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INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS: CONTEXTO HISTÓRICO, AUTORES

CLÁSSICOS E MATRIZES METODOLÓGICAS


LEONARDO BIS DOS SANTOS

O CONTEXTO DE NASCIMENTO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS: DIMENSÃO POLÍTICA E


ECONÔMICA

A transição do feudalismo para o capitalismo marca um ponto de inflexão na história da


humanidade no sentido de que há uma ruptura em várias dimensões, dentre as quais
destacarei a científica, a econômica e a política, dadas às inter-relações com outros
campos sociais. Os eventos ocorridos a partir do século XV estão elencados em um eixo
vinculados entre si, não podendo dessa forma ser compreendidos isoladamente
(TOMAZI, 2000; QUINTANEIRO et al., 1999).
O século XVIII é marcado pelas Revoluções Industrial e Francesa, alterando
significativamente o cenário econômico e político, respectivamente. Tais eventos foram
responsáveis pelo fortalecimento da burguesia e do capitalismo (ANDERY et al., 1994).
O contexto do surgimento da indústria influenciou as migrações campo-cidade e o
redesenho espacial e formação desordenada de grandes centros urbanos, assim como
todas as conseqüências sociais do crescimento urbano sem planejamento. A
industrialização ainda foi decisiva no processo de exploração da força de trabalho
humano e o redimensionamento da divisão do trabalho.
Como conseqüência da Revolução industrial a sociedade passa a se evidenciar como um
forte ponto de análise, como um objeto passível de sofrer investigações.
Sócio-politicamente a emergência da burguesia enquanto classe e posteriormente o
surgimento da classe operária – fruto do advento da industrialização – complexifica o
campo político ao incluir novos agentes no contexto social. Após as vitórias das
revoluções burguesas na Europa e nos EUA o centro de conflito social interno das
nações passara do poder monárquico vs. burguesia – intermediada pelo clero e nobreza
– para burguesia vs. proletários – intermediada pela luta pelo controle dos meios
legítimos do uso da força.

O CONTEXTO DE NASCIMENTO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS: DIMENSÃO CIENTÍFICA


Do ponto de vista científico a transição do feudalismo para o capitalismo é marcada pela
tarefa de reposicionar o Homem frente ao universo. A visão ocidental de ciência na
Idade Média se baseava no teocentrismo – centrada na religião cristã. A partir do século
XV, contudo, o movimento Renascentista forja a passagem para a visão antropocêntrica
aliada a componentes do projeto de razão humana.
Tal passagem é exemplificada pela obra de Francis Bacon (1561-1626). Pensador inglês
cuja vida pessoal foi marcada pela controvérsia, centrou sua produção científica na
reação à metafísica, contudo estabeleceu uma relação confusa com a escolástica. Seu
principal legado, muito aquém dos resultados de suas pesquisas, foi a abordagem
empiricista. Em sua perspectiva somente partindo dos fatos concretos, a partir da
experiência, chega-se às formas gerais. A indução – caminho metodológico pelo qual
parte-se de uma série de fenômenos particulares a fim de extrair generalizações – já era
conhecida desde os gregos, contudo com Bacon ganha uma amplitude singular
(ANDRADE, 1999).
Em uma direção inversa, na França, René Descartes – cujo nome em latim era Renatus
Cartesius, daí sua descendência ser conhecida por cartesianismo – constrói
argumentação que se tornaria célebre por sua posição racionalista. Sua máxima cogito
ergo sum – penso logo existo – transformou-se em rótulo intelectual e é uma
manifestação da adoção do método dedutivo – caminho metodológico que parte de uma
generalização para chegar a fenômenos particulares. Partindo da dúvida hiperbólica (a
hipótese do gênio maligno), Descartes acreditou poder chegar à certeza irrefutável e
desencadear, baseado no já conhecido, novas certezas (PESSANHA, 2004). O
racionalismo cartesiano se pauta em quatro pilares:
1) não aceitar por verdadeiro se não aquilo que se apresenta clara e
distintamente ao espírito; 2) dividir as dificuldades em tantas partes quantas
seja possível para melhor soluciona-las [princípio da análise]; 3) ordenar os
pensamentos dos mais simples para os mais complexos; e 4) fazer enumerações
completas de sorte a nada omitir. (PROTA, 2000, p. 124).
Os quatro pilares do pensamento cartesiano, com destaque para o princípio de análise,
se tornaram caros à Ciência.
Mas nenhum isoladamente obteve tamanha inserção e extensão no cenário científico
quanto o positivismo. Baseado em três premissas fundamentais, a saber, aplicadas às
ciências sociais prega que: 1) a sociedade é regida por leis naturais; 2) a sociedade pode
ser assimilada epistemologicamente à natureza e, portanto, passíveis dos processos
empregados às ciências naturais, e; 3) as ciências da sociedade devem preservar
observação e explicação dos fenômenos de forma objetiva e neutra (LÖWY, 1987).
Inicialmente o positivismo aparece como uma reação ao absolutismo com as obras de
Condorcet e Saint-Simon, contudo é a partir da obra de Auguste Comte (1791-1857) –
transfigurando o caráter contestador de seus precursores – que a corrente positivista
ganha musculatura.
É nesse contexto econômico, político e científico que as Ciências Sociais surgem. Tais
elementos sociais estão presentes nas primeiras obras de autores clássicos da então nova
ciência. Segundo Löwy (1987) as obras de Marx, Weber e, principalmente, Durkheim
incorporam em graus distintos elementos positivistas – e nesse sentido Durkheim é seu
principal expoente entre os clássicos das Ciências Sociais – demonstrando, entre outros,
como o contexto social influencia a produção científica – seja como uma adoção ou
reação a um status quo.
A seguir passo a apresentação das três ciências que formam as Ciências Sociais.

