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HISTÓRIA POLÍTICA:

NOVAS PERSPECTIVAS DE
ABORDAGENS
Uma história da História política
 
1. A velha História Política
Tradicional
✔ Bernard Guenée e Sirinelli, “a história política,
abandonada, fazia-se impor, triunfante” (L'histoire
politique. p. 301).

✔ A história política centrava-se sobre o Estado, as


instituições, as lutas pelo poder, por meio de uma
narrativa cronológica permeada de uma erudição
desprovida de alma, de densidade e de profundidade
explicativa. (P. Balmand. Le renouveau de l'histoire
politique. p. 365).

✔ A história política não representava senão uma


“crônica melhorada do Estado” (p. Chaunu. História,
Ciência Social). Para esse autor, o que faltou à
A simples acumulação e ordenação de dados em ordem
cronológica, a narrativa de “fatos”, o destaque para o
episódico, casual ou anedótico, a biografia dos grandes
personagens, a descrição de batalhas monumentais, a
relação entre as nações centradas na diplomacia, a
identificação da História com a edificação da ordem
nacional, o positivismo metodológico, foram alguns dos
pontos mais destacados pelos críticos desse campo da
história.

Em sua maioria, a leitura dos trabalhos de história


política não era nada atraente. Em geral, factual, ela
enumerava fatos e datas sem grande preocupação de lhe
dar um sentido. Institucional, ela desmontava as
engrenagens, mas descrevia apenas os órgãos de um
corpo inerte. A vida, a carne e o sangue que procuravam
os historiadores, não se encontravam em suas autopsias
2. A
contestação

Revue de Synthèse Historique


(1901-Henri Berr), em que se
criticava a história tradicional,
a “história historizante”, ou
“história episódica”, opondo-
lhe uma síntese histórica. Seu
alvo era sobretudo a história
política de Seignobos e
Barraclough, em seu livro Tendências
Atuais da História (1978), aponta a
influência do marxismo sobre a
reflexão histórica, a partir de 1917,
como elemento primordial para que o
primado do político deixasse de ter vida
própria.
Afinal, a ação dos governos não eram,
em realidade, produto ou reflexo das
correntes econômicas mais profundas?
Poder-se-ia interpretar o processo
histórico sem se fazer apelo ao conflito
Papel do novo historicismo ou
historismo, ligado às obras de Simmel
(1858-1918), Dilthey (1833-1911) e
Windelbland (1848-1915), e em parte,
Max Weber (1864-1920), tendo em
Meinecke (1862-1954) e Troeltsch
(1865-1923), seus dois maiores
historiadores. Se não era questão para
o historiador em apreender os fatos
de maneira empírica; se a única
possibilidade de compreender o
passado era o reviver em espírito,
entãoLeopol
porquevonse limitar
Ranke aos
(1795-1886: cada
acontecimentos
época tem suaspolíticos?
características
próprias necessárias de serem
captadas - como realmente foi.
A decisiva mudança, no entanto, ocorreu a partir de
1929, com a criação dos Annales. [Annales d'histoire
économique et sociale; Annales d'Histoire Sociale (1939);
Annales. Économies. Sociétés. Civilisations (1946-1993);
Annales. Histoire, Sciences Sociales (1994 até hoje)].
Entretanto, antes mesmo do surgimento dos
Annales, Lucien Febvre em seu trabalho -
História do Franco-Condado, publicado em
1912, definia sua atitude como historiador e
sobretudo em direção de uma nova proposta e
metodologia de História:

  ...
aquilo que nos atrai hoje em dia, e que nós
procuramos curiosamente no passado, não é
tanto a história das formações políticas para
sempre desaparecidas, instituições abolidas,
soberanos adormecidos em seus túmulos - do
que aquela, totalmente viva em nós, no mais
íntimo de nosso ser, das maneiras de viver e
pensar [...] das maneiras de sentir, de imaginar,
de agir, que são nossas agora, do fato de nossos
primogênitos - de todo este tesouro de
qualidades morais, de virtudes de caráter, de
Para os Annales, “a política era uma
pequena coisa na superfície do real”.

