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CAMINHOS DA FÉ

UMA EXPOSIÇÃO DOS


SALMOS DE ROMAGEM
© 2018 Augustus Nicodemus Lopes

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Estação da Fé
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Capa: Salvio Bhering
diagramação: Jasiene Guimarães
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(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil
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Nicodemus, Augustus
Caminhos da fé
1. ed. – Goiânia: Estação da Fé, 2018

ISNB 978856566244-4

1. Cristianismo 2. Fé 3. Palavra de Deus 4. Vida cristã I.Título

13-04730 CDD-234

Índices para catálogo sistemático:


1. Ensino bíblico : Doutrina cristã 234
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1ª edição - Maio de 2018


1a Edição
Goiânia
2018
ÍNDICE

7 Introdução
9 Salmo 120 - Enfrentando a mentira
19 Salmo 121 - Enfrentando os perigos da jornada
27 Salmo 122 - Jerusalém e o tabernáculo sombra de Cristo e
Sua igreja
39 Salmo 123 - Enfrentando a hostilidade
49 Salmo 124 - Se não fosse o Senhor
59 Salmo 125 - Enfrentando a adversidade
71 Salmo 126 - Como viver sempre alegre
83 Salmo 127 - Deus em primeiro lugar
95 Salmo 128 - A felicidade do que teme a Deus
107 Salmo 129 - Enfrentando o abuso
121 Salmo 130 - Das profundezas
135 Salmo 131 - Como vencer o orgulho do coração
145 Salmo 132 - Abençoarei a tua geração
159 Salmo 133 - Quando os irmãos vivem unidos

169 Salmo 134 -Abençoando e sendo abençoado


INTRODUÇÃO

E
ste livro é a exposição de uma série de salmos chamados
Salmos de Romagem, que tem início no Salmo 120 e vai
até o 134. É uma espécie de coleção de salmos dentro do
livro de Salmos. Como o nome sugere, eram salmos escritos para
serem entoados pelos peregrinos de Israel a caminho do Monte
Sião, em Jerusalém, para adorar no templo. Romagem, por sua
vez, significa uma peregrinação, uma caminhada com o objetivo
de visitar um lugar religioso. A Lei de Moisés mandava que os
judeus, pelo menos uma vez ao ano, fossem até Jerusalém, até o
templo, para adorar a Deus e fazer ofertas e sacrifícios. A alguma
das festas judaicas, o judeu tinha que comparecer; então, quando
chegava a época das festas, faziam-se caravanas de romeiros
judeus que saíam de toda parte na Palestina — e às vezes fora
dela — e caminhavam para Jerusalém levando animais para
serem sacrificados. Iam com as famílias, dormiam em tendas à
margem do caminho. Durante essas caminhadas, eles cantavam
esses salmos, do 120 ao 134. Cantavam outros também, mas
esses foram designados exatamente para aquela ocasião, por
isso é que eles são chamados de Salmos de Romagem. Era para
serem entoados durante a peregrinação que os judeus faziam até
Jerusalém.
O rei Davi escreveu pelo menos quatro desses salmos —
122, 124, 131 e 134 — e seu filho Salomão escreveu o 127; os
outros dez são anônimos. Os quinze salmos que compõem esta
coleção falam dos sentimentos do povo de Deus nas mais diversas
circunstâncias. Eles falam de angústia, esperança, confiança,
tristeza, alegria, dor, vingança, adversidade, queda pelo pecado,
confissão do pecado, tristeza pelos erros e reconciliação. Ou seja,
CAMINHOS DA FÉ

esses salmos expressam quase toda a gama de sentimentos e de


experiências que nós humanos, caídos, redimidos pela graça de
Deus, experimentamos aqui neste mundo.
Porém, o tema central de todos eles é que nós devemos
buscar a Deus em meio a todas essas circunstâncias. Esses
sentimentos descritos nos Salmos de Romagem ocorrem enquanto
estamos peregrinando. Nós mesmos estamos em peregrinação e
sabemos que o nosso lar não é aqui. Estamos caminhando para o
templo espiritual, a Jerusalém celestial, o reino eterno que Deus
preparou antes da fundação do mundo. Somos romeiros aqui
neste mundo, estamos caminhando. Infelizmente, há muitas
pessoas que não veem assim. Elas vivem e agem como se fossem
morar aqui para sempre, não conseguem ver mais além do que a
realidade presente.
Esses salmos, portanto, são apropriados para nos instruir
durante a nossa caminhada, como nós devemos nos comportar
diante dessas situações. Eles nos lembram de que somos romeiros
a caminho de nosso lar celestial. Eles nos mostram como Deus
nos trata em todas essas situações, encorajam-nos, nos animam e
nos fortalecem na fé que há em Cristo Jesus.
Estas exposições se baseiam em uma série de mensagens
que preguei nesses salmos nos cultos matutinos da Primeira Igreja
Presbiteriana de Goiânia. Minha oração é que esta obra seja uma
bênção na vida dos leitores.

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SALMO 120

ENFRENTANDO A MENTIRA

Na minha angústia, clamo ao Senhor, e


ele me ouve. Senhor, livra-me dos lábios
mentirosos, da língua enganadora. Que te
será dado ou que te será acrescentado,
ó língua enganadora? Setas agudas do
valente e brasas vivas de zimbro.
Ai de mim,
que peregrino em Meseque e habito nas
tendas de Quedar. Já há tempo demais que
habito com os que odeiam a paz. Sou pela
paz; quando, porém, eu falo, eles teimam
pela guerra.

Este livro apresenta uma série de mensagens sobre


os Salmos de Romagem. E o primeiro é exatamente este, o
Salmo 120. Nele, o salmista está refletindo sobre uma situação
angustiosa pela qual está passando. Ele habita entre gente hostil
a ele, gente que usa a mentira e a bajulação para tirar a sua paz e
para destruí-lo, e ele não tem o que fazer. Sente-se encurralado.
Então ele clama a Deus, pedindo-lhe que o liberte daqueles
mentirosos, que Deus o livre de quem o calunia e que lhe faz o
mal. E o Senhor responde, mas de uma forma diferente: em vez
de tirar os lábios mentirosos e os caluniadores, Deus, na verdade,
CAMINHOS DA FÉ

faz com que o salmista olhe para aquela situação através de uma
perspectiva diferente.
Eu penso que este salmo se aplica muito bem a cada um
de nós que pelo menos uma vez na vida já passou por situação
parecida. Assim, vamos ver em primeiro lugar a situação
angustiosa do salmista, depois a oração que ele fez, em seguida
a maneira como ele posteriormente olha para a situação e o seu
lamento final, junto à sua decisão de perseverar em meio àquele
povo.
Ele diz no verso 2: Senhor, livra-me dos lábios mentirosos e
da língua enganadora. Nisso, ele revela o que estava lhe trazendo
angústia. Havia pessoas que estavam mentindo sobre ele; é o que
lábios mentirosos quer dizer. Provavelmente se trata de pessoas
que estavam difamando o seu nome, caluniando, injuriando e
espalhando inverdades a seu respeito. Ele estava sendo alvo de
uma campanha de difamação e de assassinato de caráter, o seu
nome estava sendo vilipendiado, pessoas estavam falando dele,
e não estavam falando a verdade, porque provavelmente não
o conheciam ou porque estavam repetindo aquilo que haviam
ouvido.
Essas pessoas não queriam paz com ele (120.6-7); queriam,
na verdade, polêmica, porque ele diz que mora no meio de gente
que odeia a paz e que teima pela guerra, mesmo quando ele quer
ter paz com essas pessoas. Então ele pede a Deus: Senhor, livra-me
dos lábios mentirosos e da língua enganadora (120.2). O salmista
se vê ali naquela situação em que é alvo de mentiras, calúnias,
bajulação e falsidade.
Ele estava nessa situação terrível e, como tal, em uma
profunda angústia. Observe o verso primeiro: Na minha angústia
clamo ao Senhor, e ele me ouve. A palavra angústia aqui denota
alguém que está preso em uma jaula, ou seja, ele se sentia
encurralado, sem saída; ele olhava aquela situação toda e não
sabia o que fazer. Para onde quer que olhasse, não havia saída, as
mentiras e calúnias estavam aumentando e ele se sentia como que
prensado à parede.

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SALMO 120 - ENFRENTANDO A MENTIRA

Em seguida, nós lemos sobre a sua oração: Na minha


angústia clamo ao Senhor, e ele me ouve (120.1-2). Aqui, na
verdade, ele não está somente dizendo o que está fazendo, mas
está também se lembrando de outras situações em que clamou a
Deus, e Deus o ouviu. Ele antes já havia buscado a Deus, e Ele
o tinha escutado. Por isso é que ele agora se anima a fazer isso
novamente. Ele se sente enjaulado e angustiado, mas lembra que
antes já havia orado a Deus, e Deus o escutara. Essa é a motivação
que o leva a buscar ao Senhor.
Agora observe os três pontos da oração dele:
Primeiro: ele clama. Ou seja, é mais do que pedir. O
clamor é um pedido intenso, fervoroso e cheio de desejo, mostra
a dependência que a pessoa tem de Deus e revela a sua humildade.
É um grito de socorro de alguém que se sente encurralado.
Segundo: o nome que ele usa para se referir a Deus. No
Antigo Testamento há vários nomes que são usados para se referir
a Deus. Aqui o salmista usa o nome com o qual Deus se revelou
à nação de Israel: YAHWEH, “Eu sou o que sou, eu sou o Deus
que existe desde toda a eternidade, não há como me definir,
porque eu sou aquilo que sou e não tem ninguém igual a mim”.
Foi com esse nome que Deus se revelou a Moisés e mais tarde
na aliança que fez com o Seu povo. E é a esse Deus, o Deus do
pacto, da aliança, o Deus Todo-Poderoso, que ele clama, a quem
ele pede socorro, porque ele não vê saída para aquela situação em
que se encontra.
Terceiro: ele clama em sua angústia. Na minha angústia
clamo ao Senhor. Nem todos fazem isso quando estão angustiados.
Com muita frequência, quando as pessoas estão se sentindo
angustiadas e desesperadas, elas blasfemam de Deus, questionam
a Deus, perguntando por que isso lhes está acontecendo,
abandonam ao Senhor ou deixam de buscá-lo, endurecem o
coração e não poucas vezes se afundam no pecado mais e mais.
Porém, esse homem, em sua angústia, clamou a Deus e pediu
socorro em meio a todo aquele sofrimento.

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CAMINHOS DA FÉ

Deus já o havia atendido e haveria, então, de livrá-lo mais


uma vez. No verso 2, ele clama angustiosamente ao Senhor que o
livre dos lábios mentirosos e da língua enganadora, pede que Deus
remova, mande para longe aqueles mentirosos que estão falando
dele, aquelas pessoas que estão promovendo aquela campanha de
difamação contra ele. Geralmente essa é a oração que nós fazemos
quando estamos diante de uma situação de aperto. O próprio
Senhor Jesus, no Getsêmani, orou de uma forma semelhante
diante da perspectiva da cruz, da traição e dos soldados que se
aproximavam para prendê-lo e levá-lo à morte (Mt 26.39).
O apóstolo Paulo também, ao receber um espinho na
carne, causa de grande sofrimento e angústia, três vezes orou
a Deus para que o removesse (2Co 12.7-8). É a oração mais
natural que nós fazemos, quando estamos passando por alguma
dificuldade, problemas financeiros ou de relacionamento. Nós
pedimos que Deus remova a causa do sofrimento, que leve para
longe esse tropeço ou as pessoas que nos estão fazendo mal, que
resolva a situação.
Porém, vemos que Deus não atendeu ao pedido do
salmista exatamente daquela forma (120.3-4). Ele agora olha
para a situação através de outra perspectiva, do ponto de vista de
Deus, pois passa a refletir o que é que vai acontecer com aqueles
mentirosos e enganadores que estavam atacando o seu próximo.
E então ele fala com aquelas pessoas dirigindo-se à língua delas,
como se a língua fosse uma pessoa, com a seguinte pergunta:
Que te será dado, ou que te será acrescentado, ó língua enganadora?
Em outras palavras, ele começa a pensar no que esse pessoal iria
ganhar, o que é que Deus lhes iria dar pelo que estavam fazendo.
Deus, então, lhe responde, afirmando que vai retribuir
a essas pessoas de acordo com o pecado que elas estavam
cometendo: Setas agudas do valente, e brasas vivas de zimbro
(120.4). Naquela época, uma das armas de guerra mais letais
era a flecha. O guerreiro levava uma aljava de setas muito bem
polidas e afiadas que eram mortais se disparadas no lugar certo.
A língua enganadora é como uma seta, os lábios mentirosos são

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SALMO 120 - ENFRENTANDO A MENTIRA

como flechas que são disparadas, penetram no coração, na alma


da pessoa, e causam um sofrimento muito grande. Deus, então,
como é justo, vai fazer com que os mentirosos experimentem
o seu próprio remédio, mandando contra eles setas agudas do
valente.
E quem é que vai mandar essas setas? Não é o salmista,
ele não está pagando o mal com o mal, não está retribuindo da
mesma forma, mas ele espera em Deus, que Ele faça justiça no
tempo certo. Deus haverá de cuidar deles. E não serão somente
setas afiadas, são mencionadas aqui brasas vivas de zimbro.
Zimbro era uma madeira muito densa e que era excelente para
fazer carvão, porque fazia um carvão muito quente e que durava
bastante. Então o salmista diz: “Sabe o que é que Deus vai dar
a você, língua enganadora, lábio mentiroso, que difama, que
espalha a mentira e a calúnia, causando incêndios, causando fogo
e desgraça em meio ao povo de Deus? Deus vai colocar brasas
vivas de zimbro sobre você, ou seja, Deus vai lhe castigar na
mesma medida em que você tem feito o mal”.
O salmista, a princípio, havia pedido a Deus para livrá-lo
desses mentirosos. Mas Deus lhe manda ficar exatamente onde
está, ouvindo as mentiras e as calúnias. Porque um dia Ele irá
fazer justiça. Talvez não seja exatamente neste momento da nossa
peregrinação, mas no final da peregrinação, quando tivermos
chegado ao novo céu e à nova Terra, quando Cristo vier e instalar
o Seu reino. Deus, então, haverá de retribuir com justiça contra
todo o pecado que foi cometido aqui neste mundo, e todo pecado
receberá o justo juízo. É com isso que o salmista se consola. Agora
ele não está mais na expectativa de sair daquela situação, de os
mentirosos serem removidos, mas ele permanece ali e entrega o
caso a Deus, pois o Senhor haverá de fazer justiça. Ele conhece a
verdade e, no tempo certo do Senhor, Ele haverá de fazer justiça
e juízo.
Em seguida, o salmista lamenta a sua situação, mas está
disposto a procurar a paz e a perseverar em meio àquelas pessoas
ainda que se sinta muito cansado e desanimado com a situação

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CAMINHOS DA FÉ

(120.5-7). Ele lamenta, no verso 5: Ai de mim. Não faz mal que


façamos isso de vez em quando; uma campanha de difamação não
é algo fácil de combater, ser alvo de mentiras, críticas, calúnias,
quando não são verdadeiras. Então, quando essas coisas não
procedem, ai de mim! Não é errado você chegar diante de Deus
e dizer: “Deus, estou sofrendo, estou passando por dificuldades,
estou sentindo em meu coração todo esse sofrimento”.
O salmista expressa o sentimento dele, dizendo: Ai de mim,
que peregrino em Meseque, e habito nas tendas de Quedar (120.5).
Meseque e Quedar eram duas regiões opostas e muito distantes
de Israel. Meseque ficava na Ásia Menor, ao norte, uma região
habitada por pagãos, e Quedar era na Arábia, local de uma tribo
pagã hostil, guerreira e predadora. Ninguém pode morar em dois
lugares ao mesmo tempo. O que ele provavelmente está dizendo
é que, mesmo que estivesse entre o povo de Deus, em meio a
pessoas que ele conhecia e com as quais tinha familiaridade, ele
se sentia um estrangeiro, como se morasse em Meseque ou em
Quedar. E ele estava cansado daquela situação, observe o verso 6:
Já há tempo demais que habito com os que odeiam a paz.
As pessoas que estavam promovendo aquela campanha
não queriam paz com ele; na verdade, odiavam-na, e os esforços
que ele fazia pela paz não tinham resultado. Observe o verso 7:
Sou pela paz, quando, porém, eu falo eles teimam pela guerra. Ou
seja, ele estava vivendo em um ambiente hostil, no meio do seu
povo, talvez no meio do povo de Deus ou em um ambiente de
pagãos — o salmo não deixa claro qual era a situação histórica
precisa do salmista — mas, ou entre o povo de Deus ou entre os
pagãos, ele estava se sentindo um estrangeiro no meio de um povo
que queria guerra, que odiava a paz. Ainda assim, ele persevera,
mora ali no meio daquele povo, fala com aquele povo, busca a paz
e a reconciliação com eles, mesmo que falassem mentiras contra
ele e fizessem difamação.
Este salmo tem aplicações práticas bem relevantes para
todos nós, mas eu queria que, antes de você se colocar no lugar do
salmista, você trocasse de posição. Será que algumas vezes não é

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SALMO 120 - ENFRENTANDO A MENTIRA

você o responsável por isso ter acontecido? Por exemplo, será que
nas redes sociais você não está falando mal, criticando, espalhando
boatos e atacando uma pessoa? Ou mesmo pessoalmente, faz
fofoca, fala mal dos outros, comentando sobre os pecados e erros
das outras pessoas e criticando-as? Então, antes de você se colocar
no lugar do salmista, coloque-se no lugar do lábio mentiroso e
pergunte honestamente a Deus se você tem sido instrumento
do pecado para fazer com que essa situação ocorra no meio do
Seu povo. Como é que você está usando a sua língua? Porque
não são poucas as vezes em que situações são criadas exatamente
porque no meio do povo de Deus nós teimamos pela guerra, não
queremos promover a paz, e a melhor maneira de acabar com a
paz é você começar uma campanha de difamação.
Agora que fizemos isso, vamos inverter: somos o salmista.
Talvez você esteja sofrendo com uma campanha de difamação
ou sendo alvo de críticas e de mentiras. Talvez no trabalho, que é
um lugar onde facilmente — e especialmente se é um ambiente
hostil — um crente verdadeiro experimenta esse tipo de coisas,
lábios mentirosos e língua enganadora; talvez na escola, na
universidade ou na família, porque há parentes que nem sempre
vão conosco e sabemos como esse tipo de situação em família é
pior ainda. Há, ainda, o caso de pastores evangelistas, obreiros,
missionários, trabalhando em lugares hostis. É uma situação
muito comum. Não poucas vezes eles vão pregar o Evangelho em
um ambiente ou a um povo que é extremamente hostil, onde a
resistência ao cristianismo é muito grande.
O salmo nos ensina a clamar a Deus em nossa angústia:
Na minha angústia clamo ao Senhor, e ele me ouve. Lembra-nos
de que Deus responde às orações, como o salmista relata aqui.
Ensina-nos a não deixarmos o ressentimento nem a mágoa
entrarem e habitarem em nosso coração; lembra-nos de que nem
sempre Deus responde às nossas orações por livramento, tirando
o incômodo, como Paulo queria que Deus tirasse o espinho na
carne. Conscientize-se de que nem sempre Deus vai livrá-lo de
situações angustiosas como essa removendo a dor e a causa do

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CAMINHOS DA FÉ

sofrimento, porém Ele quer lhe dar graça para que você diga:
“Deus, eu entrego essas pessoas nas Tuas mãos e, mesmo que elas
busquem a guerra comigo, eu vou continuar a buscar e a promover
a paz”. É assim que a palavra de Deus nos ensina como combater
o mal: é vencer o mal com o bem, é vencer a mentira, a crítica e
a fofoca com oração e busca de paz, e não com ressentimento e
amargura.
Quero finalizar dizendo que este salmo pode ser considerado
— e tem sido considerado por muitos — como sendo um salmo
messiânico, porque quem é que passou por isso de forma perfeita
senão o nosso Senhor e salvador Jesus Cristo? Ele foi caluniado,
vilipendiado, traído, levantaram mentiras e injúrias contra Ele e
finalmente O mataram. Ele falava de paz, mas onde Ele andava
os inimigos iam contra Ele e queriam destruí-lo, por mais que
Ele falasse de paz e do Reino de Deus. Muitos estudiosos acham
que este salmo expressa os sentimentos do Messias, que, mesmo
que estivesse entre nós, foi como um estrangeiro, hostilizado,
perseguido, veio para o que era Seu, e o Seus não O receberam. E
é unido a Ele que você poderá enfrentar essa situação. Não tente
viver isso pelo seu esforço próprio, porque você não vai conseguir.
A nossa reação, quando as mentiras chegam, quando a calúnia e a
crítica se aproximam, é reagir, defender-nos da mesma forma e às
vezes de forma até mais intensa. Você só o conseguirá tendo paz,
humildade, pagando o mal com o bem, orando pelos inimigos e
esperando na graça de Deus mediante Jesus Cristo.
Este salmo, portanto, é um incentivo para que nós
andemos com o Senhor Jesus, que enfrentou e venceu esse tipo
de situação. Por isso, as grandes perguntas que este salmo nos faz
são: estamos unidos a Cristo? É dele que tiramos o poder para
viver neste mundo? Reagimos a essas coisas como Ele reagiu? O
espírito dele habita em nós e nos capacita a viver dessa forma? São
perguntas para que nós nos examinemos e vejamos como é que
reagimos à mentira, à calunia e à fofoca que vêm contra nós. Este
salmo nos mostra como devemos fazer: em oração e dependência
de Deus, perseverança na busca da paz e da reconciliação.

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SALMO 120 - ENFRENTANDO A MENTIRA

ORAÇÃO:

Ó Deus, dá-nos a Tua graça para aprendermos a clamar ao


Senhor em nossa angústia e olhar a situação da Tua perspectiva.
Um dia o Senhor haverá de estabelecer toda a verdade, toda a
justiça. Até esse dia, no final da nossa peregrinação, enquanto
somos romeiros, ajuda-nos a buscar a paz, ajuda-nos, Senhor,
a buscar reconciliação, mesmo contra aqueles que falsamente
nos acusam. Graças te damos, ó Deus, pelo Teu filho Jesus, que
enfrentou a mentira, a língua enganadora e os lábios mentirosos e
saiu vitorioso. Faz com que o poder da ressurreição esteja também
em nosso coração para que façamos da mesma forma. É em nome
dele que oramos. Amém.

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SALMO 121

ENFRENTANDO OS PERIGOS DA JORNADA

Elevo os olhos para os montes: de onde


me virá o socorro? O meu socorro vem
do Senhor, que fez o céu e a terra. Ele
não permitirá que os teus pés vacilem; não
dormitará aquele que te guarda. É certo
que não dormita, nem dorme o guarda
de Israel. O Senhor é quem te guarda; o
Senhor é a tua sombra à tua direita. De
dia não te molestará o sol, nem de noite,
a lua. O Senhor te guardará de todo mal;
guardará a tua alma. O Senhor guardará
a tua saída e a tua entrada, desde agora e
para sempre.

O salmo 121 é o segundo da coleção chamada Salmos de


Romagem, que são uma espécie de saltério dentro do livro dos
salmos. Como já foi dito na Introdução, esses salmos formam
uma coleção de hinos que eram cantados pelos peregrinos judeus
quando se dirigiam a Jerusalém, pelo menos uma vez por ano,
para o templo que ficava no Monte Sião, para participar de uma
das três grandes festas dos judeus.
Durante a caminhada, que às vezes poderia durar dias,
esses peregrinos judeus que vinham de cidades da Palestina e de
fora dela caminhavam em direção a Jerusalém e entoavam estes
CAMINHOS DA FÉ

salmos, que falam de muitas experiências que eles passavam, as


quais nós passamos também; tristezas, alegrias, há salmos de
confissão de pecado, outros que falam de esperança… como nós
vimos no capítulo anterior, o salmo 120 fala sobre como lidar
com a calúnia e a mentira quando nos acusam falsamente.
Essa coleção de salmos era muito querida por grandes
homens de Deus através da História, e eu tenho certeza de que
a explicação deles também trará conforto, orientação e sabedoria
para nós, que estamos em nossa peregrinação, caminhando para
a Jerusalém celestial, e passamos por tantos perigos e desafios.
A nossa caminhada é marcada por dificuldades, e estes salmos
nos lembram de como Deus deseja lidar conosco em meio a essa
peregrinação.
O salmo 121 nos lembra de que nós devemos buscar o
socorro de Deus em toda e qualquer situação que enfrentarmos
em nosso caminho neste mundo. Iniciemos com a pergunta do
salmista. No verso primeiro, ele pergunta: De onde me virá o
socorro? Essa pergunta era muito pertinente, porque havia muitos
perigos no caminho do peregrino até chegar a Jerusalém. Havia
perigo de salteadores e ladrões que ficavam esperando aquela
época do ano para fazer o arrastão, assaltando os peregrinos e
levando os seus pertences, quando não a sua própria vida; havia
animais selvagens como leões e ursos; às vezes, o caminho era
íngreme e montanhoso. Dependendo de onde ele vinha, o
peregrino tinha que atravessar uma cordilheira que ficava mais
ao norte de Jerusalém, onde o caminho era pedregoso e sujeito
a deslizamentos de pedras e rochas. Durante o dia, dependendo
da época do ano, o sol era muito escaldante, e as noites eram
extremamente frias. Havia perigos de dia e havia perigos à noite.
Assim, o peregrino a caminho de Jerusalém, o homem temente a
Deus, vulnerável, com sua mulher e filhos, levando animais para
serem sacrificados e muita bagagem, sente a sua vulnerabilidade e
a sua fraqueza e pergunta: De onde me virá o socorro?
Quem poderia socorrê-lo, então, em meio a tantas
dificuldades? Observe que ele faz essa pergunta depois de levantar

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SALMO 121 - ENFRENTANDO OS PERIGOS DA JORNADA

os olhos para os montes: Elevo os olhos para os montes e pergunto


de onde virá o socorro , ou seja, ele faz essa pergunta a si mesmo
depois de ter levantado os olhos para os montes. Havia muitos
montes no caminho do peregrino para Jerusalém, mas eu não
penso que aqui ele esteja se referindo aos montes que cercavam a
estrada. Ele está levantando os olhos para os montes de sua terra
natal ainda distantes, os montes de Jerusalém, especialmente o
Monte Sião, onde estava o templo de Deus e a arca da aliança, o
altar dos sacrifícios, onde os levitas celebravam o culto a Deus e
onde o sacerdote ministrava o perdão de Deus. É para lá que ele
está levantando os olhos.
Quando ele levanta os olhos para o Monte Sião, há uma
súplica, um pedido silencioso àquele que habita em Sião, Àquele
que habita nos montes de Jerusalém. Assim, essa expressão elevo
os meus olhos para os montes é um pedido de socorro ao Deus que
habita no Monte Sião, o Deus que escolheu Jerusalém para ser o
local de Sua habitação. É para lá que ele eleva os seus olhos e é de
lá que ele espera o socorro, como ele diz logo em seguida: O meu
socorro vem do Senhor, que fez o céu e a terra (121.2). Ou seja, ele
sabe que o seu socorro não está na companhia dos homens com
quem ele viaja, não está nas armas que eles estão levando para se
defender ou em algum tipo de equipamento. Não, a confiança e
o socorro dele estão exclusivamente no Senhor que fez os céus e a
terra. Se Deus não o socorrer, o salmista sabe que não virá socorro
de mais ninguém. Se nossa ajuda não vier do alto, ela não virá de
lugar algum.
Por que ele menciona aqui especificamente Deus como
o Criador dos céus e da terra nessa situação? A resposta é
simples: Deus fez os céus e a terra, portanto Ele domina sobre as
circunstâncias, Ele é Senhor de toda a criação, nenhuma criatura
tocará no salmista sem a permissão de Deus, e esse Deus usará
todas as criaturas que Ele quiser para proteger o salmista. As
dificuldades que vão acontecer, vão acontecer no mundo do qual
Deus é Senhor. O socorro do salmista está no Deus que fez todas
as coisas, os céus, a terra, o mar, que criou os ursos, os leões, que

21
CAMINHOS DA FÉ

criou as montanhas, os vales, que criou a raça humana. Ele não


somente criou todas as coisas, mas também preserva e mantém
todas elas e nos acompanha, Ele está conosco. Daí a esperança
do salmista no verso 2, e o seu coração descansa diante de todos
aqueles perigos.
Em seguida, até o verso 8, ele dá uma explicação do que
é que Deus faz para socorrer o Seu povo aqui neste mundo. Ele
pergunta: De onde me virá o socorro? E então responde: O meu
socorro vem do Senhor, que fez o céu e a terra. Pode ser o próprio
Deus respondendo: “Eu, o Senhor que fez os céus e a terra, não
permitirei que o teu pé vacile; vou te guardar de todo mal”. Pode
ser uma resposta do próprio Deus ou pode ser, de repente, uma
declaração de seu companheiro de viagem: “Olhe, Ele não deixará
que o teu pé vacile, Ele vai te guardar de todo mal, vai guardar tua
entrada, vai guardar tua saída”. Ou, mais provavelmente, é uma
explicação que o salmista está dando a si mesmo, pois ele olha
para os montes e diz: De onde virá o seu socorro? O coração dele
diz: Meu socorro vem de Deus que fez os céus e a terra, e aí ele pensa:
“Mas como é que Deus vai me guardar aqui neste mundo? Que
tipo de proteção e de socorro Deus vai me dar aqui neste mundo?”.
E então ele começa a falar consigo mesmo, assegurando-se de que
Deus haverá de protegê-lo.
Isso não é recitação de um mantra e tampouco pensamento
positivo. Porque sabemos que há pessoas que têm essa prática
de, quando estão em uma situação difícil, começar a rezar o Pai
Nosso como se a repetição de determinadas verdades bíblicas
em si pudesse ajudar-lhe ou tirar daquela dificuldade. O que o
salmista faz aqui é falar consigo mesmo. Ele já sabe que o seu
socorro vem do Senhor que fez os céus e a terra e aí começa a
pregar para si mesmo. Essa pregação que ele faz de que Deus o
guarda é resultado das promessas que ele já conhece, resultado
da história do seu povo. Ele lembra quem é Deus, o que Ele fez
e qual é o poder dele disponível para socorrê-lo e para ajudá-lo.
Neste capítulo, você terá o resumo dessas promessas que
Deus fez e faz ao Seu povo de guardá-lo em todo tempo. São

22
SALMO 121 - ENFRENTANDO OS PERIGOS DA JORNADA

quatro promessas desse Deus, feitas em socorro ao Seu povo. A


primeira é que Deus promete que vai guardá-lo em todo lugar:
Ele não permitirá que os teus pés vacilem; não dormitará aquele que
te guarda. É certo que não dormita, nem dorme o guarda de Israel
(121.3-4). Como eu disse, o caminho era longo e variado, havia
hora em que era subida, hora em que era descida; hora em que
o caminho era pedregoso, hora em que passava por campinas.
Deus está dizendo ao peregrino que, onde quer que ele estivesse
no caminho, Ele não iria permitir que o seu pé tropeçasse, Ele
iria guardar o seu pé, fortalecer os seus pés no caminho para que
ele não tropeçasse em momento algum. Deus lhe diz que não irá
nem cochilar, mas vai ficar atento, os Seus olhos estarão abertos
sobre o salmista durante o caminho; em todo lugar que ele fosse,
Deus o estaria vigiando. Veja o que diz o final do verso 3: Não
dormitará. Dormitar é cochilar, ou seja, não cochilará Aquele que
te guarda, não cochilará nem dormirá o Guarda de Israel.
Deus não somente promete que vai firmar os pés do
salmista para que ele possa caminhar em todo terreno, mas diz
que vai fazer isso com atenção. Sabemos que um vigia que cochila
não é de confiança. Mas, quando sabemos que há uma vigia que
não dorme à noite, o nosso coração fica tranquilo. Deus promete
que Ele não cochila e não dorme quando está cuidando de nós,
Ele vai firmar o nosso pé.
A segunda promessa é a de que Deus vai guardar o
peregrino em todas as ocasiões: O Senhor é quem te guarda; o
Senhor é a tua sombra à tua direita. De dia não te molestará o sol,
nem de noite, a lua (121.5-6). O sol representa os perigos do dia
e ele próprio trazia ameaças para a integridade dos viajantes. Os
raios muito fortes e a insolação eram uma ameaça bem real. A
lua representa os perigos da noite. Então, de dia ou à noite, Deus
haveria de preservar o Seu povo na caminhada para Jerusalém. No
verso 5, Deus se apresenta como sendo a sombra do peregrino.
A frase O Senhor é a tua sombra à tua direita pode significar a
própria sombra do peregrino. O significado, então, seria este:
aonde vamos, a nossa sombra vai. Deus está dizendo que Ele é

23
CAMINHOS DA FÉ

como a sombra, a nossa sombra, ou seja, está ligado a nós. Talvez


a figura seja da sombra lançada pelos montes ou pelas árvores e
que servia de refrigério durante o maior calor do dia. Nesse caso,
o sentido é que Deus é esse refrigério.
Note, no início do verso 5, a frase O Senhor é quem te
guarda. Esse papel de guardar o peregrino, Deus não deixou com
os anjos, Ele poderia mandar uma legião de anjos, porém Ele diz:
“Sou eu mesmo que vou guardar você aqui, sou eu mesmo que
vou lhe acompanhar durante todo o caminho”. É o Senhor quem
nos guarda.
A terceira promessa é a de que Deus vai guardá-lo de todo
tipo de males: O Senhor te guardará de todo mal; guardará a tua
alma (121.7). O que significa essa expressão todo mal? Significa
todo tipo de males, males circunstanciais, aquilo que nos acontece
aqui neste mundo, doenças, enfermidades, catástrofes, desgraças
que vêm sobre nós inesperadamente, males que nós não queremos,
não pedimos e gostaríamos que não acontecessem. Deus promete
nos guardar dessas coisas. Isso não quer dizer, porém, que elas
nunca vão nos acontecer, mas que Deus não vai permitir que
esses males nos levem ao mal maior, que é perdermos a nossa
alma, porque veja o que ele diz em seguida: O Senhor te guardará
de todo mal; guardará a tua alma. O pior mal que pode haver é
você perder a sua alma. Aqui nesta vida, nós passamos por muitas
dificuldades, nenhum peregrino está isento disso. Deus promete,
contudo, que Ele vai usar essas dificuldades, esse sofrimento e
essas angústias para nos santificar e nos firmar em Sua verdade e
em Sua palavra.
A quarta promessa é esta: O Senhor guardará a tua saída
e a tua entrada, desde agora e para sempre (121.8). Deus vai nos
guardar aqui e para sempre. A expressão guardará a tua saída e a
tua entrada pode representar a saída do peregrino de sua cidade,
o caminho todo, até a entrada em Jerusalém. Ou seja, durante o
percurso, o tempo todo Deus vai guardá-lo, vai protegê-lo e vai
estar com ele. Não somente na saída e na entrada, mas desde agora
e para sempre, Deus promete guardar e proteger o Seu povo.

24
SALMO 121 - ENFRENTANDO OS PERIGOS DA JORNADA

Quero concluir este capítulo com uma observação: por


que é que Deus promete isso? Ele não tem nenhuma obrigação
de nos proteger. A chave para nós entendermos essa promessa de
Deus e a confiança do salmista está no verso 4, quando, no final
do verso, lemos que Ele é o Guarda de Israel. E aqui essa expressão
nos leva para a doutrina da aliança. Israel era o povo da aliança,
Deus havia escolhido a nação de Israel dentre todas as demais
nações para ser o Deus daquele povo e para que eles fossem o
povo do Seu louvor e para a Sua glória. Deus lhes deu a Sua lei, a
Sua aliança, o culto. Deus fez promessas à nação de Israel e tinha
um pacto com ela. Por isso Ele é o guarda de Israel. Ele guarda
não somente a nação, mas todo Seu filho, todo membro da nação
de Israel dentro da aliança.
Nós, os que cremos em Jesus Cristo, somos os descendentes
de Israel. A Igreja é a continuação espiritual da nação de Israel.
Deus tem com a Igreja um pacto, uma aliança firmada no sangue
de Cristo, não no sangue de animais, como foi feito na antiga
aliança, mas no sangue do Cordeiro derramado na cruz. Somos o
povo da aliança, Deus é o nosso Deus, Ele prometeu nos salvar,
nos abençoar, nos guiar, nos proteger, nos perdoar e nos dar
o novo céu e a nova terra, onde habita a justiça. Por isso essas
promessas são seguras, devido à aliança de Deus conosco, feita
com o sangue precioso de Jesus, porque, não fora o sacrifício de
Cristo e o Seu sangue, Deus não teria nenhum compromisso
conosco, o sol nos molestaria de dia, a lua nos molestaria à noite,
o nosso pé vacilaria, seríamos malditos na saída e malditos na
entrada e a nossa peregrinação aqui não seria rumo a Jerusalém
celestial, mas ao Inferno eterno e ao sofrimento indizível por
conta de nossos pecados. Porém, por causa de Cristo e do que Ele
fez na cruz, Deus se oferece a nós, dizendo: “Eu sou seu guarda,
eu sou o seu socorro, eu não vou nem cochilar olhando para você,
eu vou guardar-lhe o tempo todo, em todas as situações, eu vou
guardar a sua alma, eu vou lhe preservar até aquele grande dia”.
Portanto, não podemos dar outra aplicação deste salmo
a não ser essa. Olhemos para os montes, olhemos agora para o

25
CAMINHOS DA FÉ

Monte do Calvário. Este é o monte para onde olhamos agora,


não o Monte Sião, mas o Monte do Calvário, onde o nosso
Salvador foi levantado por nós, e nós perguntamos de onde virá
o nosso socorro. O nosso socorro vem daquele que morreu por
nós na cruz, ressuscitou ao terceiro dia, está sentado à direita de
Deus Pai, Todo-Poderoso, de onde virá para julgar os vivos e os
mortos. É nele que está minha confiança, é nele que coloco a
minha esperança e é nele que espero, de dia e à noite, em qualquer
caminho, em todas as situações, que Ele guarde a minha alma.
Dificuldades virão, mas o meu socorro sempre estará presente, Ele
não vai permitir que eu seja tentado mais do que posso suportar,
Ele não vai permitir que Satanás quebre o meu relacionamento
com Ele. E nós podemos, como o apóstolo Paulo, dizer: Porque
estou certo de que, nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os
principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, nem a
altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá
separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor (Rm
8.38-39).
Que essa seja a sua esperança hoje, que você alegre o seu
coração e cultue a Deus de todo coração, louve-o e eleve os olhos
para os montes. O meu socorro vem do Senhor que não somente
fez o céus e a terra, mas me deu Seu filho para ser o meu salvador.

ORAÇÃO:

Senhor, que privilégio para nós, que alegria indizível e


cheia de glória sabermos que Tu és o Guarda de Israel, do Israel
espiritual, da Tua igreja, do Teu povo; saber que estas promessas
grandiosas chegam a nós na mediação do Teu filho Jesus
Cristo, que naquele monte levou sobre Si a nossa condenação,
derramando sangue da aliança, a nova aliança. Eu oro, Senhor,
pelo Teu povo, que o Senhor queira lhe trazer conforto, descanso
e renovação, que o Senhor abençoe aquele que sofre, que está
ansioso, preocupado, angustiado. Ó Deus, que os seus olhos se
levantem e possam olhar para o alto e descansar em Ti. É o que
nos te pedimos por amor de Jesus. Amém.
26
SALMO 122

JERUSALÉM E O TABERNÁCULO
SOMBRA DE CRISTO E SUA IGREJA

Alegrei-me quando me disseram: Vamos


à Casa do Senhor. Pararam os nossos
pés junto às tuas portas, ó Jerusalém!
Jerusalém, que estás construída como
cidade compacta, para onde sobem as tribos,
as tribos do Senhor, como convém a Israel,
para renderem graças ao nome do Senhor.
Lá estão os tronos de justiça, os tronos da
casa de Davi. Orai pela paz de Jerusalém!
Sejam prósperos os que te amam. Reine paz
dentro de teus muros e prosperidade nos
teus palácios.Por amor dos meus irmãos e
amigos, eu peço: haja paz em ti! Por amor
da Casa do Senhor, nosso Deus, buscarei o
teu bem.

O salmo que estudaremos neste capítulo foi escrito pelo


rei Davi. Ele deve ter feito a peregrinação a Jerusalém várias vezes
antes de se tornar rei. Este hino que ele compôs foi adotado pelos
peregrinos e bem expressava o sentimento de alegria que sentiam
pela casa do Senhor.
Aqui, temos o sentimento de alegria quando o peregrino
foi convidado para ir à casa do Senhor adorar a Deus, depois
CAMINHOS DA FÉ

a admiração que ele sentia diante de Jerusalém, ao dar uma


descrição da cidade (122.2-5), depois o desejo dele pela cidade
de Jerusalém, o que ele sentia no coração pela cidade e pela casa
de Deus (122.6-8), e uma decisão que ele toma no final, quando
contempla Jerusalém (122.9). É este salmo que estudaremos neste
capítulo, vendo o que ele significou naqueles dias, o que significa
para nós hoje e que lições podemos tirar para nós.
Farei primeiro algumas observações iniciais para que
entendamos bem o salmo. Comecemos falando sobre Jerusalém,
já que ela é o tema central do salmo. Jerusalém, cujo nome
era Jebus, pertencia aos jebuseus, povo que Davi conquistou.
Jerusalém passou a ser a cidade de Davi e mais tarde se tornou a
capital de todo o Israel. Deus havia dito a Moisés, muito tempo
antes, quando ainda estava no deserto, que, quando o povo
entrasse na terra prometida, Deus iria escolher um local, e um
local somente, onde Ele seria adorado, um centro do culto a ser
estabelecido na terra prometida. A razão que Deus deu a Moisés
para que houvesse um único lugar de adoração na terra prometida
era que os deuses dos povos pagãos que moravam naquela terra
eram deuses das montanhas, dos vales, dos altos, dos rios, das
árvores. Havia altares deles em todos os lugares, o que dava a ideia
de muitos deuses, e deuses espalhados. Deus queria um local só
de adoração para Ele. Era proibido adorar a Deus em outro lugar
que não fosse aquele que Ele havia ordenado. Porque Deus queria
mostrar que Ele é Deus de toda a terra, não é deus dos montes,
dos vales, do rio ou do deserto, mas é deus de toda a terra. Assim,
somente um local seria o centro de adoração, e o local escolhido
foi exatamente Jerusalém.
Quando Davi tomou a cidade de Jebus — que se tornou
Jerusalém —, Deus mandou que a arca da aliança, juntamente
com o tabernáculo que Moisés havia construído no deserto,
fosse levada para lá, no Monte Sião, e que fosse erigido aquele
tabernáculo que seria o centro de adoração de todo o povo de
Deus. A partir daí, quando o judeu quisesse adorar a Deus,
oferecer sacrifícios, trazer os seus dízimos e ofertas, encontrar o

28
SALMO 122 - JERUSALÉM E O TABERNÁCULO

povo de Deus, ouvir a lei de Deus, prestar culto a Ele e cantar


os salmos, ele viria para Jerusalém. Não havia outro lugar, era
proibido adorar a Deus em qualquer outro lugar que não fosse
Jerusalém.
É por isso que Jerusalém era o centro religioso da vida
do judeu. Era ali que estava o tabernáculo, a arca, os sacerdotes
e os altares. Ali, a Palavra de Deus era ensinada para o povo. E
não somente isso, Israel também se tornou a capital do reino. Lá
estava o trono de Davi e era ali que a dinastia do rei haveria de
governar a nação de Israel, como Deus havia prometido a Davi.
Israel era a capital do reino, era o centro religioso da nação e era
para lá que as tribos subiam para adorar a Deus. A cidade era
cercada de muros para proteção; embora ela tivesse sido edificada
em um lugar alto e era muito bem protegida, havia uma muralha
que cercava toda a cidade e várias portas que davam entrada ou
acesso a ela e que eram convenientemente guardadas. No centro
dela, estava a casa do Senhor, que era o tabernáculo que havia
sido construído no deserto, representando a presença de Deus
no meio do Seu povo. Era lá que Deus se manifestava de vez em
quando. A nuvem da glória de Deus chamada de Shekinah descia
sobre o tabernáculo e enchia-o.
Depois de Davi, seu filho Salomão levantou um templo.
Não foi Davi que construiu o templo. Quando ele escreveu este
salmo, ainda não havia templo, era o tabernáculo que estava
em Jerusalém. Porém, depois Salomão construiu um templo,
que, mais adiante, seria destruído pelos assírios e mesopotâmios
e reconstruído durante a época de Esdras e Neemias. Tanto o
tabernáculo como o templo representavam a presença de Deus
no meio do Seu povo.
Esse era o contexto. Em Jerusalém, o lugar da presença
de Deus, estava o tabernáculo, ali estavam os tronos de Davi,
dali saía a justiça, ali Deus se manifestava. Por isso, quando seus
irmãos disseram: “Vamos à casa do Senhor!”, qual foi a reação
dele? Alegria. O coração dele se alegrou, porque era lá que ele iria
cultuar a Deus. E esse é o meu primeiro ponto aqui neste capítulo:

29
CAMINHOS DA FÉ

o sentimento dos peregrinos quando convidados a viajarem até


Jerusalém: Alegrei-me quando me disseram: Vamos à casa do Senhor.
O peregrino morava longe e, quando chegou a época da festa e os
amigos lhe convidaram para irem juntos a Jerusalém, para adorar
a Deus e cultuá-lo, o coração dele se encheu de alegria. Ele amava
a Deus e queria cultuá-lo, queria servir a Deus, oferecer os seus
sacrifícios e levar as suas ofertas.
Estar com os irmãos era momento de renovação e de
deleite espiritual. Nós temos o privilégio de nos reunirmos pelo
menos duas vezes por semana e sentimos falta quando não é
possível irmos à igreja. O israelita que morava longe de Jerusalém
tinha esse privilégio três vezes por ano! Assim, quando chegou a
hora, o coração dele se alegrou porque ele iria a Jerusalém adorar
a Deus, oferecer sacrifícios, levar seus dízimos e ofertas. Ele se
alegrou porque ele amava a Deus, amava a casa do Senhor e era
uma oportunidade de renovação e deleite.
Agora, os próximos versículos relatam quando ele chega
a Jerusalém, passa os muros e olha a cidade: Pararam os nossos pés
junto às tuas portas, ó Jerusalém! Jerusalém, que estás construída como
cidade compacta, para onde sobem as tribos, as tribos do Senhor, como
convém a Israel, para renderem graças ao nome do Senhor. Lá estão
os tronos de justiça, os tronos da casa de Davi (122.2-5). Imagine
o peregrino tendo entrado por uma das portas da muralha. Ele
coloca os pés dentro de Jerusalém e contempla a cidade. Ali está
o palácio de Davi, ali está o tabernáculo, e ele começa a descrever
Jerusalém com admiração, ele olha com deleite para a cidade
querida e fala com ela como se ela pudesse lhe ouvir. Pararam os
nossos pés junto às tuas portas, ó Jerusalém! Ele está falando com
a cidade, dizendo: “Cheguei, Jerusalém, meus pés já estão aqui
dentro das tuas muralhas”.
Ele olha para a cidade e seu coração se enche de deleite, e
ele diz: Jerusalém, que estás construída como cidade compacta, para
onde sobem as tribos, as tribos do Senhor, como convém a Israel, para
renderem graças ao nome do Senhor. Eram doze tribos em Israel,
mas todas elas se juntavam como se fossem uma ali em Jerusalém.

