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Ano 1 - Número 1
Fevereiro 2023
Cezarina – GO – Brasil
Expediente:
Idioma: Português (Brasil)
Distribuição: Gratuita ( online )
Conselho Editorial: Lucas Lourenço, Nathália Pereira, Julha Barbosa.
Editor-chefe: Lucas Lourenço B. Gonçalves
Diagramação: Lucas Lourenço B. Gonçalves
Capa: Pixabay (imagens obtidas gratuitamente)
Sobre a revista:
A Revista Artes do Multiverso é uma publicação brasileira e independente.
Desenvolvida com o objetivo de dar espaço aos escritores e artistas,
profissionais ou amadores, que desejam divulgar e mostrar o seu talento para
todos os universos existentes. A literatura nunca irá morrer, pois ela vive dentro
de cada um de nós.
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A reprodução total ou parcial dos textos é permitida, desde que sejam atribuídos
os créditos aos respectivos autores, que não seja para fins comerciais e que seja
citada a fonte, conforme prevê a Lei Federal n° 9.610, de 19/02/1998 ( Lei dos
Direitos Autorais).
CRÔNICAS........................................................................................................13
Começou no elevador – Carol Demoliner......................................................14
Literatura Empoderada – Cristiane Camara...................................................16
Quero aquela do alto – Cristiane Camara.......................................................18
Simples e tão complexo– Alex Manso............................................................20
O momento certo – Flávia Bataglia.................................................................26
Detalhes do entardecer – Flávia Bataglia.......................................................27
Figurinas – Diogo Tadeu Silveira....................................................................29
Teu nome – Mariana Mendes...........................................................................31
Amigas – Hillary Sthefany................................................................................32
POESIAS...........................................................................................................35
Amo-te - Carol Demoliner................................................................................36
Vírus do amor – Luan Souza Poesias..............................................................38
Sentimentos passados – Luan Souza Poesias..............................................39
Obra pública – Mariana Mendes......................................................................40
O céu chora na solidão da noite – J.D. Ortega............................................42
O observador – J. D. Ortega.............................................................................42
Teu sorriso, meu abrigo – Ubertam Santos....................................................45
As Carolinas! – Ubertam Santos.....................................................................45
Tangerinas na janela – Nick Manfrei...............................................................47
Borboletas pela vida – Nick Manfrei................................................................48
Talvez realmente não seja para ser – Nick Manfrei........................................49
Encerrando ciclos – Edione B. Valente...........................................................50
Inverno – Glenda Fabíola.................................................................................51
Parada – Glenda Fabíola..................................................................................52
Ausência – Glenda Fabíola..............................................................................53
POEMAS...........................................................................................................55
Etimologia – Letícia Félix Fraga......................................................................56
Mitologia – Letícia Félix Fraga.........................................................................57
Substantivos coletivos – Letícia Félix Fraga..................................................59
Pássaro Urbano - Paulo Brás..........................................................................61
Ofício - Paulo Brás............................................................................................62
Aconchego de Vó - Cassiano Figueiredo Pereira..........................................63
Autodidata - Lucas Lourenço.........................................................................64
Sem Chão - Lucas Lourenço...........................................................................64
Felicidade - Ilmar Ribeiro da Silva...................................................................66
Amor gélido – Lincoln Silva.............................................................................67
Anatomia botânica – Lavínia Vianini...............................................................69
“Livro” – Lavínia Vianini..................................................................................70
Sacramento – Lavínia Vianini..........................................................................71
Barco a Belém – Valério Maronni Salles.........................................................72
Baby Blues – Fábio Martins.............................................................................74
A noite dos dinossauros – Fábio Martins.......................................................75
Manifesto anti-heroico – Fábio Martins..........................................................76
Instinto – Daiana Soares de Oliveira...............................................................78
A árvore e eu – Maria José...............................................................................79
Pássaros ao céu – Janice Maria Walter...........................................................80
Sonho Breve – Cláudio Loes...........................................................................81
Ensaio sobre nós dois – Tim Soares...............................................................82
Mini épico – Tim Soares...................................................................................82
Metáforas – Tim Soares...................................................................................83
Irmão – Ester Pacheco Brandão......................................................................84
Em ondas... – Hellen Bravo..............................................................................85
Percurso interior – Cleusa Piovesan..............................................................87
Ode à poesia – Cleusa Piovesan.....................................................................88
Páginas esquecidas – Cleusa Piovesan.........................................................89
Noites no sertão – Cleusa Piovesan...............................................................89
Magia crepuscular – Cleusa Piovesan............................................................89
Engano, medo e mentira – Luan Machado......................................................91
Amor – Luan Machado.....................................................................................91
Planeta flor – Luan Machado...........................................................................92
Vida que brilha – Lara Machado......................................................................93
Eu – Lara Machado...........................................................................................93
Seremos nada – Lara Machado.......................................................................94
Versos possíveis – Wallace Silveira Azambuja..............................................95
Musa impassível – Wallace Silveira Azambuja..............................................95
Soneto aos olhos XIX – Wallace Silveira Azambuja.......................................96
Melancolia – Luiz Felipe de Lima.....................................................................98
Soneto do ser amado – Luiz Felipe de Lima...................................................98
ABC do Pará – Luiz Felipe de Lima................................................................99
Vaga-lumes – Cláudia Gomes.......................................................................101
Teus lábios – Cláudia Gomes.......................................................................102
Baianinha – Cláudia Gomes..........................................................................102
Dependência emocional – Kailaynne Santtos.............................................104
Um dia – Kailaynne Santtos..........................................................................104
( C )ALMA – Gabriel Alves de Souza............................................................106
Na sombra dela – Narjarah Paz....................................................................108
Águas – Narjarah Paz....................................................................................108
[Penumbra] Lumaréu – Henrique de Souza................................................109
[Ruína] Temporal atemporal – Henrique de Souza.....................................110
O beijo de Judas – Breno Pitol Trager.........................................................113
O thespian – Breno Pitol Trager...................................................................114
Queria escrever um poema de amor – Leonardo Fortes Vieira.................115
Recomeços – Ana Paula Portes Thomé......................................................116
Velhos tempos – Ana Paula Portes Thomé.................................................116
Além – Elaine Perez.......................................................................................118
Eu já fui jovem – Wagner Planas..................................................................119
Velho jardineiro – Wagner Planas................................................................120
Para todo sempre – Wagner Planas.............................................................121
“Mar” – Alexandre Cruz de Oliveira.............................................................123
“Eu” – Alexandre Cruz de Oliveira...............................................................123
Milenar – Izabel da Rosa...............................................................................125
Como sempre – Sandy Lauany.....................................................................127
Minhas mãos doem – Sandy Lauany...........................................................127
Em você – Sandy Lauany..............................................................................128
Amor latente – Joseani Vieira.......................................................................129
Minhas estações – Joseani Vieira................................................................130
Coisas da vida – Joseani Vieira....................................................................131
Vó é mãe duas vezes – Davi Carneiro..........................................................133
Filha de Eros – Hillary Sthefany...................................................................134
Blue wisky – Hillary Sthefany.......................................................................134
CONTOS..........................................................................................................136
O que pode ser feito antes da guerra? – Marcia Elisia...............................137
Dhoruba – Cecília Lorca................................................................................139
Diorama no paraíso – Valério Maronni Salles..............................................141
A partida – Sandra Sandra O'Neill................................................................145
Olhar imotal – Hellen Bravo...........................................................................148
Um só coração – Hellen Bravo......................................................................150
Café sem açúcar – Patrícia Baldez................................................................153
Dono do mundo – Elaine Perez.....................................................................156
“Reflexos em pó escuro” – Alexandre Cruz de Oliveira..............................160
Amores pós-pandêmicos – Vanessa Dias....................................................163
Prêmios experimentais – Benjamim Franco................................................165
SÉRIE ARTÍSTICA VISUAL
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Hoje Ontem
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As fotos foram feitas em julho de
1999, um trabalho que estava de um
porque, o momento chegou, a
passagem para a cianotipia foi feita
em 2021. Uma lembrança e
homenagem ao hoje e ao ontem.
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Hoje Ontem
Vivien Zanlorenzi
Hoje é o futuro de Ontem
Amanhã é o Ontem de Hoje
Como nossas mãos carregam tantas cicatrizes
Tantas histórias, tantas indas e vindas por lugares,
Corpos e objetos.
Observe-as, e irá sentir o Hoje Ontem das pessoas.
Ontem agora
Helena Kolody
Aranha rendeira
Tece de novo o nhanduti do sonho
Com o mesmo fio de autrora.
A alma se enreda
na teia sutil
de ontem agora.
Vivien Zanlorenzi
Vivien Zanlorenzi, nasceu e mora em
Curitiba/PR/Brasil, artista plástica formada pela Escola de
Música e Belas Artes do Paraná EMBAP, em Superior de
Gravura, 1992/1995. Pós-graduada em História da Arte
pela mesma instituição, 2002. Com 44
exposições coletivas nos estados do Paraná, Santa
Catarina, São Paulo e Rio de Janeiro e Argentina. 06
exposições individuais e 11 Salões de arte.
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CRÔNICAS
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Começou no elevador
Carol Demoliner
Prometi nunca mais te escrever. Mas fui te ver. Que grande erro. Depois
de te olhar inteiro por segundos lentos, vi a marca que me arrebentou o peito.
Desceu seco garganta adentro. Já não sabia o que fazer no momento, o que
sentir, eu queria ir embora, sair dali. Não de perto de ti. Mas sair da condição de
não ser mais nada pra ti. E ter que passar por situações vis, como esta, onde
não aconteceu nada, mas num olhar, vi por um triz: o chupão estampado no teu
pescoço - Pegou meus dois braços estendeu eles até o teto do elevador e me
deu um soco. Cai nocauteada. Fiquei zonza. Perdi um pouco dos movimentos
do rosto. Também a fala. Que difícil ver a materialização do teu caso. Que
horrível ver o teu corpo marcado, por alguém que não sou eu. Instantaneamente
imaginei mil cenários, eles se transportaram pra minha mente, não foi
intencionalmente. Eles vieram e me torturam. Eles me sussurram coisas do tipo:
“Agora é o fim. Ele não quer saber de você. Não foi uma, nem duas, nem três. E
vocês acabaram não faz um mês. Então acorda. Agora você tá fora da lista. A
fila anda rápido. Tem muita gente na pista. Você não é a escolhida. Você não é
a mais bonita. Você não é quem mais o excita. Você não está mais em prioridade
nenhuma. Ele não te procura quando sai na rua. Ele não tá nem pra aí pra tua
ternura. Ele não quer que você seja sua mulher. Ele não te quer mais nua.”
Acabou. Ruptura. Eu fiquei ali dura, no chão, estripada, totalmente murcha. Acho
que durou uns 2 minutos. E então a gente saiu do elevador. Durou segundos. Eu
segurei as lágrimas até entrarmos pela porta. Ufa, tu não viu que eu chorei. Ai,
que dor. Eu tô perdendo o meu amor. Ai, meu olho. Ele não consegue desviar
do pescoço. Ai, meu nariz. Ele não sente mais teu cheiro. Ai, minha boca. Ela
não quer chegar mais perto da tua. Ai, minha mão. Ela te faz um carinho de
tchau. Junto com o resto do meu corpo. Porque sabe que vai sentir saudade.
Porque já está sentindo saudades. Ai, minha pele. Ela estranha encostar em ti.
Que sensação ruim, eu não sou a única a te sentir. Ai meu coração. Tá doendo.
Ta ficando mais lento. Será que eu tô morrendo? Enquanto eu permaneço
aqui sem dar nenhum passo presa no espaço que eu construo sozinha, onde
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nele em algum momento eu espero que tu continues os laços, tu me põem fora
dos teus compassos. Tu preferes uma série de mulheres. Ai, minha cabeça. Tá
odiando tudo isso. Nem sabe se quer mais te ver. Talvez seja melhor ser só
amigo. Sem mais sofrer. E porque eu já tô sentindo em ti, o teu despedir.
Pronto, te perdi. Agora é o fim. Eu cogito, nunca mais te ver.
Depois de quarta, porque já combinamos de dormir juntos mais uma vez.
Carol Demoliner
15
Literatura Empoderada
Cristiane Camara
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futuros filhinhos (ela é quem dominava a situação e escolhia o que fosse melhor).
Dispensou vários, até chegar a vez do João Ratão, que tinha uma voz de veludo,
era muito educado e poderia ser um bom pai e marido. O casamento foi
preparado e no dia da festa, João Ratão, vencido pela gula, caiu na panela de
feijoada e morreu (acidentes, enganos, frustrações acontecem, por mais que
tentemos fazer as melhores escolhas). E ela desistiu? Desanimou? Que nada!
Dizem que encontrou um noivo que é um barato! Que a ama, é gentil e amoroso
com ela e com os filhinhos deles. Não é incrível? Dona Baratinha era
empoderada! Lutou pela felicidade até encontrá-la.
Na adolescência, lembro-me dos livros de José de Alencar,
Machado de Assis, Érico Veríssimo...a biblioteca do colégio tinha muitos
clássicos. Destes, um dos livros que mais me marcou dessa fase, foi “Senhora”,
de José de Alencar. Aurélia Camargo também era muito dona de si e, mesmo
amando Seixas, fez questão de dar a ele uma lição até que percebesse o quanto
havia sido fútil e leviano. Como um bom romance romântico, tudo acaba em
“felizes para sempre”, mas a personagem de Aurélia é marcante, forte,
inteligente...
Mais tarde, já na faculdade, conheci Marina Colassanti, autora,
principalmente, de contos fantásticos. “A moça tecelã” é uma das minhas obras
preferidas da autora. A moça tecelã, conta a história de uma jovem que tinha um
tear mágico. Com ele, levava uma vida feliz e tranquila. Bastava tecer aquilo que
queria e tudo se materializava diante dela. Até que sentiu falta de uma
companhia e resolveu tecer um marido. Ele surgiu lindo, exatamente da forma
como ela o havia tecido. Mas, percebendo o poder do tear, ele logo foi fazendo
exigências e mais exigências e ela, tornou-se uma escrava de seus caprichos.
Então (essa é a parte mais mágica e incrível da história), ela decidiu que não
queria mais, que ela era mais feliz sozinha e, antes que o marido se desse conta
do que estava acontecendo, viu-se desfazendo pouco a pouco. A moça tecelã
desfez o marido e voltou à vida simples e feliz de antes. Não é incrível?
Maravilhoso? Inspirador?
A literatura sempre me inspirou muito, sempre fez parte dos meus dias,
sempre me transformou pouco a pouco, fez entender um pouquinho mais da
humanidade, fez perceber o poder que temos e o quanto o conhecimento nos
torna mais fortes e capazes, o quanto a leitura nos transforma.
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Minha filha leu recentemente os livros “A princesa salva a si mesma neste
livro” e “A bruxa não vai para a fogueira neste livro”. Achei fantástico! É um bom
começo. Meu marido diz em tom de brincadeira que estou criando uma feminista.
