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O CUIDADO MULTIPROFISSIONAL E FAMILIAR À PESSOA NO ESPECTRO DO


AUTISMO: A IMPORTÂNCIA DA COMPLEMENTARIDADE TERAPÊUTICA

Book · July 2019

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Francidalma Carvalho Filha Marcus Vinicius da Rocha Santos da Silva


Universidade Estadual do Maranhão (UEMA) Centro Universitário UNINTER
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Iel Marciano de Moraes Filho


Universidade Paulista
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PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE 233

O CUIDADO MULTIPROFISSIONAL E FAMILIAR À PESSOA


NO ESPECTRO DO AUTISMO: A IMPORTÂNCIA DA
COMPLEMENTARIDADE TERAPÊUTICA

Francidalma Soares Sousa Carvalho Filha1


Marcus Vinícius da Rocha Santos da Silva2
Hilma Mirella Costa e Silva3
Iel Marciano de Moraes Filho4
Eutima Klayre Pereira Nunes5
Maressa Laís de Oliveira Coelho6

Introdução

A terminologia Transtorno do Espectro do Autismo (TEA)


identifica um grupo de condições neurodesenvolvimentais que acometem
uma em cada 66 crianças, tendo como características principais déficits
significativos e persistentes na interação e comunicação social e a presen-

1 Doutora em Saúde. Mestre em Enfermagem. Enfermeira. Especialista em Saúde Pública, Saúde da


Família e Educação na perspectiva do Ensino Estruturado para Autistas. Docente da UEMA e UNI-
FACEMA. Realiza pesquisas no campo da Avaliação e Planejamento em Saúde, bem como acerca do
Direito à saúde e ao nascimento saudável e também sobre o Transtorno do Espectro Autístico (TEA)
e inclusão de pessoas com deficiência em âmbito escolar e de atenção à saúde.
2 Enfermeiro. Graduado em Enfermagem pelo UNIFACEMA. Atualmente é Enfermeiro Fiscal no Con-

selho Regional de Enfermagem do Paraná (COREN-PR). Atuou como Enfermeiro Plantonista no


Hospital de Urgência de Teresina Prof. Zenon Rocha. Foi bolsista PIBIC/FACEMA. Especialista em
Docência do Ensino Superior pelo IESF. Pós-Graduando em Gestão em Saúde pela UFMA. Realiza
pesquisas sobre os temas: Administração de Medicamentos e Lesões por Pressão, dentre outros.
3 Graduação em Enfermagem pelo Centro Universitário de Ciências e Tecnologia do Maranhão, Brasil

(2016). Enfermeira do Hospital Municipal Divino Espirito Santo, Matões-MA.


4 Graduação em Enfermagem pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Mestre em Ciências Am-

bientais e saúde pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Docente na Unip – Universidade
Paulista nas áreas da enfermagem e saúde pública. Pesquisa nos temas: enfermagem, saúde mental,
atenção psicossocial, papel do enfermeiro, reforma psiquiátrica e estresse ocupacional.
5 Graduação em andamento em Enfermagem e Obstetrícia. Universidade Estadual do Maranhão,

UEMA, Brasil. Ensino Médio Centro de Ensino Dom Daniel Comboni, CEDDC, Brasil. Integrante do
Grupo de Pesquisas Interdisciplinares: Educação, Saúde e Sociedade (UEMA/CNPq).
6 Graduando-se em Enfermagem e Obstetrícia. Universidade Estadual do Maranhão, UEMA, Brasil.

Ensino Médio CE Diolindo de Paula Ribeiro, CE, Brasil. Integrante do Grupo de Pesquisas Interdisci-
plinares: Educação, Saúde e Sociedade (UEMA/CNPq).

O CUIDADO MULTIPROFISSIONAL E FAMILIAR À PESSOA NO ESPECTRO DO AUTISMO:


A IMPORTÂNCIA DA COMPLEMENTARIDADE TERAPÊUTICA
234 PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE

ça de comportamentos ritualísticos, estereotipados e repetitivos, indepen-


dentemente de sua etiologia (MARQUES; BOSA, 2015).
Nos últimos anos, o TEA tem sido relacionado a fatores ambientais,
genéticos, neurológicos e imunológicos, que incluem o Transtorno Autísti-
co, Aspeger, o Transtorno Desintegrativo da infância e o Transtorno Global
do Desenvolvimento não Especificado; podendo apresentar variados graus
de classificação, desde o leve, moderado ao grave, dependendo do acome-
timento desenvolvimental da pessoa (ZANON; BOSA, 2014).
No que diz respeito aos aspectos familiares, Vieira e Fernandes
(2013) afirmam que as dificuldades enfrentadas pelas famílias com uma
criança inclusa no Espectro do Autismo perpassam por diversos seguimen-
tos, desde os aspectos financeiros até aqueles relacionados à qualidade de
vida, que podem ser definidos como a percepção do indivíduo a respeito
de sua posição na vida, no contexto de sua cultura e sistema de valores nos
quais está inserido, bem como em relação a seus objetivos, expectativas,
padrões e preocupações.
O fato é que a reação dos pais em relação ao recebimento do diag-
nóstico e o que é feito a partir dessa confirmação tem uma grande impor-
tância, podendo contribuir positiva ou negativamente, a partir das escolhas
que são feitas por familiares e profissionais, para o desenvolvimento de
habilidades da criança, diante da perspectiva de lidar com sua realidade,
mesmo possuindo limitações.
É importante ressaltar que o diagnóstico precoce é essencial, pois
o mesmo favorece que a criança com TEA seja encaminhada o mais rá-
pido possível para centros especializados e terapias, os quais resultarão
em condições mais favoráveis ao desenvolvimento dos indivíduos nessa
condição, além de promover melhor adaptação ao cotidiano familiar, tera-
pêutico e acadêmico, quando for o caso (JENDREICK, 2014).
Nessa lógica, para que se tenha uma linha de cuidado excelente, é
necessário reconhecer a essência do tratamento, o qual se caracteriza por
técnicas de mudanças de comportamento, terapias de comunicação atra-
vés da linguagem verbal e não verbal e atividades educativas. Além disso,
para que este processo sobrevenha de maneira efetiva deve ocorrer o en-
volvimento da pessoa com o provedor de cuidados primários, os profissio-

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PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE 235

nais da área da saúde, os professores e outras pessoas envolvidas nesta


assistência (SIMÕES et al., 2010).
Neste sentido, este estudo objetivou analisar a compreensão de pais/
cuidadores de pessoas no Espectro do Autismo acerca do cuidado desen-
volvidos por familiares e por equipes multiprofissionais ao indivíduo nesta
condição.

Metodologia

Trata-se de uma pesquisa avaliativa, descritiva, exploratória com


abordagem mista, quantitativa e qualitativa. O cenário deste estudo foi o
município de Balsas-MA, com população estimada em 2014 de 90.679 ha-
bitantes. Apresenta uma área de unidade territorial de 13.141,733 km² e
faz parte da região do Sul do Maranhão. A cidade é banhada pelo Rio Balsas
e localiza-se a 790 km da Capital, São Luís, e, a 397 km de Imperatriz, a
segunda maior cidade do Estado (IBGE, 2018).
A pesquisa foi realizada na Associação de Pais e Amigos dos Excep-
cionais (APAE), no Centro de Reabilitação em Terapia Ocupacional (CE-
RETO), bem como nas residências dos pais/mães/cuidadores informais,
quando necessário.
A APAE possui 9 (nove) crianças/jovens no TEA e o CERETO acom-
panha 15 (quinze) crianças/pessoa no TEA. Assim, de posse da lista no-
minal dos genitores e/ou responsáveis e, sabedores dos dias e horários
em que os mesmos possuíam atendimentos agendados, os mesmos foram
procurados e inquiridos a participar da pesquisa, sendo que na ocasião
foram explicados os objetivos e outras informações relevantes da pes-
quisa, solicitou-se a participação voluntária, somando 24 participantes,
que se referem aos pais/genitores e/ou cuidadores informais das pessoas
assistidas.
Os critérios de inclusão foram: ser pai/mãe/genitor/cuidador de
pessoa no Espectro do Autismo, acompanhada na APAE ou CERETO e acei-
tar de livre e espontânea vontade participar da pesquisa. E os critérios de
exclusão: não aceitar participar do estudo e/ou não cumprir o outro que-
sito necessário.

O CUIDADO MULTIPROFISSIONAL E FAMILIAR À PESSOA NO ESPECTRO DO AUTISMO:


A IMPORTÂNCIA DA COMPLEMENTARIDADE TERAPÊUTICA
236 PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE

A coleta dos dados ocorreu entre setembro de 2017 a março de 2018


por meio da aplicação de um formulário que continha questões sociodemo-
gráficas acerca dos pais/cuidadores informais das pessoas acompanhadas,
além de perguntas acerca do cuidar familiar e multiprofissional de crianças
no Espectro do Autismo, envolvendo perguntas fechadas e também reali-
zou-se entrevista buscando estabelecer discussões acerca das dificulda-
des, entraves e facilidades na convivência com autistas.
Quanto aos dados sociodemográficos e outras informações do cui-
dado às pessoas que vivem no TEA, contidas no formulário, através de
perguntas fechadas, compôs-se um banco de dados, a partir da digitação
de informações no software Statistical Package for the Social Sciences –
SPSS (versão 22.0 for Windows), posteriormente, foram consolidados por
meio das técnicas de estatísticas descritivas simples (frequências absoluta
e relativa). Depois, procedeu-se a discussão dos achados com base na lite-
ratura produzida sobre o tema.
Em relação às entrevistas implementadas, as informações coletadas
com perguntas abertas acerca do cuidado cotidiano e assistencial às pes-
soas no TEA foram submetidas à Análise de Conteúdo, proposta por Bardin
(2011), que tem como propósito a compreensão do significado das falas
dos sujeitos para além dos limites daquilo que é descrito. E dentre as técni-
cas de Análise de Conteúdo, optou-se pela Análise Temática, que busca os
núcleos de sentido, os quais constituíram a comunicação e cuja expressão
revelou algo importante para o objeto estudado.
Ressalta-se que, para facilitar a compreensão das informações, os
dados foram fielmente descritos e, em seguida, cada participante foi apre-
sentado no texto com a inicial “C” de Cuidador, seguido de um número cor-
respondendo à ordem em que o instrumento de pesquisa foi aplicado (C1
a C 24, de acordo com a ordem de realização das entrevistas e aplicação do
instrumento).
Esta pesquisa foi submetida à Plataforma Brasil, e, em seguida, dire-
cionada ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), tendo sido aprovada com
o número do Certificado para Apresentação para Apreciação Ética (CAAE)
42337414.7.0000.5554 e número de Parecer 1.035.635.

