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Cyntya Duarte Borges

Território de Idaho, 1868...


Embora Logan Youngblood tivesse avisado ao Forte sobre um iminente ataque
indígena, ele se recusou a levar o Exército até o acampamento de Lobo da Noite. Então
ele foi espancado e deixado preso no Forte abandonado.
Victoria Amory saiu de Boston com uma má reputação para aceitar uma posição de
tutora em Trinity Falls. Ela foi deixada para trás pelo comboio em que viajava por se
recusava a se livrar de seus preciosos livros.
Quando Victoria liberta Logan – um suposto bandido – de sua prisão, ambos terão
de se unir para fugir do ataque indígena. Durante o trajeto até Trinity Falls, Victoria
planeja reformar o caráter daquele “bandido”, sem saber que ele é o presidente do
Banco local, o prefeito interino e seu futuro empregador.
CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy

PAT TRACY mora numa comunidade rural na periferia de ldaho Falls. Seu amor
por romances históricos começou quando ela contava treze anos e leu ...E o Vento
Levou. Depois de ler a história de Rhett e Scarlett, Pat, imediatamente, escreveu
uma seqüência na qual o casal viveu feliz para sempre. Na opinião de Pat, existe uma
magia em romances históricos que não pode ser encontrada em lugar algum. Ela
aprecia ler os trabalhos de muitos escritores populares e talentosos que
compartilham essa magia com seus leitores.

Título Original: Beloved Outcast (1996)

Copyright @ 1996 by Pat Tracy Publicado originalmente em 1996


pela Harlequin Books, Toronto, Canadá.

Todos os direitos reservados, inclusive o direito de reprodução


total ou parcial, sob qualquer forma.

Esta edição é publicada por acordo com a Harlequin Enterprises B.V.

Todos os personagens desta obra, salvo os históricos, são fictícios. Qualquer outra
semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência.
Tradução: Cecília Florence Borges Rizzo

EDITORA NOVA CULTURAL


uma divisão do Círculo do Livro Ltda. Alameda
Ministro Rocha Azevedo, 346 — 112 andar
CEP 01410—901 — São Paulo — Brasil.

Copyright para a língua portuguesa: 1997

CÍRCULO DO LIVRO LTDA.

Fotocomposição: Círculo do Livro

Impressão e acabamento: Gráfica Círculo.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy

CAPÍTULO UM

Território de ldaho, 1868.

— Sente-se, Youngblood.
Logan Youngblood surpreendeu-se com o revólver apontado para o peito.
— Esta não é bem a recepção que eu esperava, coronel Windham.
O oficial da cavalaria fez um gesto com o cano da arma em direção à cadeira,
diante da escrivaninha.
— Segundo suas próprias palavras, você cavalgou dois dias e uma noite para nos
avisar sobre um ataque ao forte. Sem dúvida, pode fornecer os detalhes.
A única evidência do desagrado do coronel, além da arma assestada, era a frieza
dos olhos azuis.
Logan olhou para os outros três homens presentes. Eram tenentes envergando o
uniforme azul-marinho da cavalaria. A expressão constrangida dos três indicava a
perplexidade causada pelo comportamento do comandante.
Logan aproximou-se da cadeira. Até descobrir o que se passava, aceitaria o
tratamento estranho de Windham. Sem querer, pensou em Madison e no que
aconteceria a ela, caso o revólver servisse seu propósito.
A chegada tumultuada de Madison em sua vida prenunciava uma série de
complicações. Uma delas era a necessidade de se conseguir uma professora
competente para educar a menina de doze anos.
— Um instante. Tire a arma dele, Lawson — ordenou Windham.
Logan manteve-se imóvel, enquanto o Colt 44, que passara a usar desde a vinda
para o oeste, era tirado do coldre. Não sabia quais eram as intenções de Windham,
mas tinha certeza de que o coronel não o mataria diante de três testemunhas.
Calmamente, sentou-se.
— Amarrem esse sujeito na cadeira — foi a ordem seguinte do comandante.
Logan pulou em pé.
— Chega, coronel. Vim procurá-lo para avisar que várias tribos estão se
preparando para atacar o forte. Como já fiz isso, vou-me embora e...
O ruído do gatilho sendo destravado o interrompeu e Logan voltou a olhar para a
arma.
— Não gosto de amigos dos índios, Youngblood. Em minha opinião, eu faria um
favor ao território inteiro se o matasse agora. Mas como sou civilizado, tenho de
obedecer a lei. Portanto, vou prendê-lo sob jurisdição militar por ser cúmplice de
índios assassinos. Agora, com todos os diabos, sente-se!
O revólver permaneceu firme. Quatro soldados armados contra um civil
desarmado não era uma situação favorável. Mas como havia sobrevivido a inúmeras

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
batalhas na Guerra Civil e aos primeiros e perigosos meses no Território de Idaho,
Logan conservou-se tranqüilo. Sentou-se e sentiu alívio por não ter adiado as
providências quanto ao futuro de Madison. Graças a Deus, seu bom amigo e sócio,
Martin Pritchert, já havia contratado uma professora no leste para educar a menina.
Como Logan fosse seu tutor legal, ela não corria o risco de ficar desamparada, se algo
acontecesse a ele.
Foi preciso uma alta dose de auto disciplina para Logan se deixar amarrar em
volta dos pulsos e dos tornozelos.
— Seu prazo esgotou, Youngblood. Quero saber já onde aqueles selvagens
assassinos estão acampados.
Logan observou a expressão intransigente de Windham. Embora achasse
impossível convencê-lo de que nem todo selvagem era assassino, precisava tentar.
— O povo de Lobo da Noite está em paz. Eles não tiveram nada a ver com o
ataque às famílias do comboio de carroções. Também não tomarão parte no ataque ao
forte.
Windham virou-se de costas e pôs o revólver na escrivaninha. Em seguida, girou o
corpo e deu um murro no queixo de Logan, cuja cabeça vergou para trás.
— Você deu a resposta errada, Youngblood.
— É a única que tenho para dar — disse Logan, ao olhar para os outros três
oficiais.
— Saiam daqui e me deixem sozinho com o prisioneiro — Windham ordenou com
olhar rancoroso.
— Coronel, o senhor acha boa idéia? — indagou um dos tenentes, com voz incerta.
— Ele está amarrado, Lawson. Não há perigo de se soltar e me provocar algum
mal.
— Mas senhor, ele veio nos avisar do ataque de Blackfeet e de outras tribos.
— Ele não quer nos dizer onde encontrá-las. Quero acabar com todos os homens,
mulheres e crianças pagãs que infestam o Território de Idaho.
— Mas o sr. Youngblood é presidente do Banco Territorial — argumentou Lawson,
tentando aplacar o comandante.
— Você está questionando uma ordem, soldado?
— Não, senhor! — respondeu Lawson, ao seguir os outros dois para a porta.
Quando esta se fechou após a saída dos três, Windham disse:
— Muito bem, Youngblood, agora estamos só eu e você aqui.
Logan olhou para os braços amarrados e respondeu:
— Devido às circunstâncias, o senhor deve me desculpar por não lhe apertar a
mão.
— Sempre uma resposta incisiva e sagaz — o coronel resmungou, ao apanhar o
revólver da escrivaninha. — Você provoca uma impressão profunda nas mulheres, não e
verdade?
— O quê?! — Logan exclamou, certo de não ter entendido bem.
— Pirata Ardente é como o chamam — acrescentou Windham.
— O quê?! — Logan repetiu.

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Dessa vez, sabia ter ouvido corretamente. Pirata Ardente? Por Deus, sobre o que
o homem arengava? Ele nunca navegara pelo mar e...
— Você não sabia? É assim que as poucas mulheres honestas de Trinity Falls o
chamam, quando comentam suas aventuras de alcova com mulheres de má reputação.
Perplexo, Logan sentia-se como se tivesse deixado seu mundo ordenado e racional
para entrar num pesadelo grotesco. Que interesse este empolado e preconceituoso
oficial da cavalaria podia ter em sua vida amorosa?
— Athena é uma delas.
A sensação de perigo dominou Logan.
— Athena? — ele repetiu.
— Exato. Minha lindíssima e infiel esposa. Você se lembra dela. Afinal, não faz
ainda uma semana que a levou para a cama.
A acusação esclareceu a situação estranha. Infelizmente, também trazia a
lembrança incômoda da mulher apalpando-o quando o marido estava de costas. Num
tom cauteloso, Logan disse:
— Então é isso? Você pensa que estive com sua mulher?
— Não negue. Sua expressão o desmente. Vi bem como você olhou para ela. Todos
os homens a fitam desse jeito e a desejam. Mas até você surgir, Athena me era fiel.
— O senhor perdeu o juízo. Não toquei em sua mulher. Maldição, só a vi umas
poucas vezes e o senhor estava junto em todas as ocasiões.
Isso era verdade, exceto por um detalhe. A sra. Windham quase lhe provocara
um enfarte ao chocar-se contra ele e apalpá-lo. Logan ficara tão atônito com o contato
que, a custo, reprimira uma exclamação.
Uma outra lembrança surgiu-lhe na mente. Seis anos atrás, tinha ouvido os
protestos do irmão mais velho, a quem amava e admirava. Burke havia negado ter
seduzido a noiva de Logan. A diferença entre o passado e o presente era o fato de
Burke ter mentido e Logan, não.
O coronel riu com sarcasmo.
— Devo acreditar nas negativas do Pirata Ardente?
— Não posso ser responsabilizado pela maledicência de mulheres frustradas.
— Athena não é frustrada!
— Não ligo a mínima pelos detalhes de sua vida conjugal, coronel. Vim ao forte a
fim de avisá-lo de um ataque iminente dos índios. A tribo de Lobo da Noite foi
dizimada e ficou reduzida a uns poucos velhos, algumas mulheres e crianças. Eles não
representam uma ameaça ao senhor. O melhor será fazer planos para enfrentar os
Shoshone e os Blackfeet, que estão dispostos a guerrear.
Como se tivesse recebido um golpe, Windham gritou:
— Não se atreva a me dar ordens, Youngblood!
— Aceite-as como sugestões — Logan respondeu, com expressão carrancuda. —
Como é, vai me desamarrar agora?
— Desamarrá-lo?! Você deve estar insano ao pensar que eu faria isso.
Logan sabia que um dos dois estava louco. Infelizmente para ele, era o homem
com o revólver empunhado.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy

CAPÍTULO DOIS

Victoria Amory enrolou as rédeas largas em volta dos dedos e as puxou com toda
a força.
Os bois pararam, fazendo o carroção coberto estalar. Ela esticou o pescoço e
vasculhou o panorama em todas as direções, mas não viu sinal algum de habitação
humana na luxuriante vegetação do Território de Idaho. Também não viu o forte que,
segundo informações, deveria estar nessas redondezas. Após viajar quatro dias
sozinha pela trilha, calculava estar a uns noventa quilômetros de Trinity Falls, onde o
novo patrão e a nova vida a aguardavam.
A fim de enxergar melhor, ficou em pé.
— Alguém pode me ouvir? — gritou.
A única resposta foi o farfalhar dos pinheiros e dos álamos.
Tolice esperar algo mais, mas sentiu-se desapontada. Havia se enchido de
esperança ao aceitar a oferta de Martin Pritchert de um emprego como professora de
uma menina. Um novo começo tinha lhe parecido tentador. O propósito de deixar
Boston havia pesado mais do que as dúvidas quanto à decisão. Com a reputação em
frangalhos, sua presença no seio da família tinha se tornado constrangedora.
Não queria pensar muito na verdade dolorosa. Nenhum argumento seu tinha
convencido os pais de que a filha mais nova, Annalee, podia se casar antes da mais
velha.
Victoria suspirou e instigou os bois a continuar em frente. Estava com vinte e
quatro anos e ainda não tinha encontrado um homem com quem quisesse se casar. Por
causa da maneira antiquada de pensar dos pais, sua intenção era encontrar um marido
em Trinity Falls.
Talvez não precisasse se casar antes de Annalee, refletiu. Quem sabe os pais não
desistiriam da atitude arcaica, caso ela ficasse noiva? Por se encontrar a quase três
mil quilômetros de casa, ela poderia se atrever a escrever cartas um tanto criativas.
Naturalmente, não contaria nenhuma mentira. Apenas exageraria certas situações.
A roda direita da frente passou por uma vala e o carroção estremeceu. Victoria
foi atirada para cima, mas caiu de volta no banco. Isso a levou a pensar de novo nas
circunstâncias imediatas.
Sua grande aventura no oeste não estava correspondendo às expectativas. Quem
haveria de supor que o comboio de carroções continuasse em frente sem ela só porque
não conseguia manter a mesma velocidade dos outros? Ficara chocada com o fato de o
chefe do comboio não entender que ela não podia se livrar da carga preciosa, a fim de
seguir mais depressa.
Victoria não guardava rancor contra o homem. Ele e os outros não percebiam

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como lhe era impossível separar-se de seus livros queridos. Alguns, de Jane Austen e
James Fenimore Cooper, eram primeiras edições.
No início, ela não se sentira alarmada por ser deixada para trás. A trilha era
larga e bem marcada pela passagem de centenas de carroções. Havia alimentos
suficientes e o rio Ruby, ao longo da trilha, fornecia água para ela e para os bois. Além
do mais, o chefe do comboio tinha lhe garantido que o forte ficava perto. Tão logo o
alcançasse, pediria para um grupo de soldados acompanha-Ia até Trinity Falls.
Mas a solidão começava a enerva-Ia. Isso sem falar nos guerreiros indígenas,
sobre os quais ouvira tantas histórias. Ela se sentiria mais segura se tivesse uma arma
de fogo. Infelizmente, ela provocara um acidente no quinto dia de viagem pela trilha e
o chefe do comboio tinha lhe confiscado a carabina. O homem alegara que Victoria, de
posse de uma arma de fogo, constituía uma ameaça não só a si mesma como às outras
pessoas também.
Por Deus, não podiam culpa-Ia por atirar no pé do sr. Hyrum Dodson. O homem
tinha rondado seu carroção de madrugada e ela o tomara por um urso. Em sua opinião,
tratava-se de um erro compreensível. Mas o sr. Dodson e o chefe do comboio
pensavam de maneira diferente.
De maneira geral, as pessoas mostravam-se intolerantes com os pequenos
percalços da vida, considerou Victoria. Se não fosse por isso, ela jamais teria vindo
parar no oeste. Tudo tinha começado quando um dos pretendentes da irmã fora
apanhado em seu quarto com a calça abaixada. Ninguém havia acreditado que o pobre
rapaz escalara a treliça, do lado de fora, a fim de oferecer uma rosa a Annalee.
Tratava-se de mero acidente ele ter entrado pela janela errada.
Nesse momento, Victoria estava mudando de roupa e encontrava-se apenas com a
camisa e os calções. Trocaram olhares assustados. Mas antes de o sr. Threadgill
retornar pela janela, um marimbondo tinha saído da rosa, circulando-o duas vezes e
entrado pela perna da calça dele.
Sem pensar, Victoria havia puxado a peça para baixo e matado o inseto com
pancadas da escova de cabelo.
Se ao menos Threadgill não tivesse gritado...
As visitas da mãe, inclusive a esposa do reverendo Golly, ouviram os gritos e
subiram correndo ao segundo andar. Ser apanhada seminua e ajoelhada diante do
homem com a calça abaixada havia sido o momento mais mortificante da vida de
Victoria.
Nenhuma das mulheres se mostrara interessada em suas explicações.
Escandalizadas, elas tinham ido embora e espalhado o boato mais ultrajante sobre o
acidente inocente. Numa simples tarde, a reputação de Victoria havia ficado perdida.
O sr. Threadgill, talvez com medo de ser forçado a se casar com ela, partira para a
Europa.
Até agora, ela não se conformava com o fato de uma vida inteira, de
comportamento prudente e ajuizado, ser arruinada por uma ocorrência infeliz.
O rio sinuoso forçava a trilha a fazer mais uma curva. Ao terminá-la, Victoria
avistou uma grande construção, a centenas de metros de distância. Seria o forte? Não

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tinha importância. Em seu estado, até um bar seria bem-vindo.
Pessoas viviam lá.
Ao chegar mais perto, viu tratar-se, de fato, do forte.
Sentiu um alívio imenso. Estava segura. Firmou os olhos e tentou ler a placa de
madeira sobre a imensa porteira.
Forte Brockton.
Victoria foi dominada pela euforia. Um a um, os músculos do pescoço e dos
ombros relaxaram.
Estranhando ver a porteira aberta, parou. Nenhum homem uniformizado a
observava da torre de vigia. Nenhum soldado acorreu a fim de levar o carroção para a
segurança dentro das muralhas. Nenhum som de ocupação do lugar alcançava-lhe os
ouvidos. Sentiu um arrepio de alarme.
— Olá! — gritou, mas o vento abafou sua voz.
Instigou os bois a prosseguir em frente. A sensação de perigo, provocada pelo
farfalhar dos pinheiros e dos álamos, a forçava a procurar a segurança relativa do
forte vazio.
Victoria percorreu os olhos pelo pátio deserto. Construções compactas, numa
mistura de escritórios e habitações unidos por parede-meia, davam-lhe a impressão de
um pequeno povoado, rodeado por muralhas de proteção.
Todas as portas estavam abertas.
— Olá! — tornou a gritar, mas o silêncio foi a resposta.
Ela mal podia acreditar que uma fortaleza desse tamanho, construída para
abrigar centenas de pessoas, tivesse sido abandonada.
Victoria desceu do carroção, lutando contra o mal-estar. Os bois estavam
inquietos. Com certeza, sentiam o cheiro da água nas cisternas baixas, em frente dos
currais vazios. Estremeceu ao lembrar-se de que os animais precisavam ser
desatrelados a fim de matar a sede. Embora exausta, só lhe restava executar o
serviço. A vida dos bois valia tanto quanto a sua.
Enquanto lidava com os arreios, admitiu que a nova vida no oeste era bem mais
dura do que tinha imaginado, ao assinar o contrato enviado pelo sr. Pritchert.
Naturalmente, tinha feito isso no conforto de sua casa em Boston. Como esta estava
longe!
Quando soltou os animais, finalmente, Victoria foi inspecionar os prédios.
Escritórios e residências mostravam indícios de terem sido abandonados às pressas.
Gavetas abertas e remexidas, camas fora do lugar, roupas espalhadas, entulhavam os
aposentos.
No escritório maior, tinha-se a impressão de que um furacão passara por lá.
Mapas e papéis estavam jogados por todos os cantos. No chão, via-se ainda uma
cadeira tombada e metros de corda.
Não importava o quanto estivesse cansada, ela precisava pensar. Que ameaça
terrível havia forçado o comandante a evacuar o forte? O silêncio opressivo
aumentava-lhe o nervosismo. Pela primeira vez na vida, não sabia o que fazer. Parecia
loucura permanecer num lugar abandonado por um exército armado.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Com os ombros curvados, Victoria voltou ao pátio. Ao se aproximar do carroção,
mal notou uma pequena e baixa prisão de madeira. Estava cansada e com fome,
combinação propícia a se tomar decisões erradas. Talvez a situação não parecesse tão
preta se estivesse com o estômago cheio.
Em questão de minutos, Victoria estava acampada no centro do pátio. No início da
viagem, ela havia aprendido os detalhes para se acender uma boa fogueira.
Para preparar bolinhos, precisava apenas de farinha, sal, água e gordura. Pouco
depois, já os fritava. A atividade deu-lhe a sensação de estar no controle da situação.
As sombras já envolviam as construções, delineadas pela luz da fogueira, e o
aroma dos bolinhos impregnava o ar. Com um garfo de cabo longo, ela os virou na
gordura.
— Com todos os diabos, quem é você?
A voz rouca e masculina vibrou no ar à volta de Victoria. Ela pulou para trás e
percorreu os olhos pela escuridão, na esperança de ver o intruso.
— Eu lhe fiz uma pergunta — a voz áspera disse, ralando-lhe os nervos. —
Windham o mandou aqui para me soltar?
Soltar?
Seu olhar volveu-se para a pequena prisão a poucos metros da fogueira.
Assustada, ela percebeu que, afinal, não estava sozinha.
O odor da massa frita chamou-lhe a atenção. Os bolinhos estavam prestes a
queimar e isso ela não deixaria acontecer. Segurando o cabo da frigideira com a ponta
da anágua, tirou-a do fogo.
— Quem está aí?
Victoria teve a impressão de detectar um misto de desânimo e raiva na voz
masculina. Depois de transferir o último bolinho da gordura para um prato, aproximou-
se da prisão. Ficou aliviada ao ver uma barra de metal, firmada em dois suportes de
ferro nas laterais da porta. Isso impedia que o preso a arrombasse. Sem dúvida, só o
mais empedernido e desprezível dos vilões poderia ser trancado numa cela tão
horrorosa.
Mas ser abandonado a uma morte lenta e dolorosa de fome e sede...
Seu instinto humanitário a instigou a soltá-lo. Que crime tão hediondo fora
cometido para merecer tal castigo?
Assassinato, a mente lhe respondeu imediatamente.
Um assassino talvez fosse entregue a esse destino cruel.
De repente, Victoria deu-se conta de que não era mais só responsável pelos bois,
mas também pelo prisioneiro desconhecido. Se a cavalaria não voltasse ao forte,
caberia a ela resolver se este homem viveria ou morreria.
— Com todos os diabos, responda! Quem é você? — gritou a voz.
Victoria desviou o olhar da porta para as mãos trêmulas. Por mais pena que
tivesse do homem, seria uma louca se o soltasse antes de descobrir o crime cometido
por ele. Também não seria sensato deixá-lo perceber que se tratava de uma mulher.
Os homens se achavam superiores a elas.
Tossiu duas vezes e engrossou a voz o quanto lhe foi possível.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— A pergunta, moço, é quem é o senhor e o que fez para terminar nesta situação
terrível?

CAPÍTULO TRÊS

Logan apurou os ouvidos para entender a pergunta. Machucado e com o corpo


todo dolorido graças à sova ordenada por Windham, ele havia perdido a noção de há
quanto tempo estava preso. Tinha bebido o resto da água umas horas atrás.
— Moço, perguntei quem é o senhor — a voz estranha voltou a soar.
Logan sacudiu a cabeça a fim de clarear a mente. Devia ter passado a maior parte
do dia inconsciente. Tinha sido o aroma delicioso de algo cozinhando que o pusera
alerta. Podia jurar que alguém estava acampado perto da porta da cela. A boca
encheu-se de água. Comida quente.
— Meu nome é Logan — respondeu ele, aliviado por não estar tendo uma
alucinação. — Logan Youngblood. Que tal me soltar daqui e me oferecer um prato de
comida? Aliás, prefiro beber água antes.
A única resposta foi o silêncio. A frustração e a possibilidade de tornar a perder
os sentidos e não voltar mais a si foi o que acabou com o resto da paciência de Logan.
— O que está esperando? Abra esta maldita porta! — gritou ele.
— Não acho que seja boa idéia. Os soldados deviam ter alguma razão para
prendê-lo aí.
Furioso, Logan mal acreditou no que ouviu.
— Você quer dizer que vai me deixar morrer aqui?
Fez-se novo silêncio.
— Isso fará de você um assassino — Logan argumentou.
— Não fui eu quem o pôs aí.
— Quando eles me prenderam, tiraram meu revólver. Estou desarmado e prestes
a desmaiar.
Mais silêncio.
— Mesmo estando sozinho, você deve ter uma carabina ou uma pistola. Como
posso ser uma ameaça para você? — Logan insistiu.
Silêncio.
— Diga alguma coisa, seu desgraçado.
— O senhor pragueja demais.
— Diga algo relevante.
— Não vou soltá-lo até...
— O inferno congelar? — interrompeu ele.
— O senhor está ferido?
Logan detectou uma nota de preocupação nas palavras.
A esperança cresceu, ao mesmo tempo em que as pernas fraquejavam.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Estou com umas costelas quebradas e uma dor de cabeça infernal — admitiu
ele, em tom cansado.
— Sinto muito.
— Então, me solte.
— O que o senhor fez?
Embora fosse uma pergunta razoável, Logan perdeu o resto do controle.
— Que importância tem isso? Já disse que estou fraco demais para lhe causar
problemas.
— O senhor pode estar mentindo. E se tiver um cacete e me atacar quando eu
abrir a porta? — indagou a voz baixa.
— Você atira em mim.
Novo silêncio. Uma idéia absurda ocorreu a Logan.
— Não me diga que você não tem uma arma de fogo!
Silêncio.
Logan praguejou.
— Que tipo de idiota vagueia pelo Território de Idaho desarmado?
— Felizmente, há um canhão aqui no pátio.
De repente, Logan imaginou quem o recém-chegado podia ser.
Um menino.
Isso explicava as flutuações da voz baixa, a relutância em ouvir pragas e o medo
de soltá-lo. Logan foi tomado por uma onda de simpatia. Muitos meninotes apareciam
em Trinity Falls na esperança de encher os bolsos com ouro. Para eles, todo estranho
era um inimigo em potencial.
— Escute, menino. Você não precisa me soltar. Basta passar a comida pela
janelinha na parte de baixo da porta. E eu lhe dou meu cantil para você encher de
água.
— Por que me chamou de menino?
— Acertei em cheio, não é?
— Não sou criança.
— Tenho certeza de que você já viajou bastante e enfrentou muitas dificuldades.
Agora, que tal me dar comida e água?
A janelinha de metal abriu de repente, mas luz alguma passou por ela. Logan
percebeu já ter anoitecido. Apalpou em volta até encontrar o cantil. Passou-o pela
abertura e ficou à espera.
— Pegue aqui — disse a voz áspera.
Logan enfiou a mão pela janelinha e recebeu algo morno e de odor apetitoso. Ao
dar a primeira mordida, as papilas gustativas estimularam a produção de saliva.
Levando-se em consideração sua exigência no restaurante do Prairie Rose, sua fome
devia estar em estado avançado para se deliciar com algo tão modesto. Naturalmente,
quando morava com os Shoshone, tinha aprendido a apreciar alimentos simples.
Instantes depois, o cantil foi empurrado pela janelinha. Sentado no chão e com as
costas apoiadas na parede, Logan inclinou a cabeça para trás e sorveu o líquido
revigorante. Jamais tinha saboreado algo tão delicioso, exceto...

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Ei, menino. Por acaso você não tem aí uma garrafa de uísque?
— De jeito nenhum! E pare de me chamar de menino.
— Não me diga que seus pais não aprovam um gole de bebida alcoólica de vez em
quando.
— Isso mesmo.
Logan não se surpreendeu.
— Já comi meu bolinho. Você tem mais? — perguntou, ao estender a mão para
fora.
Recebeu mais três e, se fosse um homem religioso, teria gritado aleluia.
— Você cozinha muito bem, menino. Faz isso para ganhara vida? — indagou entre
dois goles de água. — Qual é seu nome?
A resposta demorou um pouco.
— Amory.
Apesar das circunstâncias desesperadoras, Logan descobriu que ainda podia
sorrir.
— Esse é o primeiro ou o último nome?
— Ultimo.
— Que tal a inicial do primeiro? Ou prefere ser chamado por Amory?
Silêncio.
— Você não fala muito. Tudo bem comigo, Amory — disse Logan, sentindo-se
satisfeito e dominado por uma imensa fadiga.
Novo silêncio.
Sonolento, ele fechou os olhos.
— V!
O grito estridente o fez reabrir os olhos e rir. As costelas quebradas
protestaram. Fazendo uma careta, ele deitou-se numa enxerga de palha. Achar graça
em algo na presente situação sugeria que ele, talvez, continuasse a viver.
— V. A. então — comentou.
Precisava avisar o menino de que a voz dele afinava cada vez que se irritava.
Faria isso depois. Com algum alimento no estômago, mas exausto demais, dormiria um
pouco. Mais tarde, convenceria o rapazinho a soltá-lo.
Victoria afastou-se da pequena prisão. Tentava não se sentir culpada por deixar
o homem lá dentro. Lamentava a situação de Logan Youngblood, mas não o suficiente
para arriscar a própria vida soltando-o. Primeiro, precisava descobrir qual fora o
crime dele para receber castigo tão cruel. Apenas uma pessoa ignorante não
perceberia que ele tinha sido preso lá para morrer. Os pecados do homem deviam ser
muito negros mesmo.
Victoria arrumou o acampamento e, pouco depois, deitava-se entre os cobertores
estendidos sob o carroção. Embora o forte tivesse muitas camas vazias, ela não se
atreveria a dormir numa delas. A sensação estranha da presença de seus ex-ocupantes
ainda a dominava.

— Amory, levante-se e venha cá!

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A ordem ríspida acordou Victoria e a fez sentar-se depressa, batendo a testa no
fundo do carroção. Sentiu a dor repercutir pela cabeça toda. Esperou que ela
passasse, antes de engatinhar para fora.
— Mexa-se, Amory! Temos de sair daqui!
Victoria dirigiu um olhar sombrio para a prisão.
— Eu estava dormindo — respondeu, com voz sonolenta.
— Preste atenção, menino. Se você não me soltar logo, nós dois vamos servir de
repasto para os abutres.
Na luz da manhã, a pequena cela de madeira revelava ser uma construção rústica
e grosseira. O interior devia ser miserável e amedrontador. Victoria dominou uma
onda de pena, por Logan Youngblood. Não podia se esquecer tratar-se de um
malfeitor, sofrendo o castigo merecido.
— Acalme-se, sr. Youngblood. Nenhum abutre irá comê-lo enquanto estiver preso
aí dentro.
Esperando pela reação do prisioneiro, Victoria deu-se conta de ter esquecido de
disfarçar a voz de mulher.
— Ei, menino, quantos anos você tem?
Ela tossiu, limpou a garganta e tentou falar com voz baixa.
— Tenho idade suficiente.
— Dez? Doze?
— Não é de sua conta.
— Bem, vou tentar simplificar as coisas. A qualquer momento, grupos de índios
invadirão o forte. Se o exército dos Estados Unidos não achou prudente esperá-los,
você não considera um grande risco continuar acampado aqui?
Victoria sentiu um arrepio e olhou para a porteira aberta. Devia tê-la fechado.
— Amory, os índios planejam queimar e reduzir o forte a cinzas. Eles não
pretendem levar nenhum prisioneiro. A menos que você prefira ser atingido por uma
seta em chamas, sugiro sairmos daqui já.
— Como o senhor sabe que eles vão atacar?
— Isso não importa. Nós precisamos...
— O que quer dizer com nós? Já lhe disse que não vou soltá-lo exceto se me
contar qual foi seu crime — Victoria afirmou, odiando o novo medo provocado pelas
palavras de Logan Youngblood.
— Você acredita mesmo ter escolha?
— Naturalmente.
— Vá para o inferno! Um menino teimoso não vai afugentar um bando de índios
dispostos a se vingar.
— Já expliquei que não sou...
— Tenho ouvidos, Amory. Por sua voz, você deve estar com dez anos. Não sei o
que faz vagando sozinho pelo Território de Idaho, mas se pretende fazer onze, acho
bom abrir esta porta já.
— Por que o senhor não me contou isso ontem à noite? — Victoria indagou,
desconfiada que Youngblood inventava a história a fim de forçá-la a soltá-lo.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Eu estava morto de fome e cansado demais. Depois de me alimentar, devo ter
dormido.
— E agora de manhã, acordou com a lembrança repentina de que o forte vai ser
atacado?
— Isso mesmo, menino. Precisamos chegar a Trinity Falls sem perda de tempo.
Trinity Falls, exatamente aonde ela queria ir.
— Por que o prenderam, sr. Youngblood? — Victoria indagou, imaginando se
deveria acreditar nele.
— Eu trouxe o aviso sobre o ataque.
— E o trancaram aí por causa disso?!
— Não exatamente.
— Então o que, exatamente?
— Eles queriam saber como eu estava a par dos planos dos índios.
— Um ponto razoável.
— Eu lhes contei que Lobo da Noite tinha me avisado.
— Lobo da Noite?
— É um conhecido meu.
— Não diga! Como se conheceram? — indagou Victoria, intrigada com o fato de
alguém contar com um índio em seu círculo de relacionamentos.
— Isso não tem importância.
— De fato, não. Por que Lobo da Noite o preveniu sobre o ataque?
— Ele crê que um novo derramamento de sangue só vai dificultar mais a
convivência de seu povo com o homem branco.
— Entendo.
Victoria pertencia ao grupo minoritário de simpatizantes com a causa indígena.
Para ela, os nativos eram um povo encantador e livre que, rapidamente, perdia as
terras que o abrigara através de gerações. Seria tão bom se cessasse a violência
entre os colonos e os índios. Estes mereciam a reserva de seus territórios.
— O senhor ainda não me disse por que o prenderam.
— Eu me recusei a levar o coronel Windham ao acampamento de Lobo da Noite.
— A troco de que fez isso?
— Já lhe disse. A tribo de Lobo da Noite está em paz.
— Então, eles não têm nada a temer.
— Você não pode ser tão ingênuo para acreditar nisso.
— Sou esperto o suficiente para não acabar preso.
— Mas estúpido o bastante para vir parar em território de índios em pé de
guerra.
— Sr. Youngblood?
— O quê?
— O senhor se sente bem aí na cela?
— De jeito nenhum!
— Uma pena, pois neste passo, vai continuar aí.
— Amory, o tempo está correndo.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Uma pancada no interior da porta provocou a revoada de mariposas. Victoria
recuou, gritando:
— Pare com isso!
— Preste atenção, pirralho teimoso, os índios estão vindo.
— O senhor já disse.
— E você não acreditou em mim? Aonde, você pensa, todo mundo foi? A um
piquenique? — gritou Logan, no auge da fúria.
Pela primeira vez, Victoria sentiu a tentação de abrir a porta. Se o homem dizia a
verdade sobre ter trazido a notícia do ataque, não merecia morrer. Fechou os olhos e
implorou orientação divina.
— Menino?
A voz profunda soou inflexível, mas não era a resposta dos céus.
Victoria olhou para a porta e foi dominada pela sensação de inexorabilidade. Na
verdade, sabia-se incapaz de deixar o sr. Youngblood apodrecendo na prisão.
— Vou abrir a porta.
— Quando?
Ela tentou levantar a barra de metal com as mãos.
— Agora.
— Atitude inteligente, Amory. Partiremos para Trinity Falls imediatamente.
— Lá estaremos a salvo?
— Desde a última descoberta de uma mina de ouro, a cidade cresceu muito. Tem
mais de cinco mil mineradores. Não há perigo de sermos atacados lá. Você tem um bom
cavalo?
— Não. Tenho uma junta de bois.
— Ora, que velocidade espera alcançar com eles?
— Os bois podem não ser rápidos, mas são firmes. Além do mais, tiveram tempo
para descansar.
Depois de lidar algum tempo para remover a barra de metal, Victoria desistiu de
tirá-la com as mãos e foi buscar o garfo de cabo comprido.
— Você tem um carroção? — indagou Logan. Finalmente, seus esforços
começaram a surtir efeito.
— Tenho, sim.
— Não gosto da idéia de viajar nele.
A barra soltou-se e caiu no chão. A porta da prisão se abriu, revelando um buraco
sinistro.
— As marcas das rodas são muito fáceis de serem seguidas.
— Vamos precisar do carroção. Eu me recuso a deixar minha carga preciosa para
trás — declarou Victoria com firmeza.
Logan Youngblood surgiu e piscou contra a claridade.
— Carga preciosa? — Calou-se, e ela viu os olhos escuros a encararem com
desconfiança. — Com todos os diabos...
A imprecação era dele, o medo, seu.

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CAPÍTULO QUATRO

O homem diante de Victoria não se parecia com nenhum visto por ela até então.
Além de preencher seu campo inteiro de visão, ele aumentava de estatura a cada
passo dado em frente. Sentindo a boca seca, ela recuou.
A brisa agitava os restos de uma camisa branca que, apesar de estar em
frangalhos, aderia aos ombros musculosos dele. Victoria nunca vira antes o peito nu de
um homem e, portanto, não estava preparada para a imagem dos pêlos negros que
cobriam o do prisioneiro. Por Deus, nem um índio em pé de guerra poderia ser tão
aterrador como o sr. Logan Youngblood.
Ou de aspecto tão lamentavelmente primitivo.
— Onde está o menino?
A pergunta a fez levantar os olhos do torso para o rosto. Espantou-se. O homem
dava a impressão de ter sido espancado por uma multidão furiosa. O olho direito
estava roxo e mal se abria de tão inchado, havia um corte no queixo e outro no lábio
inferior. A barba por fazer dava um toque de ferocidade às feições. Se não era o
próprio demônio, tratava-se de um de seus emissários, pronto para praticar toda a
sorte de crimes.
— O menino? — Victoria repetiu.
— Aquele com quem venho conversando desde ontem a noite.
— Eu lhe disse que não era criança.
— Quer dizer que todo este tempo conversei com você?Uma mulher?
O tom de desdém a irritou.
— Em minha opinião, é uma questão óbvia para alguém de inteligência razoável.
— Não acredito.
— É verdade. Garanto-lhe que estou viajando sozinha, sem companhia alguma,
muito menos a de uma criança — afirmou Victoria, imaginando se a reclusão na cela
horrível o havia perturbado mentalmente.
— Por quê?
— Como por quê?
Ela avaliou o desafio de levar o homem confuso até Trinity Falls. Mas havia um
lado positivo no fato de ele ser simplório. Provavelmente, tinha imaginado essa história
de os índios estarem em pé de guerra.
— O senhor quer saber por que o induzi a pensar que falava com um homem?
— Sua encenação não me interessa. Quero apenas saber por que está viajando
sozinha.
— Ah, isso. Não tenho a peste, posso lhe garantir — respondeu ela, recusando-se
a revelar ter sido banida do comboio.
Ele a encarou com expressão séria.
— Você foi atacada?

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Victoria lembrou-se do tiro desastrado no pé do sr. Dodson.
— Não foi bem um ataque, mas um mal-entendido.
— Mal-entendido?
— Pois é, pensei que um urso estava invadindo meu carroção.
— Um urso?!
O homem, de fato, tinha raciocínio limitado. Lastimável que um físico tão viril não
fosse acompanhado por um intelecto brilhante, refletiu ela. Teria essa falta de
capacidade mental o levado a participar do mundo do crime? Tomando cuidado, tentou
falar bem devagar.
— Naturalmente, não se tratava de um urso, mas eu não poderia adivinhar.
Ele entreabriu os lábios, mas não falou. Em vez disso, observou-a com um tipo de
fascinação mórbida.
— Não tive a intenção de ferir o sr. Dodson, mas ele estava no lugar errado e na
hora errada.
— Como você o machucou?
— Atirei nele.
— Você o quê?
— Bem, numa madrugada, ouvi barulho do lado de fora de meu carroção. Na
véspera, um dos homens mencionara ter visto um urso preto nas redondezas e nos
aconselhara a tomar cuidado.
— Você não podia distinguir um homem de um urso?
— Estava escuro.
— Moça, você é quem devia ser trancafiada numa cela.
— Não feri o sr. Dodson mortalmente. Apenas o atingi no pé.
— Para onde você apontou?
Victoria tinha a sensação de ter perdido o controle da conversa. Isso a
desagradava. Afinal, era o bandido quem deveria estar respondendo perguntas. Apesar
de solto, ele continuava sendo prisioneiro. Aliás, seu. Via-se obrigada a levá-lo a
Trinity Falls, onde ele responderia pelos crimes cometidos.
— Tudo aconteceu muito depressa e eu não tive tempo para apontar num ponto
em particular. Mas nós nos desviamos do assunto principal — reclamou ela.
— Então, eles a expulsaram do comboio por ter atirado no pé de alguém? —
perguntou Logan, sem se importar com suas palavras.
— Não. Eles apenas confiscaram minha carabina.
— Nesse caso, o que aconteceu? Se todos do comboio, exceto você, não
morreram num ataque, não posso imaginar uma única razão para você se separar dos
outros.
— Naturalmente, o senhor não pode — Victoria concordou, munindo-se de
paciência e como se falasse com uma criança.
— Deixe eu adivinhar. Eles a expulsaram do comboio por que você os enlouquecia
com esse seu linguajar enigmático.
Ela sabia que pancadas na cabeça provocavam confusão mental. Seria por isso que
o homem não entendia a idéia mais simples?

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Quantos golpes o senhor levou na cabeça?
Logan abafou um palavrão. De nada adiantaria praguejar contra essa mulher
caprichosa que o tinha soltado da cela. Olhou para o céu e viu que o sol já ia alto.
Precisavam abandonar o forte logo.
— Olhe, moça, eu...
— Meu nome é srta. Amory — ela o interrompeu em tom imperioso e cansada de
ser tratada com familiaridade.
— O que não fará diferença para um índio disposto a praticar justiça.
Seus olhos verdes arregalaram-se.
— Justiça?!
— A do pele-vermelha. Ela é rápida e cruel.
Como se esperasse ver uma flecha vindo em sua direção, Victoria olhou por sobre
o ombro. Uma mulher esguia, de cabelos avermelhados, que escapavam dos grampos, e
rodeada pela luz do sol, ela parecia extremamente vulnerável. Sem muita lógica, Logan
sentiu-se inclinado a protegê-la.
— Precisamos ir embora — ele repetiu.
— Não fui eu quem perdeu tempo fazendo perguntas.
Criatura irritante, pensou Logan, fazendo uma careta.
Mais tarde, descobriria os motivos de sua separação do comboio. Tinha certeza
de que ela era responsável pela situação. Ao baixar os olhos para as curvas de seus
seios e quadris, delineadas pelo vestido verde-escuro e empoeirado, teve certeza de
outra coisa também. O sr. Dodson tinha rodeado o carroção da srta. Amory com más
intenções.
Mais uma vez, ele se deu conta do quanto ela parecia vulnerável ali no pátio do
forte abandonado. Virou-se e viu os seis bois mastigando o feno espalhado à volta
deles.
— Vou atrelar os animais ao carroção.
— Eu mesma sou capaz de fazer isso. Venho cuidando de meus bois desde que
deixei Independence.
— Está recusando minha ajuda? — indagou Logan.
— Não, mas não preciso receber ordens de um delinqüente.
O emprego casual da palavra delinqüente deu vontade em Logan de sacudi-Ia
pelos ombros. Mas ele engoliu a raiva. Não tinha tempo para trocar insultos com a srta.
Amory. Não com as tribos Blackfeet e Shoshone prestes a atacar. Mais tarde, teria
oportunidade de fazê-la engolir todos os que ela lhe dirigira.
— Quer viver ou morrer, srta. Amory?
— O senhor está me ameaçando?
— Com todos os diabos, não! Mas estamos num lugar perigoso e precisamos nos
mexer.
— É o que não pára de me dizer.
Logan fechou o olho que não estava inchado e rezou para ter paciência.
— Eles estão cada vez mais perto — avisou ele.
— Não duvido. Mas devemos ainda ter tempo para estabelecer a ordem de

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comando.
Mais impaciente ainda, Logan abriu o olho. Sentia-se miserável e humilhado. Tinha
vindo ao forte para avisar sobre o assalto iminente dos índios. A recompensa por
haver deixado a segurança de Trinity Falls fora um tratamento irracional por parte de
Windham, uma sova brutal e o abandono numa cela, onde morreria à míngua.
Milagrosamente, tinha sido libertado. Porém, o destino parecia não ter se
cansado de rir a sua custa. A mulher que o soltara era completamente louca. Algo em
sua voz educada e imperiosa ralava-lhe os nervos.
— Qual é sua cidade natal, srta. Amory?
— Isso é irrelevante.
— Boston, certo?
— Sim.
Logan estremeceu. Devia ter adivinhado. Muito pouca coisa boa havia lhe
acontecido em Boston e, por isso, tinha saído de lá. Considerava a cidade a capital da
hipocrisia da América, um lugar onde homens e mulheres se importavam demais com as
aparências e não o suficiente com a integridade moral.
— Por sua expressão, deduzo que o senhor não gosta de Boston — ela comentou.
— Mais ou menos isso.
— Mas de onde sou não tem nada a ver com nossa situação atual.
Ela voltava a falar devagar como se ele tivesse dificuldade em entendê-la. De
fato, tinha, mas não por causa da velocidade de suas palavras e sim por sua mania de
falar em círculos.
— Pare! — exclamou ele.
— O que, exatamente, o senhor quer que eu pare de fazer?
— De se dirigir a mim como se eu fosse débil mental.
O rosado de suas faces acentuou-se, percebeu Logan.
Então, de fato, ela o considerava retardado?
Ficou indignado. O fato de essa mulher caprichosa se achar superior a ele era o
cúmulo. Suas palavras dirigiam-se sempre às mais variadas direções. Conversar com ela
era o mesmo que fazê-lo com um bando de borboletas coloridas.
— Não precisa se sentir ofendido com isso. Nem todas as pessoas podem se
vangloriar de ter um intelecto brilhante — afirmou ela, no sotaque firme e imperioso
de Boston.
Logan mal conteve a raiva. Sentia-se mortalmente ofendido. Nem mesmo
Windham, com a acusação ridícula de seu relacionamento com a esposa dele, lhe
causara tamanho impacto. Ele não gostava menos de ter o intelecto insultado do que se
ressentia da contestação da honra. Esta podia ser reabilitada com uma luta justa.
Entretanto, não existia uma maneira rápida e cabal para convencer esta mulher de
olhos verdes que o intelecto de ambos estava em pé de igualdade. Mas não tinha
importância o que ela pensava.
— Agora, esqueçamos a questão de quem é responsável pela situação — continuou
ela, como se não acabasse de insultá-lo. — Como o carroção e a junta de bois são meus
e o senhor está sob minha guarda, sou eu quem deve tomar as decisões sobre o que

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fazer.
— Tudo bem — resmungou ele, não querendo perder tempo com discussões.
— Então, por que o senhor não desmancha o acampamento e põe tudo de volta no
carroção enquanto eu... — Ela fez um gesto para a ma de sanitários. — Bem, o senhor
entende.
Ele não disse nada. Contentou-se com imagens da moça sendo amarrada,
amordaçada e jogada dentro do carroção.
Só depois que ela se afastou, Logan soltou a respiração. Em seguida, dirigiu-se à
junta de bois. A cada passo, as costelas reclamavam. A belezinha de Boston ignorava,
mas o ataque indígena era seu problema menor. Ela teria muita sorte se conseguisse
chegar a Trinity Falls sem que ele a esganasse.
Um pouco depois, transpirando por ter atrelado os bois ao carroção, Logan olhou
para dentro do veículo. Não quis acreditar no que via e soltou uma série de
imprecações. Só agora entendia por que o comboio a tinha abandonado. Apesar das
dores nas costelas, içou o corpo para dentro do veículo. Iria mostrar à srta. Amory
que o Oeste tinha seu código de sobrevivência. Tratava-se de uma lição que ele
aprendera e pretendia passá-la adiante.
Para o bem de ambos.
Depois de terminar as abluções matinais, Victoria sentiu-se revigorada e dirigiu-
se ao carroção. Ela havia vencido a aversão pelas habitações abandonadas e lavado o
rosto numa bacia encontrada na cômoda de um dos quartos vazios. Tinha também
usado um pente para arrumar os cabelos. Olhando-se no espelho, verificara que as
sardas haviam aumentado. Culpa do sol do oeste. Mas isso tinha seu lado bom. Os
homens não achavam as mulheres sardentas atraentes. Nem mesmo um tipo
desclassificado como Logan Youngblood lhe dirigiria atenções indesejáveis.
Ao atravessar o pátio, Victoria viu que ele já tinha atrelado os bois, guardado
tudo e encontrava-se com metade do corpo enfiado no carroção. Quando Youngblood
ficou em pé, duas coisas tornaram-se evidentes. A primeira era o fato de ele ter
encontrado uma camisa azul, do uniforme militar, para substituir a branca rasgada.
Felizmente, já não mostrava o peito nu.
A sensação de alívio durou pouco, quando Victoria o viu segurando vários de seus
livros preciosos.
— O que o senhor está fazendo? — gritou ela.
— Estou aliviando a carga a fim de seguirmos mais depressa.
Victoria não poderia se sentir mais ferida se tivesse levado um tiro.
— Ponha já os livros de volta!
— Eles só têm valor em Boston.
— Pertencem a mim e vão comigo.
— De jeito nenhum, srta. Amory.
— Já estabelecemos que quem dá as ordens aqui sou eu. Minha carga preciosa vai
comigo para Trinity Falls.
— Esta é sua carga preciosa?
— Exatamente, e não tenho a intenção de deixá-la para trás.