Discordo! (Apesar de que, esse conceito de feminista também precise ser
amplamente discutido). Estou criando uma filha que vai acreditar em si mesma,
na sua independência, que será dona do seu nariz. Isso é empoderador. A
literatura é empoderadora!
Você já tirou uma fruta no pé? Percebeu como as mais bonitas e mais
doces sempre ficam no alto? Há uma explicação científica para isso: elas
recebem mais luz do sol. O sol as faz ficarem mais docinhas. Estão mais
próximas do sol, da luz, e mais distantes de nós. E são, por tudo isso, as mais
almejadas. São maiores, mais doces, mais difíceis e, por tudo isso, dão mais
prazer quando alcançadas.
As pessoas que optam pelo mais fácil, logo dizem: “Aquela está linda, mas
não alcanço, está muito no alto. Vou me contentar com uma de baixo mesmo”.
As pessoas mais persistentes e teimosas (tudo tem uma conotação positiva e
uma conotação negativa), fazem tudo o que podem e até usam a criatividade ou
correm riscos para alcançar a laranja mais do alto. Pode-se pular, subir nos
galhos, correr o risco de cair, de quebrar um galho e se espatifar com ele, pode-
se encontrar uma vara, chamar alguém mais alto para ajudar...são muitas
possibilidades e todas elas são usadas para alcançar a laranja que está mais
próxima do sol. E que alegria quando estamos com a fruta mais linda do pé em
nossas mãos, pronta para ser saboreada! A luta para conquistá-la, a deixa ainda
mais saborosa!
Isso não se aplica apenas às laranjas, ou maçãs, ou qualquer outra fruta,
é uma verdade que se aplica à vida. Quando queremos algo de verdade, a luta
pode ser intensa, mas a glória da conquista é recompensadora e, as dificuldades
só fazem aumentar a vontade (e a teimosia), até que a vitória chegue. Isso
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também se aplica às pessoas. As mais iluminadas, mais doces, mais bem-
sucedidas, mais distantes do que somos são sempre as mais atraentes, as mais
desejáveis, o ideal que queremos alcançar.
Muitas vezes, é preciso comprar a briga, correr os riscos, encontrar
alternativas, se jogar de cabeça. Se pode dar errado? É claro que pode! Mas,
como já disse Fernando Pessoa “Quem quer ir além do Bojador, tem que ir além
da dor. Deus, ao mar, o perigo e o abismo deu, mas nele é que espelhou o céu”.
Cristiane Camara
Cristiane Camara é professora de Língua Portuguesa há
dezessete anos na rede estadual do Paraná. Formada em
Letras Português/Inglês pela UNESPAR de União da Vitória –
PR; Especialista em Língua Portuguesa e Literaturas,
Educação do Campo e Gestão Escolar e Coordenação
Pedagógica. É autora do livro de crônicas e memórias “Revire
dentro Encontre (se) fora” publicado pela editora CRV.
https://www.instagram.com/cristianeczonstka/
https://www.facebook.com/profile.php?id=100087967046787
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Simples e tão complexo
Alex Manso
20
Diana sempre estava em seus sonhos, delírios, encenações criativas de
sua mente, pois já tinha tido contato com ela em sua vida, contatos meramente
visuais, nunca trocaram uma palavra, mas tímidos olhares, trajetos da escola
para casa, percurso dentro de um ônibus, ele tinha onze anos quando ela
chamou sua atenção, seus longos cabelos passavam da cintura, eram lindos, foi
amor à primeira vista, era um sentimento puro a contar que vinha de um pré
adolescente, um menino descobrindo o que é gostar de outra pessoa, tão
importante para ele que a levou consigo para seu isolamento, em seus devaneios
Diana o ajudou muito, lhe deu forças, sem ela teria sido difícil passar por esse
longo período, quantos momentos ela passou ao seu lado, um misto de alegrias
e tristezas logo que seu delírio passava e só restava a escuridão.
Difícil precisar o tempo desse isolamento, um ano ou mais, o tempo é
relativo quando se renuncia à realidade e se permite viver um mundo de fantasia
onde não se tem compromisso com coisas cotidianas, mas um dia a irrealidade
daria lugar a uma curiosidade, aquela menina que sempre apoiou nesse período,
não era mais uma menina, com o passar do tempo já deveria ser uma mulher,
que aparência ela teria? Como saber se ele a eternizou em seus pensamentos
na figura de uma adolescente, será que constituiu uma família? Dúvidas
tomaram conta de seus pensamentos, a inquietude era mais forte que a fobia,
mas sem ajuda não conseguiria, e seus amigos imaginários não apareciam mais
com frequência, nem Diana lhe apoiava como antes, pois a existência dessa
menina era contestada por sua mente que em um momento de sobriedade
questiona a sua eterna jovialidade, então tomou uma difícil decisão e comunicou
a sua mãe:
- Não aguento mais ficar preso no quarto, eu não consigo sair sozinho,
preciso da ajuda de um psicólogo para tentar andar na rua de novo, não vai ser
fácil, mas eu preciso tentar.
Nessa época não existia redes sociais, sua volta para realidade se
confunde com a chegada da tecnologia, da interação entre desconhecidos,
grupos sociais, acesso à internet, pesquisas, em sua batalha com ajuda de
psicólogos e medicamentos, reaprendendo a andar, interagir com outras
pessoas, controlar suas emoções, se viu diante de uma página social com o
nome de Orkut, como encontrar Diana apenas sabendo seu primeiro nome? Foi
uma longa procura, utilizava métodos como nome de pessoas conhecidas que
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poderiam ter contato com ela, era quase impossível, um nome comum em meio
a centenas de homônimos.
Em um belo dia, um rosto familiar, certeza não teria naquele momento,
o rosto era de uma mulher, em seu colo uma criança aparentemente uns dois
anos de idade, algo lhe dizia que era ela, o coração batia mais forte, a intuição
confirmava que estava no caminho certo, algumas semanas de
acompanhamento à página veio a confirmação, era Diana mesmo, agora tinha
o nome e sobrenome, foram alguns anos seguindo a página no anonimato, ela
teria formado uma família, se mudado para uma cidade distante, o sentimento
era forte, alguém que teria passado o momento mais difícil de sua vida ao seu
lado, te dando força, abriu mão da sua vida, de seu envelhecimento tinha uma
família... na verdade ela seguiu a diante, apenas a imagem dela se materializou
em sua mente frágil e confusa, pesquisando em sua página percebeu que ela
cursou faculdade, se formou em administração, conheceu um rapaz, tiveram um
filho, caiu a ficha... ela nunca conversou com ele, Eduardo tinha usado a imagem
dela para conseguir passar aquele tempo isolado sem estar sozinho, ela sempre
esteve ao seu lado, apenas em seus pensamentos, em sua mente.
O tempo passou, a página social se tornou obsoleta com a chegada de
outras páginas, a interação com as pessoas ficou mais fácil, Eduardo já
conseguia controlar vários sintomas da fobia social, a timidez, a gagueira pela
insegurança de conversar, começaria a criar coragem para se posicionar em
algumas situações, mas ainda tinha uma lacuna não resolvida, como falar para
Diana o quanto ela foi importante na vida dele, ele devia isso a ela por não ter
lhe abandonado, esse dia chegou! não sei se foi um erro, mas se não fizesse
acho que ela nunca saberia como seria a reação de Diana, havia uma ânsia de
dividir fatos que ele creditava que ela o entenderia, foi quando ocorreu o primeiro
contato.
A princípio não se identificou, mandava mensagens de motivação
sempre deixando claro o quanto ela era importante, notou acompanhando suas
postagens o quanto era ligada a religião, então exaltava essa questão, mas acho
que isso a deixava mais confusa, ela deixou claro em uma das mensagens:
- Não te entendo, o porquê dessas mensagens, você me parece familiar,
mas não me lembro de onde te conheço.
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Para evitar mal entendidos, decidiu contar toda a história, a princípio
Diana pareceu compreender, mas Eduardo queria esclarecer o quanto ela foi
importante, imaturidade dele pois os relatos a deixava mais confusa, para piorar
ele falava em amor para Diana, amor que ele sentia, não querendo conquista-la,
mas apenas um sentimento unilateral, um amor que ele não escolheu, surgiu
naturalmente, ele apenas alimentou aquele sentimento, mas se tornaria
repetitivo a ponto dela postar uma indireta em sua página:
- O amor é igual capim, você planta, cuida com carinho e vem uma vaca
de outro pasto e consome.
Essa mensagem e outras postagens mostravam uma Diana de
personalidade forte, diferente daquela menina amável que ele tinha projetado,
suas insistências em mandar mensagens tentando provar seu amor começavam
a aborrecer Diana, ao mesmo tempo desconstruir a imagem de perfeição que
Eduardo tinha por ela, mas não diminuía seu amor, ele recebia mensagens de
alerta que a paciência de Diana estava diminuindo:
- Estou tolerando você, suas mensagens, mas já avisei que está passando
dos limites, um dia vou me cansar e dizer chega!
A mensagem foi um alerta, mas Eduardo sentia que não tinha passado
a mensagem do quanto Diana foi importante para ele, e esse amor que ele tanto
quer explicar, ela não tinha entendido a essência da mensagem, sem perceber
estava se tornando inconveniente, até chega ao ponto de ser bloqueado por
Diana, para ele a decisão foi um choque, como a mulher que ele sempre
idealizou como seu porto seguro teria essa atitude, por um tempo ele ficou a
refletir, porque é tão difícil provar que ama outra pessoa, depois de alguns meses
por motivo desconhecido ela desbloqueia Eduardo, tornando seu perfil
novamente visível para ele, na tentativa de tentar corrigir o erro ele torna a lhe
enviar mensagens:
- Diana, te peço desculpas, eu te idealizei de uma forma, mas você ainda
era menina, não consigo me comunicar porque você é uma mulher, tem família
agora, não consegui encontrar as palavras certas, peço que reconsidere não vou
mais te incomodar.
Diana aceita suas desculpas, mas em sua inquietude e imaturidade,
Eduardo continua a lhe enviar mensagens, comentando postagens, pois estava
acostumado a dialogar com Diana, não essa Diana mulher, mas a menina que
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sempre esteve ao seu lado, em seus devaneios preso em um quarto, isso
incomodava ela porque Eduardo até algum tempo atrás era um desconhecido,
apenas um vizinho de infância que ela nem lembrava mais, e agora tinha que
tolerar um estranho dando palpites em sua vida como se a conhecesse de muitos
anos, Eduardo não tinha essa percepção e se tornou um incômodo na vida de
Diana.
Sua segunda gravidez, agora de uma menina deixava ela mais
reservada, não postava mais fotos, mandava mensagens de indireta para ver se
Eduardo se tocava, bloqueava ele por algum tempo, mas depois desbloqueava,
creio que sua formação religiosa pesava em sua consciência que se afastasse
Eduardo completamente de sua vida poderia causar algum mal a ele, devido a
sua fragilidade emocional, mas ele não conseguia entender o recado, esse amor
que ele sentia era muito forte, alimentado por ele, mas no fundo sabia que era
unilateral, na verdade não poderia ser diferente era um estranho aos olhos dela,
passaram-se muitos anos, desgastes por causa de mensagens e comentários,
Diana seguiu sua vida, separou do marido, se reconciliou de novo, foram vários
bloqueios e desbloqueio a Eduardo, com o contato entre os dois fragilizado ele
resolveu silenciar, ela percebeu essa mudança, a última mensagem dirigida a
ele foi um desabafo, uma frase de Mário Quintana, basicamente se tratava de
uma indireta, nela dizia que você passa a mensagem quando você se cala, não
quando você fala.
Mensagem absolvida por Eduardo, mas já era tarde, o estrago estava
feito, anos de desgaste por palavras jogadas ao vento, uma ânsia de explicar
esse amor, um sentimento que não pode ser explicado, não é um simples “ Eu
te amo " é um complexo misto de sentimentos que apenas um convívio pode
provar que ele existe, Eduardo na sua incapacidade de compreender entendeu
que ele conviveu com quem achava ser a Diana, mas ela não conviveu com ele,
então não conseguiria entender esse amor que ele sentia por ela, ao tentar
compensar isso com palavras causava uma estranheza a Diana, como um
homem aparece do nada em sua vida dizendo que lhe ama, que você o ajudou
nos momentos difíceis, como assim! Era um estranho que acabara de conhecer,
mas ela até que se saiu bem, foi muito tolerante.
Para Eduardo restaria acompanhar Diana a distância, a pessoa que ele
sempre conversou era um delírio projetado por sua mente, como ele superou
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seu problema psicológico, aprendeu a conviver com a fobia social, ele também
tinha que entender que poderia sim seguir Diana, acompanhar sua vida, pois
isso ele não conseguiria viver sem, mas no silêncio, como um mero espectador,
consciente de que sua abordagem foi errada, mais ciente que ela fez parte de
sua vida, que por um tempo ele também fez parte da vida dela, Diana sabe que
Eduardo existiu e de algum modo absorveu parte da mensagem que ele quis
passar, o amor continua em seu peito, o amor simples sem pedir nada em troca,
mas tão complexo a ponto que se tentar menciona-lo causará uma grande
confusão.
Alex Manso
Nascido em Belém do Pará, sua família veio para Brasília
em 1986, onde moram até hoje, adquiriu gosto pela literatura,
escrita, cinema, tudo que conte histórias, participa de concursos
literários, conquistas de certificados e menções honrosas que
guarda com muito carinho, como reconhecimento pelas suas
obras.
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O momento certo
Flávia Bataglia
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E por falar em pendência...Assim que coloquei a xícara sobre o pires,
deixando um fundinho de café frio, recebi uma mensagem: "Posso te ligar?"
Precisava partir. Pedi a conta, paguei. Segui. Era a vida me convidando.
"Vamos, não se demore, chegou a hora de ir."
Detalhes do entardecer
Flávia Bataglia
O alaranjado do céu a beber de seu último gole na linha do horizonte,
desenhando o que finda e o que segue, aquece meus fins. De tarde. Enquanto
dirigia numa marcha poente de volta do trabalho, numa dessas, com os olhos
apertados de cansaço e transbordamento - sorri. O entardecer me convidava.
Os finais, de qualquer coisa, deveriam carregar o brilho em tom de
passagem que o sol anuncia todos os dias antes de se deitar. Pelo entendimento
do que virá a seguir. Aquela certeza de que todo ir, carrega um vir de
recompensa. Pelo movimento natural do existir. Poético. Mas que concorre com
a realidade.
Os 39 me escapam neste ano. Estou naquele instante - também poente -
de revisitar outras paisagens com um misto de alegria e despedida. Sem
contabilizar o que não foi. Mas completando com tudo que poderá ser um dia.
De tempos em tempos, me recolho. E deixo. O entardecer sabe ser
exatamente o que é: incontrolável. A juventude faz com que a gente tenha
sempre aquela visão de dias de sol forte, claridade absoluta e urgência - que se
perdem dos detalhes.
