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PADD Prova de Análise e Despiste da Dislexia

Neuropsicologia Cognitiva Ÿ Copyright © Rui Manuel Carreteiro Ÿ Abril de 2003

Resumo

Várias evidências que sugerem que o leitor normal dispõe essencialmente de duas vias para
ler as palavras: uma baseada nos sons – via fonológica – e outra na em unidades maiores que
a letra – via ortográfica. Cada uma destas vias apresenta características diferentes, pelo que
quando uma delas se encontra lesada estamos perante uma dupla dissociação.
Partindo das teorias clássicas da leitura foi possível criar uma prova (PADD – Prova de
Análise e Despiste da Dislexia) constituída por vários subtestes que analisam o desempenho
do leitor face a um conjunto de critérios com vista ao despiste de perturbações fonológicas ou
ortográficas.

Sumário

O léxico mental é a parte da memória onde convergem os diferentes tipos de informação


que dispomos relativamente às palavras, necessários para a sua compreensão. Esta informação
é armazenada em unidades, sendo o fonema uma representação formal e abstracta dos sons
elementares.
Os anos 70 e 80 destacaram-se pelo aparecimento de vários modelos de leitura (Temple,
1997). Os trabalhos de Marshall & Newcombe (in Morais, 1997), evidenciaram duas
patologias raras mas bastante informativas sobre os mecanismos utilizados na leitura das
palavras: Dislexia profunda e dislexia de superfície.

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Registada na Inspecção Geral das Actividades Culturais
O termo dislexia, refere-se a um conjunto de alterações que têm em comum uma
perturbação ou atraso da aquisição e aprendizagem da leitura, na ausência de qualquer outra
alteração das capacidades intelectuais (Habib, 2000).
A dislexia profunda (fonológica) caracteriza-se pela ocorrência de erros semânticos (e.g.,
o sujeito lê “carro” no lugar de “roda”), bem como pela grande dificuldade na leitura da
pseudopalavras, facto que atesta uma perturbação severa do processo de conversão grafo-
fonológica (Morais, 1977).
É ainda típico destes pacientes um desempenho relativamente idêntico na leitura de
palavras regulares e irregulares, bem como a falta de sensibilidade para aspectos fonológicos
(Morais, 1997).
O facto dos sujeitos com esta perturbação não conseguirem ler todas as palavras
demonstra a importância da via fonológica para uma leitura eficaz, mas a existência de uma
via alternativa.
A dislexia de superfície, parece resultar de dano na via ortográfica. Estes sujeitos lêem
palavras e pseudopalavras quase com o mesmo nível de desempenho mas lêem muito melhor
as palavras regulares do que as irregulares, facto que muita vez conduz a regularizações
(Morais, 1997).