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— Moça, não se trata de pessoas queridas. Eles não passam de livros que não
justificam sua morte — disse Logan, ao atirar uma cópia de O Último dos Moicanos, de
Cooper, no chão.
Indignada, Victoria apanhou o volume.
— Como se atreve a tanto? Isto aqui é uma primeira edição!
Sem lhe dar atenção, ele jogou longe Mulherzinhas, o último livro de Louisa May
Alcott, que Victoria ainda não tinha lido.
— O chefe do comboio resolveu deixá-la para trás certo de que a senhorita
recobraria o bom senso e aliviaria a carga. Ele cometeu um erro que estou disposto a
não repetir. Os livros ficam. Nós vamos embora.
Victoria o fitou e percebeu que não conseguiria convencê-lo a mudar de idéia.
Teve uma inspiração.
— Vai levar a manhã inteira para descarregar os livros. Não acha que devemos ir
embora já? — sugeriu, forçando um sorriso.
Logan endireitou o corpo. Não escondia a frustração.
Sem saber o que ele faria, Victoria prendeu a respiração.
— Suba logo no carroção — ordenou ele, ao virar-se de costas.
Depressa, ela apanhou Mulherzinhas do chão e correu para frente do carroção, a
fim de subir no banco alto. Não deveria se surpreender com o fato de o companheiro
mau humorado já estar sentado e segurando as rédeas.
Abafou os protestos, considerando-se feliz por ele ter concordado em não
descarregar todos os livros que ela levara dias para selecionar.
Mal tinha se sentado, quando Youngblood soltou o freio de mão e estalou o
chicote no lombo dos bois. Como um só, eles partiram em direção à porteira.
Só então, Victoria deu-se conta de ter ligado suas esperanças de sobrevivência a
um completo estranho. Imaginava se não havia cometido o maior erro de sua vida.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy

CAPÍTULO CINCO

Pelo canto dos olhos, Victoria observou o homem sentado a seu lado. Já
percorriam a trilha há quase uma hora e ele ainda não havia aberto a boca. Mantinha a
expressão sombria. Cada vez que uma das rodas passava por um buraco mais fundo,
sacudindo o carroção, ele fazia uma careta.
A essa evidência de dor, Victoria poderia se comover, caso o sr. Youngblood lhe
houvesse oferecido umas palavras amigas. Todavia, ele parecia tão incapacitado para
falar quanto os bois.
A vegetação luxuriante estendia-se quilômetro após quilômetro, o odor dos
pinheiros permeava o ar e as águas do rio Ruby batiam de encontro às margens de
granito. O sol já ia bem alto no céu sem nuvens e logo os raios quentes tornaram-se
insuportáveis. Convencida de estar adquirindo mais uma centena de sardas, Victoria
mexeu-se no banco.
Tentou lembrar-se de onde havia deixado o chapéu de aba larga. Ela o tinha
usado na véspera e só o tirara ao entrar sob o carroção para dormir. De repente, deu-
se conta de tê-lo deixado sobre os cobertores ao engatinhar para fora. Teria
Youngblood incluído o chapéu aos outros objetos quando desmanchara o acampamento?
Virou-se para olhar dentro do carroção. Nesse instante, uma das rodas atingiu
um buraco. Perdendo o equilíbrio, Victoria agarrou-se a algo sólido. Tratava-se de
Youngblood.
Sem querer, ela soltou um grito. Ao mesmo tempo, ele passou o braço a sua volta
e a puxou de encontro a si.
Duas impressões a dominaram. A primeira, e mais forte, era a conscientização da
força muscular do braço de Logan Youngblood. A segunda foi intuir que a mesma força
fluía pelo corpo ao qual ela estava prensada.
O tecido áspero da camisa azul roçou-lhe o nariz e o odor masculino embrenhou-
se no ar que ela respirava. Embora não fosse desagradável, o cheiro normal não
deixava de ser algo chocante. Por Deus, ela nunca estivera tão perto de um homem.
Nem mesmo ter visto Horace Threadgill, com a calça abaixada em seu quarto, dera-lhe
tanta sensação de intimidade como o fato de se encontrar presa pelo braço desse
patife.
— Com todos os diabos, o que está tentando fazer?
A voz profunda vibrou nos tímpanos de Victoria, provocando-lhe um arrepio na
pele. Ela levantou as mãos, a fim de empurrar-se para o lado.
— Estou me esforçando para endireitar o corpo.
Ele virou o rosto e a fitou com expressão de desdém.
— A senhorita quase me enganou.
— Pode me soltar agora.
Ele afastou-se não mais do que uns dois centímetros de seu rosto levantado.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Victoria viu que o olho aberto era castanho escuro, quase preto, e a fitava com
expressão penetrante.
— Está preparada para sentar-se quieta? — perguntou ele.
— Eu tentava pegar meu chapéu — explicou ela, esforçando-se para se soltar.
Seus instintos a avisavam ser mais prudente manter uma distância segura do
grosseirão.
— Devia ter me avisado — disse ele, ao afrouxar o braço.
— Da próxima vez, farei isso — Victoria respondeu, voltando a ocupar seu lugar
no banco.
Logan puxou as rédeas e os bois pararam.
— Obrigada. O senhor se lembra de ter pegado meu chapéu e posto no carroção
com os outros objetos? — indagou ela, ao enfiar metade do corpo no veículo.
Como não obtivesse resposta, virou o rosto para trás.
— Perguntei se...
Calou-se, desconsertada pelo olhar que Youngblood dirigia à parte de sua
anatomia para fora do carroção. A elevação indecorosa de suas nádegas estava a pouca
distância do olhar interessado.
Sujeito rude. Por que não olhava para o outro lado?, indagou-se ela, ao voltar a
sentar-se no banco.
— O senhor apanhou meu chapéu quando pôs tudo no carroção?
— Está junto com os cobertores — respondeu Logan.
— Graças a Deus. Fiquei com medo de que tivesse ficado para trás. Espere só um
minutinho. Vou pegá-lo.
— Ande depressa.
Criatura mal-educada, pensou ela, ao virar-se e entrar no carroção, pondo os pés
primeiro. Também era um movimento deselegante, mas pelo menos, nenhuma parte de
seu corpo se sobressaía para o divertimento do sr. Youngblood.
Achou logo o chapéu, mas antes de voltar para o banco, escondeu os livros que
tinha apanhado do chão antes de subir no carroção.
— Pronto — Victoria avisou ao sentar-se.
Logan não disse nada e nem fez movimento algum.
— Ora, não fique aí parado olhando para mim. Segundo o senhor, o tempo é de
suma importância — reclamou ela.
— Não vai pôr o chapéu?
— Claro!
— Então, ponha logo.
— Sabe, sr. Youngblood, o senhor é muito irritante
Victoria afirmou, enquanto tentava desatar o nó cego das fitas do chapéu.
— Estou esperando que ponha esse maldito chapéu para poder seguir em frente.
Não quero que machuque sua bem torneada parte posterior.
Ele havia observado suas nádegas! Sentiu as faces queimarem. Por Deus, o homem
era um bárbaro.
Naturalmente, ela se sentiu um tanto apaziguada por ele ter apreciado o que vira.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Mas o sr. Youngblood precisava aprender como se comportar diante de uma dama.
Todavia, criminosos desse tipo não se associavam com mulheres refinadas, nem mesmo
com as que tinham a reputação um tanto duvidosa.
— Posso muito bem pôr o chapéu e continuar sentada. Isso, é claro, se o senhor
evitar os buracos mais fundos desta estrada — Victoria disse em tom áspero.
— Não vamos continuar na estrada principal.
— Por que não? — indagou ela, parando de tentar desmanchar o nó para prestar
mais atenção.
— Por esta estrada, são uns noventa quilômetros até Trinity Falls. Com o
carroção carregado e puxado por bois, levaríamos seis dias no mínimo — explicou
Logan.
— E daí?
— Seis dias, viajando num terreno plano, nos deixaria expostos a ataques de
índios.
— Seria muito ruim acabar numa situação dessa — ela falou, como se pensasse
alto.
— A melhor solução é deixarmos a estrada principal e fazermos um desvio por
aquelas montanhas.
Victoria olhou para onde ele apontava. As tais montanhas agigantavam-se de
maneira inóspita na distância. Tinham os picos cobertos pela neve do último inverno e
nem os pinheiros e os cedros cresciam naquelas alturas.
— Se pensa que meus bois vão conseguir puxar o carroção por aquelas escarpas
de granito, o senhor, de fato, e muito simplório.
Mal acabou de falar, Victoria deu-se conta de ter sido clara o suficiente até para
um simplório dar-se conta de que fora insultado. Embaraçada, manteve o olhar nas
montanhas.
— Pretende me ofender a viagem inteira até Trinity Falls?
Só se fosse covarde, ela se recusaria a fitá-lo para responder a pergunta. Mas
isso ela não era. Virou-se bem devagar para o companheiro.
— Peço desculpa, sr. Youngblood, por ferir seus sentimentos.
Ele a encarou com expressão feroz, provocando-lhe arrepios.
— E, no futuro, vou me esforçar para controlar minha língua — acrescentou ela.
Ao ouvi-Ia, ele desviou o olhar para seus lábios. Os arrepios multiplicaram-se.
Ele curvou os lábios. Em outra pessoa, o gesto lembraria um sorriso. Em
Youngblood, ele tinha um aspecto carnívoro. Victoria imaginou se o Lobo Mau não havia
apanhado Chapeuzinho Vermelho exatamente com essa expressão predatória.
— Bem, o senhor aceita meu pedido de desculpa?
— Só se puser esse maldito chapéu depressa.
Ela reprimiu a vontade de protestar e concentrou-se em desatar o nó. Finalmente
conseguiu e pôs o chapéu.
— Não vamos passar por cima das montanhas. Existem trilhas que espero
transpor com o carroção. Uma vez protegidos pela floresta, eu me sentirei mais
seguro.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Faz sentido nos tornarmos menos visíveis — admitiu ela com certa relutância.
A perspectiva de entrar na densidade misteriosa da floresta, entretanto, era
intimidadora para alguém nascida e criada na cidade como Victoria. Parecia fácil a
possibilidade de se perderem entre aqueles pinheiros que cresciam tão perto um do
outro. Até a luz do sol custava para penetrar pelas copas das árvores.
— O senhor tem certeza de conhecer o caminho para Trinity Falls?
Ficava claro para Logan que Victoria Amory não confiava nele para levá-la de
volta à civilização. Nunca encontrara alguém que tivesse uma opinião tão ruim a
respeito dele. Nem mesmo Windham. Limitou-se a responder.
— Já moro no oeste há um bom tempo.
— Nestas montanhas? — indagou Victoria, ainda precisando ser tranqüilizada.
Ele levantou o chicote a fim de instigar os bois em frente.
— Não, na cidade.
Sem dúvida, dividindo o tempo entre os bares e a cadeia, pensou Victoria.
Logan conduziu o carroção para fora da estrada, seguindo um aclive e
embrenhando-se entre as árvores. Os galhos mais baixos dos pinheiros raspavam o
teto de lona do carroção e este sacolejava mais.
— Não estou muito certa de ser uma boa idéia vir por aqui. Não tenho um mapa
para consultar — disse ela.
— Não preciso de mapa.
— Desculpe não confiar muito no senhor, mas fui avisada pelo chefe do comboio
para permanecer na estrada principal — explicou ela.
— Fique certa de que ele, em nossa situação, também tentaria se manter invisível
aos índios.
O carroção sacolejou com mais força e Victoria quase foi atirada para fora.
Logan estendeu o braço e a puxou para junto dele.
— O que pensa estar fazendo? — perguntou ela, tentando se soltar.
— Impedindo que a senhorita caia e quebre o pescoço. Se estivéssemos indo num
passo mais vagaroso, eu lhe sugeriria que andasse. Seria menos penoso para seu corpo.
Mas pelo resto do dia, pelo menos, precisamos nos distanciar do forte o máximo
possível.
Mais uma vez, ele sentiu sua fragilidade e foi tomado pela vontade de protegê-la.
Embora isso não o agradasse, não conseguia livrar-se do sentimento.
Victoria parou de se debater. Com uma das mãos, segurava o braço e, com a
outra, o ombro dele.
— Se abandonarmos a margem do rio, como vamos dar água aos bois? — indagou
ela. — Não se preocupe, água não será problema. Há vários riachos que deságuam no
Ruby.
— Mas o senhor sabe onde...
— Olhe, srta. Amory, este não é o lugar nem a hora para termos uma discussão.
Preciso me concentrar em manter os bois numa trilha que não é mais larga do que o
traseiro de um gato. Mais tarde conversaremos.
Ele curvou-se, puxando-a consigo, quando um galho baixo ameaçou bater-lhes na

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
cabeça. Ele atingiu o topo do carroção, fazendo poeira e folhas secas voarem para
todos os lados.
Victoria enfiou o rosto na manga da camisa dele. Ao levantá-lo para respirar,
tossia.
— Desde que o senhor reconheça minha autoridade.
Logan não sabia se ria ou praguejava. A srta. Amory era a mulher mais
intransigente que ele conhecera.
— Claro. Quem dá as ordens é a senhorita.
Ele a deixaria pensar isso até chegarem a Trinity Falls.
Para Victoria, seus vinte e quatro anos de vida pareciam se reduzir a essa
jornada sacolejante através da floresta de Idaho. Já estavam viajando há horas e
Youngblood não dava sequer sinal de querer parar. Pela fome sentida, ela imaginava já
ter passado bem do meio-dia.
O homem sisudo a seu lado passava o período mais longo sem falar. Contudo, o
progresso árduo do carroção desencorajava conversas. Precisava admitir que ele
conduzia os bois com extrema perícia e conseguia manter-se na trilha estreita.
Alcançaram um trecho relativamente regular. Os estalos do carroção diminuíram
um pouco.
— É difícil acreditar como esses pinheiros finos crescem tão perto uns dos
outros. É uma beleza, não concorda? — comentou Victoria, sentindo necessidade de
compartilhar o apreço pelo esplendor da natureza.
O companheiro taciturno desviou o olhar da trilha para a floresta em volta.
— Linda e mortífera — disse ele.
A naturalidade da afirmativa a deixou gelada. Sentiu como se Youngblood
quisesse amedrontá-la de propósito. O olhar perscrutador dele a fez pensar se não
teria se colocado nas mãos do demônio. Estaria ele esperando alcançar o lugar certo,
longe de qualquer sinal de civilização, para matá-la e roubar o carroção?
Ela respirou fundo o ar com aroma de pinho e reagiu.
— Por causa dos índios? — indagou.
— Sim. Mas há também ursos, cascavéis, lobos e pumas.
Victoria preferia que ele não tivesse enumerado os animais selvagens abrigados
pela floresta. Porém, antes de dizer alguma coisa, o terreno regular tornou-se íngreme
e acidentado. Ela segurou-se com força no banco e apertou os dentes a fim de não
morder a língua.
Os arreios rangiam enquanto os bois, com as cabeças abaixadas, seguiam em
frente. Conseguiram vencer vários metros e, então, Logan puxou as rédeas.
— Oa! — soou o grito exasperado dele.
Três pinheiros estavam caídos na trilha.
— Pelo jeito, vamos ficar aqui por algum tempo. Espero que tenha um machado
entre seus livros preciosos disse ele ao descer, não escondendo uma careta de dor.
— Está amarrado do lado do carroção. O senhor vai tentar abrir caminho?
Ele lançou-lhe um olhar impaciente.
— Não vou tentar e sim fazê-lo.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Diante de tal arrogância, a simpatia de Victoria pelo homem machucado diminuiu.
— Enquanto faz isso, vou esticar as pernas. E já que temos de ficar parados aqui
por algum tempo, vou acender um fogo e fritar bolinhos.
— Nada de fogueiras.
A voz soou bem de perto. Ela já começava a descer de costas, mas parou. Olhou
por sobre o ombro e deu com o olhar penetrante de Youngblood a centímetros de seu
rosto. Piscou, sentindo-se estranhamente presa a essa proximidade inesperada.
Com as mãos em sua cintura, ele tirou-a do carroção e a pôs no chão, enquanto
continuava:
— Não podemos correr o risco de acender uma fogueira. E ao menos por mais um
dia. A fumaça trairia nossa presença.
Victoria não tinha para onde ir. Com Youngblood a suas costas e o carroção na
frente, sentia-se prisioneira.
— Tudo bem, mas quero esticar as pernas.
Deu um passo para o lado, esperando que ele a largasse. Isso não aconteceu. Os
dois segundos seguintes foram os mais longos de sua vida. Só quando lhe empurrou as
mãos, ele recuou e a soltou.
— Vou pegar o machado.
Como não precisasse responder, Victoria afastou-se um pouco do carroção.
Avistou, entre a folhagem, amoras silvestres e resolveu colhê-las. Voltou ao carroção,
para apanhar um balde, e ouviu o início do barulho do machado.
Ela olhou para a trilha. Youngblood, sem camisa, manejava a ferramenta com
economia de movimentos. A cada golpe, a lâmina afiada enterrava-se mais na madeira,
espalhando lascas por todos os lados.
A menos de três metros de distância, ela podia ver a expressão de dor dele.
Sentiu-se condoída. Ele não havia reclamado contra a necessidade de executar o
serviço.
Os músculos das costas de Youngblood contraiam-se e relaxavam cada vez que
ele levantava e abaixava o machado. Aliás, a ferramenta parecia a continuação dos
ombros e dos braços dele. Um dos troncos finos já tinha sido cortado.
Ao observá-lo, Victoria foi dominada por uma sensação estranha de letargia.
Abafou-a e foi apanhar as amoras.
Não encontrou muitas, apenas umas vinte e poucas. Mas seria delicioso saborear
as frutinhas, pensou, ao voltar para o carroção.
Youngblood, com a cabeça inclinada para trás, bebia água do cantil. O pomo-de-
adão movia-se a cada gole. Um brilho de transpiração cobria-lhe o torso nu.
Terminando de beber, ele apanhou a camisa e, num gesto distraído, esfregou-a no
pescoço. Se estivesse numa exibição zoológica em Boston, Victoria não se sentiria
mais fascinada do que pelos gestos dele. Na verdade, Logan Youngblood era uma
criatura misteriosa e exótica para ela.
Um homem.
Sem detalhes civilizados de vestimentas, ele não lembrava nenhum dos
cavalheiros seus conhecidos. Mas sua associação com eles não tinha sido tão intrigante

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quanto observar Youngblood. Ele sacudiu a camisa e vestiu-a. Outra vez, ela viu sinais
de dor nas feições dele.
— O que a senhorita traz aí? — perguntou ele, apontando para o balde.
— Amoras silvestres.
— Parabéns.
Um cumprimento vindo dele? Era ridículo, porém, ela sentiu uma onda de prazer.
— Não encontrei muitas.
— Pelo menos, não ficou aí sentada, sem fazer nada, enquanto eu cortava os
troncos.
— Teria sido uma grande bobagem.
— Em minha opinião, as mulheres tendem a ser bobas — disse ele, ao estender a
mão. — Eu levo o balde.
— Por que eu deveria entregá-lo ao senhor?
— Precisa sempre mostrar sua maldita desconfiança?
— A troco de que vou lhe dar as amoras?
Ele inclinou-se para frente e tomou-lhe o balde.
— Porque, srta. Amory, vai precisar das duas mãos para subir no carroção.
— Ah!
Fingindo desdém, ela dirigiu-se para seu lado do veículo. Enquanto alcançava o
banco, admitiu sentir-se um tanto boba.

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CAPÍTULO SEIS

Comeram as amoras enquanto viajavam. Embora fossem poucas, diminuíram um


pouco a fome de Victoria. Com uma ponta de saudade, ela lembrou-se das refeições
maravilhosas preparadas pela cozinheira da família.
Suspirou e olhou para o homem silencioso sentado ao lado. Youngblood havia
comido as amoras no retraimento que ela começava a considerar habitual. Por causa do
tamanho avantajado dele, nada mais natural que exigisse uma porção maior das frutas.
Entretanto, ele não fizera isso. Contentara-se com umas poucas.
De repente, ele virou-se e a fitou.
— Meus lábios estão azulados?
— O quê?
— Da maneira como a senhorita não tira os olhos de mim, imaginei se as amoras
não tinham deixado meus lábios azuis.
Victoria enrubesceu. Youngblood estava certo. Há muito tempo, mantinha os
olhos nele. Embaraçada, desviou os para os bois.
— Na verdade, eles estão bem avermelhados. Sem dúvida, por causa dos
ferimentos. Mas seu olho direito é que está com a mais variada gama de tonalidades.
Elas vão do azul para o roxo, passando pelo preto.
Ele a surpreendeu rindo.
— Devo estar com uma aparência infernal. Mas é como me sinto.
— Os machucados doem muito?
Pelo canto dos olhos, percebia que ele continuava fitando-a, mas relutava a
encará-lo. Algo nesse homem a perturbava.
— De vez em quando, sinto uma pontada em algum lugar — confessou ele.
Youngblood estava sendo forte, tinha certeza. Victoria lembrou-se da expressão
de dor dele ao usar o machado.
— Eu é quem deveria ter cortado os troncos.
— Por que diz isso?
— Eu o teria poupado de mais sofrimento.
— Esse é um sentimento muito generoso. Ainda mais considerando...
— O quê?
— Que sou seu prisioneiro e a senhorita pensa que está me levando para Trinity
Falls a fim de enfrentar algum tipo de julgamento.
— Não penso que o estou levando com essa finalidade. Tenho certeza de estar. —
Esquecendo-se de não querer encará-lo, virou-se para ele. — É muito importante uma
pessoa arcar com a responsabilidade de seus atos. Quando se faz algo errado, torna-
se imperioso pagar o débito para com a sociedade. Se não fosse assim, nosso país
cairia na anarquia.
Fitando-a com olhar intenso, Youngblood dava a impressão de ter algo importante

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a dizer. Estaria ele prestes a confessar os crimes cometidos? Victoria preparou-se
para ouvir qualquer coisa. Prometeu a si mesma manter-se calma, não importava quão
depravados e violentos os erros dele tivessem sido.
— A senhorita não acredita em nada que lhe contei, não é?
— Naquela história de ter sido injustamente preso, depois de avisar o forte do
ataque, e de se negar a mostrar o caminho do acampamento dos índios amigos?
A expressão dele tornou-se mais carregada.
— E inútil eu continuar me declarando inocente, certo?
— Não posso acreditar que soldados dos Estados Unidos cometam algo tão
abominável como prender um homem inofensivo.
Logan voltou a prestar atenção na trilha.
— Existe algo sobre o qual a senhorita deveria pensar.
— O quê?
— Se sou um vilão tão terrível, como a senhorita continua viva?
— Não entendo.
— Se sou tão mau quanto imagina, eu já teria aproveitado de seu corpo atraente,
cortado-a em pedaços com seu próprio machado, cozinhado-a num fogo crepitante e
preparado uma refeição quente com sua carne macia.
O coração de Victoria disparou. O fato de Youngblood poder descrever algo tão
diabólico provava que ele era perigoso. Havia cometido uma tolice ao soltá-lo e nem, ao
menos, se armara com uma faca.
Logan a olhou de soslaio. Maldição! Ela estava branca como um fantasma. A
brincadeira, feita com a intenção de tranqüilizá-la, a tinha apavorado. Isso o deixava
furioso. Não sabia com quem estava mais bravo, se consigo mesmo por ter falado
tamanha asneira, ou com ela, por ser tão crédula.
Eu é quem deveria ter cortado os troncos.
O comentário delicado surgiu-lhe na mente. Sua preocupação generosa ele
retribuía com um comentário maldoso sobre estupro, esquartejamento e canibalismo.
— Pode voltar a respirar. Não vou lhe fazer mal algum.
— Não preciso de sua permissão para fazer isso.
A bravata provocou a admiração de Logan. Ela podia estar com medo, mas não o
deixaria perceber. Precisava saber mais coisas a seu respeito, a fim de estabelecer
harmonia entre ambos. Ele tinha de fomentar um certo grau de confiança nessa
mulher do leste, pois a vida de ambos poderia ficar reduzida à necessidade de ela
obedecer-lhe as ordens sem questioná-lo. Todavia, ela não estava preparada ainda
para saber que ele era o prefeito temporário de Trinity Falls e dono de um banco. A
srta. Amory pensaria que ele estava mentindo e se tornaria mais desconfiada.
— Por que está viajando sozinha?
— O senhor não se lembra?
Os olhos verdes revelaram espanto e pena. Maldição.
Ela voltava a encará-lo como retardado.
— Lembrar-me de quê?
— Já expliquei que o chefe do comboio não quis diminuir a marcha. Lembra-se de

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meus livros? Aqueles que o senhor queria deixar no forte, a estrutura imensa de
madeira, com uma porteira enorme?
Logan rangeu os dentes, fazendo a cabeça dolorida latejar.
— Eu quis dizer viajar sozinha desde o início. A maioria das mulheres viaja com os
pais, ou o marido. — Ele não resistiu e acrescentou: — Pais são aquelas pessoas que nos
trazem ao mundo e nos criam. Marido é um homem com quem uma mulher se casa
quando já está pronta para ter a própria família. Família...
— Já entendi — interrompeu ela, corando até a raiz dos cabelos.
Logan ficou satisfeito. Já estava na hora de a srta. Amory compreender como ele
se sentia ao ser tratado como simplório.
— E então? Por que estava viajando sozinha?
— Bem, eu devia vir para o oeste na companhia de uma família. O filho mais velho
ficaria encarregado da junta de bois e do carroção. Na última hora, entretanto, eles
mudaram os planos.
A explicação revelava muito pouco.
— Por que resolveu deixar sua casa?
Victoria tornou a enrubescer e Logan percebeu ter tocado num ponto importante.
— Seus pais a deixaram vir?
— Eles aceitaram minha decisão.
Havia muita coisa que ela não estava lhe contando. Logan intuiu que deixar sua
casa tinha sido doloroso para ela.
— E seu marido? — indagou ele, tentando fisgá-la.
— Não tenho marido.
— E noivo?
— Não é de sua conta, sr. Youngblood.
— Por favor, me trate por Logan, pois pretendo chamá-la por Victoria.
Surpresa, ela piscou.
— Como o senhor sabe meu primeiro nome?
— Eu o vi escrito em seus livros.
— Ah! Bem, nestas circunstâncias, seria tolice nos tratarmos com formalidade.
Concessão cortês, embora relutante, pensou ele. Logan gostava da maneira
precisa e delicada como seus lábios formavam as palavras. Aliás, lábios convidativos.
Todavia, ela não parecia ser do tipo que sugeriria beijos. Pelo contrário. Victoria
projetava uma integridade que desafiava um homem a transpor as barreiras
levantadas por ela.
Antes de cometer uma tolice, como descobrir o sabor daqueles lábios, ele desviou
o olhar.
— E então, Victoria, se não tem marido, está noiva, ou é viúva?
— Sr. Young...
— Logan, por favor — ele corrigiu com firmeza.
— Logan, nossa associação é temporária, portanto, não há razão para você saber
se existe alguém especial em minha vida.
— Quando tudo isto terminar, imagino, surgirá um homem declarando que você

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lhe pertence, e exigindo saber o que aconteceu entre nós.
— Em primeiro lugar, não existe tal pessoa. Segundo, a única coisa que vai
acontecer será nossa chegada, sãos e salvos, a Trinity Falls — afirmou Victoria, em
tom exasperado.
Era difícil acreditar que a mulher linda, ao lado, não estivesse ligada a homem
algum, refletiu Logan. Tentou calcular sua idade, mas não achou fácil. Talvez tivesse
dezoito anos. Seu comportamento, entretanto, sugeria ser mais velha, com vinte e
quatro, ou vinte e seis anos.
A expressão de Logan tornou-se sombria. Victoria não tinha o direito de vagar
sozinha pelo Território de Idaho, ou por qualquer outro lugar. Era atraente demais,
além de teimosa, para andar desacompanhada. A situação deles provava isso. E se
Windham houvesse deixado um verdadeiro criminoso cruel trancado na cela? Victoria
o teria libertado e ficado à mercê dele. Para seu próprio bem, ela precisava aprender
que uma mulher sozinha não podia perambular pelo país como bem entendesse.
Logan deu-se conta da falta de lógica de tal protecionismo. Aliás, fora ele que o
levara a ser tutor de Madison Earley. Quando um garimpeiro tinha aparecido no banco
e contado a história de uma menina branca que morava com a tribo de Lobo da Noite,
Logan fora buscá-la. A mãe de Madison havia morrido muito tempo atrás e o pai, dono
de uma pequena mina, cuidara dela até ser assassinado por causa de um punhado de
ouro em pó.
Lobo da Noite, então, se encarregara da menina, mas o certo seria ela viver entre
seu próprio povo. Logan poderia tê-la mandado para um orfanato no leste, mas não
tivera coragem.
Ele sacudiu a cabeça. Incrível viver até os trinta anos de idade sem descobrir
esse seu traço de sentimentalismo. Sem dúvida, fora ele que o mandara ao forte a fim
de avisar Windham sobre o ataque dos índios.
E agora, via-se ligado a uma mulher que valorizava mais seus livros do que a
própria vida. Estava enganada se pensava que ele a deixara conservá-los. Nessa noite,
quando Victoria estivesse dormindo, ele aliviaria a carga do carroção, jogando fora
todos os livros.
Observou-a de soslaio. O mau humor dele melhorou, ao pensar como essa mulher
autoritária seria, finalmente, era posta em seu devido lugar. Podia visualizá-la levando-
o a,delegacia, a fim de que fosse julgado. Seria um prazer vê-la descobrir que seu
prisioneiro não era ninguém menos do que o prefeito temporário de Trinity Falls e
presidente do maior banco da cidade. Isso sem falar em outras instituições
financeiras. Que grande humilhação para ela ter de baixar o topete.
Logan estalou o chicote, pois os bois relutavam em subir um novo aclive. Parou de
pensar em Victoria e concentrou-se no destino imediato, um tributário do rio Ruby.
Deviam alcançá-lo antes do escurecer. Uma vez lá, ele acreditaria na chance de
chegarem vivos à cidade. Já estariam em terras de Lobo da Noite e livres do perigo
de perderem os escalpos.
Logan voltou a pensar em Victoria. De um jeito ou de outro, ele descobriria seus
motivos para deixar Boston e o que pretendia fazer em Trinity Falls. Certamente, não

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
iria procurar trabalho num dos bares da cidade.
Ao imaginá-la servindo bebidas num deles, sorriu. Ela estaria usando um vestido
decotado e curto o suficiente para mostrar os tornozelos. Os seios mal caberiam na
blusa justa e a pele alva estaria salpicada pelas sardas douradas. Sem dúvida, essas
marquinhas atrevidas não acabavam em volta do decote alto de seu conservador
vestido verde.
Logan tentou se controlar. Como podia imaginar essa mulher fina e puritana
vestida de maneira vulgar? O tempo passado na cela devia ter lhe perturbado a mente.
Isso ou o fato de não ter gozado, nesses últimos meses, a companhia das mulheres
alegres e irreverentes de Trinity Falls. Quando Madison passara a fazer parte de sua
vida, ele evitara os encontros habituais com Cherry, Jasmine e outras moças que não
exigiam uma aliança em troca de seus favores.
Isso teria de mudar quando ele voltasse para a cidade. Encontraria uma maneira
de retomar a vida antiga sem prejudicar o mundo de Madison. Se não conseguisse, ele
se tomaria uma ameaça para as mulheres decentes, pois só tinha pensamentos carnais
sobre os lábios sensuais, os seios e quadris bem modelados de Victoria e...
Por Deus, ele estava perdendo a cabeça. Não havia nada atraente nessa mulher
recatada. Pretendia repetir tal mentira a si mesmo até chegar a Trinity Falls.

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CAPÍTULO SETE

Os últimos raios de sol anunciavam o fim do dia. Sombras movediças pontilhavam


a trilha. Uma brisa fria e inesperada penetrou pela roupa fina de Victoria, provocando-
lhe um arrepio e fazendo-a lançar um olhar amedrontado ao redor.
Quando Logan, finalmente, parou o carroção, a noite já havia caído e dado um
toque de perigo à floresta.
— Bem, aqui estamos — declarou ele.
— E onde é aqui? — Victoria indagou, numa voz trêmula.
Custou-lhe uma boa dose de determinação para não escorregar pelo banco e
aconchegar-se a Logan. A necessidade de procurar conforto num estranho a
surpreendia, pois sempre se orgulhara de ser auto-suficiente. Com esforço, dominou a
fraqueza traiçoeira.
— Aqui é onde passaremos a noite — respondeu ele, ao descer do carroção.
Victoria forçou o olhar e distinguiu, um pouco adiante das patas dos bois, um
riacho estreito.
— Vou desatrelar a junta logo. Amanhã, partiremos ao raiar do dia — avisou
Logan.
Lá vinha ele novamente com ordens, pensou Victoria.
Todavia, estava exausta demais para iniciar uma discussão. Desejava apenas
esticar-se entre os cobertores do carroção.
Com dificuldade, desceu ao chão. Todos os músculos do corpo doíam, por causa do
dia inteiro de viagem pela trilha acidentada. Sem ânimo para andar, encostou-se numa
das rodas do veículo. Devia fazer algo útil, como encontrar os bolinhos extras feitos
na véspera no forte, mas não se mexeu.
— Victoria?
Ela estremeceu. Teria Logan já desatrelado os bois?
Nesse caso, ela estava parada ali há algum tempo.
— Sim? — respondeu, levantando a cabeça.
— Você parece morta de cansaço!
— Já, já melhoro. Só me dê uns minutinhos.
Logan pôs as mãos em seus ombros.
— Exigi demais de você hoje, Victoria.
A preocupação, entrelaçada no tom suave dele, atingiu-a num ponto vulnerável. E
enquanto as mãos a massageavam nos ombros doloridos, os olhos dela encheram-se de
lágrimas.
Victoria tentou endireitar o corpo. Havia chegado sozinha até esse ponto. Era
uma mulher resistente e não precisava do conforto oferecido por este homem.
Para horror seu, as lágrimas se avolumaram e começaram a rolar pelas faces. Sem
saber como, apoiou o rosto na camisa de Logan.

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Detestava fraquejar, ainda mais quando devia mostrar-se forte. Porém, quanto
mais lutava para se controlar, mais chorava. As mãos dele a acariciavam nas costas e
ela sentia-se como se houvesse encontrado abrigo, contra uma tempestade nas
montanhas, entre os braços deste estranho ameaçador.
Isso não estava certo, censurou a parte racional de sua mente, quando as
lágrimas já diminuíam. Tentou soltar-se do abraço, mas o corpo parecia ter idéias
próprias e ela permaneceu onde estava.
Logan a prendia com algo diferente de força física. Era como se a amparasse com
a solidariedade de um ser humano para com outro. As batidas do coração dele tinham
um ritmo acalentador e o odor masculino permeava-lhe os sentidos.
A sensação de que estava prestes a experimentar algo raro e significativo
passou-lhe pela mente conturbada, mas dissipou-se logo.
Com um movimento firme, Victoria conseguiu, finalmente, soltar-se. Como quando
Logan a ajudara a descer do carroção, ela notou uma ponta de hesitação por parte
dele.
— Desculpe. Não sei o que aconteceu comigo — murmurou ela, preparada para
uma declaração de superioridade viril diante de sua fraqueza feminina.
Surpreendeu-se ao ouvir Logan dizer:
— A culpa foi minha. Forcei-a a viajar por um trajeto árduo e longo demais para
um só dia. Você precisa agora de alimento e de uma boa noite de sono.
— Por acaso você se lembrou de pôr no carroção o prato com o resto dos
bolinhos? — ela perguntou.
Logan passou o braço por sua cintura e a guiou para trás do carroção.
— Não só trouxe os bolinhos como também carne seca e umas latas de pêssegos
que encontrei numa busca pelo forte. Só porque não vamos acender uma fogueira esta
noite não quer dizer que tenhamos de passar fome.
Pensou como Logan, apesar das falhas morais, tinha boas qualidades. Era bondoso
e empreendedor.
Ele entrou no carroção e, quase em seguida, saiu com uma braçada de cobertores.
Estendeu-os sob o veículo e, a chamou:
— Venha cá.
Meio trôpega e como se não tivesse mais energia alguma, ela aproximou-se. Ao
abaixar-se para entrar sob o carroção, sentiu cada músculo do corpo protestar. Mais
uma vez, as mãos de Logan a ampararam, ajudando-a a alcançar os cobertores.
Sentindo-se aliviada por poder deitar-se, Victoria fechou os olhos enquanto
Logan a cobria.
— Obrigada — murmurou.
— De nada. Vou tirar suas botinhas, pois se não passar umas horas sem elas, seu
pés incharão.
— Bondade sua — ela respondeu e o ouviu rir.
— Você está extenuada, não é, delegadazinha?
— O que disse?
— Como não acho que você esteja planejando receber uma gratificação ao me

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entregar ao delegado de Trinity Falls, não vou ofendê-la, chamando-a de caçadora de
recompensas.
As palavras não faziam muito sentido, mas o tom de voz era cordial, admitiu
Victoria.
No instante seguinte, Logan lhe descobria os pés e tirava suas botinhas. O fato
de estar sendo cuidada provocou-lhe um aperto no coração. Umas últimas lágrimas
escaparam de seus olhos.
— Descanse uns instantes — recomendou Logan.
Grata, Victoria entregou-se à nebulosidade do sono.
Quando Logan a sacudiu pelos ombros, não fazia idéia de quanto tempo havia
passado.
— Você precisa se alimentar antes de adormecer completamente.
— Vá embora — protestou ela.
— Pelo menos, coma um bolinho, Victoria.
Ela abriu os olhos e o viu ajoelhado ao lado. Abriu a boca para dizer que preferia
continuar dormindo, mas ele apertou o bolinho contra seus lábios.
— Vamos, coma isto. Os pêssegos ficam para amanhã cedo, quando você poderá
apreciá-los melhor.
Victoria obedeceu. Seco e já meio duro, o bolinho não tinha mais sabor.
— Agora, beba água — recomendou Logan, encostando a boca do cantil em seus
lábios.
Apoiada no cotovelo, ela soergueu-se, inclinou a cabeça para trás e tomou uma
boa dose.
— Obrigada — agradeceu, depois de ter matado a sede.
— Delegadazinha tão educada...
Apesar da mente entorpecida, ela respondeu:
— Vilão malvado tão atencioso...
Já quase adormecendo, Victoria sentiu Logan massagear-lhe O arco dos pés.
Envolta por uma sensação deliciosa, desgarrou-se da última reflexão coerente.

Algo sólido rodeava Victoria e ela aconchegou-se mais a esse abrigo seguro.
Sonhava, mas tinha certeza de não se tratar da realidade, pois sabia não ser um
passarinho de topete vermelho, terminando de fazer o ninho no alto de um pinheiro.
Lá de cima, ela podia admirar a floresta e aquecer-se ao sol. No céu, nuvens alvas
e pequenas a lembravam das velas na enseada de Boston. Ao apreciar a magia da
mente, que tornava tudo isso possível, Victoria sentia-se invencível.
Tão logo terminasse de colocar o último galinho em seu paraíso, ela teria um ninho
para rivalizar com os de outros pássaros.
Uma sombra passou por seu santuário, fazendo-a erguer a cabeça. A descida
poderosa de uma águia prendeu-lhe a atenção. Aflita, esperou que a ave desviasse o
rumo, mas isso não aconteceu. Instantes depois, invadia-lhe o ninho. A raiva dominou
Victoria. Não havia lugar para as duas ali. A águia violava-lhe o território, mas seu bico
impunha respeito. Mesmo assim, tentou empurrá-la.

