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Copyright © 2023 Jussara Leal

MEU PROFESSOR IRRESISTÍVEL


Um Dia dos Namorados diferente

1ª Edição

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte dessa obra poderá ser


reproduzida ou transmitida por qualquer forma, meios eletrônicos ou

mecânico sem consentimento e autorização por escrito do


autor/editor.

Capa: T Tenório Design


Diagramação: Jussara Leal

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e


acontecimentos descritos são produtos da imaginação do autor(a).
Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é

mera coincidência.

TEXTO REVISADO SEGUNDO O ACORDO


ORTOGRÁFICO
DA LÍNGUA PORTUGUESA. CONTÉM LINGUAGEM
INFORMAL.
Sumário
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
EPÍLOGO
CAPÍTULO 1

Muitas pessoas dizem que não há vantagem alguma em ser solteira.


Eu vos digo que há muitas! Existe algo melhor do que poder fazer o
que bem entende, na hora que quer, como quer, com quem quer?
Existe algo mais pleno do que não precisar dar satisfações a
absolutamente ninguém? Enquanto para algumas mulheres isso
parece solitário o bastante, para mim se parece perfeito!
Ao menos por enquanto...
A ideia de que temos que seguir o ciclo crescer-namorar-casar-
constituir família é muito antiquada para mim. Inclusive, acredito que
nasci no tempo certo. Morreria se tivesse nascido nos anos 50/60.
É um erro enorme acreditar que só encontraremos a verdadeira
felicidade quando estivermos acompanhadas, mas isso parece estar
enraizado em grande parte das pessoas. Há exemplos dentro da
própria família, sempre tem aquela tia que vai te abraçar com dó
pelo fato de você estar solteira, sempre tem um parente que
acredita que você não é feliz, que está encalhada, que vai ter olhar
de uma forma julgadora ou até mesmo pejorativa.
Bom, tudo isso não significa que sou contra relacionamentos ou que
nunca terei um. Significa apenas que não tenho pressa, não tenho
ansiedade alguma a ponto de sair me envolvendo com qualquer
pessoa apenas para não ficar sozinha. Talvez um dia eu queiro
filhos, queira um companheiro, queira estabelecer uma relação. Mas
será quando tive que ser. Enquanto isso não acontece eu vou sendo
feliz comigo mesma, gozando dos prazeres que a liberdade oferece,
sendo inteira e verdadeiramente feliz com meu status.
Há apenas alguns problemas...
Moro em Paraíso, uma cidade mineira que se encontra na
Mesorregião Metropolitana de Belo Horizonte e fica a exatos 96
quilômetros da capital que é o amor da minha vida.
BH é o meu lugar no mundo. A cada dez metros há um boteco,
homens bonitos, um povo receptivo e animado, não existe essa de
“é segunda-feira”, ninguém irá julgá-la por encher o cu de cachaça
em plena segundona e ir trabalhar de ressaca na terça. Certamente
outro patamar. Até mesmo o ar daquele lugar parece ser diferente. É
um avanço na qualidade de vida.
Paraíso é... legal, dependendo do dia e do meu estado de humor.
Minha mãe e eu vivemos em pé de guerra sobre essa cidade. Na
verdade, vivemos em pé de guerra com muitas questões. Enquanto
ela não larga esse lugar abençoado de forma alguma, eu sempre
desapareço daqui em todas as oportunidades.
Se em Belo Horizonte as pessoas parecem ser de bem com a
vida, em Paraíso é o contrário; não é sempre que encontramos toda
receptividade. Minhas vizinhas, por exemplo, parecem viver em uma
constante falta de sexo ou talvez seja falta do que fazer mesmo.
Elas agem como se viver fosse um sacrifício tremendo e
precisassem fazer um esforço sobre-humano para isso, só parecem
realmente felizes quando estão reunidas tomando conta da vida dos
outros. Inclusive, elas tomam tanto conta da vida dos outros que,
antes de se mudar de Paraíso, meu irmão fez o favor de mostrar a
rola para uma delas. Me lembro daquela fatídica noite como se
tivesse sido há exatos dois meses...
No menor sinal de barulho no portão, as fofoqueiras já correm
para suas respectivas janelas, independente do horário. Certa
madrugada, por volta das três da manhã, Juliano, meu irmão que
fez o favor (e teve a sorte) de se mudar para o Rio de Janeiro,
chegou da rua levemente alcoolizado. O álcool transforma as
pessoas, sou prova viva disso, e ele foi transformado naquela noite.
Cansado dessa obsessão louca pela fofoca, ele se estressou ao ver
vizinhas abrindo janelas para ver o que estava acontecendo, como
verdadeiras fiscais da madrugada.
Na verdade, não estava acontecendo nada demais. Ele só
estava mesmo colocando o carro na garagem. Mas, para elas, isso
é um grande acontecimento. Acho que elas até anotam os horários
em um caderninho para debaterem no dia seguinte. Enfim. Ele
guardou o carro na garagem e retornou para fechar o portão;
quando as viu na janela, foi tomado pelo ritmo ragatanga, pela
revolta profunda, e decidiu dar um ENORME motivo para elas
discutirem na manhã seguinte.
Juliano simplesmente abaixou a bermuda, juntamente com a
cueca, e balançou sua monstruosidade (sim, eu já tive o desprazer
de vê-lo nu e ele se parece bem com o kid bengala). Ter visto meu
irmão nu foi traumatizante para mim, mas fez um efeito com as
vizinhas. Elas ficaram pelo menos um mês inteiro sem abrir as
janelas. Mas, agora que ele se foi, as mosqueteiras voltaram com
força total e me tornei o principal alvo delas. Era menos ruim quando
havia alguém para dividir o foco comigo, mas o que me resta é ser o
alvo agora. É essa uma das coisas ruins, porque elas controlam
minha solteirice e dirigem a mim os mais diversos olhares, dentre
eles: julgadores, chocantes, olhares de piedade, ranço.
Suponhamos que eu mostre minha amada vagina, delicada,
depilada, fofinha, isso teria algum efeito sobre elas? É algo a se
pensar. Qualquer coisa para que parem de ficar controlando os
carros e os homens com quem saio.
Paraíso possui algumas singularidades. A parte da fofoca é
realmente temerosa. Ultrapassa os limites aceitáveis.
Por exemplo, aqui existe a “puta do óleo de jacaré”. Você
deve ser perguntar que diabos é isso, eu também me perguntei
quando vi um cartaz grudado na parede de uma casa. A puta do
óleo de jacaré nada mais é que uma mulher que fazia esse tal óleo
de jacaré que possui propriedades medicinais. O “puta” é um título
que ela ganhou do marido após traí-lo; não satisfeito com o chifre,
ele a colocou para fora de casa. E, para que as pessoas não
ficassem batendo em sua nada humilde residência em busca da tal
mulher, ele resolveu colocar um cartaz escrito “A PUTA DO ÓLEO
DE JACARÉ MUDOU-SE PARA O ENDEREÇO TAL TAL TAL TAL”.
Detalhe que a casa deles é na esquina de uma das avenidas mais
movimentadas da cidade, que leva as pessoas ao principal clube
recreativo. Ou seja, é impossível o bendito cartaz passar
despercebido.
Aqui também temos o Michael Jackson; um homem que se
veste com as roupas do ídolo e anda com uma caixa de som no
ombro, tocando todas as principais canções do Michael, além de dar
performances de dança dignas de... de nem sei!
Temos também um senhor de idade que anda em uma
carroça vendendo leite diretamente da fonte e dá gritos quase
ensurdecedores a plenos pulmões com a frase “Aoooooo leiteeeee”.
Não há quem não acorde com sua passagem. Todos os dias
sofremos esse “teste para cardíaco”, mas ao menos ele não é
fofoqueiro.
Há muitas outras figuras ilustres, mas não vem ao caso.
Fofoca aqui é parece um combustível para a cidade funcionar bem.
Se eu for contar cada detalhe, ficaremos até a próxima eternidade
falando sobre.
Bom, nem tudo é tão ruim quanto parece. Vamos à parte boa
da história dessa pitoresca cidade.
Ocasionalmente, eu consigo amar este lugar. Um exemplo:
quando há festas no Parque de exposições. Isso acontece duas
vezes no ano: em maio e em agosto. É exatamente nesse período
que eu me encontro e encontro também turistas altamente gostosos
que me fazem bater no peito orgulhosamente e gritar “EU MORO
EM PARAÍSO”. Acredite, parece que dizer essas palavras para
turistas faz com que eu e todas as demais mulheres solteiras da
cidade nos tornemos uma atração. A triste realidade é que não
seremos lembradas pelo nosso nome e sim como “aquela mulher de
Paraíso que eu peguei”. Mas, quem se importa? O importante é
aproveitar o momento. Também não me lembro dos nomes dos boys
gostosos que pego. Simplesmente passo o rodo e, logo em seguida,
é cada um para um lado. E, neste caso específico, estou falando
apenas de beijar na boca. Aliás, beijar na boca é uma das
maravilhas do mundo!
A festa que acontece em maio se chama “FESTA DO
CAVALO”. Ela é organizada por empresários de Belo Horizonte,
geralmente donos de boates, e conta com rodeios, shows de
bandas famosas, barraquinhas com os mais diversos tipos de
bebidas e comidas espalhadas por toda extensão do parque, além
de uma boate itinerante que se chama TAJ MAHAL. Meu Deus! Se
essa boate falasse, eu estaria muito queimada na cidade (mais do
que já sou).
O rodeio sempre começa às oito da noite e eu sou uma das
primeiras a surgir na arquibancada. Eu amo rodeios porque são
extremamente animados e porque há cowboys realmente deliciosos
nos agraciando com aquelas calças que marcam até os ovos.
Cuiabano Lima e Mara Magalhães sempre estão presentes e são os
principais responsáveis pela narração e animação. Eles levam o
público à loucura e ensinam grande quantidade de cantadas,
contribuindo indiretamente para o aumento do meu repertório. O
momento do rodeio é quando não pego ninguém. Faço questão de
ser uma espectadora atenta e ativa.
Durante os shows que acontecem após o rodeio, eu sempre
costumo estar levemente embriagada e beijando todos os homens
pegáveis que surgem aleatoriamente pedindo um beijo como se
fosse esmola. Sendo uma pessoa que gosta de ajudar os
necessitados, eu quase nunca nego, a não ser que o homem seja
altamente feio. Não é por mal, mas no mês de maio, naquele lugar
que faz um frio que deixa as pregas ainda mais enrugadas, você
precisa de álcool e um pouco de calor humano para sobreviver.
E não acaba por aí. A desgraceira é muita nessa época. É no
fim da noite, na maldita boate Taj Mahal, que as pessoas costumam
perder a dignidade. Eu sempre perco e, para me tirar de lá, é quase
arrastada. Eu pago vinte e cinco reais de ingresso naquela merda e
eu faço valer a pena o dinheiro investido naquele cubículo.
O lugar é apertado, quente, escuro, bom para você descer
até o chão e pegar pessoas que não deveria. Tudo que acontece lá
fica lá. É o único lugar onde você está protegido da fofoca. Mas, de
vez em quando, muito de vez em quando, acontece uma treta de
traição e a notícia se espalha.
Em agosto é a famosa “EXPO PARAÍSO”. Dizem que é uma
exposição de cavalos, vacas, bezerros, mas quem liga? O foco da
galera são os shows que acontecem como a “Festa do cavalo”. É
praticamente a mesma festa com um nome diferente e com o
acréscimo de ter exposição de animais. A exposição acontece
durante o dia, mas, mesmo durante a noite, eu consigo ver vários
animais rodando por lá.
Que Deus me perdoe! Mas tem umas garotas que são umas
verdadeiras vacas e uns homens que são como cavalos. Além de
ter algumas pessoas que os chifres são tão grandes que mais se
parecem touros. Na “Expo Paraíso” a maldição da boate Taj Mahal
também marca presença. Parece que eles gostam de ver o circo
pegando fogo mesmo, porque aquela boate é o verdadeiro
pandemônio.
Eu, angelical, sou sempre presença constante naquele
ambiente repleto de pecado porque gosto é do caos mesmo. E,
quando as respectivas festas acabam, o caos se instala. Durante
umas duas semanas as tretas ocorridas naquele parque ficam na
boca da galera. A quantidade de traição que é descoberta beira ao
absurdo. Aliás, essa cidade, que parece tão tranquila, é o lugar onde
a infidelidade rola solta. Ô povo para gostar de uma traição. Não
