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artigo

Contos e Terapia Narrativa: possibilitando


novas conversas

Tales and Narrative Therapy: making new conversations


possible

A frase não se faz; ela nasce. Ana Luiza de Faro


Clarice Lispector. Novis
Psicóloga clinica,
Resumo: Este artigo tem por objetivo apresentar Abstract: This paper aims at describing the ex- especialista em saúde mental
uma experiência posta em prática pela terapeu- perience that was employed by the therapist, who infantojuvenil e terapeuta de
ta ao utilizar um conto de sua própria autoria no used a tale of her own in her clinical practice with família, Rio de Janeiro, Brasil.
atendimento clínico com a Terapia Narrativa. Por the help of Narrative Therapy. Using this tool, it analuizanovis@globo.com.
meio dessa ferramenta, foi observada a possibili- was possible to favor externalization and conver-
dade de favorecer a externalização e as conversas sations of re-authoring as the client reflected on
de reautoria através da reflexão sobre questões the issues and dilemmas the fictional characters
e dilemas vividos pelos personagens da ficção. had to deal with. Playfully and smoothly, the con-
De forma leve e lúdica a conversa se desenvol- versation develops guided by imagination and by
ve orientada pela imaginação e pela ressonância the resonance the story finds in the client’s own
com a historia de vida do cliente. São apresenta- life. Here, we present two clinical cases which
dos dois casos clínicos em que foram abordados counted on the help of a tale I wrote myself – “The
o mesmo conto de minha autoria, a saber “O Pas- Bird and the Cage”.
sarinho e a Gaiola”.
Keywords: tales, narrative therapy, externaliza-
Palavras-chaves: contos, terapia narrativa, tion, re-authoring
externalização, reautoria.

Ao longo da minha trajetória profissional, determinados encontros teóricos foram


sendo estabelecidos e trouxeram uma significativa contribuição, como no caso da
terapia narrativa que gerou um grande impacto, reforçando o encantamento com
a prática clínica. O terapeuta passou a ocupar um novo lugar, não mais como o
especialista, detentor do suposto saber, mas como um profissional aberto, imbu-
ído de criar um espaço para conversas que gerassem novos entendimentos cola-
borativamente. Isto me abriu uma nova relação com o trabalho, tornando-o mais
instigante e desafiador.
A terapia narrativa nasceu na Oceania, mais precisamente na Austrália e na
Nova Zelândia, onde foi desenvolvida por estudiosos como Michael White (1990)
e David Epston (1988), no decorrer da década de 1980. Desde sua origem, foi re-
conhecida como um trabalho criativo e inovador, cujo objetivo consistia em favo-
recer reflexões originais, capazes de introduzir novos entendimentos libertadores
e resgatar a autonomia e a qualidade de vida das pessoas (Novis & Abdalla, 2013).
As narrativas, por sua vez, representam o sentido que damos à vida: elas são
constitutivas e modelam as relações, determinando como nos reconhecemos
em nossa própria história. Nós, seres humanos, somos interpretativos e busca- Recebido em: 03/02/2016
Aprovado em: 16/04/2016

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mos sempre uma maneira de explicar próprio texto resgata a liberdade e a
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e produzir sentido a partir de nossas autoria do sujeito na sua própria his-
experiências. Vamos estabelecendo tória, se reconhecendo de fato e de di-
diversos significados e criando várias reito como especialista em sua vida. O
histórias simultaneamente. Há tramas poder das histórias de vida se tornou
dominantes que podem gerar tanto uma grande inspiração. Estar aberta
um efeito positivo quanto negativo em ao novo, ao entendimento que sempre
nossas vidas (Morgan, 2007). No quo- podemos ampliar, passou a me manter
tidiano da prática clínica, os clientes atenta e disponível a novas experiên-
nos procuram com histórias saturadas cias.
pelo problema que comprometem sua
qualidade de vida e suas relações fami-
liares. Ampliando os Horizontes na
Essa abordagem propõe uma nova Prática da Terapia Narrativa
maneira de lidar com o problema ao
separá-lo da pessoa e de sua identida- Num determinado dia, minha filha
de, baseando-se na premissa de que “o Ana Cecília me convida para fazer um
problema é o problema, a pessoa não curso de Contadora de História com
é o problema” (White, 2012). Essa dis- a atriz Priscila Camargo na Casa das
sociação permite que se reconheça a Artes de Laranjeiras (CAL). Estimu-
influência dos problemas na vida do lada pela curiosidade, prontamente
sujeito e a influência dele sobre a exis- aceitei o convite. Aquela experiência
tência do problema. A externalização trouxe algo totalmente inesperado. A
é um princípio, uma filosofia que se cada conto ou fábula que ouvia, eu era
recusa a patologizar a pessoa (Den- tomada pelo mais profundo encan-
borough, 2013). À medida que exter- tamento. Quantos desdobramentos
nalizamos, abrimos espaço para o re- eram produzidos a partir de cada uma
conhecimento das multiplicidades de daquelas narrativas!
histórias que fazem parte de nós. Um dia, Priscila me fez um desafio.
Nesse processo, as conversas de re- Estávamos trabalhando com um conto
autoria são um recurso precioso, pois sobre um ratinho que seguia sua in-
convidam as pessoas a se desenvolve- tuição para chegar à “montanha bri-
rem continuamente e a contarem his- lhante”, sua verdadeira morada. Ela me
tórias sobre suas vidas (White, 2012). pediu para criar algo que representasse
São calcadas na tese de que nenhuma minhas ressonâncias a partir daquele
história pode expressar a totalidade da texto.
experiência vivida pelas pessoas e que, Desafiada, eu não sabia o que fa-
em todo relato, sempre há eventos ne- zer. Foi então que me perguntei: o que
gligenciados, inconsistências e contra- sempre me encantou? Histórias! Sem-
dições que favorecem novos entendi- pre fui apaixonada pelas histórias de
mentos e desafiam a forma como uma vida! Não por acaso, segui a carreira
história está sendo contada (Novis & de psicóloga clínica, e a cada dia no
Abdalla, 2013). As histórias saturadas meu consultório sou presenteada com
pelo problema podem ser minimiza- histórias reais, que me comovem e en-
das por esses entendimentos originais sinam.
que resgatam a qualidade de vida. Estava decidido, eu ia escrever um
A licença poética gerada pela pos- conto! E foi o que fiz, mas eu não es-
sibilidade da pessoa intervir em seu tava preparada para o que ia acontecer