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PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE 237

Resultados e discussões

Em relação aos resultados deste estudo, as informações relativas aos


questionamentos fechados, oriundos dos formulários serão apresentados
em forma de Tabelas e aquelas conseguidas por meio da entrevista serão
organizadas em Categorias, conforme se observa a seguir: Tabela 1 dos
dados sociodemográficos dos pais/cuidadores de crianças no Espectro do
Autismo.

Tabela 1 – Dados sociodemográficos de pais/cuidadores de pessoas no


Espectro Autista. Balsas-MA, 2018.
VARIÁVEIS nnnn N %
Sexo
Masculino 1 4,2
Feminino 23 95,8
Faixa Etária (anos completos)
21 – 25 1 4,2
25 – 30 7 29,2
31 – 35 9 37,2
≥ 36 7 29,4
Escolaridade
Fundamental incompleto 2 8,3
Fundamental completo 1 4,2
Médio incompleto 33 12,5
Médio completo 14 58,3
Superior incompleto 1 4,2
Superior completo 3 12,5
Estado civil
Solteiro(a) 5 20,8
Casado(a)/União estável 14 58,3
Divorciado(a) 4 16,7
Viúvo(a) 1 4,2
Atividade Laborativa
Sim 7 29,2

O CUIDADO MULTIPROFISSIONAL E FAMILIAR À PESSOA NO ESPECTRO DO AUTISMO:


A IMPORTÂNCIA DA COMPLEMENTARIDADE TERAPÊUTICA
238 PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE

Não 17 70,8
Ocupação
Do lar 17 70,8
Diarista 1 4,2
Advogado(a) 1 4,2
Enfermeiro(a) 1 4,4
Autônomo(a) 4 16,6
Grau de parentesco com a criança
Mãe 21 87,5
Madrasta 2 8,3
Pai 1 4,2
Total 24 100,0

A primeira variável refere-se ao sexo dos cuidadores, verificando-se


que a grande maioria é composta por mulheres, somando-se 23 (95,8%).
Embora este dado não surpreenda uma vez que as mulheres, historicamen-
te, mantêm uma prática de cuidados da casa e da família de modo muito
contundente, sobretudo no que se refere a membros familiares que apre-
sentam algum tipo de transtorno ou condição física e/ou psíquica que cau-
se limitações na sua vida.
A este respeito, Ribeiro (2011) refere que existem evidências de que
o TEA tem impacto sobre a família e que a sobrecarga dos cuidados recai
principalmente sobre as mães, pois geralmente são elas que, ao receberem
o diagnóstico de autismo dos filhos, largam seus empregos para cuidar ex-
clusivamente dos mesmos ou pelo menos precisam fazer ajustes nos horá-
rios para permanecerem trabalhando.
No que se refere à faixa etária, averiguou-se que 7 (29,2%) tinham
entre 25 – 30 anos, 9 (37,2%) entre 31 – 35 anos, 7 (29,4%) tinham mais
que 36 anos. Percebendo-se, portanto, que os participantes se apresen-
tam em uma idade de maior maturidade, o que poderia influenciar, po-
sitivamente, na recepção do diagnóstico, tomada de decisões quanto ao
tratamento e seguimento de orientações e terapêuticas prescritas pelos
profissionais, além de estarem mais aptos a montarem uma estrutura de
acompanhamento para os filhos/pessoas cuidadas. A este respeito, uma
pesquisa desenvolvida por Nunes e Santos (2010a), detectou que a faixa

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PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE 239

