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Fichamento

GOMES, Wilson. Transformações da Política na Era da Comunicação de Massa – capítulo 1: “O que há de


comunicação na comunicação política?”

 Há uma zona de intersecção, uma interface crescente entre comunicação e política. A idéia comum, porém, é a de
que a comunicação serviria apenas como ‘meio’, intermediador, conjunto de dispositivos de exibição entre o setor
político e a sociedade. A relação, entretanto, é muito mais complexa na sociedade contemporânea, com o
desenvolvimento da comunicação de massa. A comunicação pode ser tomada basicamente por jornalismo e
marketing político, que são opostos em sua natureza própria.
 Na área da pesquisa em comunicação há os que consideram como relevante a utilização dos meios de massa como
recurso do universo político; e os que pesquisam sobre os aspectos da comunicação vinculados à política. São dois
enfoques diferentes (sociológico/comunicacional) de um mesmo tema geral.

1. Meios de comunicação e política: apenas meios?

 As relações entre política e comunicação podem ser simplificadas em 3 modelos. Esses três modelos coexistem no
interior de uma mesma sociedade e não são melhores ou piores uns ou outros, apenas mais adequados a um
determinados contexto específico. São eles:
A) A imprensa de opinião, que surge como responsável pela criação da esfera pública durante as revoluções burguesas
do século XVIII. Essa imprensa funcionou como instrumento de crítica às zonas de segredo da política absolutista, fazia
‘arrancar’ e trazer para o âmbito da discussão pública as decisões políticas antes tomadas a portas trancadas. Esse
modelo de sistema comunicativo não é ainda independente do sistema político, é antes fruto da necessidade de se criar
um local de discussão pública política fora da esfera política restrita.
B) A partir do momento em que a burguesia toma enfim o poder, o modelo de imprensa até então vigente perde seu
sentido. Com o surgimento dos partidos dentro do sistema político e de outras instituições dentro da sociedade, surge o
que se costuma chamar de imprensa de partidos. Quando cada um desses setores passa a deter o poder de fazer circular a
informação por meios próprios, passam a se apropriar dos meios, entendidos como meros difusores até então, para
propagar suas mensagens particulares a cada grupo. Entende-se ainda, aqui, que existem duas grandes categorias o
‘universo político’ e a ‘sociedade’, e que os meios de comunicação serviriam ao interesse do primeiro de causar efeitos
sobre o segundo.
C) Por fim, o modelo industrial da comunicação de massa, quando o sistema informativo deixa de ser somente um
‘meio’ e passa a se configurar em campo social, com critérios próprios, em constante negociação com os demais
campos, inclusive o político. Esse modelo de imprensa surge a partir da transformação da comunicação em negócio: o
proprietário do meio percebe que tem nas mãos uma valiosa mercadoria – a atenção pública ou audiência, que pode ser
‘vendida’ a quem possa pagar, os chamados anunciantes. Essa transformação se dá principalmente a partir do
surgimento de uma demanda por informação desengajada, atualizada, verdadeira e objetiva (que serão os critérios que
irão nortear o trabalho jornalístico). Dessa demanda surge uma imprensa empresarial, não preocupada em gerar capital
político, mas de atender essa demanda e se auto-sustentar economicamente. E para cativar a audiência, e
consequentemente os anunciantes, o jornal precisa passar a entender a credibilidade como propriedade comercial.
Quanto mais credibilidade (obtida através dos princípios jornalísticos de objetividade, equidade etc), mais audiência,
mais anunciantes, mais sustentabilidade, mais liberdade do campo político. Ainda no que diz respeito a conquistar a
audiência, o sistema informativo começa a perceber que o entretenimento (e seus elementos, o drama, a diversão e a
ruptura com a normalidade) é uma propriedade por vezes mais relevante que os critérios próprios do sistema.
 Teoria dos campos sociais (Pierre Bourdieu): o campo jornalístico, a medida que se desliga do campo político, passa
a configurar um campo próprio, com capital e representações próprios. Cada campo tem um capital específico, que
é aquilo que tem valor dentro do campo: no caso do campo jornalístico é a credibilidade. Esse capital é distribuído
dentro do próprio campo, entre aqueles que se encaixam melhor nos padrões de comportamento estabelecidos, ainda
dentro do campo, como os mais corretos. Há uma tensão entre os campos, um quer impor o seu capital sobre o
outro. O campo econômico, obviamente, é o hegemônico atualmente, mas nem sempre foi assim. Na Idade Média,
por exemplo, a hegemonia pertencia ao campo religioso. Dentro do próprio jornalismo há uma luta concorrencial
para determinar quem possui a autoridade jornalítica, traduzida na busca pela acumulação de capital jornalístico
pelos veículos. A luta dentro do campo jornalítico é a da busca pelo reconhecimento de seus pares – e do público
também.
 A imprensa hoje é um setor industrial, que como qualquer outro volta seus interesses no sentido de, antes de tudo,
obter o máximo de lucro. Foi essa transformação que possibilitou à imprensa uma blindagem contra a imposição
dos interesses políticos – logo, estranhos ao seu próprio campo.
 ‘Onde só se via um meio, constituiu-se agora uma instituição social, com valores, regras de funcionamento,
definições sobre sua própria natureza, hierarquias, conhecimento acumulado, discurso de autolegitimação social e
deontologia específica’. Seus próprios interesses e valores passam a ser mais importantes do que os de outras
esferas.
 Conseguimos hoje identificar meios de comunicação (no sentido de meros mediadores) apenas em três
circunstâncias: nos regimes autoritários, onde é impossível se conceber um campo jornalístico; na publicidade, onde
se paga justamente para que as instituições façam o papel de mídia; e na propaganda política, através do horário
eleitoral. “Afora essas circunstâncias, a comunicação de massa não se disponibiliza, dócil e instrumental, para o uso
de instâncias alheias aos seus sistemas internos.” A comunicação e a cultura de massa deixam de ser meios e
passam a ser ambientes e sua relação com a política muda completamente.

2. Comunicação: relevos e ambientes

 Comunicação: comunicação de massa, meios técnicos e meios institucionais.


 A grande imprensa pode funcionar como um campo social, mas o jornalismo das províncias ainda continua
dependente do campo político, e se orienta pelos critérios deste campo.
 A informação televisionada (principalmente) precisa se aproximar da lógica do entretenimento, pois está inserida na
indústria do entretenimento, que busca a captura da atenção – daí o jornalismo se transformar em conversor dos
fatos da realidade em espetáculo, show, drama.
 Diante do campo político, surge um novo campo: o campo jornalístico, que é o agente que gere a esfera de
visibilidade pública. Com isso, o mundo político passou a lidar com a comunicação de massa de dois meios: ou
através das assessorias (que têm conhecimento sobre o modo de produção da informação, as rotinas produtivas, e se
utilizam desse conhecimento para inserir informações de seu interesse no sistema informativo, utilizando da sua
gramática específica) ou da publicidade (ocupando o lugar do anunciante, pagando os ônus da descredibilidade e
tentando reduzi-lo através da configuração mais adequada da mensagem transmitida, ou seja, dos códigos melhor
entendidos pela audiência)
 Nos dois casos, o campo político torna-se refém de uma capacidade profissional que não possui, que é lidar com a
organização de materiais e conteúdos típicos da comunicação de massa.
 Há diferença entre o jornalista que atua no campo jornalístico e o que atua no campo político: a deontologia que
orienta o trabalho de cada um é a do campo em que atua, que é a de onde provém o seu salário. O jornalismo
político é bastante hostil, em geral, ao campo político; enquanto que o jornalista atuante no campo político é, cada
vez mais, um profissional estratégico e requisitado. Paradoxalmente, quando mais independente for o campo
jornalístico do campo político, maior será a necessidade dos assessores e consultores por parte do campo político.
 Plasser indica cinco fatores que determinam a crescente necessidade de profissionalização da comunicação política:
o advento de uma cultura política centrada na televisão, a emergência da publicidade política paga, o crescimento da
importância dos debates televisivos e a adoção crescente do modelo de campanha centrada no candidato. Para
atender às demandas criadas por esses novos fatores, são necessárias competências que os partidos não provêm:
organização de equipes, levantamento de dados, pesquisas de opinião, administração do dia-a-dia da campanha,
estratégias, criação e disseminação de mensagens, escritura dos discursos e muitas outras. Assim, se criam ‘colônias
de agentes não-políticos no interior da esfera política’.
 Esse processo não ocorre tranquilamente, há tensões entre os agentes responsáveis pela comunicação política e os
agentes políticos, principalmente na questão da produção de conteúdos e estratégias.
 A lógica das campanhas atuais é a lógica do marketing: produção de mensagens baseada em pesquisas de opinião,
fabricação e emissão de conteúdos tendo em vista um público-alvo.
 “Insisto que a crescente profissionalização das campanhas e das consultorias políticas está diretamente associada à
crescente indisponibilidade do jornalismo a funcionar como meio passivo para a comunicação política que provém
do interior da esfera propriamente política.”
GOMES, Wilson – CAP. 2
“Negociação Política e Comunicação de Massa”