30
SALMO 122 - JERUSALÉM E O TABERNÁCULO

Era uma nação compacta, tendo centro ali em Jerusalém. Essas


tribos vinham de todos os lugares. Subiam como convém a Israel
porque Deus mandou que eles fizessem isso. Era conveniente que
eles viessem para render graças ao nome do Senhor. Era isso que
eles faziam nas festas, era isso que faziam na casa do Senhor, iam
render graças a Deus. Essa gratidão era feita de diversas formas,
por exemplo, pelos louvores que eles cantavam no templo
dirigidos pelos levitas. Davi havia colocado corais e instrumentos
de música nos cultos feitos no templo e os levitas haviam sido
orientados sobre como deveriam conduzir o cântico durante os
sacrifícios. A lei especificava que, para cada tipo de pecado, havia
uma oferta. O peregrino trazia os dízimos que havia guardado
para aquela ocasião, dez por cento de tudo que ele colhia do seu
rebanho e também do seu campo era trazido para oferecer a Deus.
Ali ele encontrava os seus irmãos, os seus parentes e amigos. Era
festa no templo, havia um átrio onde ele podia cozinhar, onde
podia se reunir com a família; alguns acampavam em tendas,
havia lugar até para os amigos que não eram judeus, o átrio dos
gentios, onde os não judeus poderiam ir também e ficar. Eles só
não podiam entrar no templo.
O peregrino, então, volta seu olhar para o palácio de Davi
e diz: “Aqui estão os tronos da justiça, é daqui que Deus governa
o Seu povo, é daqui que procede a Lei, daqui sai a vontade de
Deus e daqui Davi julga os oprimidos, faz justiça e decide entre o
certo e o errado” (122.5). Jerusalém era o centro religioso e civil
de Israel naquele tempo. Nela havia os dois ofícios: sacerdote e
rei, que são dois ofícios de Cristo.
O salmista se alegrou quando foi convidado, chegou a
Jerusalém e ficou admirado com a cidade, porque era para lá que
subiam as tribos, era de lá que saía a justiça. Então ele expressa
o desejo do seu coração, o que sente por Jerusalém, pela casa
do Senhor. Ele primeiro pede aos seus irmãos que orem por
Jerusalém (122.6): Orai pela paz de Jerusalém! Aqueles eram
tempos turbulentos, o rei Davi era um homem de guerra, ele
tinha conquistado as nações ao redor, mas de vez em quando

31
CAMINHOS DA FÉ

alguma dessas nações se levantava contra eles, como os amonitas,


os filisteus, os moabitas, que faziam guerra contra Jerusalém.
Não poucas vezes, durante o seu tempo, Davi teve que defender
a cidade de ataques dos sírios, por exemplo, que vinham de
longe para tentar saquear Jerusalém e os campos ao redor dela.
Assim, o peregrino ora pela paz de Jerusalém. Ele queria que a
cidade tivesse paz porque somente na paz é que poderia haver
prosperidade, somente quando houvesse paz em Jerusalém é que
os peregrinos poderiam ir ali para cultuar a Deus. É em paz que
o culto a Deus floresce, é em paz que nós ganhamos o nosso pão.
Ele deseja também que haja paz dentro dos muros da
cidade (122.7). No verso anterior, ele ora pela paz de Jerusalém,
e a ideia que dá é que Jerusalém seja livre da guerra. Porém, ele
ora também para que haja paz dentro da cidade, porque às vezes
não há guerra fora, mas há dentro. Então deve haver paz dentro
de Jerusalém, entre os seus moradores, entre os peregrinos, entre
os irmãos, não somente paz fora dos muros. Prosperidade é outra
coisa que ele pede nos palácios, ou seja, que Deus abençoe o
rei com prosperidade, porque, uma vez abençoando o rei com
prosperidade, ela se estende para todos os seus súditos e para
todos os moradores da cidade.
Depois de pedir orações pela paz e prosperidade de
Jerusalém, ele mesmo ora (122.8). Até aqui, ele vem pedindo
orações pela paz dentro e fora de Jerusalém, pela prosperidade,
que o governo seja próspero. E aqui ele mesmo pede: Por amor
dos meus irmãos e amigos, eu peço: haja paz em ti! O que isso quer
dizer? É que, se houver paz e prosperidade em Jerusalém, os
irmãos e amigos poderão vir três vezes ao ano, poderão cultuar
na casa do Senhor, pois haverá prosperidade para toda a nação. O
israelita vai poder ganhar o seu pão, levar avante o seu comércio,
a sua produtividade, e a sua família vai ser sustentada, e, com ela,
os filhos dos filhos, e assim por diante.
Ao final, depois de ter aberto o coração dizendo que
queria que houvesse prosperidade, alegria e paz em Jerusalém,
o peregrino toma uma decisão: Por amor da casa do Senhor,

32
SALMO 122 - JERUSALÉM E O TABERNÁCULO

nosso Deus, buscarei o teu bem (122.9). Por amor ao tabernáculo


localizado em Jerusalém, ele buscaria o bem da cidade. Buscar
o bem da cidade no contexto significa orar por ela, protegê-
la, defendê-la das guerras, contribuir financeiramente para a
manutenção do culto a Deus realizado nela. Ele quer o bem de
Jerusalém, mas ele não somente ora para que Deus abençoe a
cidade, ele resolve que ele vai buscar o seu bem.
A pergunta agora é: o que isso tem a ver conosco? Por
que nós estamos falando aqui de Jerusalém e do tabernáculo? A
cidade de Jerusalém existe até o dia de hoje, mas o templo não, o
tabernáculo já não existe mais, já não há altares, não há sacerdotes.
Então o que nós, cristãos, que moramos aqui no Brasil, mais
de dois milênios depois que este salmo foi escrito, temos a ver
com isso? Em que sentido isso nos fala como cristãos? Eu quero
considerar alguns pontos aqui antes de fazer uma aplicação para
nós.
O primeiro ponto é que a vinda de Jesus Cristo ao mundo,
oitocentos anos depois que este salmo foi escrito, representa o
ponto central da história da redenção e da salvação. Representa
o cumprimento e a consumação de todas as promessas que Deus
havia feito antes dele. Em segundo lugar, essa vinda significa que
todos os rituais, tradições, cerimônias, símbolos e instituições
do Antigo Testamento já encontraram seu cumprimento. Estas
coisas eram sombra de uma realidade que haveria de vir. Quem
fala a respeito dessa sombra é o apóstolo Paulo, em Colossenses
2.16: Portanto, ninguém vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por
causa dos dias de festa, ou da lua nova, ou dos sábados. Estas eram
as leis relacionadas com o templo, com o sacrifício e com a vida
religiosa do povo de Deus, com Jerusalém, com o tabernáculo,
com a casa do Senhor.
No verso 17, Paulo complementa: Que são sombras das
coisas futuras, mas o corpo é de Cristo. Paulo está dizendo aqui
que o tabernáculo em Jerusalém, com todos os seus rituais, era
a sombra projetada pelo corpo de Cristo, que estava chegando.
Depois que Cristo veio, eu não preciso mais da sombra. Aquele

33
CAMINHOS DA FÉ

que projetava sua sombra nas páginas do Antigo Testamento já


chegou. É nesse sentido que temos que olhar para Jerusalém, para
a casa do Senhor e para o tabernáculo. Eles eram a sombra. O
corpo já veio, o corpo é de Cristo. Jerusalém não é mais para nós
a terra santa, não é mais o centro religioso do mundo. O próprio
Jesus disse à mulher samaritana: Já chegou a hora em que nem
aqui nem em Jerusalém vocês vão adorar o Pai, porque o Pai é
espírito e Ele procura adoradores que O adorem em espírito e em
verdade (Jo 4.24). Não há mais um único centro de adoração a
Deus, como havia no Antigo Testamento.
Em que sentido Jerusalém e o templo eram sombra de
Cristo? Primeiro, Jesus disse, em certa ocasião lá em Jerusalém,
em disputa com os fariseus: Destruam esse templo, e em três
dias o reconstruirei (Jo 2.19). Os judeus não entenderam. Eles
pensavam que Jesus estava se referindo ao templo de Salomão e
perguntaram: “Como esse homem vai reconstruir o templo em
três dias?”. Mas Jesus estava falando do templo do Seu corpo: “Se
vocês me matarem, três dias depois eu ressuscito”. Ou seja, Jesus
identifica o Seu corpo como o templo. Mais tarde, no Monte
da Transfiguração com Pedro, Tiago e João, a nuvem da glória,
aquela mesma nuvem que enchia o templo e o tabernáculo,
desce sobre Ele, e Deus fala: “Esse é meu filho amado, a ele ouvi”
(Mt 17.1-5). A nuvem da glória encheu o templo, o corpo de
Cristo, porque Ele é o templo. O templo apontava para Ele. Por
extensão, então, o templo se aplica a nós, porque estamos unidos
a Cristo. Esse é um ensino claro do Novo Testamento. Estamos
unidos ao nosso Salvador. Ele é o cabeça, e nós somos o corpo.
Estamos unidos ao Senhor Jesus inseparavelmente, por isso a
Bíblia diz que, quando Cristo foi ressurreto, nós ressuscitamos
com Ele; quando Ele morreu, nós morremos com Ele; quando
Ele foi glorificado, nós fomos glorificados com Ele.
Essa é a base da nossa certeza, de que seremos perdoados
e salvos, que estamos unidos a Cristo. A história de Cristo é a
nossa e, se Ele é o templo de Deus, nós somos o templo de Deus
por extensão. É assim que a Bíblia nos trata. Por exemplo, em

34
SALMO 122 - JERUSALÉM E O TABERNÁCULO

Efésios 2.20, o apóstolo Paulo diz: Edificados sobre o fundamento


dos apóstolos e dos profetas, de que Jesus Cristo é a principal pedra da
esquina; No qual todo o edifício, bem ajustado, cresce para templo
santo no Senhor. No qual também vós juntamente sois edificados
para morada de Deus em Espírito. Deus não mora mais no templo
de Jerusalém, mas habita plenamente em Seu filho Jesus Cristo
e, por extensão, naqueles que estão ligados a Cristo. É por isso
que no Novo Testamento a igreja é chamada de a casa de Deus.
É na igreja que Deus mora e, quando eu falo em igreja, não
me refiro às quatro paredes do edifício, mas do ajuntamento
dos crentes, do ajuntamento dos filhos de Deus, daqueles que
creem no Senhor Jesus. É nesses que Deus habita, e não mais em
edifícios. Eu sei que às vezes costumamos chamar a igreja de o
templo, porém chamamos de templo somente para lembrar que
no Antigo Testamento havia uma construção dedicada a Deus.
Contudo, a igreja não é o templo no sentido em que o templo de
Jerusalém era, porque Deus não habita dentro de nossas quatro
paredes; quando vamos embora da igreja, Deus não fica lá, Ele
vai conosco. Deus habita em Seu povo, nós somos o santuário
de Deus.
Veja ainda o que Paulo diz, escrevendo aos Coríntios
3.16: Não sabeis vós que sois o templo de Deus e que o Espírito de
Deus habita em vós? Nós somos o santuário de Deus. Havia duas
palavras para santuário na língua grega: uma significava o templo,
ou o tabernáculo, e a outra indicava o santuário, que era o santo
dos santos, aquele local mais íntimo onde estava a arca da aliança,
com a lei, e onde somente podia entrar o sacerdote uma vez por
ano, levando o sangue de um cabrito, no dia da expiação. Paulo
usa essa mesma palavra para dizer-nos que nós somos o santuário
de Deus.
Na sua primeira carta, Pedro diz: Vós também, como pedras
vivas, sois edificados casa espiritual e sacerdócio santo, para oferecer
sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por intermédio de Jesus
Cristo (1Pe 2.5). Pedro compara cada crente a uma pedra viva e,
juntos, nós constituímos um edifício onde Deus habita. Somos

35
CAMINHOS DA FÉ

as pedras vivas que compõem as paredes, o teto e a base desse


edifício vivo, orgânico, espiritual e invisível, no qual Deus habita
pelo Espírito Santo.
Por fim, lembremos o que Jerusalém representa na visão
do apóstolo João: E vi um novo céu, e uma nova terra. Porque já o
primeiro céu e a primeira terra passaram, e o mar já não existe. E eu,
João, vi a santa cidade, a nova Jerusalém, que de Deus descia do céu,
adereçada como uma esposa ataviada para o seu marido. E ouvi uma
grande voz do céu, que dizia: Eis aqui o tabernáculo de Deus com
os homens, pois com eles habitará, e eles serão o seu povo, e o mesmo
Deus estará com eles, e será o seu Deus. E Deus limpará de seus olhos
toda a lágrima; e não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor,
nem dor; porque já as primeiras coisas são passadas (Ap 21.1-4).
Jerusalém representa a Igreja na sua glória, a nova Jerusalém, o
tabernáculo de Deus, quando, no novo céu e na nova terra, Deus
vier para estar conosco e o povo de Deus vai estar com Ele para
todo o sempre.
Agora estamos prontos para dizer em que este salmo,
então, se aplica para nós hoje. A primeira aplicação é que, se você
quiser fazer uma peregrinação para Jerusalém, pode ir. Deve ser
maravilhoso você andar pelas terras bíblicas. Mas, por favor, não
traga um vidrinho da água do Rio Jordão pensando que aquilo é
santo, não traga uma raspinha do Muro das Lamentações pensando
que você está trazendo pedra de um lugar santo, não traga o vinho
feito com a uva do Monte das Oliveiras ou qualquer outra coisa
pensando que aquilo ali é mais espiritual. Não vá ao Muro das
Lamentações colocar bilhetes e orações entre as pedras, como os
judeus ortodoxos costumam fazer. Não faça isso. Não peça para o
pastor usar kipá dos sacerdotes ou usar uma estola sacerdotal, não
peça para trazerem a arca para a igreja, não peça para celebrar as
festas de Israel. Por quê? Porque tudo isso era sombra! Já temos a
realidade, que é Cristo. Eu não entendo por que há evangélicos
correndo atrás de judaizantes, pessoas querendo reintroduzir na
Igreja as práticas do Antigo Testamento, que eram sombras. Esta
é a primeira lição para nós: o culto cristão é espiritual, é simples e
não tem mais esses rituais e cerimônias.
36
SALMO 122 - JERUSALÉM E O TABERNÁCULO

Segunda aplicação: você deveria se alegrar pelo privilégio


que tem de fazer parte da Igreja de Deus e cultuar a Ele juntamente
com os irmãos. Medite na alegria do salmista! Da mesma forma
como ele se alegrava por poder ir a Jerusalém, para a casa do
Senhor, todos nós deveríamos nos alegrar e comemorarmos
quando chegar o domingo, quando poderemos, com nossos
irmãos, cantar louvores a Deus, ser instruídos na palavra dele. Ter
um momento de renovação espiritual. É um privilégio que Deus
tem dado a você poder cultuá-lo livremente com tanta frequência
e na frequência que você quiser. Infelizmente, há pessoas que não
valorizam isso, aqueles “desigrejados” que acham que essa vida de
comunhão, participar de uma igreja, ser membro, envolver-se, é
coisa do homem. Não é coisa do homem, a Igreja está no centro
dos planos de Deus, você não pode ser cristão “desigrejado”.
Terceira aplicação: assim como o peregrino encantou-se
com Jerusalém ao entrar por suas portas, assim também devemos
nos encantar e nos deleitar com a Igreja de Cristo. Eu não estou
dizendo que a Igreja não tem defeito. Ela é feita de pecadores
como eu e como você, mas pecadores arrependidos, pecadores
que estão no processo de crescimento, estão peregrinando e
caminhando para a verdadeira Jerusalém. Não deixe os defeitos
da Igreja fazerem com que você se torne cínico com relação a
ela. Nós somos pecadores, seu pastor é pecador, os presbíteros
também são, os diáconos também, e você também é. Nós estamos
no caminho, aprendendo. Assim, não deixe os defeitos da Igreja
fazerem com que você desanime dela, porque ela é o plano de
Deus para nossa vida aqui neste mundo, e não há outro.
Quarta aplicação: ore e interceda pela Igreja, peça a Deus
graça e misericórdia para os que têm a responsabilidade de trazer a
Palavra, de ministrar e conduzir a Igreja nos caminhos do Senhor.
Busque o bem da Igreja, proteja-a. Fale dela como sendo a noiva
de Cristo, o corpo de Cristo. Contribua financeiramente para
o seu sustento. Fale dela e do Senhor dela ao mundo, aos seus
amigos.

37
CAMINHOS DA FÉ

ORAÇÃO:

Ó Deus, graças te damos por Tua Igreja aqui no mundo.


Graças te damos pelo privilégio de sermos parte dela. Bendito seja
o Teu nome porque nos amaste e nos fizeste Teu povo. Senhor,
concede paz e prosperidade à Tua Igreja neste mundo! Dá-nos
alegria constante quando nos reunirmos com Teu povo para te
oferecer culto. É o que pedimos em nome de Jesus. Amém.

38
SALMO 123

ENFRENTANDO A HOSTILIDADE

A ti, que habitas nos céus, elevo os olhos!


Como os olhos dos servos estão fitos
nas mãos dos seus Senhores, e os olhos
da serva, na mão de sua Senhora, assim
os nossos olhos estão fitos no Senhor,
nosso Deus, até que se compadeça de nós.
Tem misericórdia de nós, Senhor, tem
misericórdia; pois estamos sobremodo fartos
de desprezo. A nossa alma está saturada do
escárnio dos que estão à sua vontade e do
desprezo dos soberbos.

Este é o quarto salmo da coleção dos Salmos de Romagem.


Ele trata especificamente da maneira como devemos enfrentar a
oposição que sofremos aqui neste mundo, o escárnio, a zombaria
dos ímpios, o que fazer quando não aguentamos mais, quando
estamos cansados da hostilidade e da perseguição que vêm contra
nós.
Vamos primeiro tentar entender a ocasião em que o
salmo foi composto. Muitos estudiosos acham que este salmo foi
composto na época em que Israel voltou do cativeiro. Você deve
se lembrar bem da história: os judeus haviam passado setenta
anos na Babilônia como escravos, cativos por conta do juízo de
CAMINHOS DA FÉ

Deus e da idolatria. Depois de setenta anos, Deus levantou o


espírito de Ciro, o persa, que era o imperador dos medos e persas,
e libertou os cativos, os israelitas e outros povos que estavam sob
cativeiro. Ele passou um decreto dando liberdade para que esses
povos voltassem para sua terra. Os judeus voltaram em grande
número para a terra prometida, para a Palestina. Porém, quando
eles chegaram lá, encontraram a terra ocupada pelos samaritanos,
que eram uma mistura de assírios com os judeus que haviam sido
deixados lá na época da deportação.
Esses povos casaram entre si e se misturaram, adotando
uma religião que era uma combinação da religião dos assírios
com a dos israelitas. Quando os judeus chegaram, a casa já estava
ocupada. Já havia gente morando lá, a vizinhança toda era desse
misto de gente. Havia também outros povos, os moabitas e
amonitas, que ocupavam as terras vizinhas e que não estavam
satisfeitos com o retorno dos judeus. Assim, quando os judeus
chegaram lá, deu-se início à oposição e à dificuldade. Havia, em
primeiro lugar, uma briga política pelo poder e pelo espaço. Os
samaritanos, os moabitas e os amonitas não queriam que Israel
ficasse ali, embora a terra fosse de Israel por direito. O rei Ciro
havia liberado para que eles voltassem e ocupassem aquela terra,
mas os vizinhos não queriam aquele povo ali e forjaram com
ele uma aliança de paz falsa. Depois, quebraram essa aliança e
foram ao rei fazer queixa dos judeus, que os judeus eram um
povo perigoso e que no passado eles já haviam se revoltado contra
os impérios mundiais. Houve ameaças e emboscadas e era uma
situação de grande opressão para o povo de Deus morando ali,
em meio a uma vizinhança que não queria sua presença.
É assim, então, que eles elevam os olhos para Deus e
pedem a Ele ajuda em meio àquela situação de hostilidade e de
sofrimento. Eles não aguentam mais o que estão passando. Muito
tempo depois, este salmo passaria a ser cantado pelos peregrinos
rumo a Jerusalém, lembrando-se da hostilidade do mundo, da
perseguição que eles sofrem e esperando somente em Deus. Hoje,
nós cantamos este salmo também. Nós o utilizamos para expressar

40
SALMO 123 - ENFRENTANDO A HOSTILIDADE

o nosso sentimento frente à hostilidade e a nossa oração a Deus.


Este salmo fala do povo de Deus sendo oprimido e perseguido,
enfrentando o escárnio e a oposição.
O apóstolo João nos avisou desse conflito. Ele disse: Não
vos maravilheis, se o mundo vos odeia (1Jo 3.13). O próprio Jesus
disse que teríamos aflições neste mundo! Jesus nunca nos iludiu
a respeito disso, nós somos uma minoria, estamos indo contra
a cultura dominante deste mundo, os nossos valores não são os
valores deste mundo. Na universidade, por exemplo, você vai
experimentar um confronto quanto àquilo que você aprendeu
em sua casa e na igreja sobre Deus, sobre a verdade, sobre o ser
humano, sobre a família. Vai haver um confronto entre isso que
você aprendeu e aquilo que os seus professores ateus, marxistas,
humanistas e esquerdistas vão dizer para você sobre família, sobre
gênero, sobre sexo, sobre criação do mundo e sobre uma série de
outras coisas. Eu tenho certeza de que a maioria dos cristãos sabe
o que é estar em um ambiente hostil e ser provocado por pessoas
que pensam diferente.
Isso pode acontecer no ambiente de trabalho, onde você,
talvez, vá sofrer discriminação e zombaria. Os outros, sabendo
que você é cristão, começam a conversar determinadas coisas
e há falatório, palavrões e piadas, às vezes provocações. Isso
pode ocorrer na própria família. Você se sente como que “fora
do ninho”, é objeto de escárnio e zombaria. O cristão sabe o
que é isso, a Igreja foi alertada desde o início; desde o Antigo
Testamento até o dia de hoje, ela está alertada para isso. Nós
estamos no mundo, mas não somos do mundo. O mundo nos
odeia, ele olha para nós como sendo pessoas estranhas. E está
ficando cada vez mais difícil, porque aquilo em que acreditamos
começa a ser rotulado de ódio. Se afirmarmos a família, temos
ódio contra os homossexuais; se afirmarmos a vida, somos contra
a mulher que tem o direito do aborto; se afirmarmos a defesa
própria, é discurso de ódio contra os criminosos, porque deve
haver direitos iguais. Daqui a pouco, tudo o que a Igreja disser
vai ser rotulado de discurso do ódio. Nós estamos caminhando

41
CAMINHOS DA FÉ

para isso, como se estivéssemos em uma peregrinação, na qual


estamos cercados de inimigos, de gente que nos ridiculariza, que
nos detesta, que faz zombaria e todo tipo de ameaças contra nós.
O que fazer, então, quando não aguentamos mais? É a
situação do salmista. Ele está cansado de ser ridicularizado,
perseguido, odiado, insultado e desprezado. E note que essa
hostilidade é injusta. Ou seja, o salmista está sofrendo por conta
de sua fé e de sua confiança em Deus. Não vamos confundir esse
tipo de sofrimento, que é injusto, com aquele sofrimento que
nós fazemos por merecer. Às vezes isso acontece, o crente diz que
está sendo perseguido em seu trabalho, mas o caso é que ele é um
péssimo empregado mesmo. Ele está sofrendo não por causa de
Cristo, mas porque é preguiçoso, chega tarde, não faz o trabalho
direito. Não estou falando desse tipo de perseguição que você fez
por merecer, o caminho aí é você se arrepender e mudar de vida.
Mas aqui, no salmo, é uma perseguição injusta. Esse escárnio, essa
zombaria, vêm por conta do ódio religioso mesmo. A hostilidade
do mundo contra a Igreja e contra os cristãos é porque eles são
cristãos e porque pregam e dizem coisas que são contrárias àquilo
em que o mundo acredita.
E o que fazer? Em primeiro lugar, como está no verso
primeiro, temos que elevar os olhos a Deus: A ti, que habitas
nos céus, elevo os olhos! Essa expressão tu que habitas nos céus,
literalmente, no hebraico, significa tu que estás entronizado no
céu. A figura aqui é de Deus sentado no trono lá nos céus, de
onde Ele domina o Universo, de onde controla todas as coisas.
É bom nos lembrarmos de que essa é a posição de Deus, porque
essa é a melhor maneira de olhar para Deus em uma situação de
conflito. Ele está no trono e domina todas as coisas, tem tudo em
Suas mãos e faz com que todas as coisas cooperem para o bem
dos que O amam. Nada foge ao Seu controle. Ele está sentado
no trono do Universo e o salmista eleva os olhos para Ele. Às
vezes, orar é isso, é você levantar os olhos para Deus, não precisa
nem falar, é só levantar os olhos, e Deus como que diz: “Eu estou
vendo”. Eleve o seu coração, a sua alma e o seu sentimento a Ele.

42
SALMO 123 - ENFRENTANDO A HOSTILIDADE

Não existe uma figura mais bonita de dependência do que essa,


alguém que está prostrado e que eleva os olhos em um sinal de
expectativa, dizendo ao Senhor que está precisando de auxílio.
As pessoas, às vezes, têm muita dificuldade em articular
orações. Orar é um exercício espiritual que precisa de treinamento.
Precisamos intencionalmente aprender a orar, mas por vezes orar
é simplesmente levantar os olhos, olhar para Deus como sendo
a nossa fonte de esperança e de socorro, já que não há esperança
no mundo e nos homens. Porém, há esperança em Deus e Ele
entende aquilo que nós estamos passando, basta um olhar quando
você está assim, quando está oprimido, saturado, basta um olhar
para Deus em esperança, para que Ele tenha compaixão.
A compaixão, por sua vez, é o próximo ponto, explicitado
no verso 2: Como os olhos dos servos estão fitos nas mãos dos seus
Senhores, e os olhos da serva, na mão de sua Senhora, assim os nossos
olhos estão fitos no Senhor, nosso Deus, até que se compadeça de nós.
Talvez não entendamos direito este salmo porque não temos mais
esse costume, mas no Antigo Oriente todos os Senhores e as suas
esposas tinham servos que atendiam às suas necessidades e que
andavam ao seu lado. A figura aqui é de um Senhor, um patriarca
que está sentado à mesa, juntamente com sua esposa. Os servos
estão ali ao redor e ficam olhando para a mão do Senhor e da
Senhora, porque naquele tempo o patrão não falava com o servo,
mas dirigia-o pelo gesto da mão. Portanto, a obrigação do servo
era ficar olhando para a mão do patrão, o que é que o patrão iria
lhe sinalizar para fazer.
Deus está sentado no trono. Foi isso que nós vimos no
verso primeiro. E levantamos os olhos para Ele e olhamos para
a mão dele, esperando o que Ele vai fazer. Ele já viu a nossa
necessidade, já entendeu o nosso sofrimento, e ficamos agora
esperando que Ele nos proteja, nos sustente, nos console e nos
livre. Primeiro, quando passamos por essa angústia, levantamos
os olhos a Deus e oramos a Ele. Segundo, esperamos para ver a
resposta que Deus vai nos dar, exatamente como um empregado
ficava olhando para a mão do patrão, para ver o que é que o

43
CAMINHOS DA FÉ

patrão vai fazer. Deus, vendo a nossa necessidade, vai responder


de duas maneiras: primeiro, Ele pode tirar os nossos inimigos,
destruir os nossos opressores; às vezes, Deus faz isso. Há muitos
relatos na história de Israel em que Deus deu vitória militar aos
judeus contra aqueles que os oprimiam e acatavam. Assim, nos
dias de hoje, em uma situação de conflito, em uma situação em
que você está sendo oprimido, perseguido injustamente, exposto
ao ridículo, ao escárnio e à opressão, pode ser que, à medida que
você olha para Deus e espera nele, Ele simplesmente remova o
problema.
Porém, outras vezes Deus não remove o problema, mas
nos concede graça para suportá-lo. Há um episódio no Novo
Testamento muito conhecido que ilustra isso (2Co 12). O
apóstolo Paulo fala de um espinho na carne, um mensageiro de
Satanás enviado para esbofeteá-lo. Três vezes ele pediu a Deus que
o retirasse, e a resposta de Deus foi: “Não, porque a minha graça
te basta”. Deus não tirou o mensageiro de Satanás que esbofeteava
o apóstolo Paulo, mas deu graça para que Paulo pudesse suportar
todo aquele sofrimento que era trazido por esse agressor. Nós
olhamos para Deus, esperamos olhando para Sua mão para ver
o que Ele vai fazer e sabemos que Ele pode resolver de duas
maneiras: retirando a fonte do sofrimento — os escarnecedores,
inimigos e opressores — ou nos dando graça e misericórdia para
suportar.
E é exatamente isso que o salmista suplica no verso
seguinte: Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia. No
final do verso 2, vemos que os nossos olhos estão fitos no Senhor,
nosso Deus, até que se compadeça de nós. Esse se compadeça de
nós, na verdade, é até que tenha misericórdia de nós e é a mesma
palavra que aparece no verso 3: Tem misericórdia de nós, Senhor,
tem misericórdia. Três vezes aparece a palavra misericórdia no
original, e é isso que o salmista está esperando, ele está olhando
para Deus, atento para a mão de Deus, e ele quer uma coisa, quer
misericórdia da parte do Senhor. Note que ele não pede a morte
dos inimigos, não pede a destruição daqueles que o estão fazendo
sofrer, mas pede apenas que Deus tenha misericórdia dele.
44
SALMO 123 - ENFRENTANDO A HOSTILIDADE

Misericórdia é uma atitude de compaixão e ajuda para


alguém que não merece, e que deveria receber exatamente o
contrário, isto é, punição. O salmista sabe que não merece nada
de Deus, é por isso que ele não suplica justiça, mas pede três vezes
misericórdia. Ele está olhando para a mão de Deus e esperando
um gesto dele, querendo que Deus mostre misericórdia para que
ele possa atravessar aquela situação, para peregrinar neste mundo
e chegar até o final da jornada.
No final do verso 3 e no verso 4, ele abre o coração e
expõe a Deus o que está sentindo e que é a causa da oração:
tem misericórdia; pois estamos sobremodo fartos de desprezo. Nós
já recebemos todo desprezo que poderíamos suportar, estamos
sobremodo fartos. Você sabe o que é uma pessoa sobremodo
farta? Acho que todos já tiveram essa experiência. O salmista
recebeu tanto desprezo, que a alma dele está estufada, ele não
tem mais lugar para mais nada, chegou ao limite, foi até onde
poderia ir. A nossa alma está saturada (123.4). É assim que ele está
se sentindo, a sua alma está saturada de desprezo, de escárnio, ele
não aguenta mais, chegou ao seu limite por conta dos que estão à
sua volta, que não estão nem aí para Deus, fazem o que querem.
Ele sofre devido ao desprezo dos soberbos, dos arrogantes que
não se humilham diante da verdade e diante de Deus e não têm a
menor compaixão pelo seu próximo.
Em conclusão, quero aportar algumas lições que este
salmo nos traz e que se aplicam aos momentos de angústia e
sofrimento:
Primeiro: neste mundo, você está sujeito a sofrer escárnio
e desprezo. O fato de que você é filho de Deus, foi salvo pelo
sangue de Cristo e que faz parte do povo de Deus não lhe dá
uma imunidade aqui neste mundo com relação à hostilidade das
outras pessoas. Na verdade, é muito mais provável que você vá
experimentar aqui neste mundo a hostilidade, o desprezo e o
escárnio daqueles que não temem a Deus.
Segundo: há muitas situações em que você pode chegar
ao limite. Veja como é profundamente humana aqui a expressão

45
CAMINHOS DA FÉ

do salmista: “Deus, eu não aguento mais!”. Passa-se a impressão,


em alguns círculos evangélicos, de que o cristão é um super-
homem e que ele enfrenta estoicamente todas as dificuldades da
vida, sempre vitorioso, sempre alegre. Mas há situações — e nós
temos que encarar isso na vida — em que nos sentimos como
essa pessoa aqui: “Deus, eu não aguento mais, está muito difícil,
cheguei até onde eu podia chegar…”. E, em uma situação como
essa, o caminho não é o desespero e desistir ou pensar que Deus
lhe abandonou, mas é elevar os olhos para Aquele que está nos
céus e esperar que Ele tenha misericórdia. Porque Ele haverá de
ter compaixão, ou removendo a dificuldade ou dando graça para
que você caminhe mais uma vez.
Terceiro: você sempre pode aguentar um pouco mais.
Quando eu servia ao Exército, muito tempo atrás, e era aspirante
a oficial, eu me lembro bem do sargento Silva, um homem
muito sério e muito querido por todos nós. Uma das coisas que
nós tínhamos que fazer como aspirantes era a temida marcha
dos 35 quilômetros. Colocávamos todo o equipamento nas
costas, dentro de uma mochila, e andávamos até o mato, onde
acamparíamos. Depois de 10 quilômetros de marcha, eu já estava
sentindo cansaço, e o Silva ao meu lado me dizendo que eu
poderia aguentar mais um pouco. Nos 30 quilômetros, eu já não
aguentava mais nada, e o Silva continuava a dizer que eu poderia
aguentar, que eu iria conseguir. E, ao final dos 35 quilômetros,
eu sabia que só cheguei lá por conta do encorajamento do Silva.
Este salmo fica constantemente nos dizendo isto: olhe
para Deus, olhe para Sua mão, aguarde, aguente mais um pouco.
Ele sabe que você está saturado. Sabe que sua alma não aguenta
mais. Mas você aguenta mais do que você pensa por causa da
graça de Deus em você, por causa da misericórdia de Deus, que
Ele promete nos dar. Você vai atravessar essa peregrinação e vai
chegar até a Jerusalém celestial. Por isso, confiemos em nosso
Deus.
Quarto: antes de aplicar este salmo para você, verifique
de todo coração se você às vezes não é o responsável, e não a

46
SALMO 123 - ENFRENTANDO A HOSTILIDADE

vítima. Talvez, no trabalho, você tenha escolhido uma pessoa que


faz de alvo para sua zombaria, ou em sua família, alguém que,
sempre que você pode, fica criticando ou levando ao escárnio ou
ao ridículo, ou até mesmo na igreja. Então, antes de você usar este
salmo como sendo a vítima, examine o seu coração e converse
com Deus sobre isso.
Quinto: faça a seguinte pergunta a si mesmo: o escárnio e
a zombaria que eu estou sofrendo não serão algo que eu mesmo
atraí? Devido às suas atitudes, à sua falta de amor, à sua crítica,
por seu trabalho malfeito ou qualquer atitude, será que você não
está simplesmente recebendo o castigo que merece pelos erros
que cometeu?
Sexto: olhe agora para o salmo pensando na situação
descrita. Aqui é um sofrimento injusto, um sofrimento por conta
da nossa fidelidade a Cristo e a Deus. Então o que você deve
fazer? Quero que você lembre aqui e que você tome o modelo de
Cristo como exemplo a ser seguido. Ninguém foi mais perseguido
pelo mundo do que Jesus Cristo e de forma tão injusta. Ele sofreu
escárnio de Sua família a princípio, de Seus amigos, irmãos, que
não acreditavam nele, de Sua cidade local, que não O aceitou, e
depois das autoridades religiosas. Finalmente, Ele foi rejeitado,
entregue, traído, abandonado por Seus amigos e crucificado. E
qual foi a atitude de Cristo em todo esse tempo? Exatamente essa
atitude que o salmo expressa bem: o que o nosso Salvador fazia
quando sofria injustamente por você e por mim era orar por Seus
perseguidores, Ele se entregava à misericórdia de Deus. Três vezes
Ele pediu misericórdia, mas teve que aguentar por conta dos
nossos pecados. Se somos discípulos de Jesus, é assim que vamos
enfrentar a hostilidade em todo lugar. Eleve os olhos para Aquele
que está nos céus e ore pelos seus inimigos, pedindo a Deus, em
Sua misericórdia, que use tudo isso para a glória do nome dele e
para que você possa crescer e aprender.
Que Deus nos dê a graça de sermos como peregrinos que
dependem do Pai Celestial. Que sejamos discípulos de Cristo,
nosso Salvador, que enfrentou tudo isso para nos redimir dos

47
CAMINHOS DA FÉ

nossos pecados, para que sejamos sal e luz aqui neste mundo
tenebroso.

ORAÇÃO:

Eu oro, Pai, por aqueles que estão sendo injustamente


perseguidos, desprezados, escarnecidos. Eu oro para que o Senhor
lhes dê renovação e esperança, que o Senhor lhes dê resiliência,
lhes dê a graça de continuar a te servir apesar de toda a oposição.
Eu oro, Senhor, para que Tu nunca permitas que nós sejamos
instrumentos do mal, perseguindo pessoas, ridicularizando,
oprimindo, assediando outrem, mas sejamos instrumentos da
Tua graça aqui neste mundo. Abençoa nossa Igreja, ensina-nos a
perdoar, amar e ser instrumentos de bênção para todos, em nome
de Jesus. Amém.

48
SALMO 124

SE NÃO FOSSE O SENHOR

Não fosse o Senhor, que esteve ao nosso


lado, Israel que o diga; não fosse o
Senhor, que esteve ao nosso lado, quando
os homens se levantaram contra nós, e
nos teriam engolido vivos, quando a sua
ira se acendeu contra nós; as águas nos
teriam submergido, e sobre a nossa alma
teria passado a torrente; águas impetuosas
teriam passado sobre a nossa alma. Bendito
o Senhor, que não nos deu por presa aos
dentes deles. Salvou-se a nossa alma, como
um pássaro do laço dos passarinheiros;
quebrou-se o laço, e nós nos vimos livres.
O nosso socorro está em o nome do
Senhor, criador do céu e da terra.