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— Victoria, pare!
A voz irritada de homem saiu do bico curvo da ave.
— Vá embora! Não há lugar para você aqui!
— Ontem à noite havia bastante.
Victoria arregalou os olhos. O semblante meio difuso de Logan estava a
centímetros de seu nariz.
Ela soltou uma exclamação. O marginal tinha lhe invadido a cama enquanto ela
dormia. Sua cabeça repousava no ombro dele e um dos braços o rodeava na cintura. As
pernas de ambos estavam entrelaçadas, enquanto sua saia levantava-se até quase os
joelhos. Quando a mente registrou esses detalhes constrangedores, Victoria recuou.
Tentou desvencilhar-se, mas os cabelos soltos estavam sob o ombro de Logan.
— Seu patife, me solte!
Em vez de atendê-la, ele rolou para frente e prensou o corpo sobre o seu. Na luz
do amanhecer, as feições machucadas dele exibiam uma coloração mais variada ainda.
— Bom dia, Victoria.
A saudação afável contrastava tanto com a expressão amedrontadora de Logan e
com seu esforço para livrar-se dele, que Victoria ficou confusa. Lutou para manter a
compostura e para controlar o coração disparado. Ele olhava para seus lábios e esta
não era a primeira vez que o fazia. Mas Logan encontrava-se mais perto do que jamais
estivera. O corpo sólido dele a tocava em todos os lugares.
Uma reação, não apenas de medo, a fez estremecer. Uma percepção primitiva
tomou vida em seu íntimo. Um desejo adormecido se fez sentir.
Ela prendeu a respiração quando fez uma nova descoberta. Nunca havia refletido
sobre a questão. Mas, com esse invasor sobre seu corpo, intuía como o homem fora
feito para se unir à mulher. Incrível como só aos vinte e quatro anos juntava os
pedaços do quebra-cabeça.
Este devia ser o ato apaixonado que Rochester sonhara experimentar com a
querida e meiga Jane Eyre. O que Lancelot e Guinevere tinham feito para trair o rei
Arthur. Ou então, o que o próprio pai fizera com a mãe, embora ela considerasse isso
algo forçado.
Victoria concluiu que, como nunca tivera a oportunidade de usar tal
conhecimento, ele havia ficado adormecido e à espera do momento em que ela fosse
requisitada para render a inocência. Sem dúvida, este não era o tal momento.
Devagar, soltou a respiração presa. Sabia que Logan sentia a exalação do ar
morno como acontecia com ela. Que ato incrivelmente íntimo compartilhar o mesmo ar.
Logan baixou a cabeça. Ia beijá-la, percebeu ela.
Não deixe!, advertiu uma voz na mente.
Ele não fechou os olhos e apenas roçou os lábios nos seus.
Victoria não podia afastar os olhos dos dele. Respirava com dificuldade e sentia
uma tensão intensa entre si e o homem cujo peito prensava seus seios.
Seus lábios ardiam. Uma sensação estranha percorria-lhe o corpo, tocando
lugares proibidos que pulsavam, insistentes. Chega!, a mente a avisou. Ainda não,
contradisse a parte desperta do corpo que queria prolongar a proximidade prazerosa.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Logan levantou a cabeça.
Victoria, não conseguindo falar, mexeu-se, apreensiva, sob ele.
— Pare quieta, Victoria.
— De jeito nenhum!
Ele teve a audácia de sorrir-lhe. E não se tratava de um gesto irritante e
presunçoso que incentivasse seu ressentimento. Ao contrário, era meigo e abalava sua
determinação de lutar contra Logan até o fim de suas forças para preservar a honra.
— Se continuar se mexendo, Victoria, algo, que você preferiria evitar, vai
acontecer entre nós.
Ela estava certa a respeito do marginal. O desgraçado não passava de um
saqueador.
— Prefiro morrer a me entregar a você!
Num gesto brusco, ele tomou-lhe a boca. Mas dessa vez, o beijo não foi uma
carícia meiga e sim, violento e possessivo.
Logan não demorou muito para terminar o ataque covarde. Quando ele levantou a
cabeça, Victoria sentia-se como se houvesse sido marcada a ferro e fogo pela posse
selvagem.
Os olhos que exibiam ternura momentos atrás estavam cheios de mal contida
violência.
— Se eu resolvesse possuí-Ia, sua resistência não me impediria.
Ela pensou em atirar a ameaça de volta, mas Logan já havia mostrado que suas
objeções à conquista física não significavam nada para ele.
— Por favor...
Victoria detestava suplicar, mas não tinha a intenção de ser usada por esse
malfeitor. Jurava que, quando recobrasse a liberdade, pegaria uma faca para arrancar
o coração negro desse bruto. Talvez o machado fosse melhor.
Satisfação estampou-se nas feições dele.
Usaria o machado, resolveu ela.
— Eu não estava forçando-a a se entregar a mim. Dormi a seu lado e não com
você. Foi você quem rolou para meu lado, invadindo meu território. E depois, espalhou-
se sobre mim — afirmou Logan, em tom seco.
— Não fiz isso! — protestou ela, embora desconfiasse ter ouvido a verdade.
Quando eram crianças, ela e a irmã dormiam na mesma cama. Annalee sempre
reclamava que Victoria ocupava o espaço de ambas.
— Outra coisa — continuou ele. — Há vários meses não tenho o prazer de estar
com uma mulher.
Mortificada, Victoria corou até a raiz dos cabelos. Tendo descoberto como
homens e mulheres se uniam, entendia o que ele queria dizer. Como Youngblood se
atrevia a lhe revelar algo tão íntimo?
— Isso não é de minha conta — balbuciou, ofendida com a franqueza dele.
Os olhos de Logan brilharam.
— Enquanto estivermos juntos, esse ponto é, definitivamente, de sua conta.
Victoria engoliu em seco. Intuía que ele falava sério e, portanto, seria melhor que

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ela desse atenção às palavras.
— Está bem — murmurou em voz trêmula.
— Está bem o quê? — ele resmungou.
— Não faço idéia — respondeu ela, confusa.
Não compreendia como tudo havia fugido de seu controle, mas culpava Logan pela
situação.
— Neste caso, vou lhe explicar. Mantenha distância e nada de natureza pessoal
acontecerá entre nós.
Imediatamente, ela reagiu contra a maneira arrogante de Logan e a implicação
que o episódio era, de certa forma, culpa sua.
— Então, sugiro que continuemos esta discussão em posição vertical. Saia de cima
de mim! — disse ela, tentando empurrá-lo.
— É o que eu deveria fazer — concordou ele, com expressão excitada.
Mas em vez de levantar-se, ele mexeu-se um pouco, fazendo o membro roçar na
juntura das coxas de Victoria. Como algo podia ser, ao mesmo tempo, tão impróprio e
agradável?
Logan baixou as pálpebras por um instante. Ao levantá-las, exibia uma
determinação que a alarmou.
— E então? — indagou ela.
Sua voz fraca a desanimou. Precisava mostrar-se forte para pôr esse patife no
lugar dele. E este não era em cima dela!
— Então o quê?
Novamente e com mais força, Victoria tentou empurrá-lo.
Ele fez uma careta de dor, porém, não lhe inspirou um pingo de simpatia. Homens
como Logan Youngblood provocavam o próprio infortúnio com o comportamento
imoderado.
— Já vou me levantar. Espere só um instante — disse ele, numa voz meio
sufocada.
Ela mordeu o lábio. Ao empurrá-lo, havia se esquecido das costelas quebradas.
Firmado nos braços, Logan soergueu o busto. O movimento aumentou a pressão
dos quadris dele nos seus.
Apesar da barreira das roupas, a fricção sutil estimulou um tremor latejante e
desconhecido em seu âmago. Foi com esforço que ela não o puxou de volta sobre os
seios. Embaraçada com tal reação, Victoria tentou ignorar a poderosa sensação que a
dominava.
Quando Logan, finalmente, engatinhou para fora, ela continuou deitada por alguns
momentos, tentando acalmar os sentidos. Estranho como o simples fato de dois corpos
se tocarem podia provocar tal prazer alarmante.
— Vamos, Victoria, precisamos partir logo.
Ao sair para a luz do sol, ela se esforçou para apagar da mente o que tinha
acontecido. Na verdade, não fora nada grave. Naturalmente, nunca tinha sido beijada
antes. Isso devia ser o que marcara a experiência em sua mente. Só porque se sentia
abalada não queria dizer que se lembraria do fato, do odor almiscarado, do olhar

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ardente e do roçar dos lábios de Logan pelo resto da vida.
Depois de alisar o vestido amarrotado, Victoria levantou a cabeça e o viu
observando-a. Por Deus, ele lembrava um dragão feroz e comedor de homens. As
feições machucadas e o olhar faiscante eram responsáveis por essa impressão.
— O que foi agora, Logan? — indagou, contraindo os artelhos no chão.
De repente, lembrou-se dele descalçando suas botinhas e massageando-lhe os
pés. Enrubesceu. Devia estar exausta, para permitir tal intimidade.
— Pare de me olhar como se quisesse me comer. Se tem algo para dizer, diga logo
— esbravejou ela.
As palavras aumentaram as faíscas nos olhos dele.
— Moça, você precisa, realmente, de alguém para vigiá-la. Jamais repita a um
homem que ele quer comê-la.
Victoria ficou surpresa. Que coisa mais peculiar para se dizer. Quase voltou a
reavaliar o nível de inteligência de Logan, mas já sabia que ele não era limítrofe na
capacidade de raciocinar. Todavia, tratava-se de um homem muito estranho. O melhor
seria não irritá-lo.
— Está bem — disse.
A expressão dele tornou-se mais sombria.
— Não me pergunte por quê.
— Essa não era minha intenção, pois não encontro motivo para ter feito tal
observação.
Logan passou a mão pelos cabelos e, sem razão alguma, Victoria tremeu. Precisava
controlar os sentidos desordenados, pensou ela.
— Vamos comer os pêssegos agora de manhã. Depois, atrelarei a junta.
A mudança de assunto fora abrupta, mas bem-vinda.
— Ótimo.
— Seguiremos mais devagar hoje e você poderá andar.
Isso era um alívio. Ela não teria de se submeter ao sacolejar do veículo.
— Sobre o que aconteceu... — começou ele, mas parou, dirigindo o olhar para os
cobertores sob o carroção.
— Não se preocupe. Não há necessidade de analisar o episódio. Acredito ter
rolado para seu lado. Minha irmã sempre me acusava de fazer isso quando dormíamos
juntas. E, levando em consideração seu prolongado jejum de companhia feminina,
temos uma justificativa adequada.
— Muito bem explicado.
O leve tom de sarcasmo não passou despercebido a Victoria. Ficava abismada que
seu primeiro beijo na vida houvesse sido dado por esse péssimo exemplo da população
masculina. Qualquer um outro teria sido preferível a esse criminoso.
— Não acho justo você me culpar inteiramente pelo beijo — ela se queixou.
— Por que acha que penso assim?
— Você disse que eu deveria manter distância. Isso dá a impressão de que sou a
única culpada. Se você quer ser justo, deve assumir sua parte de responsabilidade no
caso e ficar longe de mim — argumentou Victoria.

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— Você está se esquecendo de uns detalhes. A vida não é justa e a razão para
você manter distância é que sou homem e você, mulher.
— Não diga! Não me venha com a velha história de que sou culpada pelo simples
fato de ser mulher!
Carrancudo, Logan deu um passo em sua direção. Ela, manteve-se firme. Estava
cansada de homens como o próprio pai, que sempre acusavam a suposta fraqueza
feminina para justificar os problemas entre os sexos.
— Pelo jeito, vou ter de ser franco.
O tom agressivo a inquietou. Ele a fitou com expressão predatória, enquanto
levava a mão para frente da calça e dizia:
— Os homens têm necessidades.
Seu olhar seguiu o gesto e, mortificada, Victoria arregalou os olhos ao vê-lo
ajeitar a calça. Franco? Logan era grosseiro além da conta!
— Nós ficamos rígidos e doloridos quando passamos algum tempo sem o conforto
feminino. Nessas ocasiões, a proximidade de uma mulher nos impede de pensar com a
cabeça e...
Calou-se e ela prendeu a respiração. Temia as próximas palavras, mas achava-se
fascinada pela explicação dele. Numa curta fração de tempo, ela descobria mais sobre
a vida em geral, e sobre homens em particular, do que havia aprendido a vida inteira.
Estava sendo uma educação constrangedora, porém, sentia-se seduzida pelo
inacreditável professor.
— Você é bonita e inocente demais para seu próprio bem, Victoria.
O elogio foi um choque, mas provocou-lhe uma onda de prazer. Quanto à
inocência, por Deus! Se Logan continuasse falando por mais cinco minutos, ela acabaria
especialista em necessidades masculinas.
— Um homem agarra o que deseja quando está a seu alcance. Uma mulher é mais
controlada. Por isso, sugeri que você mantivesse distância.
Ele tinha mais confiança nas mulheres do que era recomendável, refletiu Victoria.
Lembrava-se do momento em que quase o puxara de volta sobre ela.
— Entendo. Sabe, Logan, talvez eu possa ajudá-lo.
— O quê?! — indagou ele, atônito.
— Não fique tão surpreso. Como você disse, sou mulher e, portanto, a pessoa
ideal para resolver seu pequeno problema.
— Pequeno?!
— Veja. Sua dificuldade principal é a falta de companhia feminina.
Logan levantou a mão e a acariciou no rosto. Ela sentiu um arrepio ao longo da
espinha.
— Você é cheia de surpresas, Victoria.
Outro elogio. Ela viu-se sorrindo para esse homem não tão complexo, afinal.
— É muito simples, Logan. Tudo que temos a fazer é reformá-lo. Mudaremos sua
maneira instável de viver e corrigiremos sua deplorável falta de boas maneiras.
Ele baixou a mão como se tivesse sido queimada.
— Você faria isso?

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— Sem dúvida. É a solução perfeita — disse ela, com entusiasmo. — Posso ensiná-
lo a ser civilizado. Dessa forma, você será capaz de encontrar uma mulher boa e
decente que não o rejeitará. Naturalmente, se casará com ela. Quando o fizer, jamais
terá falta do que chama "conforto feminino".
Victoria o fitou à espera de um agradecimento pela oferta generosa.
— Vá para o inferno!

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CAPÍTULO OITO

Furiosa com a obstinação de Logan, Victoria caminhava atrás do carroção


vagaroso. Qualquer pessoa, com um mínimo de inteligência, entenderia que ele
precisava de toda a ajuda possível. Sem dúvida, o orgulho dele o impedia de aceitar
sua oferta.
Quando havia terminado a higiene matinal e voltado para junto do carroção, ela
encontrara Logan tentando enrolar uma tira de lençol ao redor do torso. Apesar de
estar irritada com ele, tinha se oferecido para ajudá-lo. Ele simplesmente respondera
ser capaz de cuidar das próprias necessidades. Se isso fosse verdade, o tolo não teria
ido parar preso numa cela abandonada.
Como não adiantasse nada explicar isso a Logan, ela havia se sentado num tronco
e comido os pêssegos de uma lata aberta por ele. De vez em quando, dirigia-lhe o
olhar.
Naturalmente, vira-se forçada a notar-lhe o peito coberto por pêlos escuros.
Outra vez. Não deixava de ser curioso esse seu crescente interesse pelo peito
magnífico e bem formado do homem. Mal podia acreditar que houvesse apoiado a
cabeça nele durante a noite. Uma pena estar dormindo durante a experiência.
De repente, Victoria tropeçou numa raiz e caiu com os joelhos e as mãos no chão.
Levantou-se e limpou a terra e as folhas secas do vestido. O carroção seguia em
frente.
Ela precisava prestar mais atenção ao que fazia, em vez de ficar pensando no
peito de Logan, recriminou-se, ao recomeçar a andar.
Suspirou. Se não se conservasse perto do carroção, Logan continuaria sem ela e
não daria por sua falta até o anoitecer. Seriam todos os homens do oeste tão
impacientes?
Victoria tinha achado os livros que ele jogara fora. Felizmente, ela os havia
encontrado e posto de volta no carroção, quando Logan estava distraído.
O homem era um bárbaro. Já havia mostrado ser capaz de qualquer coisa. Isso
sem falar na dissimulação dele. Logan conseguia vencer suas defesas e iludi-Ia com a
falsa sensação de segurança. Na véspera, à noite, ele a tinha alimentado, matado sua
sede e até massageado-lhe os pés. Havia tratado-a como uma criança e feito tudo,
exceto contar-lhe uma história para dormir.
Ele a conhecia há apenas dois dias e Victoria quase já o tinha destruí do. Logan
sabia que o corpo não seria mais o mesmo depois de tê-la segurado entre os braços
até se ver prestes a explodir e ser forçado a soltá-la. Nenhum homem merecia tal
castigo.
Victoria Amory era uma ameaça a si mesma e a todas as pessoas com quem
entrasse em contato. Apostava como o chefe do comboio e Dodson, a quem ela atirara
no pé, haviam se considerado com sorte ao se livrarem da mulher irritante.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Logan pensou na noite anterior, quando ele agira como o Bom Samaritano. Victoria
estava tão cansada, que não conseguia falar com coerência. Por razões inexplicáveis,
sua vulnerabilidade o tinha afetado, levando-o a considerar de suma importância
cuidar dela. Tinha feito tudo, exceto cantar uma cantiga de ninar.
Logan fez uma careta. Quando se deitara, tinha sido com intenções honradas.
Pretendia apenas ter uma boa noite de sono e, portanto, acomodara-se longe de
Victoria. O ritmo de sua respiração quase o fizera adormecer.
Entretanto, ainda estava acordado quando ela rolara para perto. Notou logo seu
perfume feminino e como sua silhueta caberia perfeitamente entre os braços dele.
Devia ter ficado, por quase uma hora, esperando que Victoria se aproximasse
mais. E então, ela o fizera. Ele não havia sentido um pingo de culpa ao aconchegá-la de
encontro a si. Surpreendera-se com a satisfação imensa provocada pelo simples fato
de abraçá-la. Sua mente podia ser algo confusa, mas suas curvas femininas eram
macias e convidativas.
Ele não tinha tirado vantagem da situação. Só um patife o faria. Mas permitira às
mãos o prazer de acariciá-la de leve, quando a tinha acomodado de maneira
confortável.
Estreitar uma mulher desejável de encontro ao corpo e não ir em frente era uma
tortura mais cruel do que qualquer outra imaginada pelo homem branco, ou pelo
indígena.
O beijo não tinha sido planejado. Mas ao deitar-se sobre seu corpo, ele perdera o
bom senso. Algo naqueles olhos verdes de Victoria sugeria paixão desenfreada.
Fora tolice beijá-la. Para cometer uma bobagem, um homem deveria ter a
precaução de realizar o trabalho completo. Por que não aproveitara a oportunidade
para experimentar o sabor e a textura de sua boca? Apostaria todo o dinheiro do
cofre do banco como, apesar de seu comportamento azedo, ela era uma mulher doce.
Não se enganava quanto a sua inocência. Era ela quem tornava Victoria um
problema sério. Ao se oferecer para ajudá-lo a enrolar a tira em volta do peito, ela
provara a ingenuidade. Depois do beijo, Victoria pensava que ele agüentaria o toque de
seus dedos na pele sem levar o relacionamento adiante?
Tão óbvio como as sardas douradas em seu nariz era o fato de Victoria ignorar a
natureza íntima do homem. Ela não fazia idéia de como escapara por pouco nessa
manhã. Mas mesmo que lhe custasse a vida, ele pretendia levá-la intacta até Trinity
Falls.
Não deixava de ser irônico, pois, afinal, ela o considerava abaixo de qualquer
criminoso. Mas isso era irrelevante. Ele tinha seu código de ética e este não permitia a
sedução de uma intelectual de Boston. Ficou deprimido ao d; conta de que nunca iria
provar o sabor de Victoria
Uma brisa começou a soprar e, curioso com o adiantado da hora, Logan procurou o
relógio de bolso. Só lembrou-se de já estar sem ele quando fora preso no forte. Sem
dúvida, um dos soldados tinha se apossado da peça de ouro. Observou o ângulo do sol
no céu e calculou não faltar muito para o anoitecer. Sentiu uma pontada de culpa.
Havia parado só uma vez para permitir que Victoria descansasse.

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- Oa! - gritou, e os bois pararam.
Estudando o local, Logan concluiu que estavam a menos de três quilômetros do
lugar onde pretendia passar a noite. Já tinham adentrado bem pelo território e,
portanto, poderiam acender uma fogueira fim de preparar uma refeição quente.
Desceu do carroção e ficou à espera de que Victoria vencesse os últimos metros até
ele.
Com a cabeça baixa, ela caminhava olhando para chão. Tinha os ombros curvados,
o chapéu torto e a manga direita rasgada na altura do ombro. A sensação de culpa dele
aumentou.
— O que aconteceu?
— Nada - respondeu ela ao parar. - Estou apreciando muito a caminhada por este
parque chamado Território de Idaho. Por que você não volta para o carroção e tenta
percorrer mais uns cem quilômetros antes do anoitecer?
Logan não deu atenção à sugestão sarcástica. Sua feições mostravam que ela
estava no limite da resistência. Pelo rasgo da manga, ele viu a pele queimada de sol.
Não resistiu e tocou-a. Esperava que ela recuasse, mas Victoria permaneceu imóvel,
fitando-o com ar sério.
— Você caiu?
Ela respondeu com um gesto afirmativo de cabeça. - Por que não me chamou? Eu
teria parado, meu bem. A expressão carinhosa brotou dos lábios dele por conta
própria. Mentalmente, Logan contou os segundos até ouvir seu protesto. Chegou a
três.
— Não me chame de meu bem. — Seus olhos verdes brilharam com beligerância.
— Não encontrei dificuldade em acompanhá-lo.
— Você rasgou o vestido — comentou ele, não conseguindo parar de acariciar-lhe
o ombro.
— É velho. A costura cedeu — Victoria disse, ao recuar para trás.
Tentando pensar em outra coisa além de seu corpo atraente, Logan Virou-se de
costas e disse:
— São só mais uns três quilômetros até o lugar onde vamos acampar esta noite,
Victoria. A trilha até lá não é muito acidentada. Se você for no carroção, não sofrerá
muitos solavancos.
— Posso caminhar mais três quilômetros.
— Como queira.
Sentada num toco de madeira, Victoria mantinha os olhos na fogueira, que havia
acendido enquanto Logan pescava algo para o jantar, no riacho a pouca distância. Ela
fritara a truta e uma receita de bolinhos de trigo sarraceno. Tinham terminado a
refeição com mais uma lata de pêssegos.
A escuridão aumentava e as estrelas se multiplicavam no céu. Victoria sentia-se
alimentada e satisfeita. As chamas avermelhadas tinham diminuído, mas mesmo assim
a luminosidade da fogueira era suficiente para exercer seu poder hipnótico.
— O que será que torna o fogo tão fascinante? — ela perguntou a Logan, sentado
do outro lado.

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— Isso é o mesmo que indagar por que o capim é verde e o céu, azul.
Às vezes, a lógica era irritante, pensou ela.
— Quando criança, eu costumava me sentar em frente da lareira e ficar olhando
as chamas durante horas. Via nelas dragões, castelos, mares encapelados e até
boiadas disparadas. O que você vê quando olha para o fogo, Logan?
Fez-se uma pausa e Victoria conjeturou se ele era incapaz de usar a imaginação.
— Sabe, não é uma boa idéia fixar os olhos no fogo.
— Por que não? Existe uma regra no oeste contra isso?
— Sim, de certa forma.
— Explique melhor.
— É uma questão de sobrevivência. Quando se olha para o fogo por muito tempo,
fica-se com um tipo de cegueira noturna. Se algo inesperado acontecer — digamos, a
aparição de um puma, ou de um invasor de duas pernas — e você precisar usar sua
arma depressa, não poderá atirar com precisão porque só verá a imagem ondulante das
chamas.
Victoria sentiu um arrepio. A referência de Logan a um invasor de duas pernas só
podia ser sobre um homem da lei que andara no encalço dele para prendê-lo. Que
maneira horrível de se viver, sempre esperando problemas vindos de uma sociedade
responsável. Teria ele conhecido outro tipo de vida?
— Você é um homem estranho, Logan.
— Quantas vezes você já me insultou desde que nos conhecemos, Victoria?
— Não foi minha intenção.
— Pior ainda. Como sua opinião sobre mim é péssima, você não precisa pensar em
algo rude para me dizer.
Ela retesou os músculos.
— Não tenho um único osso rude em meu corpo.
— É melhor não misturarmos seu corpo na conversa.
O que Logan queria dizer? Não apreciava seu corpo?
— Quando disse que você era um homem estranho, o sentido era peculiar.
— Grande diferença!
— Quer calar a boca e me ouvir?
Tão logo falou, Victoria bateu nos lábios. Jamais tinha usada a expressão
grosseira. Isso provava como Logan a tirava do sério. Ele poderia levar uma freira a
blasfemar.
Fez-se um silêncio prolongado e ela percebeu que Logan a obedecia.
— O que acho peculiar é o fato de você ter me dito, no primeiro dia, haver
passado grande parte do tempo em Trinity Falls e não nestas montanhas. Entretanto,
você sabe onde fica cada riacho, que curvas fazer nesta trilha, como pegar um peixe
sem vara de pescar, além de conhecer todas as regras de um acampamento. Isso que
acho fora do comum.
Fez uma pausa, ela imaginando se tinha aplacado o homem sensível. Mas por que
se importar se o havia ofendido, ou não?
— Usei seu garfo de cozinha para fisgar o peixe.

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— Está vendo? Isso não só é peculiar, mas admirável também.
— Talvez para o homem branco.
— Logan, você é um homem branco.
— Mas vivi uns tempos com os índios.
O Último dos Moicanos era um de seus livros prediletos. Pensar que o homem,
sentado do outro lado da fogueira, havia morado entre os primitivos e aprendido seus
segredos, atiçava-lhe a imaginação.
— Lobo da Noite era um dos índios com quem você conviveu?
— Morei com a tribo dele.
Victoria inclinou-se para frente. Como era difícil arrancar informações de Logan.
— Vocês se tornaram irmãos de sangue? Foi por isso que ele o avisou sobre o
ataque ao forte?
— Nós ficamos amigos.
Victoria não desanimou. Tinha certeza de que algo excitante acontecera a Logan
durante a convivência dele com os índios. Precisava induzi-lo a contar os detalhes da
experiência.
— Como vocês se conheceram?
Ela visualizava Logan, ou Lobo da Noite, salvando a vida do outro de um urso
enraivecido, talvez de bandidos.
— A primeira vez que vi Lobo da Noite, ele trocava pepitas de ouro por
mantimentos num armazém.
— Ah.
— Você parece desapontada. Imaginou que eu o tinha salvado de um linchamento?
A pergunta dele estava tão perto da verdade, que Victoria mexeu-se,
constrangida.
— Não, espere — continuou ele, sem lhe dar a oportunidade de responder. — Na
seqüência dos acontecimentos imaginados por você, seria eu quem estaria com a corda
no pescoço.
Victoria manteve-se calada. Qualquer coisa que dissesse seria usada contra ela.
— Nenhum comentário? — Logan perguntou, estranhando seu silêncio.
Ela limitou-se a dizer:
— Então, você conheceu Lobo da Noite em um armazém. O que aconteceu depois?
— Tem certeza de que quer saber?
— Absoluta.
— Não entendo. Por que está interessada em saber sobre meu relacionamento
com Lobo da Noite? — questionou ele.
— Simples. Não conheço um índio e estou curiosa. Além do mais, quero saber
como você se familiarizou com cada curva, árvore e penedo desta trilha. Vi quando
você olhou para o sol no fim da tarde. Aposto como calculou a hora exatamente.
— Não com a precisão de minutos. Se ainda tivesse meu relógio, eu o teria
consultado.
— Você o perdeu?
— Um dos soldados deve tê-lo roubado quando eu estava inconsciente.

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— Ora, isso é vergonhoso! O oficial-comandante deveria ser informado para que
pudesse repreendê-lo severamente. Isso sem falar na devolução do relógio.
Logan riu.
— Essa poderá ser sua próxima missão depois de me entregar às autoridades.
Por que ele se referia ao assunto desagradável, quando estavam se dando tão
bem?
— Por favor, fale mais sobre você e Lobo da Noite.
— A troco de que você acreditaria no que eu lhe contasse?
A pergunta a deixou perplexa. Suas suspeitas sobre o caráter dele seriam tão
óbvias? Naturalmente, o fato de tê-lo encontrado preso e abandonado pelos soldados
havia contribuído na formação de sua opinião sobre ele. Todavia, não o considerava
mentiroso. Talvez assassino ou ladrão.
Victoria tentou, mas não conseguiu, entender seus sentimentos ambivalentes por
Logan. O homem era um mistério. Possuía a habilidade de confundi-Ia de todas as
formas. Às vezes, a prendia com olhar penetrante, podia ser grosseiro, ou bondoso.
Isso a deixava confusa, pois queria confiar nele, mas tinha medo.
O único fato irrefutável sobre Logan era o de ter cometido um crime hediondo e
merecedor da pena de morte.
— Você está levando muito tempo para responder minha pergunta.
— Não tenho certeza de acreditar em tudo que você diz. Mas estou disposta a
fazer isso no caso de sua historia com Lobo da Noite — disse ela.
— Eu me considero feliz por você se mostrar tão generosa.
— Eu já lhe disse que você tem o hábito desagradável de ser sarcástico?
— Ponha mais esse defeito em minha conta.
— Bem, você conheceu Lobo da Noite em um armazém — Victoria repetiu,
determinada a arrancar a história de Logan.
— Por Deus, você é uma mulher teimosa!
— Pois ponha mais esse defeito em minha conta — sugeriu ela, em tom afável.
— E você tem coragem de me chamar de sarcástico?! Você consegue reduzir uma
pessoa a zero!
Sem lhe dar ouvidos, ela insistiu:
— Logan, o que aconteceu no armazém?
De repente, ela imaginou se Logan não tinha ido lá para roubar. Talvez por isso
hesitasse em contar a história.
— Não, Victoria — protestou ele, em tom resignado.
— Não o quê?
— Eu não estava no armazém com a intenção de roubar.
Deus misericordioso! Quando Logan adquirira a habilidade alarmante de ler sua
mente?
Logan observou Victoria do outro lado da fogueira. Não havia o mínimo traço de
hipocrisia em sua personalidade. Era a pessoa mais honesta e franca que ele
conhecera. O que pensava, dizia. Mas apreciaria mais essas qualidades se Victoria
tivesse uma opinião melhor a respeito dele.

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Logan apanhou uma vareta e atiçou o fogo. As costelas quebradas já não doíam
muito.
— Parei no armazém para comprar tabaco.
— Não sabia que você fumava.
— Gosto de um charuto de vez em quando.
Victoria levantou-se e alisou a saia. Logan quase riu do contraste entre seu porte
aristocrático e seu aspecto desarrumado. Os cabelos soltos e embaraçados lembravam
uma nuvem avermelhada no poente. O vestido, além de rasgado no ombro, estava sujo
e amarrotado e havia uma mancha de barro em seu rosto. Mas a julgar pela pose, ela
poderia estar na sala de sua casa em Boston para recepcionar a nata da sociedade.
Os pais tinham razão, admitiu Logan. Uma boa educação distinguia as pessoas.
Mas eles haviam levado essa bandeira longe demais, ao esperar que ele se casasse com
Robeena Stockard, a fim de preservar o prestígio da família. Para eles, fora
secundário o fato de a noiva ter ido para a cama com o futuro cunhado. A traição
perdia importância diante da possibilidade de um escândalo denegrir o nome dos
Youngblood. Afinal, eram banqueiros conceituados. E assim, eles tinham tomado o lado
de Burke, que alegava o engano de Logan sobre a cena vista com os próprios olhos.
— Ainda bem que você não adquiriu o péssimo hábito de mascar tabaco —
Victoria comentou.
— Ainda não — respondeu ele, ao afastar as lembranças do passado.
— Por Deus, Logan. Você já tem um bom número de maus hábitos. Por que
acrescentar outro?
Victoria rodeou o fogo e aproximou-se, sentando-se ao lado dele. Logan se
inquietou. Tinha ficado longe dela de propósito, pois aprendera uma boa lição de
manhã. Ela, pelo jeito, não. A proximidade era perigosa para ambos, além de incômodo
para o corpo dele.
Apesar da recomendação, Victoria fixou o olhar no fogo.
A luz das chamas dançava em seu rosto atraente. Logan mexeu-se, prometendo a
si mesmo um banho no riacho, depois que ela se retirasse para dormir. Alimentada
pelos lagos gelados das montanhas, a água estaria na temperatura ideal para aliviar o
calor provocado pela presença de Victoria.
Ele devia protestar contra sua acusação. Não tinha mais maus hábitos do que a
maioria dos homens. Mas disse apenas:
— Não deixa de ser bom você se interessar por meus problemas.
Ela virou-se e o fitou com ar sério. O estômago dele contraiu-se. Perplexo com o
fato de Victoria provocar-lhe tal reação, ele cutucou o fogo.
— Por favor, conte como você e Lobo da Noite se tornaram amigos — pediu ela,
tocando-o no braço.
Logan olhou para a mão tão pequena e frágil e imaginou como seria senti-Ia na
pele sem a barreira da camisa.
Talvez falar sobre Lobo da Noite quebrasse o encantamento exercido por
Victoria, refletiu ele.
— Foi em fevereiro e nevava muito. Lobo da Noite trocava pepitas de ouro por

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mantimentos. No passado, o povo dele contava com carne de búfalo suficiente para se
alimentar durante o inverno todo.
— Já ouvi falar na mortandade dos animais, provocada pelas estradas de ferro.
Que grande desperdício — Victoria comentou.
Seu conhecimento do fato e sua opinião o surpreenderam.
— O pior não é o desperdício. Quando os últimos búfalos desaparecerem, os
índios ficarão numa situação desesperadora.
— Você acha que todos os rebanhos serão dizimados?
— Já estão a caminho da extinção. Em poucos anos, as ferrovias estarão
cortando o país inteiro. Então, não haverá mais lugar para os búfalos, para o povo de
Lobo da Noite e outras tribos.
— Talvez os índios possam se tornar fazendeiros ou criadores de gado.
— Depois de conviver com eles, não creio que sejam capazes de se sujeitarem a
atividades regulamentadas. Também, eles consideram a terra de maneira diferente da
nossa.
— Como assim?
— Não acham que a terra deve ser usada como o homem branco o faz e sim
conservada, como um tipo de herança, para as gerações futuras. Esse modo de pensar
tem cunho religioso.
— Pelo que li, os índios adoram a natureza.
— Uma coisa é certa. Eles não procuram grandes riquezas. Vivem com
simplicidade, considerando as necessidades imediatas da família em primeiro lugar.
— Parece uma maneira muito satisfatória de se viver, não acha?
Logan sorriu.
— Antes de você aceitar o modo de vida indígena, precisa saber que as mulheres
trabalham muito. Com couro de veado, fazem roupas e mocassins bordados com contas
e cobertores de pele de búfalo. Curtem couro e, depois, o mastigam para torná-lo
macio. Só cozinham em fogueiras. Nunca estão com pressa, mas trabalham de sol a sol.
— Muitas mulheres brancas também trabalham bastante. As casadas com
fazendeiros carregam água, fazem sabão, lavam montanhas de roupa, cozinham, limpam
e ainda ajudam no trabalho do campo. Aposto como o dia delas é mais comprido que o
dos maridos, pois quando eles chegam em casa ao anoitecer, as tarefas do dia já
terminaram. As mulheres, com a ajuda de lampiões, ainda fazem muita coisa depois do
pôr-do-sol.
— Você tem razão. Algumas mulheres brancas trabalham tanto quanto as índias.
Victoria dobrou os joelhos e passou os braços em volta deles.
— Voltando a Lobo da Noite. Ele conseguiu os mantimentos?
— Finalmente, depois de algum tempo.
— Como assim? Ai, Logan, se não se apressar, vai levar a noite inteira para contar
esta história.
A impaciência de Victoria deixou Logan mais consciente de sua proximidade.
Imaginou se ela demonstraria a mesma veemência ao fazer amor.
— Naquela época, não era comum a presença de um índio na cidade. A de Lobo da

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Noite atraiu um grupo de curiosos. Não se sabia se eles estavam interessados no índio
ou nas pepitas de ouro que ele começava a tirar de uma sacola de couro.
— Lobo da Noite estava sozinho?
— Sim. Pelo jeito, antes de ir ao armazém, ele já tinha trocado algum ouro por um
carroção e uma parelha de cavalos. Sem dúvida, pretendia levar um bom suprimento
de mantimentos para seu povo.
— Conseguiu?
— Só depois de algumas peripécias. Gealy, o dono do armazém, tentou cobrar
quatro vezes mais o valor da mercadoria.
— Que malvadeza! Alguém deveria tê-lo impedido.
— O próprio Lobo da Noite fez isso. Sua dignidade era tanta, que Sam Gealy,
envergonhado, foi mais justo. Infelizmente, existem pessoas cujas consciências não se
deixam afetar. A visão de ouro desperta-lhes a ganância. O tamanho e a pureza das
pepitas de Lobo da Noite fez isso nos homens que observavam a barganha.
— Mas eles não podiam roubá-lo no armazém.
— A ganância não age dessa forma, Victoria.
— Explique, então.
— Quando ela domina um homem, a primeira reação deste é encarar todo mundo
como um inimigo em potencial. Cada um daqueles sujeitos planejava seguir Lobo da
Noite e apanhá-lo sozinho.
— Mas todo o ouro teria ficado no armazém. Lobo da Noite só estaria com os
mantimentos — argumentou Victoria.
— E com o conhecimento do lugar onde encontrara as pepitas. A exploração do
metal poderia transformar um miserável num homem rico.
— Lobo da Noite sabia que corria perigo?
Logan lembrou-se de como tinha fitado o chefe indígena. Naquela fração de
segundo, estabelecera-se uma comunicação silenciosa entre ambos. O índio não
ignorava o risco de estar lá, mas a situação de seu povo era tão precária, que ele se
atrevera a ir a Trinity Falls.
— Sabia, sim.
— O que aconteceu depois?
— Ele pôs tudo no carroção e dirigiu-se para fora da cidade. Então, resolvi segui-
lo.
— Você também, Logan?!
Ele levou uns segundos para registrar a implicação das palavras de Victoria. Ficou
tenso e jurou que, se ela lhe insultasse a honra ou a inteligência mais uma vez, ele a
esganaria.
— Eu também o quê, Victoria?
Ela hesitou um pouco.
— Bem, não quero ser indelicada, mas por sua maneira de falar sobre a ganância,
imaginei se... Esqueça. Não era importante.
— Tem certeza?
— Tenho. Continue a história — pediu ela.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Não fui o único a segui-lo. Pelo menos, uns doze homens fizeram o mesmo.
— Por que você o acompanhou?
Por alguma razão, Logan intuiu que Victoria acreditaria nele. Geralmente, não se
enganava.
— Eu não poderia virar as costas a um homem corajoso o suficiente para expor a
vida pelo bem dos mais fracos. Vi muitos homens bons perecerem na guerra.
— Você tomou parte nela?
Logan assentiu com um gesto de cabeça. Tinha guardado as experiências do
conflito numa parte escondida da mente. Conhecia uma verdade suprema. As guerras,
não importava quão nobremente eram classificadas, destruíam homens e suas almas.
Os sobreviventes conservavam cicatrizes não só no corpo como no espírito também.
— Bem, apesar da ambição individual de cada homem, naquela tarde de fevereiro
eles se uniram com um único objetivo: forçar Lobo da Noite a mostrar-lhes onde ele
tinha encontrado o ouro.
Logan viu Victoria estremecer. Não sabia se era por causa da história, ou do
vento frio. Para vencer a tentação de tomá-la entre os braços, tornou a reavivar o
fogo.
— Lobo da Noite conduziu a parelha num trote firme durante os primeiros
quilômetros. Aos poucos, levou os cavalos a um passo mais apressado. Os homens
fizeram o mesmo com suas montarias. Logo, todos galopavam e a distância entre o
carroção e os perseguidores diminuía. Depois de alcançar o topo de uma colina, o
veículo desapareceu de vista.
— Aí ele escapou? — indagou Victoria.
— Não. O abrigo da floresta estava um pouco mais adiante, mas Lobo da Noite
não chegaria lá antes de ser atacado. Também, não poderia abandonar o carroção e
embrenhar-se entre as árvores.
— Claro. Nesse caso, a viagem teria sido perdida.
— Mas ele provou ser mais inteligente do que os homens. Tinha preparado uma
surpresa para quem resolvesse segui-lo. Quando eles começaram a galopar colina
abaixo, foram recebidos por uns vinte guerreiros indígenas. A luta foi rápida e
definitiva.
Por alguns instantes, fez-se silêncio. Então, Victoria comentou:
— Uma pena que alguém tivesse de morrer. Mas fico satisfeita com o fato de
Lobo da Noite ter conseguido levar os mantimentos para seu povo faminto.
— Como eu seguia o grupo de perseguidores, ouvi o tiroteio antes de chegar ao
topo da colina. Freei a montaria sem ver o que tinha acontecido. Imaginei se Lobo da
Noite não fora atacado e morto. Mas isso não fazia sentido, pois sem ele vivo, os
homens não descobririam onde havia ouro. Continuei a escalar a colina e, lá de cima, vi
Lobo da Noite vindo a meu encontro.
— Ele deve ter pensado que você também estava atrás das pepitas.
— Foi o que me ocorreu. Temi por minha vida. Lobo da Noite me observou com
olhar penetrante e perguntou por que eu o havia seguido. Respondi que não considerava
favorável a situação dele para enfrentar os homens.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Ele acreditou?
— Sim. Continuo vivo, não é?
— Mas o que o levou a aceitar a palavra de um branco se ele e seu povo acabavam
de matar uma dúzia de homens que tinham tentado apanhá-lo como se ele fosse um
animal selvagem? — Victoria quis saber.
— Jamais saberei a resposta. Porém, posso lhe garantir que existe algo nos olhos
de Lobo da Noite muito peculiar, como você diria. Ele dá a impressão de poder ler o
pensamento das pessoas.
— Incrível, Logan. Essa é uma história fantástica. Você poderia escrever um livro
sobre suas experiências no oeste. Milhares de pessoas gostariam de lê-lo.
— Só você para ter uma idéia dessa, Victoria.
— Não descarte tal possibilidade — insistiu ela, apertando-lhe o braço. — Conheço
muita gente no leste que sente fascinação pelas histórias do oeste.
Dois pensamentos ocorreram a Logan. Primeiro: se continuasse a sentir a mão de
Victoria no braço por mais um instante, ele cometeria o desatino de beijá-la novamente.
Mas dessa vez não perderia a oportunidade de descobrir seu sabor.
O segundo pensamento veio em forma de pergunta. Como esta criatura se deixara
encantar pelos livros? Achou melhor investigar essa questão em vez de descobrir como
um beijo verdadeiro e profundo o afetaria.
— Você veio para o oeste por causa das histórias que leu em seus livros?
Ela lhe dirigiu um olhar incrédulo.
— Que idéia mais fantasiosa, Logan. Vim para cá por uma razão prática. Recebi a
oferta de um emprego.
— Para fazer o quê?
Mais uma vez, Logan a imaginou trabalhando num bar, vestida de maneira
escandalosa. Idéia ridícula. Ela preferiria ser enforcada a se exibir com as roupas de
uma garçonete de cabaré.
— Martin Pritchert me contratou como professora de uma menina chamada
Madison Earley.
Logan parou de respirar. Ouvia o conhecido latejar nos ouvidos. Ele sempre se
fazia sentir no momento crucial antes de a corneta anunciar o início da batalha.
Naqueles segundos que precediam o caos, Logan sempre tinha a sensação de que o
destino bafejava atrás de seu pescoço.
Pois voltava a sentir a mesma coisa. Era como se tivesse havido uma pequena
mudança no universo e o destino dirigisse sua atenção sinistra para Logan Youngblood.
— Conheço Pritchert — disse com dificuldade.
Com tantas mulheres competentes no país, o amigo tinha contratado uma de
Boston? Martin sabia o quanto ele detestava a cidade e o tipo de regras rígidas que
forçava a seus habitantes.
Não havia nada rígido em Victoria Amory, uma parte da mente dele salientou. Seu
corpo era macio e maleável.
— Então, talvez você conheça o patrão do sr. Pritchert e tutor da menina a quem
vou ensinar.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Qual é o nome dele? — Logan perguntou, certo de que Martin não tinha
informado Victoria.
Se o houvesse feito, ela o teria reconhecido quando Logan se apresentara no
forte.
— Estranho, mas pensando bem, só agora me dou conta de que o sr. Pritchert não
mencionou o nome. Por que será?
Logan sabia. O nome dele ficara desonrado na alta sociedade de Boston. Se Martin
planejava contratar um membro da elite da cidade, não poderia ter informado à
pretendente que seu futuro patrão era o mesmo homem que abandonara a noiva no altar.
Pela primeira vez, desde o dia em que deixara Boston, Logan sentiu uma pontada de
culpa pela maneira como havia rompido com Robeena. Mas, furioso com sua traição, havia
se vingado e preservado o orgulho da forma mais primitiva e satisfatória possível.
Desde então, ele se negava a conversar sobre a família, o irmão e Boston com Martin. O
amigo sempre tinha respeitado a vontade dele. Logan imaginava que, tendo saído do
caminho, Burke e Robeena haviam se casado.
— Bem, isso não é importante. Tão logo chegue a Trinity Falls, descobrirei — disse
Victoria.
— Sem dúvida.
Conte que é você.
Não. Não revelaria quem era. Victoria não tinha juntado o nome Logan Youngblood
a sua cidade natal porque ignorava qualquer ligação dele com Boston.
Ela já o considerava um criminoso comum e não entenderia os motivos dele para
vingar-se de Robeena. Não havia mal algum em apreciar a companhia de Victoria por
mais uns dias, sem lhe dar novos motivos para desprezá-lo. Aproveitaria a oportunidade
para verificar se ela era competente para educar Madison.
Mentira. Victoria Amory já havia provado seu valor. Tinha caráter e inteligência,
além de ser uma verdadeira dama.
— O fogo está quase apagado e o vento aumentou bastante. Uma pena — disse ela.
— Por quê?
— Eu pretendia tomar um banho no riacho agora à noite — respondeu Victoria, ao
levantar-se.
Logan a imaginou nua e molhada. Excitou-se.
— Você morreria congelada.
— A primeira coisa que vou fazer quando chegar a Trinity Falls é tomar um longo
banho quente.
Ele visualizou seu corpo delicado numa banheira de porcelana, cheia de espuma
perfumada. As bolhas pingariam do bico cor-de-rosa de seus seios. Para desligar-se da
fantasia, levantou-se e sugeriu:
— Bem, podemos dar o dia por encerrado e nos recolher para dormir.
— Você acha que vai chover?
Ele olhou para o céu e viu as estrelas desaparecendo sob nuvens densas,
empurradas pelo vento.
— Talvez. É melhor nos apressarmos.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Nos minutos seguintes, trabalharam juntos, arrumando o acampamento. O vento
continuava a aumentar e, quando se acomodaram sob o carroção, já sabiam da
aproximação de uma tempestade.
Logan ouviu Victoria bater queixo de frio. Pensar em aquecê-la entre os braços era
perigoso, mas ele não resistiu.
— Venha cá — chamou-a levantando a beirada do cobertor. — Você vai ficar
enregelada aí.
Idiota! Você não vai conseguir nem cochilar, com essa mulher dormindo a seu lado
outra vez, advertiu-o uma voz na mente.
Victoria escorregou até ele e entrou sob o cobertor. Estava gelada e tremia de
frio. Ele a puxou para mais perto e começou a massagear-lhe as costas.
— Relaxe. Você não tem medo de tempestades, não é?
— Não — ela balbuciou.
Deveria ter medo de mim.
Apesar da idéia encerrar a verdade, Logan não gostou. Queria que Victoria
começasse a confiar nele.
Fez um juramento. Pela primeira vez, iria considerar o interesse de outra pessoa
antes do próprio. A mulher entre os braços dele lhe salvara a vida. Precisava lutar
contra a tremenda atração sentida por ela. Victoria era a única mulher do território que
ele não podia seduzir.
Ela vinha para o oeste a fim de cuidar da educação de Madison. Como a menina
estivesse sob os cuidados dele, cabia-lhe o dever de protegê-la contra qualquer sombra
de escândalo.
Victoria precisava chegar a Trinity Falls com a reputação imaculada. Não seria
fácil, mesmo se ele resistisse a sua atração. Por causa da fama dele de mulherengo,
talvez houvesse boatos sobre o fato de ambos terem passado dias e noites sozinhos na
trilha.
Uma rajada violenta de vento sacudiu o carroção e Victoria aproximou-se mais de
Logan. Ele inquietou-se. No momento, o casamento não parecia tão penoso quanto a
frustração que o dominava.
Devagar, ele deslizou a mão por suas costas. Ao alcançar uma das nádegas,
apertou-a levemente.
— Logan! O que pensa estar fazendo?
— Tentando aquecê-la.
— Já não estou mais com frio. Não precisa me beliscar.
— Não foi um beliscão. Apenas um apertãozinho.
— Pois não repita isso.
Logan não respondeu. Ocorreu-lhe ter admitido como certo sua complacência, caso
ele fraquejasse e transpusesse os limites do decoro.
Apesar de tê-la entre os braços, Victoria não estava à disposição dele. Sua
determinação sugeria que um homem teria de conquistar não só seu coração como a
mente também, antes de possuir-lhe o corpo.
Talvez ele obtivesse sucesso no empreendimento em que outros tinham falhado.

