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Silicon Valley Bank.

No interior
Edição n.º 2 | março 2023

Medina afasta risco e fala em robustez

Encargo comercial da responsabilidade da Litográfis – Artes Gráficas, Lda. Não pode ser vendido separadamente | Distribuição gratuita e bimestral
Ministro das Finanças lembra que se trata de “um caso de um banco regional, AO ENCONTRO DO NOSSO PATRIMÓNIO

CAMINHOS DE SANTIAGO

muito especializado”. Analista fala em “erro de gestão” // PÁG. 32


CAMINHOS DE FÁTIMA
PORTUGAL, NATURALMENTE

nsustentável

SNS POR
UM FIO
Nem Manuel Pizarro nem Fernando Araújo
estão a conseguir mudar o paradigma do Serviço Nacional
de Saúde, que continua a degradar-se
com falta de profissionais e de investimento. Resistirá?
A opinião de Álvaro Beleza, Alexandra Bento, Ana Rita Cavaco,
Carlos Cortes, Ema Paulino, Filipe Costa, Joana Bordalo e Sá, Joana
Cordeiro, João Dias, João Varandas Fernandes, José Manuel Silva,
Luís Filipe Pereira, Luís Pedroso de Lima, Miguel Guimarães,
Óscar Gaspar, Pedro Frazão, Rui Cristina e Sofia Ramalho
// PÁGS. 2-23

Jornal i 2,5 € // Terça-feira, 14 março 2023 // Ano 13 // Semanário // Número 3872 // Diretor: Mário Ramires // Dir. exec.: Vítor Rainho // Dir. exec. adjunto: José Cabrita Saraiva // Dir. de arte: Francisco Alves
EDITORIAL
É urgente
um compromisso
intergeracional
A
Radar

Mário Ramires

Ai pobres das crianças que andam há meses a pagar as


greves dos profissionais da Educação. Depois de dois
anos de pandemia com Ensino à distância, aí está mais
um ano perdido com as guerras entre um Governo com
um ministro surdo e sindicatos com lideranças histéri-
cas. Entre um Estado que tira o que não pode e não dá o
que pode e professores e auxiliares que, num rol de legí-
timas reivindicações, reclamam o respeito a que não se
dão, desde logo por descurarem a educação dos discen-
tes e se esquecerem do exemplo a que deviam sentir-se
obrigados pela disciplina, pela correção, pela boas práti-
cas – pois têm toda a razão de queixa dos comportamen-
tos (tantas vezes insanos) dos alunos nas escolas –,
quem perde é o país, assim mais uma vez adiado.
E o que se passa na Educação, passa-se na Justiça, com
dezenas de milhares de diligências sucessivamente
remarcadas, como se a morosidade dos tribunais e
demais instituições relacionadas já não fosse suficiente-
mente penalizadora de quem deles está dependente.
Ao ponto de não podermos falar verdadeiramente
de Justiça – ou de uma Justiça justa – tão mau

Caos e desespero.
e a destempo é o seu funcionamento.
Como é assim na Habitação, em que as propostas total-
mente inconstitucionais de governantes que aliam a
inexperiência à insensatez – faz confusão ouvir uma

Assim vai o
jovem ministra e um pós-adolescente secretário de
Estado despejarem um argumentário sem fazerem a
mínima ideia dos disparates que dizem – já começam a
motivar contrapropostas que só podem ter-se como

estado da saúde
brincadeiras de mau gosto, de tão alucinadas (para não
dizer criminosas) como as que já vão sendo avançadas
por alguns opinadores da nossa praça (v.g. João Duque
no Jornal das 2 da SIC-N neste sábado).

em Portugal
E a Saúde? Nem se fala!!! Portugal nunca teve tantos
hospitais, tantos médicos, tantos profissionais de saúde,
mas os serviços, de urgência e todos os outros, estão
cada vez mais à beira da rutura. Da natalidade aos cui-
dados continuados e paliativos. Já para não falar no que
se passa país fora com a falta de qualidade da assistên-
cia aos mais idosos.
Com tanto dinheiro a vir da Europa (entre PRR e outros
fundos), Portugal tem uma oportunidade única para A relação não tem DANIELA SOARES FERREIRA do da saúde em Portugal. E as
restaurar a esperança. sido fácil nem para daniela.ferreira@ionline.pt queixas multiplicam-se.
Há que atalhar caminho, urgentemente, antes que seja médicos, com fechos SÓNIA PERES PINTO O caso mais recente é a demis-
tarde e a oportunidade volte, uma vez mais, a perder-se. de serviços e pedidos sonia.pinto@ionline.pt são dos chefes de equipa de
O Estado chamou a si as funções essenciais na Educa- urgência de Medicina Interna
ção, na Justiça, na Habitação, na Saúde… E está a
de demissão em bloco, Demissões em bloco de chefes do Hospital São Francisco Xavier,
falhar clamorosamente em todas elas. Não vale nem para doentes de equipa de urgências, falta de em Lisboa, que apresentaram
a pena insistir no erro. que se deparam médicos de família – as últimas a demissão em bloco numa car-
Um país em envelhecimento acelerado não pode não com filas de espera contas apontam para mais de ta enviada esta segunda-feira ao
investir na natalidade e na educação, não criar oportu- intermináveis tanto um milhão, em que as situações conselho de administração, cri-
nidades para os seus jovens, continuar a asfixiar os seus para consultas mais graves verificam-se em Lis- ticando a falta de soluções para
trabalhadores e os seus empreendedores, não ter uma como para cirurgias. boa e Vale do Tejo – encerra- os problemas do serviço.
justiça atuante e capaz de responder às demandas da Urgências são mentos de serviços e listas de As urgências pediátricas são
sociedade e da economia, não ter como cuidar dos espera para cirurgias sem fim. outros dos problemas que o setor
doentes e muito menos descurar os seus mais velhos.
o principal calcanhar Mas as verdadeiras dores de enfrenta. O ministro da Saúde
Sem esse compromisso intergeracional que faça renas-
de Aquiles. cabeça ocorrem nas urgências, já avisou que vai demorar algum
cer a esperança, não há ‘bazuca’ que nos valha. Apenas com serviços cheios, horas inter- tempo até se conhecer o plano
um Estado apodrecido, sem presente digno nem futuro. mináveis de espera. É este o esta- de reorganização das urgências

2 —14 março 2023


SAÚDE

Setor contou com mais


1.177 milhões de euros no
Orçamento do Estado deste
ano, mas insuficiente para
responder às necessidades
MAFALDA GOMES

pediátricas de Lisboa e Vale do não têm a vida mais facilitada. entanto, apesar de ter diminuí- espera aumentaram entre 15,2% to de alguns doentes verem as
Tejo que já devia ter sido divul- Os tempos máximos de espera do ligeiramente o incumprimen- e 21,9% nas consultas no domi- suas consultas e cirurgias adia-
gado. E defende que é preferí- no Serviço Nacional de Saúde to, a lista de espera para cirur- cílio, e entre 2,9% e 10,4% nos das, mas isto também é uma
vel aguardar algum tempo e ter (SNS) voltaram a aumentar, sobre- gias continua a aumentar. No pedidos de renovação de medi- luta pelos doentes, para que
um sistema mais seguro. Ainda tudo nas cirurgias cardíacas e primeiro semestre deste ano, cação, em ambos os casos entre tenham acesso e qualidade à
esta segunda-feira, a direção oncológicas durante o ano de mais de 167 mil doentes aguar- janeiro e junho deste ano. prestação de cuidados médicos
Executiva do Serviço Nacional 2021 e os primeiros seis meses davam por uma operação. Já Para este ano, o ministro da no Serviço Nacional de Saúde”,
de Saúde publicou o plano de de 2022, informou a Entidade nas primeiras consultas de espe- Saúde acenou com a realização chegou a dizer a presidente do
reorganização para as urgên- Reguladora da Saúde (ERS). cialidade realizaram-se mais de de mais de 12 326 000 consul- sindicato, Joana Bordalo e Sá.
cias de pediatria da área de Lis- Os números analisados pela 587 mil a pedido dos centros de tas (mais 15,7% face a 2019), mais Os médicos reclamam novas
boa e Vale do Tejo. Só três ficam ERS mostram que, apesar do saúde, mas piorou (37%) o incum- de 3 657 000 primeiras consul- grelhas salariais bem como o
de fora deste horário, funcio- aumento das cirurgias e consul- primento dos prazos máximos tas hospitalares (mais 29,7% face redimensionamento da lista de
nando apenas das 9h às 21h: tas relativamente ao primeiro previstos na lei. Já as consultas a 2019) e mais de 660 000 cirur- utentes dos médicos de família,
Hospital de Loures, Torres Vedras, semestre de 2021, a lista de espe- de cuidados de saúde primários gias (mais 38% comparativa- a dignificação das condições de
do Centro Hospitalar do Oeste, ra continua a aumentar. Nos pri- também sofreram atrasos signi- mente a 2019). E reconhecendo trabalho e a valorização da car-
e São Francisco Xavier, Centro meiros seis meses, um doente ficativos: as taxas de incumpri- que os elevados tempos de espe- reira, que inclua um horário-
Hospitalar Lisboa Ocidental. oncológico esperou em média mento nos prazos máximos de ra nos serviços de urgência dos base de 35 horas (a maior par-
Esta estratégia resulta de “lon- 27,5 dias (em 2021 esperou 21,5 hospitais são “um problema cró- te dos médicos no SNS trabalha
gas semanas de trabalho, com dias) pela cirurgia com a taxa nico” que só poderá ser resolvi- 40 horas por semana) e a dedi-
os profissionais das várias ins- de incumprimento de 22% (mais do com “medidas integradas em cação exclusiva opcional.
tituições que estão no terreno, um ponto percentual do que em todo o sistema”. Na última década (2011-2022),
com a ponderação e diálogo 2021) a crescer nas cinco regiões o aumento do número de pro-
necessários, visando a constru- de saúde. Para cerca de 51%, a RAIO-X Também a relação do fissionais, sobretudo desde 2015,
ção de respostas que visam asse- primeira consulta não respeita Número de Governo com o setor não tem foi anulado pelo aumento do
gurar a proximidade e o acesso o tempo previsto (em 2021, esta médicos perto da sido pacífica. Com todas as falhas número de profissionais que tra-
da população ao SNS, sublinhan-
do a enorme generosidade e
percentagem era de 32%). Quan-
to à cardiologia, houve mais pri-
reforma tem vindo que têm existido no SNS, os médi-
cos estiveram recentemente em
balham em tempo parcial e pelas
alterações aos horários de tra-
esforço dos profissionais”, diz a meiras consultas do que no ano a aumentar e sem greve numa paralisação de dois balho (regresso às 35 horas). Esta
DE-SNS em comunicado. passado, mas a grande maioria solução à vista dias convocada pela Federação é uma das principais conclusões
E se o Governo deu 1 177 milhões dos utentes espera mais do que Nacional dos Médicos (FNAM). do Relatório Recursos Huma-
de euros no Orçamento do Esta- o que está definido na lei. “Não temos outra alternativa nos em Saúde, elaborado no âmbi-
do para a Saúde só este ano, um Nos primeiros seis meses do “O fim das PPP neste momento. O Governo e to da Iniciativa para a Equidade
aumento de 10,5% em compara- ano passado, nas várias especia- foi uma péssima esta equipa ministerial estão a Social, uma parceria entre a Fun-
ção com o orçamento inicial de
2022, é insuficiente para dar res-
lidades foram realizadas no SNS
mais de 265 mil cirurgias pro-
notícia para os empurrar-nos para isso. Infeliz-
mente não era a medida que
dação “la Caixa”, o BPI e a Nova
SBE que revela ainda que a capa-
postas tanto aos profissionais gramadas – um aumento de 18% portugueses, para o queríamos tomar e lamentamos cidade do SNS “depende, entre
como aos utentes que também em relação ao ano anterior. No SNS e para o país” desde já profundamente o fac- continua na página seguinte >>

—14 março 2023 3


A Radar //

TOTAL DE RECURSOS HUMANOS DO SNS (SPA, EPE, PPP)


155 000
150 000
145 000
140 000
135 000
130 000
125 000
120 000
2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021

EVOLUÇÃO DOS RECURSOS HUMANOS NO SNS


POR GRUPO PROFISSIONAL
Técnicos de diagnóstico e terapêutica Enfermeiros
Médicos S/internos Técnicos superiores de saúde Assistentes opcionais
Médicos internos Assistentes técnicos Outros
160 000
140 000
120 000
100 000
80 000
60 000
40 000
20 000
0
2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021 2022
DEZ DEZ DEZ DEZ DEZ DEZ DEZ DEZ JUL

EVOLUÇÃO DE NÚMERO DE MÉDICOS POR FAIXA ETÁRIA


NÚMERO E PERCENTAGEM ACIMA DOS 65 ANOS
Médicos < 65 ANOS (eixo esquerda) % médicos <65 anos (eixo direita)
Médicos > 65 ANOS (eixo esquerda)
60 000 30%
50 000
40 000
30 000 15%
20 000
10 000
0 1996 97 98 99 2000 01 02 03 04 05 06 07 08 09 2010 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 2021
0%

NÚMERO DE MÉDICOS E ENFERMEIROS (POR MIL HABITANTES)


Médicos Enfermeiros
15

10 Chefes dos serviços


de urgências de vários
5
hospitais têm apresentado
0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021
a demissão devido à pressão
MAFALDA GOMES
FONTE: ORDEM DOS MÉDICOS

>> continuação da página anterior lação particularmente envelhe- resolver. Segundo os dados mais to destas saídas ao nível, por no mesmo período, apesar da
cida, com elevada prevalência atuais – que dizem respeito a exemplo, da manutenção da capa- quebra significativa em 2022,
outros fatores, do número de de doenças crónicas e hábitos dezembro de 2021 – cerca de cidade formativa no SNS”. face ao aumento da inflação)” e
horas trabalhadas e não do núme- de vida pouco saudáveis”. um quarto dos médicos (24%) os autores do estudo referem
ro de profissionais. Concluindo No entanto, os responsáveis inscritos na Ordem tinha mais E A EXAUSTÃO? O mesmo relató- que o período de recuperação
assim que ‘o esforço financeiro alertam para as limitações “que de 65 anos, “o que faz antecipar rio fala ainda na exaustão e na registado antes da pandemia
realizado foi canalizado para a impedem uma justa compara- uma vaga de aposentações nos perda do poder de compra dos “não foi suficiente para recupe-
recuperação e não para a expan- ção”, mas defendem que Portu- próximos anos, cenário que atin- profissionais de saúde. “A dete- rar significativamente as difi-
são da capacidade’”. gal é o país da OCDE com maior girá o seu pico na presente déca- rioração da atratividade do SNS culdades sentidas durante a cri-
O estudo elaborado por Pedro número de médicos por mil habi- da (2020–2030), com um expec- tem vindo também a ser refor- se financeira e para fazer face
Pita Barros e por Eduardo Cos- tantes (5,5 médicos por cada mil tável volume médio de aposen- çada pela diminuição da com- à dinâmica recente de preços”.
ta mostra que, apesar do núme- habitantes). Por outro lado, sur- tações anuais superior a 450”. petitividade das condições remu-
ro de profissionais de saúde no ge entre os dez países com menos Este envelhecimento é menos neratórias, fruto da evolução PPP VS POLÉMICAS As famosas
nosso país tenha “crescido de enfermeiros (7,1 enfermeiros expressivo nos enfermeiros mas negativa das mesmas”. E deixa Parcerias-Público-Privadas (PPP)
forma contínua” – tendo em con- por mil habitantes) e é mesmo o estudo garante que “afeta dire- números: é que, enquanto o ganho foram lançadas no Governo de
ta que entre dezembro de 2014 o país da OCDE com o rácio de tamente o planeamento dos recur- médio nacional subiu 23% entre António Guterres, em 2001, mas
e junho de 2022 se verificou um enfermeiros por médico mais sos humanos em saúde, uma vez 2011 e 2022, no caso dos médi- foram concretizadas durante um
aumento global de 29% com mais baixo (1,3 enfermeiros por médi- que a proporção de médicos enve- cos observou-se um decréscimo outro Executivo socialista, pelas
35% de médicos internos, 25% co, em contraposição à média lhecidos não só reduz o núme- de 5% (em parte explicado pelas mãos de José Sócrates e que vol-
de médicos especialistas e 35% dos restantes países que apre- ro de profissionais disponíveis aposentações) e no caso dos enfer- taram entretanto para a respon-
de enfermeiros – o aumento da sentam um rácio de 2,7 enfer- para trabalhar em período notur- meiros o ganho médio subiu 14%, sabilidade do Estado. Ainda na
procura por cuidados de saúde meiros por cada médico). no ou na urgência, como permi- no mesmo período. semana passada, o ministro da
e a sofisticação técnica “esbatem te antever, para a presente déca- “A comparação entre a evolu- Saúde defendeu que “não hou-
os ganhos obtidos pelo aumen- O PROBLEMA DO ENVELHECIMEN- da, a aposentação de cerca de 5 ção das remunerações reais e a ve decisão política” de terminar
to do número de profissionais TO E se o número de profissio- mil médicos”. E deixa sugestões: evolução do poder de compra, com as PPP e as que não foram
de saúde”. O relatório revela tam- nais não é elevado, a idade é “‘O planeamento atempado des- evidencia que, em 2022, os médi- renovadas foi por “recusa legí-
bém que Portugal “apresenta também um problema. É sabi- sas aposentações é fundamen- cos perderam 18% do poder de tima” dos privados em manter
fortes desequilíbrios na força de do que o número de médicos tal para minimizar disrupções compra face a 2011, e os enfer- o contrato durante a renovação,
trabalho em saúde, o que acen- portugueses perto da reforma no normal funcionamento dos meiros perderam 3% (em média, nomeadamente os hospitais de
tua a dificuldade para fazer face tem vindo a crescer e isso é vis- cuidados de saúde’ adiantam os os trabalhadores nacionais viram Loures, Braga e Vila Franca de
às necessidades de uma popu- to com um problema claro a investigadores, frisando o impac- o seu poder de compra subir 6% Xira. A única exceção é Cascais.

4 —14 março 2023


SAÚDE

“A política que tem sido seguida


é a de enfraquecimento do SNS
e do favorecimento do grande
setor privado da saúde”

José Manuel Silva arrasa a atuação do Executivo:


‘Conduziu o SNS talvez ao seu estado mais grave,
desde sempre, pelas mãos de um Governo que
diz que o defende, mas não é verdade’.
Como vê as greves no setor? podem ser martelados. Isso mos- de/ acessibilidade /custo per capi-
Tem a ver com a estratégia polí- tra que assistimos a uma degra- ta. E, infelizmente, o SNS está a
tica que foi seguida e não foi dação da prestação do SNS e, no perder essas características cada
melhorada por quem se seguiu entanto, os respetivos números vez mais por força de haver um
a Paulo Macedo. Hoje temos o apresentam sempre uma melho- ataque velado por via da asfixia
Serviço Nacional de Saúde no ria de ano para ano, o que é um financeira ao SNS. E não só.
estado calamitoso em que está. paradoxo. Numa altura em que Tínhamos, no essencial, três
Ou seja, a degradação do Servi- temos mais pediatras, mais obs- pilares em Portugal: o SNS, o
ço Nacional de Saúde continuou. tetras de sempre, temos os maio- pequeno setor privado e inde-
O problema é que a seguir ao res problemas nas maternida- pendente e tínhamos o grande
Governo dito da troika, os cor- des do nosso país. Alguma coi- – que na altura não era muito
tes continuaram, mas mudaram sa está mal, está muito mal. grande – setor privado e tam-
de nome para cativações. No Deve-se à falta de gestão? bém a área das misericórdias,
entanto, a estratégia é exata- O SNS não tem um problema das IPSS. O pequeno setor pri-
mente a mesma: reduzir ao míni- estrutural, ao contrário do que vado independente foi comple-
mo o financiamento do Serviço muitos dizem. Não precisa de tamente liquidado. Hoje quase
Nacional de Saúde, embora quan- reforma, precisa é de um finan- não se encontra um consultó-
titativamente o financiamento ciamento adequado e de uma rio médico independente. E como
do SNS tenha ido aumentando. gestão de qualidade que preser- é que isso foi feito? Definindo
A política que tem sido seguida ve a capacidade de resposta do para o pequeno prestador pri-
é a de enfraquecimento do Ser- SNS que é a forma mais barata vado de saúde independente
viço Nacional de Saúde e do favo- e de melhor qualidade para pro- regras incomportáveis que o
recimento do grande setor pri- porcionar recursos de saúde de Estado não seguia e, ao mesmo
vado da saúde. E isso conduziu qualidade a toda a população tempo, criando mão armada por
o SNS talvez ao seu estado mais sem discriminação. Costumava parte de uma entidade regula-
Pizarro recusou “alimentar tugueses aos cuidados de saúde. grave, desde sempre, pelas mãos dizer – e já escrevi – que o SNS dora da saúde que aplicava coi-
qualquer guerra” entre público “Todos os manuais sobre o assun- de um Governo que diz que o era o melhor serviço de saúde mas milionárias, levando ao
e privado. “Cada setor tem o seu to o aconselham e esta questão defende, mas não é verdade. do mundo na relação qualida- encerramento da generalidade
papel, mas não há dúvida de que é tanto mais verdadeira quanto E os resultados estão à vista? do pequeno prestador de cuida-
o nosso seguro coletivo é o SNS”. no ‘post- covid’ será necessário A política de saúde do Governo dos de saúde independente. E
Uma opinião contrária tem o um esforço acrescido para aumen- PSD/CDS, com Paulo Macedo na depois assistimos aos grandes
presidente da Associação Portu- tar a capacidade de resposta às pasta, fez uma boa gestão do privados. Tudo isto foi conduzi-
guesa de Hospitalização Priva- necessidades de saúde dos por- Serviço Nacional de Saúde, natu- do de forma deliberada e conti-
da (APHP) ao referir que “o fim tugueses”, diz ao i. ralmente sem corresponder àqui- nua a ser conduzido pelo atual
das PPP foi uma péssima notícia E em relação aos benefícios lo que eram as expectativas dos Governo. Temos um Governo
para os portugueses, para o SNS não hesita: “As PPP trouxeram profissionais de saúde e dos doen- que diz que defende o SNS e con-
e para o país”. E para Óscar Gas- quatro novos hospitais para o tes. Agora as circunstâncias estão tinua a seguir a mesma política
par, “os principais prejudicados SNS, construídos a tempo e horas ainda piores, não obstante a de criação de condições para o
com o fim das PPP foram os por- e sem qualquer derrapagem. Os maior despesa em saúde por crescimento do grande setor pri-
tugueses que beneficiavam do contratos estabelecidos foram parte do Governo, por força do vado da saúde. Não tenho nada
funcionamento eficiente daque- cumpridos, os termos do acom- aumento da inflação, dos aumen- contra o setor privado da saú-
les hospitais”, admitindo, no entan- panhamento da atividade assis- tos dos custos dos recursos huma- de, pelo contrário, faz parte da
to, que o fim destes regimes repre- tencial foram os mais exigentes nos e do aumento dos custos de tripeça da prestação de cuida-
senta “uma decisão política que e tidos como exemplares pelo tempo das novas tecnologias, dos de saúde à população, mas
não nos diz respeito. Compete Tribunal de Contas. As PPP pou- mas a verdade é que o SNS está a verdade é que eliminou uma,
aos decisores políticos e ao SNS param dezenas de milhões de pior, embora as estatísticas apre- enfraqueceu a outra e fortale-
definir os termos de gestão dos
seus hospitais”.
euros ao Estado em cada ano de
funcionamento. O nível de satis-
sentadas pela tutela, pelas enti-
dades oficiais do Ministério da
“O pequeno ceu outra. E naturalmente assis-
timos agora aos grandes impé-
O responsável defende que fação dos cidadãos/utentes era Saúde apontem sempre para setor privado rios por parte de empresas mul-
numa perspetiva nacional, é elevado, tal como a satisfação uma melhoria contínua dos independente foi tinacionais de prestação de
necessário que haja uma maior
articulação entre os setores pri-
dos colaboradores/profissionais
de saúde”, lembrando que os
números do Serviço Nacional
de Saúde. A verdade também é
completamente cuidados de saúde privados em
Portugal. E quando se compa-
vado e público, o que, no seu ganhos não foram apenas finan- que não há nenhuma entidade liquidado” ra o setor público e o setor pri-
entender, leva a um reforço da ceiros, mas de prestação de cui- independente que audite esses José Manuel Silva vado faz-se sempre essa análi-
sustentabilidade do sistema e a dados de saúde e da organiza- números. Ninguém sabe se cor- EX-BASTONÁRIO DOS MÉDICOS
E ATUAL PRESIDENTE
se de forma deliberadamente
um aumento de acesso dos por- ção de serviços. respondem à verdade ou não e DA CÂMARA DE COIMBRA enviesada. Sónia Peres Pinto

—14 março 2023 5


A Radar //

Contradições.
O “amor/ódio”
de Marta Temido
pelo setor privado

Naquela que foi a sua primeira entrevista depois de ter abandonado


o cargo de ministra da Saúde, Marta Temido surpreendeu o país
ao elogiar o papel dos privados durante a pandemia.