A gente nunca sabe o que pensar da vida antes da hora. É certeza que
despenca, medo que perde a voz. Sentimento que transforma. Há muita vida nos
detalhes. Na delicadeza que acabamos ganhando com os anos. Por pura
sensatez. Pelo tanto de um tudo que faz força para nascer, perdemos a coragem
de lutar contra.
Esbarro nos detalhes. Num corriqueiro folhear de páginas de livro. O meu.
Num sorriso como aquele de tarde que cai, em que meus olhos marejados
acompanhavam o sol desaparecer no horizonte, estremeço. De passagem.
Levando o que sobra e trazendo o que falta. Como tudo. Sempre. Se põe para
amanhecer depois, lentamente. Tantas vezes, muitas.
27
E novamente.
Flavia Bataglia
Flavia é biomédica e professora de yoga. Faz da
escrita uma maneira de não perder a capacidade de se
encantar com a vida.
Instagram: @Dissolvendo_pensamentos
28
Figurinhas
Diogo Tadeu Silveira
29
como a mola propulsora da Transamazônica. A rodovia, de fato, proporcionou
êxito: para garimpeiros, grileiros e transportadores de madeira ilegal, que tiveram
o acesso facilitado pela obra secular do general-mola.
Mas a figurinha que mais chama a atenção nesse álbum da época da
ditadura é a de uma pessoa depositando uma cédula na urna acompanhada da
legenda o voto é direito assegurado aos cidadãos de escolher seus governantes
nos países livres e democráticos. Seria trágico, se não fosse cômico.
30
Teu nome
Mariana Mendes
31
Amigas
Hillary Sthefany
32
- Ninguém sabe exatamente. Alguns têm uma inclinação maior que outros
para a desgraça.
- Então faço parte desses alguns?
- Você sabe a resposta...
E assim se manteve a noite. Nada de especial acontecia a não ser
determinadas visitas. As mais conhecidas eram a Tristeza e a Apatia, pois eram
minhas melhores amigas há anos. Praticamente todos os dias uma das duas me
visitava. Quando as duas se encontravam, a conversa durava a noite toda, com
cada uma contando suas frustrações do dia e da minha vida. Era engraçado
como a Tristeza sempre ia embora mais cedo e me deixava com a Apatia. Ela
alegava que meus sentimentos atuais eram quase um Vazio e que não via quase
nada dela em mim, justamente por eu não ficar me importando com coisas
pequenas.
Sempre após sua saída, a Apatia pensava em chamar a Felicidade, ou ao
menos tentar chamar, mesmo sabendo que ela não desejava estar aqui. Esta
última sempre teve um pé atrás comigo, sempre se manteve distante, mesmo eu
perguntando o porquê das coisas. Ao mesmo tempo que era sorridente e me
fazia sentir bem, anunciava meu próximo destino:
- Alguns dizem que não existo plenamente, mas aqui estou agora. Todos
os humanos parecem carentes vindo clamar por mim nos piores momentos... Eu
não entendo vocês. Eu não posso ficar para sempre! Tenho outros lugares para
visitar e se permanecer aqui por muito tempo, o Tédio toma conta de mim. Nunca
fui amiga dele nem serei. Por isso, está na hora. Voltarei, mas não em breve.
Não deixe que o Desespero chegue muito perto, a companhia dele é sua maior
inimiga.
A Raiva também se aproximava às vezes. Nunca ficava muito distante ou
próxima demais. Ela era o que eu chamava de doença. Não queria tê-la por
perto, mas em certos momentos isso era inevitável e tentava tomar conta de mim
(e algumas poucas vezes conseguia).
Nesse mesmo dia, eu e Apatia fomos dormir às 2h. Quando acordei às
7h, ela já olhava pela janela, o mesmo que eu fazia há anos, e dizia:
- É de manhã e as pessoas se levantarão, assim como você, e farão as
mesmas coisas, sem perguntar nada, sem questionar nada. São como robôs.
33
- Sim, fazemos isso, você sabe. Não há escolha e a Liberdade não existe.
É um mito. Você alguma vez a viu por aí?
- Não. Ouvi apenas relatos. Mas ela de fato não existe. Alguns apenas
acreditam e se iludem para se sentirem melhores ou menos domesticados pelo
sistema.
- Sim, sim... eu já imaginava. Por muito tempo acreditei nela e fui atrás,
mas só esbarrei com a Tristeza.
Às vezes, quando raramente saía, duas visitas me surpreendiam: A
Euforia e a Felicidade. Dependendo do dia, elas chegavam de mãos dadas,
pulando e gritando ou simplesmente caminhando lentamente ao meu lado. Com
isso, sentia-me viva mesmo que por pouco tempo ao ouvir suas vozes próximas
a mim.
Nesses momentos, eu sequer via a Apatia, mas sabia que bastava eu
abrir a porta de casa e entrar em meu quarto para encontrá-la, pois era como
sempre acontecia e eu apreciava isso.
Apesar de tudo, eu tinha orgulho de mim. Era preciso ser forte para
aguentar os diálogos rotineiros dela e quase ser esquecida pela Felicidade e sua
amiga Euforia.
É somente a vida fazendo seu papel de sempre e eu fazendo meu papel
de...
O quê? Eu ainda não descobri.
Hillary Sthefany
Hillary Sthefany da Costa Martins, tem 24 anos é
brasileira do estado do Pará (terra do açaí), amo escrever
sobre temas diversos, que vão desde a ficção, como terror
e romance, até temas mais cotidianos, o qual chama de
“meus devaneios vitais”, é bilíngue e possui sonhos
infinitos. Formada em Letras - Língua Portuguesa e
Serviços Jurídicos e Notariais. Começou a escrever por
volta de 7 anos de idade, ama a literatura e gosta de
estudar disciplinas como: física, geografia, administração
e até matemática.
34
POESIAS
35
Amo-te
Carol Demoliner
Vou gritar
Bater
Deslizar
Arrombar
Machucar
Cuspir
Sangrar
Esperar
Cansar
Continuar
36
Só vou embora quando a polícia chegar.
A-mor-te.
Carol Demoliner
Carol Demoliner (1995), é gaúcha natural de Erechim e
formanda em Psicologia. Amante de todas as formas de arte que
expressam a vida genuinamente, sempre usou das palavras
escritas e outras expressões artísticas para alcançar o que
estava na brecha de saída de seu ser. Inspirada pelo céu e pela
terra, pela vida e pela morte, começos, meios e fins, a autora
Poema: traduz seu olhar do mundo através do lírico, passeando pela
poesia, poemas, prosa poética e crônicas.
caroldemoliner@hotmail.com
Pássaro Urbano - Paulo Brás
37
Vírus do amor
38
Sentimentos passados
Você convive com uma pessoa por vários anos achando que o
relacionamento já está eternizado, pois pelo menos você se entregou
completamente tomando todo o devido cuidado, e de repente você toma um forte
baque, algo que não era esperado, a pessoa que lhe chamava tanto de meu
amor lhe causa uma grande dor dizendo que está tudo acabado, e com isso você
adquire uma tristeza muito grande e igualmente adquire uma imensa raiva no
coração, e começa uma enorme destruição das antigas lembranças começando
por aquele belo e antigo retrato. Pois é simplesmente a sua emoção entrando
em estado de erupção, fazendo com que você nunca mais busque por
sentimentos passados, pequeno coração despedaçado. Achou que estava
vivendo uma maravilha tipo rei e rainha, mas estava intensamente equivocado,
ou melhor dizendo: totalmente enganado. Por achar que a vida real é similar a
filmes da Disney que sempre terminam com um final feliz, e como sempre tudo
tão perfeito e extremamente encantado, coração danificado. Se entregou por
inteiro, sempre tratou o seu amor com todo o respeito e no final de tudo nem
recebeu um obrigado, é aí que você fica fervo. Não trata mais tudo aquilo que
construíram juntos com aquele devido respeito e já sai jogando tudo para todos
os lados, você está enfurecido e não pensa mais direito. Momentos
inesquecíveis infelizmente se tornaram em momentos conturbados, você sai
destruindo tudo sem deixar nada inteiro. Principalmente aquela antiga foto do
primeiro beijo que lhe deixava muito feliz e emocionado, você destrói com tudo
mesmo com receio. Pois é simplesmente a sua emoção entrando em estado de
erupção, fazendo com que você nunca mais busque por sentimentos passados.
39
Obra pública
Mariana Mendes
Meu corpo
Não é público
Ou é e a gente nem sabe mais
É tanto fala daqui
Encosta ali
E é o meu
Nem em obra pública mexem
Mas no corpo da mulher
Já vão dizendo que as novinhas tão sensacional
As novinhas têm idade pra ser tua irmã
Tua filha
Mas tu que é homem
E abismado nasceu de mulher
Que se pudesse nascia de homem
Mas sem tanto afeto
Porque isso é coisa de mulherzinha
Mas nunca entendi bem
Porque usam que nasceram de mulher
Que tem até irmã
Se assedia irmã,
Prima,
Tia
Sei que não é o certo
Mas se não tem respeito
A única opção que resta é medo
E infelizmente, espero que tenhas medo.
40
Mariana Mendes- LATINA
41
O céu chora na solidão da noite
J.D.Ortega
O Observador
J.D.Ortega
42
As que mexem no telefone distraídas, sem prestar a devida atenção a realidade
que vive talvez alegre em sua volta
As que ainda trabalham, e enxugam suas faces do líquido salgado que dão a
esperança da sobrevivência
E as que pedem o pão sentadas na calçada sem a certeza de mais nada, a não
ser da fome.
Simplesmente o ônibus para
Olho para frente e vejo as pessoas se cruzarem, todas perdidas nos
pensamentos, nos pesares, nos afazeres, nas necessidades, elas se
atravessam, mas parece que nenhuma está lá.
Perdidas em suas realidades estão todas a caminhar sem notar que aqui de
dentro do ônibus há alguém que as observa.
É como olhar de uma galáxia às outras.
Todas com seus sóis, seus planetas, suas luas e todo o resto
Todas a seguir seu caminho diante da vastidão incalculável do universo
De meu universo não sei se o que vejo é real, são tantos outros que passam
aqui na minha frente, que já não me lembro de nenhum deles.
E todos sem notar minha presença e sem saber como sou.
Acho que nem mesmo eu sei como sou, já que meu universo é perdidamente
desconhecido
Então estão todos lá sem saber como são, pois para mísera alma que vagueia
em sua galáxia até mesmo o seu limite calculável de massa parece
perdidamente profundo.
Percebo diante da minha galáxia distante tentando lembrar das outras que
passavam, que não há nada mais irreal do que observar as pessoas nas ruas.
Então chego no ponto de casa e é hora de descer.
43
J.D.Ortega
J.D.Ortega nasceu em Taubaté - SP e caminhou pelas
artes desde os seus 11 anos de idade, começando com Teatro
logo depois a dança, música, grafite, desenhos e pinturas.
Aos seus 18 anos quando nasceu sua paixão pela
leitura começou a escrever cartas, poesias, contos e crônicas.
Hoje aos 21 anos tem dedicado a maior parte do tempo ao seu
romance, e sua antologia poética "Raízes do Sentimento".
44
Teu sorriso, meu abrigo
Ubertam Santos
As Carolinas!
Ubertam Santos
45
Ubertam Santos
Ubertam Santos, nascido em Canoas/RS em
06/01/1987, escrevo desde os 8 anos, lançou seu
primeiro livro chamado "Rabiscos" em 2019. Participou
de 6 coletâneas.
46
Tangerinas na janela
Nick Manfrei
Ela, então, percebeu que eu os encarava e sorriu e acenou de volta para mim,
mas não consegui fazer nada.
Apenas olhava e andava e passava por eles.
Algo tão simples, mas que apenas poucas pessoas tem o prazer de viver.
Será que algum dia encontrarei alguém com quem dividir uma tangerina em
nossa sacada enquanto olhamos a vida passar?
47
Borboletas pela vida
Nick Manfrei
Eu corria e sorria e sentia a leve pressão de suas patinhas a cada passo que
dava.
Às vezes tentava olhar de canto de olho para roubar uma pequena visão
atravessada de sua beleza.
Quando terminei e comecei a fazer meu caminho de volta para casa, ela
simplesmente levantou voo e voltou de onde veio.
Eu apenas a olhava extasiada.
Encantada com sua simplicidade despreocupada.
48
Talvez realmente não seja para ser
Nick Manfrei
Nick Manfrei
Nick Manfrei (22), cineasta, cantora/compositora e
escritora é apaixonada pela poesia das sutilezas da vida. Gosta
de fazer caminhadas pelo seu bairro escutando suas músicas
favoritas, conhecer cafés novos sempre que possível e ficar
acordada até tarde da noite imaginando diferentes cenários em
sua cabeça (transformando-os em histórias).
Nasceu em São Paulo (SP), onde vive atualmente com o
pai, o irmão e duas cachorrinhas, mas cresceu em Joinville
(SC), onde tem um lugar reservado em seu coração.
Perfil do instagram: @nickmanfrei
49
Encerrando ciclos
Edione B. Valente
Nessa vida,
nem sempre vamos caminhar juntos,
e nesse finito tempo,
nem sempre vamos ter alguém ao nosso lado.
Precisamos entender que:
relacionamentos acabam,
ciclos se rompem
e amizades se desfazem.
E que tudo bem,
tudo bem...
A questão está em aceitar,
e sair sem magoas,
não deferindo rancor ou ingratidão.
Normalizem encerrar os ciclos,
mas, quebrar sem se quebrar.
Edione B. Valente
Edione B. Valente, natural de Monte Alegre do Piauí
- PI, acadêmico de Gestão Ambiental no Instituto Federal
do Piauí - Campus Corrente, Fotógrafo Profissional e
apaixonado pela natureza.
50
Inverno
Glenda Fabíola
Em seu tempo
Uma sensação de pouso
Na pele desnuda
Do tocar profundo
O inverno chegando
O sol se indo
E o sapo cantando
O guarda-chuva aberto
Um teto descoberto
Um dia de chuva.
51
Parada
Glenda Fabíola
52
Ausência
Glenda Fabíola
53
Não havia sentido sobre o que fazia.
Pronto!
A flor se ia,
Murcha, vazia.
Glenda Fabíola
Glenda Fabíola Trindade de Oliveira, Idade:22 anos;
Cidade: Nascida em Castanhal Pará/ Brasil.
Instagram: gwentrindade_12
54
POEMAS
55
Etimologia
Passei a vida toda sem saber que o pão francês não havia sido inventado na
França
que o que chamamos de sangue de barata não é realmente sangue
que aquela mesinha de plástico que vem na caixa de pizza serve para não
deixar a tampa de papelão grudar no queijo
que a ordem dos nomes dos times no placar do jogo na televisão indica os
lados dos gols
que coitado vem de coito e por que? Essa não me fez sentido até agora.