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em seguida. Assim que terminei aque- pouco mais. Passei a ler para alguns Contos e Terapia Narrativa:
la primeira história, fui arrebatada clientes os contos que considerava possibilitando novas conversas 9
Ana Luiza de Faro Novis
por uma incontrolável “onda criativa”. pertinentes com a situação de vida
Pela nova porta aberta, várias histórias que estavam vivendo. Outra surpre-
começaram a brotar e era algo que eu sa – conversas originais começaram a
simplesmente não conseguia parar de acontecer, favorecendo novos enten-
fazer. dimentos e perspectivas. Nessas con-
Nesses contos, vi retratado muito de versas, minha posição se modificava
mim e da minha experiência de vida. e discutíamos de forma criativa sobre
Eu os escrevi revisitando a minha his- os dilemas e desafios da personagem.
tória. Reencontrei aquela criança que Ao compartilhar suas percepções e
“encenava” peças de teatro fantasiada conexões com as situações narradas,
com as camisolas da mãe. Durante o o cliente ratificava sua posição de es-
processo de criação, uma polifonia se pecialista. Como autora/terapeuta,
fazia presente, trazendo todas as vozes era enorme a minha responsabilidade
e referências que me visitavam e ins- com o conto que compartilhava. Ao
piravam. invés de pedagógicos, propondo um
Dei-me conta, vivencialmente, do desfecho que poderia ser tendencioso,
quanto ouvir uma história pode am- os textos deveriam dar vazão e ampliar
pliar nossa imaginação e levar para o espaço para a imaginação.
novos caminhos, novas possibilidades: Entusiasmada com os resultados ini-
ciais obtidos, resolvi procurar outros
a virtude de uma história está em colegas para compartilhar as minhas
seu poder de inflamar a imagina- percepções. Um dos meus primeiros
ção... Vivenciamos o mundo através contatos foi com David Denborough,
de olhos que não os nossos e adqui- diretor do Dulwich Center, referência
rimos empatia pelos dramas e esfor- internacional em Terapia Narrativa.
ços alheios. (...) Na medida em que Ele me apresentou a Kim Billington,
nossos olhos e corações se abrem, ve- psicóloga radicada em Melbourne
mos mais claramente a nossa própria (Austrália). Há alguns anos ela vem
história refletida nas histórias dos desenvolvendo um trabalho com con-
outros (Feldman & Kornfield, 1994, tos e fábulas em grupos de crianças e,
p.255). mais recentemente, em atendimentos
individuais com adultos. Por uma fe-
Ao gerar meus contos, percebi a im- liz coincidência, ela havia acabado de
portância do que dizia Clarice Lispec- apresentar um belíssimo trabalho so-
tor (2010) sobre o ato de escrever: “mas bre o tema no Master em Terapia Nar-
já que há de escrever, que ao menos não rativa da Universidade de Melbourne.
se esmague as palavras nas entrelinhas.” Em seu trabalho, ela destaca a eficácia
Sábio conselho, pois, como sabemos, dos contos e histórias universais para
um texto hermeticamente fechado não a externalização e ampliação da pos-
inspira o visitante, impossibilitando a sibilidade de reautoria. As conclusões
criação a partir de sua leitura. de seus estudos vinham exatamente
Comecei a apresentar os textos para ao encontro das percepções que eu
alguns colegas, amigos e parentes. vinha vivenciando em meu trabalho.
Para minha surpresa, eles gostaram Durante nossa correspondência, gene-
das minhas histórias. Estimulada por rosamente, Kim disponibilizou a ínte-
essa primeira receptividade, ousei um gra de sua dissertação, o que me foi de