- Negociação política, ou jogo político, são os procedimentos dedicados à competição entre as forças presentes na esfera
política. Apresentam-se como acordos, articulações, acertos, barganhas, alianças, retaliações, composições e compensações,
de que a esfera política é pródiga.
- A prática política regular não apenas constitui uma permanente negociação política, como também assume a forma de uma
política de negociação, já que a arena política se constitui por disputas e concorrências entre as forças, estabelecidas através
da negociação.
- A área da pesquisa da comunicação política se dedica mais às teorizações gerais e a analise dos episódios eleitorais e dos
procedimentos políticos do que ao fenômeno político integralmente. Ao seu esforço está apenas aquela zona da política que
se estabelece em intersecção com a comunicação de massa. A maioria acaba por tecer teorias e hipóteses hipermidiáticas de
interpretação, que não vêem no jogo político senão um espetáculo, além de possuir fraco poder explicativo do jogo político
regular.
- A área da pesquisa da comunicação política: “Prefere estudar as eleições a partir da área de cobertura jornalística, da
propaganda eleitoral ou dos efeitos, na instancia da recepção, dos materiais expressivos dos jornais ou da televisão do que a
partir do jogo de forças de alianças e barganhas entre os agentes do campo político”. (pág 84, 1º parágr.).
- Para o autor, seria mais razoável que esses pesquisadores da área avançassem suas análises até os fenômenos da política
em que a interface com a comunicação é menos obvia.

1. FORMAS E AGENTES DA LUTA POLITICA

- Do ponto de vista político, a sociedade pode ser vista como duas esferas distintas, porém integradas:
¬ Esfera Civil: Concernente a todos os cidadãos, ou seja, a todos que possuem os direitos e deveres dentro da
comunidade de leis.
¬ Esfera da Decisão Política: Onde são postos todos aqueles autorizados a realizar a decisão política e a conduzir o
Estado.
- As sociedades modernas organizaram o processo da decisão política através dessas duas esferas especializadas e com
responsabilidades diferentes.
- A esfera civil é detentora da soberania legitima. Sua função é a de autorização daqueles que realizam a decisão. Sua
soberania está no fato de que decide, através de cada eleição, os indivíduos que participarão da esfera política.
- A esfera política consiste em produzir a decisão política, que pode ser de dois tipos:
¬ Decisão do governo: implementação de programas, usando-se dos recursos do Estado.
¬ Decisão parlamentar: decisão segundo regras. A decisão torna-se ela mesma uma nova regra.
- Nos dois tipos de decisão, há um efeito direto sobre o estado da coisa pública.

- Há controvérsias sobre a efetividade do poder da esfera civil. “Na divisão social do trabalho político, para usar a expressão
de Bourdieu, a esfera dos mandantes, mais nobre em termos ideológicos, tornou-se politicamente a mais passiva, enquanto a
esfera dos mandatários, que do ponto de vista da ideologia democrática é secundaria, tornou-se a mais ativa e a mais
efetiva”.(final de pág. 87)
- Segunda contraposição básica no interior da atividade política: eleições e exercício regular do poder político.
- Tecnicamente, os cidadãos controlam as funções destinadas à gestão direta do poder político através das eleições.
- Historicamente, a esfera política não funciona como deveria, como eco e reflexo da esfera civil, mas gerando programas,
discursos e leis de interesse político, em competição, que a esfera civil consome “apresentando-se ao balcão político para
escolher”.

- Terceira contraposição básica: governo e processo parlamentar.


- “O governo se ocupa com a gestão direta da coisa pública e o processo parlamentar se dedica à produção da deliberação
política”.
Governo:
- O governo dispõe dos recursos do Estado (poderes públicos), do mando e do controle sobre os mandatários que controlam
os serviços de Estado e, ainda, do poder simbólico de quem conduz a coisa pública. Além do poder de conferir poder.
- “No Brasil, há uma extensa esfera de intervenção governamental ao mesmo tempo em que grande parte dos cargos
destinados à prestação de serviço público localiza-se fora do alcance dos servidores de carreira, funcionando como
patrimônio político à disposição do grupo que governa”.
- Muitos cargos trazem consigo o acesso do Executivo à fazenda pública e o que o controle de quantidades enormes de
recursos significa em termos de poder concreto.
- Esse poder do Executivo de distribuir e controlar cargos é uma das formas com que indivíduos do Estado transformam a
coisa pública em coisa própria.
Parlamento:
- O parlamento dispõe do poder de produzir a decisão política, do poder de constituição do Estado enquanto ordenamento
legal.
- É quem controla o poder sobre o emprego dos recursos públicos objetivados e o poder sobre a conformação da coisa
pública através da decisão política.
- “Trata-se de um colegiado que se orienta de forma competitiva tanto internamente quanto na relação com quem governa”,
pois esse colegiado é composto também por uma oposição que está permanentemente em competição pelos poderes
públicos com aquele que governa.
- O governo precisa contar com a mediação parlamentar para executar seus programas e projetos.

- A base da política regular é o jogo político estabelecido pelo governo e pelo congresso. Este jogo é atravessado por várias
linhas de força e com muitos agentes ocupando funções duplas. A primeira é a entre o executivo e o legislativo; a segunda é
a que separa governo e oposição e associa parte do executivo com parte do legislativo. Existem outras em contraposição,
sem lugar constitucionalmente previsto, mas não desprezíveis. (ver fim da pág. 91).
- O centro real da política é a relação entre governo e oposição.
- O congresso é dividido em um grupo governista e um de oposição. A vitória de um significa a derrota do outro, de alguma
forma. Ambos querem manter ou aumentar seu poder eleitoral, que é um poder limitado, tendo que tirar do outro.
¬ “Na narrativa mais nobre, diríamos que os dois grupos competem para assegurar que o seu projeto de Estado se
implemente. Uma narrativa mais pragmática vê a competição como disputa para acumular o máximo de capital político
possível, garantindo a sobrevivência do próprio grupo, como patamar mínimo, e a hegemonia, como objeto de desejo. Uma
narrativa de realismo político diria, enfim, que se trata de uma competição em que se providencia o próprio sucesso através
do fracasso do outro, daí a necessidade de cuidar para tornar-lhe a vida difícil, criando-se-lhe todos os constrangimentos
possíveis”.
- Apesar dessa paridade de forças, o núcleo do poder sobre o Estado é representado pelo Executivo, cabendo aos
parlamentos o poder de refrear ou apoiar seus programas, se puderem.
- Nesse contexto de disparidade de forças entre o Executivo e o Legislativo, que surgem as varias formas de mediação entre
governo e parlamento. A democracia prevê apenas duas formas de negociação: a com vistas a composições políticas e o
convencimento através das esferas regulares de disputa argumentativa. Apesar disso, formas ilegítimas também existem.

2. A NEGOCIAÇÃO POLITICA

- São três as formas de concertamento das forças em disputa:


¬ O Domínio: quando uma das partes acumula tanta força que pode retirar todo o poder do outro. É a forma mais
eficaz de implementação de projetos por parte do grupo dominante, devido a situação de resistência zero às suas pretensões.
Essa forma não é aceita pelas regras do jogo democrático, que defende que todo político, através da autorização da
soberania popular, mantém o direito que lhe foi dado pela esfera civil, o de intervir na esfera deliberativa e votar nas
assembléias.
¬ O Convencimento Discursivo: Modo mais nobre, em que as pretensões se convertem em palavras na forma de
argumentos, para confrontar-se em discussões com outros argumentos, com vistas à produção da deliberação política. “O
pressuposto é que o acordo se dê por convencimento”. A desvantagem dessa forma está em ser um procedimento caso a
caso e não uma forma sistemática de distribuição do poder, sendo adequada para assembléias e ineficaz quando a esfera
política se compõe como grupos de luta pelo poder. Isso porque na primeira busca-se produzir uma decisão política no final,
enquanto na segunda, acumula-se e goza-se do poder político em todas as etapas.
¬ A Negociação: Este modo está sempre de acordo com as conveniências e a cultura predominante, estabelecendo-
se entre a ilegitimidade do domínio e a inconveniência da argumentação para os grupos políticos dominantes. Pode ser
praticado sozinho ou combinado com o convencimento discursivo. Supõe que as cotas de poder parlamentar não podem ser
canceladas e as admite como preliminar, enquanto procura formas de controle sistemático da distribuição do poder sobre o
Estado e de controle da produção da decisão política. Suposta essa ineliminabilidade das cotas parlamentar, cada grupo do
jogo procura acumular maior parte das cotas e impedir que seu adversário o faça primeiro; como essas cotas são bens
limitados, vale-se de várias formas de negociação. Através dela que o governo procura obter a chamada “maioria estável no
Congresso”, ofertando participação no poder de Estado, em troca de restrição da deliberação dos parlamentares. “Essas
negociações comportam o estreitamento da esfera de deliberação política e a produção de um poder político não
deliberante”.

