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Universidade de Uberaba
Reitor
Marcelo Palmério
Editoração e Arte
Produção de Materiais Didáticos-Uniube
Projeto da capa
Agência Experimental Portfólio
Edição
Universidade de Uberaba
Av. Nenê Sabino, 1801 – Bairro Universitário
208 p.
CDD B869
Sobre os autores
Alexandre Bonafim Felizardo
Bons estudos!
Capítulo Machado de Assis
1
Introdução
Caros estudantes, vamos começar agora um passeio pela obra de
um dos maiores autores da virada do século XIX para o XX, não
apenas no Brasil, mas em termos de literatura ocidental: Machado
de Assis.
Objetivos
Após o estudo deste capítulo, esperamos que você seja capaz de:
Esquema
1.1 Machado contista
1.1.1 Três tesouros perdidos
1.1.2 Um apólogo
1.2 Um homem urbano
1.3 Machado romancista
1.3.1 Linguagem
1.3.2 Leituras contemporâneas
1.4 Mais um pouco sobre Machado
1.4.1 O alienista
1.5 Conclusão
Já que você tem uma opinião sobre Machado de Assis, vamos agora
apenas lembrar que ele publicava em jornais desde a adolescência,
começando por poemas (imagine que era mais fácil encontrar espaço
num jornal para este tipo de produção – qualquer canto poderia comportar
algo pequeno e era uma excelente maneira de começar a se mostrar
socialmente, caminho escolhido por Machado). Já aos dezenove anos,
passa a publicar contos – um dos gêneros em que mais se destacou,
ponto alto de sua obra e do conto em língua portuguesa – igualmente na
imprensa, em jornais e revistas.
UNIUBE 3
INDICAÇÃO DE LEITURA
— Sua casal
— No Andaral... por uma porta secreta. Vamos! ou...
— Mas, senhor; há de ser outro, que se pareça
comigo...
— Não, não, é o senhor mesmo... como escapar-
me este ar de tolo que ressalta de toda a sua cara?
Vamos, ou deixar a cidade, ou morrer. Escolhal
Era um dilema. O Senhor X... compreendeu que
estava metido entre um cavalo e uma pistola. Pois
toda a sua paixão era ir a Minas, escolheu o cavalo.
Surgiu, porém, uma objeção.
— Mas senhor, disse ele, os meus recursos.
— Os seus recursos! Ah, tudo previ... descanse...
eu sou um mando previdente. E tirando da algibeira
da casaca uma linda carteira de couro da Rússia,
diz-lhe.
—Aqui tem dois contos de réis para os gastos de
viagem, vamos, parta! Parta imediatamente! Para
onde vai?
— Para Minas.
— Oh, a pátria do Tiradentes! Deus o leve a
salvamento. Perdoo-lhe, mas não volte a esta
corte. Boa viagem] Dizendo isso, o Sr. F... desceu
precipitadamente a escada e entrou no cabriolé, que
desapareceu em uma nuvem de poeira.
O Sr. X... ficou por alguns instantes pensativo. Não
podia acreditar nos seus olhos e ouvidos; pensava
sonhar. Um engano trazia-lhe dois contos de réis,
e a realização de um dos seus mais caros sonhos.
Jantou tranquilamente, e dal a uma hora partia para
a terra de Gonzaga, deixando em sua casa apenas
um moleque encarregado de instruir, pelo espaço de
oito dias, aos seus amigos sobre o seu destino.
No dia seguinte, pelas onze horas da manhã,
voltava o senhor F... para sua casa de Andara!, pois
tinha passado a noite fora. Entrou, penetrou na sala,
e indo deixar o chapéu sobre uma mesa, viu ali o
seguinte bilhete:
“Meu caro esposo! Parto no paquete em companhia
do teu amigo P... Vou para a Europa. Desculpa a má
companhia, pois melhor não podia ser. Tua E...”
UNIUBE 5
IMPORTANTE!
• muitos diálogos;
• personagens identificadas apenas com a primeira letra do nome;
• menção a um bairro do Rio de Janeiro;
• o tema do adultério, que será tantas vezes retomado por ele.
1.1.2 Um apólogo
INDICAÇÃO DE LEITURA
IMPORTANTE!
• muitos diálogos;
• intermediação constante do narrador;
• a amargura revestida pela ironia;
• a discreta menção ás diferenças sociais: a costureira e a baronesa.
UNIUBE 9
Você leu dois contos espaçados no tempo de escrita em quase vinte anos.
Considere que Machado escreveu contos por muitos e muitos anos – dos
dezenove aos sessenta e oito anos! Ao que parece, com eles, o autor
conquistou um público fiel. Durante todo este período de produção de
contos, escreveu cerca de duzentos contos, uma quantidade realmente
notável. Achamos que é tempo para uma breve incursão pela biografia
de Machado de Assis, um homem de seu tempo e especialmente ligado
à vida de sua cidade, o Rio de Janeiro.
“Que é da chave?”
“Que é da tranca?”
“Não sei da chave”
“Achou ‑se a chave”
“Moro longe”
“Mude ‑se para perto”
12 UNIUBE
INDICAÇÃO DE LEITURA
INDICAÇÃO DE LEITURA
INDICAÇÃO DE LEITURA
E, então, você tinha acertado o seu palpite? Achava que Pestana era um
inconformado com a fama, que preferia ser alguém diferente do que era?
• Ressurreição, 1872.
• A mão e a luva, 1874.
• Helena, 1876.
• Iaiá Garcia, 1878.
• Memórias póstumas de Brás Cubas, 1881.
• Quincas Borba, 1891.
• Dom Casmurro, 1899.
• Esaú e Jacó, 1904.
• Memorial de Aires, 1908.
