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INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

CAMPUS VENDA NOVA DO IMIGRANTE


CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS COM HABILITAÇÃO EM LÍNGUA
PORTUGUESA

DIANA CAROLINA MAGESKI GARCIA

O NOIVO E A NARRATIVA HUMORÍSTICA EM LYGIA FAGUNDES


TELLES

VENDA NOVA DO IMIGRANTE - ES


2022
INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CAMPUS VENDA NOVA DO IMIGRANTE
CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS COM HABILITAÇÃO LÍNGUA
PORTUGUESA

DIANA CAROLINA MAGESKI GARCIA

O NOIVO E A NARRATIVA HUMORÍSTICA EM LYGIA FAGUNDES


TELLES

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à


Coordenadoria do Curso de Licenciatura em
Letras com Habilitação em Língua Portuguesa do
Instituto Federal do Espírito Santo, Campus Venda
Nova do Imigrante, como requisito para obtenção
do título de Licenciada em Letras.

Orientadora: Profª. Dra. Karine Silveira

VENDA NOVA DO IMIGRANTE - ES


2022
(Biblioteca do Campus Venda Nova do Imigrante)

G215n Garcia, Diana Carolina Mageski.

O noivo e a narrativa humorística em Lygia Fagundes Telles / Diana


Carolina Mageski Garcia. - 2022.
38 f. : il ; 30.

Orientador: Karine Silveira

TCC (Graduação) Instituto Federal do Espírito Santo, Campus Venda


Nova do Imigrante, Licenciatura em Letras Português, 2022.

1. Literatura brasileira e portuguesa - Estudo e ensino . 2. Lygia Fagundes


Telles - Análise literária. 3. Humor. 4. Conto. I. Silveira, Karine . II.Título III.
Instituto Federal do Espírito Santo.

CDD: 869.07
Bibliotecário/a: Adriana Souza Machado CRB6-ES nº 572
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CAMPUS VENDA NOVA DO IMIGRANTE

FORMULÁRIO DE PARECER DA APRESENTAÇÃO FINAL DO TCC II

O(A) discente Diana Carolina Mageski Garcia


Apresentou a versão final do TCC com o título O noivo e a narrativa humorística em Lygia
Fagundes Telles ao Curso de Licenciatura em Letras-Português do Instituto Federal de
Educação do Espírito Santo – Campus Venda Nova do Imigrante, como requisito para
aprovação no componente curricular Trabalho de Conclusão de Curso.

O trabalho obteve nota 100 com o seguinte parecer:


( x ) Aprovação, sem reservas, do Trabalho de Conclusão de Curso.
( ) Aprovação somente após satisfazer as exigências pré-determinadas, no prazo fixado
pelo Regulamento (não superior ao término do período letivo).
( ) Reprovação o Trabalho de Conclusão de Curso.

Assinatura do(a) Orientador (a)

............................................................................................................
Assinatura do Avaliador (a) I*

............................................................................................................
Assinatura do Avaliador (a) II*

* Preencher somente se houver banca examinadora.

Venda Nova do Imigrante, 17 de março de 2022


AGRADECIMENTOS

Primeiramente, à Deus por não me desamparar nos momentos de dificuldade


e por me dar forças pra continuar quando me sentia desmotivada.
Aos meus pais, Sebastião e Idalina, por sempre me apoiarem e ter tido
paciência pelos momentos em família que não participei para que esse ciclo fosse
finalizado.
Aos meus irmãos, Dioni e Gabrieli, pela parceria e conselhos durante essa
caminhada.
A minha orientadora, Profª. Dra. Karine Silveira, por aceitar me acompanhar
nessa jornada, por me apresentar aos estudos de humor, por sua competência e por
me incentivar.
Aos professores do curso de Letras, por todo o conhecimento partilhado
durante os quatro anos de graduação.
Ao Instituto Federal do Espírito Santo - Campus Venda Nova do Imigrante,
por me receber para que um novo ciclo em minha vida fosse iniciado.
RESUMO

O presente trabalho busca a partir de textos teóricos relacionados ao humor e


levando em consideração as características do gênero textual conto, analisar a obra
“O Noivo” da escritora paulista Lygia Fagundes Telles. Primeiramente, busca-se
observar e analisar a obra ficcional no intuito de descrever quais são as
características que se fazem presente na narrativa, a fim de relacioná-las com os
aspectos que são atribuídos ao gênero, uma vez que para ser considerado conto o
texto deve apresentar em sua constituição determinadas particularidades. Em
seguida, o estudo consiste na investigação das passagens humorísticas que são
construídas na obra, com o intuito de compreender como Telles (2009) seleciona e
organiza o sentido humorístico em sua narrativa e com qual intuito são inseridos no
conto. Diante das análises realizadas, verificamos que a construção humorística
presente na narrativa de Telles (2009), constituída principalmente por um
rompimento humorístico, é utilizada no intuito de criticar e também de denunciar a
sociedade sem que haja a necessidade de utilizar o humor sujo para que sua
mensagem seja entendida. Por fim, entendemos que a narrativa humorística longa
pode ser utilizada em sala de aula para a formação de cidadãos críticos.

Palavras-chave: Humor, Conto, Lygia Fagundes Telles, sentido humorístico.


ABSTRACT

The present study, based on theoretical texts related to humor and considering the
characteristics of the short story textual genre, analyzes the tale "O Noivo" by Lygia
Fagundes Telles, a writer from São Paulo. Firstyl, we seek to observe and analyze
the fictional story with the intention of describing the characteristics that are present
in the narrative, in order to relate them to the aspects that are attributed to the genre,
since to be considered a short story the text must present in your constitution certain
particularities. Next, the study consists in the investigation of the humorous
passages that are built in the text, with the intention of understanding how Telles
(2009) selects and organizes the humorous sense in his narrative and with which
purpose they are inserted in the tale. In face of the analyses performed, we verified
that the humoristic construction present in Telles (2009) narrative, constituted mainly
by a humoristic break, is used in order to criticize and denounce society with no need
to use foul humor so that its message is understood. Finally, we understand that the
humorous long narrative can be used in the classroom for the formation of critical
citizens.

Keywords: Humor, Short Story, Lygia Fagundes Telles, Humorous sense.


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 6

2. ACERCA DO CONTO 8

2.1 O Conto: aspectos e constituição 8

2.2 Lygia Fagundes Telles. 11

2.3 As características do conto “O Noivo” de Lygia Fagundes Telles 13

3. O HUMOR E SUA CONSTRUÇÃO. 16

3.1 A constituição humorística e sua contribuição para o riso. 16

3.2 A construção do enredo humorístico 25

4. O CONTO DE LYGIA FAGUNDES TELLES E O ENSINO 29

4.1 O conto “O Noivo” em sala de aula 29

CONSIDERAÇÕES FINAIS 36
1. INTRODUÇÃO

O conto, segundo Moisés (2006), não apresenta sua origem de forma


precisa, existindo, assim, diferentes especulações para delimitar seu ponto de
partida. Sabe-se inicialmente que o gênero apresentava um caráter oral, visto que
suas histórias eram transmitidas verbalmente pelos povos antigos para que se
mantivesse vivo valores e tradições. Em meados do século XIX, os contos iniciam
um processo de modificação, perdem seu caráter essencialmente enunciativo e
começam a ser registrados na forma escrita. É também nesse período que passa a
ser amplamente cultivado em diferentes partes do mundo. Diante de sua evolução o
conto vai ganhando estrutura e suas próprias características, desse modo,
abandona seu posto de “forma simples” e passa a ser entendido como “forma
artística”, sendo considerado a partir desse momento como um produto literário. Em
sua nova formulação a narrativa começa a ser apresentada com um efeito único,
intenso e linear, sendo composto pela presença de um único conflito que será
delimitado pelo tempo e espaço, uma vez que o gênero possui como aspecto
principal a brevidade.
A leitura do conto – ou de outro gênero textual – é compreendida como um
momento de interação entre escritor e leitor. O contista constrói sua narrativa de
forma consciente buscando colocar em seu texto seus pensamentos e também sua
visão do que ocorre na sociedade, utilizando, assim, uma linguagem clara e
cautelosa para que o sentido do texto seja compreendido por seu leitor. Os contos
podem apresentar em sua constituição diferentes sentidos, cada autor seleciona o
sentido que melhor corresponde à intenção que busca passar para seu leitor, sendo
um deles o humorístico. O sentido humorístico é empregado nos textos por
diferentes motivos, alguns escritores o utilizam para provocar o riso em seus leitores
e também para realizar uma crítica relacionada à sociedade ou aos relacionamentos
humanos.
Diante desse cenário, o estudo apresenta o objetivo de analisar a ocorrência
do sentido humorístico na escrita da autora Lygia Fagundes Telles para que, dessa
maneira, possamos compreender como o humor é organizado no texto e com qual
finalidade as passagens humorísticas constituem a narrativa do conto “O Noivo”.