etária dos cuidadores era de aproximadamente 39,5 anos, e, em se tratan-


do de estado civil dos mesmos, 90% eram casados(as). Ainda sobre este
assunto, uma investigação feita por Karla, Mayra e Rosa (2014) identificou
que a faixa etária dos cuidadores que prevalecia era de 36 anos, e com re-
lação ao estado civil 51,6% eram casados(as).
Em relação à variável escolaridade, 14 (58,3%) concluíram o ensino
médio, 3 (12,5%) tinham o ensino médio incompleto, 1 (4,2%) está cursan-
do o ensino superior e 3 (12,5%) terminaram o mesmo. Este dado é impor-
tante, pois ao perceber que a maior parte dos cuidadores apresenta o en-
sino médio completo deduz-se que isto pode influenciar de modo positivo
na adesão e continuidade do tratamento prescrito, além de possivelmente
apresentarem melhores condições de realizar o acompanhamento. Entre-
tanto, o resultado difere dos dados encontrados por Barbosa e Fernandes
(2009), os quais verificaram que das 150 mães estudadas, 59 (39%) não
eram alfabetizadas e 51 (34%) possuíam ensino médio completo.
Quanto ao estado civil dos participantes, verificou-se que 14 (58,3%)
são casados ou vivem união estável. Este item é importante porque pode
demonstrar que o cuidado da criança é compartilhado com o(a) compa-
nheiro(a), já que as exigências de atenção à uma pessoa no Espectro Au-
tístico é maior e mais complexa do que a atenção ofertada a um(a) filho(a)
típico, precisando de uma dedicação e uma atenção mais eficiente e esme-
rada. Dados semelhantes foram encontrados por Nunes e Santos (2010b),
os quais verificaram que de 20 cuidadores de crianças autistas 19 (95%)
eram casados ou estavam em união consensual.
Conforme a variável atividade laborativa, 17 (70,8%) cuidadores não
trabalham, disponibilizando todo o seu tempo para cuidar dos filhos e da
casa e somente 7 (29,2%) possuem vínculo empregatício. Ribeiro (2011) afir-
ma que geralmente as mães ao receberem o diagnóstico de autismo dos fi-
lhos deixam seus empregos para cuidar exclusivamente dos mesmos, devido
ao alto nível de dependência e necessidade de cuidados que a mesma detém,
contribuindo assim, para que os cuidadores se abstenham de vínculos em-
pregatícios na intenção de direcionar seu tempo para o cuidado da criança.
Entretanto, convém salientar que esta não é uma realidade com-
pletamente fechada, pois quanto mais se discute e conhece sobre os dis-
túrbios presentes no TEA, também se percebe maior independência dos

O CUIDADO MULTIPROFISSIONAL E FAMILIAR À PESSOA NO ESPECTRO DO AUTISMO:


A IMPORTÂNCIA DA COMPLEMENTARIDADE TERAPÊUTICA
240 PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE

cuidadores, sobretudo as mães, em relação à sua vida profissional e aca-


dêmica, o que permite esclarecer que não é porque uma família apresenta
uma criança no espectro do Autismo que seus componentes precisarão ab-
dicar completamente de outros afazeres e desenvolvimento de atividades
laborativas em detrimento dos cuidados com o filho(a), pois existe gran-
de possibilidade de haver o desenvolvimento e aquisição de habilidades
essenciais a esta pessoa e os pais/cuidadores continuarem seus afazeres
dentro e fora de casa. Para tanto, é crucial o empoderamento dessas pes-
soas no que refere à ampliar os conhecimentos acerca do transtorno e do
seu acompanhamento.
Quanto à ocupação, 17 (70,8%) referiram ser do lar, 4 (16,6%) são
autônomos e 3 (12,6%) declararam outras ocupações. Como se pode per-
ceber, esta variável coincide com a anterior, na qual a maioria dos partici-
pantes não desenvolve atividades com vínculos empregatícios. Sobre isto,
cabe ressaltar que o acompanhamento de uma pessoa no Espectro Autís-
tico, além de tempo disponível, exige recursos materiais e financeiros para
a realização de um tratamento contínuo, além de medicamentos, elevando
os valores da terapêutica. Portanto, quando um cônjuge deixa de atuar no
mercado de trabalho para dedica-se exclusivamente em atender às neces-
sidades do filho(a) pode gerar diminuição nos recursos da família, o que em
seguida, ocasionará problemas financeiros para todos.
Corroborando com este dado, Monteiro et al. (2008) perceberam
que a maioria dos cuidadores são mães que não exercem atividade ocu-
pacional fora de casa, pela necessidade de atenção que a condição do fi-
lho requer, o que envolve uma rotina diária incluindo afazeres domésticos,
cuidados pessoais e familiares e prioritariamente cuidados que envolvem
o filho, acarretando em acúmulos de responsabilidades, que terminam por
contribuir para o afastamento ou abandono de seus sonhos e desejos pes-
soais e acadêmico-profissionais.
A variável que trata do grau de parentesco com a pessoa que no Es-
pectro Autista demonstrou-se que dos 24 cuidadores, 21 (87,5%) relatam
ser mãe, 2 (8,3%) responderam ser madrastas e 1 (4,2%) afirmou ser pai.
Desta maneira, novamente o resultado encontrado coincide com o espera-
do, já que como mencionado, as mães geralmente estão mais presentes na
vida da criança, participando mais ativamente do seu dia a dia.