L. Febvre, na resenha sobre a tese de


Braudel: O Mediterrâneo no tempo de
Filipe II afirmava que a história
política não representa senão “uma
história de superfície. Uma espuma.
Vagas de crista, que vem animar
superficialmente o poderoso
movimento respiratório de uma
massa oceânica”.
Em março-abril de 1988,
Annales (revista 43(2)) –
Editorial: “Histoire et
sciences sociales. Un
tournant critique?”
Período de incertezas,
críticas ao que
estigmatizavam na
historiografia atual: “o
retorno da narrativa,
do acontecimento, do
político, da biografia”.
Em finais de 1989 (nov.
dec), em seu editorial,
os Annales “tentando a
experiência”
procuravam redefinir
um projeto de momento,
distinto da fidelidade às
ambições que a revista
possuía desde seus
fundadores. Nesse
número, aparecia um
artigo de G. Levi sobre
os usos da biografia!
1) Retomar e descobrir as grandes contribuições
do passado, como a de Seignobos, A. Siegfried,
G. Weil, Touchard e Chevalier.
2) Contato da história com outras disciplinas,
como a ciência política, a sociologia, a
linguística ou a psicanálise.
3) A pluridisciplinaridade possibilitou o uso de
novos conceitos e técnicas de investigação,
bem como da construção de novas
problemáticas. A aproximação com a
Antropologia cultural e política (Geertz,
Sahlins, Balandier). Poder e política passaram
também para o domínio das representações
sociais, colocando-se a questão do poder
simbólico (Bourdieu; Le Goff).
4) Buscar fora da historiografia os modelos e a
sustentação teórica para repensar as relações Estado-
Sociedade. Tocqueville, H. Arendt e Weber,
diretamente ou via R. Aron, foram esses esteios. Esses
autores foram sobretudo aqueles mais ligados à
história contemporânea: Furet, Vovelle, Marc Ferro e
M. Agullon.
5) Foucault: retorno à política se estendeu em direção
à micropolítica; a luta pelo poder no interior da
família, da escola, das fábricas; os saberes enquanto
poderes; os poderes; em suma, a história política
passou a enfocar no cotidiano de cada indivíduo ou
grupo social as infinitas astúcias dos poderes.
6) Novas correntes marxistas: conceitos gramscianos,
como hegemonia, bloco histórico, intelectuais
orgânicos e tradicionais e althusserianos - autonomia
relativa, aparelhos ideológicos de Estado. Autores
A história política visa a se "inscrever numa perspectiva
global onde o político é um ponto de condensação" (R.
Rémond, p. 382). “É o lugar de gestão da sociedade global,
que dirige em parte as outras atividades; define seu
status, regulamenta seu exercício”. “É o ponto para onde
conflui a maioria das atividades e que recapitula os
outros componentes do conjunto social”(p. 447). Na visão
de Rémond, se “o político é dotado de razão de ser, tanto
como o econômico ou social, é também o elemento mais
concreto em que cada um se defronta na vida, que
interfere com sua atividade profissional ou se imiscui em
sua vida privada”. (p. 380).

Para Rosanvallon: “É o lugar onde se articulam o social e


sua representação”.
De que é feito, portanto, o político?
• Para Rémond, o político se apresenta como
um jogo complexo de interações entre seus
componentes: a dimensão institucional, as
forças em ação que disputam o poder, a
sociedade considerada como um campo de
força capaz de intervir no político; a
relação entre a política e a sociedade civil;
as ideias, os sentimentos que agitam os
indivíduos, o imaginário, o irracional.
• Para Berstein & Milza, é no cruzamento
entre os problemas de poder, as aspirações
sociais e a procura de uma forma de
transcendência que se situa o lugar do
político.
• Para P. Burke, em A Escrita da
História, a história política
apresenta-se dividida (nas
instituições e entre os historiadores)
entre dois tipos de preocupação:
com os centros de governo (poder) e
com as raízes sociais (da política e do
poder). Em geral, nas pegadas de
Foucault, o interesse maior é pelas
investigações sobre as formas
concretas que assume a luta pelo
poder (e o seu exercício) em
instituições diversas que não são
obrigatoriamente políticas. Os
historiadores políticos não mais se
restringem à alta política, aos líderes,
às elites.
• J. Le Goff: o questionamento dos últimos vinte anos
volta-se para o político, como haviam identificado e
criado os gregos da Antigüidade (“a arte de alcançar
decisões para uma discussão e de obedecer a tais
decisões como condição necessária a uma existência
social civilizada”, Moses Finley. La Découverte, 1983,
p. 13).
• Influência da obra de Aristóteles – Política, que deve
ser considerada como o primeiro tratado sobre a
natureza do estado e sobre as várias formas de
Governo, com a significação mais comum de arte ou
ciência do Governo. E não a política, tecido de
acontecimentos e atividade específica.
✔ O que legitima este retorno do político,
manifesta-se sob uma forma
profundamente renovada,
especialmente, quanto ao próprio
conceito: história do político e não da
política.