generalizando, é claro. Mas há um enorme número de traições
nesse lugar e a cara do povo nem queima. O negócio parece
enraizado. Sabe o futebol que seu namorado/marido vai jogar às
quartas-feiras à noite? Pois é..., nem vou te contar! Se você não foi
corna ainda, pode ser que se torne em algum momento no futuro, se
não abrir os olhos. E, se você não chifrou alguém, é provável que vá
fazer isso em algum momento, a não ser que seja extremamente
correta.
Eu não sou tão correta. Mas não vou falar disso agora.
Há cinco datas nas quais a cidade entra em surto: Festa do
cavalo, Expo Paraíso, Dia dos namorados, Dia 7 de Setembro
(Independência do Brasil) e Natal.
No 7 de setembro sempre há festas em sítios regadas à
muita bebida grátis. E, no Natal, durante 15 dias as ruas viram um
fervo. Os bares ficam devidamente lotados, pessoas vêm de outras
cidades e eu nunca serei capaz de explicar o motivo de tanto
furdunço nesse período. Só posso dizer que estou sempre presente
em tudo, beijando bocas novas, relembrando das velhas, e
aproveitando adoidado.
No intervalo dessas datas festivas a cidade fica um pouco
sem graça, para dizer a verdade. A vida noturna aqui não é das
melhores e eu passo a maioria dos finais de semana sentada em
cima da pick-up da minha amiga Paula, tomando cachaça na
garrafa, dançando e rodeada de uma turma que se diverte com
muito pouco. Há alguns outros finais de semanas em que muitas
pessoas fazem festas em sítios e o bicho pega que parece até um
bombardeio. São tantos acontecimentos em uma única festa que
você acorda no dia seguinte tonta e sem conseguir saber metade
das tretas.
Aos domingos é tradição ir para o famoso “Cristo Redentor”.
É! Aqui em Paraíso há um Cristo Redentor e até muito bonito,
possui uma vista fantástica de grande parte da cidade. Talvez,
algum dia, acredito que ele vá mover os braços e cobrir os olhos. É
surreal toda loucura que acontece nesse lugar.
Durante o dia parece encontro de som automotivo; carros
ficam espalhados por todos os lugares, disputando quem tem o som
mais potente enquanto o pessoal se acaba de dançar. À noite,
independente do dia, o local é escolhido para ser um motel ou
apenas um local para uma pegação mais “avançada”. Há casais que
já se aventuraram em fazer sexo lá no alto, diante da imagem do
Cristo (grudados à “roupa” da imagem como se fosse uma parede
de sustentação), há outros que usam a rua principal e as adjacentes
para poderem fazer o carro de motel.
E eu te pergunto: quem nunca?
Confesso que tanto peguei alguém no alto do cristo (sem
sexo porque não sou exibicionista), quanto já usei as ruas
adjacentes para finalizar emergências. É assim a vida na cidade
pacata, o que posso fazer? Apenas me adequar.
Ok, estou parecendo uma libertina. Sei disso. Tenho plena
consciência, o que é bom. Não é?
Nem sempre fui assim. Quer dizer, sempre fui muito
beijoqueira, mas eu era uma garota até mesmo quieta, sempre na
minha, até encontrar o homem que desgraçou a minha vida e me
fez mudar radicalmente. Ele fez valer a frase “há males que vem
para o bem”. É assim que considero a situação atualmente. Mas
apenas atualmente, porque no passado eu sofri igual uma
condenada.
Cinco dias foi o tempo que demorou para que eu me
apaixonasse por ele; aquele tipo de paixão avassaladora onde o
universo inteiro deixa de existir, exceto uma pessoa: o homem que
você acredita ser o amor da sua vida. E a pior parte: ele era feio,
MUITO, e não havia absolutamente nada atrativo fisicamente, mas
eu o achava o deus e minhas amigas quase vomitavam. Não sou
linda, mas perto dele eu era um atrativo e tinha uma senhora beleza.
Éramos totalmente incompatíveis fisicamente; eu era o estilo falsa
magra, com uma bunda incrível e seios fantásticos, ele era
desfavorecido de beleza, mas eu nem mesmo me importava.
Sim, porra! Sofrer por um homem bonito, ok! Mas sofrer por
um feio é sacanagem!
O homem tinha uma magia em torno dele que conseguia a
mulher que quisesse. O seu histórico de ex-namoradas é fantástico,
tinha algumas que até me intimidavam de tão lindas e ele nem
mesmo era rico para as pessoas se relacionarem por interesse. Era
bizarro!
Ele foi o meu primeiro homem, aquele que rompeu algumas
barreiras e em quem eu confiava com a minha vida no início. O
tempo foi passando, ele foi deixando de ser o Gentleman que eu
acreditava ser, foi colocando as manguinhas de fora, começou a
proibir determinadas amizades, a implicar com as roupas que eu
usava e a maneira como eu falava, começou a controlar meus
passos, a sair sem mim... E aí acordei do feitiço em que me
encontrava.
Eu era muito bobinha e boazinha, mas, a partir do momento
em que acordei, as coisas mudaram. Não terminei com ele. Possuía
uma espécie de obsessão, o homem trabalhou a minha mente para
me tornar dependente emocional dele e conseguiu. Passei a sofrer
com uma “doença” que se chamava AMOR PATOLÓGICO. Nunca
me droguei ou fui uma viciada em drogas, mas comparo o que eu
sentia como dependência química (que não era química). Me
transformei por completo, tive minha personalidade quase
corrompida e sofria diariamente. Porém, diante de todas essas
coisas, tornei-me uma pessoa esperta, que conseguia enxergar o
estrago sendo feito mesmo que não tivesse forças para colocar um
ponto final da história.
Vivi um relacionamento abusivo e fui corna. Mas foi um
“corna” com estilo e no talento. Não foi algo descoberto cem por
cento, foram apenas fortes suspeitas, eu colocaria a mão no fogo
por elas. No entanto, na primeira desconfiança, o que fiz? Fui chorar
no ombro de um grande amigo e acabei recebendo um belo
consolo. Gosto nem de lembrar, sobe um arrepio que... misericórdia!
Todas as mulheres deveriam ter um amigo como Francis, e estou
falando sério sobre isso. Pense num amigo que sabe consolar? Que
talento!
Ser corna foi uma experiência que não quero repetir, assim
como não quero repetir um relacionamento abusivo, porém, todas
essas experiências serviram de grande aprendizado para a minha
vida.
Primeiro, não me entrego emocionalmente com tanta
facilidade. Segundo, não me envolvo com homens comprometidos
pelo simples fato de não desejar para qualquer mulher sentir a
desconfiança ou a dor amarga de uma traição. Dói imensamente ser
enganada; traumatiza, nos faz duvidar do nosso potencial, entre
muitas outras questões.
Desde o ocorrido, decidi não namorar mais; precisava de um
tempo me desintoxicando de algo que me abalou por completo.
Depois de sofrer e arrastar meu chifre no asfalto (mesmo tendo
revidado eu sofri, acredite), decidi que ser solteira é o melhor... até
chegar o Dia dos Namorados.
Sim, é aqui que acaba todo o discurso de ser feliz sozinha.
Por sorte, essa minha crise existencial dura pouco dias apenas.
Logo acordo da magia e retomo minhas forças.
Eu odeio o Dia dos Namorados. Mas eu odeio muito mais o
Dia dos Namorados estando solteira em Paraíso. É preciso ter
sangue de barata para aturar essa data, ainda mais nessa cidade
que às vezes parece ter se perdido no tempo.
A primeira coisa que me irrita sobre esse dia é a falsidade de
algumas pessoas que não prestam durante o ano todo e resolvem
ser “fiéis” e incrivelmente maravilhosas no dia dos namorados. O
homem chifra a namorada quase na mesma velocidade em que
respira e vem bancar o Don Juan no dia 12. Vá para a merda! Tem
uns casais que eu vejo junto nesse dia que dá vontade de chegar
perto e dizer “VOCÊS ESTÃO FALANDO SÉRIO?”. Mas sempre
opto pelo silêncio.
A segunda coisa que me irrita é que a maioria das pessoas
daqui parece seguir um script todos os anos. Elas não mudam o
caralho do disco, não, e isso me faz crer que talvez a atitude delas
tenha virado tradição.
“Vamo” fazer algo diferente, meu povo! Uma viagem, um
“trem” diferenciado! É sempre “cesta de café da manhã da padaria
Sagrada Farinha”, que custa o olho do meu cu, ou flores da
floricultura C E E L E — a floricultura mais famosa de Paraíso.
Aí a pessoa envia as flores ou a cesta, o motoboy vai lá,
entrega para a mulher, que sorri amplamente e esquece todas as
merdas que o macho escroto fez com ela no passado. Uma cesta ou
um buquê de flores apaga as grosserias, as traições, o “perdido” ...
Isso é impressionante e, geralmente, só acontece mesmo no Dia
dos Namorados.
Nos outros dias o homem magoa sem dó, mas não compra
flores, não, porque precisa de dinheiro para encher o rabo de
cachaça na “pelada” de quarta e de sábado. Aí, pensando apenas
em economizar dinheiro, ele conta com a lábia que só o povo
mineiro tem. É poderosa, posso afirmar.
Enfim, no Dia dos Namorados, após o homem adoçar a
mulher durante o dia, chega à noite. Tudo muda do “doce” para o
“salgado”. Meu Deus do céu! É a pior parte!
Os melhores restaurantes da cidade ficam extremamente
lotados, porque as pessoas não querem cozinhar e tampouco
querem ir ali na cidade vizinha. Ninguém reserva vaga em lugar
algum e o pau quebra na disputa por uma mesa. Aí, quando
finalmente o casal consegue seu lugar ao sol, vem aquele clima de
romance, o vinho Canção suave, a música romântica, aquele toque
nas mãos, mãozinha na perna, olhar sedutor. Você, olhando de fora,
até passa a acreditar no amor verdadeiro. É realmente emocionante.
Os pombinhos comem até sobremesa e ficam lá, namorando
à luz de velas, sussurrando palavras bonitas. E, assim que o jantar
termina, eu vos digo BEM-VINDOS À SELVA. É no final da noite
que o filho chora e a mãe não vê.
Paraíso possui 4 motéis decentes e 2 que parecem mais
galinheiros. Os 4 decentes são realmente decentes e bastante
caros. Não posso dar o número de suítes que cada um deles possui,
mas são grandes e na estrada, um pouco afastados do centro da
cidade. É no Dia dos Namorados que eles vão à forra com a
quantidade de clientes. É surreal a maneira como a estrada fica
lotada, com fila, para conseguirem uma chance e poder foder com
um pouquinho de luxo ao menos 1 vez no ano. Porque é tradição,
está no script da população que no Dia dos Namorados tem que
rolar uma ida ao motel, tem que rolar um sexo em um lugar
diferenciado para variar e isso não pode ser adiado. É incrível o
fluxo de entra e sai dos motéis. Acho que eles devem dizer “é uma
hora pra cada casal” porque o negócio é frenético e assustador.
Aí você deve se perguntar “Como você sabe disso, Ana?”. É
óbvio. Bem entre os 4 motéis que são praticamente um ao lado do
outro, há um enorme posto chamado Trevão, que conta com uma
lojinha de conveniência que vende bebidas. E eu, normal como sou,
costumo ficar bebendo no posto e observando o movimento. Acho
que é a única época do ano que me igualo às vizinhas fofoqueiras.
Não vou mentir, eu fico nesse posto para fofocar mesmo.
Já vi até casal de amantes na fila pela foda. Já vi trios, já vi
dois casais em um só carro, já vi preliminares quentes, já vi o pau
alheio, já vi de tudo. Mas nunca vou sozinha. Sempre estou
acompanhada da minha gangue. É bem isso. Paula, Paola, Janaína,
Marcele, Gabi, Bernardo, Mozart, Lipe e alguns agregados que
surgem. A turma é grande e é difícil dizer quem vale menos.
Esse é o segundo ano consecutivo que marcamos um
encontro no posto Trevão no Dia dos Namorados, que no caso é
amanhã. A diversão é garantida, mas não nego que queria alguém
para chamar de meu.
Vamos lá...
Infelizmente eu preciso dar o braço a torcer. A cesta de café
da manhã da padaria Sagrada Farinha é a melhor, os arranjos de
flores da flora CEELE são os mais lindos e eu amaria um jantar em
qualquer restaurante da cidade, porque mineiro tem o dom da
cozinha e há comida realmente boa em qualquer um dos
restaurantes. Porém, ninguém precisa saber que eu penso dessa
maneira nos momentos de sanidade.
Viu? Por trás de uma mulher revoltada há muitas histórias,
um grande motivo.
CAPÍTULO 2

