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Edição n.º 2 | março 2023
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Ministro das Finanças lembra que se trata de “um caso de um banco regional, AO ENCONTRO DO NOSSO PATRIMÓNIO
CAMINHOS DE SANTIAGO
nsustentável
SNS POR
UM FIO
Nem Manuel Pizarro nem Fernando Araújo
estão a conseguir mudar o paradigma do Serviço Nacional
de Saúde, que continua a degradar-se
com falta de profissionais e de investimento. Resistirá?
A opinião de Álvaro Beleza, Alexandra Bento, Ana Rita Cavaco,
Carlos Cortes, Ema Paulino, Filipe Costa, Joana Bordalo e Sá, Joana
Cordeiro, João Dias, João Varandas Fernandes, José Manuel Silva,
Luís Filipe Pereira, Luís Pedroso de Lima, Miguel Guimarães,
Óscar Gaspar, Pedro Frazão, Rui Cristina e Sofia Ramalho
// PÁGS. 2-23
Jornal i 2,5 € // Terça-feira, 14 março 2023 // Ano 13 // Semanário // Número 3872 // Diretor: Mário Ramires // Dir. exec.: Vítor Rainho // Dir. exec. adjunto: José Cabrita Saraiva // Dir. de arte: Francisco Alves
EDITORIAL
É urgente
um compromisso
intergeracional
A
Radar
Mário Ramires
Caos e desespero.
e a destempo é o seu funcionamento.
Como é assim na Habitação, em que as propostas total-
mente inconstitucionais de governantes que aliam a
inexperiência à insensatez – faz confusão ouvir uma
Assim vai o
jovem ministra e um pós-adolescente secretário de
Estado despejarem um argumentário sem fazerem a
mínima ideia dos disparates que dizem – já começam a
motivar contrapropostas que só podem ter-se como
estado da saúde
brincadeiras de mau gosto, de tão alucinadas (para não
dizer criminosas) como as que já vão sendo avançadas
por alguns opinadores da nossa praça (v.g. João Duque
no Jornal das 2 da SIC-N neste sábado).
em Portugal
E a Saúde? Nem se fala!!! Portugal nunca teve tantos
hospitais, tantos médicos, tantos profissionais de saúde,
mas os serviços, de urgência e todos os outros, estão
cada vez mais à beira da rutura. Da natalidade aos cui-
dados continuados e paliativos. Já para não falar no que
se passa país fora com a falta de qualidade da assistên-
cia aos mais idosos.
Com tanto dinheiro a vir da Europa (entre PRR e outros
fundos), Portugal tem uma oportunidade única para A relação não tem DANIELA SOARES FERREIRA do da saúde em Portugal. E as
restaurar a esperança. sido fácil nem para daniela.ferreira@ionline.pt queixas multiplicam-se.
Há que atalhar caminho, urgentemente, antes que seja médicos, com fechos SÓNIA PERES PINTO O caso mais recente é a demis-
tarde e a oportunidade volte, uma vez mais, a perder-se. de serviços e pedidos sonia.pinto@ionline.pt são dos chefes de equipa de
O Estado chamou a si as funções essenciais na Educa- urgência de Medicina Interna
ção, na Justiça, na Habitação, na Saúde… E está a
de demissão em bloco, Demissões em bloco de chefes do Hospital São Francisco Xavier,
falhar clamorosamente em todas elas. Não vale nem para doentes de equipa de urgências, falta de em Lisboa, que apresentaram
a pena insistir no erro. que se deparam médicos de família – as últimas a demissão em bloco numa car-
Um país em envelhecimento acelerado não pode não com filas de espera contas apontam para mais de ta enviada esta segunda-feira ao
investir na natalidade e na educação, não criar oportu- intermináveis tanto um milhão, em que as situações conselho de administração, cri-
nidades para os seus jovens, continuar a asfixiar os seus para consultas mais graves verificam-se em Lis- ticando a falta de soluções para
trabalhadores e os seus empreendedores, não ter uma como para cirurgias. boa e Vale do Tejo – encerra- os problemas do serviço.
justiça atuante e capaz de responder às demandas da Urgências são mentos de serviços e listas de As urgências pediátricas são
sociedade e da economia, não ter como cuidar dos espera para cirurgias sem fim. outros dos problemas que o setor
doentes e muito menos descurar os seus mais velhos.
o principal calcanhar Mas as verdadeiras dores de enfrenta. O ministro da Saúde
Sem esse compromisso intergeracional que faça renas-
de Aquiles. cabeça ocorrem nas urgências, já avisou que vai demorar algum
cer a esperança, não há ‘bazuca’ que nos valha. Apenas com serviços cheios, horas inter- tempo até se conhecer o plano
um Estado apodrecido, sem presente digno nem futuro. mináveis de espera. É este o esta- de reorganização das urgências
pediátricas de Lisboa e Vale do não têm a vida mais facilitada. entanto, apesar de ter diminuí- espera aumentaram entre 15,2% to de alguns doentes verem as
Tejo que já devia ter sido divul- Os tempos máximos de espera do ligeiramente o incumprimen- e 21,9% nas consultas no domi- suas consultas e cirurgias adia-
gado. E defende que é preferí- no Serviço Nacional de Saúde to, a lista de espera para cirur- cílio, e entre 2,9% e 10,4% nos das, mas isto também é uma
vel aguardar algum tempo e ter (SNS) voltaram a aumentar, sobre- gias continua a aumentar. No pedidos de renovação de medi- luta pelos doentes, para que
um sistema mais seguro. Ainda tudo nas cirurgias cardíacas e primeiro semestre deste ano, cação, em ambos os casos entre tenham acesso e qualidade à
esta segunda-feira, a direção oncológicas durante o ano de mais de 167 mil doentes aguar- janeiro e junho deste ano. prestação de cuidados médicos
Executiva do Serviço Nacional 2021 e os primeiros seis meses davam por uma operação. Já Para este ano, o ministro da no Serviço Nacional de Saúde”,
de Saúde publicou o plano de de 2022, informou a Entidade nas primeiras consultas de espe- Saúde acenou com a realização chegou a dizer a presidente do
reorganização para as urgên- Reguladora da Saúde (ERS). cialidade realizaram-se mais de de mais de 12 326 000 consul- sindicato, Joana Bordalo e Sá.
cias de pediatria da área de Lis- Os números analisados pela 587 mil a pedido dos centros de tas (mais 15,7% face a 2019), mais Os médicos reclamam novas
boa e Vale do Tejo. Só três ficam ERS mostram que, apesar do saúde, mas piorou (37%) o incum- de 3 657 000 primeiras consul- grelhas salariais bem como o
de fora deste horário, funcio- aumento das cirurgias e consul- primento dos prazos máximos tas hospitalares (mais 29,7% face redimensionamento da lista de
nando apenas das 9h às 21h: tas relativamente ao primeiro previstos na lei. Já as consultas a 2019) e mais de 660 000 cirur- utentes dos médicos de família,
Hospital de Loures, Torres Vedras, semestre de 2021, a lista de espe- de cuidados de saúde primários gias (mais 38% comparativa- a dignificação das condições de
do Centro Hospitalar do Oeste, ra continua a aumentar. Nos pri- também sofreram atrasos signi- mente a 2019). E reconhecendo trabalho e a valorização da car-
e São Francisco Xavier, Centro meiros seis meses, um doente ficativos: as taxas de incumpri- que os elevados tempos de espe- reira, que inclua um horário-
Hospitalar Lisboa Ocidental. oncológico esperou em média mento nos prazos máximos de ra nos serviços de urgência dos base de 35 horas (a maior par-
Esta estratégia resulta de “lon- 27,5 dias (em 2021 esperou 21,5 hospitais são “um problema cró- te dos médicos no SNS trabalha
gas semanas de trabalho, com dias) pela cirurgia com a taxa nico” que só poderá ser resolvi- 40 horas por semana) e a dedi-
os profissionais das várias ins- de incumprimento de 22% (mais do com “medidas integradas em cação exclusiva opcional.
tituições que estão no terreno, um ponto percentual do que em todo o sistema”. Na última década (2011-2022),
com a ponderação e diálogo 2021) a crescer nas cinco regiões o aumento do número de pro-
necessários, visando a constru- de saúde. Para cerca de 51%, a RAIO-X Também a relação do fissionais, sobretudo desde 2015,
ção de respostas que visam asse- primeira consulta não respeita Número de Governo com o setor não tem foi anulado pelo aumento do
gurar a proximidade e o acesso o tempo previsto (em 2021, esta médicos perto da sido pacífica. Com todas as falhas número de profissionais que tra-
da população ao SNS, sublinhan-
do a enorme generosidade e
percentagem era de 32%). Quan-
to à cardiologia, houve mais pri-
reforma tem vindo que têm existido no SNS, os médi-
cos estiveram recentemente em
balham em tempo parcial e pelas
alterações aos horários de tra-
esforço dos profissionais”, diz a meiras consultas do que no ano a aumentar e sem greve numa paralisação de dois balho (regresso às 35 horas). Esta
DE-SNS em comunicado. passado, mas a grande maioria solução à vista dias convocada pela Federação é uma das principais conclusões
E se o Governo deu 1 177 milhões dos utentes espera mais do que Nacional dos Médicos (FNAM). do Relatório Recursos Huma-
de euros no Orçamento do Esta- o que está definido na lei. “Não temos outra alternativa nos em Saúde, elaborado no âmbi-
do para a Saúde só este ano, um Nos primeiros seis meses do “O fim das PPP neste momento. O Governo e to da Iniciativa para a Equidade
aumento de 10,5% em compara- ano passado, nas várias especia- foi uma péssima esta equipa ministerial estão a Social, uma parceria entre a Fun-
ção com o orçamento inicial de
2022, é insuficiente para dar res-
lidades foram realizadas no SNS
mais de 265 mil cirurgias pro-
notícia para os empurrar-nos para isso. Infeliz-
mente não era a medida que
dação “la Caixa”, o BPI e a Nova
SBE que revela ainda que a capa-
postas tanto aos profissionais gramadas – um aumento de 18% portugueses, para o queríamos tomar e lamentamos cidade do SNS “depende, entre
como aos utentes que também em relação ao ano anterior. No SNS e para o país” desde já profundamente o fac- continua na página seguinte >>
>> continuação da página anterior lação particularmente envelhe- resolver. Segundo os dados mais to destas saídas ao nível, por no mesmo período, apesar da
cida, com elevada prevalência atuais – que dizem respeito a exemplo, da manutenção da capa- quebra significativa em 2022,
outros fatores, do número de de doenças crónicas e hábitos dezembro de 2021 – cerca de cidade formativa no SNS”. face ao aumento da inflação)” e
horas trabalhadas e não do núme- de vida pouco saudáveis”. um quarto dos médicos (24%) os autores do estudo referem
ro de profissionais. Concluindo No entanto, os responsáveis inscritos na Ordem tinha mais E A EXAUSTÃO? O mesmo relató- que o período de recuperação
assim que ‘o esforço financeiro alertam para as limitações “que de 65 anos, “o que faz antecipar rio fala ainda na exaustão e na registado antes da pandemia
realizado foi canalizado para a impedem uma justa compara- uma vaga de aposentações nos perda do poder de compra dos “não foi suficiente para recupe-
recuperação e não para a expan- ção”, mas defendem que Portu- próximos anos, cenário que atin- profissionais de saúde. “A dete- rar significativamente as difi-
são da capacidade’”. gal é o país da OCDE com maior girá o seu pico na presente déca- rioração da atratividade do SNS culdades sentidas durante a cri-
O estudo elaborado por Pedro número de médicos por mil habi- da (2020–2030), com um expec- tem vindo também a ser refor- se financeira e para fazer face
Pita Barros e por Eduardo Cos- tantes (5,5 médicos por cada mil tável volume médio de aposen- çada pela diminuição da com- à dinâmica recente de preços”.