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PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE 241

A este respeito, estudo realizado por Vieira et al. (2012), concluiu


que o principal cuidador da criança autista também era a mãe, constituindo
87,5% da amostra utilizada, o que aponta para o padrão tradicional familiar
do Brasil, no qual papel de cuidar dos filhos encontra-se vinculado a figura
materna, sobretudo aqueles portadores de cuidados especiais.
Conforme Torres (2012) e Serra (2010), a mãe de crianças com TEA
necessita de atenção especial, visto que o cuidado é primordialmente exer-
cido por ela. Desse modo, sua saúde mental deve ser priorizada uma vez
que a mesma assume múltiplas responsabilidades nos cuidados físicos,
cognitivos e psicológicos do filho que necessita de zelo, disponibilidade
de tempo e paciência, além do seu papel no âmbito familiar: outros filhos,
marido, tarefas domésticas e sociais. Outrossim, é comum ficar a cargo da
mulher a paralisação da vida profissional e a manutenção das tarefas dos
demais membros da família.
A Tabela 2 versa sobre os dados do acompanhamento de pessoas no
Espectro Autístico, como se verifica:

Tabela 2 – Dados relativos ao Acompanhamento nas terapias por crian-


ças/pessoas no Espectro Autista, consoante as concepções de seus pais/
cuidadores. Balsas-MA, 2018.
VARIÁVEIS nnnn N %
Realiza acompanhamento terapêutico/tratamento
Sim 24 100,0
Satisfação com o tratamento que a pessoa cuidada/filho recebe
Bom 19 79,2
Regular 3 12,5
Ruim 2 8,3
Profissional(is) que realiza(m) o acompanhamento
Psicólogo 6 25,0
Fonoaudiólogo 3 12,5
Terapeuta Ocupacional 12 50,0
Neurologista 2 8,3
Fisioterapeuta 2 8,3
Psicopedagogo 4 16,6
Outros 3 12,5

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A IMPORTÂNCIA DA COMPLEMENTARIDADE TERAPÊUTICA
242 PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE

Frequência do atendimento terapêutico


Uma vez por semana 5 20,8
De duas a três vezes por semana 6 25,0
De três a quatro vezes por semana 9 37,5
Uma vez ao mês 1 4,2
Outra 3 12,5
Total 24 100,0

Em relação à variável realização do acompanhamento ao tratamento


ou terapia da pessoa no TEA, todos (100,0%) afirmaram que as crianças têm
acompanhamento terapêutico. Sobre isto, ressalta-se que este resultado é
muito positivo, pois os distúrbios que compõem o TEA são condições que
pela sua própria natureza, exigem uma atenção próxima, individualizada e
especializada com vistas a se alcançar os melhores níveis de desenvolvi-
mento, baseando-se em uma avaliação criteriosa e nas reações próprias da
pessoa e da família.
O acompanhamento terapêutico refere-se a atividades que têm valor
de tratamento e são complementadas pelo uso de mediações. Em alguns
serviços, as atividades terapêuticas são desenvolvidas por profissionais
diversos, tais como psicólogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais,
fisioterapeutas e, em outros, constituem-se de uma ação do projeto tera-
pêutico singular presente nas práticas de diferentes profissionais em clíni-
cas privadas ou em ambientes escolares (BRASIL, 2015).
Quanto a variável que trata da satisfação com o tratamento ou te-
rapia que a pessoa que vive no TEA recebe, constatou-se que 19 (79,1%)
afirmaram estar satisfeitos com a terapêutica, avaliando como “Bom”, 3
(12,5%) consideram “Regular” e 2 (8,3%) referiram ser “Ruim”. No que
tange aos profissionais que realizam o acompanhamento multiprofissio-
nal, verificou-se que o terapeuta ocupacional (12 – 50%) e o psicólogo (6
– 25,0%) foram os profissionais mais citados. No quesito frequência no
atendimento terapêutico, os resultados mais importantes deram conta de
que 5 (20,8%) afirmam que levam os filhos/pessoas cuidadas uma vez por
semana, 6 (25%) referiram duas ou três vezes por semana e 9 (37,5%) de
três a quatro vezes por semana.

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PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE 243

Estes são dados importantes, haja vista esta ser uma condição que
exige um tratamento contínuo e não apenas multiprofissional, mas e so-
bretudo, interdisciplinar na qual se exige uma cooperação mútua e respei-
to tanto entre os profissionais das mais diversas categorias, que precisam
conhecer e passar aos familiares a importância do trabalho efetivo de cada
um, bem como não podem ultrapassar os limites das suas atribuições e afa-
zeres; e ainda, ao mesmo tempo, é essencial que os pais/cuidadores com-
pareçam aos serviços semanalmente, quinzenalmente, mensalmente ou de
outro modo, conforme o indicado pelos trabalhadores e, por esta razão, é
fundamental que os mesmos sintam-se satisfeitos, já que isto poderá in-
fluenciar na confiança depositada na terapia recebida e na sua participação
efetiva.
Sobre isso, Silva (2010) apoiado na análise de diversos estudos, além
de sua própria observação empírica, indica ser frequente que as mães ve-
jam o tratamento como um momento e local privilegiado para que ocorra
um aprofundamento no entendimento acerca do Transtorno e um aprimo-
ramento de habilidades práticas para lidar com seu(s) filho(s).
Portanto, sempre que os pais são envolvidos na terapêutica dos fi-
lhos, a partir da orientação sobre o transtorno, os medicamentos utilizados
e as especificidades do acompanhamento recebido, amplia-se a chance de
ingresso e continuidade na terapêutica prescrita e, consequentemente, de
melhoria nas condições sócioeducacionais e de aquisição de habilidades
necessárias à vida em sociedade e na vida acadêmico-profissional, se for
o caso.