SARA PORTO co, sublinhando que a perceção de do SNS na resposta à covid-19.


sara.porto@ionline.pt do SNS querer agir sozinho, na Coisa diferente é aquilo que estas
altura, era “errada”. entidades possam ter realizado
A entrevista ocorreu na primei- “Os operadores privados e do em termos de atividade assisten-
ra quinta-feira do mês. Contudo, setor social foram essenciais para cial aos seus doentes. O que nin-
duas semanas depois, ainda ecoam a resposta à pandemia. Há mui- guém entenderia era que o SNS,
algumas das declarações da ex- ta coisa que acontece que é explo- de um momento para o outro,
ministra da saúde Marta Temi- rada, porque interessa politica- fosse responsável pelo atendi-
do, que numa conversa condu- mente ser explorada, mas isso é mento dos doentes que, por sua
zida pela jornalista Dulce Salze- da vida e é desta vida”, admitiu, livre vontade, escolheram diri- significa o quê? Que nós recebe- do afirmou: “Os contratos de par-
das, para a SIC Notícias, falou assumindo que “muitos priva- gir-se a um prestador privado”, mos um conjunto de infraestru- ceria público-privada de que temos
pela primeira vez desde que dei- dos contribuíram mais para o explicava. turas que não conhecemos, que vindo a dispor, claramente, não
xou o Governo em setembro de setor público que próprias enti- Já em outubro do mesmo ano, têm agendas operatórias, de pres- asseguram a dinâmica de respos-
2022. O momento foi marcado dades do SNS”, tendo em conta afirmava que existia “colabora- tação de cuidados... tudo o que ta às necessidades assistenciais da
por revelações e contradições. que o grupo “não era tão coeso ção com os privados e o setor seja um bom acordo é preferível população. Isso é claro quando,
A deputada na Assembleia da quanto se poderia pensar ou quan- social”. De acordo com Temido, a uma situação de conflito”, jus- no dia a seguir à assinatura do
República e presidente da comis- to se gostaria de receber”. “Os em caso de necessidade, o Esta- tificava. contrato, ele se encontra já desa-
são política concelhia de Lisboa operadores do setor privado e do até contrataria privados. Mas Em maio, numa audição parla- tualizado para a resposta a essa
do PS, falou sobre o papel dos social foram absolutamente essen- “porque nos estão a empurrar?”, mentar, a ministra da Saúde falou mesma dinâmica. Isso é claro quan-
privados durante a pandemia da ciais na resposta à pandemia. E perguntava. dos hospitais com contratos de do nos confrontamos com circuns-
covid-19 e, para surpresa de mui- às vezes até mais solidários com Um mês depois, em audição PPP. Confrontada por Álvaro Almei- tâncias como a resposta às neces-
tos, a opinião que tinha na altu- o Serviço Nacional de Saúde do conjunta da Comissão da Saúde da, deputado do PSD, sobre o fim sidades assistenciais, por exem-
ra em que desempenhou o car- que as próprias entidades do e da Comissão de Orçamento e das PPP’s e “desperdiçar 50 milhões plo, da covid-19”.
go de ministra da Saúde, mudou SNS”, afirmou. Finanças, na Assembleia da Repú- de euros do dinheiro dos contri- Segundo o Polígrafo SIC, um mês
radicalmente. Sobre o facto de essa não ser a blica, a ministra da Saúde garan- buintes portugueses”, Marta Temi- antes, a 7 de abril, a ministra tinha
Mas, afinal, o que pensa Marta imagem transmitida à época, tia que não existia “nenhuma enviado uma carta à administra-
Temido do setor privado? Quan- Temido negou que o SNS quises- barreira ideológica” que inibis- ção de cada uma das três PPP –
tas vezes mudou de ideias? se atuar sozinho: “Há muita coi- se o Governo de recorrer ao setor Cascais, Loures e Vila Franca de
sa que acontece e que é explora- privado para aliviar a pressão Xira – a elogiar o seu contributo
SOLIDARIEDADE DOS PRIVADOS da porque interessa politicamen- sobre o Serviço Nacional de Saú- precisamente no que respeita ao
Relembrava os momentos “ter- te ser explorada”. de. Contudo, por outro lado, afir- combate à covid-19. Incorrendo
ríveis” que viveu como ministra Ou seja, três anos depois, pare- mava que “não havia resposta da
Segundo assim em mais uma contradição.
da Saúde quando confessou ter ce que a ex-ministra mudou de hospitalização privada para os a ex-ministra,
sentido muita solidariedade por ideias. doentes covid-19”. durante a pandemia, MARCELO E O SNS Depois de sete
parte dos diretores dos conse- Em janeiro de 2021, numa entre- anos em Belém, o chefe de Esta-
lhos de administração dos hos- EMPURRAR OS PRIVADOS Em abril vista à RTP, já admitia até uma
os privados foram do fez um balanço dos últimos
pitais que comunicaram todos de 2020, enquanto ministra da requisição civil dos privados, “mui- essenciais meses em entrevista à RTP e ao
entre si, públicos ou privados, Saúde, assegurava que o SNS só to contra a sua vontade”: “Eu acre- jornal Público. Sobre a altura da
para “encontrarem soluções à pagaria a conta aos privados se dito que há disponibilidade para pandemia, falando sobre o esta-
crise hospitalar que assolou Lis- os pacientes infetados fossem aprofundarmos esse relaciona-
“Os contratos do e as perspetivas para o SNS,
boa em janeiro de 2021 (período encaminhados pelo SNS: “As enti- mento. Contudo, não hesitamos de parceria Marcelo Rebelo de Sousa disse
mais difícil da pandemia)”. Segun- dades que operam no setor pri- em dizer que se esse aprofunda- público-privada que as necessidades em termos
do Marta Temido, foi essa coo- vado e social podem, se assim o mento não for possível, teremos de saúde tendem sempre a agra-
peração que sustentou a saúde entenderem, e havendo necessi- que tomar medidas extremas,
não asseguram var-se, “porque nós envelhece-
do país nesse período pandémi- dade, complementar a capacida- como a requisição civil. Mas isso as respostas” mos”. “É uma população que

6 —14 março 2023


SAÚDE

Opinião
LUÍS FILIPE PEREIRA

As urgências hospitalares e a degradação do SNS


A incapacidade de resposta dos serviços de tam e têm direito, pagam do seu bolso os
urgência hospitalares às necessidades da seguros de saúde quando a Constituição lhes
população, como tem sido repetidamente garante a gratuitidade do acesso (apenas com
noticiado na Comunicação Social, em especial taxas moderadoras).
no caso das urgências dos hospitais da Região A adicionar a estes 3,5M de pessoas existem,
de Lisboa e Vale do Tejo, é apenas uma mani- ainda, mais cerca de 1,3 M (funcionários
festação de um problema de fundo do Serviço públicos e elementos das forças de segurança
Nacional de Saúde (SNS): a sua incapacidade e respetivas famílias) que recorrem também
de garantir o acesso a todos os portugueses generalizadamente ao setor privado, (no caso
aos cuidados de saúde de que necessitam, de da ADSE os funcionários públicos pagam 3,5%
forma universal, geral e (tendencialmente) dos seus vencimentos mensais) o que obvia-
gratuita, como determina a Constituição. mente não fariam se a resposta, gratuita, do
No caso especifico das urgências hospitalares, SNS, fosse a mesma da que obtêm no setor
o seu fecho (em algumas especialidades como privado.
obstetrícia e pediatria) e o mau atendimento Em síntese, cerca de 48% da população portu-
à população, têm a ver, no essencial, com a guesa procura de forma generalizada, pagan-
falta de organização e gestão e com a falta de do, o setor privado da saúde, por falta de res-
Em outubro de 2021, profissionais médicos, em resultado da inca- posta do SNS, com exceção da procura dirigi-
Marta Temido perguntava pacidade do Governo, nos últimos anos, em da, mas residual, aos cuidados de saúde não
aos hospitais privados criar condições (de melhores remunerações, cobertos ou insuficientemente cobertos pelo
porque ‘empurravam’ o SNS de perspetivas de carreira, de uma melhor SNS, como por exemplo os cuidados dentá-
BRUNO GONÇALVES organização) que pudessem evitar a saída de rios. E a procura de seguros de saúde priva-
profissionais experientes e qualificados, para dos tem vindo a aumentar constantemente
o setor privado e para o estrangeiro, e atrair e como comprovam os dados da ASF-Autorida-
envelhece, portanto, é mais doen- os esforços. Mas a coluna ver- reter os mais jovens. de de Supervisão do Setor de Seguros que
te. Nós empobrecemos, portan- tebral é o SNS”, lembrou. A acrescer a esta situação, houve também referem um aumento anual constante.
to, uma população mais pobre, uma falta de planeamento quanto ao recruta- De notar ainda que o pagamento de segu-
tende a ser mais doente e mais TEMIDO A PRESIDENTE? Na entre- mento de novos profissionais que permitisse ros privados de saúde não esgota o esforço
carenciada”, afirmou. Segundo vista à SIC Notícias, Marta Temi- colmatar a saída (que era previsível) de profis- financeiro que as famílias têm que supor-
o Presidente da República, o do foi ainda questionada sobre a sionais mais idosos para a reforma. tar para terem acesso a cuidados de saúde:
SNS, é precisamente, contando possibilidade (que tem sido mui- Mas o problema grave do acesso pela 27% das despesas totais em saúde, em Por-
com as pensões e reformas, o to comentada dentro do PS) – de população aos cuidados de saúde, manifes- tugal, são ainda suportadas pelas famílias
que há de seguro de vida rema- ser a candidata do partido à Câma- ta-se também: enquanto pagamentos diretos aos presta-
nescente dos mais idosos e pobres ra de Lisboa nas próximas autár- – Nas elevadas e persistentes listas de espera dores, uma das percentagens mais eleva-
do país. “Estamos numa corri- quicas (setembro/outubro de para cirurgias e na incapacidade de cumprir, das no contexto europeu..
da contra o tempo. Eu acho que 2025). Na prática, Marta Temido em grande parte dos hospitais do SNS, os A situação presente no país conduz a uma dis-
o ponto de partida era o possí- não excluiu essa hipótese: “Não TMRG (Tempos Máximos de Resposta Garan- criminação social das pessoas mais vulnerá-
vel. Um Governo de direita fazia sou candidata a nada. Isso exigi- tida) previstos na lei, para a sua realização; veis e desfavorecidas, que não tendo meios
uma coisa diferente, com mais ria um pensamento estratégico – nos prazos inaceitavelmente elevados para financeiros para recorrer ao setor privado,
recursos aos privados…”, conti- pessoal que não tenho”, afirmou, consultas hospitalares, chegando a atingir têm que suportar as consequências da falta
nuou, confessando não ser impos- acreditando que ainda que “é meses ou mesmo anos, em alguns hospitais e de resposta do SNS, como referido.
sível reintroduzir, onde é fun- cedo, mesmo muito cedo” para em determinadas especialidades; Ou seja, esta situação leva à existência de
damental, parceira. “Mas teria se falar nas autárquicas. Porém, – na falta de resposta dos Cuidados Primários, uma realidade dual, discriminatória, entre os
outra política, mesmo com o mais adiante na conversa, inter- com cerca de 1,5 milhões de pessoas, hoje, portugueses, contrária à garantia constitucio-
setor privado a ter crescido bru- rogada se “acharia normal que o sem médico de família. nal de equidade no acesso aos cuidados de
talmente em seguros de saúde, presidente da concelhia pudesse Esta situação de degradação de resposta do saúde: os que têm meios financeiros recor-
que resolvesse o problema de ser candidato à câmara”, a ex- SNS tem vindo a verificar-se apesar do rem ao setor privado, pagando, e os mais vul-
uma população envelhecida e ministra respondeu: “Tanto quan- aumento dos recursos financeiros de forma neráveis e desfavorecidos têm que suportar a
pobre. E sobretudo que tivesse to sei é uma circunstância que significativa. Nos 7 anos dos governos socialis- falta de resposta do SNS.
meios para isso”, explicou. “Quan- pode acontecer. Mas, o propósi- tas as despesas correntes totais do SNS Esta situação, por outro lado, leva também à
do foi com a pandemia, o priva- to [de liderar atualmente a con- aumentaram de 9,1 mil milhões (mM) em conclusão que é a falta de resposta do SNS
do foi impecável e demorou-se celhia de Lisboa] não é esse”. 2015 para cerca de 14mM em 2022. Ou seja, a que alimenta, em larga medida, o crescimen-
tempo de mais no público a recor- O “pode acontecer” acabou por maiores recursos no SNS corresponde um to do setor privado da saúde, através da pro-
rer-se ao privado”, acredita Mar- abrir todo um mundo de possi- pior desempenho. cura que lhe é dirigida pelos cidadãos e não a
celo Rebelo de Sousa. “E não bilidades em torno do seu nome A incapacidade de resposta do SNS levou a transferência de recursos do Estado para o
tinha as camas que se pensava”, para uma candidatura à CML que cerca de 3,5 Milhões de pessoas possuam, setor privado como afirmam os partidos de
acrescentou. Por isso, segundo pelo PS, com dirigentes socialis- hoje, seguros de saúde privados. Ou seja, os extrema-esquerda.
o Presidente da República, nes- tas locais a reconhecerem que a portugueses para terem acesso aos cuidados
te momento, “todos somados ex-ministra da Saúde se colocou de saúde no tempo e no modo de que necessi- Economista, gestor
somos poucos”. “Temos de somar na “rampa de lançamento”.

—14 março 2023 7


A Radar //

Opinião
MIGUEL
GUIMARÃES

Saúde em mudança?
O que falta?
Na Saúde, Portugal distinguia-se das outras carreiras para que
de outros países europeus pela sejam criadas as condições ade-
qualidade do seu serviço públi- quadas, incluindo as salariais,
co. Na verdade, durante muitos para cativar os médicos e outros
anos, apesar das dificuldades profissionais, e equilibrar o capi-
próprias de um país com recur- tal humano no SNS. Falta
sos limitados, o nosso SNS per- modernizar o SNS e torná-lo
mitiu a democratização do aces- competitivo. O SNS não vive sozi-
so a cuidados de saúde. O que nho em Portugal e tem a Europa
falta então a Portugal para recu- a olhar para nós. Ou somos com-
perar o tempo perdido? O que petitivos ou corremos o risco da
falta ao SNS para que os médi- situação atual se agravar. Falta
cos e outros profissionais optem um novo modelo de gestão que
em primeiro lugar por ficar a permita aos hospitais e ACeS
trabalhar no serviço público? terem autonomia, mais governa-
Os princípios fundadores do ção clínica e mais flexibilidade
SNS já não são cumpridos. A sua nos processos de gestão. Falta
genética está a desintegrar-se. implementar a verdadeira trans-
Por exemplo, a dignidade das formação digital, com o processo
pessoas nos cuidados de saúde clínico único à cabeça. Falta
já teve melhores dias. A equida- libertar os médicos de tarefas
de no acesso a cuidados de saú- administrativas e burocráticas e Privados têm mais de 11 mil camas para internamentos
de nunca foi universal e a situa- melhorar os procedimentos
ção tem-se agravado de forma informáticos, dando mais tempo
substancial nos últimos anos.
Escapa a solidariedade porque
está basicamente na dependên-
aos médicos para os seus doen-
tes. Falta mais cuidados integra-
dos e menos cuidados fragmen-
Hospitais. Qual o peso
cia dos impostos que pagamos.
As dificuldades que temos hoje
no SNS já têm uns anos de evo-
lução e a tão propalada mudan-
tados. Esta situação é evidente
quando confrontamos os hospi-
tais e os cuidados de saúde pri-
mários. Falta aumentar o investi-
dos privados no setor?
ça tarda em acontecer. mento em investigação, inova-
Mais de 1.5 milhões de cidadãos ção e qualidade. Faltam mais
não têm médico de família atri- cuidados continuados e paliati-
buído. Continuamos a derrapar vos. Falta implementar uma ver- Desde 2016 que os hospitais privados predominam
de forma preocupante nos tem- dadeira reforma hospitalar que em relação aos públicos e PPP. Já são 129 no total.
pos máximos de resposta garan- também inclui o serviço de
tidos para consultas, cirurgias e urgência. Falta criar um Institu-
exames. Os serviços de urgência to Público, independente e finan- JOANA MOURÃO CARVALHO A atividade dos hospitais privados já ascen-
continuam instáveis e sem ciado através do OE, que se dedi- joana.carvalho@ionline.pt de aos dois mil milhões de euros e o setor
reforma à vista. Umas vezes que em exclusividade a promo- emprega mais de 40 mil profissionais (40510),
encerram outras estão abertos. ver a saúde, a prevenir a doença Os hospitais privados têm uma posição cada dando resposta a mais de 8,4 milhões de
Continuamos com um défice e a educar os cidadãos para a vez mais preponderante no setor da saúde consultas médicas, 1,9 milhões de episódios
significativo a nível dos cuidados saúde e para a utilização dos ser- em Portugal. Desde 2016 que predominam de urgência e 338 mil cirurgias.
continuados e paliativos. A viços de saúde (com professores, em relação aos hospitais públicos de aces- Além destes, há um outro dado que suge-
reforma da saúde pública aguar- engenheiros,...). E as faltas e so universal ou em parceria público-priva- re que os utentes cada vez mais recorrem
da melhores dias. E por aí fora. situações podiam continuar. Por da, sendo que até 2022 estavam em funcio- aos operadores privados de saúde: o núme-
Na verdade a saúde em mudan- exemplo, tive agora a notícia que namento 129, com uma oferta de 11600 ro de pessoas que se precaveu quanto às des-
ça que todos desejamos ainda se demitiram das suas funções camas de internamento, de acordo com pesas com cuidados de saúde. Ao todo, já há
não está a acontecer. O que falta? de chefe de urgência mais um dados da Associação Portuguesa de Hospi- mais de 5 milhões de portugueses a benefi-
Falta um plano para a saúde em conjunto de médicos de medici- talização Privada (APHP). ciar de um seguro privado de saúde ou de
Portugal que seja consistente e na interna, desta vez do hospital Entre as maiores redes de cuidados de saú- um subsistema de saúde. Destes 3,3 milhões
claro, para que todos os cidadãos S. Francisco Xavier. É urgente de privados em Portugal estão a Luz Saú- têm seguros de saúde, sendo esta a maior
o entendam. Um plano que que a mudança aconteça. de, detida pela seguradora Fidelidade, a fatia da atividade dos hospitais privados.
transmita confiança aos doentes Lusíadas Saúde, adquirida no final do ano Ao longo dos últimos anos tem-se verifica-
e aos profissionais de saúde. Fal- Ex-Bastonário da Ordem passado pelos franceses da Vivalto Santé, a do um aumento progressivo no volume de
ta a revisão da carreira médica e dos Médicos Trofa Saúde e a CUF, que pertence ao Gru- seguros privados subscritos pela população,
po José de Mello. tal como aponta o estudo “Seguros de saúde

8 —14 março 2023


SAÚDE

Números
Opinião

129
CARLOS
CORTES

Há 129 hospitais privados


em Portugal, segundo a APHP

40510
O número de funcionários
O momento atual
dos hospitais privados já Vivemos momentos delicados no a solução para a sobreutilização
ultrapassa os 40 mil setor da Saúde e no Serviço Nacio- das urgências hospitalares.
nal de Saúde (SNS) em particular. A criação de mega-serviços de

338
Fatores internos, mas sobretudo urgência não resolverá nem a falta
externos, causam impactos pro- de recursos humanos, nem o exces-
fundamente negativos na resposta so da afluência de doentes com
do setor público que se agudiza- motivos não-urgentes.
Os hospitais privados realizaram ram com os choques de crises eco- Bem pelo contrário...
338 mil cirurgias no ano passado nómica, financeira e de saúde A resposta não está na Urgência,
pública com a pandemia COVID- mas fora dela.

2000
19. O impacto social tem sido avas- A falta de alternativas para as
salador. situações menos graves, a dificul-
A verdade é que estamos a atraves- dade de acesso aos cuidados de
sar mais uma fase difícil do SNS, saúde primários ou às consultas de
A atividade dos hospitais quer devido à escassez de recursos ambulatório dos hospitais faz com
privados ascendeu aos humanos, técnicos, financeiros e que a população opte pela urgência
dois mil milhões de euros de infraestruturas obsoletas e hospitalar. Por outro lado, a falta
depauperadas, quer ao nível da de uma rede de apoio social tam-

3,3
organização e do modelo de ges- bém contribui para o número
tão. O mais grave, a meu ver, é a expressivo de episódios de urgên-
desigualdade no acesso aos cuida- cia em Portugal. O diagnóstico está
dos de saúde em que existem não estabelecido há muito tempo.
Cerca de 3,3 milhões só diversos modelos de estrutura- Demasiado tempo.
MAFALDA GOMES de portugueses têm ção e gestão como desigualdades Os problemas dos Serviços de
um seguro de saúde regionais inadmissíveis. Os cerca Urgências são a face mais visível
de 1,4 milhões de portugueses sem de um problema de fundo do SNS.

8,4
privados no sistema de saúde português: Médico de Família residem, maio- A criação de uma rede de interven-
mitos e factos”, elaborado pelo profes- ritariamente, na área de Lisboa, ção social é prioritária. A melhoria
sor de Economia da Saúde da Nova SBE Alentejo e Algarve, o que acaba da literacia em Saúde, o aprofunda-
Pedro Pita Barros com o investigador por ter um grave impacto sobre os mento nas áreas tecnológicas e
Eduardo Costa. Desde 2000, o número Os hospitais privados foram Serviços de Urgências que assim digitais na informação e comunica-
de apólices de seguros de saúde mais responsáveis por mais de 8,4 se tornam incapazes de responde- ção são também um caminho
que duplicou, de 14% para 32% em 2021. milhões de consultas médicas rem a todas as solicitações. Cada essencial de futuro. A moderniza-
vez mais, a necessidade de ter cui- ção dos serviços de Saúde é essen-

1,9
OUTRAS ATIVIDADES DO SETOR PRIVADO dados de saúde em Portugal, inde- cial sem nunca esquecer a humani-
NA SAÚDE A presença dos privados na pendentemente da sua natureza, zação dos cuidados.
saúde não se faz apenas sentir nos hos- afunila nos Serviços de Urgência Nunca haverá investimento finan-
pitais. O setor privado da saúde é cons- abertos 24h por dia para qualquer ceiro suficiente de qualquer Orça-
tituído por mais de 30 mil empresas e Os hospitais privados deram problema de saúde. Nenhum país mento do Estado, caso se perpetue
emprega mais de 140 mil pessoas, englo- resposta a 1,9 milhões do mundo resiste a este grau esta gestão ineficiente e o receio
bando as farmácias (cerca de 3 mil), as episódios de urgência extremo de “urgencialização” de de mudanças profundas, mas
empresas de prestação de cuidados de todo o sistema. necessárias.