Tenho 21 anos de idade e, há alguns meses, trabalho na Gerdau. A


Gerdau Açominas é uma das mais importantes siderúrgicas do Brasil, e
mais famosa também, localizada nos municípios de Ouro Branco e
Congonhas, bem próximos à Paraíso.
Trabalhar lá faz minha autoestima dar as caras diariamente. 80% dos
trabalhadores de lá são homens, então ser mulher e trabalhar lá é bem
desafiador, porém animador (dependendo do estado civil da mulher, é
óbvio). Até nos dias em que acordo indisposta muitos funcionários
conseguem me fazer sorrir. Porém, não nego que me sinto um pedaço de
carne muitas das vezes.
Tudo começa bem cedo, por volta das 6:30h da manhã, quando
deixo meu amado lar para enfrentar mais um dia de trabalho. A Gerdau
disponibiliza centenas de ônibus para levarem os funcionários à empresa,
por isso, após estar devidamente pronta, sigo para um dos pontos onde há
ao menos uns 12 homens já aguardando a condução. A maioria são meus
vizinhos e, para variar, sou a única mulher.
Felizmente, tornei-me meio que um xodó para a maioria. Por mais
que receba cantadas, também recebo cuidados e uma disputa diária para
ver com quem irei sentada.
— Bom dia! — cumprimento de maneira geral e um falatório começa.
É impossível ficar lerda às seis e meia da manhã, quando se tem esses
homens falantes por perto. Eles me fazem despertar para a vida em
questão de segundos.
— Hoje ela é minha! — ouço uma voz surgir e me viro para encontrar
Léo, o GRANDE.
Léo é meu vizinho, irmão de uma amiga e amigo do meu irmão, um
cafajeste de primeira, absurdamente lindo e gostoso. Ele já namorou uma
das mulheres mais lindas da cidade e possui uma filha com ela. Mas,
acredito que por não valer o pão que come, ele agora é solteiro e causa a
destruição por onde passa. Sério, pense em um homem que não pode ver
uma boceta?! Léo! E ele, embora tenha um histórico invejável de mulheres,
não tem muitos critérios. Tudo o que importa é ter uma vagina quente.
Já ficamos. Porém, nosso envolvimento se resumiu a beijos
calientes, nada mais. Por algum motivo, tenho bloqueio em deixar que Léo
avance o sinal comigo, não aceito nem mesmo uma apalpada nos seios. A
lista de atrativos físicos do homem é extensa e invejável. Ele possui uma
pegada que parece capaz de quebrar uma pessoa ao meio, tem um beijo
que te faz querer arrancar as roupas, um perfume que faz sua calcinha
umedecer.
E eu, Ana Laura, a mulher que vive a vida livre e solta, não consegue
ir para a cama ou para onde quer que seja com Léo. Acho que talvez seja
pelo fato de conhecê-lo desde que eu era criança. Léo é 8 anos mais velho,
isso não deveria importar, admiro homens mais maduros que eu
(especialmente meu professor de matemática), porém importa pelo fato de
que eu era uma criança e ele já fodia por aí. Isso tira minha coragem de
seguir em frente.
— Nada disso! Ela vem comigo hoje! — Brandão, como chamam
Luciano, anuncia. Eu escolho por ele nessa manhã e Léo fica rindo.
Há apenas uma questão: Brandão é noivo e isso não o impede de
me convidar para sair constantemente. Há uma segunda questão que eu
havia me esquecido: ele é amigo do meu irmão. Ser amigo do meu irmão é
um inferno, porque o bicho sabe ser ciumento. Glorifico de pé todos os dias
por ele ter se mudado e deixado minha vida mais leve.
Quando o ônibus chega, entramos e nos acomodamos nas poltronas
do fundo. Eu me ajeito confortavelmente no canto e Brandão se acomoda
ao meu lado. Como de costume, ele segura uma de minhas mãos e fica
bem próximo. É tentador, preciso confessar, mas respeito seu estado civil.
Ele é moreno, quase negro, tem um sorriso perfeito, um ar de homem sério
e misterioso; é dono de um corpo bem gostoso e de um pacote generoso
que marca a calça. Mas acaba aí. Tenho muita dó da noiva dele, que é uma
mulher bastante conhecida, discreta, na dela, de família, e é corneada.
— Que dia vai me dar uma chance? — repete sua rotineira pergunta.
— O dia que você ficar solteiro — respondo, rindo e o observando.
— Por que trai sua noiva? — minha pergunta faz com que ele desvie o
olhar do meu.
— Nem todas as coisas são perfeitas, Ana. Ela possui qualidades
raras de serem encontradas, mas faltam “coisas”. Não que eu queira a
perfeição, mas... Como posso te dizer isso de forma que não seja
desrespeitosa? — gosto do cuidado que esses homens têm em me falar
assuntos sexuais. Mas, mesmo que fofo, é engraçado também.
— Ela não é uma boa parceira sexual?
— Não é — confirma. — Mas eu a amo.
— Por que não tenta mudar isso?
— Já tentei. Venho tentando há alguns anos. Ela não é muito boa no
sexo, às vezes é séria demais, correta demais. Falta um pouco de
adrenalina. E, como não quero largá-la, busco o que falta fora da relação.
— Compreendo você, mesmo não concordando — sorrio. — Meu ex
também não gostava do meu desempenho sexual. Eu era uma garota
virgem, acho que era um pouco de obrigação dele me conduzir, me ensinar,
mas não aconteceu. Ele cobrava de mim algo que eu me envergonhava e
não possuía experiência. Mas, assim que terminamos e tive minha primeira
relação sexual com outro homem, descobri que o problema estava nele. Ou
seja, nem sempre é a mulher que é frígida ou ruim de cama. Às vezes é só
o parceiro que não sabe como conduzir ou extrair o melhor dela.
— Está sugerindo que o problema sou eu? — questiona, rindo.
— Não. Mas quem sabe? Já pensou sobre isso?
— Já — confessa. — E o problema não é meu. Já fiz sexo com
muitas mulheres e todas elas saíram satisfeitas e pediram mais. O
problema não está em mim. Ana, há pessoas que não têm muito interesse
sexual mesmo. Elas se sentem saciadas com carinho, com programas de
casal. Acontece. Eu acho um absurdo não gostar de foder, mas...
— Aff... Não diga foder! — peço, sentindo o impacto das palavras.
Queria uma foda avassaladora com um alguém bem específico...
— Fode comigo.
— Pare de insistir, querido amigo! Hoje é Dia dos Namorados, se
você não sabe — digo, para caso ele tenha se esquecido desse pequeno
detalhe.
— Como esquecer? A população de Paraíso não nos permite
cometer esse delito.
— O que fará de especial essa noite com a sua noiva?
— O de sempre. — Sorrio com a resposta.
— Flores ou cesta de café da manhã, horas na fila por um
restaurante, em seguida a busca desesperada por um motel. Que belo
programa, não?
— Tem algo melhor em mente?
— Qualquer coisa é melhor que isso, Brandão. Por exemplo, você
mora sozinho. Não pode surpreendê-la cozinhando algo? Transformar seu
apartamento em um clima romântico, música ambiente, luz de velas. O
sexo virá de qualquer maneira. Não vejo motivos para passar estresse
enfrentando filas de restaurantes e motéis. Se eu fosse sua noiva, gostaria
infinitamente mais desse tipo de programa.
— Se você fosse minha noiva sinto que iríamos foder muito essa
noite. Você tem cara de ser quente e receptiva, Ana. Pode não ser hoje,
mas ainda terei ao menos uma oportunidade de prová-la.
— Você pode tentar, mas meus valores não se corrompem, caro
Brandão!
Após rir desse papo bastante quente e esclarecedor, seguimos
conversando banalidades por todo trajeto.

Na Gerdau há uma espécie de plataforma “rodoviária”. Os ônibus


estacionam e um mar de trabalhadores sai para ir em busca do outro
transporte que nos levará até o setor em que cada um trabalha. É o
momento em que não dá para ser calma. Tem que andar rapidamente para
alcançar o ônibus. É aqui que já começamos a ver ainda mais a diferença
da quantidade de mulheres para a quantidade de homens. Até o momento
só vi umas 7 mulheres e mais de 300 homens. E olha que hoje está mais
tranquilo. Muitos vieram de carro para poder chegarem mais rápido em
casa e ter sua noite de amor.
No ônibus para o meu setor felizmente há 3 mulheres, mas nós
quatro nos tornamos disputadas. Recomeça o lance de disputar com quem
iremos nos sentar e eu acabo me sentando em qualquer lugar.
Trabalho como auxiliar administrativa, me formo em Administração
no final do ano.
— Olha quem chegou! — meu chefe diz, sorridente. — Sem ressaca
por hoje?
— Sem ressaca, Marquinhos! Mas não garanto isso amanhã.
Ok! Eu já tenho uma fama de vir trabalhar de ressaca ou virada sem
dormir. Por sorte, meu chefe é o cara mais legal que poderia existir e não se
importa muito. Inclusive, quando chego fodida de ressaca ou sono, ele me
entope de café e coisas gordurosas, e nem briga quando desapareço por
uns trinta minutinhos para tirar um cochilo no vestiário.
Tenho dois chefes: Marquinhos e Max. Max é aquele que eu odeio e
que não dá muita bola para o trabalho, a não ser em caso de encher o
saco. Marquinhos é o “paz e amor”, viciado em pornografia e sempre com
um sorriso no rosto.
Como sei da pornografia?
A cada vez que preciso trabalhar em algo no computador dele ou
acessar o histórico, tudo que se vê é pornografia. É um pouco bizarro, eu
sei, mas, felizmente, nunca passei por qualquer situação constrangedora e
ele me vê como filha. Já Max...
O desgraçado é casado, pai de 4 filhos, sua esposa mora em Belo
Horizonte com as crianças e esse demônio fica em Ouro Branco de
segunda à sexta. Ele é um filho de uma boa mãe que me canta
constantemente e inclusive já fez até insinuações sobre aumentar meu
salário.
Certo dia ele me convidou para ir tomar um vinho em sua casa,
argumentou que seria bom para nós dois nos conhecermos melhor e
sugeriu que isso mostraria profissionalismo e ajudaria no aumento do meu
salário.
Não o denunciei em respeito aos filhos dele. Um respeito que nem
ele mesmo possui. A ideia de estragar uma família não me atrai.
— Quais os planos para essa noite? — Marquinhos pergunta. Ele
parece se divertir com a minha vida louca.
— Beber em algum lugar.
— Acho que está na hora de arrumar um namorado, Ana. Tenho fé
de que ano que vem essa data será diferente para você.

— Jogue essa praga em cima de outra pessoa! — exclamo, rindo. —


Vamos ao trabalho! Preciso aproveitar os dias de sanidade para trabalhar
dobrado e Max não perturbar o meu juízo.
A manhã passa muito rápida. Na hora do almoço eu caminho com
uma verdadeira tropa até o restaurante. Algumas vezes dou o azar de ser a
única mulher almoçando (além das cozinheiras que não ficam no refeitório).
É ruim comer quando há muitos homens me olhando, mas, felizmente, a
tropa que escolhi para vir almoçar hoje faz com que eu me sinta confortável.
A sobremesa hoje é doce de leite e acho muito encantador quando
alguns amigos deixam de comer para me dar. Meu vício em doce de leite
também é famoso.
Nós voltamos ao trabalho e eu mergulho de cabeça até dar mais ou
menos umas 15:45h. Existem vários turnos. Um deles termina às 16h, o
meu termina às 17:45h. Especialmente hoje há vários funcionários que
trabalham no meu turno indo embora mais cedo. Pela janela do meu
escritório os acompanho, vendo risos, animação, empolgação para
aproveitar a noite dessa data tão filha da puta.
Suspiro, volto a focar em meu trabalho e aproveito um tempinho para
verificar meu Orkut. Há alguns depoimentos escritos em letras garrafais
“NÃO ACEITE”. Um deles é da minha amiga combinando onde
cometeremos nosso “crime” essa noite e outro é de um amigo meu... aquele
amigo que me cedeu seu ombro para eu chorar na época do chifre.

“Ei, Ana. O que fará essa noite? Tentei te ligar e não obtive
sucesso, deu que estava fora de área. Me ligue quando ver esse
depoimento. Há uma festa na Iels, queria que fosse comigo.”