Categorização

Conforme mencionado, a partir das informações qualitativas, reali-


zou-se a categorização a elaboração de três categorias, conforme segue:

Categoria 1: Entendimento acerca dos Transtornos do Espectro do


Autismo

Na primeira categoria verificou-se o entendimento de pais/cuidado-


res de crianças/pessoas no Espectro Autista sobre a condição. Nas falas

O CUIDADO MULTIPROFISSIONAL E FAMILIAR À PESSOA NO ESPECTRO DO AUTISMO:


A IMPORTÂNCIA DA COMPLEMENTARIDADE TERAPÊUTICA
244 PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE

expostas a seguir, pode-se observar os conceitos referidos por alguns dos


entrevistados:

Autismo é a dificuldade em relação social, dificuldade na fala, tem movi-


mentos repetitivos, eles não gostam de som alto de zoada e tem mudanças
de comportamento. (C1)

Para te falar a verdade eu não tenho bem certeza do que é não. (C7)

Não sei. (C9)

Olha eu entendo que é um transtorno de comportamento, afeta a comuni-


cação, o comportamento, afeta mais a comunicação e a socialização dele.
(C11)

O Autismo é um transtorno do desenvolvimento e realmente, ele tem 5 anos,


se você for ver a idade do entendimento dele mesmo ele deve ter uns 2 anos,
que as crianças mais novas que ele tem mais entendimento e isso que pesa
mais é a dificuldade no entendimento. (C18)

Eu não muita coisa sobre o autismo no momento pois o meu filho foi diag-
nosticado primeiramente com TOC, já descobrimos o diagnóstico de autis-
mo ano passado. (24)

Verifica-se nas falas dos participantes que os mesmos possuem pou-


co ou nenhum conhecimento a respeito dos transtornos inclusos no Es-
pectro Autista. Fato que pode ser explicado, em parte, pela ausência de
interesse no assunto e em outra, por dificuldades no acesso a informações,
visto que os entrevistados relatam que o entendimento que detêm sobre o
TEA são provenientes das características das crianças cuidadas.
Nogueira e Rio (2011) enfatizam que uma das reclamações dos fa-
miliares de pessoas autistas é a escassez de conhecimento sobre o Trans-
torno. Afirmam ainda que nem sempre são disponibilizadas informações
sobre o tema e de como lidar com os sinais e sintomas mais evidentes, fato
que dificulta a compreensão da família a respeito do TEA e de como desen-
volver as habilidades necessárias na criança/pessoa no Espectro.
Destaca-se que embora a maioria dos participantes tenha apresen-
tado dificuldade em expressar o seu entendimento e perceptivelmente de-

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PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE 245

tém pouco conhecimento sobre o quadro apresentado pelo filho, foi pos-
sível observar que alguns cuidadores expressam sua concepção sobre o
Transtorno de modo organizado e compreensível, semelhante às definições
atualmente acatadas na literatura produzida sobre a temática.
Para Silva (2010), a maior compreensão da família sobre o TEA favo-
rece o desenvolvimento do filho e permite que ele adquira independência
e se sinta valorizado. Dessa forma, entende-se que o conhecimento acerca
das características do autismo pelos familiares representa um fator facili-
tador para que se possa promover a saúde emocional do filho no Espectro
Autístico.
Reitera-se que todas as crianças das quais os cuidadores foram en-
trevistados frequentam alguma instituição de apoio à pessoa no Espectro
e nessas instituições são desenvolvidas palestras a respeito do tema, de
modo que os cuidadores são convidados a participar das referidas ativida-
des. Portanto, para o melhor desenvolvimento da criança é fundamental
que seus pais/cuidadores conheçam as características, evolução e terapias
disponíveis para que tenham maior controle em relação ao comportamento
da criança.

Categoria 2: Dificuldades em relação ao cuidado à pessoa no Es-


pectro Autístico

Nessa categoria verificaram-se as dificuldades dos pais no cuidado à


pessoa que vive no espectro autista. Nas falas expostas a seguir, pode-se
observar as dificuldades de alguns participantes:

Sim, eu que cuido. Mas não atrapalho. A única dificuldade que eu encontro
é que eu não posso trabalhar porque tenho que me dedicar a cuidar dela
porque eu não posso e não confio em ninguém para ficar responsável por
ela aí como eu já sei o que ela gosta a forma de cuidar dela direito eu prefiro
ficar cuidando dela. (C1)

Encontro muito, já passei várias vergonhas com ela, porque ela não gos-
ta de usar calcinha e os outros achava que era a mãe que não ensinava.
Quando ela era mais pequena ela ficava se unhando, dizendo que estava
suja, aí depois que eu consultei ela, o médico disse que ela tinha o TOC aí

O CUIDADO MULTIPROFISSIONAL E FAMILIAR À PESSOA NO ESPECTRO DO AUTISMO:


A IMPORTÂNCIA DA COMPLEMENTARIDADE TERAPÊUTICA
246 PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE

que ela melhorou. Ela foge muito também, já fiquei na rua até 22h procu-
rando ela. (C6)