Este salmo, composto pelo rei Davi, é um hino de louvor


e exaltação a Deus por livramentos, por libertação concedida
em momentos de grande perigo. Aqui, o rei Davi reconhece em
primeiro lugar que, se Deus não estivesse ao lado do Seu povo
e não interviesse em momentos difíceis, o povo estaria perdido.
Depois, ele bendiz a Deus porque Ele, em momento de perigo,
sempre vem em salvamento do Seu povo. E termina o salmo
CAMINHOS DA FÉ

declarando a sua confiança em Deus e conclamando o povo a


confiar no nome do Senhor.
A primeira pergunta que nós precisamos fazer é: em
que situação Davi escreveu este salmo? Quando tomamos
conhecimento de que Davi é o autor, fica fácil responder. Nos
livros históricos (Samuel, Reis e Crônicas), encontraremos pelo
menos três situações em que Davi poderia ter escrito este salmo.
A primeira é aquela história muito conhecida de quando ele
enfrentou o gigante Golias, o campeão dos filisteus, que estava
ameaçando o exército de Deus e ninguém tinha coragem para
aceitar o desafio do gigante. Golias queria lutar contra um
guerreiro escolhido de Israel, e quem ganhasse decidiria o destino
da guerra.
Davi era um pastor de ovelhas, um homem não treinado
na batalha. Ele havia sido enviado por seu pai para o campo dos
israelitas para trazer alimento aos seus irmãos que estavam no
serviço militar e ali ouviu o gigante Golias desafiando o povo
de Deus, e não somente desafiando-o, mas insultando a Deus.
Davi é tomado, então, de um grande zelo pelo nome do Senhor
e resolve ele mesmo partir para enfrentar aquele homem grande,
poderoso, um guerreiro, já experiente. Com uma pedrada na
testa do gigante, Davi pôs fim ao conflito. Se Deus não estivesse
ao lado de Davi, o gigante Golias o teria engolido vivo, como diz
aqui, as águas e as torrentes lhe teriam passado por cima. Mas
Deus estava do lado de Davi e lhe deu esse grande livramento.
Um outro momento na vida do rei Davi em que este salmo
poderia ter sido escrito é quando ele estava fugindo do rei Saul.
Quando Saul descobriu que Davi era o escolhido de Deus para
reinar em seu lugar, Saul começou uma campanha para matá-lo e
o perseguia onde soubesse que ele estava. Há um relato de como o
rei Saul, com seu exército, descobriu onde Davi estava acampado
e veio por um lado da montanha para circundá-la e chegar aonde
Davi estava; eles estavam separados somente por uma montanha.
Quando Saul se aproximou de Davi para matá-lo, chegou um
mensageiro e disse que os filisteus acabavam de invadir algumas

50
SALMO 124 - SE NÃO FOSSE O SENHOR

cidades e ele teria que partir. Saul, então, foi obrigado a desistir
e voltar para resolver os problemas. Foi a libertação de Deus a
Davi, que certamente seria morto naquele encontro que parecia
inevitável.
Mas também há um outro episódio na vida de Davi em
que ele poderia ter escrito este salmo. Foi quando o filho dele,
chamado Absalão, se revoltou contra o seu pai e quis tomar
o trono de Israel, liderando um golpe de Estado contra o seu
próprio pai. Quando Davi viu que Absalão vinha e que já tinha
os militares ao seu lado e os influentes e políticos, fugiu pela porta
dos fundos da cidade e foi embora, juntamente com a sua tropa.
Porém, deixou um conselheiro amigo chamado Husai no palácio.
Assim, quando Absalão tomou o palácio e reuniu todos, Husai
estava no meio.
Absalão, agora rei, perguntou aos conselheiros o que
deveria fazer com seu pai, que estava fugindo e estava para
atravessar o Rio Jordão. Então um conselheiro disse que teriam
que matar Davi, aproveitando que ele estava fraco e cansado.
Porém, Husai disse que esse conselho não era bom, porque Davi
poderia se revoltar e destruir o exército do filho. O melhor a fazer
seria deixá-lo atravessar o rio, acampar e, à noite, quando estivesse
tranquilo e descansado, o atacariam de surpresa. O rei resolveu
que o conselho de Husai era melhor. Isso foi o que livrou Davi,
o conselho daquele homem que estava no palácio, senão Davi
teria sido de fato destruído naquela noite. Se Deus não estivesse
ao lado de Davi quando os homens se levantaram contra ele, ele
teria sido aniquilado.
Nós não sabemos exatamente em qual dessas situações
este salmo foi escrito, e nem mesmo se foi escrito em uma outra
situação similar. O que sabemos é que houve pelo menos três
momentos na vida de Davi em que Deus efetuou um grande
livramento, Deus o livrou do perigo. O salmo é a respeito disso e
de que Deus está ao lado do Seu povo e intervém em sua salvação.
Mais tarde, este salmo foi adicionado aos cânticos dos
peregrinos a caminho de Jerusalém. Este salmo também é muito

51
CAMINHOS DA FÉ

conhecido entre os crentes porque expressa os sentimentos do


nosso coração em nossa jornada aqui neste mundo, quando nós
peregrinamos para a Jerusalém celestial. Nós poderíamos também
contar quantas vezes Deus esteve ao nosso lado e de quantos
perigos Ele nos livrou.
Partamos, então, para a exposição do salmo. Em primeiro
lugar, ele fala que Deus está ao nosso lado: Não fosse o Senhor,
que esteve ao nosso lado, Israel que o diga; não fosse o Senhor, que
esteve ao nosso lado, quando os homens se levantaram contra nós, e
nos teriam engolido vivos, quando a sua ira se acendeu contra nós
(124.1-3). Aqui, Davi está falando sobre Deus estar ao seu lado,
e é isso que vai fazer a diferença. Se Deus não estiver ao nosso
lado, nós estamos perdidos. É porque Ele está ao nosso lado que
somos libertados, que somos livres de situações de perigo, de
calamidade, de crises que vamos encontrar neste mundo.
Isso — Deus ao nosso lado — nada mais é do que aquilo
que na Bíblia e na teologia nós chamamos de a doutrina da
aliança, a doutrina do pacto. Deus fez uma aliança com o Seu
povo. Dentre a humanidade, Ele escolheu aqueles com quem fez
uma aliança selada no sangue de Jesus, prefigurada pelo sangue
dos animais no templo do Velho Testamento. Nessa aliança,
Deus diz que é o nosso Deus e que somos o Seu povo e está ao
nosso lado. Isso significa, então, em termos práticos, que Deus
age em nosso favor, nos liberta de perigos, nos livra não somente
de situações de riscos materiais, mas mais ainda de situações de
risco espiritual. Ele nos protege, nos corrige, nos sustenta, nos
guia aqui neste mundo, porque Ele é o nosso Deus e somos o Seu
povo, Ele está ao nosso lado.
É por isso que Davi, aqui neste salmo, e o apóstolo Paulo,
em Romanos 8.31, dizem: Se Deus é por nós, quem será contra nós?
O Senhor está do nosso lado por conta da aliança. Lembre-se de
que Deus está do nosso lado não por causa de méritos nossos,
não porque nós somos melhores do que qualquer outra pessoa,
não porque você é particularmente melhor e tem mais valor do
que qualquer outra pessoa; mas, pela misericórdia e pela graça de

52
SALMO 124 - SE NÃO FOSSE O SENHOR

Deus, pela aliança que Ele fez com Seu filho Jesus Cristo, porque
Jesus morreu e derramou Seu sangue pelo povo de Deus. Essa é
a doutrina fundamental do cristianismo, ou seja, é a partir disso
— de que Deus está do nosso lado — que nós podemos falar de
salvação, de vida eterna, perdão de pecados, do mundo vindouro
e de todas as bênçãos que Deus preparou para nós.
Nos versos de 3 a 5, Davi relata o que aconteceria se Deus
não estivesse do nosso lado: Não fosse o Senhor, que esteve ao nosso
lado, quando os homens se levantaram contra nós, e nos teriam
engolido vivos, quando a sua ira se acendeu contra nós; as águas nos
teriam submergido, e sobre a nossa alma teria passado a torrente;
águas impetuosas teriam passado sobre a nossa alma. Ele usa três
figuras para descrever o que é que aconteceria conosco se Deus
não estivesse ao nosso lado: a metáfora1 de um terremoto — nos
teriam engolido vivos —, a terra se abrindo e as pessoas caindo
vivas na fenda que depois se fecha. No Antigo Testamento, há
pelo menos uma ocasião em que isso aconteceu, Deus fendeu
a terra e os inimigos do povo dele foram engolidos vivos (Nm
16.30-33).
A segunda figura que ele usa está ainda no verso 3: quando
a sua ira se acendeu contra nós. A ira se acendeu, a raiva ficou
tão intensa como uma fornalha, como fogo, que a tudo destrói,
que a tudo devora. Já a terceira figura está nos versos 4 e 5: as
águas nos teriam submergido, e sobre a nossa alma teria passado a
torrente; águas impetuosas teriam passado sobre a nossa alma. Se
o Senhor não estivesse ao seu lado, eles teriam sido destruídos,
como aqueles que perecem debaixo de uma grande inundação.
Essas três figuras, o terremoto, a fornalha e a inundação,
ilustram os perigos que nós passamos aqui nesta vida, e não
somente os perigos materiais, o risco físico, mas especialmente
os riscos e as ameaças espirituais. Temos que lembrar que essas
coisas têm uma aplicação espiritual e que, de todos os perigos que
podem nos cercar, o maior de todos é o perigo espiritual, aquele
que representa uma ameaça à nossa alma e ao nosso destino
eterno.
1 A metáfora é uma ilustração tirada da vida diária para ilustrar ou deixar claro um ponto espiritual.
53
CAMINHOS DA FÉ

Nos versos 6 e 7, porém, Davi diz que Deus libertou o


Seu povo. Ele usa mais duas metáforas para falar da libertação
de Deus. A primeira, a de um animal de presa, provavelmente
um leão: Bendito o Senhor, que não nos deu por presa aos dentes
deles. Escapar de um leão era praticamente impossível. Mas podia
acontecer! Davi sabia disso. Porque várias vezes ele livrou o seu
rebanho de um urso ou de um leão. Ele sabia o que eles poderiam
fazer quando pegassem um animal do rebanho, era uma salvação
quase impossível. Mas, bendito seja Deus, que não deixou que
fôssemos destruídos pelas presas do oponente!
A segunda figura que ele usa aqui é de uma armadilha
de pássaros: Salvou-se a nossa alma, como um pássaro do laço dos
passarinheiros; quebrou-se o laço, e nós nos vimos livres. Davi fala
que Deus o livrou como a um pássaro que escapa da armadilha.
Ele fala aqui que se quebrou o laço e eles se viram livres. Quem é
que quebrou o laço? Deus! Deus interferiu em uma situação que
parecia impossível, que não tinha saída, não havia luz no fim do
túnel, como um animal preso na boca de um leão, como uma
ave que está presa ao laço. Deus, então, interveio e, àquilo que
parecia impossível, vem a libertação. Por isso Davi diz: Bendito o
Senhor.
Depois de refletir sobre tudo isso usando essas figuras do
dia a dia, que ilustram muito bem esse ponto, ele conclui da única
forma possível: O nosso socorro está em o nome do Senhor, criador
do céu e da terra. Essa é a conclusão a que nós chegamos quando
olhamos para trás e vemos o livramento que Deus nos deu. É
nossa conclusão quando nos lembramos da doutrina da aliança,
que Deus está do nosso lado, quando nos lembramos das Suas
grandes e gloriosas promessas e como Ele é fiel. Não podemos
chegar a nenhuma conclusão a não ser essa, que o nosso socorro,
aqui nesta vida e para a vida futura, está somente no nome daquele
que é o Criador dos céus e da terra. É por isso que Ele pode fazer
essas interferências na história, é por isso que Ele pode atender às
orações e por isso Ele pode resolver casos impossíveis. Porque Ele
é o Criador dos céus e da terra, tudo lhe obedece, tudo está sob

54
SALMO 124 - SE NÃO FOSSE O SENHOR

o Seu controle, não há ninguém acima dele, não há quem possa


contestar a Sua vontade ou fazer aquilo que Ele não quer que seja
feito. Assim, o nosso socorro não está nos homens, embora Deus
possa usar as pessoas para nos ajudar, mas sabemos que por trás
de toda providência, de todo livramento, de toda ajuda e de todo
socorro está o nome do Senhor, que fez os céus e a terra.
Terminamos, então, perguntando-nos o que este salmo
nos ensina. Analisemos alguns pontos.
Primeiro: enfrentamos muitos perigos e situações de risco
em nossa jornada nesta vida. Está errada aquela teologia que
diz que porque Deus está ao nosso lado nada de ruim vai nos
acontecer. Não, o fato de que Deus está ao nosso lado não quer
dizer que Ele vá impedir os perigos ou fazer com que a nossa
vida seja supertranquila, sem problemas e sem dificuldades.
Mesmo que Deus esteja ao nosso lado, aqui neste mundo nós
sofremos violência das pessoas, adoecemos, passamos por crises
de relacionamento e crises financeiras. Aqui neste mundo, nós
estamos sujeitos também a muitos perigos espirituais que, em
um certo sentido, são muito mais graves do que esses perigos
temporais; nós corremos o risco de cair em pecado, de esfriar
nosso relacionamento com Deus, de ser tentados e oprimidos pelo
diabo, de sofrer hostilidade no mundo. A nossa vida é cercada de
ameaças, mas nós podemos e devemos aclamar ao nosso Deus em
todas as situações, lembrando o que diz o salmo 124.
Segundo, nem sempre Deus nos liberta retirando as
ameaças e os perigos físicos e temporais. Ter Deus ao nosso
lado significa que Ele vai fazer sempre aquilo que é melhor para
nós, e aquilo que é melhor para nós nem sempre é livrar-nos
do sofrimento, da dor e da angústia aqui. É através dessas coisas
que Deus obtém o fim maior, que é formar o nosso caráter, nos
fazer semelhantes ao Senhor Jesus Cristo; porque, Ele estando ao
nosso lado, a doença, a dificuldade financeira, as ameaças, não
vão nos destruir, mas vão nos fazer melhores crentes, maduros,
espirituais, vão nos desapegar dos amores deste mundo e vão nos
fazer desejar mais o reino vindouro e as coisas de Deus. O bem

55
CAMINHOS DA FÉ

maior que Deus quer para nós nem sempre está na segurança
financeira, na saúde física, no bem-estar neste mundo, mas é
Deus usando tudo isso para o nosso bem.
O apóstolo Paulo, por exemplo, reconheceu essa verdade,
após sofrimento intenso: E, para que não me ensoberbecesse com a
grandeza das revelações, foi-me posto um espinho na carne, mensageiro
de Satanás, para me esbofetear, a fim de que não me exalte. Por causa
disto, três vezes pedi ao Senhor que o afastasse de mim. Então, ele
me disse: A minha graça te basta, porque o poder se aperfeiçoa na
fraqueza. De boa vontade, pois, mais me gloriarei nas fraquezas, para
que sobre mim repouse o poder de Cristo (2Co 12.7-9). Não fora
Deus que estivesse ao lado do apóstolo Paulo, aquele espinho na
carne o teria destruído. Mas Deus atendeu à oração dele, não ao
tirar o espinho, porém dando graça para que ele pudesse suportar.
Assim também aconteceu com nosso Salvador lá no Getsêmani.
Ele pediu ao Pai que passasse dele aquele cálice, mas Deus negou
e deixou que o Seu próprio filho fosse levado à cruz e padecesse
aquela agonia. Ele tinha um propósito maior em tudo aquilo, que
era a redenção do Seu povo. Se Deus não estivesse ao nosso lado,
o Senhor Jesus não teria sido fortalecido para suportar a agonia
da cruz e morrer por nós, para que tivéssemos redenção. Assim,
o fato de termos Deus ao nosso lado não significa que vamos ter
uma vida isenta de problemas aqui. Significa que Ele vai usar isso
para o bem maior, que é o crescimento espiritual, para que nós
sejamos mais e mais parecidos com Ele.
A maior libertação de todas que Deus pode nos dar é dos
perigos eternos, espirituais. É Deus quem nos livra de Satanás.
Não é interessante que no Novo Testamento essas metáforas que
eu citei anteriormente são aplicadas a Satanás? Por exemplo,
Pedro diz aos seus leitores: Amados, não estranheis o fogo ardente
que surge no meio de vós, destinado a provar-vos, como se alguma
coisa extraordinária vos estivesse acontecendo (1Pe 4.12). Esse fogo
ardente, no contexto de Pedro, é instigado pela ação de Satanás
promovendo perseguição contra o povo de Deus. Quem é que
é chamado de leão que ruge e anda ao redor do povo de Deus?

56
SALMO 124 - SE NÃO FOSSE O SENHOR

Satanás (1Pe 5.8). De quem é dito “cuidado com as astutas ciladas


e armadilhas”? Satanás (Ef 6.11). Todas essas figuras aparecem no
Novo Testamento e são aplicadas a Satanás, que é o inimigo de
nossas almas. Ele é que arma o laço, ele é o leão da presa, que vem
como esse incêndio, que quer passar essa torrente em cima de
nós. Deus nos livra aqui neste mundo de Satanás, o inimigo das
nossas almas, que nos tenta, que nos quer oprimir, que nos quer
derrubar e afastar do nosso Deus. Se Deus não estivesse ao nosso
lado, nós já teríamos sido destruídos completamente pelo diabo e
os demônios, espíritos malignos que estão ao nosso redor.
É interessante como essa passagem é entendida pelo
apóstolo Paulo em Romanos 8. Depois de fazer uma exposição
da obra da redenção e como Deus nos livra da condenação, Paulo
diz: Que diremos, pois, à vista destas coisas? Se Deus é por nós, quem
será contra nós? Aquele que não poupou o seu próprio Filho, antes,
por todos nós o entregou, porventura, não nos dará graciosamente
com ele todas as coisas? Quem intentará acusação contra os eleitos
de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará? É Cristo
Jesus quem morreu ou, antes, quem ressuscitou, o qual está à direita
de Deus e também intercede por nós. Quem nos separará do amor
de Cristo? Será tribulação, ou angústia, ou perseguição, ou fome, ou
nudez, ou perigo, ou espada? Como está escrito: Por amor de ti, somos
entregues à morte o dia todo, fomos considerados como ovelhas para o
matadouro. Em todas estas coisas, porém, somos mais que vencedores,
por meio daquele que nos amou. Porque eu estou bem certo de que
nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as
coisas do presente, nem do porvir, nem os poderes, nem a altura, nem
a profundidade, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do
amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor (Rm 8.31-39).
Deus está ao nosso lado por causa de Cristo, por causa do
que Cristo fez na cruz. Foi Cristo que morreu, ressuscitou, está à
direita de Deus e intercede por nós. Por isso, eu gostaria que você
agora se levantasse da tristeza em que você se encontra, que você
abandonasse a mágoa, o medo, o temor do futuro e a ansiedade
e que se lembre das promessas de Deus. Que Ele está ao nosso

57
CAMINHOS DA FÉ

lado e esse partidarismo dele ao nosso favor é baseado no sangue


de Cristo, que foi derramado na cruz do Calvário por você e por
mim. Nada vai nos separar do amor de Deus. Essa tribulação que
você está passando, essa angústia, esse momento difícil, Deus vai
santificar isso pela Sua providência, para o seu bem. Nada pode
mais nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, por
isso todas as coisas cooperam para o bem daqueles que O amam.
Que você tenha a esperança e a alegria renovadas e louve
a esse Deus, cante a Ele e diga que quer viver para o Seu louvor,
porque, pelo Seu grande amor e misericórdia, Cristo morreu e lhe
livrou do maior de todos os perigos: a condenação eterna, que os
seus pecados, com justiça, mereciam.

ORAÇÃO:

Ó Deus, te damos graças porque o Senhor está ao nosso


lado, está ao lado do Teu povo e nada poderá nos separar do Teu
amor. Damos-te graças pela obra completa de Cristo e porque
através dela nós somos livres do laço do passarinheiro, da presa do
leão, da fornalha ardente, do terremoto que engole e da torrente
que destrói. Damos-te graça porque o Senhor nos preservará e
nos conservará para o Teu reino, aquele reino em que se aproxima
o mundo vindouro, que se achega a cada dia, quando o Senhor,
então, estabelecerá a justiça e a paz finalmente aqui neste mundo.
É o que nós te pedimos, em nome de Jesus. Amém.

58
SALMO 125

ENFRENTANDO A ADVERSIDADE

Os que confiam no Senhor são como o


monte Sião, que não se abala, firme para
sempre. Como em redor de Jerusalém estão
os montes, assim o Senhor, em derredor
do seu povo, desde agora e para sempre. O
cetro dos ímpios não permanecerá sobre
a sorte dos justos, para que o justo não
estenda a mão à iniquidade. Faze o bem,
Senhor, aos bons e aos retos de coração.
Quanto aos que se desviam para sendas
tortuosas, levá-los-á o Senhor juntamente
com os malfeitores. Paz sobre Israel!

Este salmo é de encorajamento. Ele tem como objetivo


animar o coração do crente quando passa por uma grande
adversidade e momentos difíceis. Nós não sabemos quem o
compôs, mas ele é um dos salmos preferidos dos cristãos. Quem
não o conhece ou não gosta dele, não é mesmo? Quem não está
familiarizado com a sua abertura: Os que confiam no Senhor são
como o monte Sião? É um daqueles versículos que decoramos, pois
ouvimos desde pequenos, e o recitamos. Não sabemos quem o
compôs, mas sabemos que ele era usado pelos peregrinos judeus
quando se deslocavam de suas cidades para Jerusalém durante as
festividades anuais ordenadas pela lei de Moisés.
CAMINHOS DA FÉ

O nosso objetivo ao expor este salmo é trazer o conforto,


o ensinamento, a instrução e o encorajamento que ele trouxe ao
povo de Deus naquela época, considerando que nós somos o povo
de Deus hoje e que também estamos peregrinando, estamos aqui
neste mundo de passagem, caminhando para o nosso lar celestial,
a Jerusalém que está nos céus. Este salmo fala de como o povo de
Deus deve se comportar quando está passando por um período
de adversidade em sua jornada para a pátria celestial.
Vamos começar tentando imaginar a situação em que este
salmo foi escrito. O que é descrito no salmo é uma situação em
que o povo de Deus está vivendo debaixo da opressão dos ímpios.
Então, olhando a história da nação de Israel, há três possibilidades
em que isso poderia ter acontecido. Primeiro: quando a nação
de Israel estava em sua terra, porém estava dominada por uma
potência estrangeira, como os moabitas, os filisteus e os amonitas.
Isso aconteceu várias vezes, conforme lemos no livro dos reis e no
livro das crônicas. Nesses livros vemos que às vezes acontecia que
um povo estrangeiro dominava a terra prometida, e Israel ficava
debaixo da opressão daqueles povos ímpios. Uma dessas ocasiões
bem pode ter sido o momento em que o salmo foi escrito.
Uma outra situação era quando um rei judeu se tornava
ímpio e oprimia o povo de Deus. Esse é outro caso que
encontramos também no livro dos reis e no livro das crônicas.
Há vários períodos em que alguns dos reis de Israel, como o rei
Acabe, que eram extremamente ímpios, oprimiam o próprio povo
de Deus, e aqueles que temiam ao Senhor sofriam sob aquele
governo opressor.
Ou pode ter sido também em situações em que Israel
estava dominando sobre a terra, mas havia alguns bolsões de
resistência e hostilidade, alguns espaços que ainda pertenciam
aos inimigos, aos filisteus, amorreus e cananeus, que estavam ao
redor, e havia sempre aquele perigo e adversidade.
Qualquer que tenha sido a situação — e eu quero acreditar
que o que encaixa melhor aqui é um tempo em que Israel estava
sendo dominado por uma potência estrangeira; este salmo traz o

60
SALMO 125 - ENFRENTANDO A ADVERSIDADE

mesmo quadro: crentes verdadeiros vivendo sob a adversidade, a


opressão e a perseguição. Havia o mau exemplo dos governantes
ímpios, que poderia corromper o crente verdadeiro, havia a
opressão, havia a injustiça. Com isso tudo, havia o risco de o
temente a Deus desanimar, desistir, ceder e, finalmente, aliar-
se com os maus, com os ímpios, viver como eles viviam e fazer
aquilo que era abominável a Deus. E, naquela época, duas coisas
em particular eram tentações para o povo de Israel: a idolatria,
que era se curvar diante dos deuses desses povos que oprimiam a
nação de Israel, o que aconteceu várias vezes, e a imoralidade, ou
seja, a devassidão, a prostituição, que também eram características
desses povos ao redor da nação de Israel.
Este salmo é escrito nesse contexto. O povo de Deus estava
sendo oprimido e ameaçado. Os que temiam a Deus estavam
sendo provados constantemente. O salmo mostra, então, de que
maneira eles deveriam se comportar e enfrentar as situações de
adversidade. E são basicamente três atitudes que o salmista nos
recomenda:
A primeira é que nós temos que nos lembrar das promessas
de Deus; isso está nos versos de 1 a 3. A segunda atitude é a de
orar a esse Deus das promessas (verso 4). A última, que está no
verso 5, é que nós devemos ficar atentos contra a tentação e o
risco de nos desviarmos por conta dessa adversidade e provação.
Agora, veremos cada uma dessas recomendações feitas no salmo,
orando para que Deus o utilize para nos confortar, animar e
encorajar quando nós mesmos passamos por tantas adversidades
aqui neste mundo.
A primeira atitude que o salmista recomenda ao povo de
Deus é que se lembre das promessas do Senhor. Nos versos de
1 a 3, o salmista se dirige àqueles que confiam no Senhor. Essa
palavra, portanto, é para o verdadeiro israelita, para o verdadeiro
judeu, aquele que temia e amava a Deus. Ele é chamado aqui de
“aquele que confia no Senhor, é bom e reto de coração e pratica
o que é justo”. Essa descrição combina duas coisas: a fé pela qual
ele é justificado e perdoado e as atitudes que demonstram isso.

61
CAMINHOS DA FÉ

Ele é bom, justo e reto de coração porque foi justificado. Ou seja,


essa palavra aqui é dada aos verdadeiros crentes dentro do povo
de Israel. No meio do povo de Deus, havia os que se desviavam,
mas essa palavra aqui é para os que confiam no Senhor e O amam
de todo o coração.
É bom lembrar o que significa confiar no Senhor. A
confiança em Deus não era somente uma atitude de pensamento
positivo ou concordar que Deus existe. Aqui no contexto, bem
como em toda a Bíblia, confiar no Senhor significa firmar-se na
palavra dele, receber de Deus uma palavra e colocar sua vida, guiar
suas ações e fazer as suas escolhas com base naquela palavra. Por
quê? Porque foi Deus que disse, e Ele é o Criador, Ele é o Senhor,
o Todo-Poderoso, Ele é fiel e não mente, não muda. O que Ele
diz vai acontecer. Confiar em Deus é você viver pela palavra dele,
colocar sua vida no que Ele diz e dirigir as suas atitudes por tudo
aquilo que Deus já falou. Na época em que o salmo foi escrito, os
cinco livros de Moisés já estavam prontos, alguns outros salmos
já estavam prontos, os livros históricos já estavam prontos, o livro
de Josué já estava pronto, talvez até o livro de Jó. Então já havia
Escritura. Aquele que confia no Senhor é o que recebe a palavra
de Deus e deposita a sua esperança completamente nela.
Há particularmente três promessas que são feitas aqui para
os que confiam no Senhor. A primeira delas é firmeza. Observe o
verso 1: Os que confiam no Senhor são como o monte Sião, que não
se abala, firme para sempre. O Monte Sião era um monte sobre
o qual estava a cidade de Jerusalém. Ele não é um monte muito
grande, não é uma montanha imponente como o Himalaia, mas
dá a ideia de fortaleza e de firmeza. Ele está firmado em uma
cadeia de montanhas, está muito seguro ali. Essa figura do monte
que passa a ideia de firmeza e estabilidade é aplicada àquele que
confia no Senhor. O que confia no Senhor é como um monte, ele
está firme, não se abala.
São duas coisas aqui que são ditas com relação à firmeza
do que confia no Senhor. A primeira é que aquele que confia
no Senhor é como o Monte Sião, que não se abala. O que isso

62
SALMO 125 - ENFRENTANDO A ADVERSIDADE

significa? Na verdade, não significa que o crente não vai passar


por problemas, apenas que esses problemas não vão abalá-lo, não
vão destruí-lo, não vão afastá-lo de Deus, como diz o restante
do verso primeiro: ele fica firme para sempre. Nós estamos aqui
diante da doutrina ensinada em toda a Bíblia, de que aqueles
que confiam no Senhor serão guardados por Deus para todo o
sempre. Eles podem passar por adversidades, eles vão passar por
problemas e dificuldades, mas nunca serão removidos da presença
de Deus, nunca vão cair da graça de Deus, nunca vão perder esse
relacionamento com Ele, jamais serão cortados da Aliança. Eles
são como uma montanha, que não se abala. Os ventos sopram,
a tempestade vem, a chuva pode cair, porém os que confiam no
Senhor são como uma montanha, eles ficam ali, firmes. Note,
entretanto, que ele está firme pela fé, e não pelos méritos dele. Ele
está firme porque confia naquele que é firme, naquele que é fiel e
naquele que o sustenta.
A segunda promessa é de proteção. Veja o que diz o verso
2: Como em redor de Jerusalém estão os montes, assim o Senhor, em
derredor do seu povo, desde agora e para sempre. Aqui, outra vez
é tirada uma comparação da geografia de Jerusalém. O Monte
Sião estava no meio de uma cadeia de montanhas — na verdade,
é um planalto, onde está erigida a cidade de Jerusalém, cercado
por montanhas mais altas. Então, da mesma forma que aquelas
montanhas cercam a cidade de Jerusalém e fornecem um refúgio
natural contra os inimigos, Deus está ao redor do Seu povo, desde
agora e para sempre. O que isso significa? Em primeiro lugar, a
ideia de que Deus está em redor, ou seja, Ele nos cerca e nos
protege por todos os lados, não há nenhuma brecha por onde o
inimigo possa entrar.
Em segundo lugar, Ele faz isso agora e para todo o
sempre. Essa proteção de Deus para o Seu povo é uma proteção
que vai durar eternidade afora. Mais uma vez, o salmo não está
dizendo que essa proteção divina significa que Deus vai evitar que
algum mal nos aconteça, como uma opressão, uma doença, uma
dificuldade financeira, um acidente ou qualquer um dos males

63
CAMINHOS DA FÉ

que são comuns à natureza humana. O que o salmo está dizendo


aqui é que Deus vai nos proteger, vai nos cercar, para que nós
jamais nos afastemos dele, para que nós permaneçamos fiéis a
Ele e firmes no relacionamento com Ele, enquanto que outros se
desviam, como vamos ver no versículo final. Deus protege o Seu
povo dos ataques do diabo, dos ataques da carne, do mundo e do
nosso próprio coração, porque a Sua aliança e a Sua fidelidade
não podem ser quebradas.
A terceira promessa é de livramento. Atente para o verso 3:
O cetro dos ímpios não permanecerá sobre a sorte dos justos, para que
o justo não estenda a mão à iniquidade. Veja que promessa! Como
eu disse, à época deste salmo, a nação de Israel estava oprimida
por um rei ímpio. Esse é o contexto provável aqui no verso 3. A
expressão o cetro2 dos ímpios significa aqui o poder dos ímpios; o
poder dos ímpios não permanecerá sobre a sorte dos justos. Se os
justos aqui eram o povo de Deus, a sorte deles, ou a porção deles,
era a nação de Israel. Ou seja, havia um rei ímpio, um poder
ímpio, que estava dominando sobre a nação de Israel, mas Deus
estava dizendo que aquilo não permaneceria muito tempo, que
Ele não iria deixar que os justos fossem oprimidos pelos ímpios
durante muito tempo. Talvez eles fossem oprimidos durante um
período, talvez eles passassem um tempo de adversidade e aflição,
porém Deus não permitiria que isso demorasse muito, para que o
justo não estenda a mão à iniquidade (final do verso 3).
Se a perseguição é muito demorada, se o sofrimento é
muito grande, se a atribulação se demora muito, o justo pode
se corromper, ele desanima. Não são poucos os membros da
Igreja que, diante de muita aflição e dificuldade, abandonam a fé,
duvidando da existência de Deus. E, quando eles não abandonam
a fé, esfriam na fé, desanimam, ficam meio que confusos, em
dúvida, porque essas coisas ruins lhes estão acontecendo. Mas há
essa promessa para os que confiam no Senhor: Ele não permitirá
que o poder do ímpio permaneça sobre o justo, para que o justo
2 Cetro é o bastão que o rei tem na mão e que simboliza o poder real, com o qual ele dá as ordens, comanda
batalhas, determina ações, promulga leis; resumindo, o cetro representa o poder.

64
SALMO 125 - ENFRENTANDO A ADVERSIDADE

não lance mão da iniquidade, para que ele não desista e queira
proceder como o ímpio, como o injusto e o corrupto, porque não
acredita mais que há diferença entre servir a Deus ou não.
No Novo Testamento, encontramos duas passagens que
são bem parecidas com essa. Uma delas é no sermão escatológico
de Jesus, em que o Senhor se referiu à grande tribulação, que é um
período de grande adversidade que um dia virá sobre o povo de
Deus. Ele disse que, se Deus não abreviasse aqueles dias, ninguém
se salvaria. Se Deus não abreviasse o tempo do sofrimento, da
adversidade e da provação, nem os eleitos suportariam (Mt
24.22).
Já a outra passagem é do apóstolo Paulo, em 1Coríntios
10.13: Não vos sobreveio tentação que não fosse humana; mas Deus
é fiel e não permitirá que sejais tentados além das vossas forças; pelo
contrário, juntamente com a tentação, vos proverá livramento, de
sorte que a possais suportar. Em outras palavras, o salmista está
dizendo: “Aguente mais um pouco, Deus é que sabe a medida,
Deus sabe o tempo, e Ele não vai permitir que o cetro do ímpio
permaneça sobre o justo, para que o justo não lance mão à
iniquidade”. Queremos nos livrar da adversidade logo, desejamos
que ela vá embora prontamente, mas Deus tem um propósito
com tudo isso!
E aqui está essa garantia, que é a terceira promessa do
salmo: quem está no controle é Deus, e não o ímpio, apesar
de ele ter o cetro. No tempo de Deus, Ele vai remover o poder
da adversidade, para que você não se corrompa. São essas três
promessas que nós devemos lembrar no tempo da adversidade.
Nós temos um grande Deus que está no controle de todas as
coisas, que sabe o que podemos suportar. O alvo dele não é
que nós aqui vivamos uma vida tranquila e confortável, mas
que permaneçamos fiéis a Ele, firmes em nossa fé e em nossa
confiança.
A segunda atitude que o salmo nos recomenda —
lembrando que a primeira é confiar nas promessas de Deus — é
orar em meio à adversidade (125.4). O salmista agora, depois

65
CAMINHOS DA FÉ

de ter se dirigido, nos versos 1, 2 e 3, aos seus irmãos que estão


passando por adversidades, dirige-se a Deus e faz uma oração:
Faze o bem, Senhor, aos bons e aos retos de coração. Ele ora: “Deus,
faze o bem a esse povo, esse Teu povo que está debaixo da
adversidade”. Fazer o bem aqui não significa tornar a nossa vida
mais fácil, significa nos firmar na fé, nos proteger da queda e do
afastamento.
Na carta de Paulo aos romanos, temos uma passagem
muito conhecida que diz que todas as coisas cooperam para o
bem dos que amam a Deus (Rm 8.28). Geralmente lemos esse
versículo pensando que o bem ali é o nosso conforto, é a nossa
prosperidade, a nossa saúde, a nossa segurança e o nosso bem-
estar e exclamamos: “Puxa, que promessa maravilhosa! Deus usa
todas as circunstâncias para o meu bem, para que eu me sinta
bem, para que eu tenha tudo e seja próspero”. Mas não é esse o
bem a que a Bíblia se refere quando diz que Deus faz tudo para o
nosso bem. Também não é esse o bem a que o salmista se refere
quando ele ora e diz: Faze o bem, Senhor. O bem aqui é o bem
espiritual, é você estar firme com Deus, ficar firme nas promessas
dele, continuar a servir a Deus mesmo quando tudo está dando
errado. Confiar em Deus quando tudo está bom é muito fácil,
mas a nossa fé é provada quando Ele tira os nossos confortos
aqui neste mundo, quando tira aquilo que nos acalenta e nos é
seguro e nos faz andar pela fé e pelas Suas promessas, quando
tudo ao redor parece dizer o contrário. Então a oração é esta:
Senhor, faze o bem a esse povo, aos bons e aos retos de coração,
que são aqueles que confiam no Senhor e que estão passando
por essa adversidade. Esta deveria ser a nossa atitude em época
de adversidade, de aflição, de problemas: clamar ao Deus da
promessa e pedir que Ele cuide de Seu povo.
Finalmente, no verso 5, há a terceira atitude: temos que
vigiar contra as tentações. Observe: Quanto aos que se desviam para
sendas tortuosas, levá-los-á o Senhor juntamente com os malfeitores.
Quem são esses a quem o salmista se refere aqui como sendo os
que se desviam para as sendas tortuosas? São aqueles membros

66
SALMO 125 - ENFRENTANDO A ADVERSIDADE

do povo de Deus que, debaixo do cetro do ímpio, debaixo do


poder da adversidade, desviam-se para sendas tortuosas. Eles
cedem diante da pressão no ambiente de trabalho, na escola, na
família, no ambiente público, em todo lugar, deixam-se dominar,
intimidar e enfraquecer pelo ímpio e pelo seu poder. Desviam-se
para caminhos tortos, saindo do caminho de Deus. São o oposto
daquele que fica firme como o Monte Sião.
Não são poucos, como eu disse, na história da Igreja, que,
debaixo de muita adversidade, perseguição e provação, desviaram-
se por caminhos tortuosos, abandonaram a fé, abandonaram a
confiança em Deus, porque acharam que Ele não era justo e que
eles não mereciam sofrer daquele jeito. Eles não entenderam o
propósito de Deus, desanimaram e voltaram atrás. Mas olhe o que
o salmista diz sobre aqueles do povo de Deus que não suportam
caminhar os três quilômetros que ainda faltam e que querem
cair no meio do caminho: levá-los-á o Senhor juntamente com os
malfeitores. Deus vai tratá-los como vai tratar os malfeitores que
estão oprimindo o Seu povo e vai levá-los a juízo.
Esse versículo é uma advertência para nós, para que nós,
em meio à dificuldade e à adversidade, não sejamos corrompidos
pela tentação de desanimar, abandonar a Deus, negar ou esfriar
a nossa fé, virar as costas para Deus ou então praticar o mal. Por
exemplo, em seu ambiente de trabalho, o poder do ímpio lhe
impõe ou o obriga a fazer o que é contra a palavra de Deus, e você
resiste e resiste, até que a uma certa altura você cede e começa a
viver como ele. Você foi corrompido, tornou-se como um deles.
E a advertência aqui é que Deus vai tratar os que se desviam para
caminhos tortuosos como trata os malfeitores, ou seja, há um dia
em que Deus vai exercer juízo e justiça e vai ajustar as contas com
todos nós, e, nesse dia, os que confiam no Senhor serão como o
Monte Sião: eles não se abalam. Porém, os que se desviarem por
caminhos tortuosos serão tratados como os malfeitores.
A última oração do salmo é a que está no final do verso
5: Paz sobre Israel! Haja paz sobre o povo de Deus, que o povo
de Deus, em meio à adversidade, encontre paz em sua confiança,

67
CAMINHOS DA FÉ

que seja como o monte Sião, que não se abala, que confia no
Senhor que o cerca, como as montanhas cercam Jerusalém. Que
o povo de Deus confie na promessa dele de que a tentação vai ser
somente por um tempo e que Ele sabe o nosso limite e vai dar o
escape também para que o Seu povo permaneça firme para todo
o sempre.
Eu termino destacando três coisas que este salmo
nos ensina. Primeira, que o povo de Deus enfrenta muitas
adversidades. É fato, começou em Israel, debaixo do domínio
pagão, depois os cristãos sob o Império Romano, depois os
cristãos na época moderna, sob os regimes totalitários, como os
regimes islâmicos, o cristão no ambiente de trabalho, na própria
família, na sociedade moderna, com leis que o expulsam mais e
mais da esfera pública, que influenciam a sua maneira de criar
os filhos, a sua visão de família e de sexualidade. A Igreja vive
debaixo de adversidade desde o dia em que nasceu. Essa é a
nossa jornada aqui. Somos peregrinos em um mundo hostil, não
somos daqui, estamos aqui, mas não pertencemos aqui, a nossa
pátria é celestial. Neste mundo, vamos enfrentar adversidades, há
inimigos por todos os lados. Então, se você pensa no cristianismo
ou que ser cristão é algum tipo de religião que tem como objetivo
beneficiá-lo aqui neste mundo e que Deus vai lhe recompensar
dando tranquilidade, paz e segurança, você tem uma concepção
errada de cristianismo.
A segunda lição que desejo destacar neste salmo é que
Deus firma, protege e livra o Seu povo. Deus não vai impedir que
o sofrimento e a adversidade venham, mas vai nos sustentar para
que não caiamos nas provações. É o que chamamos em teologia
de perseverança dos santos. Aqueles a quem Deus amou, chamou,
justificou, por quem Cristo morreu e em quem o Espírito Santo
habita jamais decairão da graça, jamais abandonarão a fé em
Deus, mesmo que passem por muitas adversidades e tribulações.
E não é por mérito deles, é porque Deus os cerca, os protege
e os livra aqui neste mundo. Os que são de Deus haverão de
perseverar mesmo em meio a tantas provações, ainda que haja
momentos de adversidade, de questionamento e de dúvida.
68
SALMO 125 - ENFRENTANDO A ADVERSIDADE

Terceira: Deus haverá de levar a juízo aqueles que


oprimem o Seu povo. Haverá um dia em que Deus levará a juízo
os que oprimem o Seu povo. Nós queremos que Ele o faça aqui e
agora. Costumamos nos perguntar por que o ímpio prospera, e a
resposta é que Deus tem um dia apontado e já tem o juiz — que
será Jesus Cristo —, em que Ele vai julgar o mundo. Somente
nesse dia haverá justiça completa e então veremos que valeu a
pena servir a Deus. Nesse dia, ficará clara a diferença entre quem
teme a Deus e confia nele e quem virou as costas para Ele. Por
isso, nós temos de viver neste mundo olhando para o futuro. A
nossa confiança está nas promessas do Senhor, e não em qualquer
conforto terreno, não em qualquer coisa aqui deste mundo, mas
sim em quem fez os céus e a terra.
Porém, como é que você vai viver isso se você não lê a sua
Bíblia todo dia? Onde é que estão as promessas de Deus? Estão ali
nas Escrituras, mas os dias passam e você usa o seu tempo de forma
equivocada, não reserva momentos para ler a Escritura. Quando
vier a adversidade, com que você vai enfrentar a dor, o sofrimento,
a intriga, a inimizade, a calúnia e a opressão? Autoajuda? Não!
Com a Palavra de Deus! É nela que nós encontramos as promessas
de Deus para que vivamos como o Monte Sião. Lembre-se, você
tem que ter a sua mente na Palavra de Deus, seu coração tem que
estar firmado nela, por isso é que você precisa diariamente tirar
tempo para ler a Escritura e meditar nela, memorizá-la e fazer
dela a linguagem do seu coração.
Outra coisa que devemos fazer é orar sem cessar, como
nos ensina o salmo: Faze o bem, Senhor. Clamar a Deus, tirar
tempo todo dia em oração com o Senhor e pedir que Ele cumpra
as Suas promessas, porque Ele é fiel. Ainda, é preciso vigiar, não
desanimar diante da provação que parece demorada demais, não
imitar a prática dos ímpios, mas ficar firme na confiança em nosso
Deus e, acima de tudo, louvá-lo pelo nosso Senhor e Salvador
Jesus Cristo. É somente por conta dele — porque foi Ele que
aguentou até o final sem desistir, Ele que tomou sobre Si todos
os nossos pecados e bebeu até a última gota do cálice da ira de

69
CAMINHOS DA FÉ

Deus — que você e eu hoje podemos ser salvos, perdoados e fazer


parte do povo de Deus. Então louve a Deus por meio de Jesus
Cristo, nosso Senhor e Salvador, o Capitão da nossa fé, nosso
Sumo Sacerdote, por meio de quem nós somos conduzidos aqui
neste mundo, até aquele grande dia em que entramos em nossa
pátria celestial.

ORAÇÃO:

Ó Senhor, bendito seja o Teu nome! Tu és fiel! As Tuas


promessas são verdadeiras. Ensina-nos a perseverar aqui neste
mundo, em meio às provações. Dá-nos graça para permanecermos
firmes quando os ímpios nos perseguem e oprimem. Guarda o
Teu povo em Teu amor. E, se falharmos, tenha compaixão de nós,
e levanta-nos para continuarmos no caminho do Reino Celestial.
Em nome de Jesus, amém.

70
SALMO 126

COMO VIVER SEMPRE ALEGRE

Quando o Senhor restaurou a sorte de


Sião, ficamos como quem sonha. Então,
a nossa boca se encheu de riso, e a nossa
língua, de júbilo; então, entre as nações se
dizia: Grandes coisas o Senhor tem feito
por eles. Com efeito, grandes coisas fez o
Senhor por nós; por isso, estamos alegres.
Restaura, Senhor, a nossa sorte, como
as torrentes no Neguebe. Os que com
lágrimas semeiam com júbilo ceifarão. Quem
sai andando e chorando, enquanto semeia,
voltará com júbilo, trazendo os seus feixes.