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grande ajuda e enriquecedor. Em certo ta pode ser aberta, apenas com a chave
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trecho, ela comenta: da imaginação e da identificação.
Michael White (2012) ratifica a
Depois que uma história é contada, contribuição e o valor da teoria do
o terapeuta é de-centrado e a pessoa mérito literário de Jerome Brunner ao
fica reposicionada em uma ponte de reconhecer paralelos entre a atividade
significado, experimentando dessa da escrita das narrativas literárias e a
forma alguma distância do seu pro- prática terapêutica. Cita que a indeter-
blema e imaginativamente dando minação do texto, através das lacunas
sentido aos pensamentos que emer- geradas pelo escritor no panorama da
gem entendimentos e sentimentos ação e da consciência, estimula o lei-
que fazem ressonância entre a his- tor a contribuir com sua imaginação
tória contada e sua própria situação e experiência vivida. De acordo com
(Billington, 2015, p.14,tradução do White (2012), na terapia buscamos
autor.). esse mesmo desdobramento, possibi-
litando novas conversas temperadas
Ao ouvirmos uma história, uma pela curiosidade e imaginação que
nova jornada começa a acontecer. Nela nos transportam a outros contextos da
nunca vamos desacompanhados, nós nossa vida, trazendo entendimentos
levamos nossos estoques de mapas de originais.
jornadas já percorridas na nossa his- As conversas de reautoria se am-
tória de vida e que nos ajudam a dar pliam, remetendo a inúmeras possibi-
sentido ao que estamos vivenciando lidades e diversos caminhos que pode-
naquele momento (White, 2012). A mos seguir, validando e referenciando
partir dessas ressonâncias com o texto, o aspecto rizomático das nossas refe-
estabelecemos uma conexão que nos rências e conexões. Não existe um fim,
mantém motivados e interessados a mas um fluir permanente e constante:
continuar nessa história original.Va-
mos compondo junto com o escritor, À medida que novos significados
preenchendo o texto com nossa pers- emergem, possibilidades futuras são
pectiva, exercitando a imaginação e concebidas, novas etapas potenciais
resgatando experiências vividas. Ao são propostas e performances únicas
longo dessa jornada, somos surpreen- de significado são negociadas (White
didos com o surgimento de possibili- & Epston, 1990, p. 81, tradução do
dades que abrem espaço para outras autor).
conversas. Novos significados nos li-
bertam de entendimentos estreitos e O desenvolvimento de histórias
nos levam para outros cenários. alternativas amplia os significados,
Um belo exemplo é o trabalho de favorecendo uma renegociação da
David Epston (1988), no qual ele utili- identidade e minimizando o poder
za um conto para criar uma nova pos- da história dominante, saturada pelo
sibilidade de conversa em uma família problema. As tramas contidas nas
que atravessava um conflito que im- histórias atiçam nossa curiosidade e
pedia o diálogo. Os resultados foram constituem um poderoso recurso para
estimulantes, propiciando a comuni- favorecer as conversações de reautoria.
cação interativa em um cenário até en- De uma forma respeitosa, como bem
tão dominado pela situação-problema. nos ensinaram os grandes mestres Mi-
Foi demonstrado que uma pesada por- chael White e David Epston, ofertamos

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mas não impomos a história. Podemos modo a preservar o sigilo profissional Contos e Terapia Narrativa:
observar essa forma de convidar neste necessário. possibilitando novas conversas 11
Ana Luiza de Faro Novis
exemplo:

Agora, eu tenho um conto, um conto O Passarinho e a Gaiola


folclórico, que levará uns 4 minutos,
que poderá ser útil, ou inteiramente A gaiola dourada era espaçosa e muito
irrelevante. É possível que alguma confortável, nada lá faltava. Além dis-
parte da história chame sua atenção, so, ficava junto a uma grande janela,
e proporcione uma visão diferen- o que garantia um ambiente arejado e
te das coisas. Se você estiver aberto uma vista agradável para o exterior.
a essa ideia, eu posso compartilhar Junto com ele moravam outros ami-
esse conto com você e fazer algumas gos, além dos seus pais, num total de
perguntas sobre o que você pensa a doze passarinhos confinados na mesma
respeito (White, 1995 p.30, tradução gaiola, que era quase um viveiro. Po-
da autora.). rém, ele era o único que havia nascido
naquele lugar.
Venho a cada dia utilizando mais os Eles eram conhecidos por todos os
contos em minha prática clínica, prin- moradores da vizinhança, não só pela
cipalmente em situações onde percebo cantoria que faziam desde os primeiros
dificuldade para abordar e aprofundar raios de sol da manhã, mas também
determinados temas. De forma leve e pelas cores vibrantes de sua plumagem.
lúdica, trabalho com os textos, respei- As crianças da rua sempre pediam para
tando a singularidade de cada cliente. visitá-los.
Os desdobramentos são estimulados Inquieto e curioso, ele gostava de pas-
por perguntas que favorecem a exter- sear por toda a gaiola, e nunca ficava
nalização e as conversas de reautoria. muito tempo parado no mesmo lugar.
Saltando de um poleiro para outro,
sempre conseguia comer mais fruta do
O Conto na Prática que os outros!
Às vezes a sua inquietude gerava
A fim de ilustrar o emprego do conto muita confusão. Teve uma vez em que
na prática clínica, cito dois casos do derrubou o bebedouro, e a água escor-
meu consultório particular, nos quais reu toda para o chão!
trabalhei utilizando o conto “O Pas- Desde pequeno, ele era diferente dos
sarinho e a Gaiola”, de minha autoria. outros passarinhos que compartilha-
Em determinado momento do proces- vam aquela moradia. Bem no fundo do
so terapêutico de cada um deles, por seu peito ardia uma chama e um espíri-
motivos distintos, sugeri a leitura do to aventureiro que não percebia em seus
conto citado. companheiros de confinamento. Apesar
Vale ressaltar que ambos os clientes, de nascido e criado em cativeiro, ouvia
Luiz e Breno, não apenas concordaram sempre uma voz dentro de si: “Se eu te-
com a divulgação de suas histórias, nho asas, é para voar.”
mas também participaram ativamente Mas com o passar do tempo, foi se
da escrita de seus relatos no momen- acomodando como os outros. Afinal,
to da confecção do presente artigo. ali estava bem alimentado, abrigado e
Os dois são maiores de idade e os no- protegido. O que mais poderia querer
mes empregados aqui são fictícios de da vida?

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Já mais velho e sossegado, ainda aca- rença. Um dos passarinhos havia de-
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lentava um sonho. Todo dia, entre as fi- saparecido. Depois de muito procurar,
nas grades da gaiola, ficava admirando seus donos desistiram. Dali para frente
a imponente árvore que se erguia em seriam apenas onze.
frente à janela e imaginava como seria Depois de alguns dias, todos se sur-
o mundo visto lá de cima, sem grades preenderam ao ouvir um lindo canto,
para atrapalhar. Devia ser mágico! que vinha da árvore em frente. Empo-
Resignado, ele evitava pensar muito leirado no galho mais alto, lá estava
nessas ilusões. Quais eram as chances ele, livre, vendo o mundo de onde tanto
de um dia sair dali? Estava escrito que desejava e saudando seus queridos ami-
seu destino seria passar toda a vida e gos.
terminar seus dias na mesma gaiola O mesmo vento daquela noite assus-
onde nasceu... tadora lhe trouxera agonia e alegria.
E assim continuava sua vidinha até Desde então, ouvia sempre a voz do co-
que, durante uma madrugada, caiu ração sobre os rumos a tomar em sua
uma forte tempestade, com raios e vida.
trovões pra tudo que era lado. Com a Passado algum tempo, voltou a sentir
ventania entrando pela janela esqueci- aquela inquietude e agitação que bem
da aberta, a gaiola foi ao chão. Alguns conhecia. Era chegada a hora de partir,
dos seus companheiros se machucaram em busca do novo e do desconhecido.
feio, e ele teve muita sorte de não se fe- Depois de lançar um último olhar
rir também. Com o impacto, a porta da para a gaiola dourada que fora seu lar,
gaiola se abriu. bateu asas e voou, até desaparecer no
Finalmente havia chegado a sua horizonte.
grande oportunidade!
Entretanto, ao se aproximar da porta
aberta, não conseguia se mexer, parali- Caso 1:
sado pelo medo. Tantas vezes ele sonha-
ra em fugir dali e, agora que o caminho Luiz é um rapaz de vinte anos, estu-
estava livre, não conseguia dar um pas- dante universitário. Chegou ao meu
so! Seu coração batia a mil por hora! consultório com a queixa de ter muita
Para piorar as coisas, naquela noite pa- dificuldade de estabelecer relaciona-
vorosa o mundo lá fora que sempre lhe mentos interpessoais. Vivia isolado
parecera tão convidativo parecia prestes em seu quarto, jogando videogame
a acabar, em meio ao aguaceiro, relâm- por muitas horas.
pagos e trovões! Desde criança, sua maneira de in-
De repente, ao ouvir o sibilar do ven- teragir gerava muita preocupação
to teve a impressão de escutar uma voz em seus pais. Era considerado muito
que lhe sussurrava: “Siga o seu coração!” agressivo quando pequeno, principal-
Era o que faltava para lhe dar co- mente em relação a sua irmã caçula.
ragem! Atravessou a porta da gaiola Seus pais se separaram quando tinha
e alçou voo pela sala, guiado por seus oito anos. De acordo com a mãe, ele
instintos. na época reagiu muito bem, alegando
A barulheira acordou os donos da que “agora teria duas casas”. À medida
casa, que correram a acudir os pobres que foi crescendo, foi diagnosticado
bichinhos. com TDA. Durante a adolescência,
Na manhã seguinte, tudo tinha vol- apresentava na escola intensa timidez,
tado ao seu lugar, mas com uma dife- com grande dificuldade para falar em