6
Além disso, também buscamos analisar e descrever as características do conto e de
observar como a obra de Telles (2009) pode ser utilizada em sala de aula com o
intuito de que os alunos desenvolvam a partir de sua leitura um olhar mais crítico em
relação à sociedade.
No primeiro capítulo, apresentamos os pressupostos teóricos a respeito do
gênero textual conto que são baseados nesta pesquisa nos estudos de Cortázar
(2006), Magalhães Júnior (1972) e Moisés (2006). Em seguida apresenta-se uma
breve revisão acerca da escritora Lygia Fagundes Telles e seu percurso literário,
bem como uma análise a respeito das características que se fazem presente no
conto “O Noivo”.
No segundo capítulo, dedicamo-nos ao estudo do humor, contendo subsídios
em relação às pesquisas que foram e estão sendo realizadas para uma melhor
compreensão de sua constituição e as três principais teorias que versam sobre o
humor. Após a explanação em relação ao quadro teórico, analisamos a construção
do enredo humorístico no conto a partir do embasamento teórico de Travaglia
(1992).
No terceiro e último capítulo, propomos uma sequência didática para as
turmas do 3º ano do Ensino Médio com o intuito de que os alunos desenvolvam, a
partir da leitura do conto, um olhar crítico perante a sociedade e que consigam
reconhecer a construção de passagens humorísticas em narrativas mais longas.

7
2. ACERCA DO CONTO

2.1 O Conto: aspectos e constituição

Segundo Magalhães Júnior (1972), o conto é a “[...]mais antiga expressão


literária de ficção[...]" (p. 9). Sua existência é datada desde os povos antigos que
ainda não possuíam uma linguagem escrita e, dessa forma, contavam suas histórias
por meio da oralidade. Com o passar dos anos as narrativas foram sendo
modificadas, abandonaram a simplicidade de suas histórias e adotaram uma
narrativa mais complexa e rebuscada (MAGALHÃES JÚNIOR, 1972). Segundo
Moisés (2006), alguns teóricos relatam que o conto teria surgido antes de Cristo,
sendo, a história de Caim e Abel1 a primeira narrativa do gênero. Durante a Idade
Média, com o surgimento de Boccaccio2, o conto conhece uma época de grande
desenvolvimento. No entanto, é apenas durante o século XIX que o conto vive sua
fase de ouro, visto que é amplamente cultivado, abandonando, assim, seu posto de
“forma simples” e passa a ser reconhecido como “forma artística” tornando-se um
produto literário.
O conto, como é conhecido atualmente, segundo Lamas (2002),
consolidou-se com o escritor americano Edgar Allan Poe. A autora retrata que para
Poe o conto deve apresentar em sua constituição um efeito único e intenso, sendo
que o conflito deve ser a parte principal que compõe o texto, dessa forma, a
narrativa presente no conto deve ser direcionada ao conflito que está ocorrendo.
Moisés (2006) em seus estudos também afirma que “o conto é, pois, uma narrativa
unívoca, univalente: constitui uma unidade dramática, uma célula dramática, visto
gravitar ao redor de um só conflito, um só drama, uma só ação” (p. 40). Na visão de
Magalhães Júnior (1972) para que uma obra seja denominada conto é necessário
que o texto apresente uma narrativa linear, ou seja, composta por começo, meio e
fim. Além disso, torna-se essencial um enredo horizontal, breve – se a narrativa se
prolongar por demais passa a ser caracterizada como um romance – e que
acontece no passado. Outro ponto que merece atenção refere-se aos personagens

1
Filhos de Adão e Eva.
2
Poeta e crítico italiano escritor da obra “Decameron”.
8
que constituem o conto, segundo Magalhães Júnior (1972) o contista ao escrever
não deve se aprofundar na psicologia dos personagens que fazem parte da
narrativa, uma vez que esse fator será explicado ao leitor durante suas ações e
condutas.
Para Cortázar (2006), estabelecer uma definição a respeito do conto é algo
bastante difícil, no entanto, relata que deve ser um texto conciso e breve e que se
constitui como uma batalha entre o escritor e sua própria história. Dessa forma,
Cortázar (2006) realiza uma interessante analogia em relação ao gênero em
questão, para o ficcionista o conto é como um boxeador, visto que apresenta seus
golpes iniciais sem nenhuma pretensão e, que podem parecer insignificantes,
entretanto, seu foco está em um local mais sólido de seu oponente – no caso do
conto, o leitor – na intenção de realizar um nocaute.
As definições encontradas a respeito do conto podem ser variadas, algumas
que conversam entre si e outras nem tanto. Diante disso, Magalhães Júnior (1972)
em seu livro "A história do conto” relembra a definição dada pelo escritor Mário de
Andrade, em que estabelece que uma narrativa é definida como conto pela simples
vontade do autor, ou seja, se um escritor determinar que sua obra é um conto ela
deve ser entendida e classificada dessa forma. Entretanto, segundo Lamas (2002),
para que um texto seja entendido como conto ele deve apresentar certas
particularidades: "[...] algumas fronteiras devem existir, como um núcleo dramático,
uma tensão, um efeito inesperado [...]” (p. 115). Moisés (2006) também afirma que é
necessário que o texto apresente em sua composição alguns aspectos importantes,
que o teórico chama de “unidades do conto”, segundo ele, as unidades são: unidade
de ação; unidade de espaço; unidade de tempo e unidade de tom.
A unidade de ação ou unidade dramática (como também é conhecida) é
estabelecida como as sequências dos atos que são praticados pelos personagens
que constituem o enredo. Deve-se levar em consideração que eles precisam estar
direcionados a um mesmo ponto. Tentando simplificar o entendimento desta
unidade, Moisés (2006) utiliza como exemplo o conto “Missa do Galo” do escritor
Machado de Assis. No conto machadiano, as ações de Nogueira e Conceição
(personagens principais do conto) nos levam a uma conversa na noite de Natal, no

9
conto a unidade dramática é justamente nesse ponto da narrativa, o mais importante
para o conto.
A unidade de espaço deve estar interligada com a unidade de ação, uma vez
que o conflito ocorre em um determinado espaço. Dessa forma, a unidade de
espaço pode ser entendida como o lugar em que os personagens circulam dentro
da narrativa. Moisés (2006) afirma que esse espaço sempre vai ser um local restrito,
ou seja, uma casa, uma rua. Entretanto, em alguns contos pode-se perceber que os
personagens se movimentam dentro da trama criada pelo contista, a mudança de
ambiente pode estar relacionada com o conflito que foi criado, sendo uma
consequência do que acontece com os personagens durante o conto.
Na unidade de tempo, os acontecimentos do conto não devem apresentar um
longo lapso de tempo, uma vez que essa característica é destinada ao gênero
textual romance, diante disso, o conflito deve acontecer em questões de horas ou
até mesmo dias, desde que não se prolongue muito, pois, o futuro do personagem
não apresenta nenhum tipo de interesse nesse gênero textual. Por fim, a unidade de
tom é a funcionalidade de cada palavra presente no conto (MOISÉS, 2006). Nesse
caso, cada palavra ou expressão utilizada para compor a história do conto
apresenta sua importância, uma vez que a retirada ou a mudança de uma
determinada palavra pode ocasionar na narrativa um desequilíbrio no entendimento
da obra e também em sua estrutura.
As unidades do conto estão intimamente relacionadas também a algumas
características importantes do gênero e que devem ser compreendidas. A primeira
delas diz respeito aos personagens que compõem a narrativa. Com a presença das
unidades de ação, espaço, tempo e tom a quantidade de personagens se torna
reduzida, sendo que o contista vai criar um personagem plano, pois, vai focar em
seu lado dramático e imobilizar, assim, sua personalidade. A estrutura do texto deve
ser paralela à quantidade de personagens e também com as unidades, diante disso,
deve ser objetivo, para Cortázar (2006) o contista “[...]não pode proceder
acomulativamente, que não tem o tempo por aliado; seu único recurso é trabalhar
em profundidade, verticalmente, seja para cima ou para baixo do espaço literário”
(p. 152). Assim como a estrutura, a linguagem presente no conto deve se

10
apresentar de forma objetiva para que durante a leitura o leitor tenha uma
compreensão imediata do sentido que o texto busca trazer.
Desde as suas primeiras manifestações o conto vem passando por grandes
mudanças, Lamas (2002) acredita que mesmo com as mais variadas modificações
que aconteceram em sua narrativa uma importante característica se mantém desde
seus primórdios, a revelação. Além disso, a autora destaca que nos contos
podemos encontrar uma maior flexibilização de sua narrativa, deixando de lado sua
forma rígida de contar histórias. Com isso, afirma que o gênero conto ainda é uma
questão em aberto no mundo literário, pois contar é algo natural do ser humano,
sendo insubstituível.