Este é um dos salmos prediletos do povo cristão. Ele fala


de restauração, alegria e júbilo. A palavra de Deus nos convoca
a vivermos assim, sempre alegres. Muitas passagens no Novo
Testamento falam a respeito disso, como: Alegrai-vos sempre no
Senhor; outra vez digo: alegrai-vos (Fp 4.4).
Esse desafio de permanecer alegres em toda e qualquer
situação tem levado os cristãos através da História a buscar a
Deus por orientação sobre a maneira pela qual nós podemos
sempre viver alegres. Mesmo quando a vida está cercada de
dificuldades, problemas, adversidades, conflitos, angústias e
CAMINHOS DA FÉ

temores, a orientação da Escritura é clara: Deus deseja que o Seu


filho aqui neste mundo sempre tenha o espírito tranquilo, de
regozijo e de gratidão por todas as coisas. A grande dificuldade é
como fazer isso. Este salmo nos fala de que maneira nós podemos
cultivar sempre um espírito alegre mesmo em meio às grandes
dificuldades.
Nós não sabemos quem compôs este salmo, mas com
certeza, ao fazê-lo, o salmista expressou muito bem os sentimentos
do povo de Deus depois que a nação de Israel foi libertada do
cativeiro da Babilônia. Esse é o provável contexto em que este
salmo foi escrito. Ele começa se referindo à restauração da sorte
de Sião no verso primeiro, que é uma referência à libertação da
nação de Israel do cativeiro babilônico.
Como você se recorda bem da história, os descendentes
de Abraão haviam entrado na terra prometida sob a liderança de
Josué, e, pela graça de Deus, conquistaram todas aquelas nações
que já habitavam ali e se tornaram o poder dominante na terra.
Então a terra passou a ser da nação de Israel, a terra que Deus
havia jurado dar aos descendentes de Abraão. Porém, o povo de
Deus, já na terra, esqueceu-se dele e começou a adorar outros
deuses, começou a se misturar com os povos pagãos e a adotar os
seus costumes. Assim, Deus mandou juízes e profetas, levantou
reis piedosos que reformaram parcialmente a religião de Israel.
Mas o povo continuava idólatra e endurecido de coração, até que
finalmente — usando um termo humano — a paciência de Deus
se esgotou e Ele resolveu castigá-los expulsando-os daquela terra
que Ele lhes havia dado.
Primeiro, Deus mandou os assírios, que eram, na época,
a nação que dominava o cenário político, econômico e mundial.
Os assírios invadiram o reino do norte, que tinha sua capital em
Samaria. Naquele tempo, Israel estava dividido em dois reinos.
O reino do norte, com capital em Samaria, onde havia o culto
aos bezerros de ouro; em vez de adorarem a Deus, eles adoravam
bezerros de ouro, imaginando que foram esses deuses que os
tiraram da terra prometida. Deus, então, mandou os assírios

72
SALMO 126 - COMO VIVER SEMPRE ALEGRE

com seu chicote para castigar o Seu povo e levou o reino do


norte em cativeiro. E havia o reino do sul, cuja capital era Judá,
da dinastia de Davi, que seguia nos mesmos erros do reino do
norte. Deus mandou os babilônicos, que já tinham dominado os
assírios a essa altura, levarem cativo o restante do povo de Deus
para a Babilônia. Eles foram presos, muitos morreram, inclusive
velhos e crianças. A nação foi assolada, o templo foi destruído,
os muros de Jerusalém foram derrubados. Os judeus perderam
tudo que tinham e foram levados em massa para a Babilônia para
servirem ali como escravos. Ficaram cerca de setenta anos como
escravos dos reinos que dominavam a Babilônia. No começo, foi
o rei Nabucodonosor, depois veio Ciro, o persa, que dominou
a Babilônia. E, durante esse tempo, lá no cativeiro, os judeus
ficaram sem o templo, ficaram sem a terra, sem os sacrifícios, sem
os sacerdotes, sem o seu rei, embora Deus não tenha se esquecido
deles. Mesmo que o Seu povo estava no cativeiro, Deus ministrou
a eles através do profeta Daniel e outros que ele havia levantado,
como o escriba Esdras.
Passados cerca de setenta anos, Deus se lembrou do
Seu povo, teve misericórdia deles e moveu o coração de Ciro,
o rei da Pérsia, que dominava o mundo naquela época e havia
tomado Babilônia e todos os reinos. Esse rei, então, passou um
decreto libertando os judeus e autorizando que eles voltassem
para a sua terra, deu-lhes presentes e dádivas, inclusive forneceu
guardas para a viagem, dizendo: “Vão e reconstruam sua cidade,
reconstruam o templo ao Deus de vocês”. Deus moveu o coração
daquele governante cerca de setenta anos depois do cativeiro, e os
judeus voltaram, não todos, mas muitos voltaram e reocuparam
as cidades antigas que um dia lhes pertenceram e começaram a
reconstruir as suas casas, os muros, o templo. Esse é o período de
Esdras, de Neemias e dos profetas Ageu, Zacarias e Malaquias,
que são os três últimos profetas que nós encontramos no Antigo
Testamento.
Porém, a vida não estava fácil. Por um lado, eles estavam
muito alegres pela restauração de sua vida como nação, mas

73
CAMINHOS DA FÉ

as dificuldades para recomeçar eram muitas. Primeiro havia a


hostilidade dos povos ao redor: ninguém queria os judeus de
volta. A terra não tinha ficado vazia. Quando os judeus saíram da
terra, outros povos a ocuparam, e agora havia o problema de ter
que conviver com vizinhos que não queriam que eles estivessem
ali. E havia também a tentação de eles voltarem a cometer os
mesmos pecados. Na verdade, muitos dos judeus que voltaram
do cativeiro já estavam se misturando com as mulheres daqueles
outros povos e começavam a praticar idolatria. As dificuldades
financeiras eram muito grandes, porque eles receberam permissão
para voltar para a terra, porém ainda eram um povo subjugado,
sob o domínio do rei da Pérsia. Eles ainda tinham que pagar
tributo e não podiam ter o seu rei de volta. Eram governados
por um preposto, alguém enviado pelo rei da Pérsia para poder
dominar sobre eles. Além disso, muitos judeus haviam ficado na
Babilônia, o retorno foi parcial.
O salmista escreve este salmo nessa situação. Ele olha para
trás, vê a restauração, vê como Deus mudou a sorte do seu povo,
libertando-o, e relembra o sentimento que eles tiveram naquele dia,
a alegria que sentiram quando chegou a notícia de que poderiam
voltar. Então ele olha para a situação presente, as dificuldades
que eles estão vivendo, que a restauração não é completa, e ora
para que Deus termine a restauração. Ele olha para frente, para o
futuro, quando Deus haverá de trazer uma restauração completa
ao seu povo. É por isso que o salmo está dividido em duas partes.
Na primeira, a alegria pela restauração passada pelas bênçãos que
Deus já deu (versos 1 a 3) e, na segunda, a alegria pela restauração
futura, por aquilo que Deus haveria de fazer (versos 4 a 6).
Aqui no salmo 126, nós encontramos o padrão do
procedimento de como podemos atender à ordem de Deus
de vivermos contentes em todo lugar e sempre. Primeiro, nos
lembrando do que Deus fez, do que Ele nos deu em Cristo
Jesus, e, segundo, olhando para o que Ele ainda nos fará e, em
meio a isso tudo, orando para que Ele cumpra a Sua promessa.
Examinemos, então, o ensino deste salmo.

74
SALMO 126 - COMO VIVER SEMPRE ALEGRE

Em primeiro lugar, o salmista se alegra, ou registra a


alegria do povo de Deus pela restauração passada (126.1-3). Eles,
na terra prometida, olham para trás, para aquele momento de
libertação, e lembram os sentimentos que tiveram quando essas
coisas aconteceram — são quatro. Quando o Senhor restaurou
a sorte de Sião, ficamos como quem sonha. Quando os cativos
souberam que estavam livres, que poderiam voltar para casa, foi
como um sonho. Era bom demais para ser verdade. A primeira
impressão foi uma mistura de incredulidade e alegria. Eles foram
surpreendidos por uma circunstância boa: o decreto do rei
dizendo que estavam livres e poderiam voltar para a sua terra. Era
um sonho!
Quando foi dito a eles que Deus restaurou a sorte de
Sião — Sião é outro nome para Jerusalém —, isto é, que agora
Sião, com Jerusalém e toda aquela região, voltou a ser deles, eles
ficaram como quem sonha, naquele estado de uma alegria quase
inacreditável pelo que Deus fez. Deus havia se lembrado deles,
miseráveis pecadores que estavam ali. Ele os tinha castigado,
estavam ali devido às suas faltas e culpas, mereciam tudo aquilo,
mas agora Deus teve misericórdia deles e os livrou do cativeiro.
A segunda reação está no verso 2: Então, a nossa boca se
encheu de riso, e a nossa língua, de júbilo. Os judeus começaram a
rir à toa, a felicidade entrou em seu coração, eles batiam no ombro
um do outro e se juntavam para rir, para celebrar e agradecer, era
só felicidade. Deus havia mudado a situação deles, Deus os havia
restaurado daquela situação tão difícil e complicada, e a boca
deles se encheu de júbilo. Eles começaram a falar da alegria que
eles estavam sentindo por aquilo que Deus havia feito. A alegria
era tão grande, que eles não conseguiam se conter. A língua
deles se encheu de júbilo e eles expressavam para as pessoas, aos
vizinhos que eram de outras nações — lembre que na Babilônia
não havia somente os judeus, mas outros povos que haviam sido
conquistados também pelos babilônicos, assírios e persas —, e
diziam: “Você ouviu a boa notícia? O rei nos libertou! Nós vamos
voltar para casa!”. Então, entre as nações se dizia: Grandes coisas o
Senhor tem feito por eles.
75
CAMINHOS DA FÉ

No verso 3, há o testemunho de glória a Deus: Com efeito,


grandes coisas fez o Senhor por nós; por isso, estamos alegres. Que
dias gloriosos aqueles em que chegou a notícia! Coração alegre,
coração exultante, coração embandeirado, em festa, alegria,
testemunho, lembrando-se de tudo que Deus fez, de como Ele
teve misericórdia, a língua cheia de júbilo, tudo isso redundando
em glória para Deus. De fato, quem assinou o decreto foi o rei,
mas sabemos quem é que segurou a mão do rei e o mandou
escrever isso: foi o nosso Deus, é Ele que está por trás de cada
libertação, de cada providência. [...] grandes coisas fez o Senhor por
nós; por isso, estamos alegres.
Contudo, aqueles dias estavam no passado. O salmista
agora ora e pede: Restaura, Senhor, a nossa sorte. Estranho, Deus não
a havia restaurado? Não é o que diz o verso primeiro? O que tinha
acontecido é que, passados os primeiros momentos, os primeiros
dias, meses e anos da euforia e da alegria, eles perceberam que a
vida mais ou menos retornara ao seu ritmo normal, eles estavam
de volta à terra prometida, mas a reconstrução da cidade era
complicada. É só ler o livro de Esdras e Neemias e você vai ver as
dificuldades que os samaritanos e outros povos estavam colocando
para a reconstrução da cidade. Havia calúnia, armadilhas, pessoas
que faziam fuxico para o rei sobre os judeus, que estavam
lutando contra aquilo. Além disso, os judeus pareciam meio que
desanimados, pois, em vez de construir a casa de Deus e trabalhar
na reconstrução do templo, estavam preocupados em abrir lojas,
abrir o seu negócio, a sua oficina, e somente o que sobrava eles
levavam a Deus.
O profeta Ageu levantou-se nessa época, perguntando:
“Por que vocês estão preocupados com a casa de vocês e não estão
reconstruindo a casa de Deus?”. O profeta Zacarias também
reclamou do povo nesse tempo. Esdras, o escriba que Deus
levantou como líder juntamente com Neemias, juntava o povo
e dizia: “Por que vocês estão devagar? Vocês estão oprimindo
os seus irmãos, vocês estão casando com mulheres desses povos
pagãos, estão começando a cometer os mesmos pecados que nos

76
SALMO 126 - COMO VIVER SEMPRE ALEGRE

levaram um dia para a Babilônia como escravos”. A situação não


era fácil, e agora a alegria se transformava em oração: “Ó Deus, o
Senhor já restaurou a nossa sorte, mas ainda não completamente,
ainda há muita coisa a ser feita, Senhor, muita coisa precisa ser
avançada”.
Então o salmista usa duas analogias nessa oração como
expectativa daquilo que ele quer que Deus faça. A primeira está
ainda no verso 4, quando ele diz: Restaura, Senhor, a nossa sorte,
como as torrentes no Neguebe. O Neguebe é uma região deserta
que fica ao sul da Judeia. Ela passava a maior parte do tempo
seca. Havia muitos riachos que ficavam secos a ponto de o leito
ficar rachado. E de repente chovia nas montanhas e vinha uma
inundação, descendo montanha abaixo, e aqueles ribeiros se
enchiam da água que descia como uma torrente e irrigavam o
deserto. Era tempo de eles começarem a semear. O que o salmista
está dizendo com essa analogia é: “Deus, da mesma forma que
inesperadamente, de repente e poderosamente tu mandas a água
que enche aqueles ribeiros secos lá no sul do Neguebe, faz a
mesma coisa conosco, restaura a nossa sorte, vem com poder, vem
com graça, com majestade e abundância, restaura completamente
o Teu povo, termina a obra que o Senhor começou, exatamente
como aquelas torrentes do Neguebe”.
Nos versos 5 e 6, nós temos a segunda ilustração que ele
usa, da restauração completa que ele deseja que Deus faça: Os
que com lágrimas semeiam com júbilo ceifarão. Quem sai andando
e chorando, enquanto semeia, voltará com júbilo, trazendo os seus
feixes. Naquelas épocas de seca, eles tinham que plantar mesmo
que o terreno estivesse seco, à espera das torrentes do Neguebe.
O agricultor saía espalhando a semente, semeando em esperança,
porque ele dependia das chuvas. Enquanto ele semeava, as lágrimas
desciam de seus olhos, pois ele não sabia o que ia acontecer, se
a torrente viria, se as chuvas viriam, porque ele estava semeando
em terreno seco. O salmista lembra aqui da fidelidade de Deus,
dizendo: Os que com lágrimas semeiam com júbilo ceifarão, porque
o Neguebe será inundado com as águas mandadas por Deus:

77
CAMINHOS DA FÉ

Quem sai andando e chorando, enquanto semeia, voltará com júbilo,


trazendo os seus feixes.
Note que ele se alegra olhando para trás: Quando o Senhor
restaurou a sorte de Sião, ficamos como quem sonha. Então, a nossa
boca se encheu de riso, e a nossa língua, de júbilo. E agora ele se
alegra olhando para frente, dizendo: “Senhor, nosso trabalho
de semeadura aqui nesta terra agora é feito com lágrimas, mas
um dia nós voltaremos trazendo os feixes com júbilo”. Júbilo é
a mesma palavra que é usada no início do salmo. Ele olha para
trás, vê o que Deus fez e se enche de júbilo. Então, ele olha para
frente, para o que Deus fará, e se enche de júbilo. É assim que
nós vivemos felizes neste mundo, a nossa alegria não está restrita
aos bens materiais ou a qualquer outra coisa, mas à ação de Deus,
à história da redenção, àquilo que Ele fez por nós e àquilo que
haverá de fazer.
É isso que o salmo nos ensina quanto a viver alegremente
neste mundo. Ele nos lembra, em primeiro lugar, que devemos
olhar para trás e, no caso do cristão, devemos lembrar o que Deus
já fez por nós em Cristo Jesus. Temos mais motivos de alegria
olhando o passado do que os judeus quando foram libertos do
cativeiro, pois Deus nos libertou de um cativeiro pior do que o
cativeiro político, pior do que o cativeiro econômico: Deus nos
libertou da escravidão do pecado em Cristo Jesus, quando Ele
nos perdoou as nossas ofensas, nos livrou do cativeiro de Satanás,
quando nos tirou do reino das trevas e nos levou para o reino
do filho do Seu amor. Ele perdoou as nossas dívidas espirituais,
o salário do pecado, que é a morte. Ele nos perdoou isso, que é
muito maior e melhor do que o rei Ciro ter perdoado as dívidas da
nação de Israel e ter liberado aquele povo. Deus nos fez parte do
Seu povo, e isso é motivo de sonharmos, de rirmos, de falarmos e
de darmos testemunho.
É a isso que a Bíblia se refere como alegria da salvação. A
salvação é um fato consumado na vida do crente, ela já aconteceu,
e nós olhamos para trás e nos perguntamos como é que Deus
pôde perdoar pecadores como nós, como é que Ele pôde restaurar

78
SALMO 126 - COMO VIVER SEMPRE ALEGRE

a nossa sorte; nós, miseráveis pecadores debaixo do cativeiro


de Satanás, da escravidão do pecado, condenados pelos nossos
delitos, com uma dívida diante de Deus que nós só podemos
pagar com a nossa alma no Inferno. Mas Deus perdoou, esqueceu,
nos libertou, nos fez Seus filhos e, mais do que simplesmente dar
uma terra como deu aos judeus, Ele nos fez herdeiros dele, nos
deu o mundo inteiro. Nós somos herdeiros de Deus e, portanto,
tudo isso nos pertence.
Portanto, a razão primeira da nossa alegria é essa, é olhar
para trás e dizer: “Grandes coisas fez o Senhor por nós, por isso
estamos alegres”. Você sabe por que vivemos tristes, abatidos e
desanimados? Porque nos esquecemos do que Deus fez. Razão
tem aquele hino quando diz: Conte as bênçãos, conte quantas são,
e você vai ver surpreso o quanto Deus já fez. Eu sei que esse hino
está se referindo à providência divina que Deus tem por nós
aqui nesta vida, mas essencialmente Ele nos lembra da grande
restauração que Deus nos deu em Cristo Jesus. É assim que nós
vivemos alegres neste mundo, olhando para trás e vendo quem
nós éramos e em que Deus nos tornou mediante Jesus Cristo.
O salmo também nos ensina que, aqui neste mundo,
essa restauração ainda não é completa. Expressamos isso da
seguinte maneira: o Reino de Deus já veio, já começou, a nossa
salvação já teve início, mas ainda não está terminada. Deus nos
libertou do pecado, porém nós ainda pecamos; Ele nos livrou da
condenação da morte, contudo ainda vamos morrer; Ele quebrou
o poder de Satanás sobre nós, entretanto o diabo ainda anda ao
redor, procurando alguém a quem devorar; Deus já nos livrou
da condenação eterna, todavia nós ainda vamos experimentar
a morte. O Senhor restaurou, porém ainda assim nós oramos:
“Restaura-nos, Senhor”.
Deus já nos restaurou, mas nós oramos: “Restaura-nos,
Senhor”. E nós olhamos, então, para o futuro, para aquele grande
dia em que Deus nos dará restauração completa, quando Ele nos
ressuscitará dos mortos, vencendo a morte definitivamente — só
a ressureição vai vencer a morte definitivamente —, quando Ele

79
CAMINHOS DA FÉ

nos dará a vida eterna, e a morte será banida, quando Ele nos
dará não uma posse em alguma parte deste planeta como deu a
Israel, mas nos dará um novo céu e uma nova terra, onde habita
a justiça; quando estaremos com Ele para todo o sempre, com o
Senhor Jesus, o amado da nossa alma, quando nunca mais haverá
dor, aflição, doença, angústia e depressão. Nós oramos e olhamos
para aquele dia, e o nosso coração se alegra, porque temos certeza
disso. Nós vivemos na esperança certa de que um dia Deus vai
fazer tudo isso conosco. Por isso, ao olharmos para trás e para
frente, o nosso coração se enche de júbilo, ainda que no presente
nós tenhamos que semear com lágrimas, ainda que no presente o
nosso coração se encha de temores e de expectativas. Ainda assim
nós oramos: “Ó Deus, cumpre o que o Senhor prometeu, traz o
reino eterno, manda o Teu filho, liberta o mundo do cativeiro do
pecado, glorifica os que são Teus, manda aquela colheita plena”.
E, enquanto não chega aquele dia aqui neste mundo, servimos a
Deus falando dele para os povos. Deus fez grandes coisas por nós,
de fato, por isso estamos alegres e servimos a Ele, aguardando o
dia da libertação.
Eu finalizo este capítulo com duas palavras de aplicação
prática. Primeiro, quero perguntar a você com toda a franqueza:
em que se baseia a sua alegria? O que faz você alegre? Quero
que você pense nisso. O que dá mais alegria a você? Talvez uma
pessoa, uma conquista pessoal, um carro que você adquiriu, uma
casa que você comprou, um projeto de viagem que você tem, a
conclusão do seu curso, seu namorado, seus filhos? O que lhe
enche de alegria?
Todas essas coisas materiais vão passar, um dia você vai
perder a sua mocidade, um dia você vai perder a sua beleza, a
sua saúde, o seu cônjuge, talvez até perca filhos, talvez perca
propriedades, tudo aquilo em que seu coração se foca como razão
de alegria aqui neste mundo. Todas essas coisas são passageiras,
todas elas são secundárias. A única razão, a única fonte verdadeira
de alegria, é Deus e a Sua obra por nós, o que Ele fez por nós em
Cristo, aquilo que Ele faz e aquilo que Ele fará.

80
SALMO 126 - COMO VIVER SEMPRE ALEGRE

É por isso que Jesus disse: “Nós estamos no mundo, mas


nós não somos do mundo”. Somos peregrinos. Nosso coração
tem que se desapegar dessas coisas aqui do mundo. Não é que
elas não sejam boas, não é que não devemos agradecer a Deus por
elas, mas a nossa alegria não pode estar nelas, porque um dia elas
faltarão. Muitos, quando perdem essas coisas, caem em depressão
e não retornam. Eu não estou dizendo que toda depressão é
resultado de uma visão espiritual deficiente, eu sei que há outras
causas para a depressão. Porém, eu desconfio que boa parte da
angústia, da tristeza, da solidão e do desânimo dos cristãos não
é um problema clínico, mas é falta de foco no que a Palavra de
Deus diz, de regozijo em Deus e nas coisas de Deus.
A segunda palavra é para aqueles que estão tristes, abatidos
e sem ânimo para continuar. Eu quero que hoje, pensando neste
salmo, você encha o seu coração de júbilo, que você olhe para
trás, não importam as tristezas, as angústias, a dor e o sofrimento,
eu quero que você olhe através delas e veja a libertação e o perdão
de Deus em Cristo Jesus, a reconciliação que Deus lhe deu
mediante Seu filho, e que isso encha o seu coração de júbilo a
ponto de você transcender à dor e à agonia que agora aprisionam
a sua alma. Que isso liberte você, que o recordar o que Deus fez
por você restaure o seu coração e a alegria da salvação, para que
você não viva dessa forma. Crentes desanimados e sem esperança
são uma péssima recomendação do Evangelho para o mundo.
Grandes coisas fez o Senhor por nós, por isso estamos alegres.
Ainda que agora esteja doente, sofrendo solitário, sem dinheiro,
sem perspectiva, confuso, eu sei o que Ele fez por mim, e o meu
coração se alegra por tudo isso.

ORAÇÃO:

Pedimos-te, ó Deus, que venhas como uma torrente no


deserto do Neguebe, inundando os ribeiros da nossa esperança
com alegria e trazendo aquela água e os frutos da semeadura em

81
CAMINHOS DA FÉ

feixes de júbilo, para que o nosso coração fique em festa e que nós
possamos mostrar ao mundo que, em meio ao desespero que nos
cerca, há motivo de alegria em um grande Deus que nos liberta e
fez por nós muito mais do que podemos pensar ou contar.
Enche-nos do Teu espírito, lembrando que o fruto do
espírito é a alegria e a paz. Ó Deus, nós queremos agora pedir
perdão ao Senhor por deixar que a tristeza, o pessimismo, o
desânimo, a desesperança, a murmuração e a reclamação encham
o nosso coração, aquele ressentimento e amargura que já duram
anos. Senhor, perdoa-nos, porque nem lembramos mais o que é
a alegria da salvação.
Enche de alegria o nosso coração, como a torrente que cai
sobre o Neguebe. Dá-nos, ó Deus, a alegria da salvação, para que
sejamos um povo alegre, o povo mais feliz deste planeta. Abençoa
a Igreja e que os Seus membros possam encontrar em Ti motivo
de regozijo em todas as coisas. Ó Deus, ouve a nossa oração.
Eu oro pelos aflitos e abatidos. Ergue-os, ó Deus, restaura
a sua sorte e que eles possam olhar para Ti e encher o coração de
gozo na presença do Senhor. É o que te pedimos por amor de
Jesus. Amém.

82
SALMO 127

DEUS EM PRIMEIRO LUGAR

Se o Senhor não edificar a casa, em vão


trabalham os que a edificam; se o Senhor
não guardar a cidade, em vão vigia a
sentinela. Inútil vos será levantar de
madrugada, repousar tarde, comer o pão que
penosamente granjeastes; aos seus amados
ele o dá enquanto dormem. Herança do
Senhor são os filhos; o fruto do ventre,
seu galardão. Como flechas na mão do
guerreiro, assim os filhos da mocidade. Feliz
o homem que enche deles a sua aljava; não
será envergonhado, quando pleitear com
os inimigos à porta.

Este salmo provavelmente foi escrito pelo rei Salomão,


conforme é dito no título — cântico de romagem de Salomão.
Além disso, o contexto em que foi escrito se aplica à época do rei
Salomão.
No final do verso 2, está dito que Deus dá aos Seus
amados o pão de cada dia. A palavra amado, no hebraico, deu
origem à palavra Jedidias, que foi o primeiro nome de Salomão
(2Sm 12.25). Os estudiosos do Antigo Testamento entendem
que de fato este salmo foi escrito pelo rei Salomão, provavelmente
CAMINHOS DA FÉ

naquela época em que ele estava construindo o templo e também


uma casa para si. Por isso o salmo inicia dizendo: Se o Senhor não
edificar a casa, em vão trabalham os que a edificam.
Mais tarde, muitos anos depois de Salomão, este salmo
originalmente composto por ele foi adicionado aos Salmos de
Romagem e depois cantado pelo povo de Israel quando do
retorno do cativeiro babilônico. Ou seja, este salmo tem uma
longa história dentro da história do povo de Deus do Antigo
Testamento.
O contexto do qual eu quero que você esteja consciente
à medida que nós trabalhamos este salmo é exatamente esse do
retorno dos judeus do cativeiro. Eles haviam regressado depois
de setenta anos de escravidão e tinham que reconstruir aquele
mesmo templo que Salomão havia construído alguns séculos
atrás. Israel estava cercado por povos hostis, havia os samaritanos,
os amonitas, os moabitas, que não queriam que Israel reedificasse
a cidade de Jerusalém e muito menos o templo, fazendo de tudo
para impedir esse trabalho.
Nem todos os judeus haviam regressado do cativeiro, o
povo era pouco, os filhos eram poucos. Este salmo provavelmente
é adaptado para aquela ocasião e expressa o sentimento e as
convicções do judeu temente a Deus, querendo reconstruir
o templo e a sua própria casa, cercado de inimigos. O salmo
expressa aqui o seguinte ponto: sem a ajuda de Deus, os judeus
não conseguiriam reconstruir o templo.
Na verdade, sem a ajuda de Deus, eles não conseguiriam
reconstruir a nação depois de setenta anos de cativeiro. Nada
sem a ajuda de Deus poderia ser feito, nenhum bem aconteceria,
todos os seus esforços seriam em vão se Deus não estivesse com
eles. Note a repetição da frase: se o Senhor não.
Em outras palavras, o salmo nos ensina que nós devemos
aguardar em Deus e confiar nele enquanto desempenhamos os
nossos deveres, cumprimos as nossas tarefas e descansamos na
providência dele, porque, se Deus não estiver conosco, todo o
nosso labor, tudo que nós fizermos aqui neste mundo, será em

84
SALMO 127 - DEUS EM PRIMEIRO LUGAR

vão. É isso que o salmo nos ensina, que, se Deus não estiver
conosco, nada do que nós fizermos aqui terá alguma valia.
E este salmo ensina essa verdade em quatro situações da
vida: a edificação de uma casa, a proteção de uma cidade, o ganho
do sustento e a importância da família.
Vejamos, agora, cada uma delas detalhadamente.
A primeira situação, que provavelmente deu origem ao
salmo, é a edificação de uma casa: Se o Senhor não edificar a casa,
em vão trabalham os que a edificam (127.1). A primeira referência
parece ter sido à construção da casa do Senhor, o templo, por
parte de Salomão. E Salomão estava muito bem consciente desse
fato. Ele tinha riquezas, tinha pessoas hábeis para construir a casa,
os povos amigos e aliados tinham mandado artífices, madeira e
pedras preciosas; o próprio rei Davi havia deixado muito material
e muita riqueza para que o seu filho Salomão construísse o
templo. Porém, Salomão sabia que, se Deus não edificasse a casa,
em vão ele estaria trabalhando, juntamente com todos os seus
empregados, para o desempenho da casa do Senhor.
Esse princípio se aplica à reconstrução ou à construção de
qualquer casa ou de qualquer projeto na vida. Se o Senhor não
edificar a casa, em vão nós trabalhamos. O que significa edificar
em vão se Deus não estiver conosco? Primeiro, pode significar
que o projeto não vai chegar ao fim, pois é Deus quem controla
as circunstâncias, é Deus quem dá saúde, quem dá os recursos,
é Deus que manda os obreiros. Por exemplo, a Torre de Babel
era um projeto que não estava de acordo com Deus. Os homens
a começaram, mas não a terminaram, porque Deus não estava
com eles. Se Deus não edificar a casa, eles trabalham em vão.
Se Deus não der as condições, nós vamos começar, porém não
vamos terminar.
Também pode significar que você até pode terminar, mas
não vai morar nela, ela vai ficar vazia ou outra pessoa vai ocupar
aquela casa. Ainda, pode significar que você vai construir e vai
morar naquela casa, porém não vai desfrutar dela.

85
CAMINHOS DA FÉ

O próprio Salomão, em várias passagens do livro de


Eclesiastes, fala a respeito disso, de pessoas que constroem
determinados itens, mas acabam não desfrutando, porque Deus
não está com elas. Veja, por exemplo, no livro de Eclesiastes,
que foi escrito pelo próprio Salomão, quando ele diz: Pois que
tem o homem de todo o seu trabalho e da fadiga do seu coração, em
que ele anda trabalhando debaixo do sol? Porque todos os seus dias
são dores, e o seu trabalho, desgosto; até de noite não descansa o seu
coração; também isto é vaidade. Nada há melhor para o homem do
que comer, beber e fazer que a sua alma goze o bem do seu trabalho.
No entanto, vi também que isto vem da mão de Deus, pois, separado
deste, quem pode comer ou quem pode alegrar-se? Porque Deus dá
sabedoria, conhecimento e prazer ao homem que lhe agrada; mas ao
pecador dá trabalho, para que ele ajunte e amontoe, a fim de dar
àquele que agrada a Deus. Também isto é vaidade e correr atrás do
vento (Ec 2.22-26).
Salomão está dizendo que, se Deus não estiver com a
pessoa, ela vai construir, vai edificar, mas para outrem, em vão
ela vai trabalhar, todo o seu empenho será em vão, porque ela
não vai desfrutar do fruto do seu trabalho. Ela não vai ter alegria
nem paz naquilo que ela tanto se esforçou durante toda a vida.
Isso é verdade a respeito de muitas pessoas que passam a vida toda
lutando, sofrendo para ganhar alguma coisa, mas não conseguem
desfrutar daquilo, aquilo não lhes traz nenhuma satisfação ou
realização, a vida deles é trabalhar, alegria eles não têm nenhuma.
Ter paz e gozar do fruto do trabalho é um dom de Deus, por isso
é que, se Deus não edificar a casa, você está trabalhando em vão.
Ou você não vai terminar ou você vai terminar e vai servir para
outro, ou você até vai morar, mas a casa não vai alegrar o seu
coração, porque é somente Deus quem dá sentido às coisas que
nós fazemos aqui neste mundo. Sem Ele, nada do que fazemos
aqui vai nos satisfazer e alegrar o nosso coração, ou seja, sem Deus
todas as nossas empreitadas serão em vão.
Ainda, no livro de Eclesiastes, há um versículo que diz:
Quanto ao homem a quem Deus conferiu riquezas e bens e lhe

86
SALMO 127 - DEUS EM PRIMEIRO LUGAR

deu poder para deles comer, e receber a sua porção, e gozar do seu
trabalho, isto é dom de Deus (Ec 5.19). Há um mal que vi debaixo
do sol e que pesa sobre os homens: o homem a quem Deus conferiu
riquezas, bens e honra, e nada lhe falta de tudo quanto a sua alma
deseja, mas Deus não lhe concede que disso coma; antes, o estranho
o come; também isto é vaidade e grave aflição (Ec 6.1-2). Às vezes,
uma pessoa tem tudo na vida, mas não tem prazer nas coisas que
tem, não tem alegria, não tem contentamento, porque, se Deus
não edificar a casa, em vão trabalham os que a edificam; se Deus
não estiver com nossas empreitadas aqui nesta vida, elas são em
vão, nós trabalhamos para nada.
A segunda referência que é usada no salmo para mostrar
que sem Deus nossa vida aqui neste mundo não vale nada é a
proteção de uma cidade. Ainda no verso primeiro, na segunda
parte, diz: Se o Senhor não guardar a cidade, em vão vigia a
sentinela (127.1b). Na época do retorno do cativeiro, o povo de
Deus estava ocupado em reconstruir os muros de Jerusalém, e os
inimigos não queriam que eles fizessem isso. O livro de Neemias
fornece o pano de fundo para este salmo. Lá você vai ver como
Neemias determinou guardas que vigiassem a cidade durante 24
horas, as famílias tinham que mandar pessoas que funcionassem
como vigias, e Neemias — que foi o grande líder na época da
reconstrução dos muros de Jerusalém e do templo — determinou
que os judeus trabalhassem com uma pá na mão e a espada na
outra, tal era o perigo. Eles estavam cercados de inimigos, era
preciso trabalhar com um olho no muro e outro no moabita que
estava querendo se aproximar e acabar com tudo.
Porém, o salmista sabe que, se Deus não guardar a cidade,
todas essas precauções serão em vão, a sentinela vigia em vão,
porque é Deus quem controla as circunstâncias. Quem é que pode
prever incêndios, terremotos, enchentes, pragas, epidemias? Tudo
pode acontecer, e a cidade irá para o chão. Em vão a sentinela
vigia se Deus não for o verdadeiro guarda da cidade, Ele é que é de
fato a nossa proteção. Isso não quer dizer que nós não temos que
tomar as medidas — coloque alarmes, faça seguro dos seus bens,

87
CAMINHOS DA FÉ

tranque as portas antes de ir dormir, tome todas as providências.


A Bíblia não é contra você tomar todo esse tipo de providência;
mas, em última análise, se Deus não guardar a cidade, tudo isso
é em vão. Ele é que é o guarda final de todas as coisas, porque
Ele é quem controla as circunstâncias, Ele é quem guia os fatos e
os acontecimentos. Tudo está na mão dele. Se Ele não estiver ao
nosso lado, podemos ter seguro, alarmes, cães guardando a casa,
podemos ter o que for, e nada disso vai nos proteger.
Se o Senhor não guardar a cidade, em vão vigia a sentinela.
Isso pode se aplicar não somente à cidade, mas também à nossa
integridade física, à nossa família, à própria Igreja de Deus,
enfim, a todos os ambientes em que nós estamos. O ponto é este:
é Deus, no final das contas, quem nos protege e cuida de nós.
Sem a proteção dele, nada do que fazemos aqui será de alguma
valia.
A terceira referência que nos é apresentada aqui neste salmo
é sobre o ganho do sustento: Inútil vos será levantar de madrugada,
repousar tarde, comer o pão que penosamente granjeastes; aos seus
amados ele o dá enquanto dormem (127.2). No verso primeiro,
ele diz que, se o Senhor não edificar a casa, é inútil o trabalho
dos que a edificam. Depois, se o Senhor não guardar a cidade,
é inútil o trabalho da sentinela. E agora, no terceiro quadro, ele
afirma que é inútil você acordar cedo, dormir tarde, suar para
ganhar o pão de cada dia. Temos que entender essa declaração
à luz do fato de que Israel era uma sociedade agrária, a forma
principal de sustento dos judeus era a agricultura, eles dependiam
especialmente das colheitas para poder sobreviver.
Ninguém que acorda cedo gosta de ir dormir tarde, e
ninguém que dorme tarde gosta de acordar cedo, não é verdade?
Só que aqui você encontra um homem que está fazendo essas
coisas, observe: Inútil vos será levantar de madrugada, repousar
tarde, comer o pão que penosamente granjeastes. Salomão está
dizendo que não adianta você trabalhar feito louco, acordando
de madrugada e indo dormir tarde para ganhar o seu pão. Tudo
isso é inútil se Deus não for com você. Afinal, esse seu trabalho

88
SALMO 127 - DEUS EM PRIMEIRO LUGAR

será para quem? O resultado do seu esforço será para o quê? Em


que isso vai lhe trazer alegria, prazer e contentamento, se você
não consegue nem dormir, de tanto trabalhar? Se o trabalho é
o deus da sua vida, se trabalhar, ganhar dinheiro, amealhar bens
e fortunas é o alvo da sua existência, é inútil isso, é em vão, não
faz sentido. E Salomão diz aqui que, enquanto você está fazendo
isso, Deus dá o pão aos Seus amados enquanto eles dormem.
Enquanto eles estão dormindo, Deus está trabalhando por eles,
Deus faz a semente germinar, a chuva cair, faz e usa as leis da
natureza para promover a felicidade e o bem daqueles que O
amam e confiam nele.
O contraste aqui não é entre uma pessoa que está em
casa orando e esperando cair um pacote de dinheiro do céu e um
cidadão que está lá no campo lavrando com todas as suas forças.
O contraste é entre dois trabalhadores, o problema é a atitude
deles: um vive para isso, vive ansioso, nervoso, estressado, a sua
vida é trabalho o tempo todo, não tem paz, não dorme direito,
não tem alegria, não tem prazer no que faz; o outro trabalha
duro, mas ele deita e dorme, porque ele confia na providência de
Deus e que Deus haverá de suprir suas necessidades e lhe dar o
pão necessário para sua subsistência.
Sem Deus, o nosso trabalho é inútil. Sem Deus, o que você
faz aqui não vai satisfazer o seu coração, você vai passar sua vida
toda se esforçando, mas não vai conhecer paz, não vai conhecer
alegria, realização e gozo nas coisas espirituais, porque vai ser
inútil você fazer tudo isso. Em contraste, Deus dá essas coisas
com alegria aos Seus amados, àqueles que O amam, confiam nele
e querem viver para Ele.
A quarta referência trata da família: Herança do Senhor
são os filhos; o fruto do ventre, seu galardão. Como flechas na mão
do guerreiro, assim os filhos da mocidade. Feliz o homem que enche
deles a sua aljava; não será envergonhado, quando pleitear com
os inimigos à porta (127.3-5). Filhos eram muito desejados em
Israel. Na verdade, eram muito desejados em todo o Oriente. Na
cultura oriental antiga, não havia plano de saúde, aposentadoria,

89
CAMINHOS DA FÉ

abrigo para idosos. Os pais dependiam dos filhos quando ficassem


velhos, e, quanto mais filhos, melhor. E eu continuo acreditando
nisso até hoje, porque plano de saúde e aposentadoria vão
garantir que você vai ter o que precisa para viver, mas e a solidão?
Quem vai visitar você? Quem vai estar lá com você para olhar as
fotos antigas, relembrar e chorar de saudade dos tempos antigos?
Quem vai fazer isso? Embora os tempos tenham mudado, isso
continua sendo verdade.
Ter muitos filhos era desejado naquela época não somente
para proteção e suporte dos pais quando ficassem idosos, mas
também para proteção da cidade. E, nessa situação, o povo de
Israel havia voltado do cativeiro, as famílias eram menores, as
dificuldades eram maiores do que quando a terra estava em paz e
havia prosperidade.
O salmo é adaptado para explicar esse ponto. Observe
a história que está sendo narrada: um pai de família está sendo
ameaçado por inimigos e é convocado para ir à porta da cidade,
porque lá era o tribunal, era lá que sentavam os juízes e os casos
eram julgados, as situações eram resolvidas, negócios eram
fechados. Um homem estava sendo convocado e confrontado por
seus inimigos para resolver um caso lá, e ele foi. Porém, quando
ele foi, ele foi cercado por dez homens enormes, formando
uma falange. Quando ele chegou lá, que os inimigos olharam,
começaram a falar fino diante daquele homem cercado por seus
filhos. Observe: Herança do Senhor são os filhos; o fruto do ventre,
seu galardão. Como flechas na mão do guerreiro, assim os filhos da
mocidade. Feliz o homem que enche deles a sua aljava; não será
envergonhado, quando pleitear com os inimigos à porta. Lá na porta
da cidade, no momento do confronto, aquele homem não ficaria
envergonhado, porque ele estava cercado daqueles homens que
ele gerou quando jovem e que eram os seus filhos, que estavam
ali para sua proteção.
O salmo nesse ponto compara o pai cercado dos filhos
com um guerreiro cuja aljava está cheia de flechas. Imagine um
guerreiro que vai para a luta e tem o arco, mas não tem flechas.

90
SALMO 127 - DEUS EM PRIMEIRO LUGAR

Os filhos são essas flechas na mão do guerreiro, em sua aljava,


quando ele vai para o combate.
Porém, o ponto é: quem é que dá esses filhos tão queridos
e desejados? De onde é que vêm os filhos? A resposta é que não
somos nós que damos nossos filhos a Deus, mas é Deus quem dá
os filhos a nós. Veja o que diz o verso 3: Herança do Senhor são os
filhos; o fruto do ventre, seu galardão. Ou seja, filhos vêm de Deus.
E agora você pode entender por que essa referência está aqui
também. Da mesma forma que Deus edifica a casa, da mesma
forma que Ele guarda a cidade e dá o pão, Ele também nos dá
a família, nos dá filhos, que são motivo de alegria, de quem nós
vamos depender, que são e serão instrumentos do Senhor para
proteção, não somente minha, mas também de toda a cidade.
Filhos são herança de Deus, e feliz o homem que enche a sua
aljava com eles.
O que este salmo nos ensina, então? Em resumo, o que
eu como cristão posso aprender deste salmo? Ele me ensina várias
coisas. A primeira delas, sem dúvida, é a soberania e a providência
de Deus sobre todas as coisas. Nosso Deus reina, Ele é Senhor,
está no controle da história e é quem edifica a casa, que protege a
cidade, que nos dá o pão de cada dia, que nos abençoa com filhos,
que nos dá segurança e proteção.
Isso nos leva ao segundo ponto que o salmo nos ensina: a
inutilidade de nosso labor, esforço e trabalho aqui neste mundo
sem a bênção de Deus. Nós vamos trabalhar para nada, vamos
nos esforçar para nada, vamos suar para nada. Se Deus não estiver
conosco, os nossos esforços serão em vão.
A terceira coisa que nós aprendemos aqui é que é Deus
quem preserva, sustenta e mantém o Seu povo, que cuida do Seu
povo e do sustento dele. Portanto, este salmo também nos ensina
a nossa total dependência de Deus. E aqui vem o ponto final dos
ensinamentos: se essa é a verdade, qual deve ser, então, o alvo
principal da minha vida? Qual deve ser o alvo principal da sua
vida? A resposta pode ser resumida naquilo que Jesus Cristo disse:
Buscai, assim, em primeiro lugar, o Reino de Deus e a sua justiça, e
todas essas coisas vos serão acrescentadas (Mt 6.33).
91
CAMINHOS DA FÉ

Esse é o alvo maior da minha vida e da sua. Não é


correr atrás dessas coisas, mas buscar a Deus em primeiro lugar,
conhecê-lo, ter comunhão com Ele, estar reconciliado com Ele,
ter Deus ao seu lado. Essa é a prioridade número um da sua vida.
Não é você arrumar um casamento, um emprego, um diploma,
ser bem-sucedido, ganhar dinheiro… Todas essas coisas são boas
e nós devemos procurá-las, mas acima delas está aquilo que dá
sentido à vida: Deus, porque sem Ele nenhuma dessas coisas vai
valer a pena ou encher o seu coração.
Quantas pessoas há mesmo dentro das igrejas que
não fazem disso a prioridade número um da sua vida e estão
interessadas em outras coisas? Não estou dizendo que essas coisas
estejam erradas, mas só que elas tomam o lugar da coisa número
um, que é de fato buscar a Deus, porque sem Ele é inútil edificar
a casa, guardar a cidade e granjear o pão. É tudo em vão se não
for a bênção de Deus que está ao seu lado.
Eu termino com algumas aplicações práticas. Creio que
a primeira delas é para os desocupados e folgados. Há pessoas
que vão usar este salmo para dizer que não precisam trabalhar,
porque Deus dá tudo. A minha palavra primeira é para você: este
salmo não está ensinando a vadiagem, a preguiça. Ao contrário,
ele fala aqui de edificar uma casa, guardar uma cidade, granjear
o pão e criar filhos. Está falando de responsabilidade. O salmo
nos ensina que nós temos que fazer todas essas coisas. A Bíblia é
contra a preguiça, a ociosidade, viver à custa de outros quando
você poderia estar ganhando o seu pão e o seu sustento.
O apóstolo Paulo chega ao ponto de dizer que, se alguém
não quiser trabalhar, não coma também (2Ts 3.10). O que este
salmo nos ensina não é usar a fé em Deus e a confiança na
providência de Deus para ficarmos parados, sem fazer nada. Ele
nos ensina a trabalhar muito, só que confiando em Deus, sabendo
que o resultado do nosso trabalho é para a glória dele, oferecendo
o que nós fazemos a Ele, Deus sendo o princípio orientador de
tudo aquilo que fazemos.

