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Universidade Federal de São Carlos

Centro de Educação e Ciências Humanas


Departamento de Ciências Sociais.

Temas de Política Contemporânea I


Prof.ª Dr.ª Gleidylucy Oliveira

Resenha do texto: “O jornalismo no novo ambiente comunicacional: uma reavaliação da


noção do jornalismo como sistema perito.

MIGUEL, L. F. - O jornalismo no novo ambiente comunicacional: Uma reavaliação da


noção do jornalismo como sistema perito. Tempo Social, São Paulo, v. 34, p. 195-216, 2022.

Állicka Cardoso S. Belisário - 792440.

Nesta obra, Miguel produz uma análise a respeito do cenário em que se estabelece as novas
diretrizes que regem o ambiente comunicacional e informativo, onde o jornalismo, sobretudo,
a metodologia jornalística passa a atuar como um “sistema perito”, ou seja, um sistema com
uma competência única e especifica, que nessa condição de exclusividade, faz uso da
credibilidade depositada sobre ele, por seus consumidores que não possuem um senso crítico
capaz de avaliar esse sistema propriamente, estabelecendo assim, um oligopólio da
informação.
Contudo, com o avançado desenvolvimento das tecnologias comunicacionais, o ambiente
jornalístico foi inundado pela gigantesca concorrência, e pela alarmante necessidade de se
adaptar a esse contexto, fazendo com que a hegemonia dos veículos tradicionais de
informação caísse por terra, entretanto, a inserção desses novos meios comunicacionais e
informativos, também possibilitou o agravamento dos sintomas do fenômeno da “pós-
verdade”, elevando ao extremo as bolhas de interpretação de mundo, o que segundo o autor,
contribui para a crise da democracia.
A priori, Miguel define o que seria um “sistema perito” ou expert system, a partir das
concepções de Anthony Giddens sobre o termo, que por sua vez, o define como “sistemas de
excelência técnica ou competência profissional que organizam grandes áreas dos ambientes
material e social”, em outras palavras, compor um sistema perito consiste em possuir plena
competência no que se propõe, o autor ainda acrescenta que somos todos, clientes desses
sistemas em qualquer esfera da vida social, e que essa posição de clientela está
intrinsecamente ligado ao fato de crermos na competência desses sistemas, sem termos
necessariamente a capacidade de avaliar ou supervisionar o funcionamento, como cientistas
das ciências humanas, jamais poderíamos avaliar o trabalho de engenheiro, um médico ou
qualquer outro especialista.
Sendo assim, o trabalho jornalístico é um sistema perito, que tem como clientela o seu
público consumidor, e para o autor a confiança investida nos jornais é compreendida por três
fatores, o primeiro se refere à veracidade das informações relatadas; o segundo à justeza na
seleção e hierarquização dos elementos importantes ao relato; e o terceiro diz respeito à
justeza na seleção e hierarquização das notícias diante dos “fatos” disponíveis, passando pela
veracidade factual e também pelo poder de agenda do jornalismo, através do enquadramento
da notícia, salientando que o jornalismo se diferencia dos outros sistemas justamente por
possuir uma baixíssima capacidade de comprovação, independente da confiança do público.
Então, considerando essa necessidade de confiança do público, as críticas ao jornalismo
empresarial, que tem como base o ganho material, ganham força por apontarem a falta de
pluralismo no jornalismo como mercadoria, fazendo com que os meios de comunicação
ditem as formas de se apreender a realidade, o que já se mostrou muito prejudicial nas
palavras do autor: “Na medida em que o jornalismo, como sistema, monopoliza a capacidade
de dizer o mundo para o público, seu discurso particular vai transitar socialmente como
universal. As implicações são profundas, tanto na autocompreensão dos grupos sociais
subalternos quanto na estruturação do debate político - uma vez que os meios de
comunicação podem ser considerados uma esfera de representação política, aquela em que
são representadas as vozes relevantes para a troca pública de razões;” é nesse cenário que
as novas tecnologias surgem como um mecanismo, e também como um desafio para o
sistema jornalístico.
Essa dualidade da inovação tecnológica, se dá principalmente, pelo fato de que, ela estabelece
uma função que poderia nos levar à uma democratização da informação, por reduzir os custos
de produção e distribuição, proporcionando uma rápida disseminação do conteúdo desejado,
aumentando o alcance e a igualdade no acesso à informação, já o caráter desafiador, vem pelo
fato dessas tecnologias causarem a perda de centralidade dos veículos tradicionais, o que não
faz deles irrelevantes, como ressalta Miguel, mas abala com toda a certeza, a capacidade de
imposição de agendas que esses veículos exerciam no passado, o que nos leva à crise de
legitimidade do jornalismo.
No início dessa terceira sessão, Miguel aponta que: “As novas tecnologias da comunicação,
facultando o acesso de um grande número de pessoas a meios de disseminação de conteúdos
que antes eram caros e exclusivos, ampliam a concorrência ao jornalismo profissional. Mas
é a erosão dos critérios de verdade que dificulta que este mesmo jornalismo profissional
empunhe os valores de uma expertise única, que serviria para diferenciá-lo de seus novos
competidores”, isso se estabelece em um contexto em que todos os relatos são enquadrados
como narrativas particulares, colocando em um mesmo patamar, o trabalho de jornalistas
treinados e experientes, e um sujeito qualquer em um “blog noticiário”, deixando claro, que
cada vez mais, a identificação entre o emissor, e seu público é chave para o sucesso do
processo comunicativo, e não mais o fator factual do que é dito. Nessa perspectiva, surgem as
Fake News, como “narrativas” destinadas a públicos identitários muito específicos, a verdade
não é mais baseada nos fatos, e sem naquilo que se acredita ser verdade, a partir de seus
princípios e crenças particulares, acreditando naquilo que se quer acreditar, obviamente o
sistema jornalístico desenvolveu suas próprias ferramentas para lidar com a disseminação das
notícias falsas, as fact checking, contudo, Miguel afirma que: “Ao terceirizar a checagem dos
fatos - ou mesmo ao buscar uma chancela externa para afiançar a veracidade de seus
próprios relatos -, o jornalismo abre mão de sua pretensão original, que era exatamente
relatar de maneira fidedigna o mundo a seu público. E nem isso garante a recomposição da
confiança de seu público.”
A guisa de conclusão, o texto de Luís Felipe Miguel, deixa claro, de forma didática e
completa, que jornalismo com a sua metodologia, foi e ainda é, um sistema perito, porém,
essa competência está sobre ataque, pois, aquilo que sustenta esse sistema, que é a confiança
do público está se esvaindo, devido à crescente concorrência não especializada que assumiu
esse posto com o desenvolvimento comunicacional, restando aos veículos tradicionais de
informação, assim como a democracia, se reinventar tornando-se mais plural e mantendo a
veracidade.

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