Com essa bagagem é que partimos, agora, para 1899, o ano seguinte ao
da publicação de Um homem célebre; e, na forma da escrita, mudando
18 UNIUBE
AMPLIANDO O CONHECIMENTO
Ítalo Calvino costumava dizer que um clássico é um livro que não terminou
de dizer o que tinha a dizer. Acho uma boa definição, você não? Uma obra
que não envelhece porque sempre está dizendo algo para o leitor, que se
aproxima dela em tempos diferentes (CALVINO, 1993, p. 18).
AMPLIANDO O CONHECIMENTO
A narrativa que começa “in medias res” utiliza um recurso narrativo que
nos é bastante conhecido devido ao seu uso pelo cinema. É a narrativa
que começa “no meio das coisas”, literalmente (que é a tradução de “in
medias res”). Vemos um personagem ou grupo já em ação, sem que
20 UNIUBE
1.3.1 Linguagem
EXEMPLIFICANDO!
EXEMPLIFICANDO!
E você, o que achou, lendo o romance? Qual a sua opinião sobre a relação
entre Bento, Capitu e Escobar — você acha que Capitu e Escobar realmente
tiveram um envolvimento amoroso, traindo Bento? E Ezequiel, você acha que
ele é filho de Bento ou seria o “filho da traição”? Reflita sobre isso e converse
com seus colegas e com seu (sua) preceptor(a) sobre isso. Troque ideias!
AMPLIANDO O CONHECIMENTO
TROCANDO IDEIAS!
Sua situação se agrava quando, em 1904, ele fica viúvo. A partir daí,
Machado experimenta um declínio em sua qualidade de vida e em sua
saúde. A saudade da companheira, com quem viveu trinta e cinco anos,
24 UNIUBE
é somada à ausência dos cuidados que ela tinha para com ele: em suas
crises, frequentes, era Carolina quem muito o ajudava. Com o passar dos
anos, Machado teve uma ulceração na língua (frequentemente mordida
por aqueles que sofrem ataques epiléticos) que degenerou num câncer
que acabou por causar a morte do escritor, em 1908.
PESQUISANDO NA WEB
1.4.1 O alienista
AMPLIANDO O CONHECIMENTO
INDICAÇÃO DE LEITURA
Vê-se de pronto que errou o “diagnóstico”, pois D. Evarista não gerou filhos,
e quanto à tentativa de evitar o amor... Será que isso seria uma atitude
sensata?
Converse com seus colegas e com seu(sua) professor(a) tutor(a) sobre isso.
Troque ideias!
UNIUBE 27
1.5 Conclusão
Machado de Assis pode ser uma de suas leituras pelos próximos anos.
Com uma prosa que não oferece dificuldades aparentes – temos a
impressão de algo bastante plano – o escritor explora com perspicácia
e domínio de linguagem, os abismos da condição humana. Como diria
o narrador de Memórias póstumas de Brás Cubas – o defunto Brás
– com a pena da galhofa, a tinta da melancolia e – acrescentamos nós
– uma fina ironia e um conhecimento da natureza humana atilado por
leituras de filosofia e literatura, Machado de Assis legou uma das grandes
obras literárias da transição do século XIX para o XX, não apenas para
a literatura brasileira, como já dissemos, mas para a literatura ocidental.
Machado de Assis não é mais conhecido e estudado porque escreveu em
português e contou com poucas traduções para as línguas consideradas
de prestígio em termos de literatura (inglês, francês, alemão). Porém, o
interesse por sua obra vem crescendo nos últimos anos, em especial nos
Estados Unidos, onde é cada vez mais estudado.
PESQUISANDO NA WEB
PARADA OBRIGATÓRIA
Converse com seus colegas e com seu (sua) professor(a) tudor(a) sobre
isso Troque ideias!
Resumo
INDICAÇÃO DE LEITURA
Referências
ASSIS, Machado de. O alienista. In: ______. Papéis avulsos. 1882. Disponível
em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000230.pdf>.
Acesso em: 9 fev. 2010.
______. Contos: uma antologia. Seleção, introdução e notas de John Gledson.
São Paulo: Companhia das Letras, 1998. v 2.
______. Dom Casmurro. São Paulo: Círculo do Livro, 1978. ______. Obra
Completa. Rio de Janeiro: W. M. Jackson, 1938. v. 24.
______. História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 1994. p. 188.
CALVINO, ítalo. Por que ler os clássicos. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
CANDIDO, Antonio. O discurso e a cidade. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2004.
RINARÉ, Rouxinol do. O alienista em cordel. São Paulo: Nova Alexandria, 2008.
Introdução
Pretendemos estudar, neste capítulo, a poesia de um grande poeta
brasileiro, Carlos Drummond de Andrade. Drummond, ao longo de
extensa produção, elaborou uma obra poética pautada pelo rigor e
pela variedade de temas. Dessa forma, o poeta escreveu poemas
tanto em versos livres como metrificados. Suas preocupações
filosóficas nortearam sua produção, em um leque amplo de
pensamentos. Temos, assim, em sua poesia, preocupações
existências, sociais e éticas, numa extensa coletânea de poemas
a constituir verdadeira riqueza para a literatura mundial.
Objetivos
Ao final deste capítulo você deverá:
• explicar os recursos poéticos da linguagem, bem como os
temas abordados pelo poeta;
• identificar o contexto social e cultural do poeta;
• analisar os significados profundos dos poemas;
• identificar as principais características da obra de
Drummond
Esquema
2.1 Considerações iniciais
2.2 Drummond e o modernismo
2.3 Características gerais da poesia de Drummond
32 UNIUBE
O poeta viveu muito tempo, de 1902 a 1987. Foram 85 anos de uma vida
a vislumbrar inúmeros acontecimentos políticos e sociais: a Segunda
Guerra Mundial, a ditadura de Getúlio Vargas e, posteriormente, a
Ditadura Militar, a Guerra Fria, a revolução feminista, o advento de uma
era de desenvolvimento tecnológico e industrial no Brasil.