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público. Sua mãe relatou que sua pas- genuína preocupação com a mãe, pela Contos e Terapia Narrativa:
sividade era tanta que ele nem mesmo sobrecarga ao cuidar sozinha dele e de possibilitando novas conversas 13
Ana Luiza de Faro Novis
se permitia escolher o biscoito que sua irmã. Ainda tinha muita dificulda-
preferia comer, e era ela que comprava de de falar do seu descontentamento,
suas roupas. pois tinha receio de expressar a raiva.
No início do nosso atendimento, Sentia-se um fracasso por não conse-
apesar do silêncio, uma coisa chamou guir ser mais espontâneo e livre. Recri-
minha atenção: a profundidade do minava-se por seu mau desempenho
seu olhar. Mediante a dificuldade de na faculdade, com dificuldades para
verbalização, perguntei se ele gostaria estudar e entregar trabalhos.
de desenhar. Para minha surpresa, ele Mantinha uma relação distante com
aceitou prontamente. O desenho que o pai e muito próxima com a mãe. Pre-
fez imediatamente me tocou – um fa- ocupada com sua performance escolar,
rol, de onde saía uma enorme luneta ela sempre procurava lhe dar sugestões
com um grande olho. Mesmo tão dis- e conselhos. Ele tentava segui-los, mas
tante, ele tudo observava. invariavelmente fracassava.
Por meio do trabalho com os dese- A cada encontro fomos trabalhan-
nhos, Luiz rapidamente evoluiu para do suas percepções e preferências,
outras formas de comunicação – como em busca das formas como as coisas
cartas e exercicios reflexivos – até che- poderiam funcionar melhor para ele.
garmos à conversa. Gradativamente ia Ele descobriu que gostava de estudar à
se revelando um rapaz muito sensível, noite, e amava praticar artes marciais.
atento, sempre trazendo a sua angústia Timidamente, ele começou a ousar.
de falar em público. Algo o impedia, e Viajou com alguns amigos, se aproxi-
ele não sabia o quê. Vivia a vida sem mou mais do pai. Na faculdade, esco-
lhe dar sentido e não demonstrava lheu estudar Mandarim, uma discipli-
nenhum desejo ou interesse especial. na da qual realmente gostava.
Apenas “ia por ir”. Estávamos caminhando rapida-
A percepção que tinha sobre si mes- mente para voos mais ousados, quan-
mo era extremamente desqualificada. do, de repente, Luiz “travou”, e o antigo
Considerava-se uma pessoa muito desinteresse voltou a pairar sobre sua
diferente das outras, sem nenhuma vida. Era preciso tentar algo novo.
esperança de mudança. Apesar de ta- Quando lhe propus ler um conto,
manho descrédito, toda semana ele vi- “o olhar conhecido do farol” voltou a
nha pontualmente à terapia. Por mais se acender. Durante a leitura, Luiz fica
que tentasse se convencer de que não atento a cada palavra. Ao final, perma-
conseguiria reagir, a persistência no nece pensativo. Pergunto se gostaria
comparecimento e sua atitude durante de fazer uma releitura silenciosa do
a sessão, firme e atenta, eram um sinal texto. Naquele momento ele precisava
de reação. daquele espaço, íntimo, consigo mes-
Com o tempo, fizemos importantes mo, para depois compartilhar o que
avanços. Depois de anos sem falar pra- desejasse.
ticamente em casa, passou a ficar um Após a leitura, peço-lhe para subli-
pouco mais participativo nas conver- nhar os trechos que chamaram mais
sas. Com esse progresso, pouco a pou- a sua atenção. Ele assinalou apenas a
co ele pôde expressar seus sentimen- palavra “acomodado”, e a última frase
tos – a dor pela separação dos pais; o do texto: “Depois de lançar um último
ressentimento pela ausência do pai; a olhar para a gaiola dourada que fôra