ta mostra que, apesar do núme- habitantes). Por outro lado, sur- tações anuais superior a 450”. petitividade das condições remu-
ro de profissionais de saúde no ge entre os dez países com menos Este envelhecimento é menos neratórias, fruto da evolução PPP VS POLÉMICAS As famosas
nosso país tenha “crescido de enfermeiros (7,1 enfermeiros expressivo nos enfermeiros mas negativa das mesmas”. E deixa Parcerias-Público-Privadas (PPP)
forma contínua” – tendo em con- por mil habitantes) e é mesmo o estudo garante que “afeta dire- números: é que, enquanto o ganho foram lançadas no Governo de
ta que entre dezembro de 2014 o país da OCDE com o rácio de tamente o planeamento dos recur- médio nacional subiu 23% entre António Guterres, em 2001, mas
e junho de 2022 se verificou um enfermeiros por médico mais sos humanos em saúde, uma vez 2011 e 2022, no caso dos médi- foram concretizadas durante um
aumento global de 29% com mais baixo (1,3 enfermeiros por médi- que a proporção de médicos enve- cos observou-se um decréscimo outro Executivo socialista, pelas
35% de médicos internos, 25% co, em contraposição à média lhecidos não só reduz o núme- de 5% (em parte explicado pelas mãos de José Sócrates e que vol-
de médicos especialistas e 35% dos restantes países que apre- ro de profissionais disponíveis aposentações) e no caso dos enfer- taram entretanto para a respon-
de enfermeiros – o aumento da sentam um rácio de 2,7 enfer- para trabalhar em período notur- meiros o ganho médio subiu 14%, sabilidade do Estado. Ainda na
procura por cuidados de saúde meiros por cada médico). no ou na urgência, como permi- no mesmo período. semana passada, o ministro da
e a sofisticação técnica “esbatem te antever, para a presente déca- “A comparação entre a evolu- Saúde defendeu que “não hou-
os ganhos obtidos pelo aumen- O PROBLEMA DO ENVELHECIMEN- da, a aposentação de cerca de 5 ção das remunerações reais e a ve decisão política” de terminar
to do número de profissionais TO E se o número de profissio- mil médicos”. E deixa sugestões: evolução do poder de compra, com as PPP e as que não foram
de saúde”. O relatório revela tam- nais não é elevado, a idade é “‘O planeamento atempado des- evidencia que, em 2022, os médi- renovadas foi por “recusa legí-
bém que Portugal “apresenta também um problema. É sabi- sas aposentações é fundamen- cos perderam 18% do poder de tima” dos privados em manter
fortes desequilíbrios na força de do que o número de médicos tal para minimizar disrupções compra face a 2011, e os enfer- o contrato durante a renovação,
trabalho em saúde, o que acen- portugueses perto da reforma no normal funcionamento dos meiros perderam 3% (em média, nomeadamente os hospitais de
tua a dificuldade para fazer face tem vindo a crescer e isso é vis- cuidados de saúde’ adiantam os os trabalhadores nacionais viram Loures, Braga e Vila Franca de
às necessidades de uma popu- to com um problema claro a investigadores, frisando o impac- o seu poder de compra subir 6% Xira. A única exceção é Cascais.
Contradições.
O “amor/ódio”
de Marta Temido
pelo setor privado
Opinião
LUÍS FILIPE PEREIRA
Opinião
MIGUEL
GUIMARÃES
Saúde em mudança?
O que falta?
Na Saúde, Portugal distinguia-se das outras carreiras para que
de outros países europeus pela sejam criadas as condições ade-
qualidade do seu serviço públi- quadas, incluindo as salariais,
co. Na verdade, durante muitos para cativar os médicos e outros
anos, apesar das dificuldades profissionais, e equilibrar o capi-
próprias de um país com recur- tal humano no SNS. Falta
sos limitados, o nosso SNS per- modernizar o SNS e torná-lo
mitiu a democratização do aces- competitivo. O SNS não vive sozi-
so a cuidados de saúde. O que nho em Portugal e tem a Europa
falta então a Portugal para recu- a olhar para nós. Ou somos com-
perar o tempo perdido? O que petitivos ou corremos o risco da
falta ao SNS para que os médi- situação atual se agravar. Falta
cos e outros profissionais optem um novo modelo de gestão que
em primeiro lugar por ficar a permita aos hospitais e ACeS
trabalhar no serviço público? terem autonomia, mais governa-
Os princípios fundadores do ção clínica e mais flexibilidade
SNS já não são cumpridos. A sua nos processos de gestão. Falta
genética está a desintegrar-se. implementar a verdadeira trans-
Por exemplo, a dignidade das formação digital, com o processo
pessoas nos cuidados de saúde clínico único à cabeça. Falta
já teve melhores dias. A equida- libertar os médicos de tarefas
de no acesso a cuidados de saú- administrativas e burocráticas e Privados têm mais de 11 mil camas para internamentos
de nunca foi universal e a situa- melhorar os procedimentos
ção tem-se agravado de forma informáticos, dando mais tempo
substancial nos últimos anos.
Escapa a solidariedade porque
está basicamente na dependên-
aos médicos para os seus doen-
tes. Falta mais cuidados integra-
dos e menos cuidados fragmen-
Hospitais. Qual o peso
cia dos impostos que pagamos.
As dificuldades que temos hoje
no SNS já têm uns anos de evo-
lução e a tão propalada mudan-
tados. Esta situação é evidente
quando confrontamos os hospi-
tais e os cuidados de saúde pri-
mários. Falta aumentar o investi-
dos privados no setor?
ça tarda em acontecer. mento em investigação, inova-
Mais de 1.5 milhões de cidadãos ção e qualidade. Faltam mais
não têm médico de família atri- cuidados continuados e paliati-
buído. Continuamos a derrapar vos. Falta implementar uma ver- Desde 2016 que os hospitais privados predominam
de forma preocupante nos tem- dadeira reforma hospitalar que em relação aos públicos e PPP. Já são 129 no total.
pos máximos de resposta garan- também inclui o serviço de
tidos para consultas, cirurgias e urgência. Falta criar um Institu-
exames. Os serviços de urgência to Público, independente e finan- JOANA MOURÃO CARVALHO A atividade dos hospitais privados já ascen-
continuam instáveis e sem ciado através do OE, que se dedi- joana.carvalho@ionline.pt de aos dois mil milhões de euros e o setor
reforma à vista. Umas vezes que em exclusividade a promo- emprega mais de 40 mil profissionais (40510),
encerram outras estão abertos. ver a saúde, a prevenir a doença Os hospitais privados têm uma posição cada dando resposta a mais de 8,4 milhões de
Continuamos com um défice e a educar os cidadãos para a vez mais preponderante no setor da saúde consultas médicas, 1,9 milhões de episódios
significativo a nível dos cuidados saúde e para a utilização dos ser- em Portugal. Desde 2016 que predominam de urgência e 338 mil cirurgias.
continuados e paliativos. A viços de saúde (com professores, em relação aos hospitais públicos de aces- Além destes, há um outro dado que suge-
reforma da saúde pública aguar- engenheiros,...). E as faltas e so universal ou em parceria público-priva- re que os utentes cada vez mais recorrem
da melhores dias. E por aí fora. situações podiam continuar. Por da, sendo que até 2022 estavam em funcio- aos operadores privados de saúde: o núme-
Na verdade a saúde em mudan- exemplo, tive agora a notícia que namento 129, com uma oferta de 11600 ro de pessoas que se precaveu quanto às des-
ça que todos desejamos ainda se demitiram das suas funções camas de internamento, de acordo com pesas com cuidados de saúde. Ao todo, já há
não está a acontecer. O que falta? de chefe de urgência mais um dados da Associação Portuguesa de Hospi- mais de 5 milhões de portugueses a benefi-
Falta um plano para a saúde em conjunto de médicos de medici- talização Privada (APHP). ciar de um seguro privado de saúde ou de
Portugal que seja consistente e na interna, desta vez do hospital Entre as maiores redes de cuidados de saú- um subsistema de saúde. Destes 3,3 milhões
claro, para que todos os cidadãos S. Francisco Xavier. É urgente de privados em Portugal estão a Luz Saú- têm seguros de saúde, sendo esta a maior
o entendam. Um plano que que a mudança aconteça. de, detida pela seguradora Fidelidade, a fatia da atividade dos hospitais privados.
transmita confiança aos doentes Lusíadas Saúde, adquirida no final do ano Ao longo dos últimos anos tem-se verifica-
e aos profissionais de saúde. Fal- Ex-Bastonário da Ordem passado pelos franceses da Vivalto Santé, a do um aumento progressivo no volume de
ta a revisão da carreira médica e dos Médicos Trofa Saúde e a CUF, que pertence ao Gru- seguros privados subscritos pela população,
po José de Mello. tal como aponta o estudo “Seguros de saúde
Números
Opinião
129
CARLOS
CORTES
40510
O número de funcionários
O momento atual
dos hospitais privados já Vivemos momentos delicados no a solução para a sobreutilização
ultrapassa os 40 mil setor da Saúde e no Serviço Nacio- das urgências hospitalares.
nal de Saúde (SNS) em particular. A criação de mega-serviços de
338
Fatores internos, mas sobretudo urgência não resolverá nem a falta
externos, causam impactos pro- de recursos humanos, nem o exces-
fundamente negativos na resposta so da afluência de doentes com
do setor público que se agudiza- motivos não-urgentes.
Os hospitais privados realizaram ram com os choques de crises eco- Bem pelo contrário...
338 mil cirurgias no ano passado nómica, financeira e de saúde A resposta não está na Urgência,
pública com a pandemia COVID- mas fora dela.
2000
19. O impacto social tem sido avas- A falta de alternativas para as
salador. situações menos graves, a dificul-
A verdade é que estamos a atraves- dade de acesso aos cuidados de
sar mais uma fase difícil do SNS, saúde primários ou às consultas de
A atividade dos hospitais quer devido à escassez de recursos ambulatório dos hospitais faz com
privados ascendeu aos humanos, técnicos, financeiros e que a população opte pela urgência
dois mil milhões de euros de infraestruturas obsoletas e hospitalar. Por outro lado, a falta
depauperadas, quer ao nível da de uma rede de apoio social tam-
3,3
organização e do modelo de ges- bém contribui para o número
tão. O mais grave, a meu ver, é a expressivo de episódios de urgên-
desigualdade no acesso aos cuida- cia em Portugal. O diagnóstico está
dos de saúde em que existem não estabelecido há muito tempo.
Cerca de 3,3 milhões só diversos modelos de estrutura- Demasiado tempo.