2.2 Lygia Fagundes Telles.

Nascida em São Paulo, Lygia Fagundes Telles, é filha de Durval Fagundes e


Maria do Rosário Silva Jardim de Moura. Seu pai era promotor público e delegado e
devido às funções que exercia sua família mudou-se bastante, diante disso, a
escritora morou em diversas cidades do interior de São Paulo. Formou-se em
Educação Física e Direito pela Universidade de São Paulo. Casou-se com
Godofredo da Silva Telles Júnior, pai de seu único filho Godofredo Neto, nascido em
1952 e falecido em 2006. Em 1960 seu casamento com Godofredo da Silva Telles
Júnior chega ao fim e em 1963 passa a viver com o ensaísta Paulo Emílio Salles.
No ano de 1982 é eleita para a Academia Paulista de Letras e em 1987 assume, na
Academia Brasileira de Letras, a cadeira nº 16 deixada por Pedro Calmon, cujo
patrono é Gregório de Matos.
O livro “Praia Viva”, lançado no ano de 1944, é considerado sua estreia no
mundo literário. A obra possui em sua composição dez contos que são dedicados
pela contista aos escritores Monteiro Lobato e Clarice Lispector. Segundo Lamas
(2002), é nos dez contos que constituem o livro que temáticas de cunho social e
psicológico – utilizadas pela escritora em suas obras – começam a aparecer.
A produção literária da escritora é bem vasta, sendo constituída pelas
seguintes obras: Contos: Praia Viva (1954); Cacto Vermelho (1949); Histórias de
Desencontro (1958); Histórias Escolhidas (1964); O Jardim Selvagem (1965); Antes

11
do Baile Verde (1970); Seminário dos Ratos (1977); Filhos Pródigos (1978),
republicado com o título A estrutura da Bolha de Sabão (1991), Mistérios (1981), A
Noite escura e mais Eu (1996), Invenção e Memória (2000). Romances: Ciranda de
Pedra (1954); Verão no Aquário (1963); As Meninas (1973); As Horas Nuas (1989).
Segundo Lucas (1990), a escrita de Lygia Fagundes Telles apresenta fortes
características da geração de 45. Essas características se relacionam intimamente
com o ambiente cultural que predominava nesse período, diante disso, as obras da
escritora são marcadas por temas de cunho existencialistas, entretanto, podemos
encontrar também traços que derivam do surrealismo e do expressionismo. Para
Lamas (2002), a escritora é a representante de uma vertente realista que é
denominada por ela como intimista-existencialista, uma vez que procura em seus
textos fragmentar a consciência humana e também por se aprofundar no
inconsciente dos personagens que compõem suas narrativas.
Os contos que são escritos por Telles possuem a característica de englobar
as mais diferentes temáticas, os temas escolhidos pela escritora sempre abarcam
situações que acontecem no dia a dia e é a partir desse momento que vai evoluindo
para situações fantásticas e sobrenaturais. Em relação a isso, Lamas (2002) afirma
que as narrativas de Telles

[...] percorre sendas várias, desde temas corriqueiros de histórias simples,


abarcando também situações complexas e estranhas, até desembocar no
sobrenatural e no fantástico, rompendo com limites racionais do humano.
Não importa o tema ou os meios: seu fulcro é o binômio
identidade/alteridade, ou seja, o encontro ou desencontro com o outro. A teia
dos relacionamentos interpessoais, o jogo entre o mundo interior e exterior e
as situações que a vida estabelece as personagens fazem do conto lygiano
peças raras de escritura de tom confessional. (LAMAS, p. 111, 2002)

Para Lucas (1990), a escritora constrói no enredo de suas obras diversas


situações humanas que apresentam um tom essencialmente amoroso. Além disso,
deixa evidente a utilização da magia, do universo fantástico, da novela gótica e
também das histórias de terror. Sua narrativa se propõe a narrar em primeira
pessoa, visto que, dessa forma, a autora coloca os personagens de seus contos em
um ritmo de observação e memória. Viana (2010) afirma que a narrativa de Telles é

12
feita de forma subjetiva e introspectiva, pois, dessa forma, o enredo dos contos vai
ser centrado nos dramas internos que serão vivenciados pelos personagens.
Lucas (1990) destaca ainda que a narrativa de Lygia Fagundes Telles é
construída de forma cautelosa e o cuidado da autora na escrita de seus contos
busca causar no leitor um grande impacto. Além disso, a atenção que a autora
coloca em suas narrativas podem ser percebidas nas combinações narrativas que
são realizadas durante a trama. Um dos contos que podemos encontrar a cautela da
autora durante seu enredo é o conto “O Noivo” que entrelaça suas narrativas com o
intuito de surpreender seu leitor.

2.3 As características do conto “O Noivo” de Lygia Fagundes Telles

O conto “O Noivo” organiza sua trama em volta de Miguel. O personagem é


acordado por sua empregada Emília na manhã de quinta-feira, avisando-o que está
atrasado para seu próprio casamento. No entanto, ele apresenta um quadro de
amnésia, visto que não se recorda de seu casamento e nem de sua noiva. Diante
disso, entra em uma busca frenética para tentar recordar a identidade de sua futura
esposa que é revelada para o personagem apenas na última página do conto, mas
deixando o leitor sem conhecê-la, pois, o conto termina sem que seu nome seja
revelado. A obra de Telles se passa em algumas horas, um horário estimado entre
às 09:00 e as 11:00 da manhã, entretanto, mesmo apresentando em seu enredo um
curto espaço de tempo para o conflito principal do conto, pode-se perceber que o
personagem vai recuperando diversas memórias de sua vida, como fica evidente no
seguinte trecho:

[...] na primeira gaveta da cômoda, do lado direito, estão as abotoaduras que


ela fez para mim, são verdes e enormes, dentro de uma caixa está o cebolão
que meu pai me deixou e também o medalhão com retrato de minha mãe,
ela está de mantilha, foi num baile de carnaval fantasiada de espanhola.
Costumava me chamar de Mimi, lembro minha infância, tudo, tudo, avenida
Paulista num casarão do vovô, um casarão cor-de-rosa com um pé de
jasmins no quintal, posso ainda sentir o perfume… (TELLES, p. 138, 2009)

13
Lucas (1990), ao teorizar sobre os personagens que constituem os contos de
Telles, afirma que os personagens masculinos normalmente não possuem o mesmo
grau de profundidade que encontramos nas personagens femininas, diante disso, a
figura masculina é apresentada em seus contos como símbolo de poder, ou seja,
possuem uma boa condição financeira e status social. Em “O Noivo”, essa
característica não é diferente, visto que Miguel – personagem principal da trama –
possui uma profissão bastante respeitada “[...] meu nome é Miguel, advogado,
quarenta anos, trabalho na Goldsmith[...]” (TELLES, p. 138, 2009) e que lhe garante
um bom status perante a sociedade. Além disso, pode-se perceber essa
característica quando falamos de Emília, empregada que trabalha na casa de
Miguel, uma vez que apenas famílias que possuem uma boa condição financeira
são capazes de manter uma empregada doméstica em suas casas.
No conto, grande parte da narrativa se passa na casa de Miguel, mais
precisamente em seu quarto, “[...]ele recostou a cabeça no espaldar da cama”
(TELLES, p. 134, 2009) “[...]como é que você se atrasou desse jeito? Descalço de
pijamas!...” (TELLES, p. 142, 2009). Moisés (2006), em seus estudos sobre o conto
afirma que durante a narrativa o personagem tende a ocupar apenas um espaço, no
entanto, pode-se perceber em alguns contos que eles se movimentam entre
diferentes espaços, isso ocorre segundo o teórico para que o conflito principal da
história seja resolvido. No conto de Telles (2009) pode-se perceber que Miguel
transita por outros espaços (quarto, carro, igreja) para que o conflito principal da
trama seja resolvido. Além de seu quarto, ele passa pelo espaço que se dá carro de
Frederico3 “A igreja é longe? Estamos diante dela – disse Frederico arrefecendo a
marcha do carro. Limpe esse corte que está sangrando, fique com meu lenço”
(TELLES, p. 143, 2009). Na parte final da trama o cenário muda para a igreja em
que vai se casar “num andar autômato, Miguel foi caminhando em meio aos
convidados que se agitaram, farfalhantes” (TELLES, p. 144, 2009).
Lamas (2002) observa que o espaço ocupado pelo personagem não constitui
um fator determinante para a narrativa da escritora, visto que toda ação presente no