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seu lar, bateu asas e voou, até desapa- tranquilizá-lo para essa conversa. Ele
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recer no horizonte.” reconhece o quanto ela o ama e quer o
Ali muito era dito. Duas marcações seu bem. Saiu decidido a, finalmente,
opostas. O ficar e o partir, o acomodar ter uma conversa aberta em casa sobre
e o ousar. Uma ousadia que falava de seus problemas.
ruptura, do não voltar. Na história de Na sessão seguinte ele relata que,
Luiz, a separação do casal levou a esse apesar do susto que sua mãe levou,
extremo, na relação com o pai. Os dois puderam conversar e ela reagiu bem.
eram muito próximos e, com essa mu- Quanto a ele, ficou muito feliz por ter
dança de rota, distanciaram-se muito. conseguido se expressar. Atualmente
Pergunto: “Se você fosse o passari- Luiz está fazendo um estágio, encan-
nho, o que seu coração estaria lhe di- tado com a profissão. “Aproveitando o
zendo?” A resposta é imediata: “Tenho seu tempo”, e cada vez mais dando voz
que aproveitar o meu tempo enquanto ao seu coração.
ainda tenho”.
E o que o passarinho teria dito a
si mesmo durante a tempestade? “O Caso 2:
tempo é curto; eu não vou poder voltar
atrás e recuperar o tempo perdido”. No- Breno tem 36 anos, e mora com sua
vamente uma resposta de extremos, mãe. O motivo para buscar o auxílio
que encoraja e ao mesmo tempo de- da terapia foi sua antiga falta de moti-
sanima. Era importante externalizar o vação. Passava a maior parte do tem-
sentimento que o paralisava. po trancado em seu quarto, e quando
O que o passarinho estava sentin- saía era para ir ao Bingo. Esse hábito
do naquela situação fazia sentido para de jogo já havia lhe trazido problemas
ele? Ele me diz que sim, e pergunto o financeiros, o que gerava muita preo-
que o medo estaria lhe dizendo: “Os cupação para seus pais.
donos da gaiola poderiam fechar sua Nem sempre fora assim. Sua vida
porta de novo.” era ativa até os 24 anos de idade, quan-
Foi nesse momento que uma pers- do sofreu dois revezes, quase simulta-
pectiva fundamental se fez presente. neamente – a perda do emprego e o
O menino rotulado na infância como fim de um namoro de quatro anos.
criança-problema, por ser raivoso e Em nosso primeiro contato, Breno
desatento, havia se escondido. Surgia mostrou-se muito tímido, com uma
um entendimento original que revelava certa dificuldade para se expressar. Pa-
uma identidade diferente daquela que o recia um menino em corpo de homem,
convidava a viver sem esperança e pa- com uma inocência em seu olhar. Logo
ralisado. Assistíamos um impulso claro ficou claro que ele carregava dentro de
em direção à liberdade de quem pode si uma dor tão intensa que o obrigou a
ser o que deseja. Ultrapassamos mais se refugiar no lugar que considerava o
uma barreira e passamos a conversar mais seguro, o seu quarto. Passava ali
sobre o seu receio. Ele conta que às ve- muitas horas, assistindo aos jogos do
zes sua mãe não o deixava falar, e fazer Botafogo, seu time do coração.
as coisas do jeito que queria. Isso o dei- Tinha uma boa relação com a
xava muito irritado mas, como não que- ­família. Seus pais eram separados, mas
ria magoá-la, acabava se submetendo. as dificuldades da época da separação
Falamos sobre o que identifica na haviam sido superadas, e atualmente
relação com sua mãe que poderia tinham uma convivência harmoniosa.

