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Contingencialismo Motta 10.1590 S0034-75901976000100002 PDF
Contingencialismo Motta 10.1590 S0034-75901976000100002 PDF
A pesquisa de Joan Woodward; Mesmo sem entrar no mérito do trabalho realizado pelos
2. Sistemas mecânicos e orgânicos; pesquisadores de organizações das últimas décadas, não
J. O grupo de Aston; poderíamos ignorar a grande produção britânica não sô
4. Variáveis estruturais; pelo seu volume como pela sua rápida absorção pelo
5. Variáveis de contexto e de desempenho; meio: acadêmico norte-americano. Com efeito, os pes-
6. Considerações adicionais. quisadores do Tavistock Institute de Londres não foram
os únicos cientistas sociais britânicos a marcar profun-
damente o desenvolvimento da teoria organizacional da
segunda metade do século XX. Outros trabalhos foram
de indiscutível importância na consolidação da cha-
mada visão sistêmica das organizações, nos Estados
Unidos, e em sua evolução para o estágio da teoria da
contingência, tentativa de operacionalização de valor
discutível mas de divulgação extremamente rápida. En-
tre os trabalhos que mais caracterizam tal contribuição
parecem indiscutivelmente estar os de Joan Woodward,
professora de sociologia industrial, na Faculdade Im-
perial de Ciência e Tecnologia da Universidade de Lon-
dres, nascida em 1916 e falecida em 1971.
Extremamente voltada para a preocupação com a
aplicação da teoria da administração, Woodward
Fernando Claudio Prestes Motta. * deixou-nos uma bibliografia que precisa ser ainda
melhor estudada e analisada. Indiscutivelmente, porem,
seus livros mais conhecidos são: OrganizaçiIo industrial:
teoria e prática e Organizaçõo industrial: comporta-
mento e controle, onde são explorados os dados a que
chega em sua ampla pesquisa na região do sudeste de
Essex. Embora Joan Woodward tenha realizado e
publicado outros trabalhos interessantes suas incursões
pelo campo da tecnologia e estrutura organizacional
são, com efeito, sua marca distintiva.
A pesquisadora britânica não hesita, ela prôpria, em
afirmar, não sem entusiasmo, que a principal conclusão
inicial desse projeto de pesquisa foi a existência de uma
ligação entre tecnologia e estrutura social, algo enun-
ciado pela primeira vez por Thorsteinreblenl em 1904
que agora pode ~er empiricamente démonstrado.ê
Tais trabalhos foram realizados enquanto ocupava o
cargo de diretora da Unidade de Pesquisa em Relações
Humanas no South East Essex College of Technology e
continuados por seu grupo de pesquisa no Imperial
College of Science andTechnology. Evidentemente o
trabalho de Woodward, especialmente pioneiro, não ex-
clui outros igualmente relevantes como os de Tom Burns
e· do grupo de Aston. Inicialmente, porem, deteremo-
nos no primeiro.
EstrutllJYl e tecnologia
ceitual e operacional, indiscutivelmente complexo, veio uma delas, em função de dificuldade de mensuração)
oferecer um reforço a mais para a teoria da contingên- que permitiu o desenvolvimento de 64 escalas. As cinco
cia, na medida em que representou uma tentativa a mais "dimensões" consideradas foram formalização, cen-
na direção do encontro de uma "base cientifica sólida" tralização, es~alizaçi.o, padronização e configuração.
para as diferenças estruturais das organizações, sem, Segundo os pesquisadores, "todos os conceitos incluídos
contudo, conseguir liberar a teoria das organizações do nessa lista de variáveis estruturais são freqüentemente
"fantasma weberiano". Teria sido mais fácil rejeitar encontrados na literatura administrativa e organiza-
pura e simplesmente a utilidade do "tipo ideal" de cional, mas, aparentemente, são os aspectos normativos
burocracia para a análise organizacional, até mesmo que recebem maior atenção".lZ Para evitar esse viés o
negando seu valor cientifico enquanto construção es- grupo preferiu definir operacionalmente as 64 escalas,
clarecedora da realidade. O grupo, porém, preferiu tes- acreditando que dessa forma seria possível testar cien-
tar o não testável. De qualquer forma, entretanto, o tificamente os vários fatores entre si. Interessa-nos, por-
trabalho merece ser conhecido tanto pelos que se in- tanto, verificar como o grupo entende as cinco "dimen-
teressam pela sofisticação quantitativa, quanto por sões".