2.1. As Alianças Sistemáticas

- São formas tanto de apoio à elegibilidade e de garantia de governabilidade, quanto constituídas na intenção de impedir ou
dificultar a elegibilidade de um adversário em comum ou a governabilidade do Executivo.
- O apoio dos lideres de opinião ou das instancias sociais que controlam ou influenciam os votos.
- Certas alianças em período eleitoral constroem bases para maiorias parlamentares; algumas alianças posteriores à vitória
eleitoral, distribuem acesso ao exercício do poder sobre os recursos de Estado aos recém-aliados. É por poder distribuir
mando político aos que quiserem ser aliados que o Executivo está sempre em vantagem sobre o parlamento.
- Assim como as alianças geram vantagens por terem sido aprovadas eleitoralmente, podem criar problemas para a
governabilidade. É por isso que no período posterior às eleições, elas tendem a ser reexaminadas e, algumas, descartadas,
por serem importantes para eleição, mas um problema para a negociação política entre governo e parlamento.
- Alianças:
¬ Ideológicas – Defende que o jogo político se estabelece através de programas, idéias e visões políticas de mundo
semelhantes.
¬ Pragmáticas – Defende que o jogo político se estabelece através de competição e luta pelo poder político entre
forças socialmente dadas. Valores associados à imagem do parceiro são mais importantes do que visão de mundo.
- O primeiro modelo se dá em sistemas políticos mais amadurecidos, com esfera civil forte e grupos políticos que disputam
em torno de projetos, enquanto o segundo é típico de sistemas políticos em que o Estado é entendido como particular do
grupo que chegou ao poder, exercendo-o através de, por exemplo, o clientelismo.
- A vitória do PT em 2002 é exemplo clássico de eficácia do segundo modelo.
- “Uma forma de adotar o segundo modelo sem perder as vantagens do primeiro consiste em um esforço para realizar
alianças fazendo crer à população tratar-se de adesões a um programa”.

2.2. A Barganha

- Nesta forma de negociação, o concorrente mais forte oferece vantagens vinculadas ao poder executivo, em troca de apoio
parlamentar. Normalmente este mais forte é o governo.
- Essa prática é particularmente eficaz quando:
1 – O parceiro da negociação é um partido ou grupo que realiza política apenas para favorecer aqueles que integram seu
próprio projeto de poder.
2 – Num sistema político um partido possui pouca relevância eleitoral. À medida que o parlamentar e o público acreditam
que a eleição do político se deu por suas próprias forças e qualidades, o parlamentar sente-se à vontade para mudar sua
legenda ou negociar seu voto diretamente com o governo, conforme suas conveniências e independente das vinculações
institucionais do partido.
- Na realidade, o que o governo oferece ao parlamentar em troca do seu apoio-sem-deliberação é o mesmo que é oferecido
nas alianças sistemáticas. (distribuição de recursos de Estado e de posições de mando para os dependentes e clientes do
parlamentar). A diferença entre elas (aliança e barganha) está no fato de as alianças buscarem um parceiro que assuma as
responsabilidades do governo, enquanto que a barganha requer principalmente o voto.
- Serve também para dificultar a vida dos oposicionistas e aliados infiéis, impedindo ou dificultando o acesso à fazenda e
retirando da rede de mando os seus apadrinhados.
- Método fisiológico: nome dado à busca de apoio parlamentar através da distribuição de posições de mando político ou
facilitações de acesso à fazenda pública (recursos de Estado).
- Comporta risco para o partido que o pratica, pois podem produzir escândalos políticos que incidem sobre o Executivo.
- Este método satisfaz a vontade de poder dos parlamentares, dos seus partidos e das suas redes, fortalecendo os núcleos de
poder pela agregação da força parlamentar decorrente dos congressistas favorecidos pelo Executivo. Entrega-se o estado
para se fortalecer o governo.
- O que comporta de eficiência, comporta em risco para os que governam, principalmente por causa das forças que
controlam o campo político, como a vigilância parlamentar das oposições ou grupos rivais, o Ministério Público e,
principalmente, o jornalismo político.
- Um dos principais riscos que comporta é o do escândalo político.
- O jornalismo político e as interações densas entre Ministério Público e imprensa, fazem emergir o escândalo político.
Neste momento é a “vez da oposição fazer a festa”, pois vai promover retaliações, procurar enfraquecer o governo diante da
opinião pública (tanto pelos jornais quanto pelas CPIs, que serve para alimentar os jornais e produzir péssima exposição do
governo). Durante o escândalo, o governo tentará afastar de si a responsabilidade, atribuindo-a ao individuo ou ao seu
partido, ao mesmo tempo em que tentará evitar formação das CPIs. (CPI = comissão parlamentar de inquérito).
- Os cargos distribuídos em troca do apoio parlamentar têm seu valor baseado tanto no poder simbólico que ele agrega
(prestigio, valor de exposição negativa, capacidade de agregar valor à imagem e etc) quanto do orçamento à disposição do
titular da pasta e a distribuição da rede de confiança do agente político que a controla.

3. FATORES QUE INCIDEM SOBRE A POLÍTICA DE NEGOCIAÇÃO


- A negociação política se explica pelo seu sistema imanente, mas fatores transcendentes ao campo especificamente político,
influenciam no seu funcionamento. Esses elementos não têm a forma do poder político, mas são importantes em suas
operações, em grau variável.
- Esses fatores são sociais e econômicos quando atingem os recursos públicos objetivados, alterando o capital fundamental
das negociações políticas. Ex: guerras, crises econômicas, ataques terroristas, revoluções ou epidemias.
- Os fatores podem também estar relacionados ao público, já que não há política que não leve a população em conta. Assim,
o favor do povo (ou o temor) também se torna um fator com incidência sobre a pratica política.
- Esses fatores também têm influencia variável no tempo e no espaço.
- Num país que depende dos recursos estrangeiros para fazer funcionar o sistema financeiro nacional, os governos se tornam
muito frágeis diante dos fornecedores de dinheiro. “Sem dinheiro e sem apoio popular, um governo é menos que nada,
porque o próprio Estado que governa, torna-se muito pouco”.
- As categorias “povo” e “público” já são recursos produzidos pela esfera política para sua competição interna. Esses
recursos entram nos cálculos da política pelo menos de dois modos: como pressão direta sobre o campo político por meio
das manifestações de massas humanas em espaços públicos ou como pressão indireta através da opinião pública. O valor
das massas é o de transformar fúria em voto, além da “potente impressão do valor do número”. No caso da opinião publica,
há apenas o voto em potencial.
- A pressão das ruas: É usada tanto pela oposição (quando a alternativa parlamentar de interferência no governo se
exclui, transferindo para a mobilização popular as funções de refreamento e controle do governo), quanto pelo governo,
apelando a ela contra uma oposição majoritária e inexorável, buscando através dos comícios, passeatas e manifestações,
uma espécie de segunda eleição.
- Em sociedades com consensos sociais mais firmados, o mais freqüente é o aparecimento do “público” através da
opinião pública, de tal forma que foi preciso criar um sistema subsidiário de habilitações, de matrizes de percepções, de
planejamentos e de ações cuja finalidade precípua é ajustar-se à opinião pública predominante. Foi necessária a criação
desse novo sistema tanto devido à aceleração e intensificação da informação política na esfera civil, tornando a opinião
pública (e, logo, do eleitorado) numa verdadeira e constante preocupação, quanto à presença da esfera de visibilidade
pública, controlada pelas indústrias de informação e entretenimento.