MAFALDA GOMES de portugueses têm ção e gestão como desigualdades Os problemas dos Serviços de
um seguro de saúde regionais inadmissíveis. Os cerca Urgências são a face mais visível
de 1,4 milhões de portugueses sem de um problema de fundo do SNS.
8,4
privados no sistema de saúde português: Médico de Família residem, maio- A criação de uma rede de interven-
mitos e factos”, elaborado pelo profes- ritariamente, na área de Lisboa, ção social é prioritária. A melhoria
sor de Economia da Saúde da Nova SBE Alentejo e Algarve, o que acaba da literacia em Saúde, o aprofunda-
Pedro Pita Barros com o investigador por ter um grave impacto sobre os mento nas áreas tecnológicas e
Eduardo Costa. Desde 2000, o número Os hospitais privados foram Serviços de Urgências que assim digitais na informação e comunica-
de apólices de seguros de saúde mais responsáveis por mais de 8,4 se tornam incapazes de responde- ção são também um caminho
que duplicou, de 14% para 32% em 2021. milhões de consultas médicas rem a todas as solicitações. Cada essencial de futuro. A moderniza-
vez mais, a necessidade de ter cui- ção dos serviços de Saúde é essen-
1,9
OUTRAS ATIVIDADES DO SETOR PRIVADO dados de saúde em Portugal, inde- cial sem nunca esquecer a humani-
NA SAÚDE A presença dos privados na pendentemente da sua natureza, zação dos cuidados.
saúde não se faz apenas sentir nos hos- afunila nos Serviços de Urgência Nunca haverá investimento finan-
pitais. O setor privado da saúde é cons- abertos 24h por dia para qualquer ceiro suficiente de qualquer Orça-
tituído por mais de 30 mil empresas e Os hospitais privados deram problema de saúde. Nenhum país mento do Estado, caso se perpetue
emprega mais de 140 mil pessoas, englo- resposta a 1,9 milhões do mundo resiste a este grau esta gestão ineficiente e o receio
bando as farmácias (cerca de 3 mil), as episódios de urgência extremo de “urgencialização” de de mudanças profundas, mas
empresas de prestação de cuidados de todo o sistema. necessárias.
30000
saúde em internamento (397 entidades), A desmotivação, as dificuldades de A Ordem dos Médicos assumirá o
passando pelas atividades de prática captação e fixação no SNS, num seu papel na busca de soluções que
médica de clínica geral (3557) e especia- círculo vicioso imparável, resultam compatibilizem a necessidade de
lizada (7718) em ambulatório, como a em saída de profissionais para o dignificar a profissão médica, a
produção (197) e distribuição (980) de O setor privado da saúde setor privado, social, em emigração revisão da carreira médica e o
medicamentos, produção de dispositi- é constituído por mais ou até em abandono da profissão melhor interesse dos doentes.
vos médicos (666), análises clínicas (240) de 30 mil empresas médica. Reaprendemos com a pandemia o
ou centros de enfermagem (397). O papel da Ordem dos Médicos, real e profundo valor da solidarie-
22000
De acordo com um estudo encomen- sobretudo neste contexto, é fulcral dade, da entreajuda e do envolvi-
dado à Informa/D&B pelo Conselho Estra- na procura de soluções consisten- mento de todos os setores da socie-
tégico Nacional de Saúde (CENS) da CIP tes e estruturantes, em colabora- dade nos problemas da Saúde.
– Confederação Empresarial de Portu- ção com os vários intervenientes O momento atual impõe coragem e
gal, divulgado no início deste ano, as Em 2021, as empresas no setor da Saúde. capacidade de agregar. Só falta o
empresas privadas de saúde em Portu- privadas de saúde (incluindo, Mas, a meu ver, há que acautelar Ministério da Saúde desempenhar
gal realizaram negócios de cerca de 22 por exemplo, farmácias, outras circunstâncias e não adotar esse papel.
mil milhões de euros em 2021, tendo o laboratórios de análises sistematicamente o aumento da
setor gerado um Valor Acrescentado e venda de equipamentos) estrutura física da Urgência como Bastonário da Ordem dos Médicos
Bruto (VAB) de 6297 milhões de euros. geraram 22 mil milhões de euros
Álvaro Beleza.
“Os centros de saúde
não podem ter
um horário de banco
que fecha às 18h”
Para o médico, a solução passa acima de tudo pela
prevenção e até sugere a mudança de nome do Ministério
da Saúde para Bem Estar. Álvaro Beleza defende
também a criação de uma espécie de cadastro clínico,
em que através do cartão de cidadão, o doente em
qualquer unidade de saúde pública ou privada tenha os
seus dados e evite a realização de exames desnecessários.
SÓNIA PERES PINTO de tratar essas pessoas, nomea- rem. Por isso, é necessário gerir,
sonia.pinto@ionline.pt damente na oncologia, a mor- em conjunto, os cuidados pri-
talidade aumentou, porque algu- mários, os hospitalares e os con-
Como vê o estado da saúde em mas não tendo acesso a trata- tinuados. E por isso só faz sen-
Portugal? Há um antes e um mento a tempo e horas, a tido se dividirmos o país em uni-
depois da pandemia? mortalidade subiu e depois esta- dades locais de saúde – ou que
Vejo as dificuldades que todos mos a tentar recuperar todo poderá ter outro nome, gostaria
os serviços de saúde estão a atra- esse período. E a acrescentar a mais de unidades integradas de
vessar, após a pandemia. As difi- isto, a pandemia tal como as saúde – que integrem cuidados
culdades do SNS e da saúde em guerras trazem evoluções tec- para gerir melhor os cuidados.
geral representaram um cho- nológicas extraordinárias e esta Acabei de ir ver um doente à alguns centros de saúde possam há outra ferramenta absoluta-
que que todos os países apanha- pandemia também trouxe, urgência geral de Santa Maria e estar abertos até à meia-noite mente essencial para melhorar
ram, nomeadamente os mais nomeadamente na medicina. está cheio de doentes. ou até outras horas que se enten- a gestão que é a digitalização.
ricos porque também foram Mas já existia... E com horas de espera der que devem estar abertos, Temos que acelerar a digitali-
aqueles que foram mais afeta- A evolução da medicina e da ciên- intermináveis? como os serviços de pediatria e zação do sistema de saúde e aí
dos pela pandemia. Isto porque cia já existia, mas acelerou imen- Mas porquê? Não é que isto vá outras patologias e que não sejam não é só o SNS, mas de todo o
a pandemia afetou em especial so e, ao mesmo tempo, estão a resolver tudo, mas deverá haver assim tão graves, se possam diri- sistema de saúde. Temos de per-
os mais velhos e os países que aparecer novos medicamentos uma gestão que esteja a gerir o gir a uma urgência dos cuida- mitir que as pessoas com um
têm mais velhos são os mais com efeitos terapêuticos extraor- hospital de Santa Maria, os cui- dos primários. Mas isto tem de cartão de cidadão quando vão a
desenvolvidos. Estamos a falar dinários, mas que são caríssi- dados primários à volta – cen- ser gerido em conjunto. qualquer unidade de saúde públi-
da Europa, dos Estados Unidos, mos. É evidente que a indústria tros de saúde e USF [Unidades Mas os centros de saúde ca ou privada tenham o seu cadas-
do Canadá e do Japão. São paí- quando descobre um medica- de Saúde Familiar] – para, por continuam a fechar cedo... tro clínico – os exames que já
ses que têm a população mais mento novo já se sabe que vai exemplo, em algumas circuns- As unidades de saúde familiar fez, as TAC, análises, etc. – e isso
idosa por causa do desenvolvi- cobrar preços mais altos, pelo tâncias ou em épocas do ano, ou os centros de saúde em algu- vai diminuir o número de exa-
mento económico. África foi menos, até haver concorrência mas circunstâncias não podem mes complementares que vai
muito menos atingida, porque e até haver genéricos. Portanto ter um horário de banco que ter de fazer, porque muitas vezes
a longevidade média não che- estamos perante uma tempes- fecha às 18h. Têm de estar aber- repetem-se exames, consultas
ga aos 50 anos. O que aconte- tade perfeita. Voltando a Portu- Se todos vivermos tos até tarde e ao sábado e domin- porque o sistema não comuni-
ceu? Por causa do confinamen- gal, está-se a tentar ir pelo rumo go. Isso existe nas ULS, como ca, mesmo dentro do SNS e, às
to, em que estivemos quase dois certo, mas o que é que é preci-
até aos 90 anos são geridas em conjunto gerem vezes, dentro do mesmo hospi-
anos confinados, deixámos de so fazer? Melhorar a gestão do vamos ter cancro, melhor o acesso às urgências. tal público. Isto porque tem vários
tratar outras patologias, nomea- SNS. A questão central é gerir mas deixou de Temos de distribuir, espalhar o sistemas informáticos, por isso
damente a oncologia. As pes- melhor os serviços públicos: hos- serviço de urgência naquilo que é preciso informatizar de manei-
soas vivem mais anos, mas vivem pitais e cuidados primários e a matar como matava pode ser espalhado por várias ra a que se ligue tudo: os cuida-
mais anos melhor, já que a medi- chave aí é o caminho que está a unidades mais pequenas, ao mes- dos primários, hospitalares, con-
cina evoluiu. Se todos vivermos ser seguido, mas que vai demo- O que é preciso mo tempo, tem que se concen- tinuados e público/privado e
até aos 90 anos garantidamen- rar anos, porque essa mudança trar o que é preciso concentrar. social. Isto está a ser feito, os
te vamos ter um cancro, seja não se faz de um dia para o outro.
fazer? Melhorar a Se por um lado, precisa de con- serviços partilhados estão a avan-
homem ou mulher. A questão É preciso ligar o que tem de ser gestão do SNS. É centrar, por outro lado, precisa çar com isso e essa revolução
é que o cancro deixou de matar ligado, isto é, também se apren- preciso gerir de descentralizar. Agora para se digital é absolutamente essen-
como matava. Muitos deles são deu com a pandemia, que temos fazer isto é preciso primeiro arti- cial para melhorar os cuidados.
curados, outros tornaram-se de tratar das pessoas desde que melhor os serviços cular em conjunto e tem de haver E, já agora, vai trazer melhor
crónicos. Agora como deixámos elas nascem até que elas mor- públicos uma gestão integrada. E depois gestão de meios financeiros.
Álvaro Beleza
diz que por causa
do confinamento
deixámos de tratar
outras patologias,
nomeadamente
a oncologia
RUI COSTA
Medicamentos.
Infarmed
promete
“mitigação” de
problemas de
abastecimento
O Ozempic e o Inderal têm dado que
falar por estarem esgotados. Infarmed
garante continuar a tentar que
medicamentos estejam disponíveis.