RELEMBRANDO
SAIBA MAIS
Essa fuga do interior rumo às metrópoles fará com que Drummond reflita
em sua poesia uma permanente tensão entre a “vida besta”, atrasada, da
cidadezinha e o alvoroço, a confusão da cidade grande, onde o homem
vai se tornando cada vez mais só e dependente das máquinas.
34 UNIUBE
Significa tudo
Todos esses escritores, empolgados com a
aquilo que se liga revolução estética do modernismo de São Paulo,
a uma dimensão
maior da vida,
irão aclimatar, adaptar as inovações estéticas da
incompreensível nova escola literária ao jeitinho dos mineiros. Os
para nós, como a
questão da morte,
jovens de Minas, muito desconfiados, irão dar uma
da eternidade e de dimensão existencial e metafísica às inovações da
Deus
vanguarda modernista.
IMPORTANTE!
IMPORTANTE!
PESQUISANDO NA WEB
SAIBA MAIS
Você já deve, inclusive, ter usado essa expressão: “esse problema é uma
pedra no meu caminho”. O poema tornou-se tão famoso que acabou virando
expressão usada no nosso dia a dia.
Vamos recapitular?
Vamos verificar, agora com mais detalhes, para que você tenha uma visão
mais ampla, algumas dessas inovações propostas pelos modernistas da
segunda fase:
1) generalização e aprofundamento da mistura de estilos: o banal e o
elevado se misturam (é o caso da pedra drummondiana); temas sérios
e problemáticos são tratados com linguagem vulgar (lembremos, por
exemplo, o texto “Poema tirado de uma notícia de jornal”, de Manuel
Bandeira, em que um suicídio é tratado com a linguagem límpida
utilizada pelos jornalistas);
Você está pronto para empreender mais esse passeio pela obra do nosso
grande poeta?
Imaginem vocês uma pessoa que vive com a “cuca quente”, perguntando
sobre o sentido da vida e da morte, indagando o porquê dos fracassos
amorosos, das relações de ódio, da calamidade social e moral do homem
corrompido pelo consumo e pelas máquinas?
Pois bem, nosso grande poeta era assim: um homem muito lúcido, muito
vivo, um poeta a gastar exaustivamente sua capacidade de análise e
reflexão do mundo. Arrigucci Júnior nos afirma que o pensamento, para
o poeta mineiro, “define a atitude básica do sujeito lírico, interferindo na
relação que este mantém com o mundo exterior, ao mesmo tempo que
cava mais fundo na própria subjetividade”. (2002, p.16.)
UNIUBE 39
EXPLICANDO MELHOR
Vamos entender um pouquinho mais sobre isso que Arrigucci Júnior nos
afirma? Para o crítico, o poeta pensa tanto, mas tanto, que fica brigando,
pelejando, com o mundo fora do eu e consigo mesmo.
Essa briga com o próprio eu nasce de uma profunda timidez, de uma falta
de jeito para lidar com as coisas práticas do mundo e, consequentemente,
uma não aceitação de si. Conforme um poema do autor, as palavras
querem explodir no íntimo do espírito. Daí nasce a sensação de angústia,
de abafamento das emoções.
EXEMPLIFICANDO!
Muita gente já deve ter sentido raiva por morar em algum lugar. Como
sabemos, várias pessoas vivem em desacordo com o espaço onde
vivem. Outros não, amam habitar onde estão. Drummond concentra
esses dois sentimentos.
Talvez somente a poesia, pelo seu registro textual, possa conter essa
plenitude perdida. Daí a constante presença da cidadezinha em sua obra.
PESQUISANDO NA WEB
Como já vimos, o nosso poeta era muito filosofante. Como conciliar essa
natureza questionadora, sempre em busca de novos horizontes, de novas
possibilidades, com um mundo tão restrito? Eis porque o poeta reserva
um olhar irônico para esse universo.
Mas não é na cidade que também está perdido o mundo dos afetos,
dos amores familiares? Ao tema da cidadezinha liga‑se o próximo, o da
família.
EXEMPLIFICANDO!
IMPORTANTE!
Quem nunca brigou com um irmão, com um pai? Às vezes, a raiva toma
nosso coração e, sem percebermos, ferimos e somos feridos.
EXPLICANDO MELHOR
Vamos ver o que Drummond tem a nos dizer das pessoas com as quais
privou o laço de fraternidade?
É pela relação social, no trato diário com o outro, que o poeta vai também
delineando sua personalidade e enriquecendo a sua obra.
EXEMPLIFICANDO!
O poema “Mário de Andrade desce aos infernos” poderá ser lido por você no
site <httpd://www.scribdc.om/doc/6919536/Carlos-Drummond-de-Andrade-
Rosa-do-povo>.
É quando, no
Em um primeiro momento, Drummond nos narra poema, o autor
discute questões
a falta, a É quando, no poema, perda do amigo ligadas à própria
falecido. Todavia, ao esboçar as imagens, o autor poesia.
na correria de São Paulo? Seria muito difícil conseguir esse intento. Daí
a indignação de Drummond frente às “vozes em febre”, adoecidas, dos
poetas da modernidade.
EXEMPLIFICANDO!
SAIBA MAIS
Theodor W. Adorno
PESQUISANDO NA WEB
IMPORTANTE!
SAIBA MAIS
Função referencial
RELEMBRANDO
não possui seu significado original; ela designa a cor de um cabelo, no caso,
loiro. A cor de ouro foi usada no lugar da cor do cabelo. É preciso salientar
que, em poesia de qualidade, o poeta usará metáforas raras, de grande
força criativa. Já o símbolo seria uma metáfora usual em uma determinada
cultura. É o caso do cálice sagrado. O cálice representa o Cristo salvador.
Difícil? Vamos usar uma imagem para facilitar? O poema, como todo
texto literário, é como um fruto. As imagens, as palavras superficiais,
seriam como a casca. No íntimo desse fruto estaria a polpa, ou seja, o
sentido referencial, denotativo, a mensagem que o poeta “deseja” passar.