3.1. A Eleição Interminável e a Esfera de Visibilidade Pública

- Já houve um tempo em que a esfera civil tomava conhecimento das agendas do governo e das pautas do Congresso apenas
através da imprensa de opinião associada a grupos de interesse e a partidos políticos ou através da imprensa oficial, que
representava o interesse de quem governava.
- Hoje vivemos em sociedades de fluxo contínuo intenso, acelerado e multidirecional de informação política. Em lugar da
imprensa de opinião e da imprensa oficial, assumem a indústria do entretenimento e o sistema industrial de informação.
Agora, devassa-se a esfera civil, tal qual a vida privada das celebridades.
- Essa alteração é essencialmente de natureza cognitiva. Formou-se um domínio multivariado, livre, intenso, veloz e de fácil
acesso, que funciona como uma grande cena da qual toda a cidadania pode se tornar espectadora e consumidora, a esfera da
visibilidade pública política.
- O volume de informação é tão grande, que a esfera civil pode reconfigurar a sua opinião e sua disposição todos os dias.
Como opinião e disposição política se transformam em votos, há uma virtualidade eleitoral constante a assombrar a esfera
política. Surge então a necessidade de saber quais são elas, produzindo, então, estoques de informação política para
consumo interno da esfera política, através dos institutos de sondagem de opinião.
- À medida que se estende o conhecimento da esfera civil sobre a esfera política, seu poder de autorização também se
estende. Sua decisão ganha a mesma extensão dos mandatos, pois os políticos terão que cortejar a esfera civil seja para
ganhar o seu voto ou para mantê-lo.
- A campanha se confunde com o mandato. A campanha agora é permanente, a eleição é interminável.
- A esfera da visibilidade pública é a forma com que um agente político ou uma matéria da pauta política, por ex., podem
assegurar o reconhecimento público da sua existência.
- Não estar em cena significa não existir; parecer mau é ser mau para o apreciador do teatro político cotidiano.

3.2. Os “fatores publicidade”


- “A política em cena é justamente a política que chega ao público, objeto das práticas que chamamos de política midiática”.
- Dispositivos e possibilidades decorrentes da eleição interminável entram como fator importante para o calculo de custo-
benefício. As composições supõem sempre um delicado conjunto de cálculos pelos quais se avalia quanta força se tem, o
que se precisa ceder e o que se pode simplesmente tomar. Calcula-se ainda, levando-se em conta o que se tem e se pode
ceder em face do que se quer e se espera obter.

3.2.1 Palcos Políticos e cotas de visibilidade

- O primeiro cálculo custo-benefício nas negociações é a exposição na esfera de visibilidade publica predominante. Para
existir, é preciso passar pela visibilidade midiática.
- Estar à frente do Executivo significa estar sempre presente no cotidiano da sociedade através da comunicação de massa.
- Cargos como os que têm um maior orçamento ou maior efeito nas prioridades do país, possuem uma grande cota de
visibilidade midiática em posso do governo para a distribuição durante as negociações e barganhas. “A cota de visibilidade
que um desses cargos comporta constitui uma boa parte do seu poder simbólico (...) é ter a chance de fazer-se ver e ouvir na
esfera pública dominante”.
- As funções parlamentares também possuem a sua cota de visibilidade e está principalmente associada à sua relação com o
governo, mas também para as funções que representam de forma emblemática o parlamento e o seu jogo – eis uma das
razões pelo qual esses últimos cargos são disputadíssimos.
- Quem exerce os cargos com visibilidade é supostamente detentor de um patrimônio de credibilidade política, capacidade
de liderança, articulação e composição, mas “a capacidade de relação com a imprensa, carisma midiático e boa capacidade
de gestão da própria imagem e condução da opinião publica tornam-se requisitos fundamentar para o papel”.
- O “tempo de rádio e TV” é destinado a garantir um tipo de presença da política na esfera de visibilidade pública
controlado pela própria política, longe dos agentes das indústrias de entretenimento e informação. A base de calculo dessa
cota é, atualmente, o tamanho das bancadas dos partidos nos dias das posses parlamentares na Câmara e no Senado Federal.
- A busca pelo acréscimo das cotas se dá em duas grandes lutas:
- Entre as eleições e a posse dos parlamentares: durante pouco mais de 60 dias, parlamentares se deslocam dos
partidos nos quais foram eleitos para outros conforme sua conveniência.
- Em torno da perspectiva de manutenção ou acréscimo de cotas de exibição na propaganda eleitoral: importante
fator no cálculo custo-benefício de alianças interpartidárias que se formam para as eleições; partidos com grandes cotas são
cortejados, enquanto aqueles com cotas minúsculas serão sócios minoritários com pequeno poder de barganha.

3.2.2. Risco de exposição negativa

- Há visibilidades desejáveis e outras indesejáveis.


- O cálculo em cima do risco da exposição negativa no interior das negociações se justifica por duas razões:
- Reserva: Articulação é uma arte de reservas. Produzir visibilidade àquilo que seja vantajoso que seja visível e
recobrir com reserva o que for conveniente. Nesse jogo de forças a exposição negativa do outro pode ser o principio de uma
nova composição política.
- Agentes externos: agentes externos ao campo político, que partem da idéia de vigilância da esfera política e de
vinculo com o interesse público, como é o caso do jornalismo político.
- O jornalismo investigativo é um perigoso adversário do segredo na esfera política e um potencial sabotador das iniciativas
de administração da reserva-exibição dos agentes políticos.
- Há um crescente risco de exposição negativa com a presença do jornalismo investigativo, além da interação dos
adversários políticos com a imprensa na relação repórter-fonte. Esse risco é sempre levado em conta na equação de custo e
beneficio.
- Governo invisível: “idéia de que o Estado estaria sob o domínio de sujeitos não autorizados”, que estariam de fato
governando. Esse é um dos grandes fantasmas a assombrar a democracia.
- “Os negociadores passam a levar em conta o potencial de exibição negativa que elas comportam e a resguardar-se de
correr demasiados riscos de aparecer mal na esfera de visibilidade pública”.

3.2.3. Apoio Popular

- “Se a visibilidade é um meio, a popularidade e a impopularidade são o objeto de desejo ou temor dos agentes do campo
político em tempos de eleição interminável e comparecem largamente na base do calculo custo-benefício do fato e das
possibilidades de negociação”. Esses são fatores importantes na luta pelos cargos e alianças, pois representam um “cacife”
na rejeição ou imposição de um político no seu meio. “Da averiguação de tais índices decorre a noção empregada pelo
campo político de ‘viabilidade eleitoral’”.
- É uma das bases de cálculo nas relações entre oposição e governo. Quanto maior o índice de apoio popular que o governo
tem, maior será a sua força na negociação com a oposição, às vezes até eliminando a negociação, pois um governo
extremamente popular estabelece ao redor de si uma “blingadem” que permite que ceda o mínimo possível para obter o que
quer do Congresso.
- No quesito apoio popular, o governo parte sempre em vantagem diante da oposição, pois é escolha majoritária da
esfera civil. A oposição foi levada a essa posição devido à derrota.
- Os governos estão sempre construindo bases de apoio tão fortes quanto puderem, para se precaver para períodos
ruins, já que os índices de popularidade tendem a modificar-se.
- Na produção da decisão política, tanto governo quanto oposição têm dificuldades para se opor a uma matéria com forte
apoio popular ou de apoiar alguma com grande rejeição, “não havendo aliança ou acordo que possa tranqüilamente impor
decisão impopular”.
- Esse fator é tanto mais importante quanto maior for a proximidade das eleições.
- O governo tem a seu favor grande quantidade de verbas publicitárias, que em geral são usadas para fazer publicidade
favorável a quem governa e não como deveria, do governo em si. À oposição resta ocupar os cargos de grande visibilidade
(que o governo tenta ocupar o quanto antes) e de conseguir o apoio dos “príncipes da opinião do jornalismo político”.

3.2.4. Imagem

- A imagem publica é também levada em conta nos cálculos que orientam as negociações políticas e é fator inibidor ou
reforçador das composições políticas.
- Os políticos apresentam-se na esfera de discrição da política de negociação como articuladores, traficantes do poder,
negociadores, enquanto na esfera publica é um “conjunto de discursos, de apresentações visuais de atos, de configurações
plásticas ou sonoras que serão decodificados pelo público como representações, opiniões, disposições afetivas, como
imagem, enfim”.
- A constante possibilidade de que seus atos reservados possam ser levados à público, faz com que os políticos tenham
bastante cautela, levando sempre em conta como seus atos repercutiriam se levados à esfera política pelos agentes da
comunicação de massa, antes de fazê-los.
- 1ª Cautela: predominantemente negativa; aumentam o controle sob os sigilos (o que é arriscado, pelo fato de a
política ser uma arte competitiva) e evitam envolver-se em acertos cuja publicação produziria certamente efeitos negativos.
A consideração dos riscos não impede que negociações impublicáveis se estabeleçam.
- O calculo de custo-benefício em que a exposição é levada em conta, faz com que se evitem certas alianças públicas
e se busquem outras com sujeitos de boa imagem pública.
- Existem pessoas na política sem grande cacife eleitoral para um cargo, mas que sua imagem é tão positiva que vale
a pena se aliar. Em detrimento, há outras que devem ser evitadas aparecer em público, por mais que sejam importante para
governar.
- “Quanto mais visibilidade possuir o mandatário, maior a sua vinculação, em termos de imagem, ao Chefe do Executivo”.