3
Amigo de Miguel que aparece apenas na parte final do conto no intuito de levá-lo para seu
casamento.
14
conto é vivido de forma interna pelo personagem, ou seja, é uma luta em sua
interioridade. Nesse caso, Miguel passa por uma luta interna para tentar se lembrar
de seu casamento “[...] não tenho nenhum casamento marcado para hoje” (TELLES,
p. 134, 2009) “[...] para o casamento, a Emília não avisou? Hora do casamento, está
na hora do casamento!” (TELLES, p. 136, 2009). Dessa forma, após se recordar de
que realmente estava prestes a casar, o personagem passa por uma luta interna
para tentar recordar quem seria sua noiva “[...]Emília sabe, pergunto a ela! Mas
perguntar, como? Emília, qual é o nome da minha noiva? Ridículo. Ridículo"
(TELLES, p. 139, 2009).
Outra característica que se pode perceber no conto escrito por Lygia
Fagundes Telles é referente à narração do texto. Isso ocorre, segundo Lamas
(2002), pois no conto a narrativa que se faz presente é a heterodiegética, que
consiste no narrador sob duas perspectivas, a primeira é a presença do narrador da
história “As batidas na porta eram suaves. Mas insistentes. Ele abriu os olhos.
Sentou-se na cama” (TELLES, p. 134, 2009) e a segunda forma de narração
encontrada no conto são momentos em que o próprio personagem se expressa
“Perdi a memória. Perdi a memória” (TELES, p. 138, 2009).
Com a leitura do conto “O Noivo” de Lygia Fagundes Telles pode- se concluir
que a escritora utiliza o esquecimento de Miguel em sua narrativa como um artifício
para prender a atenção de quem está lendo o conto. Pois, a amnésia retratada na
trama faz com que o leitor tente descobrir de que forma o personagem principal irá
resolver o conflito em que está inserido, além de se questionar se seu esquecimento
irá perdurar por todo o conto ou se ele irá se lembrar em algum momento. Além
disso, outro fator que mantém o leitor atento à narrativa é em relação à noiva
misteriosa de Miguel, no entanto, a dúvida ainda fica no ar, uma vez que esse
mistério não é revelado ao final do conto, ficando, assim, uma lacuna na história,
visto que uma das expectativas que o enredo levanta é a tentativa de saber sobre a
futura esposa do personagem principal.

15
3. O HUMOR E SUA CONSTRUÇÃO.

3.1 A constituição humorística e sua contribuição para o riso.

O humor, enquanto campo de pesquisa, enfrentou durante décadas um


inconformado desprestígio proveniente do meio acadêmico. No entanto, a
publicação da Encyclopédia of humor studies4 acabou por se tornar um marco em
relação aos estudos humorísticos, visto que os verbetes que a compõem "[...]
provocam um saudável deslocamento de fronteiras no sentido de captar a crescente
complexidade do universo de estudos humorísticos" (SALIBA, p.3, 2017). Com a
publicação da Encyclopédia, o humor acabou por consolidar sua importância para
as mais diferentes pesquisas científicas (SALIBA, 2017).
Segundo Saliba (2017), a recente publicação além de atualizar diversos
estudos sobre a constituição do humor também abriu um leque de questionamentos,
principalmente por parte dos historiadores. Em vista disso, novas investigações
foram sendo criadas com o intuito de compreender se o humor é constituído pela
natureza humana, como um instrumento de continuação da espécie, ou se é um
produto cultural que foi gerado historicamente e que passa por diferentes
transformações com o passar do tempo.
Dessa forma, diante dos questionamentos gerados a respeito da constituição
tanto do riso quanto do humor, novas pesquisas foram surgindo para que o tema
fosse compreendido cada vez melhor. As disciplinas científicas – psicologia,
ciências cognitivas e primatologia – em seus mais recentes estudos têm
proporcionado mudanças significativas no que se refere ao entendimento do riso
como uma parte do reflexo humano. Nas pesquisas que foram realizadas pela
psicologia, ciências cognitivas e primatologia, as atividades cerebrais das pessoas
foram analisadas enquanto uma piada era contada, assim, a intenção dessas
investigações era encontrar algum tipo de humor neurológico (SALIBA, 2017).

4
A “Enciclopédia de Estudos sobre o Humor”, publicada em 2014, foi organizada pelo linguista
Salvatore Attardo e reúne 335 verbetes em dois volumes que foram escritos por 214 colaboradores
de diferentes áreas do saber.
16
Em seu artigo História Cultural do Humor: Balanço Provisório e Perspectivas
de Pesquisas, Saliba (2017), destaca que Robert Provine, pioneiro no campo de
pesquisa relacionado ao riso, ao perceber o progresso das investigações que
estavam em curso, utilizou-as como base em suas pesquisas. Desse modo, o
pesquisador partiu da suspeita que o riso na verdade não apresenta sua origem nas
piadas que são contadas ou no humor. O pesquisador afirma que o riso passa a ser
estabelecido durante o momento em que buscamos algum tipo de interação social.
Assim, estabelece esse resultado, pois acredita que a chance de rir se torna muito
maior quando estamos acompanhados por outras pessoas, sendo que diminuem
consideravelmente quando nos encontramos sozinho, sem nenhuma companhia.
Por tanto, diante dos estudos realizados por Robert Provine, Saliba (2017) atesta
que "[...] o riso não seria apenas uma reação física instintiva relacionada ao humor
[...] exerceria, sobretudo, uma função de explorar uma forma instintiva de criar laços
sociais” (SALIBA, p. 4, 2017)
Contudo, Saliba (2017) expõe que as pesquisas realizadas não se limitaram
apenas aos estudos particulares de Provine, uma vez que elas serviram como base
para novas investigações e foram, dessa forma, expandidas pelos pesquisadores
Matthew M. Hurley, Daniel Denett e Reginald Adams Jr. em seu livro intitulado
"Inside jokes: using humor to reverse-engineer the mind" que a utilizaram em
conjunto com outras áreas do saber que se dedicam ao estudo do humor. A
pesquisa realizada pelos cientistas, segundo Saliba (2017), propõe que o cérebro
humano é como um computador e o riso, nesse caso, é tido como um simples
algoritmo que é utilizado para que seja desempenhado uma função de recompensa.

[...] o cérebro humano é análogo ao computador e o riso é visto como um


mecanismo mental de recompensa a uma certa tarefa ou conflito - sendo,
neste caso, o humor daí resultante definido, por analogia, como um tipo de
algoritmo que a mente humana utiliza com largas funções adaptativas: uma
"engenharia reversa do cérebro [...] (SALIBA, p.5, 2017)

Portanto, as reações desencadeadas pelo efeito de sentido humorístico


seriam uma pequena parte que está presente no lado emocional do nosso cérebro e
que realiza um processo para que os dados da nossa representação mental se

17
mantenham de forma íntegra. Dessa forma, os pesquisadores afirmam que a alegria
é uma emoção especial e que só pode ser encontrada no cérebro humano. Em suas
investigações, a Paleohumorologia sustenta que existe uma alta probabilidade do
riso ter surgido antes mesmo dos seres humanos começarem a falar, uma vez para
esse campo de pesquisa “[...] o riso provém da parte mais antiga do cérebro, a
mesma que seria responsável por emoções primordiais [...]” (SALIBA, p.7, 2017).
Outra área do conhecimento que abrange pesquisas sobre a constituição do
humor é a neurociência. Suas investigações mostram que as reações humorísticas
constituem um enfrentamento psicológico, o cérebro utiliza essas reações para que
conflitos da psique sejam resolvidos. Segundo as pesquisas, o humor que será
utilizado para que o conflito seja resolvido não precisa aparecer necessariamente
como uma piada, uma vez que eles fazem parte da vida humana.
Para Saliba (2017), as investigações apresentadas pelas mais diversas áreas
do saber possuem seus resultados com uma forma de compreensão limitada, pois,
apresentam uma aproximação maior com as circunstâncias que provocam o riso do
que com o que causa o humor. Segundo Carmelino e Figueiredo (2009), o humor é
visto

“[...] como uma espécie de arma de denúncia, capaz de revelar e flagrar


outras possibilidades de visão de mundo e das realidades naturais ou
culturais que nos cercam, funcionando, portanto, como um importante
recurso argumentativo [...]” (CARMELINO; FIGUEIREDO, p. 273, 2009).