30000
saúde em internamento (397 entidades), A desmotivação, as dificuldades de A Ordem dos Médicos assumirá o
passando pelas atividades de prática captação e fixação no SNS, num seu papel na busca de soluções que
médica de clínica geral (3557) e especia- círculo vicioso imparável, resultam compatibilizem a necessidade de
lizada (7718) em ambulatório, como a em saída de profissionais para o dignificar a profissão médica, a
produção (197) e distribuição (980) de O setor privado da saúde setor privado, social, em emigração revisão da carreira médica e o
medicamentos, produção de dispositi- é constituído por mais ou até em abandono da profissão melhor interesse dos doentes.
vos médicos (666), análises clínicas (240) de 30 mil empresas médica. Reaprendemos com a pandemia o
ou centros de enfermagem (397). O papel da Ordem dos Médicos, real e profundo valor da solidarie-

22000
De acordo com um estudo encomen- sobretudo neste contexto, é fulcral dade, da entreajuda e do envolvi-
dado à Informa/D&B pelo Conselho Estra- na procura de soluções consisten- mento de todos os setores da socie-
tégico Nacional de Saúde (CENS) da CIP tes e estruturantes, em colabora- dade nos problemas da Saúde.
– Confederação Empresarial de Portu- ção com os vários intervenientes O momento atual impõe coragem e
gal, divulgado no início deste ano, as Em 2021, as empresas no setor da Saúde. capacidade de agregar. Só falta o
empresas privadas de saúde em Portu- privadas de saúde (incluindo, Mas, a meu ver, há que acautelar Ministério da Saúde desempenhar
gal realizaram negócios de cerca de 22 por exemplo, farmácias, outras circunstâncias e não adotar esse papel.
mil milhões de euros em 2021, tendo o laboratórios de análises sistematicamente o aumento da
setor gerado um Valor Acrescentado e venda de equipamentos) estrutura física da Urgência como Bastonário da Ordem dos Médicos
Bruto (VAB) de 6297 milhões de euros. geraram 22 mil milhões de euros

—14 março 2023 9


A Radar //

Álvaro Beleza.
“Os centros de saúde
não podem ter
um horário de banco
que fecha às 18h”
Para o médico, a solução passa acima de tudo pela
prevenção e até sugere a mudança de nome do Ministério
da Saúde para Bem Estar. Álvaro Beleza defende
também a criação de uma espécie de cadastro clínico,
em que através do cartão de cidadão, o doente em
qualquer unidade de saúde pública ou privada tenha os
seus dados e evite a realização de exames desnecessários.
SÓNIA PERES PINTO de tratar essas pessoas, nomea- rem. Por isso, é necessário gerir,
sonia.pinto@ionline.pt damente na oncologia, a mor- em conjunto, os cuidados pri-
talidade aumentou, porque algu- mários, os hospitalares e os con-
Como vê o estado da saúde em mas não tendo acesso a trata- tinuados. E por isso só faz sen-
Portugal? Há um antes e um mento a tempo e horas, a tido se dividirmos o país em uni-
depois da pandemia? mortalidade subiu e depois esta- dades locais de saúde – ou que
Vejo as dificuldades que todos mos a tentar recuperar todo poderá ter outro nome, gostaria
os serviços de saúde estão a atra- esse período. E a acrescentar a mais de unidades integradas de
vessar, após a pandemia. As difi- isto, a pandemia tal como as saúde – que integrem cuidados
culdades do SNS e da saúde em guerras trazem evoluções tec- para gerir melhor os cuidados.
geral representaram um cho- nológicas extraordinárias e esta Acabei de ir ver um doente à alguns centros de saúde possam há outra ferramenta absoluta-
que que todos os países apanha- pandemia também trouxe, urgência geral de Santa Maria e estar abertos até à meia-noite mente essencial para melhorar
ram, nomeadamente os mais nomeadamente na medicina. está cheio de doentes. ou até outras horas que se enten- a gestão que é a digitalização.
ricos porque também foram Mas já existia... E com horas de espera der que devem estar abertos, Temos que acelerar a digitali-
aqueles que foram mais afeta- A evolução da medicina e da ciên- intermináveis? como os serviços de pediatria e zação do sistema de saúde e aí
dos pela pandemia. Isto porque cia já existia, mas acelerou imen- Mas porquê? Não é que isto vá outras patologias e que não sejam não é só o SNS, mas de todo o
a pandemia afetou em especial so e, ao mesmo tempo, estão a resolver tudo, mas deverá haver assim tão graves, se possam diri- sistema de saúde. Temos de per-
os mais velhos e os países que aparecer novos medicamentos uma gestão que esteja a gerir o gir a uma urgência dos cuida- mitir que as pessoas com um
têm mais velhos são os mais com efeitos terapêuticos extraor- hospital de Santa Maria, os cui- dos primários. Mas isto tem de cartão de cidadão quando vão a
desenvolvidos. Estamos a falar dinários, mas que são caríssi- dados primários à volta – cen- ser gerido em conjunto. qualquer unidade de saúde públi-
da Europa, dos Estados Unidos, mos. É evidente que a indústria tros de saúde e USF [Unidades Mas os centros de saúde ca ou privada tenham o seu cadas-
do Canadá e do Japão. São paí- quando descobre um medica- de Saúde Familiar] – para, por continuam a fechar cedo... tro clínico – os exames que já
ses que têm a população mais mento novo já se sabe que vai exemplo, em algumas circuns- As unidades de saúde familiar fez, as TAC, análises, etc. – e isso
idosa por causa do desenvolvi- cobrar preços mais altos, pelo tâncias ou em épocas do ano, ou os centros de saúde em algu- vai diminuir o número de exa-
mento económico. África foi menos, até haver concorrência mas circunstâncias não podem mes complementares que vai
muito menos atingida, porque e até haver genéricos. Portanto ter um horário de banco que ter de fazer, porque muitas vezes
a longevidade média não che- estamos perante uma tempes- fecha às 18h. Têm de estar aber- repetem-se exames, consultas
ga aos 50 anos. O que aconte- tade perfeita. Voltando a Portu- Se todos vivermos tos até tarde e ao sábado e domin- porque o sistema não comuni-
ceu? Por causa do confinamen- gal, está-se a tentar ir pelo rumo go. Isso existe nas ULS, como ca, mesmo dentro do SNS e, às
to, em que estivemos quase dois certo, mas o que é que é preci-
até aos 90 anos são geridas em conjunto gerem vezes, dentro do mesmo hospi-
anos confinados, deixámos de so fazer? Melhorar a gestão do vamos ter cancro, melhor o acesso às urgências. tal público. Isto porque tem vários
tratar outras patologias, nomea- SNS. A questão central é gerir mas deixou de Temos de distribuir, espalhar o sistemas informáticos, por isso
damente a oncologia. As pes- melhor os serviços públicos: hos- serviço de urgência naquilo que é preciso informatizar de manei-
soas vivem mais anos, mas vivem pitais e cuidados primários e a matar como matava pode ser espalhado por várias ra a que se ligue tudo: os cuida-
mais anos melhor, já que a medi- chave aí é o caminho que está a unidades mais pequenas, ao mes- dos primários, hospitalares, con-
cina evoluiu. Se todos vivermos ser seguido, mas que vai demo- O que é preciso mo tempo, tem que se concen- tinuados e público/privado e
até aos 90 anos garantidamen- rar anos, porque essa mudança trar o que é preciso concentrar. social. Isto está a ser feito, os
te vamos ter um cancro, seja não se faz de um dia para o outro.
fazer? Melhorar a Se por um lado, precisa de con- serviços partilhados estão a avan-
homem ou mulher. A questão É preciso ligar o que tem de ser gestão do SNS. É centrar, por outro lado, precisa çar com isso e essa revolução
é que o cancro deixou de matar ligado, isto é, também se apren- preciso gerir de descentralizar. Agora para se digital é absolutamente essen-
como matava. Muitos deles são deu com a pandemia, que temos fazer isto é preciso primeiro arti- cial para melhorar os cuidados.
curados, outros tornaram-se de tratar das pessoas desde que melhor os serviços cular em conjunto e tem de haver E, já agora, vai trazer melhor
crónicos. Agora como deixámos elas nascem até que elas mor- públicos uma gestão integrada. E depois gestão de meios financeiros.

10 —14 março 2023


ENTREVISTA

Álvaro Beleza
diz que por causa
do confinamento
deixámos de tratar
outras patologias,
nomeadamente
a oncologia
RUI COSTA

se ao nível dos suecos, mas a par-


tir dos 60 anos não têm a quali-
dade de vida dos suecos, são mais
doentes ou porque são diabéticos
ou porque são hipertensos. Por-
quê? Porque fizeram menos des-
porto, comeram pior e têm menos
hábitos de vida saudáveis.
E a fatura paga-se mais cedo
ou mais tarde...
E o facto de o Governo ter são unidades de cuidados con- 30 a 35 – e achatada a gestão Daí ter defendido a criação de É um assunto muito complexo,
nomeado um diretor tinuados. Têm de ter médicos, do conselho executivo à base. um processo clínico único do mas tem de haver estas refor-
executivo do Serviço Nacional enfermeiros. Sabe como se cha- Tem de se aproximar a base ao doente que permitiria poupar mas. Se há área que o Governo
de Saúde ajuda? mam os lares nos EUA? Casas topo e tem de se dar mais auto- milhões... está a ser reformista é na saú-
Isso é essencial e já devia ter sido de enfermagem, porque quan- nomia de gestão, mas uma auto- Isso é essencial e é o caminho de, mas é claro que as reformas
feito há muitos anos, porque quan- do estamos velhos precisamos nomia com responsabilidade. que está a ser feito. quando acontecem têm resis-
do o SNS foi feito pensou-se em de ter mais cuidados de saúde, E há outra ideia, mas isto tem Assim como a aposta nas tências. As pessoas têm muito
fazer isso. O SNS foi criado à ima- como é obvio. Resumindo, há de ser tudo ao mesmo tempo, teleconsultas. A população medo das mudanças.
gem do NHS inglês que tem um um conjunto de ações que são as PPP deram um ótimo resul- não estará demasiado Mas também já disse que é
diretor-geral há 50 anos. E tem de precisas de serem tomadas e tado, acabaram-se com elas. envelhecida? preciso reformar a saúde e
o ter. Para o congresso da SEDES estão a ser tomadas neste sen- Errado, devia-se era ter multi- Já as fazemos. Hoje já comunica- que só não mudam os burros...
convidei dois ex-diretores-gerais tido: ter um diretor-geral, divi- plicado. O que é que se tem de mos com os nossos doente por A pandemia explicou até à exaus-
do NHS, porque tem de ter uma dir o país em unidades integra- fazer? Dar as ferramentas à ges- email, SMS, falamos com eles por tão que temos de cuidar dos mais
gestão integrada em rede. Cada das de saúde – pode ter entre tão pública que tem a gestão zoom. Mesmo os mais velhos hoje velhos, mas não é ter cuidados só
hospital não é uma quinta. Sou privada e quais são essas fer- já estão muito dentro das novas institucionais. Temos de tratar
médico do SNS, claro que estou ramentas? É simples: contra- tecnologias e até por causa da soli- das pessoas em casa, temos de
na carreira no hospital de Santa tualização, isto é, tem uma auto- dão já usam muito o Facebook e ter enfermeiro ao domicilio, médi-
Maria, mas sou do SNS. Há pala- O Ministério devia nomia de gestão mas tem de o WhatsApp. Mas há outra coisa co ao domicilio. E já não estou a
vras absolutamente chave e acho haver contratualização, tem de que devia ser feita, e que é inte- falar do médico de família, pre-
que a pandemia ajudou a perce-
de estar na Praça haver tetos financeiros para ressante, que é deixar de ser o cisamos muito é de ter enfermei-
ber que tem de se gerir em con- de Londres porque gastar de despesa. Dentro des- Ministério da Saúde e passar a ser ros. Portugal até já tem médicos
junto o que é possível. Mas até vou devia gerir a área se teto pode gerir como acha o Ministério do Bem Estar. Temos a mais, precisa é de enfermeiros
mais longe, o Ministério devia estar que será mais conveniente. E é de ter políticas para que as pes- de família e de cuidados ao domi-
na Praça de Londres porque devia da ação social gerir em conjunto o que é pre- soas não fiquem doentes. Temos cílio. Além disso, é preciso huma-
gerir como já geriu e como acon- ciso gerir em conjunto e o ideal de apostar na prevenção da saú- nizar os cuidados e isso perce-
tece em muitos países europeus As PPP deram um seria o Ministério ter essa área de e que passem por políticas fis- beu-se com a pandemia, no entan-
a área da ação social e tudo o que social para depois integrar os cais e outras, como educação para to, isso tem de ser gerido em
está relacionado com lares, IPSS,
ótimo resultado, cuidados. Há um diretor-geral, a saúde desde pequenos nas esco- conjunto, em rede e não há que
tem de estar na saúde. acabaram-se deve-se integrar os cuidados de las. É preciso que as pessoas pas- inventar a roda. Há países com
Áreas que estão no Ministério com elas. Errado, saúde: hospitalares, continua- sem a comer melhor, façam mais soluções muito interessantes nes-
do Trabalho e da dos e primários e depois digi- exercício físico e tenham uma vida sa gestão integrada e Portugal
Solidariedade... devia-se era ter talizar o processo, pondo o cida- mais saudável. Os portugueses está a ir pelo caminho certo.
Mas está errado, porque os lares multiplicado dão no centro. têm uma taxa de longevidade qua- continua na página seguinte >>

—14 março 2023 11


A Radar //

>> continuação da página anterior

Diz que há médicos a mais,


mas o setor continua a dizer
que é insuficiente apesar das
novas contrações.
Estão é mal distribuídos. Temos
em Portugal um rácio de médi-
co por habitante dos mais altos
da Europa. Temos é falta deles
em algumas especialidades. Um
país que precisa de ter cresci-
mento demográfico e a chega-
da de imigrantes novos signifi-
ca que vamos ter mais nasci-
mentos, logo temos de ter mais
maternidades. Esses défices em
algumas especialidades têm de
ser corrigidos, claro que isso
demora anos a corrigir, mas
enquanto isso não acontece temos
de reorganizar e canalizar os
recursos para onde são neces-
sários. Há uma grande concen-
tração em Lisboa e no Porto e
há um défice no interior do país.
Mas é para isso que existem os
governos para compensar e
tomar decisões. O também presidente
E tem lançado incentivos para da SEDES reconhece
o interior. Mas não tem sido que “como há uma
suficientemente dificuldade de acesso,
compensador... as pessoas percebem
Exatamente. Mas isso é um pro- que o mais rápido e
blema geral não é só com os onde vão ser atendidas
médicos. Para o interior ser atra- é nas urgências”
tivo têm de existir políticas fis- RUI COSTA

cais atrativas em relação às cida-


des e depois tem de haver uma
política salarial de incentivos logo nos cursos de medicina, parte da economia. Por isso, pa e estamos a chegar lá, mas terra, em França porque as pes-
para os jovens que queiram tra- nas especialidades médicas, na acho que o cluster da indústria ser a Califórnia da Europa ou soas estão em burnout. Há mui-
balhar, seja para a saúde, edu- distribuição das especialidades farmacêutica portuguesa é a Florida europeia é também ta pressão e os tempos foram
cação ou outras áreas. e depois nos atrativos para os essencial porque é exportador isso. Não é só os suecos virem difíceis. Foi difícil a pandemia
Também disse que há falta de profissionais. Mas, no fundo, e Portugal pode ter mais do para cá na reforma, mas virem para quem está na saúde e é difí-
médicos de especialidade, tudo está relacionado com o que tem. E cabe aos Governos para cá para serem tratados. cil o pós-pandemia, até porque
nomeadamente de obstetrícia. financiamento do sistema e aca- ter essas ambições. O cluster Ora, isso é possível porque temos estamos a viver uma época que
Isso depois tem como ba sempre num ponto: o país da saúde privada em Portugal qualidade e isso também aju- depois de uma pandemia, em
consequência o encerramento tem de ter um crescimento eco- que tem muita qualidade tam- da a economia. que as pessoas ficaram enclau-
das maternidades ao fim de nómico que alimente as neces- bém se pode desenvolver em Como vê os pedidos de suradas, apanharam com uma
semana e à noite.... sidades do Estado social, por- termos europeus, não só para demissão em bloco dos guerra. Estamos à beira de uma
Isso acontece porquê? Porque que mesmo gerindo melhor vai tratar de portugueses mas para diretores das urgências? guerra mundial e as pessoas
de repente ficámos com muitos precisar de mais recursos, por- atrair turismo de saúde. Escre- Só quem não trabalha numa sabem disso. Não são tempos
menos médicos, uns para o pri- que estamos a envelhecer, a vi um artigo há 30 anos a defen- urgência é que não percebe. Os para brincadeira e isto cria ansie-
vado, outros para o estrangei- medicina está a melhorar, mas der a ideia de que Portugal colegas entraram praticamen- dade. Está tudo muito ansioso,
ro. É preciso estancar esta san- está mais cara: os medicamen- podia ser a Califórnia da Euro- te em burnout porque há um muito nervoso, em que se ferve
gria de saída de profissionais tos, os exames complementa- problema de acesso no siste- em pouca água, o que é natural.
dos serviços públicos. Agora é res, etc. e Portugal como um ma de saúde por causa destas E continua a haver alguma
evidente que isto vai requerer país desenvolvido que é – às razões que dei: pós-pandemia, resistência em relação às
tempo, mas têm de ser toma- vezes esquecemo-nos que faze- Portugal até já atrasos nas listas de espera. E consultas de psiquiatra...
das medidas com coragem para mos parte do clube dos mais como há uma dificuldade de Quando era pequeno via nos
resolver este problema. O país desenvolvidos e com um Esta-
tem médicos acesso, as pessoas percebem filmes que todos os america-
precisa de muitas reformas, mas do social mais desenvolvido, a mais, precisa que o acesso mais rápido e onde nos tinham um psicanalista,
estas demoram às vezes déca- melhor do que o americano, por é de enfermeiros vão ser atendidas, podem demo- em Portugal ter um psicana-
das a fazer efeitos. Não é por exemplo, na área da saúde – pre- rar 12h, às vezes 24h, é nas lista é sinal de que se é doido.
acaso que o livro da SEDES É cisamos de ter crescimento eco- de família urgências. As pessoas são inte- E isto também tem a ver com
duplicar o PIB em 20 anos e é nómico, de ter uma economia ligentes e percebem isso. E a crise que estamos a passar
isso que falta em Portugal. É mais robusta para sustentar O rácio de médico depois como também têm saí- com a Igreja. Antigamente con-
termos uma estratégia para estas necessidades. do colegas chega a um ponto fessavam-se ao padre, hoje em
décadas. Dir-me-á, está a pen- E para os profissionais
por habitante em que atingem o limite. dia, o médico ocupa muito esse
sar à chinês. Tomara eu, já nem receberem mais também é dos mais altos Ainda na semana passada lugar, porque as pessoas pre-
vou tão longe. A China pensa a implica ter uma economia da Europa. Temos assistimos a uma greve dos cisam de colo, de alguém que
cinco décadas, eu só penso para com maior crescimento... médicos e tudo indica que não as ouça, precisam de desaba-
duas ou três. Têm de ser toma- Exatamente, mas é preciso per- é falta em algumas vai ficar por aqui... far. E como médicos também
das várias medidas e começam ceber que a saúde também é especialidades Isso também acontece em Ingla- estamos cá para isso.