Fichamento – ‘O Controle Político da Comunicação’, capítulo 4 do livro ‘Transformações da política na era da comunicação
de massa’, de Wilson Gomes.
 As sociedades contemporâneas democráticas se caracterizam por: a) regulação jurídica da liberdade de imprensa b)
presença das indústrias de informação c) consolidação de campos sociais formados por profissionais de
comunicação.
 Esses aspectos garantem certa autonomia da comunicação dos outros campos, como o político e o econômico. A
constituição dos meios de comunicação em empresas voltadas aos interesses do campo econômico forma uma
proteção contra os interesses políticos dentro da esfera da comunicação. Ao mesmo tempo, a constituição de um
campo próprio, com seus princípios, valores e deontologia, preocupado com a produção de prestígio para
distribuição interna, forma outra proteção, contra a introdução dos interesses econômicos na estruturação dos
conteúdos produzidos.
 No Brasil, entretanto, ocorre um fenômeno inverso, típico de sociedades cujas democracias não foram estruturadas
sob princípios de fato republicanos: trata-se do fenômeno do controle político da comunicação de massa.
 OBS: controle político é diferente de controle público ou estatal. No primeiro, a esfera da comunicação responde
aos interesses de partidos, grupos ou indivíduos inseridos na esfera de disputa política. No segundo, responde aos
interesses do Estado, é o controle público legal, que visa equilibrar os interesses e salvaguardar o interesse público,
e não servir de instrumento de obtenção de vantagens políticas.
 Pode-se explicar o fenômeno no Brasil através do histórico da estruturação dos impérios da comunicação, que
ocorreu basicamente durante o período militar, onde as concessões eram distribuídas de acordo com os interesses
políticos, os agentes do campo político eram também proprietários dos meios de difusão e o campo jornalístico era
fraco ou inexistente.
 Formas de submissão do interesse jornalístico ao político: 1. convicção do proprietário ou de uma maioria da
redação por um ideal defendido por um grupo político; 2. produção e acúmulo de poder, mesmo que não político,
através dos instrumentos do jornalismo; 3. um grupo ou sujeito de interesses no campo político que controla direitos
de emissão.
 Nos grandes centros, hoje em dia, existe uma imprensa nos padrões descritos primeiramente, com certa autonomia
tanto do campo político, quanto do econômico. Porém, quanto mais nos afastamos das grandes cidades, mais o
segundo modelo passa a predominar. No interior e nas pequenas cidades, o governante, em geral, tem o controle
sobre os meios de comunicação.
 A comunicação social não pode ser encarada como qualquer bem, cuja posse é justificável sob quaisquer
circunstâncias. É como a educação, as estradas etc. Senão o controle, a regulação estatal é imprescindível, uma vez
que a comunicação é de extrema importância para o exercício da cidadania. Afinal, a comunicação midiática é hoje
o meio fundamental de relação entre governos e cidadãos, assim como da construção da realidade.
 Com relação à informação política, a comunicação midiática é o local onde se pode publicar ou ocultar idéias,
construir ou destruir reputações. Tudo aquilo que concerne ao cidadão é mediado pela comunicação de massa,
inclusive as decisões tomadas da esfera política. Todo o conteúdo sobre o qual se pensa e se discute na esfera civil
sobre a esfera política é organizado pelo campo da comunicação, conteúdo esse que irá condicionar qualquer
possível intervenção da esfera civil na política, seja através de manifestações regulares (voto) ou não (passeatas etc).
 É pressuposto fundamental da democracia a paridade de chances na disputa política, o que não poderá ocorrer se
uma das partes detém o poder de emissão de conteúdos políticos.
 Objetividade, neutralidade e imparcialidade não são apenas exigências do público, meramente mercadológicas, mas
valores democráticos necessários para assegurar ao cidadão a possibilidade de formar uma opinião política.
 Quando a arena de disputa política é transferida para a arena comunicacional, transferem-se também as obrigações
democráticas (paridade inicial de chances – exigências de introdução e de participação).
 Regras de uma discussão aceitável: 1. todo sujeito pode expressar-se e participar de negociações de interesse; 2.
qualquer um pode opor-se a argumento apresentado; 3. não é lícito impedir um sujeito, através de coerção de seus
direitos (já expostos) 4. as discussões não necessariamente se concluem; 5. todos os participantes devem ter iguais
oportunidades de valer-se de ações expressivas. Essas regras são obviamente desrespeitadas quando o sujeito de
pretensões políticas é também detentor do poder sobre a arena de disputa, no caso, a comunicacional.
 Esse fenômeno resulta em uma comunicação política sistematicamente distorcida pelo controle político, o que
também pode ser chamado de despotismo: ao invés de arena de disputa democrática, a esfera de visibilidade pública
controlada pela comunicação midiática torna-se palco de representações despóticas.
 Falácias sobre o problema do controle político da comunicação: 1. a lamentação pela função de arena política
exercida pela comunicação; 2. reivindicação da capacidade de denúncia do jornalismo; 3. crítica aos interesses que
motivam as informações emitidas, ao fato de o conteúdo político ser interessado (o interesse é o motor da
negociação política, logo esta não pode prescindir daquele; assim como não existe situação em que haja o elemento
humano e que haja grau zero de interesse, seja ele qual for) 5. o problema não seria com relação ao fato de existir
um controle político que causa a informação distorcida, mas sim quem detém esse controle (a luta de classes acima
dos princípios democráticos, ‘gramscianismo da comunicação’)
 O autor defende que onde houver um campo jornalístico forte, haverá uma tendência maior no sentido da autonomia
do campo da comunicação em relação ao campo político, e menor será a distorção sistemática, pois entre o interesse
político e o da audiência, o jornalismo tem preferido o segundo.
 Princípios que podem assegurar a prioridade do interesse público na comunicação política: 1. ‘princípio
publicidade’, a arena de disputa e decisões políticas deve ser aberta e disponível; 2. a discussão política deve levar
em conta os princípios já enumerados de uma discussão razoável, de argumentação e contra-argumentação, que vise
o consenso, impedindo a existência da ‘fala absoluta’; 3. a responsabilidade argumentativa deve ser exigido e
regulado também quando se trata dos meios de comunicação.

Fichamento – ‘A propaganda política: ética e estratégia’ capítulo 5 do livro ‘Transformações da política na era da
comunicação de massa’