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Apesar do contexto familiar favorável, desses progressos, alguma coisa o pu- Contos e Terapia Narrativa:
Breno foi levado a se esvaziar de qual- xava de volta para o desânimo, como possibilitando novas conversas 15
Ana Luiza de Faro Novis
quer perspectiva de vida ou ambição se de repente “a bola murchasse”.
pessoal. Estava sempre disposto a aju- Foi num desses momentos que pro-
dar seus familiares, mas não desejava pus a leitura do conto. Ele aceitou pron-
nada para si mesmo. tamente. Ao terminar, ele imediatamen-
Decidi, então, começar pelo refúgio te fez uma associação: “Assim como o
onde se abrigava, o seu quarto. Ele re- passarinho, eu já saí da gaiola e fui para
conheceu o quanto descuidava daque- o tronco, mas dali não consegui sair.” A
le lugar onde passava a maior parte do partir dessa percepção tão cristalina,
tempo. A desorganização, o desleixo e o passamos a conversar sobre a história.
abandono daquele espaço físico era uma Pergunto o que, em sua opinião,
imagem visível do seu estado de ânimo. havia levado o passarinho a voar. Ele
Quando tomou a iniciativa de arrumar me responde: “O desejo da liberdade e
o seu quarto, ele se surpreendeu consigo o medo de ficar sozinho.” Para Breno,
mesmo. Este foi o nosso ponto de parti- o pássaro vivia na gaiola cheio de pla-
da para que ele voltasse à vida. nos, que não mostrava para ninguém.
Gradativamente o bingo foi substi- Quando ele finalmente consegue se li-
tuído por outros interesses. Passou a bertar, perde o medo de ficar sozinho
viajar para diferentes localidades, a ir e pode perseguir o seus objetivos.
com mais frequência à academia. Tra- De que forma o seu coração se iden-
balhamos a ideia de desenvolver uma tifica com o do passarinho? Ele me diz:
atividade que pudesse lhe dar alguma “Existem vários caminhos. É importan-
renda para autossustento. A essa altu- te não ficar conformado; é preciso bus-
ra ele já estava mais confiante em suas car coisas novas.”
capacidades. Foi quando surgiu a ideia Ele conseguiu dar o primeiro passo
de uma atividade que denominamos – sair da gaiola e ir até o tronco da ár-
ludicamente de um “personal driver”. vore. O que havia aprendido sobre si
Ele adorava dirigir, tinha um bom car- mesmo naquele curto voo? – “Aprendi
ro e poderia oferecer serviços de mo- que voo muito bem no início, mas no
torista para eventos. Paralelamente, final muitas vezes não concretizo. Nada
essa ocupação propiciaria o relacio- é impossível, mas às vezes parece difí-
namento com um número maior de cil, tenho medo das coisas não darem
pessoas. certo. Apesar disso, eu sei que tenho as
Breno revelou-se um rapaz dedica- minhas maneiras de buscar o meu obje-
do, que cada vez mostrava maior inte- tivo, e isso me faz bem”.
resse em se encontrar. Muitas vezes me Percebendo que ele tem uma noção
pedia para escrever algumas perguntas muito precisa sobre si mesmo, pergun-
sobre os seus projetos, que o levassem to para onde mais o seu coração tem
a refletir sobre o que estava fazendo. vontade de levá-lo. “Eu sei que posso ir
Eu sempre o estimulava a avaliar os muito além do que sempre pensei. Te-
ganhos, o que funcionara e o que não nho muita vontade de finalizar os meus
funcionara, e – principalmente – o que objetivos. O sentimento de liberdade é
vinha aprendendo sobre si mesmo. Ele muito importante para mim.”
mostrava um empenho genuíno em se Conversamos sobre a liberdade e
aprofundar nessas percepções. em como voar em busca dos seus obje-
Desde então, ele está mais indepen- tivos a legitimava. Pergunto a ele qual
dente, com maior autonomia. Apesar sentimento, situação ou evento que

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reconhecia como ameaçador a liber- No início da conversa sobre o con-
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dade? “Para mim não é livre quem vive to, os relatos eram permeados de cren-
em sacrificio.” ças, referências e ressonâncias com
Nesse momento, ele se dá conta do sua própria história de vida: “Tenho
que pesava sobre suas asas. Ele queria que aproveitar o meu tempo enquanto
muito continuar a voar, mas o medo ainda tenho”, disse Luiz. “Assim como
de sofrer o paralisava. Indago sobre os o passarinho, eu já saí da gaiola e fui
voos já vividos, e se havia algum em para o tronco, mas dali não consegui
particular que havia lhe proporciona- sair”, avaliou Breno. As interpretações
do prazer e liberdade. Breno imedia- do texto eram devidamente preenchi-
tamente começa a falar: a atividade das pelas expressões da sua subjetivi-
de personal driver, as viagens, a conta dade.
bancária em dia, estar interagindo me- As perguntas foram formuladas
lhor com as pessoas, inclusive com o com base nas ressonâncias produzidas
sexo oposto. Ao terminar de falar, um pela história de cada um. Ao utilizar
sorriso iluminava a sua face. O receio determinadas partes do texto como
do sofrimento que até então o para- metáforas, buscou-se favorecer a exter-
lisava foi driblado pelo re-narrar das nalização: “se você fosse o passarinho, o
conquistas que vinha alcançando. que seu coração estaria lhe dizendo?”;
Hoje, Breno pode voar sobre a sua “e o que o passarinho teria dito a si
história em uma nova perspectiva. mesmo durante a tempestade?”; “o que
Novos projetos profissionais surgiram, havia levado o passarinho a voar?”. Os
e ele já está planejando melhorar a ca- sentimentos que os impediam de voar
tegoria do carro, para trabalhar numa puderam ser explicitados: A cobrança
cooperativa. Continuamos nossas pelo tempo perdido de Luiz o man-
conversas sobre os voos, e a cada dia tinha no lugar da pessoa que sempre
percebo Breno mais ressonante com a estava errada e reforçava sua insegu-
sua liberdade. rança em voar; no caso de Breno, era
o medo de sofrer que o fazia evitar os
riscos de alçar voos mais amplos. Ao
Discussão e Análise ser reconhecida a trama dominante,
criava-se o contexto apropriado para
As reflexões profundas e os entendi- a exploração de fatos, eventos, contra-
mentos originais construídos por Luiz dições necessárias para engendrar en-
e Breno me surpreenderam. De acor- tendimentos originais
do com as singularidades de suas his- A partir do enredo do conto, eles
tórias pessoais, ambos alçaram voos à imaginativamente davam sentido aos
sua própria maneira ao se darem conta seus pensamentos e sentimentos: sur-
de percepções fundamentais que fize- giam interpretações que traziam no-
ram toda a diferença. vos significados. As brechas presentes
Cada um encontrou sua forma par- no texto permitiam que ambos pudes-
ticular de estar com o texto: Luiz ou- sem dar sua carga autoral a essa con-
viu e depois preferiu fazer uma leitura versa; através do diálogo com o conto,
silenciosa; Breno quis apenas ouvir Luiz pôde se dar conta do receio de ter
a história. Considerei fundamental seus voos interrompidos pela família.
respeitar a preferência de cada um, Quando pergunto “o que o medo esta-
evitando a criação de um padrão que ria dizendo ao passarinho?”, ele dá voz
atropelasse os estilos individuais. a seu próprio medo: “Os donos da gaio-