MARIA MOREIRA RATO necessita do Ozempic (Semaglu-
maria.rato@ionline.pt tido), mas, por este estar esgo-
tado a nível nacional, viu ser-
A falta de alguns medicamen- lhe prescrito o Trulicity (Dula-
tos nas farmácias portuguesas glutido). A ser seguida em
tem deixado os portugueses Endocrinologia no Hospital de
preocupados, mas o Infarmed S. João, no Porto, por aquela que
garante que tudo faz e tudo con- designa como “a melhor equi-
tinuará a fazer para que esta pa”, Marta foi submetida a uma
situação seja solucionada. “O cirurgia à hipófise e foi-lhe remo-
Infarmed recebe da empresas vido um tumor de 4mm. Após
da indústria farmacêutica, enti- essa cirurgia, foi-lhe prescrito o
dades responsáveis pela colo- Ozempic, em fevereiro de 2022,
cação dos medicamentos no mas, em junho, o fármaco já não
mercado, informação sobre os estava disponível. Por isso, foi-
medicamentos que irão entrar lhe receitada uma alternativa.
em rutura de abastecimento, Em setembro, parou de fazer
conforme estabelecido legal- esta medicação porque foi nova- Falta de alguns medicamentos nas farmácias preocupa portugueses DREASTIME
Opinião Opinião
JOANA ÓSCAR
BORDALO E SÁ GASPAR
Médicos.
“Quando
saí do SNS
tive uma
sensação
de alívio”
Os médicos Pedro MARIA MOREIRA RATO mais no privado. Temos uma for- “Tinha todos os sintomas de vio. Pensei: ‘Vou livrar-me dis-
maria.rato@ionline.pt mação excelente, a nível de facul- burnout: nenhum prazer em tra- to’. Pode parecer mal, mas é a
Figueiredo, Mara dade e especialidade, por isso é balhar, irritabilidade, alterações realidade. Atingi o ponto de rutu-
Marques e Maria Há um ano fora do Serviço Nacio- que querem contratar-nos nou- no padrão de sono e isto teve ra. A não ser que tudo mude, que
João Tiago nal de Saúde (SNS), Pedro Figuei-
redo, de 40 anos, de Leiria, res-
tros países. Os utentes vão ao
privado e as pessoas entendem
impacto tanto no trabalho como
em casa. Ao final da semana, as
haja uma grande volta no SNS,
não me imagino a regressar”.
refletem acerca pira de alívio. “Andamos todos a que estão a lidar com um médi- coisas melhoravam, mas à medi- “Já se sabe que o burnout é
do estado atual roçar no burnout e quando alguém co melhor, mas pode ser exata- da que a segunda-feira se apro- uma doença profissional que
entra em burnout, deixa de se mente o mesmo que encontram ximava... Tudo piorava porque afeta cada vez mais portugue-
do SNS, preocupar. Deixamos de nos preo- no público”, desabafa. sabia aquilo que enfrentaria outra ses. Nas manchetes dos jornais
estabelecendo cupar com os resultados (óbitos, “Cada vez mais evoluímos no vez”, admite Pedro. “Quando saí podemos encontrar títulos preo-
uma comparação doenças que evoluem, etc.) e, por
vezes, desistimos e ficamos de
conhecimento médico e os alu-
nos saem a saber mais. Temos
do SNS tive uma sensação de alí- cupantes como ‘Síndrome do
burnout afeta 13% da população
com o setor baixa. Em termos de condições, médicos altamente capacitados, portuguesa’, ‘Portugal é o país
privado. no privado, temos tudo. Se qui- tiveram uma formação muito da União Europeia onde os tra-
ser ser honesto, eu vou traba- boa, boas notas, e são compara- balhadores mais correm o ris-
A psicóloga lhar mais sempre porque tenho dos com outros que têm menos co de sofrer burnout?’, ‘Stresse
Eunice Caracol a pressão de ter resultados. Não conhecimentos e são subvalori- e burnout custam €3,2 mil
explica em que é só a remuneração mais eleva-
da, mas também a contabiliza-
zados face ao mais velhos. Eu e
a minha esposa estivemos para
milhões de ano às empresas’,
‘Portugal é o terceiro país com
consiste ção dos atos”, explica em decla- sair do país. Se não fossem as “Andamos todos maiores níveis de stresse da
o burnout. rações ao i o médico de Medici- nossas filhas, faríamos parte das a roçar no burnout Europa’, entre muitos outros.
na Geral e Familiar que exerce estatísticas. Os problemas esta- Também sabemos que a covid-
exclusivamente no setor priva- vam completamente encober- e quando alguém 19 não foi generosa com os/as
do há um ano. tos. A manta já não cobria os pés entra em burnout, trabalhadores, pelos mais diver-
“Sentia-me completamente sub-
valorizado no SNS. Sou médico
e ainda esticámos para mais um
lado”, continua, refletindo: “Todos
deixa de se sos motivos, ora porque tiveram
que passar a trabalhar em casa,
e estava ali para servir os ‘senho- os anos, pessoas emigram e não preocupar” ora porque ficaram sobrecarre-
res’. As pessoas entendem que têm intenção de voltar e vai sair gados pela ausência dos colegas
quando pagam pelos serviços, é muita gente até 2025. Estamos “Sentia-me que ficaram doentes, etc.”, come-
muito mais importante do que muito envelhecidos e, a certa completamente ça por explicar a psicóloga Euni-
quando não pagam. Se eu der altura, o sistema vai colapsar. ce Caracol.
um tratamento caro a um doen- Um não serve para tapar os bura-
subvalorizado “O burnout tem sido cada vez
te, ele cumpre. Respeitam-me cos todos”. no SNS” mais estudado e é uma preocu-
02 03
pação também dos/as psicólo- preciso algum tempo de expo- para mudarmos culturas orga- acontece muito no SNS é que os uma responsabilidade e um peso
gos/as portugueses que se dedi- sição a situações de stresse labo- nizacionais e priorizar o bem- médicos estão assoberbados com grandes. Muitas das vezes, temos
cam ao estudo deste síndrome. ral, para que eventualmente o estar emocional dos/as colabo- trabalho. O número de horas de de trabalhar mais horas do que
Como já se sabe, o burnout é quadro evolua para um quadro radores/as?”, questiona. “Cola- trabalho não é suficiente para as 40 estipuladas e isto prejudi-
caracterizada pela sensação de de burnout. Por isso, cada vez boradores felizes e saudáveis dar resposta a tudo aquilo que ca a vida pessoal. É uma bola de
esgotamento ou exaustão emo- mais é importante que os CEOs são mais produtivos e economi- surge. Isso gera muita ansieda- neve”, lamenta a profissional de
cional, a redução da sensação das empresas privadas e os gran- camente rentáveis”, finaliza. de e imensos casos de burnout”, saúde. “Outra coisa que aconte-
de realização profissional e pes- des Órgãos de Gestão públicos Quem concorda com Pedro é assume, sendo que, em 2019, no ce é que os médicos não são ricos
soal e o sentimento de eficácia adotem medidas que primem o Mara Marques, de 37 anos, das ano anterior ao do surgimento como as pessoas pensam: atual-
relativamente ao trabalho, e tam- bem-estar psicológico e emocio- Caldas da Rainha, que decidiu da pandemia, aproximadamen- mente, com a inflação e a crise
bém a sensação de maior dis- nal dos seus/suas funcionários”, rescindir contrato com o SNS te 66% dos médicos portugue- que vivemos, o facto de muitos
tanciamento emocional dos rela- explicita a Psicóloga da Saúde em agosto de 2021. “Aquilo que ses relatavam um nível elevado serem mal remunerados faz com
cionamentos no trabalho”, afir- Ocupacional do Centro Hospi- de exaustão emocional, 39% que precisem de trabalhar ain-
ma a profissional mestre em talar Universitário do Algarve. demonstravam níveis elevados da mais. Acumulam locais de
Psicologia Clínica pelo ISPA - De seguida, lembra que a Orga- de despersonalização e 30% refe- trabalho para fazer face às des-
Instituto Superior de Ciências nização Mundial de Saúde (2020) riam uma elevada diminuição pesas. Sobretudo, quando vivem
Psicológicas, Sociais e da Vida. recomenda validar emoções, da realização profissional. em grandes cidades. E ao acu-
“Toda e qualquer pessoa que como o stresse ou o sentimen- Estas foram conclusões de um mularmos mais trabalho, até
seja profissionalmente ativa cor- to de pressão; importância de estudo nacional financiado pela em turnos completamente dis-
re o risco de ficar em burnout, gerir a própria saúde mental e Ordem dos Médicos sobre bur- tintos, não temos tempo para
se não se acautelarem os riscos bem-estar psicossocial, a par da nout nos médicos em Portugal, atividades que nos poderiam
psicossociais inerentes ao tra- física; recurso a estratégias de “Os médicos de que foi publicado na Revista da ajudar a distrair e descompri-
balho. Da mesma forma que coping úteis, como manter o con- daquela Ordem. Além das per- mir como o exercício físico”, diz,
acautelamos questões ergonó- tacto com família e amigos, o
família têm listas de centagens mencionadas, cerca adiantando que “é por todos estes
micas, como levantar o ecrã do descanso entre trabalho ou tur- doentes enormes, de 45% dos inquiridos (12 580 motivos que a classe médica
computador, ou assegurarmo- nos, alimentação saudável, prá- muito maiores do médicos no total) apresentaram sofre cada vez mais de depres-
nos de que a cadeira em que tra- tica de atividade física, entre níveis de ansiedade elevados e são, ansiedade e outra sintoma-
balhamos é a mais adequada, outras; evitar recurso ao consu-
que era desejável” em 21% foram identificados sinais tologia”.
também temos que acautelar mo de substâncias, como o álcool, de depressão. “No meu caso, aquilo que sen-
questões como as exigências tabaco ou outras e confiar na “O SNS não me “Os médicos de família têm lis- ti foi que o SNS não me permi-
laborais, o work-life balance, qua- família e nos colegas de traba- permitia ser a tas de doentes enormes, muito tia ser a médica de família que
lidade da liderança, assédio labo-
ral, entre outras. As pessoas não
lho que também possam estar
a passar por situações semelhan-
médica de família maiores do que era desejável, e
são os responsáveis máximos
queria ser. Tenho brio, quero
dar o meu melhor aos doentes
ficam logo em burnout. Não, é tes. “Do que estamos à espera que queria ser” pelos doentes. Recai sobre nós continua na página seguinte >>
Há quatro anos, 66% dos médicos relatavam um nível elevado de exaustão emocional DREAMSTIME
>> continuação da página anterior conhecidos cansam-nos. Demos conseguindo controlar este com- ridade. Para cuidarmos dos tos de desvalia e impotência,
tudo aquilo que conseguíamos, portamento, mas voltou em for- outros, temos de cuidar de nós que, muitas vezes, são respon-
e não conseguia fazê-lo em 15 na pandemia, e fomos ainda mais ça quando comecei o Ano primeiro”, confessa o jovem que sáveis por ideias de abandono
minutos de consulta cronome- além”, diz a secretária regional Comum. Podemos dizer que é é seguido em Psiquiatria e fre- do curso, depressão e suicídio”,
trados. E é isto que faz muitos de Lisboa e Vale do Tejo do Sin- o meu mecanismo de coping”, quenta igualmente sessões de lê-se. “Numa revisão da litera-
colegas abandonarem o SNS. dicato Independente dos Médi- sublinha. “Lidamos com muito psicoterapia. tura disponível sobre suicídio
Realmente, quem gosta de Medi- cos (SIM). “Vão exigindo cada stress, vida, morte... Honesta- “Estou atrasado no meu per- entre médicos, verificamos que
cina, de forma genuína, não se vez mais, não mexem nas gre- mente, ensinam-nos muitas coi- curso em relação aos meus cole- em toda parte do mundo a taxa
sente bem no setor público. Como lhas salariais e esta sobrecarga- sas, mas ninguém perde tempo gas, mas valeu a pena pôr tudo de suicídio na população médi-
é que nos desligamos das con- leva a depressões subdiagnosti- a perguntar se estamos bem e em stand-by para melhorar. Se ca é superior à da população
dições atuais do SNS?”, questio- cadas e a elevadas taxas de sui- a tentar que percebamos que não o tivesse feito, acho que já geral. Entre os médicos que
na. “É impossível”. cídio entre os médicos”. também devemos ser uma prio- não estaria cá”, frisa João Pedro, cometeram suicídio, colegas pró-
“Os casos de suicídio não são indo ao encontro das ideias trans- ximos têm referido mudança no
COMPORTAMENTOS AUTOLESI- objetivados. São escondidos pela mitidas em Suicídio entre médi- comportamento e aumento de
VOS, DESESPERANÇA E SUICÍDIO vergonha. Recentemente, falei cos e estudantes de medicina, um indecisão, desorganização e
“Tivemos uma pandemia em com um colega que estava com- artigo de revisão de A.M.A.S. depressão por dois ou quatro
que foram feitas horas extraor- pletamente em burnout e grita- Meleiro, do Instituto de Psiquia- meses precedendo o suicídio,
dinárias. Os médicos já vinham va comigo só porque queria aju- tria do Hospital das Clínicas da como na população geral”, é
de trás completamente desmo- dá-lo. Dizia: ‘Vocês vão ver o meu Faculdade de Medicina da Uni- salientado.
