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Campus Garanhuns
Garanhuns
2022
ANA VITÓRIA SOARES MORAES
ARTHUR HENRIQUE MACÁRIO SOARES
ELENA FELIX PORDEUS
LAÍS MARIA DA COSTA SILVA
MARIA STHEFANIE LIMA FERREIRA
Garanhuns
2022
A UTILIZAÇÃO DE IMAGENS NO ENSINO DE HISTÓRIA: UM TRABALHO DE
ANÁLISE E DESCONSTRUÇÃO DE MITOS NO ENSINO DE HISTÓRIA NO
BRASIL
RESUMO
O presente artigo busca analisar a utilização das imagens no ensino de história do Brasil como
uma forma de desconstrução de alguns mitos solidificados no imaginário social brasileiro. É
trazido como proposta o exame e contextualizações históricas das representações imagéticas
dos indígenas nas obras de Albert Eckhout e a construção da figura de Tiradentes enquanto
um herói da república e sua associação com a figura de Jesus Cristo durante os anos iniciais
da República brasileira e, posteriormente, com características cívicas e patrióticas no período
Varguista nas obras de Pedro Américo, Aurélio de Figueiredo e José Wasth Rodrigues.
1
Graduanda do curso de licenciatura em história pela Universidade de Pernambuco (UPE) - campus Garanhuns -
anavitoria.moraes@upe.br
2
Graduando do curso de licenciatura em história pela Universidade de Pernambuco (UPE) - campus Garanhuns -
arthur.msoares@upe.br
3
Graduanda do curso de licenciatura em história pela Universidade de Pernambuco (UPE) - campus Garanhuns -
elena.pordeus@upe.br
4
Graduanda do curso de licenciatura em história pela Universidade de Pernambuco (UPE) - campus Garanhuns -
lais.maria@upe.br
5
Graduanda do curso de licenciatura em história pela Universidade de Pernambuco (UPE) - campus Garanhuns -
sthefanie.lima@upe.br
1. INTRODUÇÃO
Ao longo de toda nossa história há uma tentativa de afirmar uma identidade nacional,
movimento muito influenciado pelo positivismo do século XIX. A história que, como
disciplina, acabara de nascer se alinhava a esses traços positivistas e nacionalistas, estando ali
para contribuir com o crescimento do sentimento de nação e encontrar no passado, através de
heróis e grandes narrativas, um incentivo para tal sentimento nacionalista (NADAI, 2020).
Essa história, que nasce no século XIX, é marcada pela: utilização de métodos; de fontes
documentais; por uma imparcialidade diante a história; e pela procura por uma reconstrução
histórica fidedigna, capaz de retratar exatamente os acontecimentos do passado.
E aqui no Brasil podemos citar dois exemplos que seguem esse tipo de história:
Francisco Adolfo Varnhagen e o Instituto Histórico Geográfico Brasileiro (IHGB). Segundo
Pinsky (2020), Varnhagen é o responsável por pôr em papel a ideia do Brasil como uma
nação, ou que houvesse o sentimento nacionalista, por mais que na época esse sentimento não
estava de fato consolidado, mas sim se construindo. “Varnhagen é, pois, o criador da nação
brasileira, mesmo antes de ela existir de fato. O Brasil, como nação, só apareceria algumas
décadas após a publicação de sua obra.” (PINSKY, 2020, p.17).
O IHGB segue a mesma premissa de exaltar a pátria e o sentimento de nação em voga
na época, o instituto fora criado em 1838.
[...] criado no século XIX, como instituição voltada para a produção de uma história
nacional comprometida com a construção de valores que garantisse o delineamento
de um perfil para a nação brasileira. A revista do IHGB deveria funcionar como um
veículo para desenvolver as novas gerações o amor à pátria e às instituições.
(FERREIRA; FRANCO, 2013, p.34).
Nota-se uma tentativa de tornar o indigena como herói nacional desde antes da
república perpassando até a Era Vargas. Um exemplo dessas tentativas são os romances
indianistas de José de Alencar do século XIX, como O guarani e Iracema. Mas, como citado
acima pela Elza Nadai (2020), o indigena estaria submetido ao branco cristão.
Selecionamos, aqui, uma ótica específica para trabalharmos com as representações dos
indígenas ao longo da historiografia no Brasil. Essa ótica seria a do “bom selvagem” em
contraste com o “mau selvagem”, mais especificamente, representados nas obras de Albert
Eckhout, no século XVII.
