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PRIMEIRA AULA - MICROECONOMIA 1

Departamento de Economia, UnB


Prof. José Guilherme de Lara Resende

1 Introdução
1.1 Conceitos Básicos
1.1.1 O que é Microeconomia
Microeconomia Estuda a rationale das decisões dos agentes econômicos. Provê justificativas
para uma série de problemas econômicos.

Questões Algumas questões tratadas pela Microeconomia:

• Efeito do aumento de um imposto de importação,


• Efeito de uma abertura comercial,
• etc.

1.1.2 Tipos de Agentes Econômicos


Os principais tipos de agentes que a microeconomia estuda são:

• Consumidores

• Firmas

• Governo

1.1.3 Consumidores e Firmas


• Consumidores

– Manifestam suas ações na economia por intermédio de suas demandas.


– Buscam o máximo de satisfção a partir de sua riqueza e dos preços dos bens e serviços
disponı́veis para consumo.

• Firmas

– Manifestam suas ações na economia por intermédio de sua demanda por insumos ou
fatores de produção e por sua oferta de bens e serviços produzidos.
– Procuram maximizar seu lucro a partir da tecnologia de que dispõem para produzir o
bem ofertado e dos preços dos insumos que compõem o bem ofertado.

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1.1.4 Análise Positiva e Análise Normativa
Análise Positiva
• Descreve o comportamento dos agentes e os resultados da interação entre os comportamentos
dos agentes.
Análise Normativa

• Estuda como os resultados deveriam ser e o que fazer para obtê-los.

Exemplo: Um modelo de economia positiva constata que existe monopólio em algum setor da
economia. A economia normativa estuda como este monopólio atinge a sociedade e o que pode
ser feito para corrigı́-lo.

1.1.5 Economia Neoclássica


Princı́pios Básicos da Economia Neoclássica:

1) Comportamento maximizador (sujeito a restrições),

2) Equilı́brio.

Esses dois princı́pios usam a idéia de racionalidade: As ações dos agentes econômicos são
coerentes com a busca de seu propósito (mesmo que essa busca resulte em um comportamento
prejudicial ào próprio agente ou à sociedade).

1.2 Mercado
1.2.1 Economia de Mercado
Em uma economia de mercado temos que:

• Sistema de preços opera livremente;


• Alocação eficiente dos recursos de uma sociedade;
• Economia de informação;
• Descentralização das decisões;
• Bens são produzidos pelos produtores mais eficientes e consumidos pelos consumidores que
atribuem o maior valor ao bem;

1.2.2 Critério de Eficiência de Pareto


Falhas de Mercado: impedem que o mercado seja eficiente (no sentido de Pareto).

Eficiência de Pareto: Uma alocação satisfaz o critério de eficiência de Pareto se não existe
como melhorar a situação de algum agente sem piorar a de outro agente.

Observação: o critério de eficiência de Pareto não diz nada sobre desigualdade. Ele é apenas
um critério mı́nimo de eficiência, que exclui desperdı́cios na sociedade.

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1.2.3 Falhas de Mercado
Algumas falhas de mercado:

• Externalidades;

• Poder de mercado;

• Informação Imperfeita;

• Bens Públicos.

Se alguma dessas falhas de mercado estiver presente, não podemos afirmar que a alocação de
recursos e bens alcançada por essa sociedade satisfaz o critério de eficiência de Pareto.

1.3 Modelos
1.3.1 Modelos Econômicos
Simplificações da realidade que ajudam a entender um problema complexo.

Exemplo: mapa rodoviário.

Navalha de Occan: regra para a escolha entre modelos: se temos dois modelos que explicam o
mesmo fenômeno, escolhemos o modelo mais simples.

1.4 Postulados
1.4.1 Postulados
Algumas idéias são primordiais no raciocı́nio econômico:

• Escassez

– recursos da sociedade são limitados;


– Sem escassez não existe problema econômico;
– Custo de oportunidade: custo de algum bem ou serviço é o valor da melhor alternativa
de uso dos recursos utilizados para se adquirir esse bem.