tivados e com muitas horas extra, suicídio!’. As pessoas continuam versidade de São Paulo, sendo “Chegamos a sentir-nos culpa-
sem tempo para a família nem a trabalhar apesar de estarem que no Brasil esta realidade é dos por algo aparentemente sim-
para eles mesmos. Passou a pan- mal. Os próprios médicos, mui- estudada, ao contrário daquilo ples - e a que temos direito -
demia e, na realidade, nada tas das vezes, não reconhecem que acontece em Portugal. como ficarmos com os nossos
mudou. Cada vez mais se veem que chegaram ao limite”, con- “Segundo trabalhos de Millan filhos doentes em casa. Porque
médicos deprimidos, exaustos ta, sendo que João Pedro (nome et al. e De Marco et al., alunos sabemos que os nossos utentes
e sem vontade de nada”, narra fictício), de 28 anos, interno de “Os casos de medicina com melhor per- ficam sem consulta e não sabe-
Maria João Tiago, assistente gra- uma especialidade cujo nome formance escolar encontram-se mos quando a terão”, desabafa
duada na USF São João da Talha, prefere não referir, apercebeu-
de suicídio não são num grupo de alto risco de sui- Maria João Tiago. “Uma coisa
em Loures, se de que tinha de abandonar a objetivados. cídio. Os referidos autores con- que devia ser encarada de modo
“Isto deve-se ao desinvestimen- Medicina para se reencontrar São escondidos jeturam que, por serem pessoas natural acaba por nos causar
to que há no SNS. Por exemplo, e, acima de tudo, colocar a saú- mais exigentes, estariam mais preocupação. Quando quem cui-
hoje não consigo sequer passar de mental em primeiro lugar.
pela vergonha” propensas a sofrer as pressões da dos outros nem doente pode
baixas ou dar uma consulta de “Comecei a ter problemas psi- impostas diante de qualquer ficar ou pode ter um filho doen-
forma normal porque o sistema cológicos graves no final do Ensi- “Para cuidarmos falha. O estudante passa a ter te... Queremos uma sociedade
informático vai abaixo constan- no Secundário. A pressão para dos outros, temos culpa pelo que não sabe e com assim?”, pergunta. “Tenho 30
temente. Isto, a falta de papel e
tinteiros para as impressoras e
ter boas notas era tão grande
que dei por mim a cortar-me.
de cuidar de nós isso se sente paralisado pelo
medo de errar. Esses quadros
anos de Medicina e não me lem-
bro de ver um panorama tão
outros problemas que já são Os anos foram passando e fui primeiro” caracterizam-se por sentimen- mau como o atual”.
Opinião Opinião
FILIPE LUÍS PEDROSO DE LIMA
COSTA
Opinião Opinião
RUI PEDRO
CRISTINA FRAZÃO
Opinião Opinião
JOANA JOÃO
CORDEIRO DIAS
Opinião Opinião
JOÃO VARANDAS ANA RITA
FERNANDES CAVACO
Opinião Opinião
EMA ALEXANDRA
PAULINO BENTO
14 de Março de 1960.
50 milhões de francos
pelo pequenino Eric que
se chamava Peugeot
ELA FO
04 05
decisores e do país se sobressaltou, fazen- nas, na nacionalização, na modelação da ça zero. A governação de um país, a ges-
do com que as mesmas circunstâncias que gestão e na privatização para remover o tão de uma comunidade e um exercício
tinham trazido os benfeitores, com a mudan- ativo tóxico do radar da governação. O gover- político centrado no interesse geral, na
ça dos ventos ou dos governos, os projetem no quis mandar na TAP para defender a exigência e na transparência parece uma
para um patamar de malfeitores, agora economia nacional, as empresas nacionais coisa de outra galáxia. Não se trata de ser
detentores de ativos da economia nacional, e o interesse geral, os portugueses paga- coisa de esquerda ou de direita, mas de
alguns com uma forte relevância estratégi- ram e Bruxelas impôs um plano. Com o gente decente com ética republicana, sen-
ca para as pessoas, os territórios e o país plano, parece que existiam resultados, mas tido da vivência em comunidade e senso
António Galamba como um todo. A necessidade fragiliza o a ligeireza manifestou-se sob a forma de no posicionamento do país e dos interes-
escrutínio, a ponderação e a avaliação das uma indemnização milionária a uma ex- ses gerais. Está bem longe da realidade
opções de gestão do interesse geral, mesmo governante, o governo encomendou um atual e do azimute de serviços mínimos
No imaginário da sina coletiva dos coita- quando os sinais são evidentes e desacon- estudo rápido à inspeção de finanças e, com vigentes. É possível fazer muito melhor.
dinhos, as adversidades são fatalidades às selham ligeirezas, mas há gente viciada em o resultado, não hesitou em brandir a “jus-
quais nos acomodamos, com maior ou facilitismo, porque a fatura é assumida sem- ta causa” para remover da administração NOTAS FINAIS
menor espírito de desenrasque, de impro- pre por alguém: os contribuintes. A ligeire- os bodes expiatórios vigentes, sem acaute- UM PRESIDENTE POUCOCHINHO. O homem
viso ou de resiliência, sem uma ambição za não é de esquerda ou de direita, há casos lar a solidez jurídica da rotulagem. E ago- do compromisso da Auto-Europa de Antó-
em linha com a capacidade produtiva, de e espécimes promotores da dita em todos ra parece que está a tentar construir a fun- nio Costa ganhou uma nova vida com os
organização e de obtenção de resultados os quadrantes políticos, como se tivesse havi- damentação para o que anunciou. Já tínha- casos no governo e na governação. Põe
que revelamos quando integrados nou- do uma pandemia em surdina, com danos mos uma justiça que prendia para investigar, Ministro na mira, finge-se de morto na
tras sociedades democráticas. irreparáveis no quadro moral de exigência, temos agora uma governação que anuncia crise do governo dos Açores e imiscui-
Com confrangedora ligeireza, os portu- sentido de serviço público e defesa do inte- para estudar os fundamentos das suas se em áreas da governação, sem garan-
gueses têm sido confrontados com uma resse geral dos titulares de cargos políticos. opções. E tudo com o suporte de despreo- tias de mais mãos por baixo. O país em
sucessão sistemática de inconsistências Uma cegueira utilitária, meio vale tudo, cupação e ligeireza da cobertura do dinhei- dificuldades assiste a esta linha de mon-
do exercício político, toleradas, permiti- meio irresponsável, pelo que sinaliza de ro dos contribuintes, que são chamados a tagem de jogos florais das instituições
das e desculpadas, como se não configu- imprevisibilidade e de inconsistência para colmatar todos os desmandos. Os de um democráticas.
rassem um perigoso padrão de compor- os cidadãos na observância das regras da Presidente da República em modo de ajus-
tamento nacional, lesivo da imagem do vida em sociedade e para o Mundo com o te de contas por invocação das responsabi- UM CAMPEÃO POUCOCHINHO. Um cam-
país no exterior, junto dos mercados e dos qual nos relacionamos. Esta deriva ou espi- lidades do escritório do irmão na indemni- peão é um ser humano que se superou,
investidores. ral de guinadas nas opções políticas faz de zação ilegal; os de governantes com rabos mas Nélson Évora reitera de forma sus-
Primeiro problema, aparente, a escolha Portugal um país cada vez menos confiá- presos na estrutura omissa da TAP limpa tentada intervenções indignas de um cam-
das companhias. Enfrentamos individual e vel, mesmo quando se esforça para reduzir do relatório da IGF e os de opções gover- peão, a raiar a xenofobia em relação ao
coletivamente muitos problemas de gestão a dívida pública e manter um registo de alu- nativas sem a adequada consistência jurí- campeão Pedro Pichardo. Nenhuma azia
e de sustentabilidade, recorrendo a compa- no aplicado com as instituições europeias. dica para as soluções adotadas, em relação ou inveja justifica a tragédia daquela degra-
nheiros de construção de soluções que depois Estas, tão como os que já foram vítimas das a quem sabe demais, quando se pretende dação pessoal, pública e mediática.
rejeitamos, com evidentes danos irrepará- guinadas, dos ziguezagues e das incoerên- livrar da companhia o mais depressa pos-
veis de perda de autonomia e de soberania, cias, sabem que o compromisso é válido até sível, no meio de um ensurdecedor ruído UMA IGREJA POUCOCHINHA. A confirma-
para não falar de autoridade moral. Foi ao dia em que, de um momento para o outro, de ações e omissões. ção de que há árvores da floresta da Igre-
assim com as convergências com autocra- o deixe de ser. Se fosse de crianças, era uma garotice, ja Católica indignas da instituição, da
cias detentoras de recursos financeiros que O segundo problema, a inconsistência das assim é um desastre financeiro pelo que mensagem e da relevância para os cren-
escasseavam no território nacional. Basta guinadas e o preço da leviandade. Podia já pagámos e pelo que vamos pagar à con- tes e os territórios exigia uma reação inte-
recordar Angola, a República Popular da falar da implosão das PPP que funciona- ta da inconsistência dos anúncios e das grada, proativa e consequente. Semanas
China, a Venezuela e outras paragens de vam na saúde, nas reversões nos transpor- opções governativas. depois deixou-se enlear num desnorte
sinal similar, em que o conforto do dinhei- tes, nas vendas ao desbarato de ativos estru- Uma vez mais, sinaliza-se para o país e comunicacional, de reação e de preven-
ro e o imediatismo das necessidades políti- turantes como a ANA Aeroportos de Por- para o Mundo, um Portugal nada confiá- ção, por falta de comando. Um desastro-
cas do momento, mandou os valores, os tugal, nas prepotências do pacote da habitação vel, sem pingo de previsibilidade, enquan- so lume brando que em nada ajuda à
princípios e os padrões civilizacionais às e de um lençol de casos tocados pela ligei- to se mantêm pressupostos enviesados reparação e à erradicação dos abusos.