todos aqueles que percebem que, por uma ou outra
Dissertando a propósito de especialização, o grupo
razão, algumas empresas apresentam esta ou aquela es-
refere-se à divisão de trabalho no interior da organi-
trutura e, especialmente, pelos que desconfiam que isto
tem algo a ver com tamanho e tecnologia. Além disso, é zação. Tal divisão implicaria diversos aspectos que
poderiam ser salientados. Assim, o n6mero de espe-
ponto pacifico que o trabalho' do grupo de Aston está
cialidades poderia ser dado por uma soma das funções
entre os maiores empreendimentos da teoria adminis-
trativa. Talvez o interesse que desperte esteja relacio- desempenhadas por especialistas (pessoas que desem-
penham apenas uma função e que não estão na linha
nado em uma afirmação de Jerald Hague e Michael
Aiken, diretamente derivada de Charles Perrow, segun- direta de comando). Para o grupo, tal definição de es-
pecialista é importante pois não é dificil estabelecer a
do a qual "o interesse na tecnologia como variável in-
dependente deriva do reconhecimento de que o processo relação entre pessoal de linha e pessoal de estafe. To-
de trabalho de uma organização fornece os fundamentos davia, entende ainda que é possível distinguir diversas
sobre os quais a estrutura social é construída e, por esta categorias de especialistas, tais como especialistas re-
razão, a tecnologia deve influenciar a natureza daquela lacionados à manutenção do contato da organização
estrutura" .10 com seu meio-ambiente, especíalístas voltados para a
inovação e assim por diante. Aléni do número de es-
Feitas essas considerações, convém salientar que o pecialidades, entende que outro aspecto a ser consi-
nome do grupo deriva do fato do trabalho ter sido derado seria o grau de especialização, que, no seu enten-
realizado a partir da Unidade de Pesquisa em Adminis- der, relaciona-se com a diferenciação de atividades den-
tração Industrial da Universidade de Aston, em Birmin- tro de cada função. Tal aspecto diria respeito à espe-
gham, Grã-Bretanha, à qual estavam relacionados D.S. cificidade e à abrangência decrescente das tarefas desig-
Pugh, D. J. Hickson, C. R. Hinings, K. M. MacDonald, nadas para os diversos papéis. Para o grupo, outros as-
C. Turner e T. Lupton, Foi pressuposto para o grupo o pectos ainda poderiam ser salientados. Seu interesse
fato de que a literatura sobre burocracia levaria a uma maior, contudo, parece permanecer no número de es-
análise da estrutura organizacional em termos de um pecialidades e no grau de especialização.
conjunto de variáveis tais como especialização, pa-
dronização, formalização etc. passiveis de verificação Em termos de padronização, o grupo distingue dois
empírica. Estudos comparativos estabeleceriam os perfis aspectos: padronização de procedimentos e padroni-
organizacionais de acordo com variáveis tais como zação de papéis. O primeiro é visto como aspecto básico
tamanho, propriedade e controle etc., vistas como da estrutura organizacional, que, a seu ver, no que diz
variáveis de contexto. Os perfis também seriam acom- respeito à sociologia política de Weber, distinguiria or-
panhados de estudos comparativos de comportamento ganizações burocráticas e tradicionais de organizações
individual e grupal para que fossem testados "em re- carismáticas. A operacionalização deste aspecto para os
lação clara com os contextos organizacionais". 11 fins da pesquisa, levaram à listagem de quatro cate-
12 gorias de procedimentos: processos de informação, e
transmissão de procedimentos, e processos de opera-
cionalização e implementação de decisões. A padro-
4. VARIÁVEIS ESTRUTURAIS nização dos procedimentos revelar-se-ia pela existência
de regras ou procedimentos suficientemente amplos
No que diz respeito à coleta de dados, propriamente para cobrir todas as circunstâncias e por sua utilização
dita, o grupo entendeu que seus itens deveriam tratar do efetiva e invariável. Assim, mesmo para os casos não
que devia ser feito na organização e não do que era real- previstos, deverão existir regras estabelecendo os
mente feito, como medida preventiva à mterveniência de procedimentos adequados. Já o segundo aspecto diria
percepções dos participantes. Pretendeu-se, com isto, respeito ao grau em que uma organização prescreve a
chegar à taxonomia empiricamente derivada em padronização na definição de papéis e nas qualificações
