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1 Na Itália da primeira idade moderna, os condottieri eram os chefes das “companhias livres” (Compagnie di
ventura) de mercenários que contratavam os seus serviços com os signori (os reinantes das cidades-estado
italianas) e frequentemente tornavam-se eles próprios signori da cidade ou do estado regional que serviam (é
o caso de Francisco I Sforza, condottiero ao serviço do Duque de Milão, que se tornou ele próprio Duque de
Milão, substituindo a dinastia anterior, os Visconti).
2 Georges Sorel (1847-1922), engenheiro francês e teórico do sindicalismo revolucionário, cujo pensamento
influenciou tanto o movimento anarcossindicalista como o fascismo italiano (pelo menos na sua fase inicial).
Gramsci faz aqui referência ao “mito” da “greve geral” e à sua capacidade de “suscitar e organizar” uma
“vontade coletiva”. Na mesma página, Gramsci sublinha como o pensamento de Sorel tenha como base e ponto
de referência a organização sindical, e não o partido político.
Filosofia Política 22/23 2 Giovanni Damele
subido um colapso perigoso e ameaçador mas não decisivo e catastrófico e seja necessário
reconcentrá-la e robustecê-la, e não que uma vontade coletiva tenha de ser criada ex novo,
originalmente, e endereçada em direção a objetivos certamente concretos e racionais, mas
cujo carácter concreto e racional ainda não foi verificado e criticado por uma experiência
histórica efetiva e universalmente conhecida [...].
[O] jacobinismo3 [é] exemplificação de como se tenha formado concretamente e como tenha
operado uma vontade coletiva que pelo menos em alguns sentidos foi criação ex novo,
original.
[...]
A conceção de Croce4, da política-paixão, exclui os partidos, porque não se pode pensar uma
“paixão” organizada e permanente: a paixão permanente é uma condição de excitação e de
espasmo, que determina inaptidão para agir [...].
[Caderno 13 (XXX)]
Maquiavel não é um puro cientista; ele é homem de parte, de paixões poderosas, um político
em ação, que quer criar novas relações de força e portanto não pode não se preocupar com
o “dever ser”, embora não entendido num sentido moralístico [...]. A oposição Savonarola-
Maquiavel não é oposição entre ser e dever ser [...] mas entre dois dever ser, aquele abstrato
e confuso de Savonarola e aquele realístico de Maquiavel, realístico mesmo que se não tenha
tornado numa realidade imediata, pois não se pode esperar de um indivíduo ou de um livro
que mudem a realidade, mas apenas que a interpretem e que indiquem a direção possível
para a ação.
[Caderno 13 (XXX)]
Edição de referência: Antonio Gramsci, Quaderni del Carcere, Edição crítica do Istituto
Gramsci, (Valentino Gerratana, ed.), Einaudi, Turim, 1975 (segunda edição), Vol. II
(Cadernos 6-11), p. 1022, e Vol. III (Cadernos 12-29), pp. 1555-6, 1558-9, 1567, 1577-8.
3 Referência ao Club des Jacobins, grupo politico radical da Revolução Francesa cujo líder era Maximilien de
Robespierre. Do ponto de vista de Gramsci, os jacobinos são citados aqui como exemplo precoce de
organização política com algumas características (embora rudimentais) do partido político de massa moderno
(uma elite partidária com uma capacidade de mobilização das massas).
4 Benedetto Croce, filosofo italiano (1866-1952). Gramsci faz aqui referência à interpretação de Croce da obra
de Maquiavel, que coloca ao centro o tema das “paixões” e da “política como paixão”. Para Gramsci, este é sem
dúvida um aspeto relevante, mas não até ao ponto de reduzir a política à paixão. A ideia de política como
reflexão racional e organização é o fulcro da interpretação de Gramsci do partido político como “príncipe
moderno”.