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Coltheart não nega que o acesso lexical se possa efectuar a partir de uma representação
fonológica, nomeadamente no caso da leitura de palavras complexas ou pouco familiares, mas
acredita que na leitura corrente e para um leitor sofisticado, o acesso lexical efectua-se
directamente a partir da informação ortográfica.
Os dados apresentados sugerem a existência de dois grupos de pacientes em que, por
oposição ao leitor normal, têm ora a via ortográfica ora a via fonológica afectada. Cada uma
destas vias apresenta características diferentes, pelo que quando uma delas se encontra lesada
estamos perante uma dupla dissociação.
Partindo das teorias clássicas da leitura foi possível criar uma teste (PADD – Prova de
Análise e Despiste da Dislexia) que analise o desempenho do leitor face a um conjunto de
critérios com vista ao despiste de perturbações fonológicas ou ortográficas.
A PADD é constituída por 5 subtestes, um dos quais apresenta um caracter suplementar.
Todos os subtestes que formam a PADD podem ser aplicados separadamente, no entanto
aplicação global proporciona uma informação mais rica.
Os subtestes de consciência articulatória, pretendem analisar a sensibilidade do sujeito no
que concerne à articulação dos órgãos fonéticos na produção da unidade formal e abstracta
dos sons – fonema.
No subteste de subtracção de fonemas é solicitado ao sujeito que retire o som inicial ou
final das palavras. Este subteste, baseado no “jogo do príncipe e da feiticeira” (Morais, 1997),
revela-se bastante útil e pode ser aplicado de uma forma relativamente simpática e apelativa a
crianças em idade pré-escolar.
O mesmo ocorre no subteste de troca de fonemas e no subteste de inversão de fonemas,
em que o sujeito deve ora trocar mutuamente os fonemas iniciais de duas palavras (e.g. “galo”
e “pêlo”, lê-se “guêlo”), ora inverter a ordem de aparecimento destas unidades na palavra.
O subteste de leitura é composto por seis listas que o sujeito deverá ler em voz alta: lista
1, palavras curtas e frequentes; lista 2, palavras curtas pouco frequentes: lista 3, palavras
compridas frequentes; lista 4, palavras compridas pouco frequentes; lista 5, pseudopalavras
curtas; lista 6 pseudopalavras compridas. Cada lista apresenta duas colunas: coluna A –
palavras regulares – e coluna B – palavras irregulares.
Em cada um destes subtestes é registado o tempo de latência para cada resposta, bem
como a resposta do sujeito, com vista à cotação da percentagem de erros.

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O subteste de memória auditiva imediata apresenta um carácter suplementar e
fundamenta-se no subteste de memória de dígitos proposto por Wechsler (1955). Pretende
verificar a existência de eventuais deficiências ao nível na memória auditiva que influenciem
negativamente a leitura.
Uma vez afastada a hipótese de dificuldades ao nível da memória e capacidade intelectual,
o padrão de resultados obtidos nos subtestes da PADD permite analisar o processo de leitura
bem como informar acerca de eventuais perturbações.
A ocorrência de dificuldades nas provas de consciência articulatória e consciência fonética
sugere problemas ao nível da via fonológica. Caso o subteste de leitura detecte dificuldades
na leitura de pseudopalavras e ocorram parafasias semânticas esta ideia surge reforçada.
Um desempenho razoável nos subtestes de consciência fonética e na leitura de
pseudopalavras que contraste com uma maior dificuldade na leitura de irregulares face a
regulares, bem como a ocorrência de erros de regularização, sugere perturbação na via
ortográfica.

Instruções de Aplicação

Generalidades
1. Preencher o cabeçalho da folha de protocolo com o nome, data de nascimento e
habilitações do aplicando, colocando a data da observação (se a aplicação se prolongar por
mais do que uma sessão colocar as datas do início e do fim) e o nome do técnico.

2. A PADD é uma prova que recorre a conhecimentos de Psicologia pelo que só deverá ser
aplicada por um psicólogo ou técnico com formação equivalente.

Subteste de Consciência Articulatória


1. Para o Subteste de Consciência Articulatória serão necessários os cartões estímulo.
Começar pelo cartão E, exemplificativo. O sujeito deve estar ciente de que as figuras
representam os órgãos envolvidos na produção dos sons. Identificar estes órgãos em conjunto
com o sujeito, prosseguindo apenas quando este tiver compreendido devidamente.

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2. Produzir os sons [p], [z], [t] e [a] solicitando a atenção do sujeito para a forma como se
conjugam os órgãos na produção dos sons. Quando o sujeito tiver compreendido, avançar
para a fase experimental. Note-se que não é um subteste fácil e mesmo muitos adultos
altamente letrados sentem dificuldades significativas na realização da tarefa proposta.

3. Pelo seu grau de complexidade, trata-se de um subteste cuja aplicação poderá ser saltada no
caso de crianças muito novas.

4. Assinalar a resposta do sujeito com um círculo em torno do número do carta escolhido. A


correcção das respostas deverá apenas ser realizada posteriormente quando a aplicação tiver
sido concluída.