urtigas. Em termos populares, “o importan- reza das opções políticas, mas a TAP con- numa empresa intervencionada com o Como noutras áreas há quem não tenha
te era o guito!”. Até, que a consciência dos sagra uma enorme sucessão situações levia- dinheiro de todos. Um modelo de confian- compreendido que o mundo mudou.
iNEVITÁVEL CONSELHEIRO EDITORIAL José António Saraiva FISCAL ÚNICO Vítor Vale Detentor de 91% do capital: Sunny Meridian - Unipessoal, Lda,
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EDITORA EXECUTIVA Sónia Peres Pinto Telefone Redação 211 976 146
EDITORES Joana Andrade e Laura Ramires PRODUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO Mário Silva (Diretor)
POLÍTICA Joana Mourão Carvalho DEPARTAMENTO DE INFORMÁTICA Hugo Marques (Diretor) PUBLICIDADE publicidade@newsplex.pt
SOCIEDADE Joana Faustino e Maria Moreira Rato e Miguel Branco EMAIL GERAL geral@newsplex.pt
iNEVITÁVEL
Laboratório de Física Fundamental samento? É uma velha questão, que opôs tranquiliza professores demasiado preo-
(CERN) para os negócios e o quotidiano. Alan Turing, matemático e cientista de cupados com a avaliação dos estudan-
Hoje há maior vulgarização das tecno- computação do século XX, a Ada Love- tes. Mas como o aumento do tamanho
logias, mas principalmente devido à natu- lace, pioneira no século XIX de uma área dos modelos de IA vai aumentar a cor-
ralidade, antropomorfismo, fluidez impres- dominada hoje pelo género masculino. reção das respostas, é a altura de refle-
sionantes do diálogo que permite, o Para Lovelace, as máquinas são limita- tirem sobre como ensinam e avaliam.
ChatGPT veio para ficar e vai evoluir. das pelas regras de programação. Para Cabe ao ensino complementar a IA com
No séc. XIX não se travou a revolução Turing, o critério de inteligência é ope- modelos causais para a verificação e a
Teresa Peña industrial. Hoje faz pouco sentido proi- racional e definido pela experiência. O decisão que se treinam com experiên-
bir a realidade da IA a uma geração de teste de Turing: se em mais de metade cia, abstração e desenvolvimento da ima-
estudantes profundamente embebida na de realizações da experiência de conver- ginação. O ChatGPT pode ser um teaser
A automação iniciada no fim do século cultura digital. Uma alternativa a proi- sação com uma máquina, o participan- para desenvolver esse sentido crítico.
XIX alterou profundamente o valor e a bir é avaliar as implicações da IA, abra- te humano não reconhece a natureza do Os sistemas de diálogo da IA podem
organização do trabalho. Valorizou capa- çar os seus benefícios, influenciar a sua interlocutor, considera-se que a máqui- usar-se para feedback aos estudantes, expe-
cidades de operar máquinas, fazer a sua evolução. Que competências devem as na possui inteligência artificial. riência da aprendizagem personalizada,
manutenção e adaptação a tarefas. Ago- Universidades dar na era da IA? Pode- Hoje a IA realiza tarefas complexas: melhor gestão de tempo, monitorizar a
ra, com a nova automação da Inteligên- rão cientistas usar a IA como ghost wri- reconhecimento da fala e imagem, escri- satisfação académica com intervenção
cia Artificial (IA) é diferente? Como na ter? Que tarefas de investigação e ensi- ta de textos, tradução entre centenas de rápida. Na investigação, a IA pode esti-
automação anterior, a IA pode libertar no se podem apoiar em sistemas da IA? idiomas, condução de veículos, resolu- mular a imaginação (brainstorming), criar
mais tempo para ações transformado- Que verificação humana cabe na inves- ção de alguns problemas lógicos. Para e editar textos sobre resultados, gerar
ras, levar a maior produtividade, mais tigação e ensino assistidos por IA? Que gerar respostas, o ChatGPT usa um mode- questões, análise de dados e reconheci-
bem-estar, melhores padrões de vida. implicações legais (direitos de autor, pro- lo de amostras estatísticas, sendo treina- mento de padrões – aceleradores do conhe-
Tudo depende de medidas para equilí- priedade intelectual, responsabilidade do num conjunto vastíssimo de textos cimento em qualquer área. Nas ciências
brio de benefícios e ameaças. Desta vez, pelos resultados) e éticas advêm da IA? para determinar a probabilidade de uma físicas já acontece, nas ciências sociais e
porém, são visadas as competências tra- O termo chatbot, introduzido em 1994 sequência de palavras. As respostas são humanas são passos transformadores.
dicionais de um graduado universitário, por M. L. Mauldin, designa um progra- geradas palavra a palavra. O sucesso de “Como um modelo de linguagem trei-
potencialmente em muitos setores: saú- ma baseado em modelos matemáticos sistemas como o ChatGPT vem do aumen- nado em dados, não sou capaz de ter opi-
de, transportes, construção, ensino, direi- que imita a conversa humana. Pensa- to do tamanho dos modelos da IA, em niões”, respondeu o ChatGPT à minha
to, finanças etc. As Universidades, fábri- mento e linguagem poderão deixar de número de parâmetros, aproximando-se pergunta se os computadores podem pen-
cas de investigação e ensino, vão sentir ser próprios só do ser humano. Mode- do milhão de milhões, em número de sar. Como nós temos opiniões, somos
os efeitos desta nova realidade de traba- los matemáticos conseguem imitá-los e palavras ou unidades de informação para humanos. Ainda bem! As opiniões ala-
lho. A melhor resposta é melhorar a qua- criar a ilusão dessas capacidades. Os sis- treinar esses modelos, e da capacidade vancam e transformam. Vejam-se os exem-
lidade e versatilidade da formação, usar temas IA de diálogo são como conver- de muitas operações nesse treino. plos de Alan Turing e Ada Lovelace.
a IA para a complementar, treinar mais sas com bons atores. Um ator pode impro- O ChatGPT gera textos verosímeis, mas
a imaginação, a tomada de decisão e o visar. Pode um computador também fazê- há estudos que concluem ser geradas Professora Catedrática e Presidente
espírito crítico. lo, e surpreender-nos? Os computadores cerca de 74% respostas erradas a certas do Conselho Pedagógico
O aparecimento do ChatGPT em novem- pensam, ou antes geram a ilusão de pen- questões de raciocínio e cálculo. Isto do Instituto Superior Técnico
bro passado expôs mediaticamente que
IA já saiu dos laboratórios e é acessível
a muitos. O ChatGPT espalhou-se glo-
balmente em apenas poucos meses. Em
1989 foi muito mais lenta a transposição
da World Wide Web (WWW) que mudou
a forma como trocamos informação, do
O ChatGPT gera
textos verosímeis,
mas há estudos que
Fabrice Coffrini/AFP
RÉDEA SOLTA
Insegurança Social
que nomear uma “task force” que, no ter- siasmem com propostas de aplicação em 4. Parece que Marta Temido admite ser
reno, faça uma fiscalização a todas as ins- fundos. Ainda agora nos Estados Unidos candidata à presidência da Câmara de
tituições legais e ilegais. Simultaneamen- houve um banco enorme que foi abaixo. Lisboa. Saiu, portanto, a taluda a Car-
te, deveria indicar funcionários da Segu- E entre nós há um que anunciou lucros los Moedas que, entretanto, já atinou
rança Social que superintendam “per simpáticos cá e um prejuízo desgraçado e está finalmente a produzir resulta-
capita” um certo número de unidades, na Polónia. Cuidado. Investir em pedra e dos positivos para a capital. O desastre
onde possam entrar a qualquer hora do terra não é o mesmo que investir em papel! que Marta Temido trouxe para o SNS
dia ou da noite com uma pequena equi- está tão patente na vida dos portugue-
Eduardo Oliveira e Silva pa. Claro que vão dizer que não há gente 3. A entrevista que o Presidente-analis- ses que só por fanatismo partidário ou
nem dinheiro. Mas podem resolver isso ta-comentador Marcelo deu à RTP mere- político alguém de bom senso irá votar
nem que seja com mais uma raspadinha ce ainda alguma reflexão, mesmo que nela. Marta Temido foi o terramoto na
Nota prévia: No meio da confusão que ou aplicando uma taxa aos lares. Esses curta. Desde logo porque teve um fra- saúde e de terramotos os lisboetas já
gerou o caso Alexandra Reis há uma peque- funcionários teriam de dispor de meios quíssimo nível de audiências (menos de tiveram a sua conta. Ainda por cima
na e singela constatação a fazer. Afinal o móveis e sobretudo terem salários dignos metade de um dia normal da novela Fes- não é de Lisboa e é deputada por Coim-
lugar de presidente da NAV está vago. Será para evitar tentativas de corrupção. Como ta é Festa). Há provavelmente duas cau- bra. Pois que se candidate lá na terra.
que está reservado para ela? Só nos faltava é óbvio que não há sítios para onde trans- sas: a banalização da palavra presiden-
mais essa. ferir os utentes, há que criar legislação cial e a irrelevância em que a RTP vem 5. Fez ontem dez anos que o Papa Fran-
que permita à Segurança Social tomar caindo. O Presidente da República optou cisco foi anunciado ao mundo. Junta-
1. A situação de degradação e de maus tra- posse administrativa da unidade imedia- por um misto em que bateu em toda a mente com João XXIII será certamen-
tos em lares de idosos não é nova. Hoje, ta, assegurando a gestão até à expropria- gente do Governo à oposição, que ainda te um dos Pontífices de Roma que mais
por via das redes sociais, apenas se conhe- ção e condenação dos responsáveis a penas não vê como alternativa. Mas, sobretu- tocaram a humanidade, pela sua bon-
cem mais casos chocantes, com imagens pesadas por maus tratos a pessoa indefe- do bateu na Igreja pela sua lamentável dade, pela sua coragem, pela abertura
que remetem para as dos campos de con- sa. Se nada deste género for feito, é certo atitude face aos casos de pedofilia ago- às reformas e pelo apoio que deu às
centração nazis. Logo que há uma denún- e sabido que vamos continuar a desco- ra confirmados por uma comissão inde- denúncias de crimes de abuso de crian-
cia a saltar para as manchetes é ver os brir novas casas dos horrores. Desde logo pendente. Nesse aspeto Marcelo até se ças na Igreja. Ao contrário do seu ante-
inspetores da Segurança Social aparece- porque há cada vez mais idosos e que nos controlou ao dizer que falava como PR, cessor imediato, Bento XVI, Francisco
rem onde raramente iam. Os nossos lares últimos sete anos tudo se agravou. Para omitindo o seu ponto de vista como cató- é um Papa mais virado para os proble-
são em muitos casos armazéns de velhos. grandes males grandes remédios. lico que seria certamente muito mais mas reais da humanidade, especial-
A pinta dos responsáveis e os nomes dos violento. Quanto ao executivo, o discur- mente os mais pobres e marginaliza-
donos finais de certos estabelecimentos 2. Uma mão cheia de nada. É este o termo so foi absolutamente arrasador, mas sem- dos de países que não são nucleares no
não enganam ninguém. Sempre que há concreto para o pacote da habitação. Impra- pre compensado judiciosamente por uma planeta. As suas palavras sábias e sim-
um caso mais grave, aparece o ministro ticável, irracional, absurdo economica- palavra justificativa. Uma coisa parece ples marcam mais do que os discursos
de turno (seja qual for o partido) que pro- mente e, como se não bastasse, cheio de certa: as mesmas palavras na boca de teocráticos de muitos bispos, cardeais
mete atuar, investigar e solucionar. Ana inconstitucionalidades. É, portanto, um Cavaco ou de Sampaio causavam um ter- ou padres. É um homem da tolerância,
Mendes Godinho, atual ministra, junta a nado morto que, no entanto, vai certamen- ramoto político. Basicamente, a entre- do respeito pelos direitos individuais,
isso um ar cândido e sorriso na cara onde te levar muita gente a rever a ideia de vista deu pretexto aos comentadores acima de dogmas sem fundamento. É
deveriam correr lágrimas. Tal como o seu investir na construção civil, que é um dos para mais umas largas horas de televi- bom tê-lo!