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Mas estaria disposto a pagar o preço?

CAPÍTULO DEZ

Victoria tremia, mas não por causa do vento frio. Ainda não podia acreditar como
tinha sido agradável sentir a mão de Logan acariciando-lhe as costas. Isso era um
choque para sua integridade moral. Em que estaria ele pensando para tomar tal
liberdade?
Sua face repousava no peito dele, o que a fazia ouvir-lhe as batidas do coração.
Na véspera, como estivesse exausta, tinha dormido durante a experiência
extraordinária de deitar-se junto a Logan. Nesta noite, o sono era a última coisa em
que pensava.
Surpreendia-se com o calor gerado por ele. Deitada de lado e de frente para
Logan, ela ajeitara uma das pernas entre as dele.
Victoria jamais se sentira tão protegida e mais exposta ao mesmo tempo. Seu
coração batia como se ela houvesse corrido uma grande distância. O odor de Logan, um
misto de couro, fumaça e almíscar, a deixava mais consciente de sua feminilidade.
Encostou a ponta do nariz na camisa dele. Queria gravar na memória esse cheiro
singular, para relembrá-lo com clareza no futuro. Grande tolice, admitiu.
— O que está fazendo, Victoria?
Decorando você...
— Coçando meu nariz. Você acha que vai chover? — ela perguntou.
— Provavelmente.
— Se isso acontecer, o riacho vai transbordar? — indagou, mexendo-se em busca
de uma posição mais confortável.
— Estamos acampados em terreno alto e a água não nos alcançará.
— Você é muito esperto, Logan — afirmou, ao mexer-se outra vez.
— Não esperava ouvir esse elogio de você.
Victoria corou e começou a percorrer os dedos pela frente da camisa de Logan.
— Você conheceu estas montanhas através dos índios?
Ele segurou-lhe a mão e a advertiu:
— Não faça isso.
— Desculpe. Suas costelas ainda doem?
— Um pouco.
— Você não respondeu minha outra pergunta.
— Aprendi tudo que sei sobre esta floresta quando morava com o povo de Lobo
da Noite.
— Quando você voltou a reencontrá-lo?
— Victoria, precisamos descansar. Temos de acordar cedo amanhã.
— Como dormir com o vento uivando feito um lobo enraivecido?
E com você me abraçando tão apertado que é difícil saber onde meu corpo acaba

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
e o seu começa?
— Feche os olhos e tente.
Ela obedeceu, mas foi inútil.
— Quando eu era criança e não conseguia dormir, nossa empregada me dava um
copo de leite quente.
— Victoria, não temos leite quente ou frio.
— Não precisa ser rude — queixou-se ela, esticando a perna entre as dele.
— Maldição, Victoria! Pare quieta!
Ela mordeu o lábio. Não deixava de ser ridículo permitir que o mau humor dele a
magoasse. Sem dúvida, Logan não sentia a mesma excitação que a dominava por
estarem deitados juntos.
— Se você me soltasse, eu poderia encontrar uma posição confortável.
Ele puxou os braços no mesmo instante.
— Pois não. Acomode-se à vontade.
Victoria desvencilhou a perna das dele e virou-se de costas. Apoiou o rosto no
braço dobrado, mas não achou a posição muito boa. Mas, pelo menos, não se
esparramava sobre Logan. Percebeu que ele também virava-se de costas. As nádegas
de ambos se tocavam.
Praguejando, ele tentou ajeitar o cobertor e, com isso, a descobriu. Victoria não
reclamou. Encolheu-se bem, na tentativa de manter o calor do corpo.
Ele virou-se outra vez. Cobriu-a enquanto aconchegava-se a ela. Na nova posição,
suas costas prensavam-se contra ele, que a rodeou com os braços, colocando as mãos
bem abaixo de seus seios.
Victoria sentia-se desorientada e insatisfeita, pois não tinha a mínima
possibilidade de se mexer. E estava tão desperta que conseguiria declamar todas as
poesias que decorara na vida.
— Isto não vai dar certo, Logan.
— O que não vai?
— Nós dormirmos tão juntos. Você está me apertando tanto que mal posso
respirar.
— Eu quase não a estou tocando — defendeu-se ele, ao acariciar-lhe a cintura.
Victoria alarmou-se.
— Pare com isso — pediu.
Logan voltou a colocar as mãos sob seus seios.
— Tente contar carneirinhos. É o que estou fazendo — sugeriu ele.
— Está dando certo?
Outra rajada de vento sacudiu o carroção.
— Não muito.
— Já que estamos ambos acordados, por que você não conta suas experiências
com Lobo da Noite?
— Alguém já disse que você é muito teimosa, Victoria?
— Meu pai e minha mãe. Ah, minha irmã também. Se não me engano, meus avós
fizeram alusão a minha teimosia umas duas vezes.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Sei.
— Eu me considero determinada, e não teimosa.
— Qual é a diferença? — Logan quis saber.
— Ah, é imensa. Teimosia é quando não se consegue dar ouvidos à razão.
Determinação é um traço de caráter firme. Foi o que instigou Colombo a cruzar o
oceano e levou George Washington a vencer a tirania do rei George. Com ela, Abraham
Lincoln salvou a União.
— Determinação? — Logan repetiu em tom seco.
— Exatamente. Algumas pessoas podem classificá-la como coragem, ou garra.
Sem dúvida, é mais do que simples teimosia.
— E você, Victoria, não tem nada simples.
Satisfeita, ela encarou essas palavras como elogio.
— Obrigada.
— De nada — respondeu ele em tom grave.
— E então, quando você encontrou Lobo da Noite outra vez?
O riso de Logan a envolveu e ela sorriu.
— Qual é a graça? — perguntou.
— Nada. Tudo.
— Ora, muito claro.
— Tão claro como tudo mais em nossas vidas loucas — disse ele com um suspiro.
— O que você quer dizer?
— Aqui estamos nós, dois adultos, e você quer que eu lhe conte uma história para
dormir.
Seu sorriso alargou-se.
— Já que não temos leite quente, preciso de uma história para ficar com sono —
provocou ela.
Ele ajeitou melhor o cobertor a sua volta e, quando as mãos voltaram ao lugar
anterior, Victoria teve a impressão de que estavam mais perto dos seios.
— Qualquer coisa para sossegá-la.
Qualquer coisa? Naturalmente, um beijo não a acalmaria, mas viu-se pensando em
um. Teria sido apenas nessa manhã que Logan roçara os lábios nos seus? Parecia uma
eternidade. Com firmeza, ela tentou tirar o beijo da mente.
— A segunda vez que encontrei Lobo da Noite foi na primavera. Havia chegado à
cidade a notícia de que um comboio de carroções fora atacado pelos índios. Um grupo
de homens partiu para o lugar a fim de averiguar.
— O exército não deveria se encarregar disso?
— Ainda não existia o forte. Foi o tal ataque que provocou a vinda da cavalaria
para o território e a construção do Forte Brockton.
— Houve sobreviventes?
— Um bom número. Na verdade, apenas um pequeno grupo de renegados tomara
parte na emboscada.
— Imagino quando haverá paz finalmente. Como seria bom se todos pudessem se
dar bem — Victoria comentou.

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— Deve ser isso que os pregadores chamam de céu. Será interessante descobrir
como o Todo Poderoso age para que seus anjos sejam amigos.
— Que coisa mais estranha para se dizer, Logan!
— Você imagina que os anjos indígenas batem tambores em vez de tocar harpas?
— perguntou Logan, rindo.
Victoria não resistiu e riu também.
— Até chegarmos lá, não saberemos como o céu é.
— E em sua opinião, eu nunca descobrirei — queixou-se ele.
— Felizmente, os mortais não decidem quem vai, ou não, para o céu.
— Resposta bem diplomática.
O sarcasmo na voz de Logan fora evidente.
— Por favor, continue a história sobre seu segundo encontro com Lobo da Noite.
— Gosto quando você diz por favor.
O timbre rouco da voz de Logan enterneceu Victoria.
— Vou me esforçar para usar a expressão com mais freqüência.
Ele a puxou para mais perto e Victoria sentiu a saliência do pênis. Imaginou se
isso acontecia sempre quando ele se deitava. Talvez o corpo de um homem tivesse um
jeito certo de se comportar. Lamentava ser tão ignorante sobre a anatomia masculina.
Seria bem melhor se as mulheres pudessem se instruir a esse respeito através de
livros. Dessa forma, não seriam influenciadas pelas emoções poderosas, geradas pela
proximidade do corpo masculino.
— Eu era inexperiente quando vim para o oeste.
— De onde você veio? — ela perguntou, curiosa.
— Do leste — ele respondeu, de maneira vaga. — Naquela tarde, nosso grupo
seguiu o rastro dos renegados. Quando alcançamos as montanhas, nos separamos. Eu
não estava longe daqui e parei para encher meu cantil no riacho. Ao me virar, vi Lobo
da Noite. Ele estava a cavalo e eu, a pé. Minha espingarda ficara presa na sela da
montaria e eu ainda não tinha o hábito de carregar uma pistola.
— Você, sem dúvida, ficou apavorado.
— Victoria, homens não se apavoram. Só as mulheres — ele a corrigiu.
— Bobagem. Todos os seres humanos estão sujeitos a perturbações emocionais.
Continue a história.
— Não antes de esclarecer este ponto, meu bem.
Victoria respirou fundo. Ele a chamara de meu bem outra vez. Mas com a
escuridão e o vento uivando, a expressão carinhosa não soava incompatível
— Logan, é muito natural você admitir ter ficado aterrorizado ao se deparar,
desarmado, com um índio. Até Hawkeye, de vez em quando, sentia medo.
— Com todos os diabos, quem é Hawkeye?
— O batedor corajoso que protegia Cora e Alice contra Magua.
— Como você pode chamá-lo de corajoso e medroso ao mesmo tempo?
— Como eu disse, o medo só o dominava de vez em quando. Isso acontecia quando
ele temia um ataque iminente de Magua.
— E quem é esse fulano?

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— O selvagem vilão que queria se vingar do general Munro.
— Você está falando de personagens de um de seus livros, não está?
— Claro.
— Ora, homens da vida real não se comportam como personagens de histórias.
— Alguns, sim — ela insistiu, disposta a não ouvi-lo depreciar seus heróis.
— Homens de verdade evitam certas palavras como se fosse a peste.
— Por favor, me esclareça.
— Por que, de repente, você está falando como minha avó?
Victoria mexeu-se entre os braços dele.
— Você tem uma?
— Duas, para ser preciso.
— Como são elas? — indagou, interessada em qualquer informação sobre Logan.
— Acabou minha paciência — declarou ele, ao rolar sobre Victoria.
— Saia de cima de mim, Logan. Não posso respirar.
— Tente — respondeu ele, mas soergueu-se um pouco, firmado nos cotovelos. —
Vamos esclarecer certos pontos, srta. Amory.
— Está bem — ela murmurou, observando-lhe o rosto machucado.
Por Deus, o homem parecia um guerreiro amedrontador à espera do inimigo. Ela
não sabia o que o tinha provocado. Em sua opinião, conversavam de maneira
satisfatória.
— O fato de estar desarmado ao me defrontar com Lobo da Noite não me
amedrontou. Homens não só não se amedrontam como também não desmaiam.
Entendeu?
— Mais ou menos, Logan. O sr. Dodson desmaiou. Não foi ao receber o tiro no pé,
mas quando viu o sangue.
— Ele não desmaiou.
— Você não estava lá.
— Ele perdeu os sentidos — esclareceu Logan.
— Ora, isso é uma questão de semântica.
— Não, de exatidão. As mulheres desmaiam e ficam aterrorizadas. Os homens
perdem os sentidos e se acautelam.
— Sei. Você se acautelou diante de Lobo da Noite?
— Isso mesmo.
Victoria lutou para conter o riso.
— Logan, você acredita mesmo nisso?
— Eu acredito que você está me deixando louco, Victoria.
Ela perdeu a vontade de rir.
— Como estou fazendo isso?
— Todas as vezes que conversamos, você desvia para os mais variados assuntos.
Num minuto, falávamos de índios, no seguinte, você perguntava sobre minhas avós.
Acho isso irritante.
Ela já tinha ouvido essa reclamação outras vezes.
Quando se entusiasmava, perdia o rumo da conversa.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Você prefere que eu me atenha a um tópico de cada vez?
Logan mexeu-se contra ela, insinuando mais o corpo entre suas pernas. Uma onda
de calor a dominou.
— Notou como estou excitado?
A voz rouca dele acabou com o resto de seu domínio próprio.
— O quê?!
— Percebe como é perturbador quando alguém muda, de repente, de assunto?
— Sim.
— Sim o quê?
Sim para tudo.
— Posso ver como a mudança de assunto provoca confusão. E sim. Notei como
você está... digamos, um tanto firme.
Logan suspirou.
— Ainda temos grande parte da noite pela frente. Algo vai acabar acontecendo.
— Não sei o que você quer dizer.
Aliás, Victoria não queria saber. No momento, Logan parecia um predador de duas
pernas e ela não estava preparada para lidar com ele.
— Você faz idéia de como é bom sentir seu corpo? — Logan perguntou.
Uma parte de seu ser sentiu-se estimulado. Ela tentou responder, mas não
conseguiu.
E se ele não fosse um criminoso, mas um respeitável membro da sociedade, ou
seu marido? Então, ela seria livre para acariciá-lo, para contornar-lhe os lábios com a
língua, para mexer os quadris contra os dele e sentir a reação deliciosa provocada por
qualquer contato físico entre ambos.
Mas, porque Logan não fosse um homem a quem ela desejasse como marido, ele
lhe era tão proibido quanto os anseios que provocava em seu âmago.
— Você precisa sair de cima de mim.
— Tem razão — concordou ele, mas não se mexeu.
— Então saia, Logan. Por favor.
As últimas palavras produziram um brilho nos olhos dele. Victoria estremeceu.
— Você me agrada muito, Victoria.
— Não é possível. Isto não está certo.
— Eu sei.
— Nesse caso, você precisa...
— Chega de falar.
Uma luz esbranquiçada os envolveu. Por um momento, o espaço sob o carroção
ficou iluminado e as feições tensas de Logan tornaram-se visíveis. Segundos depois, o
estrondo do trovão retumbou no ar, seguido por uma chuva torrencial.
— Só quero descobrir seu sabor. Não vou machucá-la — sussurrou ele.
Que mal haveria num beijo?, indagou-se Victoria. Também estava interessada em
provar a boca de Logan. Apesar de lhe ser proibido conhecer algo íntimo desse homem,
ela experimentaria o que a consciência permitisse. Uns poucos beijos e, talvez, umas
duas carícias. Ninguém ficaria sabendo. Depois de Logan desaparecer de sua vida, ela

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
teria algumas lembranças da convivência de ambos.
— Então, me beije.
Com a luminosidade de outro relâmpago, ela viu novamente O rosto contraído de
Logan e, ainda com o ecoar do trovão nos ouvidos, sentiu-lhe a boca na sua. Uma
carência voraz parecia instigá-lo. Os lábios dele queimavam e a língua tentava penetrar
em sua boca. Não demorou muito para conseguir.
Surpresa, mas sem repulsa, Victoria aceitou a invasão. Literalmente, ele a
saboreava.
Ela percebeu estar gemendo baixinho enquanto o beijo se aprofundava. Notou
ainda que as mãos de Logan percorriam-lhe o corpo. Estavam, agora, em seus seios,
massageando-os. Seus quadris mexeram-se contra os dele ao mesmo tempo em que o
enlaçava pelo pescoço.
E o beijo prosseguia com vida própria. Logan levantou a mão até os botões da
blusa e ela fingiu não perceber. Assim, não teria de interromper o que faziam.
Chamava-se fazer amor.
Então, ele tocou-lhe os seios nus: Separou a boca da sua e traçou uma linha de
beijos em seu pescoço.
— Ai, Victoria, você é muito melhor do que eu imaginava!
Tomou um dos mamilos na boca e ela estremeceu. Deveria forçar Logan a parar,
mas isso era a última coisa que desejava fazer. Aonde quer que essa paixão
tempestuosa fosse, ela a seguiria.
Ele rodeou o mamilo sensível com a língua.
— Maldita escuridão! Eu queria vê-Ia.
Ondas de calor espalhavam-se dos seios pelo corpo todo.
— Ai Logan...
O nome não passou de um murmúrio agitado.
— Sim, meu bem. Diga meu nome assim.
Levantou-lhe a saia e ela sentiu a mão de Logan nas coxas. Algo contraiu-se em
suas entranhas. Victoria tinha consciência do aumento do calor, da respiração
ofegante de Logan e do descompasso do próprio coração. Nada mais existia. Nada
importava.
A mão dele subiu mais um pouco. Ela soltou uma exclamação e agarrou-lhe o
braço. Percebeu que Logan ajeitava a frente da calça.
— Vou fazer tudo certo. Não se preocupe. Cuidarei de você — disse ele.
Victoria entendeu que ele dissiparia sua ansiedade crescente. Mas antes de
Logan fazer qualquer coisa, algo muito forte sacudiu o carroção.
— Com todos os diabos! — exclamou ele, ao erguer-se e olhar em volta.
Outro abalo fez o veículo estalar e dar uma guinada para o lado. Logan olhou por
entre as rodas altas.
Victoria concentrou-se em readquirir a lucidez. A interrupção, não importava sua
origem — terremoto, erupção vulcânica, turno — dera a oportunidade para seu corpo
esfriar e para a mente voltar a funcionar. Ela não podia acreditar no que quase havia
acontecido entre si e este homem.

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Nada fazia sentido. Eles não tinham nada em comum, nem laços afetivos, nem
contrato matrimonial. Por que, então, quando se aproximavam um do outro, o corpo
dele parecia soltar fagulhas em direção ao seu? Decidida, abotoou o vestido e abaixou
a saia.
— Maldição! São os bois — resmungou Logan. Fez-se uma pausa momentânea no
estremecer do carroção. Nesse intervalo, ouviu-se um rugir arrepiante.
— Deus do céu, o que foi isso? — perguntou Victoria.
— Um puma. Ele e a tempestade estão assustando os bois — respondeu Logan.
Ouviu-se novo rugido da fera, seguido por outro estremecimento do carroção.
Sem ter escolha, Logan saiu para a chuva inclemente.
Victoria garantiu ao Todo Poderoso que reconhecia um milagre quando
testemunhava um. Jurava jamais se colocar, outra vez, numa situação em que fosse
preciso um de tal magnitude para livrá-la da destruição moral. Sem dúvida, bois
agitados e um puma feroz constituíam um milagre monumental.
De agora em diante, evitaria Logan como se ele fosse a peste em pessoa. Não se
deixaria fascinar pelo corpo viril e esplêndido dele e nem se interessaria mais por
histórias sobre índios. Também não seria mais solidária com ele, pois desistia de
reformar-lhe o péssimo caráter.
Afinal, Logan não passava do meio para ela alcançar seu objetivo. E esse era
chegar a Trinity Falls. Aliás, com a dignidade intacta. E o corpo também.
Enquanto isso, refletiu ao engatinhar para fora, continuaria sendo uma parceira,
em pé de igualdade, nessa aventura de alcançarem vivos a civilização.
Enfrentando a chuva, Victoria tentou localizar a silhueta de Logan na escuridão.
Não teve dificuldade em enxergar os bois. Eles estavam bem perto do carroção.
— Você esta ficando encharcada!
Ela virou-se em direção ao grito de Logan. Com uma vara, ele tentava afastar os
bois do carroção.
— Quero ajudar — disse Victoria, ao aproximar-se.
— Você é muito pequena para ser de alguma utilidade.
Já molhada até a medula dos ossos, ela ofendeu-se.
— Você precisa de qualquer ajuda a sua disposição. — gritou ela.
E eu vou colaborar, seu palerma teimoso, acrescentou mentalmente.
Ao lado dele, pôs-se a empurrar os bois. Espalmando as mãos na pele molhada de
um dos animais, percebeu que ele e Logan tinham muito em comum. Ambos eram bons
exemplos de tamanho volumoso e de obstinação.
Talvez Logan não fosse tão peludo e mal-cheiroso, mas, em sua opinião, as
semelhanças ganhavam longe das diferenças.

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CAPÍTULO ONZE

Sentada num tronco, Victoria tentava descalçar as botinhas. Como estivessem


cobertas de lama e folhas secas, tornava-se difícil soltar o cordão dos ilhoses.
Levantou a cabeça. Uma neblina densa envolvia os pinheiros ao redor do acampamento.
Logan não estava por perto. Embora não ventasse, ela sentiu um arrepio. Suas roupas
estavam úmidas e os cabelos pendiam, gelados, pelo pescoço e ombros.
Depois de um esforço imenso, ela e Logan tinham conseguido levar os bois para
perto do riacho. Só então, haviam dado pela falta de um dos animais. Logan tinha lhe
ordenado para ficar no acampamento enquanto ele procurava o boi perdido.
Naturalmente, ela não obedecera e também saíra ao encalço do animal.
Ela já desistia de encontrá-lo quando esbarrara nele com as costas. Sua atenção
focalizava-se num gambá encharcado, do qual ela recuava. Felizmente, o bicho estava
apressado demais para lançar-lhe seu líquido mal-cheiroso.
Victoria levara o boi para o acampamento, mas Logan não estava lá. Havia gritado
para avisá-lo do retorno do animal desgarrado; ele, porém, não a tinha ouvido.
Ela percebeu estar batendo queixo. Enquanto esperava pelo retorno de Logan, a
coisa mais sensata a fazer era acender uma fogueira. Olhou em volta e desanimou.
Gravetos e galhos estavam molhados e não pegariam fogo.
Voltou a olhar para os pés. Tinha descalçado só uma botinha. Concentrou-se no
cordão da outra.
O estalar de madeira quebrada interrompeu o silêncio. Victoria levantou-se e
começou a recuar em direção ao carroção, enquanto percorria o olhar pela periferia da
clareira. Precisava de uma arma e, pela centésima vez, lamentou o confisco da
espingarda pelo chefe do comboio. Até uma pedra serviria, mas só havia pinhas secas
no chão.
Bem devagar, continuou rumo ao veículo. Quando calculou estar perto, virou-se e
pulou para trás dele. Infelizmente, o machado, usado por Logan na véspera, não estava
no lugar. Mais um exemplo de como o homem era pouco confiável. Custava muito
guardar a ferramenta depois de usá-la?
Victoria enfiou a mão sob a coberta de lona do carroção e apalpou em volta. Logo
tocou num livro grosso. Não se tratava bem de uma arma, mas serviria como tal.
Mais estalos quebraram a quietude da manhã e, cautelosa, ela olhou pelo canto do
carroção. A neblina cinzenta continuava a envolver o topo dos pinheiros. Ao levantar o
livro para atirá-lo em caso de necessidade, leu o título: Declínio e Queda do Império
Romano.
Enquanto continuava a observar a neblina cinzenta, esta abriu uma brecha,
revelando a silhueta de um homem. Ela sentiu o coração bater na garganta. Estaria na
iminência de se deparar com um índio?
A silhueta avançava com firmeza. Após uns segundos, ela reconheceu Logan. De

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ombros largos, quadris estreitos e extremamente viril, ele se materializara na fenda
da neblina. Os olhos negros brilhavam e, na mão, ele carregava o machado. Nesse
momento, parecia mais um intruso selvagem do que o homem de quem ela recebera
beijos e carícias ardentes. Abismada, lembrou-se de como ele tinha exposto seus seios
e os beijado como se experimentasse frutas exóticas. Victoria sentiu as faces
arderem. Ele também havia escorregado a mão sob sua saia e ao longo das pernas, até
alcançar a parte sensível e interna das coxas.
Ao vê-lo se aproximar, pensou na desvantagem da situação, caso se tratasse de
um intruso. Ela contava apenas com um livro grosso e ele, com um machado. Mas em
relação a Logan, não era a ferramenta afiada que o favorecia. A fraqueza traiçoeira
provocada por ele em seu corpo constituía uma arma muito mais poderosa, fascinando-
a. Apesar de saber que havia chegado à beira do desastre, Victoria guardava a
lembrança dos beijos provocadores do caos magnífico em seu âmago, da textura da
língua e dos lábios de Logan e do calor emanado por ele.
Parando a um passo de distância, ele a observou da cabeça aos pés.
— Não me diga que uma vontade incontrolável de ler a dominou.
O comentário provocou um sorriso em Victoria. Curiosa, notou certos detalhes do
aspecto de Logan. Os cabelos pretos, e ainda úmidos, grudavam na cabeça dele. O
inchaço e a coloração dos machucados no rosto tinham diminuído bem. Ora, pensou, ele
podia bem ser classificado como atraente. Mas era difícil se ter certeza por causa da
barba preta que começara a crescer.
Ela tentou não olhar para a camisa desabotoada e para o peito musculoso e peludo
dele. Consciente do risco de se tornar ridícula, ela ergueu o livro e tentou se explicar:
— Ouvi um barulho e não encontrei o machado. Pensei... — Calou-se. Queria
mesmo contar que pretendia defender-se com a história do fim de Roma?
— Você pensou, seriamente, poder matar alguém com isso?
Victoria sentiu a tentação de atirar o livro nele.
— Admito não se tratar de uma arma, mas me deu mais segurança do que não ter
nenhuma.
Uma imobilidade dominou a expressão de Logan. A despreocupação anterior
desapareceu. O olhar tornou-se enigmático e perturbador.
— Este é o terceiro dia que nos conhecemos. Você se deu conta disso? —
perguntou ele, com um laivo de aspereza na voz suave.
Apenas três dias? Victoria tinha impressão de que Logan sempre fizera parte de
sua vida. E pensar que quase havia se entregado a ele num momento de paixão
irracional. Sentiu-se perturbada. Era horrível admitir que ele havia se insinuado em
suas emoções num curto período de tempo. Como a tempestade dessa noite, ele era
uma força que precisava ser avaliada.
— Não contei os dias — disse ela.
— Pois eu, sim.
— Com que propósito?
— Para me manter na linha. Para me lembrar de que você não me pertence.
Portanto, devo manter as mãos longe de você.

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Só as mãos? E quanto ao resto?, indagou-se Victoria, mas ele continuou:
— Eu me lembrei ainda de que existem dois tipos de mulher em Trinity Falls.
— Não faço idéia. Por favor, me esclareça.
Os olhos de Logan soltaram faíscas e Victoria encolheu-se. Tinha a sensação de
haver desafiado o homem irritante. Mas algo na natureza dele a instigava a provocá-lo.
Ele era presunçoso demais para seu gosto. Como se atrevia a fingir-se de superior,
quando não passava de um reles criminoso? E pior. O homem não tinha a mínima
vontade de se corrigir.
Desde a infância, Victoria sabia que cada pessoa devia melhorar a mente e seu
lugar no mundo. Sendo mulher, seu progresso na vida incluía encontrar o companheiro
ideal. Caberia a ele proporcionar-lhe, e aos filhos, estabilidade financeira e um lugar
respeitável na sociedade.
O plano era claro. Exceto, naturalmente, a parte de encontrar o companheiro
ideal. Isso constituía um problema.
Logan inclinou-se para frente.
— Será um prazer esclarecê-la sobre as mulheres de Trinity Falls. Tentarei não
ofender sua sensibilidade, Victoria. Na verdade, você precisa aprender certas coisas.
— E você, sem dúvida, é a pessoa mais indicada para me ensinar.
Os olhos dele faiscaram mais e Victoria apertou o livro com força.
— Bem, em Trinity Falls, de um lado, existem as boas mulheres. Na maioria, são
casadas, ou viúvas, ou ainda muito jovens. Você, provavelmente, será a única solteira
que talvez seja classificada entre as boas.
— Talvez?! — Victoria indagou, indignada.
Logan sorriu.
— As outras mulheres, as de vida fácil, são as que distraem os homens. Estão
sempre alegres, bem dispostas e divertem-se a valer.
— Não duvido.
Ela não gostara da descrição de Logan. Imaginava o que fazia parte dos
divertimentos. Bebidas alcoólicas, jogatina, dança em bares enfumaçados, beijos e
sabia-se lá mais o quê. Provavelmente, ele terminaria a noite de extravagâncias com
um charuto mal-cheiroso. Sem dúvida, o homem alimentava um variado número de
vícios.
— Você não aprova? — Logan perguntou em tom seco.
— De jeito nenhum!
— Geralmente, as boas mulheres não o fazem. Elas criticam e se irritam com as
distrações de um homem.
— Distrações, ou divertimentos pervertidos?
— Em minha opinião, as boas mulheres querem eliminar todos os solteiros do
mundo. Elas não suportam a idéia de um homem ser livre e desimpedido.
— Se pretende beber leite, Logan, precisa comprar a vaca primeiro — disse ela,
citando um dos provérbios preferidos da avó.
— Acontece que eu adoro leite.
De repente, Victoria percebeu sobre o que discutia com Logan. Até então, achava

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que o ditado referia-se a beijos indiscriminados. Depois de descobrir detalhes sobre o
relacionamento entre um homem e uma mulher, sabia que a avó falava sobre a união
física fora do casamento.
Victoria sentiu-se enrubescer. Eles não deviam manter tal conversa. Era pessoal
e excitante demais.
— Bem, Logan...
— Quero sua resposta franca e honesta. Que tipo de mulher você é? — ele
perguntou, interrompendo-a.
Logan precisava indagar? Isso era ofensivo.
— Para alguém que não gosta de insultos, você é um mestre em dispensá-los.
— Obrigado.
— Não seja sarcástico.
— No início, presumi que você ficava do lado das mulheres boas. Com seu decote
fechado e as mangas compridas, você está tão bem acondicionada quanto um presunto
embrulhado.
Um presunto? Victoria mal conseguiu abafar uma exclamação de protesto. Nunca
tinha sido descrita de maneira tão horrível.
— Escute bem. Eu...
— Mas todas as vezes que chegamos perto um do outro, você se acende como um
rojão em dia de festa.
O fato de preferir ser chamada de rojão não recomendava muito seu caráter,
pensou ela.
— Chega. Você já se expressou o suficiente sobre o assunto.
Logan ignorou-a e insistiu:
— Continuo sem saber. Você é, ou não é?
— Eu deveria mandá-lo para o inferno por estar discutindo algo de natureza tão
pessoal e que não é de sua conta. Se você fosse um cavalheiro, saberia que não sou do
tipo de mulher para instigar e apreciar as atenções físicas de um homem. Talvez eu
seja a primeira que você encontra, mas sou uma dama, posso lhe garantir.
— Quem diria que damas pudessem ter sangue tão quente?
— Se meu sangue esquentou, foi porque você conseguiu, mais do que ninguém, me
enraivecer.
— Você me beijou com raiva?!
— Você me beijou!
— Não pude resistir. E foi por isso que você retribuiu meu beijo, não foi?
Também não resistiu. Não precisa me responder. O jeito com que toma vida em meus
braços, recebe minha língua em sua boca, me oferece seus seios...
— Pare!
— Precisamos conversar às claras, Victoria.
— Não! De jeito nenhum! Basta esquecer o que aconteceu e...
— Não dormimos a noite inteira por causa da tempestade. Estamos exaustos e
com as roupas molhadas. Precisamos despi-las e acender uma fogueira. Passaremos o
dia acampados, descansando. Vai ser difícil fazer isso sem saber se sou bem-vindo, ou

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não, a seu lado, entre os cobertores.
Victoria sentiu o rosto queimar.
— Com toda a certeza, não é! Na verdade, eu o... — Calou-se. Como gostaria de
ter uma pistola para ameaçá-lo.
— Você me esmagaria com esse seu livro?
— Não faça graça com assunto tão sério — disse ela.
— O ponto é que não sei se vou conseguir me controlar perto de você. Até ontem
à noite, pensava que podia — Logan confessou com franqueza.
— Acabamos nos braços um do outro por causa do frio e da tempestade —
argumentou ela.
— Em parte, talvez. Mas fomos longe demais para fingir que nada aconteceu.
— Seria possível se nós dois nos esforçássemos.
— Isso exigiria um homem melhor do que eu.
— Pois seja um homem melhor.
— Impossível. Já conheço seu sabor, Victoria. Percorri seus seios com a língua e
quase cheguei a tocar sua parte mais íntima.
Victoria cambaleou. Só um grosseirão desprezível seria capaz de vangloriar-se de
atitudes tão escandalosas. Porém, um pressentimento a dominou. As palavras
chocantes de Logan tinham abalado sua resistência.
Talvez ela estivesse, afinal, predisposta a ser uma mulher de vida fácil. Do tipo
que não se importava em ter marido, filhos, um lar, mas apenas em satisfazer as
necessidades carnais. Baixou a cabeça.
— Não precisa me humilhar — murmurou ela.
— Eu gostaria muito de erguer seu rosto e forçá-la a me fitar. Mas se fizer isso,
vou querer sentir sua boca na minha, e nós estaremos, exatamente, no ponto onde
começamos.
— E dessa vez, não haverá um milagre para nos salvar.
— Victoria, pare de tagarelar sobre coisas que não fazem sentido. Não sei por
que, mas isso me excita.
— Não me culpe por sua mente pervertida.
— Você deve saber que existem tipos ilimitados de perversão — disse ele, com
uma suavidade exasperante.
— Não me interesso por suas depravações.
— Isso mesmo, Victoria. Atice o fogo. Você deve saber o que está fazendo
parada aí em pé, com o vestido molhado grudado no corpo e usando a língua para me
reduzir a zero. Cada investida sua me faz pensar em investir também.
Embora Logan parecesse atribuir mérito ao argumento, Victoria o achou obscuro.
— Esta loucura que você me inspira é do tipo para levar um homem a pensar em
conversão.
— O que religião tem a ver com tudo isto? — perguntou ela perplexa.
— Foi você quem mencionou um milagre.
— Eu estava me referindo ao fato de os bois terem aparecido na hora exata para
nos impedir de cometer um erro.

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— Você considerou isso intervenção divina?
— Sei lá, mas funcionou. Como não pretendo me aproximar do desastre
novamente, esta nossa conversa é desnecessária.
— Não se um de nós se converter....
— Já me ofereci para reformá-lo, mas você rejeitou minha ajuda. A menos que se
torne um homem respeitável e temente a Deus, nenhuma boa mulher vai querer se
relacionar com você.
— Esta falando por si mesma, ou de como as outras mulheres me consideram?
Uma suspeita dominou Victoria. Imaginaria ele que, caso se regenerasse, poderia
cortejá-la? Não queria magoar e nem insultar Logan, mas precisava deixar claro que
não alimentava a idéia de se envolver com ele. Pertenciam a mundos diferentes e não
tinham nada em comum, exceto uma desastrosa atração mútua. Logan era rude e muito
desinibido quanto à virilidade para ocupar um lugar em sua vida.
Por Deus. Imaginava o que o sr. Pritchert e o patrão pensariam, caso ela
aparecesse ao lado de Logan, em Trinity Falls, para assumir a educação de Madison.
Havia ainda a questão de entregá-lo às autoridades. Ele seria preso, o que impediria
uma associação duradoura entre ambos.
— Você está levando muito tempo para responder minha pergunta, Victoria.
— Desculpe. Esqueci o que era — admitiu ela, confusa com o estranho rumo
tomado pela conversa.
— Eu lhe perguntei se acha que todas as mulheres me consideram com o mesmo
desprezo demonstrado por você.
— Bem. Suponho que se você pagasse seus débitos para com a sociedade e não
cometesse mais crimes, talvez várias mulheres aceitassem suas atenções.
Foi preciso um grande esforço para pronunciar as palavras. A idéia deste homem
rude cortejando qualquermulher ia além de sua imaginação.
— E se fosse você quem se convertesse, Victoria?
— Do quê? Para quê? — ela indagou atônita.
— Para meu mundo. Você poderia descobrir como é viver nele.
Ela não conseguiu disfarçar a expressão de horror.
— Viver no mundo do crime?!
— A idéia não a atrai?
— Positivamente, não!
— Está bem. Eu não esperaria que você tomasse parte nos assaltos. Eu cuidaria
dessa parte de nossa parceria.
Ela o fitou fascinada. Finalmente, quando não desejava mais ouvir, a confissão
fora feita. Ele era ladrão. O desapontamento foi profundo demais.
— O que você rouba, Logan?
— Gado, cavalos, ouro, cofres de banco, uísque, jóias, dinheiro de igrejas,
virgindade de donzelas. O habitual.
— Sei.
Victoria sentia a cabeça leve. Agora entendia por que o tinham abandonado preso
naquela cela.

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— Por causa de sua sensibilidade, eu a dispensaria de tomar parte nos roubos.
Mas você poderia me acompanhar o resto do tempo.
— Não me parece que você teria muito tempo livre.
— Victoria! — exclamou ele, exasperado. — Acredita mesmo no que acabo de
contar?!
— Não tenho escolha — respondeu ela, com ar triste.
— Tem, sim, é claro.
Victoria mal registrou a afirmativa.
— Então, você está pedindo para eu me tornar uma mulher de vida fácil — disse
ela devagar e, finalmente, decifrando os comentários obscuros de Logan. Ficou
indignada. — Quer que eu me entregue a você sem o privilégio do casamento e...
— Seja justa, Victoria. Você se considera tão superior a mim que jamais aceitaria
se casar comigo. Eu não a insultaria pedindo sua mão.
— Mas se atreve a me pedir para fazer... aquela coisa com você por simples
divertimento?
Incrédula, horrorizada e furiosa ao mesmo tempo, ela indagava-se como havia
tido coragem de deixar o patife tocá-la.
— Eu a respeito muito e não a ofenderia propondo-lhe casamento. Obviamente,
não a mereço. Mas nossa união seria mais do que divertimento. Ela provocaria um
terremoto.
— Em toda minha vida, nunca fui tão insultada!
— Nesse caso, estamos quites, Victoria.
— O quê?
Mas Logan tinha desviado o olhar para algo a suas costas. Baixinho, advertiu-a:
— Não se mexa.
Apavorada, ela o viu erguer o machado, mantendo-o acima da cabeça como se
esperasse algum tipo de sinal.
De repente, atirou a ferramenta, que passou zunindo por sua cabeça.
Instintivamente, Victoria virou-se a tempo de ver a lâmina afiada atingir um
puma, interrompendo-lhe o salto. Um rugido ecoou pela clareira enquanto a fera caía,
praticamente, a seus pés.
Tudo aconteceu tão depressa que ela não teve tempo de gritar.
— Preciso verificar se, de fato, está morto — disse Logan, ao passar por ela. —
Por favor, não olhe. Não quero que desmaie.
— Vou me esforçar para não “perder os sentidos” — então resmungou ela,
tentando contar os pingos coloridos diante dos olhos.
Suas pernas cederam e ela sentou-se no chão. Em seguida, fechou os olhos e
tapou os ouvidos com as mãos. Não queria ouvir os sons do que Logan se via forçado a
fazer ao animal.
Lamentável que uma criatura tão linda tivesse de morrer.
Porém, pessoas e feras não podiam habitar o mesmo espaço.
A idéia a entristeceu. Em poucos segundos, Logan demonstrara ter uma boa dose
da fera em seu íntimo.

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Um pensamento perturbador tomou forma em sua mente. Talvez não gostasse
tanto de Logan se ele não fosse como era. Um ladrão insensível, capaz de roubar
qualquer coisa que não estivesse presa no chão.
Ele acabava de salvar-lhe a vida, Victoria deu-se conta. Agora sim, estavam
quites.

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CAPÍTULO DOZE

— Precisamos nos livrar destas roupas molhadas, Victoria.


Preocupado com sua sensibilidade, Logan já tinha tirado o animal morto da
clareira. Sabia como Victoria ainda estava perturbada com o ataque inesperado do
puma e com a presteza dele em livrá-los da fera.
O fato de ela não ter apanhado o livro caído mostrava como estava chocada.
Antes do ataque, enquanto conversavam, ela não demonstrara desconforto algum com
o vestido e os cabelos úmidos. Agora, com os braços apertados de encontro ao peito,
tremia.
— Victoria, você tem de trocar de roupa.
Os olhos verdes brilharam momentaneamente.
— Você tem idéia fixa, Logan.
Seu hábito de sempre pensar o pior sobre ele provocou outro abalo no controle
de Logan. Sem responder, ele encaminhou-se ao carroção, de onde tirou cobertores
secos e os levou até Victoria.
— Pegue aqui. Use isto para manter sua preciosa privacidade.
— Como já estou quase seca, não vejo necessidade de me trocar.
Ele abafou uma praga. Como Victoria tinha mais roupa no carroção, sua razão para
não tirar a molhada não passava de modéstia exagerada.
— Procure algo seco para usar. Enquanto isso, vou acender uma fogueira.
— Você não vai ser capaz de acender uma — disse ela.
Logan irritou-se mais. Ela estava determinada a encará-lo como ladrão, patife e
inepto. Das três avaliações desabonadoras, a que ele mais detestava era ser
considerado incompetente.
— Com todos os diabos! Posso muito bem acender uma fogueira!
— Duvido. Tudo está muito molhado.
— Espere para ver, moça.
Como se a masculinidade dele houvesse sido desafiada, Logan decidiu preparar
um fogaréu que fizesse Victoria engolir suas palavras.
Começou arrancando punhados de capim, cujas folhas a brisa já secara. Numa
camada grossa, espalhou-os sobre a cinza da fogueira da noite anterior e cobriu-os
com gravetos. Em seguida, colocou galhos finos entrelaçados. Finalmente, escorou
vários pedaços de madeira grossos, um de encontro ao outro, formando uma estrutura
cônica, de um metro de altura.
Logan levantou a cabeça e viu Victoria ir para trás do carroção. Naturalmente,
ela pretendia usar o veículo para impedi-lo de vê-Ia. Mas estando ajoelhado, ele teria
uma visão nítida de suas pernas, no momento em que tirasse o vestido. Mas ele não
imaginava ver nada mais.
Todavia, as rodas do carroção eram muito grandes em comparação a Victoria.