Para compreender um poema é necessário traduzir suas imagens, suas
metáforas e transpô‑las para a linguagem corrente, denotativa.
E ai, tudo bem até aqui? Você está pronto para embarcar nessa nova
empreitada de nosso estudo?
PESQUISANDO NA WEB
EXEMPLIFICANDO!
Por outro lado, se verificarmos que o poema tem realmente sete estrofes,
em que cada uma delas torna‑se uma face, podemos pensar que esse
Carlos, em cada segmento, ganha um rosto diferente.
UNIUBE 51
Estranho tudo isso não é mesmo? Vamos tentar entender melhor? Aqui
nós temos uma releitura da figura do poeta maldito.
SAIBA MAIS
Alcides Villaça nos faz a seguinte afirmação sobre essa situação do poeta
no mundo: “o gauche se mostra sobretudo na insuficiência psicológica
para a ação dentro de um mundo de movimentos rápidos e de excessivos
convites”. (2006, p. 22.)
É a figura de
E qual seria esse sentido irônico no texto? linguagem que
consiste em afirmar
algo com um
Em uma sociedade banalizada, desumana, não sentido oposto à
afirmação. Se eu
ser igual a todo mundo pode representar um ato digo, “Como você
de coragem, de valorização da pessoa, do ser, em está bonitinho”,
ante alguém
vez do dinheiro, da vida alienada e esquecida de com as roupas
valores importantes como a solidariedade e arte. em desalinho ou
desarrumadas,
eu estarei sendo
Pois bem, ser “gauche” não é tão negativo assim. irônico. Na ironia, há
sempre um tom de
Pode indicar uma forte vontade de salvar o próprio desdém, às vezes
eu dessa desumanização do cotidiano. de sarcasmo, em
que muitas vezes
certa situação,
Vamos continuar nossa análise? grupo social ou
pessoa, podem
ser ridicularizados.
Na segunda estrofe, a presença desse tímido se Como vimos, o
tom de piada do
torna mais acentuada. Vejam que nesse fragmento, modernismo visava
“as casas espiam os homem”, ou estamos diante ao desprestígio das
escolas literárias,
de uma metonímia. O lugar onde se encontra o ditas sérias.
observador substitui o eu que vê. Eis, portanto,
outra face do eu lírico, de um eu que se esconde atrás da janela para
observar, para se tornar “voyeur”.
Vejam que o Carlos não se permite participar da correria das pernas, ele
fica à margem, timidamente observando o mundo.
Pois bem, nesse texto é justamente o desejo que faz as pernas correrem,
se movimentarem, em um verdadeiro jogo de ciranda. Se formos mais
além, podemos notar que há um fundo erótico a impulsionar a balbúrdia
dos movimentos da capital, da cidade grande.
54 UNIUBE
Agora o poema parece ficar mais claro, não é mesmo? Mas precisamos
seguir viagem. Há outras faces a serem analisadas.
Por outro lado, o poeta não confia nos artifícios da poesia. Para tanto ele
cita um exemplo de recurso poético incapaz de salvá‑lo. Dessa forma, a
possibilidade de ele se chamar Raimundo, palavra a rimar com mundo,
não lhe traria consolo.
Para encerrar essa brevíssima análise, vamos partir agora para a sétima
e última face.
Como toda leitura de texto literário pode ser múltipla, essa é apenas uma
delas. Há muitos outros detalhes a serem analisados e discutidos. Por
isso aconselhamos a você, como forma de enriquecimento, a leitura da
bibliografia, principalmente os livros de Alcides Villaça e Arrigucci Júnior.
UNIUBE 57
PESQUISANDO NA WEB
Salta aos olhos a relação dessa subjetividade com Itabira: por ter nascido
nesse pequeno burgo, a personagem lírica se faz triste, de ferro.
Você já deve ter ouvido muita gente falar que mineiro é custoso, um
“come quieto”, sempre em silêncio. Esse jeitinho é poetizado por
Drummond, tornando‑se um dos grandes temas de sua poesia. Essa
psicologia orgulhosa, metaforizada pelo ferro, revela justamente essa
idiossincrasia do mineiro.
EXPLICANDO MELHOR
Idiossincrasia
EXPLICANDO MELHOR
SAIBA MAIS
Mas isso não seria viver no mundo da lua? No caso do poeta não, porque
o seu ócio, a sua imobilidade, são estados em alerta, pelos quais o
escritor analisa o real, para, em seguida, transformá‑lo em poesia.
60 UNIUBE
Daí vem a ironia final, mordaz, pela qual o sujeito lírico faz o balanço final
de sua vida e de suas perdas: “Tive ouro, tive gado, tive fazendas/ Hoje
sou funcionário público”.
Mas que coisa! Eta poeta lúcido, não é mesmo? Ele nunca se autoengana,
sempre se reserva a verdade nua e crua. Muita gente não tem essa
coragem. Prefere se esconder, se enganar, pensando que a vida é
cor‑de‑rosa ou eternamente bela.
PESQUISANDO NA WEB
Vamos mergulhar em mais uma aventura? O poema pode ser lido no site
<http://www.fabiorocha.com.br/drummond.htm>.
Assim, tal situação leva a voz poética, nessa primeira estrofe, a explicitar
a contingência da qual ela não pode se furtar: a total dependência do
homem moderno em relação ao consumo.
Tudo isso nos traz uma figura não contaminada ou que pelo menos
evita sujar‑se na cinzenta brutalidade do comércio. Daí advém a grande
expressividade imagética do segundo verso, em que a roupa branca se
antepõe à sujeira da rua, numa antítese entre pureza e imundice.
Bem, até aqui tudo certo? Podemos continuar? Vamos prosseguir nossa
análise.