ANTROPOLOGIA
A antropologia pode ser descrita como a ciência do comportamento humano, cuja fonte
cognitiva reconhece identidades isoladas de distintas sociedades, marcadas por tradições
culturais específicas. Segundo Foley (1996) o comportamento humano se destaca pela
“capacidade da mente humana de gerar uma quase infinita flexibilidade de reações,
através de seu potencial simbólico e lingüístico” (FOLEY, 1996, p. 24). Sua
especificidade se concentra nas variações dos comportamentos das sociedades, tendo no
conceito de alteridade – investigação do outro, aquele que é essencialmente diferente de
mim – parâmetro para suas análises. Para Brandão (1987) o que demarca o campo de
estudos da antropologia são os
Métodos de abordagem, formas de formular perguntas, estratégias próprias de
conduzir a investigação, ênfases na busca de explicações [...]. Mais do que
sempre pretender explicar ‘tudo de todas as coisas’ a respeito da sociedade que
investiga, a Antropologia opta por explicá-las o mais possível, desde o ponto de
vista das relações que produzem a totalidade dos fenômenos sociais de que são
parte. (BRANDÃO, 1987, 48-49).
As origens da antropologia remontam o contexto intelectual da revolução darwiniana e
político a consolidação do Estado colonialista europeu. As obras de Morgan, Frazer e
Tylor formam a gênese da então nova ciência, amplamente amparados pela concepção
evolucionista. No século XX, contudo, a perspectiva evolucionista foi largamente
criticada cedendo espaço, inicialmente, para o funcionalismo – tendo como expoente
Émile Durkheim e, especificamente no campo antropológico, as observações
intelectuais de Mauss, Malinowski e Radicliffe-Brown.