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Quando ela abaixou-se para apanhar alguma coisa, Logan vislumbrou rapidamente seu
corpo. A reação dele foi imediata. O sangue abrasou-se ao mesmo tempo em que o
capim seco pegava fogo com as fagulhas de duas pedras esfregadas por ele.
Logan não queria espiá-la, mas contra a vontade, continuou a fazê-lo. Foi
recompensado. Viu-a curvar-se novamente para enxugar as pernas com o cobertor. Sua
cintura era fina e os quadris, arredondados. Os seios, bem formados, tinham mamilos
cor-de-rosa. Ela era tão linda que quase o fazia perder o fôlego. Linda e feminina.
Valente e teimosa, pensou ele, incapaz de considerá-la apenas como um corpo
atraente. Victoria era muito mais.
Ao entrar na clareira e vê-Ia com o livro na mão, o coração dele tinha se
condoído. Ela lembrava um gato molhado e amedrontado, mas determinado a enfrentar
qualquer ameaça. A vontade dele fora tomá-la nos braços e beijá-la até que a neblina
se dissipasse e o sol brilhasse.
Orgulhava-se de haver se controlado. Então, ela havia começado, outra vez, a
falar de seu assunto preferido a natureza torpe dele. Se Victoria houvesse mostrado
um único sinal de ter elevado a opinião sobre ele, talvez lhe tivesse revelado quem era.
Naturalmente, ela não acreditaria. E aí estava o problema, pois ele nunca lhe
pediria para fazê-lo. O orgulho o impedia.
Logan viu Victoria enfiar os pés num calção branco.
A peça feminina foi puxada ao longo de suas pernas. Em seguida, desceu uma
anágua franzida e, depois, uma saia cinzenta escura. Ele voltou o olhar para o fogo.
Labaredas alaranjadas lambiam a lenha grossa.
Ele tinha inventado as mentiras sobre ser ladrão quando Victoria afirmara que
nenhuma mulher de respeito o aceitaria. Todavia, não tivera a intenção de levar a
história tão longe, a ponto de convidá-la para ser parceira dele no crime, ou amante.
A proposta imprudente tinha sido provocada por sua atitude presumida de
considerá-lo o criminoso mais repreensível do mundo. Logan sacudiu a cabeça. Não
entendia o que o levara a dizer as mentiras ridículas. Compreendia apenas que Victoria
possuía a habilidade de forçá-lo a transpor os limites do comportamento racional.
Victoria surgiu, rodeando o carroção. Logan notou que todos os botões de seu
vestido, da cintura ao decote, estavam bem fechados. As mangas compridas
terminavam com punhos justos e também abotoados. Os cabelos úmidos estavam na
maior confusão, mas a escova em sua mão logo ordenaria aquele esplêndido caos
vermelho.
Logan tentou entender o que, em Victoria, o afetava tão profundamente. Ela não
era uma beleza fora do comum. Aliás, ele conhecera apenas duas na vida, sendo
Robeena uma delas. Mas Victoria possuía algo mais valioso do que o físico atraente.
Inteligência brilhava em seus olhos verdes, enquanto sua coragem o impressionava.
Considerando-se a abundância de livros sentimentais no carroção, Victoria não
devia apreciar a aparência nada romântica dele.
— Você está me olhando fixamente — censurou ela naquele tom refinado.
— É um prazer.
Abaixado perto da fogueira, esquentando-se com seu calor, não foi preciso muito

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esforço mental para comparar o efeito das chamas com a maneira de Victoria afetá-lo.
— Devo admitir que estava errada, Logan.
A afirmativa o apanhou de surpresa. Estaria ela duvidando da veracidade do
relatório dele sobre a vida de marginal? Ou pronta para reconhecer que ele não era o
pior fora-da-lei entre Boise City e 8t. Louis?
Victoria apanhou o livro do chão e, com gestos delicados, limpou a capa de couro.
— Está claro que você consegue acender uma fogueira com lenha molhada.
— Eu lhe disse que podia.
— E eu deveria ter acreditado em você.
Logan desejava que a conversa fosse sobre algo mais significativo. Mas aceitava o
elogio, apesar de pequeno.
— Está com fome? — indagou.
— Morrendo — ela respondeu, enquanto punha o livro de volta no carroção.
A cada passo gracioso, a saia do vestido simples balançava de maneira
provocativa. Ele afastou o olhar da cena estimulante e levantou-se.
— Vou pegar um peixe — avisou.
— E eu, preparar bolinhos.
Bolinhos... Logan pensou no primeiro encontro deles.
Inacreditável que houvesse ocorrido apenas três dias atrás. E eles ainda tinham
quase duas semanas pela frente na trilha. Tempo demais para manter o pensamento e
as mãos longe da mulher encantadora. Mas ele faria o diabo para resistir à tentação
pelo resto da viagem.
A ironia do objetivo de Logan não lhe passou despercebido. Ele não deveria sentir
a mínima atração por Victoria. Ela era do tipo de mulher que ele não desejava mais, a
antítese das moças alegres com quem se divertia antes da chegada de Madison.
Observou Victoria voltar para junto do fogo, trazendo uma frigideira, um saco de
farinha, uma lata de gordura e o garfo de cabo longo. Aproximou-se depressa.
— Deixe eu ajudá-la com isso tudo.
Ouvindo o próprio oferecimento gentil, Logan quase recuou. Por Deus, estava
agindo como um adolescente apaixonado pela primeira vez na vida.
Ela lhe entregou a frigideira e a lata de gordura. Logan preferiria ocupar as mãos
com seus cabelos, mas manteve-as, bem como os elogios que desejava fazer, para si
mesmo.
Victoria, você tem os cabelos mais lindos que já vi. Suas pernas são tão bem
torneadas que eu gostaria de acariciá-las. Você se dá conta de como seus seios são
adoráveis?
— Obrigada.
Logan levou um instante para entender que ela agradecia a ajuda e não os elogios
apenas imaginados.
— Bem, vou ver se pego o peixe — conseguiu dizer numa voz rouca.
Brincando com o perigo, absorvia tudo dela que lhe fazia o coração disparar. Os
magníficos cabelos vermelhos, os olhos verdes e brilhantes, a boca saborosa, os seios
macios, a cintura fina, os quadris arredondados, as pernas bem torneadas, as sardas

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douradas, a mente imprevisível e fascinante...
A língua afiada.
Logan suspirou e sentiu-se tolo por fazê-lo. Ocorria-lhe que Victoria Amory o
havia arruinado completamente.
Tinha a sensação de não dirigir mais o destino com frieza. Achava-se prestes a
sucumbir a uma explosão perigosa de sentimentalismo.
Que evolução mais revoltante. Deveria estar desgostoso. Não estava. Na
verdade, sentia-se otimista. Isso só podia ser uma aberração provocada pelo tempo
passado na trilha. Afinal ele era um cético, de sangue frio, que encarava o medo com
objetividade. E era disso que gostava.
Até agora, disse uma parte da mente que insistia em mencionar verdades nas
horas menos apropriadas. Até agora, admitiu, relutante. Mas a batalha não tinha
terminado, garantiu a si mesmo.
— Você não precisa de meu garfo, Logan?
Com olhar alheio, ele a fitou. Jamais tinha experimentado, antes, um momento de
confusão como este. Exceto quando encontrara a noiva, quase nua, no quarto do irmão.
— Para fisgar o peixe — explicou Victoria, achando-o estranho.
— Vou afiar uma vareta — disse ele e afastou-se depressa.
O homem tinha talentos escondidos, pensou Victoria, ainda impressionada com o
fato de ele ter acendido a fogueira com lenha molhada. Uma pena que não usasse essas
qualidades para levar uma vida honrada.
A neblina tinha se dissipado e Victoria pôde acompanhar Logan com os olhos até
ele sumir entre as árvores. Preferia muito mais quando ele estava por perto. Isso só
provava sua instabilidade emocional. Depois de ouvir dos lábios dele — aqueles lábios
finos e ardentes — a confissão dos erros, seria sensato manter a maior distância
possível entre ambos.
Quando Logan voltou, Victoria acabava de virar os bolinhos na gordura.
— Que cheiro apetitoso! — exclamou ele.
Em seguida, mostrou três trutas, já limpas, espetadas numa vareta.
— Vou fritá-las assim que terminar os bolinhos. Eles estão quase prontos.
— Enquanto isso, vou ver os bois. Falei sério quando disse antes que precisávamos
descansar hoje. Tanto nós como os animais merecemos uma pausa. Chegamos até aqui
num passo forçado demais. Como estamos no território de Lobo da Noite, poderemos
seguir mais devagar daqui em diante.
Victoria observou a expressão neutra de Logan. Era como se a paixão, que quase
os fizera perder o controle, não tivesse se manifestado. Até parecia que não a tinha
convidado para compartilhar da vida criminosa dele. Mas era uma falta de fortaleza
moral sua lamentar, por um instante sequer, que ele não tivesse falado sério sobre a
oferta indecente.
As trutas já estavam quase fritas, quando um zumbido ameaçador chamou sua
atenção. Victoria levantou o olhar da frigideira e viu uma abelha enorme.
— Não se assuste, Victoria. Finja que não está vendo.
Ela não percebera que Logan já havia voltado.

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— Isso é fácil para você dizer. Abelhas e eu não nos damos bem.
— Você já foi picada?
— Uma vez quando era criança.
— Doeu muito?
— Bastante.
Sua atenção continuava na abelha que, agora, voava em círculos sobre o prato de
bolinhos.
— É por isso que tem medo de abelhas?
— Não se trata de medo, mas de respeito. Houve um outro incidente com uma, do
qual saí perdendo. Sabe, acho melhor deixar os bolinhos para a abelha. Você e eu
comemos os peixes — sugeriu Victoria, ao passar as trutas para um prato.
— Não vou dividir minha comida com essa maldita. Tudo que temos a fazer é
espantá-la — disse Logan, ao se aproximar.
— Não! — gritou ela. — Abelhas não gostam de movimentos em volta delas. Além
do mais, não comem bolinhos.
Ele não lhe deu ouvidos e, abanando a mão, começou a perseguir a intrusa até
conseguir afastá-la.
Victoria admirou tal demonstração de coragem, ou de imprudência.
Naturalmente, lembrou-se de Horace Threadgill e da cena em seu quarto, que a tinha
levado a aceitar a oferta de emprego do sr. Pritchert. Não foi possível deixar de
comparar a covardia de Horace com a atitude firme de Logan.
Mas a abelha não tinha entrado pela perna da calça de Logan. Caso o tivesse feito
e ela tentasse ajudá-lo, ele não ficaria gritando por socorro. E se alguém aparecesse
inesperadamente, perceberia que ela não havia tirado a calça de Logan contra a
vontade dele.
Obviamente, o homem era capaz de se despir por conta própria.

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CAPÍTULO TREZE

Victoria caminhava ao lado do carroção. Há duas semanas, ela e Logan percorriam


a floresta que havia se tornado seu mundo. Avançavam de oito a doze quilômetros por
dia, dependendo se subiam ou desciam colinas.
Viver com Logan tornara-se um hábito, refletiu ela. Todo amanhecer, acordava
entre os braços protetores dele. Fingiam ignorar a intimidade e jamais a mencionavam.
Havia muitas coisas sobre as quais não falavam. Era mais seguro, Victoria reconhecia.
Tinha certeza de que Logan pensava da mesma forma.
Na ausência das palavras, o silêncio estimulava momentos de fantasia. Victoria
entretinha-se com pensamentos sobre Logan. Admirava-lhe a capacidade
extraordinária de conseguir alimentos e o corpo musculoso e viril. Também refletia
sobre a expressão faminta, mas ocasional, dos olhos dele. A chegada a Trinity Falls
interromperia para sempre seu contato com o homem no carroção. O coração pesava
de tristeza.
Não haveria mais Logan Youngblood. Nem mais o aconchego do corpo dele durante
as noites frias de Idaho. Ela não veria mais a barba preta crescer com o passar dos
dias. Não existiriam mais a esperança de que ele a tomasse nos braços outra vez e a
beijasse e a possibilidade de sentir o calor ardente que ele lhe provocava no âmago.
Ao levantarem acampamento naquela manhã, Logan tinha dito que haviam passado
a última noite na trilha. No final da tarde, deixariam as montanhas e desceriam para o
vale. Ao anoitecer, alcançariam o destino final. Isso significava que ela dormira, pela
última vez, nos braços dele. Tentou reprimir a tristeza inútil, mas não era fácil
dissipar a sensação de ter perdido a oportunidade de conhecer Logan
verdadeiramente.
O carroção parou. O sol estava a pino. Victoria viu Logan pular para o chão com
uma agilidade indicativa de que as costelas não o incomodavam mais. Os ferimentos do
rosto tinham cicatrizado sem deixar sinais. Mas por causa da barba negra, continuava
difícil distinguir certos ângulos das feições dele.
Com ela, as sobrancelhas grossas e o nariz reto, sem dúvida Logan parecia o
próprio vilão. Um pirata, ela pensou. Se houvesse vivido um século antes, ele teria sido
um bucaneiro, navegando pelos sete mares em busca de aventuras e tesouros. Só
faltavam um brinco de argola e um tapa-olho para completar a imagem.
— Está com fome, Victoria?
A pergunta a trouxe de volta ao presente.
— O que você tem em mente?
— Que tal um peixe? Você gosta de truta.
Gostava sim, mas antes de Logan pescá-Las para cada refeição. Sem querer,
comentara estar enjoada de peixe e, então, ele tinha começado a caçar animaizinhos
como coelhos, esquilos e guaxinins. Habituada a comer frango, carne de vaca e de

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porco, ela achava difícil se alimentar com criaturas que saltitavam pela floresta
minutos antes de aparecer em sua frigideira. Considerando as escolhas, truta não
parecia má idéia.
— Peixe está ótimo.
— Muito bem. Quero lhe mostrar uma coisa antes de sairmos daqui — disse ele.
Victoria não podia imaginar do que se tratava, a não ser que Logan houvesse
escondido, na região, o produto de algum assalto. Seria por isso que ele conhecia tão
bem esta parte da floresta?
Como fazia sempre que paravam, Victoria deu uma volta pelo lugar. Quando já
retomava ao ponto de partida, encontrou o que procurava. Quatro livros tirados do
carroção. Apanhou os volumes e, ao limpá-los, leu os títulos: Jane Eyre, Razão e
Sensibilidade, Tess e Uma História de Duas Cidades.
Como já houvesse recuperado esses mesmos livros em outras ocasiões, suspeitava
que ela e Logan divertiam-se com um jogo silencioso. Foi até o carroção e guardou os
livros.
Ela não tentava mais lutar contra a simpatia inspirada por Logan. Via claramente
como uma mulher poderia se apaixonar por ele se não tomasse cuidado. Ele conseguia
ser inteligente, jovial e afoito. Ele também provocava uma segurança que estimulava a
idéia de lhe dar filhos e envelhecer ao lado dele. Era como se Logan fosse fora do
comum, refletiu Victoria. Na verdade, ele se assemelhava a um dos heróis de seus
livros.
Mas era também ladrão. Uma mulher seria muito tola em entregar o coração a um
homem cujo futuro incerto poderia envolver prisão ou morte na forca.
Sim, seria insensatez uma mulher prudente desperdiçar amor por um homem
desse tipo. Não importava o quanto ele fosse empreendedor e amante apaixonado, ou
tivesse um físico magnífico. Victoria temia ter se tornado insensata, pois não
conseguia impedir o crescimento da ligação afetiva por Logan. Pensava nele o tempo
todo, mesmo nesse momento em que começava a catar lenha para a fogueira.
Encare a verdade, Victoria. Você está gostando dele além do que é sensato. O
homem significa problemas. E dos grandes.
Ela empurrou um galho seco com a ponta da botinha. Temia muitíssimo que,
apesar da determinação para não fazê-lo, já tivesse perdido o coração.

— Estava imaginando quando o veria outra vez, meu amigo.


Ao ouvir a voz profunda de Lobo da Noite, Logan levantou o olhar.
O chefe indígena estava a pouco mais de um metro de distância. Como sempre,
Logan ficou impressionado com a habilidade do homem para andar silenciosamente.
Com o peito nu e usando perneiras e mocassins de couro, Lobo da Noite harmonizava-
se bem com o meio ambiente.
— Como venho vagando por seu território há quase duas semanas, pensei que você
tinha coisas mais importantes para fazer do que vir me encontrar.
— Eu não diria que você anda vagando, Logan. Você traçou um caminho, tão direto
quanto possível, através desta terra. Nem uma vez desviou da trilha. Uma visita a

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nossa aldeia não teria acrescentado muitos dias a sua viagem.
Logan observou as feições do índio. Não era de seu feitio notar a atração de
outro homem, Mas Lobo da Noite tinha uma aparência tão admirável que era impossível
ignorá-la. Logan detestava descer ao nível do ciúme patético do coronel Windham, mas
na verdade, não queria que Victoria conhecesse o chefe indígena. Ela já tinha uma
visão romântica da vida entre os nativos. Provavelmente, lhe bastaria um único olhar
para se deixar seduzir pelo aspecto exótico de Lobo da Noite. Diabos o carregassem
se apresentasse Victoria a Lobo da Noite.
Esse sentimento de posse era irracional, porém, ele desistira de lutar contra o
impulso de proteger Victoria. Mais de uma vez, quase lhe revelara a identidade, mas
certo de que isso seria inútil, havia se refreado. Um homem tinha seu orgulho e o dele
fora ferido o suficiente pela ingênua moça de Boston.
Quando chegassem a Trinity Falls, ele exigiria uma reparação. Depois, se
mostraria magnânimo e aceitaria as desculpas de Victoria por ter pensado o pior a
respeito dele. Imaginar tal cena o entusiasmava tanto quanto a perspectiva de ver
Victoria diariamente quando ela começasse as aulas para Madison.
Embora teimasse em negar, ele estava reconsiderando o juramento de nunca se
casar.
— Quais são seus pensamentos para deixá-lo com ar tão sério, Logan?
— Deixei a mente divagar.
— Geralmente, são homens velhos, mulheres e crianças que deixam o pensamento
se arrastar como a fumaça de uma fogueira quase apagada. Um jovem guerreiro
apaixonado também faz isso.
— Como uma canoa mal dirigida num remoinho?
Logan perguntou.
Um largo sorriso estampou-se no rosto de Lobo da Noite.
— Você está aprendendo a maneira do Povo falar, Logan.
— Talvez seja a convivência com uma certa ruiva que me inspira a falar
poeticamente.
— Sua mulher é poética?
— Não, uma sonhadora — Logan explicou.
— Nesse caso, é vidente. Ela tem o poder de conhecer o que está para acontecer.
Logan pensou como Victoria o julgava mal. Se fosse vidente, era péssima.
— Não exatamente. Ela vive com a cabeça nas nuvens. Tem o carroção cheio de
livros e a cabeça, de bobagens.
— Não se trata de uma mulher comum. E tem a proteção dos espíritos —
comentou Lobo da Noite.
De fato, Victoria não era uma mulher comum, mas Logan não estava convencido
de que ela contava com a proteção dos deuses indígenas. Todavia, ele não tinha a
intenção de ridicularizar tais crenças.
— Ela tem sorte de continuar viva.
— O Forte Brockton não existe mais — informou Lobo da Noite.
Logan não se surpreendeu com a notícia, mas mesmo assim sentiu um arrepio na

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nuca.
— O que aconteceu?
— O que eu avisei. Os brancos construíram paredes sobre terreno sagrado. — O
chefe indígena dirigiu um olhar perscrutador a Logan. — Por que você permaneceu no
forte depois da partida dos soldados?
— Não tive escolha. Windham foi embora, me largando trancado numa cela —
respondeu Logan em tom amargo.
— Você foi deixado para morrer?!
— O coronel pensava que eu tinha um caso com a mulher dele.
— Por causa disso, ele o condenou à morte?
— Sim e também pelo fato de eu me negar a levá-lo até sua aldeia.
— Para salvar a própria vida, um outro homem, menos corajoso, talvez mostrasse
o caminho para os soldados.
— Eu não estava sendo corajoso. Ignorava que Windham mandaria me espancar e
me prender numa cela.
— Não teria feito diferença se soubesse, meu amigo. Não é de sua natureza trair
a confiança de alguém.
Logan sentiu-se embaraçado. Depois de passar doze dias na companhia de
Victoria, não estava preparado para receber elogios.
— Windham estava enlouquecido. Duvido que me mantivesse vivo mesmo se eu o
levasse até sua aldeia.
Com olhar pensativo, o índio comentou:
— Sabe, Logan, nenhum homem, nem mesmo o branco, gosta de compartilhar sua
mulher com outro.
— Não levei a mulher dele para a cama!
— Mas faz isso com muitas, não é verdade?
Logan enrubesceu com o leve tom de censura de Lobo da Noite. Estranho o grupo
de pessoas com quem ele, ultimamente, discutia sua vida amorosa. Windham, Victoria
e, agora, Lobo da Noite. Eles deveriam saber que, certas coisas, um homem preferia
guardar em segredo.
— Os costumes do homem branco são diferentes dos do índio. Em Trinity Falls há
mulheres dispostas a divertir um homem na cama sem compromisso algum.
— Mas você precisa pagá-las, não é?
— Certo. Porém, sai mais barato e menos complicado do que se casar para se
obter a mesma coisa.
— Sei. E elas distraem muitos homens? Nenhuma dessas mulheres pagas
pertence só a você?
— Isso é a melhor parte. Não quero uma mulher — respondeu Logan, pensando
que, se continuasse repetindo isso, acabaria acreditando.
— Nem mesmo a de cabelos flamejantes com quem você viaja?
Logan abriu a boca, mas nenhum som saiu.
— Essa mulher, a quem os espíritos protegem e que compartilha de seu cobertor,
Logan, você a paga com o dinheiro do homem branco ou com o ouro do Povo?

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Naturalmente, o índio não fazia idéia de como a pergunta era ofensiva. Mesmo
assim, Logan irritou-se.
— Não pago nada a Victoria!
— Ah, ela o diverte porque quer?
— Ela não faz essas coisas. E diferente das outras — Logan rosnou.
— Uma sonhadora. E muito corajosa.
— Por que diz isso?
— Quando os outros carroções seguiram em frente, ela continuou a viagem
sozinha.
— Não teve escolha.
— Não mesmo, Logan?
— Ela se recusou a deixar os livros para trás a fim de aliviar a carga do carroção.
Como não conseguisse manter a velocidade dos outros, acabou sozinha.
— Foi a escolha dela. Conservou o que valorizava mais.
— Deveria ter valorizado a própria pele.
— Sonhadores nem sempre agem como achamos melhor. Eles seguem uma voz que
não ouvimos.
— Ela é de Boston — disse Logan, como se isso explicasse tudo.
— Já ouvi falar de Boston. Essa não é sua aldeia, Logan?
Pensar na próspera cidade portuária como aldeia exigia paciência.
— Cresci lá.
— Então já conhecia esta mulher? Ela era sua amiga?
— Boston é uma cidade cheia de gente. Nunca nos vimos lá.
— Muito estranho vocês dois terem viajado para este lugar e se encontrarem.
Deve ter sido a vontade dos espíritos.
— Não houve intervenção divina, Lobo da Noite. Martin Pritchert a contratou
para dar aulas a Madison. Encontrá-la antes de ela chegar a Trinity Falls foi mera
coincidência.
— Sei.
Pelo ar cético de Lobo da Noite, ele não concordava.
— Foi falta de sorte minha ser preso na cela só porque passei seu aviso para
Windham sobre o ataque ao forte. De agora em diante, serei mais cuidadoso. Não
pretendo mais arriscar meu pescoço para salvar o de outras pessoas. Se você souber
de mais ataques de índios, não me procure.
— Não haverá mais avisos. Estou levando minha tribo para o norte — contou o
guerreiro, com olhar triste. Logan ficou chocado.
— Você está abandonando o território?
— Não há lugar para meu povo e o seu viverem aqui. Logan não sabia o que dizer.
Como era branco e fazia negócios com mineradores que garimpavam o ouro dos índios,
achava-se também um invasor como os outros.
— Não se sinta culpado, meu amigo. Conheço outros brancos, mas nenhum tão
honrado como você.
— Sinto muito — murmurou Logan.

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— Nós não nos veremos muitas vezes mais.
Logan experimentou uma sensação de perda.
— Os soldados estão perto daqui. Pararam junto ao riacho, um pouco adiante de
onde você deixou sua mulher, para os cavalos beberem água — Lobo da Noite avisou.
Logan ficou tenso.
— Acho melhor eu voltar para perto de Victoria.
— Ela não corre perigo. Mas os soldados podem querer castigá-lo por você não
lhes ter mostrado o caminho para minha aldeia.
— Eles querem vingar o incêndio do forte e não se importarão em jogar a culpa na
tribo errada — Logan disse.
— Para a cavalaria, nós índios somos todos iguais.
— Não importa o que acontecer, não os levarei até sua aldeia.
— E quanto a seu pescoço? Entendi que você não ia mais arriscá-lo.
— Posso fazer as duas coisas: continuar vivo e proteger seu povo.
— Meu amigo, se acredita no que me disse hoje, é você quem tem a cabeça nas
nuvens.
— Como assim?
— Você não acredita que os espíritos protejam sua mulher. No entanto, ela
continua viva. Se você não houvesse sido trancado na cela e libertado por ela, ambos
teriam perecido. E se você não se diverte com ela na cama, é um tolo. Os espíritos
deram vocês um ao outro.
Logan sentiu um arrepio, ao pensar em Victoria sendo morta. Porém, sabia que
uma mulher, viajando sozinha pelo território, estava condenada a uma morte quase
certa.
— Não tem nada para dizer, meu amigo? — indagou Lobo da Noite.
— Tenho, sim. Apesar dessa sua conversa em ter uma mulher só para si mesmo,
notei que você não compartilha seu cobertor com nenhuma. Entretanto, observei vária
índias jovens e bonitas lançando olhares amorosos para você.
O guerreiro enrubesceu.
— Ainda não encontrei uma a quem queira chamar de esposa.
— Talvez eu também não.
— Por que mente a si mesmo?
— Ora, você nem conhece Victoria! Como pode considerá-la tanto?
— Eu a observei de longe. O sol sorri para essa mulher que percorre,
corajosamente, a terra do Povo. O fato de continuar viva prova que os espíritos
também sorriem para ela. Um homem deve respeitar e admirar tal mulher. Ela tem
méritos.
Logan sentiu uma pontada de ciúme.
— Fico surpreso ao ouvir que você reconhece os méritos de uma mulher branca.
— Minha mãe era branca — lembrou-lhe o índio.
Logan baixou os olhos.
— Victoria não me considera digno dela.
— Ah. Seu orgulho é muito grande, meu amigo.

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— O que quer dizer com isso?
— Você já me contou o motivo para deixar sua aldeia. Em minha opinião, o fato de
a mulher de seu passado ter escolhido seu irmão em vez de você não feriu seu coração
e sim seu orgulho.
— Eu não devia ter lhe contado essa história.
— Bem, não vai aceitar meu conselho? — perguntou Lobo da Noite.
— Quando você tiver sua esposa, talvez eu o aceite. O olhar do índio tornou-se
distante.
— Não estou à procura de uma. Por enquanto, meu povo ocupa meu coração.
Logan não insistiu e mudou de assunto.
— Talvez eu precise emprestar um de seus cavalos.
— Só um?
Logan concordou com um gesto de cabeça. Começava a arquitetar um plano, no
qual estaria a sós com Victoria quando ela lhe descobrisse a identidade. Assim, ela não
sofreria embaraço público. E, se estivessem sozinhos, ele iria aceitar suas desculpas
num ambiente propício a uma demonstração apaixonada de arrependimento seu.
Também seria melhor para sua reputação, se Victoria entrasse na cidade
dirigindo, sozinha, o carroção. As pessoas admirariam sua coragem e ninguém ficaria
sabendo que os dois tinham viajado juntos por quase duas semanas.
— Você está com ar de quem planeja algo, Logan.
— Acertou.
Logan estava certo de que o esquema elaborado às pressas beneficiaria tanto a
ele quanto a Victoria.
— E esse plano protegerá seu orgulho?
— Claro — respondeu Logan, sorrindo.
— Tenho a impressão de que você vai ao encontro de problemas, meu amigo.

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CAPÍTULO CATORZE

De onde se encontrava, entre a vegetação densa do barranco acima do riacho,


Victoria observava, consternada, uns doze soldados. Eles tinham parado ali para os
cavalos beberem água.
Havia sido o tropel das montarias que a tirara da clareira onde acampavam. A
visão dos homens uniformizados, em vez de animá-la, provocava-lhe medo.
Esses soldados pertenciam ao mesmo exército responsável pelo espancamento e
pela prisão de Logan na cela do forte abandonado. A fúria a dominou. Gostaria de
descer o barranco e acusá-los da selvageria cometida. Mas temendo expor Logan ao
perigo, não o fez.
Na volta para a clareira, deu-se conta de que, não revelando sua presença e a de
Logan aos soldados, havia se tornado cúmplice dele. Apesar de ter sido educada no
cumprimento do dever, ela acabava de violar os preceitos aprendidos.
— Aí está você. Imaginei aonde tinha ido — Logan disse.
Victoria parou. Apressada, não tinha percebido já estar na clareira.
— Não fale tão alto! — advertiu ela.
— Por quê?
— Nada.
Tudo. Perto daqui, estão soldados a quem eu deveria entregá-lo. Mas não posso
fazer isso porque cometi a loucura de me apaixonar por você.
Ela respirou fundo para se acalmar.
— Vejo que você apanhou mais peixes.
— Por que está cochichando? — Logan indagou.
— Estou com dor de cabeça. Ela melhora quando falo baixo.
Por Deus, estava se tornando uma grande mentirosa.
— Nesse caso, também vou falar baixo. Talvez se você se alimentar a dor passe
— sugeriu Logan.
— Depende.
— Do quê?
— Da distância que o cheiro de comida alcança.
— Não estou entendendo.
— Você sabe, devemos evitar atrair companhia indesejável, como ursos e índios.
Imagino se o odor de algo cozinhando vai muito longe — explicou Victoria.
— Ora, estamos viajando há quase duas semanas e só agora você se preocupa com
isso?
— Você se esqueceu do puma?
— Não estávamos cozinhando nada quando ele atacou.
— É verdade.
Se o avisasse da presença dos soldados na redondeza, teria de explicar por que

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não o entregara a eles. Recusava-se a confessar os sentimentos por Logan, pois não
conseguia nem admiti-los a si mesma. Logo chegariam a Trinity Falls e se separariam.
Sem a companhia constante dele, seria mais fácil esquecê-lo.
— Tivemos sorte em não receber companhia indesejável. Exceto o puma e a
abelha — comentou ela.
— Você está pondo os dois em pé de igualdade?!
Victoria não gostou do tom zombeteiro dele.
— Estou preocupada apenas com nosso bem-estar. Já quase alcançamos a
segurança e seria tolice nos expor a perigos a esta altura. Aposto como a floresta
ferve com índios dispostos a arranjar alguns escalpos.
— Estamos em território amigo, Victoria.
— Soldados também podem aparecer e...
Calou-se, aborrecida, pois a última coisa que desejava mencionar era a presença
do exército.
— Lobo da Noite disse que há alguns por perto.
As palavras de Logan a surpreenderam.
— Você conversou com Lobo da Noite?
— Sim. Alguns minutos atrás.
Victoria sentiu-se desolada.
— Eu queria tanto conhecer seu amigo índio! Por que você não o trouxe até aqui?
Logan deu de ombros.
— Não vi necessidade.
— Como assim? Eu desejava tanto conhecer um nativo americano. Lobo da Noite
seria o ideal.
— Por quê?
— Ele não é inimigo. E você o chamou de guerreiro corajoso e nobre.
— Não tenho certeza de ter usado essas palavras. Eu apenas queria poupá-la de
um desapontamento.
— O que quer dizer?
— Você tem uma opinião muito lisonjeira sobre Lobo da Noite. Na verdade, ele é
muito velho. Já perdeu os dentes e quase todos os cabelos.
— Eu não sabia que índios ficavam calvos — Victoria comentou.
— Pois ficam. Outra coisa sobre Lobo da Noite. Ele tem um cheiro horrível.
Ninguém gosta de ficar a favor do vento ao lado dele e nem comer em sua companhia.
É muito desagradável.
— Obrigada pelo aviso, mas duvido que jamais o encontre.
— Algum dia, eu a apresentarei a um outro índio.
Não haveria outro dia, refletiu ela.
Logan observou Victoria fritar os peixes. Não se surpreendera com seu
desapontamento por não encontrar Lobo da Noite.
Fez uma careta. Incomodava-o a perspectiva de Victoria fitar o homem com
encanto nos olhos verdes. Como ele jamais tinha lhe provocado tal reação, recusava-se
a vê-Ia dispensar sua adoração a algum outro homem.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Ele desejava isso só para si mesmo, bem como sua feminilidade ardente. Mas a
única maneira de conquistar tais tesouros seria revelar-lhe quem era. E ela precisaria
acreditar. Quando chegassem a Trinity Falls, a questão seria enfrentada. Ficaria
esclarecido que ele não era um fugitivo da lei e sim um cidadão respeitável.
Victoria passou os peixes da frigideira para um prato.
— O almoço está pronto — avisou.
Ela não o tinha entregado aos soldados...
Logan estava a suas costas, no barranco, enquanto ela observava os homens
uniformizados. Segurara a respiração enquanto esperava para ver o que Victoria faria.
Na verdade, ele não corria grande perigo. Windham não estava no do grupo. Aliás, o
coronel não deveria querer que muitas pessoas ficassem sabendo como ele deixara
Logan preso para morrer. O motivo da atitude era muito pessoal. A honra ofendida por
uma esposa, supostamente, adúltera.
Logan serviu-se de duas trutas e observou Victoria. Sentada num cobertor, ela
brincava com o peixe no prato. A maioria das pessoas que viajavam pela trilha comia
qualquer coisa colocada a sua frente. Victoria, não. Ela era a criatura mais implicante
para se alimentar que ele já conhecera. Devia ser o resultado de sua educação
refinada. O mesmo se poderia dizer sobre o modo culto de se expressar e sobre a
obsessão pelos livros.
Ela levantou o olhar.
— Por que está me fitando?
Por que não me entregou aos soldados, Victoria? Está começando a confiar em
mim?
— Estou esperando que você pare de perseguir o peixe pelo prato e comece a
comer.
Ela apanhou um pedaço de truta, pôs na boca e mastigou-o enquanto o encarava.
Não havia razão para Logan achar o gesto sensual, todavia, achava. Aliás, tudo
feito por Victoria perturbava-lhe os sentidos. Seu jeito de andar, com um leve sacudir
dos quadris, a maneira de piscar quando se surpreendia, o menear da cabeça ao achar
graça em alguma coisa. Até como Victoria respirava acelerava-lhe o pulso.
Por um momento, ele deliciou-se com a visão rápida de seu corpo, quando ela
trocava a roupa molhada, depois da tempestade. Excitou-se com a lembrança e se
maldisse por invocá-la à luz do dia e na presença de Victoria. Como gostaria de deitá-la
no cobertor e...
— Logan, você está muito quieto.
— Pensei que você preferia o silêncio.
Ela inclinou um pouco a cabeça para o lado como se tentasse ouvir algo.
— Se falarmos com moderação, podemos nos distrair conversando.
Para Logan, Victoria achava que os soldados já tinham se afastado e, portanto,
eles podiam reassumir as atitudes normais.
Ele tomou um gole de água na xícara de porcelana, providenciada por Victoria a
cada refeição.
— Algum assunto especial que você queira discutir?

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Você mencionou mais cedo querer me mostrar algo.
Logan foi dominado pela expectativa.
— Tão logo acabemos de comer, vamos fazer uma caminhada. Existem umas
coisas aqui por perto que você pode achar interessantes.
— Como o quê?
— As cachoeiras.
— Ai, Logan, será ótimo apreciá-las — Victoria disse, sem conter o entusiasmo.
— Além das cachoeiras, há também piscinas naturais de água quente.
— Não diga!
Logan assentiu com um gesto de cabeça e tentou manter uma expressão neutra.
— Elas são fundas o suficiente e a temperatura da água é a ideal para um banho.
Aí está a oportunidade para você se lavar e chegar limpa à cidade logo mais à noite.
Victoria assumiu um olhar cauteloso.
— E onde você ficará enquanto tomo banho?
Não deveria se ofender com sua desconfiança, pensou Logan. Afinal, ele quase a
tinha possuído duas vezes. Por causa de sua inocência, Victoria não imaginava que
tinham feito amor centenas de vezes. Na imaginação dele, claro.
— Estarei em minha piscina, me livrando de uma grossa camada de poeira da
trilha.
Ela franziu as sobrancelhas.
— A que distância fica sua piscina da minha?
Maldição! Victoria percebia como a mente dele trabalhava.
— Bem perto.
Como se pesasse os prós e os contras do banho, ela mordeu o lábio.
— A idéia é estimulante — admitiu ela, com olhar pensativo. — Também tenho
certeza de que você respeitará minha privacidade. Afinal, estamos viajando há vários
dias e, exceto pelo início meio tumultuado, você tem sido um verdadeiro cavalheiro. Vai
ser maravilhoso chegar limpa à cidade.
Logan levantou-se.
— Vou apagar a fogueira.
Sorridente, ela também se ergueu.
— Vou apanhar umas coisas. Quero saborear a experiência.
Eu também...
Se a intenção dele não fosse honrada, Logan poderia se sentir culpado com a
confiança de Victoria. Mas o objetivo dele era forjar um laço de intimidade jamais
experimentado por ela com outro homem. Sua virgindade estaria segura.
Mais especificamente, pretendia vencer sua inibição para com ele, fazê-la
entender que um desejo impetuoso os dominava. Com ele, poderiam produzir um fogo
ardente e capaz de destruir qualquer obstáculo entre ambos. Queria acordá-la para a
paixão encerrada em seu âmago. Depois de experimentar esse despertar glorioso,
Victoria não conseguiria mais se afastar dele. Tinha de possuí-Ia completamente, a
fim de não restar lugar em sua mente, em seu coração e em seu corpo para outro
homem.

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Ao tomar essa decisão, Logan sabia que não teria sossego enquanto não se
casasse com Victoria. Se ele atendesse apenas à própria carência, estaria se
apossando de algo que ela não cederia sem a cerimônia nupcial. Ele queria seu amor,
seu calor, sua alegria e não sentimento de culpa, remorso e vergonha.
Logo deixariam as montanhas e tomariam a trilha que se juntava à estrada para a
cidade. No dia seguinte, tudo mudaria entre ambos. Victoria descobriria que ele era
seu patrão. Enquanto estivessem sob o olhar vigilante das pessoas de Trinity Falls,
teriam de se tratar de maneira estritamente profissional. Era essencial darem um
bom exemplo para Madison.
— Estou pronta.
A voz de Victoria interrompeu os pensamentos de Logan. Ela carregava toalhas,
uma muda de roupas e um sabonete cor-de-rosa, que estava em cima da pilha.
— Muito bem. O lugar não fica longe — disse ele, dirigindo-se para os limites da
clareira.
Pouco depois, olhou por sobre o ombro para ver se Victoria o seguia. Como o
caminho fosse íngreme, ele estendeu a mão e apanhou as roupas.
— Obrigada.
Sua voz estava meio ofegante e seus olhos brilhavam de expectativa. Logan
abafou um suspiro.
— Mantenha-se perto de mim.
— Não se preocupe. Não vou me perder — respondeu ela, rindo.
Apesar do calor eletrizante no corpo de Logan, ele caminhava depressa por entre
as árvores. Existiam prazeres que um homem detestava procrastinar.
Em Trinity Falls, ele tinha a firme intenção de cortejar Victoria de maneira
adequada. Como pretendia saborear cada centímetro de seu corpo adorável, estava
disposto a sacrificar o celibato.
Mas haveria outras compensações além das apreciadas na cama. A satisfação de
acordar de manhã com Victoria nos braços, de ver seus olhos verdes brilharem de
entusiasmo por um dos heróis de seus livros, de ouvir sua voz com o sotaque marcante
de Boston.
Ele a ensinaria a amá-lo. Seria fácil quando lhe contasse não ser um ladrão
perigoso. Naturalmente, Victoria ficaria zangada ao descobrir que ele escondera a
verdadeira identidade. Mas ele tinha certeza de poder apaziguá-la com palavras
afáveis e carinhosas.
Também lhe mandaria flores. Mulheres gostavam disso. Ou a levaria para jantar
no restaurante do hotel, para encantá-la com a fantástica cozinha francesa de Pierre.
Ora, com seu paladar exigente, isso seria suficiente para convencê-la a se curvar à
vontade dele.
Por outro lado, não haveria mais visitas ao Dancing Belle ou ao Golden Spur, onde
ele costumava eliminar as frustrações. Victoria não era do tipo que toleraria
infidelidades do noivo. Mas isso não o aborrecia. Ele não sentia mais atração pelas
moças que haviam satisfeito o apetite dele. Faziam parte do passado. E este não era
da conta de Victoria. Só esperava que ela não ouvisse alguém chamá-lo pelo apelido

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ridículo usado por Windham: Pirata Ardente.
Logan olhou por sobre o ombro. Corada, Victoria vinha logo atrás. Ele parou,
ajeitou as roupas sob o braço e estendeu a outra mão para ajudá-la no resto da subida.
— Chegamos.

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CAPÍTULO QUINZE

Com a ajuda de Logan, Victoria subiu vários degraus naturais de pedra. O barulho
de água caindo quebrava o silêncio da floresta. Ao juntar-se a ele, olhou para o outro
lado do penhasco, onde três colunas de água, despencavam de mais de cem metros de
altura. Os lençóis de líquido branco e espumejante lembravam véus de noivas.
— Lindíssimas — Victoria murmurou.
Virou-se para Logan e recebeu um choque. Ele estava com o braço ao redor de
sua cintura e o rosto virado para o seu. O coração disparou.
Eu o amo...
A descoberta terrível comprimiu-lhe o peito, quase impedindo-a de respirar.
Como podia ter descido tão baixo?
Sabia que devia apartar-se dele, mas não podia. Em vez disso, admirou os lábios
finos, emoldurados por um bigode e uma barba pretos. Se ficasse na ponta dos pés e o
enlaçasse pelo pescoço, poderia beijar aquela boca firme e atraente.
Precisava afastar os olhos desse homem perigoso e apreciar a beleza das
cataratas. Todavia, Logan, à maneira dele, também era um esplendor da natureza.
Além do mais, ela teria outras oportunidades para voltar ali no futuro.
— Por que não está olhando as cataratas? Você tem medo de altura? — perguntou
Logan.
Só das alturas aonde, suspeito, você pode me levar...
Ela sacudiu a cabeça.
— Não. Olhar de lugares altos não me perturba.
— Ótimo.
Com muito esforço, Victoria afastou o olhar da boca de Logan. Mas antes de
dirigi-lo às cataratas, os olhos negros dele prenderam os seus.
Bem devagar; ele baixou a cabeça. No instante seguinte, tocava-lhe os lábios.
Suspirando, ela ficou na ponta dos pés e o enlaçou pelo pescoço. Exatamente como
tinha imaginado.
E mais.
Os lábios de Logan moldaram os seus. A língua invadiu-lhe a boca, acariciando-a.
Sob a pele, Victoria sentia correntes de excitação que a faziam vibrar. Ela não tinha
forças para se libertar do ataque sensual de Logan e para pôr fim nas sensações
tumultuadas que a dominavam. Era impossível resistir à agitação poderosa que ele
provocava em seu corpo.
Logan interrompeu o beijo com um gemido.
— Victoria...
— Sim?
Não era uma pergunta, mas uma reposta. Ele entenderia? Seus seios ansiavam
para sentir as mãos dele. A boca também, ela pensou meio atordoada.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Vamos. Quero lhe mostrar as piscinas de água quente.
Ela forçou-se a soltar-lhe o pescoço. Devia ser embaraçoso para Logan livrar-se
de seu abraço. Aturdida com a forte reação, ela recuou.
— Cuidado!
O grito de Logan soou enquanto ele a agarrava pela cintura e a puxava do espaço
vazio logo a suas costas.
— Você se esqueceu de que estamos na borda de um penhasco?
— Acho que sim.
— Pois preste mais atenção — disse ele, com expressão sombria.
Sem dúvida, o homem fora esculpido da mesma pedra em que pisavam. Como podia
ele pensar numa questão tão irrelevante como piscinas de água quente?
— Vou ser mais cuidadosa — prometeu, em tom humilde. Mas revoltou-se.
Merecia desculpas de Logan. Primeiro, por invadir-lhe a boca e, em seguida, por
terminar o beijo antes que ela estivesse satisfeita.
Deveria estar grata por Logan ter lhe salvado a vida. Porém, ela não teria
recuado se o beijo não a houvesse descontrolado. A culpa era dele por haver avançado
e se afastado sem pensar em sua reação.
Logan continuava a fitá-la com expressão severa. Se ele considerava o beijo como
algo normal e sem importância, ela agiria da mesma forma.
— Bem, onde ficam as tais piscinas? — indagou, em tom animado.
— Um pouco além daquele grupo de cedros — respondeu ele, pondo o braço em
volta de sua cintura e começando a andar.
Victoria sentiu um leve cheiro de enxofre. Depois de passarem pelos cedros,
entraram numa clareira iluminada pelo sol. O cheiro de enxofre era mais acentuado ali
e o chão estava pontilhado de touceiras de capim amarelado e de pedras cobertas de
musgo. Havia uma certa densidade de vapor no ar que grudava na pele e nos cabelos.
A primeira piscina que olharam era convidativa e parecia funda o suficiente.
— É uma delícia tomar banho aí — afirmou Logan, ao colocar as roupas sobre uma
pedra ao lado.
Victoria correu os olhos pela clareira. Viu mais quatro depressões, cheias de água
e de onde saía vapor. Mas o lugar era tão aberto e desprotegido que ela não tinha
coragem para se despir. Ainda mais com Logan a seu lado.
O beijo excitante, trocado há poucos instantes, sugeria que ele não se
comportaria como um cavalheiro. Mas, talvez, a maneira abrupta de ele interromper o
contato íntimo mostrasse uma certa dose de distinção.
Desconcertada, Victoria descobriu o quanto desejava que Logan agisse como era
na verdade. Ou seja, um homem sem escrúpulos, que a tomasse nos braços e trouxesse
à tona os segredos de seu corpo, os quais ele parecia conhecer.
E se aquelas maravilhosas sensações fossem provocadas pelo ataque dele e não
por sua rendição, ela não seria responsável pelo que viesse a acontecer.
Você é covarde e hipócrita, Victoria Amory.
A verdade incomodava, mas não aliviava a tensão em seu corpo.
— Não me diga que a modéstia a impede de se despir e pular na água — disse

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Logan, rindo.
— Só um homem de sua natureza pode caçoar de minha modéstia, mas...
Mas o quê?, indagou-se calando. Vai mentir e dizer-lhe para se afastar para trás
das árvores?
— Admito não ser do tipo de mulher propensa a deixar um homem, que não seja
seu marido, ver seu corpo nu à luz do dia.
Pronto. Havia definido sua posição, embora não com muita honestidade.
— E no escuro?
— Então, não haveria propósito.
— Mas deixaria seu marido vê-Ia nua, à luz do dia?
— Para ser sincera, nunca pensei nisso. Mas se meu marido tivesse uma razão
válida para me ver nua, eu concordaria.
— O que você entende por razão válida?
— Se eu estivesse doente, ou machucada, e ele precisasse verificar a extensão
de meu estado.
Logan a fitou com olhar penetrante.
— Suponhamos que ele quisesse admirar seu corpo delicado sem a obstrução de
roupas — ele murmurou numa voz rouca que, ao mesmo tempo, acariciou e ralou seus
nervos.
— Para meu marido, eu permitiria tal liberdade.
— Homem de sorte!
— Mas o que eu faria com meu marido, caso tivesse um, não vem ao caso.
— Claro.
— Então, esta nossa conversa não faz sentido.
Um sorriso irritante estampou-se no rosto de Logan.
Victoria sentiu-se tentada a empurrá-lo, com roupa e tudo, para dentro da piscina
mais próxima.
— Vou me virar de costas enquanto você se despe avisou ele.
— Não sei se confio em você.
Ou em mim mesma, acrescentou ela mentalmente.
— Confiou lá na clareira. Você disse que, até agora, eu vinha me comportando
como um cavalheiro. Também concordou que não seria arriscado tomarmos banho nas
piscinas.
— Isso foi antes.
— Do quê?
— De você me beijar outra vez. Você não vai querer negar que, cinco minutos
atrás, fez isso, me deixando atordoada.
— Atordoada, hein?
A tentação de empurrá-lo para a água ficou mais forte.
— Eu exagerei. Seu beijo foi apenas inesperado.
Logan sacudiu a cabeça.
— Você gosta de desafiar um homem, Victoria. Mas deve ser natural, para uma
mulher de seu temperamento, atirar-se ao perigo sem pensar.