Passei a vida toda sem saber que onde cai um figo, nasce outro
que a dama da noite é um cipó e que ela chama dama da noite porque ela
morre de manhã
eu e muitas outras mulheres das quais o sonífero acabou
56
Passei a vida toda sem saber que um sonho
multidimensional com uma década de aventura
só dura três minutos
Passei a vida toda sem notar que tem uma estrela dentro da maçã
a estrela de Eva que não brilha no céu, que foi condenada,
quem não tem estátua e para a qual não fazemos uma reverência
ao entrar
e sair da igreja.
Mitologia
Letícia Félix Fraga
57
Poemas não são mais para serem cantados
por rouxinóis em prenúncio a estações;
faz tempo que não vejo um.
58
Hoje os poetas tiram férias.
Substantivos coletivos
Letícia Félix Fraga
as orquídeas, um elenco
59
as rosas, um romanceiro
as margaridas, uma tipografia
as nenúfares, uma impressão
60
Pássaro urbano
Paulo Brás
Vai, pássaro urbano
Viver na enorme sociedade
Pousar nos fios elétricos
Transitar pela cidade
Não mais viaja no verão
Prefere o frio da tempestade
Adaptou-se à rotina
Abriu mão da liberdade
Seu ninho, os prédios de apartamentos
O cimento, o dinheiro, a comodidade
Quanto mais vale na mão
Por um instante:
Saber que a vida é efêmera
Ou um produto insignificante?
61
Ofício
Paulo Brás
Sou só mais um poeta
Entre muitos, entre tortos
Entre loucos, entre ingênuos
Românticos, niilistas
Boêmios,
Os mortos, os vivos
Os conhecidos e injustiçados
Escrevo por algum motivo
Não para ter significado
Sou mais um
Sou divino
Sou profano
Admirado ou crucificado
Eu sei da minha sina
Pois não é simples alguém dizer
Que é poeta
Como quem se orgulha
Ao dizer que estuda
Medicina.
Paulo Brás
Paulo Brás nasceu em 2000, é cantor-compositor, poeta e ator de
Itaitinga (CE). Começou sua vida artística em 2014, na música e no
teatro. Publicou seu primeiro livro Filhos da Vida e Outros Poemas
em 2021, e seu primeiro EP Autorretrato de Um Quadro Em Branco
em 2022.
62
Aconchego de Vó
Cassiano Figueiredo Pereira
63
Autodidata
Lucas Lourenço
Sem chão
Lucas Lourenço
64
Cheio de pensamentos contrários
É longo o caminho
Mas o resultado é certo
No chão caiu
E ficou sem chão.
Lucas Lourenço
Lucas Lourenço Barbosa Gonçalves mora em Cezarina- (GO).
Graduado em Licenciatura Plena em Física pela Escola de
Formação de Professores e Humanidades da Pontifícia
Universidade Católica de Goiás. Quando não está mergulhado na
física e na matemática, desenha e escreve alguns poemas. Decidiu
retirar os poemas do baú e agora começou a publicar. Acredita que
a leitura é a porta para outros universos. É editor chefe da Revista
Artes do Multiverso.
65
Felicidade
Ilmar Ribeiro da Silva
Fe-li-ci-da-de...Sim!!!
É acordar todos os dias na nossa confortável caminha.
Deliciar-se no aconchegante chuveirinho.
Tomar o nosso delicioso cafezinho, com os quitutes matinais.
Fazer nossas orações de agradecimento a DEUS pelo dia que inicia.
Olhar para o lindo e infindável céu azulado, escutando a sinfonia dos pássaros
E assistindo, do vidro da varanda, a alegria dos cães passeando com seus
donos.
Saber que temos uma família que amamos muito e nos ama também
E amadas amigas que estão sempre nos telefonando ou enviando belas
mensagens pelo celular
Quisera que todas as pessoas fossem felizes...
São momentos, todos nós passamos por desafios.
Que saibamos viver o dia de hoje plenamente e aproveitar as oportunidades que
Deus nos dá.
66
Amor gélido
Lincoln Silva
E agora
Você será fria para sempre.
67
Me perdoe, por favor
Por não chorar
Mas não consigo, pois não tenho lágrimas, apenas frio.
Lincoln Silva
Nascido num bairro pobre do litoral de São Paulo,
Lincoln começou a escrever com 11 anos motivado por sua
professora de português e desde então não parou. Tendo
escrito inúmeros poemas e até um livro.
Insta: lincolnsilva545
68
Anatomia Botânica
Lavínia Vianini
Ouví-los
69
na troca de olhares em silêncio e no contemplar de um dia bonito.
A luz crepuscular diz tanto sem o uso do vocábulo
que preciso recorrer a fim de fazer do verbo, carne.
“Livro”
Lavínia Vianini
70
Sacramento
Lavínia Vianini
Sacramento em paroxítona
o seu verbo nos meus mares
como hoje
sempre
a primeira vez.
Lavínia Vianini
Lavínia Vianini é poeta, tradutora e professora.
Bacharel em Letras - Português/Inglês pela UFRJ, já
teve poemas em língua inglesa publicados em algumas
revistas internacionais. Em 2022 fundou, em conjunto
com a também poeta Letícia Felix, a revista "Linha do
Trópico". Nas horas vagas escreve, assiste filmes e
experimenta com desenhos e bordados.
71
Barco a Belém
Valério Maronni Salles
72
Valério Maronni Salles
@valeriomaronni é autor do livro “O Menino Contador”
(2022, produção independente) disponível na Amazon e
criador do blog “julianavrsempoluicao”. Ele é natural de
Muriaé-MG, tem 61 anos, é engenheiro e professor. Gosta de
literatura, ciclismo, ferromodelismo e antiguidades. Avô do
Mateus e vem aí o Alexandre.
Instagram: https://www.instagram.com/valeriomaronni
73
Baby blues - Para Ana Paula
Fábio Martins
Sim, eu ouço
a madrugada
baby,
eu te faço
uma serenata
o gato me acompanha
enquanto escorro
verbos para você
Baby, eu faço um blues
para nunca mais você
me esquecer
Linda, linda, linda
eu te faço um blues
na noite de BH
para meu coração te rasgar
e no solo da noite
e no sono da vida
e no raiar do sonho
eu me declaro a você
baby
Eu sei
que te amar
é renascer
é viver em alegria
é beber em eterna poesia.
74
A noite dos dinossauros
Fábio Martins
Dinossauros se encontram
na madrugada de BH
História para contar
Lembranças de mudanças
Tomaram porrada da vida
Caíram e se levantaram
São sobreviventes
de outras correntes
Sabem levar a vida
na noite interminável
A lua
é bela companhia
para noites de bebedeira
e rua fria
Dinossauros se encontram
para celebrar
em BH
Blues rola no ar
são anos de histórias a contar
e tantas outras ficarão para lembrar
O futuro a Deus pertence
diz o ditado popular
e pra pular os dias
dinossauros se encontram
na madrugada de BH.
75
Manifesto anti-heroico poético
Fábio Martins
Me embebedarei de vícios
neste final de ano
não serei tolo
De tolos já chegam
todos os críticos
sifilíticos
que beijam solícitos
as mãos dos que
exploram, manobram
usurpam
a vida
Me jogarei para ela
como quem se joga
do precipício
e olharei para o futuro
como quem enxerga
a salvação
Chega de toda a comiseração
quero a poesia
quero a revolução
quero a explosão
de vida
ao invés da mesmice
da cretinice
da face
desencontrada
e desacreditada
da humanidade.
76
Fábio Martins
Fábio Martins é poeta, contista e cronista, nasceu
em Santos – SP, mas reside há dez anos em BH – MG.
É professor de Língua Portuguesa do EFAF e EM.
Participou de diversas coletâneas poéticas e é autor de
livros de poemas sendo o mais recente Miscelânea,
lançado em 2022 pela Editora Libertinagem. Instagram:
@poetafabiomartins
77
(INSTINTO)
Daiana Soares de Oliveira
Me perco no cais das suas inconstâncias
Fragmentadas no soar de falsas esperanças
Sigo te observando no inseguro porto
E no vai e vem do mar
Percebo seu olhar distante
Escapando toda e qualquer expectativa
Cujo teu retorno desfeito
Como areia soprada no vento
Tece a seguinte afirmação:
Existem amores
Que permanecerão congelados no tempo
Que nem a força do vento.
Impulsiona o que a falta de pulso
Pulsa para prováveis retornos.
78
A árvore e eu
Maria José Guimarães
79
Pássaros ao céu
Janice Maria Walter
80
Sonho breve
Cláudio Loes
Cláudio Loes
Cláudio Loes , nasceu em Blumenau/SC, reside,
atualmente, em Francisco Beltrão/PR. É filósofo, engenheiro
elétrico, especialista em Educação Ambiental, escritor, poeta e
articulista. Desenvolveu e coordena o projeto Aqui Livros para
incentivar a leitura pela socialização e circulação dos livros. É
Associado do Centro de Letras do Paraná; é Associado
Correspondente da Academia Paranaense da Poesia; é Membro
do Centro de Letras de Francisco Beltrão. Publicações: Sete
Ventos, 2018; Sonho, 2018; Informações básicas para fazer
compostagem e participou em diversas coletâneas. Publica
semanalmente poema no Jornal Opinião; colunista na Via Poiesis,
Jornal Folha do Sudoeste; colunista na Revista Educação
Ambiental em Ação.
Site pessoal: http://www.claudioloes.religar.net
Instagram: https://www.instagram.com/loesclaudio/
Cláudio Loes
81
Cláudio Loes , nasceu em Blumenau/SC, reside,
atualmente, em Francisco Beltrão/PR. É filósofo, engenheiro
elétrico, especialista em Educação Ambiental, escritor, poeta e
Ensaio sobre nós 2
Tim Soares
Todos os cães na rua sabem
Sabem que temos um pé na loucura
Sabem que temos sede de vida
Sede de farra
Sede de sexo
Eles sabem que constantemente mordemos
Mais do que podemos mastigar
Eles sabem que passamos do ponto
Que nos embriagamos
E que somos obscenos
Eles sabem e comentam, fofocam, cochicham
“Lá vão aqueles dois”
Euforicamente improváveis, desvairados
E com seus fantasmas de estimação.
Mini épico
Tim Soares
O que eu almejo da vida são as exclamações. Dessas grandes, escritas em
negrito e que antecedem um breve instante de silêncio.
Depois eu quero as interrogações. É desinteressante saber do todo e ainda
tenho tantos cenários para explorar e tantas almas para lamber. É tão excitante
não saber de nada as vezes
Também quero os instantes que cabem dentro das aspas, dos parênteses, dos
colchetes.
Quero as reticências que deixam no ar que o meu próximo capítulo poderá ser
um épico escrito por Homero. Com dragões, sereias mortais e naufrágio. Há
tantas apoteoses para me desmembrar das idades. Eu quero as catarses, gnosis
e a comunhão nonsense e inesperada.
E aí e somente aí, receber de braços abertos o meu ponto final.
82
Metáforas
Tim Soares
Tenho um tesão danado nas metáforas desaforadas
Dessas que leem Sêneca e Bretch
Metáforas promíscuas que cospem em deus
E proferem blasfêmias em latim
Eu gosto daquelas metáforas que me batem na cara
Daquelas metáforas que são a própria catarse
Daquelas que estão abertas p’ra todos, mas somente os raros podem entrar.
Tim Soares
Tim Soares é poeta, escritor, editor chefe do coletivo
Corvo Literário, revisor na editora Devaneios, criador de
desafios literários, autor do romance Os últimos dias de Rob
Sheppard e de sete livretos de poemas. Quando sobra
tempo, se dedica a música.
83
Irmão
Ester Pacheco Brandão
84
Em ondas...
Hellen Bravo
85
A ti, ouvinte de tantos momentos
Não peço nada, pois já me dá tudo que preciso
Só não me tire da proteção de teu manto
Siga emanando-me seus encantos
Me permita continuar ouvindo teu canto
E eu sei que
Em ondas tudo se vai
E em ondas tudo vem.
Hellen Bravo
Nascida em Presidente Prudente, em 03 de outubro de
1985, Hellen Bravo é atriz desde 2002, formada nos palcos e
com carreira solidificada na capital São Paulo, onde realizou
trabalhos em diferentes setores da área artística. Como
grande apreciadora das artes, está sempre se aventurando
em novos campos e agora se dedica a mergulhar totalmente
na escrita.
86
Percurso interior
Cleusa Piovesan
87
Ode à poesia
Cleusa Piovesan
88
Páginas esquecidas - Cleusa Piovesan
Soturna é saudade
Regada à solidão...
Choro, ninguém vê.
No silêncio da fria madrugada,
Dói-me saber que não voltarás;
Somos história que ninguém lê,
Perdida nas páginas dessa vida
Procurando um rumo, sem quê.
Arejar da mente...
Noites de seresta
Alumia no sertão.
Ao redor da fogueira... causos;
A viola chora dolente, consola;
Logo vem o contador espertão
Animar a festa... repouso diário.
A cantoria apaga triste solidão!
Solidão em paz,
Pores do sol...
Magia de graça!
Encantos do final do dia,
Princípio do fim das luzes,
O mistério a noite abraça.
Indício de fantasias no ar,
Eu, a contemplar na praça.
89
Cleusa Piovesan
Cleusa Piovesan nasceu em São João/PR m
12/05/1967. Mestra em Letras, poetisa e escritora de
vários gêneros literários, pesquisadora das relações de
gênero, feminismo e patriarcado. Pulicou 12 livros de
autoria própria, organizadora de dois livros com alunos, e
participação em 54 coletâneas, desde 2015. Instaram:
cleusa.piovesan
90
Engano, medo e mentira
Luan Machado
Amor
Luan Machado
91
Planeta flor
Luan Machado
Em nosso planeta
nos despimos de regras.
Nos apegamos
nos entregamos
e aproveitamos o enquanto.
Muito ao contrário
daquele maldito lugar chamado terra
onde humanos se prendem
mentem e se perdem na apatia...
No nosso planeta
o tempo passa devagar.
Ele admira o nosso amor
porque quer aprender a amar.
Luan Machado
Luan Machado de Oliveira Bento, nasceu no dia 7
de agosto de 2003, natural de Fortaleza – CE . Ex-atleta
amador e atualmente poeta.
92
Vida que brilha
Lara Machado
A vida segue.
Pode ir para frente.
Pode voltar.
Nem tudo depende da gente.
Somos humanos.
Acertamos.
Erramos.
Conseguimos.
Fracassamos.
Persistirmos?
Depende ....
Se valer o tempo.
Eu só sei que a vida brilha.
Brilho de sol.
Brilho de raio.
E ela continua?
Se o próximo segundo chegar ...
Eu
Lara Machado
93
Eu só penso nele.
E eu em mim nem acho.
Já que virei ele ...
Se ele se amar ...
Certamente me amará....
Se ele se odiar?
Coração quebrado.
Perspectivas apagadas.
Talvez eu volte a ser eu.
Não totalmente.
Sempre terá toques dele.
Não reclamo.
Tudo nele é ótimo!
Será que estou cega de amor?
Certamente não.
Ele é perfeito.