• Escolha (tradeoffs)

– Escassez impõe a necessidade de escolher entre alternativas possı́veis;


– Tradeoff : situação em que para se obter alguma coisa deve-se sacrificar outra;
∗ tradeoff entre canhões e manteiga;
∗ tradeoff entre eqüidade e eficiência.

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1.4.2 Postulados (continuação)
• Comportamento Individual Maximizador

• Substituição

– Agentes estão dispostos a fazer as escolhas que a escassez de recursos exige;


– Entre quaisquer dois bens A e B que desejamos, estamos dispostos a abrir mão de um
pouco de A para receber um pouco de B;
– Essa substituição normalmente envolve pequenos incrementos dos bens (incrementos
marginais);
∗ Firma: produz até o ponto em que o acréscimo de receita pela venda do último
bem produzido (benefı́cio para a firma) for igual ao custo marginal de produzi-lo
(perda para a firma).

1.4.3 Implicações dos Postulados


• Agentes econômicos tomam decisões dependendo dos custos e benefı́cios destas decisões. Se
houver alteração nestes custos e benefı́cios, as decisões podem se modificar.

• Incentivos na economia podem induzir as pessoas ou firmas a tomarem certas decisões


(agentes econômicos respondem a incentivos: importância fundamental em economia).

• desenho de polı́ticas públicas deve levar em conta que as pessoas podem alterar seu compor-
tamento devido a uma nova lei, e essa mudança pode ter efeitos não desejáveis.

• Exemplo: Lei Seca nos Estados Unidos.

2 O Problema do Consumidor
2.1 O Problema do Consumidor
2.1.1 O Problema do Consumidor
O consumidor busca a satisfação mais alta possı́vel, dada a quantidade de recursos de que dispõe.

A satisfação do consumidor é caracterizada por preferências. Os recursos do consumidor são


caracterizados por restrições orçamentárias (ou qualquer outra restrição relevante ao problema).

=⇒ Dois objetos diferentes:

• Preferências: caracterizam o gosto do consumidor;

• Restrições: caracterizam a escassez do problema.

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2.2 O Conjunto de Escolha de Consumo
2.2.1 O Conjunto de Escolha
O primeiro objeto que devemos definir é o conjunto de escolha de consumo do indivı́duo, repre-
sentado por X.

Esse conjunto contém todas as alternativas de consumo possı́veis do indivı́duo. Para problemas
sem incerteza, esse conjunto quase sempre é Rn+ .

Seja uma cesta de consumo x ∈ X, onde X = Rn+ . Então x = (x1 , ..., xn ), onde x1 , ...., xn são
as quantidades dos bens ou serviços (indexados de 1 a n) que o indivı́duo pode desejar consumir.

Note a hipótese de perfeita divisibilidade dos bens.

2.2.2 O Conjunto de Escolha de Consumo


Propriedades de X O conjunto X satisfaz as seguintes propriedades:

6 X ⊂ Rn+ ;
1. ∅ =

2. X é fechado;

3. X é convexo;

4. 0 ∈ X.

2.3 O Conjunto Factı́vel de Consumo


2.3.1 O Conjunto Factı́vel de Consumo
O Conjunto Factı́vel de Consumo, representado por B, contém as cestas de bens que o consumidor
pode de fato escolher.

Em muitos problemas que vamos analisar este conjunto é descrito pela restrição orçamentária.

3 A Restrição Orçamentária
3.1 Definições Básicas
3.1.1 Notação
A restrição orçamentária representa a escassez no problema do consumidor. Cada consumidor
possui uma quantidade de dinheiro para gastar em um determinado perı́odo de tempo, digamos
um mês.

Vamos usar a seguinte notação:

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• x1 , ...., xn : quantidade dos bens 1, ..., n;

• p1 , ...., pn : preços dos bens 1, ..., n;

• y: renda do consumidor.