É uma boa opção ter diversão com ele essa noite, ao invés de ficar
monitorando os casais que estão indo praticar o ato sexual, mas faz um
tempo que tenho idealizado sexo com apenas uma pessoa e é um pouco
assustador como me sinto infiel só de ponderar a proposta.
Iels é uma das poucas boates da cidade, conhecida pela Quintaneja;
todas as quintas-feiras há shows de bandas sertanejas e aquele lugar vira o
caos. É extremamente bom, embora eu seja mais ligada ao funk e à música
eletrônica. Não perco uma quintaneja e já decorei todas as músicas do
Jorge e Matheus, Victor e Léo e César Menotti e Fabiano!
Estou ponderando se devo ou não aceitar o convite de Bruno quando
uma ideia muito louca surge na minha mente... Na verdade, estou bem
dividida. Uma delas é: como seria estar do outro lado essa noite? Nunca
estive em um motel nessa data. No Dia dos Namorados em que estava
comprometida, meu ex surgiu na minha casa por volta das sete da noite,
subiu as escadas que dava acesso ao meu quarto e, antes mesmo de
alcançar todos os degraus, jogou o presente em cima de mim como se
fosse uma bola, de uma maneira nada romântica. Era uma blusa que
prendia no pescoço, pega da loja da mãe dele. O desgraçado ainda teve a
audácia de dizer que pensou em mandar flores, mas ficou com preguiça.
Naquela noite ficamos no meu quarto transando como loucos.
A ideia de ser fiscal de motel essa noite me parece agradável! Talvez
eu possa levar Bruno para uma experiência diferenciada. Iels me
amedronta; a maioria dos homens que eu fico são frequentadores assíduos
de lá e temo que haja um megaencontro de peguetes. Para essa noite,
quero um programa onde possa ser livre para beijar na boca sem ter que
ficar buscando lugares escondidos onde um contatinho não vá ver o outro.
Sou muito perdida mesmo, mas dizem que as perdidas são as mais
procuradas, então estou bem!
A segunda opção seria ir à aula. Acredite, isso é ABSURDAMENTE
tentador. Todos os anos fujo da faculdade nesta data, mas, especialmente
este ano, há um alguém que me faz querer ser uma aluna exemplar e
frequentar todas as aulas: Ricardo Bueno, meu adorável professor de
matemática.
Eu ODEIO matemática desde sempre, mas ele conseguiu fazer com que eu
passasse a nutrir um encantamento pelos cálculos este ano. Nas aulas dele
me porto como a aluna aplicada (até demais). E, por ser aplicada demais,
sempre fico um pouco depois da aula tirando minhas dúvidas com ele. Era
inocente até meses atrás quando, num ato de coragem e loucura, o beijei.
Sim. Eu fiz isso. A boca dele... meu Deus! É irresistível! E fui correspondida
graças a Deus!
No início, ficamos duas semanas seguidas nos encontrando quase
todas as noites. A situação entre nós sempre foi tão intensa, desde o
primeiro beijo. Acredito que ele tenha pensado em levar a situação além,
mas estraguei tudo priorizando sair para a noitada como um trem
desgovernado. Foi aí que ele passou a ser meu amor de fim de noite.
Ocasionalmente, quando estou alcoolizada em alguma boate (ou até
mesmo quando não estou), é para ele quem ligo. Com um repertório pronto
para me dar as mais diversas advertências, ele vai me buscar e me deixa
em casa em segurança. O mais engraçado é que, mesmo quando não ligo,
sempre o encontro vagando de carro pela avenida principal durante as
madrugadas, como se estivesse em busca de um alguém — que fica bem
claro ser eu. Não importa quão perdida eu esteja, ele sempre dá um jeito de
me encontrar.
Eu saio, bebo, curto a vida. Mas, sempre no final da noite, é com ele
que eu vou para casa e é ele quem eu beijo. Nós nunca ficamos muito
abertamente em locais públicos, absolutamente ninguém sabe sobre nós,
nem mesmo as minhas amigas. Eu sou uma idiota e me arrependo às
vezes. Gosto muito dele, a ponto de sentir as famosas borboletas no
estômago e sentir também um ciúme desgraçado que me faz querer
arrancar os cabelos de algumas garotas.
Há uma química explosiva entre nós. Sinto que seremos altamente
compatíveis na cama. Ele é carinhoso, mas possui também uma voracidade
que faz minha mente viajar. É apaixonante, tem um sorriso perfeito e lábios
que... eu sou apaixonada. Tudo perfeito, não? Porém, a minha loucura
sobressai e isso acaba impedindo que avancemos.
A parte curiosa desta história é que, desde o primeiro beijo, só tenho ficado
com ele. Passei a controlar as próprias necessidades do meu corpo apenas
por beijos quentes. Há algo diferente nele que mexe comigo...
Talvez seja uma boa ir a aula esta noite. Certamente a faculdade estará
vazia, eu serei uma das poucas alunas na classe. Acho que essa é a opção
mais tentadora. Talvez seja o dia ideal para avançar as coisas entre nós.
Cansei de beijos. Quero saber o que mais ele tem a me oferecer.
Ligo meu celular e a primeira coisa que faço é ligar para Bruno —
mais conhecido como Bruninho — meu ombro amigo em horas vagas e
amigo a um longo tempo.
— Olá! — atende, animado.
— Olá, bom, acabo de ver seu depoimento. Ainda não me decidi,
mas te avisarei mais tarde. Talvez eu tenha que ir até a faculdade.
— Ana, vou esperar, mas vou deixar claro que não quero planos
loucos com as meninas hoje. Chamei você para sair, tipo um encontro a
dois mesmo. Seria em uma boate, mas seríamos nós dois. Ficaríamos lá
um pouco, sairíamos para comer algo e então faríamos outro programa.
Faz um tempo que não beijo sua boca — o tom de voz dele me faz arrepiar
e meu ventre se contorce em ansiedade.
Nós dois somos muito bons juntos. Temos muita química, muita
liberdade um com o outro. Seríamos um bom casal se quiséssemos. Mas
optamos por sermos melhores amigos e somos extremamente felizes
assim, sem problemas, sem estresse, nos pegando apenas quando
sentimos vontade (é raro). Ele é mais quieto e muito mais centrado que eu
e, além disso, há outra pessoa que simplesmente parece meu par perfeito e
que estou tentada a encontrar devido ao excesso de química e
compatibilidade.
Bruno sabe que estou vivendo uma fase de completa insanidade
desde o término do meu relacionamento, meio que um grito de revolta por
todas as coisas ruins que passei. Ele respeita isso, mas sempre que surge
oportunidade me repreende. Ele até gosta um pouco das minhas amigas,
mas julga que elas não sejam uma boa companhia, devido a todo álcool
que consumimos.
Bom, então já tenho algumas possibilidades para essa noite, é bom
ter opções.
— Eu sei que faz um tempo que não beija a minha boca e,
sinceramente, eu quero muito beijar a sua, não apenas isso. De qualquer
forma, vamos fazer o seguinte, assim que eu chegar em casa e decidir algo
te ligo, ok?
— Ok. Ficarei aguardando.

Quando chego a casa minha mãe já está nos preparativos para


aproveitar a noite.
Minha mãe é um ser humano que deveria ser estudado. Ela sai muito
mais que eu, e seria divertida se eu não soube que tem alguns traços
tóxicos. Desde que meu irmão se foi ela nem mesmo se importa quando eu
resolvo dar festas em casa. Ela sai de quarta a domingo, religiosamente.
Vai para baladas feitas especialmente para pessoas da faixa etária dela e
chega altas horas da madruga. Nunca há tempo ruim para ela e eu acho
isso o máximo, especialmente por conta da liberdade que ganho.
— Mãe! — cumprimento-a quando chego a casa.
— Filha, como foi o trabalho? Vai para a faculdade hoje?
— Mãe, o trabalho foi bom. Não costumo ir para a faculdade nesta
data, mas estou querendo enfrentar isso está noite — comento, pegando
uma banana. — E a senhora?
— Vou para o Síder com as meninas. — Síder é o tal clube onde ela
vai rebolar a bunda ao som de bolero, forró, entre outros.
— Isso aí! Vá aproveitar a vida adoidado!
— Não vai sair hoje, após a faculdade?
— Talvez. Já é uma noite infernal, imagina ficando sozinha em casa?
Bruninho me chamou para sair, mas as meninas também chamaram. Estou
um pouco indecisa. Há algo dizendo que se eu optar por sair com Bruno
vou acabar perdendo alguma coisa.
— Bruno é um bom rapaz, mas sempre fico com a sensação de que
ele quer mais do que uma simples amizade. Se você não quer ir além com
ele, é melhor optar pela programação com as suas amigas. Além disso,
sinto mais conexão entre você e Rafael. — Ela defeca pela boca. — Eu
amo mesmo é o meu Rafinha, você sabe. — Ela viu meu sofrimento, viu
todos os terrorismos que o meu ex fazia comigo e, ainda assim, o ama.
O filho da puta sabia como jogar com a mente até dos meus
familiares, mas é um absurdo que minha mãe goste do homem que
desgraçou a minha vida. Ela viu tudo de perto, todo sofrimento, todo abuso.
Ela até mesmo concordava com algumas atitudes inadmissíveis. Nunca
aceitarei.
— Pois eu gostaria que o seu Rafinha tomasse no centro do olho do
cu — digo, deixando-a só e indo tomar banho.
Embaixo da ducha eu liberto meus sentimentos e choro. Sei que é
louco, mas ainda dói quando o nome dele surge em pauta. Porém, logo em
seguida, eu visto minha armadura e saio do banho decidida a aproveitar a
noite no melhor estilo. Lugar de defunto é enterrado!
Demoro um tempo me maquiando e escolhendo uma roupa.
Capricho no visual mais do que deveria, mas fico contente com o resultado.
Estou usando um vestido preto soltinho da cintura para cima, possui um
decote sútil e nada vulgar, e é mais grudado da cintura para cima. Em meus
pés, Scarpins pretas de salto agulha dão todo o toque final. Meus cabelos
são negros e longos, estão soltos caindo como cascata pelas minhas
costas. Optei por uma maquiagem delicada para não ficar tão chamativa.
Em minhas orelhas há brincos delicados de prata e em meu braço direito,
relógio e duas pulseiras pratas. Sim, não uso relógio no braço esquerdo. Me
julgue!
É junho e sei que está frio lá fora, escolho um sobretudo preto para
compor o look. Porém, mantenho a esperança de que, em algumas horas,
estarei calorenta, de um jeito ou de outro. Se não tiver um encontro sórdido
com meu professor, terei um encontro sórdido com uma garrafa de pinga.
Quando saio do meu quarto minha mãe também já está pronta e indo
para o crime.
— Ana, não vá se embriagar e dirigir, está me ouvindo? Caso beba,
largue seu carro na rua e peça um táxi.
— Deixa comigo. Aproveite a noite e arrume algum boy que preste!
Ela sai e eu pego uma long neck na geladeira para beber enquanto
espero mais alguns minutos para sair. Por obra do destino, Bruno me envia
uma mensagem dizendo que surgiu um imprevisto com a mãe dele e nosso
plano terá que ser adiado. Quase não consigo disfarçar a satisfação ao
saber disso. Ficaria um pouco chato dizer que havia optado pela faculdade
ao invés de uma foda garantida com ele.
Quando decido que já enrolei o bastante, entro em meu carro, coloco
uma música e sigo rumo a mais uma aula interessante.
CAPÍTULO 3