Seremos nada
Lara Machado
Lara Machado
Lara Machado é uma jovem escritora. Estuda Letras na
UNILAB. É colunista no site Entre Poetas e Poesias. Pretende
continuar espalhando suas letras para quem quiser ler.
94
Versos possíveis
Wallace Silveira Azambuja
Musa impassível
Wallace Silveira Azambuja
95
O estilo manifesto e já sabido;
96
Wallace Silveira Azambuja
Wallace Silveira Azambuja tem 27 anos, mora na
cidade de Porto Alegre (RS) e faz faculdade de Letras. Gosta
muito de ler e escrever, e a prática da leitura o levou a
escrever poemas. Possui apreço especial por escrever
sonetos, a maioria dos quais postados no Instagram pessoal.
97
Melancolia
Luiz Felipe de Lima
98
Quem contigo não falava, vira sua.
Admirador secreto vira predestino.
ABC do Pará
Luiz Felipe de Lima
99
Rio de bauxita em Trombetas
Sapoti e seringa saborosos em Alter do Chão,
Taperebá e tapioca, aí que delícia!
Urucum bem vermelho para tingir o corpo
Ver-o-peso com seus banhos de cheiro,
Whisky de graviola e limão
Xícara quentinha de café com pupunha
Yara, sua lenda e seu canto no Amazonas de reencontro,
Zarabatana munduruku que assopra bem longe.
100
Vaga-lumes
Cláudia Gomes
Vi-me arremessada
Ainda criança
A um lajedo cheio de sonhos e de alegrias
Dançando com os vaga-lumes
Adentrava-me nas noites quentes
Ao som do vento nas raras folhagens.
A poesia do Sertão
É memória
Histórias e estórias
em tempos de outrora
onde a glória da inocência
vivia em plena comunhão.
E nesse tempo tão efêmero
Na vida de todo vivente
Fui feliz como o rugido de um leão.
E veio o sonho: e a infância se fez presente.
E veio o acordar: a luta diária a me guiar.
Sendo ainda tão inocente
Espero à noite
Os vaga-lumes alcançar!
101
Teus lábios
Cláudia Gomes
Baianinha
Cláudia Gomes
102
Tinha sonhos a sonhar
Queria ser professora
Sem mesmo saber soletrar.
Destemida e corajosa
Foi lá a menina orgulhosa
Buscar o astuto aprender.
E foi nas salas de aula
Que aquela baiana arretada
Mostrou ao mundo
A alegria de vencer!
Cláudia Gomes
Natural de Salvador, BA, radicada em Feira de
Santana. Doutora em Educação. Mestra em Letras. É
professora, poeta e escritora. Publicou Catadora de Versos,
Condado Poético, A Mulher e a Rosa e outros poemas de
amor, Malu: a bailarina das águas, Emilinho: o pequeno
sonhador, Mulheres empoderadas também choram, A
menina do vestido amarelo, Leve Bagagem, Pespontos em
prosa e verso, Poeminhas na palma da mão, As tranças de
Bebel, Enleituramento do texto afro-brasileiro etc. Colunista
do Jornal Maria Quitéria.
103
Dependência emocional
Kailaynne Santtos
Um dia
Kailaynne Santtos
Talvez demore
um tempo,
mas um dia,
o meu coração
vai entender, o que você nos causou.
104
Kailaynne Santtos
Kailaynne L. Souza dos Santtos - santa Rosa de viterbo
(Sp). Estudande do curso superior da modalidade letras e
licenciatura, sempre amou português e se sente lisonjeada que
poderá trabalhar com isso como professora.
Desde os quatorze anos tem o hábito da leitura em sua
vida que foi o principal responsável por ter desenvolvido sua
habilidade em escrever.
Hoje publica seus poemas em sua página do instagram
(@cafeepoesi4), mas o seu maior sonho é publicar o seu livro
de romance.
105
(C)ALMA
Gabriel Alves de Souza
106
Gabriel Alves de Souza
Gabriel Alves de Souza, 22 anos, natural de Corrente/Piauí.
Poeta, cronista, cordelista, escritor, fotógrafo, acadêmico de
Pedagogia e coautor na coluna Memórias Narradas com Laís
Fernandes e Kelvys Louzeiro. O jovem também é Embaixador
pelo movimento internacional Juventude Lixo Zero Brasil, além
de militante estudantil pelo Movimento Correnteza e Rebele-
se. Gabriel é ciclista amador, ama viajar, acampar na
natureza, assistir series e ouvir diferentes estilos musicais. Ele
já foi publicado em diversas revistas, jornais, sites, coletâneas
e antologias pelo Brasil. Idealizador da Biblioteca Comunitária
Alegria no Saber e co-criador técnico do curso Escrita Nota Mil
– Premium.
Instagram: @vixi.gabriels
107
Na sombra dela
Narjarah Paz
Águas
Narjarah Paz
Narjarah Paz
Narjarah Paz, mas sou conhecida como Nanah Paz.
Tenho 43 anos, sou mulher com deficiência e sou militante
nas causas da pessoa com deficiência e na da proteção aos
animais. Moro em São Luís - Maranhão.
Escrever para mim é algo que me liberta e por muito
tempo deixei engavetado o sonho de ser escritora. Agora
começo a escrever uma nova página, perdendo a timidez em
partilhar minhas palavras em versos que tanto me libertam.
Espero que possam libertar de alguma forma todes que os
ler.
108
[Penumbra] Lumaréu
Henrique de Souza
Da penumbra ao lumaréu,
Assim como da melancolia a felicidade,
Não pude me opor a tentar novamente,
Não pude me por a correr de ti, eis me aqui.
109
[Ruína] Temporal atemporal
Henrique de Souza
110
Pegue carona,
Me acompanhe,
Me ame, nos ame, nos seja.
111
Henrique de Souza
Henrique de Souza, 21 anos, formando de
Engenharia Ambiental, nascido em Manaus (AM) e
residente em Capanema (PA), escritor, músico e
designer gráfico desde os 14 anos, com habilidades
em poesia contemporânea e versos livres, amante
de fotografias e artes digitais.
112
O Beijo de Judas
Breno Pitol Trager
113
O Thespian
Breno Pitol Trager
114
Queria escrever um poema de amor
Leonardo Fortes Vieira
115
Recomeços
Ana Paula Portes Thomé
Se passaram um dia, dois, três...
Uma semana,
Um mês,
Um ano.
E ainda assim não aprendi a
Conviver comigo mesma depois que você se foi.
Mas agora estou tentando ser minha melhor presença
Não quero dar minha própria sentença por erros seus.
Pois a cada dia tento sair da prisão onde minha
cabeça se encontra.
E espero que daqui um mês,
Um ano,
Eu me ame e me aceite...
como um dia eu nunca consegui
e achei que você faria isso por
mim.
Eu quero me amar do jeito que um dia eu achei que te amava.
Velhos tempos
Ana Paula Portes Thomé
Quando pequena,
Meu sonho era ter o melhor brinquedo da prateleira,
Era poder brincar na rua até tarde, sem hora definida.
Meu maior desejo? Era conquistar o mundo! Da forma mais colorida e alegre
Talvez quisesse ser um herói como o meu pai
E forte como minha mãe.
Sem deixar que alguém me contrariasse ou dissesse o que eu era.
E eu queria saber, o que mudou?
Algo que alguém me falou?
116
Ou foi apenas o que a dor me ensinou?
Não tenho mais com quem brincar até tarde,
Os brinquedos da prateleira não têm mais graça e estão empoeirados.
Ainda quero conquistar o mundo, mas de uma maneira mais cinza e com
palavras que adentram a alma.
Duvidar de mim mesma já virou rotina,
Me tornei aquilo que as pessoas dizem que eu sou.
Percebi que nossos pais não são as pessoas mais fortes do mundo, nem
mesmo nossos heróis.
Eles são como nós.
E acabamos enxergando o mundo da mesma maneira que eles.
Quem dera eu não ter crescido
Quem dera eu ainda enxergar o mundo colorido.
117
Além
Elaine Perez
Tensão do mar em
rubro entardecer do tempo
pobre rosa a perder o viço no lamento de ontem
tensão da mirada em
labaredas de mágoas secas
vasto oceano a derramar-se no olhar escarlate
feitiço do ser rastejante
corado amanhecer do além
além mar.
Elaine Perez
Elaine Perez, nascida em 1965, Sorocaba, SP. diretora de
escola aposentada, escritora, poeta e compositora sorocabana.
Escreveu as obras: Caminhos Poéticos de uma educadora, Estudo
poético da Mediunidade, No cotidiano das creches - A infância
sorocabana revelada: um estudo sobre as proteções negociadas
com a violência, Medicalização e educação: o entorpecimento da
infância no cotidiano escolar, A pedra dos meus olhos, Artmada e
Na rede eu conto. Participou de antologias de poesia e contos. É
integrante do Grupo o Ato de escrever, do Clube do Contista/ Casa
do Contista, do Coletivo Escreviventes e participa das oficinas de
Mell Renault.
https://instagram.com/elaineperezfo?r=nametag
118
Eu já fui jovem
Wagner Planas
Eu já fui jovem,
De grandes aventuras,
De olhar para o céu,
De sobrevoar grandes alturas.
Eu já fui um jovem,
Já fui do norte ao Sul,
Já tive a liberdade,
De voar no céu azul.
Hoje,
Sou algo ultrapassado,
Deixado no passado,
Como objeto em uma prateleira.
Eu já fui jovem,
Hoje eu só quero paz,
Um dia a mais,
Um sacrifício a se fazer...
Eu já fui um jovem,
E hoje sou,
Apenas a sucata,
De um velho avião...
119
Velho Jardineiro
Wagner Planas
Onde está?
O Velho Jardineiro,
Que cuidou deste jardim,
Desde o primeiro janeiro,
Que este jardim foi criado.
120
Para todo sempre
Wagner Planas
O sol,
Que agora me aquece,
Está tão quente,
Como o calor,
De estar em seus braços.
O Sabor,
Do suco mais refrescante,
Não apaga de meus lábios,
O Sabor de seus beijos.
121
Wagner Planas
Wagner Planas ( por ele mesmo) - Nascido em 28 de
Maio de 1972, na Capital Paulista, estado de São Paulo, ex-
membro da UBE- União Brasileira de Escritores e atual
membro da LITERARTE – Associação Internacional de
Escritores e Artistas. Autor de mais de 60 livros entre temas
como poesias, romances, contos, peças de teatro, poemas,
mensagens, Haicai, entre outros temas, por ele mesmo ou
através de seus Heterônimos como: Wilson Silva
(Heterônimo), Creone Porfírio (Heterônimo), Daniel
Fernandes (Heterônimo), A.J.dos Santos (Heterônimo),
J.L.Gomes (Heterônimo), Icabode (Heterônimo),
Benedictus Konstantinus (Heterônimo), Chesco
(Heterônimo), Articus da Persida (Heterônimo), Horando
Almeida Prado (Heterônimo).
https://instagram.com/escritorwagnerplanas?igshid=YmMy
MTA2M2Y=
e-mail:escritorwagnerplanas@gmail.com
122
“Mar”
Alexandre Cruz de Oliveira
“Eu”
Alexandre Cruz de Oliveira
123
Mergulhei na vida para renascer
O eu que morreu levou tudo o que foi
Deixou para trás um vazio que não dói
Porque o nada que fica pode tornar mudo
O grito do eu que morreu com tudo.
124
Milenar
Izabel da Rosa
.
Sou neta de Tibiriçá,
tenho vento nos pés,
curiosidade nos olhos,
e a ansiedade como guia.
125
esquece e se apega a coisas que são voláteis demais.
Izabel da Rosa
Izabel da Rosa é poeta e escritora nascida no Rio
Grande do Sul, mãe de dois filhos, vive em Curitiba.
Participou de várias antologias de poesias e de crônicas.
Publicou livros baseados em memórias de famílias.
Organizou a antologia TOQUE DE POESIA à venda no site
Amazon, ou diretamente no instagram, com a autora.
Escreve no site www.medium.com/@izabelrc1
Está preparando o lançamento do livro de Crônicas
Viagens e Emoçoes – Crônicas Divertidas e Gafes
Memoráveis.
Está escrevendo o livro Um oceano entre minha mãe
e eu, uma história emocionante, baseada em fatos reais, a
ser lançado em breve.
126
Como sempre
Sandy Lauany
127
De que minhas mãos possam falhar,
De que meus ossos não possam
Conseguir segurar a caneta.
Como eu disse, isso ainda vai me matar.
O poeta morre daquilo que escreve,
E minha morte terá inúmeras causas.
Em você
Sandy Lauany
Tua pele me lembra as nuvens,
Tem o frescor do alvorecer
Com toque de neblina.
Teus olhos me lembram as folhas
Das árvores por onde o vento corre,
Balançando o seu cabelo e trazendo
O seu cheiro até mim.
O que me faz suspirar de tranquilidade,
Apesar das tormentas,
Sempre posso encontrar calmaria
Em você, meu amanhecer.
Sandy Lauany
Paraense, nascida em setembro de 2001. Estudante de
Pedagogia pela Universidade Federal do Pará. Aos 15 anos,
quando ainda estudava no ensino médio, teve contato com a
poesia através de um amigo e se sentiu desafiada a também
escrever. A partir daquele momento, as folhas vazias de seu
caderno foram preenchidas por poesias. Hoje, ela tem na
poesia a forma mais bela de externar todos os seus
sentimentos que fluem de dentro de si como um oceano
infinito.
128
Amor latente
Joseani Vieira
Aprisionado
ele olha de dentro
e enxerga o mundo
através do meu olhar
Fantasia
que reside em mim
todas as belezas
Sinto muito
esse amor inevitável
cativo e podado
calado e subjugado!
129
Lamento por mim
que só sei amar errado.
Minhas estações
Joseani Vieira
Sustento-me de tempestades
recomponho-me na brisa noturna
assobio meu canto em cruvianas
de cabeleiras vastas
Redemoinho
em poeiras de ilusões
sou força
movimento de natureza única.
Criatura miscigenada
eu grito
Um vendaval de sonhos!
130
Coisas da vida
Joseani Vieira
131
Felicite-se diariamente por renascer
Pois nossos problemas
De um jeito ou de outro
Irão se resolver.
Joseani Vieira
Joseani Vieira, nasceu no Rio de Janeiro e vivo
em Roraima há muito tempo. É pedagoga, publicitária e
ama a literatura. Começou a escrever aos 11 anos prosa
e poesias. Em 2021 começou a participar de concursos
e de seletivos para publicação de minha escrita. É
coautora dos livros Mostra Picuá, Pandemia: poemas,
contos e microcontos, Poesificar... Verbo de
Inspiração, Toque de Poesia e Natal sempre Natal vol.
II.
132
Vó é mãe duas vezes
Davi Carneiro
Em quantas quedas me deparei nessa vida ao cair no gozo da solidão por não
está sentindo mais sua pele sedosa e sua voz áspera de preocupação e amor.
Não seria eu de fato se não te ama-se de verdade, porque de certo modo, você
me ensinou a viver a cada dia.