 O uso da propaganda na política surgiu com o nazismo e as duas guerras mundiais, porém era controlada pelo
Estado.
 A discussão pública e a propaganda são elementos fundamentais para se obter consetimento numa situação de
disputa politica nas sociedades democráticas. Sendo a discussão pública a exposição pública de argumentos em
favor de uma posição, nas sociedades modernas ela é institucionalizada através dos parlamentos e da imprensa.
 A diferença entre discussão pública e propaganda é que a primeira é dialógica, a segunda é didática. Em comum,
dois aspectos fundamentais: informação e eficiência argumentativa, que representam, respectivamente, a dimensão
normativa e a dimensão retórica (é preciso conhecer E concordar para se aderir a uma posição).
 A sociabilidade política se transformou porque: 1. as sociedades de massa não permitem a experiência por imersão e
tornam distante a esfera da decisão política, suas ações e agentes e 2. por conta de uma cultura da telecomunicação,
sua gramática e especificidades. Assim, quase não há possibilidade deliberativa por parte dos cidadãos, pois não há
visibilidade nem acessibilidade à esfera pública, exceto nas eleições.
 Ao adaptar-se a essas novas condições, a propaganda política tradicional torna-se propaganda política midiática e
aproxima-se, seguindo cálculos de eficiência, do modelo de publicidade comercial.
 Três ‘cenas’ da transformação da propaganda política:
 1. a propaganda vira telepropaganda, devendo se submeter a algumas condições (dispender grandes quantias;
adaptar-se lógica dominante do show e do entretenimento e abrir mão dos aspectos ‘chatos’ da política; ter o
domínio da gramática televisiva ou a contratação de profissionais para tal fim; e submeter-se aos interesses políticos
internos dos meios de comunicação e seus proprietários). Esse último aspecto gera um problema ético dentro da
imprensa e da política, pois a paridade de chances iniciais é um pressuposto do modelo democático. Se os agentes
do campo político têm de passar por uma ‘seleção política’ e podem ser beneficiados pelos meios tendo em vista
seus próprios interesses, isso concederá a alguns uma enorme vantagem política, e condenará outros a uma provável
invisibilidade política, ou a propagação de uma imagem negativa. Como a imprensa controla a esfera de visibilidade
pública, ser dono de meios de comunicação e ter interesses políticos significa controlar uma parte significativa do
jogo, uma arena política.
 2. a sociedade então se dá conta de que existem problemas nessa transformação e reage com crítica e
descrença na propaganda política midiática, que estaria cada vez mais abrindo mão da verdade e da veracidade
em nome da estratégia. O alto teor estratégico significaria desregulação moral e baixo teor informativo. As
constatações podem ser verdadeiras, mas a relação não parece proceder da mesma forma. Primeiro, porque existe
um preconceito, na sociedade brasileira especificamente, contra a propaganda política. Segundo, porque a
propaganda política pode ser guiada pela estratégia, mas não é o seu propósito sacramentar e propagar a
imoralidade. Na verdade, sem a propaganda eleitoral (à qual o caso melhor se aplica) não seria possível aos
cidadãos, numa sociedade de relações indiretas, possuir insumos mínimos necessários para a tomada da decisão
política, ainda que somente o voto. Assim como é verdade que a democracia representativa só é eficaz se todos os
cidadãos possuem esses insumos. Em terceiro e último lugar, a política é sempre uma situação de disputa, logo a
competição discursiva (atendida pela propaganda) é perfeitamente justificável e legítima.
 3. a sociedade busca, através do Legislativo, eliminar os problemas éticos criados pela propaganda midiática.
Maneiras de se fazer isso: imposição do Horário Eleitoral Gratuito e de soleiras mínimas de equidade nas redes de
comunicação – já que estas são privadas e não podem sofrer controle direto; e o debate sobre financiamente público
de campanhas.
 Pressupostos de uma ética da dimensão pública – a ética em geral, é o fundamento de toda interação humana, uma
espécie de ‘contrato’ que visa garantir a própria preservação oferecendo ao outro garantis quanto à sua preservação,
‘recíproca preservação pelo recíproco reconhecimento e pela recíproca limitação da possibilidade de ação’. Seu
primeiro pressuposto, então, é o reconhecimento dos inter-agentes. Na política não poderia ser diferente, visto que
cada movimento de cada agente modifica algo na esfera civil. Escola Ética da Argumentação – pressupostos:
própria existência; exigência de sentido, exigência de verdade e exigência de veracidade; e situação discursiva ideal
(garantia e paridade de expressão).
 Problemas éticos da nova propaganda política –
 1ª questão: atinge a exigência da situação interativa ideal, que necessita de (a) existência de mediação dos
interesses; (b) que esta mediação seja aberta, que todos os concernidos possam de tornar participantes; (c) que todos
os participantes tenham igual direitos de expressão em todos os momentos da disputa: igualdade de chances de
entrada e saída, igualdade de possibilidade de expressão, igual direito ao argumento contraditório ou à discordância.
No Brasil, (a) é atendida satisfatoriamente, com horários regulados para a propaganda eleitoral, mas (b) e (c) ainda
não se materializaram. Os espaços midiáticos fora do horário eleitoral são controlados segundo os 'interesses do
patrão’ e a necessidade de altos investimentos transforma vantagens financeiras em vantagens argumentativas,
gerando assimetrias de chances e problemas éticos para ambos os campos.
 2ª questão: a linguagem, a gramática utilizada pelos meios de comunicação causaria outro tipo de problema ético.
Motivos: 1. a propaganda política tem como modelo de ‘linguagem’ a publicidade, que utiliza também o
discurso persuasiva, mas com outro enfoque: o de atingir um consumidor, não um eleitor ou cidadão; 2. ao
aproximar-se da publicidade comercial, a propaganda política submete-se à lógica social do consumo, onde os
produtos não são vendidos pelo seu valor de uso, mas pelo seu valor-signo (Baudrillard), de maneira que a
propaganda política não ‘vende’ um candidato pelo que é, mas pela sua imagem; 3. a propaganda midiática é
retórica, visa a persuasão, é natural das esferas de competição política e é claramente estratégica; 4. estratégia
retórica e estratégia conotativa tornam-se a característica da propaganda midiática, fazendo com que os
enunciados sintam-se livres da necessidade de dizer a verdade, substituindo o valor-verdade pelo valor-desempenho,
validando os conteúdos pela sua capacidade de convencimento e deixando de lado a pretensão de verdade e a de
veracidade, o que causa uma clara contradição com os pressupostos lógicos da ética da dimensão pública; 5. a
retórica é inelimininável em ambiente de competição discursiva, a retórica não é imoral, o seu uso é que pode
ser imoral, a afirmação da ética não impõe a negação da estratégia, apenas é necessária uma limitação desta última,
até por uma questão de sobrevivência da própria propaganda política (se todos os eleitores passarem a acreditar que
ela nunca diz a verdade, deixará de ser eficaz); 6. a ética subordina e limita a estratégia, existe um ponto em que a
estratégia deixa de ser legítima e passa a ser abusiva: neste ponto ela deve chocar-se com a ética da dimensão
pública.

Fichamento
Gomes, Wilson. Transformações da política na era da comunicação. Capítulo 7 – Theatrum Politicum.