Tão previsível quanto possível! Nem vou repetir todo script, mas estou
rindo. Dirijo pela avenida principal lentamente, escutando músicas
aleatórias e analisando as pessoas nas filas dos restaurantes, alguns
casais apaixonados, outros não.
Tudo vai caminhando bem até uma pessoa surgir no meu campo
de visão. Meu ex. E ele não está sozinho, está com um mulherão à
tiracolo — uma que conheço bem.
Ele está com essa garota por volta de uns 2 meses e está noivo.
Nós namoramos pouco mais de 1 ano e ele nunca foi capaz de colocar
NAMORANDO no Orkut. Isso me feriu quando descobri, por um tempo me
senti inferior, uma pessoa que não vale a pena ser assumida para todos.
Talvez eu não me encaixasse no critério de perfeição dessa
beldade! Só não o chamo de filho da puta porque a mãe dele é uma das
pessoas mais maravilhosas que já tive o prazer de conhecer. Pobrezinha,
um dia ela foi à porta da minha casa agradecer a mim e a minha mãe por
permitirmos que ele dormisse em nossa casa; ela disse que não suportava
quando ele estava em casa, que ele a deixava louca e brigava
incansavelmente com o irmão gostoso que possui. O irmão dele é um
sonho que nunca poderei realizar e é o oposto do ogro que ele é.
Disposta a não me atrasar, acelero o carro rumo à faculdade. Logo
no estacionamento avisto alguém que faz meu coração acelerar e minha
calcinha umedecer no mesmo instante. Ricardo Bueno, meu professor
irresistível! Até mesmo a música “From this moment on” começa a tocar
em minha mente conforme o observo caminhar. Abençoado seja esse
homem nu e a bagagem que ele carrega dentro das calças! Meu ex
precisa de ao menos uns 7 centímetros de pica para chegar no potencial
de Ricardo.
Não sei descrever ou explicar o que existe entre nós, mas, em
alguns momentos, sinto que ele não me leva muito a sério. Entendo e não
o julgo, ele é um homem maduro e bem resolvido, já eu..., eu não passo
muita credibilidade, especialmente minhas ações não passam. Tenho
todos os receios do mundo em me entregar a um novo relacionamento, e
costumo agir como uma garota inconsequente. Só eu sei o quanto foi
difícil colocar um fim no relacionamento tóxico que vivíamos e o quanto
doeu superá-lo.
Me lembro de quando terminamos. Às quatro horas da tarde entrei
dentro do carro dele, diante da minha casa, e coloquei um ponto final em
tudo porque enxerguei que era o melhor a ser feito. Às sete da noite eu
estava de joelhos no chão, diante da minha mãe, pedindo para que ela
ligasse para ele e implorasse para ele voltar. Foram longos dias assim,
chorando em cima de uma cama, com febre emocional e uma dor que
causava falta de ar. Era terminar e enfrentar o fim ou permanecer e acabar
sendo agredida fisicamente. Rafael já tinha feito um estrago psicológico
feio e só restava o estrago físico para completar a destruição.
Quando me reergui, eu havia me transformado em outra pessoa;
uma mulher calejada, revoltada com a vida, se auto amaldiçoando por ter
se permitido ser tão boa e disposta a recuperar o tempo que perdi naquela
relação. Eu me transformei e nem sempre sinto orgulho da pessoa que me
tornei.
A vida que levo desde o término do meu namoro é um pouco louca.
Muitas bebidas, muitas festas, muitas loucuras. Observando Ricardo à
distância, me dá um pouco de tristeza. Eu queria que ele me visse de uma
outra maneira, embora eu morra de medo me entregar. Estar perto dele
me dá uma vontade incontrolável de ser valorizada, de me tornar o centro
do seu universo. Mas como fazer isso quando eu mesma não me dou o
devido valor?
Ricardo é dedicado, inteligente, esforçado, centrado, sério na maior
parte do tempo, tem 37 anos de pura gostosura. Enquanto eu sou o
oposto. Tornei-me uma pessoa um tanto quanto inconsequente, por mais
que estude e trabalhe. Eu ainda não encontrei meu lugar no mundo. É
bastante difícil ter forças para buscar isso quando alguém insistia em dizer
que você nunca seria nada na vida. Essa merda se fixou em minha mente
e eu ainda tenho esperanças de um dia superar esse fardo e a pressão de
mostrar que, sim, eu sou alguém, eu sou realmente boa. Eu sou. Eu
costumava ser antes dele.

O encontro em um dos corredores da faculdade. Ele me analisa por


completo e sorrio.
— Professor — cumprimento-o quando para diante de mim, sentindo o
bendito cheiro do seu perfume. Ele usa Malbeck, algo que deve ser
julgado como simples para muitas pessoas, mas que consegue ser o
melhor perfume do universo. Eu sou completamente viciada; não sei se é
no perfume ou se é em Ricardo. Ele surge e todos os demais homens
desaparecem da minha mente. Se Bruno me chamou para sair hoje eu
nem me lembro mais.
Estremeço por completo quando ele faz um som rouco com a
garganta.
— Ana, você está linda. Arrumada demais para apenas uma noite
de aulas. — Diz, observando-me de uma maneira intrigante. — Sairá com
o namorado? — Pergunta.
— Bom, professor, até onde sei não possuo um namorado.

Observando Ana Laura, tudo me leva a crer que seria uma péssima
ideia me arriscar em um relacionamento com ela, especialmente na data
de hoje. Ter a consciência disso não afeta nem mesmo um pouco o meu
desejo de correr riscos.
O que me faz pensar nisto? Vejamos: Ana leva uma vida muito
desregrada e aventureira, insana combinaria bem para descrevê-la. Como
se não bastasse todos os sinais para eu me manter distante, ela é minha
aluna, o que significa que um relacionamento entre nós é antiético —
embora eu tenha me esquecido deste fato quando ela me beijou pela
primeira vez. A junção de todas essas coisas dificulta muito as coisas
entre nós.
Então eu simplesmente resolvi ignorar os contras e... Maldição!
Confessar os meus pecados deveria servir de ajuda, mas não ameniza
absolutamente nada.
É inegável que eu esteja nutrindo sentimentos por ela, não poderia
ser diferente. Quando ela está com a guarda baixa e me permite entrar um
pouco em seu universo, sempre me surpreendo. Por trás da garota
inconsequente, há uma mulher incrível. Eu diria que existe 2 versões dela:
a alcoolizada — que não é nada bonita —, e a sóbria, que a deixa
completamente diferente. É quando ela se mostra inteligente, perspicaz,
interessante.
No entanto, como nem tudo pode ser perfeito, sei que ela sofre
interferências. A influência das amigas e o fato dela possuir um trauma de
relacionamentos tem sido obstáculos difíceis de vencer.
A verdade é que temos muito em comum, mas lidamos com os
acontecimentos de forma diferente. Ambos saímos machucados de
relacionamentos. Eu terminei um relacionamento pouco mais de um mês
antes de Ana me beijar. Assim como ela terminou um relacionamento
recentemente. Quando nos beijamos, ainda estávamos feridos. Parece
bizarro, mas foi legal quando nos abrimos um pouco um para o outro e
quando descobrimos ter passado pelos mesmos traumas. Nos tornamos
bastante íntimos dessa maneira. A situação entre nós tem avançado,
tornando-se mais intensa e interessante. O bastante para que nossos
assuntos fujam do nosso passado fodido.
Nas duas primeiras semanas em que ficamos, eu deixei de ser o
professor exemplar que sempre fui. Poderia dizer que fui corrompido. Não
deveria ser assim, ao menos não dentro da faculdade. Estar aqui, no lugar
que eu considerava sagrado, agora me faz procurá-la como um
dependente. E, quando a encontro, sua imagem dança em minha mente
de uma maneira que arranca toda a minha concentração, especialmente
quando estou dando aula em sua classe. É quase trágico, mas já chego
na faculdade pensando quando irei encontrá-la.
Ela é uma das mulheres mais maravilhosas que já tive o prazer de
conhecer, mas está perdida, tentando mostrar ser uma coisa que não é.
Eu sinto que, em pouco tempo, a conheço bem, talvez a conheça até mais
do que ela mesma. Ana adotou uma postura de rebelde e se mantém
sempre na defensiva, sempre ignorando os fatos e sentimentos. Ela acha
que é capaz de mascarar o que sente, mas é transparente o bastante
para não conseguir. É possível ver sua luta entre o que quer e o que ela
gostaria de não querer. Confuso, mas é exatamente assim.
Neste exato momento eu acabo de presenciar o brilho em seus
olhos pelo simples fato de me encontrar. Sinto que ela quer mais do que
demonstra. Ana ignora o fato de que está louca por mim e isso me obriga
a ignorar o fato de que estou louco por ela. Ela não é tão boa em
mascarar isso, eu sou. Cada um usa o mecanismo de defesa que julga
apropriado, mas até quando jogaremos esse jogo?
Tenho uma turma de amigos que estão em relacionamentos sérios,
eu sou o único solteiro e o único que é fiel a uma pessoa que nem mesmo
me leva a sério.
Enquanto todos traem suas respectivas namoradas, eu sou fiel à
uma aluna maluca e ao que temos. Talvez eles traiam por estarem
insatisfeitos em algum ponto da relação. O que existe entre nós é tão
intenso e incrível que nem mesmo consigo sentir insatisfação a ponto de
ter que buscar em outra pessoa o que falta nela, e nem mesmo fizemos
sexo ainda.
Por que não fizemos sexo? Porque tenho lutado para ignorar as
próprias necessidades do meu corpo. Eu e Ana estamos em fases
diferentes. Tenho 37 anos, já vivi o furor da pós-adolescência, do início da
vida adulta. Eu amo sexo tanto quanto é possível amar, mas não sinto
prazer em quantidades, números, em ser só mais um ou fazer uma só
vez. Se eu e ela avançarmos para esse nível, temo tornar-me um trato
desgovernado sobre a garota, porque vou querê-la exclusivamente para
mim, para o meu prazer, para pertencermos um ao outro. Minha.
A minha única insatisfação é o fato de eu querer mais e ter que
manter como se estivesse bem com a forma que estamos conduzindo as
coisas. Sim, eu não sou tolo de demonstrar tanto o que eu sinto e permitir
que uma garota de 21 anos massacre meu coração. Por isso, algumas
vezes, tento mostrar um distanciamento que nem mesmo existe.
O ex-namorado dela foi um grande babaca. O homem a torturou
psicologicamente e a fez duvidar de sua própria capacidade. Na mente de
Ana, ela nunca chegará a lugar algum. Ana está cursando Administração
apenas para ter um diploma, trabalha na Gerdau apenas para ter um
emprego, bebe como louca apenas para mostrar que está bem. É tudo
uma completa mentira em que se apega para mostrar aos outros que está
no controle, feliz e que está tudo maravilhoso. Não está. Eu já ouvi relatos
de que ela era outra pessoa antes daquele babaca. Nada contra mulheres
que saem e aproveitam a vida excessivamente, mas Ana não era assim.
Era uma garota quieta, centrada, sonhadora, caseira, com poucos e bons
amigos.
Essa Ana do passado aparece todas as vezes em que está em
meus braços e é exatamente quando ela se revela, que sinto meu coração
se apertar. Sempre que ela percebe que as coisas estão mesmo ficando
sérias, se afasta. É o mecanismo de defesa que ela adotou para não ter
seu coração massacrado novamente. E esse mecanismo faz com que
perca uma grande oportunidade de viver um relacionamento com um
homem que vai valorizá-la e que faria muito para vê-la feliz, realizada e
saciada nos mais diversos sentidos: eu!
Também já tive meu coração destruído. Meu antigo relacionamento
foi tóxico e traumático.
Bruna, minha ex, é o tipo de mulher mimada. No início eu
enxergava suas atitudes como dóceis, achava até que era excesso de
fofura (sim, pode rir). Mas, com o passar do tempo, eu fui percebendo que
o que achava ser dócil nada mais era que atitudes de uma mulher
mimada, que sabia jogar com as pessoas.
Com sua voz doce, suas falas infantis, Bruna conseguia me enrolar
bem. Eu era como um tapado na relação, sem voz ativa e dando tudo de
mim. Para completar, ela era dona de uma beleza surreal, parecia um
anjo. Nosso sexo era razoável. Mas, já para o fim do relacionamento,
tornou-se extremamente frio. Eu precisava quase implorar para termos um
momento sexual. As desculpas eram as mais variáveis; desde dor de
cabeça ao cansaço. Foi indo até eu colocar um ponto final, mas não foi
fácil chegar a essa decisão.
Ana e eu temos até mesmo isso em comum. Ela terminou com o ex
mesmo o amando, eu terminei com a minha ex mesmo a amando. E,
desde então, tentamos superar toda merda. Há apenas um ponto que nos
difere: ela parece ter adquirido um trauma de se entregar, eu não. Estou
na teia dela, aguardando pelo momento em que sua visão se expandirá e
conseguirá enxergar o que está bem diante de seus olhos. É evidente e
ela apenas foge do óbvio por medo.
Por enquanto tenho sido paciente. Mas, confesso, o limite está se
aproximando. Já está se tornando insuportável vê-la cada vez mais
perdida e negando que existe algo entre nós.
Ana é uma linda morena e, especialmente hoje, está mais gostosa
que o normal, até mesmo parece ter se vestido para provocar; parece que
acordou com o propósito de testar cada um dos limites dos homens e está
me provocando com seus sorrisos que dizem muito. Ela quer ir além, eu
também. Mas será que é o momento certo?
Está evidente que decidiu jogar, e sei jogar esse jogo, por isso
estou seguro de mim, demonstrando não ser afetado a cada vez que ela
estica o vestido em seu corpo, apenas para deixar seus seios o mínimo
visíveis aos meus olhos.
— Nenhum compromisso esta noite? — Indago, avaliando-a.
— Não sei. Me diga você, professor. Eu tenho algum compromisso
esta noite? —Sorrio, mesmo querendo segurar. Ela é engraçada quando
está pronta para o ataque.
— Bom — digo, verificando a hora em meu relógio. — Talvez, no
final da aula, podemos decidir isso juntos.
— Estou ansiosa para o final da aula, então — provoca. — Até
mais, professor.
CAPÍTULO 4

A aula passa mais rápido do que o esperado.


Uma mensagem em meu celular faz meu coração disparar em meu
peito.

“Deixe seu carro no estacionamento e venha até o meu.”