Desconecto-me todo em saber que essa dor está tão longe dos meus olhos e
que por fim sei que ela é uma conclusão da vida.
Porque a vida que ela carrega é de vários anos e vivências, porque ela me viu
caminhar pela primeira vez, sorrir pela primeira vez e rir para o mundo ao meu
redor, ela viu o quanto cresci e mudei, e mesmo assim nunca me deixou de amar,
porque também sou tudo para ela. Vó é mãe duas vezes.
Davi Carneiro
Davi Carneiro, natural da cidade de Corrente -
Piauí e atualmente mora em Curitiba - Paraná, tem
24 anos, amante da arte e da poesia.
Gosta de expressar os meus sentimentos
através daquilo que sente em cada linha de verso
vivido. Esse sou eu, um ser humano aprendendo a
viver cada dia a mais em um mundo no qual remete
arte para todos os lados.
133
Filha de Eros
Hillary Sthefany
Blue WiSky
Hillary Sthefany
Em um mundo sujo
Sentia-me morto
Jogado
Residente do inferno
Sem expetativas
A vida em ruínas
Chamas
Queimando as entranhas
Sonhava o céu azul
Localizado no Sul
Encontrava o Norte
134
Fenecendo a sorte
Mas nunca fora fácil
Para um humano débil,
Inútil
Em terra hostil...
Aqui os sonhos não tem vez
1
2
3
(embriaguez)
Acorrenta-me eternamente à invalidez.
Hillary Sthefany
Hillary Sthefany da Costa Martins, tem 24 anos é
brasileira do estado do Pará (terra do açaí), amo escrever
sobre temas diversos, que vão desde a ficção, como terror
e romance, até temas mais cotidianos, o qual chama de
“meus devaneios vitais”, é bilíngue e possui sonhos
infinitos. Formada em Letras - Língua Portuguesa e
Serviços Jurídicos e Notariais. Começou a escrever por
volta de 7 anos de idade, ama a literatura e gosta de
estudar disciplinas como: física, geografia, administração
e até matemática.
135
CONTOS
136
O que pode ser feito antes da guerra?
Marcia Elisia Matos Aguiar
Talvez esta carta seja a última coisa que eu faça. Ainda não está decidido!
A cada movimento… TICK..... TICK..... TICK.…. TICK….. TICK…..
O girar dos ponteiros de um relógio entra na confusão dos meus pensamentos
e... tick.... tick.... tick.... tick.... definindo a cronometragem para o fim da
turbulência… tick… tick… tick… [CLICK!] a arma engatilhada faz meu corpo ter
certeza do que me espera.
Só um curto período de tempo para a bomba se ativar dentro campo de batalha:
o que foi perdido, já foi.
Um silêncio horrível penetra o ambiente: o caos de lá fora parece não fazer
sentido aqui. Tantas coisas podiam ter sido feitas para não chegar nesse
colapso.
Numa guerra, os dois lados, certo ou errado, se combatem. Mas como fica o
soldado no meio de tudo isso? Seria apenas um peão do erro da vida de outros?
Ou seria consequência do seu próprio erro? Que o soldado, então, morra como
um herói!
No caos absoluto, encontrei um velho amigo estirado no chão, sem vida. Me
desespero ao lembrar dos anos que tive em sua companhia. Nem lembro mais
a primeira vez que o vi e espero não lembrar dessa última.
Pelos jornais vivos espalhados pela cidade, você deve escutar o murmúrio de
uma outra história, uma diferente dessa minha versão.
Não tem mais jeito! Esta carta é a última coisa a fazer antes do confronto final.
Torço para que as melhores memórias fiquem. Não quero que a imagem
dolorosa do herói derrotado permaneça. Afinal, agora, há paz.
***************** [continua]
137
Do quarto do garoto, o som de um tiro.
No chão, ao lado o velho bichinho de pelúcia, a cor vermelha se destaca.
138
Dhoruba
Cecilia Lorca
O navio balança. Eu me sinto enjoado. Não entendo por que estou aqui.
Chicotes zumbem. Gritos e gemidos enchem o ar carregado e fedorento.
Meu nome é Dhoruba. Sou guerreiro valente. Fui pego de surpresa.
Homens feios, desbotados e de olhos muito claros nos cercaram. Eu tentei fugir,
como meu amigo Ngozi, mas não tive a mesma sorte. Amarraram-me e me
jogaram nesse porão úmido, com outras pessoas que nem mesmo conhecia.
Estão todos assustados. Tratam-nos como animais. O cheiro é
insuportável. É escuro e insalubre. Alguns homens choram, outros apenas se
entregam. Eu não vou chorar. Sou corajoso e irei sair vivo daqui. Não posso pular
desse navio. Estou acorrentado. Darei um jeito de sobreviver. Sou valente e
esperto. Sei me virar, sempre soube. Não vou morrer nesse lugar fétido.
Dizem que iremos a terras longínquas e seremos escravos. Eu não quero
trabalhar para outra pessoa. Não queria sair de minha aldeia. Estou apaixonado
por Abayomi e logo nos juntaríamos. Agora não sei se a verei de novo.
Vejo alguém vomitando, é Lisimba, ele parece doente. Há um homem
branco com cabelo cor de fogo. Ele maneja o chicote como ninguém. Não tem
dó, não entende a nossa gente. Já faz dias que me encontro nesse cativeiro
sombrio.
Leke, um jovem que fez amizade comigo, morreu ontem. Ele não
aguentou, assim como muitos outros que não estão suportando essa viagem
involuntária. Dizem que esse novo mundo é muito bonito. Muitas florestas, muita
abundância. Contudo, do que me serve tudo isso, es estiver cativo, em alguma
fazenda?
Quero ser livre de novo. Reencontrar minha família. Minha mãe deve estar
muito aflita, pudera! Está na hora da comida. É só um naco de pão velho e meia
caneca de água. Tudo isso é muito absurdo. Vivo um pesadelo e gostaria de
acordar logo!
Agora fiquei sonolento. Vou cochilar um pouco. Sonhar com a minha terra
e com os meus amigos. Sonhar que estou voltando feliz e saudável. Estou vendo
Mbita acenando. Mamãe batendo palmas. Todos estão me aguardando. Estou
chegando, vou abraçá-los! Acordei! Estou aqui de novo, nessa prisão flutuante!
139
Os dias estão passando lentos. Emagreci, e outros homens estão
adoecendo. Vou tentar ficar firme e esperto. Não vou morrer aqui nesse inferno.
Vou lutar como todas as minhas forças. Chegarei ao terrível destino, enfrentarei
todos os obstáculos. Sou Dhoruba, sou forte e tenho muito o que viver!
Cecilia Lorca
Cecilia Lorca é brasileira, nascida em São Paulo —
Capital. Formada em Biologia, pós-Graduada em Saneamento
Ambiental e Didática do ensino superior pela Universidade
Mackenzie. Formou-se também em Pedagogia pela
Universidade UniABC e lecionou por 27 anos até se aposentar
em 2015. Sempre escreveu, pois era uma paixão desde jovem,
nunca teve oportunidade de publicar seus livros, até 2017.
Atualmente conta com 9 livros em sua coleção e lançará o 10.º
em breve, sempre com muito carinho e dedicação.
140
Diorama no paraíso
Valério Maronni Salles
141
de lenha para gerar o encanto do chic-chic). O apito copiava o streaming do
instrumento de caça dos exterminadores de marrecos.
1961, dormiam os sinos na escadaria da fazenda abandonada para as
bandas do vassoural. Na plataforma de embarque em rampa de outrora ainda
escorregavam rolimãs de uma geração amanhecida que guardava na tulha o
remorso de ter trocado o comboio comunitário pelo DKV Vemag do motorista
solitário. No entreposto, sacas de café empoleiradas nas de milho encostadas
nas de palha de arroz aguardavam a chegada da correia transportadora elétrica
do interior do Estado com vida a luz de vela. Ratos faziam a ponte ferroviária só
com vagões de carga em conexão pela comunhão, lentamente desaparecendo
do campo visual (do campo rural) da meeira com o filho dependurado num
embornal de fralda enroscado no pescoço.
142
desalento, repouso eterno com direito a ferrugem e sem salão nobre no museu
imperial. As fotos históricas e as pinturas lendárias nas rodoviárias que ainda
perpetuavam o cheiro da transformação – lenha em óleo diesel – quase se
transformavam em 3d tamanho o esforço de se desprenderem do papel e da tela
ao seu real papel de baratear passeios e produtos viageiros.
1932, protestos sem sentido dos outros meios de transporte: os que não
queimavam lenha ou carvão para o vapor, queimavam óleo para lambuzar o ar.
Todos condenados por certa camada na estratosfera.
Há muito tempo atrás, ... no início, a criação dos céus e da terra, um lugar
para trilhar e outro para esfumaçar; faça-se luz, utilizada no seu farol; à tarde a
143
chegada, pela manhã a partida, à noite o descanso; por entre as vegetações e
faunas, fura-se túneis; as estrelas para guiar a composição; sejam férteis e
multipliquem-se em frotas de vagões; façam a diesel e a elétrica à semelhança
da vapor; depois o ar, que participa da combustão; o fogo, resultado da amizade
com a lenha; o calor que, como a caldeira, é arredondado formando o sol; a Via-
Láctea, composta de múltiplas vias de trilhos paralelos com semáforos a olho nu;
os sistemas planetários, cada vagão em sua órbita tracionados pelo astro central;
as paradas no tempo, estações para estrelas cadentes estacionarem; os
meteoros, como bagagens para outros destinos; o primeiro homem, Seu Ferreira
... de sua costela, sua companheira!
144
A Partida
Sandra O'Neill
Uma tarde de abril, logo após o almoço, meu marido me comunicou que
queria me deixar. Fez isso enquanto tirávamos a mesa. Estávamos casados há
5 anos e tínhamos uma linda filha de 10 meses que, naquele momento, dormia
tranquilamente em seu carrinho estacionado em um dos cantos da sala de jantar.
Eu não sei explicar o que eu senti, apenas que meus olhos começaram a
arder e meu peito a queimar. Entendam, eu amava meu marido e quando o
escolhi tinha certeza de que seria para sempre. Separação era algo muito
distante da minha realidade. Naquele momento eu tinha que me manter forte
quando na verdade eu queria desabar.
Em um instante eu era uma das mulheres mais felizes do meu círculo de
amigas, com uma filha linda e um marido maravilhoso, no momento seguinte,
diante de mim, eu via desmoronar toda a minha felicidade eu diria mais, eu via
desmoronar minha vida como um castelo de areia ou de cartas que bastava uma
rajada de vento para que tudo fosse destruído. E eu queria muito saber quem
era o vento responsável por aquele momento de tensão.
Ele não me deu maiores explicações apenas que estava cansado daquela
vida, que tinha cansado de "brincar de casinha" e queria seguir, só que seria
uma viagem sem mim, sem nós!
A princípio eu fiquei muito triste e perdida pois apesar de ser uma
profissional liberal e ter minha independência financeira garantida desde muito
jovem, eu me casei para ter o meu "felizes até que a morte os separe"! Embora
a ruptura do nosso casamento estivesse sendo uma espécie de morte para mim
naquele momento.
O que eu fiz em seguida foi surreal até para mim.
Levei os pratos até a pia e comecei a lavar como se ele não estivesse ali
ou não tivesse me dito absolutamente nada. E a minha reação o pegou de
surpresa. Ele não soube o que fazer ou como reagir. No instante seguinte,
percebendo que eu não o responderia naquele momento, pegou as chaves do
nosso carro (eu disse mesmo, nosso?!) e saiu. Precisava processar minha
indiferença diante de suas palavras. Mal sabia ele que eu não estava indiferente,
apenas não sabia o que dizer.
145
Por fora eu fingia bem toda essa indiferença, mas por dentro meu peito
queimava e minha cabeça exigia uma explicação. Por que ele estava nos
deixando? Não éramos boas o bastante para ele? O que tínhamos feito de
errado? O que EU tinha feito de errado?
Meu marido não voltou naquela noite e nem na seguinte, mas eu sabia
onde encontrá-lo. Estava na casa da mãe e apenas isso foi o suficiente para eu
exigir que me explicasse o que estava acontecendo, afinal minha sogra nunca
gostou mesmo de mim, ela preferia que um dos filhos morresse a ter que aturar
uma nora fora de seu padrão de exigência.
O telefone foi atendido no 3º toque, ele já estava mesmo me esperando
ligar. Não falamos muito, apenas o suficiente para entender que ele já tinha feito
sua escolha muito antes daquele momento. Muito antes de nos casarmos ele já
sabia que não ficaria comigo pra sempre, que tinha sido apenas para afrontar
sua mãe, mas que não deu certo.
Aquele amor por mim nunca foi real, pelo menos não por parte dele. O
meu tinha sido, o meu era real! Nos despedimos com cordialidade combinando
que ele voltaria ao nosso apartamento para pegar seus pertences no dia
seguinte. Naquela noite eu não dormi e não sei por quanto tempo mais eu fiquei
assim, vagando como um zumbi perdida entre o que era real e o que eu gostaria
que fosse.
Meu casamento acabou oficialmente em 05 de maio de 2010 mas minha
vida continuou. Hoje, 10 anos após o ocorrido, eu sou uma pessoa melhor do
que fui quando estava com ele. Não que eu o tenha esquecido ou que meu amor
por ele não tenha valido a pena, tudo vale a pena!! Tudo é aprendizado. Chorar?
Chorei por noites a fio, por dias, meses, por que não dizer, anos? Mas hoje sei
que tudo foi aprendizado. Se hoje sou essa mulher forte da qual minha filha tem
orgulho foi graças a decisão dele de um dia me deixar.
146
Sandra O'Neill
Advogada por formação. Educadora por
profissão e escritora por afinidade . Neta de
portugueses e irlandeses, Sandra escreve desde os 13.
Seu primeiro incentivador foi o escritor Pedro Bandeira.
Fã de Cinthia Freire, Brittainy Cherry e Ana Beatriz
Brandão, costuma ler romances clichês e romantasia,
sendo esse último, seu gênero favorito. Seus textos
estão em suas redes sociais, na plataforma Scriv e em
diversas antologias. Também podemos encontrar seus
livros na Amazon. Atualmente mora em Campinas com
sua filha Sofia, sua mãe Marinete e um gato laranja
chamado Van Gogh.
147
Olhar imortal
Hellen Bravo
Adentrei no casarão ao cair da noite, imediatamente, vi-me rodeada de
inúmeros quadros até encontrar o atelier claustrofóbico, pouco iluminado, sujo e
triste. Observei cada detalhe do cômodo, enquanto caminhava pensando que o
local de criação de um artista, deveria ser um lugar mais alegre, sem entender
como minha companhia poderia ser trocada por toda aquela tristeza. Meu amado
pintor adormecera segurando alguns pincéis, sentado numa poltrona, que era o
único móvel do ambiente, além de um banco de madeira e um cavalete
suportando uma tela em branco.