92
SALMO 127 - DEUS EM PRIMEIRO LUGAR

A segunda aplicação é para os que vivem para acumular


bens, ganhar dinheiro, garantir segurança material. A pergunta
é: qual vai ser o valor disso tudo? De que adianta você ganhar o
mundo inteiro e perder a sua alma? Somente Deus pode lhe dar
condição de desfrutar do seu trabalho, do seu esforço, do seu
estudo e do seu planejamento. Portanto, a prioridade número um
da sua vida é aprender a descansar nas promessas de Deus e dar a
Ele o primeiro lugar em tudo que você fizer.
E, aqui, eu quero lembrar aos adolescentes e jovens que
esta é a melhor época para vocês começarem a pensar nisso.
Comecem a pensar nisso agora, consagrem a sua vida a isso desde
cedo, aprendam a dar a Deus o primeiro lugar, porque, à medida
que vamos crescendo e ficando velhos, vai ficando mais difícil,
hábitos antigos custam a morrer. Então aprendam cedo a buscar
a Deus em primeiro lugar, a viver uma vida de piedade e devoção
a Ele.
Contudo, a aplicação mais importante de todas tem a ver
com a salvação de nossa alma. Se estes princípios valem no mundo
material, imagine a aplicação com relação à nossa salvação. Em
vão nós trabalhamos para obter o perdão de pecados, em vão nós
nos esforçamos pensando em ganhar a salvação, porque quem
providencia, dá e supre a salvação é Deus, em Cristo Jesus. Se Ele
supre o pão de cada dia, se Ele supre a nossa casa, a segurança e
tudo mais, é Ele quem também nos dá redenção plena e completa
em Cristo Jesus. Se a Bíblia me ensina a depender de Deus para
o pão de cada dia, muito mais para a redenção da minha alma. E
aqui está o Evangelho, que é Deus quem providencia a redenção
dos meus pecados, o perdão das minhas iniquidades, Ele é quem
me salva da condenação eterna mediante Jesus Cristo, quem Ele
mandou ao mundo para ser o nosso redentor.
Eu concluo este capítulo perguntando a você qual é o seu
relacionamento com esse Deus. Ele tem o primeiro lugar em sua
vida? É Ele, de fato, o princípio orientador de tudo que você faz, a
razão de ser da sua existência? Que Deus fale ao seu coração e que
você possa dizer: “Sim, Senhor, se o Senhor não edificar a casa,

93
CAMINHOS DA FÉ

eu estou trabalhando em vão; se o Senhor não guardar a cidade,


eu estou vigiando em vão. É inútil eu levantar de madrugada
e suar para ganhar o pão de cada dia, porque o Senhor dá aos
Teus amados enquanto dormem”. Que essa seja a oração do seu
coração, que você diga a Deus que quer viver para a Sua glória e
depender dele em todas as coisas.

ORAÇÃO:

Pai, nós te agradecemos pela casa, pela cidade, pelo pão e


pela família; tudo isso vem do Senhor. Eu quero orar, Senhor, pelos
jovens que estão fazendo planos para o futuro, cujo coração bate
excitado quando pensa nos projetos e nos sonhos. Agradecemos-
te por isso, porque os jovens podem sonhar, mas pedimos que
eles aprendam a dar-te o primeiro lugar em todas as coisas que
planejem, ser servos Teus em primeiro lugar e viver para a glória
do redentor e salvador Jesus Cristo.
Eu quero orar pelos filhos que têm pais idosos e que já não
lhes cuidam mais, negligenciam os seus pais. Ó Deus, ajuda-os
a lembrar da dívida de gratidão e também do dever bíblico de
abençoar os pais quando estiverem carentes, idosos e solitários.
Também quero orar pelos casais, por aqueles que casaram
e não pensam ter filhos, aqueles que têm medo de trazer filhos
ao mundo, que eles ouçam este salmo, Senhor, e vejam a grande
bênção que são filhos, que são a herança Tua, galardão Teu para
os Teus amados. Abençoa-nos, ó Deus, com famílias frutíferas e
numerosas, mesmo em uma época difícil como a de hoje. Que
nós olhemos além das dificuldades financeiras e vejamos as Tuas
promessas. Abençoa a Tua Igreja e dá-nos a graça de vivermos
para Ti todos os momentos da nossa vida. Amém.

94
SALMO 128

A FELICIDADE DO QUE TEME A DEUS

Bem-aventurado aquele que teme ao Senhor


e anda nos seus caminhos! Do trabalho de
tuas mãos comerás, feliz serás, e tudo te
irá bem. Tua esposa, no interior de tua casa,
será como a videira frutífera; teus filhos,
como rebentos da oliveira, à roda da tua
mesa. Eis como será abençoado o homem
que teme ao Senhor! O Senhor te abençoe
desde Sião, para que vejas a prosperidade de
Jerusalém durante os dias de tua vida, vejas
os filhos de teus filhos. Paz sobre Israel!

Este salmo trata de algumas das bênçãos materiais que


Deus prometeu dar àqueles que O temem aqui neste mundo. O
salmo declara a felicidade dessa pessoa que teme a Deus e que é por
Deus abençoada. A expressão bem-aventurado, que abre o salmo,
significa simplesmente isto: feliz é aquele que ama ao Senhor. Ele é
bem-aventurado porque as coisas que vão acontecer a ele são boas,
por isso ele é feliz. E essa felicidade, conforme lemos no salmo,
consiste em uma família constituída, uma prole numerosa, filhos
ao redor da mesa. O bem-aventurado come do seu trabalho, tem
o suficiente para o seu sustento, vive muitos anos, vê os filhos dos
filhos e vê, ainda, a prosperidade do povo de Deus. Esse é o ideal
CAMINHOS DA FÉ

de felicidade que este salmo nos passa, daquele que teme a Deus.
Ou seja, aqui neste mundo ele é abençoado com um casamento
feliz, família constituída, longevidade, trabalho e o privilégio de
ver a sua posteridade, bem como o progresso do povo de Deus.
Este salmo, que era cantado juntamente com outros
pelos peregrinos a caminho de Jerusalém, tinha alguns objetivos.
Primeiro, incentivar aqueles que temiam a Deus a continuar a
viver em obediência aos caminhos do Senhor. Segundo, despertar
a gratidão do povo de Deus diante das bênçãos materiais. O
salmo está dizendo que ter trabalho, sustento, família e filhos,
viver em comunidade e ver a prosperidade do povo de Deus são
privilégios que Ele dá. Por isso, este salmo nos convida à gratidão
e a relembrar que toda coisa boa, na verdade, vem de Deus.
O salmo também parece ter o objetivo de promover a
comunhão e a unidade do povo de Deus. Nós vamos ver que
essas bênçãos estão relacionadas a Jerusalém, ao templo, à paz
da cidade, que representa a Igreja, o povo de Deus. Assim, meu
objetivo neste capítulo é entender de que maneira este salmo tem
validade ou se aplica aos dias de hoje e também despertar em nós
o temor a Deus, a gratidão e o desejo de continuar a servi-lo aqui
neste mundo.
O salmo tem duas partes: na primeira, há uma descrição de
como Deus abençoa aqueles que O temem, como será abençoado
aquele que teme ao Senhor (128.1-4). Na segunda, o salmista ora
por aquele que teme ao Senhor, pedindo que Ele derrame as Suas
bênçãos sobre ele (128.5-6).
Vamos começar vendo as bênçãos que Deus promete
dar àquele que O teme. Elas estão referidas nos versos de 1 a 4.
No verso 1, lemos: Bem-aventurado aquele que teme ao Senhor.
Ou seja, essas promessas não são do tipo “é assim que Deus vai
abençoar o mundo todo”. Não, elas são dirigidas àquele que teme
ao Senhor. É verdade que há muita gente que não teme ao Senhor
e que tem família, filhos, prosperidade, trabalho e morre com
mais de 100 anos de idade. É que essas bênçãos materiais, na
Bíblia, sempre são vistas como sendo acompanhadas com o poder
e a capacidade para você desfrutar delas.
96
SALMO 128 - A FELICIDADE DO QUE TEME A DEUS

O livro de Eclesiastes, por exemplo, escrito pelo rei


Salomão, descreve uma época em que ele tinha tudo o que alguém
poderia querer. Ele era um político poderoso, um governante
temido, um homem extremamente rico que tinha de todos os
prazeres que poderia imaginar. Contudo, ele simplesmente não
encontrava alegria naquelas coisas. Ele tinha muito, e não tinha
nada, era uma pessoa rica, culta, que tinha servos e empregados,
próspera, porém não tinha prazer naquelas coisas. E então ele diz
que percebeu que tudo aquilo que tinha era vaidade, “vaidade das
vaidades”. É assim que ele descreve, no livro de Eclesiastes, a vida
do homem que tem tudo, e ao mesmo tempo não tem nada.
Assim, quando um salmo como este diz que Deus
abençoa com prosperidade material os Seus servos, está incluído
aqui que Deus também lhes dá alegria nessas coisas, o que nos
leva à seguinte conclusão: um crente, mesmo tendo pouco, pode
ser feliz, porque a verdadeira felicidade é você se alegrar naquilo
que Deus lhe deu aqui neste mundo. Há pessoas que têm muito,
mas vivem angustiadas, vivem sem prazer e sem alegria. E, ao
contrário, há também pessoas que têm muito pouco, mas que
são uma fonte constante de alegria e de satisfação, ficam “felizes
da vida”, mesmo com aquelas coisas poucas que têm. As bênçãos
materiais que vêm de Deus sempre são acompanhadas com o
prazer e a alegria nessas coisas, ainda que nem sempre elas sejam
muitas e nem sejam abundantes.
Lembre-se de que temer a Deus não é ter medo de Deus,
embora com certeza deveríamos ter também, porque Ele é o
criador de todas as coisas, Ele é o Senhor da nossa vida e na mão
dele está o poder de nos fazer eternamente felizes ou eternamente
miseráveis. Ter medo de Deus é prudente, porém o temer a Deus
vai mais além. O ímpio é que tem medo de Deus. O que teme
a Deus, na verdade, tem por Ele um amor respeitoso, é uma
combinação de amor e respeito, e isso se mostra na prática, pela
obediência à vontade de Deus, que é o que o salmista diz ainda
no verso 1, explicando quem é aquele que teme a Deus: Bem-
aventurado aquele que teme ao Senhor e anda nos seus caminhos.

97
CAMINHOS DA FÉ

Portanto, o que teme a Deus é alguém que O ama e O


respeita e que, como resultado, anda nos Seus caminhos, anda
de acordo com a Sua vontade, vontade esta revelada na Escritura.
É na Bíblia que nós encontramos a revelação dos caminhos de
Deus, quem é Deus, o que Ele gosta, o que Ele promete, do que
Ele se agrada, o que Ele proíbe. É a revelação do caráter de Deus,
do Seu querer e da Sua vontade.
A pessoa que teme a Deus é aquela que O ama, respeita
e procura viver aqui neste mundo de acordo com a Sua vontade.
É a essa pessoa que essas promessas são feitas: Bem-aventurado
aquele que teme ao Senhor e anda nos seus caminhos! Essa é a
descrição do verdadeiro crente, tanto no Antigo como no Novo
Testamento. O verdadeiro crente é aquele que teme ao Senhor,
que tem esse amor respeitoso para com Ele e, como resultado,
anda nos caminhos que Deus revela.
As bênçãos que são prometidas estão nos versos 2 a 4.
Para que possamos entendê-las, temos que nos lembrar em que
contexto o salmo foi escrito.
O quadro de felicidade que encontramos é o quadro da
felicidade do Antigo Oriente, na época de Israel. A pessoa que era
feliz no Antigo Oriente era uma pessoa que tinha uma propriedade,
que plantava e colhia e se alimentava daquela fazendinha; essa
pessoa tinha uma esposa, muitos filhos e vivia muito tempo. Via
os netos, via os bisnetos, peregrinava para Jerusalém, junto com o
povo de Deus, e lá oferecia os seus sacrifícios e via a prosperidade
do povo de Deus. Esse era o ideal de felicidade no Israel do
Antigo Oriente, e é assim que Deus retrata aqui aquele que será
abençoado por Ele.
Há duas coisas que precisamos levar em consideração ao
tentarmos entender esse ponto. Primeiro: essas coisas que são
descritas como sendo o padrão de felicidade, e que eram o padrão
de felicidade naquela época, em alguma medida, continuam
sendo padrão de felicidade ainda hoje na sociedade ocidental. Eu
sei que a família vem sendo questionada, o estilo de vida antigo
vem sendo cada vez mais abandonado, estilos alternativos de

98
SALMO 128 - A FELICIDADE DO QUE TEME A DEUS

família vêm surgindo, as mulheres que antes eram caseiras estão


mais independentes financeiramente. Hoje as pessoas casam mais
tarde e ter dois filhos já é muito para a maioria delas. Alguns
casais não querem nem ter filhos. Eu sei que tudo isso hoje é
questionado, mas ainda assim eu creio que nós devemos levar em
consideração que essas coisas que são colocadas aqui e que eram o
padrão de felicidade daquela época de alguma maneira satisfazem
os desejos mais profundos do coração do homem. Qualquer que
seja a cultura e o tempo em que ele vive, ele quer trabalhar, quer
ganhar seu sustento através do trabalho das suas mãos, seja na
chácara do Antigo Oriente, seja como profissional de TI em uma
moderna multinacional. Ainda hoje nós continuamos a desejar
alguém para constituir família e ter filhos. Nós queremos viver
muito, queremos ver outras gerações, queremos ver os nossos
filhos. São desejos que estão gravados no coração do homem,
porque Deus nos fez à Sua imagem e semelhança. Nosso Deus
é triuno, Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo. As três
Pessoas vivem em harmonia e em comunhão. E nós fomos criados
à imagem desse Deus. Sendo assim, mesmo que este salmo tenha
sido escrito para aquela época, os princípios contidos nele valem
para nós hoje.
A segunda coisa que precisamos lembrar é a aliança que
Deus havia feito com Abraão e seus descendentes. Deus chamou
Abraão e lhe fez uma promessa. Abraão é o pai da nação israelita.
Deus lhes fez uma promessa de que lhes daria uma terra, uma
terra só para eles, que eles se tornariam uma grande nação, uma
nação numerosa, que o nome deles seria engrandecido. Deus
também prometeu que através dos filhos de Abraão outras nações
seriam benditas e que, um dia, da descendência de Abraão viria
o Messias.
Imagine então que, além de você ser oriental, ainda tinha
o incentivo dessa aliança, um Deus que disse que o salvador do
mundo poderia ser um de seus filhos. Toda família e todo homem
temente a Deus viviam na expectativa de que da linhagem
deles viria o Messias. A terra era vista como um dom de Deus,

99
CAMINHOS DA FÉ

trabalhar a terra, ver o fruto da terra, comer do fruto da terra, era


um dom de Deus. Com todos esses incentivos, o israelita vivia
na expectativa de ser abençoado por Deus com propriedade,
prosperidade, filhos, uma mulher que cuidasse da família, que ele
vivesse muito e que vivesse em comunhão com o povo de Deus.
Volto a dizer que essas coisas ainda estão no nosso coração, elas
ainda fazem parte dos anseios mais profundos do nosso coração.
Era assim que Deus abençoaria o israelita fiel.
Vamos, então, examinar mais de perto essas promessas.
Após pronunciar de maneira geral a felicidade do que teme a
Deus (128.1), o salmista diz: Do trabalho de tuas mãos comerás,
feliz serás, e tudo te irá bem (128.2). Ou seja, vai dar tudo certo
para você aqui. Percebemos aqui que aquela maldição que foi
colocada na queda é atenuada. Quando Adão caiu lá no Paraíso,
Deus disse: […] maldita é a terra por tua causa! Com fadiga comerás
dela todos os dias de tua vida. Ela te produzirá também espinhos e
abrolhos, porque tu és pó e ao pó tornarás (Gn 3.17-19). Com a
bênção de Deus, o trabalho que foi colocado como uma maldição
é revertido para ser uma bênção, Deus abençoa com trabalho
aqueles que são Seus, aqueles que O temem. Há oportunidade
de trabalhar, o privilégio de ganhar o pão com seu próprio labor.
Sabemos que há situações de pessoas que estão comendo
do trabalho de outros. Talvez achar emprego esteja difícil, as
circunstâncias não são favoráveis, mas o ideal de Deus para nós
é que nós comamos do trabalho das nossas próprias mãos. Se
formos fazer algum tipo de correção aqui, seria ao preguiçoso,
aquele que quer passar a vida toda comendo do trabalho dos
outros. Uma bênção que Deus dá àqueles que são Seus é de fato
poder trabalhar e ter o prazer de comer do trabalho da sua própria
mão. Neste caso, o israelita comeria da sua plantação, frutos e
sementes, leite, vinho, azeite, carne, tudo isso como o produto
do seu trabalho no campo, e ele seria feliz, na alegria de estar
ali na terra prometida, alegria de comer do próprio trabalho, de
sustentar a família e os filhos e de ter recursos para ajudar outras
pessoas.

100
SALMO 128 - A FELICIDADE DO QUE TEME A DEUS

A segunda promessa é esta: Tua esposa, no interior de tua


casa, será como a videira frutífera (128.3). O interior da casa era
aquele departamento na tenda ou da casa do israelita que era
reservado para a mulher. Essa declaração revela o ideal de esposa
para aquela época, uma mulher caseira, boa dona de casa que
gosta da vida em família. Há mulheres que realmente não têm
a vocação de casar. Para constituir família, a mulher tem que ser
caseira; não é que ela não possa trabalhar fora, se a necessidade
assim o exige, mas ela tem que gostar da vida do lar, de fazer as
coisas em casa, de estar com o marido e os filhos. Há mulheres que
seriam mais felizes se ficassem solteiras, porque não têm vocação
para serem donas de casa. O casamento é o padrão de Deus para a
raça humana, porém isso não quer dizer que todos têm que casar
para serem felizes. O padrão de relacionamento, casamento e de
família envolve uma mulher que queira constituir casa, ela tem
que gostar da ideia de viver com o marido, ter filhos e criá-los.
Tudo isso faz parte do ideal bíblico de propagação e propalação
da nossa espécie e também da Igreja de Deus. Dessa forma, aqui
a mulher é comparada a uma videira frutífera, uma parreira que
dá muitas uvas, assim contribuindo para que o povo de Deus se
multiplique e que a Sua bênção chegue a outros povos.
A terceira promessa mencionada é esta: teus filhos, como
rebentos da oliveira, à roda da tua mesa (128.3). A oliveira era
outra árvore nacional dos israelitas. Eles gostavam muito da
parreira por causa do vinho, e da oliveira por causa do azeite.
A figura aqui representada é do homem cercado de filhos, que
são comparados a brotos de oliveira. O homem vai viver muito
e vai morrer, mas no lugar dele há os brotos já surgindo. A ideia
aqui é de renovação, a perpetuidade da família, de continuação
da linhagem; o seu nome e o seu sangue vão continuar através
desses que estão chegando, resultado desse casamento. São duas
ideias: da renovação e continuação do povo de Deus. E, como
eu disse, havia a esperança da chegada do Messias: um daqueles
filhos poderia ser o Messias.

101
CAMINHOS DA FÉ

O salmista conclui a primeira parte reafirmando, no verso


4: Eis como será abençoado o homem que teme ao Senhor! É assim
que Deus vai abençoar aquele que O teme e que anda nos Seus
caminhos, ele receberá de Deus essas coisas e o prazer e a alegria
que elas trazem ao seu coração.
Agora, na segunda parte do salmo (128.5-6), o salmista
ora por essa pessoa que teme ao Senhor. A oração é para que
essas bênçãos venham juntas com a bênção geral sobre o povo de
Deus. Era como se o salmista dissesse que essas bênçãos não são
individuais, mas vêm acompanhadas com as bênçãos do povo de
Deus. Talvez o salmista queira enfatizar aqui a nossa unidade,
a ideia de que nós fazemos parte de um povo; não somente
somos abençoados, mas fazemos parte de um povo abençoado.
O salmista ora como se o homem abençoado estivesse diante
dele e pudesse ouvir: Eis como será abençoado o homem que
teme ao Senhor! Então ele se volta para o homem no verso 5 e o
abençoa, dizendo: O Senhor te abençoe desde Sião, para que vejas a
prosperidade de Jerusalém durante os dias de tua vida, vejas os filhos
de teus filhos. Paz sobre Israel!
E o que ele diz nessa oração? Primeiro, que o Senhor o
abençoe desde Sião. Sião é o nome do monte onde estava edificada
a cidade de Jerusalém, onde estava o templo de Deus. Quando
ele diz o Senhor te abençoe desde Sião, ele está dizendo que essas
bênçãos vêm do Deus que mora em Jerusalém, o Deus da aliança,
o Deus de Israel, de Abraão, de Isaque e de Jacó, o Deus de Davi,
o único Deus verdadeiro, Criador dos céus e da terra. De lá de
Sião, Ele vai abençoar você, ou seja, essas bênçãos não me chegam
individualmente, mas procedem do Deus que é o Deus de um
povo. É esse Deus que está me abençoando, eu sou parte desse
povo, e essas bênçãos vêm em decorrência disso.
A segunda coisa que ele pede está ainda no verso 5:
para que vejas a prosperidade de Jerusalém durante os dias de tua
vida. Aqui não é somente uma oração para que o israelita viva
muitos anos e seja longevo, mas para que ele viva o suficiente
para, durante esse tempo, ver a prosperidade do povo de Deus.

102
SALMO 128 - A FELICIDADE DO QUE TEME A DEUS

Aqui percebemos que isso não é tanto uma bênção material. Você
lembra que eu disse que essas bênçãos vêm acompanhadas com
as bênçãos espirituais? A bênção não é só viver muito, porque,
sinceramente, tem gente que vive muito e gostaria de ter morrido
cedo, pois sua vida é infeliz. Então, não é só viver muito, mas é
viver muito e ver a prosperidade do povo de Deus, viver para ver
os filhos dos filhos andando nos caminhos do Senhor, a Igreja
crescendo e se multiplicando, o Reino de Deus avançando e as
bênçãos sendo derramadas sobre os nossos queridos. Só assim vale
a pena viver muito, ter uma vida longa, para ver a prosperidade
da Igreja, o crescimento do povo de Deus e dos nossos filhos, que
vêm logo em seguida, no verso 6: vejas os filhos de teus filhos. É
outro pedido: longevidade para ver os netos e bisnetos. Mas não
é só ver os netos e os bisnetos, é vê-los andando nos caminhos
do Senhor, vivendo para a glória de Deus. É assim que Deus vai
abençoar aquele que O teme.
Em conclusão, o que é que o salmo nos ensina? Primeiro,
que Deus abençoa aqui neste mundo aqueles que O temem e andam
nos Seus caminhos. Nós não podemos nos esquecer disso, de que
há promessas de bênçãos materiais, Deus não somente abençoa
com bênçãos espirituais, como perdão de pecados, reconciliação,
novo nascimento, adoção, nos dar o Espírito Santo, nos dar a paz,
nos dar a tranquilidade. Tudo isso vem do Altíssimo, porém Ele
também nos abençoa com bênçãos materiais — prosperidade,
trabalho, longevidade, saúde, conforto —, privilégios que nós
temos que são dados da parte de Deus, incluindo a alegria de
participar dessas coisas, de trabalhar e de se sustentar, o privilégio
de casar, ter filhos e vê-los andando nos caminhos de Deus, ver o
povo de Deus abençoado e crescendo aqui neste mundo. É isso
que este salmo nos ensina, que o nosso Deus é poderoso para nos
abençoar materialmente também.
Agora, há ocasiões e situações em que nós não
compreendemos por que Deus decide não conceder essas
bênçãos mesmo aos que são fiéis. Podemos pensar aqui, por
exemplo, nos crentes perseguidos nos países islâmicos. Eles são

103
CAMINHOS DA FÉ

tementes a Deus, O amam, são crentes em Jesus. Mas são presos,


torturados, a família é separada, membros da família são mortos,
seus bens são arrestados pelas autoridades, eles não têm nenhuma
dessas bênçãos e morrem cedo. Então, por motivos que nós não
compreendemos, às vezes o Deus soberano, em Sua sabedoria,
resolve não abençoar os fiéis com bênçãos materiais. Isso quer
dizer que os fiéis que estão desprovidos de bênçãos materiais serão
infelizes? Não, porque a Bíblia nos ensina a temer a Deus, amá-lo
e nos alegrar nele quando Ele nos abençoa assim ou quando tira
essas bênçãos.
Jó, por exemplo, que era um homem temente a Deus,
tinha muitos filhos, era próspero, mais do que todos os do
Oriente. Um dia, o diabo foi dizer a Deus que Jó só era feliz
porque o Senhor o cobriu de bênçãos, mas que, se Deus tirasse
tudo dele, ele provavelmente não seria mais temente a Ele. Deus,
então, deu permissão ao diabo para tirar-lhe tudo, inclusive a
saúde. E o diabo assim o fez. Porém, Jó, mesmo privado de todos
esses confortos, família, trabalho, prosperidade, saúde, disse: Deus
deu, Deus tomou, bendito seja o nome do Senhor. Em momento
algum Jó atribuiu a Deus falta alguma.
Normalmente Deus abençoa materialmente aqueles que
O temem e andam nos Seus caminhos, por isso você pode orar por
isso, você pode pedir isso, não está errado. Mas o que você precisa
saber é que isso não é uma regra geral, não acontece sempre. Às
vezes, na soberania e na sabedoria de Deus, por motivos que não
sabemos, Ele prova o crente, tirando-lhe essas coisas e fazendo
com que ele atravesse momentos de dificuldade financeira e
relacional, crises na família, problemas de saúde… Deus faz isso
para nos testar, porque o problema da bênção é que, quando
Deus nos abençoa com muita coisa, ficamos acomodados, e um
crente acomodado não ora, não agradece, não quer ir à igreja; é
quando a necessidade aperta que ele vai de joelhos, clama e lê a
Bíblia. Então, Deus não pode nos abençoar sempre com muito,
porque isso seria ruim para nós. Por isso, Ele às vezes tira nossos
confortos, exatamente para que nos lembremos de que, de todas

104
SALMO 128 - A FELICIDADE DO QUE TEME A DEUS

as bênçãos que nós temos nesta vida, a maior de todas é o próprio


Deus na pessoa do Seu filho Jesus. Tudo mais pode nos faltar;
porém, se nós tivermos o Senhor, então temos tudo. Se Deus é por
nós, quem será contra nós? (Rm 8.31)
Que Deus conforte o seu coração e lhe encha de alegria
em servir ao Senhor juntamente com o Seu povo.

ORAÇÃO:

Senhor, nós queremos pedir pelos Teus filhos que te


temem, que andam nos Teus caminhos, mas que estão passando
por momentos de privação, dificuldade e luta. Ó Deus, dá-
lhes pleno contentamento na fartura e na necessidade. Oramos
também para que o Senhor seja servido em aliviar nossas dores
aqui neste mundo. Cura os doentes, dá o pão de cada dia, abre
portas de emprego para os jovens que estão chegando ao mercado
de trabalho. Ajuda aqueles que estão estudando também, os
adolescentes que estão lutando ainda com a questão da vocação,
o que vão ser, que trabalho vão escolher, que caminho vão seguir.
Ajuda também os pais que lutam com filhos desobedientes e
rebeldes. Ajuda-nos, ó Deus, em toda essa situação e nos dê graça
para ver o Teu povo caminhando e prosperando. Dá-nos a graça
de ver os nossos filhos e os filhos dos nossos filhos andando nos
Teus caminhos, para a glória do Teu nome e alegria do Teu povo.
É o que pedimos em nome de Jesus. Amém.

105
SALMO 129

ENFRENTANDO O ABUSO

Muitas vezes me angustiaram desde a minha


mocidade, Israel que o diga; desde a minha
mocidade, me angustiaram, todavia, não
prevaleceram contra mim. Sobre o meu dorso
lavraram os aradores; nele abriram longos
sulcos. Mas o Senhor é justo; cortou as
cordas dos ímpios. Sejam envergonhados e
repelidos todos os que aborrecem a Sião!
Sejam como a erva dos telhados, que seca
antes de florescer, com a qual não enche a
mão o ceifeiro, nem os braços, o que ata os
feixes!
E também os que passam não dizem: A
bênção do Senhor seja convosco! Nós vos
abençoamos em nome do Senhor!

Não se sabe exatamente em que contexto este salmo foi


escrito nem quem o escreveu, mas tudo indica que foi escrito e
depois cantado durante um período de opressão da nação de Israel
por povos inimigos. Talvez em uma das opressões em tempos de
dominação estrangeira, quando Israel estava na terra prometida.
Aqui, o salmista trata dos abusos e dos sofrimentos enfrentados
pelo povo de Deus através de sua história e como Deus os livrou.
CAMINHOS DA FÉ

A divisão do salmo é fácil: em primeiro lugar, o salmista


dá uma descrição, ou lembra, dos abusos que o povo de Deus
sofreu através de sua história e da angústia que esses sofrimentos
causaram (129.1-3). Depois, ele expressa a sua certeza de que
Deus haverá de preservar o Seu povo como sempre preservou
(129.4), e em seguida faz uma oração imprecatória contra os
inimigos do povo de Deus e que causaram todo esse sofrimento
(129.5-8).
Quanto aos abusos cometidos contra o povo de Deus,
estes são relatados nos versos de 1 a 3: Muitas vezes me angustiaram
desde a minha mocidade, Israel que o diga; desde a minha mocidade,
me angustiaram, todavia, não prevaleceram contra mim. Sobre o
meu dorso lavraram os aradores; nele abriram longos sulcos. Nessa
passagem, o salmista fala dos sofrimentos da nação de Israel como
se ele fosse a nação de Israel, ou como se ele fosse o porta-voz da
nação de Israel. Note que ele diz muitas vezes me angustiaram e,
também, no verso 2, desde a minha mocidade me angustiaram.
Porém, ele não está falando de si próprio, de sua experiência
pessoal, mas está falando como se fosse a nação de Israel, conforme
relata o final do verso primeiro. Depois de dizer muitas vezes me
angustiaram desde a minha mocidade, ele diz: Israel que o diga.
Então quem, na verdade, está dizendo é a nação de Israel, ele
funciona como o porta-voz.
Essa é uma figura de linguagem muito usada chamada
personificação, em que a pessoa fala como se fosse a nação de
Israel, para narrar as experiências de sofrimento que a nação teve.
O que, então, ele nos ensina sobre os abusos que o povo de Deus
sofreu em sua história? Primeiro, que foram muito intensos. Note
que ele diz muitas vezes me angustiaram. Não foi uma vez só,
não foram duas, mas muitas vezes que houve situações de abuso,
opressão e hostilidade contra o povo de Deus. Ele também repete
o termo angustiar duas vezes: no verso primeiro — muitas vezes
me angustiaram — e no verso 2, como se não tivesse dito antes
— desde a minha mocidade me angustiaram. Nós sabemos que é
uma das características da literatura hebraica dar ênfase a alguma

108
SALMO 129 - ENFRENTANDO O ABUSO

coisa através da repetição. Quando você encontra repetições que


às vezes até parecem uma redundância, na verdade se trata de
um artifício literário para expressar ênfase. O fato de ele repetir
a mesma frase duas vezes significa que ele está querendo dizer
que os sofrimentos e a angústia causados pelos abusos sofridos
realmente foram muito intensos. Ele também nos diz que não
somente aconteceram muitas vezes, mas que foram constantes.
O que causou essa angústia não foram acidentes pessoais,
catástrofes como terremotos, secas, pestes, que traziam prejuízo
para aquele povo, especialmente porque era um povo que
dependia da agricultura. Mas ele diz que foram pessoas: desde a
sua mocidade eles o angustiaram. A palavra eles não aparece no
texto em português, porém está no hebraico, “eles o angustiaram
desde a sua mocidade”. Ele está falando de pessoas que oprimiram,
que hostilizaram e que provocaram abuso.
Esse sofrimento que a nação passou é descrito como
sendo brutal. Observe o que ele diz no verso 3: Sobre o meu dorso
lavraram os aradores; nele abriram longos sulcos. Aqui, ele está
usando a figura bem conhecida na nação de Israel do agricultor
que vai para o campo com uma junta de bois, e amarrado com
cordas aos bois está o arado, que era uma peça em forma de v em
que o agricultor poderia segurar e que tinha um aguilhão que
entrava na terra, uma espécie de faca. Ele fustigava os bois, que
puxavam o arado, e ele enfiava o aguilhão na terra. Os bois iam
puxando e o aguilhão ia abrindo os sulcos na terra, aonde depois
a semente seria lançada.
Ele diz aqui, fazendo uma comparação, que os sofrimentos
eram tantos e tão intensos, que era como se alguém estivesse
lavrando em suas costas, passando o arado, com aquele aguilhão
penetrando e rasgando tudo e deixando a ferida aberta. É a figura
que ele usa para descrever a brutalidade dos sofrimentos que a
nação de Israel passou.
Mas, então, a que ele se refere? Lembremos a história de
Israel. Há pelo menos três situações que podem estar na mente do
salmista. Primeiro, a escravidão no Egito durante quatrocentos

109
CAMINHOS DA FÉ

anos. Mal a nação de Israel nascera, tornou-se escrava do faraó


por quatrocentos anos. Nesses anos, o faraó escravizou os filhos
de Israel, brutalizou, mandou matá-los, chicoteou, torturou-os,
causou todo tipo de abuso possível ao povo de Israel durante
esse tempo. Outra situação que pode estar na mente do salmista
é aquele tempo em que Israel estava na terra prometida, mas
dominada por povos pagãos, como os moabitas, os amonitas, os
filisteus e os sírios, que de vez em quando se levantavam contra a
nação de Israel, invadiam Canaã, subjugavam os judeus, levavam
os filhos como escravos, tomavam conta das plantações e os
obrigavam a pagar pesados tributos. Era um tempo de opressão e
de abuso sofrido.
Ou então ele se refere aos setenta anos de exílio que eles
passaram na Babilônia, para onde foram levados como escravos,
tirados de sua terra, tendo suas propriedades todas confiscadas.
Muita gente morreu e a nação foi transportada para o exílio, e lá
sofreu brutalidade e perseguição. Um exemplo do sofrimento que
eles passaram durante o tempo de exílio na Mesopotâmia é aquele
que nos é narrado no livro de Ester, quando Hamã se levanta para
matar todos os judeus, e, se não fosse a intervenção de Deus, toda
a nação teria sido dizimada naquele período de escravidão.
O nosso salmista provavelmente está se lembrando de
todos esses episódios e dizendo: muitas vezes me angustiaram.
Muitas vezes angustiaram a nação de Israel, muitas vezes ela foi
angustiada desde que nasceu como nação, e os sofrimentos foram
tão grandes, que era como se alguém passasse um arado nas suas
costas. Esses são os abusos e sofrimentos que nós experimentamos
durante a nossa história, como povo de Deus.
Estamos a dois mil e quinhentos anos desde que este salmo
foi escrito e temos a vantagem da história para ver que esses abusos
continuaram. Eles não pararam aqui com este salmo. O Israel de
Deus, a Igreja, sofreu muito também. A Igreja foi perseguida,
dizimada pelo Império Romano, ou, pelo menos, o Império
Romano procurou dizimá-la durante os quatro primeiros séculos
de sua existência; houve pelo menos dez perseguições desde Nero

110
SALMO 129 - ENFRENTANDO O ABUSO

até Diocleciano, que foi o último imperador, que perseguiu com


muita ferocidade os cristãos até o século quarto. Durante a Idade
Média, os fiéis foram perseguidos e mortos depois da Reforma
Protestante, reformados e puritanos perseguidos e mortos,
cristãos oprimidos, assediados, presos e torturados em regimes
comunistas e islâmicos. Hoje o cristianismo continua sendo a
religião mais perseguida do mundo.
Apesar de todas essas angústias que são descritas aqui,
voltando ao nosso salmista, ele tem esperança. Estamos, então, na
segunda parte do salmo, no verso 4, quando ele diz: Mas o Senhor
é justo; cortou as cordas dos ímpios. Ele já havia dito no verso 2 que
aquelas tentativas de destruir o povo de Deus não prevaleceram,
e aqui no verso 4 ele explica por que não prevaleceram: porque
Deus, que é justo, cortou as cordas dos ímpios. Ele se refere ao
fato de que a nação de Israel, apesar de toda aquela perseguição
que foi feita pelo faraó no Egito, os povos pagãos da Palestina
pelos babilônicos e assírios durante o período do exílio, a nação
sobreviveu, o povo de Deus continuou a existir; apesar de todo
o abuso e do sofrimento passado, ela saiu da escravidão do Egito
para ser uma nação, Israel sobreviveu aos reis pagãos na Palestina
e voltou do exílio para a sua terra.
A Igreja também sobreviveu e tem sobrevivido ao longo
de sua história. Sobreviveu à perseguição dos imperadores na
Idade Média, experimentou a reforma e a revitalização. Apesar
da perseguição, ela cresceu e se instalou nos países comunistas,
continua crescendo e se expandindo no mundo, em que pese os
lavradores terem arados em suas costas. A razão pela qual o povo
de Deus não foi destruído e não tem sido destruído é exatamente
aquilo que o salmista diz no verso 4: a fidelidade de Deus para com
o Seu povo. Ele diz aqui que Deus cortou as cordas dos ímpios.
Você lembra que eu comentei como é que o arado funciona?
Então, imagine-os arando as costas do justo e Deus chegando e
cortando as cordas, trazendo libertação. Deus interrompe, chega
no momento crucial em que não há mais esperança e corta as
cordas dos ímpios que estavam passando o arado nas costas do

111
CAMINHOS DA FÉ

povo de Deus. É a maneira de o salmista dizer e falar da libertação


de Deus. Deus não permitiu que o Seu povo fosse destruído e
extinto, e o salmista diz que Ele fez isso porque Ele é justo.
Em que sentido Deus é justo para preservar o Seu
povo? Primeiro, porque Ele aborrece a impiedade, a crueldade
e a brutalidade. Por isso, Ele não permitiu que essas coisas
prevalecessem contra o Seu povo. Segundo, porque Deus é fiel.
Lembra a combinação dessas duas coisas, lá na primeira carta de
João? Se confessarmos os nossos pecados, Ele é fiel e justo para nos
perdoar os pecados (1Jo 1.9). A justiça de Deus anda junto com a
Sua fidelidade, porque Ele tem uma aliança com Seu povo, Ele
lembrou-se do Seu povo e o protegeu, não deixou que Seu povo
fosse destruído, por amor à Sua palavra. Ele fez uma aliança,
um pacto com o Seu povo, e Ele é fiel àquilo que promete. A
fidelidade de Deus impediu e tem impedido que a Igreja seja
destruída, Jesus ratificou isso quando disse que as portas do
Inferno não haverão de prevalecer contra a Igreja de Deus e que
Deus haverá de manter o Seu povo até o dia do juízo final e
depois eternamente na glória.
Agora vem a terceira parte do salmo e que é a mais
complicada: o salmista relembra a história e a fidelidade de Deus
e ora pela destruição dos seus inimigos: Sejam envergonhados
e repelidos todos os que aborrecem a Sião! Sejam como a erva dos
telhados, que seca antes de florescer, com a qual não enche a mão o
ceifeiro, nem os braços, o que ata os feixes! E também os que passam
não dizem: A bênção do Senhor seja convosco! Nós vos abençoamos
em nome do Senhor! (129.6-9). Ou seja, ele ora para que Deus
destrua os Seus inimigos, aqueles que causaram esse sofrimento,
essa angústia ao povo de Deus. Que o Senhor, então, os destrua!
Esse tipo de oração que a pessoa que teme e conhece a
Deus faz pedindo a destruição dos inimigos é chamada de oração
imprecatória. Nessa oração, o temente a Deus pede que Ele castigue
os inimigos, que lhes retribua conforme aquilo que eles fizeram
contra o povo de Deus. Observe alguns exemplos: A morte os
assalte, e vivos desçam à cova! Porque há maldade nas suas moradas

112
SALMO 129 - ENFRENTANDO O ABUSO

e no seu íntimo (Sl 55.15); Ó Deus, quebra-lhes os dentes na boca;


arranca, Senhor, os queixais aos leõezinhos. Desapareçam como águas
que se escoam (Sl 58.6-7); Fiquem órfãos os seus filhos, e viúva, a sua
esposa. Andem errantes os seus filhos e mendiguem; e sejam expulsos
das ruínas de suas casas. De tudo o que tem, lance mão o usurário;
do fruto do seu trabalho, esbulhem-no os estranhos. Ninguém tenha
misericórdia dele, nem haja quem se compadeça dos seus órfãos (Sl
109.9-13). Estas são chamadas orações imprecatórias, que se
fazem contra os inimigos. Você encontra muitas delas no livro
dos salmos. No Novo Testamento temos exemplos disso também.
Observe o que o salmista está pedindo que Deus faça com
esses inimigos que causaram tanto sofrimento ao Seu povo: no
verso 5, que eles sejam envergonhados e repelidos; nos versos 6
e 7, que eles sejam ressecados, restem poucos, inúteis e de pouca
duração, como aquela erva que é plantada no telhado. Por não
haver solo, ali a erva não tem raízes e o sol a queima. Ela dura
pouco, a ponto de que o ceifeiro que passa não consegue nem
encher uma mão com aquela erva. Ela se seca, é pouca e não tem
profundidade. O que ata os feixes também não consegue nem
levar uma braçada delas, porque é pouca e dura pouquíssimo.
É isso que ele está dizendo: “Deus, faz com que os inimigos do
Teu povo sejam como essa relva que cresce no telhado, ressecada,
pouca e inútil, que não tem finalidade nenhuma”.
E não só isso, mas ele diz também, no verso 8, que
ninguém abençoe esse povo dizendo: “Eu te abençoo em nome
do Senhor. Ele pede que ninguém abençoe esses ímpios, que eles
sejam realmente relegados à maldição, que sejam completamente
destruídos. Isso, à primeira vista, esse tipo de oração, pode soar
estranho para quem é crente. Será que eu posso fazer uma oração
dessas contra os inimigos, as pessoas que me angustiaram, que me
aborreceram e que causaram tanta angústia?
Eu quero dizer algumas coisas breves sobre esse tipo
de oração. Quando você estuda essas orações imprecatórias na
Bíblia, você percebe primeiro que o que o salmista ou a pessoa
que está orando quer não é vingança pessoal. Ele não está com

113
CAMINHOS DA FÉ

raiva pelo que eles lhe fizeram e não pede a Deus que acabe com
eles por isso. A sua preocupação não é vingança pessoal, em
momento algum. Todas essas orações imprecatórias, na verdade,
são manifestações do desejo de que Deus seja glorificado e que a
justiça dele seja feita. Elas são movidas por indignação do crente
que ama a Deus e vê que o Seu povo está sofrendo. Ele quer
que Deus faça justiça contra os seus adversários e que a verdade
de Deus seja estabelecida, lembrando que o Senhor é amor, mas
também é justo e verdadeiro.
O segundo fato sobre essa oração é que nenhuma dessas
pessoas na Bíblia que faz esse tipo de oração resolve se vingar
pessoalmente dos seus inimigos. Ao contrário, o que elas fazem
é entregar os inimigos nas mãos de Deus. Elas não vão pegar a
espada e dizer que elas mesmas vão fazer justiça, mas entregam
essas pessoas a Deus e dizem: “Deus, faça justiça, não sou eu que
vou fazer com minhas mãos, mas o Senhor faça justiça”.
A terceira coisa é que o alvo final dessas orações sempre
é a glória de Deus e nasce do desejo de ver Deus vindicado. Já a
quarta é orar pela destruição dos inimigos de Deus, caso eles não
se arrependam. Seria mais ou menos assim: “Senhor, eu oro para
que eles se arrependam, oro para que eles se convertam, os meus
inimigos e os inimigos do povo de Deus, que eles se convertam
para a Tua glória; mas, se eles não se converterem, se eles não se
arrependerem, destrói-os, Deus, para que a Tua glória e a Tua
justiça sejam manifestas”. Temos que orar pela conversão dos
inimigos, mas a conversão passa pelo arrependimento. Devemos
orar para que Deus salve os nossos inimigos. Porém, para isso,
eles têm que se arrepender, e, se eles não quiserem se arrepender,
que Deus dê o justo juízo e a justa retribuição, ou seja, castigo,
condenação e destruição porque eles não se arrependeram.
Nosso dever, primeiramente, como cristãos é orar pela
conversão e arrependimento dos ímpios, dos inimigos de Deus.
Contudo, se eles não querem se arrepender e mudar, nós podemos
orar conforme os salmos nos mostram, para que Deus faça a Sua
justiça e que exerça a Sua ira santa contra os seus inimigos. Aqui

114
SALMO 129 - ENFRENTANDO O ABUSO

está meu quinto ponto: que essa oração pode, sim, ser feita por um
crente com relação aos inimigos do povo de Deus que perseguem,
assolam, abusam, torturam e matam o povo de Deus e também
quando o cristão é vítima de um abuso pessoal da parte de ímpios
que o perseguem e angustiam. Inclusive, a seguir veremos alguns
trechos bíblicos sobre o tema.
Jesus disse aos Seus discípulos que, quando eles fossem
evangelizar, entrassem em uma cidade e não fossem recebidos,
que batessem o pó da sandália contra aquele povo. Bater o pó
da sandália significa dizer “nem o pó das ruas, das cidades de
vocês, eu quero que esteja comigo, porque vocês são objeto da
ira de Deus”, e Jesus disse que menos rigor haverá para Sodoma e
Gomorra, no Dia do Juízo, do que para aquela cidade (Mt 10.15).
O apóstolo Paulo estava sendo julgado perante o sinédrio,
e, quando o julgamento começou e Paulo iniciou sua defesa, o
sumo sacerdote mandou um empregado bater na boca de Paulo,
que se virou para o sacerdote e disse: Deus haverá de te destruir,
parede branqueada (At 23.3). Então o empregado questionou
como Paulo podia dizer isso de um sumo sacerdote, ao que Paulo
respondeu que não sabia que ele era o sumo sacerdote. Desculpou-
se, não pelo que disse, mas porque disse contra o sumo sacerdote.
Paulo também menciona um tal Alexandre que lhe causou
muitos males e diz: Deus haverá de pagar a ele conforme as suas
obras (2Tm 4.14). Note que Paulo não estava procurando uma
vingança pessoal, mas entregou Alexandre nas mãos de Deus, que
é santo e justo.
Em Apocalipse, João tem uma visão do céu, das almas
dos que foram mortos pelo nome de Jesus, os mártires, e estas
almas estavam perguntando a Deus até quando Ele não vingaria
o sangue daqueles que habitavam sobre a terra. Eles estavam
pedindo a Deus quando é que o Senhor faria justiça, quando é
que o Senhor iria punir os inimigos, destruir aqueles que queriam
destruir o Seu povo (Ap 6.10). No mesmo livro de Apocalipse,
é mencionada a queda da grande Babilônia, que representa os
reinos desse mundo que perseguem o povo de Deus. Lá, o anjo

115
CAMINHOS DA FÉ

passa gritando que caíra a grande Babilônia: Exultai sobre ela, ó


céus, e vós, santos, apóstolos e profetas, porque Deus contra ela julgou
a vossa causa (Ap 18.20).
Ou seja, a oração imprecatória faz parte, sim, da vida
do cristão. Agora, se você vai orar dessa forma, você tem que
fazer exatamente como a Bíblia ensina, pensando nos inimigos
do povo de Deus. A minha oração sempre é esta: “Senhor, eu
oro pela conversão desse povo que persegue os cristãos, que os
aniquila e os tortura, trazendo-lhes a morte. Eu oro para que eles
se convertam; mas, se eles não quiserem se converter, eu sei o que
é que o Senhor vai fazer, o Senhor vai castigá-los e destruí-los.
Que assim seja, Deus, porque Tu és justo, verdadeiro e bom”. Eu
creio que essa é a aplicação que nós podemos fazer quanto a este
salmo.
Alguém pode perguntar se eu não me esqueci de mencionar
a oração de Cristo na cruz: Pai, perdoa-lhes, porque eles não sabem o
que fazem (Lc 23.34). Quanto a isso, duas observações: a primeira
é que Jesus não queria uma vingança pessoal contra aquelas
pessoas. Segunda: estava implícito na oração de Jesus que aquele
perdão que Ele pede a Deus para os Seus inimigos seria mediante
o arrependimento; se os inimigos dele não se arrependessem,
é claro que Jesus não oraria pelo perdão, porque perdão é para
quem se arrepende. Se não há arrependimento também não há
perdão. Logo após a oração de Jesus, o centurião que estava ali,
vendo aquilo, disse: Verdadeiramente, esse homem era justo! (Lc
23.47). Aquele soldado respondeu à oração de Jesus, arrependeu-
se e foi perdoado ali. Implicitamente, ele estava dizendo que
errou, que havia crucificado o filho de Deus, liderado os soldados
que enfiaram os pregos em Suas mãos e pés.
A oração de Jesus também se reflete no ladrão na cruz.
Um deles se virou para Jesus e começou a insultá-lo. O outro,
então, o repreendeu e disse: “Por que você ainda faz isso? Nós
estamos aqui porque nós merecemos, estamos aqui recebendo o
castigo dos nossos pecados, mas este nenhum mal fez” (Lc 23.40-
41). Jesus, então, se voltou para ele e disse: “Hoje você vai estar

116
SALMO 129 - ENFRENTANDO O ABUSO

comigo no paraíso” (Lc 23.43), ou seja, houve perdão, porque o


que houve antes foi o arrependimento da parte do ladrão. Então
a minha oração é: Senhor, salva os ímpios, salva aqueles que
me perseguem, salva aqueles que me torturam, aqueles que me
abusam e produzem todo tipo de sofrimento; mas, se eles não
quiserem se arrepender, julga-os, ó Deus, entrego-os na Tua mão.
Tu, que és santo e verdadeiro, faz aquilo que Tu disseste que faria
com todo ímpio que se rebela contra Ti.
O que, então, em resumo, você pode aprender? Como
você deve enfrentar o abuso e a angústia que por vezes vêm sobre
você? Há alguns pontos que quero destacar aqui: primeiro, você
vai sofrer, sim. Esteja consciente de que neste mundo os filhos de
Deus sofrem, sim, abusos, hostilidade, opressão e perseguição.
Por isso, não fique surpreso nem espantado quando essas coisas
acontecem em sua vida. Não é que Deus lhe abandonou, mas
Ele permite que essas coisas aconteçam com o Seu povo, como
Ele permitiu com a nação de Israel e como tem permitido com a
Igreja através da história.
Segundo: Deus sempre está com você. Lembre-se de que
Deus sempre esteve com o Seu povo em meio ao abuso sofrido, Ele
nunca permitiu que os Seus fossem completamente destruídos ou
que chegassem a um ponto de desespero em que abandonassem
a fé. Ao contrário, Ele sempre os sustentou no meio da provação
e da dificuldade.
Terceiro: ore por seus inimigos. Ore pelo arrependimento
e conversão daqueles que cometeram abusos e injustiça contra
você e ore também para que Deus exerça o juízo se eles não se
arrependerem, como o salmista faz aqui.
Quarto: você não deve alimentar sentimentos de vingança.
Não alimente sentimentos de ira, vingança, ódio e rancor, mas
deixe essas pessoas na mão de Deus, como diz a Palavra: “Deus
haverá de retribuir”. Em Romanos 12, Paulo diz: Não vos vingueis
a vós mesmos, amados, mas dai lugar à ira. Não deixemos que a
nossa ira entre no caminho, porém deixemos que a ira de Deus
se manifeste.