Nas três últimas estrofes, o poeta irá detalhar o nascimento de uma rosa
estranha, de uma rosa sem cor, feia. Como se sabe, a rosa é símbolo da
poesia e, nesse caso, se configura como uma forma de resistência da
poesia ante as adversidades do mundo.
Vamos parar um minutinho, para fazermos uma reflexão sobre isso que
acabamos de expressar. Um importante teórico da poesia, Alfredo Bosi, em
seu livro O ser e o tempo da poesia, alega-nos que o poeta da modernidade,
ante o mundo desumano em que vivemos, empreende, a poesia, um ato
de crítica, de negação desse mesmo mundo. Nesse sentido, a poesia, por
UNIUBE 67
mais negativa que pareça, ela quase sempre guarda uma atitude utópica,
humanizadora.
Talvez por isso tal flor é motivo de escândalo: ela anuncia a poesia como
discurso a imperar em nosso mundo, a despeito da máquina, do asfalto e
das guerras.
2.8 Conclusão
É importante notar que este breve estudo não consegue dar conta da
vastíssima obra do poeta. Portanto, fica um convite. Vamos ler mais esse
poeta e aprender mais sobre sua poesia?
Resumo
Referências
ACHCAR, Franciso. Carlos Drummond de Andrade. São Paulo: Publifolha, 2000.
BOSI, Alfredo. O ser e o tempo da poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
UNIUBE 69
VILLAÇA, Alcides. Passos de Drummond. São Paulo: Cosac & Naify, 2006.
Capítulo A travessia literária genial
3 de Guimarães Rosa
Introdução
Neste capítulo, em que se procura de maneira didática, fazer
uma introdução ao universo literário de João Guimarães Rosa,
você encontrará, em primeiro lugar, alguns dados indispensáveis
da vida do escritor; em seguida, irá entrar em contato com um
breve histórico das obras, para, por fim, deparar-se com o mais
importante, os traços que fazem do discurso rosiano uma das
produções mais singulares da literatura brasileira.
Objetivos
Após o estudo deste capítulo, você deverá ser capaz de:
Esquema
3.1 Considerações iniciais
3.2 Obras
3.3 Características do discurso rosiano
3.4 Conclusão
3.2 Obras
SAIBA MAIS
Arcaísmo e neologismo
fadas adultos”, justificando que: “Com esta afirmativa, direi de sua intensa
maturidade, ao mesmo tempo em que salienta seu apelo ao encantatório
e ao maravilhoso, ao imaginário, ao mítico e ao feérico sem esquecer
as vinculações que têm com a terra e o povo.” Em outro ponto de seu
estudo (1970, p. 425; p. 449), Oliveira reitera a “solução poético-feérica
para o problema do destino” em Grande sertão: veredas, concluindo,
em seguida: “Contra o esquematismo da inteligência e do racional a
vitória do psiquismo ‘noturno’, porque nele predomina mágica, lúdica,
onipotente, a Imaginação.”
3.4 Conclusão
Referências
Introdução
Neste capítulo, você conhecerá importantes obras de Mário de
Andrade. Inicialmente, iremos verificar aspectos temáticos e
formais da obra Macunaíma. Assim, a partir de determinados
excertos do capítulo “Macumba”, iremos mergulhar nos intricados
processos estilísticos dessa obra tão importante de nossa
literatura.
Objetivos
Ao final deste capítulo, você deverá ser capaz de:
• Identificar os aspectos temáticos e estilísticos obra
Macuinaíma;
• Conhecer as inovações formais da poesia modernista de
Mário de Andrade;
• Apreender as características formais, estilísticas e líricas
dos textos de Contos Novos;
• Conhecer as inovações da estética modernista.
92 UNIUBE
Esquema
4.1 Macunaíma: a saga de um herói sem caráter
4.2 Introdução à poesia de Mário de Andrade
4.3 Introdução: algumas informações sobre o gênero
Olá, estamos prestes a iniciar um passeio por uma das obras mais
inusitadas e inovadoras de nosso modernismo: o Macunaíma, de Mário
de Andrade.
Feérico
Nessa obra, vamos lidar com um mundo feérico,
universo lendário e mágico, pátria dos sonhos,
Mágico, absurdo, onde o que importa não é a lógica, a razão,
termo ligado aos
contos de fada, mas a força dos devaneios. Por isso, temos
em que a fantasia de ler esse livro com um olhar lúdico, despido
molda o real.
de preconceitos. É preciso brincar, ser criança
Lúdico novamente, para podermos mergulhar nessa
Relativo às verdadeira saga não de um herói apenas, o
brincadeiras de Macunaíma, mas de toda a cultura brasileira.
criança, gesto ou
ação de brincar, de
jogar, de se divertir.Nesse sentido, é importante salientar um aspecto
fundamental da obra: o seu caráter folclórico,
ligado aos mitos indígenas e afro-americanos. Mário, afinado ao espírito
modernista e um dos mentores desse movimento, tinha um amplo e
profundo interesse por tudo o que se relacionava ao Brasil. Assim, ao
longo da vida, ele foi um incansável pesquisador do folclore nacional, dos
mitos indígenas e afro-brasileiros, foi, enfim, um dos grandes folcloristas
de nosso país.
Em “Boi-luna”, o herói irá travar uma luta com o terrível monstro Capei.
Após driblá-lo, Macunaíma corta a cabeça da fera. Entretanto, tal gesto
não é capaz de refrear a perseguição, pois o monstro, reduzido a
uma cabeça apenas, torna-se escravo de Macunaíma, continuando a
perseguir o seu mais novo amo. Logo desenganado, Capei sobe para
o céu, transformando-se em lua. Enfim, deparamos, aqui, com mais
uma metamorfose, recurso típico ao longo de toda a trama, em que
personagens se transformam em astros. Nesse ínterim, Macunaíma
perde a muiraquitã no rio. O amuleto, engolido por um tracajá, espécie
de réptil, é resgatado por um pescador e vendido para o grande vilão da
história, o gigante Venceslau Pietro Pietra.