CIÊNCIA POLÍTICA
No século III a.C Aristóteles escreveu em Política que o “homem é um animal político”
(ARISTÓTELES apud CHÂTELET et al., 1997, p. 15). A tradição clássica grega é sem
dúvida precursora no estudo da política e deixou legado relevante para seus estudos. A
partir de um salto temporal que atinge o Renascimento e o subseqüente período
moderno destacam-se autores notadamente influentes na ciência política como
Maquiavel (1469-1527), Hobbes (1588-1679), Locke (1632-1704), Montesquieu (1689-
1775), Rousseau (1712-1778) e Tocqueville (1805-1859). Contudo a produção
intelectual envolvendo a temática se processava sem continuidade, estava situada muito
mais no campo da filosofia política e não representou força para desenvolver um ramo
acadêmico, haja vista a descontinuidade da produção científica. Segundo Blondel
(1996), somente na segunda metade do século XIX a Ciência Política se constitui
enquanto disciplina acadêmica. Ainda segundo o autor a política se refere:
Ao poder, lidando com a resolução de conflitos ou fornecendo mecanismos para
a tomada de decisões. Na verdade, a política abrange todas essas coisas, uma
vez que é o mecanismo através do qual uma ação coletiva pode ser exercida em
qualquer comunidade, na medida em que nela não há unanimidade e enquanto a
comunidade continua a existir. (BLONDEL, 1996, p. 80).
A ciência política se destaca pelo tratamento científico dado ao objeto específico, que
gravita em torno da política e, consequentemente, da noção de poder – entendido no
âmbito das ciências humanas como potência de influência: 1) sobre a própria ação do
agente; 2) sobre outrem; ou 3) sobre grupo específico (LEBRUN, 1984).
Para Paranhos (1987):
O que se denomina de Ciência Política encontra seu objeto de investigação e
análise num elenco considerável de preocupações que envolvem, em termos
gerais, as Ciências Sociais. Toma como eixo a questão do poder, do Estado, do
governo, das relações de dominação, da autoridade, abrindo campo para o
estudo, entre muitos outros temas, da ideologia, dos partidos políticos, dos
sindicatos, gravitando, assim, prioritariamente, em torno de determinadas
instituições políticas e sociais. (PARANHOS, 1987, p. 53).
O objeto da ciência política, assim, expõe um dilema fundamental relacionado à
idiossincrasia, uma vez que a ação coletiva e a liderança são elementos chaves no
exercício do poder.
SOCIOLOGIA
O primeiro autor a conferir o nome de sociologia à “ciência da sociedade” foi Auguste
Comte. Contudo, atribuir à sociologia o estudo da sociedade é demasiado vago e
sobreposto a outras ciências, como a ciência política e antropologia, por exemplo. A
adoção de um objeto tão vago, contudo, obscurece a ciência que pretendia inaugurar-se.
A consolidação da sociologia enquanto disciplina acadêmica se processou na segunda
metade do século XIX com as obras notadamente de Émile Durkheim e Max Weber,
cujos trabalhos tinham a preocupação de nortear o campo de atuação da ciência. Esses
autores tiveram a preocupação destacada em delimitar o objeto e a metodologia própria
da sociologia, diferenciando-a de outras ciências humanas. Destaca-se ainda a obra de
Karl Marx na composição da então nova ciência, formando com os outros dois autores o
núcleo clássico da sociologia. Este último, porém, destoa do contexto científico da
época ao declarar que a ciência deve ter como pressuposto a intervenção social – crítico
e transformador – anulando a hipótese de neutralidade científica.
Segundo Costa (1987), “a sociologia é uma ciência que se define não por seu objeto de
estudo mas por sua abordagem, isto é, pela forma como pesquisa, analisa e interpreta os
fenômenos sociais” (COSTA, 1987, p. 11). Na verdade as variadas formas de
combinação entre objeto – que nas ciências humanas é constituído de sujeitos-objetos,
dada sua ação e potência de interação – e metodologias, conferem à sociologia sua
singularidade. Decorre desse quadro geral a importância dos conceitos como
ferramentas teóricas para apreensão das relações sociais em conluio com o referencial
teórico-metodológico para balizar as análises. Assim apresento os três conceitos-chaves
dos três clássicos da sociologia – Durkheim, Weber e Marx.
Émile Durkheim (1858-1917) destaca em sua sociologia o estudo dos fatos sociais que
são reconhecíveis por ser:
Toda maneira de agir fixa ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma
coerção exterior; ou então ainda, que é geral na extensão de uma sociedade
dada, apresentando uma existência própria, independente das manifestações
individuais que possa ter. (DURKHEIM, 1978, p. 11).
Já para Max Weber (1864-1920) o objeto de estudo da sociologia é a ação social que:
Orienta-se pelo comportamento de outros, seja este passado, presente ou
esperado como futuro (vingança por ataques anteriores, defesa contra ataques
presentes ou medidas de defesa pra enfrentar ataques futuros). Os ‘outros’
podem ser indivíduos e conhecidos ou uma multiplicidade indeterminada de
pessoas completamente desconhecidas (‘dinheiro’, por exemplo, significa um
bem destinado à troca, que o agente aceita no ato de troca, porque sua ação está
orientada pela expectativa de que muitos outros, porém desconhecidos e em
número indeterminado, estarão dispostos a aceitá-lo também, por sua parte,
num ato de troca futuro).
Karl Marx (1818-1883) destaca em suas análises os modos de produção – que são a
base de conflitos de classe – como questão-chave:
O modo pelo qual os homens produzem os seus meios de vida depende
inicialmente da constituição mesma dos meios de vida encontrados aí e a ser
produzidos. Este modo da produção não deve ser considerado só segundo o
aspecto de ser a reprodução da existência física dos indivíduos. Ele já é antes
uma maneira determinada de atividade desses indivíduos, uma maneira
determinada de manifestar em a sua vida, um modo de vida determinado. Os
indivíduos são assim como manifestam a sua vida. O que eles são coincide
portanto com a sua produção, tanto com o que produzem quanto também com
o como produzem. Portanto, o que os indivíduos são depende das condições
materiais da sua produção. (MARX e ENGELS, 1983 187).

