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A casa dos Irmãos Carvalho era solitária e desprovida de qualquer presença
feminina. A mãe dos Irmãos veio de Cuiabá no Mato Grosso quando eram crianças.
Divorciou-se do pai que era alcoólatra e vieram embora para Anápolis. Com a morte de
Jósa e o ingresso dos dois irmãos mais novos no crime, ela foi morar em Aragarças,
divisa entre Goiás e Mato Grosso. Deveria estar na faixa dos quarenta anos e a julgar
pela beleza dos jovens seria uma mulher muito bela, porém, não se casou de novo e
vivia num hotel de Aragarças. O hotel pertencia a uma tia dos Irmãos que ficara viúva e
deu abrigo a irmã. Ney estava com dezenove anos e Dimá com vinte e um, mas já eram
tão conhecidos pela Polícia da cidade quanto Jósa e Mendinha. Ney era solteiro e não
tinha uma namorada fixa: seus encontros amorosos com mulheres aconteciam longe
dali. Dimá era pai de uma menina de cinco anos que vivia com a jovem que era sua mãe
e ainda mantinha um relacionamento amoroso com ele, mas nenhuma mulher visitava
aquele lugar, zelado apenas por eles.
A casa era espaçosa e deveria ter um cinco quartos que não dispunham de
camas, por isso, Pareja e Elias dormiram na sala, sobre colchonetes de espuma. Logo
pela manhã Elias foi a sua Belina velha e voltou com uma mala onde estavam os
disfarces de seu novo personagem. O mais difícil que achava não deveria ser criar
personagens ou representa-los e sim representar alguém que realmente existia: este era o
caso do Doutor Adalberto Viana.
Dimá havia lhe dado uma fotografia saída numa das maiores revistas de Direito
do Brasil e nela estava o homem que Elias deveria tornar-se, através das artes cênicas.
Um terno bege e uma gravata discreta. Uma imitação de óculos Bulgari comprada em
camelô. Uma imitação barata de um relógio Louis Moinet Magistralis no pulso
(verdadeiro deveria custar o mesmo preço de uma Ferrari). Uma imitação de um par de
sapatos italianos da marca Testoni (dos mais caros do mundo). Elias olhou-se num
espelho e chamou Ney e Dimá que disseram ser ele uma cópia do Doutor Adalberto.
Pareja que já tinha assistido entrevistas com o Vice-Presidente da OAB disse estar
vendo o próprio Advogado em sua frente. Só faltava o carro com chofer que conduziria
o Doutor a cadeia municipal. O veículo seria providenciado por Cigano Mete Bala.
Cigano Mete Bala só foi chegar à casa dos Irmãos à uma hora da tarde, atrasado
uns quarenta minutos. Elias e Pareja que seria o chofer o esperavam defronte a casa. Ao
verem o carro que seria usado se assustaram. Pareja assoviou ao ver o Lamborghini
luxuosíssimo ali parado. Como quem contasse vantagem, Cigano disse-lhes que o
Lamborghini era o único em Anápolis e Goiânia, pertencendo ao sobrinho do
Governador. O rapaz era chefe do jogo-do-bicho e dono de Boates de luxo em Goiânia:
devia favores a Cigano e os saudava com aquele empréstimo.
Quando chegou a AV. Carlos Silva, Pareja fez questão de dirigir o Lamborghini
bem devagar como se o desfilasse: o resultado foi os comerciantes saindo de seus
estabelecimentos para verem o luxuoso veículo. Elias conferia a carteira de identidade
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falsificada com sua foto, disfarçado no Doutor Adalberto Viana. O grupo pensou até
mesmo nas credencias da OAB. Elias carregava um documento falso, assinado pelo
Presidente da República Itamar Franco. O documento era uma ordem legislativa com os
novos direitos dos Agentes Prisionais e PMS carcereiros. Neste Falso-comunicado: o
Congresso anunciava mais de cinquenta benefícios aos Militares prestadores de serviços
carcerários. O Doutor Adalberto vinha como um fiscal do governo e levaria notícias da
cadeia municipal ao Presidente da República que iria analisa-las para o envio dos
benefícios.
O Major perguntou com uma voz ríspida e com os dentes meio cerrados:
__É esquisito esse negócio do Presidente mandar lembrança pra mim, porque
ninguém manda lembrança pra quem não conhece! Eu não conheço o nosso Presidente!
Elias engasgou em seco e sentiu que tinha sido descoberto, mas corrigiu-se
dizendo:
__O senhor pode até não conhecer o Presidente, mas eu te garanto que ele já
conhece o seu trabalho aqui na cadeia de Anápolis! Todos lá em Brasília te elogiam!
Como Freud disse: “Nos defendemos diante de críticas, mas somos indefesos
perante aqueles que nos elogiam’”. O Major Andrade olhou para Elias com jeito de
gratidão e disse-lhe:
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__Os PMS de Anápolis fazem o melhor pra serem os melhores! É só isso!
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__Meu sonho é ser Coronel da Polícia Militar de Anápolis! O senhor sabe o
significado da palavra Coronel?
__Não Major, mas eu quero saber! Me conte que eu agora fiquei bem curioso!
__Tem que pensar positivo Major, é como diz os livros de autoajuda: “Nunca
desista de seus sonhos”’.
__Livro de autoajuda é coisa de quem não tem o que fazer! Um bobo escreve o
que todo mundo já sabe e outro bobo que já sabia, lê e acha que tá certo!
Elias garantiu ao Major Andrade que antes daquele ano terminar ele seria
Coronel da Polícia Militar na cidade.
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