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la poderiam fechar sua porta de novo. O conto cria uma ponte entre o real Contos e Terapia Narrativa:
Breno, por sua vez, pôde compreender e o imaginário, gerando uma comple- possibilitando novas conversas 17
Ana Luiza de Faro Novis
que associar seus voos à possibilidade mentaridade única. Nessa dança, rit-
de sacrifício o desestimulava a voar: mos, passos e ideias originais circulam
“Não é livre quem vive em sacrifício”, pelo setting. Cada rota diferente sem-
ele conclui. pre possibilita um novo entendimento
O aparecimento de histórias alter- e devolve a liberdade. Ao compartilhar
nativas possibilitou a renegociação meus contos, este momento torna-se
das narrativas pessoais, possibilitan- extremamente especial para mim. Ou-
do voos com liberdade. Através das vir e presenciar diferentes desdobra-
conversas de reautoria, Luiz pôde re- mentos, caminhos e opiniões sempre
conhecer seu desejo de ser livre, bem me enriquece. A autoria tem mão du-
como a possibilidade de dialogar com pla, de mim para o cliente e dele para
sua mãe, validando o elo de amor e mim. Saio muito revigorada de nossas
confiança dos dois. Já Breno reavaliou conversas.
o convite para a continuidade ao voo, Sempre acreditei no poder das his-
ao reconhecer o prazer nos voos re- tórias de vida. Este é um fragmento da
centementes vividos. minha, do Luiz e do Breno.

Considerações finais Referências

Através deste relato, procurei com- Billington, K. (2015). Why should chil-
partilhar a interseção de duas grandes dren have all the fun? How a folktale
paixões em minha vida. Uma antiga, might open a doorway into narrati-
a Terapia Narrativa. A outra, mais re- ve re-authoring conversations with
cente, a literatura. Ao ouvirmos uma adults. Dissertação apresentada no
história não ficamos passivos. O inte- Master em Terapia Narrativa e Tra-
resse despertado pela trama nos trans- balho Comunitário, Universidade
porta para aquele universo mágico; de Melbourne, Austrália.
carregamos conosco as nossas referên- Denborough, D. (2014). Retelling The
cias e experiências, dando um sentido Stories of our Lives. New York, NY:
pessoal ao que é ouvido. Cada signifi- W. W. Norton.
cado se mostra único e especial. Epston, D. (1988). The story of dory the
As novas narrativas que Luiz e Bre- cat. Australian & New Zealand Jour-
no fizeram emergir a partir do diálogo nal of Family Therapy, 9, 3, 1988,
com o conto foram gratas surpresas; 172-173. Disponível em: http://
são casos como esses que tornam a www.narrativeapproaches.com/
prática da Terapia Narrativa gratifi- narrative%20papers%20folder/
cante e encantadora. Nunca sabemos dory.htm. Acesso em: 13 abr. 2016.
para onde pode levar a imaginação e Feldman, C. & Kornfield, J. (1994). His-
a criatividade de quem nos ouve. Cada tórias da Alma Histórias do Coração.
ouvinte estabelece seu próprio e único São Paulo: Pioneira Editora, 1994.
“plano de voo”. Quanto a mim, a escri- Lispector, C. (2010). Crônicas para Jo-
tora cuida da decolagem, enquanto a vens de Escrita e Vida. Rio de Janei-
terapeuta se mantém curiosa e aberta, ro: Editora Rocco Jovens Editores.
estimulando os passageiros a tirar o Morgan, A. (2007). O que é terapia nar-
máximo proveito da jornada. rativa?: uma introdução de fácil lei-

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tura. Porto Alegre: Centro de Estu- White, M. & Epston, D. (1990). Narra-
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dos e Práticas Narrativas. tive means to therapeutic ends. New
Novis, A. L.; Abdalla, L. H. (2013). A York, NY: W. W. Norton, 1990.
despensa da vida. Revista Nova White, M. (2012). Mapas da prática
Perspectiva Sistêmica. Rio de Janei- narrativa. Porto Alegre: Brasileira,
ro, RJ, n.45, p.25-33, abril 2013. 2012.
White, M. (1995). Re-authoring lives:
interviews & essays. Adelaide, Aus-
tralia: Dulwich Centre Publications,
p. 30.

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