Eu vou.
— Planos para essa noite? — ele sussurra em meu ouvido assim
que entro no carro. Arrepio-me por completo antes de encará-lo.
Sua boca desliza pelo meu pescoço e eu começo a gemer sem nem
mesmo ponderar o local em que estamos. Abro meus olhos para ver
se há alguém próximo ao carro, mas, por sorte, não há ninguém.
Uma mão desliza pelo meu seio e eu levo minha mão em sua
ereção. É completamente errado, mas eu daria para ele exatamente
aqui nesse lugar.
— Ricardo... me tira daqui — peço, e ele se afasta de uma só vez.
Dessa vez não protesto. Ele está decidido a nos tirar daqui com
urgência. Fica ainda mais evidente quando ele acelera.
Seguimos até um condomínio, e logo ele estaciona diante de uma
suntuosa casa. É aí que, contrariando a insanidade que possuo, me
torno ansiosa e receosa. É provável que atingiremos um novo nível
agora. Ele é um homem bem maduro, muitos anos mais velho e
mais experiente. Estou me sentindo como uma garotinha medrosa
quando ele surge abrindo a porta do carro para que descer.
Na varandinha, ele volta a me beijar como um predador. Suas mãos
descem diretamente para as laterais das minhas pernas e então vão
subindo de maneira tortuosa para dentro do meu vestido. Estou
ofegante, uma bagunça, e piora quando ele abre a porta da casa
para que possamos entrar.
— Está certa sobre o que quer? — Indaga, me olhando de uma
maneira que beira a indecência. — Preciso que saiba que é um
caminho sem volta, Ana.
— Um caminho sem volta? — Questiono.
— Não sou um moleque, não sou como o babaca imaturo que a
magoou. Tentei adiar ao máximo o acontecimento de hoje, mas
sabemos que não dá mais.
— Não dá — concordo.
— Você gosta de mim. Mais do que está disposta a assumir. Eu não
serei o homem paciente que vai suportar ficar rondando as
madrugadas em busca da garota inconsequente que insiste em
teimar ser. Nós vamos atingir o novo nível, e então será minha.
Obviamente não será a minha prisioneira ou terá que renunciar a
um pouco de diversão com as amigas. Mas não irei compartilhá-la,
Ana. Se quer mesmo foder comigo agora, isso se tornará um
relacionamento sério. — Estou impactada com a palavra “foder”
saindo de sua boca. — Diga, Ana..., abrirá essas pernas e me dará
essa boceta gostosa, ou escolherá ir embora?
Deus! Ricardo fala coisas sacanas! Estou arrepiada, sentindo coisas
estranhas em minha intimidade apenas por ouvi-lo falar.
É óbvio que abrirei as minhas pernas, especialmente porque quero
mais de tudo que estou sentindo e tudo o que ele está me
oferecendo. O respondo com um sorriso malicioso e retirando meu
vestido. Seu olhar desliza por todo meu corpo, incendiando cada
pedacinho por onde passa. Retiro minhas sandálias também.
O observo retirar a camisa, chutar os tênis, as meias, descer a calça
em uma velocidade recorde. Mordo meu lábio fortemente quando
ele abaixa a cueca. Estou surpresa com a visão que estou tendo.
Ele é generoso. Seu pau é grande, grosso, perfeito. Sou capaz de
sentir como é ser invadida por ele. Estou divagando quando ele me
pega insanamente, retirando meu sutiã como um verdadeiro expert,
rasgando minha calcinha e me jogando contra a parede.
Eu sorrio, mas o riso morre quando ele provoca, deslizando seu pau
em minha entrada.
— Você está molhada, Ana. Nem mesmo preciso estar dentro para
sentir. Quer muito isso, não é mesmo?
— Eu não sabia que era o tipo provocador.
— E eu não sabia que ficaria tão louco por você, garota — sussurra
em meu ouvido antes de deixar uma leve mordida no lóbulo da
minha orelha.
O puxo para um beijo arrebatador e, no processo, ele me invade de
uma só vez, surpreendendo-me. Um gemido alto escapa de mim,
um misto de dor e satisfação plena. Ele afasta nossos lábios, me faz
levantar a cabeça, puxa meus cabelos, segura meu pescoço e me
fode impiedosamente, olhando diretamente em meus olhos. Não
consigo escapar da eletricidade que transita entre nós. Ricardo é tão
bem-dotado, que tudo em mim se encontra preenchido e um pouco
dolorido. Ele sai por completo e entra novamente, de uma só vez,
com força. Eu deliro em seus braços, deleitando-me com a
sensação mais incrível que já senti. Fazer sexo é bom, mas fazer
sexo com quem está disposto a foder seu corpo e sua mente é
INCRÍVEL. Ele se parece um selvagem desesperado para foder, a
imagem foge por completo do professor certinho e centrado. Uma
caixinha de surpresas.
Estou sendo fodida com determinação por um homão com braços
tão fortes que parecem capazes de me quebrar ao meio. E ele não
parece satisfeito com a parede, tanto que me leva para o quarto,
sem me deixar vazia por um segundo sequer.
Ele prende minhas mãos acima da cabeça e com a mão livre
explora meu seio. Ele ainda não está se movendo, então sou eu
quem impulsiono meu corpo, pedindo, clamando pelos movimentos.
Ricardo praticamente ruge e começa a ação. Por um momento
penso que iremos quebrar a cama. Ele é voraz e gosta das coisas
loucas no sexo.
Ele me faz abrir as pernas ao máximo e dá estocadas que me fazem
delirar. E, mesmo quando solta minhas mãos, permaneço com elas
acima da minha cabeça, me permitindo ser devorada da forma que
ele quer. Eu o deixo fazer o que quiser comigo, desde que me
proporcione o prazer arrebatador que estou sentindo agora, algo
que nunca havia experimentado antes. Ele me exterminou para
homens da minha idade, definitivamente. Ouso dizer que eles
precisam nascer de novo ou se esforçarem mais.
Ricardo segura meus quadris, arremetendo muito rápido, e eu me
sinto em completa queda livre, deixando meu corpo se desintegrar.
Um orgasmo incrível me toma, juntamente com a sensação de
saciedade e fogo. Tudo em mim parece ter sido desperto apenas
agora. Eu me pego suspirando em completa plenitude quando um
sussurro em meu ouvido me faz despertar do sonho que acabei de
ter... é como um sonho realmente.
— Quer namorar comigo? — ele pergunta, trazendo-me muito
rapidamente para a realidade.
— Se prometer que vai me foder assim diariamente, eu quero. —
Encontro forças para dizer, enquanto sorrio.
— Estou louco por você, garota. Eu só consigo pensar em todas as
maneiras que foderei minha namorada inexperiente.
— Como sabe que sou tão inexperiente?
— Está bastante visível. Mas eu gosto que seja assim.
— Gosta da minha inexperiência? — Pergunto.
— Sim, porque assim posso corrompê-la e transformá-la ao meu
modo na cama. — Engulo em seco diante das palavras
promissoras. — Agora diga que sim para que possamos quebrar
cada canto desse quarto.
— Sim. Agora cumpra sua promessa. — Peço, me movendo sob
seu corpo. — Quero muito você, Ricardo. Eu esperei durante muito
tempo para tê-lo dentro de mim. Idealizei esse momento, mas nada
chega perto do que imaginei. Você é tão gostoso dentro...
— Eu não vou sair daqui. Vou gozar em você e vou continuar
gozando e gozando, sem sair de dentro de você. Vou te bagunçar
todinha, e você vai implorar por mais. Vou fazê-la viciar em mim da
mesma forma que estou viciado em você. — Meu corpo formiga de
desejo enquanto ele diz cada uma das palavras. Deslizo minhas
mãos pelas suas costas, arranhando levemente e aperto sua bunda,
fazendo-o se movimentar.
— Faça... faça tudo o que quiser. Eu quero! — Ele beija minha boca
e se afasta abruptamente. Sou girada na cama e posta de quatro,
como se fosse um fantoche. Agarro as cobertas e me empino ao
máximo para ele, conseguindo um gemido de presente.
Ele me invade lentamente e parece precisar usar todo o
autocontrole para se segurar. Essa é a posição que provavelmente o
derruba. Eu o levo ao limite.
Ele traz uma mão em meus cabelos, puxando-os fortemente e
começa a arremeter forte. Em alguns momentos, que meu corpo é
impulsionado para frente, meus joelhos quase cedem. Bruto, forte.
Ricardo não é delicado. Não é o tipo de homem que pergunta se
está doendo ou não, e isso me deixa com mais tesão do que
deveria. Ele me dá tapas na bunda que queimam e eu me sinto
como uma sádica, sorrindo a cada vez. Ricardo sabe cuidar e fazer
uma mulher gozar.
Eu faço de tudo para tornar as coisas mais difíceis. Rebolo minha
bunda e a impulsiono para ele o tempo inteiro. Ele solta sons de
aprovação e, quando estou gozando, ele se liberta dentro de mim.
Gozar juntos é perfeito pra caralho, mesmo que meus joelhos
tenham acabado de ceder e que o corpo de Ricardo esteja me
pressionando contra a cama.
Ele beija minha nuca, costas, ombros e sai de dentro de mim. Me
viro, preguiçosamente, sorrindo como uma boba apaixonada.
Não sei dizer por quanto tempo ficamos assim, mas eu não trocaria
esse momento por nada. Valeu a pena a espera. Esse homem
explodiu minha mente agora.

E foi assim que nos tornamos viciados um no outro.


Os encontros passaram as ser constantes.
As aulas tornaram-se mais interessantes.
O estacionamento passou a ser aproveitado de outra maneira.
Os perigos noturnos tornaram-se sem graça.
As noites agora são aproveitadas no meu mais novo
playground da vida: Ricardo Bueno, o professor mais gostoso
que a faculdade já teve.
E, com nem tudo é perfeito, nos tornamos alvo de fofoca dentro e
fora da faculdade, mesmo tomando o máximo de cuidado para
manter nosso relacionamento escondido por questão de ética.
Porém, seguiremos driblando até que o destino resolva mudar os
fatos.
EPÍLOGO

1 ANO DEPOIS

Hoje é apenas mais um dia incrivelmente maravilhoso para


uma mulher latino-americana comprometida!
Ah! O que dizer sobre o Dia dos Namorados? Tudo é tão
romântico!
Logo ao abrir os olhos já dou de cara com uma enorme cesta
de café da manhã da padaria Sagrada Farinha. Isso faz meu sorriso
se expandir e meu peito inflar de emoção.
Ao invés de descer da cama, como uma pessoa normal faria,
eu simplesmente pulo, radiante o bastante para agir dentro da
normalidade.
Corro até a cesta e a pego, levando-a diretamente para cima
da cama. Volto a me sentar e até mesmo ignoro a vontade de fazer
xixi. Tudo que importa neste momento é abri-la, pegar o cartão e
degustar todas as maravilhas que habitam em seu interior.
“Que espécie de namorado eu seria se não te enviasse uma
cesta da Sagrada Farinha? Me desculpe, Ana, mas preciso
seguir a tradição, algo me diz que, se eu não fizer, teremos azar
na relação! Eu amo você! Que o dia de hoje seja ainda melhor
do que essa mesma data do ano passado. Espero que esteja
preparada para a incrível jornada que preparei para nós. Pronta
para sair da rotina?
Beijos, seu professor.”

Ele é tão romântico! Eu amo!


Ok! Sei que me tornei contraditória a tudo que eu falava no
passado. Mas, em minha defesa, somos seres humanos, estamos
sujeitos a transformações. Não sou a mesma pessoa que eu era há
1 ano, tampouco possuo as mesmas opiniões.
Ricardo, com toda a maturidade que possui, surgiu e fez com
que todas as minhas inseguranças desaparecessem. Ele resgatou a
minha verdadeira essência, algo que havia se perdido por conta de
um babaca. Pode parecer fácil mudar radicalmente como fiz após
sofrer a desilusão que sofri, mas toda aquela mudança me
machucava muito. Foram muitas as vezes em que me olhava
através do espelho e não reconhecia a mulher que nele estava
refletida. Minhas atitudes não condiziam com a mulher que eu
idealizava em minha adolescência.
Aquilo fazia com que eu levantasse questões extremamente
dolorosas sobre mim mesma e, quando se tornava demais, eu
simplesmente jogava tudo para o alto e ia em busca da rebeldia,
que parecia preencher o meu vazio existencial.
Agora resgatei meu verdadeiro “eu” e tudo tem sido mais
leve. Sigo com as minhas amizades normalmente, não há
cobranças, não há torturas psicológicas. Tudo que há entre Ricardo
e eu é uma relação madura em que agimos como crianças quando
queremos e agimos como verdadeiros adultos quando necessário.
Nos divertimos, aprendemos juntos e um engrandece o outro
diariamente.
Estou comendo o primeiro biscoitinho da cesta quando meu
celular toca e o nome do meu chefe surge no visor. Me assusto, com
medo de estar atrasada, e atendo rapidamente:
— Eu fiz algo de errado?
— Que? — pergunta, confuso. — Não há nada de errado,
Ana. Estou ligando para comunicar que hoje você tem o dia de folga
para passear com o seu professor. Enfim, o rapaz foi muito
insistente e persuasivo. E acho que você merece aproveitar essa
data. Tenha momentos de diversões e volte amanhã, sem ressaca.
— Sério?
— Sério. Ele disse que, como é DIA DOS NAMORADOS, é
necessário aproveitar o dia inteiro. Então, feliz Dia dos Namorados,
Ana! — ele encerra a ligação, eu olho para a cesta e a coloco de
escanteio. De repente, ela deixou de ser atrativa. Se eu não vou ao
trabalho, então dormirei um pouco mais e deixarei todas as
guloseimas para quando acordar.
Meu sono dura muito pouco. Sou acordada pelo interfone e a
voz nada delicada da minha mãe. Quase fico mal-humorada, porém,
quando estou prestes a gritar, ela surge no quarto, trazendo um
buquê de flores da Flora CEELE.
Um sorriso de doer a mandíbula brota em meu rosto.
— Esse Ricardo está saindo melhor que encomenda, hein?
Parece que ele gosta mesmo de você — Dona Fatinha comenta,
rindo.
— Ele é... impressionante! — suspiro, pegando o cartão.