oposição àquelas de Etzioni, Parsons, Blau e Scott etc. para o cargo, nos titulos dos cargos e símbolos de status,
Para tanto, foram selecionadas cerca de 50 organizações bem como nas recompensas pelo desempenho, dos
de tipos diversos na região britânica de Birmingham. papéis. Na base dessas escalas. são consideradas as
Além de questionários e entrevistas, o grupo apoiou-se: qualificações alcançadas formalmente, por um lado, e
na análise de documentos (a partir da 'seleção de seis aquelas demonstradas através de características de
"dimensões" burocráticas e do posterior abandono de personalidade, por outro. Entendem os pesquisadores
,--, - - ----------
A chamada burocracia plena caracteriza-se pela alta fluxo de trabalho, não estando, nesse caso, a tecnologia
estruturação de atividades e alta concentração de au- relacionada com a estrutura administrativa e hierár-
toridade e, também, pela alta dependência e integração ,quica mais ampla.2o Alguns anos mais tarde o grupo fez
do fluxo de trabalho relativamente baixa em termos de uma nova pesquisa de contexto, com uma amostra que
tecnologia. Por outro lado, apresenta uma alta pa- incluia 14 das organizações anteriormente estudadas,
dronização de procedimentos de seleção e promoção, utilizando uma série reduzida de itens' e variáveis:
além de uma alta formalização na definição de papéis. dependência; tamanho, tecnologia e estruturação de
Na amostra estudada, apenas um setor industrial de um atividades. Tal pesquisa visava testar a validade e con-
departamento governamental cabia nesse setor. Pos- tiabilidade dos instrumentos utilizados, bem como
teriormente, um estudo semelhante feito por outro analisar diacronicamente as referidas organizações. Sua
grupo de pesquisadores identificou esse tipo de es- importância dizia respeito especialmente à confirmação
trutura em organizações estatais ligadas ao sistema ou não da alta correlação anteriormente encontrada en-
ferroviário, à eletricidade, etc. tre tamanho e estruturação de atividades. Todavia,
A chamada burocracia plena nascente, apresenta as verificou-se que as organizações haviam se tomado
mesmas características, embora menos pronunciadas. menores, embora com as atividades mais estruturadas.
Na amostra estudada, colocaram-se nesse grupo quatro A justificativa apresentada pelo grupo de Aston foi a de
organizações: uma empresa de construção civil, uma que a correlação não havia sido desmentida, mas que o
fábrica de abrasivos, um departamento de transportes que havia se tomado claro era que o aumento no ta-
governamental de nivel local e uma fábrica de papel. manho leva realmente à maior estruturação de ativi-
A chamada burocracia de fluxo de trabalho carac- dades, mas que a sua diminuição não implica redução na
teriza-se 'por altos escores na estruturação de atividades estruturação de atividades.
e baixos escores na concentração de autoridade e no O trabalho e as conclusões dos pesquisadores de As-
controle de linha do fluxo de trabalho, .características ton vêm sendo alvo de umnúmero razoável de criticas de
exatamente opostas àquelas da chamada burocracia de natureza conceitual, metodol6gica e operacional. Uma
pessoal. Na amostra estudada, o conjunto caracterizado das criticas mais conhecidas é a de que houve falha na
como burocracia de fluxo de trabalho incluiu as em- definição das variáveis; que os resultados obtidos são
presas maiores enquanto que o segundo conjunto in- tautológicos, uma vez que as variáveis formalização e
cluiu principalmente ôrgãos governamentais. padronização praticamente mediram a mesma coisa,
A chamada burocracia nascente de fluxo de trabalho sendo, assim, evidente a razão dos altos índices de es-
apresenta as mesmas características daquela de fluxo truturação de atividades encontrados. Outra critica
de trabalho, em nivel menos acentuado. Na amostra são conhecida diz respeito ao fato de que existindo 20 em-
organizações consideravelmente maiores em termos presas filiais na amostra, surpreendente teria sido en-
relativos. Já as pré-burocracias de fluxo de trabalho são contrar baixa correlação entre centralização na tomada
caracterizadas por uma estruturação de atividade con- de decisões e perda de autonomia e não, ao contrário,
sideravelmente mais baixa, mantendo as outras carac- como tautologicamente teriam concluído os pesqui-
teristicas da burocracia de fluxo de trabalho, inclusive a sadores. Mais recentemente, Sérgio Mindlin questinou a