12 —14 março 2023


ENTREVISTA

há muito que inventar. É só da Saúde responde sempre Opinião


perceber e adaptar ao Estado perante esses imponderáveis.
as ferramentas de gestão que É o caso da grávida que morre SOFIA
têm os privados. depois de ter sido transferida, RAMALHO
Que balanço faz do trabalho aliás foi a gota de água e que
de Manuel Pizarro? provocou a demissão de Marta
Por ter uma certa idade sou ami- Temido. Claro que o responsá-
go deles todos, até porque são vel político tem de assumir as
mais jovens e acompanho-os há responsabilidades, mesmo que
uns anos. Quando me formei em não tenha uma responsabilida-
medicina estava Manuel Pizar- de efetiva, concreta. E a saúde
ro a entrar. Já Fernando Araú- é um lugar para os corajosos.
jo é meu colega de especialida- E com o Governo a correr o Saúde mental para todos
de, conheço-o desde que era
interno. Acho que Manuel Pizar-
risco de ter cada vez maior
dificuldade em contratar ... ou só para alguns?
ro está a fazer bem, está a ouvir Qualquer Governo tem essa
as câmaras, os colegas, as insti- dificuldade, porque qualquer A necessidade de recorrer a serviços públicos para obter
tuições, mas tudo isto vai demo- um que aceite sabe que é mui- apoio para mais saúde psicológica ou para responder a um
rar anos. Este é o inicio de um to difícil, pois é um trabalho de problema de saúde mental tem tido um enorme crescimen-
caminho, as pessoas não podem muita responsabilidade e des- to em Portugal e na Europa nas últimas décadas. A ideia de
querer resolver tudo, ainda por gasta muito. que apenas aqueles que necessitam de cuidados continua-
cima, com esta pressão toda. É uma função cada vez mais dos de saúde mental para perturbações mentais, o estigma
Acho que a reforma da criação escrutinada... associado aos hospitais psiquiátricos que atualmente se
das ULS, a própria ideia de uma Isso é como tudo na vida. É como extinguem, ou a ideia de que a saúde mental estava desti-
comissão executiva que esteja ser médicos, estamos cá para nada aos “loucos” há muito têm dado lugar a que qualquer
a gerir todo o sistema público resolver esta pressão. É difícil? pessoa procure apoio para cuidar e promover a sua saúde
de saúde já é um caminho mui- É, mas há uma coisa que me lem- psicológica e para aliviar o seu sofrimento psicológico. Tal,
to importante. O problema das bro todos os dias: é mais difícil mais do que justifica o direito à universalidade, gratuitida-
urgências é conjuntural e que estar na Ucrânia a combater os de e equidade no acesso a cuidados de saúde psicológica de
é preciso resolver agora. Mas russos. Todos os dias estão a mor- qualidade no Serviço Nacional de Saúde (SNS).
tem de se revolver estrutural- rer ucranianos para defenderem Nos últimos anos, a saúde mental é um dos principais
mente, caso contrário, andamos o nosso Estado social, a nossa motivos de procura de consultas nos Cuidados de Saúde
sempre aqui em emergência. democracia liberal, esta Europa Primários (CSP) pelos portugueses. Mas o acesso está limi-
E em relação ao trabalho de que gostamos. Quanto à saúde tado a apenas alguns. Serviços de saúde mental organiza-
Marta Temido? estou otimista. Acho que o minis- dos e eficientes, e mais profissionais de saúde mental preci-
Costumo dizer que os dois luga- tro está a ir pela linha certa. Fer- sam-se urgentemente. Muito especialmente psicólogos. Os
res mais difíceis na política é nando Araújo é excelente e está cerca de 300 que integram os CSP são manifestamente
ser ministro da Saúde e ser líder a fazer aquilo que tem de ser fei- poucos, discriminando e abandonando à sorte uma grande
da oposição. É muito difícil satis- to. Sinceramente se fosse um parte da população que fica impossibilitada de aceder.
Criticou o fim das PPP. Esta fazer todas as expectativas e, Governo do PSD não faria mui- Este seria o contexto certo para intervenções psicológicas
decisão foi puramente ainda por cima, foi ministra to diferente. acho que tem que de primeira linha, para a leitura e promoção de mudanças
ideológica? durante a pandemia e em prin- ser moderado, ao centro para nos comportamentos do dia a dia de crianças, jovens e
Foi uma questão absolutamen- cípio só há uma de cem em cem que não venha um Governo e adultos, tendo em conta os seus contextos de vida pessoal,
te ideológica, são as PPP e a anos. E depois teve uma coliga- depois desfaça tudo e faça tudo familiar, social, académico ou de trabalho, remetendo para
TAP. Houve um Governo de ção à esquerda que também ao contrário. Tem de ser uma uma segunda linha a necessidade de recorrer e de gastar
gerigonça, com o partido comu- condicionou o Governo. A ques- coisa pragmática, sensata, basea- dinheiro ao próprio e ao Estado em psicofármacos.
nista que ainda não aprendeu tão aqui é que o lugar em si é da na evidência, ouvindo quem Mas as pessoas têm realmente acesso aos cuidados de saú-
com a queda do Muro em 89 e muito difícil e apanha-se mui- sabe, tendo essa paciência e depois de psicológica gratuita, de que necessitam, em Portugal?
já lá vão mais de 30 anos e um ta pancada, até porque há sem- ter a coragem de tomar medi- Não. Não universal, gratuita ou equitativamente! Depois de
partido anarco-marxista como pre imponderáveis e o ministro das que têm de ser tomadas. perder a mãe para a COVID-19, a ansiedade e o medo da
o Bloco de Esquerda que ain- morte passaram a estar presentes no dia a dia da Joaquina
da acredita que o Estado é que PUB (nome fictício), que já pouco saboreava a comida, dormia
vai resolver tudo e dá mau resul- mal e já não desejava estar com amigos, nem sentia prazer
tado. Foi uma questão ideoló- em receber a família em sua casa. No trabalho, preferia
gica, o Partido Socialista foi for- colocar os fones o tempo todo, para não ouvir vozes ou
çado pela coligação a tomar mostrar o seu mau humor, e ficava em pânico sempre que
essa posição e andou-se para AVISO DE LEILÃO ELECTRÓNICO se aproximava a data de entrega dos relatórios de desem-
trás, perdeu-se tempo, agora é VENDA DE BENS EM PROCESSO DE INSOLVÊNCIA penho. Resistente, mas seguindo o conselho da filha, procu-
preciso recuperar esse tempo rou o Centro de Saúde da sua área de residência. Com mui-
Processo: 13891/21.8T8OAZ-J. Comércio de Oliveira de Azeméis-Juíz-1
perdido. E o que aconteceu com ta sorte, quase seis meses depois teve acesso à primeira
Insolvente: Sérgio Filipe dos Santos Pinto e outro
as PPS também aconteceu com Informa-se os eventuais interessados do Leilão Eletrónico, agendado com data de abertu- consulta, mas a segunda ficou marcada para dali a seis
a TAP por acharem que os paí- ra a 13/03/2023, pelas 14 horas e encerramento a 29/03/2023, pelas 14 horas, a decorrer
no site www.ptrelax.net (modalidade Leilão Eletrónico), para a aquisição do bem.
meses depois. Sem que tivesse recebido a intervenção
ses têm de ter companhias áreas. necessária e atempada, os sintomas agravaram-se e instala-
Verba nº. 1:
Isso é um disparate. É bom que – Veículo automóvel da marca Fiat, modelo Punto 55 (176 AQ 53 F), do ano de 1996, ram-se, dando agora origem a ataques de pânico e a um
de cor prata, a gasolina, com 143.254 Km
Portugal tenha uma compa- quadro depressivo, que a inibiram de poder exercer a sua
nhia aérea, mas acima de tudo Valor de Abertura-150.00€; Valor Base-400.00€; Valor Mínimo-350.00€ atividade profissional durante algum tempo. É assim com
é bom que Portugal tenha um REGULAMENTO E CONDIÇÕES GERAIS PARA VENDA uma parte significativa das pessoas que procuram apoio
– Os bens da presente venda são vendidos conforme o estado físico e jurídico em
hub. Mas, voltando à saúde, é que se encontram, sem qualquer tipo de garantia de eventuais vícios que existam ou psicológico por via do SNS.
preciso também fazer refor- venham a surgir, sendo da responsabilidade do proponente os encargos da compra, Uma reforma no SNS na atualidade só pode contemplar o
remoção e obrigações fiscais;
mas na gestão, de maneira a direito básico de acesso de todos, sem exceção, à saúde e ao
Todos os interessados podem participar no leilão eletrónico, desde que cumpram
que a gestão pública possa ter as regras do regulamento e condições gerais para venda, disponíveis no site www. bem-estar.
ptrelax.net
as ferramentas que têm o hos-
A Leiloeira,
pital dos Lusíadas, da Luz, anti- Próxima Rúbrica, Lda. Vice-presidente da Ordem dos Psicólogos Portugueses
gas PPP. Isso é simples e não

—14 março 2023 13


A Radar //

Medicamentos.
Infarmed
promete
“mitigação” de
problemas de
abastecimento
O Ozempic e o Inderal têm dado que
falar por estarem esgotados. Infarmed
garante continuar a tentar que
medicamentos estejam disponíveis.
MARIA MOREIRA RATO necessita do Ozempic (Semaglu-
maria.rato@ionline.pt tido), mas, por este estar esgo-
tado a nível nacional, viu ser-
A falta de alguns medicamen- lhe prescrito o Trulicity (Dula-
tos nas farmácias portuguesas glutido). A ser seguida em
tem deixado os portugueses Endocrinologia no Hospital de
preocupados, mas o Infarmed S. João, no Porto, por aquela que
garante que tudo faz e tudo con- designa como “a melhor equi-
tinuará a fazer para que esta pa”, Marta foi submetida a uma
situação seja solucionada. “O cirurgia à hipófise e foi-lhe remo-
Infarmed recebe da empresas vido um tumor de 4mm. Após
da indústria farmacêutica, enti- essa cirurgia, foi-lhe prescrito o
dades responsáveis pela colo- Ozempic, em fevereiro de 2022,
cação dos medicamentos no mas, em junho, o fármaco já não
mercado, informação sobre os estava disponível. Por isso, foi-
medicamentos que irão entrar lhe receitada uma alternativa.
em rutura de abastecimento, Em setembro, parou de fazer
conforme estabelecido legal- esta medicação porque foi nova- Falta de alguns medicamentos nas farmácias preocupa portugueses DREASTIME

mente. Estas situações aconte- mente operada, mas voltou a


cem por motivos multifatoriais, tomá-la em janeiro. Contudo, tra comercializado, apesar de se que este é outro medicamen- impacto de uma crise e o impac-
sendo o número total bastante não esconde que prefere o Ozem- ainda apresentar constrangi- to que não se encontra com faci- to que uma coisa tão pequena
volátil”, explica, adiantando que pic, porque o Trulicity é “mui- mentos no abastecimento, situa- lidade nas farmácias nacionais. como o Inderal pode ter. Não
o valor de aproximadamente to violento” naquilo que concer- ção que também se manifesta a “Não o tomei durante um tem- estou a dizer que cura todas as
1000 a que o i teve acesso “será ne a administração. nível Europeu”, diz agora o Infar- po. Aproveitei que tinha uma crises, mas se prevenir duas de
o total de apresentações de medi- “O manuseamento é muito med. “Relativamente ao Inde- viagem a Espanha para comprá- cinco... Já melhora a minha vida”,
camentos em rutura”. mais difícil. Enquanto a ‘cane- ral, encontra-se comercializada lo, sem receita, porque o tomo afirma. “É triste verificar que
Ou seja, se tomarmos como ta’ do Ozempic é mais pequena a dosagem de 10 mg”. Recorde- para prevenir as enxaquecas. não há uma resposta clara”,
exemplo o paracetamol XYZ e discreta, tenho de rodar esta Nesse período acabei por estar adianta a jovem que sofre des-
(nome fictício), se notificarmos e, quando a coloco na barriga, um pouco mais suscetível”, con- ta doença desde 2014.
a rutura de: Paracetamol XYZ, tenho de fazer mais força e ouve- ta Sofia Fernandes, de 26 anos. “As questões relacionadas com
Comprimidos, 1000mg, emba- se um barulho. No meu caso, “O meu médico não sugeriu a disponibilidade de medica-
lagem de 30 comprimidos; Para- incomoda-me um bocado”, expli- nenhuma alternativa. Mesmo mentos são transversais a nível
cetamol XYZ, Comprimidos, ca. “Em termos de resultados, agora, tomo 1 Inderal por dia à europeu e mesmo mundial. O
1000mg, embalagem de 60 com- se calhar não sou um bom exem- “O medicamento noite, a dose mínima. É supos- Infarmed continuará a monito-
primidos; Paracetamol XYZ, plo, por assim dizer, porque devi- to tomar 2 de manhã e 1 à noi- rizar o mercado nacional e, em
Comprimidos, 500mg, embala- do à síndrome de Cushing não
Ozempic, nas suas te”, constata. “Quando estes aca- conjunto com as autoridades
gem de 30 comprimidos; Para- há muito que se possa fazer. O três dosagens, já se barem, não terei mais. É melhor congéneres europeias e também
cetamol XYZ, Comprimidos, impacto do medicamento é mais encontra tomar um do que não tomar de com os Gabinetes criados com
500mg, embalagem de 60 com- de manutenção do peso e não todo porque me ajuda, ainda o apoio da Agência Europeia de
primidos e Paracetamol XYZ, de perda”, sublinha, adiantan-
comercializado” que o Inderal não consiga pre- Medicamentos e da Comissão
Xarope, 40mg/ml, embalagem do que aquilo que a incomoda venir todas as crises”, diz. “Para Europeia para o efeito, desen-
de 150ml estamos a falar de um é saber que existem pessoas dia- “Relativamente ao ser franca, sinto-me um pouco volver todas as formas possíveis
só medicamento, mas de cinco béticas que estão sem acesso ao Inderal, encontra- revoltada. Ainda por cima, só de mitigação de situações de
apresentações. Ozempic. agora estamos a desmistificar e problemas de abastecimento de
Marta Lino, de 37 anos, que “O medicamento Ozempic, nas
se comercializada a normalizar as enxaquecas. Então, medicamentos”, avança ao i a
sofre de síndrome de Cushing e suas três dosagens, já se encon- dosagem de 10mg” as pessoas não entendem o autoridade do medicamento.

14 —14 março 2023


SAÚDE

Opinião Opinião
JOANA ÓSCAR
BORDALO E SÁ GASPAR

Salvar o Serviço Nacional de Saúde O tempo não volta para trás


O Serviço Nacional de Saúde uma remuneração justa para o Entrei na Faculdade de Economia do Porto velmente, não refletiu esse efeito na contra-
(SNS), que é uma das maiores seu nível de diferenciação e res- em 1987. Lembro-me de que o primeiro tualização externa. Os valores das conven-
construções constitucionais da ponsabilidade. A solução passaria choque para muitos dos caloiros foi o ções não tiveram qualquer atualização. Ou
democracia portuguesa, encon- pela possibilidade de um regime manual de matemática financeira do prof. seja, desvalorizaram, como ensinaria o
tra-se moribundo e precisa de ser de trabalho com dedicação exclu- Miguel Cadilhe. Foi remédio santo para prof. Cadilhe.
salvo. siva, opcional e majorada, bem enraizar a ideia de que o tempo é uma A este respeito, ainda recentemente a Enti-
Com a criação do SNS, concreti- como a revisão da carreira, dos variável da maior importância e que, por dade Reguladora da Saúde referiu que tem
zou-se o direito à proteção e o acordos coletivos de trabalho e vezes, é difícil calcular o valor atual da per- alertado “o Ministério da Saúde para a
acesso à saúde de todos os cida- respetivas grelhas salariais. Tam- petualidade. importância de os preços fixados serem efi-
dãos, independentemente da sua bém é fundamental assegurar Parece talvez um pouco estranho, mas revi- cientes, no sentido de se promover, simulta-
condição económica e social. No uma formação especializada e de sitei estas memórias a pensar nalgumas neamente i) aplicação eficiente dos recur-
entanto, na década de 90, iniciou- qualidade, com melhoria das cir- questões do Sistema de Saúde. A primeira, sos públicos,, ii) atratividade suficiente para,
se o desmantelamento – na gene- cunstâncias laborais dos médicos induzida pela minha costela de economista, tendo em conta as condições de mercado,
ralidade da Europa e, particular- internos, considerando-os como o tem a ver com o financiamento do SNS — os operadores privados quererem aderir às
mente, Portugal – do Estado Social 1.º grau da carreira. aliás, para ser mais exato, sub-financiamen- convenções, assim promovendo o acesso à
e do SNS. O subfinanciamento cró- A reposição dos 25 dias úteis de to do SNS, já que para 2023 faltam assumi- saúde e iii) incentivos à prestação de cuida-
nico do SNS, a incapacidade de férias por ano e dos 5 dias suple- damente e à partida 500 milhões de euros. dos com qualidade e segurança por parte
reformar, a gestão não participa- mentares de férias quando o Alguns advogam que não há aqui problema dos operadores privados.”
da, levados a cabo pelos sucessivos período normal for gozado fora da nenhum, porque o dinheiro acaba sempre Não sendo acautelado este princípio, como
governos, tem colocado em risco a época alta, assim como a consa- por aparecer, ainda que por injeções de alerta a ERS, há cada vez menos operado-
universalidade do seu funciona- gração dos descansos compensa- milhares de milhões de euros em dezem- res convencionados com o SNS. O drama é
mento e a qualidade dos serviços. tórios por trabalho efetuado em bro, no finalzinho do ano, uma espécie de que não é nada certo que eles aceitem vol-
A pandemia de COVID-19 veio qualquer um dos dias de descanso “fantasma dos natais passados” que conti- tar. Dito de outra forma, uma solução que
agravar ainda mais estas dificulda- semanal seriam fundamentais nua a assombrar os hospitais EPE. era adequada e sensata meses antes, perde
des, ao mesmo tempo que lançou para que os médicos pudessem Esta leitura benigna falha e não compreen- parte da sua eficácia se for decidida e con-
novos desafios. O esforço inaudito equilibrar a sua vida profissional e de o básico: se o orçamento nasce incorre- cretizada tardiamente. Entretanto, as variá-
dos profissionais do SNS permitiu pessoal. Outras medidas, pren- to, ele não pode ser cumprido logo desde o veis de análise mudaram, os agentes tive-
o seu combate eficaz, o sucesso da dem-se com descongelamento momento em que começa a ser executado. ram de ajustar-se e, pior do que tudo, a
vacinação e a recuperação da ati- imediato da progressão na carrei- Ora bem, isto desresponsabiliza os gesto- confiança entre as partes sofreu uma forte
vidade não realizada durante os ra médica, a passagem do tempo res, não deixa qualquer possibilidade de erosão e, nalguns casos, foi até definitiva-
períodos de maior atividade pan- normal de trabalho em serviço de gestão estratégica, desvirtua e desrespeita a mente estilhaçada.
démica. urgência, das 18 para as 12 horas relação com os fornecedores. Os efeitos Na saúde, os operadores privados fazem a
Contudo, a situação laboral dos semanais, o redimensionamento negativos são múltiplos e fortalecem-se sua parte, mas percebem que as entidades
médicos deteriorou-se enorme- da lista de utentes dos Médicos de entre si acabando, infelizmente, por preju- públicas estão cada vez menos interessa-
mente. Os médicos estão desmoti- Família e a anulação das quotas dicar o doente. das na sua colaboração. Aconteceu com o
vados e exaustos, abandonando para a passagem das USF de É importante sublinhar que dinheiro que SIGIC, com as convenções de ambulatório,
diariamente o SNS, em busca de modelo A para modelo B, e a atua- aparece no final do ano já não vale o mes- com a Covid-19, com o regime convencio-
melhores condições de trabalho e lização do suplemento de Autori- mo que valeria no início. Em 2022, esta nado da ADSE, com as PPP, etc.
salários adequados. Assim, uns dade de Saúde para os médicos de verdade ficou ainda mais evidente porque O que eram ou poderiam ser instrumentos
partem para o sector privado e Saúde Pública, com a aplicação a inflação rondou os 10%. Quando o finan- de aumento da oferta de saúde aos portu-
outros emigram. Continuamos a uniforme do regime de disponibili- ciamento fica aquém das necessidades, as gueses e de alargamento do acesso aos cui-
ter um milhão e meio de cidadãos dade permanente. dívidas vencidas acumulam-se — tem sido dados cristalizaram-se em processos em
sem médico de família, e serviços Na greve de todos os médicos, de 8 na ordem dos dois milhões de euros por que os laços de confiança foram esticados
de urgência, numa área tão sensí- e 9 de março, levada a cabo pela dia no SNS — e os credores não podem fin- ao limite, enfraquecidos com suspeições e
vel como a materno-infantil, a Federação Nacional dos Médicos, gir que a correção monetária é efetuada. falta de diálogo.
encerrarem por falta de médicos. que teve uma adesão elevadíssi- O fenómeno da inflação é uma evidência. Como o mundo não anda para trás, é
Esta progressiva fragilização colo- ma, os médicos demonstraram o O SNS sabe bem quanto está a pagar impossível apagar a experiência adquirida
ca em risco a continuidade do seu descontentamento ao Ministé- mais pelo gás e eletricidade, alimentação e o que ela implicou. Se acreditarmos, e eu
SNS, cuja perda representaria um rio da Saúde, e que estão unidos. e consumos diversos. Assim, mais de 8% sou dos que acreditam, que o caminho do
retrocesso social que o país não Os médicos esperam ver, final- da transferência que o SNS recebe é acesso universal, da eficiência e da susten-
poderia suportar. mente, uma mudança de atitude absorvida pelo aumento dos custos — tabilidade passa pela conjugação de esfor-
É imprescindível salvar o SNS, para resolver de forma séria e faço notar que o governo aumentou o ços e pela articulação entre atores, tem —
dotando-o de médicos nas suas célere, os problemas dos médicos salário mínimo para 760 euros e compro- temos todos — de fazer um esforço para
múltiplas áreas e especialidades, e salvar o SNS. É preciso cuidar de meteu-se a um aumento da massa sala- contruir relações de confiança assente em
para continuar a garantir uma quem cuida. rial de 5,1% em 2023. bases transparentes e com previsibilidade.
saúde universal, geral, gratuita e O Ministério da Saúde tem de tal forma O tempo não anda para trás mas o passado
acessível a toda a população. É Presidente da Federação consciência do impacto da inflação que traz lições de futuro.
essencial garantir aos médicos Nacional dos Médicos aumentou significativamente os termos da
condições de trabalho dignas e Oncologista Médica no IPO do Porto. contratualização interna. Mas, inexplica- Presidente da APHP

—14 março 2023 15


A Radar //

Médicos.
“Quando
saí do SNS
tive uma
sensação
de alívio”

Os médicos Pedro MARIA MOREIRA RATO mais no privado. Temos uma for- “Tinha todos os sintomas de vio. Pensei: ‘Vou livrar-me dis-
maria.rato@ionline.pt mação excelente, a nível de facul- burnout: nenhum prazer em tra- to’. Pode parecer mal, mas é a
Figueiredo, Mara dade e especialidade, por isso é balhar, irritabilidade, alterações realidade. Atingi o ponto de rutu-
Marques e Maria Há um ano fora do Serviço Nacio- que querem contratar-nos nou- no padrão de sono e isto teve ra. A não ser que tudo mude, que
João Tiago nal de Saúde (SNS), Pedro Figuei-
redo, de 40 anos, de Leiria, res-
tros países. Os utentes vão ao
privado e as pessoas entendem
impacto tanto no trabalho como
em casa. Ao final da semana, as
haja uma grande volta no SNS,
não me imagino a regressar”.
refletem acerca pira de alívio. “Andamos todos a que estão a lidar com um médi- coisas melhoravam, mas à medi- “Já se sabe que o burnout é
do estado atual roçar no burnout e quando alguém co melhor, mas pode ser exata- da que a segunda-feira se apro- uma doença profissional que
entra em burnout, deixa de se mente o mesmo que encontram ximava... Tudo piorava porque afeta cada vez mais portugue-
do SNS, preocupar. Deixamos de nos preo- no público”, desabafa. sabia aquilo que enfrentaria outra ses. Nas manchetes dos jornais
estabelecendo cupar com os resultados (óbitos, “Cada vez mais evoluímos no vez”, admite Pedro. “Quando saí podemos encontrar títulos preo-
uma comparação doenças que evoluem, etc.) e, por
vezes, desistimos e ficamos de
conhecimento médico e os alu-
nos saem a saber mais. Temos
do SNS tive uma sensação de alí- cupantes como ‘Síndrome do
burnout afeta 13% da população
com o setor baixa. Em termos de condições, médicos altamente capacitados, portuguesa’, ‘Portugal é o país
privado. no privado, temos tudo. Se qui- tiveram uma formação muito da União Europeia onde os tra-
ser ser honesto, eu vou traba- boa, boas notas, e são compara- balhadores mais correm o ris-
A psicóloga lhar mais sempre porque tenho dos com outros que têm menos co de sofrer burnout?’, ‘Stresse
Eunice Caracol a pressão de ter resultados. Não conhecimentos e são subvalori- e burnout custam €3,2 mil
explica em que é só a remuneração mais eleva-
da, mas também a contabiliza-
zados face ao mais velhos. Eu e
a minha esposa estivemos para
milhões de ano às empresas’,
‘Portugal é o terceiro país com
consiste ção dos atos”, explica em decla- sair do país. Se não fossem as “Andamos todos maiores níveis de stresse da
o burnout. rações ao i o médico de Medici- nossas filhas, faríamos parte das a roçar no burnout Europa’, entre muitos outros.
na Geral e Familiar que exerce estatísticas. Os problemas esta- Também sabemos que a covid-
exclusivamente no setor priva- vam completamente encober- e quando alguém 19 não foi generosa com os/as
do há um ano. tos. A manta já não cobria os pés entra em burnout, trabalhadores, pelos mais diver-
“Sentia-me completamente sub-
valorizado no SNS. Sou médico
e ainda esticámos para mais um
lado”, continua, refletindo: “Todos
deixa de se sos motivos, ora porque tiveram
que passar a trabalhar em casa,
e estava ali para servir os ‘senho- os anos, pessoas emigram e não preocupar” ora porque ficaram sobrecarre-
res’. As pessoas entendem que têm intenção de voltar e vai sair gados pela ausência dos colegas
quando pagam pelos serviços, é muita gente até 2025. Estamos “Sentia-me que ficaram doentes, etc.”, come-
muito mais importante do que muito envelhecidos e, a certa completamente ça por explicar a psicóloga Euni-
quando não pagam. Se eu der altura, o sistema vai colapsar. ce Caracol.
um tratamento caro a um doen- Um não serve para tapar os bura-
subvalorizado “O burnout tem sido cada vez
te, ele cumpre. Respeitam-me cos todos”. no SNS” mais estudado e é uma preocu-

16 —14 março 2023


SAÚDE

01 01 Um estudo de 2019 02 Mara Marques tem 37 03 Maria João Tiago é


concluiu que grande parte anos e é médica de médica de Medicina Geral
dos médicos portugueses Medicina Geral e Familiar e Familiar e secretária
estão em burnout nas Caldas da Rainha regional do SIM
ANTÓNIO PEDRO SANTOS DR DR