Vamos usar as seguintes hipóteses:

• Hipótese 1: Preços dos bens são fixos,

• Hipótese 2: A renda y do consumidor é exógena.

3.1.2 A Restrição Orçamentária


A restrição orçamentária pode então ser escrita como:

p1 x1 + .... + pn xn ≤ y

Ou seja, o que o consumidor gasta não pode ultrapassar a quantidade de dinheiro de que dispõe.

A reta orçamentária é o conjunto de cestas de bens que custam exatamente y (ou seja, cestas
de bens que exaurem toda a renda do consumidor):

p1 x1 + .... + pn xn = y

O conjunto factı́vel de consumo é descrito por:

B = {x ∈ Rn+ ; px ≤ y}

3.1.3 Representação Gráfica para o Caso de Dois Bens


Vamos ilustrar a restrição e a reta orçamentárias em um gráfico onde os eixos representam a
quantidade dos bens.

Observe que:

• Se o consumidor gastar todo o seu dinheiro no bem 1, ele pode comprar no máximo y/p1
unidades desse bem.

• Se ele gastar todo o seu dinheiro no bem 2, ele pode comprar no máximo y/p2 unidades
desse bem.

• A reta orçamentária possui inclinação −p1 /p2 . A inclinação da reta orçamentária informa
o valor de troca de mercado entre os dois bens: para se obter uma unidade do bem 1, o
consumidor tem que abrir mão de −p1 /p2 unidades do bem 2.

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3.1.4 Representação Gráfica

x2
6

y/p2
Q
Q
Q
Q Reta Orçamentária
Q 
Q
Q
Q
Q
Q
Restrição Q
Q
Orçamentária Q
Q
Q
Q
Q
Q
QQ -
y/p1 x1

3.1.5 Custo de Mercado de um Bem


Exemplo: suponha que Carlos consuma x1 unidades do bem 1 e x2 unidades do bem 2, quantidades
que satisfazem a reta orçamentária. Carlos decide consumir ∆x1 a mais do bem 1. Para isso, ele
vai ter que abrir mão de uma quantidade do bem 2, representada por ∆x2 , de modo que a reta
orçamentária continue válida:

p1 (x1 + ∆x1 ) + p2 (x2 + ∆x2 ) = y

Subtraindo da expressão acima a reta orçamentária original, dada por p1 x1 + p2 x2 = m,


obtemos:
∆x2 p1
=−
∆x1 p2

3.1.6 Custo de Mercado de um Bem


Note que ∆x
∆x1
2
= − pp12 é o custo do bem 2 em termos do bem 1: para o consumidor obter mais uma
unidade do bem, ele deve abrir mão de pp12 unidades do bem 1.

Exemplo: Suponha que p1 = 2 e p2 = 4. Ento ∆x 2


∆x1
= − 24 = − 12 . Portanto, se o consumidor
quiser consumir mais uma unidade do bem 2, ele tem que abrir mão de 2 unidades do bem 1.

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3.2 Estática Comparativa
3.2.1 Efeitos de uma Alteração na Renda

x2
6

y ∗ /p2 Renda aumentou de y para y ∗


Q
Q
Q
Q
Q
y/p2 Q
Q
Q Q
Q Aumento
Q da Renda Q
Q Q
Q  Q
Q Q
Q Q
Q Q
Q Q
Q Q
Q Q
Q Q
Q QQ -
y/p1 y ∗ /p1 x1

3.2.2 Efeitos de uma Alteração nos Preços


Se o preço de um dos bens se modificar, a inclinação da reta orçamentária se modifica também.

Por exemplo, se o preço do bem 1 aumentar, a reta se desloca de modo que o intercepto vertical
não muda, já que o preço do bem 2 não mudou (se o consumidor comprar apenas o bem 2, ele
adquire a mesma quantidade que antes, y/p2 ).
Porém, o intercepto horizontal muda para um ponto de menor valor (se o consumidor comprar
apenas o bem 1, ele agora adquire uma quantidade menor do que antes, já que o preço desse bem
aumentou).