117
CAMINHOS DA FÉ

Quinto: Deus vai fazer justiça. Espere o dia do juízo,


Deus vai, sim, fazer justiça. Eu sei que o nosso coração clama por
justiça aqui neste mundo, especialmente quando estamos sendo
injustiçados, mas há um dia em que Deus vai fazer isso, e você
espera esse dia e entrega os seus inimigos nas mãos do Deus que
pode convertê-los, o Deus que pode trazer a justiça sobre eles.
Alguém me pergunta: “Pastor, mas é muito difícil isso,
nós perdoarmos, orarmos pela conversão dos inimigos ou não
guardar rancor e mágoa no nosso coração”. Aqui, eu termino
dizendo que as forças para isso vêm mediante a comunhão com
Jesus Cristo. Jesus sofreu o abuso da humanidade em nosso
lugar, Ele foi angustiado, passaram o arado em Suas costas,
Ele foi chicoteado, mas orou pela conversão dos Seus inimigos
e entregou-se a Deus, para que Deus fizesse toda a justiça.
Unidos a Cristo, nosso redentor e salvador, nós teremos o poder
necessário para enfrentar o abuso, a hostilidade, a perseguição e o
sofrimento aqui neste mundo da maneira correta. Os sofrimentos
nem sempre irão embora, não adianta pedir a Deus para sempre
passar de você o cálice ou tirar-lhe o espinho na carne. Deus nem
sempre vai atender a esse tipo de coisa, mas Ele sempre vai lhe
dar a graça para que você possa suportar, para que você possa
orar pelas pessoas que lhe afligem, lhe maltratam e lhe incutem
sofrimento; Ele vai lhe dar a graça também para que você anseie o
dia da glória e da justiça de Deus, em que os inimigos de Deus e
do Seu povo serão finalmente destruídos para a glória do Senhor
e para o estabelecimento de toda a justiça. Que Deus assim
nos fortaleça em meio a toda dificuldade e hostilidade que nós
enfrentamos.

ORAÇÃO:

Ó Deus, ajuda-nos a ver a realidade como o Senhor a


vê. O Senhor é Deus amoroso e perdoador, mas também é
fogo consumidor. Horrível coisa é cair nas mãos do Deus vivo.

118
SALMO 129 - ENFRENTANDO O ABUSO

Pedimos, nosso Deus, que o Senhor converta os inimigos da


Igreja e do Teu povo, aqueles que infligem perseguição, morte e
tortura, que são infiéis.
Pedimos que o Senhor levante missionários, que o
Evangelho se espalhe nesses países e cidades onde essa perseguição
aberta ou velada acontece. Mas também, Senhor, se eles não se
arrependerem, trata-os conforme as suas obras, dá-lhes o retorno
e a paga merecida, porque Tu és Deus justo e verdadeiro, Tu não
permitirás que a injustiça prevaleça, para que o justo não tenha
que lançar mão à iniquidade. Damos-te graças porque Jesus é o
nosso redentor e sofreu o abuso em nosso lugar, e é em nome dele
que nós oramos. Amém.

119
SALMO 130

DAS PROFUNDEZAS

Das profundezas clamo a ti, Senhor.


Escuta, Senhor, a minha voz; estejam
alertas os teus ouvidos às minhas súplicas.
Se observares, Senhor, iniquidades, quem,
Senhor, subsistirá? Contigo, porém, está
o perdão, para que te temam. Aguardo o
Senhor, a minha alma o aguarda; eu espero
na sua palavra. A minha alma anseia pelo
Senhor mais do que os guardas pelo romper
da manhã. Mais do que os guardas pelo
romper da manhã, espere Israel no Senhor,
pois no Senhor há misericórdia; nele, há
copiosa redenção. É ele quem redime a
Israel de todas as suas iniquidades.

Este é um dos salmos mais apreciados de todo o saltério.


Era um dos salmos prediletos de Agostinho, era o salmo predileto
de Lutero, de Calvino e de um dos grandes escritores puritanos,
John Owen, que escreveu um comentário de mais de trezentas
páginas só sobre ele. Lutero considerava este salmo um dos salmos
paulinos, ou seja, um dos salmos em que o Evangelho e a graça de
Deus aparecem de forma mais clara em toda a Bíblia. Não é sem
motivo que essas pessoas gostavam deste salmo. Basta lê-lo e nós
CAMINHOS DA FÉ

já nos identificamos com ele, percebemos que aqui estão algumas


das verdades centrais da vida cristã. Este salmo é um dos Salmos
de Romagem, mas é também considerado um dos sete salmos
penitenciais que temos na Bíblia.
Os salmos penitenciais são aqueles em que o autor derrama
o coração diante de Deus. Ele está quebrantado, encontra-se
arrependido e quer o perdão de Deus; expressa toda a tristeza
do seu coração e busca a Deus por misericórdia. São sete desses
salmos — o salmo 6, o salmo 32, o salmo 51, o salmo 102, o
salmo 143 e este salmo aqui, que é uma combinação das duas
coisas. Ele expressa não somente os anseios do peregrino quando
caminha para Jerusalém, mas também as profundidades do nosso
coração.
Nós não sabemos quem escreveu este salmo nem sabemos
ao certo a situação em que ele foi escrito. O autor está passando
uma grande tribulação em sua alma e busca a Deus lá do fundo
do poço, procura a Deus por perdão e depois exorta os seus
companheiros a fazerem o mesmo. Este salmo pode ter sido
escrito como uma expressão de algo que estava acontecendo com
a nação de Israel. Você se recorda de que os judeus foram levados
como cativos para a Babilônia, onde passaram setenta anos
longe de casa, presos como escravos, sendo assediados, sofrendo
hostilidade e abusos. Alguns acham que este salmo foi escrito
naquela época. Outros acham, porém, que foi escrito para ser
cantado naqueles dias de jejum, oração e humilhação que eram
parte do calendário religioso de Israel. O mais provável, todavia,
é que este salmo esteja expressando a experiência pessoal do seu
autor, depois de ter caído em pecado, quando ele humilha-se
diante de Deus, busca a Sua ajuda, busca restauração e depois
exorta os seus irmãos a fazerem o mesmo. De qualquer forma,
este salmo descreve bem a experiência de todos os filhos de Deus
quando se encontram nas profundezas e de lá clamam a Deus por
perdão.
Nós veremos primeiro a oração que o salmista faz (130.1-
2), depois o argumento que ele usa com Deus para que o Senhor

122
SALMO 130 - DAS PROFUNDEZAS

o perdoe (130.3-4), logo em seguida a espera dele pela resposta de


Deus depois de ter orado (130.5-6) e por último o ensinamento
que ele faz à nação de Israel (130.7-8).
Comecemos, então, com a oração que ele faz a Deus:
Das profundezas clamo a ti, Senhor. Escuta, Senhor, a minha voz;
estejam alertas os teus ouvidos às minhas súplicas (130.1-2). O que
motivou o salmista a orar? A resposta é o estado em que ele se
encontrava. Ele diz: das profundezas eu clamo a ti. A expressão das
profundezas descreve no livro dos salmos uma situação crítica de
perigo e de calamidade, ou então uma angústia profunda da alma.
Com certeza essa é a situação em que o salmista se encontra aqui.
Ele está nas profundezas de sua alma, perturbada pelo pecado
que ele cometeu, o coração dele está turbado, a sua consciência
está culpada. Ele havia perdido a alegria da salvação, sentia-se
como alguém que tinha sido lançado ao mar e foi afundando,
afundando, e chegara lá no fundo, nas profundezas do oceano,
lançado fora da presença de Deus. Ele estava em profundo
desespero. Essa era a situação em que ele se encontrava. A sua
alma estava turbada, ele se sentia nas profundezas, lançado de
diante de Deus.
Agora, note que o que ele perdeu aqui com o seu pecado
foi a alegria da salvação. Ele não perdeu a salvação, porque
ele ainda está chamando por Deus, ele dá mostras de que está
arrependido, sente tristeza por seu pecado e quer o perdão de
Deus. Ele é um crente que caiu e está se sentindo nas profundezas,
com a consciência culpada, o coração inquieto e a incerteza do
favor de Deus. A alegria espiritual foi embora, ele se encontra em
profunda perturbação, e é de lá das profundezas que ele clama a
Deus.
Aqui já temos uma lição preciosa para quando caímos
em pecado, quando tropeçamos e fazemos o que não devemos
e que começamos a nos sentir assim, lá no fundo do poço, nas
profundezas. A nossa primeira reação é nos escondermos de Deus
ou pararmos de buscá-lo. Esse homem aqui clama das profundezas.
Ele não deixou as profundezas impedirem a sua busca por Deus.

123
CAMINHOS DA FÉ

É isso que devemos fazer quando nos encontramos lá no fundo


do poço, em profundo desespero. Nós temos que fazer o que este
salmo nos ensina: clamar a Deus. Quem é crente verdadeiro já
passou por alguma experiência dessas. Não é à toa que Lutero,
Calvino e Agostinho gostavam deste salmo e que é um dos salmos
prediletos da Igreja através da História. Ele reflete uma situação
em que nós cristãos com frequência nos encontramos, lá nas
profundezas, lá no fundo, sentindo-nos desesperados, sem saída,
a consciência turbada, sem a alegria da salvação, incertos com
relação ao que Deus está sentindo por nós. Foi essa situação que
fez com que o salmista orasse.
Agora, em segundo lugar, note que a oração dele é uma
súplica: Escuta, Senhor, a minha voz; estejam alertas os teus ouvidos
às minhas súplicas. Súplicas é uma palavra que carrega um pedido
de socorro de alguém que sabe que não merece resposta. Por isso
ele suplica, pede com emoção, com o coração. Ele demonstra
com essa súplica toda a sua dependência de Deus. Quando
suplicamos a alguém, nos colocamos em uma posição de total
dependência e de não merecimento, porque a súplica já revela que
nós temos consciência de que não merecemos nem ser ouvidos
nem atendidos. A súplica é o último recurso do desesperado, ele
chegou a um ponto em que não tem mais o que negociar, não
tem mais o que exigir e o que reivindicar, só lhe resta suplicar, e
é o que nosso salmista faz. Lá das profundezas, ele suplica, como
Jonas nas profundezas do mar, como Daniel na cova dos leões ou
como o profeta Jeremias quando foi lançado ao fundo do poço.
Os versos 1 e 2 nos dizem com clareza o que ele suplica,
o que ele quer de Deus. Primeiro, ele diz, no verso 2: Escuta,
Senhor, a minha voz. Ele quer que Deus o ouça. Na maioria das
vezes em que suplicamos a Deus em uma situação de desespero,
queremos só isso, que Deus nos ouça, porque sabemos que Ele é
bom, que Ele é Todo-Poderoso e pode nos tirar daquela situação.
Queremos só que Ele nos ouça, porque, se Deus nos ouvir, o
problema estará resolvido, da maneira que Ele quiser, no tempo
que Ele quiser e da forma como Ele quiser.

124
SALMO 130 - DAS PROFUNDEZAS

“Ouve a minha voz.” É só isso que ele quer, e é claro que


aqui no meio está implícito um pedido de perdão dos pecados
que ele cometeu e que o levaram a ficar nessa situação. Essa oração
ilustra bem o verdadeiro arrependimento. O que Deus deseja de
nós quando caímos em pecado é que nos arrependamos daquele
pecado e que O procuremos, para que recebamos o perdão.
Essa oração é uma oração de alguém que está verdadeiramente
arrependido, está procurando a Deus em uma atitude súplice,
das profundezas em que ele se encontra. Deus com certeza está
pronto a atender quando percebe o arrependimento verdadeiro
em nosso coração. É isso que esses dois versículos nos ensinam,
que lá das profundezas nós podemos suplicar que Deus nos ouça
e nos perdoe.
Nos versos 3 e 4, o salmista argumenta com Deus como
que querendo convencer o Senhor a perdoá-lo. Essa é uma parte
importante da vida de oração. Nós suplicamos, nos colocamos
diante de Deus totalmente dependentes dele, mas Deus nos
convida a argumentar com Ele. Era como se Deus dissesse:
“Tudo bem, eu estou te ouvindo, me dê algum motivo para que
eu perdoe você; por que eu deveria perdoá-lo? Por qual razão eu
deveria atender à sua oração? Argumente comigo, me convença”.
Faz parte da sua oração “convencer” a Deus que Ele deve atender
ao seu pedido. Deus quer ouvir as suas razões e motivos para
que Ele lhe atenda. Esse engajamento em argumento com Deus é
uma das partes mais profundas da oração; não é só você chegar e
dizer a Deus que quer um emprego, por exemplo — e eu sei que
pode parecer óbvio por que é que você quer um emprego —, mas
Deus quer que você elabore: por que Ele lhe daria um emprego?
Ah, porque você tem que ganhar o seu pão, porque quer ajudar
as outras pessoas… É preciso argumentar com Deus.
E é o que o salmista faz agora. Primeiro ele quer que Deus
o ouça, e em seguida ele argumenta com Deus por que é que Ele
deveria perdoá-lo, dando-lhe dois motivos. Note que ele não se
defende nessa argumentação, ele não vai dizer que quer que o
Senhor o perdoe porque há pessoas piores do que ele, ou então

125
CAMINHOS DA FÉ

que quer que o Senhor o perdoe porque a culpa não foi somente
dele. Note que ele não se desculpa. Observe os dois argumentos
que ele usa diante de Deus: o primeiro está no verso 3: Se
observares, Senhor, iniquidades, quem, Senhor, subsistirá? O que
ele está dizendo a Deus aqui é o seguinte: se o Senhor for seguir
estritamente a lógica da Sua justiça, o Senhor terá que destruir a
raça humana toda. Deus é santo, justo e verdadeiro e por isso tem
que castigar todos aqueles que praticam a iniquidade, porque Ele
não pode contemplar o mal, não pode conviver com o pecado. A
santidade de Deus exige que todo pecador seja castigado e que a
pessoa que peca seja destruída.
Porém, disso vem o segundo ponto: todos os homens
praticam a iniquidade, não há um que não peque. Então,
consequentemente, Deus tem que aniquilar toda a raça humana.
É isso que ele está dizendo aqui: Se observares, Senhor, iniquidades.
Observar poderia ser traduzido como fazer uma lista: “Então,
Senhor, se o Senhor for anotar meticulosa e detalhadamente as
iniquidades que os homens cometem e punir cada uma delas,
o Senhor sabe quem vai sobrar na terra? Ninguém. Quem
subsistirá, se nós todos somos pecadores, pecamos diariamente e
quebramos a Tua lei? Se o Senhor for tomar nota ponto a ponto
disso, detalhe por detalhe, e castigar-nos de acordo com as nossas
iniquidades, ninguém vai sobreviver diante de Ti, a raça humana
será extinta. É isso que o Senhor quer? É isso que o Senhor quer
fazer?”. Veja que argumento que ele utiliza diante de Deus!
Agora, é claro que Deus observa todos os pecados,
iniquidades, transgressões e faltas que os homens cometem diante
dele. O salmista não está questionando que Deus tem o direito
de fazer isso, mas que, se Deus não tiver misericórdia — que é
o próximo argumento —, a raça humana será completamente
destruída diante dele. Ao argumentar assim, ele está confessando
a sua culpa, está dizendo que ele está no meio desse povo que vai
ser destruído, porque é pecador, ele admite a sua culpa e o seu
pecado.

126
SALMO 130 - DAS PROFUNDEZAS

Aí, vem o segundo argumento, exposto no verso 4:


Contigo, porém, está o perdão, para que te temam. Aqui, ele diz:
“Tu és o Deus santo que pode destruir a humanidade por causa
dos seus pecados. Mas o Senhor tem também autoridade para
perdoar, tem poder para isso, contigo está o perdão; o perdão não
está com os homens, não está com os falsos deuses, não está em
lugar nenhum, mas está contigo, só o Senhor pode perdoar. É
isso que eu peço, não justiça, porque, se o Senhor me tratar com
justiça, eu serei aniquilado, porém eu peço misericórdia, eu peço
perdão, e contigo está o perdão”.
E por que é que o perdão está com Deus e com Ele
somente? Porque Ele é o Criador dos céus e da terra, porque Ele
fez o homem à Sua imagem e semelhança e colocou a raça humana
debaixo da Sua autoridade. Quando nós pecamos, pecamos contra
Ele; quando você mente para o irmão, é mentira contra Deus;
quando você maltrata um irmão, você está maltratando a Deus;
quando você fala mal de um irmão, em última análise, você está
falando mal de Deus. Todo pecado é contra Deus, por isso Ele é o
ofendido maior e final, e só quem é o ofendido pode perdoar. Eu
não posso perdoar por outra pessoa; mas, como todo pecado no
final é uma ofensa contra Deus, quem pode nos perdoar é Deus.
Com Ele está o perdão; não é com os homens, não é com falsos
deuses, não sou eu que perdoo, mas o perdão está com Deus, e o
poder de conceder o perdão está também com Ele.
Perdoar, na Bíblia, não significa fazer vista grossa, do
tipo “não vi nada”. Também não significa não levar em conta,
minimizar, relativizar ou deixar por menos. O perdão na Bíblia
é sempre o resultado de uma transação, alguém tem que ser
punido. Deus é justo, e para que Deus perdoe o pecador tem que
ser castigado. O perdão não é liberado de graça, o pecador tem
que ser punido. Como é que isso era feito na época do salmista?
Quando um judeu pecava, ele levava um animal ao templo como
oferta pelo seu pecado. O sacerdote derramava o sangue daquele
animal e pronunciava o perdão para o israelita pecador, que saía
do templo se considerando perdoado. Mas aquele animal tinha

127
CAMINHOS DA FÉ

morrido no lugar dele, o sangue daquele animal era considerado


como pagamento pelo pecado que ele havia cometido. O templo
de Jerusalém, na verdade, era um grande açougue, centenas de
animais eram sacrificados diariamente ali, o sangue corria o
tempo todo do altar, porque sem derramamento de sangue não
há perdão de pecados. É claro que aquele sangue dos animais
na verdade não podia perdoar pecados, mas era um símbolo do
Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo.
Aqueles sacrifícios apontavam para o filho de Deus, Jesus
Cristo, que veio ao mundo e que se ofereceu no altar da cruz,
no Monte Gólgota. O sangue dele derramado na cruz é o preço
que Deus pagou para poder perdoar-nos hoje. Então, quando o
salmista diz contigo está o perdão, ele não somente está dizendo:
“O Senhor tem o poder de perdoar”, mas está dizendo: “O Senhor
tem todos os recursos necessários para que esse perdão seja dado”,
porque ele sabia que sem sangue não havia perdão; “Contigo está
o perdão, o Senhor providencia o sacrifício, o Senhor tem todos
os recursos pelos quais o perdão pode ser dado”.
Ainda, há um terceiro argumento oferecido pelo salmista
para que Deus o perdoe: para que te temam (130.4). Aqui, ele
apelou para a glória de Deus. Ele diz, no final: “Senhor, se o
Senhor me perdoar, o Senhor vai ser glorificado, as pessoas vão
temer ao Senhor”. Temer a Deus, na Bíblia, não é ter medo dele.
Como é que eu vou ter medo de quem me perdoa? Temer aqui é
respeitar, é um amor respeitoso, adoração, veneração. “Contigo,
Senhor, está o perdão para que as pessoas te busquem, elas sabem
que o perdão está com o Senhor, por isso elas te adoram, elas têm
um respeito pelo Senhor, porque só o Senhor pode perdoar, e, se
o Senhor não perdoar, elas serão destruídas; então, no final, se o
Senhor me perdoar, isso vai aumentar a Tua glória, as pessoas vão
olhar para o Senhor e dizer: ‘Esse é o Deus de Israel, esse é o Deus
verdadeiro, o Deus que perdoa pecados’.” Ou seja, o salmista aqui
está apelando para aquilo que Deus preza mais, que é a própria
glória: “Senhor, me perdoa, porque a glória no final será Tua, as
pessoas vão temer e honrar o Senhor”.

128
SALMO 130 - DAS PROFUNDEZAS

Você sabe argumentar com Deus assim? Sabe por que boa
parte das nossas orações não são respondidas? Porque não fazemos
aquilo que Deus nos ensina. Simplesmente pedimos que Ele nos
dê, porque queremos e queremos, e nos esquecemos de dizer a
Deus por quê. Precisamos conversar, argumentar com Ele. Esse
tempo que gastamos em comunhão com Deus, argumentando
com Ele, é o que faz a oração. Conversar com Ele, argumentar
com Ele, se engajar com Ele, esse é o tipo de oração que Deus se
deleita em responder.
Espero que você já tenha notado que o perdão de Deus não
leva a uma vida dissoluta. Digo isso porque poderíamos pensar
assim: “Se Deus me livra e me perdoa, eu vou me sentir tranquilo
para pecar de novo, pois eu sei que Ele vai me perdoar”. Assim,
isso de que Deus perdoa acaba nos deixando mais relaxados
para cometer o pecado, porque temos certeza do perdão. Por
exemplo, se o menino sabe que ele pode fazer uma coisa errada
e que nenhum mal vai lhe acontecer, a mamãe e o papai não
vão repreendê-lo, então o menino se sente encorajado para ficar
fazendo aquela coisa errada, já que não tem consequência. Se eu
sei que Deus me perdoa, será que isso não me leva a viver uma vida
errada porque eu sei do perdão de Deus? Mas não, observe o que
o salmista diz: Contigo está o perdão, para que te temam. Quem é
verdadeiramente perdoado vai temer a Deus, vai respeitá-lo e não
vai querer pecar mais. O perdão de Deus tem esse efeito naquele
que se arrependeu e foi perdoado. Nós queremos nos ver livres do
pecado e das consequências dele, nós vamos temer a Deus, e não
abusar da bondade dele toda vez que Ele nos perdoa.
Agora vamos para a espera do salmista depois de ter orado
(130.5-6). Essa é uma parte também muito importante da oração.
A oração não termina quando acaba, porque, depois de você ter
orado, entra no estado de espera e expectativa. Muitos de nós
fazemos uma oração a Deus, acabamos de orar e simplesmente
esquecemos o assunto. Ouvi uma vez uma história que aconteceu
no Nordeste. Era uma localidade de muita seca, uma cidade do
interior, e o pastor pediu no domingo que na quarta-feira todos

129
CAMINHOS DA FÉ

fossem à igreja porque eles iriam orar por chuva. Na quarta-


feira, a igreja toda foi, mas somente uma menininha levou um
guarda-chuva. Não é interessante? Quantos estavam realmente
na expectativa de que Deus havia de responder? Quantas vezes
pedimos a Deus coisas que realmente não esperamos que Ele vá
dar? Porém, o salmista, depois de ter argumentado com Deus,
coloca-se em um estado de espera: Aguardo o Senhor, a minha
alma o aguarda; eu espero na sua palavra. A minha alma anseia
pelo Senhor mais do que os guardas pelo romper da manhã (130.5-
6). Observe como ele fica nesse estado de espera ansiosa para que
Deus atenda à sua oração, ele quer se sentir perdoado. Ele pediu
perdão a Deus, argumentou com Deus por que Deus deveria
perdoá-lo, e agora ele quer sentir a resposta do Senhor, quer
experimentar a certeza de que Deus o atendeu e que seus pecados
foram perdoados, ele quer ter essa confirmação no coração de que
foi atendido.
Atente para o fato de como é que ele espera. São quatro
observações:
Primeira: ele espera de todo o coração: Aguardo o Senhor,
a minha alma o aguarda. Esse a minha alma o aguarda é uma
expressão para dizer que é uma espera sincera, que parte do
coração, então ele está engajado realmente, ele deseja isso.
Segunda: ele espera confiando nas promessas de Deus: eu
espero na sua palavra. Que palavra é essa? Antes dele, na lei de
Moisés, Deus havia prometido perdoar quem se arrependesse.
No livro de Êxodo, Deus aparece a Moisés e diz que é um Deus
compassivo, clemente e longânimo e que perdoa a iniquidade
(Êx 34.6-7). O salmista conhecia a lei, e na lei há promessas de
que Deus haveria de perdoar o Seu povo, como parte da aliança
que Deus tinha feito com a nação de Israel. O salmista espera
confiando nessa palavra de Deus. O Senhor prometeu que ele
perdoaria aqueles que se arrependessem e O buscassem. Ele se
apega àquela palavra e a sua alma espera a resposta de Deus.
Terceira: ele espera com ansiedade: A minha alma anseia
pelo Senhor mais do que os guardas pelo romper da manhã. A

130
SALMO 130 - DAS PROFUNDEZAS

figura que ele traz aqui é de um vigia que passa a noite acordado
vigiando uma instalação que lhe foi confiada; está tudo escuro, e
na escuridão podem surgir os perigos e as ameaças. E o que é que
o vigia mais anseia durante aquelas longas noites de espera? Que
o sol surja no horizonte. “A minha alma anseia pelo Senhor mais
do que um vigia espera o nascer do dia”, é a figura que ele usa para
mostrar a ansiedade com que está aguardando a resposta de Deus
e a profundidade com que ele deseja isso. Às vezes, nós pedimos
as coisas para Deus, mas não há anseio em nosso coração, não
há essa expectativa, não há esse desejo, essa espera angustiada, de
que Deus nos responda. Note aqui que ele anseia isso tudo, o que
mostra o quanto ele queria experimentar o perdão de Deus e o
quanto ele queria voltar a ter a certeza da salvação.
Quarta: ele espera no Senhor. Nós já vimos que o salmista
esperava de todo o coração. Ele não tinha mais nada a fazer. Já
havia argumentado com Deus, trouxe diante de Deus as razões
pelas quais o Senhor deveria perdoá-lo, e agora ele entrou em
estado de espera. Não tinha mais nada que ele pudesse fazer, ele
não podia mover um dedo para o perdão dos pecados, não podia
fazer uma única boa obra, não havia nenhum ritual na Igreja que
ele pudesse fazer para o perdão de seus pecados, pois só quem
perdoa pecados é Deus. Por isso, agora ele espera no Senhor. Só
Deus podia perdoá-lo.
A última parte do salmo diz que, enquanto o salmista
espera, ele se volta para os amigos e, com base na sua experiência,
os exorta a buscar o Senhor: Mais do que os guardas pelo romper
da manhã, espere Israel no Senhor, pois no Senhor há misericórdia;
nele, há copiosa redenção. É ele quem redime a Israel de todas as suas
iniquidades (130.7-8). Primeiro ele orou, depois ele argumentou
com Deus, esperou e, por último, pregou, virando-se para os
amigos e dizendo: “Israel — ou seja, meus irmãos —, esperem
em Deus, assim como eu estou esperando”. Para isso, ele utiliza
três argumentos:
Primeiro: em Deus há misericórdia. Misericórdia é o que
nós precisamos. Nós não precisamos de justiça, nunca peça a

131
CAMINHOS DA FÉ

Deus que lhe faça justiça; se Deus for fazer justiça, Ele vai mandar
você para o inferno. Diga: “Senhor, misericórdia é só o que eu
quero, não me trates como eu mereço, na verdade me trata ao
contrário do que eu mereço”. Misericórdia, é isso que o salmista
pede a Deus. Este é o seu primeiro argumento: espere em Deus,
porque nele há misericórdia.
Segundo: Deus perdoa. No verso 7, ele diz: nele, há copiosa
redenção; abundante redenção, Deus redime, perdoa, recebe
pecadores e faz isso com abundância.
Terceiro: Ele é o Deus de Israel. É ele quem redime a Israel
de todas as suas iniquidades; Ele é o Deus que tem uma aliança
com Israel. Os outros deuses não podem perdoar. Os ídolos, que
são fruto da imaginação humana, não podem perdoar, Maria não
pode perdoar, os santos não podem perdoar, o Papa não pode
perdoar, os bispos não podem perdoar, pastores não podem
perdoar, igreja não pode perdoar, mas no Senhor há abundante
redenção, Ele é quem redime Israel de todas as suas iniquidades.
Concluindo, o que podemos aprender com este salmo?
Eu quero resumir rapidamente aqui: primeiro, não há nada mais
importante na vida do que receber o perdão de pecados. Pode
nos faltar tudo nesta vida, o pão de cada dia, a saúde, amigos…
mas o perdão de pecados é a coisa mais importante para a nossa
existência aqui.
Segundo: nós podemos ter a certeza do perdão de pecados,
a certeza da nossa salvação. Nós perdemos a alegria e a certeza
da salvação quando pecamos, mas pelo arrependimento e pela
oração, com um pedido de perdão, Deus nos renova, nos perdoa
e nos restaura.
Terceiro: aprendemos com este salmo que Deus está
pronto a ouvir as nossas orações pelo perdão, se nós estivermos
de fato arrependidos, se nós buscarmos esse perdão com base no
sacrifício completo de Jesus Cristo.
Como está você hoje com relação a isso? Talvez você
esteja nas profundezas agora. É exatamente daí que você tem
que clamar a Deus; talvez você esteja com a consciência pesada,

132
SALMO 130 - DAS PROFUNDEZAS

o coração perturbado, perdeu a alegria da salvação, não tem


mais certeza do relacionamento com Deus, Ele está como que
distante; você lê a Bíblia, porém ela não fala mais, você perdeu a
vontade de orar, aquele tempo gostoso de comunhão com Deus
já se foi, você se sente lá nas profundezas. Eu quero que agora
você lembre que é exatamente onde está, nas profundezas, que
você tem que clamar a Deus e se chegar para Ele com súplicas,
argumentando com Ele, dizendo: “Deus, não me trates conforme
os meus pecados merecem, mas contigo está o perdão, Deus, por
isso me perdoa, levanta-me de onde eu estou, traz-me de volta a
uma vida espiritual firme, eu quero ser cheio do Espírito Santo,
quero andar contigo, torna a dar-me a alegria da Tua salvação”.
Se você está nessa situação hoje, eu quero que você ouça a palavra
de Deus e que, das profundezas, clame a Deus e diga: “Senhor,
aqui estou, renova-me, enche o meu coração de alegria, ensina-
me a viver para a Tua glória, liberta-me dessa situação, para que
Tu sejas temido, pois em Ti há copiosa redenção”.

ORAÇÃO:

Ó Deus misericordioso e bom! Das profundezas


clamamos a Ti. Ouve a oração de todo aquele que, sinceramente
arrependido, te busca com o coração contrito, implorando o Teu
perdão. Damos-te graças pelo sacrifício perfeito de Jesus Cristo,
Teu filho, por meio do qual podemos obter pleno perdão para
nossas iniquidades. A Ti seja sempre a glória. Em nome de Jesus,
amém.

133
SALMO 131

COMO VENCER O ORGULHO


DO CORAÇÃO

Senhor, não é soberbo o meu coração, nem


altivo o meu olhar; não ando à procura de
grandes coisas, nem de coisas maravilhosas
demais para mim. Pelo contrário, fiz calar
e sossegar a minha alma; como a criança
desmamada se aquieta nos braços de sua
mãe, como essa criança é a minha alma para
comigo. Espera, ó Israel, no Senhor, desde
agora e para sempre.

Este salmo é atribuído ao rei Davi. Davi, o mais conhecido


dos reis de Israel, era pastor de ovelhas, Deus o tirou detrás do
rebanho e o colocou como rei no lugar de Saul. Ele foi o segundo
rei de Israel e, de todos, o mais conhecido. Tido como o amigo de
Deus, escreveu vários dos salmos. Era homem de guerra, temente
a Deus. Este salmo é um salmo em que ele exorta o povo de Deus
a esperar somente em Deus depois que ele aquieta e acalma o seu
próprio coração.
Os salmos foram escritos durante alguma situação, algum
ambiente vivencial, que deu origem à sua forma e à maneira
como ele foi escrito ou ao tema dele. Os estudiosos se perguntam
qual foi a situação na vida do rei Davi que o levou a escrever este
CAMINHOS DA FÉ

salmo. Uma das possibilidades é quando Davi ainda não era rei
de Israel e foi acusado pelo rei Saul e pelos seus súditos de ter
ambições de se tornar rei, matar Saul e ocupar o trono de Israel.
Nós lemos a respeito desses episódios nos dois livros de Samuel e
também no livro das Crônicas. De fato, houve uma época em que
Deus deixou muito claro que Davi seria o verdadeiro rei de Israel.
Porém, quem reinava era Saul, e ele começou a olhar para Davi
como sendo o seu rival, aquela pessoa que tomaria o trono em seu
lugar. Os súditos do rei Saul o ficavam instigando e dizendo que
Davi estava tramando contra ele, porque Davi tinha aspirações e
queria ser o rei de Israel. Isso fez com que o ódio de Saul por Davi
se multiplicasse e que ele procurasse matar Davi diversas vezes.
Então talvez tenha sido nessa ocasião que Davi escreveu
este salmo, em que ele diz que o seu coração não buscava essas
coisas, ele não queria coisas extraordinárias, o olhar dele não
era soberbo nem altivo; ao contrário, a sua alma estava muito
tranquila, confiante e satisfeita nos braços de Deus como uma
criança está nos braços de sua mãe. Ele não estava procurando
essas coisas, a satisfação dele era em Deus. Deus o bastava.
Ele termina o salmo dizendo ao povo, seus compatriotas, que
colocassem a sua esperança e a sua confiança somente em Deus,
agora e para todo o sempre, porque Ele é quem pode de fato
satisfazer os anseios mais profundos do coração.
Assim, este salmo é uma expressão dos sentimentos de
Davi diante de Deus. Note que, embora seja dirigido a Deus, este
salmo não é uma oração. Davi não pede nada aqui, ele só declara
seus sentimentos diante do Senhor. Quando ouviu aquelas
acusações, ele chegou à presença de Deus e disse: “Senhor, eu vou
responder a essas acusações diante de Ti, o Senhor me conhece,
sabe que o meu coração não está procurando essas coisas, sabe
que eu não planejo coisas grandes demais para mim, que a
minha alma está tranquila, segura e que o Senhor é minha única
satisfação e minha única esperança”. Este salmo é uma espécie
de prestação de contas que Davi faz da sua alma diante de Deus,
porque Deus é aquele que conhece o que se passa dentro de nós.