Referente ao ser,
No plano humano, encontramos os incidentes
à essência mais relacionados à precariedade da vida: a mentira,
íntima da natureza a trapaça, a ira, a vingança. Ao longo de toda a
humana de um
indivíduo. história, podemos vislumbrar uma exaltação das
Perfídia
paixões. Nesse aspecto, por ser uma narrativa
de fundo mítico, ela se assemelha às tragédias
Deslealdade, gregas, aos mitos em geral, nos quais os jogos
traição.
de interesse e perfídia são preponderantes na
constituição do drama humano.
Javevó
Nesse fragmento, com argúcia e perícia técnica,
Pessoa de aspecto o autor ressalta aspectos contraditórios do terreiro
desagradável.
de Dona Ciata. A fina lâmina da ironia de Mário,
Galguincha de grande expressividade humorística, já se
Pessoa
desfibra no fragmento em que o herói carrega um
muitomagra. litro de pinga debaixo do braço. Esse garrafão era
“obrigatório”, portanto de extrema necessidade.
Agora, resta saber a que tipo de necessidade a pinga iria satisfazer.
Aqui, com efeito, podemos desvelar uma ambiguidade, recurso que gera
a ironia e o humor. Levava-se a pinga para o santo, num gesto sacro,
mas também para se embriagar, para saciar o próprio gozo. Sagrado e
profano se entrecruzam, transformando a festa em acontecimento ritual,
em que gozo e sacrifício, dor e prazer, êxtase e embriaguez, espírito e
corpo, mesclam-se de forma uníssona. Dessa forma, o humor nasce
dessa descrição deformadora, que transforma o crente, o religioso, em
pinguço, figura arquetípica do desvairado, do malandro. Temos, portanto,
um ritual dionisíaco, em que gozo carnal é feito êxtase espiritual.
Bem, por esse nosso passeio pelo livro Macunaíma, você passou a
conhecer um pouco mais do estilo de Mário de Andrade. Com toda a
certeza, ao ler o livro, você se sentirá mais íntimo do texto e poderá
compreendê-lo de forma mais efetiva.
PESQUISANDO
a) Verso livre
RELEMBRANDO
Você, com toda a certeza, já deve saber a diferença entre verso livre e fixo. O
que distingue as duas modalidades é a questão da regularidade das sílabas
poéticas. Por exemplo, um soneto alexandrino é fixo, porque em todo verso
há exatamente doze sílabas poéticas. Isso não acontece nos poemas de
versificação livre, em que a contagem silábica oscila de um verso a outro.
EXEMPLIFICANDO!
b) Enumeração caótica
IMPORTANTE!
EXEMPLIFICANDO!
EXEMPLIFICANDO!
d) Neologismo
Vamos prosseguir? Por hora, não se esqueça: o que torna essa poesia
fascinante é justamente a sua estranheza.
e) A pesquisa folclórica
EXEMPLIFICANDO!
SAIBA MAIS
Referente ao
cérebro
Por esses métodos expressivos, Mário exerce um
tipo de literatura ambulante, inquieta, errática. O
Espasmo
movimento da caminhada é acompanhado por um
Movimento exercício do espírito. Por conseguinte, a agitação
involuntário
do pensamento dá-se por um processo inquieto
Trôpego de elucubrações e de movimentos cerebrinos,
De respiração
ampliados e expandidos pelo agito corporal. Tudo
entrecortada, é inquietação, ansiedade, espasmo, nessa escrita
cansada.
sem fôlego, trôpega, a girar em signos moventes,
Caleidoscópico em estado alterado, em ritmo caleidoscópico.
Referente a
caleidoscópio, Vamos ver um exemplo? Primeiramente, iremos
objeto que incide
luzes difusas, a
notar o processo de “notação lírica” em seguida de
girar. “meditação”:
116 UNIUBE
EXEMPLIFICANDO!
EXEMPLIFICANDO!
Acreditamos que muitos leitores, hoje em dia, sintam certa empatia por
esse gênero. Como vivemos em uma era de permanentes mudanças,
em que a correria do cotidiano quase nos impossibilita de ler um
romance de grande fôlego, o conto surge como um texto de leitura
mais condensada, uma oportunidade de usufruirmos grandes aventuras
em um breve período de tempo. Podemos ler um conto no caminho
do trabalho, no nosso horário de almoço ou até mesmo durante um
intervalo de nossas tarefas do dia a dia.
SAIBA MAIS
Vamos em frente?
Paulillo afirma que o livro de Mário oscila entre “dois tipos de existência
ou temas, à primeira vista antagônicos, mas na verdade duas faces de
uma única medalha: o primeiro fala de uma experiência de plenitude, em
que o homem vive em vibrante harmonia, consigo mesmo e o mundo;
o outro trata de uma realidade irremediavelmente prosaica e solitária”.
Tais momentos se encadeiam num jogo de interdependência, num
emaranhado de significações indestrinçáveis, em que êxtase e angústia,
plenitude e vazio, se interpenetram, como realidades fatais e inexoráveis
da condição humana.
A palavra rito vem dos cerimoniais religiosos. Por ele, a gente executa
uma ação simbólica capaz de nos ligar a Deus. O gesto litúrgico da comunhão,
132 UNIUBE
PESQUISANDO NA WEB
O conto principia-se pela descrição feita pelo seu amigo Juca. Esse último
é o narrador. Vejamos como Mário delineia os aspectos físicos de sua per-
sonagem: “Frederico Paciência era aquela solaridade escandalosa. Trazia
nos olhos grandes bem pretos, na boca larga, na musculatura quadrada
da peitaria, em principal nas mãos enormes, uma franqueza, uma saúde,
uma ausência rija de segundas intenções” (ANDRADE, 1993, p. 80). Pela
descrição, podemos ver, antes de tudo, o portento físico de Frederico.