3.2.3 Efeitos de uma Alteração nem um Preço

x2
6

y/p2 Preço do bem 1 aumentou de p1 para p̂1


Q
@Q
@Q
@QQ
@ Q
@ QQ
@ Q
@ Q
Q
@ Q
@ Q
Q
@ Aumento Qdo
@ Preço de 1QQ
@ Q
@ QQ -
y/p̂1 y/p1 x1

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3.2.4 Preços Absolutos e Preços Relativos
O que ocorre se todos os preços e a renda aumentam?
Por exemplo, suponha que todos os preços dobram de um perı́odo para o outro. Nesse caso a
restrição orçamentária se torna
(2p1 )x1 + (2p2 )x2 + .... + (2pn )xn ≤ (2y),
igual à restrição orçamentária original,
p1 x1 + p2 x2 + .... + pn xn ≤ y.
Intuitivamente, se todos os preços da economia aumentam (ou diminuem) na mesma proporção,
incluindo a renda do consumidor, então nada muda.

3.2.5 Numerário
Portanto:
• Mudanças nos preços absolutos não têm efeito real;
• Agentes econômicos não sofrem de ilusão monetária;
• Apenas mudanças nos preços relativos têm efeito.

Podemos então transformar um dos preços em numerário, o que significa torná-lo igual a 1.
Por exemplo, preço do bem 1 como o numerário da economia: a restrição orçamentária se torna
x1 + (p2 /p1 )x2 + .... + (pn /p1 )xn ≤ (y/p1 )

3.3 Restrições causadas pela Escassez


3.3.1 Restrições causadas pela Escassez
Vamos derivar restrições ao comportamento do consumidor geradas pela restrição orçamentária.
Suponha que a demanda de um bem i qualquer depende dos preços de todos os bens e da renda
do consumidor:

xi = xi (p, y).

Essa demanda é chamada Marshalliana.

3.3.2 Restrições
Restrições:

• ”Adding-up”:
p1 x1 (p, y) + ... + pn xn (p, y) = y.
• Homogeneidade. A demanda Marshalliana de cada bem é homogênea de grau zero:
xi (tp, ty) = xi (p, y), para todo bem i, para todo t ≥ 0.

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3.3.3 Agregação de Engel e Agregação de Cournot
Vamos agora diferenciar a propriedade de ”adding-up” com relação a y e com relação a cada preço
pi , respectivamente:
n
X ∂xj (p, y)
pj = 1 (Agregação de Engel)
j=1
∂y
n
X ∂xj (p, y)
pj + xi (p, y) = 0 (Agregação de Cournot)
j=1
∂pi

Todo sistema de demandas Marshallianas deve satisfazer essas duas equações.

3.3.4 Homogeneidade
A propriedade de homogeneidade também restringe as variações que podem ocorrer com as de-
mandas Marshallianas. Podemos mostrar que a seguinte relação é válida:
n
X ∂xi (p, y) ∂xi (p, y)
pj + y = 0, para todo i.
j=1
∂pj ∂y

Ou seja, uma mudança proporcional nos preços e na renda deixa a demanda dos bens inalterada.
Mais à frente veremos essas restrições em termos de elasticidades, um conceito fundamental em
economia.

3.3.5 Conclusão
Observações:

• Todas as restrições vistas são obtidas usando apenas a restrição orçamentária;

• Nada foi dito sobre os gostos ou preferências dos consumidores;

• Mais ainda, as restrições de adding-up e homogeneidade (e as restrições a respeito da variação


da demanda Marshalliana obtidas a partir dessas duas restrições) são tudo o que podemos
dizer sobre o comportamento do consumidor usando apenas a restrição orçamentária.

Então para inferirmos mais restrições sobre as demandas, precisamos modelar as preferências
dos consumidores.

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