 A partir da era Collor, a política brasileira passa a produzir em abundância representações com propósitos políticos,
atividade conhecida como dramaturgia política.
 Essas representações podem partir do campo político ou dos sistemas de informação. A produção de cenas e
personagens do mundo político não é exclusividade do campo político, ele não detém o controle, embora possa
também produzir.
 Passam a ter significativa importância as pesquisas de opinião, a partir da qual os políticos e seus consultores de
imagem passam a trabalhar, com intuito de ganhos eleitorais.
 Nas últimas duas décadas, todo o drama político se realiza através da comunicação de massa, principalmente da
televisão.
 O que deve ser observado é que os políticos não são meros atores, embora tenham de interpretar papéis no jogo
político, mas homens com responsabilidades sobre a vida de milhões de pessoas, assim como os cidadãos não são
mera platéia.
 Tendo em vista este cenário, o autor vai defender uma aproximação da política e a poética. A poética é a habilidade
de despertar, de maneira controlada e prevista, uma emoção no ânimo do receptor. Contrapõe-se à retórica, que é o
convencimento por meio de argumentos, ou seja, um processo puramente cognitivo, e não emocional.
 O autor ressalta que, entretanto, que uma narrativa pode conter ambos os elementos, produzindo convicções e
sentimentos, despertando a cognição e a emoção, fazer sentir e pensar, ao mesmo tempo.
 A habilidade poética consiste em dominar os elementos da narrativa, de maneira a construir antecipadamente a
recepção. “A arte da produção de boas representações consiste, então, em dominar os recursos pelos quais se
estabelecem as estratégias que prevêem e solicitam as respostas da recepção”.
 Elementos da narrativa: enredo, personagens e meios.
 A retórica é o elemento fundamental da atividade política não-despótica, se funda no princípio da solução negociada
e visa à produção de persuasão.
 O que acontece atualmente é que a comunicação de massa controla o acesso à esfera da visibilidade pública,
necessária à atividade política. E a natureza tradicional da comunicação política, do discurso persuasivo, não se
encaixa na lógica da comunicação de massa, que é baseada na diversão e no entretenimento. A partir daí, a política
deverá se adaptar ao novo padrão para alcançar a visibilidade necessária.
 Principais mudanças na configuração da política diante do modelo de comunicação massiva: A) as democracias
dependem cada vez mais dos meios e instituições de comunicação de massa e B) o modelo tradicional, em que as
instituições do ramo serviam meramente como meios técnicos deixa de ser possível, as instituições tornam-se
indisponíveis aos interesses do campo político.
 Os veículos de comunicação devem atrair a audiência, que é vendida aos anunciantes. Para atrair o público, existe
uma lógica, baseada no entretenimento e incompatível com o conteúdo da política tradicional. Os produtos da
comunicação de massa devem ser capazes de garantir a atenção do público, e o conteúdo político tradicional não é
capaz.
 Por um lado, o público depende da comunicação de massa para tomar conhecimento do mundo que vai além da sua
percepção sensorial imediata e formar sua opinião; por outro, a política precisa também, para apresentar suas
propostas, atividades e posições à esfera civil e obter apoio popular. A comunicação de massa, então, controla a
interface entre essas duas sociedades – política e civil – que se relacionam, sem, entretanto, ter o controle desse
fluxo.
 A parte competitiva da política é a que mais se assemelha a uma narrativa, por isso é mais bem assimilada pelo
sistema informativo, ao contrário da parte argumentativa.
 “Cultura” midiática: a comunicação é responsável pela formação de mentalidades, de valores, lógicas, formas de
sensibilidade. Não apenas transmissão de informação.
 Desenvolvimento do capitalismo e função da publicidade: tornar a produção independente das oscilações e arbítrios
dos consumidores, criar demandas, planejadas e constantes. O sistema produtivo passa a ser capaz de influenciar a
demanda. “Racionalização do sistema produtivo”. A publicidade não apenas informa, ela seduz. A lógica
publicitária influencia na configuração da cultura da comunicação de massa, fazendo com a indústria da informação
também se guie pela lógica do entretenimento.
 Os veículos que não se adaptam a essa lógica tendem à insignificância social, e, por outro lado, os que buscam a
atenção do público, têm que lidar com o gosto, a competências e as habilidades deste, ou seja, têm de adotar a
gramática e a lógica da recepção, que também foram construídas pela comunicação de massa, num processo que se
retroalimenta – “teoria dos tostines”.
 Os conteúdos inseridos na lógica da indústria da informação imprescindem de três elementos principais para
conquistar a audiência: A) a novidade, responsável por capturar a atenção, mediante um processo de ruptura com a
regularidade (que enfraquece a atenção e a memória) B) a construção de um vínculo afetivo, responsável por cativar
e fidelizar e C) a diversão, obtida pelo desligamento da realidade, ou seja, do discurso ficcional, da ficção. Assim,
torna-se indispensável a habilidade e a técnica da produção da ficção, através da construção de enredos e
personagens e da configuração dos meios da representação, que deverá provocar efeitos dramáticos sobre os
destinatários. Ficam descartados, então, os conteúdos em que predominem a regularidade, o tédio, a profundidade e
a lentidão; em oposição à sedução das aparências, à embriaguez visual, à velocidade, ao prazer imediato, ao
conflito, a histórias e personagens rapidamente identificáveis, enfim, produtos que solicitem uma interpretação
mínima e um máximo engajamento emocional. Estes princípios regem a enciclopédia cultural elementar da
sociedade contemporânea.
 Diante disso, o sistema de organização e apresentação da informação tende a se enquadrar nestes termos: o
entretenimento, como referência básica, a ruptura, a diversão e a dramaticidade como subsistemas. A televisão é
onde essa lógica da comunicação de massa se realiza completamente. Tudo que é produzido pelo sistema
informativo tem como fim fixar a atenção do espectador.
 Os subsistemas: 1. a ruptura: o mais noticiável é o interessante, o improvável, o extraordinário, o inesperado, a
novidade. 2. a diversão: o consumo da informação deve ser distraído, descompromissado, de maneira a entreter o
público, não somente informá-lo. Por isso as imagens tornam-se tão importantes, o texto tem de ser ágil, dinâmico,
e o conteúdo, superficial, imediatamente compreensível. A informação agora tem de agradar sensorialmente, e não
só provocar um acréscimo nos estoques cognitivos. 3. o drama: a informação torna-se uma representação encenada,
com o objetivo de produzir efeitos emocionais no público, transformando fatos em histórias e pessoas em
personagens.
 Estes critérios são incompatíveis com a expressão dos conteúdos tradicionais da política – o debate, o processo
argumentativo, o discurso, a análise racional e objetiva, as decisões justificadas, onde existe a necessidade de um
compromisso mais profundo, além da mera apreciação. Para ter acesso à esfera de visibilidade pública, a esfera
política passa a operar segundo uma gramática que não a sua, mas a da comunicação de massa, regida por tais
princípios.
 Na sociedade contemporânea, a comunicação passa a suprir uma demanda cognitiva por atualidade, de maneira que
as impressões adquiridas através da experiência midiática passam a ser mais importante do que as obtidas por
imersão social. Essas interações midiáticas constituem-se no cimento social de hoje, constroem a própria noção de
realidade. O mundo agora é um ‘mundo-em-tela’ ou um ‘mundo-em-página’. Do ponto de vista congnitivo, ‘o real é
o midiático e o midiático é o real’.
 Na democracia, o acesso à visibilidade pública é imprescindível à legitimação. Assim, o campo político fica a mercê
do sistema informativo, que atende à demanda da sociedade por informação política. A percepção da existência dos
sujeitos políticos depende da sua presença nos circuitos informativos produzidos pelo jornalismo e pela indústria do
entretenimento, uma vez que o alcance imediato é muito restrito. Estando ausentes destes circuitos, não serão
capazes de influenciar e orientar as ações politicamente relevantes dos indivíduos.
 Assim, com poucas exceções como em regimes autoritários, a política se vê obrigada a se acomodar à lógica da
comunicação de massa, e passa a construir os acontecimentos, personagens e relações políticas de maneira que se
tornem irresistíveis aos critérios e à rotina do sistema informativo, forçando a sua entrada. Não importa a maneira
de se alcançar a visibilidade – através do jornalismo ou da propaganda política –, o instrumento fundamental é
sempre a capacidade de entreter.
 O campo político utiliza os próprios critérios do jornalismo para ter acesso ao sistema informativo e passa a
construir acontecimentos com capacidade para atrair a atenção pública, devidamente adaptados às rotinas e às
características técnicas dos veículos. Começam a aparecer os chamados fatos-notícias: o que antes eram dois
elementos distintos (fato, da ordem da realidade e notícia, da ordem da enunciação), se confudem, a partir do
momento em que o campo político produz fatos, acontecimentos, com o único intuito de produzirem um efeito na
realidade e serem noticiados. Esses fatos seguem cálculos de noticiabilidade e a lógica do entretenimento (produção
de representações – poética)
 Segundo os subsistemas da lógica do entretenimento, então, a política passa a produzir fatos com o intuito de
romper com a realidade (descartando a rotina tradicional de debates e decisões), de divertir (evitando a tediosa
dimensão discurso-argumentativa) e de dramatizar (transformando os conflitos políticos em encenações e os
sujeitos em personagens).
 A encenação política é o modo pelo qual a política, astutamente, usa em seu benefício a lógica da comunicação de
massa. Como a necessidade de visibilidade é crescente, é crescente o número de fatos-notícias, e cada vez menor a
quantidade de fatos políticos que acontecem por conta própria, independente da possibilidade de exibição na esfera
de visibilidade pública.
 O jornalismo, principalmente o televisivo, é atraído pelo espetáculo, especialmente pelo espetáculo político, a partir
do momento em que a indústria da informação passa a operar com a gramática e a lógica do entretenimento.
Existem muitos modelos de jornalismo dentro da indústria da informação, mas a força maior tende para o
jornalismo-espetáculo, que adota a lógica da indústria do entretenimento, do discurso espetacular da narrativa e do
conflito como estrutura dramática. Isso causa fenômenos como o jornalismo de declaração e a predominância de
notícias sobre a competição política, em detrimento das propostas e decisões, suas causas e conseqüências sobre a
vida das pessoas.
 O ápice do jornalismo-espetáculo é o escândalo político, que ainda é uma narrativa (um escândalo não é um fato,
mas o que se interpreta dele) onde a dimensão dramática é explorada ao máximo e os efeitos emocionais causados
sobre o público também são extremos.
 O jornalismo político inserido na comunicação de massa é obrigado a disputar a atenção do público com os demais
produtos da indústria do entretenimento, encarando essa disputa nos próprios termos que essa indústria coloca. A
diferença é que, por trás das representações, os fatos políticos, produzidos ou não, causam efeitos diretos na vida
dos indivíduos que compõem a sociedade.

Fichamento – ‘A Transformação da Política’, cap. 8 do livro de Wilson.