02 03

pação também dos/as psicólo- preciso algum tempo de expo- para mudarmos culturas orga- acontece muito no SNS é que os uma responsabilidade e um peso
gos/as portugueses que se dedi- sição a situações de stresse labo- nizacionais e priorizar o bem- médicos estão assoberbados com grandes. Muitas das vezes, temos
cam ao estudo deste síndrome. ral, para que eventualmente o estar emocional dos/as colabo- trabalho. O número de horas de de trabalhar mais horas do que
Como já se sabe, o burnout é quadro evolua para um quadro radores/as?”, questiona. “Cola- trabalho não é suficiente para as 40 estipuladas e isto prejudi-
caracterizada pela sensação de de burnout. Por isso, cada vez boradores felizes e saudáveis dar resposta a tudo aquilo que ca a vida pessoal. É uma bola de
esgotamento ou exaustão emo- mais é importante que os CEOs são mais produtivos e economi- surge. Isso gera muita ansieda- neve”, lamenta a profissional de
cional, a redução da sensação das empresas privadas e os gran- camente rentáveis”, finaliza. de e imensos casos de burnout”, saúde. “Outra coisa que aconte-
de realização profissional e pes- des Órgãos de Gestão públicos Quem concorda com Pedro é assume, sendo que, em 2019, no ce é que os médicos não são ricos
soal e o sentimento de eficácia adotem medidas que primem o Mara Marques, de 37 anos, das ano anterior ao do surgimento como as pessoas pensam: atual-
relativamente ao trabalho, e tam- bem-estar psicológico e emocio- Caldas da Rainha, que decidiu da pandemia, aproximadamen- mente, com a inflação e a crise
bém a sensação de maior dis- nal dos seus/suas funcionários”, rescindir contrato com o SNS te 66% dos médicos portugue- que vivemos, o facto de muitos
tanciamento emocional dos rela- explicita a Psicóloga da Saúde em agosto de 2021. “Aquilo que ses relatavam um nível elevado serem mal remunerados faz com
cionamentos no trabalho”, afir- Ocupacional do Centro Hospi- de exaustão emocional, 39% que precisem de trabalhar ain-
ma a profissional mestre em talar Universitário do Algarve. demonstravam níveis elevados da mais. Acumulam locais de
Psicologia Clínica pelo ISPA - De seguida, lembra que a Orga- de despersonalização e 30% refe- trabalho para fazer face às des-
Instituto Superior de Ciências nização Mundial de Saúde (2020) riam uma elevada diminuição pesas. Sobretudo, quando vivem
Psicológicas, Sociais e da Vida. recomenda validar emoções, da realização profissional. em grandes cidades. E ao acu-
“Toda e qualquer pessoa que como o stresse ou o sentimen- Estas foram conclusões de um mularmos mais trabalho, até
seja profissionalmente ativa cor- to de pressão; importância de estudo nacional financiado pela em turnos completamente dis-
re o risco de ficar em burnout, gerir a própria saúde mental e Ordem dos Médicos sobre bur- tintos, não temos tempo para
se não se acautelarem os riscos bem-estar psicossocial, a par da nout nos médicos em Portugal, atividades que nos poderiam
psicossociais inerentes ao tra- física; recurso a estratégias de “Os médicos de que foi publicado na Revista da ajudar a distrair e descompri-
balho. Da mesma forma que coping úteis, como manter o con- daquela Ordem. Além das per- mir como o exercício físico”, diz,
acautelamos questões ergonó- tacto com família e amigos, o
família têm listas de centagens mencionadas, cerca adiantando que “é por todos estes
micas, como levantar o ecrã do descanso entre trabalho ou tur- doentes enormes, de 45% dos inquiridos (12 580 motivos que a classe médica
computador, ou assegurarmo- nos, alimentação saudável, prá- muito maiores do médicos no total) apresentaram sofre cada vez mais de depres-
nos de que a cadeira em que tra- tica de atividade física, entre níveis de ansiedade elevados e são, ansiedade e outra sintoma-
balhamos é a mais adequada, outras; evitar recurso ao consu-
que era desejável” em 21% foram identificados sinais tologia”.
também temos que acautelar mo de substâncias, como o álcool, de depressão. “No meu caso, aquilo que sen-
questões como as exigências tabaco ou outras e confiar na “O SNS não me “Os médicos de família têm lis- ti foi que o SNS não me permi-
laborais, o work-life balance, qua- família e nos colegas de traba- permitia ser a tas de doentes enormes, muito tia ser a médica de família que
lidade da liderança, assédio labo-
ral, entre outras. As pessoas não
lho que também possam estar
a passar por situações semelhan-
médica de família maiores do que era desejável, e
são os responsáveis máximos
queria ser. Tenho brio, quero
dar o meu melhor aos doentes
ficam logo em burnout. Não, é tes. “Do que estamos à espera que queria ser” pelos doentes. Recai sobre nós continua na página seguinte >>

—14 março 2023 17


A Radar //

Há quatro anos, 66% dos médicos relatavam um nível elevado de exaustão emocional DREAMSTIME

>> continuação da página anterior conhecidos cansam-nos. Demos conseguindo controlar este com- ridade. Para cuidarmos dos tos de desvalia e impotência,
tudo aquilo que conseguíamos, portamento, mas voltou em for- outros, temos de cuidar de nós que, muitas vezes, são respon-
e não conseguia fazê-lo em 15 na pandemia, e fomos ainda mais ça quando comecei o Ano primeiro”, confessa o jovem que sáveis por ideias de abandono
minutos de consulta cronome- além”, diz a secretária regional Comum. Podemos dizer que é é seguido em Psiquiatria e fre- do curso, depressão e suicídio”,
trados. E é isto que faz muitos de Lisboa e Vale do Tejo do Sin- o meu mecanismo de coping”, quenta igualmente sessões de lê-se. “Numa revisão da litera-
colegas abandonarem o SNS. dicato Independente dos Médi- sublinha. “Lidamos com muito psicoterapia. tura disponível sobre suicídio
Realmente, quem gosta de Medi- cos (SIM). “Vão exigindo cada stress, vida, morte... Honesta- “Estou atrasado no meu per- entre médicos, verificamos que
cina, de forma genuína, não se vez mais, não mexem nas gre- mente, ensinam-nos muitas coi- curso em relação aos meus cole- em toda parte do mundo a taxa
sente bem no setor público. Como lhas salariais e esta sobrecarga- sas, mas ninguém perde tempo gas, mas valeu a pena pôr tudo de suicídio na população médi-
é que nos desligamos das con- leva a depressões subdiagnosti- a perguntar se estamos bem e em stand-by para melhorar. Se ca é superior à da população
dições atuais do SNS?”, questio- cadas e a elevadas taxas de sui- a tentar que percebamos que não o tivesse feito, acho que já geral. Entre os médicos que
na. “É impossível”. cídio entre os médicos”. também devemos ser uma prio- não estaria cá”, frisa João Pedro, cometeram suicídio, colegas pró-
“Os casos de suicídio não são indo ao encontro das ideias trans- ximos têm referido mudança no
COMPORTAMENTOS AUTOLESI- objetivados. São escondidos pela mitidas em Suicídio entre médi- comportamento e aumento de
VOS, DESESPERANÇA E SUICÍDIO vergonha. Recentemente, falei cos e estudantes de medicina, um indecisão, desorganização e
“Tivemos uma pandemia em com um colega que estava com- artigo de revisão de A.M.A.S. depressão por dois ou quatro
que foram feitas horas extraor- pletamente em burnout e grita- Meleiro, do Instituto de Psiquia- meses precedendo o suicídio,
dinárias. Os médicos já vinham va comigo só porque queria aju- tria do Hospital das Clínicas da como na população geral”, é
de trás completamente desmo- dá-lo. Dizia: ‘Vocês vão ver o meu Faculdade de Medicina da Uni- salientado.
tivados e com muitas horas extra, suicídio!’. As pessoas continuam versidade de São Paulo, sendo “Chegamos a sentir-nos culpa-
sem tempo para a família nem a trabalhar apesar de estarem que no Brasil esta realidade é dos por algo aparentemente sim-
para eles mesmos. Passou a pan- mal. Os próprios médicos, mui- estudada, ao contrário daquilo ples - e a que temos direito -
demia e, na realidade, nada tas das vezes, não reconhecem que acontece em Portugal. como ficarmos com os nossos
mudou. Cada vez mais se veem que chegaram ao limite”, con- “Segundo trabalhos de Millan filhos doentes em casa. Porque
médicos deprimidos, exaustos ta, sendo que João Pedro (nome et al. e De Marco et al., alunos sabemos que os nossos utentes
e sem vontade de nada”, narra fictício), de 28 anos, interno de “Os casos de medicina com melhor per- ficam sem consulta e não sabe-
Maria João Tiago, assistente gra- uma especialidade cujo nome formance escolar encontram-se mos quando a terão”, desabafa
duada na USF São João da Talha, prefere não referir, apercebeu-
de suicídio não são num grupo de alto risco de sui- Maria João Tiago. “Uma coisa
em Loures, se de que tinha de abandonar a objetivados. cídio. Os referidos autores con- que devia ser encarada de modo
“Isto deve-se ao desinvestimen- Medicina para se reencontrar São escondidos jeturam que, por serem pessoas natural acaba por nos causar
to que há no SNS. Por exemplo, e, acima de tudo, colocar a saú- mais exigentes, estariam mais preocupação. Quando quem cui-
hoje não consigo sequer passar de mental em primeiro lugar.
pela vergonha” propensas a sofrer as pressões da dos outros nem doente pode
baixas ou dar uma consulta de “Comecei a ter problemas psi- impostas diante de qualquer ficar ou pode ter um filho doen-
forma normal porque o sistema cológicos graves no final do Ensi- “Para cuidarmos falha. O estudante passa a ter te... Queremos uma sociedade
informático vai abaixo constan- no Secundário. A pressão para dos outros, temos culpa pelo que não sabe e com assim?”, pergunta. “Tenho 30
temente. Isto, a falta de papel e
tinteiros para as impressoras e
ter boas notas era tão grande
que dei por mim a cortar-me.
de cuidar de nós isso se sente paralisado pelo
medo de errar. Esses quadros
anos de Medicina e não me lem-
bro de ver um panorama tão
outros problemas que já são Os anos foram passando e fui primeiro” caracterizam-se por sentimen- mau como o atual”.

18 —14 março 2023


DEPOIMENTOS

Opinião Opinião
FILIPE LUÍS PEDROSO DE LIMA
COSTA

Valor em Saúde: a chave Um logro chamado SNS


para a sustentabilidade O Estado deve garantir o acesso à saúde a todos miria uma atitude preventiva e de educação
os cidadãos, independentemente da sua condi- para estilos de vida saudáveis, visitaria esse agre-
A saúde enfrenta enormes desafios que podemos sintetizar da ção económica e assegurar, nas instituições de gado e não, como hoje acontece, na versão clíni-
seguinte forma: como manter ou melhorar os cuidados de saúde saúde públicas e privadas, adequados padrões co geral, diria falaciosamente que geria um
com os recursos atuais, que são escassos e não vão chegar a de eficiência e de qualidade (artº 64 da CRP). ficheiro com milhares de utentes dos quais nem
todos e a tudo? Quanto ao acesso ao serviço público de saúde, a metade vai à consulta uma vez por ano. Esta
Torna-se essencial, por isso, uma utilização mais racional e efi- realidade mostra as dificuldades que os cida- prática, conveniente, para fazer um horário
ciente dos recursos disponíveis (humanos, infraestruturas, dãos enfrentam diariamente. Falta de consultas público das nove às treze e depois ir trabalhar
medtech, etc.) e a medição do que realmente importa para os atempadas, urgências com tempos de espera para o privado não serve para suportar um siste-
doentes, de modo a contribuir para o real valor da saúde num inaceitáveis – quando não estão encerradas e ma de cuidados de saúde primários eficiente.
modelo de verdadeira sustentabilidade. cirurgias com tempos de espera que ultrapas- Quanto às regras de gestão. Um profissional de
O atual sistema de saúde em todo o mundo tem estado, na última sam os prazos clinicamente aceitáveis. A pers- saúde tem que ser remunerado de acordo com
década, numa crise de sustentabilidade económica, que se deve petiva da reforma de um número significativo a sua competência e produtividade. Sem uma
essencialmente à falta de evidência na concretização dos seus de profissionais de saúde nos próximos tempos adequada autonomia para gerir os recursos
objetivos: proporcionar os cuidados adequados aos melhores só faz antever um agravamento significativo no humanos nas condições que o mercado de tra-
resultados para os doentes. Os cuidados de saúde implicam sem- futuro próximo. Em consequência, assiste-se a balho estabeleceu, as unidades públicas de saú-
pre uma enorme despesa e têm sido vistos, não como um investi- uma transferência da acessibilidade do setor de nunca conseguirão ser eficientes e ser con-
mento, mas na maioria das vezes como um custo, porque de facto público para o privado com o consequente correntes com o setor privado. Por outro lado,
há poucas evidências da relação direta entre o dinheiro investido e aumento de custos para os cidadãos pondo deve ser a competência e não o Partido a deter-
o retorno real dos ganhos nos cuidados de saúde, ou seja, em assim em causa o princípio de um acesso uni- minar quem gere as unidades públicas de saú-
regra, não se ‘vê’ o retorno positivo do investimento feito em saúde versal e geral tendencialmente gratuito. Chega de. Os exemplos de incompetência na gestão
nos resultados clínicos obtidos pelas populações no seu todo. a ser pungente verificar que, numa determina- das unidades públicas de saúde chegam a ser
Tornou-se inevitável, por isso, integrar progressivamente modelos de da localidade, uma unidade pública não respon- chocantes.
decisão e de gestão que não podem depender simplesmente do volu- de às necessidades da população e, no mesmo Ao acabarem com os Hospitais SA acabaram
me de produção, mas de uma exigência-extra: a avaliação de resulta- local, uma unidade privada responde. com esta facilidade de o setor público poder
dos em saúde que na verdade acabam por contribuir para um Numa outra vertente de análise não deixa de competir com o setor privado. O fanatismo
melhor equilíbrio entre todos os stakeholders do sistema. A isso ser interessante verificar que unidades públicas ideológico virou o feitiço contra o feiticeiro.
acresce, como já dissemos, o facto de vivermos cada vez mais numa que até há pouco eram geridas por entidades Se querem cumprir a Constituição deem ao
sociedade económica de pressão sobre os custos e de ser cada vez privadas – as denominadas Parcerias Público- setor público as mesmas regras que os privados
mais exigido, a políticos e gestores, a redução das despesas em saúde Privadas – deixaram de responder às necessida- tem para gerir as suas unidades e reformem os
ou, pelo menos, a sua utilização adequada às verdadeiras necessida- des da população e vieram engrossar o número Cuidados de Saúde Primários.
des das populações. Ora, sem novos instrumentos de análise e avalia- de unidades incapazes de dar resposta – o Hos- A terceira razão é de natureza ideológica. A
ção não será possível falar em sustentabilidade do sistema de saúde. pital de Loures é um caso exemplar. O Estado esquerda em Portugal é a direita da Europa.
Assim, é importante levantar questões ao modelo atual. Qual o não está a ser capaz de conseguir assegurar Imobilista, avessa a reformas e de visão curta.
valor dos gestos produzidos ao longo da cadeia de cuidados numa adequados padrões de eficiência e de qualidade Assim, para ela, defender o SNS, é atacar os pri-
determinada doença? As instituições de saúde conseguem nas instituições de saúde públicas. vados. Não são capazes de ver que a opção pela
demonstrar de forma tangível o valor para o doente, para si pró- Em suma, o que a realidade mostra é que o iniciativa privada é dos cidadãos portugueses
prias e para a sociedade em geral, dos milhares de consultas, exa- setor privado floresce e o setor público definha que não encontram alternativa no setor públi-
mes complementares de diagnóstico e tratamentos que realizam e fragiliza-se. co, que os profissionais de saúde dos privados
todos os dias? Estaremos a conseguir enviar a mensagem correta No meu entendimento são três as razões para são os mesmos do setor público cansados de
para a tomada de decisões e para o mercado dos cuidados de saúde esta realidade. Em primeiro lugar uma deficien- serem mal remunerados pelo Estado. Assim, a
com o atual modelo de financiamento e avaliação dos cuidados? te arquitetura do sistema público de saúde. CULPA DESTA SITUAÇÃO é desta esquerda
Necessitamos de um sistema de saúde mais equilibrado, que Depois, regras de gestão que não promovem a retrógrada e conservadora que não consegue
produza melhores resultados para os doentes e com um desper- eficácia e a eficiência. E em terceiro lugar uma afirmar o primado do cidadão português face à
dício reduzido da variabilidade de produção. Um sistema que, questão de natureza ideológica. natureza do prestador do serviço. É desta
na perspetiva dos pagadores, seja um investimento no equilíbrio Quanto à arquitetura. O Serviço Nacional de esquerda que na prossecução da lógica salaza-
e na diferenciação do que é efetivamente melhor para cada Saúde assenta nos cuidados primários como seu rista deixa que os funcionários públicos e
doente. Um sistema, afinal, que crie o incentivo fundamental: o pilar fundamental. O modo de funcionamento outros agentes do Estado tenham regras dife-
de produzir melhores resultados para os doentes ao custo corre- deste pilar tem-se mostrado ineficiente e falacio- rentes e privilegiadas em relação ao restante
to, criando assim valor em saúde. so. A sua ineficiência está comprovada pelo sur- povo trabalhador. É esta esquerda que não se
Por isso, torna-se essencial a adoção, para uma melhor decisão par- gimento nas urgências de um número crónico e importa que as grandes empresas tenham
tilhada, mais consciente e transparente, da estratégia Value Based significativo das denominadas “falsas urgências. seguros privados para os seus trabalhadores e
Health Care (VBHC), a qual vai progressivamente quebrar o atual A falácia reside na implementação do conceito que os rurais se fiquem pela ineficácia e demo-
paradigma em saúde e abrir portas, assim, a uma verdadeira sus- “Médico de Família”. Cada família deveria ter ras do SNS.
tentabilidade do sistema de saúde, no seu todo. É o que estamos a um Médico de Família e não um Clínico Geral. Assim, se querem cumprir o artigo 64º da Cons-
fazer no Grupo Luz Saúde. Um contributo para a mudança, a trans- Cada Médico de Família deveria ter a seu cargo tituição da República Portuguesa digam à
parência e a sustentabilidade do sistema de saúde em Portugal. um determinado número de famílias. O Médico esquerda que basta de LOGRO.
de Família saberia a situação de saúde de um
Diretor de Gestão deValor em Saúde (Grupo Luz Saúde) agregado familiar e dos seus componentes, assu- Ex-administrador hospitalar

—14 março 2023 19


A Radar //

Opinião Opinião
RUI PEDRO
CRISTINA FRAZÃO

O colapso anunciado do SNS Precisamos de medidas estruturais


A recente greve dos médicos suscitou uma
catadupa de declarações do ministro da
estado de degradação do SNS está a atingir
um ponto crítico. Mais: em termos de futu-
para defender e reforçar o SNS
tutela e da recente Direção Executiva do ro, o estatuto do SNS não traz soluções O novo estatuto do SNS foi apresen- e a deixar as populações cada vez mais
Serviço Nacional de Saúde (DE-SNS) de exequíveis. tado como a cura para todos os distantes do SNS com o argumento da
difícil entendimento para o cidadão Anuncia-se o aumento do número de pro- males do SNS, por Marta Temido, reorganização.
comum, pela multiplicidade de alegadas fissionais no SNS, que não é garantia de tendo essa ministra governado desde Quando se fecham blocos de partos, a
soluções apresentadas. mais cuidados aos utentes, já que grande 2018 até setembro último com total seguir fecham-se as pediatrias e, por
Faltam médicos de família, há 1,6 milhões parte das contratações serviu para manter apoio do seu partido como também fim, o SNS fica numa senda de encer-
de portugueses à espera? O Sr. ministro a capacidade existente. A eficácia do SNS do PCP e do BE. Mas afinal o novo ramentos que não terá fim. Não terá
garante terem sido contratados mais depende, entre outros fatores, do número estatuto do SNS foi um autocarro fim, enquanto o mais importante não
médicos. O DE-SNS reconhece, no entanto, de horas trabalhadas e não do número de desgovernado a embater de frente for cuidado, e o mais importante são
desconhecer quantos dos médicos contra- profissionais. Mas, como reconheceu o res- no muro da realidade. os profissionais. Assim, a “dedicação
tados têm horários reduzidos, nem sabe ponsável da Direção Executiva, esta estru- O ministro e o novo CEO da Saúde plena” nada tem a ver com a dedica-
qual a presente força de trabalho médico tura desconhece este indicador. também foram apresentados, há ção exclusiva no serviço público, não
no SNS em termos de número de horas. E a verdade é que, nos últimos 7 anos, o vários meses, como uma panaceia respondendo à reivindicação de mui-
Fecham as urgências um pouco por SNS mergulhou numa difícil e profunda para as deficiências da gestão no SNS. tos profissionais que gostariam de
todo o país? A Reorganização das urgên- crise, para a qual muito contribuíram as Mas afinal o que apresentam é igual beneficiar de um regime de dedica-
cias de várias especialidades será conhe- decisões políticas erradas e eivadas de pre- ao anterior executivo ministerial, não ção exclusiva voluntária no SNS, com
cida esta semana, garante o DE-SNS, conceito ideológico, mas também a inca- passam de encerramentos. Este é o um acréscimo remuneratório digno.
Fernando Araújo. pacidade de perceção do sistema de saúde estado a que tudo isto chegou depois E o estatuto do SNS, é mais uma
Mas há um pequeno senão: a prometida como um todo, cenário agravado por uma de uma geringonça de 6 anos, depois ameaça à estabilidade e às carreiras,
estratégia de reorganização em rede só pandemia inesperada e indesejada. de uma maioria absoluta de já 2 pois não estanca a saída de profissio-
contempla, tanto quanto é público, das O estado caótico e de pré-ruptura do SNS ministros da saúde, igualmente sim- nais e generaliza o regime do contra-
urgências de urologia, gastrenterologia evoluiu para um colapso anunciado. É páticos, mas incompetentes. O estado to individual de trabalho.
e pediatria dos hospitais de Lisboa e indesmentível a desorganização, a falta de actual do SNS não responde às exi- Chegámos aqui depois de, nas últi-
Vale do Tejo. liderança e a gestão desastrosa dos recur- gências de recuperação do Serviço mas décadas, a pressão sobre os pro-
Em comunicado, lá vem mais uma pro- sos humanos. Nacional de Saúde, antes pelo contrá- fissionais de saúde ter-se vindo sem-
messa: o plano final de reorganização das Apesar da narrativa do aumento de inves- rio, vemos mesmo um retrocesso pre a acentuar. Esta pressão foi sendo
respostas do SNS será “agora concluído timento no SNS, a execução orçamental face à aprovação da nova Lei de acumulada ao longo de três choques
pela DE-SNS, com a tranquilidade, ponde- demonstra o logro. Na realidade, em 2022, Bases da Saúde. A prova disso é que distintos que ocorreram de forma
ração e diálogo necessários”, por se tratar o Orçamento do Estado (OE) previa um hoje, quando deveríamos estar a falar sequencial desde 2010. A crise finan-
de “matérias complexas e que afetam de investimento de 509 milhões de euros da abertura de mais serviços no SNS, ceira de 2011/2014 colocou uma enor-
forma profunda a vida das pessoas”. (M€). Os últimos dados disponíveis refe- estamos a falar de encerramentos. me pressão no sistema de saúde com
Há pelo menos uma verdade: a grave rem um grau de execução de apenas 45%, Os partidos da esquerda parlamentar reduções salariais, aumento dos
situação do SNS afeta de forma profunda a de 230 M€. têm total responsabilidade na fuga de horários de trabalho e o congelamen-
vida das pessoas. Dificilmente encontra- Já o OE para 2023 apresenta para saúde, encéfalos do SNS, que produz a escas- to real do orçamento para o SNS.
mos um setor onde a atual crise de gover- no conjunto das despesas públicas, no sez de recursos humanos e, conse- Depois, a recuperação no pós-crise
nação afete tão diretamente a vida diária. valor mais alto da última década. Acontece quentemente, as faltas de acesso a cui- entre 2015 e 2019 trouxe a diminui-
Se essas dificuldades eram já evidentes que grande parte deste esforço está asso- dados de qualidade em saúde, desde ção do horário de trabalho da maio-
antes de 2020, a pandemia agravou fragili- ciado a efeitos preço, não se prevendo um os cuidados primários aos hospitala- ria dos profissionais de saúde mas
dades estruturais do SNS, cujos problemas aumento significativo da capacidade de res mais especializados. Os exemplos contribuiu indiretamente para acen-
não se resolvem com juras de rápida reso- prestação de cuidados de saúde. são muitos e por todo o país. Os médi- tuar a pressão: a mesma procura por
lução, comunicados delicodoces, ou pro- É imperativo o atual SNS evolua para um cos dizem que “vivem os piores cuidados de saúde teve de ser satisfei-
postas ideológicas. Salvar o SNS exige Sistema de Saúde assente num modelo de momentos da sua vida com desespe- ta por um número menor de horas
visão, clareza de missão e a concretização cuidados integrados, centrado nas pessoas ro” – e pensemos que foram médicos de trabalho. Finalmente, a pandemia,
urgente das tão necessárias reformas con- e nas suas necessidades específicas, focado que trabalharam durante a pandemia. sentida principalmente entre 2020 e
tinuamente adiadas. na melhoria da qualidade de vida e do Dizem ainda “outrora era um hospital 2021, veio aumentar drasticamente a
Teria sido um ato de inteligência política bem estar, ao invés de um sistema apenas modelo e revolucionário na aborda- carga de trabalho. O seu impacto ain-
que poderia unir todos os agentes da saú- orientado para a doença, como atualmen- gem e gestão dos doentes”, mas que da hoje se sente na saúde dos portu-
de em torno de uma causa comum, o te existe. Para tal, impõe-se uma reorgani- agora “vive os piores momentos da gueses, por milhares de consultas,
governo ter ouvido os partidos da oposição zação do SNS a sério e a revisão da atual sua história e vê-se a não cumprir o exames, diagnósticos e cirurgias que
e a sociedade portuguesa antes de avançar Lei de Bases da Saúde, se quisermos impe- seu maior objectivo“. Estes relatos, ficaram por realizar.
com o Estatuto do SNS. Entendem os dir o colapso. O PSD continuará a apresen- ilustrativos de todo o país, são do Hos- Esta tempestade perfeita coloca o
governantes que tudo podem fazer, igno- tar propostas, mesmo que o PS as conti- pital Beatriz Ângelo, um ano e meio governo no olho do furacão da saúde
rando todos e os resultados estão à vista. nue a chumbar. Podem chumbar mas nós depois da reversão da PPP. Isto é só a e era preciso uma exemplar mestria
É unânime, quer entre dos profissionais de continuaremos a lutar pelo nosso país. ponta do iceberg que é a má qualidade de planeamento governativo, que
todos os setores envolvidos, dos seus orga- assistencial que adveio do preconceito manifestamente não existe.
nismos representativos e, já agora, do Deputado do PSD ideológico. O Governo está a encerrar
maior partido da oposição, que o atual e coordenador da comissão de saúde serviços de urgência e especialidades Deputado do Chega