“Achou mesmo que eu me esqueceria da outra tradição? Sei


que muitos homens escolhem entre um ou outro, mas, como
sou precavido, preferi mandar as duas coisas. Deus me livre de
ter azar na relação! Brincadeiras à parte, você é incrível, Ana.
Muito incrível! E eu amo você!
Beijos, Ricardo Bueno.”

Às 10h da manhã ele surge e eu me pego radiante quando


diz que estamos indo fazer uma pequena viagem.
Viu? Todos os homens deveriam ser assim, criativos. Deus
me livre de pegar fila de restaurante e motel!
Ricardo é o melhor namorado!

Ana Laura é uma mulher que odeia a mesmice. O óbvio a


deixa irritada, a rotina a deixa estressada, a falta de criatividade a
deixa frustrada. Ela é uma mulher exigente, acredito que sejam os
baques da vida que a tenham transformado nisso. Mas não é uma
crítica. Eu gosto que ela seja assim e acho que todas as mulheres
deveriam ter certo nível de exigência, principalmente se tratando
dos homens.
Não foi uma tarefa muito difícil decidir um roteiro para
comemorar nosso primeiro Dia dos Namorados como um casal
oficial. O bom de ter sido apenas amigo dela por um longo período é
que a conheço bem. Sei seus gostos, seus desgostos, seus sonhos
e sei que ela ama muito Belo Horizonte, nosso destino no dia de
hoje. Quando a pedi em namoro ela me fez prometer que jamais
passaríamos essa data em nossa cidade natal, então estou
cumprindo minha promessa.
Assim que ela percebeu esse detalhe, passou a tagarelar
sem parar, além de fazer milhares de declarações de amor para
mim. Sim, isso é quase bizarro se tratando dela, a anti-romance.
Agora, em frente à primeira parada do dia, eu me encontro
tonto e perdido com a confusão emocional em que ela se encontra.
— Você é meu par! — Ana exclama, incrivelmente animada,
porém chorando.
— Eu sou. Meu coração está falhando aqui com todo esse
romantismo. Mas, por favor, apenas pare de chorar. É um dia
animado, prometo fazê-la rir até dobrar a barriga. Agora retire seus
óculos.
— Para quê? Eu devo estar horrível... — Ela está
absurdamente linda. Felicidade combina com a minha namorada.
— Nós estamos chegando ao destino e vou precisar que faça
algo. — Um pouco relutante, ela os retira e eu a guio. — Abra o
porta-luvas. — Ela abre e pega a venda que estava guardada,
esperando por ela.
— Uma venda?
— Preciso que a coloque, sem trapacear, vou confiar em
você. — Ela limpa as lágrimas de seu rosto e então sorri, fazendo
exatamente o que pedi. Sinceramente? Estou estranhando ela estar
obediente. Ana não é de seguir ordens ou até mesmo pedidos.
Relutância é uma característica forte que ela possui. — Você fica
uma delícia vendada, talvez eu vá utilizar essa venda à noite...
— Meu Deus! Eu estou uma bagunça perfeita de emoção,
tesão, empolgação, ansiedade.
— Guarde o tesão para mais tarde, ok, Sapinha? Prometo
que valerá a pena!
— Estou contando com isso — a senhorita exigente diz, dá
um suspiro forte e fica quietinha em seu assento. Deus, eu a amo.
Pra caralho. Não há qualquer coisa que eu não seja capaz de fazer
na intenção de vê-la feliz como está agora.
Estaciono o carro, dou a volta e a pego em meus braços.
Como um cavalheiro perfeito, jogo-a em meu ombro, dou um tapa
em sua bunda e atravesso a rua enquanto ela aperta minha bunda e
ri. Eu não sabia que essa gargalhada era meu som prefiro no
mundo, mas acabo de perceber que é.
— Sejam bem-vindos! — uma recepcionista informa,
sorrindo, enquanto coloco minha namorada no chão.
— Onde nós estamos? — Ana questiona. Sorrio enquanto a
posiciono de frente para a entrada e retiro sua venda. Ela tenta se
ajustar à claridade e vejo sua boca abrir em espanto.
— Vamos lá, namorada! Foi difícil pra caralho pedir folga para
o seu chefe. Temos que aproveitar! — digo e ela se joga em meus
braços.
— Isso é incrível, Ricardo!!!!!!!!!!! Eu amo você e amo quando
fala palavrão fora do sexo!
Uma gargalhada escapa de mim. Eu acabo de ganhar o
melhor de todos os presentes do Dia dos Namorados!