136
SALMO 131 - COMO VENCER O ORGULHO DO CORAÇÃO

Ocasionalmente, nós temos que dar contas dos nossos atos às


pessoas, aos homens, àqueles que nos rodeiam, mas, acima de
tudo, nós sempre temos que dar contas do nosso coração diante
de Deus. É isso que Davi está fazendo aqui, uma prestação de
contas, porque ninguém conhece nossa alma melhor do que Deus,
Ele é quem sonda o mais íntimo do nosso coração, e é quando
nós nos colocamos na presença de Deus que temos verdadeiro
conhecimento de nós mesmos.
João Calvino, em suas Institutas da Religião Cristã, que é o
livro clássico da Reforma Protestante, ao falar do conhecimento
de Deus, diz que, quanto mais você conhece a Deus, mais você
se conhece; ao contrário do que diziam os filósofos: “Conhece-te
a ti mesmo”, na ideia de que, quanto mais você se examina e se
analisa, mais você tem um conhecimento correto de si mesmo.
Mas Calvino e outros reformadores disseram que, quanto mais
você conhece a Deus, mais você vai conhecer a si mesmo, porque
é diante de Deus que o nosso coração se manifesta, diante de Deus
a nossa mente fica clara. Quantas vezes eu tenho me chegado
diante de Deus confuso e perplexo e começo a orar, começo a
buscá-lo, a ler a Escritura, a conversar com Deus, e de repente
fica claro o que está em meu coração. As minhas verdadeiras
intenções, os motivos do meu coração se aclaram na presença de
Deus. É diante dele que nós nos conhecemos e conhecemos o
nosso coração.
O nosso coração, conforme diz o profeta Jeremias, é
desesperadamente corrupto, quem o conhecerá? (Jr 17.9). Nós não
conhecemos o nosso coração profundamente e com frequência
somos enganados por ele. Por isso, Davi comparece diante de
Deus e examina o seu coração, concluindo: “Senhor, as minhas
intenções estão corretas, eu não quero ser rei de Isael, eu não
estou buscando a coroa, eu não quero ter poder e glória, o Senhor
conhece o meu coração, o Senhor sabe que eu estou me sentindo
na verdade como uma criança desmamada nos braços de sua
mãe”. Essa é uma das grandes vantagens da oração e da vida em
comunhão com Deus, que nós aprendemos a nos conhecer a nós
mesmos.
137
CAMINHOS DA FÉ

Durante a Reforma Protestante, os salmos foram


metrificados, inclusive por João Calvino, para serem cantados
pelos crentes. Havia muita gente que achava que não deveria
cantar o salmo 131, porque era muito ousado. Observe o que
o salmo está dizendo: Senhor, não é soberbo o meu coração, nem
altivo o meu olhar; não ando à procura de grandes coisas, nem de
coisas maravilhosas demais para mim. Quem é que pode cantar
isso? Quem é que pode dizer de todo o coração que isso é verdade
a respeito do seu coração? Então, houve muitos que, depois da
Reforma Protestante, achavam que cantar isto seria hipocrisia ou
falsa humildade. Uma resposta que se deu para isso é que os salmos
foram escritos para nos ensinar. Nós podemos cantar um salmo
como este, podemos ler em conjunto um salmo como este, como
expressão do que está em nossa alma, porque eles foram feitos
para nos ensinar aquilo que nós devemos ser e de que maneira
nós podemos obter o ideal que é colocado aqui. Podemos ler este
salmo juntos ainda que seja para dizer: “Ó Deus, faz com que o
meu coração seja como Davi, faz com que eu possa dizer isso de
todo o coração, faz com que o meu coração seja humilde como o
de Davi, para que eu possa declarar essas verdades diante de Ti”.
É isso que é este salmo, uma prestação de contas, uma
avaliação sincera das intenções do coração diante de Deus e
que deveria ser cantado pelos peregrinos à medida que eles
caminhavam para Jerusalém, dizendo que a confiança deles estava
somente em Deus, assim como uma criança depende, confia e
descansa nos braços de sua mãe.
Agora veremos os três versículos detalhadamente. No
primeiro, Davi nega que está sendo movido pela soberba; no
segundo, ele diz qual é o verdadeiro estado de sua alma, e no
terceiro ele exorta o seu povo a confiar somente em Deus.
Em primeiro lugar, Davi nega que está sendo movido
pela soberba: Senhor, não é soberbo o meu coração, nem altivo o
meu olhar; não ando à procura de grandes coisas, nem de coisas
maravilhosas demais para mim (131.1). Se a situação em que Davi
escreveu este salmo é aquela que eu descrevi no início, antes de

138
SALMO 131 - COMO VENCER O ORGULHO DO CORAÇÃO

ele se tornar rei, sendo acusado de que tinha ambições políticas,


então o salmo faz todo sentido. Ele está dizendo aqui: Senhor, não
é soberbo o meu coração, ou seja: “O meu coração não é orgulhoso,
eu não estou querendo ser rei, assumir uma posição de domínio
e de glória sobre os demais membros do meu povo, não há essa
soberba em meu coração”. Não é que Davi esteja dizendo que
ele nunca foi soberbo; mas, com respeito àquele assunto, o seu
coração estava em paz.
Em seguida, ele diz que o seu olhar não é altivo, ou seja,
ele não olha para as pessoas de cima para baixo, que é um sinal
de desprezo. Ele não menospreza as outras pessoas como se ele
fosse alguém e os outros não fossem nada. Ele não se considera
maior ou acima das pessoas que estão ao seu redor, o seu olhar
não é altivo. Há pessoas que sabem com o olhar dizer “você não
vale nada”, e só com o olhar de desprezo delas nos sentimos
minúsculos. Mas Davi diz: “Senhor, o meu olhar não é altivo, eu
não estou olhando para as pessoas assim, e exatamente porque o
meu coração não é soberbo eu não estou querendo essas coisas,
não estou me julgando acima dos outros”.
Ainda, ele diz: Não ando à procura de grandes coisas, ou seja,
“Senhor, Tu me conheces, eu não estou secretamente, no íntimo
do meu coração, querendo coisas maravilhosas demais para mim”.
É o que ele vai dizer em seguida: “Eu não estou procurando aquilo
que está acima da minha capacidade e para o qual eu não fui
preparado nem destinado por Ti, eu me contento com aquilo que
o Senhor me deu, eu quero viver dentro daquilo que o Senhor
me proporciona, eu não passo a minha vida procurando ser mais,
ter mais e sempre alcançar uma posição maior e mais elevada;
não, Senhor, eu não ando à procura de grandes coisas, eu estou
satisfeito com a porção que o Senhor me deu nesta vida”.
E a quarta negativa dele está no final do verso primeiro: “Eu
não procuro coisas maravilhosas demais para mim”. Há pessoas
que acham que não têm nada maravilhoso demais para elas, não
é? Há pessoas que acham que são as melhores, que podem tudo e
que são capazes de tudo, têm uma opinião sobre tudo, sabem sobre

139
CAMINHOS DA FÉ

tudo, já leram sobre tudo, conhecem tudo, aquelas pessoas que


sempre têm que estar por cima. Davi, porém, diz: “Senhor, eu não
sou assim, eu não estou procurando coisas maravilhosas demais
para mim, eu estou satisfeito com as coisas normais do dia a dia,
eu não estou querendo que o Senhor faça nada extraordinário em
minha vida, eu me contento em viver a vida comum como pastor
de ovelhas — é o que ele era provavelmente quando escreveu
este salmo —; eu sou pastor de ovelhas, é assim que eu ganho
minha vida, é assim que eu sustento a minha família. Todos
estão dizendo que eu estou querendo ser rei, mas não é verdade.
Eu, rei? Senhor, isso é maravilhoso demais! Quem sou eu para
ocupar o trono de Israel?”. Porém, há pessoas que, ao contrário,
dizem, por exemplo, quando ouvem a notícia de que serão “rei de
Israel”: “Já era tempo, vocês já deveriam ter reconhecido que eu
sou o melhor”. Mas aquele que é verdadeiramente humilde não
procura essas coisas, e, quando ele é agraciado ou indicado para
uma posição de honra, ele até fica surpreso: “Como é que eu, que
não sou digno disso, fui alçado a essa posição?”.
Note ainda que é diante de Deus que Davi expressa a
humildade do seu coração. Perceba o quão sério é isso. Ele não
está falando diante dos homens; uma coisa é você chegar para
alguém dizendo que não é orgulhoso, não tem pretensões, e outra
é você se ajoelhar e, sinceramente, diante de Deus, dizer: “Senhor,
sonda o meu coração, ó Senhor, conhece as minhas intenções,
meu olhar não é altivo, meu olhar não é soberbo, eu não procuro
essas coisas grandes nem coisas maravilhosas demais para mim”.
E aqui passamos para o versículo 2, no qual Davi agora faz
o contrário. Primeiro, ele disse o que não estava em seu coração
(131.1), e agora ele descreve como é que ele sente o seu coração:
Pelo contrário, fiz calar e sossegar a minha alma (131.2). Não é
que ele não era tentado por essas coisas. O profeta Samuel o
havia ungido, dizendo que ele seria rei de Israel. É claro que Davi
pensou a respeito daquelas coisas, mas ele fez calar a sua alma,
sossegar o seu coração, como se dissesse: “Senhor, se o Senhor vai
me fazer rei de Israel, que seja no tempo do Senhor e no modo

140
SALMO 131 - COMO VENCER O ORGULHO DO CORAÇÃO

do Senhor; eu não vou levantar a mão contra o ungido do Senhor


que é Saul, mas vou esperar o tempo do Senhor”. Não faltaram
pessoas que dissessem: “Você tem a oportunidade agora, mata
Saul”.
Você se lembra do episódio em que Davi estava escondido
com seus homens bem lá no fundo da caverna de Adulão? Saul
entrou lá, despreocupado, e os homens de Davi lhe disseram: “É
agora, mata”, e Davi disse: “Meu coração não está à procura de
grandes coisas, irmãos, se Deus for me dar o reino, será da forma
dele, da maneira dele, no tempo dele. O meu olhar não é altivo,
eu não olho de cima para baixo para Saul, eu não quero acabar
com a vida dele, eu não sou digno de estar no trono de Israel, eu
já aquietei a minha alma”.
Que exercício extraordinário de humildade! Isso se
chama domínio próprio, que é fruto do Espírito (Gl 5.22-23). O
homem que domina o seu coração domina tudo. Davi aquietou
o seu coração diante de Deus, e usa uma figura, ainda no verso 2,
para descrever bem aquilo que ele estava sentindo: como a criança
desmamada se aquieta nos braços de sua mãe, como essa criança é a
minha alma para comigo (131.2). Essa é uma figura muito bonita,
da criança que estava inquieta, que mamou e agora está satisfeita
nos braços de sua mãe. Davi diz: “Da mesma forma que aquela
criança está ali nos braços de sua mãe, a minha alma está nos Teus
braços, ó Deus”. Essa figura expressa três pensamentos:
Primeiro: total dependência. Uma criança de peito
depende completamente de sua mãe, pois ela não se alimenta
sozinha. A primeira ideia que é transmitida aqui com essa figura,
assim, é de total dependência: como um bebê depende de sua mãe
para viver, Davi diz: “A minha alma também depende do Senhor,
e é isso que alimenta a minha alma, e não desejos e grandeza”.
Segundo: plena satisfação. Um bebê, depois que foi
alimentado, fica nos braços da mãe completamente satisfeito;
antes, ele estava chorando, mas agora está rindo, ou então
dormindo, tranquilo, porque está completamente satisfeito,
não está pensando mais em nada a não ser naquela sensação de
satisfação que está sentindo.
141
CAMINHOS DA FÉ

Terceiro: segurança. O bebê, nos braços de sua mãe,


se sente seguro, não se preocupa com nenhuma ameaça, não
está imaginando que coisa alguma possa atingi-lo, ele se sente
protegido. Era assim que Davi se sentia com relação a Deus,
protegido, satisfeito, seguro e totalmente dependente. Por isso,
a alma dele estava tranquila, por isso ele não estava procurando
coisas grandes demais para ele. Quando o crente está satisfeito
em Deus, ele não vive à procura dessas coisas, a alegria dele é
em Deus e nas coisas de Deus, ele busca em primeiro lugar o
Reino de Deus e a Sua justiça e sabe que as outras coisas serão
acrescentadas. Mas, quando invertemos isso, a alma se inquieta,
se agita, a pessoa vive em um constante estado de angústia e
de preocupação. Porém, quando ela encontra em Deus plena
satisfação, ela se aquieta como esse bebê, o coração não está
procurando coisas maravilhosas demais, o olhar não é altivo nem
o coração é orgulhoso, porque está satisfeito como um bebê nos
braços de sua mãe.
A satisfação plena em Deus é o remédio mais eficaz contra
a altivez, a soberba e o desprezo pelos outros. E é por isso que,
tendo aprendido essa lição, Davi vai um passo mais além. Agora,
conforme o verso 3, ele quer que aquele que vai ser o seu povo
experimente o mesmo: Espera, ó Israel, no Senhor, desde agora e
para sempre (131.3). Assim como a criança espera em sua mãe
por sustento, segurança e satisfação, Davi espera em Deus, que
seja Ele a razão da existência de Israel, que seja Ele a fonte de
satisfação plena, agora e para todo o sempre. Esperar transmite a
ideia de esperança: “Ponham a sua esperança no Senhor”. E essa
esperança, quando Davi diz isso, está baseada em duas coisas:
Primeira: em quem Deus é. Ele é o Deus da aliança, o
Deus de Israel e o Deus todo-poderoso, o Deus onisciente,
misericordioso e bom que nos conhece, nos sustenta e nos ama.
Eu só posso esperar em Deus porque eu sei quem Ele é, a minha
esperança está nele, porque eu sei quem Ele é, senão eu não teria
esperança, eu teria suspeita, dúvidas e questionamentos. Mas eu
sei quem é Deus, o meu criador, o meu redentor, que deu Seu filho

142
SALMO 131 - COMO VENCER O ORGULHO DO CORAÇÃO

para morrer pelos meus pecados, que derramou na cruz sangue


precioso para que eu pudesse me reconciliar com Ele. Esse é o
Deus do qual a Bíblia diz: “Põe a tua esperança nele, aguarda nele,
descansa nele. Espera, ó Israel, no Senhor, pelo que ele é e pelo
que ele prometeu”. Deus nos fez promessas maravilhosas, Ele nos
prometeu a vida eterna em Seu filho Jesus Cristo, prometeu-nos
a ressurreição, a imortalidade, prometeu que estaria conosco em
nossas aflições aqui neste mundo, que, mesmo que passemos por
dificuldades e contrariedades, ele está conosco a cada momento,
Ele prometeu que não nos deixaria ser provados e tentados mais
do que nós podemos suportar. Por isso, espere em Deus, aquiete
a sua alma, não busque coisas grandes demais nem seja altivo seu
olhar nem soberbo o seu coração, mas espere em Deus e descanse
nele para encontro da paz aqui neste mundo.
Os peregrinos deviam cantar isso quando estavam a
caminho de Jerusalém, pois é um Salmo de Romagem, e nós
também devemos cantá-lo à medida que caminhamos aqui neste
mundo e peregrinamos em direção à Jerusalém celestial.
Eu estava lendo a história de Viktor Frankl, que era
um neurologista e psiquiatra austríaco que viveu nos campos
de concentração nazista. Ele atravessou todo aquele período e
sobreviveu, afirmando que o fez porque tinha esperança de que
alguém o viria libertar. Ele não era cristão, mas tinha esperança
de que alguma coisa haveria de acontecer que quebraria o poder
dos nazistas. Em sua biografia, ele descreve como passou fome,
sede, frio, doenças e muito medo, mas sobreviveu porque tinha
esperança. Porém, ele narrou vários casos que encontrou de
prisioneiros que perderam a esperança, e, quando um prisioneiro
perdia a esperança, ele ficava somente deitado na cama, não
obedecia às ordens dos nazistas, não comia, não fazia as suas
necessidades no lugar certo, simplesmente ficava ali esperando
para morrer.
Viver sem esperança traz esse tipo de paralisia, inércia e
morte. A nossa esperança como cristãos não está nas coisas grandes
e maravilhosas, naquilo que nós podemos obter e conquistar com

143
CAMINHOS DA FÉ

o nosso mérito, mas a nossa esperança, que nos ajuda a viver neste
mundo, está no Senhor Deus de Israel, Criador dos céus e da
terra, nosso redentor. Portanto, eu quero convidar você a colocar
a sua esperança somente nele. Talvez você esteja aflito, agitado,
pensando em uma série de coisas, seu coração esteja turbado, mas
eu quero que você, no fundo do seu coração, ore este salmo e diga
ao Senhor: “Aquieta meu coração, satisfaz a minha alma como
uma criança, faz-me sentir a segurança que há nos Teus braços,
faz com que eu viva em paz aqui neste mundo, que eu confie em
Ti e nas Tuas promessas para que eu possa dar testemunho de
quem Tu és e que vale a pena servir ao Deus vivo, agora e para
todo o sempre. Amém”.

ORAÇÃO:

Ó Deus, que essa declaração de Davi seja a nossa. Que,


com confiança, nós possamos dizer que aquietamos nossa alma
e nosso coração e que estamos tranquilos e confiantes como um
bebê nos braços de sua mãe e que a nossa esperança está somente
no Senhor, agora e para todo o sempre.
Senhor, Tu és a nossa esperança. Em Ti somente
encontramos plena satisfação e descanso para as nossas almas
como Teu filho um dia nos disse: “Vinde a mim todos vós que
estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei”. Oro, Senhor,
pelo Teu povo, por aqueles que estão inquietos, desesperançados,
agitados na busca de coisas maravilhosas e grandes demais. Oro
por aqueles cujo olhar é soberbo e cujo coração é altivo. Eu peço,
Senhor, que a Tua palavra cure, instrua, abençoe, repreenda,
console e conforte, que Teu povo seja transformado depois de
ouvir a Tua voz, porque ela aquieta o coração e dá luz e instrução.
Fica com Teu povo sempre, ó Senhor. Amém.

144
SALMO 132

ABENÇOAREI A TUA GERAÇÃO

Lembra-te, Senhor, a favor de Davi, de


todas as suas provações; de como jurou ao
Senhor e fez votos ao Poderoso Jacó:
de
Não entrarei na tenda em que moro, nem
subirei ao leito em que repouso, não darei
sono aos meus olhos, nem repouso às minhas
pálpebras, até que eu encontre lugar para o
Senhor, morada para o Poderoso de Jacó.
Ouvimos dizer que a arca se achava em
Efrata e a encontramos no campo de Jaar.
Entremos na sua morada, adoremos ante
o estrado de seus pés. Levanta-te, Senhor,
entra no lugar do teu repouso, tu e a arca
de tua fortaleza. Vistam-se de justiça os
teus sacerdotes, e exultem os teus fiéis. Por
amor de Davi, teu servo, não desprezes o
rosto do teu ungido. O Senhor jurou a Davi
com firme juramento e dele não se apartará:
Um rebento da tua carne farei subir para o
teu trono. Se os teus filhos guardarem a
minha aliança e o testemunho que eu lhes
ensinar, também os seus filhos se assentarão
para sempre no teu trono. Pois oSenhor
escolheu a Sião, preferiu-a por sua morada:
CAMINHOS DA FÉ

Este é para sempre o lugar do meu repouso;


aqui habitarei, pois o preferi. Abençoarei
com abundância o seu mantimento e de pão
fartarei os seus pobres. Vestirei de salvação
os seus sacerdotes, e de júbilo exultarão os
seus fiéis. Ali, Davi;
farei brotar a força de
preparei uma lâmpada para o meu ungido.
Cobrirei de vexame os seus inimigos; mas
sobre ele florescerá a sua coroa.

Para algumas pessoas, o Antigo Testamento é complicado,


chato e difícil. Alguns crentes gostariam que só existisse o Novo
Testamento e, de preferência, só o Evangelho de João; do Antigo,
talvez se salvassem os salmos, mas não um salmo desse tamanho
e tão complexo.
A verdade é que o cristianismo, a nossa religião que
Deus nos deu, a única verdadeira, não surgiu “do nada”. Ela é
a continuação e o desenvolvimento da revelação que Deus fez
desde o início do mundo a pessoas especiais e em seguida a um
povo que Ele escolheu, que foi a nação de Israel. Nós não temos
como entender o cristianismo se não entendermos de onde nós
viemos e o que somos. Em um certo sentido, ser cristão é ser
um historiador, é gostar de história, é ser um arqueólogo, um
pesquisador, é procurar entender as nossas raízes. Há muitas
religiões que independem de história, especialmente as religiões
místicas, as religiões orientais, que não são baseadas em fatos
históricos, eventos salvadores e intervenções de deuses na natureza
e na história. Para eles, conceitos como história da salvação são
indiferentes. Muitas dessas religiões se concentram no aqui e no
agora e no relacionamento que a pessoa tem com a divindade,
mas cristianismo é mais do que isso. O cristianismo é uma
doutrina que tem enraizamento histórico, é um desenvolvimento
de promessas e fatos muito mais antigos do que nós, e, sem
compreendê-los, nós não saberemos o que é de fato a nossa fé.

146
SALMO 132 - ABENÇOAREI A TUA GERAÇÃO

Tudo isso fica solto no vácuo se você não for às origens, aos
tempos antigos, ao Antigo Testamento, aprender a respeito de
como tudo começou.
Este salmo é um exemplo disso. Ele condensa muitas das
principais doutrinas que são fundamentais para o cristianismo e
vem na forma de uma oração que foi feita por Salomão por ocasião
da inauguração do templo em Jerusalém. Essa oração expressa
aqueles pontos fundamentais a respeito da Igreja de Deus daquele
tempo e que se cumpriram através da história, até que chegassem
até nós. Então, eu vou iniciar este capítulo contando um pouco
da história, para que possamos entender este salmo.
Iniciarei com a história da arca da aliança: Deus apareceu
a um homem chamado Abraão e lhe fez uma promessa, de que,
dentre os filhos dele, viria um povo numeroso que Deus escolheria
para ser o Seu povo, povo único e exclusivo. Prometeu ainda que
de entre os seus filhos viria um que seria uma bênção para todas
as nações do mundo. Deus fez exatamente isso, chamou esse
homem, fez-lhe promessas, tirou-o de onde ele morava e ofereceu
a ele uma terra. Esse homem morou naquela terra muitos anos,
sem nunca ter tido título de propriedade. Os seus filhos foram
para o Egito para escapar da fome e lá se multiplicaram. Deus
mandou um homem chamado Moisés, que tirou os filhos de
Abraão do Egito, trouxe-os de volta para a terra prometida e fez
uma aliança com eles, dizendo: “Eu tirei o pai de vocês lá de onde
ele morava e fiz grandes promessas, e entre elas estava essa de que
vocês, os filhos de Abraão, seriam o meu povo. Nós vamos agora
celebrar esse casamento, essa aliança, eu sou o Deus de vocês, e
vocês são o meu povo”.
E Deus, então, estabeleceu algumas condições desse pacto:
“Primeiro: eu sou o único Deus que vocês vão adorar, porque
também não existe outro, eu sou o único Deus verdadeiro. Vocês
serão o meu povo exclusivo, eu não vou adotar outras pessoas,
outros povos, mas vocês serão o meu povo. A base do nosso
relacionamento vai ser a lei, que inclui os dez mandamentos.
Eles expressam o que eu gosto, e é isso que eu quero que vocês

147
CAMINHOS DA FÉ

façam. Se vocês me desobedecerem, oferecerão sacrifícios como


pagamento da culpa, eu estou separando uma tribo inteira dentre
vocês de sacerdotes, que vão sacrificar animais e oferecer ofertas
pelos pecados que vocês cometerem; então, toda vez que vocês
quebrarem essa lei, vocês vão ao sacerdotes, levam um animal,
que vai ser morto no lugar de vocês. Vocês é que deveriam morrer,
pois quebraram a minha lei, mas esse animal vai ser morto no
lugar de vocês. E, como vocês são um povo nômade, um povo
que está sempre andando, se deslocando, eu vou fazer uma arca,
uma caixa de madeira coberta de ouro, onde vou colocar os dez
mandamentos dentro, que é esse acordo que nós estamos fazendo.
E essa arca vai estar com vocês o tempo todo, aonde vocês forem
vocês vão levar essa arca, que é a arca da aliança. Dentro dela
estarão os dez mandamentos; no topo dela, vocês vão fazer dois
anjos de ouro batido, um virado para o outro, cujas asas se toquem
no meio. É ali que o sumo sacerdote, o principal dos sacerdotes,
uma vez por ano vai derramar sangue de um animal para perdão
de todos os pecados. Essa arca só poderá ser levada pelos levitas
e sacerdotes, ninguém mais poderá mexer nela. Vocês farão uma
tenda portátil e, quando vocês andarem, vão desarmar a tenda,
colocar nas costas dos levitas e vão andando. Quando eu disser
‘é aqui’, vocês param, armam a tenda, põem a arca lá dentro,
chamam o sacerdote e se inicia tudo de novo”.
Em resumo, Deus fez um pacto com a nação de Israel, e a
arca era o símbolo da presença dele.
Finalmente, o povo de Israel entrou na terra prometida,
como Deus havia dito, e tomou posse dela. Mas começou a
adorar outros deuses, esquecendo-se de Deus, e a arca se perdeu,
ninguém sabia onde ela estava. Na verdade, ninguém estava mais
preocupado com Deus, eles estavam adorando os deuses dos
assírios, dos egípcios, dos filisteus e dos fenícios. Esqueceram-se
de Deus, e a arca de Deus, o símbolo da presença dele, ninguém
sabia onde estava. Ela andava de um lado para o outro. Teve um
tempo em que ela ficou com os filisteus, que a conquistaram e
a levaram para dentro do templo do deus Dagon, o deus peixe,

148
SALMO 132 - ABENÇOAREI A TUA GERAÇÃO

dos filisteus. Há até um episódio interessante: quando trouxeram


a arca do Senhor e a colocaram no templo de Dagon, a imagem
de Dagon caiu em frente à arca de Deus. O povo ficou alarmado,
pensou: “Mas que coisa estranha, o deus Dagon se curvando diante
dessa arca”, então moveram Dagon de lugar, e no dia seguinte ele
caiu, quebrou os pés e as pernas. Os filisteus disseram: “Esse deus
dos judeus é maior do que o deus Dagon, nós temos que tirar ele
daqui”. Deus começou a castigar os filisteus com peste bubônica,
doenças em meio ao povo, e os filisteus acharam melhor devolver
a arca, porque o deus dela era poderoso demais, e deram um jeito
de mandá-la de volta aos israelitas.
Ela acabou parando na fazenda de alguém, em um campo
que ficava em Efrata, e ficou lá durante anos, esquecida, até que
Davi se tornou rei de Israel. Davi amava a Deus e queria que o
povo se voltasse a Ele. Davi perguntou onde estava a arca, símbolo
da presença de Deus, ao que lhe foi respondido. Então, ele fez
todo um cortejo, juntou gente, fez uma grande festa. Pegaram a
arca e a levaram para Jerusalém, para a colocarem no tabernáculo
do Monte Sião. Mas, no meio do caminho, começaram as
complicações. A arca foi caindo do carro, e um homem bem
intencionado chamado Uzá colocou a mão nela para segurá-la,
e foi fulminado, morrendo na hora. Davi disse: “Esse Deus é
terrível demais, é tremendo demais, como é que vou levar um
Deus desse lá para o meu palácio?”. Então deixou a arca em um
pedaço de terra que havia comprado de um judeu.
Depois que Davi aprendeu que quem deveria conduzir a
arca eram os levitas, e ninguém mais poderia tocar nela, organizou
uma procissão em que a arca ia na frente levada pelos levitas,
tudo conforme Deus havia mandado, oferecendo sacrifícios,
e levaram-na para o tabernáculo que Davi havia montado no
Monte Sião. Assim, a arca entrou lá e por lá ficou. Mas Davi não
estava satisfeito. Ele disse: “Mas não está certo isso, porque a arca
do Deus que eu amo está numa tenda e eu moro num palácio
de marfim, de ouro, de madeira preciosa, cheio de servos, e a
arca da aliança está lá num barraco. Isso não está certo, eu quero

149
CAMINHOS DA FÉ

construir um templo definitivo onde a arca vai ficar, o local do


seu repouso”. E Davi começou a se preparar para fazer isso. Deus,
então, mandou um profeta falar com Davi, dizendo: “Davi,
tenho duas notícias para você, uma ruim e uma boa, eu vou
começar com a ruim: você não vai fazer um templo para Deus,
porque você é homem de guerra, você matou muita gente, você
fez muitas guerras e não vai construir um templo para o Senhor.
A boa notícia é que o Senhor viu o teu desejo e a tua devoção, e
te fez um juramento: um filho teu vai construir esse templo. Mais
ainda, Davi, de ti virá aquele que vai se sentar no trono de Israel
e ele vai ser rei para todo o sempre. Tem uma condição: se vocês
cumprirem a lei do Senhor, Davi, não vai faltar um filho teu que
se sente no trono de Israel. Deus será pai para ele e ele será um
filho para Deus”.
Deus fez esse juramento a Davi, que concordou. Essa
segunda parte foi dita a Davi em uma visão. Ele, então, louva a
Deus e encarrega seu filho Salomão de construir o templo. Ele já
deixara preparado material, ouro, pedras preciosas, e Salomão,
então, quando Davi morre, assume o reino, construindo um
templo magnífico, coberto de ouro, de pedras preciosas, de
especiarias, exatamente como Moisés havia determinado que se
fizesse. E agora chegou a hora da inauguração. O salmo 132 fala
dessa inauguração, relata sobre o dia em que Salomão trouxe a
arca da aliança para dentro do templo, a oração que ele fez e o
que pediu.
O meu objetivo é expor essa oração de Salomão como
uma oração pela prosperidade do povo de Deus. É uma oração
em que se pede que Deus seja exaltado, oração que deveria ser
a expressão do nosso coração, do desejo da nossa alma. Que o
profundo do nosso ser seja consumido por esse desejo ardente de
ver a glória de Deus e a prosperidade do Seu povo.
Vamos iniciar com a oração em si. Neste capítulo, eu
farei de forma diferente dos outros: neles, eu começo no verso
primeiro e vou trabalhando até o final, mas agora começarei no
meio do salmo, onde há a oração que Salomão fez naquele dia

150
SALMO 132 - ABENÇOAREI A TUA GERAÇÃO

da inauguração. São os versos 8, 9 e 10: Levanta-te, Senhor, entra


no lugar do teu repouso, tu e a arca de tua fortaleza. Vistam-se de
justiça os teus sacerdotes, e exultem os teus fiéis. Por amor de Davi,
teu servo, não desprezes o rosto do teu ungido. Essa oração, você
vai encontrar repetida no segundo livro de Crônicas, onde temos
todos os detalhes do que estava acontecendo (2Cr 6.41-42).
A oração que Salomão está fazendo na hora em que os
sacerdotes vão trazer a arca para dentro do templo é: Levanta-te,
Senhor, como se Deus estivesse esperando aquele momento. Ele
pede quatro coisas: primeiro, entra no lugar do teu repouso, tu e
a arca de tua fortaleza. O templo que Salomão havia feito era o
lugar do repouso de Deus, porque Deus havia andado de lugar
em lugar — lembra que a arca representava a presença de Deus?
Aonde ela ia, o Senhor ia —, estava andando por Jerusalém,
parava na fazenda de um, na fazenda de outro, ninguém sabia
onde estava, porém agora ela teria um local definitivo. Por isso,
Salomão diz: entra no lugar do teu repouso. Não é que Deus precisa
de repouso, não é que habita em locais feitos por mãos humanas,
mas é a maneira de dizer que aquele local é o local onde as pessoas
iriam buscar a Deus, onde Ele ouviria as orações, onde Deus se
encontraria com Seu povo. Por isso ele pede que o Senhor entre
na casa que ele lhe preparou, a arca, que era o símbolo do Seu
poder.
A segunda oração está no verso 9: Vistam-se de justiça os
teus sacerdotes; que esses que vão ministrar ao Senhor, que vão
ministrar o louvor, a adoração, que vão ensinar a palavra de Deus
e que vão fazer os sacrifícios sejam vestidos não somente com
aquelas vestes especiais que a lei de Moisés mandava. Salomão ora
assim: “Senhor, que os Teus sacerdotes estejam vestidos de justiça,
que eles sejam pessoas justas e santas diante de Ti, para poder
ministrar ao Senhor o culto do qual o Senhor é digno”.
A terceira oração está no final do verso 9: e exultem os teus
fiéis; ou seja, que aqueles que estão aqui neste momento, que
te amam, que são fiéis a Ti, exultem, fiquem cheios de alegria
com a chegada do Senhor no templo, porque é isso que importa.

151
CAMINHOS DA FÉ

Se o Senhor não estiver no templo, os fiéis não vão exultar de


alegria. A razão do nosso gozo e prazer em irmos nos juntar com
os irmãos é exatamente o encontro com Deus. É isso que é culto,
ir encontrar Deus.
E a última oração, registrada no verso 10: Por amor de
Davi, teu servo, não desprezes o rosto do teu ungido. Por amor de
Davi, aquele a quem o Senhor fez o juramento e a promessa, “não
despreze o rei, o teu ungido” — o ungido aqui é o rei, que era
ungido por um profeta para ser rei de Israel. No caso, Salomão
está pedindo aqui por ele mesmo: “Não vires o rosto de mim, não
desprezes o meu rosto, não tires de mim a Tua graça, eu preciso
de Ti para governar esse povo, fica comigo”.
Resumindo, houve quatro pedidos:

- “Senhor, entra no templo”;


- “Sacerdotes, pratiquem e vivam a justiça”;
- “Povo de Deus, alegre-se com a presença dele no culto”;
- “Senhor, não desprezes o Teu ungido” — lembrando que
a palavra ungido, em hebraico, é messias, ou seja, “não desprezes o
Teu ungido, o Messias”.

Essa é a oração. Vejamos agora que ela se baseia em duas


coisas: na parte que vem antes e na parte que vem depois. Na parte
que vem antes, Salomão está apelando para um juramento que
Davi fez. Observe como ele começa o salmo: Lembra-te, Senhor, a
favor de Davi, de todas as suas provações; ele vai fazer a oração, mas
ele está preparando o caminho antes de orar, dizendo: “Senhor, eu
quero que o Senhor se lembre de Davi e de como ele sofreu, Davi
queria muito construir um templo para o Senhor. Uzá morreu,
Davi foi rejeitado, o Senhor não deixou Davi construir o templo,
mas ele te amava muito, Senhor”. Veja, no verso 2, como ele fez
um juramento ao Senhor: Não entrarei na tenda em que moro,
nem subirei ao leito em que repouso, não darei sono aos meus olhos,
nem repouso às minhas pálpebras, até que eu encontre lugar para o
Senhor, morada para o Poderoso de Jacó; Salomão está dizendo:

152
SALMO 132 - ABENÇOAREI A TUA GERAÇÃO

“Senhor, lembra do amor que Davi tinha por Ti a ponto de ele


ter feito este juramento?”. É claro que isso é em sentido figurado,
é uma hipérbole, mas é uma maneira clara de expressar esse forte
sentimento. Para Davi, era prioridade. A coisa mais importante
em sua vida era achar o lugar da habitação de Deus, o lugar da
arca, o local de culto a Deus, esse era o desejo do seu coração, era
o anseio dele, ele amava a Deus e queria isso para Deus, e fez um
juramento de que iria fazer isso.
Nós sabemos que Deus apareceu a Davi e disse: “Não vais
fazer isso, mas sim o teu filho”. Porém, o amor de Davi por Deus
é a base da oração de seu filho Salomão: “Senhor, lembra-te de
Davi, meu Pai, de como ele te amou, como ele foi fiel a Ti”.
Aqui percebemos a influência de um homem fiel sobre toda a
sua descendência. Eu ficaria muito grato e honrado — e talvez
eu nem vá ver esse dia, porque quem sabe esteja na glória —
se um dia um filho ou um neto meu orasse a Deus e pedisse:
“Deus, lembra-te de Augustus, de como ele te amou, como ele
quis te servir; eu não mereço nada, não tenho mérito nenhum,
mas lembra dele, lembra-te de toda a sua descendência, que quer
te servir”. Pais, vocês não estão deixando em vão um referencial
aos seus filhos. Queira Deus que um dia seus filhos possam dizer:
“Senhor, atenda minha oração, não por minha causa, mas por
causa dos meus pais, lembra-te dos meus pais, de como eles te
amavam, como oraram e pediram por mim”. Essa é a base da
oração de Salomão.
Depois de fazer essa oração, Salomão agora se lembra do
juramento de Deus a Davi. Na primeira parte, é o juramento de
Davi para Deus, agora Salomão se lembra do juramento de Deus
para Davi, quando Deus apareceu a Davi e disse: “Tu não vais
construir o templo, mas o teu filho vai”. Deus fez outras promessas
na ocasião. Do verso 11 ao 12, nós temos a recapitulação das
promessas: O Senhor jurou a Davi com firme juramento e dele não
se apartará: Um rebento da tua carne farei subir para o teu trono.
Se os teus filhos guardarem a minha aliança e o testemunho que eu
lhes ensinar, também os seus filhos se assentarão para sempre no teu

153
CAMINHOS DA FÉ

trono (2Sm 7.12-16). Está aqui o juramento que Deus fez a Davi
naquela ocasião: “Davi, um de vocês vai construir o templo, um
de teus filhos. Mas eu vou fazer mais do que isso, eu vou te dar
para sempre o reino de Israel, um filho teu sempre estará sentado
no reino de Israel, se andar de acordo com os meus caminhos”.
Deus tinha Jesus Cristo, o Messias, em mente aqui. Jesus
era filho de Davi e nasceria muito tempo depois. Salomão, depois
de tudo isso, cometeu erros, casou com mulheres que não eram
tementes a Deus, passou a adorar os deuses dessas mulheres,
desviou-se no fim da vida. O seu filho Roboão foi um insensato.
Quando assumiu o trono, dividiu o reino, ficando ele com o
reino do sul, que era o reino de Judá, e o reino do norte ficou com
capital em Samaria, com Jeroboão. A primeira coisa que Jeroboão
fez quando os reinos se separaram foi construir um templo em
Samaria e colocar ali dois bezerros de ouro, dizendo que esses eram
os deuses que tiraram Israel da terra do Egito. Assim, entraram
profundamente na idolatria e esqueceram-se de Deus. Depois de
Roboão, veio outro rei insensato, que quebrou a aliança com o
Senhor, até que finalmente Deus se cansou de tanta rebelião e os
expulsou da terra prometida. E foi durante a invasão babilônica e
o desterro que a arca se perdeu. Não sabemos mais onde ela está,
ela foi levada talvez para Babilônia, como se a presença e a glória
de Deus tivessem saído da nação de Israel. Mas, olhando para a
história posterior, vemos a fidelidade de Deus no cumprimento
daquelas promessas feitas a Davi, porque de Davi veio aquele que
se assentou finalmente no trono de Israel, Jesus de Nazaré, filho
de Davi. Ele morreu pelos nossos pecados, ressuscitou dos mortos
e sentou no trono do universo, à direita de Deus. Ele é chamado
na Bíblia constantemente de a raiz de Davi, o descendente de
Davi, aquele a quem foram feitas as promessas. Ao ressurgir dos
mortos e subir aos céus e se sentar à direita de Deus, Ele cumpriu
essas promessas.
Voltando ao nosso salmo, Deus diz em seguida que vai
escolher Sião como sendo o local da Sua habitação: Pois o Senhor
escolheu a Sião, preferiu-a por sua morada: Este é para sempre o

154
SALMO 132 - ABENÇOAREI A TUA GERAÇÃO

lugar do meu repouso; aqui habitarei, pois o preferi. Abençoarei com


abundância o seu mantimento e de pão fartarei os seus pobres. Vestirei
de salvação os seus sacerdotes, e de júbilo exultarão os seus fiéis. Ali,
farei brotar a força de Davi; preparei uma lâmpada para o meu
ungido. Cobrirei de vexame os seus inimigos; mas sobre ele florescerá
a sua coroa (132.13-18). Ou seja, tudo aquilo que Salomão pediu,
Deus está dizendo que vai fazer.
Olhemos para trás: essas promessas foram feitas há dois
mil e oitocentos anos. O cristianismo é o cumprimento de todas
essas promessas na pessoa de Jesus de Nazaré. Deus entrou em Seu
templo — Jesus Cristo é o templo de Deus. Veja o que o apóstolo
Paulo diz em Colossenses: Em Cristo habita corporalmente toda a
plenitude da divindade (Cl 2.9). O templo era uma figura de Jesus
Cristo, em quem Deus habitou completamente, e nós, unidos a
Cristo, somos agora habitação de Deus. Deus não habita em um
lugar físico, Ele habita naqueles que estão ligados a Jesus Cristo,
que é aquele que o templo representava. A arca era símbolo da
aliança entre Deus e o Seu povo. Nós não precisamos mais da
arca, ela até desapareceu, nem sabemos mais onde está. Porém,
ela é simbolizada na aliança que Deus tem com o Seu povo,
firmada em promessas maiores e selada no sangue de Jesus, e não
no sangue de animais que era derramado na tampa daquela arca
uma vez por ano.
Quanto aos sacerdotes, todo o povo de Deus agora
é sacerdote. Nós ministramos ao Senhor, nos aproximamos
diretamente dele, não mais oferecendo sacrifícios de animais,
mas com base no sacrifício completo de Cristo Jesus, por meio
de quem nós temos acesso direto a Deus. Quando nos reunimos
na igreja, nós só podemos fazer o que fazemos porque tudo que
foi dito neste salmo se cumpriu. Deus entrou em Seu templo,
Seus sacerdotes se revestiram de justiça, o povo se alegrou, a arca
entrou em Seu repouso, Deus escolheu Sião e prometeu abençoá-
la e, da descendência de Davi, veio aquele que se sentou não só
no trono de Israel, mas no trono do universo.

155
CAMINHOS DA FÉ

Você não pode ser cristão e ignorar que o cristianismo está


baseado em atos salvadores de Deus na História. O cristianismo
é uma fé histórica, que se baseia em fatos; se esses fatos não
existiram, a nossa fé é vã, nós estamos vivendo uma ilusão, e
seria melhor abandonarmos a fé se esses fatos não forem verdade.
E o fato mais importante de todos é a ressurreição do filho de
Davi. Eu quero terminar esta parte, antes de fazer a aplicação,
lendo o que disse o apóstolo Pedro no dia de Pentecostes —
Pedro está falando aos judeus de Jerusalém depois da morte e da
ressurreição de Cristo, depois que o Espírito Santo veio: Irmãos,
seja-me permitido dizer-vos claramente a respeito do patriarca Davi
que ele morreu e foi sepultado, e o seu túmulo permanece entre nós
até hoje. Sendo, pois, profeta e sabendo que Deus lhe havia jurado
que um dos seus descendentes se assentaria no seu trono (aqui, Pedro
está lembrando aquele juramento, Davi era profeta e sabia do
juramento que Deus fez de que um descendente haveria de se
sentar no trono para sempre). Prevendo isto, referiu-se à ressurreição
de Cristo [...] (At 2.29-31).
A ressurreição de Cristo é o cumprimento daquela
promessa que Deus fez a Davi: “um descendente teu vai se sentar no
trono de Israel para todo o sempre”. Jesus reina, mas não somente
sentado no trono de Israel, porém no trono do universo. É isso
que é o cristianismo, é a conscientização de que Deus cumpriu
as Suas promessas, é o cumprimento, o desenvolvimento e o
desabrochar de toda essa história, tendo como clímax a vinda de
Jesus Cristo ao mundo. E o que nos compete hoje como cristãos,
como pessoas que creem nessa história, pessoas que creem nesses
fatos? O salmo já nos indica: primeiro, nós nos reunimos para
adorar esse Deus, para dizer a Ele: “Tu és fiel, Tu cumpriste todas
as Tuas promessas”; segundo: este salmo nos ensina a orar pela
prosperidade da Igreja, do povo de Deus, assim como Salomão
estava orando: “Senhor, vem habitar entre nós, faz o Teu povo
se alegrar”. Salomão amava a Deus e queria o bem da Igreja do
Senhor, e nós nos reunimos para isso. Somos parte desse povo
e oramos e pedimos que Deus cumpra todas as Suas promessas
entre nós.
156
SALMO 132 - ABENÇOAREI A TUA GERAÇÃO

Há também uma terceira aplicação que nós percebemos


aqui: não fosse o descendente de Davi, Jesus Cristo, ter realizado
o sacrifício completo e perfeito, nenhum de nós poderia chegar
à presença de Deus para adorá-lo, porque a promessa era
condicional: “Se os teus filhos andarem nos meus mandamentos,
eu cumprirei todas as promessas”. Um deles cumpriu, Jesus
de Nazaré. Ele cumpriu exatamente a lei, aquela lei que estava
dentro da arca, Ele guardou toda ela, não quebrou um único
mandamento. Portanto, a promessa agora é segura e nós podemos
nos chegar a Deus hoje e adorá-lo e servi-lo de todo o coração.
Como está o seu coração? Eu quero que hoje você desperte
para algumas coisas. Primeiro, que você diga em seu coração:
“Eu quero conhecer esse Deus, eu quero conhecer essa redenção,
quero amar esse Deus e viver de todo coração para ele, não quero
ser um crente de fim de semana, mas quero viver a minha vida
a cada momento da semana como um discípulo de Jesus Cristo,
crente no Criador de todas as coisas”. Eu quero que você veja
também a importância de estudar e conhecer a Escritura, gastar
tempo lendo o Antigo Testamento e vendo as promessas. As
histórias não estão aqui em vão, esse livro nos foi dado para isso,
para que conheçamos a Deus e conheçamos quem somos, o que
estamos fazendo aqui e para onde vamos. Em outras palavras, essa
mensagem é um chamado para que saiamos da superficialidade,
do meio compromisso, da mornidão, e digamos: “Eu quero ser
um cristão de verdade, consciente da minha herança, que sei das
minhas origens, sei de onde vim e para onde vou”. Um salmo
como esse nos convoca a isso.
E, finalmente, é um salmo que nos chama à oração,
ensinando-nos a orar. O salmista ora, mas ele ora baseado em
duas coisas: primeiro, que Deus se lembre da piedade e fidelidade
dos que vieram antes de nós e que, por amor a nossos pais
espirituais, nos abençoe. Segundo, que Ele se lembre de todas
as Suas promessas para conosco. A oração nada mais é do que
lembrar a Deus a história: “O Senhor já fez isso antes, faz de
novo, e as promessas que o Senhor prometeu estão aqui na Bíblia,
cumpre a Tua palavra, porque Tu és fiel”.
157
CAMINHOS DA FÉ

ORAÇÃO:

Ó Deus Todo-Poderoso, graças te damos por Tua fidelidade.


Graças te damos porque cumpriste tudo que prometeste ao Teu
servo Davi. Louvamos o Teu nome por Jesus Cristo, em quem
todas as Tuas promessas se realizam. Concede que sejamos servos
fiéis aqui neste mundo, enquanto aguardamos o retorno de Teu
Filho para estabelecer o Reino eterno. Amém.

158
SALMO 133

QUANDO OS IRMÃOS VIVEM UNIDOS

Oh! Como é bom e agradável viverem unidos


os irmãos! É como o óleo precioso sobre a
cabeça, o qual desce para a barba, a barba
de Arão, e desce para a gola de suas vestes.
É como o orvalho do Hermom, que desce
sobre os montes de Sião. Ali, ordena o
Senhor a sua bênção e a vida para sempre.