DIVERSIDADE TEÓRICO-METODOLÓGICA DAS CIÊNCIAS SOCIAIS


As matrizes teórico-metodológicas das Ciências Sociais em conjunto com seus
respectivos objetos delimitados conferem singularidade aos campos disciplinares. Com
a sofisticação dos argumentos e do referencial teórico, observamos atualmente um
crescente número de novas abordagens, que seriam impossíveis de serem abordadas
num espaço conferido à introdução das Ciências Sociais. Assim faz-se necessário uma
abordagem pontual. Destaco as matrizes funcionalista, compreensiva, materialista
histórica e a estruturalista, dadas suas combinações/recombinações,
interpretações/reinterpretações, configurações/reconfigurações ao longo da história das
Ciências Sociais, bem como a atualidade, se consideradas suas revisitações. Admito o
quanto é difícil estabelecer um corte como esse, tendo em vista que abordagens como a
evolucionista, tão cara a antropologia e a sociologia marxista, não sejam contempladas.
Justifico minha posição atribuindo a combinação de concepções clássicas que, porém,
mantêm sua atualidade e inserção na produção acadêmica.

MATERIALISMO HISTÓRICO
O materialismo histórico se apresenta como raiz diametralmente oposta ao idealismo,
donde as idéias precedem a matéria. Para o materialismo histórico “qualquer coisa que
exista é apenas matéria, ou pelo menos depende dela” (BHASKAR, 1996, p. 452).
Apresenta-se como uma reação à metafísica, declarando que o mundo empírico é a base
do conhecimento humano e que a história reflete a relação entre seres humanos e
matéria por intermédio dos modos de produção. Tais relações são alteradas ao longo do
tempo conformando novos arranjos sociais. Marx, seu expoente clássico, explica o
materialismo histórico da seguinte forma:
Inteiramente em oposição à filosofia alemã que desce do céu para a terra, aqui
se sobre da terra para o céu. Em outras palavras, não se parte do que os homens
dizem, imaginam, se representam, também não de homens ditos, pensados,
imaginados, representados, para daí se chegar aos homens de carne e osso;
parte-se de homens efetivamente ativos e a partir do processo efetivo de vida
deles é também apresentado o desenvolvimento dos reflexos ideológicos e dos
ecos desse processo de vida. Também as imagens nebulosas no cérebro dos
homens são sublimações necessárias do seu processo material de vida,
empiricamente constável e ligado a pressupostos materiais. Com isso a moral,
religião, metafísica e qualquer outra ideologia e as formas de consciência
correspondentes a elas, não mantêm mais a aparência de autonomia. Não têm
história, não têm desenvolvimento, mas desenvolvendo a sua produção material
e o seu intercâmbio material os homens mudam, com esta sua realidade efetiva,
também o seu pensamento e os produtos do seu pensamento. Não a consciência
determina a vida, mas a vida determina a consciência. (MARX e ENGELS,
1983, p. 193).
Este fragmento do texto de A história dos homens contida no livro A ideologia alemã –
escrito entre 1845-1848 – retrata bem a postura metodológica do materialismo histórico.
À obra de Marx o materialismo histórico ainda foi adicionado a dialética materialista
que consiste basicamente no seguinte processo:
TESE ANTI-TESE SÍNTESE
Sendo que a tese emana da matéria – este ponto é especial se comparado com a dialética
em Hegel, que sugere a origem da tese na metafísica.
Os estudos de Marx influenciaram os três campos das Ciências Sociais.