✔ Um campo ampliado e polimorfo


aberto a todos os domínios da gestão do
poder; uma história cujo conceito
fundamental e pluridisciplinar é aquele
de poder.

✔ Este conceito não negligencia nem o


poder econômico, nem o prestígio
social, nem o poder ideológico, nem o
• Para Berstein, o objeto do político referia-se
essencialmente à questão da distribuição e repartição
da autoridade e do poder no interior de um grupo
humano dado, revelando uma amplidão excepcional,
que permite a análise de comportamentos individuais
e coletivos, seus efeitos, percepções e sensibilidades e
alargando o interesse para fenômenos de transmissão
de crenças, normas e valores.
✔ Sirinelli (visão semelhante): o “objeto de estudo
da história política é a questão da transmissão e
repartição da autoridade e do poder no seio de
um grupo humano dado”.
✔ “É a dupla dimensão, tanto da atuação quanto do
pensamento, do homem que se constitui o objeto
da história política”. Da mesma forma, é a dupla
dimensão individual e coletiva que também deve
ser levada em consideração. Daí as relações que
podem ser estabelecidas entre a história política
e a história cultural.
✔ Para Elton, professor de História Constitucional
da Inglaterra em Cambridge, falecido em 1994,
em seu cerne, a história política objetiva estudar
a maneira como os grupos humanos tentaram,
ao longo dos anos, organizar suas vidas e
conduzir seus negócios em relação com outros
grupos distintos de suas sociedades.

✔ A história política deve estudar a história dos


homens e mulheres na ação pública, não
devendo, no entanto, se confinar apenas na
descrição desta ação. Ela deve entendê-la.
Para Rémond, em artigo recente
(Axes et Méthodes) torna-se
necessário reconhecer o campo
do político, inventariando aquilo
que lhe faz parte por direito e
traçando seus contornos.

Nesse sentido, os fenômenos


políticos são flexíveis e móveis;
não há fronteiras naturais do
político. Ele pode se dilatar até
englobar a quase-totalidade dos
fenômenos sociais.

Se o slogan “Tudo é político” que


teve um momento favorável, na
década de 1968, formulava uma
pretensão excessiva, ele exprimia
Numa perspectiva mais crítica, a visão de Sirinelli :
“O importante é menos a reabilitação - legítima - da
história política do que a relegitimação do objeto
político e sua inserção no ecúmeno do historiador”.

Em outras palavras, é menos a história política


tradicional que reaparece na superfície, menos ainda
a vontade de fazer uma chave de inteligibilidade
única ou, pior ainda, o fundamento de uma história
total e hegemônica, que a redefinição de uma história
do político, que se afirma, depois de alguns anos.

Trata-se de um projeto que considera a política como


tendo uma história própria e que vê neste projeto um
terreno favorável de experiência para apreender as
diferenças cronológicas, as relações entre estruturas e
contingências, entre estratégias individuais e coletivas,
em síntese, tudo aquilo que se oferece atualmente ao
Campos da história política:
• estudo institucional do Estado
e do estudo do poder;
• conceito de mentalidades;
• história das representações e
aquela dos mitos – poder
simbólico;
• Trajetórias Políticas;
• História dos intelectuais;
• Culturas políticas;
• História das ideias políticas;
• História do conceito político;
• História das Linguagens

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