antecessor, Vieira da Silva, Godinho é um motores da economia. Será bom para a são e rádio. Nem sequer se abordaram
desastre. Tanto na questão dos lares de banca que vai manter depósitos com zero os momentos mais difíceis dos sete anos 6. Quem também faz dez anos é a CMTV.
idosos, como na sinalização de crianças de juros. Oxalá os investidores não se entu- de mandato. Foi pena. Trouxe uma mudança na comunica-
(ainda há pouco ocorreu o caso horrível ção que poucos referem e reconhe-
de uma criança assassinada em Setúbal), cem. Fala do povo, para o povo e à
no pagamento de pensões e no apoio aos moda do povo. Ali, não há preocupa-
desvalidos. A Segurança Social entre nós ções estilísticas. Há eficácia e às vezes
é o oposto das Finanças. Como tem de excessos. Mas não se lhe pode tirar
pagar, faz tudo arrastando os pés dos seus mérito. O mesmo acontece ao jornal
milhares de funcionários que amam o que é o porta-aviões do grupo Cofina.
teletrabalho e as marcações prévias. Nas As outras televisões e jornais tiveram
finanças é exatamente o contrário. A ins- de se adaptar e passar a abordar casos
tituição não para quieta, salvo quando em que não tocavam. E o grupo CM
estão em causa estornos ou milhares de até já trata de política. E quando o faz
milhões como o IMI e o Imposto de Selo é arrasador. Sócrates, Pinho e Alexan-
de barragens. É reinar com o pagode e dra Reis que o digam. Se é assim ape-
governar cativando. Nos lares apenas os nas no cabo, o que será no dia em que
parentes chegados acabam por poder esteja em canal aberto? Vítor Direito,
fazer denúncias. Muitos empregados têm o mestre do jornalismo que fundou o
limitações por serem imigrantes indocu- CM com Carlos Barbosa, talvez nun-
mentados, sem preparação e sem sensi- ca imaginasse tamanho impacto e tan-
bilidade. Esses são factos. A senhora minis- to poder do jornal que nasceu ali para
tra, em vez de aparecer com ar sonso, os lados da Praça das Flores, ao lado
deveria pegar o problema de frente. Há Tal como o seu antecessor, Ana Mendes Godinho é um desastre MIGUEL SILVA de O Tempo.
Leis à patada
A análise desta proposta – tão má que até custa a ler e pior, a acreditar – é um catálogo de violações
de direitos constitucionalmente garantidos, de atropelamentos de princípios fundamentais, de entre
os quais o da proporcionalidade, de desprezo arrogante pelos direitos dos cidadãos.
Ora, é disso que a proposta de lei “+Habi- investiram no nosso país e se veriam ati- de qualquer crédito internacional como
tação” do Governo trata. Do confisco de rados para situações impensáveis num país de investimento, a fuga de quem já
direitos. À patada. país da União Europeia. Nem me venham para cá veio, a acrescer à fuga de quem cá
A análise desta proposta – tão má que até com a conversa – mentirosa – de que outros nasceu, daqui para fora…
custa a ler e pior, a acreditar – é um catá- países da União têm leis similares, porque Porquê tudo isto? Porque o primeiro-
logo de violações de direitos constitucio- pura e simplesmente, não é verdade. ministro é estúpido, excessivamente incom-
nalmente garantidos, de atropelamentos Acresce, cereja em cima do bolo, o con- petente ou totalmente ignorante das rea-
de princípios fundamentais, de entre os gelamento das rendas mesmo para novos lidades da vida? Não, não é por isso.
João Luís Mota quais o da proporcionalidade, de despre- contratos de arrendamento, ou seja, enten- A causa primeira é simplesmente que o
de Campos zo arrogante pelos direitos dos cidadãos. damo-nos, o Estado fixa de uma vez por poder em Portugal foi sequestrado por
Custa-me dizer isto, mas não há subs- todas e para a eternidade, as rendas que um bando de gente pouco honesta, como
Penso não ser exagero dizer que a comu- tantivos e adjectivos suficientes para qua- podem ser cobradas pelos proprietários! “aquele” que contratou com um adianta-
nidade jurídica está em estado de choque lificar o tão excruciantemente má que esta Falta ainda acrescentar a criação de um mento de 300.000 euros um centro trans-
com a proposta de lei apresentada à dis- proposta consegue ser. Estado pidesco (é o verdadeiro regresso fronteiriço em Caminha, uma noção total-
cussão pública pelo Governo em matéria Já muita gente se pronunciou sobre a aos tempos do Dr. Salazar: rendas conge- mente ridícula, que desqualificaria qual-
de habitação. questão do arrendamento coercivo e o ladas, preços administrativos, escritos nas quer um para o que fosse, mas que António
Tudo nessa proposta é tragicamente absurdo que consistiria em impor a alguém janelas e agora, a PIDE) em que as empre- Costa entendeu por bem fazer seu secre-
mau, violador dos direitos dos cidadãos, que não o queira fazer, o arrendamento sas de serviços de água, electricidade e tário de Estado adjunto.
ignorante em relação a princípios básicos de uma casa sua. A reforçar o absurdo fica gás teriam de informar a Gestapo (per- Este bando é capaz de tudo para se man-
do direito e dos direitos fundamentais pre- o facto de que o Estado poderia apossar- dão, as finanças) dos consumos de cada ter no poder. Tudo é tudo, sem limites nem
vistos, entre outros textos, na Carta dos se de um prédio, fazer-lhe nos seus ter- casa, para efeitos de avaliação sobre se restrições. Para abafar os múltiplos casos
Direitos Fundamentais da União Euro- mos e condições (caras e corruptas como estão devolutas. Pena têm os comunistas de corrupção que se abateram sobre o
peia, cujo artigo 17º, aliás concordante sabemos) “obras” de requalificação e subar- que em 1975 não houvesse meios de con- governo, vale tudo, incluindo destruir a
com a Constituição portuguesa, dispõe rendá-lo cobrando-se das rendas para paga- trolo destes. economia, arruinar o crédito externo de
que “todas as pessoas têm o direito de fruir mento dos custos das obras feitas contra O resultado deste desastre, se porventu- Portugal, pôr em causa todos os nossos
da propriedade dos seus bens legalmen- a vontade do dono, que assim ficaria pro- ra pudesse entrar em vigor alguma vez, direitos, inventar um “1º direito à habita-
te adquiridos, de os utilizar, de dispor deles vado do que tivesse sido seu, por décadas seria o maior colapso do parque imobiliá- ção” que justificaria medidas excepcionais
e de os transmitir em vida ou por morte”. e décadas… ou seja, para sempre. rio português a que teríamos assistido na de espezinhamento dos direitos de toda a
Já todos sabemos que o direito de pro- Isto é apenas um exemplo. Ponto por nossa geração, o fim do mercado do arren- gente, em prol sabe-se lá bem de quem,
priedade – pilar fundamental da liberda- ponto, medida por medida é, como já dis- damento, a paragem da construção de pré- mas estou disposto a apostar simples con-
de individual e colectiva – não é absoluto. se, um catálogo de brutalidades burocrá- dios novos salvo de habitação social ou de tra dobrado, que há-de haver muitos meni-
Como se diz também nessa Carta, “A uti- ticas, posses abusivas, corrupção previs- luxo, o ainda maior empobrecimento da nos, meninas e menines do PS a precisar
lização dos bens pode ser regulamentada ta e arbítrio desmedido, o que esta pro- classe média, centenas de milhares de des- de casinha e logo por acaso, da sua, caro
por lei na medida do necessário ao inte- posta de lei prevê. empregados, milhares de empresas fali- leitor. Azar o seu.
resse geral”. Não respeita nem os direitos dos nacio- das, a renovada degenerescência dos par- Como é evidente, isto não pode ser, isto
O ponto é que a “medida do necessário nais – o que é costumeiro em Portugal – ques urbanos de Lisboa e do Porto, o enclau- não é tudo deles, há direitos e tribunais, a
ao interesse geral” não pode nem deve ter nem os dos estrangeiros que de boa fé suramento do país sobre si próprio, a perda justiça demora mas lá chegará, há a car-
como substância o confisco (apropriação ta europeia dos direitos fundamentais, e
sem contrapartida) da propriedade dos há “nós”.
cidadãos, em função apenas de opções Também nos cabe a nós opor a isto, como
ideológicas dos governos em funções, ain- dizia a música, “uma muralha de aço”,
da que os nossos governantes estejam con- uma resistência cidadã ao espezinhamen-
vencidos, na esteira de um qualquer to dos nossos direitos e, pelo menos, pelo
Proudhon de pacotilha, que “a proprieda- menos, uma decisão inabalável que as
de é um roubo”… acrobacias retóricas e as promessas rotas
do Dr. Costa não podem alterar: não vol-
tar a votar neste bando.