FUNCIONALISMO
Esta corrente se preocupa basicamente com as instituições sociais em suas formas
duráveis. A matriz funcionalista foca esforços na investigação das formas de
manutenção da sociedade. Os padrões sociais e suas respectivas funções dentro do
cenário social são analisados e desejados em resposta a uma necessidade de sociedade
coesa. A busca do equilíbrio social como modelo de sociedade é permeada pelo estudo
das partes, tendo como parâmetro o funcionamento do todo. Para Bruyne et al. “o
funcionalismo convém para estudar a sociedade como uma totalidade que integra as
diferentes instituições e que as utiliza para sua conservação” (BRUYNE, HERMAN e
SCHOUTHEETE, 1991, p. 144).
Assim, Durkheim (1978) em seus estudos sobre crime atesta seu caráter normal, dado
que é observado em todas as sociedades conhecidas e, portanto, não pertencente ao rol
das excentricidades e sim da continuidade. A perspectiva durkheiminiana considera que
a sociedade é mais que o simples conjunto de indivíduos e exerce coercitividades sobre
esses. Daí seu objeto – fato social – versar sobre inter-relações humanas cuja dimensão
coercitiva – emanada da sociedade – é tão presente quanto a própria interação social.
Essa coercitividade age sobre os indivíduos de forma a manter a ordem social.
O funcionalismo teve grande inserção na antropologia – com os estudos de Malinowski
e Radicliffe-Brown – e na sociologia – expresso nas obras de Merton e Parsons, por
exemplo.

MATRIZ COMPREENSIVA
A matriz compreensiva ao contrário do funcionalismo foca sua atenção à ação
individual constituída de elementos sociais.
A abordagem compreensiva visa apreender e explicar o sentido da atividade
social individual e coletiva enquanto realização de uma intenção. Ela se
justifica na medida em que a ação humana é essencialmente a expressão de uma
consciência, o produto de valores, a resultante de motivações. (BRUYNE,
HERMAN e SCHOUTHEETE, 1991, p. 139)
Nem toda ação é ação social – “um choque entre dois ciclistas, por exemplo, é um
simples acontecimento do mesmo caráter de um fenômeno natural” (WEBER, 1994, p.
14). A ação social é dotada de subjetividade e sua constituição socialmente atribuída – a
linguagem é aprendida socialmente, assim como os sistemas de valores, pesos e
medidas, sentimentos, etc. – dota-a de significação, conferindo racionalidades à ação.
As causas das ações são multivariadas, a totalidade social é multifacetada e as relações
sociais são dotadas de significados. A Ciência, assim, possui caráter compreensivo
desses significados multidimensionais. Aqui ressalto a crítica ao marxismo que atribui
peso desigual à dimensão econômica, que confere à luta de classes o motor da história.
A fim de apreender a realidade e conferir validade científica aos seus trabalhos, Weber
lança mão dos tipos ideais como recurso metodológico. Esses são construções abstratas
no sentido que não são observados na realidade e servem de parâmetros aos elementos
reconhecíveis empiricamente.
Os estudos de Weber tiveram grande inserção na sociologia, na ciência política e na
antropologia – esta última a partir de releituras e recombinações da matriz compreensiva
– e inauguraram o que ficou convencionado chamar de individualismo metodológico.

ESTRUTURALISMO
O estruturalismo se caracteriza pela sua natureza sistêmica e nesse ponto se aproxima
do funcionalismo. Contudo a tensão entre agente e sociedade é abordada de forma
radicalmente diferente entre ambas. Se de um lado a sociedade se apresenta de forma
impositiva e coercitiva, no estruturalismo as estruturas demarcam a manifestação da
“transformação e produção de sentido novo” (BRUYNE, HERMAN e
SCHOUTHEETE, 1991, p. 146). O significado do conteúdo em dada relação social
advêm, na perspectiva estruturalista, da interação entre estrutura-estruturante –
sociedade, por exemplo – e estrutura-estruturadora – indivíduo, por exemplo. A
sociedade é vista como uma estrutura onde seus elementos estão conectados, porém ao
contrário do funcionalismo não representam elos funcionais entre si. A estrutura social é
o que organiza, o que conecta e relaciona as diversas instâncias, as múltiplas relações
entre grupos e instituições e demais elementos, sendo que estrutura é uma construção
teórica capaz de dar sentido aos dados empíricos, mas que não é empiricamente
observável. Segundo Boudon e Bourricaud (1993) o estruturalismo demonstra que “um
conjunto de instituições características de uma sociedade constitui uma ‘estrutura’ no
sentido de que esse conjunto deve ser analisado como uma combinação não-aleatória de
elementos” (BOUDON e BOURRICAUD, 1993, p. 225). Esse caminho metodológico
propõe, ainda, uma saída particular para problemas gerais, afinal cada estrutura é
analisada dentro de seu perfil particular.
A obra de Lévi-Strauss (1908-) é expoente do estruturalismo nas Ciências Sociais. Sua
perspectiva obteve maior inserção na antropologia e na sociologia – nesta última pode
ser apreciada a obras recentes de Pierre Bourdieu, que se auto-intitulava como
estruturalista genético.

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