Saliba (2017) afirma que o humor não pode ser entendido apenas como uma
técnica utilizada para produzir o riso, uma vez que deve ser compreendido também
como uma forma de avaliar de que modo as sociedades se representam.
Quando se trata de estabelecer as definições sobre o humor, pode-se
encontrar as mais variadas teorias. No entanto, quando investigações sobre o tema
são iniciadas, os pesquisadores utilizam como base para seus estudos três teorias
consideradas essenciais para compreender o humor que são: a Teoria da
Superioridade, a Teoria do Alívio e a Teoria da Incongruência.
Na Teoria da Superioridade, o humor é gerado pelo sentimento de
superioridade que sentimos em relação ao outro. Nesse caso, o discurso sobre o

18
outro pode conter tons de “[...] hostilidade, malícia, agressão e menosprezo [...]
aspectos negativos e pejorativos que caracterizam o riso [...]” (SALIBA, p.14, 2017).
Essa forma de utilizar o humor para estabelecer uma relação de superioridade pode
ser vista com bastante frequência em muitas piadas que possuem um conteúdo
étnico ou de gênero, uma vez que normalmente elas são utilizadas para buscar
estabelecer uma tentativa de acreditar que um grupo de indivíduos é melhor do que
o outro. Entretanto, é importante ressaltar que a teoria da superioridade nem
sempre estará atrelada à tentativa de utilizar o humor de forma negativa, pois

O humor pode ser visto como uma vantagem competitiva, ou seja, uma
forma de dizer ao inimigo que também é tão forte quanto ele, sobretudo
quando a superioridade não se dá apenas pelo aspecto físico da força, mas
também pela inteligência e esperteza. (SALIBA, p. 14, 2017)

Na Teoria do Alívio ou Teoria da Catarse – como também é conhecida – o


humor é criado através da liberação e do alívio das tensões presentes na psique
humana. Essa liberação ocorre por meio dos chistes, dessa forma, as tensões vão
se transformando de algo tido como inusitado para uma situação familiar. Para
Freud, teórico responsável pelos estudos que deram início à teoria, o humor teria na
verdade a função de liberar, assim, “[...] impulsos libidinais, morais e
escatológicos[...]” (SALIBA, p. 15, 2017)
Na Teoria da Incongruência, iniciada por Vitor Raskin, o humor é estabelecido
por meio de scripts que são distintos, mas que devem ser compatíveis. Segundo
Silveira (2013), o script:

[...] é o conhecido compartilhado entre interlocutores, sentido bona-fide; o


outro, responsável por gerar o humor, é o que destoa do senso comum e
causa surpresa, sentido non-bona-fide. Com isso, ocorre a troca do modo de
comunicação bona-fide para non-bona-fide a partir de um gatilho óbvio ou
implícito. (SILVEIRA, p. 45, 2013)

Assim, o texto humorístico seria percebido, inicialmente de uma maneira e


terminaria de outra, diferente do entendimento inicial. Essa forma de compreensão
do texto humorístico é, segundo Saliba (2017), uma forma criada para analisar

19
piadas. O pesquisador ressalta que Raskin estabelece as piadas como textos
humorísticos não confiáveis, no entanto, é necessário que o sentido confiável esteja
presente, uma vez que será nessa oposição de sentidos que o leitor vai encontrar o
humor presente no texto.
Gil (1995) destaca que nas piadas o humor acontece “[...] quando se
quebram regras preestabelecidas, quando se transgridem as normas linguísticas e
sociais.” (p.111). Para Possenti (2001), “[...] as piadas fornecem simultaneamente
um dos melhores retratos dos valores e problemas de uma sociedade[...]” (p.1),
além de ser um importante suporte para os estudos sobre como funciona a língua e
se tornando um terreno extremamente fértl para a produção do sentido humorístico.
Segundo Gil (1995), o humor presente nas piadas é compreendido quando
entendemos que sua composição apresenta um antecedente, um consequente e um
mediador. O elemento mediador pode ser entendido como um gatilho que vai ser
responsável por auxiliar na passagem de um elemento a outro e que pode ser
produzido por um mecanismo linguístico que está presente no texto. Com relação às
piadas e seus diferentes sentidos, Possenti (2001) argumenta que o mecanismo que
está presente na base da anedota é o duplo sentido, contudo, é necessário ter
cautela, pois ele pode aparecer de diferentes formas. Além do duplo sentido citado
por Possenti, Gil (1995), seleciona alguns mecanismos que também podem
proporcionar a construção do humor nas piadas – a autora seleciona apenas oito,
uma vez que os mecanismos linguísticos de construção do humor são variados –
eles são: a onomatopeia; a rima; a comparação; a intensificação; a inversão
sintática; a homonímia; a polissemia e a impropriedade.
Para além dos textos o humor também pode ter sua constituição analisada
através de programas de televisão. Nesse sentido, Travaglia (1992) investigou em
seu artigo O que é engraçado? Categorias do risível e o humor brasileiro na
televisão a construção humorística a partir de diferentes programas de TV. Em suas
pesquisas, após analisar os mais diferentes programas humorísticos o teórico
encontra seis categorias responsáveis pela construção do humor, segundo
Travaglia, essas categorias são: humor quanto a forma de composição; objetivo do
humor; humor quanto ao grau de polidez; humor quanto ao assunto; humor quanto
ao código e o que provoca o riso.

20
Na primeira categoria, Travaglia (1992) relata que o humor em relação a sua
composição pode ser descritivo, narrativo ou dissertativo. Para que o humor seja
considerado descritivo o riso deve ser provocado pelos trejeitos do personagem
(sua caracterização) como é o caso de Dona Bela, personagem que compõe o
elenco da "Escolinha do Professor Raimundo”. Na composição narrativa, o riso vai
ser causado pelo o que ocorre em cena. Na composição dissertativa, o que constrói
o humor são as ideias que são apresentadas ao público que acompanha o
programa.
A segunda categoria relaciona o objetivo pelo qual o humor é construído. O
autor a subdivide em outras quatro categorias: O riso pelo riso, em que o humor
teria como função principal provocar a diversão, fazer com que as pessoas riem; Na
liberação, o humor não pode ser entendido apenas como uma simples forma de
escape, para Travaglia, nesse caso o humor apresenta um caráter
sócio-psicológico. O terceiro objetivo do humor é a crítica social que é utilizada
como forma de mostrar os absurdos que acontecem e com o intuito também de
desejar mudanças na sociedade. A última subcategoria referente ao objetivo do
humor é a denúncia, que consiste em criticar alguns comportamentos que ocorrem e
são muitas vezes incentivados pela sociedade.
Na terceira categoria, Travaglia (1992) faz referência ao discurso, ou seja, as
palavras e expressões que são utilizadas. O autor destaca que se pode encontrar: o
humor de salão, que consiste em uma linguagem mais refinada, nobre; o humor sujo
ou pesado, nesse caso, podemos encontrar uma linguagem que apresenta muitos
palavrões e com termos que são de conhecimento de todos; o humor médio,
segundo Travaglia (1972), é o meio termo entre o humor de salão e o humor
pesado, ele acaba por ficar no meio do caminho.
A quarta categoria do humor refere-se ao assunto que está sendo tratado.
Segundo o autor, esse tipo de construção humorística apresenta quatro
subcategorias. Na primeira temos o humor negro que é realizado de maneira
agressiva e que abarca situações trágicas que a sociedade tenta esquecer. A
segunda subcategoria é o humor sexual que sempre vai retratar algum fato que está
ligado ao sexo. A terceira subcategoria é delimitada pelo humor social uma forma de
criticar características de determinados grupos sociais, seus costumes e atitudes.