utilização de mecanismos impessoais de controle. Na variável contextual dependência, que embora definida
amostra, são menores que as de classe anterior, mas sig- em termos muito amplos, acaba ficando reduzida à
nificativamente mais independentes, revelando altos es- dependência em relação à matriz, ou seja, tratando-se
cores de concentração de propriedade e controle. 'de dependência intra-organizacional. Para Mindlin, tal
fato implica um viés nos resultados obtidos. 21
Finalmente, as chamadas organizações implicitamen-
te estruturadas são as que apresentam alta centralização
de decisões e padronização de procedimentos de seleção
e promoção. Os escores de controle de linha do fluxo de 6. CONSIDERAÇÕES ADICIONAIS
trabalho são altos, mas a estruturação de atividades é
consideravelmente mais baixa do que aquela da bu- O empiricismo britânico parece ter fornecido à teoria
rocracia plena, da burocracia plena nascente e da das organizações a operaclonalízação de alguns con-
burocracia de pessoal. Nessa classe incluiriam-se uma "ceitos presentes no quadro maior da teoria geral dos sis- 15
cadeia de varejo, uma cadeia de sapatarias, uma loja de temas de Ludwing von Bertalanffy, a qual, po âmbito da
departameritos, uma companhia de seguros, uma di- organização passa a expressar-se enquanto teoria da
visão de pesquisa, uma fábrica de componentes indus- contingência, amplamente divulgada nos Estados
triais, uma fábrica de brinquedos e uma empresa de Unidos e países dependentes e periféricos, na primeira
construção. 19 metade da década de 70. Sem prejuizo das teorizações e
A variável tecnologia mereceu outro estudo do grupo das pesquisas de campo realizadas na América do Nor-
de Aston, que pretendeu medir a relação particular en- te, o trabalho britânico impõe-se por várias razões, entre
tre tecnologia de operações e estrutura. Foram anali- as quais seu espirito acadêmico e o cuidado na mani-
sadas 31 unidades pertencentes à amostra original. Os pulação de técnicas e instrumentos de pesquisas. Divul-
resultados obtidos foram comparados àqueles a que ga-se, rapidamente, pelo interesse que representa para
chegou Joan Woodward. De um modo geral, chegou-se à os profissionais do desenvolvimento organizacional en-
conclusão de que "quanto menor a organização, mais tre outros, na medida em que suas conclusões podem ser
sua estrutura é influenciada pelos efeitos imediatos da postas a serviço dos apólogos da "metaburocracia", a
tecnologia de operações; quanto maior, mais . esses partir de algumas generalizações e artifícios te6ricos.
efeitos são confiados a variáveis tais como proporções Nesse sentido, a seriedade com que Jean Woodward
empregadas. em atividades especificamente ligadas ao conduziu .seu·trabalho é ressaltada pelo cuidado me-
Estrutura e teCnologia
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todol6gico que inclui a recusa da generalizaçio. De 8 Burns. Tom & Stalker. G.M. The management oi innovation, Tavis-
qualquer forma, pelo trabalho desta, de Tom Bums, e tock Publications. 1968. p, 262.
do grupo de Aston, a par dos conhecidissimos estudos 9 Burns. Tom & Stalker, G.M. op. citop. 1S4
do Tavistock Institute22 os britânicos colocam-se na
vanguarda da teoria das organizações centrada nas 10 Hague. Jerald & Aiken Miehael. Routine. technology. social struc-
ture and organization goals. Administrative Science Quarterly. Ithaca,
noções de sistema e de estabilidade. relegando a segun- v. 14. n, 3. p, 367. Sept. 1969.
do plano problemas de poder. controle social e conflito.
11 Pugh. D.S.: Hiekson. D.J.: Hinings. c.R.; MaeDonald. K.M &
Nesse tipo de visão à critica não representa um elemento Lupton. T. A conceptual scheme for organization analysis. Adminis-
especialmente importante. face à impaciência com que trutive Scienc ••Quarter(I •. lthaca. V. 8. n. 3. p. 289. Dec, 1963.
são esperados os resultados desejados. •
12 Pugh, D.S.: Hickson, D.J.; Hinings. C.R.; MacDonald. K.M.; Tur-
ner. C. & Lupton, T. op. citop. 301.
13 Pugh. D.S.: Hickson, D.J.; Hinings, C.R.; MaeDonald. K.M.;
Turner. C. & Lupton, T. op. citop. 310.
7 Woodward. J08n. Tecnology. management. control and arganization 22 Veja Motta. F.C.P. Teoria geral da administração: uma intro-
behavior. In: Woodward & Reeves. op. citop; 242. durão. são Paulo. Livraria Pioneira Editora. 1974.
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