20 —14 março 2023


DEPOIMENTOS

Opinião Opinião
JOANA JOÃO
CORDEIRO DIAS

SNS: passado, presente e futuro Precisamos de medidas estruturais


O Serviço Nacional de Saúde
(SNS) mudou Portugal. Foi uma
sobretudo, da conceção de todo o
modelo de saúde, que concentra
para defender e reforçar o SNS
importante reforma que garantiu no Estado todas as funções: O Serviço Nacional de Saúde (SNS) urgências, o que na verdade tem
a todos os cidadãos, sem exceção, regulador, financiador e confrontado que está com grandes mostrado ser igual a encerramen-
o acesso geral, universal e prestador, que é dominado por problemas e contrariedades, rela- tos. Ainda que por agora não se
tendencialmente gratuito a preconceitos contra os setores cionados com uma carência de tratem de encerramentos à desca-
cuidados de saúde e é inegável a privado e social e que é avesso à profissionais e falta de investimen- rada, como fizeram no passado,
sua contribuição para a melhoria concorrência e à tos em equipamentos e infraestru- são encerramentos parciais que,
da qualidade de vida, justiça complementaridade entre turas, ainda assim continua a reve- devagarinho, farão com que no
social e dignidade dos prestadores de cuidados de lar uma enorme capacidade de futuro se tornem definitivos. É evi-
portugueses. saúde. Mais, porque o modelo resistir e de responder às necessi- dente que existem problemas de
Durante largos anos, com o SNS e existente nega às pessoas a dades de cuidados de saúde da organização e que haverá sempre
com o seu desenvolvimento, liberdade de escolha sobre a sua população. espaço para melhorar, no entanto
foram alcançados muitos ganhos saúde. A par da necessária identificação com a criação da Direcção Executi-
em saúde, positivos e relevantes, Na ótica da Iniciativa Liberal, é das fragilidades de que o SNS va não se resolveu o problema da
como a redução drástica da necessária uma mudança de padece, que se manifesta por autonomia de gestão das unidades
mortalidade infantil ou o paradigma, em que passemos de extensas listas de espera para de saúde para que possam resol-
aumento da esperança média de uma saúde centrada no cirurgias, exames e tratamentos, ver, em tempo, as dificuldades que
vida, mas a verdade é que o nosso prestador e no Estado para uma bem como por um crescente enfrentam. Continua a subsistir
sistema de saúde enfrenta, hoje, saúde centrada nas pessoas e nos número de utentes sem médico e uma dependência de decisões da
inúmeros desafios, potenciados melhores resultados em saúde. enfermeiro de família, profissio- tutela e do Ministério das Finan-
por uma sociedade cada vez mais Uma saúde focada na prestação nais de saúde exaustos e cada vez ças, sendo que o diretor executivo
envelhecida e com mais doenças de melhores cuidados de saúde e maior desvio dos recursos finan- tem liberdade para contratar mais
crónicas. O que temos atualmente na liberdade de escolha das ceiros públicos, de forma crescen- privados, mas já não pode aprovar
é um sistema que não se soube pessoas e em que o acesso seja, te, para os grupos económicos pri- os orçamentos dos hospitais públi-
adaptar a esta evolução e que verdadeiramente, geral e vados, é preciso implementar cos, que estão dependentes do aval
insiste nas soluções do passado universal, e que não deixe medidas que solucionem as suas do ministro das finanças.
para responder ao presente e ao ninguém para trás por falta de debilidades. Contudo, para que tal Precisamos de um SNS que abra a
futuro. alternativas. aconteça, é necessário em primei- porta a mais médicos, enfermeiros
Nos últimos anos, situações que O futuro da saúde em Portugal ro lugar vontade de o fazer e con- e assistentes técnicos e operacio-
são inaceitáveis num sistema de terá, assim, que passar por um sequentemente criar as condições nais, mas também psicólogos, far-
saúde de qualidade são modelo mais coerente, que se impõem, a começar pela macêuticos, técnicos superiores de
recorrentes: temos cada vez mais equilibrado e transparente, que atração e fixação de profissionais diagnóstico e terapêutica, dentis-
pessoas sem médico de família aposta na promoção da saúde e de saúde no SNS. tas, nutricionistas e tantas outras
(ao contrário do prometido); as na prevenção da doença e onde o Hoje deparamo-nos com um profissões, para garantir um traba-
longas listas de espera para prestador público (o SNS) coabita momento crucial quanto à viabili- lho que é cada vez mais multidisci-
consultas, exames ou cirurgias em pé de igualdade com os dade de muitos serviços e unida- plinar e de equipa.
aumentam; as urgências prestadores privados ou do setor des que estão a aproximar-se peri- Precisamos de um SNS que asse-
hospitalares estão, social e com os profissionais gosamente de um ponto de difícil gure o seu carácter público, geral,
permanentemente, sobrelotadas liberais, para que se assegure, retorno. Assistimos a dificuldades universal e gratuito, a gestão
ou encerradas; temos unidades efetivamente e sempre, a todas as nas mais diversas especialidades pública dos estabelecimentos de
de saúde com instalações e pessoas, o acesso a cuidados de médicas, confrontadas que estão saúde que integram o SNS, pondo
equipamentos obsoletos e, saúde a tempo e horas, com com uma tremenda carência de fim à promiscuidade entre os seto-
muitas vezes, sem consumíveis qualidade e segurança. Um médicos, que nos serviços de res público e privado. Tudo isto
básicos; e temos profissionais de modelo que premeia os ganhos urgência não conseguem assegu- tem custos, claro que sim! Mas
saúde esgotados e sem vontade em saúde e que contenha em si rar as escalas, seja da Ginecolo- custará sempre menos do que
de trabalhar no SNS. os incentivos à inovação, à gia/obstetrícia, à psiquiatria pas- entregar serviços de saúde aos
Adicionalmente, vemos a gestão gestão, à valorização dos sando pela pediatria, sendo tam- grupos privados. Ou seja, o SNS
sem autonomia e a tutela sem profissionais de saúde, à bém afetados os cuidados não é só a melhor via para assegu-
visão ou estratégia. melhoria contínua dos cuidados programados. rar o direito à saúde a todos, como
Para a Iniciativa Liberal, o atual prestados e à satisfação dos Quando se esperava que o Gover- é a resposta com menor custo. A
sistema de saúde, utentes. E não é preciso no correspondesse a todas as difi- opção de reduzir os serviços públi-
predominantemente estatizado e “inventar a roda”, estes modelos culdades do SNS, com a contrata- cos de saúde implica comprar
politizado, centralizado no de sistema de saúde existem e ção de mais profissionais de saúde, mais ao privado, o que fragiliza o
Estado e no SNS, já não serve a são dos melhores do mundo. valorização das suas carreiras e acesso à saúde e corresponde ine-
Portugal. E isto porque os salários e mais investimento, o que vitavelmente a maiores custos
problemas existentes não são Deputada da IL que integra a o Governo apresenta como solução para o povo português.
apenas consequência de falhas de Comissão de Saúde e membro da é a reorganização e reestruturação
gestão ou de estratégia, mas, Comissão Executiva da IL dos serviços, em particular das Deputado do PCP

—14 março 2023 21


A Radar //

Opinião Opinião
JOÃO VARANDAS ANA RITA
FERNANDES CAVACO

Saúde sem Rei O diagnóstico do costume,


nem Roque a inércia de sempre
Há muitas confusões e indefinições no fun- Quais as soluções para os principais proble- O diagnóstico é conhecido, está escrito e tem sido debatido até à
cionamento e na sustentabilidade do Serviço mas reconhecidos no SNS? exaustão. Falta fazer. O Serviço Nacional de Saúde tem dificulda-
Nacional de Saúde (SNS), na sua forma atual. Com o aparecimento de mais um organis- des crónicas no acesso, faltam recursos humanos e continua subfi-
Os governos do Partido Socialista desde mo, é inevitável continuarem a existir nanciado. Até aqui, nada de novo. Apesar deste cenário, os portu-
Novembro 2015, formalmente com acordo avanços e recuos que não levam à reso- gueses reconhecem no SNS um dos pilares da Democracia do qual
do Partido Comunista, Bloco de Esquerda e lução dos urgentes problemas do SNS. não tencionam abdicar. É daqui que partimos para qualquer esbo-
“Os Verdes” e em Janeiro de 2022 com Por outro lado, as cinco Administrações ço ou tentativa de reforma que os sucessivos governos têm adiado.
maioria absoluta, apresentaram como obje- Regionais de Saúde perdem a interven- Continuamos com problemas evidentes no acesso aos cuidados
tivos gerais, a defesa do SNS e o equilíbrio ção operacional em aspetos de contra- de saúde, muito por culpa da incapacidade de concretizarmos
no seu financiamento. tação, assumindo novamente o papel uma verdadeira reforma dos Cuidados de Saúde Primários
Como sabemos, a organização e o funciona- fracassado de planeamento e coordena- capaz de retirar pressão sobre os serviços de urgência, mas não
mento dos Serviços de Saúde estão a provo- ção regional, que já tinham nas suas só. O actual modelo centrado no hospital é, só por si, redutor,
car danos aos cidadãos, em matéria de atribuições. sobretudo num País com evidentes clivagens sociais e assime-
direito à saúde, tudo isto agravado pelas cir- O desafio é precisamente saber se estes trias regionais. As dificuldades no acesso estão a prejudicar,
cunstâncias de exaustão dos profissionais institutos públicos, serão capazes de sobretudo, os mais pobres que não têm capacidade financeira
de saúde. demonstrar eficiência, apesar da amalga- para recorrer a serviços privados de saúde e todos aqueles cida-
Prevenção com rastreios e consultas que ma que foi criada. dãos que vivem longe dos centros urbanos.
não se efetivam, intervenções cirúrgicas, No orçamento para 2023, no conjunto Este problema resulta, em grande medida, da sobreposição de
tratamentos oncológicos e exames comple- das despesas públicas, a saúde alcança o desajustes crónicos no sector, começando pela falta de financia-
mentares de diagnóstico que não aconte- valor mais alto dos últimos dez anos, ain- mento e de critério na aplicação dos investimentos, passando
cem em tempos clínicos recomendados e da assim, grande parte desde apoio, está pela incapacidade de retermos o talento e culminando em
uma rede de cuidados continuados e palia- relacionado a efeitos preço. Não se prog- modelos arcaicos de gestão e organização.
tivos sem respostas. nostica um aumento considerável da Portugal perdeu mais de 15 mil enfermeiros em oito anos. Não
A reorganização das urgências e dos servi- capacidade de prestação de cuidados de há País que resista a esta sangria. É urgente avançar com uma
ços de prestação de cuidados estão a ser saúde. estratégia de retenção de profissionais. O tempo é de valorização
tratados com mezinhas e pensos rápidos, O histórico da execução orçamental ante- dos recursos humanos assente em três pilares: salário, carreira e
não deram grandes resultados, bem pelo vê acrescidas dificuldades, no controlo da condições de trabalho.
contrário, sobrecarregam as Unidades que despesa do pessoal, bens e serviço. A verdade é que não é possível redefinir a política de recursos
têm bons resultados. O Partido Socialista não está a contribuir humanos e reter o talento se, ao mesmo tempo, não revolucio-
A implementação eficaz das Unidades para uma melhoria do SNS porque tem narmos a forma como gerimos os hospitais. O desafio passa por
Locais de Saúde (ULS), depende da disponi- uma visão tática e não uma visão estraté- premiar o mérito, humanizar as relações de trabalho e gerir
bilidade de recursos e equipamentos inexis- gica, não permitindo que o acesso dos com eficiência.
tentes, não sendo do conhecimento público portugueses aos cuidados de saúde seja Entretanto, o tempo vai passando. Um em cada três portugueses
as avaliações e os resultados autênticos, da uma realidade. terá mais de 65 anos em 2050 e um em cada oito será maior de
satisfação das necessidades da população. Pelo que se compreende, a Direção Exe- 80. Por cá, os mais velhos estão condenados a dois movimentos
Existem sinais de degradação. cutiva do SNS, tem a missão de determi- simultâneos: envelhecer e empobrecer (que é praticamente a
Não faz sentido existir mais uma estrutura, nar as diretrizes para que o desempenho mesma coisa). É urgente libertar o País de um modelo focado na
Direção Executiva do SNS (DE-SNS), tendo o do SNS seja favorável. urgência e na crise aguda. O nosso sistema não dispõe de uma
Ministério da Saúde muitas instituições O que está expresso na Lei de Bases é rede de cuidados integrados e eficientes que permitam lidar com
para a gestão global dos cuidados de saúde compatível com diferentes visões para as o ritmo de envelhecimento da população, o que torna imperativo
primários e hospitalares. parcerias público-privada e possibilita a apostar num novo paradigma assistencial, de maior proximidade,
Como exemplos, a Administração Central participação dos setores privado e social. reforçando o acesso aos cuidados de saúde primários e comunitá-
de Cuidados de Saúde (ACSS) e as cinco Se existem estes recursos, porque não uti- rios, apostando na presença no domicílio, ao mesmo tempo que
Administrações Regionais de Saúde. Temos lizá-los, sem amarras ideológicas, como o se garante meios e dignidade aos cuidados continuados.
dificuldade em entender. CDS tem vindo a afirmar insistentemente? O cenário de terror vivido em muitos lares coloca a nu a dura
Qual a colaboração de proximidade que a Por último, faz sentido que os membros da realidade em que vivemos. O Estado demitiu-se de zelar pela
DE-SNS pode vir a ter, e que sinergias com Direção Executiva do SNS, não tenham um proteção dos mais velhos. Ao não fiscalizar o cumprimento da
as Instituições públicas, privadas e sociais? sistema remuneratório, com uma compo- Lei, abriu a porta ao abuso, à desumanidade e à tragédia. É pre-
As boas intenções não são suficientes para nente de acordo com o desempenho? ciso garantir que os cuidados de enfermagem são prestados por
resolver os problemas das Instituições. Ainda não conhecemos, até hoje, a inten- enfermeiros e que estes existem em número suficiente. Neste
Existindo divergências entre a ACSS e a ção e o que pretende cumprir o Ministé- caso, vou mais longe: defendo que a direção dos lares deve ser
Direção Executiva do SNS, quem prevalece? rio da Saúde com a Direção Executiva do entregue aos enfermeiros e que a tutela possa ser partilhada
Como responsabilizar a DE-SNS se não tem SNS. Seria de esperar, quanto mais não entre a Segurança Social e a Saúde. É urgente colocar o cuidado
as tarefas de conceder verbas e recursos seja, que haja algum escrutínio, dado que dos idosos como um dos grandes desafios da comunidade. Hoje
humanos, dois mecanismos fundamentais estão envolvidos dinheiros públicos. são os nossos pais e avós, seremos nós amanhã.
para a resolução das principais dificuldades
identificadas. Médico e Vice-Presidente do CDS/PP Bastonária da Ordem dos Enfermeiros

22 —14 março 2023


DEPOIMENTOS

Opinião Opinião
EMA ALEXANDRA
PAULINO BENTO

SNS: transformar os desafios Os desafios de cuidar da Nutrição no Serviço


em oportunidades Nacional de Saúde: olhar para o futuro
Os desafios do Serviço Nacional de Saúde são conhecidos, as A importância da criação do Serviço intervenção preventiva, sendo
soluções têm sido amplamente debatidas e as conclusões são Nacional de Saúde (SNS) em Portugal e necessário reconsiderar as prioridades
praticamente consensuais. Sabemos que a pandemia nos tro- a sua positiva evolução nas últimas em saúde.
cou as prioridades, mas deixou a descoberto necessidades há décadas, é um facto incontestável. Ao longo das últimas décadas, Portugal
muito identificadas. De um evidente consenso e valor assistiu a um processo de modificações
Chegados a 2023, estamos conscientes de que os medica- insubstituível, o SNS tem-se afirmado sequencial no padrão de consumo
mentos e, em particular, as vacinas tiveram um papel pre- como um dos melhores sistemas de alimentar que se traduziu na
ponderante no regresso a uma normalidade que, não sendo saúde do Mundo, reforçando assim a predominância de doenças crónicas e
igual à que conhecíamos antes, é aquela na qual podemos importância da construção deste na redução de anos de vida saudável.
continuar a perspetivar progresso e crescimento socioeco- património inigualável, que já conta Assim, o objetivo será atingir-se uma
nómico. com 43 anos, e que protege os cidadãos nova transição nutricional, através da
Estamos, ainda, a constatar o que se antecipava num contex- com um direito incomutável: a garantia mudança de comportamentos, para um
to de utilização intermitente dos serviços de saúde durante a da proteção da saúde. padrão alimentar saudável, como se tem
pandemia, associado aos desafios demográficos que já No entanto, e pese embora a sua notável verificado em outros países
conhecíamos: além do aumento da mortalidade que se missão pública, ao SNS identificam-se desenvolvidos.
observou no curto prazo, somos agora confrontados com o algumas fragilidades de caráter A alimentação é um dos determinantes
acréscimo de morbilidade associada ao aumento da carga de estrutural e organizacional que apesar com mais impacto na saúde e no
doença, observável num grande número de países. de se tentarem colmatar com reformas, combate de algumas doenças, tornando-
Isto leva-nos, por um lado, a observar dois fenómenos: a numa tentativa de resposta a diferentes se fundamental a definição de políticas
escassez de medicamentos e o crescimento da despesa com dificuldades do sistema, torna-se que elevem a qualidade dos cuidados e a
os mesmos. O medicamento é um investimento da sociedade fundamental a continuidade de um eficiência de recursos, bem como
para mais e melhor saúde. Não apenas contribui para a qua- caminho cada vez mais coeso, que estratégias de promoção da saúde, com
lidade de vida das pessoas, como assegura e aumenta a pro- obrigue a uma abordagem e visão foco na nutrição, analisando as
dutividade do país, diminuindo gastos em intervenções des- integrada dos cuidados de saúde e de particularidades do indivíduo e a
necessárias, quando por ele prevenidas. adaptação a novas realidades, desafios e comunidade onde se insere.
O crescimento da despesa pública com medicamentos, de for- cenários (muitas vezes inesperados, Na verdade, será importante reiterar
ma sustentável e acompanhada pelo farmacêutico – de forma como a pandemia de COVID-19). (e as vezes que forem necessárias) que
a garantir que o investimento se transforma em ganhos em Portugal, nas últimas décadas, grande parte das doenças de progressão
saúde –, é o garante de uma sociedade que responde conti- conseguiu uma grande evolução nos lenta e duração prolongada podem ser
nuamente às necessidades e expetativas das pessoas. indicadores de saúde, nomeadamente prevenidas e reduzidas com uma forte
Por outro lado, neste contexto de pressão continuada sobre o no que diz respeito ao aumento da intervenção nutricional, onde o
SNS, as farmácias continuarão a ser uma porta de entrada esperança média de vida e à diminuição nutricionista pode e deve fazer a
para o sistema de saúde e um recurso importante para o na mortalidade infantil, mas mesmo diferença.
acompanhamento da população. Será importante definir, de assim o sistema enfrenta, atualmente, Portugal nunca conseguirá,
forma estruturada, de que forma os farmacêuticos e as far- características de uma população cada verdadeiramente, promover a saúde da
mácias serão envolvidos nesta estratégia, e como se deverão vez mais envelhecida e com uma população se desvalorizar as questões
posicionar para facilitar o percurso das pessoas no sistema elevada carga de doenças crónicas. alimentares e nutricionais, devendo
de saúde, em conjunto com os outros profissionais de saúde. Vivemos, assim, um tempo da saúde olhar para estas temáticas numa
A nível internacional, temos assistido a um movimento no pública caracterizada pela elevada perspetiva integrada e global,
sentido da contratualização e remuneração por serviços prevalência de patologias que se assegurando por um lado o direito à
prestados, à semelhança que se observou em Portugal para a prolongam no tempo, como as doenças alimentação adequada e, por outro lado,
testagem, e que contribuiu comprovadamente para a redu- cardiovasculares e respiratórias, o estratégias eficazes para melhorar a
ção das desigualdades de acesso ao serviço por parte dos cancro e a diabetes mellitus, saúde nutricional da população.
cidadãos. representando estas doenças 86% das O futuro do SNS passa também pela
A rede de farmácias está capacitada para prestar um conjun- mortes. Para além disso, tratam-se de nutrição e pelos profissionais nesta
to de serviços, como a renovação da terapêutica e a dispensa patologias que necessitam, por norma, área. Desta forma, será importante
de medicamentos hospitalares em proximidade, já incluídos de tratamento prolongado e resultam repensar o número adequado de
no Orçamento do Estado para 2023, mas também serviços num enorme aumento dos custos nutricionistas, bem como o modelo de
de avaliação e referenciação de situações clínicas ligeiras e relacionados. acesso aos cuidados de nutrição.
consultas farmacêuticas de revisão da medicação. Este atual perfil demográfico e Aos nutricionistas caberá sempre lugar
Mais do que nunca, precisamos de uma visão para as políti- epidemiológico reflete as evidentes para mais e melhor nutrição em prol da
cas de Saúde que transforme os desafios em oportunidades. alterações da sociedade portuguesa, população, em diferentes estruturas do
Precisamos de um Governo que orquestre a execução, em sobretudo no que diz respeito a novos SNS, pela importância da atuação destes
conjunto com os parceiros do Setor. Precisamos de soluções estilos de vida, incluindo os profissionais na qualidade de cuidados
efetivas que melhorem a vida dos portugueses. comportamentos alimentares, de saúde prestados.
pressionando o SNS com destas
Presidente da Associação Nacional de Farmácias patologias que deveriam ter uma forte Bastonária da Ordem dos Nutricionistas