Com certeza encontro dificuldades no dia a dia, essa minha caminhada por
médico e fato dele não aquietar, eu tenho que está toda vida do lado dele,
o fato dele não fala, ele só diz mãe tudo para ele é mãe. É muito cansativo.
Que ele é muito esperto, esperto até demais. (C10)

As vezes encontro dificuldade. A dificuldade maior é de levar ele para escola


pela manhã as vezes ele não quer de jeito nenhum aí as vezes é tão tanto
que ele não quer que eu peço a menina para ir na escola avisar que ele não
vai e justificar a faltinha dele. (C17)

Mãe de autista sempre se cobra muito né? Eu acho que eu poderia ser me-
lhor, eu faço tudo o que eu posso mas acho que poderia ser melhor ainda
poderia ter um poderzinho a mais. Mas é tranquilo. O que eu puder fazer a
mais por ele eu irei fazer. (C18)

Eu não encontro dificuldades com relação ao cuidar do meu filho, a única


que sinto é o apoio da família que eu não tenho, que mesmo eles sabendo
do diagnóstico dele, eles não ajudam. Porque para mim fica muito pesado
tenho que controlar ele e controlar os outros, por que todo mundo sabe da
doença dele e todos os profissionais que frequentei com eles diziam que a
família tem que se unir em prol dele e ajudar. Ele não gosta que brinque com
ele. Já é motivo dele ficar irado, se isolar. (C24)

Constatou-se que os principais empecilhos relativos ao cuidado à


criança/pessoa que no TEA dizem respeito às exigências de exclusividade de
atenção, que fez, inclusive, como observado em resultados anteriores, com
que a maioria dos pais/cuidadores deixasse de trabalhar para dedicar-se a
esta atenção; o acompanhamento escolar também foi citado fortemente men-
cionado, bem como alguns comportamentos disruptivos e estereotipados.
No que tange aos empecilhos em relação ao cuidado à pessoa no
Espectro Autista, um questionário elaborado por Balestro e Fernandes
(2012) demonstrou que a grande maioria dos cuidadores afirmou sentir
dificuldades relacionadas à comunicação com seu filho(a), principalmente
no que se refere ao entendimento sobre o que o seu filho(a) quer e tam-
bém deste com as demais pessoas. Freire (2012) cita que são várias as difi-
culdades demonstradas por crianças no Espectro do Autismo, no entanto,

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PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE 247

a que mais se destaca é a ausência da comunicação verbal ou atraso da lin-


guagem, limitando em sobremaneira as atividades diárias de tais pessoas.
Neste estudo os participantes foram enfáticos em apontar algumas
características muito comuns nas pessoas no Espectro Autístico, tais como
estereotipias, apego obsessivo à rotinas, problemas com a adesão esco-
lar, bem como distúrbios comportamentais que dificultam o cuidado e a
atenção ofertada por pais/cuidadores. Outrossim, percebeu-se também
desafogo relativo às múltiplas exigências de desprendimento de tempo que
ocasionam cansaço e exclusividade de atenção.

Categoria 3: Rotina familiar, Lazer e Religiosidade

Na Categoria 3 abordam-se aspectos da rotina familiar, lazer e reli-


giosidade da família, sobretudo após o diagnóstico de Transtorno do Es-
pectro do Autismo, conforme se observa a seguir:

Sim, houve muitas mudanças em nossas vidas depois da descoberta, prin-


cipalmente a rotina de tratamento dela que requer muito de mim e escola
e tudo ela precisa de acompanhamento e a rotina é que a gente não pode
trabalhar, tem que se dedicar só a ela. (C1)

Ele sempre vai para casa da vó dele, que ele gosta, as vezes para a chácara
dos meus vizinhos. Ele gosta de jogar bola com os meninos, mas eles já
sabem o jeito dele. (C7)

Sim sou evangélica, participo da igreja e às vezes levo ele comigo, porque
em outras ele não está muito bem. (C9)

Casas dos avôs, shopping, igreja, lugares que tenha praia, ele gosta muito
de praia [. ]. (C20)

Ele gosta muito de pula-pula daí o pai dele comprou um para ele, de vez en-
quanto eu e ele fica dentro desse pula-pula que ela gosta de pular, mas não
gosta de pular sozinho e as vezes eu pulo com ele. A gente sai para andar na
motoquinha, velocípede. Sempre participo dos lazeres com ele. (C18)

Sou católica e participo da comunidade católica Shalom, embora nem sem-


pre consigo frequentar porque às vezes ele está com muito problema. (C21)

O CUIDADO MULTIPROFISSIONAL E FAMILIAR À PESSOA NO ESPECTRO DO AUTISMO:


A IMPORTÂNCIA DA COMPLEMENTARIDADE TERAPÊUTICA
248 PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE

Pelas descrições, percebe-se que apesar das especificidades e alte-


rações típicas do TEA, o simples fato de apresenta-lo não é uma condição
para que estas pessoas deixem de participar de eventos religiosos e de la-
zer, além de jogos e brincadeiras comuns da idade das crianças, como fre-
quentar parques, casa de familiares e espaços religiosos.
Ressalta-se a importância do apoio espiritual/religioso às famílias de
crianças com TEA, pois a crença em um ser superior sustenta a esperan-
ça, ameniza a angústia de conviver com as implicações do TEA e facilita a
adaptação da família as adversidades vivenciadas no cotidiano. Além do
mais, a espiritualidade assume um importante tipo de apoio social, a qual
se apresenta não como solução do problema, mas sim como uma modali-
dade de ajuda para o enfrentamento de adversidades, amenizando a dor e
o sofrimento, diminuindo a ansiedade e a depressão. Além disso, a relação
entre irmãos é um importante recurso de socialização, pois possibilita tro-
cas e interação (HERBES; DALPRA, 2016).
É obrigação dos órgãos e entidades do poder público assegurar às
pessoas com deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, decor-
rentes da Constituição Federal, inclusive os direitos à cultura, desporto,
turismo e lazer. Nesse sentido, as pessoas com deficiência deverão ser in-
cluídas, respeitadas suas limitações, em todas as iniciativas relacionadas à
cultura, desporto, turismo e lazer, sendo facilitado o acesso, o ingresso e a
permanência desta parcela da população em todos os serviços oferecidos
pela comunidade. (BRASIL, 2013).
Diante das dificuldades relacionadas ao comportamento da criança,
são utilizadas predominantemente as estratégias de ação direta e de aceita-
ção. Para lidar com as emoções, recorre-se preferencialmente à distração,
busca de apoio social/religioso, inação e evitação (SCHMIDT; DELL’AGLIO;
BOSA, 2007).
As características clínicas da síndrome afetam as condições físicas
e mentais do indivíduo em diferentes níveis, de acordo com o seu grau
de comprometimento. Há, então, uma possível sobrecarga decorrente dos
cuidados especiais exigidos pela criança autista, assim, a condição afeta
todos os membros da família, causando estresse diretamente, como na re-
dução das interações sociais (LEE et al., 2008).

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PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE 249

Considerações finais

A terminologia Transtorno do Espectro do Autismo identifica uma


condição neurodesenvolvimental compreendida por meio de avaliações
comportamentais, caracterizada por déficits na comunicação social, na in-
teração, na sensibilidade sensorial, coordenação motora e níveis de aten-
ção e que geralmente cursa com a presença de complicações relativas ao
empenho e à realização de atividades.
Constatou-se que a grande maioria dos cuidadores participantes da
pesquisa é composta por mães, que não desenvolve atividade ocupacional,
portanto, dedicam seu tempo exclusivamente para os cuidados da casa e
do(s) filhos(s), sendo que todos realizam algum tipo de acompanhamento,
sendo que os pais/cuidadores estão satisfeitos com o tratamento multipro-
fissional. Além disso, observou-se que os cuidadores entendem a impor-
tância em realizar o tratamento e acompanhamento corretamente visando
assim a melhoria do desenvolvimento da criança ao longo dos anos, haja
vista que as intervenções objetivam melhorar a vida das pessoas com TEA,
uma vez que ainda não há cura para o transtorno.
Assim, sabendo-se das dificuldades de se cuidar de pessoas no Es-
pectro Autístico, é fundamental que os cuidadores tenham à sua disposição
uma rede de suporte, seja da família e amigos, mas também do Estado,
por parte dos sistemas de saúde, educação, social e segurança pública com
vistas a estimular o desenvolvimento das pessoas com TEA e buscar sua
inserção nos mais diversos âmbitos, para que as mesmas tenham uma vida
o mais próximo possível do típico. Além do mais, a atenção multiprofis-
sional e interdisciplinar é essencial para que a pessoa tenha as maiores e
melhores oportunidades possíveis de desenvolver habilidades essenciais
no contexto psico-socio-educacional e quiçá profissional.

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O CUIDADO MULTIPROFISSIONAL E FAMILIAR À PESSOA NO ESPECTRO DO AUTISMO:


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250 PARTE III — EDUCAÇÃO, SAÚDE E SOCIEDADE

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FRANCIDALMA SOARES SOUSA CARVALHO FILHA • MARCUS VINÍCIUS DA ROCHA SANTOS DA SILVA • HILMA MIRELLA COSTA E SILVA
IEL MARCIANO DE MORAES FILHO • EUTIMA KLAYRE PEREIRA NUNES • MARESSA LAÍS DE OLIVEIRA COELHO
Um material do livro :

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Bibliotecária: Perpétua Socorro Tavares Guimarães CRB 3/ 801-98
Pesquisas interdisciplinares sobre formação e práticas educativas nos contextos socioeducacional,
saúde e direito /Franc-Lane Sousa Carvalho do Nascimento, Andressa Graziele Brandt, Nadja
Regina Sousa Magalhães, et al. [organizadoras]. – Fortaleza:Imprece, 2019.
307 p.
ISBN: 978-85-8126-204-8
1. Educação 2. Contextos educacionais I. Nascimento, Franc-Lane Sousa Carvalho do II.Brandt,
Andressa Graziele III. Magalhães, Nadja Regina Sousa IV. Título.
CDD: 370

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