Este é mais um dos Salmos de Romagem atribuídos ao


rei Davi. Aqui ele fala a respeito da união do povo de Deus, da
unidade e da harmonia que deveria haver entre o povo de Deus.
Quão bom e quão agradável é viverem unidos os irmãos! Tudo
indica que este salmo foi composto depois que Davi assumiu
o governo de todo Israel. Temos que voltar um pouquinho na
história para entender o que está acontecendo aqui.
Depois que o povo de Israel entrou na terra prometida,
debaixo da liderança de Josué, a terra foi dividida entre as doze
tribos. Essas doze tribos tinham juízes que governavam sobre uma
parte de Israel, outros juízes sobre outra parte de Israel, e havia
muita confusão, muita contenda e muita controvérsia. Nessa
época, apareceram juízes que governavam sobre todas as tribos,
como Sansão, Jefté e finalmente o próprio Samuel, que também
era profeta. A lei que havia naquela época era que cada um fazia
CAMINHOS DA FÉ

o que bem achava diante dos seus olhos. Não havia um local
certo de adorar a Deus, as tribos tinham seus santuários; havia
santuários mais ao norte e santuários mais ao sul. A confusão era
generalizada. Finalmente, depois que os filhos de Samuel, que
iriam se tornar juízes, se corromperam, os israelitas cansaram e
disseram que queriam um rei, e Deus lhes deu o rei Saul, que foi o
primeiro dos reis de Israel, e, debaixo dele, as tribos se ajuntaram.
Porém, Saul não foi um bom rei, e conflitos internos
começaram a acontecer. Com a morte de Saul, houve guerra civil
entre as tribos, e a tribo de Judá escolheu Davi para ser o seu
rei. As outras onze tribos não aceitaram Davi e elegeram Isboset,
que era descendente de Saul. Aí começou a guerra civil na nação
de Israel. O reino de Judá, comandado por Davi, lutava contra
as onze tribos comandadas por Isboset. Depois de um conflito
sangrento que durou muitos anos, finalmente a tribo de Judá
venceu, e Davi foi, então, coroado rei de todo Israel. A guerra
cessou, a paz foi estabelecida. Jerusalém foi reconhecida como o
lugar que Deus havia escolhido para seu adorado. Não era mais
possível ter outro templo, outro local de adoração, mas somente
lá em Jerusalém. E o povo se viu debaixo do domínio do rei
Davi, que foi um bom rei. Durante o seu período, quando as
doze tribos estavam unificadas debaixo da sua liderança, a nação
de Israel prosperou em todos os sentidos, aumentou o território,
conquistou inimigos, teve prosperidade financeira e espiritual, o
culto a Deus se estabeleceu. Davi fez mudanças no templo, criou
o sistema de levitas e de corais e passou o reino unificado para
o seu filho Salomão. Então essa é a ocasião em que este salmo
foi escrito, para comemorar aquela unidade que finalmente havia
chegado à nação de Israel.
Agora, partiremos para a exposição detalhada do salmo
e veremos que lições ele traz para nós hoje, terminando com
algumas aplicações.
No verso primeiro, Davi expressa a sua alegria com a
unidade do povo de Deus: Oh! Como é bom e agradável viverem
unidos os irmãos! (133.1). Os irmãos aqui são os irmãos judeus,

160
SALMO 133 - QUANDO OS IRMÃOS VIVEM UNIDOS

os judeus de todas as tribos que estavam agora unificados viviam


em união. Eles tinham agora um único rei, que dava identidade e
unidade à nação. Não havia mais guerra civil, eles poderiam viver
em paz. Um israelita da tribo de Manassés poderia conviver em
paz com o israelita da tribo de Zebulom, a tribo de Gade poderia
viver em paz com a tribo de Benjamim. Eles poderiam viajar no
território das outras tribos, não havia barreira na fronteira, era
zona livre. Era um momento de grande prosperidade e alegria.
Porém, o salmo está falando especialmente daquela união
espiritual que agora havia entre as doze tribos. Eles estavam
unidos para adorar o mesmo Deus, e não mais deuses como
Baal ou Astarote, os baalins e aqueles outros deuses pagãos que
comumente eram adorados durante o tempo dos juízes. Mas
agora Deus, e somente Ele, era o Deus de Israel, e o Seu culto
era celebrado somente em Jerusalém, onde estava o tabernáculo,
a arca da aliança, a lei de Deus, os sacrifícios e os sacerdotes.
Por isso Davi diz: “Como é bom e agradável viverem unidos os
irmãos”. Que coisa boa quando há paz, quando há tranquilidade,
prosperidade e alegria, essa convivência pacífica que havia debaixo
do rei Davi e pela providência de Deus.
Davi se refere a essa união, em segundo lugar, como sendo
boa e agradável. Não é preciso explicar muita coisa sobre isso. O
que é bom e agradável é algo que nos dá prazer e enlevo. Faltam
adjetivos para poder descrever o que a união de fato representa,
por isso é que Davi escolheu duas figuras para explicar essa união
e por que ela é boa e agradável. A primeira é o óleo que era
derramado na cabeça do sacerdote. Ele diz, no verso primeiro:
Como é bom e agradável viverem unidos os irmãos! Aí, faz uma
comparação no verso 2: É como o óleo precioso sobre a cabeça, o
qual desce para a barba, a barba de Arão, e desce para a gola de suas
vestes. Esse óleo era confeccionado de acordo com uma receita
que Deus tinha dado a Moisés. Ninguém mais podia fazer esse
óleo a não ser os sacerdotes. Ele era composto do azeite mais
fino de oliva e quatro especiarias extremamente caras e raras. O
resultado era um óleo especial muito perfumado. Quando ele

161
CAMINHOS DA FÉ

era derramado, o cheiro se alastrava pelo tabernáculo e todos


podiam sentir o aroma daquele óleo, particularmente porque
ele era derramado em abundância. Era derramado na cabeça e
ia descendo pelo rosto de Arão, passava pela barba e descia pelas
vestes. A orla à que Davi se refere aqui, sempre pensamos que é a
gola, mas é o pé da túnica, é a orla inferior. O óleo passava pela
roupa toda e chegava até lá embaixo. Davi diz que a união era
semelhante a esse óleo.
Outro detalhe é que esse óleo era usado somente na unção
do sacerdote. Quando um sacerdote era escolhido para ministrar
diante de Deus, ele era ungido com esse óleo, que era derramado
de maneira abundante sobre a sua cabeça em uma cerimônia
pública. Ao fazer essa comparação, Davi pode ter tido algumas
ideias em mente. Por exemplo, a união é preciosa como aquele
óleo raro e caro. Assim, a união no meio do povo de Deus é
algo também precioso e às vezes raro e caro para nós. Talvez não
seja uma coisa tão comum, por isso ela devesse ser valorizada e
buscada como aquele óleo tão precioso. Talvez Davi também
tenha pensado na fragrância. Aquele era um óleo extremamente
perfumado, que agradava. É gostoso quando cheiramos um bom
perfume, nos dá prazer. A união do povo de Deus é como esse
perfume que agrada e enleva.
Entretanto, eu penso que talvez Davi tinha em mente
particularmente outro ponto que faz mais sentido quando olhamos
o contexto: o óleo começava a ser derramado na cabeça e passava
por todo o corpo do sacerdote, indo até o final de suas vestes,
ou seja, o óleo percorria Arão todo, expressando unidade. Da
mesma forma que aquele óleo passava por Arão completamente,
unindo todas as peças de seu vestuário, a união trazia todas as
tribos juntas. Penso que esse é o ponto de comparação: o óleo que
escorria passava pela cabeça, pela barba, pelos ombros, pelo peito,
ia descendo pelas pernas, até chegar lá embaixo, à orla das vestes
e às sandálias. Ou seja, Arão, que era o representante de Deus
diante do povo e do povo diante de Deus, era coberto da cabeça
aos pés pelo mesmo óleo. O óleo que era derramado na cabeça era

162
SALMO 133 - QUANDO OS IRMÃOS VIVEM UNIDOS

o mesmo óleo que chegava lá nos pés, e isso expressava a união


do povo de Deus. É nesse sentido que o óleo se encaixa aqui. Eu
sei que a primeira reação nossa é pensar que Davi está pensando
no óleo porque é precioso e cheiroso, mas a ideia de ele escorrer
completamente, cobrindo o sacerdote todo, expressa a ideia de
união, de unidade e coesão. Assim era o povo de Deus, unido
como aquele óleo que passava pelo corpo inteiro do sacerdote,
que era representante do povo diante de Deus.
Contudo, ele tem uma segunda comparação aqui, que
está no verso 3, quando ele diz que essa união do povo de Deus
é como o orvalho do Hermom, que desce sobre os montes de Sião. O
Hermom é o monte mais alto no norte de Jerusalém, o seu pico
permanece coberto de neve a maior parte do ano. Ele fica hoje
onde é a Síria e pode ser visto a quilômetros de distância. É uma
montanha imponente, a mais alta daquela região. E ali, no pé do
Hermom, havia uma terra alagada, o sol batia e a água evaporava,
formando um orvalho, uma névoa grossa que caía sobre o Monte
Hermom.
Agora, nós perguntamos: e Sião? Porque ele diz que é como
o orvalho do Hermom, que desce sobre os montes de Sião. O problema
é que Sião está a quilômetros de distância, Hermom está no norte
e Sião está no sul. Como o orvalho de Hermom cai nos montes
de Sião? Novamente, é a mesma figura do sacerdote, a ideia aqui
do orvalho não é tanto de algo frutífero, refrescante, assim como
o orvalho fecunda a terra, mas é que o mesmo orvalho que caía lá
no Monte Hermom, no norte, era trazido pelo vento e caía sobre
os montes de Sião, unindo as duas montanhas. Mais uma vez há
ideia de unidade. As duas figuras que Davi usa aqui — a união
do povo de Deus é como óleo que corre pelo sacerdote e é como
o orvalho que fecunda dois montes distantes — trazem a ideia
de unidade, e o israelita entenderia isso perfeitamente. Ele estava
familiarizado com os ritos sacerdotais, ele sabia como o sacerdote
era ungido, e também estava familiarizado com a geografia da
Palestina. Ele entenderia perfeitamente o que é que Davi estava
querendo dizer.

163
CAMINHOS DA FÉ

As duas figuras apontam para Deus como sendo aquele


que concede a união tanto no óleo quanto no orvalho. Há a ideia
de algo que é derramado em cima e que escorre, unindo por onde
passa. E a união é essa bênção que vem de Deus, vem de cima
e escorre sobre nós e nos une debaixo de um cabeça que é Jesus
Cristo. As duas figuras escolhidas pelo rei Davi são muito bonitas
e muito apropriadas.
O resultado dessa união está no final do verso 3, quando
Davi diz: Ali (nos montes de Sião), ordena o Senhor a sua bênção e
a vida para sempre. Sião era o local do santuário, para ali subiam
as tribos de Israel unificadas, era o símbolo da união espiritual
do povo de Deus, e era ali que Deus ordenava a Sua bênção. Ali,
quando o povo estava reunido, quando o povo, em consenso,
buscava a Deus com um só coração, uma só alma e um só desejo.
O sentido é esse, que Deus abençoa o Seu povo ali, quando
este está unido para servi-lo. A união é a base da bênção; se não
há união, se não há comunhão, se não há unidade, Deus não
ordena a bênção e a vida para sempre, porque, onde há discórdia,
descontentamento, dissenção, divisão, inimizade, intrigas e
separação, o Espírito Santo de Deus é entristecido, o óleo não
corre e o orvalho não desce. Mas, ali onde o povo de Deus está
unido, Ele ordena a Sua bênção e a vida para sempre.
Que o ali seja aqui e que Deus derrame sobre nós o óleo
precioso e o orvalho do Hermom, a Sua bênção e a vida sobre o
povo de Deus unido debaixo de um só cabeça, Jesus Cristo. Isto
me leva para o próximo ponto: o que este salmo significa para nós
hoje? Vamos ver mais um pouquinho de história.
Durante o reinado de Salomão, os irmãos viveram em
união, as tribos estavam unidas e, como eu disse, Israel prosperou
e cresceu em todos os sentidos. Mas, depois que Salomão
morreu e seu filho Roboão assumiu o trono, o reino se dividiu
novamente, os filhos de Salomão brigaram entre si e o reino do
norte se separou com a maioria das tribos e estabeleceu um novo
santuário em uma nova capital na cidade de Samaria, rapidamente
entrando em declínio, pois agora não havia mais Davi para

164
SALMO 133 - QUANDO OS IRMÃOS VIVEM UNIDOS

guiá-los, com sua mão forte, sábia e espiritual. Eles adoraram


outros deuses, construíram dois bezerros de ouro, colocaram-nos
em um santuário na cidade de Samaria e disseram: “Eis aqui,
Israel, os deuses que te tiraram da terra do Egito”; e o povo todo
abandonou a Deus e começou a seguir os bezerros de Samaria.
Assim, começou a guerra do reino do norte com o reino do sul.
O reino do sul ficou com os descendentes de Davi, que
continuaram com Jerusalém como capital. A idolatria começou
a voltar, embora de vez em quando havia um filho de Davi que
se sentava no trono e que promovia uma limpeza, uma reforma e
um avivamento, e o povo voltava para Deus; mas, quando aquele
rei morria, voltava a idolatria toda. Finalmente Deus mandou o
juízo sobre o reino do norte, que foi levado cativo pelos assírios
que invadiram toda aquela região, mataram os judeus e os levaram
para fora da terra. O reino de Judá ainda demorou um pouco
para ser atingido. Por amor a Davi, Deus ainda segurou um
pouquinho o reino do sul, mas finalmente os babilônicos vieram
e levaram embora os judeus como cativos para a Babilônia.
Ali, Deus havia ordenado a Sua bênção e a vida para
sempre. Mas, não havendo mais união, não havendo mais
unidade, veio guerra, perda, tristeza e morte. Como a história de
Israel tão claramente nos ensina, foi nessa época que os profetas
como Isaías, Jeremias, Ezequiel e Oseias começaram a falar do
reino do Messias, que o Messias haveria de vir para a nação de
Israel e que Ele haveria de unificar outra vez as doze tribos, que
outra vez o reino do norte e o reino do sul seriam um povo só.
Os profetas disseram que o Messias seria um dos descendentes de
Davi que se assentaria em seu trono. Os profetas todos começaram
a falar da esperança messiânica que era a vinda do filho de Davi,
que haveria de reunir os judeus debaixo do mesmo rei, que era o
Senhor Jesus. Era disso que os profetas estavam falando.
O filho de Davi já veio, é Jesus Cristo, filho das promessas,
que morreu na cruz pelo Seu povo, por aqueles que são Seus, e
ressuscitou ao terceiro dia, subiu aos céus e se assentou no trono
de Davi, à direita de Deus, no trono do universo, e reina. E o

165
CAMINHOS DA FÉ

povo do filho de Davi ressurreto e vivo, Jesus Cristo, é um povo


que é composto agora não somente dos judeus, os que creram
nele e creem nele também, mas de todos aqueles que, de todas as
nações, confessam que Jesus Cristo é o filho de Deus, o Senhor e
Salvador. Nós estamos ligados a Jesus Cristo pelo Espírito Santo
e, portanto, ligados entre nós pelo mesmo espírito em Cristo.
Deus cumpriu essa promessa, Ele tem um povo que está unido
entre si de forma inquebrantável, unido ao filho de Davi, um
povo único que adora o único e verdadeiro Deus.
Você já percebeu como é que Tiago começa a carta dele?
Ele inicia falando das doze tribos que se encontram na dispersão
(Tg 1.1-2). Tiago não está escrevendo para as doze tribos de Israel
literalmente, ele está se referindo à Igreja de Cristo. A Igreja é as
doze tribos reunidas. O filho de Davi reina, Ele tem um povo e
nós estamos unidos debaixo dele, somos irmãos, estamos ligados
uns aos outros, porque há uma só fé, um só Deus, um só salvador
e um só Espírito que habita em nós. Por isso nós podemos hoje
dizer quão bom e quão agradável é que os irmãos vivam em união.
Há algumas aplicações que eu quero fazer aqui,
terminando este capítulo. Primeiro, eu me dirijo àquelas pessoas
que se sentem solitárias aqui neste mundo, talvez sem parentes ou
longe da família, não casaram, não tiveram filhos. Eu queria que
vocês olhassem para o povo de Deus como sendo o seu povo, a
sua família, os seus irmãos. É isso que a Igreja representa, ela é a
expressão desse povo único de Deus. Uma das experiências mais
agradáveis nas oportunidades em que a minha esposa e eu temos
tido de viajar pelo mundo é que, aonde chegamos e encontramos
crentes em Cristo Jesus, nos sentimos em casa; aonde quer que
tenhamos viajado, encontramos irmãos, e é como se fosse família,
é como se nós nos conhecêssemos há muito tempo. E eu quero
que você olhe a Igreja dessa maneira. Procure oportunidades
de comunhão, procure estar com os irmãos, procure conhecer
aqueles que fazem parte desse mesmo corpo e que têm a mesma
fé, desfrutar da amizade deles, participar da comunhão com eles,
e juntos adorar e servir o mesmo Deus.

166
SALMO 133 - QUANDO OS IRMÃOS VIVEM UNIDOS

A segunda palavra é para aqueles que vão à igreja apenas


para escutar um sermão. A igreja é muito mais do que isso. O que
nós fazemos aos domingos é apenas uma das muitas atividades
e engajamentos que expressam a nossa união e nossa união
com Jesus Cristo. A igreja é muito mais do que isso que nós
experimentamos nos cultos dominicais. Por isso eu quero que
você olhe para a igreja como sendo a sua família, o seu povo, com
o qual você deveria se envolver mais e onde você deveria buscar
respostas, ajuda, comunhão, alegria, fraternidade e amizade. As
oportunidades são muitas e elas estão aí.
A terceira aplicação é para aqueles que são céticos e
desconfiados da Igreja por conta das suas muitas divisões e
denominações. “Pastor, o que o Senhor está falando é muito
bonito, mas e os batistas, metodistas, pentecostais? Como
explicar isso aí diante da união?” Eu quero que você olhe para
essas divisões e diferenças que existem entre o povo de Deus
como sendo aquelas doze tribos. Cada uma delas tinha os seus
costumes, o seu modo de falar, mas todos eram judeus, apenas
moravam em locais diferentes. Deus tem somente uma igreja,
que é composta de todos aqueles que professam a fé em Cristo
Jesus como Senhor e Salvador, e todo aquele que professa a Jesus
como único Senhor e Salvador é meu irmão. Agora, nós, que
cremos nisso, nos dividimos, há a tribo dos presbiterianos, a tribo
dos batistas, dos metodistas, dos irmãos pentecostais, uns são
mais eufóricos no culto, outros são mais calados na maneira de
adorar, uns têm uma forma em que organizam a igreja no sistema
eclesiástico, outros já têm outra forma. Mas é um povo só, se crê
no Senhor Jesus como Senhor e Salvador, se recebe a Escritura
como palavra infalível e inerrante de Deus. Nós temos as nossas
diferenças culturais e regionais; mas, como povo de Deus, somos
um só.
Agora, na hora em que o israelita começava a adorar Baal,
aí já não era mais irmão dos demais judeus. Há diferenças que são
fatais para a comunhão. Um grupo de irmãos que vai negar, por
exemplo, a divindade de Jesus Cristo, a autoridade da Escritura e

167
CAMINHOS DA FÉ

que Cristo morreu pelos nossos pecados, não faz parte do nosso
povo. Aqui não é apenas uma questão de divisão e denominação,
aqui já é outra religião. Mas, entre aqueles que creem no Senhor
Jesus como Senhor e Salvador, há diferenças que não são fatais ou
cruciais para quebrar a nossa união e a nossa unidade.
Jesus Cristo tem um povo, e esse povo vive debaixo dele,
unido a Ele pelo Espírito Santo e entre nós pelo mesmo Espírito.
Um dia, as doze tribos espirituais deixarão de existir e Deus terá
um povo, e um povo somente na vinda do Senhor Jesus. Quando
Ele vier buscar a Sua igreja, todas essas diferenças serão desfeitas.
E então, vendo como somos vistos e entendendo como somos
entendidos, participaremos dessa plena união e unidade da qual a
vida da Igreja é apenas um pálido reflexo aqui neste mundo.
Eu termino com um apelo para todos nós, para que,
no vínculo da paz e no poder do Espírito Santo, mantenhamos
essa união e essa unidade visível entre nós como testemunho da
unidade do povo de Deus, porque é ali que o Senhor determina a
sua bênção e a vida para sempre. Como é bom e agradável viverem
unidos os irmãos! É como óleo precioso sobre a cabeça que desce
pelo corpo, é como o orvalho do Hermom, que desce também
no sul, nos montes de Sião, unindo tudo, porque ali onde há
unidade ordena o Senhor a Sua bênção e a vida para sempre.

ORAÇÃO:

Senhor, concede-nos a alegria de viver essa unidade, essa


união com todo o nosso coração. Concede, Senhor, que aquilo
que impede essa união, as desavenças, as diferenças, as discórdias
e as contendas, seja removido, que haja perdão, reconciliação,
humildade e compreensão. Oro que haja união nas famílias, nos
relacionamentos entre os amigos, na Tua Igreja em geral, no Teu
povo. Amém.

168
SALMO 134

ABENÇOANDO E SENDO ABENÇOADO

Bendizei ao Senhor, vós todos, servos do


Senhor, que assistis na Casa do Senhor,
nas horas da noite; erguei as mãos para o
santuário e bendizei ao Senhor. De Sião
te abençoe o Senhor, criador do céu e da
terra!

Este capítulo apresenta o último salmo que compõe


a série dos Salmos de Romagem. O salmo que fecha esta série
fala a respeito de bênçãos, de como bendizemos a Deus e como
Ele também nos bendiz. Lembrando que os salmos iniciam em
Quedar — salmo 120, no qual o peregrino diz: “Ai de mim,
que moro em Quedar” — e terminam aqui em Sião, quando o
peregrino chega a Jerusalém, onde a bênção está.
A situação provável para a escrita deste pequeno salmo é
a seguinte: a caravana de peregrinos chega a Jerusalém e se dirige
ao templo, que era o local da adoração a Deus, e ali convoca os
sacerdotes e levitas a bendizer a Deus e a orar por eles, e isso já no
finzinho do dia, no turno da tarde, iniciando-se já o turno que
levava ao dia seguinte. Os sacerdotes, então, se voltam e abençoam
o povo com a bênção sacerdotal que era exclusiva deles.
Se olharmos dessa maneira, o salmo fica claro. Ele tem
duas partes: a primeira, nos versos 1 e 2, em que o peregrino
CAMINHOS DA FÉ

exorta os levitas e sacerdotes a bendizerem a Deus e a interceder


por eles; e a segunda parte, que é só o verso 3, são os sacerdotes
que se voltam para o povo, dizendo que o Senhor os abençoe de
Sião. É, portanto, uma antífona, ou seja, um salmo de fala e refala,
os peregrinos falam e os sacerdotes respondem — os peregrinos
falam nos versos 1 e 2 e os sacerdotes respondem no verso 3.
Vamos ver, então, os detalhes do salmo e depois verificar de
que maneira ele pode ser usado por nós nos dias de hoje, quando
não temos templo, não vamos a Jerusalém e muito menos temos
sacerdotes. Assim, de que maneira este salmo pode ser aplicado
a nós?
Vamos começar com a exortação dos peregrinos aos
sacerdotes e levitas para que bendigam a Deus: Bendizei ao
Senhor, vós todos, servos do Senhor, que assistis na Casa do Senhor,
nas horas da noite; erguei as mãos para o santuário e bendizei ao
Senhor (134.1-2). Embora nossa tradução Almeida não diga, no
hebraico esta passagem começa com uma expressão que poderia
ser traduzida como Atenção ou Eis aqui, chamando atenção
dos sacerdotes. É um salmo que começa com essa expressão de
chamado e de atenção para os que estão servindo a Deus no
templo de Jerusalém.
Eles são chamados aqui no verso primeiro de servos do
Senhor. Todo o povo de Israel, todo israelita verdadeiro, era servo
de Deus, mas os sacerdotes e levitas eram chamados de servos de
Deus porque se dedicavam exclusivamente ao serviço de Deus,
no templo. Eles assistiam na casa do Senhor. A assistência que
eles prestavam a Deus na casa do Senhor, que era o templo de
Jerusalém, incluía oferecer os sacrifícios, que não eram poucos.
Temos de pensar no templo de Jerusalém quase como um
açougue gigantesco, onde animais eram mortos um atrás do outro
no grande altar que ficava no centro e na entrada do santo dos
santos. É por isso que havia uma tribo inteira que era dedicada ao
serviço do templo, porque ali se faziam esses sacrifícios de manhã,
à tarde e à noite. A assistência que o sacerdote e levitas faziam
incluía primeiro essa oferta dos sacrifícios. O povo trazia muitas

170
SALMO 134 - ABENÇOANDO E SENDO ABENÇOADO

ofertas para Deus, trazia os dízimos, os grãos, farinha, dinheiro


em espécie, e os sacerdotes e letivas tinham que tomar aquelas
ofertas, apresentá-las diante de Deus e armazená-las nos diversos
compartimentos que havia no templo.
E era momento também, algumas vezes, durante o dia,
especialmente na hora dos sacrifícios da manhã, da tarde e da
noite, de os sacerdotes instruírem o povo na palavra de Deus,
lendo a lei de Moisés e dando a explicação. Eles oravam pelo
povo e o abençoavam. Era essa a rotina que se fazia no templo
o dia todo. Era um local muito movimentado, com muita
gente chegando, especialmente durante as três festas da Páscoa,
Tabernáculo e Pentecostes, quando os israelitas vinham de todas
as partes para adorar a Deus.
No caso, nota-se aqui que essa caravana parece ter chegado
ao fim do dia, e exorta os servos do Senhor que assistem em Sua
casa a bendizer a Deus nas horas da noite. Lembre-se de que o dia
terminava às seis horas e a noite começava em seguida. Para os
judeus, o dia começava com a noite. Esse grupo de peregrinos deve
ter chegado ao templo de viagem já no fim do dia, de tardezinha,
quando a turma de sacerdotes da noite estava chegando.
Eles iriam assistir na casa do Senhor durante as horas
da noite. O que eles faziam não envolvia mais sacrifícios, mas
tinham que manter o fogo do altar aceso. O fogo do altar nunca
poderia se apagar, a lei de Moisés mandava isso. Também o
candelabro de ouro, o menorá, com sete braços, tinha que ser
mantido aceso o tempo todo. Lá dentro estava a arca da aliança,
com as tábuas da lei e outras riquezas e preciosidades. O turno da
noite mantinha acesas todas as luzes do templo e preparava tudo
para o dia seguinte. Quando o serviço regular começasse, às seis
da manhã, deveria estar tudo pronto para novamente começar a
morte de animais.
Algumas vezes, havia judeus que passavam a noite no
templo. Há um caso no Novo Testamento da profetiza Ana, que
não se afastava do templo dia e noite, vivendo em jejum e orações
(Lc 2.36-37). Às vezes, alguns israelitas viravam a noite em vigília,

171
CAMINHOS DA FÉ

orando e buscando a Deus ali no templo. Era sempre preciso que


o templo estivesse aberto e houvesse pessoas lá.
Os peregrinos chegam, então, na hora do turno da noite
e dizem aos sacerdotes e levitas: “Bendigam a Deus todos vocês,
servos do Senhor, que assistem na casa do Senhor nas horas
da noite”. A exortação é para que eles bendigam ao Senhor, e
a impressão que dá é que eles estão dizendo: “Não somente se
dediquem aos arranjos que precisam ser feitos durante a noite para
o dia seguinte, mas que durante a noite vocês estejam também
bendizendo a Deus, estejam louvando a Deus, adorando-o,
intercedendo pelo Seu povo durante a noite”. Ou seja, o apelo
era para que não faltasse oração, louvor e adoração a Deus no
templo, mesmo durante a noite. Aquele local de adoração deveria
ser cheio com os louvores de Deus, com orações e súplicas diante
dele.
E como é que eles deveriam fazer isso? O verso 2 diz:
Erguei as mãos para o santuário e bendizei ao Senhor. A exortação
que é feita aqui aos sacerdotes e levitas é que eles bendissessem
a Deus levantando as mãos, ou seja, como expressão da elevação
do coração. O levantar de mãos durante as orações ou durante o
louvor e bendizer a Deus é apenas um símbolo do elevar da nossa
alma e do nosso coração. Também, quando nós levantamos as
mãos para o alto, fazemos referência ao fato de que nós estamos
aqui e Deus está acima, e, como nós levantamos as mãos abertas,
significa que estamos pedindo a Ele e estamos prontos para
receber.
O que torna uma oração eficaz não é a postura física que
nós tomamos: de joelhos, em pé, sentados, deitados, levantando
mãos, com as mãos baixas, mãos para a direita, para a esquerda…
nada disso torna a oração mais eficiente; mas, porque nós somos
alma e corpo, com frequência a postura física serve para expressar
o nosso estado de alma. Por isso é que na Bíblia é muito comum
você ver pessoas aquebrantadas que se ajoelham para orar, pois a
postura de joelhos expressa o que vai na alma, a humilhação e o
quebrantamento diante de Deus. O levantar as mãos na oração

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SALMO 134 - ABENÇOANDO E SENDO ABENÇOADO

pode expressar esse elevar do nosso coração e da nossa alma, e é


uma expressão também da dependência que nós temos de Deus.
Ele está nos céus e nós estamos aqui, e nossas mãos estão elevadas
para receber dele a Sua graça e a Sua misericórdia.
Certa vez, eu estava pregando em uma igreja pentecostal,
em um encontro de obreiros, e notei que durante o louvor eles
estavam muito cautelosos porque havia um pastor presbiteriano
ali: eu! Depois eles vieram conversar comigo e me perguntaram se
em minha igreja podia levantar a mão. Eu respondi que sim, que
não havia nenhuma proibição, não fazemos disso uma regra ou
lei, deixamos cada um à vontade para fazer isso, o que ensinamos
é que uma oração não vai ser mais eficiente se você levantar as
mãos. O que faz com que Deus ouça a oração são outras coisas
que a Bíblia diz: a oração tem que ser feita em nome de Jesus,
tem que ser feita com fé, com sinceridade, com devoção, com
entrega total do nosso coração. Se você faz levantando mãos
ou não, é uma opção sua, mas lembrando apenas que a eficácia
da oração não está na postura física que nós tomamos, embora
você vai encontrar recomendações como esta: “Bendiga a Deus
levantando as mãos”. Às vezes, a postura física convém porque ela
expressa o sentimento que existe em nossa alma.
No caso aqui em particular, os peregrinos estão exortando
os sacerdotes: “Levantem as mãos para o santuário”. O santuário
era a parte mais interior do templo, onde estava a arca da aliança.
Havia o santo lugar, que era o templo, e havia, dentro dele, o
santo dos santos, que era uma câmara cujo acesso era restrito e
proibido a todos, menos ao sumo sacerdote, que entrava lá uma
vez por ano no dia da expiação, para derramar sangue pelo povo
de Deus sobre o propiciatório, a tampa da arca. E era tão restrito
o acesso, que, depois de um tempo, criou-se o costume entre os
sacerdotes de que, quando o sumo sacerdote fosse entrar lá, era
amarrada uma corda em seu tornozelo, caso ele passasse mal lá
dentro. Como ninguém poderia entrar, se, depois de um tempo
puxando, o sacerdote não reagisse, os levitas o puxavam para ver
se ele estava bem. Isso não estava na lei de Moisés, mas era um
costume prático que os judeus adotaram.
173
CAMINHOS DA FÉ

Então, aqui, os levitas são exortados a bendizer a Deus e a


interceder pelo povo levantando as mãos em direção ao santuário,
que é onde estava a arca da aliança. Por que isso? Porque a arca
da aliança simbolizava a presença de Deus, era ali que Deus
se manifestava. Você deve se lembrar dos salmos que dizem:
“Deus mora no meio dos querubins”, e quase sempre as pessoas
imaginam Deus no céu cercado de querubins. Mas não era isso, e
sim que em cima da arca havia dois querubins voltados um para
o outro, com suas asas se tocando. Era ali que Deus habitava, a
arca com os querubins era símbolo da presença de Deus. Quando
diz: “Levantai as mãos para o santuário”, é mais ou menos dizer:
“Levantai as mãos para o Deus que habita entre os querubins,
que está lá onde está a arca, que é símbolo da Sua aliança e do
Seu acordo com o Seu povo”. Bendizer a Deus significa falar bem
dele, elogiá-lo, louvá-lo, e também o levantar das mãos significa
súplice oração.
Agora o quadro está completo: os peregrinos chegam ao
fim do dia e dizem: “Bendigam a Deus a noite toda. Sabemos que
vocês têm trabalho para fazer, mas não se esqueçam de bendizer
a Deus levantando suas mãos para a presença dele, orando por
nós, louvando e bendizendo esse Deus para que não falte louvor
na casa dele”.
E aí há a resposta dos sacerdotes, no verso 3: De Sião te
abençoe o Senhor, criador do céu e da terra! Imaginamos os sacerdotes
se voltando para o povo e pronunciando aquela bênção sacerdotal.
Essa prerrogativa de abençoar o povo era dos sacerdotes. Está no
Livro de Números, 6.22-27: Disse o Senhor a Moisés: Fala a Arão
e a seus filhos, dizendo: Assim abençoareis os filhos de Israel e dir-
lhes-eis: O Senhor te abençoe e te guarde; o Senhor faça resplandecer
o rosto sobre ti e tenha misericórdia de ti; o Senhor sobre ti levante o
rosto e te dê a paz. Assim, porão o meu nome sobre os filhos de Israel,
e eu os abençoarei. Era uma prerrogativa do sacerdote abençoar o
povo de Deus conforme aquela bênção.
Aqui, é o que eles fazem no verso 3, eles se voltam para
o povo e abençoam, dando dois destaques. Primeiro: De Sião

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SALMO 134 - ABENÇOANDO E SENDO ABENÇOADO

te abençoe o Senhor. Sião é Jerusalém, ou seja, “De Jerusalém


te abençoe o Senhor”. Por que isso? Mais uma vez, Sião é onde
estava o templo, onde estava a arca que simbolizava a presença
do Senhor e a aliança dele com o Seu povo. Quando o sacerdote
diz: De Sião te abençoe o Senhor, seria lembrar que é o Deus da
aliança, o Deus que tem um pacto conosco, e a sede do Seu reino
é Jerusalém. “E de lá, onde quer que você se encontre, quando
você voltar para sua casa lá nos confins de Zebulom e Naftali,
nos extremos de Israel, ao norte e ao sul, ainda assim de lá de
Jerusalém o Senhor haverá de te abençoar, Ele sempre estará
contigo, pois Ele é o Deus da aliança.”
O segundo destaque que o sacerdote dá aqui na bênção
é que: De Sião te abençoe o Senhor, criador do céu e da terra! Aqui
está a razão pela qual Deus pode nos abençoar, porque Ele é o
criador do céu e da terra, tudo é dele, portanto Ele pode dar
bênçãos dos céus e pode dar bênçãos da terra, e nada impede o
Seu poder. Eu não posso abençoar você porque eu não sou dono
de nada. Nós não temos como abençoar, nós podemos pedir
que Deus, Criador dos céus e da terra, abençoe o nosso irmão,
mas nós não podemos abençoar uma pessoa, porque é o maior
que abençoa o menor, e nós somos todos iguais. Só Deus pode
abençoar, porque Ele tem todas as coisas em Suas mãos e pode
tirar dos Seus tesouros e concedê-los aos homens, bênçãos dos
céus e bênçãos da terra.
Por isso é que eles dizem: De Sião te abençoe o Senhor,
criador dos céus e da terra, eles foram cuidadosos em dizer: “Que
o Senhor te abençoe, não somos nós que te abençoamos, mas é
o Senhor”.
O que nós podemos aprender com este salmo tão
curtinho, mas tão rico de lições preciosas para nós? Eu quero
destacar, antes de trazer alguma aplicação prática, dois ou três
pontos que tornam o salmo relevante e para que ele faça sentido
para nós hoje. Nós temos que lembrar, em primeiro lugar, que os
sacerdotes do Antigo Testamento, bem como os levitas, eram uma
figura, um símbolo de Jesus Cristo. Deus instituiu os sacerdotes

175
CAMINHOS DA FÉ

e levitas como uma figura que simbolizava aquele sumo sacerdote


final, maior, perfeito e completo, que seria o Seu filho Jesus
Cristo. À semelhança dos sacerdotes, Ele ofereceu sacrifícios pelo
povo, e o sacrifício que Ele ofereceu foi a Si mesmo, Ele era o
cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Cristo era ao
mesmo tempo sacerdote e oferta, era o ofertante e a oferta em Si.
Ele ministrou a Deus um sacrifício completo e perfeito, absoluto,
final e suficiente pelos pecados do Seu povo.
Depois da morte, Ele subiu aos céus, entrou no santo dos
santos, na presença de Deus, onde vive para interceder por Seu
povo. Ele nos entende e se compadece de nós, porque Ele é um
de nós. É o único mediador entre Deus e os homens, e, através
dele, Deus nos abençoa, e nós bendizemos e adoramos a Deus,
chegando até a Sua presença.
Nós hoje, portanto, não temos mais sacerdotes, pessoas
que vão oferecer sacrifícios de animais, orar e interceder por nós
diante de Deus para que Ele nos perdoe; nós não temos mais o
sistema de levitas, aquele sistema que havia no templo; o templo,
com os sacerdotes e os levitas e os sacrifícios de animais, era tudo
figura de Cristo, símbolo do sacrifício completo que Ele faria
por nós. É por isso que hoje nós não temos mais templo. Eu sei
que costumamos nos referir ao edifício da igreja como sendo o
templo, mas não no sentido do Antigo Testamento. Ali, o templo
era um local separado, específico e único onde Deus habitava,
e era onde, e somente onde, Ele aceitaria receber adoração. Os
templos cristãos não são como o templo do Antigo Testamento,
são apenas locais que foram construídos para reunião do povo de
Deus. Púlpito não é altar — às vezes você ouve o pastor dizendo:
“Eu quero convidar os irmãos a virem até o altar do templo”. Mas
nós não temos mais altar. Pastor também não é sacerdote. Tudo
aquilo se cumpriu em Jesus, Ele é o nosso sumo sacerdote, em
quem nós temos todos aqueles privilégios que eram apresentados
pelo ministério levítico.
Agora, um segundo ponto que nós temos que lembrar é
que a Bíblia se refere aos cristãos em geral como sendo sacerdotes.

176
SALMO 134 - ABENÇOANDO E SENDO ABENÇOADO

Cito apenas três passagens. Na sua primeira carta, Pedro diz,


falando aos cristãos: também vós mesmos, como pedras que vivem,
sois edificados casa espiritual para serdes sacerdócio santo, a fim de
oferecerdes sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por intermédio de
Jesus Cristo (1Pe 2.5). Você percebe a linguagem que Pedro está
usando aqui? Ele está usando a linguagem do Antigo Testamento
e aplicando aos cristãos, dizendo-lhes que eles são pedras que
vivem, edificadas na casa espiritual. A figura aqui é do templo
de Jerusalém, mas ele está dizendo agora que os crentes é que
são templo, um templo espiritual de pedras vivas. Cada um de
nós, por assim dizer, figuradamente, é um tijolo desse templo
espiritual onde Deus habita.
Pedro diz em seguida: para serdes sacerdócio santo. Agora
cada crente é um sacerdote diante de Deus. Observe: a fim de
oferecerdes sacrifícios espirituais. Então está tudo aqui: templo,
sacerdote, sacrifício, só que tudo isso agora é aplicado aos crentes
em Jesus. Nós somos o templo, somos os sacerdotes e oferecemos
a Deus um sacrifício espiritual — não mais de animais —, que é
a entrega do nosso coração, da nossa vida, do nosso louvor e do
nosso caminhar. Ou seja, Deus continua a ser servido, mas por
um povo espiritual que O adora na mediação do único sumo
sacerdote, que é Jesus Cristo.
Veja, ainda, o verso 9: Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio
real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus. Também
Apocalipse 1.5-6, quando João diz: Àquele que nos ama, e, pelo
seu sangue, nos libertou dos nossos pecados, e nos constituiu reino,
sacerdotes para o seu Deus e Pai, a ele a glória e o domínio pelos
séculos dos séculos. Amém! Os cristãos, então, são constituídos
como sacerdócio santo, sacerdotes para Deus. E o que é que isso
significa? Não é no sentido de mediador, porque o único mediador
entre Deus e os homens é o sumo sacerdote Jesus Cristo. Nós
somos chamados de sacerdotes porque temos acesso à presença
de Deus como só o sumo sacerdote no Antigo Testamento tinha,
quando ele chegava ao santo dos santos uma vez por ano. Nós
agora podemos chegar à presença de Deus a qualquer momento,

177
CAMINHOS DA FÉ

em qualquer lugar, e orar a Deus, bendizer a Deus, ouvir a Sua


voz, ser por Ele instruídos e consolados. Que grande privilégio
para nós!
No Antigo Testamento, o judeu temente e piedoso a
Deus tinha que ir ao templo, tinha que depender do sacerdote,
para que o sacerdote intercedesse por ele, para que o sacerdote
oferecesse sacrifícios, e ele ficava esperando a bênção. Hoje,
nós nos achegamos a Deus em casa, no trânsito, no trabalho,
fazendo compras, na escola… em qualquer lugar nós elevamos
nosso coração a Deus, chegamos à Sua presença, cultuamos a Ele,
nos reunimos na casa dos irmãos. Que privilégio para nós que
vivemos depois da vinda de Jesus e depois de Ele ter cumprido
todas as leis cerimoniais!
Isso traz algumas implicações para nós: pastor não é
sacerdote, pastor não é mediador, não perdoa pecados, a oração
do pastor não é mais eficiente do que a sua, pastor não tem poder
para abençoar ninguém. Nós podemos pedir, e devemos pedir,
que Deus abençoe os nossos irmãos.
Agora, outras aplicações práticas. Este salmo se torna um
salmo de encorajamento para que nós bendigamos a Deus em
todo tempo, nos turnos do dia, da tarde e da noite. Que não
faltem diante de Deus o louvor e a adoração do Seu povo, que
haja em nós aquilo que mais tarde o apóstolo Paulo vai dizer:
Orai sem cessar (1Ts 5.17). Aproveitemos esse grande privilégio
que nos foi dado de chegar à presença do Criador dos céus e da
terra a todo tempo, em qualquer lugar e qualquer que seja a nossa
situação. Façamos isso mediante Jesus, lembremos que é somente
pela mediação dele, pelo Seu sacrifício e pela Sua intercessão que
nós podemos fazer, e devemos fazer isso em todo tempo.
Uma palavrinha que eu daria também àqueles que estão
angustiados, aflitos, atribulados e abatidos: este salmo é um
convite a vocês buscarem a bênção de Deus. Cheguem-se a Ele na
mediação de Jesus e tragam diante dele as suas aflições e ansiedades
em todo tempo e confiem que Ele vai atender às suas orações.
Este salmo nos traz vários incentivos para que nós façamos isso.

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SALMO 134 - ABENÇOANDO E SENDO ABENÇOADO

Primeiro, porque ele diz: “Que o Senhor te abençoe, Ele, que é


o Criador dos céus e da terra”. Isso é um incentivo para você! O
Criador dos céus e da terra, que tem todo o poder, que do nada
fez tudo que existe e que governa tudo que existe, está acessível a
você, e você pode levar-lhe as suas angústias e necessidades.
O salmo também diz que Ele é o Deus que mora em Sião,
a cidade que era o símbolo da aliança, do pacto que Deus tem
conosco por meio de Jesus Cristo. Deus é fiel. Há também um
incentivo aqui para que nós busquemos a Deus na esperança de
sermos ouvidos: é que nós temos um sumo sacerdote que intercede
por nós. As nossas orações chegam à presença de Deus mediante a
intercessão de Jesus, que, ao lado do Pai, intercede por nós, pede
por nós, toma as nossas orações e as apresenta ao Pai santificadas
e purificadas pelo Seu sangue e pelo Espírito Santo. Há todo um
incentivo aqui para que você ore, para que chegue diante de Deus
e deposite diante dele a sua angústia e necessidade.
Diante de todo esse incentivo que este salmo nos dá,
reconheçamos que nós desperdiçamos muitas oportunidades de
chegar à presença de Deus, gastar tempo diante dele para adorá-
lo, servi-lo, assisti-lo e bendizê-lo, levantar as mãos diante dele,
cultuá-lo, suplicar, colocar diante dele as nossas necessidades. Boa
parte dos nossos problemas e angústias é porque não fazemos o
que o salmo 143 está dizendo: Bendizei ao Senhor, vós todos, servos
do Senhor, que assistis na Casa do Senhor, nas horas da noite; erguei
as mãos para o santuário e bendizei ao Senhor.
Que Deus assim nos dê esse espírito de adoração e temor
e que nós busquemos o nosso Deus mediante Jesus em todo
tempo.

ORAÇÃO:

Que privilégio o Senhor nos dá, Senhor, Criador dos céus


e da terra, de chegarmos à Tua presença, não somente na igreja,
lugar dedicado ao Senhor, mas em todo lugar; levantar as mãos,

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CAMINHOS DA FÉ

levantar nosso coração, elevar a nossa alma e as nossas palavras


diante de Ti e chegar à Tua presença na mediação do Teu filho
Jesus, na certeza de que Ele está intercedendo por nós. Damos-te
graças por esse grande privilégio, queremos bendizer o Teu nome
agora, por isso ajuda-nos a orar sem cessar. É o que te pedimos,
por amor de Jesus. Amém.

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Estação da Fé
Caixa postal 246 - CEP 74001-970
Goiânia - GO
Tel.: (62) 3653-5251 / 4101-1998
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