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— Obviamente, você não me conhece bem. Não sou como imagina.
— Sei. Você não passa de uma senhorita acanhada e incapaz de conversar com a
própria sombra.
— Não há motivo para se assustar a sombra.
Ele prosseguiu como se não a tivesse ouvido:
— Você é uma pessoa caseira, que não vive perigosamente, não se coloca em
situações arriscadas e nem expõe a vida de maneira descuidada.
— Correto. Não faço nada disso — concordou ela.
Ele riu, divertido.
Sem pensar duas vezes, Victoria levantou as mãos e o empurrou pelo peito.
Embora surpreso, ele não se desequilibrou e, dando um passo para o lado, não caiu na
piscina logo atrás. Em seguida e num movimento rápido, segurou-a pelos pulsos e a
repreendeu:
— Meu bem, às vezes você não sabe a hora de parar.
— Não sou seu bem!
E não fazia sentido lamentar o fato de que nunca seria. O homem estava
destinado a terminar a vida tumultuada com a corda no pescoço.
— Mas poderia ser se não estivesse tão determinada a pensar o pior sobre mim.
Ela olhou para os pulsos presos.
— Solte minhas mãos.
— Peça por favor.
Em vez de atendê-lo, ela puxou-se para trás. Nada aconteceu. Victoria pensou em
dar-lhe uns pontapés. Mas fez uma careta e perguntou:
— Por que você está agindo de maneira tão irritante?
— Estou cansado de você não confiar em mim.
— Imagine! Caso tenha se esquecido, eu o encontrei...
— Preso numa cela. Como poderia esquecer se você menciona o fato a todo
instante? Mas você já conviveu comigo o tempo suficiente para formar uma opinião
sobre meu caráter.
— Já lhe disse, caso se lembre, que confio em você. De certa forma.
— Isso é muito vago — Logan respondeu ao acariciar, com os polegares, a parte
interna de seus pulsos.
Ela tentou ignorar a sensação deliciosa provocada pelo gesto.
— Pois então, vou esclarecer. Minha confiança não vai ao ponto de permitir que eu
tome banho, nua, diante de seus olhos perscrutadores. Entendeu?
Falando assim tão alto, a explicação parecia sincera.
— Ora, por que não disse isso antes? — indagou Logan.
O homem esgotava-lhe a paciência. Ela não fazia idéia do que ele esperava ganhar
ao irritá-la. Mas bastava.
— Vai soltar minhas mãos?
— Não sei. Você vai tentar outra vez me empurrar para dentro da água?
A voz morosa da pergunta a fez enrubescer.
— Se você me deixar apreciar o banho em privacidade, prometo não atacá-lo

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mais.
Logan curvou a cabeça e beijou-lhe os dois pulsos. Sentir os cabelos dele na
ponta do nariz era desconcertante. E se enfiasse os dedos na cabeleira negra? Qual
seria a sensação?, indagou-se Victoria.
Logan a soltou, mas por um instante ela não soube onde colocar as mãos. Antes de
fazer algo condenável, como acariciá-lo na nuca, crispou-as e as manteve junto ao
corpo.
— Não posso deixá-la aqui desprotegida, Victoria. Não seria responsável de
minha parte.
— Não corro perigo de me afogar.
— Um urso poderia aparecer. Ou um lobo ou um puma, todos dispostos a se
deliciar com sua carne macia. Há ainda o perigo de um índio surgir e, fascinado por
você, capturá-la. De forma alguma, posso me afastar.
— Não vou tirar o vestido com você me olhando.
— Fico de costas — disse ele, virando-se. — Dispa-se e entre na água. Aí, eu me
livro de minhas roupas e caio em outra piscina.
— Não tenho a mínima intenção de vê-lo nu!
— É só fechar os olhos.
Não havia outra solução para o dilema de sua modéstia, refletiu ela. Contanto que
Logan não a beijasse, a tocasse ou a olhasse, ela se sentiria relativamente segura.
Victoria tocou o primeiro botão da blusa, mas parou.
— Logan, quero lhe fazer um aviso. Vou me despir e entrar na água. Se você se
virar antes de eu avisá-lo, se entrar na minha piscina ou violar o mais simples princípio
de cavalheirismo, eu...
— Você o que, Victoria?
Ela abriu vários botões.
— Ficarei muito desapontada.
— E daí?
Victoria abriu os outros botões e tirou o vestido.
— Sei guardar ressentimentos — afirmou ela.
— É mesmo?
A voz acariciante provocou-lhe arrepios pela pele toda. Descalçou as botinhas, as
meias e livrou-se da roupa de baixo. Estava completamente nua, com Logan a poucos
passos de distância. Ao sentir o sol e a brisa no corpo, sua lascívia aumentou.
— Já entrou na água?
— Não! Continue de costas!
Com cuidado e segurando-se na borda da piscina, ela baixou o corpo até as solas
dos pés tocarem o fundo de pedra. Mesmo assim, a água chegava só até um pouco
abaixo dos seios.
— Posso me virar agora?
— Não!
— Pensei ter ouvido você entrar na água.
— Não completamente.

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Dobrando os joelhos, ela viu os seios submergirem. Infelizmente, a água era tão
transparente quanto o vidro e pouco importava se os seios estivessem dentro ou fora
dela.
— Logan?
— O quê?
— Você não quer ir um pouco mais para trás e usar a piscina a sua esquerda?
— Claro.
— Então, faça isso. Depois, pode se virar.
Ele atendeu seu pedido, porém, isso não era suficiente.
Logan estava a menos de quatro metros de distância. Sem saber quão bem ele
enxergava, Victoria cruzou os braços sobre o peito.
— Você esqueceu algo, meu bem.
Mais uma vez, ele dirigia-lhe a expressão carinhosa.
Resolveu ignorá-la.
— O quê?
— O sabonete. Você não quer usá-lo?
— Naturalmente.
— Então, vou levá-lo. A menos que você mesma queira sair da água para pegá-lo.
— Pare de falar e venha me trazer o sabonete.
Logan riu baixinho.
— Você manda.
Em poucos passos, ele alcançou a pedra, ao lado da piscina de Victoria, onde
estava o sabonete e apanhou-o. Olhou para ela. Seus braços cobriam os seios, mas não
havia nada que ela pudesse fazer para esconder o resto do corpo.
— Entregue logo o sabonete — disse ela.
— Você vai precisar estender a mão.
Victoria arregalou os olhos. Ele estava certo. Cuidadosamente, soltou um dos
braços. No mesmo instante, o seio esquerdo ficou exposto. Recusando-se a encarar
Logan, estendeu a mão acima da cabeça e ficou à espera. Teve a impressão de que o
tempo parava. Finalmente, sentiu o sabonete na palma da mão. Fechou-a e encolheu o
braço sobre o peito novamente.
O silêncio era tão denso quanto o ar úmido.
— Victoria.
Ela forçou-se a levantar o olhar. Ele estava bem perto e a fitava com expressão
penetrante. Lembrava uma locomotiva desgovernada e prestes a destruir tudo que
encontrasse no caminho.
— Nunca vi nada tão lindo quanto você — murmurou ele.
Respirar tornou-se um problema para Victoria.
Logan começou a desabotoar a camisa. Ela queria protestar contra a proximidade
dele de sua piscina, mas não conseguiu falar. Muda, viu as beiradas da camisa
separarem-se e expor o peito peludo dele. Depois de tirar a peça, ele a jogou ao lado
de seu vestido.
Em seguida, desafivelou o cinto. Victoria sabia que ele percebia seu olhar

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observador; mas isso não foi o suficiente para desviá-lo. Havia algo tão hipnótico nos
gestos casuais de Logan que ela se sentia enfeitiçada.
Com os dedos na vista da calça, Logan avisou:
— Você precisa saber, Victoria, que quando um homem deseja uma mulher, ele
não pode disfarçar.
Ela viu a saliência na calça que confirmava as palavras dele. Uma curiosidade
irreprimível a impediu de fechar os olhos.
Enquanto descalçava as botas, Logan continuou:
— Os homens são feitos de maneira bem simples. Vemos uma mulher que agita
nosso sangue e endurecemos.
Baixou a calça e Victoria viu que ele falara a verdade. O membro erguia-se com a
mesma audácia e impetuosidade de seu dono. Ela fechou os olhos. Contudo, era tarde
demais para apagar, da mente, a beleza viril do corpo de Logan.
O que estaria acontecendo com ela? Por que sentia essa estranha letargia que a
deixava tão desinibida? Era como se uma força estranha possuísse seu corpo,
deixando-a incapaz de resistir à atração de Logan.
— Eu a choquei, Victoria?
Não. Fiquei chocada comigo mesma!
Pelo barulho de água, ela percebeu que Logan tinha entrado numa piscina.
Entreabriu os olhos e viu que ele usava uma bem ao lado da sua.
Mordeu o lábio. Depois de observá-lo se despir, ela não podia representar o papel
de moça inocente e ofendida.
Victoria viu Logan flutuar de costas, com o rosto virado para o sol. Ele dava a
impressão de não ter a mínima preocupação na vida. Não se importava com a chegada à
civilização e com o fim do relacionamento de ambos? Não percebia o risco iminente de
ser preso? Talvez fosse essa atitude de desapego que o tivesse levado ao mundo do
crime.
Victoria suspirou e começou a se ensaboar. Lavou os cabelos três vezes. Quando
terminou, pôs o sabonete na borda da piscina e acomodou-se numa posição semelhante
à de Logan.
A água quente tinha lhe relaxado os músculo e a deixado num estado de
languidez. Fechou os olhos. Se não temesse se afogar, dormiria um pouco, refletiu.
— Como está o banho?
A voz sonora de Logan tirou-a da sonolência.
— Um verdadeiro paraíso.
— Nada como um banho quente para restaurar o bom humor de uma pessoa. Não
quer me emprestar o sabonete?
Victoria sorriu.
— Você vai ficar com perfume de rosa.
— Não tem importância. Jogue-o para cá.
Ela o atirou e Logan apanhou-o no ar, começando logo a ensaboar a barba.
A expressão de Victoria tornou-se triste. Não compreendia esse homem tão
afoito e imprudente, que havia entrado em sua vida com força avassaladora. Ele

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parecia tão satisfeito e sem a mínima preocupação com o futuro.
Por mais algum tempo, continuaram em silêncio. Então, o barulho de Logan, saindo
da piscina, chamou a atenção de Victoria. Ela virou a cabeça. A água escorria dele,
deixando listras brilhantes no corpo musculoso e cheio de pêlos.
Imediatamente, fechou os olhos. Ao ouvi-l rir, ficou apreensiva.
— Um pouco tarde para se mostrar acanhada, meu bem.
Percebendo-lhe a sombra sobre si, concluiu que Logan estava em pé a sua frente.
— Como já satisfiz minha curiosidade, não há necessidade de vê-lo nu outra vez.
Por Deus, estava metida numa grande encrenca. Por que cedera à tentação de
observá-lo?
— Victoria, me dê sua mão.
— A troco de quê? — perguntou, tentando se acalmar. Tarde demais, descobria
estar numa situação crítica.
Como pretendia içar o corpo para a beira da piscina, se não contava com a
agilidade e a força de Logan?
— Deveria estar claro para você que vai precisar de minha ajuda para sair daí.
— Tem razão. Mas posso sugerir que você se vista antes de me ajudar?
Seria melhor se um dos dois estivesse vestido. Dessa forma, as peles não se
tocariam e uma dose de decência seria preservada.
— Pode, claro, mas não vou fazê-lo — respondeu ele, com a satisfação de estar
em posição de superioridade na barganha.
Criatura detestável, de corpo magnífico e viril.
— Pare de me atormentar e ponha a calça — Victoria disse, em tom autoritário.
Não era fácil falar com o homem pingando água ali tão perto. Isso sem mencionar
o fato de ele ter uma visão completa de seu corpo. Naturalmente, os braços escondiam
os seios, mas os olhos dele estavam em outro lugar. E o outro lugar pulsava com
entusiasmo.
Em vez de pôr a calça, Logan abaixou-se. Victoria forçou-se a manter os olhos
longe da parte íntima que ele não se constrangia em mostrar. Modéstia e Logan não se
conheciam.
— Quero olhá-la inteirinha. Você também não quer me olhar?
— Você sabe que não pararíamos aí — ela argumentou.
— Claro, pois desejo tocá-la e ser tocado por você.
As imagens alarmantes, provocadas por Logan em sua mente tumultuada, a
assustavam. Victoria tinha a sensação de estar na beira de um precipício, que mudaria
sua vida para sempre. Apesar do revés inocente que havia lhe destruído a reputação e
a mandado para o outro lado do país, ela era uma boa mulher.
Mas que desejava um homem mau.
— Não faremos nada que você não queira — murmurou ele.
Aí estava o problema. Ela queria fazer tudo com Logan.
Se isso acontecesse, não poderia mais aceitar o cargo de professora de uma
menina inocente.
— Você tem o poder de me levar a querer fazer coisas que não deveria. É uma

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
péssima influência em mim queixou-se ela.
— Sou mesmo?
— E eu tinha grandes esperanças de regenerá-lo.
— Acha que falhou?
— Se permitir que me tire da água, com você nu como no dia em que nasceu,
certamente falhei. Sinto dizer, mas você é uma causa perdida. Tentei muito
despertar-lhe a consciência. Você, por outro lado, me faz considerar algo desastroso.
— Se eu tiver de sacrificar moral e honra para tê-la em meus braços, estou
disposto a fazer a troca.
— Mas não deveria ser assim.
— Dê sua mão, Victoria.
Ela fitou-lhe os olhos negros e, como hipnotizada, levantou o braço. Em questão
de segundos, seu corpo era içado da piscina e envolvido pelos braços de Logan. Nem a
fantasia mais ousada poderia tê-la preparado para a sensação provocada pelo roçar de
sua pele na de Logan.
Espalmou as mãos no peito dele para impedir uma aproximação maior. Mas ao
sentir os pêlos, não resistiu e enfiou os dedos entre eles.
Logan a deitou sobre as roupas descartadas.
— Ai, meu bem, eu não planejava me sentir assim.
Pensei que pudesse apenas admirar seu corpo, acariciá-lo e não ir mais longe.
Victoria observou-lhe as feições. O olhar faminto dele abalou-lhe a resolução e o
bom senso.
— Eu também não planejava me sentir assim — ela confessou baixinho. — Não há
escolha a não ser nos resignarmos ao inevitável.
Um sorriso estampou-se no rosto barbudo, deixando-o com a aparência de pirata,
como Victoria o havia chamado em segredo.
— Criaturinha tão corajosa.
— Ai, Logan, me beije.
— Daqui a um instante. Antes de irmos adiante, precisamos acertar certas coisas.
Ela queria paixão e não conversas.
— Podemos fazer isso depois, Logan.
— Aprecio seu espírito, meu bem. Mas existem certas coisas a meu respeito que
você precisa saber antes...
— Não há mais nada que eu queira saber sobre você — afirmou ela,
interrompendo-o.
Uma barreira pareceu formar-se nos olhos dele.
— Entendo.
Victoria sorriu para encorajá-lo.
— Acho muito nobre de sua parte querer me lembrar de seus erros passados.
Mas nós só temos agora, este minuto, Logan.
Ele continuou com olhar sombrio, porém, acabou sorrindo.
— Pensei que você já tinha me insultado tanto quanto podia.
Ela o fitou, perplexa.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Como assim?
Logan curvou a cabeça e roçou os lábios em seu ombro.
O contato inesperado provocou um arrepio ao longo da espinha de Victoria.
— Vai levar bem mais de um minuto para fazermos amor.
Outras sensações deliciosas a dominaram.
— Por Deus, você é linda!
O elogio excitou-a mais.
— Você também é lindo.
Era verdade, pensou ela, inebriada. Logan Youngblood era um homem de grande
beleza física.
— Eu tinha razão sobre suas sardas — disse ele, ao curvar a cabeça sobre seus
seios.
Nesse momento de paixão, ela não tinha pensado nas sardas. Se Logan, como a
maioria dos homens, não as apreciava, deveriam interromper esse negócio de fazer
amor.
— Tão sedutoras... É como se sua pele estivesse salpicada de ouro em pó.
Comentário típico de um ladrão, refletiu ela.
— Seus mamilos rosados lembram as rosas do jardim de minha família. — Beijou-
os. — Cada centímetro de seu corpo é perfeito, Victoria.
Logan estendeu a mão e tocou-a em sua parte mais intima. Os dedos tatearam à
volta e, depois, se aprofundaram.
Victoria, sem poder falar, acomodou a cabeça no ombro dele e fechou os olhos.
Jamais tinha sentido algo como as sensações que lhe percorriam o corpo.
— Eu já disse como adoro seus cabelos vermelhos? Quando a vi pela primeira vez,
comparei-a a um passarinho de penas vermelhas.
Enquanto a voz profunda a envolvia, os dedos continuavam sua massagem mágica.
Victoria entregou-se às forças prementes que se avolumavam em seu âmago.
Intuía que algo extraordinário estava para acontecer e não tentou impedir a
movimentação dos quadris.
— Encontrei seu ninho, passarinho vermelho. É macio, sedoso e guarda alguma
coisa muito especial.
Ele acelerou a massagem dos dedos e Victoria arqueou o corpo.
— Isso mesmo, meu bem. Abra as asas e voe.
Ela beijou-lhe o ombro e imaginou se não estava perdendo a razão. Então e sem
aviso, uma convulsão a fez estremecer. Era como se, num momento, ela pairasse na
borda de um tormento excitante e, depois, entrasse no paraíso.
— Logan!
— Sim, meu amor. Deixe-se levar.
A voz dele tornou-se parte do esplendor em seu âmago.
Ela estremeceu outra vez, saboreando a chama derradeira que acabava de
percorrer-lhe o corpo.
Fascinada, Victoria mal percebeu que Logan mudava de posição e se acomodava
entre suas coxas.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Pensei que pudesse trazê-la até aqui e parar sem... — Fitou-a com expressão
torturada. — Imaginei prendê-la a mim, mas fui eu quem se tornou cativo, meu bem.
Não consigo me esquivar de amá-la.
Victoria olhou para as feições atormentadas de Logan e foi tomada por uma
sensação de inevitabilidade. Era como se esse momento estivesse destinado a
acontecer e nada que eles pudessem ter feito antes o teria interceptado.
Ela estendeu as mãos e o acariciou ao longo dos braços.
Com os olhos transbordando de amor, murmurou:
— Você já esperou demais, Logan.
— Ai, meu bem...
Logan penetrou-a com um impulso rápido que quase a fez perder o fôlego. Houve
dor, passageira e logo esquecida. Houve êxtase, ardente, vigoroso e meigo que os levou
à satisfação plena, graças à cadência dos impulsos profundos e firmes de Logan.
Mas não houve arrependimento...

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy

CAPÍTULO DEZESSEIS

Victoria não se deu conta do passar do tempo. Num momento, ela e Logan se
abraçavam e, no seguinte, já estavam vestidos e ao lado do carroção na clareira.
Logan olhou para o sol.
— Ainda dá tempo para chegar a Trinity Falls com a luz do dia.
A sensação de perda destroçava suas defesas frágeis. Confusa, ela observou
Logan. Depois de tê-la possuído intensamente, ele não pronunciara mais expressões de
carinho, nem mesmo um mísero “meu bem” para aliviar sua sensibilidade abalada.
Logan apenas a forçara a se vestir depressa, enquanto fazia o mesmo, a fim de se
porem logo a caminho. Victoria percebia uma raiva mal contida nele, mas não fazia
idéia do que a provocara. Ela havia concluído, pelo grito exultante dele, ao estremecer
sobre seu corpo, que o tinha agradado o suficiente.
Mas nesse momento, sem a fúria da paixão, Logan parecia um estranho. Aliás,
bem ranzinza.
— Victoria!
A voz enérgica a fez levantar a cabeça. Um estranho mau e ingrato!
— O quê?
— Daqui para a frente, é melhor você ir sentada no carroção.
Victoria ignorou o ar dele de quem não queria conversa e perguntou:
— Por quê?
Estava certa. A expressão de Logan tornou-se mais carregada ainda. Que pena!
Sem dúvida, este homem não só era um vilão digno de castigo, como também um
amante apagado. Bem, exceto no momento da relação, admitiu ela. Mas depois do ato,
ele não estava correspondendo a suas expectativas.
Victoria suspirou.
— Daqui a uns três quilômetros, esta trilha seguirá por um declive íngreme até a
estrada principal. Desse ponto em diante, os bois andarão mais depressa — explicou
ele.
Victoria queria ver para crer. Segundo suas observações, esses animais só
mantinham uma velocidade: Morosa.
Ao ajudá-la a subir no carroção, Logan parecia ter se esquecido das vezes em que
ela o fizera sozinha.
Victoria sabia o que a aguardava dentro em pouco. No espaço de um único dia, ela
violaria o ponto central de todos os seus princípios.
Já acomodado no banco, com o chicote numa das mãos e as rédeas na outra,
Logan disse:
— Segure-se, meu bem. Este primeiro trecho é muito acidentado.
Agora, quando já era tarde demais para amenizar seu ressentimento, ele usava a
expressão carinhosa com a maior naturalidade. Ela sentiu vontade de chorar, de

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
ranger os dentes e de bater na cabeça dele com um livro grosso. Tudo ao mesmo
tempo.
Partiram. Com o braço ao redor de sua cintura, Logan a puxou para junto de si.
Seguiram pelo caminho irregular durante meia hora. Então, pararam numa curva de
onde se via o vale abaixo. Enxergava-se perfeitamente uma confusão de barracas e
casas que pareciam ter brotado das touceiras de artemísia.
— Lá está ela — Logan anunciou.
Consternada, Victoria olhou para o conglomerado de edifícios de madeira e de
fileiras desordenadas de barracas sujas.
— Trinity Falls?!
— Não diga que está desapontada.
— É diferente do que eu esperava. Maior também disfarçou ela.
— Trinity Falls tem vinte e dois bares, quatro armazéns, um consultório médico,
um jornal, quatro hotéis, três igrejas, uma escola e um banco. Graças às recentes
descobertas de minas de ouro, a cidade atingiu um grau de grande progresso.
O orgulho óbvio de Logan pela comunidade recém-formada dava a impressão de
que ele era corretor de imóveis.
— Também tem uma cadeia?
— Claro — respondeu ele, com olhar sombrio.
— Logan, preciso lhe contar algo antes de seguirmos em frente.
— Sou todo ouvidos, Victoria.
Ele parecia estar preparado para escutar alguma coisa importante. Uma
possibilidade dolorosa ocorreu a Victoria. Logan acreditaria que, tendo ela se dado
inteiramente, ele poderia contar com sua simpatia e induzi-la a não entregá-lo às
autoridades? Seriam a paixão ardente, os beijos, as carícias um esforço por parte
dele para fazê-la esquecer seu dever? Fitou-o e desejou que as dúvidas não a
magoassem tanto.
— Logan, quando você estava conversando com Lobo da Noite, vi uma tropa da
cavalaria. Os soldados tinham parado para as montarias beberem água no riacho.
— É mesmo?
— Eu sei que deveria tê-los chamado.
Se o tivesse feito, Logan não a teria seduzido, refletiu ela.
— Por que você não os chamou?
— Tive medo do que eles pudessem fazer a você e não fui capaz de entregá-lo —
respondeu ela honestamente.
— Se sou um criminoso tão desprezível, você deveria ter feito isso.
— É claro. Mas há outra coisa que você precisa saber.
— O quê?
— Quando chegarmos a Trinity Falls, também não vou ter coragem para entregá-
lo ao delegado.
— Não mesmo?
— Portanto, se você me fez conhecer o amor com o intuito de me impedir...
As mãos de Logan, de repente, a agarraram pelos ombros. Uma expressão

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
amedrontadora contorcia-lhe as feições.
— Não me provoque, Victoria!
O brilho de raiva nos olhos dele a convenceu, como nada mais poderia, que Logan
não tivera motivos espúrios para possuí-Ia.
— Apenas me pareceu possível que um fugitivo da lei fizesse qualquer coisa para
não ser apanhado.
O olhar raivoso de Logan tornou-se mais contundente.
— Você sempre volta ao mesmo ponto, não é? — indagou ele.
— Ora, o fato de você ser um criminoso é um fator significante em suas ligações
com outras pessoas.
— Eu não sou!
A negativa, feita numa voz tensa e quase gutural, tocou Victoria profundamente.
— Essa é a idéia. Todas as grandes jornadas começam com um único passo.
— Com todos os diabos! Do que está falando?
— Reflita, Logan. Você foi deixado naquela cela para morrer. Lobo da Noite
contou que os índios queimaram o forte completamente. Isso quer dizer que o exército
e todo mundo pensam que Logan Youngblood morreu. Você pode recomeçar sua vida
com um novo nome e ir morar em outro lugar.
As mãos de Logan afrouxaram em seus ombros. Além da raiva, incredulidade e
frustração estampavam-se no semblante dele.
— Então, vai me deixar escapar?
— Acredito em você, Logan. Sei que, se tentar e for perseverante, vai se
reabilitar. Entretanto, precisa se lembrar de que não poderá ceder à tentação. Esse
seu amor pelo ouro não é um mal, desde que você esteja disposto a trabalhar para
ganhá-lo.
Logan perdeu o olhar na distância e, depois, voltou a fitá-la.
— Isso quer dizer adeus?
— Lamento muito, mas é. — Ela piscou, na tentativa de impedir um dilúvio de
lágrimas inúteis. — Vou sempre me lembrar de você com muito afeto, Logan.
— E se eu lhe disser que este não é um adeus, pois sou um cidadão respeitador da
lei, que mora em Trinity Falls há quase seis anos, e dono do Banco Territorial? A
Câmara de Vereadores me designou prefeito quando...
— Pare! Se pretende começar uma nova vida, deve aprender a dizer a verdade —
interrompeu Victoria, incapaz de continuar ouvindo as mentiras deslavadas de Logan.
— Maldição!
— E praguejar não vai ajudá-lo a se associar com pessoas respeitáveis.
— Ora, minha incrédula São Tomé, você não me deixa escolha, a não ser deixá-la
descobrir a verdade da maneira mais difícil. Sabe, as primeiras impressões enganam.
As palavras tocaram seu coração. Contudo, Victoria sabia que as alegações
exageradas sobre quem ele era certamente não mereciam crédito. Pessoas como Logan
mentiam para se auto-afirmar.
— De fato, as aparências iludem — começou ela, achando que a própria
experiência poderia ajudá-lo, embora relutasse em revelá-la. — Você me perguntou,

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
uma vez, por que vim para o oeste. Bem, como você, também fui forçada a encarar um
novo começo de vida.
— O que aconteceu?
— Fui apanhada numa situação comprometedora.
— De que tipo? — indagou ele, desconfiado.
— Um incidente inofensivo e inocente que poderia ter sido explicado se alguém
estivesse disposto a descobrir a verdade. Por isso, sei avaliar como é desastroso
quando nos julgam mal. Todavia, uma pessoa não pode usar essa circunstância
desagradável para justificar erros futuros.
— Você tem explicação para tudo, não é?
— Infelizmente, não. Lamento não termos usado o tempo de maneira mais
proveitosa, Logan. Grande parte da culpa foi minha. Desperdiçamos tantos dias sem
conversar, quando poderíamos tê-los usado com um propósito melhor.
Um brilho passageiro iluminou o olhar dele. Levantou a mão e roçou a ponta dos
dedos em sua face. Em seguida, entregou-lhe as rédeas e pulou para o chão.
Atônita, Victoria perguntou:
— O que está fazendo?
— Indo embora.
— Mas... mas...
— Mas o quê? Você disse que ia me liberar. Mudou de idéia?
Ela sentiu um aperto no coração. Logan ia mesmo embora.
— Talvez seja melhor assim. Mas como você vai sobreviver aqui? — indagou,
preocupada.
— Darei um jeito — respondeu ele e virou-se.
— Espere! Não vá ainda. Tenho uma coisa para você.
Victoria largou as rédeas e entrou na parte de trás do carroção. À procura de
algo que podia dar-lhe a fim de ajudá-lo a começar a nova vida, ela afastou vários itens
até tocar uma bolsinha, escondida num canto.
Meio ofegante, voltou para fora. Com expressão impaciente, Logan continuava
parado no mesmo lugar. A maneira indiferente de ele aceitar a separação de ambos a
magoava. Sua angústia crescente diminuiria se ele mostrasse um leve sinal de tristeza.
Reprimindo a vontade de censurá-lo, desceu do carroção e estendeu a mão.
— Olhe, pegue isto.
Logan olhou para a bolsinha com curiosidade.
— Do que se trata?
— São umas moedas de ouro para ajudá-lo no início da nova vida.
— Imagine! Fiquei aqui esperando que você me oferecesse um livro como presente
de despedida.
— Ah, não seria prático.
— Você deve ter a Bíblia entre sua coleção de livros. Em seu empenho para me
regenerar, você deveria dá-Ia para mim.
— Pensei nisso, porém, ela é grande e pesada demais para você carregá-la em
suas viagens. O dinheiro vai ser mais útil.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Logan cruzou os braços.
— Não quero suas malditas moedas.
Um ladrão que não queria ouro? Ela gostaria de interpretar a atitude de Logan
como sinal de que ele estava realmente disposto a virar uma nova página. Mas, na
verdade, acreditava que ele era orgulhoso demais para aceitar dinheiro de uma
mulher.
— Não considere isto como um gesto de caridade, mas como um empréstimo até
você poder me pagar.
— Pelo futuro previsto por você, as chances de nos encontrarmos são nulas.
Victoria sentiu um nó na garganta.
— Você poderá me mandar o dinheiro pelo correio.
— Pretende morar em Trinity Falls?
— Não sei — confessou ela baixinho. — Não tenho certeza de poder honrar o
contrato com o sr. Pritchert.
— Com todos os diabos, do que está falando?
— Bem, depois do que fizemos... — Incapaz de fitar Logan, ela baixou o olhar. —
Não sou mais, exatamente, a mesma pessoa que o sr. Pritchert contratou para ensinar
a tutelada de seu patrão. Uma das razões para ele aceitar meus serviços foi, sem
dúvida, o fato de conhecer meu pai e a reputação de minha família. Ele preferiu
ignorar um boato infeliz a meu respeito porque achou que eu seria uma influência
benéfica na menina de quem eu deveria cuidar. Não sou mais merecedora da confiança
dele e, em sã consciência, devo informá-lo do fato.
— Não seja boba, Victoria! Não conte a ninguém o que aconteceu nas piscinas de
água quente.
— Mas naturalmente...
— Estou falando sério. Se fizer isso, arranjará uma grande dor de cabeça para si
mesma. Você é a mesma mulher que era antes de eu perder o controle e de levar as
coisas mais longe do que tinha o direito ou a intenção de fazer.
— Fui eu quem permitiu tal liberdade. Tenho de assumir a responsabilidade de
meus atos. — Olhou para a bolsinha que Logan não queria aceitar. — Por favor, pegue
isto.
— Com uma condição.
— Qual é?
— Prometa que não contará a ninguém o que aconteceu entre nós nestas duas
últimas semanas.
O aperto no coração de Victoria aumentou.
— Entendo. Você tem medo que eu mencione seu nome e as autoridades
descubram que você não morreu no forte.
— Meu bem, a esta altura, não tenho uma maldita razão para continuar
conversando com você — disse ele, exasperado, ao arrancar a bolsinha de sua mão. —
Apenas prometa não revelar seu sentimento de culpa a ninguém por enquanto.
— Eu planejava ser discreta e só falar sobre o assunto com o sr. Pritchert.
Logan quase encostou o rosto barbudo no seu.

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— Você não vai contar a Mar... ao sr. Pritchert coisa alguma sobre nós. Entendeu?
— Seu tom não me assusta, Logan. Além do mais, que diferença fará para você, se
vai estar a quilômetros de distância? Já disse que não vou mencionar seu nome.
— Victoria, quero já sua promessa.
Ela o encarou com olhar fuzilante. Onde ele fora arranjar essa idéia errada de
que tinha autoridade sobre sua maneira de conduzir a própria vida? A relação deles
era passageira e destinada, pelas circunstâncias, a terminar tão logo ela subisse no
carroção e partisse.
Todavia, a questão parecia ser de grande importância para ele. Seria essa
exigência de silêncio uma tentativa de Logan para proteger seu futuro, da mesma
forma que ela se esforçava para fazer com o dele? A possibilidade anulou sua raiva.
— Está bem, Logan. Não vou contar nada ao sr. Pritchert.
— Não vá mudar de idéia.
Victoria recuou. Tinha de se despedir. Não conseguia encontrar mais razões para
detê-lo. Havia lhe dado bons conselhos, oitenta dólares em moedas de ouro e a
promessa de manter em segredo o relacionamento de ambos.
— Adeus, Victoria — disse Logan e virou-se.
Num impulso, ela o segurou pelo braço.
— Não vá ainda. Tenho uma outra coisa para lhe dar.
Se ela já não o conhecesse bem, pensaria ter visto um laivo de ternura no olhar
de Logan.
— Não preciso de mais dinheiro — afirmou ele.
— Não se trata disso. Espere aqui. Volto já, já.
Victoria tornou a entrar no carroção e procurou, entre os livros, um volume fino e
encadernado a couro. Quando o encontrou, voltou depressa para fora.
— Para você, Logan — disse ela, oferecendo o livro. Sem os escrúpulos
demonstrados em relação às moedas, ele aceitou o presente.
— O que é?
— Uma coletânea de poesias de Keats. É muito especial.
Mais uma vez, ela pensou ver ternura no olhar de Logan.
— Vou guardá-lo com muito apreço.
— Quando você o ler, espero que se lembre de mim — murmurou ela com voz
embargada.
— Maldição!
A imprecação a surpreendeu.
— Você não quer se lembrar de mim?
— Por nada deste mundo, meu bem, jamais a esquecerei. Você está se afligindo
por nada. Esta não é uma despedida final — garantiu ele.
— Mas tem de ser. Seria muito perigoso você aparecer em Trinity Falls. As
pessoas de lá devem conhecê-lo. Se os militares descobrirem que você continua vivo, o
matarão.
Logan a fitou bem dentro dos olhos.
— Teimosa!

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— O quê?
— Você pode chamar isso de firmeza de caráter ou determinação, meu bem. Mas
você é a criatura mais teimosa que já conheci.
— Com o que isso tem a ver?
— Com tudo. — Ele enfiou o livro dentro da camisa.
— Até mais ver, Victoria.
Ela não podia retê-lo pela terceira vez. Mas também não conseguiria vê-lo sair de
sua vida para sempre sem lhe revelar os sentimentos profundos. Apesar das
afirmações de Logan ao contrário, sabia que não o veria mais.
— Eu te amo, Logan Youngblood.
Ao ouvir a declaração murmurada, ele já estava de costas. Parou e virou-se
devagar. A expressão dele revelava um misto de otimismo e desconfiança.
— Prometa se lembrar dessas palavras quando me encontrar na próxima vez.
Victoria recusou-se a chorar; mas as emoções tumultuadas a impediram de falar.
Apenas assentiu com um gesto de cabeça.
Logan virou-se outra vez e saiu de sua vida. Instintivamente, ela começou a segui-
lo, porém, parou.
Estava tudo terminado.

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CAPÍTULO DEZESSETE

Victoria inspecionou a imagem no espelho do quarto do hotel. Viu uma moça de


expressão séria, com a pele bronzeada de sol, usando uma jaqueta xadrez, blusa
branca e saia cinza. Tinha a impressão de estar olhando para uma estranha. Seria essa
moça, aparentemente tranqüila, realmente ela?
Havia prendido os cabelos num coque elegante na nuca e colocado um chapeuzinho
de palha preta. O broche de camafeu, preso entre os babados do decote, amenizava
um pouco a simplicidade da toalete. Não queria exibir uma aparência severa demais na
entrevista com o novo patrão.
Tentou respirar fundo a fim de se acalmar, mas o espartilho a impediu. Depois de
meses viajando pelas estradas para o oeste, achava difícil acostumar-se de novo com
essa peça rígida do vestuário. Mas também não era natural ver-se rodeada por
paredes em vez de pinheiros esguios, ou ter um teto de estuque branco sobre a
cabeça e não o céu azul.
Victoria afastou-se do espelho. A suíte do hotel, providenciada por Martin
Pritchert, era tão elegante quanto qualquer sala de visitas de Boston. Sem dúvida, o
Prairie Rose Hotel era um estabelecimento de qualidade superior. Os tapetes persas,
as cortinas de veludo e o estofamento macio de poltronas e sofás atestavam isso.
Olhou para a cama confortável. Deitar-se num colchão macio e entre lençóis bem
esticados tinha lhe parecido o máximo do luxo. Não se lembrava de quando havia
apreciado mais uma noite de sono. Exceto ao acomodar-se no chão duro, mas entre os
braços de Logan Youngblood.
A lembrança a entristeceu. Tentou abafar a sensação de perda evocada ao
pensar na separação abrupta de ambos. Tinha sido melhor assim. Não havia
perspectiva alguma de um futuro comum para ela e um homem como Logan. Eles eram
tão diferentes quanto o fogo e o gelo.
Não tinha ilusões sobre qual dos dois era a fonte de chamas e quem se reduzira a
uma indecorosa poça durante a poderosa luta que os empolgara. Logan tinha derretido
até o último vestígio de sua inocência congelada.
O relógio no consolo tocou. Victoria sobressaltou-se. Martin Pritchert deveria
chegar a qualquer momento para levá-la ao escritório do patrão. Refletiu como, caso os
dois soubessem do que lhe acontecera na trilha da floresta, eles não mais a
considerariam digna para educar Madison.
Cumprindo a promessa feita a Logan, ela não havia contado nada ao sr. Pritchert.
Teria sido muito humilhante tocar em tal assunto com o homem simpático e sua
esposa, durante o jantar da véspera, no restaurante do hotel. Todavia, ela se sentira
uma farsante. Depois de seu comportamento leviano com Logan, ela não tinha mais o
direito de conviver com pessoas virtuosas.
Sentia-se desesperançada, pois a saudade de Logan era imensa. Tinha a sensação

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
de que parte de seu ser fora arrancada, ao vê-lo desaparecer entre as árvores. Talvez
tivesse cometido um grande erro. Deveria ter seguido Logan até os confins da terra e
enfrentado uma vida de incertezas e privações, em vez de perder o homem a quem
amava.
Racionalmente, sabia ter feito a escolha certa, mas seu coração era uma concha
vazia. Se pudesse voltar atrás e mudar o passado, ela o faria. Mesmo se não obtivesse
felicidade duradoura, pelo menos, passaria mais tempo ao lado de Logan.
Bateram na porta e Victoria a abriu imediatamente.
Martin Pritchert, num terno azul-marinho, a cumprimentou, sorridente. A
cabeleira farta e grisalha e as suíças estavam muito bem penteadas. Os olhos azuis do
homem brilhavam com vitalidade e bom humor.
— Muito bem, srta. Amory, vejo que está pronta para nosso compromisso.
— Estou, sim.
— Então, vamos. Meu patrão não gosta de esperar.
Victoria apanhou a bolsa e perguntou:
— Preciso de um casaco?
— Não. Está um dia agradável e sem vento. As ruas estão secas.
Com Pritchert segurando-lhe o braço, saíram para o corredor.
— Chove muito aqui? — ela quis saber.
— Não tanto quanto nas montanhas. Como foi seu café da manhã?
— Um banquete. Foi muito atencioso de sua parte dar ordens para que o
trouxessem a meu quarto. Eu não me importaria de tomar o café na sala de jantar do
hotel — Victoria afirmou, quando alcançavam a escada circular.
— Trinity Falls é uma cidade cheia de mineradores. Não seria conveniente andar
por aí desacompanhada, srta. Amory. Homens rudes e desregrados vagam pelas ruas.
Ela acabava de passar duas semanas na companhia de seu próprio homem rude e
desregrado, refletiu Victoria. Como gostaria de ouvir-lhe a voz e sentir, novamente,
seus braços ao redor dela.
— Sem dúvida, uma mulher pode comer no hotel sem ser incomodada — disse ela,
tentando tirar Logan do pensamento.
— Uma mulher sozinha, especialmente tão adorável como a senhorita, deve
sempre andar acompanhada. Lembre-se de que não está mais em Boston.
Ao deixarem o hotel e passarem para a calçada de madeira, Victoria
compreendeu a recomendação do sr. Pritchert. De fato, não era Boston. Uma rua
larga, de terra e esburacada, cortava o centro da cidade. Por ela, transitavam
carroções, charretes e dezenas de homens a cavalo. A passagem de todos levantava
uma nuvem de poeira.
Centenas de pedestres enchiam as calçadas. Quase todos, homens. Uns poucos
vestiam-se com elegância, mas a maioria usava calça folgada e camisa xadrez. Eles
entravam ou saíam de bares, cumprimentavam-se aos gritos, riam, praguejam e até
cantavam. As poucas mulheres contavam com a companhia de um homem.
A impressão mais marcante do lugar era o barulho exagerado. Para Victoria, a
dissonância dos ruídos mais variados soava mais agressiva aos ouvidos, depois das duas