Albert Eckhout, artista holandes da corte de Maurício de Nassau, produziu obras e
pinturas de gênero, ou seja, tipos e costumes sobre o Novo Mundo. Dentre as produções
estão: Homem Negro, Mulher Negra, Homem Mulato, Mulher Mameluca, Homem Tupi,
Mulher Tupi, Homem Tapuia e Mulher Tapuia. Aqui, iremos conversar sobre a Mulher Tapuia
(1637-1644) e a Mulher Tupi (1641). Sobre as pinturas de Eckhout, o historiador Yobenj
Aucardo (2008) afirma que:
Eckhout vai inaugurar uma época em que a imagem mais descritiva e
naturalista vai se impor nos registros dos viajantes. Entretanto, não é possível
separar o que se “ve” do que se “sabe” (experiência). A pintura holandesa de
Eckhout é prova disso; ainda que o artista possua técnicas sofisticadas, como
o uso da perspectiva, o domínio das cores, a habilidade nos detalhes,
ferramentas para representar o mundo natural, está evidente que “redutos de
convenções” – parafraseando Gombrich – faziam com que os artistas
aplicassem fórmulas aprendidas ao invés de se apoiarem completamente no
natural. (CHICANGANA-BAYONA, 2008, p. 603)
Na pintura da Mulher Tupi (Figura 1) esta é retratada vestida, seus cabelos presos com
uma trança, um cesto na cabeça, uma criança nos braços, uma bananeira ao lado - planta
introduzida pelos colonos - e ao fundo uma propriedade que configura-se semelhante a um
engenho. Já na pintura da Mulher Tapuia (Figura 2) esta aparece seminua, cabelos soltos e
levando em suas mãos e cesto, partes do corpo de um ser humano (braços e pernas) além de
está em um ambiente visivelmente longínquo do de convívio da sociedade “civilizada”.
Fonte: Itaucultural
Visto isso, entende-se que o contexto das imagens reafirmam as ideias coloniais de que
existiam grupos indígenas amigos e não amigos além de evidenciar um grau de civilidade a
partir dos contrastes da composição das pinturas. A Mulher Tupi está perto dos colonos e
carregando uma criança deixando-a com aparência afetiva. Já o conteúdo da Mulher Tapuia
remete ao ritual de Antropofagia por vezes mal interpretado pelos colonos e sendo levado
para um campo religioso de interpretação e não cultural que por sua vez a prática era realizada
em razão dos rituais específicos de cada etnia e contribuiu para reforçar as ideias dos povos
indígenas distantes dos “civilizados” terem caráter bárbaro.
Outro ponto a ser observado é a presença dos animais nas duas produções, enquanto na
mulher tupi está um sapo - indefeso -, na mulher tapuia está uma cobra. Este é um aspecto que
se repete em demais produções sobre os tapuias: a inserção de bichos peçonhentos também
para reafirmar sua barbárie, Dito isso, Eckhout trabalha nas suas telas com categorias de
civilizado, relativamente civilizado e completamente incivilizado. Categorias estas que
respondiam à relação estabelecida com o próprio europeu, mais que as próprias características
linguísticas, étnicas ou culturais (CHICANGANA-BAYONA, 2008, p. 600)
Com a imagem de Tiradentes não foi diferente, é na segunda metade do século XIX,
em meio ao um período no qual o republicanismo se torna latente,que sua história é resgatada
como a encarnação dos ideais da república brasileira. Essa adoção de símbolos é ainda mais
forte após a proclamação da República em 1889, os participantes do 15 de novembro
acabavam por não passar uma mensagem de unidade do movimento para ser solidificada na
memória nacional, não agradavam a todos e a promoção de nomes como os de Deodoro da
Fonseca e Floriano Peixoto enquanto heróis da república não resultou em algo significativo
"A pequena densidade histórica do 15 de novembro (uma passeata militar) não fornecia
terreno adequado para a germinação de mitos" (CARVALHO,1990, p. 57).
A imagem de Tiradentes tem seu destaque no campo das disputas de narrativas
monárquicas e republicanas em 1862, no evento de inauguração da estátua equestre dedicada
ao imperador dom Pedro I, erguida no local onde fora anteriormente erguida a forca do
suplício de Tiradentes, considerado como uma afronta edificar ali a imagem do neto da
mulher responsável pela condenação mesmo, isso provocou reações por parte dos
republicanos "Teófilo Otoni, o liberal mineiro líder da revolta de 1842, chamou a estátua de
mentiras de bronze, e a expressão virou grito de guerra dos republicanos" (CARVALHO,
1990, p.60).