—14 março 2023 23


B Zoom //

14 de Março de 1960.
50 milhões de francos
pelo pequenino Eric que
se chamava Peugeot

Tinha pouco mais 02

de quatro anos e foi


raptado enquanto
brincava num parque
infantil anexo
ao campo de golfe
do qual o avô
e proprietário das
fábricas de automóveis
com o mesmo nome
era sócio. Três mil
gendarmes saíram
para as ruas. 48 horas
depois foi encontrado,
tendo o resgate sido
pago em segredo.
AFONSO DE MELO forte: “Se qualquer coisa acontecer ao
afonso.melo@ionline.pt pequeno Eric os responsáveis serão con-
denados à morte por guilhotina!” Pois, a
A angústia entrou às escâncaras na casa guilhotina ainda assustava os franceses
da família Peugeot proprietária da famo- e muito. E, apesar de Roland se ter recu-
sa marca de automóveis do mesmo nome. sado a apresentar uma queixa formal con-
O pequeno Eric, membro mais jovem da tra os raptores com receio das consequên-
família e filho de um dos vice-presiden- cias, a polícia lançou-se numa caçada furio-
tes da empresa, Roland, foi raptado e uma sa pronta a não deixar pedra sobre pedra
carta ameaçadora foi enviada aos pais até que Eric fosse encontrado.
dizendo algo como isto – “O vosso filho No dia 14 de Março, um hoteleiro de
está vivo e encontra-se bem. Queremos Semaïle, uma pequena vila perto de Alen-
50 milhões de francos para o devolver. çon, na Normadia, avisou a polícia local
Não falem com a Polícia e mantenham- que tinham almoçado no seu estabele-
03 se em silêncio absoluto”. Ora, como se tal cimento dois homens com cerca de trin-
fosse possível? Estamos a falar de uma ta anos acompanhados por um menino
daquelas famílias que, em França, anda- de quatro anos, tendo desconfiado que
va quotidianamente nas bocas do mun- acabara de servir os raptores. Referiu
do. Não tardou que mais de três mil gen- também a marca e a matrícula do veí-
darmes andassem à caça dos raptores culo no qual se faziam transportar. Com
embora, tal como ficara estabelecido, a o dinheiro do resgate na mão, os melian-
família tenha entregue o dinheiro do res- tes trataram de deixar a criança no sítio
gate de uma forma tão discreta que sobre antecipadamente combinado com Roland
isso nada se soube. Possuíam uma auto- para alívio dos Peugeot. Mas não se dei-
rização extraordinária assinada por um xaram apanhar com facilidade. Só no
juiz para poder deter e levar para a esqua- final de 11 meses de investigações é que
dra quem quer que fosse sem mandato Pierre-Marie Larcher e Robert Rolland
de captura. Peugeot era um nome com foram sujeitos a condenação. Não ape-
um enorme peso social. Eric desapareceu nas eles mas também os seus cúmplices:
da vista dos seus pais enquanto brincava Ingelise Bodin, Rolande Niemezyk e Jean-
num parque infantil de um campo de gol- Simon Rothman. Entretanto já tinham
fe do qual o seu avô e presidente da mar- gasto uma boa quantia dos 50 milhões
ca era sócio. O aviso das autoridades foi de francos com que se abotoaram.

24 —14 março 2023


MO
A VIDA COI... 01

ELA FO

04 05

01 O pequeno Eric 04 Uma foto de Eric ainda


ao colo da mãe depois bebé – o avô era o
de 48 horas de rapto presidente da fábrica
de automóveis Peugeot
02 Com medo de represálias,
o pai, Roland, nunca 05 Depois de passada
divulgou ter pago o resgate a tormenta, são e salvo
com a mãe que viveu
03 Capa do Paris-Match como uma terrível angústa
não poderia deixar de ser FOTOS DR

—14 março 2023 25


C Opiniões
CONTA CORRENTE

Será uma fatalidade Portugal


não ser confiável?
Uma vez mais, sinaliza-se para o país e para o Mundo, um Portugal nada confiável, sem pingo de previsibilidade,
enquanto se mantêm pressupostos enviesados numa empresa intervencionada com o dinheiro de todos.

decisores e do país se sobressaltou, fazen- nas, na nacionalização, na modelação da ça zero. A governação de um país, a ges-
do com que as mesmas circunstâncias que gestão e na privatização para remover o tão de uma comunidade e um exercício
tinham trazido os benfeitores, com a mudan- ativo tóxico do radar da governação. O gover- político centrado no interesse geral, na
ça dos ventos ou dos governos, os projetem no quis mandar na TAP para defender a exigência e na transparência parece uma
para um patamar de malfeitores, agora economia nacional, as empresas nacionais coisa de outra galáxia. Não se trata de ser
detentores de ativos da economia nacional, e o interesse geral, os portugueses paga- coisa de esquerda ou de direita, mas de
alguns com uma forte relevância estratégi- ram e Bruxelas impôs um plano. Com o gente decente com ética republicana, sen-
ca para as pessoas, os territórios e o país plano, parece que existiam resultados, mas tido da vivência em comunidade e senso
António Galamba como um todo. A necessidade fragiliza o a ligeireza manifestou-se sob a forma de no posicionamento do país e dos interes-
escrutínio, a ponderação e a avaliação das uma indemnização milionária a uma ex- ses gerais. Está bem longe da realidade
opções de gestão do interesse geral, mesmo governante, o governo encomendou um atual e do azimute de serviços mínimos
No imaginário da sina coletiva dos coita- quando os sinais são evidentes e desacon- estudo rápido à inspeção de finanças e, com vigentes. É possível fazer muito melhor.
dinhos, as adversidades são fatalidades às selham ligeirezas, mas há gente viciada em o resultado, não hesitou em brandir a “jus-
quais nos acomodamos, com maior ou facilitismo, porque a fatura é assumida sem- ta causa” para remover da administração NOTAS FINAIS
menor espírito de desenrasque, de impro- pre por alguém: os contribuintes. A ligeire- os bodes expiatórios vigentes, sem acaute- UM PRESIDENTE POUCOCHINHO. O homem
viso ou de resiliência, sem uma ambição za não é de esquerda ou de direita, há casos lar a solidez jurídica da rotulagem. E ago- do compromisso da Auto-Europa de Antó-
em linha com a capacidade produtiva, de e espécimes promotores da dita em todos ra parece que está a tentar construir a fun- nio Costa ganhou uma nova vida com os
organização e de obtenção de resultados os quadrantes políticos, como se tivesse havi- damentação para o que anunciou. Já tínha- casos no governo e na governação. Põe
que revelamos quando integrados nou- do uma pandemia em surdina, com danos mos uma justiça que prendia para investigar, Ministro na mira, finge-se de morto na
tras sociedades democráticas. irreparáveis no quadro moral de exigência, temos agora uma governação que anuncia crise do governo dos Açores e imiscui-
Com confrangedora ligeireza, os portu- sentido de serviço público e defesa do inte- para estudar os fundamentos das suas se em áreas da governação, sem garan-
gueses têm sido confrontados com uma resse geral dos titulares de cargos políticos. opções. E tudo com o suporte de despreo- tias de mais mãos por baixo. O país em
sucessão sistemática de inconsistências Uma cegueira utilitária, meio vale tudo, cupação e ligeireza da cobertura do dinhei- dificuldades assiste a esta linha de mon-
do exercício político, toleradas, permiti- meio irresponsável, pelo que sinaliza de ro dos contribuintes, que são chamados a tagem de jogos florais das instituições
das e desculpadas, como se não configu- imprevisibilidade e de inconsistência para colmatar todos os desmandos. Os de um democráticas.
rassem um perigoso padrão de compor- os cidadãos na observância das regras da Presidente da República em modo de ajus-
tamento nacional, lesivo da imagem do vida em sociedade e para o Mundo com o te de contas por invocação das responsabi- UM CAMPEÃO POUCOCHINHO. Um cam-
país no exterior, junto dos mercados e dos qual nos relacionamos. Esta deriva ou espi- lidades do escritório do irmão na indemni- peão é um ser humano que se superou,
investidores. ral de guinadas nas opções políticas faz de zação ilegal; os de governantes com rabos mas Nélson Évora reitera de forma sus-
Primeiro problema, aparente, a escolha Portugal um país cada vez menos confiá- presos na estrutura omissa da TAP limpa tentada intervenções indignas de um cam-
das companhias. Enfrentamos individual e vel, mesmo quando se esforça para reduzir do relatório da IGF e os de opções gover- peão, a raiar a xenofobia em relação ao
coletivamente muitos problemas de gestão a dívida pública e manter um registo de alu- nativas sem a adequada consistência jurí- campeão Pedro Pichardo. Nenhuma azia
e de sustentabilidade, recorrendo a compa- no aplicado com as instituições europeias. dica para as soluções adotadas, em relação ou inveja justifica a tragédia daquela degra-
nheiros de construção de soluções que depois Estas, tão como os que já foram vítimas das a quem sabe demais, quando se pretende dação pessoal, pública e mediática.
rejeitamos, com evidentes danos irrepará- guinadas, dos ziguezagues e das incoerên- livrar da companhia o mais depressa pos-
veis de perda de autonomia e de soberania, cias, sabem que o compromisso é válido até sível, no meio de um ensurdecedor ruído UMA IGREJA POUCOCHINHA. A confirma-
para não falar de autoridade moral. Foi ao dia em que, de um momento para o outro, de ações e omissões. ção de que há árvores da floresta da Igre-
assim com as convergências com autocra- o deixe de ser. Se fosse de crianças, era uma garotice, ja Católica indignas da instituição, da
cias detentoras de recursos financeiros que O segundo problema, a inconsistência das assim é um desastre financeiro pelo que mensagem e da relevância para os cren-
escasseavam no território nacional. Basta guinadas e o preço da leviandade. Podia já pagámos e pelo que vamos pagar à con- tes e os territórios exigia uma reação inte-
recordar Angola, a República Popular da falar da implosão das PPP que funciona- ta da inconsistência dos anúncios e das grada, proativa e consequente. Semanas
China, a Venezuela e outras paragens de vam na saúde, nas reversões nos transpor- opções governativas. depois deixou-se enlear num desnorte
sinal similar, em que o conforto do dinhei- tes, nas vendas ao desbarato de ativos estru- Uma vez mais, sinaliza-se para o país e comunicacional, de reação e de preven-
ro e o imediatismo das necessidades políti- turantes como a ANA Aeroportos de Por- para o Mundo, um Portugal nada confiá- ção, por falta de comando. Um desastro-
cas do momento, mandou os valores, os tugal, nas prepotências do pacote da habitação vel, sem pingo de previsibilidade, enquan- so lume brando que em nada ajuda à
princípios e os padrões civilizacionais às e de um lençol de casos tocados pela ligei- to se mantêm pressupostos enviesados reparação e à erradicação dos abusos.
urtigas. Em termos populares, “o importan- reza das opções políticas, mas a TAP con- numa empresa intervencionada com o Como noutras áreas há quem não tenha
te era o guito!”. Até, que a consciência dos sagra uma enorme sucessão situações levia- dinheiro de todos. Um modelo de confian- compreendido que o mundo mudou.

iNEVITÁVEL CONSELHEIRO EDITORIAL José António Saraiva FISCAL ÚNICO Vítor Vale Detentor de 91% do capital: Sunny Meridian - Unipessoal, Lda,
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26 —14 março 2023


TÉCNICO

Inteligência Artificial e desafios


na formação avançada e na investigação
O aparecimento do ChatGPT em novembro passado expôs
mediaticamente que IA já saiu dos laboratórios e é acessível a muitos.

Laboratório de Física Fundamental samento? É uma velha questão, que opôs tranquiliza professores demasiado preo-
(CERN) para os negócios e o quotidiano. Alan Turing, matemático e cientista de cupados com a avaliação dos estudan-
Hoje há maior vulgarização das tecno- computação do século XX, a Ada Love- tes. Mas como o aumento do tamanho
logias, mas principalmente devido à natu- lace, pioneira no século XIX de uma área dos modelos de IA vai aumentar a cor-
ralidade, antropomorfismo, fluidez impres- dominada hoje pelo género masculino. reção das respostas, é a altura de refle-
sionantes do diálogo que permite, o Para Lovelace, as máquinas são limita- tirem sobre como ensinam e avaliam.
ChatGPT veio para ficar e vai evoluir. das pelas regras de programação. Para Cabe ao ensino complementar a IA com
No séc. XIX não se travou a revolução Turing, o critério de inteligência é ope- modelos causais para a verificação e a
Teresa Peña industrial. Hoje faz pouco sentido proi- racional e definido pela experiência. O decisão que se treinam com experiên-
bir a realidade da IA a uma geração de teste de Turing: se em mais de metade cia, abstração e desenvolvimento da ima-
estudantes profundamente embebida na de realizações da experiência de conver- ginação. O ChatGPT pode ser um teaser
A automação iniciada no fim do século cultura digital. Uma alternativa a proi- sação com uma máquina, o participan- para desenvolver esse sentido crítico.
XIX alterou profundamente o valor e a bir é avaliar as implicações da IA, abra- te humano não reconhece a natureza do Os sistemas de diálogo da IA podem
organização do trabalho. Valorizou capa- çar os seus benefícios, influenciar a sua interlocutor, considera-se que a máqui- usar-se para feedback aos estudantes, expe-
cidades de operar máquinas, fazer a sua evolução. Que competências devem as na possui inteligência artificial. riência da aprendizagem personalizada,
manutenção e adaptação a tarefas. Ago- Universidades dar na era da IA? Pode- Hoje a IA realiza tarefas complexas: melhor gestão de tempo, monitorizar a
ra, com a nova automação da Inteligên- rão cientistas usar a IA como ghost wri- reconhecimento da fala e imagem, escri- satisfação académica com intervenção
cia Artificial (IA) é diferente? Como na ter? Que tarefas de investigação e ensi- ta de textos, tradução entre centenas de rápida. Na investigação, a IA pode esti-
automação anterior, a IA pode libertar no se podem apoiar em sistemas da IA? idiomas, condução de veículos, resolu- mular a imaginação (brainstorming), criar
mais tempo para ações transformado- Que verificação humana cabe na inves- ção de alguns problemas lógicos. Para e editar textos sobre resultados, gerar
ras, levar a maior produtividade, mais tigação e ensino assistidos por IA? Que gerar respostas, o ChatGPT usa um mode- questões, análise de dados e reconheci-
bem-estar, melhores padrões de vida. implicações legais (direitos de autor, pro- lo de amostras estatísticas, sendo treina- mento de padrões – aceleradores do conhe-
Tudo depende de medidas para equilí- priedade intelectual, responsabilidade do num conjunto vastíssimo de textos cimento em qualquer área. Nas ciências
brio de benefícios e ameaças. Desta vez, pelos resultados) e éticas advêm da IA? para determinar a probabilidade de uma físicas já acontece, nas ciências sociais e
porém, são visadas as competências tra- O termo chatbot, introduzido em 1994 sequência de palavras. As respostas são humanas são passos transformadores.
dicionais de um graduado universitário, por M. L. Mauldin, designa um progra- geradas palavra a palavra. O sucesso de “Como um modelo de linguagem trei-
potencialmente em muitos setores: saú- ma baseado em modelos matemáticos sistemas como o ChatGPT vem do aumen- nado em dados, não sou capaz de ter opi-
de, transportes, construção, ensino, direi- que imita a conversa humana. Pensa- to do tamanho dos modelos da IA, em niões”, respondeu o ChatGPT à minha
to, finanças etc. As Universidades, fábri- mento e linguagem poderão deixar de número de parâmetros, aproximando-se pergunta se os computadores podem pen-
cas de investigação e ensino, vão sentir ser próprios só do ser humano. Mode- do milhão de milhões, em número de sar. Como nós temos opiniões, somos
os efeitos desta nova realidade de traba- los matemáticos conseguem imitá-los e palavras ou unidades de informação para humanos. Ainda bem! As opiniões ala-
lho. A melhor resposta é melhorar a qua- criar a ilusão dessas capacidades. Os sis- treinar esses modelos, e da capacidade vancam e transformam. Vejam-se os exem-
lidade e versatilidade da formação, usar temas IA de diálogo são como conver- de muitas operações nesse treino. plos de Alan Turing e Ada Lovelace.
a IA para a complementar, treinar mais sas com bons atores. Um ator pode impro- O ChatGPT gera textos verosímeis, mas
a imaginação, a tomada de decisão e o visar. Pode um computador também fazê- há estudos que concluem ser geradas Professora Catedrática e Presidente
espírito crítico. lo, e surpreender-nos? Os computadores cerca de 74% respostas erradas a certas do Conselho Pedagógico
O aparecimento do ChatGPT em novem- pensam, ou antes geram a ilusão de pen- questões de raciocínio e cálculo. Isto do Instituto Superior Técnico
bro passado expôs mediaticamente que
IA já saiu dos laboratórios e é acessível
a muitos. O ChatGPT espalhou-se glo-
balmente em apenas poucos meses. Em
1989 foi muito mais lenta a transposição
da World Wide Web (WWW) que mudou
a forma como trocamos informação, do

O ChatGPT gera
textos verosímeis,
mas há estudos que
Fabrice Coffrini/AFP

concluem ser geradas


cerca de 74% respostas
erradas a certas questões
de raciocínio e cálculo O ChatGPT espalhou-se globalmente em apenas poucos meses

—14 março 2023 27


C Opiniões

RÉDEA SOLTA

Insegurança Social

A ministra Ana Mendes Godinho é um desastre com sorriso cândido.

que nomear uma “task force” que, no ter- siasmem com propostas de aplicação em 4. Parece que Marta Temido admite ser
reno, faça uma fiscalização a todas as ins- fundos. Ainda agora nos Estados Unidos candidata à presidência da Câmara de
tituições legais e ilegais. Simultaneamen- houve um banco enorme que foi abaixo. Lisboa. Saiu, portanto, a taluda a Car-
te, deveria indicar funcionários da Segu- E entre nós há um que anunciou lucros los Moedas que, entretanto, já atinou
rança Social que superintendam “per simpáticos cá e um prejuízo desgraçado e está finalmente a produzir resulta-
capita” um certo número de unidades, na Polónia. Cuidado. Investir em pedra e dos positivos para a capital. O desastre
onde possam entrar a qualquer hora do terra não é o mesmo que investir em papel! que Marta Temido trouxe para o SNS
dia ou da noite com uma pequena equi- está tão patente na vida dos portugue-
Eduardo Oliveira e Silva pa. Claro que vão dizer que não há gente 3. A entrevista que o Presidente-analis- ses que só por fanatismo partidário ou
nem dinheiro. Mas podem resolver isso ta-comentador Marcelo deu à RTP mere- político alguém de bom senso irá votar
nem que seja com mais uma raspadinha ce ainda alguma reflexão, mesmo que nela. Marta Temido foi o terramoto na
Nota prévia: No meio da confusão que ou aplicando uma taxa aos lares. Esses curta. Desde logo porque teve um fra- saúde e de terramotos os lisboetas já
gerou o caso Alexandra Reis há uma peque- funcionários teriam de dispor de meios quíssimo nível de audiências (menos de tiveram a sua conta. Ainda por cima
na e singela constatação a fazer. Afinal o móveis e sobretudo terem salários dignos metade de um dia normal da novela Fes- não é de Lisboa e é deputada por Coim-
lugar de presidente da NAV está vago. Será para evitar tentativas de corrupção. Como ta é Festa). Há provavelmente duas cau- bra. Pois que se candidate lá na terra.
que está reservado para ela? Só nos faltava é óbvio que não há sítios para onde trans- sas: a banalização da palavra presiden-
mais essa. ferir os utentes, há que criar legislação cial e a irrelevância em que a RTP vem 5. Fez ontem dez anos que o Papa Fran-
que permita à Segurança Social tomar caindo. O Presidente da República optou cisco foi anunciado ao mundo. Junta-
1. A situação de degradação e de maus tra- posse administrativa da unidade imedia- por um misto em que bateu em toda a mente com João XXIII será certamen-
tos em lares de idosos não é nova. Hoje, ta, assegurando a gestão até à expropria- gente do Governo à oposição, que ainda te um dos Pontífices de Roma que mais
por via das redes sociais, apenas se conhe- ção e condenação dos responsáveis a penas não vê como alternativa. Mas, sobretu- tocaram a humanidade, pela sua bon-
cem mais casos chocantes, com imagens pesadas por maus tratos a pessoa indefe- do bateu na Igreja pela sua lamentável dade, pela sua coragem, pela abertura
que remetem para as dos campos de con- sa. Se nada deste género for feito, é certo atitude face aos casos de pedofilia ago- às reformas e pelo apoio que deu às
centração nazis. Logo que há uma denún- e sabido que vamos continuar a desco- ra confirmados por uma comissão inde- denúncias de crimes de abuso de crian-
cia a saltar para as manchetes é ver os brir novas casas dos horrores. Desde logo pendente. Nesse aspeto Marcelo até se ças na Igreja. Ao contrário do seu ante-
inspetores da Segurança Social aparece- porque há cada vez mais idosos e que nos controlou ao dizer que falava como PR, cessor imediato, Bento XVI, Francisco
rem onde raramente iam. Os nossos lares últimos sete anos tudo se agravou. Para omitindo o seu ponto de vista como cató- é um Papa mais virado para os proble-
são em muitos casos armazéns de velhos. grandes males grandes remédios. lico que seria certamente muito mais mas reais da humanidade, especial-
A pinta dos responsáveis e os nomes dos violento. Quanto ao executivo, o discur- mente os mais pobres e marginaliza-
donos finais de certos estabelecimentos 2. Uma mão cheia de nada. É este o termo so foi absolutamente arrasador, mas sem- dos de países que não são nucleares no
não enganam ninguém. Sempre que há concreto para o pacote da habitação. Impra- pre compensado judiciosamente por uma planeta. As suas palavras sábias e sim-
um caso mais grave, aparece o ministro ticável, irracional, absurdo economica- palavra justificativa. Uma coisa parece ples marcam mais do que os discursos
de turno (seja qual for o partido) que pro- mente e, como se não bastasse, cheio de certa: as mesmas palavras na boca de teocráticos de muitos bispos, cardeais
mete atuar, investigar e solucionar. Ana inconstitucionalidades. É, portanto, um Cavaco ou de Sampaio causavam um ter- ou padres. É um homem da tolerância,
Mendes Godinho, atual ministra, junta a nado morto que, no entanto, vai certamen- ramoto político. Basicamente, a entre- do respeito pelos direitos individuais,
isso um ar cândido e sorriso na cara onde te levar muita gente a rever a ideia de vista deu pretexto aos comentadores acima de dogmas sem fundamento. É
deveriam correr lágrimas. Tal como o seu investir na construção civil, que é um dos para mais umas largas horas de televi- bom tê-lo!
antecessor, Vieira da Silva, Godinho é um motores da economia. Será bom para a são e rádio. Nem sequer se abordaram
desastre. Tanto na questão dos lares de banca que vai manter depósitos com zero os momentos mais difíceis dos sete anos 6. Quem também faz dez anos é a CMTV.
idosos, como na sinalização de crianças de juros. Oxalá os investidores não se entu- de mandato. Foi pena. Trouxe uma mudança na comunica-
(ainda há pouco ocorreu o caso horrível ção que poucos referem e reconhe-
de uma criança assassinada em Setúbal), cem. Fala do povo, para o povo e à
no pagamento de pensões e no apoio aos moda do povo. Ali, não há preocupa-
desvalidos. A Segurança Social entre nós ções estilísticas. Há eficácia e às vezes
é o oposto das Finanças. Como tem de excessos. Mas não se lhe pode tirar
pagar, faz tudo arrastando os pés dos seus mérito. O mesmo acontece ao jornal
milhares de funcionários que amam o que é o porta-aviões do grupo Cofina.
teletrabalho e as marcações prévias. Nas As outras televisões e jornais tiveram
finanças é exatamente o contrário. A ins- de se adaptar e passar a abordar casos
tituição não para quieta, salvo quando em que não tocavam. E o grupo CM
estão em causa estornos ou milhares de até já trata de política. E quando o faz
milhões como o IMI e o Imposto de Selo é arrasador. Sócrates, Pinho e Alexan-
de barragens. É reinar com o pagode e dra Reis que o digam. Se é assim ape-
governar cativando. Nos lares apenas os nas no cabo, o que será no dia em que
parentes chegados acabam por poder esteja em canal aberto? Vítor Direito,
fazer denúncias. Muitos empregados têm o mestre do jornalismo que fundou o
limitações por serem imigrantes indocu- CM com Carlos Barbosa, talvez nun-
mentados, sem preparação e sem sensi- ca imaginasse tamanho impacto e tan-
bilidade. Esses são factos. A senhora minis- to poder do jornal que nasceu ali para
tra, em vez de aparecer com ar sonso, os lados da Praça das Flores, ao lado
deveria pegar o problema de frente. Há Tal como o seu antecessor, Ana Mendes Godinho é um desastre MIGUEL SILVA de O Tempo.