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semanas de silêncio quase absoluto da floresta.
Ouviu-se o estampido de dois tiros. Victoria sobressaltou-se.
— Não se assuste, srta. Amory. Tiros, nesta cidade, raramente significam
problema sério. Geralmente, trata-se de uma discussão sem importância numa mesa de
jogo.
— É sempre assim? — ela perguntou.
— Hoje a cidade está mais agitada do que normalmente. Ontem, chegaram vários
carroções de suprimentos e a notícia da descoberta de uma nova mina de ouro —
explicou Pritchert para, em seguida, segurar-lhe o braço com firmeza. — O Banco
Territorial fica do outro lado da rua. Quando eu disser “vá”, atravesse correndo e não
pare até alcançar a calçada em frente.
— Está bem — concordou Victoria, à espera de um intervalo no tráfego quase
interminável.
— Reconheço, srta. Amory, estar muito impressionado com sua viagem, sem
incidentes, pelas montanhas. Felizmente, chegou bem aqui.
Como não poderia ter enfrentado a aventura sem o auxilio de Logan, ela sentiu-se
culpada por aceitar o elogio.
— Foi muita sorte o senhor estar na entrada da cidade ontem ao entardecer.
Se ela não houvesse encontrado o homem, teria enfrentado um desafio para
procurá-lo pela cidade. Durante a última etapa da viagem, não havia cruzado com
ninguém. Apenas um cavaleiro passara por ela a galope. Algo na postura dele a tinha
lembrado Logan. Isso provava como ele estava infiltrado em seus pensamentos.
Durante o jantar da véspera, Victoria tivera a impressão de ouvir o timbre da voz
de Logan. Três vezes, ao ver homens de ombros largos e cabelos escuros, ela havia se
virado para olhá-los no rosto, na esperança de ver o semblante querido de Logan.
Mulher tola, refletiu ela. Mesmo assim, não conseguia deixar de observar os
homens em volta, à procura de Logan Youngblood.
— Agora. Vá!
Victoria viu-se atravessando a rua na mais desabalada corrida.
— Oa! — gritou um cavaleiro ao puxar as rédeas da montaria, que levantou as
patas dianteiras no ar.
Victoria olhou por sobre o ombro. O homem já controlava o cavalo, mas um
carroção, puxado por mulas, vinha em sua direção e do sr. Pritchert. Ela deu um salto
para a frente, uma verdadeira proeza, considerando-se o espartilho apertado.
Ofegantes, os dois alcançaram a calçada do outro lado.
— Misericórdia! Isso acontece todas as vezes em que se quer atravessar a rua?
Por Deus, o carroção quase nos atropelou!
— Escapamos por uma questão de segundos — afirmou Pritchert, rindo.
Victoria sorriu da boa disposição do homem.
— Foi por ser uma corredora veloz que o senhor me contratou? — gracejou ela.
Antes de Pritchert responder, um homem, sem querer, chocou-se contra
Victoria. Embora não fosse com muita força, ela cambaleou. No instante seguinte,
duas mãos enormes, sobre seus braços, a fizeram readquirir o equilíbrio.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Desculpe, senhorita, eu não a vi.
Victoria endireitou o chapéu, que havia caído sobre seus olhos, e viu um enorme
homem grisalho a sua frente.
Alguém mais, apressado, esbarrou no outro ombro de Victoria. Aturdida, ela
olhou em volta.
— Veja por onde passa! — gritou o gigante a seu lado, antes de lhe perguntar: —
A senhorita está bem?
— Estou, sim
— Olhem, abram espaço! — soou a voz retumbante desse Golias.
Como num passe de mágica, as pessoas se afastaram.
Sorrindo para o homem, Victoria agradeceu:
— Obrigada, senhor.
— Maldição! Ai, desculpe minha linguagem, senhorita, mas ninguém me chama de
senhor. Meu nome é Newt Timothy White.
— Não se preocupe, Newt, não me aconteceu nada. Como pode ver, estou muito
bem.
— Fico contente e tenho muito prazer em conhecê-la. — Dirigiu um olhar
fulminante a Pritchert. — O senhor precisa cuidar melhor desta jovem.
— Com as calçadas tão cheias hoje, essa é uma tarefa difícil.
— Tem razão. Aonde vão indo? — indagou Newt.
— A srta. Amory e eu estamos a caminho do Banco Territorial.
— Se não se importam, eu os acompanho para protegê-la contra novos esbarrões.
— Obrigada, Newt — agradeceu ela, surpresa com tanta amabilidade.
O gigante sorriu e Victoria viu-se caminhando entre dois cavalheiros. Poucos
passos adiante, tiveram de parar.
— Quem é sua amiga, Newt?
O homem baixinho e de pernas arqueadas acabava de sair de um bar, rodeado por
vários companheiros. Todos a olharam com admiração.
— Esta é a srta. Amory. Eu a estou acompanhando até o banco para garantir sua
segurança no caminho.
— Ora, sua srta. Amory é muito bonita.
— Uma verdadeira dama.
— O que ela está fazendo em Trinity Falls?
Newt exibiu um largo sorriso.
— Não sei. Sem dúvida, ela é uma mulher refinada.
Nenhuma das observações lisonjeiras tinha sido dirigida diretamente a ela. E
Victoria teve a sensação curiosa de estar sendo admirada como se fosse uma estátua.
— Vamos acompanhá-los, Newt. Precaução e caldo de galinha não fazem mal a
ninguém — o homem baixinho afirmou.
— Aceita, srta. Amory? — o gigante indagou.
Meio aturdida, Victoria assentiu com um gesto de cabeça. Depois, olhou para o sr.
Pritchert. Ele não demonstrava surpresa alguma com a virada dos acontecimentos.
Continuaram andando, mas logo, um novo grupo de homens os forçou a parar outra

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
vez. Como antes, a apresentação resumiu-se ao fato de tratar-se da srta. Amory a
caminho do banco. Ao chegar lá, o grupo tinha mais de trinta pessoas. Enquanto
Victoria e o sr. Pritchert entravam no banco, um coro, de vozes masculinas, gritava
palavras de despedida e de agradecimento pela honra de acompanhá-la.
Estupefata, Victoria quis saber o motivo de tanta comoção.
— Não há muitas moças bonitas em Trinity Falls. Até os homens se acostumarem
com sua presença na cidade, a senhorita atrairá um bom número deles. A maioria é de
homens decentes que lamenta a ausência de mais mulheres refinadas — explicou
Pritchert.
Victoria pensou em seu envolvimento com Logan e se sentiu uma impostora.
— Acho que vou levar algum tempo para me acostumar com isto.
Era um tanto intimidador pensar em si mesma como um tipo de beleza. Crescera
ao lado da lindíssima irmã mais nova e não mantinha ilusões quanto à aparência pouco
digna de nota. Havia a questão dos cabelos vermelhos e das sardas.
Em Boston, eles não eram considerados atributos.
— Bem, venha comigo — disse Pritchert.
Victoria o acompanhou até uma porta de carvalho com letras douradas.
Entretanto, não pôde lê-Ias, pois os ombros do homem bloqueavam sua visão.
Ele bateu duas vezes e, então abriu a porta.
— Entre. Seu patrão a está esperando.
Antes de Victoria poder agradecer-lhe a gentileza de trazê-la até ali, ele recuou
e fechou a porta.
Apanhada de surpresa por essa partida súbita, ela correu os olhos pelo aposento,
aparentemente, vazio. Deu-se conta de que o sr. Pritchert não tinha lhe fornecido o
nome do patrão e nem a apresentado a ele. Por causa disso, a entrevista ia ter um
início embaraçoso.
A sala era mobiliada com a mesma elegância de sua suíte no hotel. A peça de
maior destaque era uma escrivaninha grande, em frente da qual havia duas cadeiras de
madeira entalhada. Atrás, ficava outra maior, de encosto alto, estofada e coberta de
brocado verde-escuro. No momento, ela estava virada para uma estante atrás da
escrivaninha. Havia ainda vários lampiões de bronze, mesinhas e um tapete persa. O
escritório transpirava dinheiro e refinamento. No ar, pairava um leve cheiro de
charuto.
Victoria deu uns passos para a frente. A cadeira de brocado verde virou-se de
repente, sobressaltando-a. Um homem, impecavelmente vestido, de ombros largos e de
uns trinta anos, ocupava quase todo seu espaço. Os cabelos escuros estavam bem
aparados e o rosto, barbeado. Os olhos, de expressão inteligente e observadora, a
fitavam de maneira desconcertante.
Tratava-se do homem mais atraente que ela já vira. A fenda no queixo bem feito
aumentava a vitalidade viril irradiada por ele.
Victoria considerou sua opinião deprimente. Apenas vinte e quatro horas atrás,
havia se entregado a um homem que lhe satisfizera plenamente os sentidos,
convencendo-a a nunca mais querer olhar para outro membro do sexo masculino.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Que caráter deplorável o seu!
Ciente de que o silêncio já se prolongava demais, Victoria forçou-se a sorrir.
Como o patrão requisitara essa entrevista, ele deveria ser o primeiro a falar.
— Não tem nada para dizer? — a indagou ele, ao levantar-se. A voz sonora a
assustou. Sem dúvida, a mente lhe pregava uma peça. Este homem surpreendente
parecia-se muito com Logan. Numa tentativa de se controlar, Victoria estendeu a mão
enluvada para o patrão.
— Muito prazer, senhor. Sou Victoria Amory e estou contente por, finalmente,
conhecê-lo.
Uma expressão de incredulidade assomou no semblante do homem. Teria ele
confundido a agenda e estado à espera de outra pessoa?
— Victoria.
Por alguma razão, a maneira de ele pronunciar seu nome provocou-lhe um arrepio.
Mais uma vez, a voz dele lembrava a de Logan.
— Isso mesmo — ela confirmou.
Como se esperasse que ela dissesse ou fizesse algo significativo, o homem
continuou a fitá-la. Victoria sentia-se perdida e não sabia como agir.
Passou-se mais um minuto de silêncio intolerável. Como sua mão continuasse
estendida, ela imaginou se o gesto não tinha sido petulante demais. Foi nesse momento
crítico que a memória escolheu para encher-lhe a mente com a imagem do corpo, nu e
magnífico, de Logan apossando-se do seu.
Pelo calor nas orelhas, percebeu estar enrubescendo.
Já ia baixar a mão quando, de repente, o patrão a tomou na dele. Uma corrente
de energia penetrou pelo tecido da luva e, com rapidez alarmante, percorreu seu corpo
até atingir os lugares mais vulneráveis.
Instintivamente, ela tentou livrar a mão do aperto constrangedor. Algo familiar
na expressão do homem a desorientava.
— Por favor, sente-se, srta. Amory.
Como as pernas mal a sustentassem, ela aceitou a sugestão.
— Bem, como o senhor pode ver, cheguei finalmente.
Num movimento ágil, o homem bem vestido voltou a sentar-se na cadeira atrás da
escrivaninha.
— Imagino como sua viagem para o oeste foi difícil.
A voz continuava a lembrá-la da de Logan. Quando sua mente o esqueceria?
— Grande parte foi tranqüila — disse ela.
— Segundo meu assistente, o sr. Pritchert, a senhorita foi forçada a separar-se
do comboio de carroções e terminar a viagem sozinha.
— É verdade.
— Através de território de índios hostis?
— Felizmente, não encontrei nenhum.
Ele inclinou-se para a frente.
— Desculpe, srta. Amory, mas acho difícil acreditar que uma mulher, sozinha,
pudesse dirigir uma junta de bois, desde o Forte Brockton até Trinity Falls, e durante

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
um levante indígena, sem se deparar com algum tipo de hostilidade.
— Vim pelas montanhas.
— Não diga!
— Foi a única maneira para se evitar problemas.
— Parabéns pelo seu ótimo senso de direção, srta. Amory.
— Obrigada. Tive muita sorte.
— Também acho.
Victoria mal podia abafar o sentimento de culpa.
Novamente fez-se um silêncio incômodo. Ela estava confusa. Algo lhe dizia para
tomar cuidado com o homem do outro lado da escrivaninha. Ele lhe dava a impressão de
suspeitar de suas palavras. Por outro lado, exercia-lhe uma forte atração.
— Estou ansiosa para conhecer Madison. O sr. Pritchert me contou que ela é uma
menina inteligente e de grande vivacidade.
— Madison é muito especial. Por essa razão, pretendo ser bem exigente com sua
professora.
Um sinal de alarme soou na mente de Victoria.
— O que o senhor quer dizer com exigente?
— Fiz especificações claras ao sr. Pritchert. Quero que Madison seja educada
por uma mulher de estirpe. Ela deve gozar de uma reputação intocável e dar exemplo
marcante de integridade moral para minha tutelada. Naturalmente, também precisa
ser inteligente e capaz de ajudar Madison a vencer as conseqüências de sua infância
desastrosa.
A confusão de Victoria aumentou. Se o patrão descobrisse que ela havia perdido
a virgindade com um criminoso da laia de Youngblood, ele a expulsaria dali
imediatamente.
— Tenho ainda outras exigências. A senhorita usa óculos? — indagou ele na voz
sonora, acabando com quase o resto do controle de Victoria.
— Como?
— Preste atenção. Meu tempo é muito valioso e eu não gosto de repetir as
palavras.
Ela corou outra vez. Ressentia-se da arrogância dele. Imaginava quanto tempo
esse homem sobreviveria, por conta própria, na trilha das montanhas como Logan tinha
feito.
— Não uso óculos, senhor — respondeu ela de cabeça erguida.
— Então, considera sua visão boa?
— Sim.
— E quanto a sua memória? É capaz de lembrar-se de fatos e datas históricos
significativos?
— Claro!
— Em que ano começou a Conquista Normanda?
Ela estranhou a pergunta irrelevante.
— Muitas pessoas pensam ser 1066, mas acredito que 1055 é uma data mais
precisa.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— E em que ano Lincoln tornou-se presidente?
— 1861.
Aos poucos, Victoria chegou à conclusão alarmante de que havia algo errado com
esse homem. Estaria ele de posse das faculdades mentais? Talvez esse estado fosse
recente e não do conhecimento do sr. Pritchert.
— Muito bem, srta. Amory — disse ele com expressão insatisfeita.
Quando ele se levantou, Victoria também o fez. Não tinha a intenção de lidar com
um louco em pé, não importava o quanto ele fosse viril e atraente.
— Fico contente ao saber que tanto sua visão quanto sua memória estão em boas
condições.
Victoria forçou um sorriso e começou a recuar, de costas, para a porta. Sua
situação era precária. Não podia trabalhar para esse lunático e tinha dado todo seu
dinheiro para Logan. Como arranjaria o suficiente para voltar para Boston?
Mesmo se conseguisse, o reencontro com o pai não seria nada agradável. Meio
desesperada, imaginou se não encontraria outro trabalho em Trinity Falls. Quem sabe
Newt, o minerador gigante, não precisaria de uma aprendiz?
— Aonde vai, srta. Amory? Nossa entrevista não terminou.
Encostada na porta, ela agarrou a maçaneta.
— Não estou me sentindo bem, senhor. Acho que um pouco de ar fresco...
Ele aproximou-se.
— Você não vai a lugar algum, Victoria.
Antes de ela poder abrir a porta, duas mãos seguraram seus braços. Apanhada de
surpresa pelo ataque repentino, ela levou uns segundos para pensar em gritar por
socorro. Ao abrir a boca para fazê-la, recebeu o beijo ardente e possessivo do patrão.
Seguiram-se momentos de resistência e pânico. Então, algo estranho aconteceu.
Devagar, seu corpo submeteu-se ao abraço do homem. A rendição começara em sua
mente e nos sentidos agitados. Ela sentia o gosto e o odor de Logan.
Aturdida com a confusão, Victoria mantinha os olhos abertos. A língua que
invadira sua boca acariciava seu interior, enquanto mãos, firmadas em suas nádegas, a
empurravam de encontro ao corpo excitado do homem. O sabor dele era estimulante e
convidativo.
Trêmula, ela o fitou. No brilho sensual dos olhos pretos, Victoria descobriu a
verdade incontestável.
Logan Youngblood a abraçava e beijava.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy

CAPÍTULO DEZOITO

Por um instante, Victoria pensou ter sido ela quem enlouquecera. Como este
homem, elegante e atraente, podia ser Logan? O seu amante indômito e fora-da-lei
usando um terno?
O beijo continuou, íntimo e sensual. Por uns momentos, estar entre os braços de
Logan e sentir-lhe a língua acariciando a sua era suficiente.
Aos poucos, porém, por mais que Victoria tentasse resistir, as dúvidas
começaram a dominá-La. O que Logan fazia ali? Por que estava no escritório de seu
patrão, convenientemente localizado num banco?
Com esforço, Victoria afastou a boca.
— Logan, você não deveria estar aqui.
Ele traçou uma linha de beijos ao longo de seu pescoço.
— Por que não?
A naturalidade dele a exasperou.
— Pode me dizer o que está fazendo aqui?
— Beijando-a — respondeu ele, rindo.
— Logan, esta situação não tem graça nenhuma. Foi uma grande tolice sua se
arriscar tanto para me ver afirmou ela, embora não soubesse se ele estava ali por sua
causa ou do dinheiro guardado no cofre. — O que fez com meu patrão? Como chegou à
cidade antes de mim? Roupas de quem você está usando?
Uma idéia horrível a assaltou. E se o patrão, vestindo apenas ceroulas, estivesse
amarrado e amordaçado em algum canto? Nesse caso, a qualquer momento, os
funcionários do banco poderiam invadir a sala, aos gritos, e acompanhados da polícia.
— Victoria, relaxe. Você está tão branca quanto um fantasma.
Pelo sorriso meigo de Logan, tornava-se óbvio que ele não levava a sério a
precariedade da situação.
— Meu bem, acalme-se. Não há com o que se preocupar. Tudo está sob controle
— insistiu ele.
— Logan, nada está sob controle. Você tem de escapar antes de alguém encontrá-
lo aqui. E por favor, me diga onde está meu patrão. Você não lhe fez mal algum além de
roubar suas roupas, não é?
O semblante de Logan tornou-se sombrio e Victoria imaginou o pior. Sem dúvida,
ele não tinha matado o homem. Recusava-se a acreditar ter se apaixonado por um
assassino.
Ele a sacudiu pelos ombros.
— Victoria, juro que, se você me acusar de mais um crime, a ponho de bruços
sobre os joelhos e lhe dou umas boas palmadas.
— Você não me assusta com ameaças de castigos físicos. Ao oposto de meu
patrão, que deve ser velho e fraco, sou capaz de me defender.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Com todos os diabos!
— Não é que você não fique bem de terno, Logan. Ora, com seus cabelos aparados
e sem a barba, eu quase não o reconheci.
— Quase?! Moça, nós fizemos amor ontem e hoje você já não sabia quem eu era!
Victoria enrubesceu. Logan tinha razão para estar bravo. Seu senso de
observação provara ser bem falho. Mas em sua defesa, havia o fato de nunca ter visto,
claramente, o rosto dele. Nos primeiros dias, as feições estavam muito desfiguradas
pelos ferimentos. Depois, o semblante dele ficara obscurecido pela barba e bigode
pretos e fartos.
— Sinto muito, mas você era o último homem que eu esperava encontrar aqui. Fica
muito elegante assim, bem vestido e limpo.
O ar severo dele abrandou-se um pouco.
— Você também.
O coração de Victoria acelerou as batidas.
— Estou muito contente por vê-lo, mas você se arriscou demais ao vir aqui.
— Victoria, se você me ouvir com atenção, verá que tudo está bem.
Ela queria muito acreditar. Talvez ele tivesse usado as moedas de ouro para
comprar a roupa.
— Como você chegou à cidade tão depressa? — ela quis saber.
— Pedi um cavalo emprestado.
Não teria roubado?, indagou-se ela.
— Sei. Por acaso era o cavaleiro que passou por mim ao entardecer?
— Era, sim.
— Não parou porque...
— Eu queria chegar a Trinity Falls antes de você. Fui eu quem mandou Martin
Pritchert encontrá-la. Queria que ele garantisse sua segurança e conforto.
— Mas como sabia onde encontrá-lo? Trinity Falls é uma cidade grande.
— Meu bem, sei onde Martin mora porque ele trabalha para mim. Falei a verdade
ao afirmar ter sido, injustamente, preso naquela cela para morrer. Levei, de fato, o
aviso sobre o ataque indígena ao forte. Sou o proprietário e presidente deste banco, o
prefeito temporário de Trinity Falls e seu patrão.
A atitude convincente de Logan fez Victoria pensar, pela primeira vez desde que
se conheciam, se não havia tirado conclusões erradas sobre ele.
— Quando eu o aconselhei a iniciar uma nova vida... — Respirou fundo. — Você já
tinha uma?
— Sim. Como vê, meu bem, está tudo certo.
Tudo certo? Como assim? De jeito nenhum! Victoria viu-se sacudida por uma fúria
imensa. Ela havia sido iludida e passado por boba. Durante todo o tempo da convivência
de ambos, enquanto tentava reformá-lo e se apaixonava por ele, Logan ria a suas
costas.
A verdade pura e simples era o fato de ela ter sido uma grandíssima tola no
relacionamento com este homem, ou seja, seu patrão. De forma alguma trabalharia
para Logan Youngblood. Ele podia não ser ladrão ou assassino, mas era um patife

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salafrário.
— Você não tem nada a dizer?
A pergunta aumentou-lhe a fúria.
— Claro, Logan — ela começou, mas não conseguiu dizer mais nada.
Satisfeito, ele sorriu.
— Em minha opinião, um noivado de duas semanas é suficiente. Naturalmente, um
de três meses calaria as más línguas. Mas não vou agüentar esperar tanto tempo por
nosso casamento.
Victoria não confiava em si mesma para pronunciar uma única palavra, pois só
tinha vontade de gritar.
— Mas dormiremos juntos todas as noites destas duas semanas — continuou ele.
— Teremos apenas de tomar cuidado para não sermos apanhados. Como seu quarto no
hotel fica pegado ao meu, não vai ser difícil. Depois de Madison ir dormir, poderemos
nos encontrar. Tudo vai dar certo.
Victoria caminhou até a escrivaninha e observou o que havia em cima. Além de
pilhas de papel, caneta, tinteiro e uma faca de prata para abrir cartas, ela viu um
pedaço de cristal bruto, cor-de-rosa, provavelmente usado como peso de papel.
Apanhou-o na mão.
— Victoria, você está muito quieta.
— É mesmo?
Logan a fitou com desconfiança como se esperasse uma explosão sua.
— Deve estar um tanto aborrecida por descobrir que não sou um marginal
perigoso, como você teimava em me considerar. Mas você precisa admitir que não
estava disposta a acreditar em minhas palavras quando eu tentava esclarecê-la a meu
respeito.
Era exasperante dar razão a ele. De má vontade, largou o pedaço de cristal. Não
era uma mulher violenta ou dada a explosões temperamentais.
— Embora odeie admitir, reconheço não ter acreditado no fato de você ser preso
injustamente.
A desconfiança desapareceu do olhar de Logan.
— Aceito suas desculpas de bom grado, meu bem.
— Eu não as ofereci.
— E nem precisa. Eu também não gosto de admitir quando estou errado. Vamos
apenas retomar nosso relacionamento daqui para a frente — disse Logan, ao tentar
abraçá-la.
— Não se atreva a me tocar!
— Acalme-se, Victoria.
— Não quero me acalmar e nem agir racionalmente. Você me fez de boba, Logan.
Não tinha o direito de me possuir sem eu saber quem você era realmente. Foi muita
falta de consideração sua. Mesmo não sendo um ladrão, ou um assassino, você não é um
cavalheiro.
— Não era minha intenção possuí-Ia.
Victoria sentiu-se como se tivesse sido jogada na água gelada de um rio.

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— Essa é a coisa mais desprezível para você dizer!
— Mas é a verdade. Daqui em diante, só vamos usar a verdade.
— Está insinuando que eu o seduzi? — indagou ela, brava.
— Não, claro. Tive um trabalhão para convencê-la a se despir.
— Então, como pode afirmar que não queria me possuir?
— Minha intenção era apenas despertá-la para o amor, meu bem — Logan
confessou, tomando-a nos braços, antes que ela pudesse impedi-lo. — Sabia que
quando chegássemos a Trinity Falls você se zangaria comigo e, então, eu precisaria
contar com uma vantagem a fim de domá-la.
Victoria ficou rígida.
— Você me possuiu a fim de me domar?!
— Não. Fiz isso porque, ao sentir seu corpo nu e macio de encontro ao meu, não
resisti.
As palavras provocaram-lhe a lembrança da sensação poderosa experimentada
naquele momento. Victoria estremeceu.
— Eu queria que você se sentisse ligada a mim, Victoria — continuou ele numa voz
rouca. — Desejava acariciá-la como você jamais fora. Queria beijar seus mamilos
excitados, tocá-la em sua parte mais íntima e mostrar--lhe como era se sentir
explodindo de prazer.
E, após uma breve pausa, continuou:
— Você precisava experimentar tudo que eu poderia lhe proporcionar. Se
percebesse como nosso relacionamento poderia ser bom, não seria capaz de me
abandonar. O que eu não tinha previsto era como você reagiria com paixão e qual seria
o efeito de senti-Ia atingir o êxtase com as carícias de meus dedos. Isso me fez
perder a razão.
— Mesmo sabendo o quanto estava errado, não consegui resistir sua atração.
Sendo assim, foi você, de certa forma, quem me seduziu. Apenas lamento termos tido
uns minutos, e não horas, para fazer amor. Mas esta noite pretendo compensar a
pressa da primeira vez. Teremos uma cama macia e a noite inteira para nos explorar e
enlouquecer de desejo.
Victoria encolheu-se entre os braços de Logan e ordenou a sua natureza
pecaminosa para se comportar. De forma alguma poderia deixar que as palavras
ardentes de Logan a levassem a outra rendição desastrosa da carne.
Também não havia lhe escapado à atenção que ele não tinha mencionado a palavra
amor. Embora se admirasse ter sido capaz de despertar a paixão deste homem viril,
não se via na obrigação de satisfazê-la.
Quanto à questão de casamento, ela a considerava conversa fiada. Logan queria
apenas duas semanas de paixão desenfreada para, depois, livrar-se dela.
Devagar, Victoria soltou-se dos braços de Logan.
— Bem, eu...
Diga alguma coisa, sua tonta! Algo para tirá-la daqui e da influência perigosa
deste homem.
— Sim, meu bem.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
O problema, ela presumia, estava dentro de si mesma. Na verdade, não queria
escapar das garras sedutoras de Logan.
— Você estava falando sério ao mencionar casamento? — ela perguntou, disposta
a tratar desse ponto abertamente.
— Poderia me proporcionar a honra de se tornar minha esposa, srta. Amory?
Embora a frase arcaica sugerisse gracejo, o coração de Victoria derreteu-se. Por
um momento, imaginou se ele não estava rindo de si mesmo e não dela, pois havia, nos
olhos pretos, uma ponta de ternura.
Ela suspirou. A essa altura, não importava se Logan estava sendo, ou não, honesto.
Ela precisava ser sincera consigo mesma. Não podia aceitar a proposta de casamento.
Pelo menos enquanto não tivesse certeza de que os sentimentos de Logan iam além de
mero desejo físico.
— Desconfio não poder aceitar sua proposta.
As palavras firmes produziram um silêncio opressivo.
Um ar de determinação marcava as feições de Logan. Via-se que ele não era
homem de aceitar não como resposta.
— Você ainda está ressentida por eu não tê-la convencido não ser um fora-da-lei.
Victoria apertou os lábios. Logan aumentava-lhe a sensação de ser uma ingênua
crédula.
— Seria tolice pensarmos em casamento.
— Por quê?
— Somos estranhos e não temos nada em comum.
— Errado.
— Eu nem sabia quem você era até dez minutos atrás — disse ela, erguendo o
queixo.
— Há um dia, sob o céu limpo, você abriu suas coxas lindas e me convidou para
penetrá-la. Isso nos tornou bem íntimos.
A franqueza fez Victoria encolher-se mais.
— Eu me entreguei a um homem que não existe!
Irritado, Logan bateu no peito.
— Estou aqui bem em frente a você. Como pode afirmar que não existo?
— Mas não o conheço! Eu me apaixonei por um malandro com a inclinação para ser
preso. Você não é ele e sim um banqueiro.
— Essa é a coisa mais idiota que você já disse.
Os olhos de Victoria encheram-se de lágrimas.
— Está bem. Sou uma idiota por me deixar seduzir por um homem dissimulado,
desonesto e astuto.
— Meu bem, não comece a chorar.
— Choro se quiser.
— Você tem de se casar comigo, pois me ama.
— Não amo, não!
— Mas você confessou...
— Eu me apaixonei por outro homem.

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— Eu sou o outro homem! — Logan esbravejou.
— Não adianta gritar comigo. Eu já me decidi. Não vou me casar e nem trabalhar
para você. Vou voltar para casa.
Mesmo enquanto dizia as palavras, elas não faziam sentido. Os últimos
acontecimentos a deixavam tão confusa que Victoria não conseguia raciocinar.
— Victoria, você não pode voltar para Boston.
— Por que não?
— Você me deu todo seu dinheiro.
A menção do fato enfureceu-a mais.
— Devolva já minhas moedas. E meu livro também.
— O livro? De jeito nenhum! Ele é muito valioso para mim e eu me nego a devolvê-
lo.
— E quanto às moedas? Elas também lhe são valiosas? Duvido. Tal quantia deve
ser insignificante para você.
— Engana-se. As moedas de ouro representam um ótimo investimento. Não vou
abrir mão delas enquanto viver.
— Venderei o carroção e os bois.
— Não será suficiente.
— Vendo meus livros. Isso deverá dar para pagar minha passagem numa diligência
— murmurou ela, sentindo o coração despedaçar-se.
— Imagino. Já posso ver centenas de mineradores brigando para comprar O
Declínio e a Queda do Império Romano. Será difícil você controlar os homens
decididos a se instruir.
O sarcasmo de Logan a fez repensar na possibilidade de atirar nele o pedaço de
cristal.
— Não é de sua conta. Darei um jeito.
— Você está se esquecendo de algo.
— Do quê? — indagou ela, desconfiada.
— O contrato assinado para trabalhar para mim, cuidando da educação de
Madison. Você veio para o oeste com dinheiro adiantado por Martin. Não lhe resta
escolha a não ser honrar o contrato.
A cabeça de Victoria latejava.
— Você não pode esperar que eu cumpra esse acordo. Não depois do que
aconteceu entre nós.
Logan exibiu aquele sorriso confiante, do qual ela se ressentia, e caminhou até a
porta, encostando-se nela. Ao bloquear a única saída do escritório, ele a provocava.
Mas declarar guerra contra ele seria uma perda de tempo, refletiu Victoria.
— Espero que você me acompanhe até o hotel e seja apresentada a Madison.
Espero que cumpra os termos do contrato e gaste os dois próximos anos instruindo-a e
ajudando-a a adquirir os hábitos de uma dama.
Empurrada contra a parede, Victoria resolveu usar a única arma de que dispunha.
— Acho estranho você permitir que alguém como eu, cuja honra se perdeu, se
aproxime da menina. Não sou mais uma dama de virtudes sem máculas.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Logan não escondeu a fúria e fitou-a com expressão ameaçadora.
— Para o resto do mundo, Victoria, você é uma verdadeira dama. Sou a única
pessoa a quem você permitiu experimentar sua paixão. Vou guardar esta lembrança
pelo resto da vida e não deixarei que você a transforme em algo feio.
Envergonhada, mas não acovardada, ela procurou uma saída da situação
embaraçosa. Não havia nenhuma. Mais desanimador era admitir que ficar legalmente
ligada a Logan Youngblood não se tratava de uma perspectiva ruim.
Não se casaria com ele apressadamente. Nem o receberia em seu quarto. Se ele
se mostrasse arrependido e a cortejasse por um longo período, talvez concordasse em
se casar com ele. Naturalmente, Logan precisaria amá-la tanto quanto ela o amava.
— Bem, você não me deixa escolha. Cumprirei o contrato.
— Muito sensato de sua parte.
— Mas quero deixar claro que nosso relacionamento será estritamente de
negócios. Como meu patrão, espero que você se comporte de maneira discreta. Nada
de visitas noturnas a meu quarto, nem de abraços e beijos inconvenientes. Nós nos
comportaremos como adultos respeitáveis.
— Sei. Você vai me fazer sofrer antes de me aceitar em sua cama, não é?
— Comentários como esse precisam acabar.
— Quanto tempo vai levar, Victoria?
— Bem mais do que duas semanas.
— Espera que eu a presenteie com flores e bombons?
— Claro.
— E também que a leve para jantar?
— Uma boa idéia. O Prairie Rose tem um ótimo restaurante.
— Acertado, então.
A capitulação rápida de Logan a apanhou de surpresa.
— Concorda em...
— Cortejá-la — completou ele.
Victoria enrubesceu. A perspectiva era inebriante. Ela o amava, mas Logan era um
homem intimidador.
— Vou deixar que você me ponha à prova a fim de, legalmente, uni-Ia a mim —
disse ele.
A declaração fria a alarmou. Tinha a esperança de algum romantismo, mas não
havia nenhum na expressão severa de Logan. Ele parecia um homem prestes a entrar
em combate. Mesmo assim, sentiu uma ponta de entusiasmo.
Talvez estivesse destinada a ter uma vida de aventuras. Ao vir para o oeste, fora
em busca de uma, mas não a tinha visualizado na pessoa vigorosa de Logan Youngblood.
Considerava-se à altura da empreitada. Aliás, talvez fosse a única mulher, em Trinity
Falls, capaz de manter Logan na linha.
Sem dúvida, empregaria seus melhores esforços.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy

CAPÍTULO DEZENOVE

— Pelo menos, não houve tiros — comentou Martin Pritchert, ao servir-se de uma
dose de conhaque.
Sentado no sofá de sua suíte no hotel, Logan esticou as pernas para a frente.
— Victoria não tinha uma pistola.
— Em minha opinião, ela recebeu, muito bem, a notícia de que você era seu
patrão. Não ouvi gritaria alguma. Victoria Amory parece ser sensata.
— Você não pensaria assim se a visse apanhando o pedaço de cristal em minha
escrivaninha. Nem sei como não o atirou em mim.
— Imaginação sua. A srta. Amory é o modelo perfeito de decoro e boas maneiras.
Embaraçado, Logan mexeu-se na cadeira. Victoria havia se vangloriado dessas
qualidades até se envolver com ele. Olhando para as botas, franziu a testa. Maldição,
ela ainda era uma dama, embora não se considerasse. Era sua dama e ia tornar-se sua
esposa.
Mas não permitiria que ela desse as cartas. Não tinha a intenção de deixar a data
do casamento para um futuro incerto por causa de seu orgulho ferido. Haveriam de se
casar dentro de duas semanas. E, nesta noite, dormiriam juntos.
No escritório, de manhã, ele havia tentado ganhar tempo. No decorrer do dia,
Victoria se acostumaria com o fato de ele não ser um marginal. Ao anoitecer, sua raiva
teria abrandado, ele tinha certeza.
— Estou curioso para saber o que aconteceu entre você e a srta. Amory no
trajeto para cá — disse Pritchert.
— Adquiri um alto apreço por seu caráter e isso transformou-se em afeto.
Pretendo me casar com ela.
— Não diga! Se bem me lembro, você declarou, inúmeras vezes, que preferia ser
esquartejado a se casar. A que o caráter da srta. Amory tem para fazê-lo mudar de
idéia?
A pergunta irritou Logan tanto quanto a expressão divertida de Pritchert.
— Certas coisas são difíceis de se explicar. A que, por exemplo, em sua mulher, o
levou a se casar com ela?
— Muito simples. Eu me apaixonei perdidamente por ela. Sua alegria e beleza me
encantavam. Admito ter me enganado um pouco sobre sua personalidade. Eu a via mais
como uma jovem de grande vivacidade do que como uma mulher resoluta. Mas com o
passar dos anos, fiquei aliviado por ela ter uma faceta séria de caráter.
— Tenho certeza de que Victoria dará uma boa esposa, como também exercerá
influência positiva em Madison — Logan afirmou.
— Parabéns, meu amigo. Depois de sua experiência desastrosa com Robeena,
comecei a duvidar que você voltasse a amar alguém.
— Quem falou em amor?

123
CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Concluí... Quer dizer, eu... — começou Martin sem esconder o desapontamento,
mas calou-se.
— Se seus esforços casamenteiros eram uma tentativa para me enredar numa
união amorosa, você falhou, Martin.
— Meus esforços casamenteiros?!
— Eu lhe expliquei claramente que queria uma mulher mais velha para cuidar de
Madison. E você me conhece bem para saber que ela não deveria ser de Boston. Você
contrariou minhas preferências, prevendo um relacionamento mais do que profissional
entre ela e mim.
— Absurdo! Não sou adivinho, Logan! Como iria saber que o coronel o abandonaria
preso lá no forte e que a srta. Amory apareceria e o soltaria? Também não poderia ter
previsto que você viajaria, por duas semanas, com a moça pelas montanhas.
— Mas você providenciou para que Victoria morasse, como eu, no hotel. Esqueceu-
se de que ela deveria ser pensionista sua e de Constance?
Martin ficou vermelho até a raiz dos cabelos.
— Bem, eu... Ora, com todos os diabos, homem! Você precisava mudar de vida.
— Por que Victoria Amory, Martin? O que o fez escolhê-la para seu plano de
acabar com meu celibato? — indagou Logan, curioso e não bravo com a situação.
— O pai dela e eu somos amigos desde a juventude. Embora a srta. Amory não se
lembre, nós nos conhecemos anos atrás. Naquela ocasião, fiquei impressionado com sua
segurança e inteligência. Quando o juiz Amory mencionou, numa carta, que a filha fora
envolvida injustamente num escândalo, e você me pediu para procurar uma professora
para Madison, me ocorreu... Bem, Victoria Amory poderia ser a moça para ajudá-lo a
esquecer Robeena.
— Não posso imaginar nenhum tipo de escândalo envolvendo Victoria.
— Como o juiz Amory explicou, tudo não passou de um mal-entendido.
— E por que você não mencionou meu nome a ele e à filha?
— Você sabe muito bem que seu nome adquiriu um estigma infeliz quando você
não apareceu na igreja para seu próprio casamento.
— Meu irmão concordou com sua decisão de manter meu nome em segredo? —
Logan perguntou.
— O que o leva a pensar que Burke está a par desta história?
— Não acredito muito em coincidências. Quando você apareceu em Trinity Falls,
poucos meses depois de mim, eu me perguntei por que um próspero homem de
negócios, como você, deixaria Boston. Além do mais, você conhecia meu irmão e até
tinha negócios com ele.
— Você se dá conta de ser esta a primeira vez que menciona o nome de seu irmão
para mim?
Devagar, Logan sacudiu a cabeça afirmativamente. Não tinha certeza por que
tentava descobrir o papel de Burke na escolha de Victoria para cuidar de Madison.
Depois desses anos todos, talvez seu ressentimento contra o irmão houvesse
abrandado.
Martin limpou a garganta.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Escrevi para Burke para saber se ele achava a srta. Amory uma boa candidata.
— Para ensinar Madison?
— Na verdade, nosso objetivo era colocar uma jovem decente em sua vida,
alguém que o fizesse esquecer a experiência desastrosa com Robeena.
— Ela e Burke se casaram?
— Sem dúvida, era com isso que ela contava quando deu um jeito para você
encontrá-la no quarto de seu irmão. Mas Burke não a queria nem como esposa e nem
como amante.
As palavras do amigo soaram como uma promessa para pôr fim na desavença
entre Logan e Burke. Sendo jovem e temperamental, seria possível, Logan admitiu, que
ele houvesse tirado a conclusão errada sobre o que vira no quarto do irmão. Teria sido
Robeena a responsável pelo encontro ilícito interrompido por Logan?
— Por que você veio para Trinity Falls cinco anos atrás, Martin?
— Burke sabia que eu alimentava a idéia de vir para o oeste. Ele sugeriu Trinity
Falls.
— Por quê? Para cuidar de mim? — Logan indagou, lembrando-se de como o irmão
mais velho, desde a infância, tentava protegê-lo.
— Não tem sido fácil, você sabe. Quando cheguei aqui, você estava morando com
os índios. Deus do céu, sua aparência era horrível. Você tinha se transformado num
selvagem.
— Você, então, me sugeriu fundar um banco aqui na cidade.
— Ora, você pertence a uma família de banqueiros, Logan. Nada mais natural que
você usasse os fundos deixados em Boston e iniciasse sua própria instituição
financeira.
— Outra idéia de Burke, imagino.
— Bem, ele a aprovou.
— Por Deus, ele é o sócio anônimo cuja parte nós compramos no ano passado?
— O que você acha? — perguntou Martin, com olhar malicioso.
— Acho que um maldito cão de guarda tem me vigiado desde minha vinda para cá!
— Não foi fácil para ele quando você se apresentou como soldado voluntário.
— Nem sei como ele não tramou para eu não ser aceito.
— Com certeza, tentou.
Uma lembrança subiu à tona da mente de Logan. Durante a guerra, ele se tornara
amigo de um tal Bartholomew Bridger. O homem atarracado, estivador do porto de
Boston, o tinha acompanhado em todas as batalhas. Em várias ocasiões, Bridger se
colocara entre Logan e o perigo. Depois da guerra, o estivador recebera uma
inesperada quantia de dinheiro. Tinha sido o suficiente para comprar seu próprio
barco. Provavelmente, Bridger fora mais um dos anjos da guarda do irmão, refletiu
Logan.
— Burke nunca o perdeu de vista, Logan.
— Com todos os diabos, imagino!
— Para ser sincero, eu esperava uma demonstração maior de raiva quando você
descobrisse as interferências de Burke em sua vida — comentou Martin.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Talvez a passagem do tempo tenha esfriado minha raiva.
— Seis anos de silêncio, entre você e seu irmão, é demais, Logan. Você precisa
se livrar dessa amargura.
Logan imaginou se já não estaria na hora de ir a Boston e ouvir o lado da história
do irmão.
— Tenho mais novidades — disse Martin.
— Sobre meu irmão?
— Não, sobre alguém daqui mesmo. Quando passei pela recepção do hotel, vi o
coronel Windham conversando com um cidadão. Ele contava ter recebido reforços e
que pretendia atacar os índios.
Logan praguejou.
— O homem é incapaz de admitir que os índios, responsáveis pelo incêndio do
forte, já devem estar longe da região há muito tempo. O idiota vai acabar atacando a
tribo de Lobo da Noite. Vou ter de avisar meu amigo.
— Se Windham o apanhar fazendo isso, não perderá tempo em prendê-lo e irá
colocá-lo diante de um pelotão de fuzilamento.
— Duvido que consiga.
— Seja razoável, Logan. Você não encontrará um único aliado, no território
inteiro, se ficar do lado dos índios.
Logan lembrou-se da atitude simpática de Victoria em relação a Lobo da Noite.
— Nem todos os brancos odeiam os índios..
— Talvez não, mas a maioria morre de medo deles. Isso sem falar nos ambiciosos.
Estes querem as terras e o ouro dos índios. Encare a verdade, Logan. Você estaria
arriscando a vida por uma causa perdida.
— Tenho de avisar Lobo da Noite — teimou Logan. — Madison ainda está com
Constance?
Martin consultou o relógio de bolso.
— A menina deve estar no quarto, dando os últimos retoques no vestido que
comprou esta manhã para impressionar a srta. Amory.
Algo mais ocorreu a Logan.
— Constance estava envolvida em seu plano para unir Victoria a mim?
— Por Deus, não! Embora ame muito minha mulher, sou obrigado a admitir que ela
é incapaz de guardar um segredo.
Apesar de Martin não dizer, Logan sabia ser verdade que Constance não
aprovaria a associação de um homem, com sua fama de mulherengo, com uma jovem
aristocrata e inocente como Victoria.
— Você mandou levar os livros de Victoria a sua suíte como pedi?
— Sim. Apareceu um número enorme de voluntários para carregar as caixas. Ah,
já vendi o carroção e os bois.
— Mas você não lhe entregou o dinheiro, não é?
— Não, está em meu bolso. Porém, não acho ético retê-lo.
— Não se preocupe, Martin. Ela o receberá. Eventualmente.
Depois de se casar comigo.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Logan levantou-se.
— Está na hora de encontrarmos as senhoras para o almoço.
Quando Victoria ouviu a batida na porta, estava entretida empilhando seus livros.
Ao abri-la, deparou-se com a esposa de Martin Pritchert, a quem fora apresentada na
véspera.
— Bom dia, sra. Pritchert.
A matrona simpática sorriu.
— Você prometeu me chamar de Constance, lembra-se?
Victoria retribuiu o sorriso.
— Entre, por favor. Desculpe a confusão. Você me apanhou desempacotando
minha bagagem.
— Pelo jeito, você pretende montar uma biblioteca. Todos estes livros são seus?
Acostumada a esse tipo de comentário, Victoria não se surpreendeu.
— Quando estiverem em estantes, não vai parecer que sejam tantos.
— Acredito. Você está pronta? Temos de pegar Madison e ir encontrar Martin e
Logan lá embaixo.
— Só me dê um minutinho para lavar as mãos e pentear os cabelos.
Constance apanhou um livro deixado por Victoria na mesa.
— Mulherzinhas. Já ouvi falar nele. Dizem que é muito interessante.
Victoria pôs a água de uma jarra numa bacia e começou a lavar as mãos.
— Não estou muito adiantada na leitura, mas as personagens são encantadoras.
— Quatro irmãs, não é?
— Sim. Tenho esperança que Madison aprecie a história — disse Victoria,
enquanto enxugava as mãos.
— Vai ter de ensiná-la a ler primeiro.
— É verdade. Logan mencionou que ela é analfabeta.
Percebeu ter cometido a indiscrição de referir-se a Logan pelo primeiro nome.
Esperava que Constance não tivesse notado.
— Sabe, Madison foi criada como selvagem.
— Pobrezinha.
— Eu não deveria lhe dizer isto, mas nem sempre tive admiração pelo homem para
quem meu marido trabalha. Logan Youngblood nunca se apegou aos refinamentos
sociais valorizados por nós. Mas quando ele aceitou a responsabilidade de cuidar de
Madison, fui obrigada a mudar minha opinião sobre ele.
Victoria manteve-se calada.
— Vejo por sua expressão que você desaprova minha crítica. Mas acho meu dever
informá-la que seu patrão tem uma reputação terrível por causa de seu relacionamento
com mulheres.
Victoria não conseguiu fitar Constance. Temia se trair, pois sabia muito bem que
Logan, nem sempre, se comportava como um cavalheiro. E que ela própria, às vezes,
não agia com a lisura de uma dama.
— Sabe, ele é chamado de Pirata Ardente.
— O quê?! — exclamou Victoria, sem conseguir disfarçar a surpresa.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— É um título chocante, mas apropriado. Ele se esforçou bem para merecê-lo —
disse Constance.
O que uma pessoa fazia para merecer tal apelido?, Victoria indagou-se.
— Ele adquiriu o hábito de juntar-se às mulheres de vida fácil e de acompanhá-
las a lugares públicos como se fossem senhoras de respeito.
Victoria refreou-se de comentar o comportamento escandaloso de Logan. Como
poderia, se ela própria perdera a virtude nas mãos dele?
— Minha franqueza a deixou chocada, mas considero meu dever de cristã avisá-la
sobre o caráter de seu patrão. Você deve ser cuidadosa e manter uma conduta
decorosa, pois está morando muito perto dele. Compreende o que estou dizendo,
Victoria?
— Sim, claro.
— Não dê a mão a Logan Youngblood, pois ele haverá de querer o braço também.
A citação desse clichê lembrou Victoria de outro, sobre alguém trancar a casa
depois do assalto de um ladrão.
— Tal depravação moral teve início na tarde em que ele abandonou a pobre srta.
Stockard no altar. Essa atitude lamentável mostrou claramente o desprezo de Logan
Youngblood pelo sexo fraco. Não é de se admirar que ele tenha arranjado problemas
com o coronel Windham.
— Mas ele tratou o sr. Youngblood com crueldade vil! — protestou Victoria.
— Ora, minha cara, quando um homem enfrenta o amante da mulher, age com um
certo descontrole. O meu querido Martin atiraria no homem que ousasse tomar
liberdades comigo.
O relógio no consolo bateu enquanto Victoria refletia sobre as revelações
desalentadoras sobre Logan. Constance alarmou-se.
— Meu Deus! Temos de pegar Madison e descer logo. Pouco depois, as duas
paravam diante de outra porta, no mesmo andar, que Constance abriu sem bater antes.
A cena diante delas fez Victoria esquecer os pensamentos sobre Logan.
Uma jovenzinha, usando um vestido cor-de-rosa vivo, com fileiras e mais fileiras
de babadinhos brancos, sentava-se no chão. Com uma das mãos, ela segurava um maço
de notas de dinheiro e, com a outra, atirou dois dados no chão. Um senhor idoso e
magro, com o uniforme do hotel, ajoelhava-se a seu lado.
— Por Deus, srta. Earley, outro sete! Fiquei limpo!
— Madison, o que isto significa? — indagou Constance com veemência.
O homem pulou em pé.
— Desculpe, senhora. Eu estava apenas...
Sem encontrar uma explicação plausível para sua presença no quarto, ele calou-
se.
A menina, por outro lado, levantou-se calmamente. Teve até a precaução de
enfiar as notas no bolso, Victoria notou.
— Acalme-se, Herbie, ou você sofrerá um ataque.
— Ele vai ter de se preocupar com outras coisas além de ataques. Quando meu
marido e o sr. Youngblood informarem o gerente o que estava fazendo aqui, o senhor

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perderá o emprego! — esbravejou Constance.
Sem se deixar afetar pelas palavras, a menina sorriu para o homem trêmulo e
pálido.
— Não se preocupe, Herbie. Explicarei que nada disto foi por culpa sua. Você não
perderá o emprego, prometo.
— Você não está em condições de fazer promessa alguma, mocinha!
Madison exibiu um sorriso encantador.
— Ora, sra. Pritchert. Não há razão para se aborrecer com Herbie. Ele estava
apenas me ensinando a somar aqueles números que a senhora insiste para eu aprender.
Isso, claro, não explicava o dinheiro escondido no bolso, refletiu Victoria.
Não muito convencida, Constance virou-se para o homem.
— Pode sair.
O pobre não esperou segunda ordem. Quase tropeçando, deixou o aposento.
— Como pode ver, srta. Amory, precisamos muito de seus serviços aqui. Esta é
sua aluna, Madison Earley.
Ciente do olhar perscrutador da menina, Victoria estendeu a mão.
— Como vai, Madison?
— Podia ir melhor — respondeu ela, ao apertar a mão de Victoria e fitá-la com os
olhos azuis brilhando. Então, você é a mulher que Logan mandou buscar para me
transformar numa dama?
— Madison! Seja mais respeitosa com a srta. Amory! — Constance a advertiu.
Victoria não se ofendeu com o tratamento familiar. Tinha certeza de que seria
um desafio, mas também um prazer, conviver com a menina esperta, desinibida e
alegre.