Decidida a aceitar a proposta de Frederico fui usando um vestido de estilo
Vitoriano na cor lilás com uma peça bordada, em tom mais escuro, passando
pela lateral dos braços deixando meus ombros a mostra, com um grande laço na
parte de trás, na altura da cintura e o espartilho amarrado com força valorizando
meu colo. Meus cabelos foram divididos ao meio, com os cachos largos e
marcados suspensos, emoldurando meu rosto de traços delicados com apenas
um colorido nos lábios. Quando ele despertou, como que tocado pela intuição, e
me viu, pude sentir o prazer que estava lhe proporcionando ao atender seu
pedido.
Frederico desejava me eternizar numa obra digna de aclamações. Entre
tantas donzelas, ele sonhava em ter-me como sua modelo. Dizia, envolvendo-
me em palavras doces, que queria registrar para todo o sempre, a minha beleza
encantadora para que, num futuro distante, as pessoas pudessem, através de
sua arte, olhar bem dentro dos meus olhos e reconhecerem, com clareza, toda
a doçura e a força de uma mulher, que com o brilho envolvente da juventude
conseguiu, sem maiores esforços, inspirar um pobre artista.
Ainda assim, eu sentia-me traída! Não conseguia ignorar a força muito
superior que se interpunha em nosso convívio. Era um poder que resistia às
minhas carícias, aos meus apelas, fazendo-me sentir distante do homem que
amo com tanta devoção. Eu lutava constantemente para manter acesa a chama
de um amor, quase platônico e débil.
Enquanto ele dizia que ninguém nesse mundo, por mais que tentasse,
poderia fazê-lo mais feliz do que eu, era perceptível o regozijo que sentia a cada
obra que dava vida. Era um amor tão intenso que, se largasse tudo para ficar
148
comigo, faltaria uma parte que, certamente, ficaria impregnada nos pincéis,
tintas, nas paredes,... Eu tinha uma rival invisível e possessiva que nos mantinha
separados e de nada me servia ser a mulher amada se não o tinha dedicando-
me atenção e companheirismo. Eu devia, então, fechar os olhos e aceitar as
migalhas desse amor com resignação? Sim... Eu faria por ele tanto quanto me
pedisse. Eu ficaria naquela saleta, de bom grado, todo o tempo necessário para
realizar sua obra. Dando-me por satisfeita sabendo que, ao menos durante
aquele período, ele teria olhos somente para mim.
Sentei-me na poltrona, acomodei-me e ele posicionou meu corpo e rosto
na posição em que queria me retratar na tela. Depois colocou os candelabros ao
meu redor e próximo do banco de madeira em que se sentou diante do cavalete,
dando início à sua obra. Porém, com o passar dos dias presa, naquele ambiente
frio, com pouca ventilação, por horas a fio sem alimentação adequada e
dormindo pouco, fui acometida pela peste branca. Não me sentia bem, o corpo
já parecia não obedecer aos meus comandos e, por muitas vezes, a vertigem só
não me dominou porque fui sustentada pelo olhar possessivo que Frederico
lançava sobre mim. Ele precisava de silêncio e eu esforçava-me ao máximo para
não tossir o tempo todo, evitando sair da posição ao levar o lenço até a boca
para aparar o sangue, até que já não pude mais segurar e soltei meu corpo,
quase caindo da poltrona. Quando percebeu, Frederico veio, prontamente, me
amparar pedindo que eu aguentasse um pouco mais... Por ele... Pela arte!
Eu havia dado a ele a maior de todas as provas de amor. Consegui
suportar muito mais tempo do que imaginava e faltando apenas os últimos
retoques, eu o encorajei a terminar. Então, com sua ajuda, posicionei-me
novamente, tentando manter a postura. Ele voltou para a tela e não notou
quando perdi os sentidos novamente.
Após a última pincelada, Frederico havia concluído sua obra-prima.
Levantou-se do banco, afastou-se um pouco e contemplou, extasiado, por um
minuto até que explodiu afirmando: — Isso é a própria vida!... Deus, é a vida
mesmo!
Virou o cavalete com o quadro já pronto em direção à sua esposa e
encontrou Justina recostada na poltrona, pálida, serena, morta e desabou num
choro descontrolado agarrado ao corpo, sem conseguir desgrudar seus olhos
149
dos olhos retratados na pintura que, agora, pareciam julgá-lo até que ele próprio
perecesse.
O retrato daquela jovem no despertar da feminilidade, que guarda sua
própria alma tão bem captada pelo homem a quem tanto amou, encontra-se hoje
com uma moldura dourada, em formato oval, numa galeria de artes onde pode
ser apreciada, provocando a imaginação com seu belo e discreto sorriso, e
perseguindo os admiradores com o seu olhar imortal.
Um só coração, um só amor
Hellen Bravo
Estão ambos em cena, com seus figurinos. Ela com um longo vestido
preto com uma fenda na perna direita, salto alto, cabelo preso apenas de um
lado com uma presilha vermelha. Ele com uma calça e suspensórios pretos
passando por cima da camisa branca e uma gravata vermelha. ― Então isso é
tudo? – diz ela chorando. ― É apenas o fim! – diz ele enxugando com um lenço
a lágrima que escorre pelo rosto dela. Olham-se fixamente. Aos poucos ele
substitui o lenço pelo toque de sua mão. Aproximam-se lentamente, vão se
beijar. Quando seus lábios estão quase se encontrando, ele se afasta. Ela olha
tentando entender. Ele abaixa a cabeça, continua se afastando, olha mais uma
vez para ela e sai correndo. Ela o segue. Inicia-se então uma pequena
perseguição.
Ele entra num camarim e fecha a porta apoiando-se nela como se
quisesse evitar que ela entrasse. Abaixa a cabeça repentinamente e, quando se
levanta, segura a porta com uma mão e com a outra vai desfazendo o nó da
gravata lentamente. Tira a gravata, encosta-se na parede e abre o primeiro botão
da camisa para recuperar o fôlego, vai dobrando a gravata quando ouve alguém
bater na porta. ― Posso entrar? – silêncio – Sou eu! – A porta se abre e entra
Flávia. Carolina olha para ela e responde ― E aqui sou eu! - Ambas parecem
decepcionadas.
Flávia se aproxima da amiga dizendo que está tudo bem e senta-se numa
cadeira próxima à mesa. ― Estão conseguindo se virar? – pergunta Carolina.
Flávia responde com um aceno positivo com a cabeça dizendo ― Ambos temos
150
alguma noção. Claro que se tivéssemos alguém olhando de fora nos ajudaria,
mas está funcionando bem mesmo sem direção. Me lembro quando você dirigiu
o Alvo e deu o personagem da Marieta para sem graça da Diana, mesmo
sabendo que o personagem era para ser seu. Lembro bem de você ajoelhada
no palco mostrando para ela como se fazia o triângulo – desenha um triângulo
no ar enquanto fala – um traço, dois traços e três traços – Carolina ri e se senta
numa cadeira jogando a gravata em cima da mesa sem perceber o vidro aberto
de mostarda que cai manchando a gravata. Flávia se aproxima da amiga,
acariciando seu cabelo curto. ― Você é uma boa diretora, mas prefiro você em
cena. E você sabe bem que nasceu para ser atriz! - Carolina respira fundo, pega
a gravata e vai para o banheiro. ― O ensaio hoje foi muito bom! – diz Flávia
tentando disfarçar, enquanto ouve o barulho de água da torneira vindo do
banheiro onde Carolina tenta, em vão, limpar a mancha de mostarda da gravata.
― Quase nos beijamos! – completa Flávia. A torneira se fecha instantaneamente
e acontece um breve silêncio antes que Carolina volte para o camarim.
Flávia, como sempre, acompanhava Carolina quando aconteceu pela
primeira vez e sem nada entender insistia em perguntar à Carol se estava bem,
pedindo para que a respondesse quase que em desespero até se assustar ao
ouvir da amiga algo que não esperava de forma alguma e num tom totalmente
diferente do habitual ― Quem é Carol? Meu nome é Tom!
A primeira vez que Tom apareceu foi na entrada do teatro. A postura de
Carolina mudou completamente. Mudou também o jeito de falar, de andar e
principalmente de olhar. Olhava tudo como se fosse pela primeira vez. Ali da
entrada podia ver a plateia. Maravilhado subiu correndo as escadas de acesso
ao público. Ao entrar pela lateral da plateia, observa tudo com o encantamento
de uma criança que vai pela primeira vez a um parque de diversões. Flávia
entrou logo atrás e sentou-se na plateia. Tom tocava o estofado das poltronas,
contemplando do teto ao carpete, até se deparar com o palco e perguntar com
brilho nos olhos ― Posso subir? – Flávia prontamente autoriza. Tom sobe ao
palco, caminha por toda sua extensão, olha tudo apaixonadamente. Para na
boca de cena, olha para Flávia e diz com segurança: ― Avise a todos que vamos
montar Enamorados. – Flávia levanta-se num salto e aproximando-se do palco
pergunta, quem, sem precisar dizer uma só palavra e, como se lesse seus
pensamentos, Tom responde com convicção ― Eu e você. - ela sorri sem jeito.
151
― Não sou atriz. Ele desce do palco, a olha nos olhos e diz ― Mas sempre quis
ser. A Carolina sabe disso e por isso escreveu este texto. Ela só não sabia que
eu faria o personagem masculino. Aliás, ela não sabia que ela mesma o faria
através de mim!
― Transtorno Dissociativo de Identidade – Disse o médico que completou
– Trata-se de uma condição mental onde uma pessoa demonstra características
de duas ou mais personalidades ou identidades distintas, cada uma com sua
maneira de perceber e agir. Carolina nunca mais seria apenas Carolina, pois vez
ou outra “apagava” e não se lembrava de nada que seu álter Tom havia feito
nesse tempo.
Flávia não sabe o que esperar de Carolina depois de contar sobre o quase
beijo entre ela e Tom. Beijo esse que não está no texto, nem ao menos a intenção
ou sugestão de um beijo. Carolina não escreveu isso, achava desnecessário
esse beijo. Acredita que um beijo entre os personagens acabaria com a magia
do momento proposto em seu texto. Preocupada Flávia vai logo perguntando ―
Você vai me tirar da peça? – Claro que não! Você sabe muito bem que a é
escolha não é minha, é dele! – responde Carolina.
Pensativa, Flávia vai se aproximando de Carolina ― Vocês são muito
parecidos. Sabe, às vezes tenho a impressão de vê-lo em você. – Descreve
acariciando Carolina – ― O cabelo curto, os olhos que parecem enxergar a
minha alma, a boca, ombros, peito... – Nesse momento, Carolina segura a mão
de Flávia sobre o lado esquerdo de seu peito e completa ― E coração! É o
mesmo, sabia? - Ao que Flávia responde ― Sim! São como um só! - Carolina
respira fundo e sem mais conseguir segurar diz ― Somos um só! Com um só
coração e um só amor!
Hellen Bravo
Nascida em Presidente Prudente, em 03 de outubro
de 1985, Hellen Bravo é atriz desde 2002, formada nos
palcos e com carreira solidificada na capital São Paulo,
onde realizou trabalhos em diferentes setores da área
artística. Como grande apreciadora das artes, está sempre
se aventurando em novos campos e agora se dedica a
mergulhar totalmente na escrita.
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Café sem açúcar
Patrícia Baldez
Minha primeira vez foi com a melhor amiga. Melhor, achava eu até então.
Depois foi o namorado inaugural. Sabe aquele que a gente acha que é o
cara da vida, a alma gêmea? Na hora doeu, mas hoje acho bom ter vivido isso
logo cedo. Evitou delírios.
Certa vez, que não foi comigo, mas marcou como se tivesse sido, foi
quando tia Vilma contou sobre o chefe que, além de bonito, parecia gente boa.
Eu lembro porque a tia contou a história muitas vezes, por muitos anos. E desde
então eu desconfio de gente super legal.
A verdade é que todo mundo mente, todo mundo engana. E, quando a
gente cai no golpe, passa um bom tempo pensando no que fez para merecer.
Depois, grita que mulher nunca é amiga, e nenhum homem presta, e chefe nunca
vai ser legal de verdade. Chora até cansar, ficar leve de novo, esquecer, e
pronto. Segue adiante.
Mas traição de pai e mãe é outra coisa.
Tem coisas que a gente não deveria aprender com nossos pais: traição é
uma delas.
Uma hora ou outra a gente vai sentir na pele e vai aprender. Porque a
vida é mesmo feita de segredos e mentiras. Às vezes expostos; outras, nunca
revelados. Um dia a gente é alvo; no outro, algoz. Às vezes arde; muitas outras,
no fundo, pouco importam.
Numa quarta-feira à tarde eu vi meu pai aos beijos com a Dona Clara e
desejei ficar cega. Eu vi. Ninguém me contou. O Sol estava forte e achei que
podia ter me enganado. Cega pela luz. Cheguei perto o suficiente para ver sem
ser vista. E enxerguei. Nítido, embora cega de raiva. Não esperava ver meu pai
ali e não esperava ver Dona Clara na boca do meu pai. Aquilo me deixou sombria
por dias. Talvez tenha chovido. Dentro do quarto choveu.
Depois de cega, fiquei muda por três dias inteiros. Só voltei a falar no
domingo. É que domingo era o nosso dia de café-da-manhã de hotel, uma
brincadeira que criamos quando eu era tão pequena que nem lembro bem como.
Só sei que começou depois de umas férias.
- Bia, você anda tão estranha esses últimos dias. Aconteceu alguma coisa?
153
- Eu vi o papai beijando a Dona Clara - disse assim mesmo. Papo reto. Eu
não traio.
E o silêncio que toda manhã de domingo merece invadiu a sala. Acho que
até o passarinho da janela parou de cantar num susto. Foi como se um parente
próximo tivesse morrido. Não sei se um parente querido, daqueles de quem
sempre sentiremos falta, ou um bem distante, que nos comove mais pela morte
do que pela vida. Mas alguém morreu. Ou algo. E, depois do alívio de ter cuspido
o veneno que me matava aos poucos, senti medo de ter dado o bote em minha
mãe querendo enfiar as presas no meu pai.
- Ouviu, mãe? Eu vi o pai beijando a Dona Clara. A senhora faz tudo por
esta família e o que ganha em troca? Chifres - insisti esperando uma
reação que nunca veio.
Meus pais se entreolharam com uma cumplicidade desconcertante para
quem tinha jogado uma bomba de potencial atômico. Nunca havia lido sobre o
silêncio em Nagasaki.
- Eu falo? Ou você fala? - minha mãe enfim reagiu.
- Você - disse meu pai, que a esta hora devia estar aos pés dela, mas não
estava.
- Filha, vou começar com um conselho: à exceção de casos de violência
doméstica, nunca se meta na vida de um casal. Você pode morar com
eles, ser fruto deles, e ainda assim não saber o que se passa naquela
intimidade - minha mãe falou com a tranquilidade de quem bebe leite
morno. Se um dia você for contar a alguém que ela é, sei lá, chifruda, né?