21
Por fim, a quarta subcategoria refere-se ao humor étnico, nesse caso, o humor é
construído com base nas características que, podem ser tanto atribuídas, quanto
reais de um determinado povo.
Na quinta categoria, Travaglia (1992) destaca duas formas para que o humor
aconteça. O humor verbal ou linguístico em que está relacionado ao que é escrito
ou ao que é dito e o humor não-verbal, nesse caso, o humor está associado a
outros tipos de código que pode ser: a situação, os gestos, a caracterização, os
movimentos, as expressões, os ruídos e os objetos.
Na sexta categoria podem-se encontrar alguns elementos que o autor
considera provocar o riso. Para Travaglia (1992), os elementos expostos por ele não
podem ser considerados totalmente humorísticos, uma vez que não apresentam
somente esse uso. Os elementos são divididos em dois grupos que são chamados
de: script e mecanismo. No grupo do script, os elementos que provocam o riso são:
estupidez; esperteza/astúcia; ridículo; absurdo e mesquinhez. No grupo dos
mecanismos temos: a cumplicidade; a ironia; a mistura de lugares sociais ou
posições de sujeito; a ambiguidade; o uso de estereótipo; a contradição; a sugestão;
a descontinuidade de tópico ou quebra de tópico; a paródia; o jogo de palavra; a
quebra-língua; o exagero; o desrespeito a regras conversacionais; as observações
metalinguísticas; a violação de normas sociais e o lugar social.
As categorias analisadas por Travaglia (1992), mesmo que utilizadas para
estudar a construção do humor na televisão, também podem ser utilizadas como
base para analisar o humor em textos verbais escritos. Dessa forma, levando em
consideração os estudos realizados pelo teórico, as categorias: humor quanto a
forma de composição; objetivo do humor; humor quanto ao grau de polidez; humor
quanto ao assunto e o humor quanto ao código foram utilizadas para analisar o
conto “O Noivo” da escritora Lygia Fagundes Telles. Na tabela abaixo, encontram-se
as cinco categorias de Travaglia (1992) utilizadas para analisar o conto e as
subcategorias que estão presentes na narrativa para a construção do humor.

22
CATEGORIAS DO HUMOR SEGUNDO TRAVAGLIA

CATEGORIAS NO
CONTO “O NOIVO”

Descritivo
Humor quanto à forma de
composição Narrativo Narrativo/Descritivo
Dissertativo

Riso pelo riso

Liberação
Objetivo do humor Crítica
Crítica Social Social/Denúncia
Denúncia

Humor de salão
Humor quanto ao grau de
polidez Humor sujo ou pesado Humor de salão
Humor médio

Humor negro

Humor sexual
Humor quanto ao assunto Humor social
Humor social

Humor étnico

Verbal ou linguístico
Humor quanto ao código Verbal
Não-verbal
Quadro 1: Categorias e subcategorias responsáveis pela construção do humor para Travaglia
(1992) e sua associação com o conto “O Noivo”.

A primeira categoria analisada no conto foi em relação ao humor quanto a


forma de composição. Na narrativa de Lygia Fagundes Telles as passagens
humorísticas são construídas pela autora de duas formas. A primeira forma de
composição do humor que podemos notar é a narrativa, sendo que alguns trechos
humorísticos são criados de acordo com o que está acontecendo no conto, como
pode ser notado no trecho “Ela deu uma risadinha. O senhor já acordou mesmo?
Acho que ainda está dormindo, é bom tomar um café. Vou trazer o café” (TELLES,

23
p.134, 2009). Além da subcategoria narrativa, pode-se notar no texto a construção
do humor de maneira descritiva, uma vez que o personagem Miguel descreve seus
chefes do escritório de advocacia como “chatos” que pode ser entendida como uma
maneira engraçada de se referir a alguém, como poder ser visto no trecho

“Estou ótimo, nunca estive tão em forma, sei tudo, lembro tudo, meu nome é
Miguel, advogado, quarenta anos, trabalho na Goldsmith e Pedro é meu
chefe, são chatos mas ganho bem [...]” (TELLES, p.138, 2009)

Ao analisar no conto o objetivo com que o humor foi empregado – segunda


categoria de Travaglia (1992) – pode-se notar que em grande parte das passagens
humorísticas a construção do humor é baseada em uma crítica social ou denúncia.
Esse fato se evidencia pois, segundo Lucas (1990), Lygia utiliza o humor para
realizar uma crítica, seja em relação à sociedade e suas tradições ou destinada aos
relacionamentos humanos. No trecho, “[...] Palhaçada de casamento com fraque.
Ela deve ter exigido todo o ritual, não abriu mão de nada, igreja, viagem de
núpcias… E eu? Que papel estou fazendo nisso tudo?![...]” (TELLES, p.140, 2009),
podemos perceber uma crítica social que se torna engraçada, uma vez que a fala de
Miguel faz uma crítica a instância do casamento, mais precisamente a suas
tradições, uma vez que na década de 1960 – ano que o conto foi escrito e publicado
pela primeira vez – para que uma união fosse estabelecida perante a sociedade era
preciso todo um ritual que, geralmente era preparado pelas futuras noivas, enquanto
os noivos ficavam apenas a espera do grande dia. No conto, a crítica social não fica
restrita apenas ao objetivo do humor, uma vez que em sua maioria os trechos
apresentam em sua constituição o humor social – quarta categoria do humor –
utilizada para criticar seus costumes e atitudes, como foi analisado no trecho acima.
Em sua terceira categoria, Travaglia (1992), relaciona o humor quanto ao
grau de polidez, ou seja, as palavras e expressões que são utilizadas para que o
humor fique em evidência. Nos trechos humorísticos encontrados a linguagem
utilizada é refinada sem a presença de palavras de baixo calão, dessa forma, a
linguagem humorística é considerada como de salão. Por fim, o humor é
estabelecido em sua forma verbal, pois ele acontece devido ao que está escrito no
texto.

24
Nesse sentido, podemos concluir que a escritora utiliza o enredo humorístico
em sua obra para realizar diferentes críticas à sociedade com o intuito de fazer com
que seus leitores reflitam sobre as temáticas abordadas durante a narrativa, sendo
que sua utilização vai além de apenas provocar o riso. Com isso, pode-se
compreender que o planejamento e construção do sentido humorístico requer do
escritor elementos necessários para que seu objetivo seja alcançado.

3.2 A construção do enredo humorístico

Para a teoria literária o enredo é entendido como o conjunto de fatos que


acontece em uma história. Segundo Silveira (2019), Attardo – responsável por
inserir o enredo nos estudos sobre o humor – classifica o enredo como os eventos
que são apresentados no texto, mas que não estão em ordem cronológica e sim na
ordem em que aparecem na narrativa. A pesquisadora destaca que o enredo é o
material que está sendo apresentado e ordenado a partir de um determinado ponto
de vista e que será compreendido pelos leitores, uma vez que suas inferências são
importantes para a formação do enredo.
Em suas pesquisas, Silveira (2019) destaca que para a construção do enredo
humorístico é necessário que haja no texto a presença de “[...] sentido confiável (ou
bona-fide) e não confiável (ou non-bona-fide), a oposição de scripts, os gatilhos
humorísticos (jab lines), o elemento surpresa (punch line); [...] além do recurso da
intertextualidade” (SILVEIRA, p.46, 2009).
O sentido confiável (ou bona-fide) é formado no início da leitura sendo este
compatível com a realidade e que vai acionar os conhecimentos de mundo do leitor;
o sentido não confiável (ou non-bona-fide) tem como intuito romper as expectativas
do leitor, visto que não irá encontrar o que esperava ao final de sua leitura; na
oposição de scripts, o texto vai apresentar dois cenários distintos, ou seja, opostos
para que o efeito humorístico seja provocado; os gatilhos humorísticos (jab line) são
entendidos como instâncias humorísticas (palavras, orações ou expressões) que
surgem em meio a narrativa de forma inesperada; o elemento surpresa (punch line)
é compreendido como um elemento de interrupção que vai desconstruir o sentido

25
que estava sendo elaborado, sendo que deve ocorrer no final do texto; e a
intertextualidade é a presença de outros textos durante a narrativa.
Segundo Silveira (2019), Attardo destaca que a compreensão do enredo
humorístico é complexa, desse modo, para melhorar seu entendimento o subdividiu
em cinco classificações, a saber: narrativas similares a piadas; enredo
metanarrativo; enredo com fabular humorística; enredo com fabulae séria; e
rompimento humorístico e ilusão realística.
Na primeira classificação, narrativas similares a piadas, o texto precisa de um
elemento surpresa – que também é concebido por Attardo como um elemento de
interrupção – para que seja finalizado, visto que será ele que caracteriza a narrativa
como uma piada ou similar; no enredo metanarrativo, segunda classificação do
enredo humorístico, as convenções narrativas serão manipuladas para que o efeito
humorístico seja construído; na classificação enredo com fabulae humorística, a
narrativa não tem a obrigação de ser finalizada com um elemento surpresa, pois o
enredo pode ser constituído de outros mecanismos responsáveis pela produção do
humor e devido a isso são considerados humorísticos; na quarta classificação,
enredo com fabulae séria, o texto pode apresentar uma narrativa humorística,
entretanto, ela é escondida pela seriedade da história o que acaba ocasionando o
enfraquecimento do humor; no rompimento humorístico e ilusão realista, última
classificação de Attardo, a narrativa é considerada séria e que em determinados
momentos vai acontecer uma quebra de sua seriedade para a construção de uma
passagem humorística, nesse caso, o texto não é considerado engraçado.
Silveira (2019) ressalta diante das classificações de Attardo que a abordagem
referente ao enredo humorístico ainda é muito breve e que necessita de novos
estudos e análises para que haja uma melhor definição a respeito de sua temática.
Em relação a construção do enredo humorístico, o conto de Lygia Fagundes
Telles, pode ser definido – segundo as categorias de Attardo – como rompimento
humorístico e ilusão realista, uma vez que a narrativa é considerada séria. Contudo,
a escritora também utiliza em seu conto outros mecanismos para a construção do
humor, como é o caso dos gatilhos humorísticos e o elemento surpresa. A utilização
das passagens humorísticas na narrativa se deve para que haja uma quebra na
seriedade que está sendo contada. Essa quebra é uma característica bastante

26
comum em outras produções de Telles. Diante disso, o quadro abaixo ilustra como
ocorre a construção do enredo humorístico no conto “O Noivo”.