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CAPÍTULO VINTE

O almoço no restaurante do hotel, com Logan, Madison, Martin e Constance,


estava sendo uma experiência estimulante para Victoria. A conversa não esmorecia
enquanto a comida deliciosa era servida.
Logan sentava-se bem a sua frente e lhe dirigia olhares possessivos. Ela, por sua
vez, encantava-se em admirar as mãos dele. Lembrava-se de senti-Ias na pele, em
carícias inebriantes. Mexeu-se na cadeira e imaginou a reação dos outros, caso
pudessem ler seus pensamentos. Sem dúvida a considerariam tão desprezível quanto
as mulheres com quem Logan se divertia.
— Logan, não olhe para a porta. O coronel Windham e a mulher acabam de chegar.
As palavras de Martin desviaram o rumo dos pensamentos de Victoria. Como os
outros, olhou para a entrada.
Um homem magro, usando o uniforme azul do exército, e uma mulher linda,
começavam a atravessar a sala. A loira atraente era uns cinco centímetros mais alta
do que o marido.
— Que grande ousadia! — protestou Madison, levantando-se. — Como ele se
atreve a mostrar essa cara de doninha em público depois do que fez a você, Logan?
Mesmo se você tivesse ido para a cama com a mulher dele, o coronel não tinha o
direito...
— Sente-se, Madison — ordenou Logan, com severidade suficiente para fazê-La
obedecer. Em seguida, dirigiu um olhar penetrante para Victoria. — Vamos deixar bem
claro que nada, de natureza pessoal, ocorreu entre mim e Athena Windham.
No silêncio após a declaração de Logan, o militar e a mulher atravessaram boa
parte da sala. Quando estavam perto da mesa, Pritchert e Logan levantaram-se.
A tensão era forte o suficiente para produzir chamas sem a ajuda de uma
fagulha.
— Muito bem. Vejo que você teve sorte, Youngblood, e conseguiu chegar vivo à
cidade.
— Não foi graças ao senhor — respondeu Logan. Os olhos do coronel brilharam de
ódio.
— O que quer dizer? Dei ordens para você ser solto e receber um cavalo a fim de
voltar para cá. Naturalmente, na confusão para evacuar o forte, não tive tempo para
lhe desejar boa viagem — acrescentou com um sorriso mau.
Logan manteve-se calado.
— Como deve saber, Youngblood, nosso assunto ainda não terminou — continuou o
oficial. — Incumbi vários de meus homens para levá-lo ao escritório temporário, que
arrumei na igreja Metodista. Lá, poderemos acabar a discussão começada no forte.
— Considero o assunto encerrado — declarou Logan com frieza.
— Os selvagens assassinos, que queimaram o forte, continuam pela região. Você

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levará meus homens até eles para que possamos exterminá-los.
Victoria olhou em volta e notou que a cena prendia a atenção de várias pessoas. A
maioria delas parecia apoiar a idéia do coronel de matar os índios, ou expulsá-los do
território.
— É sempre um prazer atender os militares — Logan declarou com ironia
ameaçadora.
Victoria sentiu a boca seca. Se Logan acompanhasse Windham às montanhas, não
voltaria vivo, tinha certeza. Embora mal controlasse a fúria, ele não exibia o mínimo
sinal de medo. Teria Logan a intenção de trair Lobo da Noite, ou apenas tentava adiar
o acerto de contas?
— Meus homens chegarão logo a fim de garantir sua ida a meu escritório sem
imprevisto algum — Windham informou, com desdém evidente. — Vamos, Athena. Já
atrasamos bastante nosso almoço.
O casal se afastou, mas não antes de Victoria detectar o olhar interessado da
sra. Windham para Logan.
— Por Deus! Foi uma cena e tanto! Esse homem tem uma forte aversão por você,
Logan — comentou Constance.
— O que pretende fazer? — perguntou Martin, preocupado, enquanto ele e Logan
voltavam a se sentar. O ódio de Windham por você é óbvio. Se puder, ele não o trará
vivo das montanhas.
— Não tenho escolha. Embora seja civil, Windham tem autoridade suficiente para
me forçar a levá-lo até Lobo da Noite.
Pela naturalidade de Logan falar, ninguém desconfiaria que a vida dele corria
perigo.
— Você não pode fazer isso — Madison protestou. — Lobo da Noite salvou minha
vida quando meu pai foi assassinado.
— Não se preocupe com ele, Maddy. A última vez que conversei com Lobo da
Noite, ele estava levando a tribo para o norte — contou Logan, sorrindo para a menina.
— Se você levar Windham à aldeia indígena abandonada, ele o matará lá mesmo —
Martin argumentou com olhar sombrio.
— Apenas ontem você conversou com Lobo da Noite — Victoria aparteou. — Qual
a distância que um homem idoso poderia ter percorrido nesse meio tempo?
Especialmente conduzindo a tribo inteira?
Todos à mesa a fitaram com expressão de surpresa e ela não entendeu o motivo
de tal reação.
— De onde você tirou a idéia de que Lobo da Noite é velho? — Madison
perguntou. — Ele deve ser mais novo do que Logan.
Confusa, Victoria olhou para Logan.
— Você me disse tratar-se de um homem idoso e fraco.
Um rubor intenso espalhou-se pelo rosto de Logan.
— Eu devia estar me referindo a Vento da Noite desculpou-se ele.
— Quem é esse? Nunca ouvi falar dele. Achava que conhecia todo mundo da tribo
de Lobo da Noite — Madison quis saber.

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— É um chefe indígena velho e desdentado — explicou Victoria, sem saber como
Logan podia dizer que havia descrito outra pessoa e não Lobo da Noite.
— Bem, isso não vem ao caso. Se você acompanhar Windham amanhã, duvido que
volte. Especialmente se não lhe entregar Lobo da Noite — afirmou Martin.
Um silêncio opressivo envolveu a todos e a chegada de quatro soldados aumentou-
lhes a tensão.
— Sr. Logan Youngblood? — um deles indagou.
— Pois não — respondeu Logan, ao levantar-se.
— O senhor deverá nos acompanhar.
— Não vá — Madison e Victoria disseram ao mesmo tempo, pondo-se em pé.
Logan as fitou com ternura inesperada.
— Aprecio a solicitude de ambas, mas não tenho escolha a não ser obedecer.
— Mas Windham ainda está almoçando ao lado da mulher — Madison argumentou.
— Não tem importância. Seja uma boa menina e sente-se, Maddy — disse Logan.
Com olhar beligerante, ela ergueu a cabeça e enfiou a mão no bolso.
— Tenho uma pistola aqui e estou disposta a atirar no primeiro de vocês, seus
vermes, que se atreverem a dar um passo em direção a Logan.
— Ai, meu Deus! — Constance gemeu.
Victoria não se alarmou, pois sabia que a saliência no bolso da menina não passava
do maço de notas ganhas no jogo com Herbie.
— Maddy, pare de representar e sente-se — ordenou Logan com severidade.
De má vontade, Madison atirou-se na cadeira. Victoria, entretanto, permaneceu
em pé.
— Você também pode se sentar — Logan disse num tom mais ameno, fitando-a.
— Eu gostaria de acompanhá-los ao escritório do coronel.
— É melhor ficar aqui, senhorita. Se o coronel precisar de sua colaboração,
mandará buscá-la — disse um dos soldados.
Victoria forçou-se a aparentar calma.
— Não quero discutir com o senhor. Todavia, sei que Lobo da Noite, o chefe
indígena a quem procuram, deixou o Território de Idaho. Quando o sr. Youngblood me
acompanhava do forte a Trinity Falls, nós encontramos o selvagem. Ele e a tribo
inteira seguiam para o oeste. Como isso aconteceu mais de três semanas atrás, o sr.
Youngblood será incapaz de levá-los até eles.
Victoria esperava ser atingida por um raio, como castigo pela mentira deslavada.
Todos à mesa estavam cientes de sua impostura, sabia, pois até minutos atrás ela
ignorava que Lobo da Noite não fosse velho. Também tinha anunciado publicamente sua
associação com Logan.
Apesar da agitação íntima, Victoria notou o olhar de admiração de Madison. Por
alguma razão, isso a estimulou. Contanto que não olhasse para Logan, realizaria a
proeza de se fazer acreditar pelos soldados.
— Talvez deva ir conosco também, senhorita.
— Que diabos pensa estar fazendo?
Embora baixa, a voz irritada de Logan atingiu Victoria com a força de um murro.

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A cada minuto, ela sentia-se menos confiante.
Os soldados os tinham trazido à igreja metodista a fim de esperar pelo coronel
Windham. Eles os vigiavam a distância.
— Devia estar claro para você. Salvando sua vida outra vez — respondeu ela.
— Meu bem, você não sabe em que está se metendo. Windham não é racional
quando se trata de mim. O melhor que você pode fazer é ficar fora do caminho dele.
Eu me defendo sozinho — Logan disse, com olhar carrancudo.
— Da última vez em que tentou, você acabou dentro de uma cela.
— Victoria, nada de discussões. Não quero vê-Ia envolvida no caso. Não se pode
prever o que Windham fará. Tenho a impressão de que ele está prestes a explodir. E
se isto acontecer, não pensará duas vezes em enforcar uma mulher.
As palavras de Logan abalaram Victoria, mas de forma alguma sairia do lado dele.
Já o tinha feito uma vez e não repetiria o mesmo erro. Talvez o orgulho de Logan não
o deixasse admitir que ela lhe dava a única oportunidade de permanecer vivo. Criando
coragem, ela respondeu:
— Pelo que eu saiba, a animosidade de Windham por você foi provocada por sua
associação com a mulher dele. Através dos séculos e até nossos dias, um marido vem
se mostrando cioso da fidelidade da esposa. Até recentemente, ocorriam duelos por
conta de tais incidentes.
— Nunca fui para a cama com essa mulher — Logan declarou, furioso.
— Tem certeza?
— Deus do céu! Pensava que você já tinha me acusado de todos os erros possíveis.
No entanto, você aparece com mais um.
— Bem, ela é uma mulher linda e parece sentir atração por você.
— Por que diz isso?
— Ela o fitou com interesse indisfarçável.
— Então é isso? Uma mulher me olha e eu sou condenado por seduzi-Ia?
Victoria sentiu-se tentada a lhe dizer que, se ele não tivesse fama de
mulherengo, a situação atual não teria surgido.
Mas refreou-se. Não queria irritá-lo mencionando o passado, quando o futuro
dele mostrava-se tão incerto.
— Não por mim, Logan. Acredito em você. Sei que não teve nada com Athena
Windham. Mas o marido dela alimenta dúvidas a esse respeito. Isso deve estar
atrapalhando o raciocínio dele. Mesmo assim, estou convencida de poder apelar para
seu lado prático.
— Victoria, se você não for embora daqui enquanto pode, vou pô-la de bruços no
meu colo e aplicar-lhe umas boas palmadas.
— Os soldados não vão permitir. Sabe, é muito exasperante essa sua mania de me
ameaçar com castigos físicos, como se eu fosse uma criança desobediente. Em vez
disso, você deveria se mostrar grato. Seria bom se tivesse um pouco de confiança em
mim. Se não fosse esse seu excesso de arrogância masculina, você admitiria que estou
na posição ideal para tirá-lo da armadilha em que o coronel Windham o apanhou.
— Não faço a mínima idéia sobre o que você está falando, mas...

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Não faz, claro — disse ela, interrompendo-o. — Você acha que as mulheres só
servem para uma coisa.
Um brilho repentino surgiu nos olhos de Logan.
— Continue. Sou todo ouvidos — murmurou ele.
— Logan, um homem à beira do desastre deve pensar em assuntos mais
importantes. Seu ultimato para me casar com você...
Foi a vez dele interrompê-la.
— Reconheço que meu pedido de casamento foi meio apressado e pouco
romântico, mas eu não o classificaria como ultimato.
— Lá em seu escritório, você tratou do assunto como se fosse uma questão de
negócios. Não demonstrou o mínimo sentimento.
— Meu bem, você não estava, naquela hora, com a mínima inclinação para ouvir
tagarelice sentimental sobre o amor.
O coração de Victoria quase parou. Tagarelice sentimental?, pensou ela,
indignada. Homens que largavam a noiva no altar não podiam ser românticos, claro.
— Seja como for, reconheço estar em débito com você por ter me trazido, em
segurança, a Trinity Falls. Entretanto, casar-me com você, como pagamento de minha
dívida, me parece exagero. Mas ajudá-lo a escapar das garras do coronel Windham,
será uma troca mais razoável.
Pelo olhar sombrio de Logan, Victoria percebeu que ele não concordava com seu
modo de pensar. Antes, porém, de continuarem a discussão, a porta da igreja abriu-se
e o coronel Windham entrou.
Fez-se um silêncio profundo e o mundo pareceu parar. Mas, de repente, a
movimentação tomou conta do lugar. Os soldados aproximaram-se deles e os levaram
para a frente da capela, onde o coronel os aguardava.
— O tenente Lawson me informou que a senhorita tem informações para me dar
— disse ele, dirigindo-se a Victoria.
Ela intuiu ser melhor entrar logo no assunto.
— Quando o sr. Youngblood e eu vínhamos para Trinity Falls, encontramos um
índio chamado Lobo da Noite e sua tribo.
— Está dizendo que Logan a levou à aldeia deles?
— Não. Nós estávamos viajando. Eles também.
— Para o oeste, segundo a senhorita informou meus homens.
Victoria percebeu que sua história, contada no hotel, já era do conhecimento do
coronel.
— Exatamente. Como vê, a presença do sr. Youngblood não vai ajudá-lo em nada.
Ele não será capaz de levá-lo até Lobo da Noite.
O coronel a observou com uma antipatia tão óbvia que Victoria começou a duvidar
da possibilidade de o homem se mostrar razoável. Talvez Logan tivesse razão.
— Meus parabéns, Youngblood.
— Pelo quê? — indagou Logan, desconfiado.
— Por encontrar outra vítima para seus divertimentos libidinosos. Ela está um
pouco acima das amantes que costuma arranjar para abrir as pernas para você.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Logan não deu sinal de que ia atacar. Num momento, estava a seu lado, no
seguinte, agarrava o pescoço de Windham. Os soldados em volta, num esforço inútil,
tentaram tirá-lo de cima do coronel.
Os dois iniciaram uma luta ferrenha, chocando-se contra os móveis e derrubando
os soldados que se esforçavam para separá-los. Victoria nunca havia testemunhado
algo tão violento. Murros fortíssimos e pragas rouquenhas a fizeram encolher-se,
embora procurasse uma maneira para terminar a briga.
Por mero acidente, seu olhar caiu numa pistola largada em cima de uma mesa.
Instintivamente, apanhou-a. Sabia o suficiente para destravar e apontar a arma.
— Parem, ou eu atiro! — gritou.
A ordem não surtiu efeito algum.
Com a pistola apontada para o alto, ela puxou o gatilho.
O estampido provocou o fim da luta.
Os homens endireitaram-se e sacaram as armas. Tarde demais, Victoria deu-se
conta de sua vulnerabilidade. Com o coração apertado, viu Logan limpar, com as costas
da mão, o sangue dos lábios.
— Abaixe a arma, srta. Amory — ordenou Windham.
— Se eu não obedecer, o que o senhor fará? Atirará em mim?
— Victoria — murmurou Logan.
— Sim, querido?
A palavra carinhosa, dita em alto e bom som, fez Logan franzir a testa.
— Seria melhor seguir a ordem do coronel Windham — sugeriu ele.
— Não precisamos mais nos preocupar com a opinião dele.
— E por que não, srta. Amory? — indagou o oficial.
— Acaba de me ocorrer que o senhor não sabe com quem está lidando. Não sou,
como o senhor disse de maneira vulgar há poucos instantes, uma das amantes de
Logan. Meu pai é juiz federal e conta com muitos amigos em posição de destaque no
governo. Nenhum deles ficaria satisfeito ao saber que a filha do amigo foi maltratada
por um oficial do exército.
Windham limpou o sangue dos lábios na manga.
— Eu tenho lá a obrigação de acreditar que seja quem diz ser?
Apesar do tom de escárnio, Victoria levantou mais os ombros.
— Não estou acostumada a que duvidem de minha palavra.
— Quem se deita com cães, srta. Amory, não deve se surpreender por ficar cheio
de pulgas.
Victoria o encarou bem dentro dos olhos.
— Que expressão original, coronel. Isso me faz lembrar de algo que o senador
Wilson gosta de dizer. Na vida, não importa o que se conhece, mas quem. Meu pai
convidou o senador e a esposa para jantar, lá em casa, um pouco antes de minha
partida de Boston. Foi uma reunião festiva, ainda mais com a presença do general
Bradshaw e senhora. Era difícil saber se o general estava mais entusiasmado com a
perspectiva de ser pai, ou com a transferência para a capital.
Por um instante, os olhos de Windham faiscaram. Mas então, um ar de resignação

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
estampou-se em seu rosto machucado.
— Tem minha permissão para ir embora, srta. Amory.
— Só irei se for acompanhada pelo sr. Youngblood — disse ela, com firmeza.
— Ele ainda não cumpriu seu dever de cidadão dos Estados Unidos, o de nos
ajudar a localizar índios hostis.
— Meu pai não compartilharia de sua opinião. O sr. Youngblood e eu estamos
noivos e prestes a nos casar. Como o senhor pode ver, não sou mais uma jovenzinha e
meu pai espera, há muito tempo, que eu lhe dê um genro. Aliás, me atrevo a dizer que a
preservação do bom estado de saúde de Logan é de grande importância para meu pai.
A expressão de derrota sombreou o olhar de Windham e Victoria sentiu ter
ganho a batalha. Ficou eufórica. Havia conseguido! Havia salvado a vida de Logan!
Dirigiu-lhe um olhar vitorioso. Em vez de fitá-la com gratidão e apreço, Logan
estava com o semblante carregado.
— Naturalmente, devo respeitar a vontade de um juiz do tribunal federal —
disse-lhe o coronel.
— Fico aliviada em ouvir isto — respondeu Victoria com um sorriso conciliatório.
— Aliás, respeito-a a ponto de apressar o casamento da filha com o homem a
quem ele tanto considera.
— O quê?
— A senhorita me ouviu. Se, de fato, é noiva deste homem, não pode se opor a um
casamento apressado que o colocará, definitivamente, sob a proteção de seu pai. Em
sã consciência, eu não ordenaria a um civil casado que arriscasse a vida pelo país. Mas
não teria o mínimo escrúpulo em exigir isso de um solteiro.
Victoria olhou em volta.
— O senhor quer dizer agora e aqui?
— Tenente, vá avisar o reverendo Donally que precisamos dos serviços dele.
Victoria engoliu em seco. Não se atrevia a olhar para Logan. Embora a tivesse
pedido em casamento, com certeza ele não esperava trocar os votos sob a mira de
pistolas.
— Algum problema, srta. Amory?
— Não, nenhum. Apenas eu esperava me casar com um vestido de noiva —
respondeu ela com um sorriso forçado.
— Ora, esse é um detalhe sem importância quando se realiza uma união desta
magnitude.
Odeio este homem, pensou Victoria.
— Há algo mais que o senhor precisa providenciar, coronel Windham.
— Do que se trata? Quer que meus homens vão apanhar flores para enfeitar a
igreja?
Victoria gostaria de ser homem para poder dar os próprios murros nesse sujeito.
— Quando Logan foi preso, um de seus soldados roubou o relógio dele.
Windham virou-se para Logan.
— Está acusando um de meus homens de ser ladrão?
— Esqueça. Posso comprar outro relógio. Mande apressar Donally — disse Logan

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com frieza.
O que estaria ele pensando, imaginou Victoria, enquanto esperavam pela chegada
do reverendo. Não tinha pressa de descobrir. O importante era o fato de ter lhe
salvado a vida outra vez. Uma pena que não houvesse recuperado o relógio também.

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CAPÍTULO VINTE E UM

— Você sabia exatamente, Victoria, que fraqueza de Windham deveria ameaçar.


Atacou sua carreira militar.
Estas eram as primeiras palavras pronunciadas por Logan depois de se tornar seu
marido. Os soldados os tinham acompanhado ao hotel em silêncio e, agora, ela e Logan
estavam à porta de seu quarto.
— Algo na maneira dele exibir o uniforme engalanado me fez pensar que, depois
do amor pela esposa, a coisa mais importante para ele era ser oficial do exército.
— E você explorou esse ponto sem piedade. Eu não fazia idéia de como você era
uma mulher hábil — comentou Logan.
Victoria observou-lhe o rosto machucado, enquanto refletia sobre o tom
enigmático dele. Logan não aprovara sua interferência, lá na igreja, para salvar a vida
dele? Ou estava aborrecido porque suas ameaças ao coronel Windham tinham
resultado num casamento apressado com ela?
Mas nessa mesma manhã, ele não havia lhe pedido a mão? Aliás, Logan,
praticamente, lhe ordenara para se casar com ele. Ansiosa, procurou algum sinal de
satisfação no olhar dele.
— Logan, você não está aborrecido por termos nos casado, não é?
Ele a acariciou no rosto. Vendo-lhe a ternura no olhar, Victoria percebeu que, se
os lábios de Logan não estivessem tão inchados, ele sorriria.
— Entre. Mais tarde conversaremos — disse ele.
— Sobre o quê? — ela perguntou, tensa.
— Vários assuntos.
— Não podemos tratar deles agora?
— Quero primeiro tomar um banho e me livrar das marcas do tumulto lá na igreja.
— Você quer dizer da luta? Suas roupas estão rasgadas e sujas de sangue.
— Isso faz lembrar como nos conhecemos, não acha?
Victoria pensou na aparência de Logan naquela primeira manhã. Ele parecia uma
fera magnífica e indomável. Observando-o neste momento, concluiu que nada tinha
mudado. Ela perdera o coração para um ser ardente e possessivo, que tinha vencido
suas barreiras.
E era seu marido.
— Logan, entre. Vou cuidar de seus ferimentos.
— Desta vez, minha senhora dominadora, vamos agir a meu modo — disse ele, ao
abrir a porta do quarto e empurrá-La para dentro.
Antes de Victoria poder protestar, a porta fechava-se.
— O que aconteceu?
Só então ela viu Madison vindo a seu encontro.
— Onde está Logan? — a menina quis saber.

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— No quarto dele, tomando banho.
— Ora, ele estava tão limpo. Para que outro banho no meio do dia?
— Ele é homem e homens são criaturas muito estranhas — respondeu Victoria.
— Então, Windham mudou de idéia? Isso é fantástico, pois o homem estava
furioso.
Victoria observou o vestido vistoso e os caracóis da menina.
— Madison, quem escolheu seu vestido e penteou seus cabelos?
— Eu mesma — respondeu ela com orgulho. — Logan me disse que tinha mandado
buscar uma verdadeira dama para me educar. Então, eu quis ficar bonita. O que você
acha? — perguntou, rodopiando.
Uma imensa ternura dominou Victoria. Por nada deste mundo magoaria os
sentimentos da menina.
— Você está linda!

Assobiando, Logan saiu do banho e apanhou a toalha. Sentia-se muito satisfeito


com a vida. Victoria Amory tornara-se sua esposa diante da lei dos homens e de Deus.
Ele temera ter de lutar por um bom tempo para conseguir isso, porém, ela mesma
havia provocado o desfecho feliz.
Jogou a toalha sobre a cama e já ia começar a se vestir, quando ouviu a porta do
quarto abrir-se. Parou de assobiar e enrolou a toalha ao redor da cintura. Sabia quem
acabava de entrar na sala ao lado.
Victoria não tinha ficado satisfeita em adiar a conversa entre eles. Por respeito
a sua sensibilidade, ele se manteria coberto durante os primeiros minutos. Então,
pensou confiante ao passar do quarto para a sala, a noite chegaria bem mais cedo do
que ele se atrevera a esperar.
Parou estupefato. A visita não era a esposa.
— Sra. Windham, que diabos está fazendo aqui? Exibindo um elegante vestido de
seda azul, a mulher sorriu.
— Tentei não vir, mas não resisti. Não se preocupe, meu marido não faz idéia de
onde eu esteja. Não fique bravo comigo, Logan. Sei que lhe causei muitos problemas,
mas pretendo recompensá-Lo.
— Não será necessário. Por favor, vá embora. Esqueceremos que esteve aqui —
Logan, nervoso, apressou-se em dizer.
— Mas eu não quero esquecer. Vamos, Logan, somos ambos adultos. Ouvi falar de
suas aventuras com mulheres. Você é o Casanova de Trinity Falls — gracejou
Athena, começando a desabotoar o vestido.
— Não estou pedindo algo que você já não tenha feito incontáveis vezes. Não
farei exigência social alguma. Afinal, tenho um marido.
— Pois então, volte para ele e o deixe...
— Ele é um cavaleiro melhor do que um amante. Você não compreende? Quero
fazer amor com um homem misterioso que saberá me satisfazer. Meu marido recebeu
ordens para ser transferido. Esta é a única oportunidade para nos amarmos — disse
ela, aproximando-se.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Pare! Não chegue mais perto!
Logan sentiu-se um idiota por proferir palavras tão melodramáticas. Mas nunca
estivera na situação de ser atacado por uma mulher casada.
— Não se esquive — ela sussurrou. — Prometo agradá-lo. Segundo ouvi dizer,
existem certos atos que uma mulher pode desempenhar para os homens. Infelizmente,
meu marido os considera de mau gosto. Mas você, tenho certeza, não é da mesma
opinião.
Logan recuava enquanto Athena se aproximava. Seu vestido estava
completamente desabotoado e ela não usava roupa de baixo, o que lhe expunha os
seios nus. Ele não sentiu a mínima aguilhoada de desejo. Levado pelo pânico, segurou-a
pelos ombros e a empurrou.
A mulher, mais forte do que ele imaginava, resistiu e abraçou-o. Sentindo a
toalha soltar-se e cair no chão, ele praguejou.
Nessa conjuntura perigosa, Logan ouviu a porta da suíte abrir-se novamente. Para
provar sua falta de sorte, devia ser o coronel Windham, empunhando a pistola.
Todavia, ele viu-se diante de Victoria.
Logan tornou a praguejar. Mulher alguma acreditaria que ele era uma vítima
inocente das investidas de Athena Windham. Pela primeira vez na vida, ele tivera a
felicidade nas mãos. Agora, via-se ameaçado a perdê-la.
Não tinha culpa de nada e, custasse o que custasse, haveria de convencer
Victoria disso.
— Sra. Windham, deixe Logan em paz. Ele, agora, é um homem casado e me
pertence. Não pretendo compartilhá-lo com ninguém mais — declarou Victoria.
Atônito com sua calma, Logan livrou-se das mãos de Athena. Percebendo estar
nu, tornou a enrolar a toalha na cintura.
Athena Windham também exibiu um alto grau de compostura, pensou Logan, ao
vê-Ia abotoar o vestido.
— Estou muito desapontada, srta. Amory.
— Sra. Youngblood — corrigiu Victoria, mas levada pela curiosidade, perguntou:
— Qual a razão de seu desapontamento?
— O fato de ter se casado com o Pirata Ardente.
Logan arrepiou-se ao ouvir o apelido ofensivo. Tinha esperado que Victoria jamais
o conhecesse.
— Na verdade, isso não é justo — prosseguiu Athena, ao dirigir-se à porta. —
Homens como Logan Youngblood não foram feitos para se tornarem maridos comuns.
Deveriam ser livres como garanhões sem donos. São os sonhos de todas as mulheres
nas horas escuras antes do amanhecer. E uma vez na vida, se a mulher tiver sorte,
fará amor com ele.
Athena saiu e fechou a porta.
— Victoria, me deixe explicar.
— Sou toda ouvidos.
— Essa mulher entrou em meu quarto, sem ser convidada, e atirou-se em mim.
— Entendo.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Eu estava nu porque acabava de sair do banho.
— Faz sentido.
— Acredita em mim?!
— Claro.
Logan semicerrou os olhos. Desde a primeira vez em que ouvira a voz de Victoria,
vinda do lado de fora da cela no forte, tinha havido um sem fim de altercações entre
eles. Como, agora, ela aceitava facilmente o fato de encontrá-lo nu e nas mãos de
outra mulher?
— Por que acredita em mim? — indagou ele, segurando a respiração.
Ela lhe diria que suas razões baseavam*se no amor e na confiança por ele? Ou a
verdade seria que ela não se importava o suficiente com ele e, portanto, lhe era
indiferente como agia?
— Acredito em você porque algo semelhante aconteceu a mim.
— Como assim?
— Bem, meu desastre não foi da mesma escala que o do Pirata Ardente sendo
seduzido por Athena, a deusa grega da guerra.
— Maldição, Victoria! Não repita mais isso! Pelo menos, perto de mim.
Ela o fitou com ternura imensa.
— Mesmo antes de Constance mencioná-lo, eu já o considerava meu pirata
particular.
Logan reconheceu um certo mérito no apelido ofensivo. Aceitaria qualquer coisa
que agradasse a mulher.
— Você me falava sobre uma cena comprometedora de seu passado — disse ele,
aproximando-se de Victoria e percebendo que ela estava com camadas demais de
roupa.
— Pensando bem, há algo comum entre sua experiência e a minha. Eu estava em
meu quarto e vestia apenas camisa e calções. Quando mamãe e as amigas entraram lá,
em resposta aos gritos de socorro do sr. Threadgill, ele estava sem calça.
Logan a encarou com olhar sombrio. Mas pela expressão divertida de Victoria,
percebeu que o incidente não era sobre uma jovem e o amante sendo apanhados em um
encontro ilícito. Mesmo assim, imaginou se o sujeito não havia tentado se aproveitar
dela.
— Acho bom me contar essa história direitinho.
— Tudo não passou de um mal-entendido. Numa tarde e por engano, o sr.
Threadgill subiu até a janela de meu quarto, pensando ser o de minha irmã. Levava uma
rosa para ela. Pretendia colocá-la em seu travesseiro, imagino. Só depois de estar
dentro do quarto, ele percebeu o engano.
— E como ficou sem calça?
— Eu a tirei.
Logan segurou Victoria pelos ombros.
— Pare de me torturar, meu bem, e explique como foi isso.
Victoria suspirou e deixou Logan puxá-la de encontro ao peito, onde encostou a
face.

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
— Uma abelha saiu voando de entre as pétalas da rosa e subiu pela perna da calça
de Threadgill.
— Não me diga! — Logan exclamou, sacudindo um pouco o corpo. — E você tentou
ajudar, tirando a calça do homem a fim de pegar a abelha?
— Está rindo de mim?
— Não, meu bem — mentiu ele.
Uma parte da despreocupação de Logan desapareceu.
Lembrava-se de quando tinha entrado no quarto do irmão e se deparado com
Robeena lá. A cena era muito semelhante à que Victoria interrompera com Athena
Windham.
As dúvidas, que vinha tendo ultimamente sobre a noite terrível, intensificaram-
se. Como se intuísse a inquietação de Logan, Victoria soltou-se do abraço e o fitou.
— Alguma coisa errada?
— Estou pensando num episódio de meu passado, envolvendo meu irmão mais velho
e minha noiva.
Sua expressão de interesse o incentivou a prosseguir.
— Eu os apanhei juntos como você me descobriu com Athena.
— E você ficou muito magoado. Seu irmão conseguiu explicar a situação?
— Minha noiva estava na cama dele e eu não esperei para ouvir explicação alguma.
— Agora, começa a imaginar se não deveria ter feito isso, não é?
— Exato, meu bem.
— Essa sua noiva foi quem você abandonou no altar?
— Deus do céu! Como descobriu isso?
— Constance me contou — respondeu Victoria.
— Maldição! Sei que Martin a ama com loucura, mas essa mulher é uma abelhuda!
— Ela estava apenas me avisando sobre sua reputação de mulherengo. Constance
não sabia que já era tarde demais para seus conselhos.
Um canto gelado do coração de Logan começou a derreter. Com as mãos atrás do
pescoço de Victoria, puxou-a para dar-lhe um beijo ardente. Sentindo suas carícias
suaves no peito, temeu não controlar a paixão que ela lhe despertava. O contato de sua
língua na dele o fez gemer e aprofundar o beijo.
Quando Logan afastou a boca da sua, sentia-se completamente excitado e ansioso
para penetrar seu corpo. Com um suspiro de frustração, afastou-a dele.
— O que aconteceu? Por que você parou? — Victoria indagou com expressão
confusa.
— Meu bem, antes de alguém mais invadir esta suíte, preciso passar a chave na
porta.
Um ar de compreensão estampou-se em seu rosto e ela sorriu.
Nesse momento, vendo-a com sua roupa elegante, as faces coradas, os olhos
verdes brilhando, a mão trêmula, Logan Youngblood descobriu amá-la perdida e
irrevogavelmente.
Diante dele estava a mulher que não só havia lhe salvado a vida duas vezes como
também livrado-o da solidão que, sorrateiramente, tinha invadido a alma dele.

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— Eu te amo, Victoria Amory Youngblood.
Victoria não disfarçou a surpresa e Logan maldisse a si mesmo pelo atraso da
confissão. Devia tê-la feito, ao lado das piscinas de água quente, onde seduzira
Victoria.
Ansiosa, ela não perdeu tempo em tirar a jaqueta.
— Eu também te amo, meu pirata corajoso.
Ele estranhou o fato de se comover ao ser tratado pelo apelido odiado.
— Você faz idéia do poder que exerce sobre mim, meu bem?
— Como pode dizer isso se me sinto como uma folha frágil sendo levada pela
ventania de uma tempestade? — perguntou ela, ao livrar-se da blusa.
— Ai, meu bem, a tempestade está dentro de mim e na iminência de desencadear.
Logan ajudou-a a despir o resto das roupas e, em seguida, carregou-a até a cama.
Em instantes, ele a tinha como queria, deliciosamente nua e contorcendo-se sob as
carícias dele.
Com os dedos, Logan procurou e achou o canal aveludado e úmido, feito só para
ele. Victoria estremeceu e ele a beijou com paixão. Mas quanto mais a acariciava, mais
desejava sentir-lhe a pele macia e os mamilos excitados. Saboreou-os com a avidez de
um homem faminto.
— Ai, Logan, não sei quanto mais vou agüentar — Victoria queixou-se, abrindo as
coxas.
Ele queria esperar mais, acirrar o desejo de ambos ao máximo, mas não foi capaz.
Era escravo desta mulher e não conseguiria retardar, nem por um segundo, o retorno
para o interior de seu corpo, cujo aconchego ficara marcado na mente dele.
Quando a penetrou, o fez com um único impulso rápido. Victoria gritou-lhe o
nome, forçando-o a render-se à carência primitiva que os levaria para além dos limites
do controle.
Ele ouviu seu grito vitorioso ao alcançar o êxtase e aspirou seu perfume feminino,
enquanto seu corpo estremecia de prazer. Abrigado completamente em seu âmago, ele
experimentou a própria ascensão ao paraíso. Num único fôlego, chamou seu nome e
jurou-lhe amor.
Quase imediatamente, Logan lamentou a posse quase selvagem da esposa. Com
sentimento de culpa, retraiu-se de seu corpo. Tinha consciência de haver agido, com
ela, de maneira carnal e jamais usada com outra mulher. Sem dúvida, costumava
demonstrar mais consideração por rameiras, em face do que fizera com Victoria.
Cheio de remorso, observou o corpo lindo da companheira. Desejava estreitá-lo
de encontro ao peito, mas temia sua reação. Suas coxas ainda estavam afastadas e
ele, maldição, sentiu nova pontada do desejo.
Por Deus, ele era um caso perdido.
— Você está pretendendo ir a algum lugar?
Sua voz morosa o envolveu como uma brisa morna.
— Não — respondeu ele num tom neutro e à espera de uma reação explosiva.
— Ainda bem. Sabe, não gostei muito da primeira vez em que fizemos amor e...
— Meu bem — interrompeu ele, ansioso por impedir suas reclamações justas. —

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
Não sei o que deu em mim, mas prometo que será diferente na próxima vez.
— Próxima vez? — ela repetiu, no mesmo tom preguiçoso.
Por Deus, não era possível que Victoria se mostrasse tão aborrecida, a ponto de
não lhe dar outra oportunidade para mostrar como podia ser um amante atencioso.
— Naturalmente, haverá a próxima vez — apressou-se ele em afirmar.
— Mas esse é o ponto. Não quero que esta vez já tenha terminado. Por que não
volta para junto de mim e recomeça a me beijar? Desejo tanto acariciá-lo e que você...
— Sim? — perguntou ele, incendiando-se.
— Quero que você toque meu corpo inteiro.
Uma alegria imensa o inundou, ao perceber ter provocado a satisfação da esposa.
Ela continuava desejando-o.
— Vou beijar cada centímetro seu — prometeu ele.
— É mesmo?
— Adoro sua pele dourada e linda. Quero saborear cada pedacinho dela.
O rubor espalhou-se da ponta dos seios até atingir o rosto de Victoria.
— Sei que é meu marido, mas é muito perturbador quando me olha desse jeito e
diz essas coisas.
— Gosto de perturbá-la, Victoria.
— E você precisa saber que minha pele não é dourada. Se a luz fosse melhor,
veria que sou coberta de sardas.
— Vi cada uma delas quando fizemos amor lá nas piscinas — contou Logan,
sorrindo e ao estalar um beijo em sua cintura.
— Logan!
— Sim, meu amor — sussurrou ele, começando a usar as mãos e os lábios em
afagos sensuais.
—Ai!
— Gosta disso? Eu estava morrendo de vontade de acariciá-la assim.
— Ai, meu Deus!
Nos instantes seguintes, Logan viu-se embalado pelos suspiros e gritinhos da
esposa adorável.
Ele se sentia como se houvesse, realmente, capturado um passarinho vermelho e
ensinado-o a cantar só para ele. Os anos de solidão tinham terminado. Victoria o
libertara de uma prisão muito mais escura do que as construídas pelos homens. Eles
dois e Madison viveriam num mundo de luz e felicidade. Para ele, o futuro brilhava
como uma moeda de ouro. Até a idéia de reconciliar-se com o irmão já não parecia mais
impossível.
— Logan?
Ele percorreu os dedos ao longo de sua espinha.
— O quê?
— Você vai construir uma casa para nós. Um hotel, ainda que bom como este, não
é um lugar para Madison crescer.
— Calculo que vai ser preciso uma mansão para acomodar seus livros.
Victoria apoiou o rosto no peito dele.

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— Não. Basta uma casa para abrigar nosso amor e onde Madison possa usufruir
dele. Mais tarde, nossos filhos também serão criados nela.
Comovido, Logan fechou os olhos.
— Haverá também lugar para seus livros, meu bem. Construirei uma biblioteca
grande o suficiente para guardar todos os volumes que você trouxe e outros tantos.
— Meu querido, eu me contentaria em morar numa barraca, caso você não
pudesse me oferecer nada melhor.
— Ah, é? Mas quando me considerava um fora-da-lei, não titubeou em me mandar
embora. Precisa compreender que tenho os meios para cuidar de você pelo resto da
vida.
Victoria ergueu a cabeça e o beijou nos lábios.
— Você nem pode imaginar o quanto me arrependi por ter feito isso. Quando
percebi meu erro, não sabia onde procurá-lo. Pensei que o tinha perdido para sempre.
Logan a estreitou entre os braços.
— Nós dois cometemos enganos.
— Depois, já aqui em Trinity Falls, fiquei furiosa com você por ter me feito
passar por boba, na avaliação falsa de seu caráter.
— A certa altura lá na trilha, desisti de convencê-la de que eu não era um
bandido.
— Desculpe.
— Só isso? Estava esperando algo mais elaborado.
— Estou disposta a satisfazê-lo.
— Ótimo — disse Logan, rolando sobre ela. — E quanto a me considerar um
simplório, um fora-da-lei, por achar que eu queria roubar o ouro de Lobo da Noite e
que fora ao banco a fim de assaltá-lo?
— Ah, Logan, perdoe-me por ter duvidado de você.
— Confia plenamente em mim?
— Provei isso ao não procurar uma pistola para atirar em você, quando encontrei a
sra. Windham em seu quarto.
— Eu não sabia se você agia daquela forma porque confiava em mim, ou porque
não se importava comigo.
— Ai, meu querido, eu me importo tanto com você!
— Graças a Deus.
Victoria refletiu sobre a vulnerabilidade inesperada de Logan. Ele era forte,
destemido e inseguro. Ele não gostava de reconhecer tal fraqueza.
— Caso se sinta mais feliz, meu querido, prometo atirar em você se o apanhar
com outra mulher nos braços.
Ela sentiu Logan rir em lugares interessantes de seu corpo.
— Eu já me sinto muito feliz ao saber que você me pertence.
— Quando descobriu que me amava, Logan?
— Bem, eu a quis desde o início.
— Imagine! Você antipatizou comigo no primeiro instante.
— Vamos com cuidado, meu bem. Precisamos reconstituir a história com precisão

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CH 107 Atos de Sedução Pat Tracy
para contá-la a nossos filhos. Quando saí da cela e pus os olhos em você, notei logo
tratar-se de uma mulher bonita.
— Você não demonstrou gostar de mim. Aliás, não escondeu o desapontamento
por eu não ser o menino imaginado por você.
— Admito ter visualizado um garoto corajoso e cheio de energia. No lugar dele,
deparei-me com uma mulher graciosa, com sotaque de Boston e um carroção cheio de
livros.
— Que mal há em ser de Boston? Você também é de lá.
— Eu tinha uma certa má vontade com o lugar. Mas isso é coisa do passado.
— Tem certeza?
— É sua cidade natal, meu bem. E para mim, isso a transforma no paraíso.
Com Victoria entre os braços, Logan estava encontrando dificuldade para
conversar.
— E quanto à biblioteca que você vai construir para mim?
— O que tem ela?
— Pense um pouco. Seria muito egoísmo mantê-la só para mim. Trinity Falls
precisa de uma biblioteca pública.
Pensar? Logan mal podia respirar. Como iria pensar?
— Sim, meu bem. Qualquer coisa que você diga.
Essas tinham sido suas palavras ao tentar estabelecer a ordem de comando no
início da viagem. Mas as tentativas para manobrar e reformar Logan eram águas
passadas. Enquanto as carícias dele se tornavam mais íntimas e audaciosas, Victoria
Amory Youngblood entregou-se à paixão de seu marginal bem-amado.
E a uma aventura mais turbulenta e espetacular que se poderia imaginar.

F I M

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