Direcionando a análise à iconografia do herói produzida no período do início da
República se destacam as obras “Tiradentes esquartejado” de Pedro Américo, produzida em
1893 e a obra “Martírio de Tiradentes”, de Aurélio de Figueiredo, também do ano de 1893.
Um ponto a ser evidenciado ao analisar essas construções imagéticas é o fato de serem
inspiradas na iconografia construída de Jesus Cristo, essa construção se deu pelo fato de haver
uma forte influência cristã no Brasil.
Apesar de não ter sido crucificado, Tiradentes é representado, em uma plano que
lembra a crucificação de Cristo, na obra de Pedro Américo (Figura 3) “A cabeça, com longas
barbas ruivas, está colocada em posição mais alta, tendo ao lado um crucifixo, numa clara
sugestão da semelhança entre os dois dramas”. (CARVALHO, 1990, p. 65)
Na obra O Martírio de Tiradentes (Figura 4) a influência cristã continua a ser
reforçada pelo artista:
Na cena, o alferes aparece visualizado de baixo para cima e o frade que o
acompanhou ao cadafalso mostra-lhe, em seus últimos momentos de vida, um
crucifixo, que nos permite visualizar naquela representação toda uma simbologia
que indica que o seu sofrimento até a forca assemelha-se ao sofrimento sentido por
Cristo após sofrer a traição de um de seus discípulos. (BORGES, 2020)
Figura 5: Alferes Joaquim José da Silva Xavier. O Tiradentes, de José Wasth Rodrigues, 1940.
Nos parágrafos anteriores, vimos como a história - em seu início como disciplina e
como ciência - utilizava-se das fontes e que tipo de fonte eram consideradas pelos
historiadores da escola metódica e positivista do século XIX, seriam elas apenas documentais.
Há uma grande mudança no século XX, com o movimento da Escola dos Annales, onde um
dos pontos de mudança será a possibilidade de análise de outras fontes para o trabalho do
historiador e é nesse momento em que a utilização de imagens toma uma nova força dentro da
historiografia.
As imagens, nas suas diversas formas de representação, são consideradas fontes de
grande valia para o historiador na atualidade. Sem dúvida, a participação do grupo
dos Annales no processo de legitimação das fontes visuais no campo historiográfico
teve importante peso. As discussões sobre a ampliação da noção de documento, a
incorporação de novas fontes, a aproximação da história com outras ciências
humanas e a renovação de temas e problemas foram pontos fundamentais para que
as fontes visuais fossem incorporadas definitivamente no leque de possibilidades dos
pesquisadores. (MUAZE, 2015, p.2015)
Tendo essas mudanças em mente, podemos partir para a questão da utilização de
imagens na sala de aula, aprofundado a questão da problematização de como a iconografia foi
utilizada e ainda pode ser, durante o ensino de história no Brasil. O primeiro ponto a se
problematizar é a utilização das imagens de forma passiva e meramente ilustrativa, ou seja,
quando os professores usam a iconografia para exemplificar o contexto histórico, porém não
problematizam e não transcendem o que é representado na obra. Sobre essa problemática,
Muaze vai falar sobre a formação dos professores na área das licenciaturas:
Os currículos dos cursos de licenciatura e bacharelado em história das diferentes
universidades do país tendem, na sua maioria, a reafirmar essa inclinação ao não
oferecerem (ou oferecerem de forma tímida) disciplinas de caráter Instrumental no
que compete ao trabalho com imagem, cultura visual, visualidade. Essa formação
logocêntrica reforça a prática de decodificar imagem em texto, esvaziando-a de seu
potencial interpretativo e expressão social. (MUAZE, 2015, p.22)
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
CARVALHO, José Murilo de. A formação das almas: o imaginário da República no Brasil.
São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
MUAZE, Mariana de Aguiar Ferreira. Ensino de história e imagens: territórios possíveis. In:
ROCHA, Helenice; MAGALHÃES, Marcelo; GONTIJO, Rebeca (org.). O ensino de
história em questão: cultura histórica, uso do passado. Rio de Janeiro: Fgv, 2015.
NADAI, Elza. O ensino de história e a "pedagogia do cidadão". In: PINSKY, Jaime (org.). O
ensino de história e a criação do fato. 14º ed. São Paulo: Contexto, 2020.
PINSKY, Jaime. Nação e o ensino de história. In: PINSKY, Jaime (org.). O ensino de
história e a criação do fato. 14. ed. São Paulo: Contexto, 2020. p. 1-142.