Certifique-se de que ela tem interesse em saber. Este negócio de tratar o
outro como você gostaria de ser tratado é um bom parâmetro, mas a
verdade é que a gente não é o outro e nunca vai saber como ele pensa,
ou sente.
E a luz chegou à mesa, brilhando a maçã verde e derretendo a manteiga
amarela.
- Eu e seu pai temos 45 anos. Trabalhamos, pagamos nossas contas,
sustentamos nossa casa e nos achamos no direito de sentir prazer.
O pão me desceu seco.
- De todos os livros que lhe demos, a gente sempre evitou os de fadas. Não
só porque não queríamos que você esperasse por príncipes, mas também
154
para que não crescesse acreditando em fantasias sobre o amor ideal.
Você pode ser feliz por muito tempo, até pra sempre, mas não o tempo
todo. Eu sinto se ter visto seu pai beijando outra mulher partiu seu
coração. Mas isso não tem nada a ver com você. Nem comigo. Só diz
respeito a ele e à moça beijada.
- Como é que é? Então trair é ok aqui em casa?
- Trair? Bia, traição é pretensão de quem se imagina autoridade sobre
comportamentos alheios. No caso de relações amorosas, é fantasia de
quem se acha dono do desejo do outro. Conhece algo mais mutável que
desejo? Isso mesmo - disse acarinhando a mesa - você amava tapioca,
teve a fase do pão com ovo, depois cuscuz, hoje é só café sem açúcar, e
ninguém sabe o que vai ser amanhã. Mas estamos aqui, juntos. Sempre
mudando, sempre nós, juntos.
- Amor, é a Clara - meu pai disse mostrando o celular. E era o celular da
minha mãe.
- Não é possível! Você sabia? Ela liga para você para falar com o papai?
- Não, filha - meu pai acordou. Quem vai sair com ela é sua mãe. Aquele
beijo foi a gente testando se seria bom ficarmos os três. Mas não será.
Vamos pra praia comigo?
Tem coisas que a gente deveria aprender com nossos pais: aos domingos
cada um faz o que gosta; e café só presta quente.
Patrícia Baldez
Patrícia Baldez é formada em Comunicação e História.
Talvez por isso tenha uma necessidade visceral de
comunicar suas histórias cotidianamente. Tem a leitura e a
interpretação da vida como um hábito. Escreve numa
tentativa constante de entender o mundo ao redor e o interno
também. Nem sempre consegue, mas está decidida a
continuar tentando. Para conhecer mais sobre sua escrita,
visite o Linktree na bio do seu perfil literário no Instagram: o
@partsy.79.
155
Dono do mundo
Elaine Perez
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— Não acredito, você vai falar dos delírios dessa sua amiga. Ela vive
fazendo sua cabeça. Meu, ela só fala em ET. — o clima amistoso começou a
pesar.
— Você falou e eu ouvi. Agora posso falar sobre seu ídolo? — questionou
a mulher..
Sérgio fez um movimento com a cabeça, demonstrando estar disposto a
ouvir. Até porque, conhecendo Carina, sabia da força dela quando desejava ser
ouvida.
— Ana Clara me falou sobre o Elon Musk. Há várias teorias sobre ele.
Todas interessantes.
— Quais? — perguntou Sérgio e depois tomou um volumoso gole de
vinho.
— Ele pretende fazer da humanidade uma espécie multi-planetária. Não
é delírio, ele está junto com a NASA nesses estudos.
— Essa informação eu engulo. Já li algo e pretendo pesquisar mais sobre
o assunto. Tem mais alguma coisa?
— Muitas coisas. O seu gênio divulgou sobre a nova descoberta da China
no lado oculto da lua. Você não está sabendo? Pois bem, os chineses
descobriram o "Hélio-3”, substância tida por eles como a fonte de energia do
futuro. Com certeza ele vai se meter nesse assunto.
— Qual a relação disso tudo com seu questionamento sobre humanos
híbridos? — perguntou Sérgio.
— Vamos lá, o poder desse homem, exposto por você mesmo, é enorme.
Sua inteligência nem se questiona.
— Até aí sem nenhuma novidade. — falou o namorado.
— Existem segmentos de espiritualistas e religiosos defendendo a
possibilidade do Elon Musk ser um anticristo. Estamos só conjecturando.
— Agora, nós vamos migrar da ciência para o sobrenatural, espiritual e
seja lá mais o quê? — questionou Sérgio.
— Vamos contextualizar. Seu milionário teve uma carreira meteórica. Deu
tudo certo para ele.
— Qual o problema? — perguntou Sérgio.
— Uma de suas empresas constrói naves e foguetes e outra prometeu
colocar uma infinidade de satélites em órbita baixa, para vender internet. Aí, eu
157
e a Ana Clara, interessadas em extraterrestres, somos as únicas delirantes? E
ele? Seu interesse é só econômico? Científico?
— Não sei aonde você quer chegar com essa conversa. — Sérgio sentiu
a cabeça rodar.
— Você é o jornalista e eu a socióloga aloprada. Quero somente dialogar.
Sem endeusar. — Carina continuou.
— Ele esteve no Brasil, conversando com o Bozo. Certeza, a Amazônia
deve ter sido foco dos diálogos. — Carina, estava bem ligada, e deu sequência
aos argumentos.
— Ele já se pronunciou a respeito de robôs, máquinas e computadores e
afirmou a possibilidade deles dominarem o mundo. Para isso já apresentou a
solução, implantar chips em nossos cérebros.
— Talvez isso resolva os problemas da humanidade. — respondeu
Sérgio, com uma dose de ironia.
— Nem Foucault, Deleuze e talvez nem Agamben consigam explicar essa
realidade. — respondeu a socióloga.
— Lá vem você com seus pensadores. Essa gente não produziu e não
produz nada.
— Será? Não pretendo destruir ou rotular seu ídolo. Só acho perigoso
tanta devoção.
— E tem mais, existem teorias sobre seres reptilianos, sobre híbridos e
seu papel nos espaços de poder. Ana Clara acredita na possibilidade do Elon
Musk ser um desses seres.
— E você acredita, também? — perguntou Sérgio.
— Eu prefiro ficar no campo das indagações sociológicas e filosóficas. E
pergunto. Estaria ele imbuído do desejo real em libertar a humanidade do atual
controle? Estar em campos estratégicos de poder e assumir o controle, pode ser
indício do domínio, capaz de submeter ainda mais a humanidade.
Sérgio não respondeu, bebeu o último gole na garrafa e disse estar com
sono.
Carina ficou arrumando a cozinha, e se arrependeu de ter dito para Sérgio
algumas falas de sua conversa com a amiga Ana Clara.
O noivo reagiu da pior maneira e não deixou espaço para nenhuma vírgula
a mais. Takuya foi substituído pelo ronco forte e profundo.
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Elaine Perez
Elaine Perez, nascida em 1965, Sorocaba, SP. diretora
de escola aposentada, escritora, poeta e compositora
sorocabana. Escreveu as obras: Caminhos Poéticos de uma
educadora, Estudo poético da Mediunidade, No cotidiano das
creches - A infância sorocabana revelada: um estudo sobre
as proteções negociadas com a violência, Medicalização e
educação: o entorpecimento da infância no cotidiano escolar,
A pedra dos meus olhos, Artmada e Na rede eu conto.
Participou de antologias de poesia e contos. É integrante do
Grupo o Ato de escrever, do Clube do Contista/ Casa do
Contista, do Coletivo Escreviventes e participa das oficinas
de Mell Renault.
https://instagram.com/elaineperezfo?r=nametag
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“Reflexos em pó escuro”
Alexandre Cruz de Oliveira
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misteriosamente, sem explicação, mas fazendo todo o sentido e dando sentido
à nossa existência, como se a vida nos abraçasse e nos disse-se ao ouvido:
“-Sim, estou aqui!”.
Vejo-me sentado no centro de uma circunferência, medida pelo raio da
minha audição, como um vértice perdido observo e ouço, sou rodeado por todas
estas conversas que são como caminhos com inúmeras saídas e sempre com
um fim, não vejo onde vão parar, posso apenas imaginar. O meu diálogo é
interior, converso com a imaginação e transcrevo para o papel, consigo escolher
qualquer caminho, ou saltar entre eles, sem barreiras nem fim, tenho mais
destinos à minha frente do que as conversas que me rodeiam neste jardim,
porque dependem de algo físico, a mente não tem barreiras, não necessita de
uma boca para falar nem de ouvidos para ouvir.
Olho para o relógio, o tempo perdeu-se na reflexão, reaparece agora com
o cair do sol nas árvores, surgindo com a noção de mais um dia findado. Limitado
pela luz para escrever fecho o caderno, mudo de rumo e entro no caminho
inevitável que me leva à realidade da vida quotidiana, conheço-o bem pois ando
nele todos os dias, e, no entanto, parece-me surreal.
Com o aproximar da cidade o verde dominante da natureza é sufocado
aos poucos até ser engolido pelas cores escuras das ruas, somando lugubridade
ao pôr do sol. A cidade não para, segue num movimento frenético pela escuridão
adentro, o seu barulho expulsa a paz do silêncio e abafa os pensamentos,
penetrando no subconsciente como um vírus. Somos moídos pelas engrenagens
desta máquina devoradora, que nos puxa em todas as direções como um
instrumento de tortura medieval, arrancando-nos os membros, cada um para seu
lado para serem repartidos e devorados por uma sociedade canibal, todos
servem de alimento e todos se alimentam, enojando-se à luz e saciando-se na
escuridão. A cidade é um organismo vivo e nós somos o sangue que corre nas
suas veias. Todos se entregam num sacrifício voluntário, deixando-se abraçar
pelos seus braços feitos de correntes de opressão, confortando-se na
resignação impotente da cobardia. Sentem-se seguros e felizes, sendo
retribuídos com os seus desejos e paixões, que embora sendo fugazes são
perpetuados em imagens de felicidade ilusória numa qualquer rede social,
enganando-se a si próprios e ao mundo.
161
Caminhamos num crescimento egoísta e horizontal que nos afasta da
plenitude a que nos destinamos, seguimos em frente procurando o nosso reflexo
num destino que nunca chega, só existe no nosso desejo, e o desejo vive na
ignorância, só conhece o que o satisfaz. Eu procuro esse reflexo no branco do
meu caderno, nos meus pensamentos, perpetuados em traços negros, para
amanhã poder olhar para eles como me olho ao espelho quando acordo num
novo dia. Serei o mesmo? Só mais uma página o dirá.
162
Amores pós-pandêmicos
Vanessa Dias
163
urgente. Consultou Macedônio na esperança de separar suas almas novamente.
Mas, ao que parece, o recém-inaugurado direito penado não previa essa
cláusula. Teriam uma eternidade para resolver essa bagaça.
Vanessa Dias
A autora é Cientista Social (UFF) e Mestre em
Memória Social (UNIRIO). Já atuou como pesquisadora e
docente no ensino superior. Atua como Gestora de Políticas
Públicas no município de Petrópolis/RJ. Participa do Coletivo
de autoras "Mulheres Maravilhosas". Vem se dedicando à
escrita de contos e crônicas abordando os desafios da vida
contemporânea. Publicou em coletâneas físicas, bem como
em revistas digitais. Mantém um perfil no IG: @
o_brasil_me_obriga_a_escrever, no qual busca uma escrita
diária mais leve e interativa. Contato: e-mail:
van.dias.pvgd@gmail.com
164
Prêmios experimentais
Benjamim Franco
165
—Por que tanta cor? Tudo é tão… brilhoso.
A voz da Professora ecoava na cabeça delu. “Bem-vinde à Terra de
Antanho, e à Realidade Consentida. Animé, não precisa falar em voz alta. Só
pensa na Câmara RC e subvocaliza as coisas, falando em pensamento, e eu te
escuto, tá bom?”
“É tudo tão colorido. Tão vermelho e… azul?” Elu apontou pra uma
samambaia.
“Este tom específico de azul a gente chama de ‘verde’, Animé. Você vai
ter que se acostumar.”
“E que lugar é esse? Todo diferente…”
“Este é o seu quarto aqui na simulação! O seu quarto, na sua casa! Tá
feliz, Animé?”
Animé bafou as costas da mão, e cheirou. —A halitose sumiu. Sumiu!
Elu observou seu quarto. As paredes estavam vazias, pintadas em um
tom de pêssego. A mobília era minimalista: uma cama de solteiro com lençóis
azul-marinho, e na escrivaninha, havia apenas um espelho de mão. Havia, é
claro, a samambaia. Por último, havia um imenso guarda-roupas: um guarda-
roupas feito de…
—Madeira? Madeira de verdade? De árvore?!
“Animé, não se esqueça, esta é a Realidade Consentida… então não é
‘de verdade’ de verdade, mas é tão ‘de verdade’ como se fosse! Taí seu prêmio.”
Animé estava extasiade. —E tem árvores de verdade aqui?
Elu surgiu em frente à sua casa. Cercada por uma muralhinha circular, de
três tijolos de altura, e fincada em um murundu de terra roxa bem vermelha,
estava uma árvore.
“Terminalia catappa. Uma amendoeira da praia. Toda sua, Animé!”
Animé começou a chorar sem parar. Elu abraçou a árvore, esfregando a
casca áspera. Aí, algo caiu em sua cabeça.
—O que é isso?— Animé apontou para o pelote verde e oval.
“É o fruto. Caiu da árvore.”
—Estragou a árvore? Minha árvore quebrou? Ah, não!— Uma folha, do
tamanho da cabeça de Animé, caia, dançando pelo ar, até pousar junto a outra
folha, e a um panfleto de propaganda.
166
—Por que tudo é tão… sujo? Por que tudo fede tanto?— Elu empurrou a
folha com seu sapato. — Por que tudo é assim? — Animé olhou em torno: havia
rachaduras no cimento, mato nas frestas da calçada, e junto à guia amarelo-ovo,
algo que parecia… — Isso é… excremento?!
A Professora suspirou. “Não se esqueça: a Realidade Consentida é como
a Terra um dia foi. Mas será que temos que abrandar a simulação ainda mais?”
O coração de Animé disparou. Elu atravessou a rua correndo, em pânico
ao ver as folhas caídas, vermelhas e marrons, as paredes das casas e
comércios, pintadas em todas as cores; os panfletos, pôsteres e pichações.
—É muito pra mim— gritou Animé —É demais pra mim!
A Professora estalou a língua. —Realidade Consentida, abortar!
FIM
Benjamim Franco
Nascido e criado no Vale do Paraíba, entre Rio
e São Paulo, Benjamim Franco é técnico em
informática e historiador. Seus textos podem ser
encontrados em lugares como a Pulpa, a Revista
Pretérita, e Subtextos. Sua primeiro auto publicação,
O espírito da batata e outras histórias, está disponível
na Amazon.
Benjamim Franco
Nascido e criado no Vale do Paraíba, entre Rio
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e São Paulo, Benjamim Franco é técnico em
informática e historiador. Seus textos podem ser
Obrigado por ler até aqui,
a revista foi produzida com
muito carinho.
Se você gostou
compartilhe!
Muito obrigado!
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