escola... Mas era tudo mentira!
Cheguei na Laguna e ele me fez de empregada. Eu tinha
que cuidar dos filhos dele, limpar a casa, costurar,
cozinhar e a mulher dele não fazia nada!
Só sabia brigar comigo e exigir que eu trabalhasse mais.
Não tinha tempo para ir para a escola.
Depois de uma briga com meu irmão, fugi para a casa da
vizinha e voltei para casa de minha mãe.
O amor
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cidade. A gente queria que os filhos soubessem ler e
escrever. Todos foram para a escola e trabalhavam no
outro período para ajudar em casa.
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ajudavam no começo, desenhar as letras não era fácil.
Eu já tinha quase 70 anos!
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Desta vez, aproveitei para aprender como fazer essa
farofa tão simples e que eu nunca consegui fazer igual.
Tem coisas na vida que não adianta saber só a teoria...
Misturar e servir
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As viagens de Irma
Essa história começou em Forquilhinha (no sul
do estado de Santa Catarina), uma colônia alemã, e se
misturou com as histórias de viagens, amores, família, e
claro, comida. Família grande, eram 12 filhos e uma mãe
que ficou viúva muito cedo. Os filhos iam crescendo e
mudando para cidades maiores, havia a preocupação de
estudar e ter uma vida melhor. Alguns foram estudar
fora do Brasil, fazendo o movimento contrário aos dos
seus antepassados.
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Homens aprendem a costurar, cozinhar,
arrumar a casa e lavar a roupa da mesma forma que
mulheres também aprendem a carnear um porco, cuidar
da roça e outras tarefas mais pesadas. Os filhos são
criados para o mundo e não para serem dependentes de
outras pessoas. Existe também a preocupação em
manter a cultura, o interesse pelas artes e pela música
desde pequeno.
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E foi num desses que se apaixonou... Um amor que não
iria muito longe, pois logo ela foi morar em Porto
Alegre. Ele disse que era melhor terminar, que a
distância não daria certo... (parece que essas histórias
de homens que desistem fácil nunca acabam).
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Sim, para todos os lugares que eles viajaram e ainda vão
viajar!
No caminho...
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E assim, fui conhecer a Irma Heerdt, tomar café,
aprender uma nova receita e ouvir algumas boas
histórias. Uma história que começou em Forquilhinha
(no sul do estado de Santa Catarina), uma colônia
alemã, e se misturou com as histórias de viagens,
amores, família, e claro, comida.
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Quanto mais eu escuto, mais vontade eu tenho
de viajar... E quem sabe, de aprender alemão também.
Até agora, o mais próximo que cheguei de uma cidade
alemã foi Blumenau, e nem fica na Alemanha!
2 ovos batidos
Sal
Modo de fazer
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Refogue o bacon e acrescente o aipim aos poucos, vá
mexendo até dourar (criando uma crosta dourada e
crocante).
Delícia!
Hummmmm...
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Santinha
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permite uma foto. Ela volta para casa, colhe a hortelã no
quintal e prepara os ingredientes para o kibe...
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Naquele tempo, início dos anos 80, não havia
essa preocupação tão grande com o consumo de açúcar
e os problemas que ele poderia causar. Os refrigerantes
vinham em garrafas de vidro, um litro parece que rendia
20 copos. As vendas, como eram chamadas as quitandas
dos bairros, exibiam suspiros enormes e coloridos,
sorvete de Maria-mole que vinham com brindes (eu
gostava daqueles anéis de plástico, com corações que
imitavam pedras preciosas).
O doce de leite vinha em pequenos pacotinhos,
era preciso fazer um furo (bem pequeno, pra durar
mais) para abrir e ficar chupando o doce.
As balas eram vendidas em baleiros enormes que
giravam, era difícil escolher um sabor só. Os pirulitos
eram em formato de chupeta, o palito era de madeira e
ruim de segurar. O sorvete era da Kibon e vinha em latas
decoradas, parece que rendia muito mais que os de hoje
também...
Quando a vó dizia "vamos na venda", eu sempre estava
pronta!
Todo esse açúcar consumido era gasto em
pouco tempo nas brincadeiras pela rua: pega-pega,
esconde-esconde, bicicleta, pé na lata, queimada,
elástico... A vizinhança toda se conhecia, os portões não
ficavam cadeados, os cachorros não ficavam dentro de
casa. A gente terminava rápido os deveres de casa para
poder brincar na rua. Eu tinha uma coleção de bonecas,
essas eu não levava para rua, brincava sozinha para não
estragar.
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Mas a vó dava banho e comida antes de os pais
chegarem em casa... Cheirosinhos e comportados como
dois anjinhos (ela nunca contava das brigas e das "artes"
pra eles).
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Receita: Kibe da Vó Elena
½ kg de carne moída
4 ovos
1 cebola ralada
hortelã
sal
pimenta do reino
nós moscada
cebolinha verde
salsinha
Modo de fazer
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Servir com pedacinhos de limão
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por favor!
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E logo começou a me contar sua história: tem
dois filhos, trabalha muito e estava se separando de um
marido que não valia nada. Depois de vinte e nove anos
de casamento, ela tomou coragem e resolveu começar
outra história.
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Viu no casamento um sonho de estabilidade e
segurança. Fez três faculdades e nunca parou de
estudar.
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... Começo
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Com Suzana Staudinger, em Itajaí.
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Com Caio Monti, em Florianópolis
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Com Fátima Silva, no Morro das Pedras
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Com Uwe Wagner, em Garopaba
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Com Irma Heerdt, em Florianópolis
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Com minha vó Elena e meu irmão
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Vó Glória, no sítio (eu era a fotógrafa)
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Meus sinceros agradecimentos a todos que fizeram
parte destes primeiros capítulos, foi um prazer poder
ouvir e compartilhar estas histórias.
Kayaboop
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