Memória de Dígitos
Este subteste baseia-se na proposta de Wechsler para análise da memória seguindo o mesmo
procedimento indicado pelo autor nas suas escalas de inteligência.

Subtracção de Fonemas
1. Neste subteste o sujeito deve retirar ora o fonema inicial ora os fonemas finais da palavra.
É importante que o sujeito perceba que o subteste alude ao fonema e não as letras ou conjunto
de letras. Aliás o objectivo do subteste reside mesmo na análise da capacidade do sujeito em
fazer esta distinção.

2. Em crianças mais novas recomenda-se o recurso ao fantástico transformando a tarefa num


jogo. Por exemplo “imagina que uma feiticeira fazia desaparecer este bocadinho da palavra.
Que som(ns) é que ficava(m)?”.

Inversão de Fonemas
1. Ainda no domínio da análise da consciência fonética, é agora solicitado ao sujeito que
inverta a ordem do aparecimento dos sons na palavra. Não se trata de ler a palavra de trás para
a frente, mas antes de referir os sons de forma inversa.

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2. Trata-se novamente de um subteste complexo, particularmente ara crianças e iletrados. Em
caso de dificuldades notórias na inversão de dois fonemas, recomenda-se a não aplicação da
lista de três fonemas.

3. Sugere-se que anotação seja feita em função dos fonemas referidos pelo sujeito e não em
termos de certo ou errado. Este tipo de correcção deverá antes ser realizada no final.

Subteste de Troca de Fonemas


1. Deve o sujeito agora fundir o fonema inicial da primeira palavra (e.g. casa) com os
fonemas terminais da segunda palavra (e.g. barro, em que a resposta certa seria carro).

2. Em crianças mais novas sugere-se novamente o recurso à fantasia como no jogo do


príncipe e da feiticeira.

3. Sugere-se que anotação seja feita em função dos fonemas referidos pelo sujeito e não em
termos de certo ou errado. Este tipo de correcção deverá antes ser realizada no final.

Leitura de Palavras
1. O subteste de leitura de palavras pode ser aplicado de duas formas diferentes consoante se
está a analisa o processo de escrita (despiste da disortografia) ou da leitura (dislexia). A
diferença reside em se é solicitado que o sujeito escreva ou leia as palavras constantes nas
listas.

2. Para cada uma das listas deve ser anotado (em frente das palavras) a resposta do sujeito
(lida/escrita) para correcção futura da quadricula à frente apresentada.

3. O subteste e formado por 6 listas de palavras: Lista 1 – palavras curtas frequentes (PCF),
Lista 2 – palavras curtas pouco frequentes (PCPF), Lista 3 – palavras compridas frequentes
(PCpF), Lista 4 – palavras compridas pouco frequentes (PCpPF), Lista 5 – pseudopalavras
curtas (PpC) e Lista 6 – pseudopalavras compridas (PPCp).

4. Cada uma destas listas apresenta duas colunas – coluna A, constituída por palavras
regulares e coluna B, constituída por palavras irregulares.

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5. Para cada listagem deve ser anotado o total de respostas correctas e incorrectas com vista à
cotação e comparação das percentagens de sucesso com vista ao enquadramento no
diagnóstico.

Outros
Paralelamente à aplicação da PADD recomenda-se a aplicação de um teste de inteligência a
fim de exc luir a hipótese de dificuldades intelectuais, bem como uma prova grafo-perceptiva.
Poderá ser ainda importante a exclusão da hipótese se dificuldades visuais e/ou auditivas.

Referências

Habib, M. (2000). Bases neurológicas dos comportamentos. Lisboa: Climepsi Editores

Morais, J. (1997). A arte de ler Psicologia cognitiva da leitura. Lisboa: Edições Cosmo.

Temple, C. (1997). Developmental cognitive neuropsychology. United Kingdom:


Psychology Press.

Wechsler. D. (1955). Manual, Weschsler Adult intelligence Scale. New York:


psychological Corporation.

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