Além da extrema beleza, ele também é robusto, vigoroso, encarnando
as pulsões de uma masculinidade viril, forte. Do físico, podemos extrair
antecedentes de sua personalidade. Como iremos notar, Frederico também
tinha o espírito robusto, moralmente correto, honestíssimo.
A amizade dos dois jovens se acirra, ganha vulto, quando Juca intimida
Frederico, dizendo a este que ele era seu único amigo. A passagem, um
solilóquio repleto de sentimentos em tumulto, serve como ato inaugural
do amor em silêncio, sorrateiro, entre os dois jovens:
UNIUBE 137
Esses jogos cênicos fazem com que nos acerquemos de um drama silen-
cioso, de um sofrimento calado: o amor que se amordaça, que não toma
corpo, não ganha estatuto físico e concreto. Frederico, ao brigar com
seu caluniador, luta contra o medo, contra sua própria sombra. Afinal,
não havia mesmo um fato concreto a temer. Se os demais colegas
insinuavam um possível namoro entre os dois jovens, tal feito, todavia,
nunca existiu de fato, materialmente.
Bem, como você pôde notar, a obra de Mário é riquíssima. Fica o convite
à leitura de seus livros.
Resumo
Mário não foi apenas prosador, sua poesia também foi altamente
revolucionária, propondo, no cenário da lírica brasileira, as inovações das
Vanguardas Europeias. Poesia ao mesmo tempo arrebatada e prosaica,
de linguagem mista, num amálgama entre o prosaico e altamente lírico, a
poesia de Mário é um registro poético da São Paulo do início do século XX.
142 UNIUBE
Referências
BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 1994.
LAFETÁ, João Luiz. In: BOSI, Alfredo (org.). Leitura de poesia. São Paulo:
Ática, 2003.
Introdução
Neste capítulo, faremos um passeio pela Vila dos Confins, lugar ro-
deado de causos mineiros e disputas políticas. Vocês já estudaram
que a narrativa literária, a ficção, o romance permitem ao autor da
obra uma grande liberdade criativa. Apesar de toda obra literária
ser calcada na visão de mundo do escritor, encontramos, muitas
vezes, obras em que a representação do real e ficção estão
imbricadas de tal forma, que se torna difícil ao leitor distinguir as
duas situações.
Objetivos
Ao final deste capítulo, esperamos que você esteja apto a:
Esquema
5.1 A obra – situando os Confins
5.2 Submetendo os Confins às teses sobre regionalismo: é
possível confirmá-lo?
5.3 A trama e seus personagens
5.4 Conclusão
Você já ouviu falar sobre um lugar chamado Vila dos Confins? E Mário
Palmério, você sabe quem foi? Qual a contribuição da obra e do autor para
a nossa literatura?
146 UNIUBE
Antes de continuarmos nossos estudos, que tal fazermos uma parada para
pesquisarmos sobre autor e obra. Visite sites, livros de literatura e faça um
rápido registro, em seu caderno, das informações obtidas. Estas anotações
poderão ser muito úteis no decorrer de nosso estudo.
SAIBA MAIS
<http://www.releituras.com/cyroanjos_menu.asp>.
<http://www.releituras.com/guimarosa_menu.asp>.
<http://www.releituras.com/fsabino_menu.asp>.
Rachel de Queiroz, que prefaciou Vila dos Confins, diz que quando o
telefone tocou em sua casa, estranhou que um deputado que não era de
“sua bancada” quisesse falar com ela. Respondeu-lhe que o receberia
com muito prazer. A hora era de crise política, mas não era o deputado
que vinha lhe procurar, era o escritor. Trazia debaixo do braço um original
datilografado que queria que ela lesse. Palmério, como todo candidato a
estreante, apresentou-se tímido, tratou-a como “medalhona”, usou as
148 UNIUBE
AMPLIANDO O CONHECIMENTO
Desde a primeira edição até a mais recente, Vila dos Confins apresenta o
prefácio de Raquel de Queiroz.
SAIBA MAIS
<http://www.releituras.com/racheldequeiroz_bio.asp>
SAIBA MAIS
<http://www.arq.ufsc.br/arq5625/modulo2modernidade/manifestos/manifesto-
regionalista.htm>
Vila dos Confins foi classificado por Alfredo Bosi, junto com outras
obras, como “um regionalismo menor” (BOSI, 2003), amante do típico,
do exótico e vazado numa linguagem, que por seu apego a antigas
convenções narrativas, não poderia ser chamada de moderna. Contudo,
para esse crítico, no contexto mineiro/goiano pode ser considerado um
romance de boa fatura. O regionalismo de Mário Palmério é situado pela
crítica literária como um caso de permanência e transformação desse
gênero, e, segundo Bosi, contrapondo-se aos elementos tensos e críticos
anteriores.
AMPLIANDO O CONHECIMENTO
Considerado por muitos como o último crítico brasileiro por excelência, derra-
deiro representante de uma geração de críticos de literatura conhecidos
como “militantes”, Wilson Martins tem uma trajetória de mais de cinquenta
anos analisando, discutindo, polemizando, exaltando, rebaixando, em
UNIUBE 151
o Triângulo ainda não era o plantador de soja e milho que é hoje e nem
tampouco a referência nacional em gado zebu:
Alvarez (2006) entende que quando lemos um romance, uma voz está
nos contando uma história e essa voz é diferente de qualquer outra
que se tenha escutado e ela está falando diretamente com quem lê,
comungando com essa pessoa em particular, bem em seu ouvido e no
UNIUBE 157
seu jeito todo peculiar. Pode falar com você a partir de séculos atrás,
ou como se estivesse ali, do outro lado da sala. Os escritores criam um
momento da vida em si, se fazem ouvir e os leitores lhes dão ouvidos,
trabalham para criar ou encontrar uma voz que irá alcançar os leitores,
fazendo-os apurar os ouvidos e apurar a atenção.