Pode parecer bobeira, mas estou extremamente feliz desde o


momento em que percebi que estávamos indo para Belo Horizonte.
Confesso que muitas coisas se passaram pela minha cabeça,
menos essa. Estamos em um parque de diversões, de frente para a
Lagoa da Pampulha que tanto amo!
É um tipo de diversão nada adulta que combina
perfeitamente conosco!
Mesmo que eu tenha tido outro relacionamento antes desse,
considero que hoje é o meu primeiro Dia dos Namorados. Tudo é
diferente quando tenho ao meu lado um homem disposto a qualquer
coisa para me fazer feliz. Esse é Ricardo e eu nunca serei capaz de
agradecer o suficiente.
Mordo meu lábio inferior e tento de todas as maneiras não
chorar, mas se torna impossível. Pergunto-me se algum dia ele
deixará de me surpreender. Parece que foi um presente de Deus
após eu ter sofrido tanto em um relacionamento abusivo. Será que
algum dia nessa vida Ricardo deixará de ser tão perfeitamente
perfeito? Quase o sufoco em um abraço que diz muito mais do que
centenas de palavras que eu poderia dizer. Parece um sonho, mas,
então, sinto o chão tocar meus pés, mostrando-me que nada disso é
um sonho e que tirei mesmo a sorte grande tendo um namorado
como ele.
— Preparada para um pouco de diversão? — pergunta,
beijando a ponta do meu nariz. Seus polegares acariciam minhas
bochechas e vejo os músculos da sua mandíbula se entesarem. Há
um misto de sentimentos passando em seus olhos, eu quase posso
vê-los.
— Eu estou preparada, animada também. É o melhor
presente de Dia dos Namorados! — afirmo, sorridente. — Vim a
viagem inteira pensando em qual motel você me levaria e olha onde
estamos? Em um parque de diversões! Meus planos seriam
totalmente sexuais.
— É claro que vamos fazer uma parada em um motel, mas
pensei em algo diferente para o dia. Você é tão insana, talvez eu
pareça tolo agora, mas tudo que consigo pensar é em quão lindo
seu sorriso vai ficar enquanto se diverte nos brinquedos. — Se um
dia odiei romance nem me lembro!
— Não, você não se parece nada tolo. — Muito pelo
contrário. Há aqui, diante dos meus olhos, o melhor namorado que
eu jamais pedi a Deus e que Ele achou que eu merecia.
— É algo singelo, genuíno e adolescente — sorri. — Mas
quis muito trazê-la aqui. Há algumas surpresas. Só preciso que
saiba que eu te amo, independente de tudo. Não se assuste com
todo meu romantismo, ok? — suas palavras intoxicam minha alma.
Porém, há um pouco de culpa em mim, bem lá no fundo. Culpa por
ter criticado essa coisa de romance e agora Ricardo se sentir
receoso.
Eu costumava ser a garota romântica, que escrevia o nome
do namorado em todos os pedaços de papeis que encontrava pela
frente. É fácil acreditar em contos de fadas até viver um
relacionamento infernal que deixa muito claro que príncipes
encantados não existem. Mas Ricardo é a prova de que não
devemos deixar de acreditar. Não é porque deu errado uma vez que
dará errado sempre.
Ele segura minha mão e começamos a explorar o local. Eu já
tinha vindo nesse parque há muitos anos, quando ainda era
adolescente, mas, pelo que vejo, muitas coisas mudaram. Está mais
moderno e mais completo.
Uma mulher surge do nada e nos entrega duas pulseiras, que
dão acesso a todos os brinquedos.
Em busca de escolher qual será a primeira diversão, meus
olhos varrem todo o local até encontrar a montanha-russa. Só pelo
meu olhar Ricardo ganha a compreensão de que ela será nossa
primeira etapa da diversão do dia. Ele sabe que gosto de
adrenalina. Meu namorado me conhece bem.
— Então a montanha-russa, hein? — pergunta, sorrindo.
— Exatamente! — exclamo, abraçando-o, e ele me joga em
seu ombro. — Ricardo Bueno! Pare com isso! Me coloque no chão!
— Sou um namorado perfeito. Estou levando minha amada
até o brinquedo, uai! Minha garota rebelde gosta de adrenalina.
— Com toda certeza, senhor bonitão. Adrenalina corre em
minhas veias — sorrio, batendo em sua bunda perfeita.
Ele me retira dos seus ombros e eu deslizo pelo seu corpo de
uma maneira indecente. Nem eu estou me entendendo no dia de
hoje, mas quem se importa? Ricardo deveria saber que nessa etapa
do nosso relacionamento ele é mais atrativo que qualquer parque de
diversões.
Ele sorri com o olhar descarado que dou e então segura
minha mão, enquanto um funcionário abre o brinquedo para nos
acomodarmos.
Fechamos as travas de segurança e eu fecho meus olhos
quando o brinquedo começa a se mover.
— Era meu preferido quando criança — sussurro em seu
ouvido. — Na fase adulta você é o meu brinquedo preferido. Você
me faz sentir mais friozinho na barriga do que a própria montanha-
russa.
— Você é safada, não é mesmo? Minha garota novinha e
safada. Não há como manter o romantismo que estou tentando ter.
— Sinto meu ventre se contrair com as palavras. Eu sou a garota
novinha e safada dele. Isso é tão quente quanto se parece ser.
—Você é muito destruidor da minha calcinha, Ricardo Bueno.
— Sou muito, não sou, meu amor? Aliás, hoje eu realmente
mereço um agrado diferenciado. — Compreendo sua sugestão. Ele
sabe que não é tão fácil assim, mas decido me divertir um pouco.
— Eu amo quando você me pega por trás — digo,
provocando-o, sabendo exatamente o que minhas palavras
causam.
— Eu estou começando a achar que seus planos seriam mais
vantajosos.
— Agora falando sério, Ricardo, eu amo você. Você é o
melhor, imbatível, insuperável, incrível, é a coisa mais linda desse
mundo inteiro — derramo meu amor até me dar conta de que
estamos no alto da montanha-russa. — Ai, meu Deus!!!!!!!!!!!! —
grito quando ela desce de uma só vez.
— Caralho, eu vou ficar surdo!
— Ninguém mandou me trazer num parque de diversões! —
grito, preparando-me para outra queda livre.
Ao todo são seis voltas. Minha garganta está seca e
arranhando quando saímos. Ricardo parece mais traumatizado com
os meus gritos do que com o brinquedo.
Para descansar da adrenalina decidimos como segunda
atração as xícaras, bem light. Seria algo normal se fôssemos um
casal normal. Mas basta olhar para a boca de Ricardo que tudo
muda. Assim, bem do nada, a pegação começa e eu sinto que estou
prestes a arrancar minha roupa fora.
Eu gostaria de entender por que isso acontece com nós dois,
porque certamente não é algo normal. Nem mesmo uma terapia de
casal conseguiria conter as labaredas que transitam entre nós dois.
— Porra, Ana! Mil vezes porra! Você quer me desmoralizar
nesse parque? — Eu dou mais uma gargalhada. — Seu sorriso me
faz ganhar a porra do dia inteiro, minha princesa. Desde que me deu
a oportunidade de ser seu namorado, eu vivo para fazê-la sorrir e,
cada vez que consigo, dá uma sensação incrível de estar cumprindo
meu dever.
— Não me faça chorar, por favor. Isso vai me desmoralizar —
brinco, beijando a ponta do seu nariz e deitando minha cabeça em
seu ombro.
Quando saímos da xícara, decidimos comer churros.
Acontece que Ricardo e eu somos absurdamente pervertidos. Eu
nem mesmo posso lamber o doce de leite escorrendo que esse
simples gesto parece levar meu namorado ao limite.
Definitivamente, nós perdemos o propósito desse passeio, tenho
certeza. Ricardo parece ligeiramente arrependido por não ter ido
direto a um motel e, de propósito, decido prolongar ainda mais
nossa estada nesse parque, apenas para enlouquecê-lo.
— Ok, vamos ao carrinho de bate-bate, assim mantemos a
distância um do outro — sugiro, fazendo-o rir.
— Qualquer coisa para ficar longe de você agora, Ana.
— Você foi extremamente romântico agora — brinco, dando
um soco em seu braço.
— Queria fazer sexo no banheiro do parque — confessa, me
deixando chocada.
— Você deve estar ficando maluco, professor. Só isso
explica.
— É sério. Vamos lá, Ana, você gosta de uma coisa errada!
— Até curto mesmo, mas não em um parque de diversões.
— Guarde seu combustível para mais tarde, namorado.
Agora vamos para outro tipo de adrenalina! — informo, seguindo em
busca dos carrinhos de bate-bate.
É o brinquedo onde mais nos divertimos, vamos ao menos
cinco vezes seguidas. Ricardo possui um senso de direção perigosa
absurda e me mata de rir a cada curva engraçada que faz. Já eu,
passo o tempo todo na missão de fugir dos seus ataques, mas eles
acontecem e eu fico o tempo todo pulando e gargalhando com os
solavancos que recebo.
Após a loucura, pegamos um balde de pipoca e seguimos
para a roda gigante. O desastre surge quando resolvemos nos beijar
no alto e o balde de pipoca cai de nossas mãos, fazendo com que
as pipocas voem.
— Oh, merda! — exclamo, gargalhando. — Isso foi trágico,
porém bonito. Uma chuva de pipocas!
— Trágico é estar duro, Ana. O fato de você ter ficado
“interditada” por quatro dias complicou as coisas para mim! — Ele
está se referindo à minha menstruação. — Eu planejei tudo de
maneira divertida nesse parque e agora só consigo pensar na forma
mais rápida de tirá-la daqui.
— Podemos controlar o fogo, agora é sério. Vamos esquecer
que existe sexo e vamos apenas aproveitar. Foi para isso que
viemos aqui. O sexo apenas não existe mais, ok? Somos virgens,
puros e inocentes.
— Nós conseguiremos. Temos a força, princesa. — Eu deito
minha cabeça em seu ombro e seguimos o fluxo da roda gigante. É
tão legal ver parte da cidade do alto. Me aconchego mais aos
braços do meu namorado e respiro o ar puro. Plenitude nem sempre
é estar saciada sexualmente, plenitude é estar nos braços dele, é
saber que temos uma linda relação, que somos cúmplices, fiéis,
amigos, que somos felizes e...
Não sou corna!
Nós repetimos mais uma dose da roda gigante e nos
perdemos cada um em seus devidos pensamentos. Se me fosse
concebido um poder, eu escolheria o poder de ler mentes. Daria
muitas coisas para saber o que se passa por trás do olhar do meu
professor. Será que ele está fazendo reflexões sobre o passado e
presente? Será que ele se sente tão no auge da plenitude quanto eu
me sinto?
Não sei ler pensamentos. Mas há algo que sei bem: apreciar
o quanto ele é incrivelmente lindo, meu Deus!
Quando fica sério e pensativo sua mandíbula fica rija, seu
olhar vagueia, distante.
Quando fica brincalhão e sorridente, seu olhar brilha.
Ricardo se porta de maneira séria a maior parte do tempo. Só
é brincalhão quando estou perto. Todo o restante do tempo ele é um
homem cem por cento centrado, que parece ter mais idade do que
tem. Amo os momentos reservados a mim, em que ele se permite
ser completamente leve. Nestes momentos, ele faz drama, finge
carência, cria brigas só para quebrarmos o pau e fodermos como
selvagens, inventa atividades físicas juntos... É um sonho encantado
de homem. Temos uma relação que eu nem mesmo sabia que
poderia existir. Tão intensa, regada de cumplicidade e amor. Jamais
imaginei que seria assim... Valeu a pena ter corrido o risco de
entregar meu coração novamente.
Saímos da roda gigante, incrivelmente mais calmos, e vamos
à pescaria ganhar brindes bobos.
— Neste momento só consigo pensar em mil e um tipos de
brincadeiras que quero fazer com você essa noite — ele sussurra
em meu ouvido, fazendo com que um arrepio tome todo meu corpo.
— Não quero mais ir aos brinquedos — meu lado devasso dá
as caras mesmo após eu decidir que torturá-lo seria meu propósito.
— O que você quer?
— Você! — digo, puxando-o para mim.
— É uma pena, Ana, não posso atender ao seu pedido agora.
Quando a convidei para ir até o banheiro, fortalecer uma rapidinha,
você não quis. Acabei desanimando. Realmente tenho grandes
planos de brincadeiras adultas, mas vamos deixar para mais tarde.
Não fique triste ou frustrada, a noite está se aproximando e ela
certamente será uma criança — avisa, saindo da minha traseira e
andando em direção ao brinquedo KAMIKAZE.
Nossa última parada é no tiro ao alvo. Ricardo cismou que só
sai daqui quando ganhar um urso para mim.
— Ok, para ganhar o maior urso eu tenho que acertar qual?
— ele questiona ao garoto que cuida da barraquinha.
— O número 161 na primeira tentativa — o garoto explica.
— Se eu ganhar você vai viajar comigo no próximo final de
semana para algum lugar isolado da civilização, onde poderemos
andar nus — informa na cara do garoto, me deixando mortificada. O
que deu nesse homem?
— Ricardo Bueno! — advirto, quase abrindo um buraco no
chão.
— Não somos crianças. Somos namorados, é óbvio que o
garoto sabe que fazemos sexo. Não sabe?
— Claro. Pessoas comprometidas fazem sexo — o garoto
responde, rindo, no mínimo achando meu namorado um louco
pervertido.
— Solteiros também, sexo é vida — Ricardo diz, sorridente.
— A não ser que tenha feito um voto de castidade, aí já não faz.
— Isso não pode ser sério! — exclamo, ainda embasbacada
com a conversa.
— Então, camarada, se eu atirar no 161 o urso é meu? —
Ricardo pergunta com um tom de seriedade agora. Quem vai
entender esse homem? Ninguém!
— Todo seu.
— Valendo a porta dos fundos e uma viagem — meu
namorado pisca um olho para mim, mira no número 161 e dá um tiro
certeiro, como se fosse um atirador de elite. Eu fico com a boca no
chão tamanha a rapidez e precisão do disparo.
— Caralho! Como você fez isso? — pergunto, no auge da
incredulidade. Não é possível!
— Sou bom de mira. Na verdade, não apenas bom de mira.
Sou bom em tudo, né, amor da minha vida? Pode confessar, Ana.
Sou foda — brinca, se gabando, e pega o enorme urso. É lindo, dá
para dormir em cima dele fácil. Estou ainda mais apaixonada agora.
Ele me entrega o urso, mas, assim que o abraço, sinto algo
dentro da camisa da pelúcia.
— Há algo aqui. — Informo a ele, que sorri.
— Será?
— Ricardo, Ricardo... — sorrio, entregando-lhe o urso
novamente para poder ter as mãos livres. Eu encontro uma caixinha
de veludo e franzo a testa.
— Vamos lá, abra — incentiva e então eu a abro para
encontrar algo um tanto quando chocante.
— O que é isso? Ok, eu sei o que é... — Meu Deus do céu!
Como ele preparou isso? Não saímos de perto um do outro desde
que chegamos aqui.
— Eu amo você — afirma com um tom totalmente diferente
agora. — Eu quero tudo com você, Ana. Tudo. O pacote completo.
— O que isso significa? — Eu sei o que significa, mas estou
tremendo agora.
— Algumas coisas — responde vagamente. — Você quer?
— Ricardo, por favor, me diga... — peço, com os olhos
lacrimejando, encarando fixamente seus olhos cor de mel que, por
algum motivo, estão mais escuros neste momento.
Quando eu era apenas uma adolescente vivia sonhando com
esse momento. Agora que está me acontecendo, me encontro
prestes a desmaiar com o impacto. Nos meus sonhos de contos de
fadas era tudo totalmente diferente, havia meus pais presentes, um
grande jantar em família. Mas Ricardo é um príncipe encantado
diferenciado. Não seria ele se fizesse um pedido da forma
“tradicional”.
Encontro-me entorpecida, observando-o e aguardando as
palavras saírem de sua boca. Estou ansiosa agora, sentindo um
misto de emoções avassaladoras. Foi tão inesperado. Eu nem
mesmo tive tempo de sonhar com Ricardo me pedindo em
casamento.
— Eu quero o pacote completo com você. — Por que ele
simplesmente não pode dizer?
— O pacote completo — divago. Não acredito que estou
recebendo esse tipo de proposta em um parque, em plena luz do
dia, com um garoto que trabalha em uma das barraquinhas sendo
testemunha.
Ricardo pega a caixinha da minha mão e se ajoelha no chão,
bem diante de mim. Eu levo minha mão à boca e sinto minhas
pernas enfraquecerem.
— Ana, talvez considere esse pedido precoce, sendo que só
estamos realmente juntos há um ano. Mas eu acho que nunca
estive tão certo sobre o que quero. Você disse que eu sou seu par, e
sim, eu sou mesmo. Assim como você é o meu par e não consigo
mais imaginar um futuro em que você não esteja ao meu lado.
Somos duas pessoas que se encontraram num período em que
estávamos passando por uma forte turbulência emocional, tínhamos
tudo para dar muito errado. Mas, de alguma forma, nos encaixamos
como se tivéssemos sido criados especialmente um para o outro,
como as peças de um quebra-cabeça. Não tenhamos pressa, mas
não percamos tempo. Eu não quero apressar, mas também não
quero perder tempo. Consigo imaginar a minha vida inteira ao seu
lado, é por isso que não consegui esperar mais. Ana, minha garota
rebelde, você aceita se casar comigo?
O inevitável acontece.
Assim que Ricardo termina de pronunciar as palavras perco
as forças e tudo fica escuro...

Ana ainda está adormecida e eu nem compreendo por que


esse desmaio durou tanto tempo. Ela está recebendo algum tipo de
medicação intravenosa enquanto estou sentado em uma cadeira,
observando-a e aguardando a bela adormecida acordar.
Demora um pouquinho para que eu a encontre de olhos
abertos.
— Puta merda! — exclama ao se dar conta de onde estamos.
— Estamos mesmo em um hospital?
— É o que parece, Ana! — respondo, tentando não rir.
— Ok, já podemos ir embora? Era sonho ou você me pediu
em casamento?
— Eu? Obviamente não! É claro que foi um sonho. Está
louca, Ana? — Ela parece desapontada ao ouvir minhas palavras.
Há até mesmo lágrimas em seus olhos agora. — Ei, não chore. É
claro que é verdade — sorrio, pegando a caixinha de veludo em
meu bolso. — Eu te amo, Ana. Mesmo tendo a carregado
desmaiada pelo parque inteiro, você ainda é o meu par. Falta
apenas dizer que aceita.
— É mesmo real?
— É claro que sim — sorrio e me aproximo dela. — Você
aceita? Eu prometo fazê-la rir de fazer xixi nas calças, prometo fazer
um monte de loucuras, nunca ser insuficiente sexualmente... — Ela
dá uma gargalhada gostosa.
— Sim!!!!!! Mil vezes sim!!!!!! Ai, meu Deus! Estou eufórica
agora! Cadê as pessoas capacitadas para me tirarem daqui? Eu
estou noiva do meu professor! — Ela me assusta às vezes. Nem
mesmo permite que eu coloque a aliança em seu dedo,
simplesmente está tomada pela euforia e gritando como uma louca.
Somente quando saímos do hospital que ela se dá conta de
que não há um anel em seu dedo.
— Onde está o anel?
— Guardado. Você não sabe ser romântica, Ana. Nosso
noivado só será validado após colocar o anel em seu dedinho. —
Ela sorri e, sinceramente, nem parece que desmaiou e acabou de
sair do hospital.
É dentro do carro que coloco o anel em seu dedo e ela fica
longos minutos observando, como se fosse parte de algum tipo de
alucinação.
Pois é real. É muito real. Ela disse sim e agora, nos próximos
meses, tudo mudará. Será o fim da minha carreira universitária?
Não sei dizer, mas sei que vale à pena enfrentar tudo o que
aparecer em nosso caminho.

FIM.

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