O NOIVO: CONSTRUÇÃO DO ENREDO HUMORÍSTICO

TRECHO TÉCNICA

“[...] Estava ficando muito velha, Rompimento humorístico e Ilusão


coitada, aquilo era arteriosclerose, realística
imagine, vir batendo na porta daquele
jeito, “Hora do casamento!...” [...]”
(p.134)

“Ela já não podia ouvi-lo. Atirando Rompimento humorístico e Ilusão


longe as cobertas levantou-se. realística. Sendo que em ambas as
“Bobagem, não tenho casamento passagens a autora faz uso de um
nenhum para hoje. Ainda bem, uma elemento surpresa. No primeiro trecho,
chateação…” [...]” (p.135) com a expressão “ainda bem, uma
chateação" e no segundo “não gosto de
ver” para se referir ao casamento, uma
vez que normalmente o casamento é
“Quando passava por Emília, ela visto como uma ocasião alegre, motivo
enxugava os olhos na barra do de lágrimas por parte dos convidados.
avental. Tocou-lhe no braço. Você não Diante disso, as expressões vão
vem Emília? Não gosto de ver. (p.143) desconstruir os sentidos que vinham
sendo elaborados.

“Levantou-se de um salto e arrancou o Rompimento humorístico e Ilusão


paletó do pijama. Mas que brincadeira realística. No trecho, Telles faz uso da
é esta? Que jogo é este? “Estou ótimo, palavra “chatos” para definir os chefes
nunca estive tão em forma, sei tudo, de Miguel, nesse sentido, percebe-se
lembro tudo, meu nome é Miguel, que a autora utiliza um gatilho
advogado, quarenta anos, trabalho na humorístico para construir o humor.

27
Goldsmith e Pedro é meu chefe, são
chatos mas ganho bem [...]” (p.138)

“[...]As coisas se passavam como nas Rompimento humorístico e Ilusão


histórias encantadas, onde o príncipe realística. No trecho, Telles trabalha o
mandava vir a donzela de um reino humor com a ajuda da intertextualidade,
distante sem tê-la visto nunca, o amor desse modo, realiza uma comparação
construído em torno de um anel de entre a situação que Miguel está
cabelo, de um lenço, de um retrato. “E passando com seu casamento e a
nem isso eu tenho, ou tenho?”...” maneira como o enlace matrimonial é
(p.139) organizado nos contos de fada.

“[...]Palhaçada de casamento com Rompimento humorístico e Ilusão


fraque. Ela deve ter exigido todo o realística. No conto a fala de Miguel
ritual, não abriu mão de nada, igreja, interrompe seus pensamentos e acaba
viagem de núpcias… E eu? Que papel por tornar-se engraçada fazendo uma
estou fazendo nisso tudo?![...]” (p.140) crítica às tradições do casamento.

“[...] Era evidente que ela não podia Rompimento humorístico e Ilusão
gostar da ideia de vê-lo casado, realística.
nenhuma empregada quer ter de
repente uma patroa ” (p.140)

Quadro 2: A construção do enredo humorístico no conto de Lygia Fagundes Telles.

28
4. O CONTO DE LYGIA FAGUNDES TELLES E O ENSINO

4.1 O conto “O Noivo” em sala de aula

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento normativo que


define as aprendizagens essenciais que os alunos devem desenvolver ao longo de
sua passagem pela Educação Básica, define que o ensino de Língua Portuguesa –
em todas as suas modalidades – deve proporcionar aos alunos experiências para
que possam desenvolver uma participação crítica nas mais variadas esferas da
sociedade que, são constituídas por diferentes formas de linguagem, como por
exemplo, a oralidade e a escrita.
Dessa forma, torna-se essencial trabalhar em sala de aula formas de
compreender os mais diferentes sentidos que os textos possuem. Quando os
estudantes completam o Ensino Fundamental e ingressam na modalidade do
Ensino Médio a BNCC em sua habilidade EM13LP01 destaca que os alunos devem

“Relacionar o texto, tanto na produção como na leitura/escuta, com suas


condições de produção e seu contexto sócio-histórico de circulação
(leitor/audiência previstos, objetivos, pontos de vista e perspectiva, papel
social do autor, época, gênero do discurso, etc.), de forma a ampliar as
possibilidades de construção de sentidos e de análise crítica e produzir
textos adequados a diferentes situações.” (BRASIL, p.506, 2017)

Em sua habilidade EM13LP06 ainda ressalta que é necessário que os


estudantes saibam

“Analisar efeitos de sentido decorrentes de usos expressivos da linguagem,


da escolha de determinadas palavras ou expressões de ordenação,
combinação e contraposição de palavras dentre outros, para ampliar as
possibilidades de construção de sentidos e de uso crítico da
língua.”(BRASIL, p. 507, 2017)

Portanto, o objetivo é propor que o aluno ao ter contato com a obra da


escritora Lygia Fagundes Telles possa relacionar as condições de produção do
conto e, assim, compreender os sentidos do texto a fim de construir um olhar crítico
para algumas situações que estão presentes em sua narrativa.

29
4.2 Sequência didática: O conto “O Noivo” em sala de aula

AULA 1:

I. Dados de Identificação:
Escola: ___________________________________________________________
Professor (a): ______________________________________________________
Disciplina: Língua Portuguesa
Série: 3º ano E.M

II. Tema:

Leitura e compreensão do conto “O Noivo”, da escritora Lygia Fagundes Telles, e


suas passagens humorísticas para a construção do texto e de uma visão crítica da
sociedade.

III. Objetivos:

Objetivos específicos:
● Compreender as características do gênero conto;
● Analisar e identificar na obra de Lygia Fagundes Telles os aspectos de sua
escrita e as características do gênero textual conto;

IV. Conteúdo:

● Gênero conto e suas características;


● A escrita de Lygia Fagundes Telles;
● As características presentes no conto “O Noivo”

V. Desenvolvimento do tema:

Para uma melhor compreensão da teoria que será trabalhada a aula pode ser
dividida em dois momentos:

1. O primeiro momento será uma breve revisão acerca do gênero textual


conto, pois sua constituição é formada por diversos aspectos importantes

30
que o leitor deve ficar atento para uma melhor compreensão de sua
narrativa. Desse modo, selecione as características principais que
constituem o gênero e explique para os alunos, como por exemplo: os
personagens, o tempo, o espaço, etc.

2. Para o segundo momento da aula, é interessante falar sobre a escritora


Lygia Fagundes Telles, uma vez que Lucas (1990) destaca que a escritora
gosta de utilizar em suas obras jogos verbais para realizar comentários
irônicos a respeito do cotidiano, assim, consegue chamar atenção para os
males que existem na sociedade e fazer uma crítica sobre as relações
humanas. Dessa forma, compreender o processo de escrita da autora vai
auxiliar os alunos no momento de leitura do conto “O Noivo” que será
trabalhado em sala de aula.

3. Primeira leitura do conto: será feita de forma coletiva para que os alunos
possam encontrar no texto e posteriormente debater quais aspectos
marcantes da escrita de Lygia podem ser encontrados no texto.

VI. Recursos didáticos: (quadro, pincel, datashow, etc.)

VII. Avaliação:

Formativa: Observar o debate proporcionado aos alunos sobre o gênero estudado


e a construção narrativa da escritora Lygia Fagundes Telles.

VIII. Bibliografia:

TELLES, Lygia Fagundes. O Noivo. In: Meus Contos esquecidos. 1ºed. Rio de
Janeiro: JPA, 2009.

31
AULA 2:

I. Dados de Identificação:
Escola: ___________________________________________________________
Professor (a): ______________________________________________________
Disciplina: Língua Portuguesa
Série: 3º ano E.M

II. Tema:

Leitura e compreensão do conto “O Noivo”, da escritora Lygia Fagundes Telles, e


suas passagens humorísticas para a construção do texto e de uma visão crítica da
sociedade.