1. A política de aparências

 Questão: o que há de novo na política midiática? Consensos: a luta pela imposição e gestão da opinião política é um
fenômeno importante; grande parte dos agentes políticos é dispensada na prática de fazer pensar e fazer sentir; uma
parte relevante da política hoje se realiza na arena fornecida pela comunicação de massa e se configura como
política de opinião, que normalmente ocorre em situação disputa entre os partidos e agentes.
 O problema: a novidade é caracterizada como originalidade ou transformação? Teses: 1. teoria instrumental: os
meios de comunicação servem apenas como instrumentos à disposição do campo político (INCORRETA). 2.
originalidade: a comunicação de massa transfigurou completamente a política contemporânea (INCORRETA – em
outras circunstâncias históricas e culturais é possível observar práticas congruentes com a política de opinião)
 A gestão da opinião não é exclusiva da democracia, apenas é mais observável porque na sociedade democrática a
legitimidade emana da esfera civil (princípio de soberania popular).
 O exemplo de Luís XIV ilustra claramente a prática da política de opinião em circunstâncias diferentes da atual. O
rei buscava construir uma imagem positiva de si junto à população, especialmente a nobreza, tornando a gestão de
sua imagem um projeto do Estado. Destaca-se a gradiosidade tetral conferida às cerimônias e aparições do rei, além
do emprego de uma ‘política cultural’, através do incentivo das artes
 Maquiavel: sua obra foi a primeira formulação explícita para a produção de opinião pública e se apresenta como
uma série de regras, atemporal e fora de um quadro de valores; é prescritiva, não descritiva. Ele apresenta o
problema da gestão de imagem como problema central da atividade política e aponta a necessidade de se conhecer o
público, seus desejos e temores, afim de melhor atender às suas demandas. A necessidade de colocar a população
(plebe) em primeiro lugar nada tem a ver com o princípio de soberania popular democrático, mas com a visão do
‘poder do número’ e com o fato de considerar mais fácil satisfaze-la do que aos nobres. O autor afirma que ‘ser
temido é melhor que ser amado, pois os homens têm menos escrúpulos em ofender quem se faz amar do que quem
se faz temer’. Na sua teoria das aparências, afirma que a realidade, aquilo que o príncipe realmente é, é apenas a
matéria-prima para aquilo que é mais importante, que é o que dele se pensa. E que é preferível parecer do que ser,
pois uma representação é mutável, ao contrário do caráter próprio. Levando em conta que o príncipe deve satisfazer
segmentos diversos (povo, nobreza, potências estrangeiras, exército), com desejos diversos e muitas vezes
antagônicos, é preferível que seu quadro de características não corresponda à realidade, pois assim é mais fácil
moldá-lo. Essa constatação, que pode parecer imoral, se apoia numa concepção de moral política onde a
manutenção do Estado é o valor mais elevado.
 Conclusão: ‘há mais coisas em comum entre a política de opinião praticada no passado e a que agora se pratica do
que sonha o deslumbramento hipermidiático contemporâneo’. A gestão de opinião política existe mesmo em
sociedades que não são massivas, não conhecem a comunicação de massa e nem são democráticas. Isso talvez se
explique pelo fato de a política de opinião ser conatural à própria atividade política.

2. A política-espetáculo

 Costuma-se caracterizar a política midiática contemporânea por analogia (ou seja, tem valor metafórico) com a
noção de espetáculo de quatro modos diferentes:
1. A política em cena: idéia do espetáculo em seu sentido cênico, como aquilo que se dá a ver, que coloca seu
apreciador na condição de espectador. Essa perspectiva tem dois aspectos importantes: a exibição (tem-se a
impressão de que tudo na política se realiza como um show televisivo) e a contraposição entre atuação e passividade
(onde os agentes políticos seriam ativos, e o cidadãos meros consumidores-espectadores).
2. A dramaturgia política: sentido propriamente dramatúrgico de espetáculo, que evoca a idéia de representação, de
artifício ficcional, de papéis e personagens, de estrutura narrativa, de efeitos emocionais previstos. A diferença com
relação à representação teatral comum é que, nesta, existe um acordo consciente entre público e ator que permite a
ficção. Embora essa avaliação seja feita de maneira geral de forma negativa, há que se atentar para o fato de a
encenação ser um fenômeno político e social natural de todos os tipos de interação (Goffman). A crítica maior aqui
é para a a realocação da cidadania como público passivo e, ainda mais além, a sua manipulação através dos
dispositivos teatrais.
3. A espetacularização da política: nesse sentido, a política contemporânea seria espetacular porque se dedica a
providenciar fatos, situações e textos notáveis, admiráveis, que merecem ser vistos, de maneira tal que não possam
deixar de ser notados pelo sistema informativo, garantindo sua presença na esfera de visibilidade pública.
4. O simulacro político: a política contemporânea seria não apenas algo que se dá a ver, mas algo que impede que se
veja outras coisas, através da artificiosidade, que conspira contra a verdade e a substância. A política, nesse sentido,
seria apenas mais uma dimensão da sociedade do simulacro (Baudrillard).
 A matriz da analogia, o que há de comum nas várias interpretações da metáfora, é o caráter de exibição, de aquilo
que se dá a ver, que se apresenta em cena com objetivos específicos de obter apoio ou consentimento dos cidadãos.
Isso normalmente é avaliado de maneira negativa e pejorativa, como se o fato de ser encenada fizesse a atividade
política perder substância. Constatou-se, entretanto, que essa não é uma prática exclusiva da política
contemporânea, mas é uma atividade natural da própria atividade política. Questão: porque, então, a política se
encena? Duas teses: 1. hipótese da legitimação cerimonial e; 2. hipótese do controle teatral da informação política.
 As cerimônias do poder político: hipótese antropológica, segunda a qual a força das aparências não pode ser
desprezada pelos governantes, e que a legitimidade do poder se dá através do compartilhamento simbólico
promovido pelas cerimônias do poder. Isso vale essencialmente para as sociedades de tradição, embora uma
campanha eleitoral possa ser considerada uma cerimônia de poder. Nas sociedades democráticas há pouca
potencialidade dramática, uma vez que é fundada nas operações discursivas do tipo argumentativa, mas o aspecto
dramático não é totalmente dispensado – vide as ‘guerras de imagem’, os escândalos e a competição com o
jornalismo político.
 O manejo social das impressões: hipótese sociólogica baseada nas idéias de Goffman – ‘ casa indivíduo ou grupo
atua para os outros para dirigir e regular a impressão que formam a seu respeito’. Controlamos nossas expressões,
afim de dirigir nossas impressões, mas o outro sabe disso e tenta descobrir o que há por trás das expressões.
Interagir é atuar e assistir a atuações, interpretando nos dois sentidos – representação e apreensão. A política, como
tipo de interação social, apenas se adequa a essa lógica, sendo impossível pensar na atividade política (e qualquer
atividade social) com grau zero de teatralização.

3. A transformação da política

 Conclusão: para além de posições radicais, a questão é a da caracterização da mudança da política midiática
contemporânea, que nem foi completa, nem foi nenhuma. ‘A política se transformou e não se transformou’.
 Se a transformação da política tivesse sido completa e ela fosse apenas encenação, haveriam se extinguido práticas
como as negociações, as articulações, as barganhas, os acordos de bastidores, as pressões e compensações. A
comunicação mudou muito da antiga concepção de esfera pública e reconfigurou as competições eleitorais, mas não
é possível, por isso, adotar uma perspectiva de alteração global. Além disso, é fácil notar como os grupos políticos
têm percebido e de adequado dessas transformações, em seu próprio benefício.
 O motivo para a polarização das posições na discussão é a simplificação demasiada do fenômeno político: não
existe simplesmente a política, mas uma variedade de sistemas de práticas que, juntos indissociavelmente,
configuram a atividade política. A atividade política não é um bloco monolítico, mas um conjunto complexo de
habilidades. Cada um desses sistemas de práticas convive no mesmo contexto, não se substituem ou sobrepõem. A
alteração em um dos sistemas causa mudanças no todo, mas não é capaz de reconfigurá-lo totalmente. Assim, a
política midiática não seria uma nova política, mas uma reconfiguração de um dos sistemas de práticas políticas.
 Hipótese do livro: enquanto o sistema de habilidades voltado para dentro (ad intra) permanece estável desde a
consolidação dos modelos republicanos modernos; o sistema de habilidades voltado para fora (ad extra) se
transformaram de acordo com as demandas da sociedade da comunicação de massa. O primeiro sofreu influências
do segundo, mas não causou sua extinção, nem transformou todo o quadro da política moderna. A dita ‘política de
partidos’ não deixou de existir diante da política midiática, esta última é que se transformou, se desenvolveu, se
configurou como um sistema novo que ocupa o lugar de um antigo sistema ad extra, obsoleto, onde os partidos
controlavam os veículos de comunicação. Não há uma passagem de modelos, como defendem alguns autores. Na
verdade, são sistemas de valores, representações, habilidades, que trabalham complementar-mente. Os sistemas
podem e devem conviver, e não entendidos como modelos impermeáveis um ao outro.
 Não se pode negar que o sistema de práticas da política é, de alguma forma, alterado pela onipresença dos meios de
comunicação de massa. Mas aquilo que é mais afetado por essa onipresença é justamente o sistema de habilidades
destinado a produzir impressões e lidar com o público, a política ad extra, que tem basicamente dois papéis: 1.
apreender e reagir às demandas, medos e desejos do público, tendo em vista o efeito que isso provocaria, de maneira
a produzir impressões positivas e 2. agir sobre a esfera civil buscando construir a opinião, a imagem e os afetos do
público. Em geral, as duas operações ocorrem juntas, e se tratam de funções sociais indispensáveis que, em outros
contextos, foram satisfeitas por outros sistemas de práticas, que hoje foram substituídos pela prática da política
midiática.

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