28 —14 março 2023


POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE

Leis à patada
A análise desta proposta – tão má que até custa a ler e pior, a acreditar – é um catálogo de violações
de direitos constitucionalmente garantidos, de atropelamentos de princípios fundamentais, de entre
os quais o da proporcionalidade, de desprezo arrogante pelos direitos dos cidadãos.

Ora, é disso que a proposta de lei “+Habi- investiram no nosso país e se veriam ati- de qualquer crédito internacional como
tação” do Governo trata. Do confisco de rados para situações impensáveis num país de investimento, a fuga de quem já
direitos. À patada. país da União Europeia. Nem me venham para cá veio, a acrescer à fuga de quem cá
A análise desta proposta – tão má que até com a conversa – mentirosa – de que outros nasceu, daqui para fora…
custa a ler e pior, a acreditar – é um catá- países da União têm leis similares, porque Porquê tudo isto? Porque o primeiro-
logo de violações de direitos constitucio- pura e simplesmente, não é verdade. ministro é estúpido, excessivamente incom-
nalmente garantidos, de atropelamentos Acresce, cereja em cima do bolo, o con- petente ou totalmente ignorante das rea-
de princípios fundamentais, de entre os gelamento das rendas mesmo para novos lidades da vida? Não, não é por isso.
João Luís Mota quais o da proporcionalidade, de despre- contratos de arrendamento, ou seja, enten- A causa primeira é simplesmente que o
de Campos zo arrogante pelos direitos dos cidadãos. damo-nos, o Estado fixa de uma vez por poder em Portugal foi sequestrado por
Custa-me dizer isto, mas não há subs- todas e para a eternidade, as rendas que um bando de gente pouco honesta, como
Penso não ser exagero dizer que a comu- tantivos e adjectivos suficientes para qua- podem ser cobradas pelos proprietários! “aquele” que contratou com um adianta-
nidade jurídica está em estado de choque lificar o tão excruciantemente má que esta Falta ainda acrescentar a criação de um mento de 300.000 euros um centro trans-
com a proposta de lei apresentada à dis- proposta consegue ser. Estado pidesco (é o verdadeiro regresso fronteiriço em Caminha, uma noção total-
cussão pública pelo Governo em matéria Já muita gente se pronunciou sobre a aos tempos do Dr. Salazar: rendas conge- mente ridícula, que desqualificaria qual-
de habitação. questão do arrendamento coercivo e o ladas, preços administrativos, escritos nas quer um para o que fosse, mas que António
Tudo nessa proposta é tragicamente absurdo que consistiria em impor a alguém janelas e agora, a PIDE) em que as empre- Costa entendeu por bem fazer seu secre-
mau, violador dos direitos dos cidadãos, que não o queira fazer, o arrendamento sas de serviços de água, electricidade e tário de Estado adjunto.
ignorante em relação a princípios básicos de uma casa sua. A reforçar o absurdo fica gás teriam de informar a Gestapo (per- Este bando é capaz de tudo para se man-
do direito e dos direitos fundamentais pre- o facto de que o Estado poderia apossar- dão, as finanças) dos consumos de cada ter no poder. Tudo é tudo, sem limites nem
vistos, entre outros textos, na Carta dos se de um prédio, fazer-lhe nos seus ter- casa, para efeitos de avaliação sobre se restrições. Para abafar os múltiplos casos
Direitos Fundamentais da União Euro- mos e condições (caras e corruptas como estão devolutas. Pena têm os comunistas de corrupção que se abateram sobre o
peia, cujo artigo 17º, aliás concordante sabemos) “obras” de requalificação e subar- que em 1975 não houvesse meios de con- governo, vale tudo, incluindo destruir a
com a Constituição portuguesa, dispõe rendá-lo cobrando-se das rendas para paga- trolo destes. economia, arruinar o crédito externo de
que “todas as pessoas têm o direito de fruir mento dos custos das obras feitas contra O resultado deste desastre, se porventu- Portugal, pôr em causa todos os nossos
da propriedade dos seus bens legalmen- a vontade do dono, que assim ficaria pro- ra pudesse entrar em vigor alguma vez, direitos, inventar um “1º direito à habita-
te adquiridos, de os utilizar, de dispor deles vado do que tivesse sido seu, por décadas seria o maior colapso do parque imobiliá- ção” que justificaria medidas excepcionais
e de os transmitir em vida ou por morte”. e décadas… ou seja, para sempre. rio português a que teríamos assistido na de espezinhamento dos direitos de toda a
Já todos sabemos que o direito de pro- Isto é apenas um exemplo. Ponto por nossa geração, o fim do mercado do arren- gente, em prol sabe-se lá bem de quem,
priedade – pilar fundamental da liberda- ponto, medida por medida é, como já dis- damento, a paragem da construção de pré- mas estou disposto a apostar simples con-
de individual e colectiva – não é absoluto. se, um catálogo de brutalidades burocrá- dios novos salvo de habitação social ou de tra dobrado, que há-de haver muitos meni-
Como se diz também nessa Carta, “A uti- ticas, posses abusivas, corrupção previs- luxo, o ainda maior empobrecimento da nos, meninas e menines do PS a precisar
lização dos bens pode ser regulamentada ta e arbítrio desmedido, o que esta pro- classe média, centenas de milhares de des- de casinha e logo por acaso, da sua, caro
por lei na medida do necessário ao inte- posta de lei prevê. empregados, milhares de empresas fali- leitor. Azar o seu.
resse geral”. Não respeita nem os direitos dos nacio- das, a renovada degenerescência dos par- Como é evidente, isto não pode ser, isto
O ponto é que a “medida do necessário nais – o que é costumeiro em Portugal – ques urbanos de Lisboa e do Porto, o enclau- não é tudo deles, há direitos e tribunais, a
ao interesse geral” não pode nem deve ter nem os dos estrangeiros que de boa fé suramento do país sobre si próprio, a perda justiça demora mas lá chegará, há a car-
como substância o confisco (apropriação ta europeia dos direitos fundamentais, e
sem contrapartida) da propriedade dos há “nós”.
cidadãos, em função apenas de opções Também nos cabe a nós opor a isto, como
ideológicas dos governos em funções, ain- dizia a música, “uma muralha de aço”,
da que os nossos governantes estejam con- uma resistência cidadã ao espezinhamen-
vencidos, na esteira de um qualquer to dos nossos direitos e, pelo menos, pelo
Proudhon de pacotilha, que “a proprieda- menos, uma decisão inabalável que as
de é um roubo”… acrobacias retóricas e as promessas rotas
do Dr. Costa não podem alterar: não vol-
tar a votar neste bando.
Valha-nos que nas últimas eleições autár-
quicas votamos para Lisboa e para o Por-
Estou disposto to e tantas e tantas outras cidades princi-
pais, no PSD e no CDS, e que os presiden-
a apostar simples tes dessas Câmaras já declararam que nos
contra dobrado, que seus municípios não vai haver estes des-
há-de haver muitos varios. A menos que o bando de desvaira-
dos que nos desgoverna decida retirar aos
meninos, meninas municípios as suas legítimas competên-
e menines do PS cias. Já nada me surpreenderia…
a precisar de casinha
Dreamstime

Advogado, ex-secretário de estado


e logo por acaso, da sua, da Justiça, subscritor do Manifesto
caro leitor. Azar o seu A proposta de lei “+Habitação” do Governo trata-se de um confisco de direitos Por uma Democracia de Qualidade

—14 março 2023 29


D Mais // Pessoas

NA LINHA DA FRENTE
POR JOSÉ PAULO
DO CARMO

Realidade,
ficção e fake
Numa era dominada pelas “fake com uma miúda que foi ter com
news” e por querermos sucessi- ele a apresentar-se depois de
vamente mostrar em vez de viver, terem feito “match” (quando
é muitas vezes difícil de distin- duas pessoas gostam das foto-
guir a realidade da ficção ou da grafias uma da outra). Depois
mentira. Mas há outros que são de o ver com um ar atónito, mos-
caricatos e tristes, pela estupidez trou-me a referida aplicação e
que encerram. A atriz Sharon o Instagram da pessoa que ali
Stone veio revelar agora, numa se apresentava e de facto, à luz
recente entrevista, o sofrimento dos mil e um filtros e da magia Brincadeiras ambíguas
que lhe foi imputado pelo mais do photoshop, o que a persona-
famoso cruzar de pernas da his- gem mostrava nas suas redes e ■ A atriz Jane Fonda sugeriu, na passada sexta-feira, assassinar os políticos que são con-
tória do cinema, numa cena do depois a sua figura presencial tra o aborto. A ideia pode parecer demasiado “extrema” para ter sido mesmo dita em voz
filme Instinto Fatal. Parece que, não tinham absolutamente nada alta, mas a verdade é que aconteceu. Em declarações ao programa The View, a também
segundo ela, perdeu a custódia a ver. Se não me tivesse sido ativista disse: “Estamos no controlo dos nossos corpos há várias décadas e somos capazes
do filho porque o juiz disse ao garantido eu jurava que não está- de decidir quantos filhos queremos ter e quando. Agora que sabemos como é, não vamos
seu progenitor, na altura com 4 vamos a falar do mesmo. voltar atrás, não me importo com as leis. Não vamos voltar atrás”. Joy Behar, a apresen-
anos, em pleno tribunal, que a Isto é hoje em dia a prática habi- tadora daquele programa questionou a atriz sobe quais seriam as soluções para lidar
mãe pela referida cena, fazia fil- tual, defendemos o que é natu- com as decisões políticas que afetam a liberdade de escolha das mulheres. “Bem, tenho
mes pornográficos. É inusitado ral, a liberdade do corpo, até lhe pensado no assassinato”, respondeu. O comentário da atriz de 85 anos foi levado pelas
que pessoas minimamente infor- chamamos do novo normal, ten- outras participantes no debate como uma brincadeira, contudo, esta não fez questão de
madas, confundam o que é cine- ta-se de tudo para prestigiar as esclarecer se o era mesmo ou se as palavras eram para ser levadas à letra.
ma do que é o dia-a-dia de quem supostas imperfeições como bele-
escolhe determinada profissão. za própria mas depois tentamos
Mas não é o primeiro relato de por tudo uma forma do que aos Mais uma cartada
vários atores seja no grande ou olhos de alguns parece perfei- para os recém-papás
pequeno ecrã que geraram ódios ção só para agradar à vista e aos
ou paixões absolutamente faná- olhares. Faz lembrar aqueles ■ O cantor John Legend, de 44 anos, e a mulher,
ticos, induzidos por uma deter- rapazes que se mostram verda- Chrissy Teigen, de 37, estiveram, na noite de domin-
minada representação (por sinal deiros príncipes nos primeiros go, presentes na cerimónia dos Óscares, que decor-
de excelência) que devia ficar por meses de namoro fazendo e reu em Beverly Hills, na Califórnia. Já é comum o
ali. Faz-me lembrar a minha infân- cedendo a tudo e depois, quan- casal presentear os fãs com momentos ternurentos e
cia quando achava que partir um do passa a paixão fogosa e arden- únicos, mas desta ninguém estava à espera. Enquan-
braço era o braço sair literalmen- te, e vem ao de cima quem são to decorria o jantar anual dos Óscares organizado
te do corpo. na realidade o choque frontal pela Vanity Fair, John e Chrissy foram vistos a jogar
Diferente, mas noutro campo, é acontece. Separações bruscas e com um baralho de cartas do UNO. E para os mais
aquilo que nos vão apresentan- intensas ou casamentos quebra- céticos, há imagens que o mostram. Recorde-se que
do todos os dias as redes sociais. dos. É o tempo da imagem e do o casal compareceu na cerimónia depois de, a 13 de
As vidas idílicas e perfeitas, de vídeo, depois queremos retirar janeiro, terem sido novamente pais. O novo filho
pessoas que muitas vezes não o lado sexual dos instintos, onde família junta-se a Luna Simone, de seis anos, e a
têm onde cair mortas ou de casais não se pode dar um piropo ou Miles Theodore, de quatro.
super apaixonados que vamos fazer um elogio que é logo cen-
a ver e nem se falam em casa. surado mas em que as meninas
É a vida do faz de conta, o novo de 18 anos (ou menos), passeiam Paul Auster
vício dos novos tempos, a caça os seus corpos semi despidos e em “Cancerland”
ao like de forma desenfreada. os rabos em grande destaque no
Dizia-me há uns dias um ami- Instagram, para ganhar visibili- ■ O escritor norte-america-
go que costuma passear regu- dade e com isso jantares ofere- no Paul Auster foi diagnosti-
larmente pela aplicação de encon- cidos nos restaurantes da moda cado com cancro, em dezem-
tros Tinder, que “aquilo está-se e noites em hotéis de luxo e os bro do ano passado. A infor-
a tornar muito perigoso”, usou pais nada fazem. Há por aí mui- mação foi agora divulgada
até um termo que me ficou na to boa gente que sofre imenso pela esposa, a também escri-
memória, “ um Kinder surpre- por não lhes darem valor inte- tora, Siri Hustvedt. “Tenho
sa”, por nunca se saber o que lectual e ninguém querer saber vivido num lugar ao qual pas-
aparece por trás de uma foto- o que pensam disto ou daquilo, sei a chamar ‘Cancerland’
grafia. Veio a conversa ao caso mas a única frase que lhes é conhe- [terra do cancro]”, escreveu
por estarmos a dançar num dos cida é um hashtag dos sítios que nas redes sociais. O roman-
restaurantes dançantes de Lis- frequentam. Comprem pipocas cista de 76 anos encontra-se a
boa e ele ter ficado estupefacto que isto ainda agora começou. fazer tratamentos de quimio-
terapia e imunoterapia em
Nova Iorque.

30 —14 março 2023


Passatempos

PALAVRAS CRUZADAS

HORIZONTAIS: 1 – Tirar o pêlo, a pele ou a casca de. Sinal que, no princípio de HORIZONTAIS: 1 – Vara flexível de vimeiro. O que professa a arte dramática. 2 –
uma pauta de música, indica a posição das notas e o grau da sua elevação. 2 – Elas. Los Angeles (abrev.). Enganar-se. 3 – Embarcação comprida e estreita feita
Expõe. Capital de Marrocos. 3 – Contracção de ‘em’ com ‘a’. Poder estar dentro. de um tronco escavado, usada na África e na América. Mulo. 4 – Pequeno cabo
Segundo. 4 – Aia. Recitar. Um certo. 5 – Regras. Grupo de pessoas que cantam náutico para alar ou puxar. Enfeitar com objectos de oiro. 5 – Impregnar de uma
juntamente. 6 – Penitente. 7 – Sólio. Armadilha (prov.). 8 – A minha pessoa. Bom substância oleosa. Ave parecida com a pomba. 6 – Unidade monetária da Romé-
nome. Avenida (abrev.). 9 – Impertinência. Brinquedo de criança. 10 – Prefixo (três). nia. 7 – Aprovação (fig.). Cheio de ira. 8 – Curar. Frio (gír.). 9 – Outra coisa (ant.).
Mamífero herbívoro do Sudoeste africano que se desloca geralmente em grandes Conjunto dos cónegos de uma catedral. 10 – Versejar. Prefixo (repetição). Senhor
manadas, também conhecido por boi-cavalo. Casal. 11 – Abre à força. (abrev.). 11 – Encolerizar. Tecido de malha para cobrir o pé e parte da perna.

VERTICAIS: 1 – Que diz respeito ao direito de punir. Cuidado. 2 – Prova. Desmo- VERTICAIS: 1 – Grande onda. Associar. 2 – Vogal (pl.). Variante do pronome ‘o’.
ronar-se. 3 – Medida itinerária chinesa. Planta herbácea da família das umbelíferas. Valor intrínseco ou estimativo. 3 – Dançar a polca. Terceira nota musical. 4 – O que
Serviços Secretos dos Estados Unidos da América. 4 – Abecedário. Gesto combi- há de melhor numa sociedade ou num grupo. Revestir de laca. 5 – Lugar de muita
nado entre duas ou mais pessoas. 5 – Verdadeiro. Faço passar por um filtro. Grosa areia. Escassa. 6 – Pessoa que exerce o poder absoluto (fig.). 7 – Que não vê.
(abrev.). 6 – Segunda letra do alfabeto grego. Último numa série de nove. 7 – Acre- Requerer pressa. 8 – Ser infiel a. Disposição regular e metódica. 9 – Sufixo (agen-
ditar. Prestar para. A unidade. 8 – Face inferior do pão. Enrubescer. 9 – Prefixo te). Praça larga. 10 – Ramificação de uma estrada ou de um caminho-de-ferro.
(oposição). Segmento de tronco de árvore. Oferta Pública de Aquisição (sigla). 10 Eles. Sétima nota da escala musical. 11 – Relativo ao campo ou à vida campestre.
– Apupar. Charão. 11 – Radical do álcool etílico. Somítico. Tontura.

SUDOKU
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SOLUÇÕES
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—14 março 2023 31


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2023/03/14 3ªFeira
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SUL 11º 12º

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MADEIRA 17º 14º

SEMÁFORO

Papa Francisco
Silicon Valley Bank anunciou falência na sexta-feira NOAH BERGER/AFP Nos seus dez anos de
pontificado, o Pontífice
voltou a condenar a guerra

Silicon Valley Bank. Medina e a lamentar as mortes e a


dor que tem provocado –
sem fazer distinção dos

afasta risco e fala em robustez lados. Faça o que fizer


daqui em diante, Francisco
já revolucionou a Igreja,
com a sua coragem, a sua
humildade e a sua menta-
lidade arejada.

Ministro das Finanças lembra que se trata de “um caso de um banco


regional, muito especializado”. Analista fala em “erro de gestão”.
SÓNIA PERES PINTO que o sistema bancário do país está segu- O QUE FALHOU Para Mário Martins, ana-
sonia.pinto@ionline.pt ro e que “todos os americanos devem lista da ActivTrades, o colapso deve-se
estar confiantes de que os seus depósi- “fundamentalmente a erro de gestão, Manuel Pizarro
O sistema bancário europeu está “sóli- tos estarão lá”. Joe Biden disse ainda que tal como costuma ocorrer com todas as
do”. A garantia é dada por Fernando os contribuintes não serão responsáveis quedas de instituições bancárias”. E diz As opiniões são quase unâ-
Medina depois da queda do Silicon Valley pelas perdas de uma falência bancária, que, neste caso específico, também como nimes: embora gaste mais,
Bank (SVB). O ministro das Finanças con- apelando ao Congresso para “reforçar” habitualmente, “deriva da exposição o SNS está num estado
sidera que se trata de “um caso de um a regulação do setor. excessiva a um determinado ativo, que lastimável e a prestar um
banco regional, muito especializado”, Recorde-se que o SVB, com sede na Cali- por um evento inesperado perde valor, mau serviço aos utentes.
adiantando que as autoridades dos EUA fórnia, anunciou na quarta-feira que esta- sendo que de novo por incompetência Ontem, mais uma demis-
“lidaram rapidamente com a situação e va a tentar realizar um aumento de capi- da gestão, o reajustamento do risco para são: neste caso dos direto-
em força”. Também o presidente do Euro- tal para ultrapassar as dificuldades finan- acautelar um desenvolvimento inespe- res de urgência do S. Fran-
grupo, Paschal Donohoe, lembrou que ceiras. No entanto, este anúncio levou rado deixou muito a desejar, isto por- cisco Xavier. Não é por
“não há exposição direta” do sistema ban- muitos clientes a retirar os fundos e os que com a subida dos juros por parte acaso. PP. 2-23
cário europeu a esta falência, mas acres- reguladores encerraram o banco na sex- da Fed, que não obstante ter sido mui-
centou que o colapso do banco califor- ta-feira por falta de liquidez. O preço das to célere, mas ainda assim agora com
niano é “um lembrete” para a necessi- ações da empresa acabou por entrar em cerca de um ano de duração, os clien-
dade de garantir a resiliência dos bancos. colapso, o que, por sua vez, afetou o setor tes do banco começaram a necessitar
Essa garantia já tinha sido dada pelo bancário em geral, tanto nos Estados de maior liquidez, o que os levou a reti-
Presidente norte-americano ao revelar Unidos como em outros países. rar capital do banco”.

Greg Becker
Habitação. Proprietários Resolução do BES foi legal, Bispo de Lamego pede
prometem ir para tribunal diz Supremo Tribunal que CI corrija informação O CEO do Silicon Valley
Bank (SVB) é o protagonis-
PORTUGAL A Associação Lisbonense de PORTUGAL O Supremo Tribunal Admi- PORTUGAL D. António Couto, bispo de ta da mais recente crise
Proprietários (ALP) submeteu o seu con- nistrativo considerou que não foi ilegal Lamego, confirmou que recebeu uma lis- financeira, que está a ter
tributo às consultas públicas do progra- a resolução do BES, decidida pelo Ban- ta com dois nomes de sacerdotes da dio- ecos a nível mundial. Dizem
ma Mais Habitação e defendeu que o co de Portugal em 2014, não tendo vio- cese alegadamente suspeitos de abuso e as notícias que dias antes
mesmo contém medidas “inaceitáveis”. lado a constituição. Esta é a conclusão diz não ter mais informação. O bispo ficou do colapso vendeu milhões
Por isso, deixou o aviso que vai bater-se que consta no acórdão a que a Lusa teve indignado com as afirmações de elemen- em ações. Claramente, as
pela fiscalização da constitucionalidade acesso. Em causa estão os recursos de tos da comissão que fez o estudo dos abu- suas manobras de última
caso sejam aprovadas. A associação lamen- várias empresas que considerarem ile- sos na Igreja, afirmando que todos rece- hora para evitar a falência
tou também que o programa ponha fim gais várias decisões do Banco de Portu- beram informação e já solicitou à comis- não resultaram. P. 32
ao Balcão Nacional do Arrendamento. gal, que diziam violar a Constituição. são que corrija o que disse. José Cabrita Saraiva

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