Valha-nos que nas últimas eleições autár-
quicas votamos para Lisboa e para o Por-
Estou disposto to e tantas e tantas outras cidades princi-
pais, no PSD e no CDS, e que os presiden-
a apostar simples tes dessas Câmaras já declararam que nos
contra dobrado, que seus municípios não vai haver estes des-
há-de haver muitos varios. A menos que o bando de desvaira-
dos que nos desgoverna decida retirar aos
meninos, meninas municípios as suas legítimas competên-
e menines do PS cias. Já nada me surpreenderia…
a precisar de casinha
Dreamstime
NA LINHA DA FRENTE
POR JOSÉ PAULO
DO CARMO
Realidade,
ficção e fake
Numa era dominada pelas “fake com uma miúda que foi ter com
news” e por querermos sucessi- ele a apresentar-se depois de
vamente mostrar em vez de viver, terem feito “match” (quando
é muitas vezes difícil de distin- duas pessoas gostam das foto-
guir a realidade da ficção ou da grafias uma da outra). Depois
mentira. Mas há outros que são de o ver com um ar atónito, mos-
caricatos e tristes, pela estupidez trou-me a referida aplicação e
que encerram. A atriz Sharon o Instagram da pessoa que ali
Stone veio revelar agora, numa se apresentava e de facto, à luz
recente entrevista, o sofrimento dos mil e um filtros e da magia Brincadeiras ambíguas
que lhe foi imputado pelo mais do photoshop, o que a persona-
famoso cruzar de pernas da his- gem mostrava nas suas redes e ■ A atriz Jane Fonda sugeriu, na passada sexta-feira, assassinar os políticos que são con-
tória do cinema, numa cena do depois a sua figura presencial tra o aborto. A ideia pode parecer demasiado “extrema” para ter sido mesmo dita em voz
filme Instinto Fatal. Parece que, não tinham absolutamente nada alta, mas a verdade é que aconteceu. Em declarações ao programa The View, a também
segundo ela, perdeu a custódia a ver. Se não me tivesse sido ativista disse: “Estamos no controlo dos nossos corpos há várias décadas e somos capazes
do filho porque o juiz disse ao garantido eu jurava que não está- de decidir quantos filhos queremos ter e quando. Agora que sabemos como é, não vamos
seu progenitor, na altura com 4 vamos a falar do mesmo. voltar atrás, não me importo com as leis. Não vamos voltar atrás”. Joy Behar, a apresen-
anos, em pleno tribunal, que a Isto é hoje em dia a prática habi- tadora daquele programa questionou a atriz sobe quais seriam as soluções para lidar
mãe pela referida cena, fazia fil- tual, defendemos o que é natu- com as decisões políticas que afetam a liberdade de escolha das mulheres. “Bem, tenho
mes pornográficos. É inusitado ral, a liberdade do corpo, até lhe pensado no assassinato”, respondeu. O comentário da atriz de 85 anos foi levado pelas
que pessoas minimamente infor- chamamos do novo normal, ten- outras participantes no debate como uma brincadeira, contudo, esta não fez questão de
madas, confundam o que é cine- ta-se de tudo para prestigiar as esclarecer se o era mesmo ou se as palavras eram para ser levadas à letra.
ma do que é o dia-a-dia de quem supostas imperfeições como bele-
escolhe determinada profissão. za própria mas depois tentamos
Mas não é o primeiro relato de por tudo uma forma do que aos Mais uma cartada
vários atores seja no grande ou olhos de alguns parece perfei- para os recém-papás
pequeno ecrã que geraram ódios ção só para agradar à vista e aos
ou paixões absolutamente faná- olhares. Faz lembrar aqueles ■ O cantor John Legend, de 44 anos, e a mulher,
ticos, induzidos por uma deter- rapazes que se mostram verda- Chrissy Teigen, de 37, estiveram, na noite de domin-
minada representação (por sinal deiros príncipes nos primeiros go, presentes na cerimónia dos Óscares, que decor-
de excelência) que devia ficar por meses de namoro fazendo e reu em Beverly Hills, na Califórnia. Já é comum o
ali. Faz-me lembrar a minha infân- cedendo a tudo e depois, quan- casal presentear os fãs com momentos ternurentos e
cia quando achava que partir um do passa a paixão fogosa e arden- únicos, mas desta ninguém estava à espera. Enquan-
braço era o braço sair literalmen- te, e vem ao de cima quem são to decorria o jantar anual dos Óscares organizado
te do corpo. na realidade o choque frontal pela Vanity Fair, John e Chrissy foram vistos a jogar
Diferente, mas noutro campo, é acontece. Separações bruscas e com um baralho de cartas do UNO. E para os mais
aquilo que nos vão apresentan- intensas ou casamentos quebra- céticos, há imagens que o mostram. Recorde-se que
do todos os dias as redes sociais. dos. É o tempo da imagem e do o casal compareceu na cerimónia depois de, a 13 de
As vidas idílicas e perfeitas, de vídeo, depois queremos retirar janeiro, terem sido novamente pais. O novo filho
pessoas que muitas vezes não o lado sexual dos instintos, onde família junta-se a Luna Simone, de seis anos, e a
têm onde cair mortas ou de casais não se pode dar um piropo ou Miles Theodore, de quatro.
super apaixonados que vamos fazer um elogio que é logo cen-
a ver e nem se falam em casa. surado mas em que as meninas
É a vida do faz de conta, o novo de 18 anos (ou menos), passeiam Paul Auster
vício dos novos tempos, a caça os seus corpos semi despidos e em “Cancerland”
ao like de forma desenfreada. os rabos em grande destaque no
Dizia-me há uns dias um ami- Instagram, para ganhar visibili- ■ O escritor norte-america-
go que costuma passear regu- dade e com isso jantares ofere- no Paul Auster foi diagnosti-
larmente pela aplicação de encon- cidos nos restaurantes da moda cado com cancro, em dezem-
tros Tinder, que “aquilo está-se e noites em hotéis de luxo e os bro do ano passado. A infor-
a tornar muito perigoso”, usou pais nada fazem. Há por aí mui- mação foi agora divulgada
até um termo que me ficou na to boa gente que sofre imenso pela esposa, a também escri-
memória, “ um Kinder surpre- por não lhes darem valor inte- tora, Siri Hustvedt. “Tenho
sa”, por nunca se saber o que lectual e ninguém querer saber vivido num lugar ao qual pas-
aparece por trás de uma foto- o que pensam disto ou daquilo, sei a chamar ‘Cancerland’
grafia. Veio a conversa ao caso mas a única frase que lhes é conhe- [terra do cancro]”, escreveu
por estarmos a dançar num dos cida é um hashtag dos sítios que nas redes sociais. O roman-
restaurantes dançantes de Lis- frequentam. Comprem pipocas cista de 76 anos encontra-se a
boa e ele ter ficado estupefacto que isto ainda agora começou. fazer tratamentos de quimio-
terapia e imunoterapia em
Nova Iorque.
PALAVRAS CRUZADAS
HORIZONTAIS: 1 – Tirar o pêlo, a pele ou a casca de. Sinal que, no princípio de HORIZONTAIS: 1 – Vara flexível de vimeiro. O que professa a arte dramática. 2 –
uma pauta de música, indica a posição das notas e o grau da sua elevação. 2 – Elas. Los Angeles (abrev.). Enganar-se. 3 – Embarcação comprida e estreita feita
Expõe. Capital de Marrocos. 3 – Contracção de ‘em’ com ‘a’. Poder estar dentro. de um tronco escavado, usada na África e na América. Mulo. 4 – Pequeno cabo
Segundo. 4 – Aia. Recitar. Um certo. 5 – Regras. Grupo de pessoas que cantam náutico para alar ou puxar. Enfeitar com objectos de oiro. 5 – Impregnar de uma
juntamente. 6 – Penitente. 7 – Sólio. Armadilha (prov.). 8 – A minha pessoa. Bom substância oleosa. Ave parecida com a pomba. 6 – Unidade monetária da Romé-
nome. Avenida (abrev.). 9 – Impertinência. Brinquedo de criança. 10 – Prefixo (três). nia. 7 – Aprovação (fig.). Cheio de ira. 8 – Curar. Frio (gír.). 9 – Outra coisa (ant.).
Mamífero herbívoro do Sudoeste africano que se desloca geralmente em grandes Conjunto dos cónegos de uma catedral. 10 – Versejar. Prefixo (repetição). Senhor
manadas, também conhecido por boi-cavalo. Casal. 11 – Abre à força. (abrev.). 11 – Encolerizar. Tecido de malha para cobrir o pé e parte da perna.
VERTICAIS: 1 – Que diz respeito ao direito de punir. Cuidado. 2 – Prova. Desmo- VERTICAIS: 1 – Grande onda. Associar. 2 – Vogal (pl.). Variante do pronome ‘o’.
ronar-se. 3 – Medida itinerária chinesa. Planta herbácea da família das umbelíferas. Valor intrínseco ou estimativo. 3 – Dançar a polca. Terceira nota musical. 4 – O que
Serviços Secretos dos Estados Unidos da América. 4 – Abecedário. Gesto combi- há de melhor numa sociedade ou num grupo. Revestir de laca. 5 – Lugar de muita
nado entre duas ou mais pessoas. 5 – Verdadeiro. Faço passar por um filtro. Grosa areia. Escassa. 6 – Pessoa que exerce o poder absoluto (fig.). 7 – Que não vê.
(abrev.). 6 – Segunda letra do alfabeto grego. Último numa série de nove. 7 – Acre- Requerer pressa. 8 – Ser infiel a. Disposição regular e metódica. 9 – Sufixo (agen-
ditar. Prestar para. A unidade. 8 – Face inferior do pão. Enrubescer. 9 – Prefixo te). Praça larga. 10 – Ramificação de uma estrada ou de um caminho-de-ferro.
(oposição). Segmento de tronco de árvore. Oferta Pública de Aquisição (sigla). 10 Eles. Sétima nota da escala musical. 11 – Relativo ao campo ou à vida campestre.
– Apupar. Charão. 11 – Radical do álcool etílico. Somítico. Tontura.
SUDOKU
1 | GRAU DE DIFICULDADE ★★★★★ 2 | GRAU DE DIFICULDADE ★★★★★ 3 | GRAU DE DIFICULDADE ★★★★★ 4 | GRAU DE DIFICULDADE ★★★★★
SOLUÇÕES
4| 3| 2| 1|
5 607727 193333
TEMPO
HOJE AMANHÃ
16º 18º
NORTE 9º 7º
2023/03/14 3ªFeira
19º 21º
CENTRO 10º 10º
22º 23º
SUL 11º 12º
19º 17º
AÇORES 15º 13º
23º 21º
MADEIRA 17º 14º
SEMÁFORO
Papa Francisco
Silicon Valley Bank anunciou falência na sexta-feira NOAH BERGER/AFP Nos seus dez anos de
pontificado, o Pontífice
voltou a condenar a guerra
Greg Becker
Habitação. Proprietários Resolução do BES foi legal, Bispo de Lamego pede
prometem ir para tribunal diz Supremo Tribunal que CI corrija informação O CEO do Silicon Valley
Bank (SVB) é o protagonis-
PORTUGAL A Associação Lisbonense de PORTUGAL O Supremo Tribunal Admi- PORTUGAL D. António Couto, bispo de ta da mais recente crise
Proprietários (ALP) submeteu o seu con- nistrativo considerou que não foi ilegal Lamego, confirmou que recebeu uma lis- financeira, que está a ter
tributo às consultas públicas do progra- a resolução do BES, decidida pelo Ban- ta com dois nomes de sacerdotes da dio- ecos a nível mundial. Dizem
ma Mais Habitação e defendeu que o co de Portugal em 2014, não tendo vio- cese alegadamente suspeitos de abuso e as notícias que dias antes
mesmo contém medidas “inaceitáveis”. lado a constituição. Esta é a conclusão diz não ter mais informação. O bispo ficou do colapso vendeu milhões
Por isso, deixou o aviso que vai bater-se que consta no acórdão a que a Lusa teve indignado com as afirmações de elemen- em ações. Claramente, as
pela fiscalização da constitucionalidade acesso. Em causa estão os recursos de tos da comissão que fez o estudo dos abu- suas manobras de última
caso sejam aprovadas. A associação lamen- várias empresas que considerarem ile- sos na Igreja, afirmando que todos rece- hora para evitar a falência
tou também que o programa ponha fim gais várias decisões do Banco de Portu- beram informação e já solicitou à comis- não resultaram. P. 32
ao Balcão Nacional do Arrendamento. gal, que diziam violar a Constituição. são que corrija o que disse. José Cabrita Saraiva