III. Objetivos:

Objetivos específicos:
● Ler e analisar o conto “O Noivo” buscando encontrar passagens
humorísticas que a escritora constrói durante a sua narrativa;

IV. Conteúdo:

● Leitura do conto;
● Localizar passagens humorísticas;

V. Desenvolvimento do tema:

A segunda aula da sequência didática será utilizada para que os alunos façam
uma leitura individual de “O Noivo”. A leitura coletiva realizada na 1º aula fez com
que tivessem um primeiro contato com o texto e sua narrativa, desse modo, já
estão cientes da temática utilizada pela escritora. A leitura individual fará com que
os alunos tenham um olhar mais atento para a trama e, além disso, de encontrar
algumas passagens humorísticas que estão presentes no conto.

Após a leitura os alunos peçam aos alunos que grifem as partes do texto que
consideram como humorístico, para em um segundo momento conversar sobre o
motivo de um determinado trecho ser considerado assim em sua visão.

32
VI. Recursos didáticos: Conto “O Noivo”, Quadro, Pincel.

VII. Avaliação:

Formativa: Observar o processo de leitura realizado pelos alunos e quais critérios


utilizam para encontrar uma passagem humorística no conto.

VIII. Bibliografia:

TELLES, Lygia Fagundes. O Noivo. In: Meus Contos esquecidos.1º ed. Rio de
Janeiro: JPA, 2009.

AULA 3:

I. Dados de Identificação:
Escola: ___________________________________________________________
Professor (a): ______________________________________________________
Disciplina: Língua Portuguesa
Série: 3º ano E.M

II. Tema:

Leitura e compreensão do conto “O Noivo”, da escritora Lygia Fagundes Telles, e


suas passagens humorísticas para a construção do texto e de uma visão crítica da
sociedade.

III. Objetivos:

Objetivos específicos:

● Debater sobre o conto lido buscando responder como a narrativa


desenvolvida pela autora levou a construção de algumas passagens
humorísticas que estão presente no texto e como elas realizam uma crítica
perante a sociedade e as relações humanas;

IV. Conteúdo:

● Leitura e debate do conto “O Noivo”

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V. Desenvolvimento do tema:

Alguns trechos que apresentam o humor estão presentes na tabela abaixo.

ALGUNS TRECHOS HUMORÍSTICOS NO CONTO “O NOIVO”

“[...] Estava ficando muito velha, coitada, “[...] Era evidente que ela não podia
aquilo era arteriosclerose, imagine, vir gostar da ideia de vê-lo casado,
batendo na porta daquele jeito, “Hora do nenhuma empregada quer ter de
casamento!...” [...]” (p.134) repente uma patroa ” (p.140)

“[...]Palhaçada de casamento com “[...]As coisas se passavam como


fraque. Ela deve ter exigido todo o ritual, nas histórias encantadas, onde o
não abriu mão de nada, igreja, viagem príncipe mandava vir a donzela de
de núpcias… E eu? Que papel estou um reino distante sem tê-la visto
fazendo nisso tudo?![...]” (p.140) nunca, o amor construído em torno
de um anel de cabelo, de um lenço,
de um retrato. “E nem isso eu tenho,
ou tenho?”...” (p.139)

“Levantou-se de um salto e arrancou o “Ela já não podia ouvi-lo. Atirando


paletó do pijama. Mas que brincadeira é longe as cobertas levantou-se.
esta? Que jogo é este? “Estou ótimo, “Bobagem, não tenho casamento
nunca estive tão em forma, sei tudo, nenhum para hoje. Ainda bem, uma
lembro tudo, meu nome é Miguel, chateação…” [...]” (p.135)
advogado, quarenta anos, trabalho na
Goldsmith e Pedro é meu chefe, são
chatos mas ganho bem [...]” (p.138)

“Quando passava por Emília, ela


enxugava os olhos na barra do avental.
Tocou-lhe no braço. Você não vem
Emília? Não gosto de ver. (p.143)

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VI. Recursos didáticos: (quadro, pincel, papel)

VII. Avaliação:

Formativa: Momentos de observação e auxílio aos alunos na busca pela


compreensão da construção do enredo humorístico no conto.

VIII. Bibliografia:

TELLES, Lygia Fagundes. O Noivo. In: Meus Contos esquecidos.1º ed. Rio de
Janeiro: JPA, 2009.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta pesquisa refletimos sobre a construção do sentido humorístico no


conto da escritora Lygia Fagundes Telles. O trabalho partiu do intuito de analisar de
que forma os mecanismos linguísticos são utilizados pela autora para que o humor
fosse construído e a qual finalidade o enredo humorístico encontrado no conto está
atribuído. Porém, antes de iniciar com a análise humorística, no primeiro capítulo
buscamos compreender a constituição do gênero textual conto através dos estudos
teóricos de Cortázar (2006), Magalhães Júnior (1972) e Moisés (2006). A partir das
discussões proporcionadas pelos textos teóricos a respeito dos aspectos que
compõem o texto, procuramos traçar e descrever as características que integram a
obra “O Noivo” de Telles.
No que refere-se às investigações relacionadas à construção humorística,
verificamos que o conto selecionado como objeto de análise possui em seu enredo
passagens humorísticas que foram construídas pela autora de forma intencional. O
humor que está sendo realizado através da narrativa do conto é constituído em sua
maioria pela autora para realizar uma crítica relacionada à sociedade ou uma
denúncia em relação às atitudes e pensamentos do personagem Miguel. Lygia
Fagundes Telles constrói o enredo humorístico de forma cautelosa e clara sem que
haja necessidade do uso de palavrões ou expressões de baixo calão, sendo
considerado então como um humor limpo e muito bem estruturado. Portanto, o
enredo humorístico utilizado pela escritora em seu conto faz com que seus leitores
desenvolvam um olhar mais atento e crítico para o lugar que os cercam.
Por fim, no último capítulo desta pesquisa, buscamos construir uma
sequência didática no intuito de auxiliar os professores da Educação Básica na
utilização de textos humorísticos longos em sala de aula. Nessa perspectiva, o
aluno a partir dos conhecimentos partilhados em aula terá condições de
compreender como o humor é construído e com qual finalidade. Desse modo,
formaremos alunos mais críticos perante nossa sociedade.

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REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília,


2017.

CARMELINO, Ana Cristina; FIGUEIREDO, Maria Flávia. O Humor no gênero


“coluna de variedades” de José Simão. Anais do VI Congresso Internacional da
ABRALIN. João Pessoa, PB: UFPB, 2009. P. 273-281.

CORTÁZAR, Júlio. Alguns aspectos do conto. In: Valise de Cronópio. Editora


Perspectiva. São Paulo. 2006

GIL, Célia Maria Carcagnolo. Humor: alguns mecanismos linguísticos. Alfa. São
Paulo. 39: 111-119. 1995

LAMAS, Berenice Sica. Lygia Fagundes Telles: Imaginário e a escritura do


duplo. Tese de Doutorado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul: Porto
Alegre. 2002

LUCAS, Fábio. A ficção giratória de Lygia Fagundes Telles. Travessia,


Florianópolis, n.20, p.60 – 77, 1990.

MAGALHÃES JUNIOR, Raimundo. A arte do conto: sua história, seus gêneros,


sua técnica, seus mestres. Edições Bloch. Rio de Janeiro. 1972

MOISÉS, Massaud. A criação literária: prosa I. Editora Cultrix. São Paulo. 2006

POSSENTI, Sírio. O humor e a língua. Ciência Hoje. vol.30, n.176, p. 72-74, out.
2001

SALIBA, Elias Thomé. História cultural do humor: balanço provisório e


perspectivas de pesquisas. rev.hist (São Paulo), n.176, a. 01017. 2017

SILVEIRA, Karine. O enredo humorístico na constituição das falsas notícias do


Diário Pernambucano. Odisseia, Natal, RN, v.3, n.2, p. 29-45, jul-dez. 2018.

_________, Karine. Notícias Humorísticas: que textos são estes?. Tese de


Mestrado. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Belo Horizonte. 2019

TRAVAGLIA, Luiz Carlos. O que é engraçado? Categorias do risível e o humor


brasileiro na televisão. Leitura: Estudos linguísticos e literários. Maceió,
Universidade Federal de Alagoas. n.5, p.42-49. 1992

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VIANA, Maria José A. Os (des)enredos do amor: a narrativa do fracasso
amoroso em contos de Lygia Fagundes Telles. Dissertação de Mestrado.
Universidade Federal do Pará. Belém. 2010

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