Uma boa parte da crítica especializada acreditava que Vila dos Confins
alcançara o que Chiappini definiu como uma ponte que permite aos
leitores sair dos seus guetos citadinos, comunicando-se e aprendendo
sobre tantos outros becos do mundo. Mário
Palmério conseguiu que os leitores do meio urbano Newton Belleza
não se distanciassem preconceituosamente do Escritor, dramaturgo
homem do campo. Em sua análise, feita em O e crítico literário.
Jornal, Newton Belleza assim se manifestou:
Afrânio Coutinho (1976) entende que toda obra de arte é regional quando
tem por pano de fundo alguma região particular ou parece germinar desse
fundo, retirando sua substância do clima, da topografia, da flora, da fau-
na como elementos que afetam a vida humana na região, bem como das
maneiras peculiares da sociedade estabelecida naquela localidade e que
a fizeram distinta de outras. A Literatura Brasileira, segundo Coutinho, é
parte de uma cultura regionalmente diferenciada e inter-regionalmente
relacionada de grande importância para a crítica e história literárias.
Jorge Turco, sírio, solteirão, dono de uma venda na Vila, era quem
“hospedava” o deputado, e era em seu estabelecimento que ocorriam
as reuniões com os companheiros de diretório, correligionários: João
Soares, Antero, Tinoco, Jeová, Jerominho... As ausências também eram
anotadas e revelavam como andava o apoio. Não vieram o Alcindo
da coletoria, o Juvêncio, o Juiz de Paz. Intendente e delegado não
compareciam mesmo. Agora que Paulo fundara o diretório da União
Cívica, o Coronel Chico Belo não perdoaria aqueles que estavam
apoiando a candidatura de João Soares. Ainda não era prefeito e Chico
Belo mandava e desmandava. Grileiro de terras, chefe de uma tropa de
jagunços, controlava tudo pela força, pela violência.
A malária derrubou o deputado, que com febre alta, desmaiou frente aos
correligionários. Maneiroso, o tio Aurélio esquentou a conversa com os
pobres, buscando saber se entre ele e os hospedeiros não havia algum
ramo familiar em comum, afinal viviam na mesma região. Não seriam
primos distantes?
Foi firmado acordo entre o Secretário, Coronel Chico Belo e Osmírio, pelo
qual o governo se comprometia a baixar os atos de nomeação do Capitão
Otávio, do auxiliar da Coletoria, os três contratos das professoras e cinquen-
ta contos adiantados para a Campanha eleitoral que seriam descontados
na base de setenta e cinco mil réis por cabeça, mais mil votos para Osmírio
180 UNIUBE
como deputado estadual na região e Vila dos Confins estaria com o Secre-
tário que era candidato a deputado federal.
O capítulo vinte e dois de Vila dos Confins inicia-se com Paulo Santos
com água pelos joelhos, em virtude das chuvas que provocaram uma
enchente e o atolamento do carro no lamaçal resultante. Quase duas
semanas ausente tentando arrebanhar colaboradores e reerguer o
moral dos correligionários e agora a estrada daquele jeito! Uma dúvida
martelava-lhe o pensamento: teria sido realmente uma tocaia a pororoca
cortada e derrubada no meio da estrada? “A batida de foice no mato, o
amassado dos ramos onde o jagunço se amoitara, atrás do pé de ipê?
UNIUBE 181
Chico Belo foi até a frente da venda do Jorge Turco e leu o telegrama, não
dando o braço a torcer: “Eu bem sabia! Conheço muito esse oficial... Fui
apresentado a ele no palacete do dr. Carvalhinho: homem de confiança
do secretário. A troca foi pró-forma. Ora quem havia de ser – o Idôneo!
Meu companheiro de pif-paf...” (PALMÉRIO, 2003, p. 225).
UNIUBE 185
AMPLIANDO O CONHECIMENTO
Final do dia, urnas lacradas e sob proteção policial, Paulo vai descansar
depois de dois dias e duas noites sem dormir. Na segunda feira, o
deputado retoma as pescarias e ali, vigiando o caniço, rememora os
acontecimentos e as pessoas da Vila com quem conviveu nesse período
de campanha. Padre Sommer, companheiro na pescaria, desconfiado da
falsa tocaia armada por Paulo, passa-lhe um sermão. A apuração das
urnas começaria no dia seguinte ao meio dia. Eleição apertada essa de
Vila dos Confins! Dos mil e cem alistados, somente oitocentos e setenta
e nove compareceram.
Capador que estava com uma boiada de zebu das boas para atravessar
para a outra margem. Esta era a última viagem, que custo! Padre
Sommer e Aurélio iam também, Gerôncio já havia feito vinte e duas
travessias com o gado e a correnteza estava aumentando, a chuva tinha
sido forte à noite. Paulo falou com o padre: “Meu primeiro serviço no Rio
vai ser a verba para a ponte aqui no rio Urucanã (...) Na força da cheia, a
água espremida nestes barrancos arrebenta com qualquer cabo de aço.
Um perigo, este porto!” (PALMÉRIO, 2003, p.279). Só ficaram o deputado
e Xixi Piriá no barranco, Ritinha, com seu vestido vermelho de chita, ia
visitar dona Iaiá, na Vila.
5.4 Conclusão
SAIBA MAIS
Resumo
Referências
BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 2003.
HOUAISS, Antonio. Sobre a Linguagem de “Vila dos Confins”. Revista do Livro. Rio
de Janeiro: Órgão do Instituto Nacional do Livro (MEC) – n. 9, ano III, mar. 1958.
196 UNIUBE
LEMAIRE, Ria. O mundo feito texto. DECCA, Edgard Salvadori de LEMAIRE, Ria
(orgs) Pelas margens: outros caminhos da história e da literatura. Campinas,
São Paulo: Ed. da Unicamp, 2000.
PALMÉRIO, Mário. Vila dos Confins. Rio de Janeiro: Editora José Olympio
Ltda, 2003.